Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7918/20.2T8SNT-E.L1-6
Relator: MANUEL RODRIGUES
Descritores: ACÇÃO DE REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA ALTERNADA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - O exercício conjunto, pelos progenitores, de responsabilidades parentais relativamente a filho menor pode coexistir com uma das seguintes situações: i) exercício conjunto com fixação de residência habitual da criança junto de um dos pais; ii) exercício conjunto com alternância de residência da criança, de acordo com um determinado período temporal; iii) e exercício conjunto com permanência da criança na casa de morada de família, vivendo com os pais alternadamente (art.º 1906.º, n.ºs e 1 5 do Cód. Civil).
II - O artigo 1906º do Cód. Civil não veda a hipótese de guarda alternada, não existindo outrossim impedimento à existência de dois ou três domicílios do menor, assim como sucede com qualquer pessoa que resida alternadamente em diversos lugares (artigo 82º n.º 1 do Cód. Civil).
III - Mesmo não existindo acordo entre os pais, a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais – artigo 1906.º do Cód. Civil –, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes ou se mostrar que a medida não promove os interesses do filho, porquanto, em abstrato, é a situação que se encontra mais próxima da vivência em comum entre pais e filhos e melhor promove as vantagens daí resultantes para a criação, desenvolvimento e solidificação dos vínculos afetivos próprios da filiação.
(Sumario elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: *
I – Relatório[[1]]
1.1. AA… intentou, em 11-06-2020, a presente acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais, relativamente à filha BB…, contra CC…, mãe da menor, pedindo que a fixação de um regime de guarda partilhada, com residência alternada junto de cada um dos progenitores.
1.2. Citada, a requerida não apresentou alegações.
1.3. Entretanto, o requerente atravessou nos autos três requerimentos a juntar meios de prova e a comunicar aos autos condutas da requerida que reputa lesivas do são e normal desenvolvimento da menor BB…, filha de ambos, tendo requerido, inclusive, que a progenitora fosse submetida a uma avaliação psicológica.
1.4. Em 18-11-2020, realizou-se Conferência de Pais (cfr. acta com a ref.ª Citius 127845454), no âmbito da qual não lograram os progenitores chegar a acordo, tendo a Exma. Juiz a quo proferido a seguinte decisão provisória de regulação da responsabilidades parentais:
Tendo em conta as declarações de todos os presentes e os elementos juntos aos autos, verifica-se que os pais desta criança vivem perto um do outro, a criança completa dois anos de idade em Fevereiro de 2021, o pai tem outra filha, que se encontra em regime de guarda partilhada, em semanas alternadas, com a qual a mãe conviveu durante o período de tempo que viveram juntos, é benéfico para o equilíbrio psicológico da criança que se proceda a um desmame progressivo do consumo de leite materno, tendo em conta também as necessidades de ingestão pela menor de outro tipo de alimentos, nomeadamente sólidos, que não foi apontado pelo pai, nem pela mãe a incapacidade de um deles para prestar à filha os cuidados básicos de que a mesma necessita, sendo que é ainda grande o conflito que opõe estes progenitores, o que torna impossível na presente data o acordo dos mesmos na fixação de um regime definitivo de Regulação do exercício das Responsabilidades Parentais desta criança.
Urge, no entanto, a fixação de um regime que apazigue o relacionamento dos pais um para com o outro, que lhes permita programar a sua vida em função dos tempos em que irão estar com a criança e que permita também à criança desfrutar em qualidade do período de tempo em que está com cada um dos pais, com reflexos no seu bem-estar físico e psicológico.
Assim sendo, nos termos previstos nos art.ºs 28º e 38º, alínea b) do RGPTC, decide-se regular provisoriamente o exercício das responsabilidades da menor BB…, nascida a 14 de Fevereiro de 2019, nos seguintes termos:
1. A menor, BB…, fica entregue aos cuidados da mãe e com ela residindo, cabendo a ambos os progenitores o exercício das responsabilidades parentais da filha;
2. Fixa-se a residência da menor junto da mãe;
3. Até completar dois anos de idade, a menor ficará com o pai em fins-de-semana, de 15 em 15 dias, de 6ª feira a domingo, indo o pai buscá-la e pô-la a casa da mãe, pelas 18h de cada um dos dias, com início a 21 de Novembro de 2020;
4. Nos dois meses seguintes a menor estará com o pai de 5ª feira a domingo, de 15 em 15 dias, indo buscá-la e pô-la a casa da mãe pelas 18h de cada um dos dias, com início a 14 de Fevereiro de 2021 até 14 de Abril de 2021;
5. Após esse período de tempo a menor estará com o pai de 4ª feira a domingo, de 15 em 15 dias, indo o pai buscá-la e pô-la a casa da mãe pelas 18h de cada um dos dias, com início a 14 de Abril de 2021;
6. Todas as 4ª feiras das semanas em que a menor não fica a dormir em casa do pai, o pai irá buscar a menor à escola ou a casa da mãe, pelas 15h, e entrega-a em casa da mãe até às 20h, já jantada;
7. A menor passará, alternadamente de ano para ano, com cada um dos progenitores, o Natal, o Ano Novo e a Páscoa, sendo este ano o Natal passado com a mãe e indo o pai buscar a menor a casa da mãe às 9h do dia 31 de Dezembro de 2020 e entregá-la em casa da mãe no dia 3 de Janeiro de 2021, pelas 18h;
8. No dia de aniversário da menor, a menor almoçará com um dos progenitores e jantará com o outro, alternadamente de ano para ano;
9. No dia da mãe, no dia de aniversário da mãe, no dia do pai e no dia de aniversário do pai, a menor passará o dia com o respectivo progenitor;
10. No dia de aniversário da irmã da menor (filha do pai), a menor passa o dia com o pai e com a irmã;
11. No verão de 2021, a menor passará com o pai uma semana de férias a coincidir com o aniversário do pai;
12. A partir do verão de 2022, a menor passará as duas primeiras semanas de Agosto com o pai;
13. O pai contribuirá, a título de pensão de alimentos para a menor, com a quantia mensal de €200,00 (duzentos euros), a entregar à mãe através transferência bancária, até ao dia 8 do mês a que respeitar, devendo esta quantia ser actualizada anualmente, de acordo com o índice de inflação publicado pelo INE.
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Declara-se suspensa a presente instância.
Solicite à EMAT de Sintra a intervenção de técnico especializado nos presentes autos, enviando cópia dos requerimentos das partes e da presente acta, não se designando nova data para continuação da presente diligência, tendo em conta os atrasos dos serviços, devido ao volume de trabalho pendente, manifestado noutros processos de igual natureza.
Passe certidão da presente decisão caso as partes, os seus patronos ou mandatários solicitem.
Notifique.”
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1.5. Em 29-03-2022, a EMAT Tutelar Cível de Lisboa elaborou relatório sobre audição técnica especializada juntos aos autos principais em 30-03-2022, no qual fez constar, além do mais o seguinte:
“(…) foram analisados na entrevista conjunta, os pontos acima referidos, obtendo-se a seguinte concordância/não concordância/concordância parcial, nas matérias que se passam a transcrever:
Ponto 1 e 2 – o pai mantém a sua pretensão de se definir uma residência semanal alternada da filha BB…, no presente com 3 anos de idade, casa do pai e casa da mãe, mantendo os motivos apresentados na sua petição inicial, tais como, dificuldades de comunicação com a mãe, obstáculos desta na sua relação com a filha, negligência da mãe nos cuidados alimentares da filha, etc.; o que é refutado pela mãe que pretende a prossecução da residência fixa da filha, fundamentado nas dificuldades de comunicação entre os pais, atitudes agressivas e impositivas do progenitor, negligência nos cuidados de higiene da filha e de saúde, quando passa os fins-de-semana com o pai, em que este a entrega com febre, assada no rabinho e zona genital e mal da barriga, recorrendo a consultas no hospital, em que é diagnosticado gastroenterite, infeção urinária, laringite, etc., conforme documentos apresentados ao pai e entregues fotocópias nesta EMAT. Perante o descrito apurou-se que a mãe interpôs processo (Apenso A) a requerer a residência fixa da filha e a redução dos fins-de-semana da filha com o pai.
No respeitante, ao exercício das responsabilidades parentais da filha nas questões de particular importância atribuída a ambos, apesar de haver concordância nesta matéria, existem dificuldades na sua capacidade de comunicação inerentes às suas características individuais e estilos de vida, em particular, que interferem no seu entendimento quanto aos cuidados a ter com a filha comum, consenso a tomar nas decisões que respeitam aos aspectos educativos e de saúde da filha, acusando-se mutuamente de alguns aspectos de negligência relativos aos hábitos alimentares que cada um inclui na alimentação da menor, nos cuidados de higiene da mesma com repercussões no seu bem-estar, e nos recursos aos serviços de saúde nessas ocasiões.
Ponto 3, 4 e 5 – a relação da menor com o pai em termos dos tempos graduais definidos nestes pontos foram cumpridos em conformidade, e mantém-se no presente na sua funcionalidade, em que a BB… está com o pai de 4.ª feira a domingo, quinzenalmente, sendo as deslocações asseguradas pelo pai, que vai buscar e levar a menor a casa da mãe. Perante os desentendimentos entre os pais e acusações mútuas quanto a condutas de negligência nos cuidados de higiene e alimentares, abaixo referenciados, aferiu-se que no processo que a mãe interpôs requereu a redução dos dias de fim-de-semana da filha com o pai, para o estágio anterior, de 6.ªfeira a domingo.
Ponto 6 – as 4.ª feiras das semanas em que a menor não fica a dormir em casa do pai está em curso, tendo os seus horários sido reajustados, uma vez que ficou estipulado das 15 horas até às 20 horas, e está a decorrer entre as 14 horas e as 21 horas.
Ponto 7 – as épocas festivas (Natal, Ano Novo e Páscoa) ficou estipulado que a menor passaria os mesmos de modo alternado, o que tem sido cumprido, apesar de não haver concordância entre os pais em relação ao Natal. A mãe pretende que o Natal seja partilhado entre a Véspera e o Dia de Natal considerando a convivência familiar nesta época festiva, o que não foi aceite pelo pai, devido às suas deslocações para o Alentejo, de modo a estar com a sua família alargada.
Ponto 8, 9 e 10 – o aniversário da menor, aniversários dos pais e aniversário da irmã consanguínea, foi referenciado por ambos os pais como estando a ser vivenciado de acordo com o definido no regime provisório.
Neste ponto, a mãe pediu que os aniversários dos primos da BB… (1 de Novembro do primo Afonso, e 25 de Outubro do primo GG..), quando coincidisse com o fim-de-semana do pai, pudesse ser alterado ou que a BB… pudesse estar presente nestas datas festivas, o que não foi aceite pelo pai, porque pretende ir para o Alentejo nos seus fins-de-semana, para estar com a sua família (mãe/avó materna da menor). Foi igualmente referenciado que os aniversários das respectivas avós deveriam ser inclusas nesta análise, o que não se concretizou.
No entanto, ressalva-se que individualmente, cada um reconhece a importância da família na vida dos próprios e da BB…, sendo mencionado que as avós, tia materna, tio paterno, primos maternos e paternos, são pessoas de referência na vida da BB…, conquanto, o pai não tenha acedido no reajustamento requerido pela mãe.
Ponto 11 e 12 – nas férias referentes ao ano transacto a menor passou uma semana de férias com o pai coincidindo com o aniversário deste. Todavia, foi reportado que o pai interpôs processo judicial (Apenso B) porque pretendia acrescentar mais uma semana de férias com a filha, e não houve entendimento entre os pais da BB….
No corrente ano ficou definido que a menor passaria a primeira quinzena com o pai, requerendo a mãe que este período seja repartido em semanas alternadas, o que não foi aceite pelo pai, por pretender deslocar-se para o Alentejo (casa de sua mãe) e conjugar estas férias com as da irmã DD… e restante família alargada paterna.
A mãe informou que tirou férias para estar com a filha na última semana de Julho, uma vez que a BB… irá estar com o pai na 1.ªquinzena de Agosto, mas coincidindo, a partir de 4.ªfeira, com o fim-de-semana com o pai, esta irá estar duas semanas e meia com o pai, pelo que, a mãe pediu ao pai para ficar com a filha durante a semana, não tendo o pai acedido neste pedido.
Foi ainda proposto que, os meses de Julho e Agosto, a BB… passasse semanas alternadas com cada um dos pais, o que não foi aceite por ambos.
Ponto 13 – a pensão de alimentos estipulada de 200€ está a ser liquidada, não se configurando este aspecto como consensual, na perspectiva de, se for implementada uma residência semanal alternada, o pai deixa de liquidar uma pensão de alimentos.
Todavia, do que foi abordado conjuntamente, as despesas de saúde da filha não estarão a ser compartilhadas, pelo desacordo quanto às mesmas, tendo-se informado que as mesmas devem ser comprovadas e constar o nome da BB….
Quanto às despesas de Educação da BB…, a serem equacionadas a partir do próximo ano lectivo, estas não foram consensuais.
A mãe pretende inscrever num colégio particular, “Os M…”, por considerar que se trata de um bom colégio a nível de ensino/formação pedagógica, o que obteve a não concordância do pai, que pretende que a filha frequente um jardim infantil público, designadamente, no Agrupamento de Escolas D. … ou na …, em Massamá/Queluz. Estas propostas não foram aceites pela mãe, que manteve a sua pretensão, verbalizando que assume os custos na integra com o Colégio particular acima referido.
Nas suas fundamentações, o pai transmitiu que o trânsito existente no percurso da casa da mãe ao equipamento de infância na sua área de residência, em termos de acessibilidade, no período da manhã, é mais fácil, do que da sua casa para o equipamento na zona de residência da mãe - Lisboa. Do apurado, a mãe mantém a sua intenção em inscrever a filha no referido colégio particular em Lisboa, pelos motivos apresentados e não reconhecimento da mesma qualidade de ensino nas escolas apresentadas pelo pai. Por sua vez, este assume que quer dar o mesmo tipo de oportunidades escolares a ambas as filhas, relembrando a mãe ao pai que a sua filha DD… andou num colégio particular até concluir o ensino básico. Nesta comparação, o pai acede na frequência de um colégio particular, persistindo que o mesmo deve ser na sua área de residência, pelos motivos explanados.
Sobreveio, nesta diligencia, acusações mútuas, de não cedência, que na generalidade foram demonstradas por ambos.
- Dados relativos à menor dos autos:
BB…, no presente com 3 anos de idade, é a única filha resultante do relacionamento mantido entre o requerente e a requerida (progenitores), que terá perdurado desde o ano de 2018 quando se conheceram e iniciaram uma proximidade relacional amorosa em que resultou numa gravidez não planeada que induziu a uma vivência conjunta, no final desta gestação considerada de risco.
O termo da relação veio a acontecer em Junho de 2020, cessando a coabitação, por motivos associados ao desgaste relacional e uma vivencia descrita como pautada por discussões recorrentes, após o nascimento da filha, pelos estilos de vida preconizados por cada um. O requerente imputa uma conduta da requerida centrada na filha desde o nascimento da mesma, considerando que as suas atitudes e comportamentos eram excessivos a nível protectivo, tais como, o não sair de casa por a filha não ter as vacinas nos primeiros meses de vida, o recurso à mama quando a filha chorava, e o sentimento de posse relativo à filha que atribui à requerida/progenitora. Em suma, no seu entender, a requerida evidenciava dificuldades em saber gerir e ou autocontrolar-se em todas as situações vividas pela filha recém-nascida, e no seu processo de crescimento.
Por sua vez, a requerida verbalizou que não teve o apoio do requerente nos cuidados da filha, ausentando-se de casa durante muito tempo, desenvolvendo actividades com os amigos e a ex-companheira, e quando estava presente, reclamava por qualquer situação mediante o recurso de impropérios sobre o seu estado físico e desinteresse na relação de casal. Sentiu-se sozinha a cuidar pela primeira vez de um bebé recém-nascido.
À data da separação dos pais a BB… tinha em torno do ano e quatro meses de idade, altura em que se mudou com a mãe para uma casa localizada nas proximidades da residência do pai, em Massamá. Nesta altura, o progenitor transmitiu que via a filha aos sábados e sem pernoita, relatando que os convívios com esta filha passaram a ser mais amplos a partir da decisão do Tribunal no âmbito do presente processo interposto por si.
A menor BB… terá permanecido em casa até aos seus nove meses de idade, aos cuidados dos pais, embora com descrições nem sempre coincidentes sobre quem assumia diariamente os cuidados da mesma. Nesta altura integra o Colégio … em Massamá, onde terá permanecido até ao ano de idade, sendo a sua frequência referida como irregular, face aos sintomas de febre, expetoração, etc., em que ficava em casa. A mãe explicitou que nesta fase a filha esteve por diversas vezes doente com laringites, bronquiolites, otites, viroses, etc., permanecendo o pai em casa com a filha, por se encontrar em teletrabalho, sendo que o progenitor desvalorizava estas doenças da filha. A própria também ficou algumas vezes em casa com a filha doente. As divergências relacionais e comunicacionais acintosas culminaram na sua saída de casa com a filha, pertença do progenitor, e em comentários de maledicência deste aos amigos sobre si, todavia, transmitiu que arrendou uma casa próxima, onde a filha ficava durante o dia com o pai por este estar em teletrabalho, e pernoitava em casa com a mãe.
É neste contexto que recebe a notificação judicial relativo ao presente processo sem que o requerente tenha ensaiado qualquer tentativa de acordo consigo sobre a filha, situação que a desgostou. Seguidamente, descreve algumas ocorrências que a desagradaram, tais como, duas viagens para o Alentejo com a filha, sem que tivesse tomado as devidas providências necessárias aos cuidados de higiene da filha (fraldas, muda de roupa, etc.).
A partir da decisão judicial quanto à regulação das responsabilidades parentais, que o regime provisório veio implementar uma funcionalidade que considera nem sempre estar adequada ao bem-estar da filha, na medida em que o pai não atende o telefone quando lhe telefona para saber notícias da filha e falar com a mesma. Contrariamente, não se opõe a estes contactos sendo que o pai raramente telefona para saber como a filha está, e de modo a preparar o saco com a roupa e os bens essenciais aos cuidados da mesma, conforme o prepara quando a filha vai para o pai, aos fins-de-semana.
Com a situação epidemiológica marcante a partir de Março de 2020, Covid 19, BB… deixa de frequentar o Colégio, e tem permanecido em casa com a mãe e o pai, nos tempos e momentos afectos a cada um, de acordo com o regime provisório estipulado judicialmente, em Novembro de 2020, e que está a decorrer.
Actualmente, apesar de equacionarem a integração em equipamento de infância adequado à faixa etária da BB…, inexiste concordância quanto à escolha do mesmo, pretendendo a mãe inscreve-la no Colégio particular, “Os M…”, localizado perto da sua residência actual, e pelo reconhecimento pedagógico, ou na Escolinha perto da sua casa que aparentemente terá uma lista de espera elevada e possivelmente sem possibilidade de a BB… integrar a mesma, embora não considere ter a mesma preponderância ao nível do ensino, enquanto que, o pai equaciona a inscrição da filha numa Escola pública ou privada que esteja situada nas imediações da sua futura morada, em Queluz, por considerar que estas são igualmente qualificadas, e ainda, pelo tempo associado ao trânsito impactante no percurso/deslocações inerentes à gestão do quotidiano da filha entre as respectivas casas dos pais e o equipamento de infância que irá integrar.
Da observação pontual e circunstancial da menor em ambos os contextos familiares e habitacionais, constactou-se que a menor demonstra numa fase inicial timidez na interacção com pessoas desconhecidas, recorrendo à proximidade física com ambos os pais (nestas deslocações a observação da menor foi circunscrita à sua interacção com a figura materna - casa da mãe, e figura paterna - casa do pai). Apesar da timidez patenteada, a BB… requer a atenção dos adultos e a sua participação nas suas actividades/brincadeiras, mostrando todos os brinquedos que gosta, conquanto, ao nível da comunicação mantenha a sua timidez.
Nestes espaços habitacionais foi evidente que a menor se apropria e se movimenta à vontade e recorre à proximidade física dos pais sucessiva de autonomia nas suas brincadeiras.
- Avaliação das competências parentais
Do percepcionado do contacto com os pais, estes evidenciam motivação e aptidão para o exercício de uma parentalidade inscrita num processo de envolvimento individual responsável. Todavia, ao nível do processo de comunicação e cooperação em que é respeitado o papel do outro progenitor, constactou-se haver uma ambivalência entre a consensualidade e não consensualidade, o reconhecimento ou não da coparentalidade, decursiva das dificuldades ao nível de uma comunicação positiva e centrada nos cuidados e nas necessidades de desenvolvimento da filha comum.
No decorrer da entrevista conjunta, houve momentos de maior ou menor receptividade/disponibilidade manifestada por cada progenitor para chegar a consensos nas matérias em análise, bem como posições firmes e opostas, nas matérias acima descritas, e em que não foi possível a sua obtenção, mediante os motivos alegados.
Contudo, as situações de fragilidade que imputam ao outro em tom acusatório de negligência foi abordado, nomeadamente, os cuidados com os alimentos que podem proporcionar alguma reacção alérgica na menor (ex.º carne de porco, sumos de laranja em excesso, etc.), pela falta de verduras na alimentação da filha e de fruta natural em vez de boiões, segundo verbalizou o pai, a alimentação condimentada que o pai dá à filha e que esta já teve uma gastrite e uma infecção urinária com febres altas, devido à alimentação que o pai dá à filha, que o mesmo desvaloriza, dizendo que não está boa da cabeça, por a levar ao hospital, desvalorizando o estado da filha, segundo a mãe, comentando o pai que a mãe lhe telefona por tudo e por nada, com situações que para si não são graves, considerando as suas atitudes exageradas, a necessidade de se mudar mais regularmente as fraldas e recurso às pomadas para prevenção das assaduras e cicatrização das feridas, pela possível reacção alérgica da menor ao tempo que mantém as fraldas nas viagens de e para o Alentejo de cerca de 2/3horas. Estas situações deveriam ser motivo de atenção e partilha entre os pais e não motivo de acusações mútuas, de modo a verificarem que géneros alimentícios ou outro contexto provoca as reações alérgicas à filha. Ambos reconhecem que a filha bebe muita água.
Em suma, as dificuldades de comunicação e de entendimento relacionado com as questões de particular importância para a filha foram evidenciados, acusando a mãe que o pai diz mal de si na presença de terceiros, e acusando o pai de que a mãe é inflexível e apresenta atitudes extremas pelo que solicitou a avaliação psicológica da mesma.
Nesta contextualização, ambos foram sensibilizados para a importância de uma comunicação mais objectiva e assertiva, de partilha de informação com respostas adequadas e não impróprias, na medida em que no contacto individual não se detectou atitudes e ou comportamentos extremos de desadequação nas respectivas condutas, pelo que, a persistir nesta situação, se deveria solicitar avaliações psicológicas a ambos, o que foi aceite pelos intervenientes em causa. Ambos foram responsabilizados pelos seus actos e discurso, mediante respeito mútuo, e de partilha das informações da filha a serem abordadas entre si e não com interferência de terceiros, coresponsabilizando-se no exercício da parentalidade numa ambiência aprazível e salutar à proximidade relacional e emocional da menor com ambos os pais e respectiva família alargada.
Apesar das posturas divergentes foram constantemente sensibilizados que a tomada de decisões relacionadas com o projecto de vida da filha é da responsabilidade de ambos os pais, e que apesar de os estilos de vida e hábitos alimentares serem diferentes, deviam centrar-se no bem-estar da BB…. Daí a importância da comunicação entre si, a cessação de comentários impróprios em relação ao outro, em particular na presença da filha, o reconhecimento das capacidades e competências do outro a nível da parentalidade, a atenção e preocupação de cada um nos cuidados da filha a serem respeitados, a partilha da informação relativa à saúde e aspectos educativos da filha, a informação/comunicação do local onde a filha se encontra nos períodos de férias e o estabelecimento de contactos adequados com o outro progenitor nessas ocasiões, a serem implementados pelos próprios.
