Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
844/16.1T8MTA.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: SEGURO DE INVALIDEZ
DATA DA VERIFICAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I. Sendo o risco coberto por um seguro a invalidez total e permanente, o sinistro ocorre quando ela se dá e não quando ela se apura no fim do processo destinado a isso.
II. Os sentimentos negativos sofridos pelo autor com a opção, pela seguradora, da data do sinistro como sendo a data do apuramento do sinistro, devem ser indemnizados como danos não patrimoniais.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

             A intentou a presente acção contra a Companhia de Seguros, SA, e o Banco, SA, pedindo a condenação solidária das rés a pagarem-lhe: (i) 3000€ de indemnização por danos morais, 4853,21€ relativos às mensalidades do empréstimo (capital e juros) e 727,60€ relativos aos prémios do seguro, pagos pelo autor desde 2014 até Agosto de 2015; e (ii) o que se liquidar mais tarde relativamente às quantias por si pagas relativamente ao período compreendido entre 2012 e 2014; tudo com juros legais: o relativo a danos morais a partir da citação e as restantes quantias desde a incapacidade.
             Alegou para tanto, em síntese, que contraiu um empréstimo no banco para compra de habitação e que, para cobertura do risco de não poder pagar esse empréstimo, por morte ou incapacidade, aderiu a um contrato de seguro que já existia entre o banco e a seguradora, ambas do mesmo grupo económico; a incapacidade verificou-se em 2012 mas, por não ter sido informado, pelo banco, dos trâmites necessários para accionar o seguro, nem das cláusulas do seguro, e apesar de tudo o que fez para o efeito junto da mesmo banco, só em fins de 2015, com efeitos reportados a 13/08/2015, é que a seguradora pagou ao banco o empréstimo em causa, tendo ele tido que pagar até lá os valores em dívida.
             Citadas em 14/12/2016, as rés contestaram impugnando, no essencial, os factos alegados pelo autor no que se refere aos comportamentos e culpas que ele lhes imputava, dizendo terem cumprido as suas obrigações nos termos devidos.
             Realizado o julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e absolvendo as rés dos pedidos.
             O autor recorre desta sentença, porque entende que o risco segurado se concretizou em 2012 ou pelo menos 2014, pelo que, desde uma dessas datas devia ter deixado de pagar o empréstimo, pelo que tem direito ao reembolso dos valores pagos desde uma delas.
             As rés contra-alegaram defendendo a improcedência do recurso.
             Questão que importa decidir: se o autor tem direito aos valores peticionados.           
                                                                 *
              Foram dados como provados os seguintes factos provados [em B transcreveu-se também o que consta das condições particulares do contrato em causa, esclarecendo-se que as transcritas no corpo de B vêm das condições gerais; provado com base no mesmo contrato, naturalmente não impugnado]:
             A) Em 10/11/1999, o autor celebrou com o banco um empréstimo à habitação/construção, ao qual foi atribuído o n.º HPP 000.000000.485, pelo valor contratado de 74.819,68€, em 288 prestações durante 300 meses.
             B) O autor aderiu, por proposta datada de 14/11/2005, a um seguro vida grupo celebrado entre as rés, titulado pela apólice 5.001.152, com a cobertura, durante o prazo do empréstimo, dos riscos de morte e invalidez total e permanente por doença ou acidente definindo-se esta [nas condições gerais] como «a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos: a) a pessoa segura fique completa e definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos e aptidões; b) corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem de 66,66%, definida em condições particulares, de acordo com a tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela pessoa segura»; c) seja reconhecida previamente pela instituição de segurança social pela qual a pessoa segura se encontre abrangida ou pelo tribunal do trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de segurança social, por junta médica».
              Nas condições particulares consta o seguinte:
Artigo 3.°
Riscos Cobertos
             O que está coberto:
             1. O Contrato de Seguro abrange as seguintes garantias:
             a) Garantia Principal — Morte por Doença ou Acidente;
             b) Garantia Complementar — Invalidez Total e Permanente por Doença ou Acidente.
             Considera-se inválido a Pessoa Segura que apresente um grau de desvalorização igual ou superior a 66,6(6)%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Tra-balho e Doenças Profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela Pessoa Segura, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias preexistentes.
              A garantia corresponde à antecipação de 100% do capital seguro.
[…]
             C) Tendo-se acordado que, mediante o pagamento de determinada quantia monetária por parte do autor, o banco iria receber da seguradora as quantias em dívida do empréstimo no momento da ocorrência do risco morte ou invalidez total e permanente do autor.
             D) O autor pagou as quantias monetárias respeitantes ao seguro mencionado em B e C, entre 2012 e 2015, tendo pago o montante de 907,30€, referente a 2012 e 2013, sendo o capital seguro, em 2012, de 51.556,07€, a importância de 767,88€, entre 2014 e Agosto de 2015, sendo o capital seguro, em 2014, de 41.351,99€.
              E) O autor ficou doente em Outubro de 2012, sofrendo de blefarospasmo, ficando desde Novembro de 2012 de baixa por doença.
