Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2151/15.8T8FAR.L1-4
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
TRABALHO SUPLEMENTAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I - O conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, não coincide plenamente com o conceito de retribuição que decorre do Código do Trabalho. Com efeito, aquele surge com maior abrangência ou amplitude do que este, porquanto, para além de integrar as prestações recebidas pelo trabalhador (sinistrado), enquanto correspetivo ou contrapartida da sua prestação de trabalho ao serviço do empregador, nele se integram também todas as prestações recebidas por aquele da parte deste com carácter de regularidade, desde que não se destinem a compensá-lo por custos aleatórios.
II - Como se referiu no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt, «[i]mporta que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado» (sublinhado nosso) pelo que, tendo em consideração a abrangência do conceito de retribuição que decorre do disposto no art. 71º da LAT, quando conjugada com o que está verdadeiramente em causa neste tipo de ações, não poderemos deixar de concluir que as importâncias (o seu valor médio) pagas pela Ré/apelante ao Autor/apelado a título de trabalho suplementar, em 7 (sete) dos 12 (doze) meses que precederam a data do acidente de trabalho por este sofrido, com as consequências que resultam da matéria de facto provada, devem ser levadas em consideração a título da retribuição por este auferida à data do acidente, para efeitos no cálculo das prestações que lhe são devidas ao abrigo da mencionada LAT.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.
RELATÓRIO
AAA, nascido em …, residente, atualmente, na Rua (…) Torres Vedras, em 2 de setembro de 2015, deduziu participação de acidente de trabalho contra a BBB., com sede na Rua (…) Lisboa, a CCC – Companhia de Seguros, S.A., com sede na Rua (…) Lisboa e a DDD – Companhia de Seguros, S.A., com sede (…) Lisboa, porquanto, no dia 11 de Setembro de 2014 foi vítima de acidente de viação e simultaneamente de trabalho quando se dirigia de motociclo da sua residência para o seu local de trabalho e foi embatido frontalmente por uma outra viatura que circulava em sentido contrário e invadiu a sua faixa de rodagem, acidente de que resultaram lesões que lhe determinaram incapacidades temporárias e permanentes para o trabalho.
Procedeu-se à fase conciliatória do processo a qual culminou com a realização, em 4 de outubro de 2017, da tentativa de conciliação a que se alude no art. 108º do CPT, tentativa para que foram convocados o sinistrado AAA, a sua entidade empregadora BBB. e a seguradora em matéria de acidentes de trabalho CCC – Companhia de Seguros, S.A.[1], tentativa que não surtiu efeito, porquanto, o sinistrado entendeu estar afetado de uma incapacidade superior à que lhe foi atribuída pelo perito médico do GML Faro (IPP de 45,4109%, com I.P.A.T.H.), o legal representante da Ré seguradora, embora tivesse reconhecido o acidente dos autos como de trabalho, o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões consideradas pelo senhor perito médico, referiu não estar de acordo com o grau de avaliação da incapacidade indicado pelo Ministério Público, ou seja, a IPP de 68,1200% com IPATH [(IPP de 45,4109%, com I.P.A.T.H.) + 1,5 de bonificação face às instruções da TNI] e por isso não aceitar o acordo por este proposto. O legal representante da entidade empregadora, embora também tivesse reconhecido o acidente dos autos como de trabalho, o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões consideradas pelo senhor perito médico do GMLFaro, declarou não aceitar qualquer responsabilidade relativa a reparação dos danos decorrentes desse acidente de trabalho, por entender que todas as quantias pagas ao sinistrado – com a natureza de retribuição regular e periódica – encontram-se, por si, totalmente transferidas para a responsabilidade da seguradora e que todos os valores mensais pagos a título de trabalho suplementar não representam retribuição regular ou periódica, pois não são de valor mensal igual e foram processados e pagos apenas nos meses de Março, Maio, Julho, Agosto, Setembro e Outubro de 2014 por motivo de legítimo, legal e excecional acréscimo da sua atividade, razão pela qual refere não aceitar a conciliação nos termos do acordo proposto pelo Ministério Público.
Dadas as partes por não conciliadas, deduziu o Autor AAA petição contra a Ré empregadora BBB e contra a Ré seguradora CCC – Companhia de Seguros, S.A..
Alega, em síntese e com interesse, que prestava a sua força de trabalho, por conta, no interesse, sob as ordens, direção e fiscalização da 1.ª Ré, que lhe atribuiu a categoria profissional de técnico de manutenção de aeronaves, sendo que, em razão do exercício da sua atividade, auferia uma retribuição mensal que, à data do acidente que a seguir se descreve, se cifrava, em média, em 2.250,00€.
No dia 11 de Setembro de 2014, por volta das 22 horas, saiu da sua casa sita na (…) Quarteira, tripulando o seu veículo motorizado – motociclo – com a matrícula (…), em direção ao Aeroporto Internacional de Faro, para aí cumprir as suas funções.
No trajeto normalmente utilizado, cumpriu, escrupulosamente com todas as regras estradais e adaptou a velocidade do motociclo que conduzia, às concretas condições da via.
Em determinado momento do trajeto, no sentido Quarteira → Almancil, seguia pela Avenida …, em Loulé, na sua faixa de rodagem, na sua mão de trânsito, a uma velocidade de cerca de 45 km/h, sendo que o local era em reta de boa visibilidade, no dia em causa o céu estava limpo, não tinha ocorrido qualquer precipitação, o pavimento estava seco, devidamente alcatroado e sem apresentar irregularidades relevantes ou sequer vestígios de detritos/lixo.
Todavia, súbita e inesperadamente, sem que o aqui Autor alguma atitude pudesse ter tomado no sentido de evitar o embate, o condutor de um veículo automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula (…), tripulado por (…), que circulava em sentido contrário (de Faro em direção a Almancil), saiu da faixa de rodagem em que se deslocava e invadiu a faixa contrária, por onde circulava o motociclo tripulado pelo Autor, embatendo frontalmente neste.
O condutor do veículo de matrícula (…), (…) foi submetido a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, tendo acusado uma TAS de, pelo menos, 2,14 g/l, correspondente à TAS de 2,25 g/l registada.
Na sequência daquele embate, o Autor foi projetado pelo ar a uma distância de vários metros, tendo sido prontamente assistido no local e encaminhado para o Hospital de Faro onde foi operado à perna esquerda, de modo a serem implantados fixadores no fémur, e efetuado o encavilhamento na tíbia, além de lhe ter sido efetuada uma limpeza cirúrgica à mão e foi transferido para o Hospital de Santa Maria em Lisboa onde foi submetido a mais três intervenções cirúrgicas: duas à mão esquerda e outra à perna esquerda, durante os vinte e oito dias em que o Autor se manteve internado nesse Hospital, a que se seguiu nova intervenção cirúrgica à mão esquerda realizada na Clínica de Todos-os-Santos.
Já mais recentemente, o Autor veio a ser novamente intervencionado na Clinica do SAMS à mão e à perna esquerda.
Em razão dos ferimentos que sofreu em consequência do acidente de que foi vítima, o Autor, durante vários meses, perdeu toda a autonomia, deixou de andar pelo próprio pé, deslocando-se em cadeira de rodas que tinha que ser empurrada por terceiros atentas as lesões na mão esquerda que o impediam de a movimentar, deixou de ser capaz de efetuar as mais simples tarefas quotidianas, nomeadamente deixou de conseguir vestir-se, por si próprio e até de conseguir utilizar os talheres para se alimentar autonomamente.
Em razão do referido acidente, dos ferimentos sofridos e da situação de incapacidade consequente daqueles, o Autor estagnou na progressão da sua carreira profissional, pois não mais pôde frequentar quaisquer ações de formação, quer as ministradas pela 1ª Ré, quer pela (…) ou quaisquer outras entidades.
O Autor, desde a data do sinistro, que se encontra a residir, com a sua companheira, em casa dos pais, Rua (…), Torres Vedras.
Na sequência do acidente e da sua impossibilidade física de exercer as funções que exercia anteriormente, a sua entidade patronal e ora 1ª R., fez operar a caducidade do contrato de trabalho anteriormente outorgado entre ambos, encontrando-se, atualmente, desempregado.
O Autor participou a ocorrência do sinistro à 2ª Ré, para a qual a 1ª Ré havia transferido a responsabilidade infortunística laboral, por intermédio de seguro de acidentes de trabalho.
Concluiu pedindo que o acidente descrito fosse caracterizado como acidente de trabalho, com todas as consequências legais daí resultantes, designadamente com a fixação da incapacidade e respetiva pensão, com as devidas atualizações legais.
Pediu ainda que fosse submetido a perícia por junta médica para apuramento do tipo e grau de incapacidade decorrente do referido acidente de trabalho, formulando os correspondentes quesitos, bem como que lhe fosse fixada uma pensão a título provisório.
A Ré “CCC” também requereu a realização de junta médica, formulando os respetivos quesitos.
Em 02/11/2017 foi proferido despacho de aperfeiçoamento no que concerne à petição inicial deduzida pelo Autor e foi indeferido o requerimento de junta médica deduzido pela Ré “CCC”.
O Autor juntou ao processo petição inicial aperfeiçoada.
Citadas as Rés para contestarem, fê-lo apenas a Ré patronal, alegando, em síntese e com interesse que é uma sociedade que se dedica à atividade de reparação, manutenção e limpeza de aeronaves, veículos especiais e outros equipamentos de transporte, sendo que um dos seus principais clientes é a empresa de aviação “(…) Ltd.”
O Autor foi admitido ao seu serviço para o exercício das funções inerentes à categoria de «técnico de manutenção de aeronaves» para prestar as suas funções no Aeroporto Internacional de Faro.
O sinistrado manteve-se ao seu serviço até 11/09/2014, data em que, na sequência de um acidente de viação, ficou impossibilitado de prestar trabalho.
Relativamente aos factos, designadamente aos atinentes à fixação do grau de incapacidade do sinistrado, adere à posição da Ré seguradora “CCC, S.A.”
Na pendência do contrato de trabalho, o sinistrado auferiu, desde 25/02/2013 até 31/12/2013 as quantias que descrimina no art. 8º da sua contestação e que aqui se dão por reproduzidas e no período que mediou entre 01/01/2014 até 11/09/2014 auferiu as quantias mencionadas no art. 9º daquela peça processual e que aqui se dão por reproduzidas, pelo que, em 2013, o sinistrado realizou e recebeu o pagamento de trabalho suplementar apenas em 4 meses (de agosto a novembro) e em 2014º sinistrado realizou e recebeu trabalho suplementar durante 5 meses (em março, maio, junho, agosto e setembro).
Assim, o sinistrado, no desempenho de funções ao serviço da Ré empregadora, não realizou trabalho suplementar com caráter de regularidade, mas apenas pontualmente quando os acréscimos de atividade assim o exigiam, pelo que deve improceder a pretensão do sinistrado no que respeita à caracterização do trabalho suplementar prestado, como retribuição regular.
Ao contrário do alegado pelo sinistrado, transferiu para a co-Ré seguradora toda a sua responsabilidade decorrente das quantias que lhe foram pagas e que integram o conceito de retribuição, porquanto, respeitante a todas as prestações que revestiram, efetivamente, caráter de regularidade na pendência do contrato de trabalho.
Concluiu que a ação deve ser julgada improcedente e, em conformidade, ser absolvida dos pedidos com todas as consequências legais.
Foi proferido despacho saneador com fixação da matéria de facto considerada como assente e controvertida, determinando-se ainda o desdobramento do processo de forma a ser fixada a incapacidade que afeta o sinistrado.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento a que se seguiu a prolação de sentença que culminou com o seguinte:
«Dispositivo:
Pelo exposto julgo a ação procedente, e em consequência:
1) Declaro que o Autor sofreu um acidente de trabalho que lhe determinou uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) com incapacidade permanente parcial (IPP) de 68,11635%) desde 23.02.2017;
2) Condeno a Ré CCC – Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao Autor:
a) … uma pensão anual e vitalícia no montante de € 19.015,30 (dezanove mil e quinze euros e trinta cêntimos), devida desde 23.02.2017, a pagar em prestações mensais adiantadas até ao 3.º dia de cada mês, correspondentes, cada uma, a 1/14 da pensão anual, a que acrescem os subsídios de férias e de Natal, cada um também no valor de 1/14 da pensão anual, respetivamente, nos meses de Junho e Novembro, bem como juros de mora à taxa legal contados sobre o valor de cada uma das prestações mensais relativas ao pagamento da pensão desde a data em que deveria ter sido efetuado o pagamento de cada uma dessas prestações (3.º dia de cada mês) até integral pagamento das mesmas;
b) … um subsídio de elevada incapacidade permanente no valor de €5.004,40 (cinco mil e quatro euros e quarenta cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal, vencidos desde 23.02.2017 e vincendos até integral pagamento;
c) … a quantia de € 836,98 (oitocentos e trinta e seis euros e noventa e oito cêntimos) a título de indemnização (remanescente) por incapacidade temporária absoluta, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde 23.02.2017 e vincendos até integral pagamento;
d) …. a quantia de € 30,00 (trinta euros) a título de pagamento de despesas, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde 04.10.2017 e vincendos até integral pagamento;
3) Condeno a Ré BBB, Ldª, a pagar ao Autor:
a) … uma pensão anual e vitalícia no montante de € 1.701,08 (mil setecentos e um euros e oito cêntimos), devida desde 23.02.2017, a pagar em prestações mensais adiantadas até ao 3.º dia de cada mês, correspondentes, cada uma, a 1/14 da pensão anual, a que acrescem os subsídios de férias e de Natal, cada um também no valor de 1/14 da pensão anual, respetivamente, nos meses de Junho e Novembro, bem como juros de mora à taxa legal contados sobre o valor de cada uma das prestações mensais relativas ao pagamento da pensão desde a data em que deveria ter sido efetuado o pagamento de cada uma dessas prestações (3.º dia de cada mês) até integral pagamento das mesmas;
b) … a quantia de € 4.783,33 (quatro mil setecentos e oitenta e três euros e trinta e três cêntimos) a título de indemnização por incapacidade temporária absoluta, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde 23.02.2017 e vincendos até integral pagamento;
4) Condeno as Rés no pagamento das custas do processo na proporção dos respetivos decaimentos;
5) Fixo o valor da causa em € 365.236,27 (trezentos e sessenta e cinco mil duzentos e trinta e seis euros e vinte e sete cêntimos).
*
Após trânsito em julgado:
- As Rés deverão, no prazo de 30 dias, juntar aos autos documento comprovativo do pagamento das prestações em que foram condenadas e que já se mostrem vencidas (capital e juros), sob pena de poder ser oficiosamente ordenado o início de processo executivo, nos termos do disposto no artigo 90º, n.º 2, do C.P.T..
- A Ré seguradora deverá comunicar aos autos a atualização da pensão relativamente ao ano de 2018;
- Devem os autos ir com vista ao Ministério Público para os efeitos do disposto no artigo 8º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 142/99 de 30/04, visando a atualização da pensão a cargo da empregadora;
- Cumpra-se o disposto no artigo 137º, n.º 1, do C.P.T., visando o cálculo da caução a ser prestada pela empregadora nos termos dos artigos 84 e 85º da NLAT.».
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Inconformada com esta sentença, veio a Ré empregadora BBB interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões:
(…)
Nestes termos, deverá ser concedido provimento ao presente recurso de apelação, devendo a douta sentença recorrida ser substituída por outra que:
a) Reconheça que a R./Apelante transferiu para a Ré Seguradora a responsabilidade sobre todas as quantias pagas ao Sinistrado que integravam o conceito de retribuição regular (o que não era, manifestamente, o caso da retribuição por trabalho suplementar), tudo com as legais consequências;
b) Absolva, em consequência, a R./Apelante do pagamento de todas as quantias descriminadas na sentença recorrida, absolvendo-a de todos os pedidos contra si formulados.
PARA QUE SE FAÇA JUSTIÇA!
*
Contra-alegou o Autor e sinistrado AAA, formulando as seguintes conclusões:
(…)
Nestes termos, esperando e confiando no douto suprimento de V. Exas., deverá ser julgado totalmente improcedente o recurso interposto pela Recorrente mantendo-se, na íntegra, a sentença recorrida, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA !
*
Admitido o recurso com adequado regime de subida e efeito devolutivo, foram os autos remetidos para esta 2ª instância.
Mantida a admissão do recurso, determinou-se que fosse dado cumprimento ao disposto no n.º 3 do art. 87º do CPT, tendo a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitido o douto parecer de fls. 306 no sentido da improcedência do recurso.
Esse parecer mereceu resposta concordante da parte do Autor e discordante da parte da Ré empregadora.
Pelas razões que figuram de fls. 317 foram dispensados os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos.
Cumpre, pois, apreciar e decidir do mérito do recurso interposto.
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APRECIAÇÃO
Dado que, como se sabe, são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto perante o Tribunal ad quem, salvo no que concerne a questões de conhecimento oficioso, em face das conclusões extraídas pela Ré/apelante no recurso em causa, coloca-se à apreciação deste Tribunal da Relação a questão de se saber se as remunerações auferidas pelo sinistrado e Autor/apelado, a título de trabalho suplementar prestado ao serviço daquela no ano que precedeu a data de verificação do sinistro de que foi vítima em 11 de Setembro de 2014, devem, ou não, integrar o conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações que lhe são devidas por força da LAT.
*
Fundamentos de facto
Em 1ª instância considerou-se provada a seguinte matéria de facto:
1) Em 25/02/2013 o Autor celebrou contrato de trabalho com a Ré BBB, Lda., exercendo por conta, no interesse, sob as ordens, direção e fiscalização daquela Ré, as funções de técnico de manutenção de aeronaves no Aeroporto Internacional de Faro;
2) No dia 11/09/2014, o Autor sofreu um acidente de trabalho, quando em Almancil - Loulé, no itinerário e aquando da sua deslocação de casa para o local de trabalho, sofreu acidente de viação, em consequência do qual sofreu as seguintes lesões: politraumatismo sem perda de conhecimento; traumatismo do membro superior esquerdo com esfacelo grave do antebraço e mão; fratura do cúbito e dos M3 e M4; traumatismo do membro inferior esquerdo com fratura do fémur e fratura diafisária dos ossos da perna;
3) Na sequência do acidente sofrido, o Autor deixou de poder desempenhar as funções para que tinha sido contratado, que exigiam perícia, domínio da motricidade fina dos dedos das mãos e particular destreza dos mesmos dedos da sua mão esquerda, e que o Autor perdeu e deixou de possuir, em consequência do acidente, tendo a Ré BBB, Ldª, operado a caducidade do contrato de trabalho uma vez que não dispunha de qualquer outra função/cargo que o Autor pudesse desempenhar;
4) A Ré BBB, Ldª, tinha a responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a Ré CCC – Companhia de Seguros, S.A, através da apólice nº 0012 10049904, em função da retribuição anual total de € 29.887,32, que integra as seguintes componentes retributivas: € 1.300,00/mês x 14 meses (incluídos os subsídios de férias e natal) – salário base; € 112,64/mês x 11 meses – subsídio de alimentação; € 870,69/mês x 12 meses – ajudas de custo;
5) Para além das retribuições referidas em 4), nos 12 meses anteriores ao acidente – setembro de 2013 a Agosto de 2014, inclusive –, o Autor auferiu ainda as seguintes a título de retribuição por trabalho suplementar prestado:

Mês / anoValor (€)
Setembro 2013
1.028,00
Outubro 2013
205,68
Novembro 2013
205,68
Dezembro 2013
_
Janeiro 2014
_
Fevereiro 2014
_
Março 2014
788,67
Abril 2014
_
Maio 2014
85,72
 Junho 2014
154,26
 Julho 2014
_
 Agosto 2014
205,68
Total
2.673,69


6) A Ré CCC – Companhia de Seguros, S.A. pagou ao Autor a quantia de € 52.632,68 a título de indemnizações por ITA no período compreendido entre 12.09.2014 e 22.02.2017, data em que foi concedida alta clínica ao Autor, e, na tentativa de conciliação, aceitou efetuar o pagamento da quantia adicional de € 836,42 a título de valor remanescente de indemnizações por ITA ainda em dívida;
7) Em deslocações ao Tribunal e ao Gabinete de Medicina Legal e Forense do Oeste o Autor despendeu a quantia de € 30,00;
8) A Ré BBB, Ldª., não pagou ao Autor qualquer montante a título de indemnização por incapacidades temporárias;
9) As lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente determinaram uma situação de incapacidade temporária absoluta entre 12.09.2014 e 22.02.2017, data da alta;
10) Em consequência do acidente o Autor ficou a padecer de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) com incapacidade permanente parcial (IPP) de 68,11635% desde 23.02.2017.
*
Dado que esta matéria de facto não foi objeto de qualquer impugnação, nem se vê motivo para uma alteração oficiosa da mesma, considera-se definitivamente assente.
*
Fundamentos de direito
Como se referiu, a questão de recurso suscitada à apreciação deste Tribunal da Relação, consiste em saber se as remunerações auferidas pelo sinistrado e aqui Autor/apelado AAA a título de trabalho suplementar prestado ao serviço da Ré/apelante BBB. durante o ano que precedeu a data de verificação do sinistro de que foi vítima em 11 de Setembro de 2014, devem, ou não, integrar o conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações que lhe são devidas por força da LAT.
Em síntese, alega e conclui a Ré/apelante que, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, o trabalho suplementar realizado pelo sinistrado e aqui Autor/apelado foi esporádico, irregular e correspondeu maioritariamente aos meses de Verão.
Alega ainda que, nos termos do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009, a indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente, sendo os montantes considerados, enquanto retribuição, apurados com base nos critérios de “normalidade” e de “regularidade”.
Refere, por outro lado e com base em douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 14.03.2016 no processo n.º 1242/11.9TTVNG.P1[2], que, para efeitos de acidente de trabalho, uma prestação só é regular se assumir um carácter de permanência, frequência ou habitualidade, em termos tais que o trabalhador detenha a legitima expectativa de as receber, integrando as mesmas o seu “orçamento” programado porque paga durante todos os meses de atividade, sendo que, com base no entendimento maioritário seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores (indicando, como exemplo, o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.12.2010 proferido no processo n.º 2065/07.5TTLSB.L1.S1[3]) para que uma prestação acessória seja considerada como integrante da retribuição, é necessário que ocorra em todos os meses de atividade, ou seja, onze meses por ano.
Pede, por isso, que a sentença recorrida seja substituída por outra que:
a) Reconheça que transferiu para a Ré seguradora a responsabilidade sobre todas as quantias pagas ao Sinistrado que integravam o conceito de retribuição regular, o que não era, manifestamente, o caso da retribuição por trabalho suplementar;
b) Absolva, em consequência, a Ré/apelante do pagamento de todas as quantias descriminadas na sentença recorrida, absolvendo-a de todos os pedidos contra si formulados.
Vejamos se lhe assiste razão!
Mostra-se incontroverso, perante a matéria que consta dos pontos 2) e 3) dos factos provados e tendo em consideração o disposto nos artigos 8º e 9º n.º 1 al. a) e n.º 2 al b), ambos da Lei n.º 98/2009 de 04-09 (doravante designada por LAT e aplicável ao caso), que o acidente sofrido pelo sinistrado e aqui Autor AAA em 11 de Setembro de 2014, configura um acidente de trabalho. Aliás, nenhuma das partes coloca em causa tal qualificação.
Nesta fase do processo e como se referiu, apenas se discute se as importâncias auferidas pelo Autor e sinistrado AAA ao serviço da Ré BBB, Ldª a título de trabalho suplementar, nos 12 (doze) meses que precederam a data do referido acidente, devem ou não integrar o conceito de retribuição para efeitos do cálculo das prestações que àquele são devidas por força da mencionada LAT e isto, porquanto, se estipula no seu art. 71º n.º 1 que «[a] indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente».
Ora, nos termos do n.º 2 deste preceito legal, «[e]ntende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios» e prevê-se no n.º 3 do mesmo dispositivo legal que, «[e]ntende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade».
Por outro lado e no que aqui releva, estipula-se no art. 258º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12-02, que:
«1- Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2- A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas, feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.
3- Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.».
Destaca o Prof. Bernardo Lobo Xavier[4] na noção de retribuição que emerge deste normativo legal, quatro elementos principais que dela são caracterizadores:
1º - «Prestações regulares e periódicas», na medida em que, por um lado não são arbitrárias mas seguem uma regra permanente ou constante e, por outro lado, são relativas a períodos certos (ou aproximadamente certos) no tempo, de modo a integrarem-se na periodicidade e na repetência própria das relações contratuais de trabalho e nas necessidades recíprocas que o contrato de trabalho se destina a servir.
2º - «…em dinheiro ou em espécie…», traduzida num conjunto de valores patrimoniais – pecuniários ou não, mas, ainda assim avaliáveis em dinheiro – não constituindo retribuição outras atribuições de ordem não patrimonial.
3º - «…a que… o trabalhador tem direito…» por título contratual e normativo, correspondendo a um dever da entidade empregadora, o que, em regra, faz excluir as gratificações e liberalidades, para além de excluir as importâncias atribuídas por terceiros.
4º - «…como contrapartida do trabalho», já que é o trabalho prestado a causa determinante da retribuição, sendo aquele e esta prestações de carácter correspetivo e sinalagmático «retribui-se quem trabalha, trabalha-se porque se é retribuído.»
Estamos perante a chamada retribuição em sentido próprio ou técnico-jurídico que surge dotada das características de obrigatoriedade da prestação em dinheiro ou em espécie feita pelo empregador ao trabalhador, obrigatoriedade decorrente da lei, de uma convenção ou então dos usos (da profissão ou da empresa), da correspetividade ou contrapartida dessa prestação face à disponibilidade de trabalho oferecida pelo trabalhador e da regularidade e periodicidade com que a prestação é efetuada.
Todavia, do confronto dos mencionados dispositivos legais (art. 71º da LAT e art. 258º do CT), verifica-se que o conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, não coincide plenamente com o conceito de retribuição que decorre da aludida norma do Código do Trabalho. Com efeito, aquele surge com maior abrangência ou amplitude do que este, porquanto, para além de integrar as prestações recebidas pelo trabalhador (sinistrado), enquanto correspetivo ou contrapartida da sua prestação de trabalho ao serviço do empregador, nele se integram também todas as prestações recebidas por aquele da parte deste com carácter de regularidade, desde que não se destinem a compensá-lo por custos aleatórios (cfr. art. 71º n.º 2 da LAT).
É certo que no n.º 3 do art. 258º do Código do Trabalho se estabelece uma presunção de retribuição relativamente toda e qualquer prestação – em dinheiro ou em espécie – feita pelo empregador ao trabalhador. Contudo, estamos perante uma presunção “iuris tantum” que, como tal, pode ser ilidida, bastando que o empregador demonstre factos reveladores da não obrigatoriedade do seu pagamento ao trabalhador, ou então que a mesma não constitui uma contrapartida da prestação de trabalho, ou ainda, que se não verifica a regularidade ou a periodicidade do seu pagamento ao trabalhador.
Constata-se, portanto, que o elemento caracterizador do conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, é o da regularidade do pagamento de uma determinada prestação pelo empregador ao trabalhador sinistrado, sendo que, como se refere, a dado passo, no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1[5], «[o] conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado».
Contudo, como, a nosso ver, bem se refere neste douto Aresto, «[i]mporta que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado» (realce e sublinhado nosso), razão pela qual, no entendimento jurisprudencial ali expresso, careça de sentido o apelo ao critério de que para que uma prestação seja considerada como integrante da retribuição (isto, a nosso ver, para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho), seja necessário que o seu pagamento ocorra em todos os meses de atividade do trabalhador, ou seja, onze meses por ano, critério levado em consideração, designadamente, nos doutos Acórdãos proferidos, também pelo Supremo Tribunal de Justiça, respetivamente, em 16/12/2010 no processo n.º 2065/07.5TTLSB.L1.S1 e em 10/10/2015  no processo n.º 4156/10.6TTLSB.L1.S1[6], sendo que neles o que estava em causa era a natureza retributiva de específicas prestações, de forma a saber-se se deveriam ser integradas no cálculo do valor da retribuição por férias, por subsídio de férias e por subsídio de Natal, nada tendo a ver a jurisprudência neles estabelecida com o reflexo da perda da capacidade de ganho do sinistrado e com a sua projeção em termos de rendimentos futuros, como também se refere no douto Aresto do STJ que estamos a acompanhar.
Daí que, a nosso ver, seja perfeitamente compreensível a maior abrangência ou amplitude dada pelo legislador, ao longo dos anos, ao conceito de retribuição nos diplomas que têm regulado o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, face ao conceito de retribuição ínsito nas normas que, ao longo dos anos, vêm regulando o contrato de trabalho.
Na verdade, acrescenta-se no mencionado Acórdão do STJ de 31/10/2018 que, «apesar de proferida sobre a norma do artigo 26.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, continua inteiramente válida a jurisprudência fixada nesta Secção no acórdão invocado na sentença proferida na 1.ª instância[10][7], onde a este propósito se referiu o seguinte:
«Por seu turno, o n.º 3 do falado artigo 26.º prescreve deste modo:
“Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Se este normativo começa por apelar ao critério geral de retribuição – que já alude, ele próprio, à regularidade da prestação – para depois adicionar aquelas prestações regulares que não se destinem a compensar custos aleatórios, é forçoso reconhecer que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações.
No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.», concluindo, depois, que «[n]este contexto, o subsídio de prevenção auferido pelo sinistrado durante 7 meses no ano anterior ao do acidente tem natureza retributiva para os efeitos dos n.ºs 1, 2, e 3 do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009 e, como tal, deve ser tomado em consideração no cálculo das pensões e indemnizações ali previstas».
Posto isto e revertendo-se ao caso em apreço, provou-se que, para além das retribuições referidas em 4), nos 12 meses anteriores ao acidente, ou seja, entre setembro de 2013 a agosto de 2014, inclusive, o Autor e sinistrado AAA auferiu ainda, a título de retribuições por trabalho suplementar prestado ao serviço da sua entidade empregadora, a ora Ré/apelante BBB., as que se discriminam no ponto 5) dos factos provados, ou seja, as que lhe foram pagas nos meses de setembro, outubro e novembro de 2013, março, maio, junho e agosto de 2014.
Perante esta matéria de facto provada, diremos, antes de mais que, contrariamente ao que parece inferir-se das alegações e conclusões do recurso interposto pela Ré/apelante e como, a nosso ver, bem se menciona no voto de vencido que consta do douto Acórdão da Relação de Évora de 07/12/2016, proferido no processo n.º 67/14.4T8STB.E1[8], «A prestação de trabalho suplementar não constitui uma prestação acessória, mas a continuação da execução da prestação principal a que (o trabalhador) está obrigado, a qual reveste maior penosidade por se prolongar para além do horário normal de trabalho. A natureza e as funções não se alteram. O que muda é apenas a duração diária, semanal ou mensal da prestação do trabalhador. O pagamento desta prestação constitui a contrapartida da obrigação do trabalhador em prestar trabalho suplementar, nos termos em que a lei (ou convenção, acrescentamos nós,) o prevê».
Ora, logo por aqui, parece não se poder deixar de concluir que o valor médio das importâncias pagas pelo empregador ao trabalhador sinistrado, a título de trabalho suplementar prestado, devem considerar-se parte integrante da retribuição deste (n.º 1 do art. 258º do CT), a que acresce a circunstância de, não podendo este deixar de beneficiar da presunção estabelecida no n.º 3 do mesmo art. 258º do CT e cabendo ao empregador ilidir uma tal presunção, a verdade é que no caso vertente a Ré/apelante nada logrou demonstrar no sentido do afastamento dessa presunção, sendo certo que, como bem se refere no mesmo voto de vencido, «durante o tempo em que presta trabalho suplementar o trabalhador está sujeito ao risco de ocorrência de acidente de trabalho, pelo que é justo que seja a empregadora, beneficiária desta atividade, a suportar o risco inerente e repare os danos tendo em conta também as quantias auferidas pela prestação do trabalho suplementar».
Contudo, ainda que se entendesse ser dificilmente integrável no conceito de retribuição que resulta da aludida norma do Código do Trabalho o valor médio das prestações pagas pelo empregador ao trabalhador sinistrado a título de trabalho suplementar, a verdade é que, tendo em consideração a abrangência do conceito de retribuição que decorre do disposto no art. 71º da LAT, quando conjugada com o que está verdadeiramente em causa neste tipo de ações e a que anteriormente nos reportámos, não poderemos deixar de concluir que as importâncias (o seu valor médio) pagas pela Ré/apelante ao Autor/apelado a título de trabalho suplementar, em 7 (sete) dos 12 (doze) meses que precederam a data do acidente de trabalho por este sofrido em 11 de setembro de 2014, com as consequências que resultam da matéria de facto provada [v. pontos 2), 3) e 10)], devem ser levadas em consideração a título da retribuição por este auferida à data do acidente, para efeitos no cálculo das prestações que lhe são devidas ao abrigo da mencionada LAT, motivo pelo qual não merece censura a sentença recorrida ao haver concluído desse modo e ao responsabilizar a Ré/apelante, pela parte da sua responsabilidade não transferida para a Ré/seguradora, nos termos que constam da sentença recorrida.
DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo da Ré/apelante.

Lisboa, 2019/07/11                           
José António Santos Feteira (Relator)
Filomena Maria Moreira Manso
José Manuel Duro Mateus Cardoso

[1] A seguradora DDD SEGUROS – Companhia de Seguros, S.A. não foi convocada por ser seguradora do veículo terceiro que embateu no do sinistrado.
[2] Acórdão acessível em www.dgsi.pt
[3] Igualmente acessível em www.dgsi.pt
[4] Em Manual de Direito do Trabalho – Verbo – pagª 545 a 547.
[5] Acessível em www.dgsi.pt.
[6] Qualquer deles igualmente acessível em www.dgsi.pt.
[7] [10] Proferido no processo n.º 436/09.1YFLIS, datado de 17 de março de 2010, disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI, onde, além do mais se referiu em sede de sumário, o seguinte: «XVII - O art. 26.º, da LAT, adota um conceito de retribuição que, aproximando-se, num primeiro momento, do conceito genérico vertido no art. 249.º, do Código do Trabalho de 2003, acaba por nele integrar, num segundo momento, todas as prestações que assumam carácter de regularidade, o que significa que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações».
[8] Também ele acessível em www.dgsi.pt.