Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
25438/12.7YYLSB-B.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: DIREITO DE REPRESENTAÇÃO
TRANSMISSÃO DA HERANÇA
REPÚDIO DA HERANÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/26/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I-A representação só ocorre, todavia, na linha recta descendente. Esta regra segue o propósito da representação que é o de proteger a descendência (Artigo 2042º). De acordo com o artigo 2056º a aceitação pode ser expressa ou tácita. Já o repúdio não pode ser tácito, tem que ser expresso, estando sujeito à forma exigida para a alienação da herança (artigo 2063º). Assim, se a herança disser respeito a imóveis, o repúdio tem de ser feito por escritura pública.
II- Na representação, não há sucessão do autor da sucessão para o representado, e é indiferente que a haja deste para o representante. O representante tem de ter legitimidade em relação ao autor, mas não precisa de a ter em relação ao representado.
III-Enquanto o direito de representação pressupõe que o representado não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado – que não chegou a ser chamado ou respondeu não ao chamamento sucessório -, o direito de transmissão do art.º 2058 do CCiv, pelo contrário, pressupõe que o chamado à sucessão faleceu sem exercer o seu direito de aceitar ou repudiar a herança ou o legado.
IV-Comprovado nos autos que a requerida MCM é viúva de CM- que não repudiou expressamente a herança de seu pai-, filho do primitivo executado VM- este falecido antes do filho CM-, o direito de aceitar ou repudiar a herança do sogro transmitiu-se-lhe por força do disposto no art.º 2058 do CCiv, e não havendo notícia de a ter repudiado nenhum obstáculo ocorre para que seja habilitada na execução do mencionado VM como o foi.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

REQUERENTE na HABILITAÇÃO de HERDEIROS: NOVO BANCO S.A.(representado, juntamente com outra pela ilustre advogado JG como dos autos resulta)
*
APELANTE/ REQUERIDA na HABILITAÇÃO de HERDEIROS: MCM.(representada pelo ilustre advogado JP conforme instrumento de procuração de 4/6/2020 junto aos autos)
Com os sinais dos autos.
Valor do incidente: (242.235,84 euros)
*
I.1. Por apenso à execução que propôs contra JM e VM veio o exequente Novo Banco S.A. requerer contra JM e incertos incidente de habilitação de herdeiros do mencionado VM falecido a 20/5/2017 sendo que não obstante as diligências efectuados não logrou o requerente localizar a existência de processos de imposto de selo por óbito do executado de quê se pede a colaboração do tribunal  ao abrigo do art.º 7/4 para que a A.T.A. informe se por óbito do mencionado VM foi instaurado qualquer processo de imposto de selo, assim como não localizou habilitações de herdeiros solicitando nos mesmos termos ao tribunal a recorrido a notificação do co-executado JM para vir aos autos informar se conhece a identidade dos herdeiros do executado falecido, o que foi deferido, tendo a A.T.A vindo informar que não foi apresentada a declaração a participar o óbito do referido VM, informando o requerido JM, via seu ilustre advogado que o outro herdeiro dos eu falecido pai VM era o seu irmão CM, já falecido.
I.2 Face ao falecimento do habilitando CM foi determinada a suspensão da instância da habilitação dos herdeiros de VM até à habilitação dos herdeiros de CM por despacho de 9/3/2020, sobrevindo a decisão de habilitação dos herdeiros do habilitando CM de 2/12/2020 que julgou habilitados MCM, MM e MMM como sucessores do habilitando CM, e porque já havia contestação dos herdeiros de CM em relação à herança de VM no sentido da sua improcedência na medida em que tendo o mencionado VM falecido em 2017 e o filho CM em 27/7/2018 sem nunca ter aceite a herança aberta por morte do pai VM, nunca dele tendo recebido qualquer bem ou praticasse acto de que resultasse o reconhecimento ou a assumpção da sua vontade de aceitara a mencionada herança, sendo que os filhos de CM repudiaram expressamente a herança aberta pelo seu avô VM, não podendo ser julgados habilitados na execução assim o não pode a viúva MCM por ser alheia à herança aberta por morte de VM.
I.3 Por sentença de 26/1/2022 foram julgados habilitados como sucessores do falecido executado VM, JM seu filho e MCM, sua nora, absolvendo os demais do pedido.