              F) Em 25/05/2015, uma junta médica atribuiu ao autor uma incapacidade permanente global de 0,957 [= 95,70%], devido a uma deficiência assim definida na tabela nacional de incapacidades, referindo que a incapacidade está instalada desde 2014.
             G) O autor solicitou por escrito, junto do banco o accionamento do seguro no dia 16/06/2015, a qual remeteu à seguradora o pedido, nessa data.
             H) A seguradora, em 24/06/2015, remeteu à agência do banco resposta no sentido de ser necessário para a apreciação do sinistro documento do banco (ou outro similar) com data da passagem definitiva à situação de reforma.
             I) Em 17/11/2015, o autor remeteu à agência do banco, através de e-mail, o documento atinente à reforma, emitido pelo Instituto da Seg. Social, datado de 10/11/2015, atribuindo pensão por invalidez absoluta, com início em 13/08/2015.
              J) E o banco remeteu-o à seguradora em 19/11/2015.
              K) Após a recepção do documento a seguradora concluiu o processo de sinistro e emitiu o respectivo recibo de indemnização, remetendo-o à agência do banco em 11/12/2015, autorizando o débito na conta do autor do valor de 35.573,48€.
              L) A seguradora reconheceu a incapacidade do autor com efeitos a partir de 13/8/2015, para efeitos do seguro descrito em B e C.
             M) O banco promoveu a liquidação do empréstimo A em 22/12/2015, pelo valor de 34.534,99€, montante que se encontrava em dívida à data do pagamento.
             N) Tendo o remanescente do valor do recibo, conforme montantes assinalados em K e M, permanecido na conta à ordem do autor, atendendo ao momento do reconhecimento da incapacidade, mencionado em L.
             O) A espera pelo accionamento do seguro e a data escolhida para pagamento do capital, elencada em D, provocou angústia, ten-são e desgaste emocional e psicológico ao autor, face à sua doença.
             A sentença fundamentou assim o indeferimento da pretensão do autor, em síntese feita por este TRL:
             No contrato de seguro em causa, o risco consistia, em alternativa, na morte do autor ou na sua invalidez total e permanente por doença, considerando-se inválida a pessoa que apresente um grau de desvalorização igual ou superior a 66,6(6)%, de acordo com a tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida.
             Invoca (e prova) o autor que sofreu uma incapacidade permanente global superior a 66%. Tal facto, porém, não é contestado pela seguradora, que despendeu quantia suficiente para a liquidação do mútuo bancário, conforme contratualizado. O direito controvertido prende-se então com a data a que deveria imputar-se o pagamento.
             Nesta sede, o autor aponta dois momentos, o primeiro do início da doença (tendo no caso logrado demonstrar-se que o autor começou a demonstrar sintomatologia em Outubro / Novembro de 2012), em seguida o do atestado de incapacidade (que aponta para o ano de 2014).
             Já a seguradora propugna que, de acordo com o contrato celebrado, será de estabelecer a incapacidade para o trabalho para o dia 13/08/2015, data em que o ISS considerou o autor como reformado por incapacidade.
             Assim, importa saber qual o momento em que, de acordo com o seguro celebrado entre as rés e alvo da adesão do autor, deveria ser liquidado o empréstimo bancário.
             Ora, nesta sede, logrou-se demonstrar que o risco assumido pela seguradora se relaciona com a incapacidade do autor para o trabalho, o que se percebe, uma vez que o autor perdendo a capacidade de receber rendimento coloca em causa, pelo menos em termos de probabilidade, o pagamento do mútuo bancário a que o seguro em questão se encontra adstrito.
                Mas a incapacidade, para além de ter de ser superior a 66,66% (como já vimos que é), terá de ser reconhecida previamente pela ISS pela qual a pessoa segura se encontre abrangida ou pelo tribunal do trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de segurança social, por junta médica (tudo conforme B dos factos provados).
             Assim sendo, mesmo que não se tenha demonstrado a informação da cláusula em apreço por parte das rés, seria sempre esta a interpretação a fazer de acordo com as regras da boa fé, tendo em atenção que o autor sabia – ou deveria saber – que só com a incapacidade para o trabalho é que o seguro seria activado.
             Tudo aponta, então, para o momento em que se constatou que o autor ficou incapacitado para o trabalho, no caso a ocasião temporal em que o autor se encontrou reformado, ou seja, o dia 13/08/2015, uma vez que, conforme aponta a seguradora, os conceitos de incapacidade e de incapacidade para o trabalho não são totalmente coincidentes, sendo certo que, a não concordar com a data elencada como o da incapacidade para o trabalho – conforme delineada pelo ISS – deveria o autor ter impugnado tal acto administrativo, o que não fez (não o tendo sequer alegado em sede de PI), conformando-se com o mesmo, com as consequências daí advenientes.
             Pelo exposto, não existe qualquer incumprimento contratual por parte das rés.
                                                                 *
            O autor argumenta com o seguinte (transcreve-se tudo o que de útil consta do próprio corpo das alegações):
                           I. Uma junta médica do Ministério da saúde (vide doc. 2 junto à PI) atribui ao autor uma incapacidade parcial permanente de 95,7% de acordo com a tabela nacional de incapacidades referindo ainda que a incapacidade esta instalada desde 2014.
                          II. As rés só consideraram e liquidaram o valor do empréstimo em divida à data de Agosto de 2015, no valor de 35.573,48€ (vide facto K) e não o valor em divida em 2014 de 41.351,99€ (vide facto D).
                         III. Ignoraram deste modo aquele facto.
                         IV. As rés, em especial o tomador banco, não provou que informou o autor do funcionamento do seguro; se tal tivesse acontecido o autor em 2012 tinha actuado de imediato junto dos réus.
                       V. Consta das cl.5ª das condições particulares do seguro junto pela seguradora, que “por cada pessoa segura, o beneficiário em caso de morte ou invalidez é o banco pelo valor da divida à data do sinistro….”
                      VI. Ora a data do sinistro é, no caso em apreço, pelo menos 2014 conforme refere a Junta médica.
                     VII. Mais, resulta do facto E que o autor ficou doente em Outubro de 2012, sofrendo de blefarospasmo, ficando desde Novembro de 2012 de baixa por doença, factos estes que enquadram todos os pressupostos da invalidez total e permanente o que reforça e explica a grave incapacidade do autor.
                   VIII. O autor juntou também relatório médico elaborado em modelo próprio da seguradora (vide doc.1 junto à PI) onde a médica do Hospital de Setúbal descreve nomeadamente a doença a sua gravidade, a data do diagnóstico (2012), coincidente com a baixa referida em E, a ocorrência de depressão em “padecimentos secundários relacionados com a invalidez”, refere ainda o estado de invalidez motiva uma invalidez absoluta de 100% (ou seja de carácter não temporário), que o autor não pode exercer qualquer outra profissão e que necessita de ajuda de terceira pessoa (vide doc.1 fls. 1 e 2 junto à PI).
                IX. Ficou dado como provado em O que “a espera pelo accionamento do seguro e a data escolhida para pagamento do capital, elencada em D, provocou angústia, tensão e desgaste emocional e psicológico ao autor, face à sua doença.”
              A seguradora respondeu, em síntese, que:
             I. Os factos devem considerar-se definitivamente assentes, quanto mais não fosse por ausência de impugnação por parte do autor na forma [e] com a substância que a lei para tal impõe.
             II. Para que o risco de invalidez total e permanente por doença se concretizasse em obrigação de indemnizar, era necessário que, cumulativamente, fossem preenchidos os três requisitos constantes do corpo B dos factos provados.
             III. Pretende o autor situar a sua situação de invalidez total e permanente por doença, primeiro em 2012 e, subsidiariamente, em 2014, pelo que se lhe impunha que demonstrasse que essa situação existia já em qualquer dessas alturas.
             IV. Demonstrou-se que «o autor ficou doente em Outubro de 2012, sofrendo de blefarospasmo, ficando desde Novembro de 2012 de baixa por doença».
             V. Mas uma situação de baixa por doença é, por definição, provisória e não implica nem determina uma incapacidade permanente e definitiva e, sobretudo, que implique que o autor haja ficado completa e definitivamente incapacitado de exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos e aptidões a partir do momento em que entrou em situação de baixa em Novembro de 2012.
            VI. Refere ainda o autor a existência de um atestado multiusos passado por uma junta médica em 25/05/2015 referindo «que a incapacidade está instalada desde 2014».
            VII. Este tipo de atestados são utilizados, muitas vezes benevolamente, para efeitos meramente fiscais, isto é, para que os destinatários dos mesmos possam ter benefícios fiscais.
            VIII. E daí que contratualmente não seja esse o elemento decisivo a ter em contra para que se deva ter como comprovada a tal situação de incapacidade definitiva, sendo antes necessário o preenchimento do 3º requisito referido no corpo de B dos factos provados.
            IX. Os três requisitos referidos no corpo de B dos factos provados apenas ficaram preenchidos em 10/11/2015, com retroacção à data de 13/08/2015 (o que nem tinha de ocorrer).
            X. O autor sempre esteve consciente da necessidade de ser reformado para que as garantias do contrato funcionassem, como expressamente resultou das suas próprias declarações de parte prestadas em audiência e do depoimento de sua mulher que, como testemunha, aí prestou também o seu depoimento.
            XI. O autor recebeu uma parte da indemnização paga pela seguradora, como resulta do facto N. E isto pela circunstância do capital em dívida ao banco na data do pagamento ser inferior à do capital seguro nessa mesma data. Não se percebe como poderia o autor pretender os valores peticionados sem deduzir aos mesmos o valor já recebido por conta do contrato de seguro ajuizado.
