Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
504/05.9TBLNH.L1-2
Relator: MARIA JOSÉ MOURO
Descritores: JUSTIFICAÇÃO NOTARIAL
FALSAS DECLARAÇÕES
USUCAPIÃO
NULIDADE DO CONTRATO
REGISTO PREDIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/10/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Não logrando os 1ºs RR. demonstrar os factos constitutivos da aquisição por usucapião do prédio por parte do R., conforme este se arrogara quando da outorga da escritura de justificação notarial, aquela escritura é ineficaz, devendo a inscrição de aquisição no Registo Predial a favor daquele R. ser cancelada.
II – Falhando, porque cancelada, a 1ª inscrição obtida mediante recurso à escritura de justificação, em termos lógicos tal inquinaria a inscrição seguinte.
III – Muito embora a venda do prédio pelos 1ºs RR. aos 2ºs RR., reconduzindo-se a uma venda de coisa alheia, fosse ineficaz em relação à A., ela poderia vir invocar a nulidade do contrato de compra e venda, como o fez.
IV – Tendo a presente acção sido proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do contrato de compra e venda, face ao disposto no nº 2 do art. 291 do CC não podem ser reconhecidos quaisquer direitos aos 2ºs RR..
V – Não havendo a A. e os 2ºs RR. adquirido quaisquer direitos de «um autor comum» e, não sendo terceiros entre si, para efeitos de registo, não lhes seria aplicável o nº 2 do art. 17 do CRP.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
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I – A intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra B, C, D e E.
Alegou a A., em resumo:
Em 14 de Dezembro de 1979 a A. adquiriu a F a legítima posse e propriedade de metade indivisa do terreno rústico, terra de semeadura, no sítio de “G”, limite da freguesia de Ribamar, com a área total de 4.000 m2. O contrato de compra e venda foi verbal, formalizado apenas através de um contrato-promessa subscrito naquele mesmo dia, havendo a A. pago o preço de 55.000$00.
A intenção verdadeira de ambas as partes não estava em transaccionar “metade indivisa” do prédio - que já então não se podia dividir por simples vontade das partes - mas sim a parcela de 2.000 m2 devidamente autonomizada e identificada, correspondente à metade sul do prédio.
Naquela altura aquele F vendeu de forma idêntica, sem escritura pública, ao R. B a outra “metade indivisa” do mesmo prédio, com a mesma intenção de vender a restante parcela de 2.000 m2, a metade norte do prédio.
Após a compra a A. tomou posse efectiva dos 2.000 m2 da metade Sul do prédio, delimitando-a, o que fez em colaboração com o R. B, desde princípio de 1980 se encontrando as duas parcelas de terreno autonomizadas.
Durante cerca de 25 anos a A. sempre utilizou aquele terreno, actuando à vista de toda a gente, com ânimo de quem trata de coisa própria e é titular do direito de propriedade sobre essa coisa, convivendo, aliás, com o R. B.
Sucede que quando no Verão de 2004 a A. se deslocou ao terreno verificou que este se encontrava demarcado por vedação em arame construída sem seu conhecimento e ficou a saber por intermédio da ex-mulher do R. B que este, por escritura de justificação notarial reclamara, em Outubro de 2003, ter adquirido por usucapião a totalidade do prédio.
Após, em 6 de Fevereiro de 2004, o R. B vendeu a totalidade do prédio aos RR. E e D, venda essa nula por se tratar de venda de coisa alheia.
Pediu a A.:
- que seja julgada nula e de nenhum efeito a escritura de justificação notarial outorgada pelo R. B no Cartório notarial da Lourinhã em 15-10-2003 na parte relativa à parcela de 2000 m2 do lado Sul do prédio;
- que seja declarada nula e de nenhum efeito em relação à A. a escritura de compra e venda outorgada pelos RR. em 6-2-2004 no 16º Cartório Notarial de Lisboa, na parte relativa à parcela de 2000 m2 do lado Sul do prédio;
- que sejam cancelados os registos de aquisição por usucapião a favor do R. B e de compra e venda a favor dos RR. E e D, com referência ao lado Sul do prédio;
- que seja reconhecido o direito de propriedade por usucapião de metade do prédio – a parcela Sul – a favor da A. sendo os RR. condenados a reconhecerem a A. como legítima proprietária e a restituir a possa da mesma:
- que sejam os RR. condenados a pagar solidariamente à A., a título de indemnização por perdas e danos 5.000,00 €, por cada ano que decorra até ao momento da restituição.
Contestaram os RR. D e E, essencialmente impugnando os factos alegados pela A..
Também os RR. B e C contestaram. Alegaram que a petição é inepta e que o direito de acção da A. caducou; impugnaram matéria de facto alegada pela A. referindo, designadamente, que apenas nos três primeiros anos após a aquisição a A. apareceu na zona, nunca mais sendo vista no local desde então. Referiram que durante 24 anos o R. teve a posse do terreno agindo como possuidor e proprietário dos 4.000 m2, nomeadamente pagando contribuições e limpando o terreno, sendo os RR. os únicos proprietários do mesmo por o haverem adquirido por usucapião.