I.4. Inconformada com a sentença, MCM interpôs recurso em cujas alegações em suma conclui:
1. CM faleceu após a morte de seu pai sem ter aceite nem repudiado a herança deixada por aquele conforme se constata pelas circunstâncias de não existir aceitação escrita nem qualquer acto que permitisse configurar uma aceitação tácita, sendo que os filhos de CM por escritura pública repudiaram a herança do avôs paterno o autor da sucessão;
2. Por força do art.º 2042, do CCiv, na sucessão legal era aos filhos de CM que competia o repúdio da herança do avô, sendo que a viúva de CM não era nem é sucessora do seu sogro e por isso não podia ter repudiado a sua herança, sendo que por força do art.º 2062, do CCiv, os efeitos do repúdio da herança retroagem ao momento da abertura da sucessão considerando-se como não chamados os sucessíveis que repudiaram, salvo para efeitos de representação.
I.4. Recebido o recurso, mantendo-se a instância válida fora os autos com vistos aos Excelentíssimos juízes-adjuntos que nada sugeriram.
I.5. Saber se ocorre na decisão recorrida erro de interpretação e de aplicação das disposições legais dos art.ºs 2039 e 2042 do CCiv, sendo que por morte do falecido executado e subsequente morte do seu filho que não chegou a aceitar ou a repudiara a herança do executado, aplicam-se as disposições legais do direito de representação do filho do executado, não sendo chamada à herança do executado a sua nora
II. É do seguinte teor as decisão recorrida:
“(...) I – Do incidente de habilitação de herdeiros:
1.1. Na pendência da ação executiva, e por apenso a esta, veio o exequente Novo Banco, S.A., deduzir incidente de habilitação dos herdeiros do                                                                              falecido executado VM contra JM e CM.
Falecido o habilitando CM, foram habilitados como seus sucessores MCM, MM e MMM (sentença de fls. 64 a 66).
1.2. Os requeridos MCM, MM e MMM deduziram contestação.
Notificado, o requerido/executado JM não deduziu contestação.
1.3. O tribunal é competente, o processo é o próprio e não há nulidades principais.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, sendo, além do mais, legítimas.
Não há quaisquer outras nulidades, questões prévias ou excepções que obstem ao conhecimento do mérito deste incidente.
1.4. Os autos oferecem já os elementos necessários à decisão do incidente (art. 354 nº. 1 do C. P. Civil).
II- Apreciando:
1- A execução deu entrada em juízo em 21 de Dezembro de 2012 intentada pelo Banco Espírito Santo, S.A. contra VM e JM.
2. VM faleceu em 20 de maio de 2017 no estado de viúvo de MLM (certidão do assento de óbito de fls. 49 da execução).
3. A fls. 86 consta a certidão de nascimento do habilitando JM
4. A fls. 27/vº. está junta a certidão de óbito do habilitando CM, de que consta que faleceu no estado de casado com MCM.
5. A fls. 55/vº. a 56/vº. está junta a escritura de “Repúdios de herança” datada de 1.10.2019, de que consta que MCM, MM e MMM “repudiam a herança aberta por óbito de seu avô VM”.
2. 2. Aplicando o direito:
O incidente de habilitação constitui-se como um mecanismo processual que tem como função operar uma modificação subjetiva da instância, na sequência de uma comprovação judicial da aquisição por transmissão da situação jurídica intervivos, por sucessão (falecimento ou extinção).
In casu, o que se pretende é a habilitação dos sucessores de uma determinada parte, por força do seu falecimento.
Trata-se de uma situação em que a habilitação é obrigatória, uma vez que até ocorrer fica suspensa a instância (art. 269 nº 1 al. a) do C.P.C.): “A morte ou extinção de uma das partes determina, obrigatoriamente, a modificação subjetiva da instância, suspendendo-se esta (...) para que se proceda à habilitação.” (Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, II, 2ª edição revista e atualizada, Lisboa, 1971, p. 211).
A habilitação-incidente, vem pois provocar uma modificação subjetiva da instância, na sequência de uma comprovação judicial da aquisição por transmissão, da situação jurídica de quem faleceu ou foi extinto.