           XII. Qualquer valor que fosse devido pela seguradora teria como fonte uma responsabilidade contratual, porque assente no contrato de seguro ajuizado, e teria uma natureza pecuniária. Ora, como estabelece o art. 806, nºs 1 e 2, do CC, a indemnização devida em relação a obrigações pecuniárias é o pagamento de juros de mora à taxa legal contados da data da constituição em mora, o que tem como únicas excepções as obrigações emergentes de responsabilidade civil por facto ilícito e pelo risco (art. 806/3 do CC). E não sendo este o caso, e ainda que estivesse a seguradora em mora, e não está, a sanção seria o pagamento de juros de mora e não o pagamento das quantias peticionadas nos presentes autos.
              O banco respondeu, também em síntese, que:
             1. O autor olvida que, nos termos que resultam do contrato, e conforme consta do corpo do facto B, o seguro a que o autor aderiu abrange a cobertura tal como definida naquele corpo, isto é com os três requisitos cumulativos ai previstos.
             2. Conforme é do pleno conhecimento do autor e resultou provado em I, o autor apenas remeteu ao banco em 17/11/2015, através de e-mail, o documento atinente à reforma, emitido pelo ISS, datado de 10/11/2015 o qual atribuía pensão por invalidez absoluta com efeitos a 13/08/2015.
             3. E logo que tal documento chegou ao poder da seguradora, esta analisou e encerrou o processo de sinistro em apreço emitindo o respectivo recibo de indemnização ao autor, com efeitos a 13/08/2015, data da verificação da invalidez absoluta;
             4. Logo, só nessa data é que estavam preenchidos os requisitos cumulativos de verificação de incapacidade.
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              Decidindo:
O risco coberto e a data em que ele se verificou
             Apesar de nos factos provados ter sido feito constar, na 1.ª instância, apenas a definição de invalidez constante das condições gerais do contrato de seguro entre o banco e a seguradora a que o autor aderiu, na fundamentação de direito da sentença começa-se por dizer, bem, que “no contrato de seguro em causa, o risco consistia […] na invalidez total e permanente por doença, considerando-se inválida a pessoa que apresente um grau de desvalorização igual ou superior a 66,6(6)%, de acordo com a tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida.” Ou seja, utiliza-se a definição que vem das condições particulares do contrato de seguro.
             E são estas, naturalmente, as que prevalecem, por serem condições particulares e não gerais (art. 7 do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais aprovado pelo DL 446/85, de 25/10, com sucessivas alterações = LCCG).
              O risco coberto não é assim aquilo que consta do corpo do facto B, ou seja a invalidez total e permanente com o preenchimento cumulativo dos três requisitos que aí constam, os dois primeiros dando uma definição da-quela invalidez - não coincidente literalmente com a que vem das condições particulares, mas que no caso não se põe em dúvida estar à mesma verificada e por isso não interessa discutir a eventual discrepância -, e o último tendo a ver com o processo/modo de verificação dessa invalidez.
             O contraente indeterminado normal que se limitasse a aderir ao contrato, tendo em conta o artigo 3 das condições particulares do seguro, não teria dúvidas em lhe dar o sentido de que o risco coberto de invalidez total e permanente era o que aí estava definido, e não esse risco quando verificado por um determinado processo ou modo definido numa condição geral do contrato. É esse, por isso, o sentido que lhe deve ser dado (art. 11/1 da LCCG).
             E, se dúvidas houvesse, era esse o sentido que teria que prevalecer (art. 11/2 da LCCG).
             Neste mesmo sentido, veja-se o ac. do TRL de 26/01/2017, proc. 19505/15.2T8LSB.L1-2 (confirmado pelo ac. do STJ de 12/10/2017, 19505/15.2T8LSB.L1.S1): “uma coisa é a ocorrência do sinistro cujo risco está coberto pelo seguro, cuja determinação no tempo é certa, e outra é o processo de verificação dessa ocorrência e das suas consequências, cuja duração no tempo será maior ou menor e dependerá de múltiplas variáveis, em boa parte alheias à pessoa segurada, e que poderão prolongar-se até data posterior à da cessação do contrato de seguro.” (no mesmo sentido, ainda, o ac. do TRL de 09/03/2017, proc. 2121/12.8TVLSB.L1-2).
             Aliás, se assim não fosse, isto é, se, pelo contrário, o sinistro englobasse o processo de verificação da ocorrência do mesmo, bastava às seguradoras atrasar o processo de verificação do sinistro, prolongando-o para além de uma qualquer causa de cessação do contrato, para que o segurado ficasse sem a cobertura do seguro. Ou bastava que tal acontecesse mesmo sem intenção das seguradoras.
              Sendo essa a situação objectiva que está precisamente em causa naqueles dois acórdãos do TRL (o primeiro tem ainda referência a outros acórdãos no mesmo sentido; e o segundo tem extensa fundamentação).
             O art. 99 da LCS dá a noção de sinistro: O sinistro corresponde à verificação, total ou parcial, do evento que desencadeia o accionamento da cobertura do risco prevista no contrato.
             Ou, na definição partilhada por Menezes Cordeiro e Margarida Lima do Rego, “[o] sinistro corresponde a verificação, total ou parcial, dos factos compreendidos no risco assumido pelo segurador” (Contrato de seguro e terceiros, daquela autora, Coimbra Editora, Maio 2010, págs. 94-95).
              A ‘verificação’, aqui, tem o óbvio significado de ocorrência do evento, não o de processo de verificação da ocorrência. Ele é o evento que desencadeia o accionamento, não o evento mais o processo desencadeado.
             Sendo o sinistro a invalidez no sentido definido no art. 3 das condições particulares ele ocorreu no momento em que a invalidez está instalada, isto é, desde 2014 (parte final do facto F). Sendo que esta referência a 2014 tem correspondência com a mesma referência constante de D dos factos provados, ou seja, desde 01/01/2014 (foi também este o sentido considerado no ac. do TRL de Jan2017, sem sequer discutir a questão, naturalmente por a ter como linear).
             A data em que terminou o processo de verificação dessa ocorrência é irrelevante. A informação do ISS não faz parte do risco coberto.
             E também é irrelevante a data em que ele foi participado/reclamado ao banco ou à seguradora, pois que esta participação/reclamação não faz parte do sinistro (talvez pudesse fazer parte, como explicam as anotações de Arnaldo Costa Oliveira e Pedro Romano Martinez, na LCS anotada, 2011, 2ª edição, Almedina, págs. 373 a 379; mas no caso concreto não faz e por isso a questão não importa; de qualquer modo, tratando-se de um contrato celebrado por adesão, a existência de uma cláusula com esse sentido só poderia ser oposta ao aderente se tivessem sido cumpridos os deveres dos arts. 4, 5 e 6 da LCCG).
             Eventuais danos que a seguradora tivesse com a tardia participação do sinistro, teriam que ser alegados e provados pela seguradora (art. 342/1 do CC).
             Seja como for, é por conta do autor que corre o prejuízo da participação tardia. Quanto mais tarde fizer a participação, mais tarde surge a obrigação da seguradora pagar e mais tarde se vence a mesma, como se verá à frente.
*
              Para além de tudo o que antecede, ainda se poderia dizer, como o sugere a argumentação do autor, que para as rés poderem invocar a definição constante das condições gerais do contrato, contra o autor, teria que ter sido dado como provado que ao autor tinha sido dado conhecimento das mesmas, já que o autor se limitou a aderir a tal contrato (arts. 4 e 5 da LCCG). E como isso não está provado (apesar de ter sido tentado provar…), tal definição nem sequer se poderia dizer constante do contrato (art. 8-a da LCCG). 
             No entanto, a solução da questão da oponibilidade da exclusão das cláusulas à seguradora – que é quem tem de pagar - ou, visto da perspectiva contrária, da oponibilidade das cláusulas ao segurado, não é, neste momento, linear, porque, como lembra o ac. do STJ de 20/06/2017, proc. 1709/13.4TBFLG.P1.S1, “a jurisprudência do STJ na matéria não é uniforme: alguns acórdãos orientam-se no sentido de que o dever de informação aos aderentes nos seguros de grupo cabe exclusivamente ao tomador do seguro; outros, por força da aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais, defendem que também o segurador tem deveres de informação; e outros, ainda, que mesmo que tal dever recaia em primeira linha sobre o tomador do seguro, não se pode afastar que no caso concreto, por força da ambiguidade das cláusulas contratuais gerais predispostas pelo segurador, o incumprimento do dever de informação lhe seja também imputável” [neste último sentido, dir-se-ia o melhor, vejam-se os acs.: do STJ de 29/11/2016, proc. 1274/15.8T8GMR.S1: X. Na vigência do artigo 4 do DL. 176/95, de 26/07, não tendo o Banco tomador e beneficiário do seguro, provado ter cumprido o ónus de informação “sobre as coberturas exclusões contratadas”, não pode a seguradora, demandada como ré, e o Banco que na acção foi interveniente principal, opor ao aderente do contrato de seguro de grupo do ramo vida, as cláusulas que não foram informadas, para se eximirem do pagamento do capital seguro, verificado o risco previsto.”; do STJ de 14/04/2015, proc. 294/2002.E1.S1, e do TRP de 27/02/2014, proc. 2334/10.7TBGDM.P1].
             E como se entende que a outra via de fundamentação é suficiente, não se desenvolve a questão.
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             De qualquer modo, a aceitar-se que a cláusula das condições gerais existia e teria de ser tida em conta e que se sobreporia às condições particulares (contra o que, nesta parte, se decidiu acima), a mesma sempre seria de considerar proibida, por abusiva; assim, por exemplo: “É nula a cláusula de definição de ‘invalidez absoluta e definitiva’ constante do contrato de seguro (não conhecida do segurado, anteriormente à assinatura da proposta de adesão ao seguro de grupo), pela qual a seguradora proponente, afastando-se do escopo do contrato e do dever de consideração do interesse real dos aderentes, impõe o prévio reconhecimento “pela ISS pela qual a pessoa segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a pessoa segura não se encontre abrangida por nenhum regime ou instituição de Segurança Social, por junta médica”, por violar, desde logo, os arts 15 e 16, do DL 446/85, de 25/10 (LCCG), já que constitui limitação sem justificação e trai as legítimas expectativas e a confiança do segurado aderente de que o seguro cobria, sem mais, esse risco, verificada que realmente estivesse situação de invalidez absoluta e definitiva.” (ac. do TRG de 30/11/2017, proc. 830/12.0TBVCT.G1 – e Ana Serra Calmeiro, Das cláusulas abusivas no contrato de seguro, Almedina, 2014, págs. 43 a 49, espec. a nota 133), ou “É abusiva, e por isso nula, a cláusula contratual geral inserta nas Condições Gerais do dito contrato de seguro de grupo que, mercê da cumulativa exigência de plúrimas circunstâncias, limita de tal forma a verificação da invalidez total e permanente que exclui do âmbito expectável da cobertura situação de incapacidade que a deviam integrar (art. 21-a do DL 446/85, de 25/10”) (ac. do TRG de 11/07/2017, proc. 1301/15.9T8VCT.G1, com inúmeras referências – no mesmo sentido, veja-se o estudo de Ana Serra Calmeira acabado de citar, págs. 43 a 49).                 
             Assim, não tem razão a sentença, nem as rés, ao pretenderem que a data do sinistro é 13/08/2015, pois que o sinistro, tal como ele resulta do contrato, ocorre desde 2014 (facto F).
             Aliás, do ponto de vista material isto também é evidente: se a sentença recorrida entende que “o risco assumido pela seguradora se relaciona com a incapacidade do autor para o trabalho, o que se percebe, uma vez que o autor perdendo a capacidade de receber rendimento coloca em causa, pelo menos em termos de probabilidade, o pagamento do mútuo bancário a que o seguro em questão se encontra adstrito”, essa incapacidade existe desde 2014 e não no momento em que termina o processo de verificação. A partir do momento em que o autor perde a capacidade para o trabalho – 2014 – perde a capacidade de receber os rendimentos para pagar o empréstimo e por isso é desde esse momento, e não de outro, que o risco se concretizou em sinistro.
             Pelo que, o princípio geral de interpretação e integração das CCG de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluem (art. 10 da LCCG), aponta neste sentido e não naquele a que chegou a sentença recorrida.
             Mas já não tem razão, o autor, ao pretender reportar o sinistro a 2012, com base no facto E, pois que tudo o que aí consta é apenas que o autor ficou doente em Outubro de 2012, ficando desde Novembro de 2012 de baixa por doença, que não se diz ser permanente.
             É certo que o autor, com aquilo que diz em VIII, sugere que, do que consta do doc.1 junto à PI, se poderiam tirar outras conclusões. Mas o autor não disse ter recorrido da matéria de facto, não disse impugnar nenhum dos pontos de facto dados como provados, nem nenhum daqueles que foram dados como não provados, nem disse qual o concreto conteúdo de algum facto que quisesse que fosse dado como provado. Assim sendo, e como sugere a seguradora naquilo que diz em I, por força dos arts. 639/1 e 640/1-a-c, ambos do CPC, é irrelevante o que consta daquela conclusão VIII, não se tendo que apreciar, por isso, se, ao nível dos factos (com possível reflexo no direito), é o autor que tem razão no que aí diz, ou se é antes a seguradora no que diz em V (em complemento do que a motivação de facto da sentença recorrida já dizia sobre o assunto e que não se transcreve porque, por isso, não tem interesse).
             É também irrelevante aquilo que a seguradora diz em X, sobre factos que não constam dos factos provados, esquecendo ela que tinha acabado de dizer que não tinha havido impugnação da decisão da matéria de facto e que, por isso, os factos estavam assentes; pelo que não pode invocar outros.
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              O que a seguradora deve pagar
              Em 2014, data a que se deve então reportar a invalidez, o capital seguro tinha o valor de 41.351,99€.
              Em princípio seria esse o valor que a seguradora tinha que pagar.
             A seguradora pagou 35.573,48€ (com isto já se está a entrar em linha de conta com tudo o que a seguradora já pagou, pelo que nada resta que não esteja a ser considerado – o que afasta a objecção que a seguradora podia colocar tendo em conta o que diz em XI), pelo que a diferença era 5778,51€.
             Mas o autor só pediu 4853,21€ relativos às mensalidades do empréstimo (capital e juros) pagas por ele durante o período de 2014 até Agosto de 2015, pelo que é só a isso que ele tem direito.
             E isso porque o capital seguro não é necessariamente o capital em dívida e se o autor só diz ter pago 4853,21€ não há razões para considerar que ele pagou mais do que isso. Até porque nos factos provados nem sequer consta nada quanto ao pagamento das mensalidades (o que, de qualquer modo, não é impedimento a que esse pagamento seja considerado nestes autos, pois que o autor dizia ter continuado a pagar as mensalidades e as rés não impugnaram essa afirmação, que está aliás na lógica do que consta dos factos provados: se a dívida ao banco foi diminuindo ao longo de 2014 e 2015 é porque o autor foi fazendo esse pagamento).