Em reconvenção pediram o reconhecimento aos RR. da posse e da propriedade, por inversão do título da posse da totalidade do prédio em referência.
A A. replicou.
No saneador foram julgadas improcedentes as excepções da ineptidão da p.i. e da caducidade.
A final foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
«Por todo o exposto, o Tribunal julga e declara a presente acção parcialmente procedente por provada e, consequentemente:
a) Declara nula a escritura de justificação notarial outorgada pelo R. B no Cartório Notarial de Lourinhã, em 15 de Outubro de 2003, e exarada de fls. 34 a 35 v., do Livro 130-D;
b) Declara nula – por violação do trato sucessivo – a escritura de compra e venda lavrada no 16.º Cartório Notarial de Lisboa, em 6 de Fevereiro de 2004, exarada de fls. 69 a 70, do Livro 251-I, e em que intervieram B e mulher, C, e D;
c) Ordena o cancelamento das inscrições registais efectuadas com base nas escrituras sobreditas;
d) Condena os 2º RR. a restituírem à A. a posse de 2000 m2 do prédio rústico denominado “G”, com a área 4000 m2, sito em Ribamar, freguesia de Santa Bárbara, concelho da Lourinhã, a confrontar do Norte com H, do Sul com I, do Nascente com caminho e do Poente com domínio marítimo, não descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã e inscrito na matriz rústica da freguesia de Santa Bárbara sob o artigo 30 Secção R, por tal ser o peticionado;
No mais, absolve os RR. do pedido».
Desta sentença apelaram os RR. E e D, concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: (…)
A A. contra alegou nos termos de fls. 588 e seguintes.
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II - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
1) Por escritura pública de justificação, lavrada no Cartório Notarial de Lourinhã, em 15 de Outubro de 2003, exarada de fls. 34 a 35 v., do Livro 130-D, B casado com C, declarou que, com exclusão de outrem, é dono e legítimo possuidor do prédio rústico denominado “G”, com a área 4000 m2, sito em Ribamar, freguesia de Santa Bárbara, concelho da Lourinhã, a confrontar do Norte com H, do Sul com I, do Nascente com caminho e do Poente com domínio marítimo, não descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã e inscrito na matriz rústica da freguesia de Santa Bárbara sob o artigo 30 Secção R (al. A. da matéria de facto assente);
2) Mais declarou que possui o referido prédio, em nome próprio há mais de 24 anos, sem a menor oposição de quem quer que seja, desde o seu início, por o ter comprado com dinheiro próprio dele, por acto não titulado, compra essa feita durante o ano de 1979, a J e marido K, posse essa que sempre exerceu sem interrupção e ostensivamente, com conhecimento e acatamento de toda a gente, sendo, por isso, uma posse pacífica, contínua, pública e de boa fé, pois sempre cuidou e cuida o citado prédio procedendo à necessária conservação e melhoramento, sempre pagou e paga, em nome próprio, as respectivas contribuições, praticando, assim, os actos normais que definem a qualidade de proprietário (al. B. da matéria de facto assente);
3) Por escritura pública de compra e venda, lavrada no 16.º Cartório Notarial de Lisboa, em 6 de Fevereiro de 2004, exarada de fls. 69 a 70, do Livro 251-I, B e mulher, C, declararam que vendem a D, que declara aceitar a venda, pelo preço de € 9.000,00, que declararam já ter recebido, o prédio rústico denominado e sito em “G”, na freguesia de Ribamar, concelho da Lourinhã, inscrito na matriz rústica sob o artigo 30 Secção R, descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã sob o número 1053 (al. C. da matéria de facto assente);
4) O prédio rústico, sito em “G”, composto de terra de cultura arvense, inscrito na matriz sob o artigo 30 da Secção R da freguesia de Santa Bárbara, encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã sob o n.º 01053 da freguesia de Ribamar, a favor de D, casado com E, por compra (al. D da matéria de facto assente);
5) Na acção de processo ordinário n.º 30/05.6TBLNH, que correu termos neste Tribunal, na qual foram RR. B e mulher C, foi proferida sentença, transitada em julgado em 18/5/2007, na qual ficou provado que “por acordo celebrado com terceiro no ano de 1979, a autora e o réu declararam comprar uma parcela com a área de 2000 m2 do prédio” sito no lugar de G, Ribamar (al. E da matéria de facto assente);
6) Os RR. D e E viram no Jornal …, o anúncio da venda da propriedade descrita como: Lourinhã/Aldeia de Ribamar. Terreno de 4000 m2, c/ casa T2 e garagem, c/ óptima vista mar p/ Peniche e Berlengas, com acesso a praia do Vale Mitão e outras. Trata o próprio. 91-4230824 (AR 1436207) (al. F. da matéria de facto assente);
7) Em finais de 1979, o R. B começou a edificar uma casa com garagem e anexo, que ficou pronta 2 anos depois (al. G. da matéria de facto assente);
8) Por contrato de compra e venda celebrado, em 14 de Dezembro de 1979, entre a A. e F, aquela adquiriu metade indivisa do terreno rústico, terra de semeadura, no sítio de “G”, limite da freguesia de Ribamar, a confrontar do Norte com António …, do Sul com I, do Nascente com serventia e do Poente com o mar, inscrito na respectiva matriz cadastral rústica da freguesia de Santa Bárbara, sob o n.º 30 da Secção R, que detém a área total de 4000 m2 (artº 1º da base instrutória);
9) O dito contrato foi celebrado verbalmente e formalizado através de um escrito intitulado “contrato de promessa de compra e venda” no qual F declarou prometer vender à A. metade indivisa de uma propriedade rústica, terra de semeadura, no sítio de “G”, limite de Ribamar, a confrontar do Norte com António …, do Sul com I, do Nascente com serventia e do Poente com o mar, inscrito na respectiva matriz cadastral rústica da freguesia de Santa Bárbara, sob o prédio n.º 30 da Secção R, pela importância total de 55.000$00, que já recebeu (artº 2º da base instrutória);
10) A escritura definitiva não foi celebrada (artº 3º da base instrutória);
11) Nessa altura, F vendeu, de forma idêntica, ao R. B a outra metade indivisa do mesmo prédio (artº 4º da base instrutória);
12) … com a mesma intenção de vender a restante parcela de 2000 m2, correspondente à parcela Norte, com as confrontações a Norte H, a Sul Maria …, a Nascente serventia e a Poente o mar (artº 5º da base instrutória);
13) Era intenção da A. e do R. B dividir o prédio ao meio (artº 6º da base instrutória);
14) Logo após 14 de Dezembro de 1979 a A. delimitou a parte Norte daquele prédio com recurso a uma linha longitudinal, no sentido Poente – Nascente, a todo o comprimento do terreno, feita de arbustos, caniçal e outra vegetação (artº 7º da base instrutória);
15) Tal foi feito de acordo com a A. (artº 8º da base instrutória);
16) Assim, desde princípio de 1980 que a parcela da A. e do R. B se encontram autonomizadas, compondo duas línguas de terra com cerca de 100 m2 x 20 m2, confinantes entre si (artº 9º da base instrutória);
17) Durante cerca de 25 anos, a A. sempre usou a parcela Sul para fins lúdicos, principalmente durante a época balnear (artº 10º da base instrutória);
18) … procedendo à limpeza anual do terreno e a várias desmatagens (artº 11º da base instrutória);
19) … diligenciando junto da autarquia pela obtenção de licenças e pareceres sobre projectos de edificação de casa de praia a construir naquele terreno (artº 15º da base instrutória);
20) Todos estes actos eram exercidos de dia e à vista de toda a gente (artº 16º da base instrutória);
21) … com o ânimo e a convicção de quem trata de coisa própria e é titular do direito de propriedade sobre essa coisa (artº 17º da base instrutória);
22) Nunca foi a A. impedida, por quem quer que fosse, de praticar os referidos actos (artº 18º da base instrutória);
23) Muito menos pelos vizinhos e confinantes que lhe reconheciam a posse e a propriedade da parte Sul do terreno (artº 19º da base instrutória);
24) Quando a A. se deslocou ao seu terreno, no Verão de 2004, verificou que este se encontra demarcado por vedação de arame, que foi construída sem a sua autorização ou conhecimento (artº 20º da base instrutória);
25) Ficou, então, a ter conhecimento da celebração da escritura de justificação mencionada em A) (artº 21º da base instrutória);
26) Na relação de bens apresentada na sequência do divórcio do R. B, decretado por sentença transitada em julgado em 23 de Outubro de 2000, consta o prédio sito no lugar de G - Ribamar, inscrito na matriz urbana da freguesia de Santa Bárbara, sob o n.º U-2041, com 4000 m2 (artº 25º da base instrutória);
27) O terreno rústico denominado “G” manteve-se na matriz até 1994 em nome de F (artº 26º da base instrutória);
28) No intuito de legalizar o terreno e a moradia nela implantada desde finais de 1979, o R. B preencheu a declaração para inscrição ou alteração de inscrição de prédios urbanos na matriz, modelo 129 da DGCI, que entregou, em 25/8/1994, na Repartição de Finanças da Lourinhã, da mesma constando como área descoberta do prédio 3930 m2 e como área coberta 70 m2 (artº 27º da base instrutória);
29) O R. B liquidou as contribuições autárquicas de 1991, 1992, 1993, 1994 e 1995 e posteriormente calculadas sobre a totalidade da área do terreno (artº 28º da base instrutória);
30) As construções mencionadas em G) encontram-se implantadas na parcela Norte (artº 34º da base instrutória).
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III – Como é sabido são as conclusões da alegação de recurso que definem o objecto do mesmo recurso.
Deste modo, tendo em conta o teor das conclusões dos apelantes as questões que se nos colocam são as seguintes: se não há suporte fáctico para que fosse considerado que a escritura de justificação notarial «assenta em declarações falsas»; se aos apelantes não foi conferida a protecção que para terceiros de boa fé decorreria dos arts. 291 do CC e 17, nº 2, do Código de Registo Predial; se é contraditória a condenação inserta na alínea d) com o teor das alíneas anteriores do dispositivo da sentença; se se imporia, no caso, a redução do negócio.
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IV – 1 - A decisão do Tribunal de 1ª instância assentou na consideração de se haver provado que o R. B «nunca foi proprietário» do prédio com a área de 4.000 m2 sito em «G», devendo ser declarada nula a escritura de justificação notarial, instrumento esse que «está eivado de declarações falsas»; entendeu-se, na sequência, mostrar-se ineficaz em relação à A. a compra e venda celebrada entre os 1ºs e 2ºs RR..
Antes de nos debruçarmos concretamente sobre a posição dos RR. E e D, tem interesse um prévio enquadramento, com referência ao que antecedentemente respeita aos dois outros RR., tendo em conta as considerações que os apelantes dirigem com respeito à escritura de justificação notarial.
Sabemos que o R. B, em escritura pública de justificação, lavrada no Cartório Notarial de Lourinhã, em 15 de Outubro de 2003, declarou que, com exclusão de outrem, era dono e legítimo possuidor do prédio rústico denominado “G”, com a área 4000 m2, sito em Ribamar, freguesia de Santa Bárbara, concelho da Lourinhã, não descrito na Conservatória do Registo Predial da Lourinhã, bem como que vinha possuindo o referido prédio, em nome próprio há mais de 24 anos, sem a menor oposição de quem quer que fosse, desde o seu início, por o ter comprado com dinheiro próprio, por acto não titulado e durante o ano de 1979, a J e marido K, posse essa que sempre exercera sem interrupção e ostensivamente, com conhecimento e acatamento de toda a gente, sendo, por isso, uma posse pacífica, contínua, pública e de boa fé, pois sempre cuidou e cuida o citado prédio procedendo à necessária conservação e melhoramento, sempre pagou e paga, em nome próprio, as respectivas contribuições, praticando, assim, os actos normais que definem a qualidade de proprietário.
Sucede que não foi demonstrado corresponderem estas declarações à realidade. Na verdade, provou-se que quer a A. quer aquele R. haviam adquirido verbalmente a F metade indivisa do aludido prédio, sem que fosse celebrada a correspondente escritura pública, havendo o mesmo R. e a A. dividido o prédio em duas parcelas de 2.000 m2 cada uma, as quais desde princípios de 1980 se encontram autonomizadas, usando a A. a parcela Sul durante cerca de 25 anos. Os RR. não lograram provar que o R, B durante 24 anos fez e mandou fazer a limpeza de ervas, pedras, vegetação rasteira e acessos de todo o terreno (4.000 m2), como seu legítimo dono, sem que alguma vez alguém o importunasse, à vista de todos (respostas negativas aos artigos 29) a 33) da Base Instrutória).
No que concerne à demanda dos RR. B e C esta acção reconduz-se, afinal, a uma impugnação da justificação notarial, tendo em conta a escritura pública por aquele outorgada em 15-10-2003. Muito embora a A. peça que seja “julgada nula e de nenhum efeito a escritura de justificação notarial”, na verdade ela visava paralisar os efeitos da justificação notarial, querendo que fosse atingido o direito invocado pelo R. B na escritura de justificação, com a declaração de que aquele R. não adquirira a propriedade do prédio consoante o teor daquela escritura, sendo esta ineficaz - neste âmbito sendo a escritura realizada declarada de «nenhum efeito» consoante expressamente peticionado. Do que se trata verdadeiramente é da ineficácia daquela escritura, declarando-se que não produz efeitos, por o R. não ter adquirido o prédio por usucapião ([1]).
A escritura justificação notarial é um meio ou expediente técnico simplificado, de obter a primeira inscrição registral de um prédio que alguém afirma ser seu. Todavia, como observado no acórdão do STJ de 4-12-2007 ([2]) «não oferece cabais garantias de segurança e de correspondência com a realidade, potenciando, mesmo, a sua utilização fraudulenta e permitindo que o justificante dela se sirva para titular direitos que não possui, com lesão de direitos de terceiros.
Efectivamente, trata-se de uma forma especial de titular direitos sobre imóveis, para efeito de descrição na Conservatória do Registo Predial, baseada em declarações dos próprios interessados, embora confirmadas por três declarantes, em que a fraude é possível e simples de executar».
Não esqueçamos que o facto comprovado pelo registo da escritura de notificação é impugnável nos termos gerais do nº 1 do art. 8 do CRP.
Como vimos, não lograram os RR. demonstrar os factos constitutivos da aquisição por usucapião da propriedade do prédio por parte do R. B, nos termos em que este se arrogou quando da outorga da escritura ([3]).
Refira-se que a circunstância de o R. B haver liquidado as contribuições autárquicas de 1991, 1992, 1993, 1994 e 1995 e posteriormente calculadas sobre a totalidade da área do terreno, bem como a de ter constado da relação de bens apresentada na sequência do divórcio daquele R. o prédio sito no lugar de G - Ribamar, inscrito na matriz urbana da freguesia de Santa Bárbara, sob o n.º U-2041, com 4000 m2 não são suficientes para conduzir àquela demonstração.
Nesta situação os RR. B e C não podiam beneficiar da presunção derivada da inscrição no Registo Predial a seu favor, nos termos do art. 7 do CRP.
Como dito naquele acórdão de 4-12-2007: «A impugnação da escritura de justificação significa a impugnação dos factos com base nos quais foi celebrado o registo.
A impugnação desses factos, traduzida na alegação da sua não verificação ou da sua não correspondência com a realidade, não pode deixar de abalar a credibilidade do registo e a sua eficácia prevista no art. 7º do Cód. Reg. Predial, que é precisamente a presunção de que existe um direito cuja existência é posta em causa através da presente acção.
Daí que, impugnada a escritura com base na qual foi lavrado o registo, por impugnado também se tem de haver esse mesmo registo, não podendo valer contra o impugnante a referida presunção, que a lei concede no pressuposto da existência do direito registado».
Deste modo, o facto justificado na escritura encontra-se impugnado e aquela escritura é ineficaz, pelo que por via dela os RR. B e C não podiam registar quaisquer direitos sobre o mesmo prédio, devendo a inscrição de aquisição por usucapião a favor daquele R. no Registo Predial ser cancelada.
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IV – 2 – O art. 34, nº 2, do Código de Registo Predial consagra o princípio do trato sucessivo.
Refere José Alberto Gonzalez ([4]) que este princípio tem dois sentidos:
- um sentido material «segundo o qual a demonstração da titularidade do direito supõe a verificação de um nexo ininterrupto de factos aquisitivos, válidos e eficazes, desde o primeiro titular até ao actual»;
- em sentido formal, consagrado naquele art. 34,  «o trato sucessivo supõe apenas que do registo conste um encadeamento lógico de inscrições, independentemente de o mesmo corresponder (ou não) àquilo que na verdade sucedeu»; está basicamente em causa um problema de racionalidade do próprio registo.
Com a justificação notarial pretende-se estabelecer o trato sucessivo nos termos dos arts. 116 do C. Reg. Predial cujo nº 1 dispõe: «O adquirente que não disponha de documento para a prova do seu direito pode obter a primeira inscrição mediante escritura de justificação notarial ou decisão proferida no âmbito do processo de justificação previsto neste capítulo».
Falhando, porque cancelada, a 1ª inscrição obtida mediante recurso à escritura de justificação, em termos lógicos tal circunstância inquinaria a inscrição seguinte.
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IV – 3 - Temos, consoante acima concluído, que os RR. B e C não demonstraram ser titulares do direito de propriedade sobre o prédio com 4.000 m2, sito em “G”. Aliás, a A. provou que por acordo verbal comprara metade indivisa do terreno rústico, terra de semeadura, no sítio de “G”, que por acordo entre ela e aquele R. foram autonomizadas duas parcelas do imóvel, que a A. desde 1980 sempre usou a parcela Sul para efeitos lúdicos, principalmente durante a época balnear, procedendo à limpeza do terreno e a várias desmatagens, diligenciando junto da autarquia pela obtenção de licenças e pareceres, tudo isto de dia e à vista de toda a gente, com o ânimo e a convicção de quem trata de coisa própria e é titular do direito de propriedade sobre essa coisa, nunca havendo sido impedida de o fazer.
Contudo, por escritura pública de compra e venda celebrada em 6-2-2004, venderam os RR. B e C o referido prédio ao R. D. Careciam os RR. B e C de legitimidade para realizar a venda de um direito (de propriedade) de que não eram titulares sobre aquele prédio com 4.000 m2, sito em “G”, o que nos reconduziria à venda de coisa alheia (art. 892 do CC), ineficaz relativamente à A. (nº 2 do art. 406 do CC) ([5]).
Na apelação os RR. E e D salientam o seu alheamento de “quaisquer condutas irregulares”, já que a sua intervenção se iniciou, tão só, quando viram um anúncio no jornal para venda do imóvel, que celebraram a escritura de compra e venda e de seguida procederam à inscrição no registo, bem antes da instauração na presente acção, mas que não lhes foi “conferida a protecção inerente ao facto de serem terceiros de boa-fé”. Invocam o art. 291 do CC e o nº 2 do art. 17 do CRP ([6]).
Consoante resulta da certidão de registo de fls. 102 e seguintes, pela Ap.06/28112003, fora inscrita a aquisição a favor do R. B da aquisição por usucapião do prédio a que nos referimos.
Sabemos que os RR. E e D se interessaram pelo imóvel por terem visto no Jornal … um anúncio de venda do mesmo (sem que se conheça a data do dito anúncio).
Não se provou que estes RR. soubessem da relação da A. com o imóvel (respostas aos artigos 22) e 23) da Base Instrutória) mas daí não se pode inferir o contrário (ou seja que não soubessem), sendo certo que tal não foi incluído na Base Instrutória, apesar de articulado por aqueles RR. (artigos 22 e 23 da respectiva contestação).