Este incidente, na prática, traduz-se numa forma especial de sanar a falta de personalidade judiciária de uma parte (o seu falecimento) - daí, a suspensão (até sua decisão) da instância no processo em causa - pretendendo-se com ele “colocar o sucessor ou sucessores do falecido no lugar que este ocupava no processo” (Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, II, Almedina, 1982, p. 149; em sentido idêntico, José Alberto dos Reis; Código de processo Civil I., Coimbra Editora, 1982, p. 575).
No que respeita à ação executiva, nos termos do disposto pela regra geral contida no art. 53 nº. 1 do C. P. Civil, tem legitimidade como executado aquele que no título tenha a posição de
devedor, sendo que esta regra comporta desvios, como o previsto pelo art. 54 nº. 1 e que tem por base a sucessão no direito ou na obrigação, sendo que “se a transmissão do direito ou da dívida acontecer na pendência da ação executiva, é através do incidente de habilitação que se farão intervir na execução os sucessores das pessoas que no título executivo figuram como credor e devedor.” (Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, Almedina, 7ª. Edição, p. 57).
A habilitação dos herdeiros não certifica que os herdeiros aceitaram a herança ou receberam os bens; é um incidente que visa apenas apreciar quem são os herdeiros, para os investir na qualidade de executados: “quanto se trate de habilitar os sucessores de devedor falecido, não cabe dentro do objeto do incidente averiguar se esses sucessores receberam bens por força dos quais deva ser satisfeita a obrigação accionada (…). “ (Eurico Lopes-Cardoso e
Álvaro Lopes-Cardoso, Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, Livraria Petrony, 1999, p. 240).
O exequente intentou a habilitação contra os filhos do falecido executado, sendo que se veio a verificar que o habilitando CM havia falecido e foram habilitados os seus sucessores.
O habilitando JM não contestou, restando habilitá-lo. *
Os requeridos MCM, MCM, MM e MMM deduziram contestação alegando que os três últimos repudiaram a herança de seu avô, VM e que MCM, viúva de CM não pode ser habilitada por ser totalmente alheia à herança.
O repúdio da herança está previsto pelos arts. 2062 e seguintes do C. Civil, sendo um negócio jurídico unilateral, não receptício e irrevogável (cfr. Oliveira Ascensão, Direito Civil, Sucessões, Coimbra, 1989, pp. 431 e ss.): “Com efeito, a titularidade das relações jurídicas transmite-se pela sucessão hereditária (artº 2024º do CCiv), que se abre no momento da morte (artº 2031º do CCiv) através do chamamento dos herdeiros (artº 2032º do CCiv).
Aos chamados abrem-se duas hipóteses, que mutuamente se excluem: ou aceitam a herança (artº 2050º do CCiv) ou a repudiam (artº 2062º do CCiv), sendo tais declarações irrevogáveis (artigos 2061º e 2066º do CCiv).” (Ac. RL de 13.03.-2007, proc. nº. 933/2007-1, relatado pelo Desembargador Folque de Magalhães, em dgsi.pt)
Assim, “Pela aceitação o sucessor manifesta a sua vontade no sentido de tornar seus os direitos e obrigações que foram transmitidas pela lei ou pelo testamento; pelo repúdio a vontade é manifestada em sentido contrário.” (Ac. TRL de 2.11.2006, proc. nº. 8769/2006-6, relatado pelo Desembargador Granja da Fonseca, em dgis.pt).
Significa isto que “O sucessível, que repudiou a herança, não pode ser habilitado como sucessor do executado.“ (Ac. TRL de 16.06.1992, proc. nº. 0059121, relatado pelo Desembargador João Caldeira, em dgsi.pt).
Os habilitandos MCM, MM e MMM comprovaram o repúdio, juntando cópia da escritura descrita nos factos provados, pelo que restará absolve-los do pedido.
No que tange à requerida MCM, esta não repudiou a herança.
Embora venha alegar que é alheia à herança, é preciso ter em conta que esta foi habilitada pelo óbito do seu marido, o requerido CM (filho do falecido executado), por ser sua sucessora nos termos dos arts. 2133 nº. 1 al. a) e 2139 nº. 1 do C. Civil.
Por seu turno, o habilitando falecido, CM, era filho do falecido executado VM, sendo seu sucessor nos termos dos arts. 2133 nº. 1 al. a) e 2139 nº. 2 do C. Civil.
Uma vez que, como alegado, o habilitando CM não repudiou a herança de seu pai VM, a habilitanda, sendo sucessora do falecido habilitando por ser sua cônjuge, é sucessora do pai daquele, o falecido executado VM, improcedendo a sua contestação.
III - Decisão:
Nestes termos e por tudo exposto, ao abrigo dos arts. 2026 e 2142 e seguintes do C. Civil e dos 352 e 353 do C. P. Civil:
a) julgam-se habilitados JM e MCM como sucessores do falecido executado VM.
b) absolvem-se do pedido os requeridos MCM, MM e  MMM.(...)
III.1.Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 635, n.º 4, 639, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3. Saber se ocorre, na decisão recorrida, erro de interpretação e de aplicação das  disposições legais dos art.ºs 2039 e 2042 do CCiv, sendo que por morte do falecido executado e subsequente morte do seu filho, que não chegou a aceitar ou a repudiar a herança do executado, aplicam-se as disposições legais do direito de representação do filho do executado, não sendo chamada à herança do executado a sua nora.
III.3.1. No caso concreto está provado que o primitivo executado VM faleceu a 20/5/2017, sendo que o seu filho CM faleceu a 27/6/2018 ou seja faleceu depois do seu pai e não antes. Também está provado que por falecimento do mencionado CM e nesta mesma execução foi proferida decisão de 4/12/2020 e que está a fls. 64/66, decisão essa transitada em julgado que, tendo por base a decisão proferida no procedimento simplificado de habilitação de herdeiros e registos de 13/8/2018 e que se encontra a fls. 29/29 v.º foram julgados habilitados como sucessores do habilitando CM os mencionados MCM, MCM, MM e MMM, por isso a Ora recorrente, viúva de CM foi julgada habilitada como sucessora do seu falecido marido.
III.3.2. A questão que se coloca é a de saber se inexistindo documento equivalente ou habilitação notarial de herdeiros do falecido executado VM, pai do mencionado CM, inexistindo alegação e demonstração de que o falecido CM praticou qualquer acto donde se pudesse concluir pelo reconhecimento ou a assumpção da sua vontade de aceitar a pernaça se deve concluir que o mesmo não quis aceitar a herança do seu pai tal como previsto no art.º 2039 do CCiv, dando-se assim a representação sucessória, sendo beneficiários exclusivos os mencionados no art.º 2042 do CCiv, por isso os descendentes na linha recta do filho do autor da sucessão, e a nora, nesse circunstancialismo, alheia à sucessão e à habilitação na execução por falecimento dos eu sogro. Ora, não obstante não ter contestado a verdade é que o outro filho do executado VM, ora JM, desconhece-se se praticou ou deixou de praticar algum acto de aceitação da herança do seu pai e não obstante foi habilitado na execução e se se entendesse a necessidade da prova de ter praticado algum acto donde resultasse a aceitação expressa ou tácita da herança de seu pais como condição de habilitação, não vindo alegada nem demonstrada então pelas mesmas razões e não obstante a falta de contestação, por ser questão direito também se teria de ter concluído pela improcedência em relação ao mencionado JM e assim não aconteceu.
III.3.3. A questão prende-se com a figura do direito de representação que a decisão recorrida afastou na medida em que por não ter repudiado a herança o mencionado CM se deve considerar sucessor do seu pai VM nos termos do art.ºs 2133/1/a e 2139/2 do CCiv e a recorrente, sua viúva, por ser sucessora do seu marido e não ter repudiado a herança do mesmo deve ser habilitada como sucessora. O chamamento de sucessíveis dá‐se pela ordem do artigo 2133º, sendo que cada sucessível passa pelo filtro da capacidade.
III.3.4. Dentro de cada classe de sucessíveis, há a possibilidade de um descendente de um herdeiro/legatário ocupar a posição deste que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado, recorrendo ao mecanismo da representação (artigo 2039º), para se pôr no seu lugar.
Isto significa que para proteger o autor da herança, a lei cria o instrumento da representação que, ao invés de seguir a classe dos sucessíveis do artigo 2133º, permite suprir (artigo 2043º):
• a incapacidade do primeiro chamado;
• a inexistência do primeiro chamado;
• a indignidade do primeiro chamado;
• o repúdio do primeiro chamado;
III.3.5. A representação só ocorre, todavia, na linha recta descendente. Esta regra segue o propósito da representação que é o de proteger a descendência (Artigo 2042º). Na linha recta ascendente não há representação. De acordo com o artigo 2056º a aceitação pode ser expressa ou tácita. Já o repúdio não pode ser tácito, tem que ser expresso, estando sujeito à forma exigida para a alienação da herança (artigo 2063º). Assim, se a herança disser respeito a imóveis, o repúdio tem de ser feito por escritura pública.
III.3.6. Na representação, não há sucessão do autor da sucessão para o representado, e é indiferente que a haja deste para o representante. O representante tem de ter legitimidade em relação ao autor, mas não precisa de a ter em relação ao representado» - Direito Civil, Sucessões, Oliveira Ascensão, Coimbra Editora, 1981, pag.187.
III.3.7.A diferença, portanto, é que a transmissão do direito de suceder é derivada, adquirida por transmissão e no direito de representação, a vocação é originária.
Nas palavras de Capelo de Sousa (Lições de Direito das Sucessões, vol.I, pag.313), o direito de transmissão pressupõe que o sucessível tenha falecido e que este falecimento se dê após a abertura do de cujus sem que o chamado tenha exercido o seu direito de aceitar ou repudiar a sucessão, ao invés do direito de representação, que postula estar o sucessível impossibilitado de aceitar a sucessão ou tê-la repudiado.
III.3.8.Também se colhe dos ensinamentos de Pereira Coelho (Direito da Sucessões, Lições ao curso de 1973-1974), que «enquanto o direito de representação pressupõe que o representado não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado – que não chegou a ser chamado ou respondeu não ao chamamento sucessório -, o direito de transmissão, pelo contrário, pressupõe que o chamado à sucessão faleceu sem exercer o seu direito de aceitar ou repudiar a herança ou o legado» - pag.125.
III.3.6.E, na página seguinte, pode ainda ler-se: «Enquanto no direito de representação há um só fenómeno sucessório, na transmissão do direito de aceitar operam-se dois fenómenos sucessórios (…) e, por outro lado, enquanto o direito de representação é exclusivamente atribuído (na sucessão legal), aos descendentes dos filhos ou dos irmãos do de cujus (artº 2042), o direito de aceitar ou repudiar transmite-se genericamente aos herdeiros (legítimos ou testamentários) do chamado que não chegou a exercer aquele direito (artº 2058º).[2]
III.3.7.Por força do que se contém no artº 2042º, é pressuposto do direito de representação legal a falta de um parente da 1ª ou 3ª classe de sucessíveis do artº 2133º, resultante de pré-morte, incapacidade por indignidade, deserção, ausência ou repúdio.
III.3.8. Ora, indiscutivelmente que a viúva de CM é sua herdeira, pelo que o direito de aceitar ou repudiar a herança do sogro transmitiu-se-lhe por força do disposto no art.º 2058 do CCiv, e não havendo noticia de a ter repudiado nenhum obstáculo ocorre para que seja habilitada na execução do mencionado VM como o foi.

IV- Decidindo
IV.1 Tudo visto acordam os juízes, pelas razões referidas em III, em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
Regime da Responsabilidade por Custas: As custas são da responsabilidade da apelante que decai e porque decai (art.º 527/1 e 2)

Lxa., 26-05-2022
João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Manuel Leitão Leal
Nelson Borges Carneiro
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[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/6, entrado em vigor a 1/9/2013,  atento o disposto no art.º 6/1 e 6/4 ( o incidente de habilitação de herdeiros de executado é de 2018) da referida Lei, que se não aplica, todavia, ao título executivo dos autos, à forma do processo executivo, ao requerimento executivo dos autos e tramitação da fase introdutória destes autos por a execução ter tido o seu início em 2012, e atento o disposto nos art.ºs 6/3 e 8 da Lei 41/2013, aplicando-se, nessa parte, o disposto no DL 329-A/95 de 12/09); ao Código referido, na redacção dada pela referida Lei, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2] Neste sentido entre outros o AcRG de 11/6/2015 no processo 1502/06.0tbvrl-a.G1