             O autor tem direito a este valor porque, a partir do sinistro, quem devia ter pago era a seguradora. Tendo-o feito ele, que nisso estava obviamente interessado, pois que, caso contrário, corria o risco de o contrato de mútuo ser resolvido por falta pagamento, ele sub-rogou-se no direito do banco à realização da prestação nos termos a que a seguradora estava obrigada (art. 592/1 do CC), podendo ser ela agora a exigi-lo da seguradora (art. 593/1 do CC).
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             Para além daquele valor, o autor invocava ainda o pagamento de 727,60€ pelos prémios de seguro pagos por ele durante o mesmo período (de 2014 a Agosto de 2015).
              Provou-se, no entanto, que ele pagou mais do que isso, ou seja, pagou 767,88€.
             Aqui o autor tem direito à restituição desse pagamento pela seguradora, a título de enriquecimento sem causa desta: o autor pagou-lhe (através do banco) os prémios de seguro quando, a partir do sinistro, já não o tinha de fazer, pois que, com o pagamento do empréstimo a que a seguradora estava obrigada por força do sinistro, o seguro do empréstimo deixava de ter causa justificativa (arts. 473 e 476/1, ambos do CC).
             Mas não tem direito ao preciso valor pago, de 767,88€, por força da limitação decorrente do facto de o autor só ter pedido, a este título, 727,60€ (art. 609/1 do CPC).
           E não vale aqui a argumentação de que “os limites da condenação contidos no art. 609/1 do CPC, têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra”, porque isto só vale “nos casos em que o efeito jurídico pretendido se apresenta como indemnização decorrente de um único facto ilícito, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, a certa espécie ou classe de danos” (ac. do STJ de 25/03/2010, proc. 1052/05.2TTMTS.S1); ora, no caso dos autos, este pedido tem por base o enriquecimento sem causa e, por isso, o valor que ultrapassa o pedido não pode ser concedido com base noutra causa de pedir - responsabilidade civil por facto ilícito – que diz respeito a outro pedido.
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             Assim, o autor tem direito à soma do valor de 4853,21€ com 727,60€, ou seja, 5580,81€, tal como pedido.
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             O pagamento, a ser feito pela seguradora, devia ter ocorrido 30 dias (art. 104 da LCS) “após a confirmação da ocorrência do sinistro e das suas causas, circunstâncias e consequências.” (art. 102/1 da LCS), ou seja, no caso, em 11/01/2016 (facto K).
             Assim, está em mora, naquele montante, desde 12/01/2016 e não desde a verificação do sinistro, como queria o autor.
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             Os danos não patrimoniais
             Antes de mais diga-se que não é hoje muito discutido que também no domínio da responsabilidade contratual possa haver lugar à indemnização dos danos morais.
             Calvão da Silva (Responsabilidade civil do produtor, Teses, Almedina, 1990, pág. 688, nota 2) por exemplo, diz que “em geral, e tendo em conta a tendência crescente para a unificação das duas espécies de responsabilidade, não descortinamos razões ponderosas para não considerar a ressarcibilidade do dano não patrimonial um princípio geral aplicável também à responsabilidade contratual”.
             No mesmo sentido, também, por exemplo, António Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, Almedina, Teses, 1990, nota 77, págs. 31/34, e Eva Sónia Moreira da Silva, As relações entre a responsabilidade pré-contratual por informações e os vícios da vontade (erro e dolo), O caso da indução negligente em erro, Almedina, 2010, pág. 149; e, por últimos, Ana Mafalda Miranda de Barbosa, Lições de responsabilidade civil, Principia, 2017, págs. 427 a 429, e Ana Prata, no CC anotado, Almedina, 2017, pág. 646.
             A questão é que se trate de danos com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito (art. 496 do CC) e que “a natureza da prestação contenda essencialmente com valores de ordem não patrimonial.” (António Pinto Monteiro, obra citada, pág. 34).
             No caso entende-se que quem adere a um contrato de seguro para cobertura do risco de deixar de poder pagar a amortização do empréstimo que contraiu para compra da habitação, pretende garantir um mínimo de paz de espírito para a sua vida futura, ficando com a segurança de que, apesar de poder perder os seus rendimentos, ficará sempre com um local para habitar. Pelo que a natureza da prestação contende com aqueles valores de ordem não patrimonial. E a criação de uma situação de angústia devido ao comportamento de uma seguradora que de algum modo põe em causa o funcionamento desse seguro, é uma situação de danos com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito.