Para efeitos de raciocínio admitamos, todavia, face àquela inscrição de aquisição a favor do R. B e uma vez que o interesse pelo imóvel foi despoletado pelo referido anúncio, presumir-se que os RR. E e D se encontravam de boa fé, na concepção prevista no nº 3 do art. 291 do CC – ou seja, que na ocasião em que adquiriram o imóvel desconheciam, sem culpa, que os outros RR. não eram detentores do direito de propriedade sobre o mesmo.
Estes RR. fizeram inscrever no registo – Ap. 08/20022004, certidão de fls. 102 e seguintes – a aquisição do prédio a seu favor. Posteriormente – Ap. 05/20050922 – teve lugar a inscrição da presente acção.
Diz-nos Isabel Pereira Mendes ([7]) que através do princípio da fé pública registral protegem-se os subadquirentes de boa fé que adquiriram direitos inscritos no Registo e que, por sua vez, os inscrevam a seu favor, verificando-se em certas circunstâncias a atribuição ao registo de verdadeiros efeitos substantivos, encontrando-se aquele princípio consignado no nº 2 do art. 17 do CRP numa interpretação conjugada com a do art. 291 do CC. Defendendo que «tendo o adquirente feito a sua aquisição de boa fé e a título oneroso, confiado na presunção registral emergente do registo anterior a favor do transmitente, e tendo, por sua vez, inscrito a respectiva aquisição antes do registo de qualquer acção impugnatória, a nosso ver nunca poderia vir a ser espoliado do bem adquirido, a não ser por via do eventual funcionamento das normas que regulam o conflito entre a presunção derivada do registo e a derivada da posse». Acrescenta ([8]) que no caso do subadquirente de boa fé e a título oneroso que confiou na presunção registral emergente do registo a favor do transmitente e registou a sua aquisição antes do registo da respectiva acção impugnatória ele não poderá ser prejudicado pela declaração de nulidade do registo a favor do transmitente, quer essa nulidade tenha por base os motivos indicados no art. 16 do CRP, tal outros, tal como a nulidade do título que lhe serviu de base.
Não nos parece, todavia, que seja exactamente assim, designadamente tendo em vista o caso dos autos. Afigura-se-nos, aliás, que no direito português o princípio da fé pública do registo tem um âmbito de aplicação limitado como consequência lógica da função meramente declarativa do registo.
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IV – 4 – Muito embora o negócio fosse ineficaz (e não “somente” nulo) em relação à A. ela poderia vir invocar a nulidade do contrato, como o fez ([9]) ([10]).
Ora, dispõe o art. 291 do CC:
«1- A declaração de nulidade ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, por terceiro de boa fé, se o registo da aquisição for anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação.
2- Os direitos de terceiro não são, todavia reconhecidos, se a acção for proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio.
3- É considerado de boa fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia, sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável».
Diz-se naquele acórdão do STJ de 16-11-2010, citando Antunes Varela, que visa este dispositivo «a protecção do terceiro de boa fé, ou seja, do terceiro adquirente (ou subadquirente) que no momento da aquisição, sem culpa, desconhecia o vício do negócio nulo ou anulável, estabelecendo, assim, um desvio ao princípio geral sobre os efeitos da nulidade ou da anulabilidade do negócio (art. 289º), quando estão em causa bens imóveis, ou móveis sujeitos a registo. Isto “na medida em que permite ao titular da inscrição efectuada no registo, embora só a partir de certo período posterior à conclusão do contrato nulo ou anulável, fazer prevalecer o seu direito (real) referente ao imóvel ou ao móvel sujeito a registo sobre o direito, relativo à mesma coisa, do beneficiário da nulidade ou anulação” …»
Acrescentando-se, mais adiante: «Porém, de harmonia com o nº 2 da disposição, os direitos de terceiro sobre a coisa a restituir, cedem se a acção de nulidade ou anulação for interposta e registada dentro de três anos posteriores ao negócio. Nesta circunstância, os direitos de terceiro não serão considerados, mesmo que o registo da aquisição seja anterior ao registo da acção de declaração de nulidade ou anulação».
Não parece sofrer dúvida que o art. 291 se mantém em vigor na íntegra sem que o nº 2 do art. 17 do CRP o haja afectado ([11]).
Maria Clara Sottomayor ([12]) expressa o seu entendimento de que a norma do art. 291 deve ser interpretada tendo em conta todo o sistema, nomeadamente o sistema de transmissão de direitos reais e os princípios registrais, estando, em consequência, nela subentendida a exigência de registo prévio do alienante, como condição da sua aplicação, o que está de acordo, designadamente, com o elemento racional, «na medida em que o terceiro, em regra, só pode estar de boa fé, quando confiou na correcção do registo precedente».
No transcrito nº 2 daquele artigo a lei faz a conciliação entre os interesses do verdadeiro proprietário – que pode impor a realidade jurídico material ao terceiro durante um prazo de três anos a contar da data da conclusão do negócio inválido – e os do terceiro sub-adquirente, interessado em salvaguardar a sua aquisição dos efeitos da invalidade.