O núcleo familiar materno é constituído pela progenitora, de 36 anos de idade, e pela filha BB…, menor do presente processo, de 3 anos de idade, e residem na morada que consta no frontispício deste documento há pouco mais de um ano.
CC… trabalha como responsável de recursos humanos para a empresa de consultadoria denominada Ne…. Desde Novembro de 2019 que informou que está a trabalhar a partir de casa (teletrabalho), estando efectiva nesta empresa. A sua remuneração líquida mensal incide nos 1600€ acrescido de aproximadamente 170€ de cartão de refeição.
De rendimentos a favor da filha BB… recebe a pensão de alimentos de 200€/mês e a prestação familiar (abono) de 26,27€ mensais.
As despesas mensais mais significativas que mencionou consistem em 750€ de renda de casa, 135€ de consumos domésticos (água, luz e gás), 400€ de alimentação e produtos para a casa, e 180€ de despesas com a filha referentes a fraldas, toalhitas, produtos de higiene roupa.
CC… descreve a filha como uma criança muito extrovertida, feliz, reguila, meiguinha, que gosta de aprender coisas novas, determinada, com iniciativa para fazer sozinha, mas quando não consegue pede ajuda. Considera a sua relação com a filha muito coesa e afectuosa.
BB… em casa da mãe tem o seu quarto que está devidamente preparado, decorado e organizado em funções das necessidades e bem-estar da filha.
As rotinas neste contexto foram descritas da seguinte forma: acorda por volta das 9 horas, toma o pequeno almoço, e a seguir brinca sozinha ou com a mãe. Almoça pelas 12 horas. Come bem e um pouco de tudo. Após o almoço e quando o tempo o permite vão passear até ao jardim, ao parque infantil (baloiços e escorregas), às compras se necessário. Pelas 15h30m lancha, e de seguida se tiver sono pede para dormir, caso contrário brinca. Adora pintar. Ao final da tarde, antes do jantar toma banho, janta pelas 20horas, e em torno das 21/21h30m deita-se. Normalmente, em casa da mãe, dorme no seu quarto, solicitando a companhia da mãe, para adormecer. Dorme bem a noite toda.
As consultas que são marcadas para a filha no Hospital da L.., nomeadamente com a Pediatra, são do conhecimento do pai, porque este recebe as notificações e informações clínicas da filha através da aplicação do referido hospital, e segundo a mãe informa o pai quando marca as consultas, apesar de este desvalorizar as mesmas, acusando a mãe de ser excessiva nos cuidados de saúde da filha. A mãe alega que o pai não é atento aos cuidados de saúde da filha que vem sempre doente da casa do pai.
As situações ante expostas consistiram no motivo pelo qual requereu judicialmente (Apenso A) a alteração das responsabilidades parentais, fixando-se uma residência fixa da filha consigo, e a redução dos dias dos fins-de-semana da filha com o pai, de 6.ª feira a domingo, de 15 em 15 dias, e na 4.ªfeira seguinte, que a filha esteja com o pai das 14horas até às 20/21horas.
Por sua vez, o núcleo familiar paterno é de momento composto por si, e pela filha DD…, presentemente com 13 anos de idade, e que mantém uma residência semanal alternada desde os seus cinco ou seis anos de idade, altura em que houve entendimento com a mãe da filha DD…, a qual tinha aproximadamente dois anos de idade quando os pais se separaram.
Os fins-de-semana alargados da BB…, de 4.ª feira a domingo, estão circunscritos à semana em que tem a filha DD… consigo, promovendo a convivência entre as duas filhas, apesar da idade díspar, e as idas ao fim-de-semana para o Alentejo, de 6.ªfeira a domingo, casa de sua mãe/avó paterna das menores.
O progenitor considera que a sua relação com as filhas é saudável e afável, reconhecendo que apesar das diferentes idades e interesses de ambas divergir, mantêm uma relação afectuosa entre si.
Por norma, vai buscar a BB… a casa da mãe, pelas 19 horas, após ir buscar a filha DD… à Escola/ATL pelas 18horas e 30 minutos. Após chegar a casa, as rotinas incidem nos banhos, jantar, brincadeiras, e pelas 21/22 horas o deitar. No dia seguinte, pelas 7 horas e 20 minutos vão levar a DD… à Escola, e regressa para casa com a  BB…, que nesta altura toma o pequeno-almoço, e permanecem em casa, por se encontrar em contexto de teletrabalho, gerindo as brincadeiras e refeições ao longo do dia com a BB…. Em torno das 17 horas e 30 minutos/18 horas vão buscar a DD… ao Centro de Estudos, e vão para casa, seguindo o mesmo registo do dia anterior. Na 6.ª feira, sucede o mesmo que no período da manhã do dia anterior, e após o termo das aulas da filha DD…, às 13/14 horas, vão busca-la, e normalmente vão passar o fim-de-semana com a sua mãe no Alentejo.
AA…, de 44 anos de idade, informou que trabalha há dezoito anos para a entidade Nat…, empresa do sector energético, como responsável de grandes consumos, mediante um vencimento líquido mensal em torno dos 1900€. De despesas mensais mais significativas que comporta referiu que tem dois créditos à habitação no valor de 800€; 200€ de pensão de Alimentos da filha BB…; 140€ de encargos com a filha DD…, uma vez que não está definida judicialmente o valor de pensão de alimentos desta filha; condomínio de 70€; consumos domésticos das duas casas de 150€; internet e TV de 40€; o que corresponde ao valor de 1400€, salvaguardando-se que as despesas descriminadas não correspondem aos reais encargos mensais que subvenciona.
A filha DD…, de 13 anos de idade, frequenta o 8.º ano de escolaridade, na Escola D. …, em Queluz. Descreve esta filha como sendo muito reservada e preguiçosa. Meiga. Carinhosa. A nível do seu aproveitamento escolar podia obter melhores resultados desde que estudasse um pouco mais.
A filha BB… é muito mexida e irrequieta, sendo igualmente meiguinha. Apresenta dificuldades em ser contrariada e em gerir estas situações, mediante choro compulsivo, que nem sempre é fácil contornar, recorrendo nessas alturas a outras distrações ou à interação com a irmã DD…
Neste espaço habitacional (em Moscavide) as filhas partilham o mesmo quarto (beliche) sendo que na maioria das vezes, a BB… dorme com o pai. Na casa que adquiriu e que está em obras cada uma das filhas vai ter um quarto próprio.
- Disponibilidade relacional/comunicacional
Do percepcionado no decurso das diligências realizadas face ao requerido no âmbito do presente processo, a conflitualidade entre ambas as figuras parentais constantes nas peças processuais inclusas no presente processo, e transmitidas por ambos nas diligências realizadas, mantém-se no presente, necessitando os pais de proceder a uma autorreflexão quanto às suas características individuais distintas, aos reais motivos da sua conflitualidade mantida e acentuada desde a ruptura conjugal, e que interferem na sua interação e comunicação e no respeito mútuo a ser desenvolvido, sem interferências de outrem ou de maledicências em relação ao outro, redimensionando a sua comunicação centrada nos aspectos respeitantes à filha comum BB…, menor a quem se reporta o presente processo, face a idade da mesma (3 anos), e à importância dos pais enquanto responsáveis pelos seus principais cuidados protectivos e educativos.
Ambos os progenitores evidenciam motivação e propósito na assumpção do exercício da parentalidade para com a menor, patenteando condutas de participação na gestão do quotidiano da filha e na satisfação das suas necessidades básicas de acordo com as suas disponibilidades laborais, conquanto, se considere que o processo de colaboração entre si, prevaleça em desarmonia, sobressaindo os posicionamentos que perseveram, conforme ante referenciado.
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Face ao exposto, e da intervenção realizada, junto dos intervenientes do processo, foi passível a reanálise das matérias preponderantes nos autos em conformidade com a pretensão de cada um dos progenitores, sem que houvesse entendimento possível quanto à pretensão patenteada por cada uma das figuras parentais, mantendo-se as atitudes e discurso em tom acusatório em relação ao outro, conforme descrito neste documento.
Considerando a relevância de ser implementada uma melhoria na redefinição das posturas dos pais, e ensaio destes num processo de comunicação mais consentâneo entre si, com recurso ou não terapêutico, com vista a estabelecerem estratégias relacionais e comunicacionais facilitadoras da sua coresponsabilização parental, não se afigura de momento de propor alterações ao regime provisório em curso, na medida em que se perspectiva a breve prazo outras alterações significantes na vida da BB…, tais como, a primeira vez em que estará um período de férias prolongado sem a presença/contacto com o outro progenitor, e ainda, a sua (re)integração em equipamento de ensino adequado à sua faixa etária, que requerem mudanças nas suas rotinas e adaptações a este processo de socialização, sem consensualidade entre os pais. A esta proposta está subjacente o sentir de cada um face às suas características individuais e maneiras de ser/estar e estilos de vida, e de desempenho ao nível da parentalidade, a que se associam os períodos conturbados repercutores na sua capacidade de entendimento desde a fase de gestação até ao presente, que se têm espelhado no exercício das suas responsabilidades parentais, mormente, na coresponsabilização parental para com a filha BB…, presentemente com 3 anos de idade.”
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1.6. Em 02-07-2022 a requerida deu entrada de acção de alteração do regime provisório de responsabilidades parentais (apenso A), pedindo a residência fixa da filha e a redução dos fins-de-semana da filha com o pai, alegando que este negligencia os cuidados de higiene da filha e de saúde, quando passa os fins-de-semana com ele, em que a entrega com febre, assada no rabinho e zona genital e mal da barriga, tendo recorrido a consultas no hospital, onde lhe foi diagnosticado gastroenterite, infeção urinária, laringite, etc..
1.7. Após a ocorrência de algumas vicissitudes processuais, em 30-06-2022 realizou-se nova Conferência de Pais (cfr. acta com a ref.ª Citius 138463323).
1.7.1. Nesta, perante a falta de acordo dos progenitores, ouvidos em declarações, o Ministério Público formulou a seguinte promoção:
“Perante o tempo decorrido desde a implementação do regime provisório fixado nestes autos, a idade da menor e a necessidade da mesma iniciar a frequência de escola, para o que é essencial definir a sua residência, e uma vez que não houve acordo, neste momento, quanto ao exercício das responsabilidades parentais, importa decidir se é de manter o regime provisório fixado nos autos ou se de alterar o mesmo, sendo que a pretensão da mãe é de que o mesmo seja reduzido para a residência exclusiva consigo e os fins-de-semana com o pai ou, no limite, que se mantenha o que se encontra fixado, e que a pretensão do pai é a de que a criança passe a residir consigo em semanas alternadas.
Tendo em consideração o regime vigente até ao momento e que a diminuição do mesmo, como pretendido pela mãe, prejudicaria a menor, desde logo pela diminuição do contato que a mesma vem tendo, desde há algum tempo, com o pai e com a sua irmã e, ainda, que as razões aqui apontadas pela mãe, para que não se implemente o regime de residência alternada não lograram convencer o Ministério Público, entende-se que este é o momento ideal para que se fixe uma residência alternada à menor, ainda que não haja acordo entre os progenitores, assegurando-se assim, e desde já, um convívio igualitário com ambos os progenitores, a estabilidade da criança em termos de residência de inicio de frequência em estabelecimento de ensino, assim se acautelando os interesses da menor.”
1.7.2. E a Senhora Juíza a quo proferiu a seguinte Decisão:
A mãe reputa acusações ao pai de quando a menor vem da casa deste, de que vem recorrentemente, doente, por exemplo, com febre e com situações que terão vindo a culminar em laringites ou vulvovaginites, tendo ainda inclusive reportado, situações de infeção urinária; além disso, ao facto de, recorrentemente, a menor vir com assaduras na vagina e no rabo, derivado ao uso de fralda e ao não asseverar dos respetivos cuidados por parte do pai para que isso não acontecesse.
Sucede também que há cerca de 2/3 meses a menor já não usa fralda, tais assaduras já não se constatam e quanto às doenças que aduz a menor ter sofrido, não está comprovado que a sua eclosão pudesse ser prevenida ou controlada pelo pai.
Tais imputações não são suficientemente fortes para fazer o Tribunal concluir pela não aplicação, ainda que provisoriamente, de um regime de residência alternada, que apenas vem acrescentar ao já implementado regime há mais de ano e meio, mais 2 dias de vivência do menor com o pai.
A menor esta já acostumada a este regime de vivência e a mãe não relata que a menor venha infeliz ou desagradada da casa do pai ou que narre qualquer situação de vivência que faça perigar pelo seu bem-estar físico ou emocional.
Sendo, ainda, premente que a menor integre equipamento de infância, importa desde logo ainda que, em termos provisórios, uma vez que não houve acordo, acautelar a definição da residência da menor, para que a mesma, na nova fase do ingresso escolar que se avizinha, possa ter a maior estabilidade possível.
A aduzida redução de convívios com o pai, como propugna a mãe, é contrária ao superior interesse da criança, conquanto que a mesma priva nos períodos que está com o pai, igualmente com a sua irmã, de quem o pai partilha residência alternada com a respetiva mãe, sendo do seu superior interesse, que a menor passe igual período de tempo com cada um dos progenitores.
Assim sendo, nos termos e para os efeitos dos art.º 28º e art.º 38º ambos do RGPTC, decide-se proceder à alteração do regime de regulação provisório, fixado em 18 de Novembro de 2020, determinando que:
1- A menor fica entregue aos cuidados de ambos os pais, residindo com cada um deles em períodos semanais, semanas que começaram à 6ªfeira, indo cada um dos progenitores buscá-la ao equipamento escolar (quando a menor ingressar no ensino) e entregando-a na 6ªfeira subsequente no mesmo local;
2- Enquanto a menor não estiver a frequentar o ensino, o que acontece presentemente, o progenitor que iniciará a semana, recolhê-la-á e entregá-la-á na casa do outro progenitor;
3- O Natal e Ano Novo serão passados em bloco com cada um dos progenitores –em cada ano, os dias 24 e 25 são passados com um dos progenitores e os dias 31 e 1 com o outro progenitor, o que alterna anualmente; sendo este ano o Natal passado com a mãe e o Ano Novo passado com o pai.
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Tendo logrado infrutífero o acordo entre as partes, cumpra-se o art.º 39º nº4 do RGPTC, notificando-se as partes para, querendo, em 15 dias, apresentarem alegações, arrolarem até 10 testemunhas e juntarem documentos.”
1.8. Posteriormente, por despacho de 28-09-2022 (ref.ª Citius 13906212), aquela Decisão veio a ser alterada, nos seguintes termos:
Na alteração à regulação provisória das responsabilidades parentais relativas à menor BB…, implementadas na conferência de pais do passado dia 30.06.2022, estando em curso a residência alternada, em complemento, ao mesmo, determino, provisoriamente, ao abrigo do artigo 28,º, n.º 1 do RGPTC, que o pai deixa de pagar a pensão de alimentos mensal de €200,00, assegurando cada um dos progenitores a alimentação e as despesas do quotidiano da menor, nas semanas em que a mesma lhes estiver confiada.
No mais, as despesas extraordinárias de educação, designadamente, livros/material escolar, e de saúde, na parte não comparticipada pelo SNS ou outro subsistema de saúde, tais como medicamentos, consultas de especialidade, intervenções cirúrgicas, óculos, aparelhos dentários, próteses e atividades extracurriculares (desde que, de comum acordo, entre os progenitores), serão pagas por ambos os progenitores na proporção de metade, devendo aquele que efetuar a despesa apresentar fatura/recibo com o número de contribuinte da menor até 30 dias da realização da despesa para ser reembolsado pelo outro progenitor da parte que lhe cabe.”
1.9. Inconformada com o decidido, veio a requerida interpor o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão provisória recorrida seja revogada e substituída por outra que “ordene e mantenha a guarda e residência da Menor, BB…, a favor da Mãe, e que reduza o tempo e pernoitas da Criança junto do Pai, ao abrigo de um mero direito de visitas deste”.
Para o efeito, formulou alegações que rematou com as seguintes conclusões:
«1. O objecto do presente recurso é o despacho proferido pelo Douto Tribunal a quo em sede de conferência de pais realizada no dia 30-06-2022, designadamente, nos seus segmentos: 1- A menor fica entregue aos cuidados de ambos os pais, residindo com cada um deles em períodos semanais, semanas que começaram à 6ªfeira, indo cada um dos progenitores buscá-la ao equipamento escolar (quando a menor ingressar no ensino) e entregando-a na 6ª feira subsequente no mesmo local; 2- Enquanto a menor não estiver a frequentar o ensino, o que acontece presentemente, o progenitor que iniciará a semana, recolhê-la-á e entregá-la-á na casa do outro progenitor; 3- O Natal e Ano Novo serão passados em bloco com cada um dos progenitores –em cada ano, os dias 24 e 25 são passados com um dos progenitores e os dias 31 e 1 com o outro progenitor, o que alterna anualmente; sendo este ano o Natal passado com a mãe e o Ano Novo passado com o pai.
2. O objecto do presente recurso define-se assim pela impugnação da alteração do regime provisório fixado, com a oposição expressa da Mãe, em sede da conferência de pais realizada no dia 30-06-2022, na qual foi estabelecido pelo Douto Tribunal de Primeira Instância a alteração do regime de guarda e residência da Menor, BB…, passando abruptamente de um regime de guarda e residência junto da Mãe, para um regime de guarda com residência alternada.
3. Pelo que o âmbito do presente recurso é: o despacho a quo proferido em sede de conferência de pais realizada no dia 30-06-2022 nos seus segmentos supra indicados; b) dos factos e da prova; c) da aplicação do Direito aos factos.
4. Ao decidir, pese embora, provisoriamente, o Douto Tribunal a quo desconsiderou, por completo, as declarações de parte proferidas pela Mãe, no âmbito da Conferência de Pais realizada no dia 30-06-2022.
5. Atendendo às declarações da Mãe, impunha-se decisão diversa daquela que foi tomada.
6. Pelo que deveria ter sido mantida a guarda e residência da Menor, BB…., a favor da Mãe, ora Recorrente, e bem assim, reduzido o tempo e número de pernoitas da Criança em casa do Progenitor.
7. A rutura com a figura de referência da Menor, que é a mãe, com quem passa neste momento 10 dias da semana, para passar a estar afastada 8 dias, salvo melhor e mais douto entendimento, é de uma agressividade extrema para uma criança que não tem idade nem maturidade para perceber e compreender este afastamento e estas alterações. Irá ter consequências desastrosas na sua estabilidade emocional, na sua integração na escola e no seu desenvolvimento futuro. Assim, para além das várias preocupações da Mãe em relação aos competências parentais do pai, este não é de todo o momento indicado para fazer mais uma alteração abrupta em toda a realidade que a BB… conhece, tal como é sustentado, mais se diga, pelo parecer da ATE.
8. A acrescer, através de inúmeros estudos científicos publicados, a estruturação da personalidade de uma criança fundamenta-se na sua vinculação psicológica e nas relações de afeto e pertença que se estabelecem nos primeiros anos de vida à sua figura de referência, e de acordo com conhecimentos científicos já devidamente comprovados, o corte precoce e repentino com essas relações afetivas produz na criança sérios prejuízos no seu desenvolvimento provocando sentimentos de abandono, ansiedade, dor e sofrimento psicológico, entre outros, que se manifestará mais tarde em vários aspetos da sua vida.
9. Assim, e considerando os princípios fundamentais na Declaração dos Direitos da Criança que reconhecem que o “superior interesse da criança” deve ser a base fulcral, sempre que uma decisão judicial tem que ser tomada para assegurar o bem-estar da criança, uma residência alternada, neste caso, não poderá ser aceite, com a devida vénia por entendimento diferente, como o melhor para a BB… por força da factualidade que reveste este caso concreto.
10. Ao ter decidido como decidiu, o Douto Tribunal a quo, para além de ter desvalorizado a produção de prova que não deveria ter sido desvalorizada, violou igualmente o disposto nos art.ºs 28.º, 38.º e 40.º do Regime Geral do Processo Tutelar Civil, no art.º 1906.º, n.º 5 do Cód. Civil, no sentido de não ter sido acautelado o superior interesse e saúde da Menor, apenas com três anos de idade.
11. A Mãe é a principal cuidadora da BB…, actualmente, com três anos de idade.
12. A vinculação da Criança é para com a Mãe, pois foi sempre esta o seu porto de abrigo.
13. Foi sempre a Mãe que a alimentou, que a vestiu, que lhe deu banho, que a adormeceu, em suma, que dela cuidou diariamente.
14. Durante os períodos de tempo que a Menor passa com o Pai, regressa sistematicamente aos cuidados maternos com problemas de saúde vários, verbi gratia, infecção urinária, gastroenterite e assaduras em zonas íntimas.
15. Muitas são as vezes em que o Progenitor nem se dá conta destas situações e problemas que causa à saúde da Menor.
16. Sendo claro e inequívoco que estes problemas de saúde são causados pela negligência e falta de capacidades parentais do Pai.
17. A BB… tem três anos de idade, e durante toda a sua vida sempre viveu com a Mãe.
18. A BB…, como qualquer criança de três anos, necessita de rotinas. A Mãe cria essas rotinas na vida da Menor, contudo, quando a BB… está com o Pai, todas essas rotinas são destruídas.
19. A BB… chora inconsolável quando tem de ir para casa do Pai, não quer ir, chora e grita, pede à Mãe para ficar com ela, e repete que não quer ir para casa do Progenitor.
20. Quando regressa de casa do Pai, a Menor vem com as rotinas todas alteradas, e extremamente instável a nível psicológico e emocional.
21. Ainda, após as quatro pernoitas quinzenais com o Pai, a BB… regressa aos cuidados maternos extremamente carente e nota-se que esta situação lhe provoca bastante ansiedade. No dia que chega agarra-se à Mãe e não a larga durante horas, nem sequer para dormir.
22. O regime provisório que se encontrava em vigor previa quatro pernoitas com o Pai, sendo que era notório que esse regime já não estava a funcionar, e não estava a garantir o superior interesse da BB…, pelo que um regime de guarda e residência alternada, ainda mais dor e sofrimento na Menor vai provocar.
23. A BB…, na casa em que reside com a Mãe, tem um quarto só para si, na casa do Pai, tem de partilhar o quarto com a meia-irmã de treze anos, ou dormir com o Pai.
24. O Pai, actualmente ainda reside em Moscavide, Lisboa, mas afirmou na Conferência de Pais realizada em 30-06-2022, que já comprou casa em Massamá, e que se vai mudar mal acabe de fazer obras na sua nova casa.
25. A Mãe reside em São Domingos de Benfica.
26. A distância, geográfica e relativa, entre Massamá e São Domingos de Benfica, não é compaginável com uma guarda com residência alternada.
27. O trânsito nos acessos a Lisboa, quer seja IC19 e 2.ª Circular, acrescido da distância geográfica entre as duas casas, torna impossível a fixação de uma escola para a Menor.
28. Acresce que a BB… está já inscrita numa escola pública, nas Laranjeiras, em Lisboa.
29. A residência alternada de uma criança menor, com apenas três anos de idade é fortemente desaconselhável.
30. Pelo menos até aos quatro anos de idade, não se deve afastar durante períodos de tempo tão grandes, as crianças da sua figura de referência, a Mãe.
31. Uma decisão judicial que, com a devida vénia, provoca uma rutura tão forte com o regime que até agora vinha a ser praticado, que era a guarda e residência junto da Mãe, irá provocar danos psicológicos e emocionais na BB…, que não vai entender porque vai ter de ficar afastada da sua figura de referência e principal cuidadora durante uma semana inteira.
32. Com três anos de idade, a criança necessita de estabilidade e de uma rotina diária com regras simples e bem definidas, de forma a permitir um crescimento harmonioso. Ora, a necessária estabilidade não é compatível com uma situação em que a criança está uma semana a viver sob um regime, em que tem um horário e rotinas, e na semana seguinte já tem um horário e rotinas totalmente diferentes (ou melhor, total ausência de horários e rotinas).
33. Nos termos do art.º 640.º, n.º 1 do Cód. de Processo Civil, aplicado ex vi art.º 33.º do RGPTC, cumpre referir que o Douto Tribunal a quo desconsiderou, por completo, todas as declarações proferidas pela Mãe na referida conferência de pais realizada em 30-06-2022.
34. Quando prestou as suas declarações de parte, a Mãe referiu expressamente as suas preocupações quanto às condutas de negligência e descuido do Pai quanto a cuidados básicos a ter com a BB…, e que redundaram, inúmeras vezes, em problemas vários na saúde da Criança.
35. Em concreto, a Mãe afirmou que: “A mãe reputa acusações ao pai de quando a menor vem da casa deste, de que vem recorrentemente, doente, por exemplo, com febre e com situações que terão vindo a culminar em laringites ou vulvovaginites, tendo ainda inclusive reportado, situações de infeção urinária; além disso, ao facto de, recorrentemente, a menor vir com assaduras na vagina e no rabo, derivado ao uso de fralda e ao não asseverar dos respetivos cuidados por parte do pai para que isso não acontecesse”.
36. Em bom rigor, as preocupações e declarações da Mãe, que são um meio de prova, e que referiu inúmeros episódios de faltas de cuidado por parte do Progenitor nos momentos em que tem a Criança na sua casa, deveriam ter formado a convicção da Julgadora em sentido diametralmente oposto aquele que foi tomado.
37. Nos termos das declarações prestadas pela Mãe, que relatou todos os episódios de faltas de cuidado do Pai para com a BB…, e atento a idade da Menor, apenas com três anos, deveria sim ter-se optado por manter o regime de guarda e residência a favor da Mãe, nos exactos termos em que foi fixado no âmbito da conferência de pais realizada em 18-11-2020.
38. A ser realizada alguma alteração, deveria sim ter-se então reduzido o número de pernoitas da BB… em casa do Progenitor, de maneira a reduzir o risco dos inúmeros problemas de saúde que já causou à Filha.
39. Contudo, em sentido inverso, considerou a Mm.ª Juiz a quo que: “Sucede também que há cerca de 2/3 meses a menor já não usa fralda, tais assaduras já não se constatam e quanto às doenças que aduz a menor ter sofrido, não está comprovado que a sua eclosão pudesse ser prevenida ou controlada pelo pai. Tais imputações não são suficientemente fortes para fazer o Tribunal concluir pela não aplicação, ainda que provisoriamente, de um regime de residência alternada, que apenas vem acrescentar ao já implementado regime há mais de ano e meio, mais 2 dias de vivência do menor com o pai”.
40. Em bom rigor, a Apelante reportou ao Douto Tribunal a quo inúmeros problemas de saúde que foram causados pelo Pai, por exemplo, uma gastroenterite que causou à BB…, muito para além, portanto, dos problemas causados por o Apelado não mudar apenas a fralda à bebé.
41. Estão em causa, condutas de falta de cuidado e negligência reiteradas, praticadas pelo Pai contra a BB...
42. Ainda, foi reportado pela Apelante que a Menor chora imenso quando tem de se afastar da Mãe para ir para casa do Pai. A Criança verbaliza que não quer ir para casa do Pai. Quando regressa aos braços da Mãe após as visitas ao Pai, chora imenso, abraça-se à Progenitora e não a quer largar.
43. As primeiras noites após o fim das visitas ao Pai, a Criança dorme a noite toda sem largar a Mãe.
44. Ainda, quando regressa das visitas, vem com os sonos todos alterados, e ainda os horários de refeição estão profundamente alterados.
45. Termos em que não se pode deixar de impugnar o vertido na conclusão retirada pelo Douto Tribunal a quo, que considerou: “A menor esta já acostumada a este regime de vivência e a mãe não relata que a menor venha infeliz ou desagradada da casa do pai ou que narre qualquer situação de vivência que faça perigar pelo seu bem-estar físico ou emocional”.
46. Por força do que ficou dito, não pode deixar a Apelante de considerar que o Douto Tribunal a quo não andou bem ao retirar as conclusões que retirou sobre a prova por declarações de parte da Mãe, pelo que se impunha fosse tomada decisão diversa da efectivamente tomada, e se mantivesse a guarda e residência da Menor continuasse a favor da Mãe.
47. O Douto Tribunal a quo, com a devida vénia, não retirou as devidas conclusões da prova carreada para os autos. A acrescer, atento a fase processual em que os referidos autos estão, impunha-se que se aguardasse então o decurso de produção de prova, quer pericial, quer testemunhal em sede de audiência de discussão e julgamento, e apenas depois então se consideraria, com a devida vénia, que poderia ser tomada uma decisão como a que foi tomada, tão diferente da que estava em vigor, e que vai quebrar muitas das rotinas da Criança apenas com três anos.
48. Nos termos do art.º 639.º do Cód. de Processo Civil, aplicado ex vi art.º 33.º do RGPTC, cumpre referir que ao ter decidido como decidiu, o Douto Tribunal a quo violou, com a devida vénia, as regras legais vertidas nos art.ºs 28.º, 38.º e 40.º do RGPTC, e no art.º 1906.º do Cód. Civil, uma vez que se considera, salvo melhor e mais douto entendimento, que a decisão ora em crise não acautela o superior interesse e crescimento harmonioso da Menor BB….
49. Uma vez que foram suscitadas sérias dúvidas sobre as capacidades parentais do Progenitor, invocadas inúmeras situações em que o Progenitor actuou com negligência quanto aos cuidados básicos a ter com a BB…, o que provocou doenças e problemas de saúde na Menor;
50. ainda, que a Menor sempre viveu com a Mãe, desde que nasceu até à presente data, e que apenas tem três anos de idade;
51. que se desconhece as condições de habitabilidade da casa do ora Apelado, e bem assim de quando e como vai viver para outro concelho (Sintra);
52. impunha-se que o Douto Tribunal a quo, salvo o devido respeito, tomasse uma decisão diametralmente oposta, e atento o disposto nos art.ºs 28.º, 38.º e 40.º do RGPTC, e no art.º 1906.º do Cód. Civil, interpretasse estas disposições legais no sentido de manter a guarda e residência da BB… a favor da Mãe, diminuindo ainda o tempo das visitas da Menor ao Pai.
53. Por tudo o que ficou dito, e dando cumprimento ao disposto nos art.ºs 639.º e 640.º do Cód. de Processo Civil, aplicados ex vi art.º 33.º do RGPTC, cumpre referir que todos os factos carreados para os autos, em função da prova por declarações de parte (declarações da Mãe) já produzida nos autos, e bem assim, prova pericial já existente, impunha-se que o Douto Tribunal a quo tomasse uma decisão em sentido inverso daquela que tomou, ou seja, deveria, com a devida vénia, ter mantido a guarda e residência da BB… junto da Mãe, violando, com a decisão tomada, o disposto, pelo menos, nos art.ºs 28.º, 38.º e 40.º do RGPTC, e art.º 1906.º do Cód. Civil, uma vez que se considera, com a devida vénia, que a decisão posta em crise não acautela o superior interesse e crescimento harmonioso da BB….
54. Razões estas pelas quais outra opção não resta à ora Apelante que não seja peticionar aos Venerandos Juízes Desembargadores desta Relação, a revogação do despacho proferido pelo Tribunal a quo nos seus segmentos ora em crise, designadamente, ao determinar e alterar o regime de guarda e residência da BB… a favor da Mãe, para um regime de responsabilidades parentais de guarda e residência alternada.
55. Nestes termos, o Douto Despacho, nos segmentos em crise, proferido na referida conferência de pais realizada em 30-06-2022, deverá ser substituído por outro que ordene e mantenha a guarda e residência da Menor, BB…, a favor da Mãe, e que reduza o tempo e pernoitas da Criança junto do Pai, ao abrigo de um mero direito de visitas deste, em termos doutamente a suprir por V. Exas.»
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1.10. O requerente apresentou contra-alegações a pugnar improcedência do recurso e consequente manutenção do regime provisório de exercício de responsabilidades parentais fixado pela Decisão proferida em 30-06-2022, extraindo da sua alegação as seguintes conclusões:
«A. O Recurso ora interposto pela mãe/Recorrente/Requerida, da menor BB…, deve improceder de facto e de direito, pois não corresponde à verdade dos factos.
B. Devendo tão só, ter efeito devolutivo, conforme estatui o art.º 185.º da O.T.M.
C. O mesmo assenta na vontade maternal de fazer crer que o pai é mau pai, não reunindo habilidades para tal.
D. Desta forma, tentando revogar a medida provisória imposta pelo Tribunal a quo.
E. No entanto, o pai sempre cuidou da filha durante o dia e sendo esta uma bebé, dava-lhe banho, comida, punha-a a fazer a sesta, mudava-lhe a fralda e tudo o mais necessário, para que a mãe pudesse trabalhar em regime de teletrabalho.
F. O pai fazia o seu teletrabalho de noite, pois a profissão permitia-lho, para tratar da filha de dia, enquanto a mãe estava em teletrabalho.
G. Quando a mãe acabava o turno e já não precisava, o pai já não estava com a filha.
H. Ao contrário do que a mãe quer fazer crer, enquanto casal sempre viveram com a filha em Massamá.
I. E o pai, após a separação, continuou aqui a viver.
J. A mãe veio viver para Lisboa com a bebé.
K. Decidindo, desde o início da separação afastar a filha do pai, pois desde essa altura que havia a distância demográfica entre Lisboa e Massamá que a Requerida/mãe/Recorrente agora – falsamente – quer fazer crer nunca ter existido.
L. Mas foi sempre o pai/Recorrido/Requerente, a deslocar-se para ver a filha.
M. E também foi este a intentar a ação de regulação das responsabilidades parentais, pois sendo um pai presente, atento, meigo e responsável que adora a BB…, não ia apenas ver a filha quando a mãe deixasse.
N. Assim, luta pelo direito de acompanhar o crescimento da filha, em igualdade de circunstâncias com a mãe.
O. Valendo-se de situações normais que acontecem na vida das crianças: assaduras de fraldas, episódios febris fruto de amigdalites, faringites e doenças infantis.
P. Mas a criança também adoecia quando estavam juntos e o pai era mais descontraído.
Q. O pai tem outra filha de quem tem guarda partilhada e residência alternada, sem percalços.
R. A irmã da BB… (DD…) é também muito presente e o pai privilegia esta situação que a mãe da BB… tenta evitar a todo o custo.
S. O pai não coloca em causa a competência maternal da mãe, não obstante a filha vir por vezes doente ou magoada de sua casa.
T. A mãe considera que a filha é sua propriedade e apenas consigo deve estar, devendo decidir a sua vida, sozinha.
U. Mas a mãe sabe que pode sempre contar com o pai para educar e amar a filha, não se aceitando esta batalha que só prejudica a menor BB… e desgasta os pais.
V. Presentemente, o pai/Recorrido/Requerente reside provisoriamente em Moscavide, numa casa que já era sua e se destina ao mercado de arrendamento, uma vez que vendeu a casa onde viveu com a mãe/Recorrente/Requerida e a filha em Massamá e adquiriu uma outra fracção neste local, para onde se mudará definitivamente após o término das obras.
W. O acordo provisório do Exercício das Responsabilidades Parentais pretendia que aos poucos o pai fosse tendo mais tempo com a menor BB…, para progressivamente se chegar a uma residência alternada, vontade do Requerente/Recorrido/pai, desde o início deste processo.
X. A Requerida/Recorrente/mãe nunca o quis e tudo tem feito para denegrir a imagem do Requerente/Recorrido como pai.
Y. O pai não é desinteressado ou negligente, mas é mais descontraído do que a mãe e vê estas situações com naturalidade.
Z. É completamente falso que a menor não queira ir para o pai, que chore ou faça birras por ir contrariada.
AA. A BB… é uma criança alegre e feliz. Faz birras e chora como qualquer uma da sua idade.
BB. Adora estar com o pai e com a sua família, socializando com estes e com as crianças com quem estiver.
CC. E este faz questão de tratar e estar com a filha, nos bons e maus momentos.
DD. Este ano, a BB… vai finalmente voltar à creche, que tanta falta lhe faz.
EE. Por vontade do pai, a filha estava na creche desde sempre.
FF. O pai tem disponibilidade total para estar com a filha, pois quando precisa, trabalha de noite, como a mãe se recordará, pois nessa altura dava-lhe jeito o pai tratar da filha, de dia.
GG. A mãe não quis que entre 2020 e 2021, a menor fosse para a creche e esta esteve fechada em casa com a mãe, o que não ajudou no seu saltar desenvolvimento.
HH. Este ano quando pai perguntou à mãe se a menina ia para a escola, esta respondeu que a tinha inscrito, mas que certamente não teria vaga.
II. E que o mais certo era ficar consigo mais um ano em casa!
JJ. O pai perguntou porque não colocava a filha na escola em Massamá.
KK. Não teria trânsito para a trazer nem para a levar para casa, pois andaria ao contrário do mesmo.
LL. A mãe recusou e prefere colocá-la numa escola particular.
MM. Obviamente que o pai não concorda com os fundamentos maternais para tal.
NN. Este é um assunto de particular interesse na vida da filha, que tem de ser decidido por ambos, conforme conta no acordo da regulação do exercício das responsabilidades parentais.
OO. E resulta da Lei Civil pois, independentemente da residência da menor ser partilhada, há temas que têm de ser alvo de acordo dos pais, como resulta do art.º 1906.º n.º 1 do Código Civil.
PP. Reitera-se que, o pai sempre viveu em Massamá. Não vive agora, apenas transitoriamente, por aguardar a finalização das obras na sua casa.
QQ. A mãe também lá viveu consigo, enquanto residiram juntos.
RR. Esta é uma falsa nova situação.
SS. Para o pai faz sentido ter uma hipótese de escola em Massamá.
TT. Como se não bastasse, neste momento a Requerida/mãe/Recorrente, não contente por ter ido morar para Lisboa, sem ter avisado o Requerente/Recorrido/pai.
UU. Decidiu afastar ainda mais a filha do pai, decidindo unilateralmente que tem de ir viver para o Montijo, para perto da irmã e dos sobrinhos.
VV. Esta situação revela que tudo quer fazer para impedir uma residência alternada, tentando que o pai desista da mesma.
WW. Não ponderou em momento algum na estabilidade da filha, que estará bastante mais longe do pai e da irmã.
XX. Obviamente que tal é uma estratégia de afastamento do progenitor.
YY. A qual foi prontamente identificada e condenada pelo Tribunal a quo, que a repudiou.
ZZ. Ora, a mãe não pode decidir a vida da menor, sem levar em conta o pai.
AAA. Esta menor tem pai e uma relação afetiva com este e com a sua família.
BBB. Este pai sempre pagou o que lhe foi demonstrado ser despesas da filha, mas não serve só para esse fim.
CCC. Quer estar presente na vida da filha, tem este direito e exige-o.
DDD. É um bom pai, tem todas as capacidades parentais para cuidar da menor e tem os mesmos direitos da mãe.
EEE. É contraditório que a mãe invoca o art.º 1906.º n.º 5 do CC, mas não aplica a parte que diz: “a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais com do filho com o outro”
FFF. Quando a mãe alega que a mudança do regime vai bulir com as rotinas da menor, quer dizer “com as dela própria”.
GGG. Quando a mãe fala num “corte abrupto” que este regime trará à filha, esquece-se que é ela quem lhe quer infringir esse corte, levando-a para o Montijo, para longe do pai e da irmã.
HHH. A menor está muito habituada ao pai.
III. Não há qualquer instabilidade emocional e psicológica nesta criança, que a mãe tenta acreditar existir (e isto é grave!, pois pode ser uma patologia da mãe).
JJJ. A BB… tem uma vinculação à mãe, não se nega. Mas também tem ao pai!
KKK. É falso dizer-se que tem uma total vinculação à mãe e que esta foi a sua principal cuidadora.
LLL. Pois, como no início se referiu, era o pai quem de si tratava até à separação.
MMM. E só não continuou a tratar, porque a mãe o impediu!
NNN. E o Tribunal a quo percebeu claramente a intenção desta mãe de tentar alienar o pai da vida da filha.
OOO. E se a mãe insistir em afastar a filha daquele, este irá reclamar a sua guarda total pois não aceita que a filha lhe seja tirada por capricho e maldade.
PPP. O superior interesse da criança não está a ser acautelado pela mãe!
QQQ. Que apenas pretende afastar a filha do pai.
RRR. Chegando ao cúmulo de o descrever neste recurso, praticamente como um pai agressor e perigoso. É completamente mentira que a BB… regresse de casa do pai extremamente carente ou ansiosa.
SSS. O pai deixa-a sempre bem-disposta e alegre.
TTT. E isto não é salvaguardar o superior interesse da criança, mas da mãe.
UUU. O Tribunal a quo, não violou o RGPTC, tendo duas magistradas decidido, perante as provas que existem no processo, as alegações infundadas da mãe e o relatório técnico que não foi proferido a favor de nenhum do progenitor, que este era o melhor regime para a BB…
VVV. E decidiu bem, pois tudo o que a mãe alega é falso: não há medos, choros, angustias ou tristeza com o pai.
WWW. Não há alteração geográfica. Sempre foi assim desde a separação.
XXX. Os episódios de doença foram fruto do tempo, da situação, da idade. Nada mais.
YYY. O pai tem todas as capacidades para o ser.
ZZZ. Devendo manter-se o regime provisório declarado em 30 de Junho de 2022.»
*
1.11. O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência e pela manutenção da decisão recorrida.
Para tanto, formulou alegações que rematou com as seguintes conclusões:
«1. Em respeito pelo superior interesse da criança, entendemos que deverá ser indeferida atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso e fixado o efeito regra previsto no art.º 32.º, n.º 3 do RGPTC, por forma a obstar à indefinição da situação da BB…, que aguarda decisão nestes autos devido à falta de acordo dos progenitores.
2. Sendo que não se vislumbra que a implementação, de imediato, da residência alternada com ambos os progenitores, possa causar qualquer instabilidade psicológica à BB… porquanto, desde 14.04.2021, que a mesma fica com o pai, de 15 em 15 dias, de 4.ª feira a Domingo, ao que apenas se irão acrescentar outros dois dias da semana.
3. Acresce que, face ao tempo decorrido desde a propositura da acção e considerando o regime que já vem sendo exercido há mais de um ano, bem como a necessidade da BB… ingressar um equipamento de infância, mostra-se premente evitar o protelamento da situação da menor e fixar, o quanto antes, o regime de residência alternada com ambos os progenitores.
4. O regime de residência alternada fixado, provisoriamente, por decisão proferida na conferência de pais realizada em 30.06.2022, é que aquele que melhor acautela o superior interesse da BB ...
5. Na verdade, e conforme resulta da fundamentação da decisão: “A menor esta já acostumada a este regime de vivência e a mãe não relata que a menor venha infeliz ou desagradada da casa do pai ou que narre qualquer situação de vivência que faça perigar pelo seu bem-estar físico ou emocional.
Sendo, ainda, premente que a menor integre equipamento de infância, importa desde logo ainda que, em termos provisórios, uma vez que não houve acordo, acautelar a definição da residência da menor, para que a mesma, na nova fase do ingresso escolar que se avizinha, possa ter a maior estabilidade possível.
A aduzida redução de convívios com o pai, como propugna a mãe, é contrária ao superior interesse da criança, conquanto que a mesma priva nos períodos que está com o pai, igualmente com a sua irmã, de quem o pai partilha residência alternada com a respetiva mãe, sendo do seu superior interesse, que a menor passe igual período de tempo com cada um dos progenitores.”
6. As imputações apresentadas pela mãe relativamente à conduta negligente do pai para com a filha não foram olvidadas pelo tribunal, mas não foram suficientes, quer por se desconhecer se as doenças foram efectivamente provocadas por tais condutas quer por não se verificarem ao momento (isto no que diz respeito às assaduras por já não usar fralda), para obstar a tal decisão.
7. Nem tão pouco, o regresso do progenitor a Massamá, local onde sempre viveu e no qual a BB… residiu nos seus primeiros anos de vida, se mostrou um obstáculo à decisão de aplicar esse regime.
8. E isto porque, considerando o tempo que a BB… já vem passando com o pai, é indubitável que a redução de convívios da BB… com o progenitor – o que sucederia, inevitavelmente, com uma mudança da residência da mãe para o Montijo, como esta pretendia – e, consequentemente, com a irmã consanguínea, causaria uma forte instabilidade na mesma.
9. Deste modo, a decisão proferida nos autos a título provisório, fixando a residência da BB…, em semanas alternadas, com ambos os progenitores, é aquela que melhor acautela os interesses da BB…»
*
1.12. Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II - Objecto e delimitação do recurso:
Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer de todas as questões colocadas pela recorrente e das que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. artigos 635º e 639º do Código de Processo Civil (doravante CPC)], salientando-se, no entanto, que esta Relação não está obrigada a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito - cf. art.º 5º, n.º 3, do CPC.
No caso, atendendo às conclusões formuladas, as questões colocadas nos recursos consistem em saber:
1.ª - do alegado erro de julgamento da matéria de facto, por errada apreciação e valoração dos meios de prova;
2.ª - saber se a decisão provisória recorrida violou o superior interesse da Menor BB….
III – Fundamentação
3.1. Os Factos:
Para a decisão do recurso relevam os factos descritos no relatório supra, que resultam da tramitação dos autos principais e respectivos apensos.
3.2. Mérito do recurso:
- Primeira questão - do alegado erro de julgamento da matéria de facto, por errada apreciação e valoração dos meios de prova.
A recorrente insurge-se contra a decisão provisória proferida em sede de Conferência de Pais realizada no dia 30-06-2022, posteriormente complementada pela decisão de 28-09-2022 (quanto a alimentos), que alterou o regime provisório anteriormente estabelecido, em Conferência de Pais realizada no dia 18-11-2020, passando de um regime de guarda e residência junto da Mãe, para um regime de guarda com residência alternada.
Considera a recorrente que o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, “para além de ter desvalorizado a produção de prova que não deveria ter sido desvalorizada, violou igualmente o disposto nos artigos 28.º, 38.º e 40.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, no artigo 1906.º, n.º 5, do Cód. Civil, no sentido de não ter sido acautelado o superior interesse e saúde da Menor, apenas com três anos de idade.” (conclusão 10.ª).
Concretizando, aduz que o Tribunal a quo desvalorizou as declarações da Mãe nas quais referiu inúmeros episódios de negligência/falta de cuidados de higiene por parte do Progenitor nos momentos em que tem a Criança na sua casa (referiu que houve situações em que o Pai entregou a BB… com febre, assada no rabinho e zona genital e mal da barriga, recorrendo a consultas no hospital, tendo sido diagnosticado gastroenterite, infeção urinária, laringite, etc.) e que se as preocupações e declarações da Mãe tivessem sido tidas em consideração a Julgadora teria formado uma convicção em sentido diametralmente oposto aquele que foi tomado.
Acontece, porém, que o Tribunal a quo não desvalorizou ou desatendeu as queixas apresentadas pela Mãe relativamente ao Pai aquando da tomada da decisão, pois que a elas se refere expressamente no seu discurso argumentativo, tendo ponderado que os episódios a que se referiam tais queixas não eram actuais ou que não se podia estabelecer o nexo causal entre a sua ocorrência e a conduta do Pai, como melhor consta da fundamentação da decisão recorrida que se transcreve:
A mãe reputa acusações ao pai de quando a menor vem da casa deste, de que vem recorrentemente, doente, por exemplo, com febre e com situações que terão vindo a culminar em laringites ou vulvovaginites, tendo ainda inclusive reportado, situações de infeção urinária; além disso, ao facto de, recorrentemente, a menor vir com assaduras na vagina e no rabo, derivado ao uso de fralda e ao não asseverar dos respetivos cuidados por parte do pai para que isso não acontecesse.
Sucede também que há cerca de 2/3 meses a menor já não usa fralda, tais assaduras já não se constatam e quanto às doenças que aduz a menor ter sofrido, não está comprovado que a sua eclosão pudesse ser prevenida ou controlada pelo pai.
Tais imputações não são suficientemente fortes para fazer o Tribunal concluir pela não aplicação, ainda que provisoriamente, de um regime de residência alternada, que apenas vem acrescentar ao já implementado regime há mais de ano e meio, mais 2 dias de vivência do menor com o pai.
A menor esta já acostumada a este regime de vivência e a mãe não relata que a menor venha infeliz ou desagradada da casa do pai ou que narre qualquer situação de vivência que faça perigar pelo seu bem-estar físico ou emocional.
Sendo, ainda, premente que a menor integre equipamento de infância, importa desde logo ainda que, em termos provisórios, uma vez que não houve acordo, acautelar a definição da residência da menor, para que a mesma, na nova fase do ingresso escolar que se avizinha, possa ter a maior estabilidade possível.
A aduzida redução de convívios com o pai, como propugna a mãe, é contrária ao superior interesse da criança, conquanto que a mesma priva nos períodos que está com o pai, igualmente com a sua irmã, de quem o pai partilha residência alternada com a respetiva mãe, sendo do seu superior interesse, que a menor passe igual período de tempo com cada um dos progenitores.”
A tudo acresce que se a recorrente pretendia impugnar os fundamentos de facto em que assente a decisão recorrida deveria ter observado os ónus primários previstos nas alíneas a), b) e c) do art.º 640.º do CPC. Não o tendo feito, está vedado a esta Relação reapreciar a decisão da matéria de facto.
Com efeito, as exigências da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do citado artigo 640º do CPC, integram um ónus primário, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto.
E, por outro lado, a exigência da indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo 640º, integra um ónus secundário, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida (Ac. do STJ, de 21-03-2019, Revista n.º 3683/16.6T8CBR.C1.S2, disponível em www.dgsi.pt.).
O incumprimento de qualquer um desses ónus implica a imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões (Ac. do STJ, de 02-02-2022, Revista n.º 1786/17.9T8PVZ.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.).
Termos em que se decide rejeitar a impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
*
- Segunda questão -  saber se a decisão recorrida viola o superior interesse da Criança
Antes, porém, alguns breves apontamentos sobre o processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais.
A regulação do exercício das responsabilidades parentais comporta três aspectos: a guarda, o regime de visitas e os alimentos.
O critério legal de atribuição ou repartição das responsabilidades parentais é, como se sabe, o “superior interesse da criança“ - artigos 1905.º do Cód. Civil, 42.º, n.º 1, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) e 3.º, n.º 1, da Convenção Sobre os Direitos da Criança.
E o “interesse superior da criança“, enquanto conceito jurídico indeterminado carece de preenchimento valorativo, cuja concretização deve ter por referência os princípios constitucionais, como o direito da criança à protecção da sociedade e do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral (art.º 69.º, n.º 1, da CRP), reclamando uma análise sistémica e interdisciplinar da situação concreta de cada criança, na sua individualidade própria e envolvência (cf. acórdão da Relação de Coimbra, de 3/5/2006, proc. n.º 681/06, acessível em www.dgsi.pt).
O exercício das responsabilidades parentais deve ter presente ainda o princípio da dignidade da pessoa humana, legitimador do menor enquanto sujeito de direitos e não como mero objecto, o princípio da continuidade das relações familiares e da convivência familiar e o princípio da igualdade dos pais.
Deve, ainda, promover a cooperação dos pais no bem-estar emocional da criança, exaurindo qualquer factor propiciador da hostilidade psicológica dos progenitores.
Daí que a lei privilegie a consensualização, ou seja que os conflitos familiares sejam dirimidos por via do consenso, com recurso a audição técnica especializada e ou à mediação [com o consentimento das partes], sempre que necessário – art.ºs 4.º, n.º 1, 23.º e 44.º, alínea b), do RGPTC.
Na ausência desse consenso, o Tribunal tem de decidir tendo sempre como pano de fundo “o superior interesse da criança”.
Foi o que o Tribunal a quo fez, em nossa opinião, com ponderação e acerto.
Defende a recorrente que a alteração do regime de guarda e residência da Menor junto da Mãe, par um regime de guarda com residência alternada não responde ao superior interesse da Menor BB…, actualmente com três anos de idade. Como óbice ao novo regime de guarda partilhada, além das reservas em relação às competências parentais do Pai, adita que este não é o momento indicado para fazer mais uma alteração abrupta em toda a realidade que a BB… conhece, tal como sustentado no parecer da ATE. Que a Mãe é a principal cuidadora da Menor, que a vinculação da Criança é com a Mãe, pois sempre foi esta o seu porto de abrigo (foi sempre a Mãe que a alimentou, que a vestiu, que lhe deu banho, que a adormeceu e que dela cuidou diariamente).
Acrescenta, igualmente, que a BB… chora inconsolavelmente quanto tem de ir para casa do Pai, que não quer ir, que chora e grita e que pede à Mãe para ficar com ela.
Diga-se, antes de mais, que estas afirmações não têm correspondência com a verdade factual.
Relativamente às competências parentais, o que resulta do relatório de ATE elaborado pela EMAT de Lisboa é que ambos os progenitores “evidenciam motivação e aptidão para o exercício de uma parentalidade inscrita num processo de envolvimento individual responsável”. O que se constactou foram falhas ao nível do processo de comunicação e cooperação, que exige que seja respeitado o papel do outro progenitor, dando-se nota de haver uma “ambivalência entre a consensualidade e não consensualidade, o reconhecimento ou não da coparentalidade, decursiva das dificuldades ao nível de uma comunicação positiva e centrada nos cuidados e nas necessidades de desenvolvimento da filha comum.”
Por outro lado e em boa verdade, não se pode considerar que a Mãe da BB…, aqui recorrente, nesta altura fosse a única e principal figura vinculante de referência da Menor, ponderando que o regime que vigorou até à Conferência de Pais ocorrida em 30-06-2022 já levava cerca de 20 meses de implementação e permitiu aumentar os períodos de convívio da Criança com o Pai e a sua irmã consanguínea, a DD…, que reside com o progenitor comum em semanas alternadas, coincidentes com o período em que a BB… fica com o Pai.
Diga-se, ainda, que a recorrente não referiu anteriormente, designadamente na Conferência de Pais de 30-06-2022 que a Criança vinha triste ou a chorar de casa do Pai ou que não quisesse ir para casa do Pai, como agora alega, antes apontando como grande obstáculo à residência alternada ou à manutenção do regime fixado anteriormente o facto de pretender mudar-se para o Montijo – facto que, como dá devida nota a Magistrada do Ministério Público, nem sequer é mencionado nas suas alegações de recurso e que, por isso, não pode aqui ser equacionado.
Obtempera, igualmente, a recorrente a questão da mudança, num futuro próximo, da residência do Pai de Moscavide para Massamá. Como resulta do declaro pelo Pai ao Tribunal e à EMAT, em sede de ATE, trata-se de um regresso ao local onde sempre residiu, designadamente com a Mãe e com a BB … quando esta nasceu.
Como quer que seja, entendemos que a distância entre Massamá e Lisboa (São Domingos de Benfica), local de residência da Mãe, não inviabiliza a implementação de uma residência alternada.
O regime que vigorava anteriormente foi o fixado na Conferência de Pais realizada em 18-11-2020, que regulou, provisoriamente, o exercício das responsabilidades parentais relativamente à BB… nos termos seguintes:
1. A menor, BB…, fica entregue aos cuidados da mãe e com ela residindo, cabendo a ambos os progenitores o exercício das responsabilidades parentais da filha;
2. Fixa-se a residência da menor junto da mãe;
3. Até completar dois anos de idade, a menor ficará com o pai em fins-de-semana, de 15 em 15 dias, de 6ª feira a domingo, indo o pai buscá-la e pô-la a casa da mãe, pelas 18h de cada um dos dias, com início a 21 de Novembro de 2020;
4. Nos dois meses seguintes a menor estará com o pai de 5ª feira a domingo, de 15 em 15 dias, indo buscá-la e pô-la a casa da mãe pelas 18h de cada um dos dias, com início a 14 de Fevereiro de 2021 até 14 de Abril de 2021;
5. Após esse período de tempo a menor estará com o pai de 4ª feira a domingo, de 15 em 15 dias, indo o pai buscá-la e pô-la a casa da mãe pelas 18h de cada um dos dias, com início a 14 de Abril de 2021;
6. Todas as 4ª feiras das semanas em que a menor não fica a dormir em casa do pai, o pai irá buscar a menor à escola ou a casa da mãe, pelas 15h, e entrega-a em casa da mãe até às 20h, já jantada.”.
Tal regime, aplicado provisoriamente enquanto se aguardava o relatório da audição técnica especializada, previu um aumento gradual dos convívios da criança com o Pai, e foi aplicado porquanto se entendeu, já naquela altura, premente decidir “(…) a fixação de um regime que apazigue o relacionamento dos pais um para com o outro, que lhes permita programar a sua vida em função dos tempos em que irão estar com a criança e que permita também à criança desfrutar em qualidade do período de tempo em que está com cada um dos pais, com reflexos no seu bem-estar físico e psicológico.” (cf. acta com a ref.ª Citius 127845454, de 18-11-2020).
O processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais é um processo de jurisdição voluntária (art.º 12.º do RGPTC) caracterizando-se, por isso, pelo predomínio do princípio do inquisitório sobre o principio do dispositivo (art.º 986.º do CPC), pelo predomínio do critério de equidade na decisão sobre o critério da legalidade (art.º 987.º do CPC) e pela livre revogabilidade das decisões em face de circunstâncias supervenientes (art.º 988.º do CPC), tudo em ordem a salvaguardar o superior interesse relevante em causa, ou seja, o do menor.
Ora, é nosso entendimento que essas circunstâncias supervenientes (tempo decorrido desde a implementação do anterior regime; adaptação da Menor ao acréscimo do tempo de convívio como o Pai; conveniência da Menor integrar equipamento de infância; e benefícios advindos do reforço dos vínculos afectivos com o Pai e a irmã DD…) que justificaram e justificam a alteração estabelecida pela decisão recorrida resultaram amplamente demonstradas nos presentes autos e foram avaliadas com bom senso e segundo critérios de razoabilidade e juízos de equidade pela Exma. Juíza a quo, tudo conduzindo à solução adoptada como a mais adequada ao superior interesse da Menor BB…
Dos autos perpassa alguma instabilidade emocional demonstrada pela recorrente e preocupação excessiva e injustificada com a situação da BB… quando entregue aos cuidados do Pai, circunstância que só agrava a conflitualidade entre as duas figuras parentais bem patente nos autos, interferindo na interacção e comunicação entre ambos e impedindo a adopção de estratégias relacionais e comunicacionais facilitadores de um ambiente de corresponsabilização parental.
Foi, aliás, o facto do conflito parental se manter mais centrado na figura materna, adotando o pai uma postura mais apaziguadora e centrada na criança, que fundamentou o pedido de regulação das responsabilidades parentais por parte do requerente, surgindo o pedido de alteração do regime entretanto fixado formulado pela requerida (apenso A) como uma estratégia para obviar ao previsível estabelecimento de um regime de guarda e residência alternada.
Que o Pai é mais apaziguador resulta do facto de ter uma outra filha, a DD…, de 13 anos de idade, em regime de guarda e residência alternada há cerca de seis anos, consensualmente acordado com a respectiva progenitora, sua anterior companheira, com quem mantém bom relacionamento (seguindo resulta do declarado pela requerida e do relatório de ATE).
Tudo ponderado, considera-se que a dupla residência ou residência alternada, semanalmente, em face da idade, desenvolvimento emocional da BB… e equivalentes competências parentais que ambos os progenitores revelam para garantir as necessidades básicas da filha, é a solução mais adequada e ajustada a evitar o esmorecer da imagem paterna, pela divisão equilibrada do tempo de convívio da Menor com o Pai (e irmã) e com a Mãe, de forma a que a mesmo não perca o vínculo com nenhum deles, o que contribuirá, certamente, para evitar sofrimento e eventuais problemas psicológicos à  BB….
A Lei nº 65/2020, de 4 de Novembro, veio estabelecer as condições em que o tribunal pode decretar a residência alternada do filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos progenitores, alterando o Código Civil.
Mais concretamente, foi alterado o art.º 1906º do Código Civil, cujo n.º 6 passou a ser do seguinte teor:
«6 - Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos
Esta alteração veio tornar expressa a possibilidade de ser fixado o regime de guarda partilhada, com residência alternada, mesmo para os casos em que não haja mútuo acordo entre os progenitores nesse sentido.
Na verdade, vinham-se perfilando distintos e contrapostos entendimentos ao nível doutrinal e jurisprudencial sobre essa questão, ora sustentando-se a necessidade de acordo dos progenitores e inexistência de conflito entre os mesmos -cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do TRC de 5.05.2009 (proferido no proc. nº 530/07.3TBCVL-A.C1), do TRL de 7.11.2013 (proferido no proc. nº 7598/12.9TBCSC-A.L1-6), de 18.03.2013 (proferido no proc. nº 3500/10.0TBBRR.L1-6) e de 14.02.2015 (proferido no proc. nº 1463/14.2TBCSC.L1-8) e do TRP de 13.05.2014 (proferido no proc. nº 107/08.6TBVFR-A.P1) e de 28.06.2016 (proferido no proc. nº 3850/11.9TBSTS-A.P1), todos acessíveis em www.dgsi.pt; na doutrina, vide CLARA SOTTOMAYOR, in “Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio”, 6ª ed. revista, págs. 262 e seguintes e JOANA SALAZAR GOMES, in “O superior interesse da criança e as novas formas de guarda”, 2017, págs. 101 e seguintes., ora defendendo-se que a residência alternada é possível mesmo contra a vontade dos progenitores e em caso da existência de conflito entre eles, contanto que essa solução se revele a mais adequada à satisfação do superior interesse da criança (cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do TRC de 24.10.2017 (proferido no proc. nº 273/13.9TBCTB-A.C1) e de 27.04.2017 (proferido no proc. nº 4147/16.3T8PBL-A.C1), do TRE de Évora de 9.11.2017 (proferido no proc. nº 1997/15.1T8STR.E1) e de 7.06.2018 (proferido no proc. nº 4505/11.0TBPTM.E1), do TRL de 17.12.2015 (proferido no proc. nº 6001/11.6TBCSC.L1-6) e de 24.01.2017 (proferido no proc. nº 954/15.2T8AMD-A.L1-7) e do TRG de 2.11.2017 (proferido no proc. nº 996/16.0T8BCL-C.G1), todos acessíveis em www.dgsi.pt.; na doutrina, entre outros, GUILHERME DE OLIVEIRA, A residência alternada na Lei nº 61/2008, in “Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Carlos Pamplona Corte Real”, 2016, JOSÉ LAMAS LEITE, in “Revista do Ministério Público”, nº 151 (Julho-Setembro de 2017), págs. 65-81 e JOAQUIM MANUEL DA SILVA, in “A família das crianças na separação dos pais – A guarda compartilhada”, 2016, págs. 135 e seguintes.
Sobre os argumentos esgrimidos pelos adeptos das teses em confronto vide, com mais profundidade, o acórdão do TRL de 7-08-2017, proferido no proc. n.º 835/17.5T8SXL-A-2), acessível em www.dgsi.pt., que vão desde considerar que um regime de alternância de residência se revela desajustado no que respeita à consolidação dos hábitos, valores, e ideias na mente do menor, com prejuízo para a formação da sua personalidade, sobretudo em crianças de tenra idade, face ao revezamento sistemático entre casas e pais, com padrões de vida diferentes, saindo o mesmo “prejudicado” em resultado das separações repetidas relativamente a cada um dos seus progenitores, causadas pela constante mudança de residência.
De outra banda, tem sido defendido que a residência alternada possibilita – se os progenitores souberem aproveitar as virtualidades desse regime de residência – que o filho volte a ter com os progenitores uma relação o mais próxima possível da que com eles mantinha antes da separação, evitando, desse modo, quebrar a relação afectiva que antes tinha com ambos.
A tudo acresce que o objetivo de fixar responsabilidades parentais não deve (salvo se se ocorrerem situações objectivas que o aconselhem) ser escolher ou dar prevalência a um dos progenitores, mas antes verificar as potencialidades de ambos e organizar a nova relação entre eles e o filho.
Serve isto para dizer que a solução da residência alternada tem ganho força redobrada pela consciência de que os laços afetivos se constroem dia-a-dia e não se compadecem com o tradicional regime de convívios em fins-de-semana quinzenais, na medida em que a fixação da residência junto de um só dos progenitores leva ao progressivo esbatimento da relação afectiva com o outro progenitor, fazendo com que o menor se sinta uma mera “visita” em casa deste, levando a que o progenitor desista de investir na relação por se sentir excluído do dia-a-dia da criança.
Nas palavras de ANTÓNIO JOSÉ FIALHO[[2]], “Haverá que promover um “tempo de qualidade” com ambos os progenitores, de modo a que cada um deles possa acompanhar o dia-a-dia do seu filho, nos trabalhos escolares, nas brincadeiras, no momento de deitar, etc., levar e ir buscar à escola, conhecer os professores, os amigos, etc., de modo a que o menor continue a ter um pai por inteiro e uma mãe por inteiro.
Por outro lado, como refere Tomé d’Almeida Ramião[[3]], “o interesse superior da criança só será respeitado quando esteja salvaguardado o exercício efectivo dos seus direitos. Por isso que o conceito de “superior interesse da criança” está relacionado com o exercício dos seus direitos. O que significa que no confronto dos vários interesses em presença, por ventura legítimos, deve prevalecer “o superior interesse da criança”, deve dar-se preferência e prevalência à solução que melhor garanta o exercício dos seus direitos”.
Tudo visto e ponderado, temos para nós que a solução encontrada pelo Tribunal a quo, de residência alternada da BB…, semanalmente, com cada um dos progenitores é, face às circunstâncias relevantes do caso concreto já descritas e à relativa proximidade geográfica de ambas as residências, a que melhor garante o exercício dos direitos desta criança, e a que mais potencial tem para diminuir a conflitualidade parental tão nefasta ao seu desenvolvimento harmonioso, equilibrado e são.
O foco da decisão recorrida não está, como parece sugerir a recorrente, no interesse do pai, mas no direito fundamental e inalienável da BB… manter equitativamente relações de proximidade com ambos os progenitores, manifestando os mesmos a sua afectividade, bem como partilha recíproca de experiências e valores.
É natural que a BB …. precise de tempo para se habituar a viver, por períodos iguais, em dois lugares distintos, em duas casas com distintos modos de funcionamento, de tempo para se adaptar a essa nova realidade.
Contudo, as diferenças de género e também de estilos parentais ou rotinas são enriquecedoras para a criança.
Mas a BB … é uma criança inteligente e já revelou essa capacidade de adaptação e interacção positiva com ambos os pais, pelo que vai adaptar-se sem dificuldades de maior a esta nova realidade e colher benefícios, em termos de bem-estar e saúde psicológica, da alteração do regime estabelecido operada pela decisão recorrida.
Por via da alteração implementada, os tempos de relação afectiva com o progenitor e naturalmente com a família paterna serão, seguramente, promotores da solidificação de laços afectivos e as vivências no novo contexto podem ser promotoras de enriquecimento para o desenvolvimento da BB ….
É consabido que o desmembramento da célula familiar, consequência da dissolução do casamento ou da simples separação de facto dos progenitores, dá o mote para a disputa quanto ao destino dos filhos, designadamente no que respeita à definição da guarda e dos períodos de convívio com o progenitor não guardião.
Essa disputa, que nem sempre desaparece ou conhece tréguas com a regulação, pauta-se por uma intensa carga emocional, que facilmente descamba em comportamentos irreflectidos e irresponsáveis de um dos progenitores, que usa o processo de regulação das responsabilidades parentais e todos os meios processuais ao seu alcance com a finalidade de afastar o outro progenitor do projecto de vida dos filhos.
Cabe, agora, à mãe, aqui recorrente, na efectiva defesa do superior interesse da BB…, mudar alguns aspectos da sua interacção com esta sua filha e com o Pai, começando a partilhar as responsabilidades parentais numa lógica de cooperação e não de exclusividade/propriedade que só poderá conduzir a resultados que a mesma certamente não antecipa, nem deseja.
A lamentável realidade, de permanente disputa, com que se defronta a BB… só serve para comprometer o são desenvolvimento da sua personalidade.
Os argumentos invocados pela recorrente para se opor ao decidido, apesar de ser indiscutível a legitimidade da sua pretensão, não podem ser atendidos, desde logo porque o não foi a “putativa” impugnação de facto em que assentavam tais argumentos e porque o “superior interesse” da Menor reclama que se dê prevalência a um regime de guarda partilhada, com residência alternada, semanalmente.
Considera-se, pois, que o Tribunal a quo fez uma adequada leitura do caso concreto e que decidiu de acordo com o superior interesse da Menor BB…, não merecendo tal decisão o reparo que lhe é feito.
Nesta matéria, as ciências sociais não ditam soluções exactas para os casos, sendo que cada caso é um caso, mas há factores que têm de ser ponderados por quem decide pelo impacto particular no bem-estar da criança. Deve prevalecer o bom senso na procuração da solução mais adequada ao bem-estar da criança, a parte mais vulnerável da equação, e dos progenitores separados ou divorciados, procurando-se atingir um ponto de equilíbrio entre os direitos da criança e os direitos que assistem a cada um dos progenitores.
Certo é que o anterior regime de visitas e convívio não acautelava, dentro do contexto superveniente apurado, de forma equilibrada e ajustada, os direitos do progenitor e da Menor. É nosso entendimento que o novo regime, no contexto actual, potencia a solidificação dos laços afectivos existentes entre o progenitor e a sua filha BB… e desta com a irmã DD… e é simultaneamente promotor do são desenvolvimento biopsicossocial da BB…, o que está de acordo com o seu superior interesse e com o preceituado no art.º 1906.º, n.ºs 5 e 7, do Cód. Civil.
Por conseguinte, improcede o recurso interposto pela requerida CC.
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A recorrente, porque decaiu no recurso, é responsável pelo pagamento das respectivas custas – artigos 527.º do CPC e 7.º, n.º 4, do Regulamento das Custas Processuais.  
IV- Decisão
Por tudo o exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, manter a decisão proferida em 30-06-2022, com a ref.ª Citius 138463323, que fixou o regime regulador das responsabilidades parentais relativamente à Menor BB…, com a alteração introduzida pela decisão proferida em 28-09-2022, com a ref.ª Citius 139806212.
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Custas pela requerida e recorrente.
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Registe e notifique.
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Lisboa, 12-01-2023
Manuel Rodrigues
Nuno Lopes Ribeiro
Gabriela de Fátima Marques
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[1] Com aproveitamento do relatório da sentença recorrida.
[2] Residência alternada – visões de outras paragens, inA Tutela Cível do Superior Interesse da Criança”, T. I, Julho 2014, E-book CEJ p.397, in
http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/familia/Tutela_Civel_Superior_Interesse_Crianca_TomoI.pdf
[3] In Regime Geral do Processo Tutelar Cível Anotado e Comentado, 2.ª edição, Quid Juris, anotação ao artigo 4.º, p. 23.