              Posto isto:
              Só há prova [facto G] de o autor ter participado o sinistro em 16/06/2015 ao banco. Não há notícia de o autor, até aquela data, ter feito mais algo mais. Ora, logo naquela data, o banco remeteu à seguradora o pedido de accionamento de seguro. A 24/06/2015, a seguradora remeteu ao banco resposta no sentido de ser necessário para a apreciação do sinistro documento do banco (ou outro similar) com data da passagem definitiva à situação de reforma. Em 17/11/2015, o autor remeteu ao banco, através de e-mail, o documento atinente à reforma, emitido pelo Instituto da Segurança Social, datado de 10/11/2015. Não se sabe o que ocorreu neste período de 24/06/2015 a 10/11/2015 (4 meses e meio), pelo que a demora não pode ser imputada às rés. O banco remeteu o documento à seguradora em 19/11/2015, 2 dias depois, o que é razoável. Após a recepção do documento a seguradora concluiu o processo de sinistro e emitiu o respectivo recibo de indemnização, remetendo-o ao banco em 11/12/2015. Este prazo de 22 dias já não parece razoável, mas também não se vê razões para o poder considerar causador dos sentimentos referidos em O dos factos provados.
             No facto O consta que “a espera pelo accionamento do seguro e a data escolhida para pagamento do capital” provocaram os sentimentos do autor ali descritos.
             Face à análise acabada de fazer, não se considera que essa espera possa ser imputadas às rés.
             O que já pode ser imputado, e apenas à seguradora, é a data escolhida para pagamento do capital, ou melhor a data escolhida para data do sinistro.
             Como se considera que essa data está errada, tem que se considerar que a seguradora não cumpriu o contrato nessa parte. E essa falta é presumivelmente culposa (art. 799/1 do CC).
             Assim, ela deve ser condenada a pagar uma indemnização que compense o autor por parte dos sentimentos provocados (art. 496/1 do CC); só em parte visto que, na outra parte, já se viu que não pode ser imputada às rés.
             Por força do art. 496/4 do CC, o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494, isto é, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
              Tendo em conta que se trata de uma culpa presumida, que nada consta quanto à situação económica do autor, que o que estava em causa acaba por ser pouco mais que o valor correspondente a pouco mais de 1 ano e meio de pagamentos e que o autor pedia 3000€ por esses sentimentos relativos ao período de 2012 a 2015, inclusive, ou seja, 4 anos, quando o período provado é de fins de Maio de 2015 a fins de Dezembro de 2015, isto é, 7 meses, considera-se que o valor adequado da compensação a atribuir é de 450€.
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            As quantias em causa vencem juros, que são os juros legais, por ora de 4%: arts. 806 e 559 do CC e Portaria 291/03, de 08/04. A indemnização por danos não patrimoniais, que só agora foi liquidada, vence juros só desde a citação (art. 805/3, 2ª parte, do CC).  
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             Nenhum dos factos que permitiram concluir pela responsabilidade da seguradora têm a ver com o banco, pelo que a absolvição desta se tem de manter. Aliás, no recurso, o autor nem tenta fundamentar a condenação do banco.
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             Custas:
             O autor e a seguradora perderam em parte, quer a acção quer o recurso, pelo que têm de pagar as custas respectivas na proporção do vencimento (art. 527 do CPC).
             A acção e o recurso têm o mesmo valor formal: 8580,81€, mas isso porque o autor não contabilizou o valor do pedido ilíquido. Para se ter este minimamente em conta, há que considerar que o autor englobava nele os valores pagos desde Nov2012 a Dez2013, inclusive, que não se sabe precisamente quais sejam. Mas se, desde 01/01/2014 a 13/08/2014 (isto é, 20 meses) estão em causa 5580,81€, no período de 14 meses estariam em causa provavelmente cerca de 3906,57€.
             Assim, o que o autor queria, na melhor das hipóteses, era 5580,81€ + 3906,57€ + 3000€, ou seja, 12487,38€.
             Teve um ganho de causa de 5580,81€ + 450€ = 6030,81€. Ou seja, 48,30%. Como se trata de um valor aproximado, considera-se que se deve proceder ao seu arredondamento: 50% para cada um (autor e seguradora).
             As custas a considerar agora, quer na acção quer no recurso, são as custas de parte (visto que quer as taxas de justiça quer os eventuais encargos são para serem pagos no decurso do processo: arts. 529, 530, 532 e 533, todos do CPC; se ainda for apurado algo em dívida, deve ser pago pelo devedor e depois entram em regra de custas de parte).
              O banco não perdeu a acção nem o recurso. Quem perdeu, frente a ela, foi o autor, pelo que é este que tem de pagar as custas desta (art. 527 do CPC).
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              Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida na parte em que julgou a acção improcedente contra a seguradora e substituindo-a por este acórdão que agora julga a acção parcialmente procedente contra a seguradora e a condena a pagar ao autor 5580,81€, com juros desde 12/01/2016, mais 450€, com juros desde 14/12/2016. Os juros são à taxa legal (de 4% ao ano por ora) e vencem-se até integral pagamento.
             Valor da acção e do recurso: 8580,81€.
             Custas (quer quanto à acção quer quanto ao recurso):
             - as custas de parte do banco são a pagar pelo autor.
             - as custas de parte da seguradora são a pagar pelo autor em 50%.
             - e as custas de parte do autor são a pagar pela seguradora em 50%
             
Lisboa, 24/05/2018
             
Pedro Martins
Arlindo Crua
António Moreira