No caso dos autos a presente acção foi intentada em 14-6-2005 e foi inscrita no Registo pela Ap. 05/20050922. Como a compra pelo R. D ocorrera por escritura pública outorgada em 6-2-2004, com inscrição da aquisição no Registo pela Ap. 08/20022004, conclui-se a acção foi proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio. Pelo que, face a esta disposição legal, os direitos dos RR. E e D não podem ser reconhecidos.
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IV – 5 - O nº 2 do art. 17 do CRP dispõe que a «declaração de nulidade do registo não prejudica os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé, se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção de nulidade».
Entendeu o STJ no seu acórdão de26-10-2010 ([13]): «De acordo com o art. 17.º do CRgP, desde que o registo do acto seja anterior ao registo de acção de nulidade, a declaração de invalidade do negócio não estorva os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé. Esta disposição, em confronto com o art. 291.º do CC, estabelece, a propósito das causas de nulidade do registo, as condições de invocação da nulidade (n.º 1) e as circunstâncias em que a declaração de nulidade do registo não prejudica os direitos adquiridos a título onerosos por terceiro de boa fé. Ou seja, o art. 291.º trata da nulidade e anulabilidade do negócio jurídico (nulidade substantiva), ao passo que o art. 17.º trata da nulidade do registo (nulidade registral)».
Do mesmo modo fora considerado pelo STJ no seu acórdão de 21-4-2009 ([14]): «Não nos suscitam grandes dúvidas ao considerar que o conceito constante no artigo 291.º n.º 2 da lei civil se reporta à invalidade substantiva, enquanto o n.º 2 do artigo 17.º do Código do Registo Predial se limita à nulidade registral».
Igualmente  se nos afigura que a protecção mais ampla do terceiro constante do nº 2 do art. 17 do CRP está limitada às invalidades registrais, não abrangendo as invalidades do título.
Sucede que a aplicação do nº 2 do art. 17 do CRP ao presente caso seria, em qualquer caso, de afastar. Para efeitos de registo, atento o nº 4 do art. 5 do CRP, terceiros «são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si». Ora, a A. e os RR. E e D não adquiriram os respectivos direitos de «um autor comum» e, não sendo terceiros entre si, para efeitos de registo, não lhes seria aplicável o nº 2 do art. 17 do CRP ([15]).
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IV – 6 - Trazem os apelantes – e só agora – aos autos a questão referente à redução do negócio que celebraram (o contrato de compra e venda celebrado com os RR. B e C), entendendo que se trata de questão de conhecimento oficioso. Mas, mesmo nesta ocasião, não explicam em que termos pretenderiam que essa redução operasse: Compra e venda de metade indivisa do prédio? Compra e venda de parte determinada do mesmo (a parcela Norte)? ([16])
Determina o art. 292 do CC que a «nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se mostre que este não teria sido concluído sem a parte viciada».
E dispõe o art. 902 do CC que «se os bens só parcialmente forem alheios e o contrato valer na parte restante, por aplicação do artigo 292º observar-se-ão as disposições antecedentes quanto à parte nula e reduzir-se-á proporcionalmente o preço estipulado».
A venda de bens parcialmente alheios poderá ocorrer em duas situações: quando o vendedor aliena a coisa por inteiro quando é dono, apenas, de uma parte material da mesma; quando o vendedor aliena toda a coisa quando é dono, tão só, de uma quota abstracta da mesma, como sucede na compropriedade. Nesta última situação não será aplicável o art. 902, já que o nº 2 do art. 1408 do CC considera, no caso, integralmente aplicável o regime da venda de coisa alheia, pelo que o preceito seria aplicável, somente, à primeira situação ([17]).
No caso dos autos sabemos que no ano de 1979 F vendeu, verbalmente, ao R. B metade indivisa do prédio rústico, no sítio de “G”, sem que fosse celebrada escritura pública, com intenção de ser vendida a parcela de 2000 m2, correspondente à parcela Norte, sendo intenção da A. e daquele R. dividir o prédio ao meio, havendo procedido, efectivamente, e por acordo a tal delimitação e encontrando-se desde 1980 autonomizadas as duas parcelas. Sabemos, também, que o R. B em finais de 1979 edificou na parcela Norte uma casa com garagem e anexo, obra que ficou pronta dois anos depois.
Os factos são escassos para caracterização do direito do R. B sobre o imóvel e, logo, sobre os termos em que poderia ter lugar a “redução”. Tendo esta sido tardiamente suscitada, a verdade é que o Tribunal não dispõe de elementos fácticos para a sua apreciação.
Não há, pois, qualquer redução do negócio a considerar.
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IV – 7 - Afirmam os apelantes no ponto V das suas conclusões de recurso: «Afigura-se contraditória (senão impossível) a condenação dos 2ºs RR (Apelantes), constante da al. d) da sentença (dispositivo), em restituírem 2000m2 do prédio rústico denominado “G”, com a área de 4000m2, freguesia de Santa Bárbara, concelho da Lourinhã, não descrito na CRP da Lourinhã e inscrito na matriz rústica da freguesia de Santa Bárbara sob o artº 30 –Secção R, face ao declarado e ordenado nas al. a), al. b) e al. c)».
