Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2014/10.3TVLSB.L1-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: NULIDADE DE SENTENÇA
PERSONALIDADE JURÍDICA
PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO
LEGITIMIDADE PASSIVA
CUSTAS
OMISSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: “I - A omissão quanto a custas, é um erro material, sujeito ao regime do art.º 667º, n.º 1, do Código de Processo Civil de 1961, e que se distingue da hipótese de reforma da decisão quanto a custas, nos quadros do art.º 669º, n.º 1, alínea b) do mesmo Código, a qual pressupõe uma decisão quanto a custas enfermando de erro. II – Também se não confundindo com a nulidade de sentença prevista no art.º 668º, n.º 1, alínea f) do referido compêndio normativo, que dispõe para o caso de a proferida condenação em custas não observar os requisitos estabelecidos no art.º 659º, n.º 4 daquele Código. III - A personalidade judiciária é o “pressuposto dos restantes pressupostos subjectivos”, devendo assim conhecer-se daquela antes destes. IV – Conquanto o art.º 6º, alínea a) do Código de Processo Civil pareça dar uma leitura restritiva do conceito de património autónomo para efeitos de extensão da personalidade judiciária, este conceito tem de abranger os fundos de investimento imobiliário. V – No caso da liquidação não compulsiva do Fundo de Investimento, a liquidação termina com o encerramento das contas pela entidade gestora e o momento do termo da liquidação é o momento da extinção do fundo.”.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam no Tribunal da Relação

I – A “A, S.A.” intentou ação declarativa com processo comum sob a forma ordinária, contra “B”, “C, S.A.” e “D, S.A.”, pedindo a condenação:
a) Das 1ª e 2ª RR. a celebrar com a A. o contrato prometido com os mesmos termos e obrigações constantes do contrato outorgado entre a A. e a R. 4857;
Ou, se assim não se entendesse:
b) Condenar qualquer uma das RR., solidária ou individualmente, a pagar à A. a penalidade prevista contratualmente, no valor de € 100.000,00;
De qualquer forma:
c) Condenar as RR. no pagamento à A. numa indemnização pela quebra de vendas, desde a data que se apurar como a da entrega efetiva da loja que referencia  “às mesmas”, o que terá ocorrido em Outubro ou Novembro de 2009, até efetiva entrega do locado à A., ou, este não ocorrendo, até à data do trânsito em julgado da sentença e pelo valor mensal de € 5.807,55, num valor global a contabilizar a final;
d) Condenar as RR. a pagar à A. o dano sofrido com a perda de clientes, em valor a fixar equitativamente pelo Tribunal, mas que se requer não ser inferior a € 5.000 mensais, a contabilizar desde a data que se apurar como a da entrega efetiva da loja às mesmas, o que terá ocorrido em Outubro ou Novembro de 2009, até efetiva entrega do locado à A., ou, este não ocorrendo, até à data do transito em julgado da sentença, a contabilizar a final;e) Condenar as RR. a pagar à A. a quantia não inferior a € 50.000,00 a título de indemnização pela perda da sua imagem comercial;f) Condenar as RR. no pagamento à A. da quantia de € 1.500,00 por força do tempo e trabalho despendido pelo seu sócio e gerente no acompanhamento do litígio;
g) Condenar as RR. a pagar à A. a quantia que se apurar a final e respeitante a pagamento de custas judiciais e a pagamento de despesas e honorários dos seus advogados, sendo que a contabilização dos honorários dos advogados é feita com base numa taxa horária de €175,00;
h) Condenar as RR. a pagar à A. juros à taxa dos juros comerciais sobre todas as quantias em que forem condenadas.

Alegando, para tanto e em suma:
A A., encontra-se instalada no antigo E desde 1942, tendo arrendado ao longo dos anos várias partes do Palácio, onde hoje em dia se situam as instalações.
A “4857” é uma empresa do ramo imobiliário e antiga proprietária do E à data da celebração do contrato de arrendamento em análise nestes autos.
A C é uma sociedade gestora do grupo F, sendo vocacionada para a gestão de Fundos de Investimento Imobiliário.
O Fundo B é um fundo de promoção imobiliária na zona histórica e central de Lisboa, em projetos de reabilitação.
A gestão do Fundo é efetuada, pela entidade gestora inscrita na CMVM, ou seja a R. C.
Por contrato outorgado em 14 de Fevereiro de 2007 a empresa D, S.A., então proprietária do E, e a própria A., acordaram numa série de alterações aos contratos de arrendamento existentes, respeitantes a diversas partes daquele Palácio, cessação de uns, alteração das condições contratuais de outros, utilização de outras partes do palácio em regime de comodato, alterações ao valor das rendas, etc.
Nos termos do disposto na Cláusula 4ª do Contrato, a referida 4857 fez uma promessa unilateral de arrendamento à A., relativamente à loja, sita no palácio, com entrada pelos nºs 48 e 48-A.
Em 29 de Julho de 2008, a A. foi notificada pela empresa D e pelo G, este gerido pela empresa H, S.A., de que ambas as empresas iriam fazer uma permuta entre um imóvel de que era proprietário o Fundo G, e o E, propriedade da 4857.
Mais informaram que, imediatamente após essa permuta, sucessivamente, no mesmo dia, hora e cartório notarial, o Fundo G venderia o E ao R. Fundo B, gerido pela R. C.
Por carta datada de 29 de Agosto de 2008, a A. é notificada pela R. C que, na sequência da carta recebida pela A. em 29 de Julho de 2008, o R. Fundo B, adquiriu em 13 de Agosto de 2008, o E, adquirindo o Fundo R. a posição de arrendatário, pelo que as rendas lhe deveriam passar a ser pagas.
Não sendo a sobredita promessa unilateral honrada pelo novo proprietário do Palácio.
Apesar de “todas as obrigações nascidas do contrato celebrado entre a A. e a 4857, segundo foi confirmado à A. pela 4857”, terem sido “reconhecidas e aceites” pela C e pelo Fundo B.
O que tem ocasionado prejuízos vários à A., pela mesma discriminados.

Contestaram as RR..

Arguindo as 1ª e 2ª RR. a falta de personalidade do B, na alegada circunstância de  ter a A. optado “por demandar o Fundo e a C autonomamente, como dois Réus individualmente considerados, quando aquele, como património autónomo apenas poderia estar em juízo representado pela sua administração, a ser exercida, ope legis, por uma sociedade gestora de fundos de investimento imobiliários.”.
E, bem assim, a ilegitimidade passiva da C, por ter sido autonomamente demandada…não sendo em nenhum momento proprietária do imóvel, nem, assim, sujeito da relação controvertida tal como0 configurada pela Autora.
Com impugnação, no mais.
E arguindo a 3ª Ré a sua própria falta de “personalidade jurídica e judiciária”, por isso que a sua extinção ocorreu em 15 de Julho de 2010,  com o registo da liquidação, portanto antes da propositura da presente ação, em 23 de Setembro de 2010.
Para além da sua ilegitimidade passiva, sendo que, encerrada a liquidação e extinta a sociedade, a ação teria que ter sido proposta contra a generalidade dos sócios.
E, ainda que esta Ré não estivesse liquidada e em consequência extinta, ponto é que o E foi vendido à 1ª Ré pelo Fundo G e não pela 3ª Ré.
Deduzindo, no restante, impugnação.

Houve réplica da A., sustentando a improcedência das arguidas exceções, requerendo o chamamento do Fundo G para contestar, querendo, a ação, e a condenação das RR. Fundo B e C, como litigantes de má-fé, em multa e indemnização à A., em montante, esta, não inferior a € 100.000,00, acrescida de todas as despesas que a A. tenha com os presentes autos, nomeadamente o valor dos honorários dos seus mandatários, em montante a apurar a final.

Convidada a A. a “clarificar qual o incidente de (intervenção de terceiros) a que pretendia aludir”, veio aquela fazê-lo, referindo tratar-se do incidente de intervenção principal provocada.

Por despacho de folhas 319-323, foi admitida a requerida intervenção do Fundo G, representado pela H, S.A., cuja citação se ordenou.

Contestando o chamado, defendeu-se por exceção, invocando a sua “destituição” de personalidade judiciária, por ter tido lugar a sua liquidação.
Deduzindo ainda impugnação.

Em despacho de folhas 357 a 362, que aqui se dá por reproduzido, julgou-se improcedente a arguida exceção dilatória de falta de personalidade judiciária do 1º Réu – “B”, que se entendeu representado pela 2ª Ré “C, S.A.”.
E procedente a exceção de falta de personalidade judiciária da 3ª Ré – “D, S.A.”, assim absolvida (da instância).
Mais se julgando o 1º Réu – que, como visto, havia deduzido a correspondente arguição – parte ilegítima, “absolvendo-se este da instância”.

Inconformadas, recorreram a A. e a Interveniente principal.

Formulando a primeira, nas suas alegações, as seguintes conclusões (…):

E dizendo a segunda, em conclusões (…):

Finaliza com a revogação da “Sentença recorrida (…) com as legais consequências.”.

O Réu “B” respondeu às alegações de recurso apresentadas pelas recorrentes “A, S.A.” e “G”, propugnando a retificação ou reforma da decisão “quanto à omissão quanto a custas e quanto ao Interveniente Fundo G” e, “quanto ao mais”, a manutenção do julgado.
Por despacho de folhas 440-442, foi sustentada a não verificação de “qualquer nulidade por omissão de pronúncia”.
Procedendo-se, “nos termos do preceituado no art.º 669/1/b/ do C.P.C.  (…) à reforma da decisão quanto a custas, condenando-se a A. no seu pagamento”.

II- Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objeto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961, aqui imperante no que concerne à admissibilidade e âmbito do recurso, considerando tratar-se, a recorrida, de decisão proferida antes da entrada em vigor da lei n.º 41/2013, de 26 de Junho - são questões propostas à resolução deste Tribunal:

A – No recurso interposto pela A.
- se a decisão recorrida enferma das nulidades que lhe são assacadas;
- se a Ré “B”, representada pela “C, S.A.”, é parte legítima.

B – No recurso interposto pela Ré G.
- se a decisão recorrida enferma das nulidades que lhe são assacadas;
- se a Ré “B” é parte ilegítima.
*
Dada a convergência, na sua quase totalidade, das alegações de ambas as Recorrentes, abordar-se-ão, conjuntamente – com a ressalva da “nulidade de sentença” por omissão de pronúncia quanto à matéria da litigância de má-fé do “Fundo B”, arguida pela A. – as questões suscitadas, sem autonomização sistemática.
*
Com interesse, emerge da dinâmica processual o que se deixou referido supra, em sede de relatório.

II – 1 - Das arguidas nulidades da decisão recorrida.
1. Da omissão quanto a custas.
No já referido despacho de folhas 440-442, e como visto, procedeu-se “nos termos do preceituado no art.º 669/1/b/ do C.P.C. (…) à reforma da decisão quanto a custas, condenando-se a A. no seu pagamento”.
Ora trata-se a omissão quanto a custas, de erro material, sujeito ao regime do art.º 667º, n.º 1, do Código de Processo Civil de 1961[1] (vigente à data da prolação do despacho recorrido).
Que não de hipótese de reforma da decisão quanto a custas, nos quadros do art.º 669º, n.º 1, alínea b) do mesmo Código, a qual pressupõe uma decisão quanto a custas enfermando de erro, por se “não ter respeitado alguma das normas dos art.ºs 446º a 455º do Código de Processo Civil ou de legislação avulsa”, podendo, nesse caso “qualquer das partes pedir a sua modificação, de modo a observarem-se as normas aplicáveis na matéria.”. [2]
Nem da nulidade prevista no art.º 668º, n.º 1, alínea f) do referido compêndio normativo, que dispõe para o caso de a proferida condenação em custas não observar os requisitos estabelecidos no art.º 659º, n.º 4 daquele Código
Como quer que seja, por via do assim “reformado”, corrigiu-se a decisão recorrida, retirando-se em qualquer caso objeto à arguida omissão daquela nesse plano tributário.

2. Da omissão de pronúncia quanto ao interveniente Fundo G.
Aquele foi chamado a requerimento da A., deferido por despacho de folhas 319-323, no qual se considerou e designadamente, encontrar tal intervenção abrigo normativo “nos art.ºs 28º/2, 320º/a), 325º/1 e 326º do C.P.C.”.
Intervindo efetivamente o chamado no processo, devidamente representado, oferecendo contestação própria, onde alegou que “tendo sido o Réu extinto, e em consequência destituído de personalidade judiciária, deve V. Exa, nos termos do art.º 288º, n.º 1, alínea c) do C.P.C., “abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância””, vd. art.º 7º daquele articulado, onde o Fundo chamado se assume como Réu.

É facto incontornável que a decisão recorrida é absolutamente omissa no tocante à referida interveniente principal, que ali não mereceu a mais leve referência.

Ora “O interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu”, cfr. art.º 321º, do Código de Processo Civil.
Anotando José Lebre de Freitas, João Redinha, Rui Pinto,[3] que “Melhor se diria (…) que o interveniente principal faz valer um interesse próprio”, e que “O interesse “paralelo que o interveniente faz valer abrange, portanto, o interesse “igual” do art.º 329-a, latamente entendido, e o interesse independente do do autor, mas com ele conexo, circunscrito nos termos do art.º 30.””.
E, “O que do preceito se tira de útil é que, pedindo ou contestando, o interveniente principal não actua por conta do autor ou réu primitivo, como acontece na substituição processual e na acção popular (…) mas no seu próprio interesse, ainda quando o pedido ou a contestação se faça por mera aderência aos articulados já apresentados.”.
Também, nos termos do art.º 322º, n.º 2, do mesmo Código,[4] “O interveniente (…) goza de todos os direitos de parte principal a partir do momento da sua intervenção.”.
Sendo que “Se o chamado intervier no processo, a sentença apreciará o seu direito e constituirá caso julgado em relação a ele”, vd. art.º 328º, n.º 1, do mesmo Código.
Norma que, segundo os mesmo autores, “não precisaria de ser expressa: o interveniente goza, a partir da intervenção, de todos os direitos de parte principal (…) pelo que, assumindo a posição de autor ou réu, a sua situação jurídica (direito, dever, sujeição, ou outra) terá de ser considerada na sentença, que, obviamente, constituirá caso julgado em relação a ele. É indiferente, para tanto, que a intervenção tenha sido espontânea ou provocada.”.[5]

Isto visto, temos que ao não se pronunciar relativamente ao R. “G”, no proferido saneador, e, mais concretamente, sobre a matéria da exceção dilatória de falta de personalidade judiciária daquele – que sendo de conhecimento oficioso, fora pelo mesmo arguida – incorreu a decisão recorrida em manifesta e incontornável omissão de pronúncia.
A qual é o antitético do dever do juiz de “conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art.º 660-2) (…) cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão.”.[6]
Não colhendo, in adversum, a consideração, no despacho de folhas 440-442, de que “o despacho saneador apenas apreciou os pressupostos em relação à A. e RR., não entrando no mérito da acção, ficando prejudicado em razão da procedência da excepção de falta de personalidade judiciária e de ilegitimidade das RR.” (D, S.A.”, e “B”).
Desde logo, sempre importaria consignar na decisão recorrida o equacionamento de uma tal prejudicialidade.
O que se não mostra feito.
Depois – e sendo que a subsunção da situação hipoteseada nos autos, à de um litisconsórcio necessário passivo, no despacho que admitiu o chamamento, se mostra abandonada na decisão recorrida, enquanto julga o 1º R. parte ilegítima e a 2ª Ré (4857) carente de personalidade judiciária – ponto é que tratando-se a personalidade judiciária, do primeiro dos pressupostos processuais relativos às partes, nunca poderia deixar de se conhecer daquele, no que tange à Ré/interveniente, a menos que se verificasse a procedência de exceção dilatória relativamente à A., o que não foi o caso, cfr. art.ºs 493º, n.º 2, 494º, alínea c), e 510º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil.
As exceções dilatórias relativas às outras rés apenas determinaram a absolvição da instância daquelas, que não da Ré/interveniente.
E se intervindo o chamado no processo, a sentença apreciará o seu direito e constituirá caso julgado em relação a ele, tal não prejudica a sua posição de parte principal no processo para todos os demais efeitos, e designadamente o de conhecimento das exceções dilatórias que lhe digam respeito, pelo mesmo arguidas, ou de conhecimento oficioso.

Procedendo pois, e nesta parte, as conclusões de ambos os Recorrentes.

Mas, deste modo verificada a correspondente nulidade – cfr. art.ºs 666º, n.º 3 e 668º, n.º 1, alínea d), 1ª parte, do Código de Processo Civil – importa que esta Relação, substituindo-se ao tribunal recorrido, nos termos do art.º 715º, n.º 1,[7] do Código de Processo Civil, conheça da arguida falta de personalidade da Ré G.

3. E, assim:
3.1. Nos termos do art.º 5º, n.º 1 do Código de Processo Civil "A personalidade judiciária consiste na suscetibilidade de ser parte.".
E se “Quem tiver personalidade jurídica tem igualmente personalidade judiciária” – vd. n.º 2 do mesmo art.º – também certo é que se poderá ter personalidade judiciária sem se ter personalidade jurídica, como se prevê relativamente às entidades referidas no art.º 6º do dito Código, entre as quais se incluem os “patrimónios autónomos semelhantes” à herança jacente, “cujo titular não esteja determinado”.
Sendo “Que salvo disposição especial em contrário, os patrimónios autónomos são representados pelos seus administradores (…)”, cfr. art.º 22º do mesmo Código de Processo Civil.
Assinale-se que este pressuposto processual – a personalidade judiciária – como se frisa em Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-03-2008,[8] “deve estar presente em qualquer processo de natureza contenciosa.”.
Ocupando, na sugestiva expressão de Castro Mendes,[9] “um lugar muito especial entre os pressupostos processuais (como a personalidade jurídica entre os status): é o pressuposto dos restantes pressupostos subjectivos”.
Com efeito, “Se falta a legitimidade, por exemplo, por exemplo, a instância trava-se entre o tribunal e duas partes, sendo uma (pelo menos) ilegítima. Se falta a personalidade judiciária, não há parte: falta em rigor o ramo da instância em que essa devia funcionar como sujeito. Falta a instância, embora haja uma aparência de instância, que chega para fundamentar os actos de processo que se pratiquem.”.[10]
Como também se refere no supracitado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, “Na verdade, sendo o processo civil o instrumento criado para a definição de direitos e obrigações na esfera do direito privado (direito civil ou direito comercial), natural é que todo aquele que seja atingido na sua esfera jurídica pelos efeitos da decisão judicial constitua uma entidade capaz de suportar tais consequências.”.
 
O “G”, iniciou a sua atividade em 27-12-2006, sendo a sua administração, gestão e representação assegurada pela H, S.A., cfr. folhas 348. 
Vigorando, naquela data, o Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário, estabelecido pelo Decreto-lei n.º 60/2002, de 20 de Março, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 252/2003, de 17-10, e 13/2005, de 07-01.

Nos termos do art.º 2º daquele Regime:
“1 – (…)
2 - Os fundos de investimento constituem patrimónios autónomos, pertencentes, no regime especial de comunhão regulado pelo presente diploma, a uma pluralidade de pessoas singulares ou colectivas designadas «participantes», sem prejuízo do disposto no artigo 48.º, que não respondem, em caso algum, pelas dívidas destes ou das entidades que, nos termos da lei, asseguram a sua gestão.
3 - (…)
4 – (…)”, (o realce a negrito é nosso).

Dispondo-se no art.º 6º do mesmo que:
“1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a administração dos fundos de investimento imobiliário é exercida por uma sociedade gestora de fundos de investimento imobiliário, adiante designada por sociedade gestora, com sede principal e efectiva da administração em Portugal.”.

Perante um tal quadro normativo, conclui-se no supracitado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que “Face ao art. 6º do CPC, apesar do Fundo de Investimento Imobiliário carecer de personalidade jurídica, não se lhe poderá, sem mais, negar a susceptibilidade de ser parte, que lhe advém, face a este normativo, da circunstância de constituir um património autónomo.”.
Afigura-se-nos no entanto que a apertada literalidade do citado art.º 6º, alínea a), ao referir-se a “patrimónios autónomos semelhantes cujo titular não estiver determinado”, justificará algumas considerações adjuvantes, no sentido do reconhecimento da personalidade judiciária ao património autónomo constituído pelo Fundo de Investimento Imobiliário.
E assim dir-se-á, com Remédio Marques,[11] que “situações de separação ou de diferenciação patrimonial”, admitem a personificação judiciária de “entes dotados de autonomia patrimonial, e, em regra, cujos titulares não estejam determinados”.
O que, refere o mesmo autor, será o caso dos fundos de investimento, “acervo patrimonial, este, que pertence, em regime de propriedade de mão comum, ao colectivo dos múltiplos titulares das unidades de participação”.
Justificando que “São novamente razões pragmáticas ligadas à dificuldade de exigir a coligação ou o litisconsórcio (activo ou passivo) dessas unidades de participação (…) que permite sustentar a extensão teleológica deste artigo 6.º a outras realidades juridicamente não personificadas”.
Também Alexandre Brandão da Veiga[12] observando que “Os fundos são representados pela entidade gestora. No entanto, têm personalidade judiciária, como patrimónios autónomos que são.”.
E desse modo, sendo embora que “O art.º 6º/a Cd. Proc. Civil parece dar uma leitura restrictiva deste conceito. Apenas aqueles semelhantes à herança jacente cujo titular não estivesse determinado estariam nesta situação. A verdade é que este conceito tem de abranger os fundos, na medida em que os seus titulares, embora determináveis não são determinados. Por outro lado, e sobretudo, numa perspectiva material justifica-se que o fundo vá a juízo por si mesmo, embora representado pela entidade gestora. É que as atribuições patrimoniais não são abstractas para a entidade gestora. Os créditos e os débitos são débitos do fundo. O que é válido para um fundo pode não ser válido para outro. Dois fundos de uma entidade gestora, perante dois casos muito semelhantes, podem ter vitórias processuais ou sofrer derrotas em condições bem diferentes.
Por outro lado, os fundos, perante as entidades concessionárias de poderes de autoridade e da Administração Pública em geral, têm igualmente legitimidade. Com efeito, o pedido de uma licença (por exemplo, de uma licença de construção nos fundos imobiliários), de uma autorização, ou da prática de qualquer outro acto administrativo, quando se dirige à esfera do fundo deve ser por este pedido directamente.
Há aqui que proceder a algumas limitações.
Em primeiro lugar, nem todos os pedidos feitos pela entidade gestora relativos aos fundos são pedidos do fundo. Com efeito, ficam excluídos os pedidos relativos à autorização do fundo propriamente dito (porque este não existe ainda, pelo menos licitamente) ou em relação às alterações sobre a própria estrutura do fundo).
Em segundo lugar, a lei não permite expressamente a possibilidade de representação judicial do fundo aos participantes. Estes, como vimos, apenas têm direitos sobre o fundo, nos termos acima descritos, a propósito da substituição da entidade gestora e da liquidação. Nestes casos, os participantes são partes legítimas para o recurso judicial do acto de substituição da entidade gestora (para o tribunal administrativo) ou de actos de liquidação dos fundos (para os tribunais cíveis, salvo o acto de aprovação das contas dos fundos, que é um acto administrativo, recorrível para os tribunais administrativos), não por serem representantes dos fundos, mas porque têm direitos (de audição prévia obrigatória e de maioria obstáculo no caso de substituição e de promoção de liquidação) consagrados na lei que podem em consequência ser impugnados judicialmente. Mas fazem-no, não enquanto representantes dos fundos, mas enquanto titulares de uma quota-parte dos mesmos.” (sublinhado nosso).

A não se aceitar esta extensão da personalidade judiciária aos Fundos de Investimento Imobiliário, não se vislumbra como salvaguardar a autonomia patrimonial do Fundo, que se manifesta, designadamente, na sua irresponsabilidade pelas dívidas dos participantes ou da sociedade gestora, ou, ainda, de outros fundos administrados pela mesma sociedade.

3.2. Porém, vindo aquela exceção arguida na contestação do referido Fundo, como decorrente da sua extinção, e documentada a comunicação da deliberação da Assembleia de Participantes do “G”, do dia 7 de Agosto de 2008, de proceder à liquidação do fundo, a ocorrer “previsivelmente (…) no próximo dia 12 de Agosto de 2008, e a comunicação por parte da mesma D, S.A.”, da concretização, no dia 14 de Agosto de 2008, da “distribuição pelos participantes do “G” do produto da liquidação do Fundo – vd. folhas 346 e 347 – nada foi oposto pela A. nem pelos demais réus.
Importando por isso julgar provada tal liquidação, verificável já à data da propositura da ação, a saber, 23-09-2010.

Certo a propósito prever-se no art.º 34º do dito Regime, a liquidação do fundo de investimento e os termos em que a mesma se deverá realizar.
Sendo que tratando-se, como se trata, de um Fundo fechado – ou seja um Fundo cujas unidades de participação são em número fixo, cfr. art.º 3.º, n.º 3 do RJFII – contempla a lei a deliberação dos seus participantes no sentido da liquidação do Fundo, vd. art.ºs 47º e 45º, n.º 1, alínea g) do mesmo RJFII.

Ora, conquanto reportado ao anterior regime jurídico dos fundos de investimento imobiliário - Decreto-Lei nº 294/95, de 17 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 323/97, de 26 de Novembro – mantém plena atualidade, no confronto do RJFII estabelecido pelo Decreto-lei n.º 60/2002, o considerado por Alexandre Brandão da Veiga, a propósito do momento de extinção do fundo de investimento: “Não definindo a lei, mais uma vez, de modo sistemático, qual o momento de extinção do fundo, apenas podemos estabelecer conclusões com base em construção dogmática. Há que distinguir a liquidação compulsiva da liquidação não compulsiva.
Em ambos os casos, a liquidação não pode encerrar enquanto não houver partilha integral. (…) No caso da liquidação não compulsiva, a liquidação termina com o encerramento das contas pela entidade gestora. O momento do termo da liquidação é o momento da extinção do fundo. A extinção do fundo tem como consequências o termo dos deveres das entidades gestora e do depositário e a caducidade da autorização administrativa do fundo (…) é o acto de encerramento da liquidação ou a sua aprovação que têm de ser os últimos momentos de vida deste mesmo fundo”.
[13]

Sendo assim apodítico que por via da sua liquidação o Fundo G se encontrava extinto à data da propositura da presente ação.
E, logo, não lhe assistia personalidade judiciária.

Devendo pois esse Fundo, na procedência da correspondente exceção dilatória, ser absolvido da instância.

4. Da omissão quanto à requerida condenação da R. Fundo B, representada pela C, como litigante de má-fé.
Alega a A./recorrente que “na sua réplica, atendendo aos factos trazidos aos autos pelas RR. 4857 e Fundo G, pediu a condenação da R. Fundo B, representada pela C, como litigante de má-fé.”.
Sendo que “Também quanto a este pedido nada diz a sentença recorrida, havendo mais uma vez omissão de pronúncia, nos mesmos termos supra expostos.”.

Da substanciação da acusada má-fé ocupou-se a A. nos art.ºs 14º a 25º da sua réplica.
Ora, exercendo “o contraditório” sobre tal pedido de condenação por litigância de má-fé, apresentou a C – assim e afinal em representação do “B” – extenso articulado onde impugna a versão apresentada pela Ré “D” e pelo Fundo G.
Referindo expressamente, e a sintetizar, que “nessas circunstâncias, não correspondem à verdade as afirmações, muito convenientemente tecidas pela D e nas quais a Autora fundamenta o pedido de condenação do Fundo e da C como litigantes de má-fé.”.
E ser “absolutamente falso que, quer o Fundo, quer a C, tenham alguma vez assumido honrar as responsabilidades de um “Contrato” que não foi minimamente considerado nas premissas do negócio.”.
Rematando – depois de outras considerações quanto à inexistência, por parte do mesmo Fundo e da C, da intenção de clamorosa chocante ou grosseira alteração dos factos, ou omissão dos mesmos – com a improcedência da “pretensão de litigância de má fé alegada pela Autora”.

Logo assim se alcançando tratar-se, aquela de que a A. conclui a acusada litigância de má-fé, de matéria controvertida.

Por isso – e desde que, em sede de saneador, se julgou o Réu “B”, representado pela “C, S.A.”, como parte ilegítima, e a Ré “D, S.A.”, destituída de personalidade judiciária, absolvendo-os da instância, mais se considerando “prejudicado”, e afinal, o conhecimento da arguida falta de personalidade judiciária da Ré/interveniente Fundo G, “em razão da procedência da excepção de falta de personalidade judiciária e de legitimidade das RR.” – não podia nem tinha que se conhecer de tal má fé processual.

Não se verificando pois a, nesta vertente, pretendida omissão de pronúncia.

Com improcedência das correspondentes conclusões da Recorrente/A.

II – 2 – Da legitimidade do Réu “B”.
A decisão recorrida equacionou a ausência de tal pressuposto processual, relativamente àquela Ré, nos seguintes termos:
“Ora a alegação da Autora constante do seu articulado torna evidente que a mesma radica o petitório no inadimplemento do contrato promessa celebrado com a Ré D, SA. em relação ao qual o B, SA,(?) é res inter alios.
É o que resulta do disposto no art. 406º/2 do CPC no qual se acha plasmado o princípio da eficácia relativa dos contratos, estipulando que em relação a terceiros, o contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei, correspondendo ao brocardo latino res inter alios acta, aliis neque nocet neque prodest.
Ora da alegação constante da petição inicial não emerge factualidade através da qual se possa considerar que o R. se tenha tornado devedor da A., já que a parte no contrato invocado como causa de pedir é apenas esta e a R. D, SA.”.

Convergindo a recorrente/A. e a recorrente/ré, G, quanto a tratar-se esta de questão de que se não poderia conhecer logo no saneador, por isso que alegados foram pela A. factos de que, se provados, decorre a sucessão do R. Fundo B nos direitos e nas obrigações do anterior proprietário do prédio.
E, desde já se adiantará, assiste-lhes razão.

Não sofre crise aferir-se a legitimidade processual das partes – correspondente à titularidade do interesse direto em demandar e em contradizer, respetivamente – em função da posição daquelas na relação jurídica controvertida, tal como ela é configurada pelo autor, cfr. art.º 26º, do Código de Processo Civil de 1961 (sem alterações no art.º 30º do novo Código de Processo Civil).
Ora a A. fundamenta o seu petitório na celebração em 14 de Fevereiro de 2007 de contrato com “a empresa D, S.A.,, então proprietária do E e senhoria da A., por via do qual “acordaram numa série de alterações aos contratos de arrendamento existentes, respeitantes a diversas partes do E, cessação de uns, alteração das condições contratuais de outros, 17. utilização de outras partes do palácio em regime de comodato, alterações ao valor das rendas, etc.”.
E “18. Nos termos do disposto na Cláusula 4ª do Contrato, a referida D fez uma promessa unilateral de arrendamento à A., relativamente à loja, sita no palácio, com entrada pelos nºs 48 e 48-A. 19. da qual era arrendatário, na altura, I, 20. e onde funcionava o estabelecimento comercial da empresa J, 21. obrigando-se a celebrar com a A. novo contrato de arrendamento, 22. e obrigando-se ainda a não transmitir a sua posição de proprietária daquela loja, sem o consentimento prévio da A., a prestar por escrito.
29. Em 29 de Julho de 2008, a A. foi notificada pela empresa G e pelo G, este gerido pela empresa H, S.A., nos termos da carta que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais,
30. de que ambas as empresas iriam fazer uma permuta entre um imóvel de que era proprietário o Fundo G, e o E, propriedade da 4857.
31. Mais informaram que, imediatamente após essa permuta, sucessivamente, no mesmo dia, hora e cartório notarial, o Fundo G venderia o E ao R. Fundo B, gerido pela R. C.
32. A A. foi, nos termos da mesma carta, notificada para exercer o seu direito de preferência sobre a aquisição,
33. e de que o mesmo implicava, para o (s) adquirente (s) a assunção da posição contratual de senhorio nos contratos de arrendamento existentes, com excepção do contrato de arrendamento da parte do E correspondente à antiga casa da porteira.
34. Nada mais foi excepcionado na referida comunicação.
50. Facto é que a A. tem uma expectativa legítima e fundada num contrato,
51. o qual foi legitimamente aceite por todas as partes intervenientes, mesmo que sucessoras nos contratos de permuta e compra e venda,
52. até porque todas as obrigações nascidas do contrato celebrado entre a A. e a D, segundo foi confirmado à A. pela 4857, foram reconhecidas e aceites,
53. tanto que estão a ser aplicadas, nomeadamente no que às rendas diz respeito.
55. Acresce, ainda, que o negócio feito entre a 4857 e o G, e consequentemente com as RR., uma vez que se tratou de um só negócio, embora com actos notariais diferentes, foi-o sempre com o perfeito conhecimento por parte do Fundo G de que a permuta implicava a transmissão de todas as obrigações que a 4857 tinha para com a A.,
56. tendo os legais representantes da 4857 informado os legais representantes do Fundo G dessa transmissão das obrigações nascidas do contrato de 14 de Fevereiro de 2007,
57. tendo este facto sido comunicado à A. pelos representantes da D.
80. Acontece que a A. está a ser usada pelas RR. um pouco como bola de ping-pong e arma de arremesso: a D diz que transmitiu para a C todos os direitos e obrigações nascidas do contrato que celebrou com a A., e que existem documentos que comprovam essa situação (que a A. desconhece, porque não teve intervenção nesses negócios).
81. Por sua vez, a C remete para as escrituras celebradas, nas quais a D não transmite formalmente quaisquer encargos ou obrigações que digam respeito à A..
82. E ambas as RR. se divertem, alegremente, a ver a A. numa situação de desespero, atirando as culpas uma para cima da outra, mas nada resolvendo.
118. A integralidade da propriedade do E é transmitido por permuta pela proprietária originária a uma empresa terceira, que, por sua vez, e de imediato, transmite essa mesma propriedade por venda ao actual proprietário, o Fundo B, ora Réu.
119. As transmissões da propriedade efectuadas, e referidas no artigo anterior, são-no conjuntamente com as obrigações nascidas do contrato,
120. as quais eram do conhecimento dos adquirentes,
121. que nunca as excepcionaram, segundo o que foi referido à A. pelos legais representantes da R. D,
122. nem na altura da celebração dos negócios aquisitivos,
123. nem na altura em que a A. notificou as RR. para a celebração do contrato, assim que teve conhecimento do acórdão que decretou o despejo dos anteriores inquilinos da loja.”.

Neste conspecto – e sendo outra a questão da prova de factos que tais – temos que o Fundo B, adquirente do prédio de que a A. é locatária, e sucessor na posição de locador, relativamente aos contratos de locação celebrados com a A. tendo como objeto espaços do prédio respetivo, aceitou todas as obrigações emergentes do contrato de 14 de Fevereiro de 2007, e assim, designadamente, a da “promessa unilateral de arrendamento”, consignada na cláusula 4ª daquele.
E, deste modo, para lá de tal cláusula 4ª não respeitar diretamente à economia de qualquer um dos contratos de arrendamento vigentes, em que a A. é locatária.
Mas sendo também evidente – o que aliás resulta marginal, perante o alegado “reconhecimento e aceitação” "por todas as partes intervenientes, mesmo que sucessoras nos contratos de permuta e compra e venda”, de “todas as obrigações nascidas do contrato celebrado entre a A. e a D” – que a inserção da sobredita cláusula surge como estruturante do equilíbrio negocial então alcançado, que passou pela revogação do contrato de arrendamento “mencionado no considerando b1 supra”, pela redução do “objecto do contrato de arrendamento mencionado no Considerando b2 supra”, e pela prorrogação da “duração do contrato de arrendamento mencionado no Considerando b3” – vd. cláusula 1ª – com redefinição de renda quanto àqueles dois subsistentes contratos de arrendamento, cfr. cláusula 3ª.

Sendo assim pois sem necessidade de discorrer quanto à natureza do contrato de locação, de que parte da doutrina – em especial Oliveira Ascensão[14]  e, numa primeira fase, Menezes Cordeiro[15] – tem defendido decorrer para o locatário um direito real de gozo, enquanto para a doutrina tradicional maioritária, e jurisprudência uniforme[16] - o direito do locatário tem natureza meramente creditícia.[17]

Não pode pois recusar-se legitimidade passiva ao “B”, assim sujeito da relação material controvertida, configurada pela A.

Procedendo pois, também nesta parte, as conclusões das Recorrentes.
*
Devendo a ação prosseguir seus termos, relativamente ao R. “B”, representado pela “C, S.A.”.

III - Nestes termos, acordam em julgar a apelação da A. parcialmente procedente, e a do Interveniente “Fundo G” totalmente procedente, e julgam este fundo destituído de personalidade judiciária, absolvendo-o da instância, e o “B”, parte legítima, devendo a ação, se a tanto nada mais obstar, prosseguir termos, contra aquele Fundo, subsistindo, no mais, a decisão recorrida.

Custas, na apelação da A., por esta e pelo R. B, na proporção de 5% para aquela e 95% para este, e na apelação do Fundo G, apenas pelo mesmo B.
*
Lisboa, 2014-04-03

Ezagüy Martins

Maria José Mouro

Maria Teresa Albuquerque

[1] Assim, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado, Rui Pinto, in “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 673, nota 4.
[2] Ibidem.
[3] In op. cit., Vol. 1º, 1999, pág. 566.
[4] Ainda e sempre, na hipótese dos autos, o Código de Processo Civil de 1961.
[5] In op. cit., Vol. 1º, pág. 576.
[6] Idem, pág. 670.
[7]A que corresponde o art.º 665º, n.º 1, do novo Código de Processo Civil. 
[8] Proc. 08B402, Relator: OLIVEIRA ROCHA, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[9] In “Direito Processual Civil”, Vol. II, FDL, Lisboa, 1974, págs. 14-15.
[10] In op. cit., pág. 15.
[11] In “Acção Declarativa à Luz do Código Revisto”, Coimbra Editora, 3ª edição, págs.354-355.
[12] In “Fundos de Investimento Mobiliário e Imobiliário – Regime Jurídico”, Almedina, Coimbra, Abril 1999, págs. 407-408.
[13] In op. cit., pág. 295.
[14] In “Direito Civil – Reais”, 5ª ed., Coimbra, 1993, págs. 534 e seguintes.
[15] In “Da natureza do direito do locatário”, Lisboa, 1980, págs. 13 e seguintes.
[16] Dando conta dessa uniformidade, a nível do Supremo Tribunal de Justiça, veja-se Pinto Furtado, in “Manual de arrendamento urbano”, Vol. I, 4ª ed., Almedina, 2007, pág. 59, nota 68.
[17] Assim, Januário Gomes, in “Constituição da relação de arrendamento urbano”, Almedina, Coimbra, 1980, págs. 122 e seguintes; P. Lima e A. Varela, in “Código Civil, Anotado”, Vol. II, 4ª ed., Coimbra Editora, 1997, págs. 479-480, e Menezes Leitão, in “Direito das Obrigações”, Vol. III, 2ª Ed., Maio de 2004, págs. 301, 302.  

Decisão Texto Integral: