Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
65/14.8YHLSB.L1-6
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PRODUTOS FARMACÊUTICOS
CONCORRÊNCIA DESLEAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/07/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - São pressupostos (cumulativos) de decretação do procedimento cautelar do art.º 338.-I do CPI, não só a titularidade de um direito de propriedade industrial, mas ainda a violação efectiva/consumada desse direito ou, pelo menos, a sua violação iminente, desde que susceptível – esta última – de causar lesão grave e dificilmente reparável desse direito.
- Por isso, o requerente desse procedimento cautelar, para além de demonstrar que é titular do direito, deve convencer, ainda que sumariamente, que já se verifica ou está iminente uma violação do direito naqueles moldes.
- O que essencialmente releva, no contexto de protecção de direitos ligados a marcas (vistas como sinais distintivos de mercadorias, produtos ou serviços), é a ideia de semelhança, reportada ao risco de confusão, ou, na perspectiva contrária, a respectiva capacidade distintiva.
- Radicando aqui a bitola essencial a considerar, ela dependerá de diversos factores em concreto, designadamente do nível de conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser estabelecida com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos e os serviços designados.
- Estando em causa produtos farmacêuticos traduzidos em pensos transdérmicos, que constituem medicamentos genéricos (os da Apelada), com certas semelhanças de aspecto e de características técnicas face ao produto de referência (o das Apelantes), sendo diversas as marcas nominativas sob que são comercializados, o que é bem patente nas respectivas embalagens e saquetas em que encerrados no âmbito da sua produção e comercialização, elucidando claramente quanto à origem diversa dos produtos, é notória a inconfundibilidade do conjunto, mormente aquando da sua prescrição e comercialização, tendo em conta que tal prescrição cabe a profissionais especializados, os médicos, tratando-se, pois, de um sector de mercado exigente e onde intervêm profissionais de saúde especializados e fortemente informados.
- A concorrência desleal pressupõe a prática de acto(s) contrário(s) às normas e usos honestos de determinado ramo de actividade económica, a obstrução às exigências da boa fé – objectiva, enquanto padrão/norma de conduta, traduzida no agir honesto, correcto e leal na prática comercial – exigível, in casu, a quem se movimente neste mercado concorrencial do medicamento.
- Mercado esse legalmente aberto a medicamentos genéricos, de si mais baratos, à escolha dos consumidores, sob prévia prescrição médica, como foi intento da legislação em vigor.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

***

I – Relatório ([1])

“N... AG”, sociedade comercial suíça, com sede ..., e
“N... S. A.”, com sede ...,
instauraram procedimento cautelar comum, nos termos do disposto no artigo 338-I.º do Código da Propriedade Industrial (doravante, CPI), contra
“T... LDA.”, com sede ...,

pedindo que:
a) Seja ordenado à Requerida que se abstenha de usar, nos seus produtos, qualquer sinal com a configuração indicada no art.º 82.º do requerimento inicial, que reproduza ou seja confundível com as marcas comunitárias registadas a favor da 1.ª Requerente;
b) Seja ordenado à Requerida que se abstenha de produzir, fabricar, mandar fabricar, importar, publicitar e comercializar produtos com a configuração em causa, que reproduzam ou sejam confundíveis com as marcas comunitárias registadas a favor da 1.ª Requerente;
c) Seja ordenada a apreensão de todos os produtos com a configuração indicada no art.º 82.º do requerimento inicial, que reproduzam ou sejam confundíveis com as marcas comunitárias registadas a favor da Requerente, que se encontrem, quer na sede da Requerida, quer já em distribuição (em estabelecimentos comerciais de terceiros);
d) A Requerida seja condenada a destruir todos os adesivos que tenha em seu poder, conforme descrito nas al.ªs b) e c) supra;
e) A Requerida seja condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor € 13.000,00, por cada dia de incumprimento das providências uma vez decretadas;
f) Seja ordenado à Requerida que informe o Tribunal sobre as quantidades produzidas, fabricadas, entregues, recebidas ou encomendadas de produtos que reproduzam ou sejam confundíveis com as marcas comunitárias registadas da Requerente, bem como sobre o rendimento obtido com aquelas actividades;
g) A Requerida seja notificada para apresentar ao Tribunal todos os documentos contabilísticos e comerciais (facturas, notas de encomenda, guias de remessa, documentos alfandegários, etc.) relativos à aquisição, importação, armazenamento, venda e/ou utilização de todos os produtos “RIVASTIGMINA TEVA”, nas várias dosagens aprovadas comercializadas (4,6 mg/24h – 7 unidades; 4,6 mg/24h – 30 unidades e 9,5 mg/24h – 30 unidades).

Para tanto, alegam, em síntese:
- ocorrer violação, pela Requerida, dos direitos decorrentes da titularidade, pela 1.ª Requerente, dos registos das marcas comunitárias n.ºs 11293362 (figurativa) e 11293404 (figurativa), violação essa decorrente da comercialização, pela Requerida, de adesivos transdérmicos contendo o agente farmacêutico Rivastigmina, para o tratamento da doença de Alzheimer, os quais constituem reprodução dos sinais constantes das marcas acima indicadas, que são utilizadas pelas mesmas para identificar produtos idênticos aos comercializados pela Demandada;
- as diminutas diferenças entre os adesivos transdérmicos distribuídos e comercializados pela Requerida e as marcas da 1.ª Requerente não bastam para assegurar a diferenciação entre esses produtos, existindo risco de confusão para o consumidor médio;
- tal actuação da Requerida causa risco de diluição das marcas da 1.ª Requerente, desvalorizando-as;
- o comportamento da Requerida traduz ainda concorrência desleal, por as Requerentes desenvolverem actividades idênticas, sendo que aquela, ao comercializar adesivos que transmitem uma impressão de conjunto semelhante à dos adesivos das Requerentes, incorre na prática de actos geradores de confusão, sancionados pelo art.º 317.º, n.º 1, al.ª a), do CPI.

A Requerida, citada, deduziu oposição, concluindo pela improcedência do procedimento.

Para tanto, defendeu:
- enfermarem as marcas da 1.ª Requerente de nulidade, por desprovidas de carácter distintivo e serem constituídas exclusivamente por características dos produtos que visam assinalar;
- encontrarem-se pendentes de apreciação pedidos de declaração de nulidade dos referidos registos de marca comunitária n.ºs 011293362 e 011293404;
- a eventual distintividade que existisse seria tão exígua que o uso de um penso transdérmico por terceiros com características visuais ligeiramente diferentes bastaria para permitir aos consumidores a sua diferenciação;
- as diferenças entre as marcas da 1.ª Requerente e os pensos transdérmicos da Requerida permitem que, no seu conjunto, os consumidores procedam a fácil distinção, afastando qualquer risco de confusão, sendo certo que a lei impõe que os medicamentos genéricos (como os da Requerida aqui em causa) tenham a mesma forma farmacêutica / características técnicas, dos medicamentos de referência (os das Requerentes);
- correram termos na Alemanha e na Roménia procedimentos cautelares semelhantes ao presente, que foram julgados improcedentes, por se considerar não existir risco de erro ou confusão para o consumidor;
- sendo a pretensão das Requerentes manifestamente infundada, consubstanciando litigância de má-fé, requer a Requerida o seu ressarcimento pelos custos da sua defesa.

Realizada a audiência final, foi proferida decisão – datada de 02/06/2014 –, onde foi julgado improcedente o procedimento cautelar, com total absolvição da Requerida, bem como o incidente de condenação por litigância de má fé.

Desta decisão final vieram as Requerentes interpor o presente recurso, apresentando, após convite do Relator ao aperfeiçoamento conclusivo, as seguintes
Conclusões:

«A. O presente recurso de Apelação vem da Douta Sentença de fls._, a qual decidiu julgar improcedente o procedimento cautelar interposto pelas ora Apelantes e, em consequência, absolver a Apelada T... LDA., dos pedidos formulados pelas Requerentes, ora Apelantes, N... AG e N... S.A.
B. Salvo o devido respeito, as ora Apelantes não podem concordar com a decisão do Mm.º Juiz a quo, por considerarem, não só, ter sido feita uma errada apreciação da matéria de facto, como que o entendimento na mesma perfilhado, não se encontra correcto à luz dos critérios legais aplicáveis ao caso em apreço.
C. Com efeito, atendendo não só à prova testemunhal apresentada, como aos documentos juntos aos autos, as ora Apelantes não podem concordar com o entendimento do Tribunal a quo ao considerar não provados os factos constantes dos Pontos i, ii, iii, v, vi, vii, viii, ix e x, da fundamentação de facto, devendo os supra referidos factos ter sido considerados provados, pelas razões que adiante se indicam:

- Pontos i e ii
D. Relativamente à testemunha J..., e com o devido respeito por opinião contrária, entendem as ora Apelantes que o seu depoimento não é merecedor da relevância que lhe foi dada pelo Douto Tribunal a quo.
E. Com efeito, esta testemunha, quando contra-inquirida, admitiu não conhecer a formulação em causa ou os excipientes do produto, razão pela qual não pode garantir se a aparência similar verificada entre os produtos era absolutamente necessária.
F. Contrariamente ao entendimento do Douto Tribunal a quo, o depoimento da testemunha Paula Jesus foi peremptória ao afirmar que “Num adesivo transdérmico, o que é importante é a substância química activa que está no adesivo.”, não existindo qualquer alteração da eficácia clinica ou da segurança se o adesivo não for redondo e não tiver protecção quadrada ou “pontinhos”.
G. No que respeita à forma circular da camada de adesivo, veja-se que, o próprio Tribunal a quo considerou indiciariamente provado que “A aderência dos adesivos sobre a pele pode ser alcançada por formas quadradas ou rectangulares que disponham de bordas arredondadas, ou por formas ovais.” (Ponto 15 dos factos indiciariamente provados)
H. No que respeita à forma quadrada da camada posterior dos adesivos, do depoimento de J..., retira-se que, desde que os cortes fossem a direito, o efeito pretendido (com vantagens meramente económicas e não técnicas) seria o mesmo.
I. Tal argumento também terá de ser desconsiderado atendendo ao facto de existirem no mercado muitíssimos adesivos, com diferentes formas da camada posterior, que cumprem igualmente a sua função, como assinala o depoimento da testemunha P...

- Pontos iii, v e vi:
J. Indica o Tribunal que, para considerar indiciariamente não provados os referidos pontos baseou-se no depoimento da testemunha J..., bem como no documento junto pela Apelada a fls. 1065 a 1076.
K. No que respeita à testemunha J..., desde já se remete para o indicado supra, quanto ao desconhecimento que a mesma revelou sobre o caso concreto.
L. Quanto ao documento junto pela Apelada a fls. 1065 a 1076, trata-se de uma “Declaração de Yongyoun Hwang”, que se identifica como responsável pela equipa de investigação de Novos Fármacos na S..., que mais não é do que a empresa fabricante e distribuidora dos adesivos comercializados pela Apelada, bem como a Requerente dos pedidos de declaração de nulidade apresentados contra as marcas comunitárias da titularidade da Apelante N... AG.
M. Deste modo, deverá ser tido em consideração o facto de a S... ter interesse directo no resultado do presente processo, pelo que deverá ser desconsiderada totalmente, a informação constante da referida declaração.
N. Ao invés, maior relevância deveria ter sido dada aos diversos elementos constantes do processo e ao depoimento da testemunha P..., indicado supra, que permitem concluir pela existência de diversos adesivos no mercado, incluindo adesivos de rivastigmina, que não dispõem de pontos “arredondados”, ou mesmo de quaisquer pontos, cumprindo, igualmente, a sua função.

- Pontos vii e viii:
O. As características particulares do produto das Apelantes, aliado ao facto de durante 5 anos ter sido o único adesivo no mercado para o tratamento da doença de Alzheimer, conforme resultou provado pelo Tribunal a quo, fez que com que a sua aparência seja apreendida pelo público-alvo.
P. A testemunha R... chamou-lhe, inclusivamente, um dos dois produtos topo existentes no mercado para a doença de Alzheimer.
Q. A testemunha M..., indicou tratar-se de um produto muito prestigiado, tendo sido o único produto (adesivo) contendo rivastigmina no mercado durante muito tempo. Sendo proveniente de um laboratório muito conceituado, que o público em geral reconhece como um laboratório de qualidade.
R. Veja-se que, na análise destes pontos o Tribunal a quo deveria ter tido em consideração o específico mercado dos produtos para o tratamento da doença de Alzheimer, bem como o facto de o surgimento deste produto (EXELON®) no mercado ter sido tão revolucionário comparado com outros tipos de administração da rivastigmina existentes, tendo-se mantido durante 5 anos como o único disponível.
S. Todos estes factos aliados contribuíram para que a especifica aparência deste produto se tenha tornado conhecida, e até familiar, pelo público relevante.
T. Os adesivos EXELON® das Apelantes são assim conhecidos não só pela sua marca nominativa, mas também, pela sua especial aparência e características particulares.
U. Uma vez que os elementos característicos da marca da Apelante estão reproduzidas, com exactidão, nos adesivos da Apelada, que reproduzem ainda – com uma precisão milimétrica – as dimensões dos adesivos originais fabricados pelas Apelantes, o público-alvo é levado a considerar que aquele se trata de um produto das Apelantes ou de uma empresa com uma relação autorizada ou afiliação com as Apelantes.
V. Tanto a testemunha M... como a testemunha R..., não tiveram dúvida em afirmar que dado o perfil dos doentes e do cuidador em apreço, as características estéticas dos produtos são muito importantes, uma vez que os utentes se fidelizam a estas.
W. E não se diga que existe algum tipo de imposição legal ou regulatória de os genéricos possuírem a mesma aparência que o medicamento originário, uma vez que o mercado está repleto de genéricos com uma aparência completamente distinta do produto originário.

- Pontos ix e x:
X. Indica o tribunal que não foi feita prova da existência de prejuízo para as Apeladas, resultante da diluição que resulta fatalmente do uso da mesma marca por outra empresa e com a erosão do seu carácter distintivo.
Y. No entanto, a esse respeito, se dirá que o Regulamento n.º 207/2009 sobre a marca comunitária e a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia não exigem a apresentação de provas de um prejuízo real, admitindo igualmente o risco sério de um tal prejuízo, ao permitir a utilização das deduções lógicas.
Z. Ora, da prova produzida nos presentes autos e indicada supra, é possível, sem margem para qualquer dúvida, concluir pela existência de risco sério de prejuízo causado às Apelantes e o impacto negativo causado nos seus sinais protegidos pela actuação ilícita da Apelada.

AA. Por todo o exposto, os Pontos i, ii, iii, v, vi, vii, viii, ix e x da fundamentação de facto constante da Sentença de fls._, deveriam ter sido dados como provados, com as legais consequências.

- DO DIREITO:

- Das marcas da Apelante:
BB. Entendem as Apelantes ter resultado provado, à exaustão, que a aparência conjunta protegida pelas marcas da Apelante não é, de modo algum, necessária, no seu todo, para se conseguir um resultado técnico, nos termos definidos pelo art.7.º, n.º 1, e) ii do RMC.
CC. Com efeito, mesmo assumindo que determinadas características do desenho em causa têm uma determinada função, de modo algum se poderá concluir que o sinal em causa é exclusivamente composto pelas características necessárias a uma determinada solução técnica.
DD. O Tribunal indica, ainda, que as características das marcas da Apelante são comuns e habituais, no entanto, a Apelada não conseguiu demonstrar, não tendo resultado provado, a existência de um único adesivo existente no mercado aquando do aparecimento do seu produto, para o tratamento da doença tipo Alzheimer, que comungasse da combinação das características presentes nas marcas da Apelante.
EE. Quanto ao facto de o adesivo das Apelantes ser comercializado com o elemento nominativo EXELON® no mesmo, se diga que a presença de uma determinada marca nominativa no produto não invalida de o mesmo possa ter outras marcas (designadamente, figurativas), incluindo marcas que representem a aparência desse produto juntamente com a camada protectora (se assim fosse não existiriam marcas que representam a aparência de um produto).
FF. Não constituindo tal circunstância factor de redução da eficácia distintiva da marca figurativa em questão.
GG. Do exposto, resulta que as marcas da ora Primeira Apelante, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, dispõem de suficiente capacidade distintiva, estando totalmente aptas a desempenhar a sua função jurídica, que é permitir a identificação do produto e a sua diferenciação face aos produtos do mesmo género.

- Da semelhança entre os sinais em apreço:
HH. Veja-se que, a aparência dos adesivos da Apelante não é essencialmente caracterizada pela cor de pele da área circular, mas sim pelo facto de a área circular ao centro estar claramente separada e ser facilmente distinguível da camada posterior transparente e quadrada e dos pontos arredondados posicionados e dispostos à volta da área circular.

II. E é precisamente esta separação e distinção clara que caracteriza também os adesivos da Apelada.
JJ. No que respeita ao facto de os produtos da Apelada ostentarem os vocábulos “Rivastigmina 4,6 mg/24h” “Rivastigmina 4,6 mg/24h”, se diga que a semelhança entre os sinais em apreço não é atenuada pelas inscrições exibidas pelos adesivos da Apelada aqui em causa.
KK. Isto porque “Rivastigmina” é apenas a versão portuguesa da Denominação Comum Internacional (DCI) “Rivastigmina” do princípio activo, o que será óbvio para o público-alvo e “4,6 mg/24h” e “9,5 mg/24h” são indicações de dosagem aprovada que, mais uma vez, serão facilmente reconhecidas como tal pelo público-alvo.
LL. Estes elementos puramente descritivos impressos nos adesivos da Apelada não devem, pois, ser tidos em conta na avaliação da semelhança.

- Da existência de risco de confusão entre os sinais em confronto:
MM. Ora, nesta matéria, a jurisprudência e a doutrina têm sido unânimes em considerar que a questão da imitação deve ser apreciada pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca e não pelas dissemelhanças que poderiam oferecer os diversos pormenores considerados isolada e separadamente.
NN. Sempre, portanto, que no conjunto da marca se possa ver uma semelhança capaz de estabelecer confusão deve considerar-se a marca como imitada, sem estar a atender ao facto de ser ou não necessário o confronto das marcas para apreender as diferenças que as separam; deve-se olhar à semelhança do conjunto e não à natureza das dissemelhanças ou ao grau das diferenças que as separam.
OO. Ora, nos casos dos autos, existe indubitavelmente um elevado grau de confundibilidade, entre os produtos das Apelantes e da Apelada, que não se verifica em relação aos outros produtos existentes no mercado.
PP. Assim sendo, o facto de o adesivo das Apelantes não ter uma aparência de modo algum comum e habitual em relação aos demais produtos presentes no mercado (com excepção do da Apelada), dever-se-á concluir que a actuação da Apelada visa a confusão/imitação dos sinais protegidos por estas.
QQ. Nesta (confusão) se incluindo a associação, na medida em que, como supra se expôs, as semelhanças existentes levarão o público-alvo a considerar, erradamente, que se trata de um produto das Apelantes ou de uma empresa com uma relação autorizada ou afiliação com as Apelantes.

- Da concorrência desleal:
RR. Por todo o exposto, duvidas não devem, igualmente, existir quanto ao facto de o comportamento da Apelada também consubstanciar em relação às Apelantes manifesta concorrência desleal.
SS. Com efeito, não restam dúvidas de que a actividade da Apelada é idêntica à actividade desenvolvida pelas Apelantes.
TT. Acresce que a totalidade das características dos adesivos da Apelante para tratamento do Alzheimer, acima descritas, forma a base da individualidade concorrencial desses adesivos.
UU. O aspecto de conjunto visual dos adesivos das Apelantes é único, pois difere significativamente até dos produtos similares disponíveis no mercado como adesivos transdérmicos, tanto no mercado específico dos adesivos transdérmicos para o tratamento da doença de Alzheimer, quer no mercado farmacêutico considerado como um todo, como demonstrado acima.
VV. Verifica-se, assim, uma quase idêntica apropriação, por parte da Apelada, dos esforços de outrem, na medida em que todos os elementos do desenho que formam a individualidade concorrencial dos adesivos são idênticos.
WW. A fraude quanto à origem comercial seria, neste caso, perfeitamente evitável, uma vez que, como supra se demonstrou, existem aparências alternativas disponíveis aos fabricantes, que afastam a necessidade de copiar dos adesivos das Apeladas.
XX. Por tudo o que supra se expôs, a actuação deliberada da Apelada, deve ser considerada censurável e proibida, constituindo o produto da Apelada uma cópia grosseira e servil dos adesivos das Apelantes.
YY. A aparência do adesivo das Apelantes, sendo facilmente percepcionada e reconhecida, leva a que os consumidores aceitem mais facilmente o produto da Apelada.
ZZ. Tanto mais que, estando estes já habituados à existência dos adesivos EXELON® e PROMETAX®, verão o adesivo da Apelada, em virtude das diminutas diferenças existentes com os adesivos das Apelantes, como um terceiro adesivo N..., presente no mercado.

AAA. Ora, resulta claro, pelas razões já apontadas supra, que a conduta da Apelada denuncia que a mesma visa retirar vantagens patrimoniais e aproveitar-se de toda uma notoriedade e prestígio alcançados pelas Apelantes e pelos seus produtos.

BBB. Tendo ainda a Apelada, com tal actuação, a possibilidade de reduzir significativamente o tempo e os custos necessários à criação dos produtos em causa, o que lhe conferindo, indubitavelmente, uma vantagem ilegítima sobre os outros concorrentes.

CCC. Deste modo, existindo efectiva violação de um direito de marca, e demonstrada que está a sua titularidade, estão preenchidos os requisitos para o decretamento das providências adequadas a proibir a continuação da violação – cf. art.º 338.º-I, n.º 1, al. b) do C.P.I.

DDD. Em face de tudo quanto antecede, a sentença recorrida acabou por violar o disposto nos artigos 362.º, n.º 1, 363.º, n.ºs 1 e 2, 365.º, n.º 1, 78.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Civil e dos artigos 317.º e 338.º-I do Código da Propriedade Industrial, pelo que deve ser revogada.

EEE. Sendo substituída por decisão que defira a providência cautelar apresentada pelas ora Apelantes, e, em consequência, decrete as medidas requeridas, adequadas e necessárias à cessação do ilícito, nos termos daquelas disposições legais.».
Pugnam pela revogação da sentença, decidindo-se pelo deferimento e consequente decretamento das medidas requeridas.

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A Apelada contra-alegou, concluindo pela confirmação da decisão em crise.

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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem.

Foram juntos documentos tendentes a demonstrar que ocorreu decisão, proferida pela Divisão de Anulação do IHMI, de anulação do registo de uma das marcas em causa – a marca comunitária n.º 11293362 (figurativa) –, bem como que não se trata de decisão definitiva, por ter sido interposto recurso com efeito suspensivo.

Nessa sequência, veio a Apelada sugerir a suspensão do processo por iniciativa do Tribunal, ao abrigo do disposto nos art.ºs 269.º, n.º 1, al.ª c), primeira parte, e 272.º, n.º 3, ambos do NCPCiv..
A contraparte opôs-se à suspensão sugerida, entendendo não haver motivo legal para tanto, matéria de que se conhecerá em sede de acórdão.
Mantidos nesta Relação o regime e o efeito fixados ao recurso e colhidos que foram os vistos, cumpre então apreciar e decidir.

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II – Âmbito do Recurso:
Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (exceptuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil actualmente em vigor e aqui aplicável (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, constata-se que o thema decidendum, incidindo sobre a decisão da matéria de facto e de direito, consiste em saber:
1. - Se é caso de suspensão da instância cautelar;
2. - Se deve proceder a impugnação da decisão de facto;
3.- Se ocorreu errada aplicação do direito ao caso, impondo-se a pretendida procedência das medidas cautelares peticionadas.

***

III – Questão prévia.
        Da suspensão do processo por determinação do juiz
Como referido, foi colocada a questão da suspensão da instância, por sugestão – que não requerimento expresso – da Apelada, ao que logo se opôs a parte contrária, que pretende ver decidido o recurso sem delongas.

Junta, como dito, documentação tendente a demonstrar a existência de decisão, proferida pela Divisão de Anulação do IHMI, de anulação do registo de uma das marcas em causa – a marca comunitária n.º 11293362 (figurativa) –, bem como que foi interposto recurso com efeito suspensivo, a decisão definitiva da questão da nulidade desse registo pode ser ainda demorada, o mesmo podendo acontecer, sendo o caso, com a outra marca em causa, em relação à qual também foi apresentado pedido, pendente de apreciação no IHMI, de declaração de nulidade do registo de marca comunitária (cfr. pontos 52.- a 54.-, não impugnados, da decisão recorrida).

É certo que uma eventual decisão definitiva de nulidade do registo de uma ou de ambas as marcas em discussão traria, a ocorrer, inevitáveis repercussões sobre o desfecho desta causa, o que permitiria, de certo modo, configurar uma relação de alguma prejudicialidade.

E, na perspectiva da Apelada, seria pertinente o equacionar da suspensão da instância por decisão do juiz, ao abrigo das normas processuais invocadas por aquela.

Todavia, o preceito do art.º 272.º, n.º 2, do NCPCiv., veda a opção suspensiva se a causa dependente (a presente) estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.

Ora, os presentes autos já terminaram o seu curso em 1.ª instância, encontrando-se já na fase recursória, apenas carecendo de tramitação muito simples para decisão do recurso.

Por outro lado, trata-se de procedimento cautelar, não parecendo que a instância cautelar, marcada pela celeridade e urgência, deve esperar indefinidamente pela decisão de uma questão que se desconhece quando terá desfecho final e definitivo.

Tal morosidade previsível poderia inutilizar a pretensão cautelar, marcada, precisamente, como está, pela urgência.

Termos em que se não acolhe a sugestão de suspensão do procedimento cautelar na fase recursória.

IV – Fundamentação:

A) Matéria de facto:
Na 1.ª instância foi considerada a seguinte factualidade como sumariamente provada:
1.- A requerente N... AG é a empresa-mãe de um grupo empresarial internacional com sede em Basileia, Suíça, cuja actividade consiste no comércio e indústria de produtos farmacêuticos.
2.- A N... AG funciona directamente e através de várias filiais no mundo, entre as quais se inclui a segunda requerente.
3.- A segunda requerente, N... S.A., é responsável, nomeadamente, pela comercialização e distribuição dos produtos da primeira requerente e, mais concretamente, dos produtos em causa no presente processo.
4.- As requerentes integram o grupo de empresas N..., que vem desenvolvendo diversos medicamentos, sendo pioneiro na descoberta de tratamentos para a Doença de Alzheimer.
5.- No mercado português, encontra-se disponível uma gama de produtos para o tratamento da Doença de Alzheimer, entre os quais os medicamentos baseados na substância activa Rivastigmina, comercializados pelo Grupo N..., sob a marca EXELON® e também vendidos sob a marca PROMETAX®.
6.- Encontram-se também disponíveis, desde 1 de Setembro de 2012, medicamentos genéricos compostos pela substância activa Rivastigmina.
7.- Grande parte dos medicamentos para tratamento da Doença de Alzheimer são administrados na forma de comprimidos ou cápsulas.
8.- Os adesivos transdérmicos contendo Rivastigmina foram disponibilizados pela primeira vez, em Abril de 2008, e até recentemente era o Grupo N... que oferecia em Portugal fármacos para tratamento do Alzheimer na forma de adesivos transdérmicos em diferentes dosagens – os adesivos das requerentes EXELON® e PROMETAX®, contendo Rivastigmina.
9.- Uma filial do Grupo N... – a N... LTD. – é titular das Autorizações de Introdução no Mercado relativas aos produtos farmacêuticos comercializados sob as referidas marcas EXELON® e PROMETAX®, sendo, no entanto, o produto PROMETAX® vendido pela empresa BIAL, com a autorização do Grupo N...
10.- Estima-se que em Portugal existam 90.000 doentes diagnosticados com a doença de Alzheimer, parte dos quais tratados (cerca de 14.000 a 15.000 doentes) com os adesivos das requerentes.
11.- Em Novembro de 2013, a quota de mercado das requerentes, em Portugal, quanto a preparações farmacêuticas para o tratamento da doença de Alzheimer, era de cerca de 30%.
12.- Como todos os outros fármacos para tratamento da doença de Alzheimer, os adesivos das requerentes são geralmente receitados por neurologistas e psiquiatras.
13.- Os adesivos transdérmicos das requerentes são conhecidos por neurologistas e outros médicos pela designação “EXELON”, correspondente à sua marca, sendo vistos como produtos inovadores e de alta qualidade.
14.- Apresentam a configuração explicitada no ponto 14.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1240 (cujo teor aqui se dá por reproduzido).
E dispõem das seguintes características:
- Todos os adesivos estão ligados a um revestimento amovível quadrado (camada posterior);
- O revestimento amovível (camada posterior) tem uma área vertical sobreposta no centro;
- O adesivo propriamente dito está posicionado numa área circular no centro do revestimento amovível;
- A distância entre o adesivo circular e o revestimento amovível quadrado é de 0,5 cm nos quatro pontos mais próximos em ambos os tamanhos de adesivo;
- Esta área circular está, por sua vez, rodeada por “pontos” dispostos a espaços regulares e também posicionados em círculo;
- Estes “pontos” são arredondados e estão dispostos nos adesivos da requerente em número variado, dependendo da dimensão do adesivo;
- Existe uma área vertical claramente visível ao centro.
- O adesivo mais pequeno (dose aprovada de 4,6 mg/24h) tem um revestimento amovível quadrado (camada posterior) que mede 3,5 cm x 3,5cm e uma camada redonda de adesivo com um diâmetro de 2,5 cm.
- O adesivo maior (com uma dose aprovada de 9,5 mg/24h) tem uma camada posterior que mede 4,5 cm x 4,5 cm, enquanto o adesivo em si mesmo tem 3,5 cm de diâmetro.
15.- A aderência dos adesivos sobre a pele pode ser alcançada por formas quadradas ou rectangulares que disponham de bordas arredondadas, ou por formas ovais.
16.- Existem fabricantes de adesivos com Rivastigmina que não usam uma área de adesivo circular, como sucede com o produtor de genéricos Actavis, cujo produto está aprovado na União Europeia, cujo “Resumo das Características do Medicamento”, que faz parte da Autorização de Introdução no Mercado para os adesivos em causa, descreve “Adesivos rectangulares, com aproximadamente com aproximadamente 2,5 cm a 1,8 cm e cantos redondos. Cada adesivo consiste na combinação de um revestimento amovível fendido com uma camada funcional contendo uma matriz de adesivo farmacológico (DIA) e uma camada posterior protectora. A camada posterior é transparente a translúcida e tem impressa a sigla “R5” num padrão repetido”.
17.- Existem vários adesivos transdérmicos disponíveis no mercado nacional, relativos a outros medicamentos, com características visuais diferentes dos adesivos EXELON das requerentes, como sejam os que apresentam as seguintes configurações (as explicitadas no ponto 17.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1242-1244, cujo teor aqui se dá por reproduzido):
NITRO-DUR – S...
NITRODERM TTS – N...
ESTALIS SEQUI – N...
ESTALIS – N...
CLIMARA – B...
NITRADISC – P...
PLASTRANIT – U...
EVRA – J...
18.- Os separadores na camada posterior de um adesivo, desenhados como pontos, servem para reforçar a estabilidade do adesivo quando armazenado, reduzindo o chamado “fluxo a frio”.
19.- O termo “fluxo a frio” descreve o fenómeno através do qual as substâncias sólidas começam a fluir na ausência de aquecimento, e.g., devido a pressão.
20.- Os separadores desenhados como pontos nestes adesivos têm como função principal fornecer ao adesivo em si mesmo protecção contra a pressão e, assim, reduzir o fluxo a frio da cola para a bolsa, bem como do medicamento contido no próprio adesivo. Se, ainda assim, o fluxo a frio ocorrer, os separadores servem geralmente para evitar que o adesivo se cole à bolsa.
21.- A Patente Europeia 0405393, já expirada, contém outras configurações de separadores, indicadas nas seguintes figuras (as explicitadas no ponto 21.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1244-1245, cujo teor se dá por reproduzido).
22.- A equipa de vendas da segunda requerente tem feito, junto de médicos, demonstrações do uso do seu adesivo, nas quais o exibe aberto.
23.- A primeira requerente é titular do registo da marca comunitária n.º 011293362 (figurativa), pedido em 25-10-2012 e concedido em 22-03-2013, para assinalar “preparações farmacêuticas para o tratamento da demência tipo Alzheimer”, na classe 5 da Classificação Internacional de Nice, com a indicação no registo das cores cinzenta e bege e com a seguinte configuração (a explicitada no ponto 23.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1245, cujo teor se dá por reproduzido).
24.- A primeira requerente é ainda titular do registo da marca comunitária n.º 011293404 (figurativa), pedido em 25-10-2012 e concedido em 22-03-2013, para assinalar “preparações farmacêuticas para o tratamento da demência tipo Alzheimer”, na classe 5 da Classificação Internacional de Nice, com a indicação no registo das cores cinzenta e bege e com a seguinte configuração (a explicitada no ponto 24.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1245, cujo teor se dá por reproduzido).
25.- A requerida é uma sociedade comercial que tem por objecto “a importação e exportação, marketing, venda, distribuição, troca e produção, directa ou indirecta, de produtos e artigos farmacêuticos (incluindo ingredientes farmacêuticos activos) e a aquisição e exploração de patentes, marcas e outros direitos de propriedade intelectual e industrial; actividade de agência e representação de todo o tipo de sociedades do sector farmacêutico dentro e fora de Portugal”.
26.- A requerida integra o Grupo T..., um dos maiores grupos farmacêuticos a nível mundial, nomeadamente de medicamentos genéricos, liderado pela sociedade T... Limited, com sede em Israel.
27.- Os produtos da requerida, sob o nome RIVASTIGMINA TEVA - SISTEMA TRANSDÉRMICO, foram objecto de Autorização de Introdução no Mercado (AIM) aprovada pelo INFARMED, I.P., em 24-04-2013.
28.- Os referidos pensos transdérmicos RIVASTIGMINA TEVA são fabricados pela SK Chemicals, uma empresa sul-coreana, sendo a T... que os envolve nos invólucros de protecção (saquetas) ostentando a sua marca que, por seu turno, são embalados em caixas de cartão, também elas ostentando a sua marca.
29.- Tais produtos estão a ser comercializados pela requerida em Portugal, desde 1 de Novembro de 2013, nas mesmas dosagens e unidades dos adesivos EXELON® das requerentes, ou seja, 4,6 mg/24h – 7 unidades, 4,6 mg/24h – 30 unidades e 9,5 mg/24h – 30 unidades, e apresentam a seguinte configuração (a explicitada no ponto 29.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1246, cujo teor se dá por reproduzido).
30.- O adesivo mais pequeno (dose aprovada de 4,6 mg/24h) tem um revestimento amovível quadrado (camada posterior) que mede 3,5 cm x 3,5cm e uma camada redonda de adesivo com um diâmetro de 2,5 cm.
31.- O adesivo maior (dose aprovada de 9,5 mg/24h) tem uma camada posterior que mede 4,5 cm x 4,5 cm, enquanto o adesivo em si mesmo tem 3,5 cm de diâmetro.
32.- A distância entre o adesivo circular e as extremidades no revestimento amovível quadrado (camada posterior) é de 0,5cm nos quatro pontos mais estreitos.
33.- Os adesivos da requerida possuem uma zona de sobreposição visível no revestimento amovível (camada posterior), situada ao centro, na vertical.
34.- Os pontos arredondados estão dispostos no revestimento amovível (camada posterior) à volta da área do adesivo, colocados em intervalos regulares entre si e em relação à camada de adesivo e ordenados em círculo, sendo que o adesivo mais pequeno da requerida (dose aprovada de 4,6 mg/24h) tem 20 pontos arredondados, enquanto o adesivo EXELON® das requerentes (dose aprovada de 4,6 mg/24h) tem 15 pontos arredondados, e o adesivo maior da requerida (dose aprovada de 9,5 mg/24h) tem 26 pontos arredondados, enquanto o adesivo EXELON® das requerentes (dose aprovada de 9,5 mg/24h) tem 20 pontos arredondados.
35.- A camada posterior do adesivo da requerida é transparente e a verdadeira camada de adesivo (área circular) é feita de um material translúcido.
36.- As camadas de adesivo da requerente, ao centro, tem a cor bege ou “cor de pele” e as camadas de adesivo da requerida, ao centro, são de cor branca acinzentada translúcida.
37.- Os adesivos têm a seguinte aparência, quando colocados sobre a mão (a explicitada no ponto 37.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1247, cujo teor se dá por reproduzido).
38.- No Resumo das Características do Medicamento (RCM), relativo aos adesivos transdérmicos da requerida, lê-se que estes são usados para “tratamento sintomático da demência de Alzheimer leve a moderadamente grave”.
39.- De acordo com o referido RCM, o medicamento da requerida “é um sistema transdérmico de forma circular numa matriz de três camadas, composto por uma película de suporte, uma matriz farmacológica (acrílica) que contém a substância ativa, uma matriz adesiva (de silicone) e adicionalmente uma película amovível rectangular.
A parte exterior da camada de suporte é translúcida, branca e impressa a preto como se indica a seguir:
- Rivastigmina Teva 4,6 mg/24 h sistema transdérmico:
«Rivastigmine, 4,6 mg/24 h»
- Rivastigmina Teva 9,5 mg/24 h sistema transdérmico:
«Rivastigmine, 9,5 mg/24 h»”.
40.- As requerentes não autorizaram a requerida a usar as marcas referidas em 23 e 24 nem a utilizar quaisquer adesivos com a configuração dos seus adesivos transdérmicos com a marca EXELON®.
41.- O penso transdérmico consiste num adesivo impregnado com um fármaco, que é absorvido lentamente através da pele e constitui uma forma farmacêutica, ou seja, o estado final que as substâncias activas apresentam depois de serem submetidas às operações farmacêuticas necessárias, a fim de facilitar a sua administração e obter o maior efeito terapêutico desejado.
42.- A opção pelos pensos transdérmicos em detrimento de formas farmacêuticas mais convencionais, como os comprimidos, visa reduzir a ocorrência de efeitos secundários gastrointestinais e que a substância activa seja libertada de forma constante, actuando de forma mais prolongada.
43.- A estrutura de 3 camadas de um penso transdérmico (composta por uma película de protecção, o penso aposto de forma centralizada e uma película removível dividida em duas partes sobrepostas) garante a preservação da preparação farmacêutica impregnada no núcleo do penso e permite a sua aplicação sem que haja contacto com a preparação farmacêutica.
44.- As formas arredondadas dos pensos garantem grande índice de eficácia terapêutica, na medida em que têm um maior grau de adaptabilidade à superfície cutânea e bem assim à movimentação do corpo humano.
45.- As formas angulares têm mais pontos de descolamento do que as formas arredondadas, o que pode afectar a libertação homogénea da substância activa na superfície cutânea a toda a extensão do penso.
46.- A película de protecção ou revestimento amovível (camada posterior) tem como função facilitar a aplicação do penso à pele e evitar o contacto com a parte adesiva do penso, na qual se encontra a substância activa, evitando ainda essa película que partículas voláteis entrem em contacto com o penso no período compreendido entre o fabrico do penso e a aplicação no doente.
47.- A forma quadrada dessa película ou revestimento permite evitar a perda de material aquando do seu fabrico, relacionada com cortes que não sejam a direito.
48.- A barra vertical formada com as duas partes da película ou revestimento removível sobrepostas permite a aplicação do penso directamente no doente sem contacto com as mãos e sem transferência da preparação farmacêutica para o sistema transdérmico da pessoa que aplica o penso no doente, constituindo numa solução utilizada nos pensos, em geral, como sucede com os que a seguir se reproduzem (os explicitados no ponto 48.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1249, cujo teor se dá por reproduzido).
49.- O penso transdérmico com um núcleo redondo, contornado por pontos e aposto numa película quadrada consta da Patente EUA 6440454B1, registada em 27 de Agosto de 2002, não sendo a aparência de tal penso, com a seguinte configuração, reivindicada no âmbito da patente (como explicitado no ponto 49.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1250, cujo teor se dá por reproduzido).
50.- Na página 198 do Resumo das Características do Medicamento (RCM) EXELON® lê-se: «Cada adesivo transdérmico é um fino adesivo transdérmico tipo-matriz contendo três camadas. A parte exterior da camada de revestimento é bege e rotulada com “Exelon”, “4.6 mg/24 h” e “AMCX”».
51.- Lê-se ainda na mesma página do referido RCM:
«Qual o aspeto de Exelon e conteúdo da embalagem
Cada adesivo transdérmico é um fino adesivo transdérmico contendo três camadas. A camada exterior é bege e rotulada com uma das seguintes inscrições:
- “Exelon”, “4.6 mg/24 h” e “AMCX”,
- “Exelon”, “9.5 mg/24 h” e “BHDI”,
- “Exelon”, “13.3 mg/24 h” e “CNFU”.
Cada adesivo transdérmico é selado numa saqueta.
Exelon 4,6 mg/24 h adesivos transdérmicos e Exelon 9,5 mg/24 h adesivos transdérmicos estão disponíveis em embalagens contendo 7, 30 ou 42 saquetas e em embalagens múltiplas contendo 60, 84 ou 90 saquetas.
Exelon 13,3 mg/24 h adesivos transdérmicos estão disponíveis em embalagens contendo 7 ou 30 saquetas e em embalagens múltiplas contendo 60 ou 90 saquetas.»
52.- Foram apresentados no Instituto de Harmonização no Mercado Interno (IHMI) dois pedidos de declaração de nulidade do registo da marca comunitária n.º 011293362, um deduzido pela sociedade alemã neuraxpharm Arzneimittel GmbH e o outro deduzido pela sociedade coreana SK Chemicals.
53.- Em relação ao registo da marca comunitária n.º 011293404, encontra-se pendente de apreciação no IHMI um pedido de declaração de nulidade deduzido pela SK Chemicals.
54.- Os pedidos de declaração de nulidade do registo deduzidos pela S..., referidos em 52 e 53, foram apresentados ao abrigo do disposto no artigo 52.º, n.º 1, alínea a), com fundamento na violação do disposto nos artigos 7.º, n.º 1, alíneas a), b) e e), todos do RMC.
55.- Os pensos transdérmicos são disponibilizados em saquetas individuais ostentando a marca ou designação comercial, as quais se encontram acomodadas dentro de uma embalagem de cartão que também ostenta a marca ou designação do medicamento, com a seguinte configuração (a explicitada no ponto 55.- da factualidade considerada provada da sentença recorrida, a fls. 1251, cujo teor se dá por reproduzido):
a) Saquetas (pensos transdérmicos das requerentes)
b) Embalagens exteriores de cartão (pensos transdérmicos das requerentes) – vista parcial
c) Saquetas (pensos transdérmicos da requerida)
d) Embalagens exteriores de cartão (pensos transdérmicos da requerida) – vista parcial
56.- As saquetas protectoras dos pensos transdérmicos da N... apresentam as seguintes características:
- cor alfazema (na dosagem de 9,5 mg/24 h) ou salmão claro (na dosagem de 4,6 mg/24h);
- aposição da marca EXELON®, acompanhada da informação sobre a dosagem, a forma farmacêutica e a substância inscritas na cor roxa;
- aposição da marca de fabrico N... sobre a marca EXELON®;
- texto justificado à esquerda, com sinalização de corte à direita;
- código de barras colocado na barra esquerda da saqueta.
57.- As saquetas protectoras dos pensos transdérmicos da TEVA apresentam as seguintes características:
- cor branca respectivamente nas dosagens 9,5 mg/24h e 4,6 mg/24 h;
- aposição dos elementos verbais Rivastigmina Teva, dosagens, forma farmacêutica e substância na cor preta;
- aposição da marca de fabrico TEVA justificada à direita em linha com a inscrição “1 sistema transdérmico por saqueta”;
- texto justificado à esquerda, com sinalização de corte à direita.
58.- As embalagens de cartão de armazenamento das saquetas individuais de pensos transdérmicos da N... apresentam as seguintes características:
- cor alfazema (na dosagem de 9,5 mg/24 h) ou salmão claro (na dosagem de 4,6 mg/24 h);
- aposição da marca EXELON®, acompanhada da informação sobre a dosagem, a forma farmacêutica e a substância inscritas na cor roxa;
- aposição da marca de fabrico N... no canto superior direito;
- sistema de abertura na vertical de tipo envelope;
- forma paralelepipédica, que assenta sobre o lado mais comprido (orientação horizontal).
59.- As embalagens de cartão de armazenamento das saquetas individuais de pensos transdérmicos da TEVA apresentam as seguintes características:
- lateral frontal de cor branca, combinando elementos circulares amarelo torrado como moldura do número de unidades e da dosagem que surge destacada por estar aposta contra uma circunferência de tamanho mais reduzido roxo escuro ou cinzento prata, respectivamente nas dosagens 9,5 mg/24h e 4,6 mg/24 h;
- restantes laterais da caixa na cor amarelo torrado;
- aposição dos elementos verbais Rivastigmina Teva, dosagens, forma farmacêutica e substância na cor roxa escura;
- aposição da marca de fabrico TEVA no canto inferior direito;
- sistema de abertura de envelope com ponteado para destaque a meio da embalagem e sistema de abertura convencional;
- forma paralelepipédica, que assenta no lado mais curto (orientação vertical).
60.- No momento da compra dos produtos na farmácia, quem os adquire toma contacto com as embalagens de cartão de armazenamento das saquetas individuais de pensos transdérmicos, referidas em 58 e 59.

*

Factos julgados indiciariamente não provados:

Foi considerado sumariamente não provado:
i.- A forma circular da camada de adesivo em si mesma não qualquer base ou efeito dos pontos de vista médico ou técnico. Em especial, a forma redonda da área central não confere qualquer qualidade adicional em termos de uso de propriedades de adesão em comparação com outras formas vulgarmente disponíveis no mercado (artigo 41.º do requerimento inicial).
ii.- A forma quadrada da camada posterior dos adesivos das requerentes é apenas ditada pela aparência do produto arbitrariamente escolhida por aquelas (artigo 45.º do requerimento inicial).
iii.- A presença, forma, disposição, número e localização dos pontos arredondados que rodeiam o adesivo propriamente dito também não se devem a quaisquer requisitos técnicos (artigo 47.º do requerimento inicial).
iv.- Os “pontos” arredondados não formam uma barreira mecânica capaz de evitar que os princípios activos dos adesivos vazem para a bolsa, sendo meros separadores (artigo 51.º do requerimento inicial).
v.- O resultado referido em 20 dos factos indiciariamente provados pode ser alcançado através de várias outras configurações, como sejam as indicadas nas figuras constantes da Patente Europeia 0405393 (artigo 58.º do requerimento inicial).
vi.- Existem outros adesivos no mercado que não usam de todo separadores, pelo menos separadores visíveis nos próprios adesivos, os quais funcionam bem sem quaisquer separadores (pelo menos visíveis) (artigo 59.º do requerimento inicial).
vii.- A configuração do adesivo das requerentes, que resulta da combinação peculiar da camada posterior quadrada com a área circular ao centro, rodeada pelos pontos dispostos em círculo à volta do adesivo circular, com uma aparência e disposição específicas, a área de sobreposição e as proporções dos elementos individuais sobrepostos, é imediatamente identificada pelo público-alvo, mais especificamente médicos e outros profissionais da medicina, assim como cuidadores, familiares e doentes, como se tratando de um produto das mesmas (artigos 63.º, 74.º e 75.º do requerimento inicial).
viii.- O público relevante poderá supor que o adesivo da requerida é mais uma versão do adesivo fabricado pela requerente, noutra dosagem, ou a versão genérica fabricada por uma filial da requerente (artigo 101.º do requerimento inicial).
ix.- Esta situação tem causado graves prejuízos às requerentes que, com a actuação da requerida, estão a ser confrontadas com a diluição que resulta fatalmente do uso da mesma marca por outra empresa, e com a erosão do carácter distintivo das suas marcas comunitárias registadas (artigo 104.º do requerimento inicial).
x.- Além disso, a requerida, ao comercializar um produto com a apresentação em causa, consegue assegurar-se, sem grande esforço, de que o produto é bem recebido pelos consumidores, que estão familiarizados com as marcas e os produtos das requerentes (artigo 105.º do requerimento inicial).
xi.- Artigos 72.º a 74.º da oposição.
xii.- As requerentes nunca pretenderam usar a marca comunitária n.º 011293362 (artigo 82.º da oposição.

***

B) Substância do recurso:

1. - Do erro de julgamento quanto à decisão de facto
1.1. - A questão que agora se coloca é a de saber se o Tribunal a quo avaliou erroneamente as provas produzidas, devendo, por isso, a matéria de facto fixada pela 1.ª instância ser alterada por esta Relação (nos termos do disposto nos art.ºs 639.º, n.º 1, 640.º e 662.º, nº 1, todos do NCPCiv.), no segmento em que considerou não provados os factos dos pontos i, ii, iii, v, vi, vii, viii, ix e x da fundamentação de facto constante da sentença, que as Apelantes pretendem sejam agora julgados como provados.

Vejamos, então.

1.2. - Quanto aos pontos i e ii :
Nesta parte foi dado como não provado (sumariamente):
i.- A forma circular da camada de adesivo em si mesma não qualquer base ou efeito dos pontos de vista médico ou técnico. Em especial, a forma redonda da área central não confere qualquer qualidade adicional em termos de uso de propriedades de adesão em comparação com outras formas vulgarmente disponíveis no mercado (artigo 41.º do requerimento inicial);
ii.- A forma quadrada da camada posterior dos adesivos das requerentes é apenas ditada pela aparência do produto arbitrariamente escolhida por aquelas (artigo 45.º do requerimento inicial).

O Tribunal a quo fundamentou, nesta parte, a sua convicção do seguinte modo:
“Quanto aos factos indiciariamente não provados, não foi feita prova suficiente da sua demonstração ou resultou apurada factualidade contrária.

Assim, em concreto:
Factos i. e ii. - O depoimento da testemunha J..., que conduziu à demonstração dos factos 44, 45 e 47, foi de molde a afastar a prova indiciária da matéria ora em apreço”.
Entendem, em contrário, as Apelantes que o depoimento daquela testemunha não é credível, já que, teria admitido, em contra-instância, não ter tido oportunidade de analisar o produto em concreto ou de conhecer estudos ou pareceres sobre o tema.

Será assim?

Cabe, desde logo, lembrar que nos pontos 44.- e 45.- dos factos apurados da sentença – ali dados, pois, como sumariamente provados, sem controvérsia, já que não se trata de matéria impugnada no recurso – ficou assente que as formas arredondadas dos pensos garantem grande índice de eficácia terapêutica, na medida em que têm um maior grau de adaptabilidade à superfície cutânea e bem assim à movimentação do corpo humano (44.-), bem como que as formas angulares têm mais pontos de descolamento do que as formas arredondadas, o que pode afectar a libertação homogénea da substância activa na superfície cutânea a toda a extensão do penso (45.-).
E ficou também assente – igualmente incontroverso, por não impugnado no recurso – que a forma quadrada dessa película ou revestimento permite evitar a perda de material aquando do seu fabrico, relacionada com cortes que não sejam a direito (47.-).
Quer dizer, ocorre, salvo o devido respeito, notória incompatibilidade entre a realidade dos factos dados como assentes/apurados naqueles pontos 44.-, 45.- e 47.-, por um lado, e os factos dos pontos ora impugnados, os pontos i e ii da factualidade dada como não provada.
Se aqueles (45.-, 46.- e 47.-) foram dados como sumariamente apurados, não o poderiam ser também, sob pena de contradição, os pontos/factos i e ii, por de pendor factual contrário.
Ora, aceitando as Apelantes tais factos dos pontos 45.-, 46.- e 47.- (não os impugnando), não podem pretender que se dê como apurado também o factualismo contrário, com o que, naturalmente, o Tribunal a quo incorreria em contradição que não seria aceitável.
Donde que, se aceitaram as Apelantes a factualidade daqueles pontos 45.-, 46.- e 47.-. – aliás, com base no depoimento da testemunha J... e nos conhecimentos pelo mesmo apresentados, como dito na respectiva fundamentação da convicção do Julgador –, não possam pretender agora que o Tribunal entre em contradição em sede de decisão de facto, dando também como apurada factualidade de nítido pendor contrário.

Justifica-se, por isso, o ponto de vista da 1.ª instância, ao apresentar o depoimento daquela testemunha J... como idóneo a conduzir, como conduziu, à demonstração dos factos 44.-, 45.- e 47.-, e a afastar, natural e logicamente, a prova indiciária da matéria ora em apreço, de si sedeada em campo factual contraditório com aqueloutra.
Com o que, sem necessidade de mais demoradas considerações, logo tem de improceder esta parte da impugnação.

1.3. - Quanto aos pontos iii, v e vi :

Nesta parte foi dado como sumariamente não provado:
iii.- A presença, forma, disposição, número e localização dos pontos arredondados que rodeiam o adesivo propriamente dito também não se devem a quaisquer requisitos técnicos (artigo 47.º do requerimento inicial).
v.- O resultado referido em 20 dos factos indiciariamente provados pode ser alcançado através de várias outras configurações, como sejam as indicadas nas figuras constantes da Patente Europeia 0405393 (artigo 58.º do requerimento inicial).
vi.- Existem outros adesivos no mercado que não usam de todo separadores, pelo menos separadores visíveis nos próprios adesivos, os quais funcionam bem sem quaisquer separadores (pelo menos visíveis) (artigo 59.º do requerimento inicial).
O Tribunal a quo fundamentou, nesta parte, a sua convicção, quanto ao ponto iii., com o “depoimento da testemunha J..., conjugado com o documento junto pela requerida a fls. 1065 a 1076 (relatório de estudo: desenvolvimento do relevo optimizado para pensos de Rivastigmina)”, que “foram de molde a afastar, nesta sede indiciária, a prova da matéria ora em apreço”.
Quanto ao ponto v., explicitou o Julgador em 1.ª instância que “as requerentes não fizeram prova testemunha[l], documental ou outra que lograsse demonstrar, ainda que indiciariamente, este facto, a ela não se substituindo a reprodução, no requerimento inicial, do teor das figuras que constam da patente em questão”.
E, quanto ao ponto vi., foi dito que: “Por um lado, a ausência de prova testemunha[l], documental ou outra que, em complemento com a observação directa da configuração dos objectos J a P, juntos a fls.1093 a 1096, lograsse demonstrar, ainda que indiciariamente, este facto e, por outro, o depoimento da testemunha J..., conjugado com o documento junto pela requerida a fls.1065 a 1076 (relatório de estudo: desenvolvimento do relevo optimizado para pensos de Rivastigmina), levou a que, nesta sede indiciária, se considerasse não provada a matéria ora em apreço”.

Contra-argumentam as Recorrentes, desde logo, com a falta de relevância/credibilidade do depoimento da testemunha aludida, J..., o que reiteram, mas o que, pelas mesmas razões já antes citadas, não pode proceder.

Com efeito, repete-se, se as Apelantes aceitaram que o julgamento fáctico da 1.ª instância tivesse – como teve – o depoimento da testemunha J..., por conhecedora, como idóneo/credível a conduzir, como conduziu, à demonstração dos factos 44.-, 45.- e 47.-, e a afastar, natural e logicamente, a prova indiciária da matéria de pendor contraditório, não pode depois vir invocar o desconhecimento da materialidade fáctica por tal testemunha.

Invocam depois as Apelantes que o documento de fls. 1065-1076 – dito (relatório de estudo: desenvolvimento do relevo optimizado para pensos de Rivastigmina)” – não passa de uma declaração de entidade ligada à empresa fabricante e distribuidora dos adesivos comercializados pela apelada, bem como requerente em pedidos de declaração de nulidade contra as ora Recorrentes.

Por isso, concluem as Apelantes que, ante o interesse directo no resultado deste processo por parte da “S...”, o documento em causa (“Declaração de Youngyoun Hwang”, que se identifica como responsável da equipa de investigação de Novos Fármacos da “S...”), deve ser totalmente desconsiderado em termos probatórios.
Assim não fez o Tribunal a quo e pensamos que bem.

O documento em causa constitui elemento probatório não substituído da livre convicção do Tribunal, por adquirido validamente para os autos.

O respectivo autor/subscritor não é parte no processo, nem se demonstra que seja representante de alguma das partes, apenas se invocando ser responsável da equipa de investigação de novos fármacos da “S...” e não representante legal da mesma, que, por sua vez, se não confunde com qualquer das partes.

Assim, a invocada qualidade de colaborador do autor do documento, não é de per si circunstância justificativa para o afastamento probatório do documento, que devia ser, como foi, objecto de livre apreciação do Tribunal, com o dever deste – que seguramente observou – de ter em conta as relações daquele autor do documento com alguma das partes ou com sociedade(s) ligada(s) a alguma delas.

É consabido que não é a simples ligação a uma das partes, desde que se não seja representante dela, que afecta, de per si, o valor da prova que seja produzida (testemunhal ou documental).
Quanto ao valor intrínseco do documento, embora as Apelantes ponham também em causa, mormente quanto a certas afirmações/conclusões/pressupostos ali enunciados, a sua exactidão, certo é que ao mesmo assiste a admissibilidade e força probatória que lhe foi conferida, decorrente dos conhecimentos do autor do documento, da análise pelo mesmo encetada e da demais assertividade do seu conteúdo, pelo que bem andou, salvo o devido respeito, a 1.ª instância em, conjugadamente com a demais prova já enunciada, lhe conferir credibilidade para formação da convicção.

1.4. - Quanto aos pontos vii e viii :
Deu-se como sumariamente não provado:
vii.- A configuração do adesivo das requerentes, que resulta da combinação peculiar da camada posterior quadrada com a área circular ao centro, rodeada pelos pontos dispostos em círculo à volta do adesivo circular, com uma aparência e disposição específicas, a área de sobreposição e as proporções dos elementos individuais sobrepostos, é imediatamente identificada pelo público-alvo, mais especificamente médicos e outros profissionais da medicina, assim como cuidadores, familiares e doentes, como se tratando de um produto das mesmas (artigos 63.º, 74.º e 75.º do requerimento inicial).
viii.- O público relevante poderá supor que o adesivo da requerida é mais uma versão do adesivo fabricado pela requerente, noutra dosagem, ou a versão genérica fabricada por uma filial da requerente (artigo 101.º do requerimento inicial).

A 1.ª instância fundamentou assim a sua convicção:
Facto vii. - Da prova produzida, mormente testemunhal e documental, não resultaram elementos bastantes para demonstrar, ainda que a título indiciário, esta factualidade. Acresce que a prova indiciária efectuada apontou claramente no sentido de que os médicos conhecem o produto das requerentes pela marca EXELON, associando esta designação ao mesmo, e que o contacto que os utilizadores/cuidadores têm com o produto em questão, no momento da sua dispensa em farmácia, é efectuado com referência à embalagem de cartão em que vem acondicionado, na qual figura precisamente a designação EXELON (bem como N...).
Facto viii. - Pelas razões apontadas a propósito do facto vii., a que acresce o facto de na embalagem de cartão em que vêm acondicionados os adesivos da requerida e na qual se faz a dispensa em farmácia aos utilizadores/cuidadores, figurar a designação Rivastigmina Teva, bem distinta da designação EXELON dos adesivos das requerentes. Por outro lado, no acto da prescrição, os médicos atendem fundamentalmente ao princípio activo em questão (Rivastigmina) e bem assim às designações dos medicamentos de referência (in casu, EXELON), pelo que não se vê como a configuração do adesivo possa influir estes técnicos no processo de elaboração de uma receita médica.

As Apeladas não aceitam esta argumentação, pretendendo uma resposta contrária a esta matéria.

Porém, a nosso ver, e salvo o devido respeito, sem qualquer razão.
O que releva essencialmente, perante produto/medicamento vendido em embalagens e saquetas contendo clara especificação das respectivas marcas nominativas em confronto (bem diversas entre si), ademais com prescrição e aplicação por pessoal profissional, médico ou especializado, é tal diversa sinalização, desde logo exterior, dos produtos, tal como os conhecimentos técnicos dos médicos prescritores, profissionais exímios no conhecimento dos medicamentos, respectivas marcas e laboratórios de origem, tal como características e cuidados de utilização.

Mesmo não pondo em causa que o aspecto visual e características mais facilmente apreensíveis do produto também sejam relevantes, sobretudo para os utentes, e que as Apelantes se tenham destacado no mercado neste domínio, tornando muito conhecido e apreciado o seu produto/adesivos, não pode deixar de concordar-se com o Julgador em 1.ª instância, quando enfatiza que o pessoal médico – normalmente especializado – conhece bem o produto das Requerentes/Apelantes pela sua marca, “EXELON”, associando esta designação ao mesmo, e que o contacto que os utilizadores/cuidadores têm com o respectivo produto, no momento da sua dispensa em farmácia, é efectuado com referência à embalagem de cartão em que vem acondicionado, na qual figura precisamente a designação “EXELON”, tal como, se dúvidas houvesse, “N...”.
Bem como quando não deixa de salientar que na embalagem de cartão em que vêm acondicionados os adesivos da Requerida/Apelada e na qual se faz a dispensa em farmácia aos utilizadores/cuidadores, figura, por seu lado, a designação “Rivastigmina Teva”, em nada confundível (por bem distinta) daqueloutra designação “EXELON” da contraparte.

E ainda quando refere, com todo o acerto, que no acto da prescrição, os médicos atendem fundamentalmente ao princípio activo em questão (“Rivastigmina”) e às designações dos medicamentos de referência (“EXELON”).

Tudo para concluir – o que sufragamos inteiramente, nesta perspectiva, e com todo o devido respeito pelo entendimento contrário – que não se vê como a configuração do adesivo (elemento interno, encerrado na embalagem/saquetas, normalmente com visibilidade e manuseamento apenas no momento da aplicação no corpo do paciente, que não no da prescrição ou aquisição individual) possa condicionar/equivocar tais técnicos em sede prescritiva e influir no processo de elaboração de uma receita médica dirigida a determinado paciente.
Donde, à luz das regras da lógica, da razoabilidade e da experiência comum, crivo sob que deve ser aferida toda a prova, mesmo a de pendor valorativo divergente invocada pelas Apelantes, a improcedência das conclusões das Recorrentes em contrário.

1.5. - Quanto aos pontos ix e x:
Foi dado como sumariamente não provado:
ix.- Esta situação tem causado graves prejuízos às requerentes que, com a actuação da requerida, estão a ser confrontadas com a diluição que resulta fatalmente do uso da mesma marca por outra empresa, e com a erosão do carácter distintivo das suas marcas comunitárias registadas (artigo 104.º do requerimento inicial).
x.- Além disso, a requerida, ao comercializar um produto com a apresentação em causa, consegue assegurar-se, sem grande esforço, de que o produto é bem recebido pelos consumidores, que estão familiarizados com as marcas e os produtos das requerentes (artigo 105.º do requerimento inicial).

A 1.ª instância fundamentou:
Factos ix. e x. - Da prova produzida, mormente testemunhal e documental, não resultaram elementos bastantes para demonstrar, ainda que a título indiciário, esta factualidade. Saliente-se que da diminuição do volume de vendas do produto das requerentes, referida pela testemunha A..., não se extrai, ainda que a título indiciário, o invocado prejuízo emergente de aproveitamento por banda da requerida, encontrando-se antes uma explicação plausível na diferença de preços entre o medicamento de referência das primeiras e o genérico da segunda, referido pela testemunha A..., ou seja, numa circunstância natural de mercado, alvo, aliás, de regulação legal.

Contrapõe a parte apelante que é de concluir pela existência no caso de risco sério de prejuízo decorrente do impacto negativo adveniente dos sinais protegidos dos produtos das Recorrentes, ante a actuação ilícita da Apelada.

Deve começar por dizer-se que nos segmentos impugnados se surpreende alguma matéria de cariz não fáctico, logo, insusceptível de juízo probatório (positivo ou negativo) e de impugnação em sede de julgamento de facto.

É o caso do ponto x, sendo conclusivo/valorativo (logo, não fáctico) se a situação tem causado “graves prejuízos” às requerentes que estão a ser confrontadas com a “diluição que resulta fatalmente do uso da mesma marca” por outra empresa, e com a “erosão do carácter distintivo das suas marcas” comunitárias registadas.

Trata-se aqui, na verdade, de conclusões/valorações, que haveriam de ser extraídas de material fáctico alegado, esse, sim, a dever ser respondido como “provado” ou “não provado”.

Quanto ao mais, pensamos também, fazendo apelo aos aludidos critérios de lógica, razoabilidade e experiência comum, na apreciação da prova em discussão, e sopesando as posições das partes, na contraposição entre medicamento de referência e respectivo genérico, este, enquanto tal, permitido face à lei vigente, que os invocados prejuízos – ou risco sério de ocorrência dos mesmos – se vão, afinal, radicar na dita “diminuição do volume de vendas do produto das Requerentes/Apelantes [referida pela testemunha A...], não tanto por via de um abusivo aproveitamento pela Requerida/Apelada, mas, com maior probabilidade – a atender nesta sede de juízo cautelar –, na diferença comparativa de preços praticados entre o medicamento de referência (das Recorrentes) e o respectivo genérico (da Apelada), tal como referido em sede de prova testemunhal (citada testemunha A...), o que levou o Julgador a concluir/convencer-se que estamos perante “uma circunstância natural de mercado, alvo, aliás, de regulação legal”.
Com o que – diga-se – inteiramente se concorda, assim improcedendo, em consequência, as conclusões em contrário das Apelantes e se quedando inalterado o quadro fáctico (provado e não provado, em termos sumários) da 1.ª instância.
 
2. - Da pretendida errada aplicação do direito:
Pretende, por fim, a Apelante, baseando-se na factualidade que visava fosse agora julgada provada (improvada na 1.ª instância), que o Tribunal a quo incorreu numa errada aplicação em sede de matéria de direito, pois que devem considerar-se verificados todos os requisitos de procedência do procedimento cautelar intentado, com a consequente alteração do decidido na 1.ª instância.

Ora, desde logo deve dizer-se que, como visto, não logrou provar-se ocorrer qualquer erro de julgamento em sede de decisão da matéria de facto.

Em vez disso o quadro fáctico a atender nesta instância é precisamente o mesmo que foi considerado pelo Tribunal a quo, persistindo improvados todos os factos que as Apelantes pretendiam ver julgados provados e em que suportavam a sua alegação de direito.

Donde que, em matéria de direito, fiquem substancialmente prejudicadas as conclusões das Recorrentes, tanto mais que, diga-se desde já, se mostra criteriosa e adequada, a nosso ver, a fundamentação jurídica da sentença em crise.

Com efeito, por demonstrar fica, ante a factualidade provada, qualquer “violação ou fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial” (art.º 338.º-I, n.º 1, do CPI).

Só em tais casos, inverificados na situação dos autos, “pode o tribunal, a pedido do interessado, decretar as providências adequadas a:
a) Inibir qualquer violação iminente; ou
b) Proibir a continuação da violação”.
O n.º 2 do mesmo preceito legal prescreve dever o requerente fazer a prova necessária tendente a demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial, ou que está autorizado a utilizá-lo, e que se verifica ou está iminente a violação do seu direito ([2]).

Como dito na decisão recorrida, são pressupostos deste tipo de procedimentos cautelares:
a) A titularidade de um direito de propriedade industrial;
b) A violação efectiva desse direito ou a sua violação iminente, susceptível de causar lesão grave e dificilmente reparável.

Quanto ao primeiro pressuposto (al.ª a)), basta a violação efectiva (consumada) independentemente da sua maior ou menor gravidade e da dificuldade de reparação.

Já quanto ao outro pressuposto (o da al.ª b)), estando em causa uma ameaça de lesão (em vez de uma lesão efectiva/consumada), já se exige que ocorra iminência de violação e que a mesma possa causar lesão grave e dificilmente reparável do direito.

Como também enfatizado na decisão em crise, as Requerentes/Apelantes produzem e comercializam adesivos transdérmicos, com características e configuração próprias, fazendo-o sob a marca EXELON®, o que fazem desde há anos, tendo adquirido reconhecimento no mercado, sendo a 1.ª Requerente titular do registo das marcas comunitária n.ºs 011293362 e 011293404 (ambas figurativas), pedidos em 25-10-2012 e concedidos em 22-03-2013, para assinalar “preparações farmacêuticas para o tratamento da demência tipo Alzheimer”, na classe 5 da Classificação Internacional de Nice, com a indicação no registo das cores cinzenta e bege.

Por sua vez, a Requerida/Apelada, também do ramo farmacêutico, comercializa no mercado português adesivos transdérmicos com a mesma destinação e a designação RIVASTIGMINA TEVA - SISTEMA TRANSDÉRMICO.

Pretendiam, desde logo, as Requerentes/Apelantes ocorrer violação, pela contraparte, do direito exclusivo decorrente do registo das referidas marcas comunitárias.

Diz-se a este respeito na sentença recorrida:
«… a marca destina-se a individualizar produtos ou serviços de uma empresa e a distingui-los dos produtos ou serviços de outras empresas, tendo como elemento essencial caracterizador a função distintiva que desempenha.

A marca comunitária está sujeita ao regime jurídico constante do Regulamento (CE) n.º 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009 (doravante RMC).
Trata-se de um sinal comunitário de carácter unitário, produzindo por essa via os mesmos efeitos em toda a Comunidade, sendo o seu registo concedido pelo Instituto de Harmonização no Mercado Interno.

In casu, estão em causa duas marcas figurativas que representam os próprios adesivos transdérmicos, consistindo os respectivos sinais em reproduções (fotografias) da perspectiva frontal dos mesmos.

Ou seja, estamos perante representações bidimensionais dos adesivos das requerentes que, dada a natureza dos produtos em causa (em particular, a reduzida espessura e, por isso, a diminuta relevância gráfica da sua profundidade), permite ao observador a percepção dos elementos essenciais da sua forma tridimensional.
Assim, embora figurativos (não tridimensionais), os sinais em causa servem-se da forma do produto (reproduzida fotograficamente) para prosseguir a função distintiva inerente à marca.

A este respeito o artigo 4.º do RMC estabelece que a forma do produto ou do seu acondicionamento pode constituir marca comunitária, desde que o correspondente sinal, susceptível de representação gráfica, seja adequado para distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.

A marca comunitária confere ao seu titular o direito de exclusivo consagrado no artigo 9.º do RMC, o qual fica, por essa via, habilitado a proibir um terceiro de utilizar, sem o seu consentimento, na vida comercial:
- um sinal idêntico à marca em causa, para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais esta foi registada [artigo 9.º, n.º 1, alínea a)]; ou
- um sinal que, pela sua identidade ou semelhança com a marca comunitária e pela identidade ou semelhança dos produtos ou serviços abrangidos pela marca comunitária e pelo sinal, provoque o risco de confusão no espírito do público, sendo que o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca [artigo 9.º, n.º 1, alínea b)].
Importa também assinalar que a marca comunitária beneficia da presunção de validade consagrada no artigo 99.º do RMC, o que leva a que neste contexto cautelar esteja vedado ao tribunal o conhecimento e declaração de qualquer invalidade que porventura afecte os sinais em apreço, sendo certo, por outro lado, que a título principal é ao organismo comunitário Instituto de Harmonização do Mercado Interno (IHMI) que compete apreciar e decidir a declaração de nulidade (artigos 53.º, n.º 1, alínea a), e 56.º, n.º 1, alínea b), ambos do RMC).

Aliás, no caso vertente, tal como resultou demonstrado, foram deduzidos junto do IHMI pedidos de declaração de nulidade das marcas comunitárias em apreço (cf. factos 52 a 54).

Assim, no quadro da validade presumida acima descrita, que constitui fundamento bastante para a verificação indiciária do direito registral invocado pelas requerentes, há que avaliar se a forma de produto utilizada pela requerida constitui infracção das marcas comunitárias em apreço, à luz do que dispõe o artigo 9.º do RMC.»

Neste contexto há que repetir que uma das marcas foi mesmo objecto de declaração de nulidade do registo, encontrando-se pendente, todavia, recurso com efeito suspensivo, enquanto a outra marca está pendente de processo de declaração de nulidade de registo.

Concordamos também que o que essencialmente releva, neste contexto de protecção de direitos ligados a marcas ([3]), é a ideia de semelhança, reportada ao risco de confusãoou no polo oposto
a capacidade distintiva.

Este, traduzindo a bitola essencial a considerar, dependerá de diversos factores, designadamente do conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser estabelecida com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos e os serviços designados” (cf. considerando 8 do RMC).

Aqui chegados, resta-nos concordar com o Tribunal recorrido quando conclui que “as marcas da primeira requerente estão longe de constituírem sinais fortes.

Ao invés, nesta sede indiciária, estamos em condições de afirmar que aquelas revestem reduzida eficácia distintiva, circunstância que obviamente relevará para efeitos de apreciação do mencionado risco de confusão.

Na verdade, para além de a forma representada pelos referidos sinais ser comum em produtos do ramo de mercado em causa, os mesmos ostentam elementos que constituem soluções técnicas que, enquanto tais, não podem ficar reservadas ao exclusivo de um único operador no mercado, in casu, as requerentes.

Neste sentido, a lei impede o seu registo como marca comunitária quando o sinal for exclusivamente constituído pela imposta pela própria natureza do produto (artigo 7.º, n.º 1, alínea e), i), do RCM) ou pela forma do produto necessária para obter um resultado técnico (artigo 7.º, n.º 1, alínea e), ii), do RCM).

A forma representada nas marcas da primeira requerente é comum e habitual no âmbito do sector de mercado a que respeitam os produtos em causa, sendo, no essencial, a forma que os mesmos devem ter para cumprir a sua finalidade ou função”.

Não parece haver dúvidas de constituírem os pensos transdérmicos (cujo modo de funcionamento se traduz na operância de adesivos impregnados com um fármaco, a ser absorvido lentamente através da pele) um modelo/forma farmacêutico conhecido e usado de há longas décadas, com a vantagem de preservar, relativamente a outros fármacos (os tomados por via oral) a saúde gastrointestinal dos pacientes, optando-se por uma aplicação local, com a substância activa a ser libertada de forma constante e prolongada.

Assim, tratando-se sempre de pensos (transdérmicos), temos também por irrecusável que – como dito na decisão em crise - os sinais das marcas das Apelantes apresentam “elementos que constituem soluções técnicas, sendo as suas características físicas determinantes para a obtenção de resultados técnicos que são relevantes no contexto em que se inserem os produtos em causa, ou seja, o meio farmacêutico, orientado pelas soluções terapêuticas mais eficazes, na perspectiva dos utilizadores.

Quanto à configuração, pois, e, do mesmo modo, às características, dos ditos produtos/pensos/fármacos, no confronto entre os das Apelantes (de referência) e os da Apelada (genéricos), verifica-se – sumariamente, embora – estarem em causa, por um lado, um modelo geral tornado comum ao longo de décadas, e, por outro lado, uma «função técnica dos separadores, existentes na referida camada posterior ou revestimento amovível, os quais servem para reforçar a estabilidade do adesivo quando armazenado, reduzindo o chamado “fluxo a frio” (factos 18 a 20), ainda que esse resultado técnico possa ser alcançado com separadores que não possuam a forma redonda dos “pontos” dos pensos das requerentes e da requerida» ([4]).

Só pode, pois, concluir-se, salvo o devido respeito, por não ter ficado demonstrado, nesta sede sumária, o pretendido elevado poder distintivo dos produtos/pensos, no seu reporte, claro, à marca invocada/registada (embora procedimentalmente questionada na sua validade), das Apelantes, podendo dizer-se, com a 1.ª instância, que se trata de “marcas de reduzida eficácia distintiva”, faltando, neste contexto, a característica da notoriedade, tanto mais que «o conhecimento que os clínicos possuem do medicamento das requerentes e sobre as suas qualidades tem como referência, não aquele formato objecto de registo, mas a própria designação “EXELON” – cf. facto 13)».

Tudo se reduzindo às semelhanças de aspecto e de características dos produtos/fármacos/pensos – que não, seguramente, quanto às marcas nominativas sob que são comercializados e às respectivas embalagens e saquetas, estas notoriamente diversas / /inconfundíveis e, como é lógico, primeiramente visíveis –, será de concluir também que, ainda assim, alguns elementos distintivos dos próprios pensos são equacionáveis, o que basta para afastar o risco de confusão, mormente tendo em atenção o público a que os fármacos são destinados e o modo como são prescritos e vendidos.

Voltemos a citar a sentença:
«… para além de as cores dos adesivos (camada posterior e área circular) serem diversas (saliente-se, a este respeito, que as cores reivindicadas nos registos comunitários são o cinzento e o bege – cf. factos 23 e 24), os produtos da requerida ostentam os vocábulos “Rivastigmina 4,6 mg/24h” “Rivastigmina 4,6 mg/24h”, enquanto a forma representada na marca n.º 011293362 não contém qualquer elemento nominativo e na marca n.º 011293404 apenas se lêem as iniciais “BHDI”, apostas no centro da área circular do penso, num tom bege mais escuro.

Analisadas, pois, as diferenças que caracterizam a forma de produto utilizado pela requerida, visto no seu conjunto, à luz do limitado jus prohibendi ou âmbito exclusivo das marcas das requerentes, nos termos acima apontados, resulta que não se verifica o risco de confusão que o artigo 9.º, n.º 1 exige para legitimar a pretensão proibitiva deduzida nos presentes autos.

E se assim é, então há que concluir que o requisito da violação efectiva do direito ou da sua violação iminente, susceptível de causar lesão grave e dificilmente reparável, previsto no artigo 318.º-I do CPI, não se mostra preenchido.».

Contrapõe a parte recorrente que ficou indemonstrada a existência de qualquer adesivo existente no mercado aquando do aparecimento do seu produto, para o tratamento da doença tipo Alzheimer, que comungasse da combinação das características presentes nas marcas da Apelante. Porém, se tal pode consubstanciar a existência de um fármaco de referência, não pode inibir, como visto, o surgimento, ao abrigo da lei, de um fármaco congénere genérico, como o da Apelada.

É certo, por outro lado, como também referem as Apelantes, que o facto de o seu adesivo ser comercializado com o elemento nominativo EXELON® no mesmo – é o mais visível, mesmo antes da abertura do produto, pois que impresso no exterior da embalagem –, a presença de uma determinada marca nominativa no produto não invalida que possa ter outras marcas (designadamente, figurativas), incluindo marcas que representem a aparência desse produto juntamente com a camada protectora.

Porém, aquele notório elemento nominativo, pela sua imediata visibilidade, logo adquire/confere elevada distintividade ao conjunto, subalternizando os outros elementos (encerrados no interior da embalagem/saquetas, os representativos da aparência do produto), não podendo induzir, obviamente, os médicos prescritores em erro ou confusão, nem o demais pessoal profissional de saúde, aqueles que são chamados a fazer as opções relevantes tendentes às medidas perapeuticas a seguir e procedimentos a adoptar.

Não pode, pois, concluir-se, no contexto aludido, por uma visão comparativa de conjunto – o qual não pode ser esquecido nem negligenciado perante elementos particulares, ainda que relevantes – que suscite confusão ou confundibilidade.

Donde a improcedência, salvo o devido respeito, das conclusões em contrário das Recorrentes.

Resta a questão da concorrência desleal:
Ora, afastada a confundibilidade – muito mais a confusão – e visto tudo o anteriormente exposto, só pode concluir-se pela não demonstração da invocada “quase idêntica apropriação dos esforços de outrem” (conclusão VV.), inexistindo, em apreciação sumária, e sem prejuízo de juízo definitivo perante a instância principal, demonstração de “cópia grosseira e servil dos adesivos das Apelantes” (conclusão XX.) ou de situação de “mais fácil aceitação pelos consumidores do produto da Apelada” (conclusão YY.), a não ser por razões do foro económico – de si legítimas –, consabido (e provado) que os fármacos genéricos são substancialmente menos dispendiosos para os consumidores por comparação aos medicamentos de referência.

Mas aí estamos perante o mercado de medicamentos aberto a medicamentos genéricos, mais baratos, à escolha dos consumidores, (sempre) no quadro de prévia prescrição médica, como foi intento da legislação em vigor – vontade e decisão do legislador.

Não se descortina, pois, in casu, qualquer o acto, praticado pela Apelada, em contrário às normas e usos honestos deste ramo de actividade económica, à boa fé exigível a quem se movimente neste mercado concorrencial do medicamento ([5]), com o consumidor a poder optar entre medicamentos de referência, de si mais caros, ou genéricos, concebidos para serem mais acessíveis economicamente aos doentes, a quem cabe o poder de escolha, num âmbito técnico onde operam profissionais de saúde, a começar pelos médicos prescritores.

Como dito em recente Ac. do STJ:
«A noção de concorrência desleal é dada através de uma definição geral, seguida de uma enumeração exemplificativa de actos desleais: a cláusula geral, de carácter valorativo, e não taxativa, torna a apreciação da deslealdade do acto dependente da sensibilidade do julgador, propiciando a criação de algumas zonas nebulosas, mas tem vantagens, pela maleabilidade que permite e a consequente possibilidade de adequar o conceito de concorrência desleal às várias situações que, em cada momento e sector de actividade, se considerem contrárias às normas e usos honestos.

De acordo com essa noção constituem pressupostos da concorrência desleal: (i) a prática de um acto de concorrência; (ii) contrário às normas e usos honestos; (iii) de qualquer ramo de actividade económica.

(…)

A deslealdade afere-se pela violação autónoma de normas sociais de conduta e não por violação de normas legais (ainda que possa haver actos desleais que também sejam ilegais). As normas de comportamento são regras constantes dos códigos de boa conduta, elaborados, com crescente frequência, por diversas associações profissionais. Por sua vez, os usos honestos são padrões sociais de conduta de carácter extra-jurídico, correspondentes a práticas sociais, nem sempre uniformes, pois podem variar consoante o sector de actividade considerado.

(…)

A concorrência desleal traduz, em síntese, os actos repudiados pela consciência normal dos comerciantes, por contrários aos usos honestos do comércio, que sejam susceptíveis de causar prejuízo à empresa de um competidor pela usurpação, ainda que parcial, da sua clientela, com vista à criação e expansão, directa ou indirecta, de uma clientela própria.» ([6]).

Ora, revertendo ao caso dos autos, no contexto apurado de livre concorrência entre fármacos de referência e produtos congéneres genéricos – como salientado na sentença recorrida, que enumera o respectivo regime legal e para o qual nos limitamos a remeter – inexiste demonstração de conduta comercial contrária às normas ou usos honestos comerciais.
Só pode, assim, confirmar-se a decisão recorrida, improcedendo todas as conclusões em contrário.

***

V – Sumariando (art.º 663.º, n.º 7, do NCPCiv.):
1. - São pressupostos (cumulativos) de decretação do procedimento cautelar do art.º 338.-I do CPI, não só a titularidade de um direito de propriedade industrial, mas ainda a violação efectiva/consumada desse direito ou, pelo menos, a sua violação iminente, desde que susceptível – esta última – de causar lesão grave e dificilmente reparável desse direito.
2. - Por isso, o requerente desse procedimento cautelar, para além de demonstrar que é titular do direito, deve convencer, ainda que sumariamente, que já se verifica ou está iminente uma violação do direito naqueles moldes.
3. - O que essencialmente releva, no contexto de protecção de direitos ligados a marcas (vistas como sinais distintivos de mercadorias, produtos ou serviços), é a ideia de semelhança, reportada ao risco de confusão, ou, na perspectiva contrária, a respectiva capacidade distintiva.
4. - Radicando aqui a bitola essencial a considerar, ela dependerá de diversos factores em concreto, designadamente do nível de conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser estabelecida com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos e os serviços designados.
5. - Estando em causa produtos farmacêuticos traduzidos em pensos transdérmicos, que constituem medicamentos genéricos (os da Apelada), com certas semelhanças de aspecto e de características técnicas face ao produto de referência (o das Apelantes), sendo diversas as marcas nominativas sob que são comercializados, o que é bem patente nas respectivas embalagens e saquetas em que encerrados no âmbito da sua produção e comercialização, elucidando claramente quanto à origem diversa dos produtos, é notória a inconfundibilidade do conjunto, mormente aquando da sua prescrição e comercialização, tendo em conta que tal prescrição cabe a profissionais especializados, os médicos, tratando-se, pois, de um sector de mercado exigente e onde intervêm profissionais de saúde especializados e fortemente informados.
6. - A concorrência desleal pressupõe a prática de acto(s) contrário(s) às normas e usos honestos de determinado ramo de actividade económica, a obstrução às exigências da boa fé – objectiva, enquanto padrão/norma de conduta, traduzida no agir honesto, correcto e leal na prática comercial – exigível, in casu, a quem se movimente neste mercado concorrencial do medicamento.
7. - Mercado esse legalmente aberto a medicamentos genéricos, de si mais baratos, à escolha dos consumidores, sob prévia prescrição médica, como foi intento da legislação em vigor.

***

VI – Decisão:

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, manter a decisão recorrida.
Custas da apelação pelas Apelantes.

Escrito e revisto pelo relator.
Elaborado em computador.


Lisboa, 07/05/2015

José Vítor dos Santos Amaral           
Regina Almeida                                              
Maria Manuela Gomes


([1]) Segue-se, no essencial, o relatório da decisão recorrida.
([2]) É o seguinte o texto integral actual deste dispositivo legal (sob a epígrafe “providências cautelares”), muito convocado pelas Apelantes:«1 - Sempre que haja violação ou fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial, pode o tribunal, a pedido do interessado, decretar as providências adequadas a:
               a) Inibir qualquer violação iminente; ou
               b) Proibir a continuação da violação.
2 - O tribunal exige que o requerente forneça os elementos de prova para demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial, ou que está autorizado a utilizá-lo, e que se verifica ou está iminente uma violação.
3 - As providências previstas no n.º 1 podem também ser decretadas contra qualquer intermediário cujos serviços estejam a ser utilizados por terceiros para violar direitos de propriedade industrial.
4 - Pode o tribunal, oficiosamente ou a pedido do requerente, decretar uma sanção pecuniária compulsória com vista a assegurar a execução das providências previstas no n.º 1.
5 - Ao presente artigo é aplicável o disposto nos artigos 338.º-E a 338.º-G.
6 - A pedido da parte requerida, as providências decretadas a que se refere o n.º 1 podem ser substituídas por caução, sempre que esta, ouvido o requerente, se mostre adequada a assegurar a indemnização do titular.
7 - Na determinação das providências previstas neste artigo, deve o tribunal atender à natureza dos direitos de propriedade industrial, salvaguardando, nomeadamente, a possibilidade de o titular continuar a explorar, sem qualquer restrição, os seus direitos».
([3]) A marca é vista como um sinal distintivo de mercadorias, produtos ou serviços, como pode ler-se no sumário do Ac. STJ, de 29/01/2015, Proc. 1222/06.6TYLSB.L1.S1 (Cons. Silva Gonçalves), em www.dgsi.pt.
([4]) Cfr. ainda a sentença recorrida, que cita, por sua vez, o Acórdão do TJUE de 18-06- 2002, proferido no processo C-299/88, n.os 83 e 84, caso Philips v. Remington.
([5]) Tal como consta do Ac. STJ, de 30/09/2014, Proc. 1195/08.0TYLSB.L1.S1 (Cons. Fonseca Ramos), disponível em www.dgsi.pt, “A lei não proíbe a concorrência, sob pena de coarctar o direito de livre estabelecimento e de iniciativa privada que têm tutela constitucional – arts. 47º e 61º da Lei Fundamental; proíbe, sim a concorrência desleal, violadora do dever de lealdade, que é a que um sujeito de direito exerce de modo a afectar, à margem da lei, os saudáveis princípios da concorrência” (itálico aditado).
([6]) Assim, entre outros, o Ac. STJ, de 26/02/2015, Proc. 1288/05.6TYLSB.L1.S1 (Cons. Fernanda Isabel Pereira), em www.dgsi.pt.