Nestas alíneas o Tribunal havia, declarado nulas as escrituras de justificação notarial e de compra e venda e ordenado o cancelamento das inscrições registais efectuadas com base naquelas escrituras. Na alínea d) o Tribunal condenou os RR./apelantes « a restituírem à A. a posse de 2000 m2 do prédio rústico denominado “G”, com a área 4000 m2…»
Todavia, em nosso entender, inexiste a apontada contradição.
Desde logo, porque  o Tribunal de 1ª instância limitou-se a decidir no âmbito do que lhe fora pedido.
Na verdade, a A. pedira que lhe fosse restituída a posse dos aludidos 2.000 m2 do prédio em causa. Determina o 661, nº 1, do CPC que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir; o juiz está limitado pelos pedidos das partes e não pode deles extravasar.
Não procede, pois, a argumentação dos apelantes.
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V – Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes.
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Lisboa, 10 de Abril de 2014

Maria José Mouro

Teresa Albuquerque
                                                                      
Isabel Canadas

[1]              Ver, a propósito, o acórdão do STJ de 24-6-2004, ao qual se poderá aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 03B3843, o acórdão do STJ de 3-7-2003, ao qual se poderá aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 03B2066, e o acórdão de uniformização de jurisprudência proferido em 4-12-2007, ao qual se poderá aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 07A2464.
[2] Acórdão de uniformização de jurisprudência ao qual se poderá aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 07A2464.
[3]A acção de impugnação de justificação notarial é uma acção declarativa de simples apreciação negativa -  art. 4, nºs 1 e 2, al. a) do CPC – com ela se pretendendo a declaração da inexistência do direito arrogado na escritura. Daí, recair sobre os RR. o ónus da prova dos factos constitutivos daquele direito de que na escritura de justificação se arrogaram - os factos por eles invocados como integrantes de causa de aquisição do direito de propriedade de que naquela escritura se atribuíram a titularidade - consoante decorre do art. 343, nº 1, do CC.
[4] Em «Direitos Reais e Direito Registal Imobiliário», Quid Juris, 4ª edição, pag. 165.
[5] Diz-nos Maria Clara Sotttomayor - em «Invalidade e Registo – A Protecção do Terceiro Adquirente de Boa Fé», Almedina, 2010, pags. 855-856 - que o regime de venda de bens alheios no art. 892 do CC «regula apenas as chamadas relações internas, entre o vendedor e o comprador, resultando a ineficácia em relação ao verdadeiro proprietário da regra res inter alios acta. A doutrina tem entendido que esta máxima resulta do princípio do efeito relativo dos contratos, de tal forma que o verdadeiro proprietário não tem que se preocupar com um negócio concluído por um terceiro e no qual não participou. Contudo, devemos entender que, embora o verdadeiro proprietário tenha ao seu dispor uma acção de declaração do direito e uma acção de reivindicação contra o possuidor ou pretenso proprietário do imóvel, ele tem legitimidade, como qualquer interessado, para intentar uma acção de nulidade do contrato de compra e venda, celebrado entre o vendedor não legitimado e o comprador».
Havendo decidido o STJ no seu acórdão de 16-11-2010, ao qual se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 42/2001.C1.S1, não obstante o negócio seja ineficaz em relação ao proprietário da coisa, este poderá arguir a nulidade do contrato.
O que se disse com respeito ao proprietário poderá dizer-se, igualmente, quanto ao comproprietário. Face ao nº 2 do art. 1408 do CC a disposição ou oneração de parte especificada da coisa comum sem consentimento dos consortes é havida como disposição ou oneração de coisa alheia.
[6]Refira-se que muito embora os RR. Alícia e João Paes Mamede no seu articulado hajam referido factos que traduziriam aquele seu alheamento de “quaisquer condutas irregulares” não invocam expressamente os arts. 291 do CC e 17, nº2 do CRP.
[7]Em «Estudos Sobre Registo Predial», Almedina, pags. 64-65 e 69 e segs.
[8] Obra citada, pag. 93.
[9] Consoante já antes considerado.
[10]A A. pediu que fosse «declarada nula e ineficaz em relação à Autora a escritura de compra e venda…»
[11]Ver o acórdão do STJ de 27-4-2005, publicado na Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do STJ, ano XIII, tomo 2, pag. 75.
[12]Em «Invalidade e Registo – A Protecção do Terceiro Adquirente de Boa Fé», Almedina, 2010, pag. 315. 
[13]A cujo sumário se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 1268/03.6TBSCR.L1.S1. 

[14]Ao qual se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, proc. 5/09.6YFLSB.
[15]Ver o supra citado acórdão do STJ de 16-11-2010.
[16]Sem prejuízo, quanto a esta última hipótese, da possibilidade de se tratar de um caso de indivisibilidade determinado pela lei, como os previstos no 1376 art. do CC, em que se fixa uma dimensão mínima da propriedade rústica para além da qual o fraccionamento daquela propriedade é legalmente vedado.
[17]Ver Menezes Leitão, «Direito das Obrigações», Vol. III, «Contratos em Especial», Almedina, 3ª edição,  pag. 106.
Decisão Texto Integral: