Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
21034/17.0T8LSB.L1-1
Relator: ISABEL FONSECA
Descritores: CASO JULGADO
EFEITOS
AUTORIDADE
CAUSA DE PEDIR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/01/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. Os efeitos do caso julgado podem ser vistos numa dupla perspetiva, tratando-se de realidades distintas: a exceção de caso julgado, exceção dilatória a que alude o art. 577º, alínea i) do Cód. de Processo Civil, aferindo-se pela identidade dos sujeitos, pedido e causa de pedir (art. 581º), pressupondo a repetição de uma causa; trata-se de exceção de conhecimento oficioso e dá origem à absolvição da instância (arts. 578º e 576º, nº2);

2. E a autoridade do caso julgado, que importa a aceitação de decisão proferida anteriormente, noutro processo, cujo conteúdo importa ao presente e que se lhe impõe, assim obstando que uma determinada situação jurídica ou relação seja novamente apreciada;

3. A causa de pedir é constituída pelo conjunto de factos, juridicamente relevantes, que são constitutivos do direito invocado, fundamentando a pretensão formulada (cfr. o art. 581º, nº4 do CPC). Tendo a autora, na segunda ação que instaurou, formulado pedido de indemnização tendo em vista o ressarcimento dos danos patrimoniais aí invocados, na vertente dos lucros cessantes, pedido que foi apreciado e julgado improcedente, não pode, posteriormente, intentar nova ação, para o mesmo efeito, invocando os mesmos danos, ainda que apresentando uma roupagem aparentemente diferente: o facto jurídico é o mesmo, ainda que a realidade que lhe subjaz seja descrita de outra forma.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa.


 
I.RELATÓRIO


Ação: Declarativa comum.

Autor/apelante
A..

Ré/apelada
B., LDA.

Pedido
Condenação da ré no pagamento da quantia de € 35.636,50, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos. 
 
Causa de pedir
Em 08/01/2015 intentou uma ação declarativa de condenação contra a ré pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização por incumprimento contratual, com fundamento em rescisão, sem justa causa, do contrato de fornecimento de produtos celebrado entre as partes.
Anteriormente a tal ação a autora já havia instaurado, contra a ré, uma outra ação declarativa de condenação pedindo a declaração de invalidade da resolução do contrato operada pela ré.
Por decisão, transitada em julgado, no âmbito desse processo o Tribunal julgou procedente o pedido da autora, declarando inválida, por falta de fundamento, a resolução do contrato.
Munida da sentença que declarou ilícita a resolução contratual efetuada pela ré, pretendendo reclamar o ressarcimento dos danos que tal rescisão lhe provocou, intentou a segunda ação.
No âmbito da segunda ação foi proferida sentença onde se exarou que “a resolução contratual abre caminho a indemnização apenas pelos danos negativos, reconhecendo-se, contudo, que pode, excepcionalmente, ter lugar indemnização por danos positivos.
Interposto recurso contra esta sentença veio a mesma a ser confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
Na fundamentação do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa exarou-se que “uma resolução do contrato ilícita, porque sem fundamento contratual ou legal, implica a destruição retroactiva dessa relação contratual, colocando a parte que a ela recorre em responsabilidade civil pelo incumprimento definitivo do contrato”.
Responsabilidade civil que com a presente acção se pretende efectivar, reclamando o preço da prestação de serviços não pago em virtude da cessação prematura do contrato.
A par dos danos emergentes a indemnização abarca a compensação pelos lucros cessantes.
A rescisão operada pela Ré foi causa directa e adequada à verificação de todos os danos: i) os lucros que deixou de obter em virtude da cessação ilícita do contrato, ii) os danos morais que sofreu.

Oposição
A ré apresentou contestação invocando que esta é a terceira ação que a autora intenta contra si com base nos mesmos factos e fundamentos jurídicos.
Na primeira ação proposta foi declarada inválida a resolução do contrato operada pela ré, mas julgados improcedentes os pedidos indemnizatórios deduzidos.
Na segunda ação foi pedida a condenação da ré no pagamento de indemnizações por danos patrimoniais (a título de lucros cessantes) e não patrimoniais, alegadamente decorrentes da resolução.
Por sentença proferida na segunda ação foi a ré absolvida de tais pedidos indemnizatórios por: i) no que respeita ao pedido de condenação da ré no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais se verificar a exceção de caso julgado face ao anterior processo instaurado pela autora contra a ré, que correu termos sob o n.° 17429/09.1T2SNT, ii) quanto ao pedido de condenação da ré no pagamento de indemnização por danos patrimoniais (a título de lucros cessantes), por inexistência de qualquer suporte fáctico ou legal que justificasse tais alegados danos.
Contra esta decisão foi interposto recurso pela autora que foi julgado improcedente.
Em todas as ações por si intentadas a autora procura o ressarcimento dos danos alegadamente decorrentes da resolução do contrato por parte da ré.
A autora pretende, uma vez mais, a condenação da ré no pagamento de urna indemnização por danos patrimoniais (a título de lucros cessantes), tratando-se de uma verdadeira repetição da causa, já que há perfeita identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, sendo evidente a verificação da exceção dilatória de caso julgado.
Caso assim não se entenda deve o pedido de indemnização improceder.
Peticiona a condenação da autora como litigante de má-fé dado o pedido formulado já ter sido expressamente deduzido na ação anterior que a autora interpôs contra a ré e que foi liminarmente julgado improcedente e dado esta saber que já linha sido decidido que havia caso julgado quanto ao pedido de condenação da ré em indemnização por danos patrimoniais, a título de lucros cessantes, entre a segunda e a primeira ação proposta pela Autora contra a Ré, porquanto o caso julgado cobre o deduzido e o dedutível.
Conclui advogando que a autora veio deduzir pretensão cuja falta de fundamento não devia (nem podia) ignorar.

Resposta
A autora exerceu o contraditório relativamente à matéria de exceção e ao pedido de condenação como litigante de má-fé e pugnou pela sua improcedência.

Julgamento
Findos os articulados, foi proferida decisão, em 17-02-2019, que concluiu como segue:

“Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção as considerações expendidas e as normas legais citadas, decide-se:
a)- Julgar verificada a excepção dilatória de caso julgado e, consequentemente, absolver a Ré da instância.
b)-  Condenar a Autora como litigante de má-fé numa multa que se fixa em 4 UC e numa indemnização a pagar à Ré a fixar, nos termos do disposto no artigo 543°, n.° 3 do Código de Processo Civil.
c)- Notificar a Ré para, no prazo de 10 dias, concretizar, ao abrigo do disposto no artigo 543° do CPC, a indemnização peticionada.
*

Custas a cargo da Autora, sem prejuízo da decisão administrativa dos autos (artigo 527° do CPC).
*

Valor da acção: € 35.636,50.
Registe e notifique”.

Recurso
Não se conformando a autora apelou formulando as seguintes conclusões:

I. Ora, a excepção de caso julgado pressupõe a necessidade de verificação da chamada tríplice identidade entre as causas, quanto aos sujeitos, efeito jurídico visado (pedido) e facto jurídico-fundamento (causa de pedir).
II. A causa de pedir na presente acção - o incumprimento contratual por parte da Ré e a falta de pagamento do preço até ao final do contrato -, bem como o pedido de condenação no pagamento do preço em falta até ao termo do contrato, não foram invocados nas acções anteriores.
III. Com efeito, na primeira acção, a Autora veio simplesmente pedir a declaração de ilicitude da resolução do contrato de fornecimento vigente entre as partes e o consequente direito ao ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes de tal resolução ilícita.
IV.  Já na segunda acção, a causa de pedir integrava a ilícita resolução do celebrado contrato e os alegados danos positivos, sendo o pedido destinado a colocar o lesado na situação em que se encontraria se o contrato fosse exactamente cumprido.
V. O que a Autora pretende na presente acção é, numa fórmula simples, e colocando a tónica no incumprimento contratual, receber os pagamentos que deveriam ter sido feitos pela Ré até ao termo do contrato, não fosse o seu incumprimento.
VI. Assim, uma vez que as causas de pedir e pedidos são distintos nas três acções, não se verifica qualquer excepção de caso julgado, ao contrário do
VII.  Nenhum dos requisitos da litigância de má-fé se verifica.
VIII. A primeira acção mereceu provimento e a segunda acção não foi julgada procedente por razões de mera configuração jurídica, sendo a presente acção apenas uma mera correcção da configuração jurídica da segunda.
IX. A Autora verteu nestes autos toda a factualidade que interessava à boa decisão da causa, tendo expressamente referido a existência de anteriores acções e o respectivo desfecho, nomeadamente nos artigos 5° a 16° da sua petição inicial.
X. A Autora esclareceu, na sua petição inicial, que a segunda acção foi julgada improcedente, resumindo os motivos dessa improcedência, que resultam tanto da sentença proferida, como do acórdão proferido em sede de recurso.
XI.Por maioria de razão, não se justifica qualquer indemnização a arbitrar à Ré.
XII. O Tribunal recorrido violou assim os art.°s 580.°, n.° 1, segunda parte, e 542.°, do C.P.C.
Termos em que deverão V. Exas. julgar a presente apelação totalmente procedente, por provada e, em consequência, revogar a sentença recorrida, ordenando ao Tribunal de 1.a Instância que prossiga para realização de julgamento.

A ré apresentou contra alegações, formulando as seguintes conclusões:

A.  Sumariamente, o objeto do presente íitígio incide sobre a instauração de uma ação declarativa de condenação em processo comum, no âmbito da qual a Autora, ora Recorrente, peticiona o pagamento de 35.636,50 EUR (trinta e cinco mil seiscentos e trinta e seis euros e cinquenta cêntimos), acrescido de juros de mora comerciais vencidos e vincendos, fundamentando essa pretensão no facto de ter suportado danos patrimoniais, a título de lucros cessantes, alegadamente decorrentes do incumprimento contratual, com fundamento em rescisão do contrato de fornecimento de produtos celebrado entre a Recorrente e a Ré, ora Recorrida.
B. A douta Sentença proferida peia Meritíssima Juiz de Direito do Tribunal a quo em 17 de fevereiro de 2019 determinou (i) a procedência da exceção dilatória de caso julgado invocada pela Recorrida, e em consequência, absolveu-a da instância; e (ii) a condenação da Recorrente como litigante de má- fé numa multa que se fixa em 4 UC (quatro unidades de conta) e numa indemnização a pagar à Recorrida em montante a fixar, nos termos do disposto no artigo 543.°, n.° 3 do CPC.
C. Pelas razões sumariamente apontadas, e pelas demais que serão detalhadas de seguida, dizemo-lo sem tibiezas, e também sem quaisquer estado de alma, mas antes e apenas com a convicção e a contundência próprias do patrocínio empenhado e rigoroso: a Autora, ora Recorrente, apenas mantém a sua postura litigante, instaurando ações de forma ininterrupta e recorrendo invariavelmente dos seus desfechos, usando e abusando do recurso aos Tribunais, por se manter beneficiária de apoio judiciário, sem ter que se preocupar com o pagamento de taxas de justiça nem com a compensação das despesas do seu mandatário.

D. Importa, em beneficio da clareza de raciocínio, descrever sucintamente a linha cronológica dos acontecimentos que sucederam desde 2009 (data em que a Recorrente instaurou a primeira ação de condenação contra a aqui Recorrida), até à presente data, sendo tal descrição, por si só, ilustrativa da manifesta falta de fundamento da pretensão formulada pela Recorrente:
4)- Em 2009, a Recorrente, em conjunto com Ricardo José da Costa Branquinho (ambos sócios da sociedade “Distribuições J. G. R. de Joana e RB", doravante designada “JGR,") intentou uma ação declarativa de condenação, que correu termos sob o n.° 17429/09.1 T9SNT, peticionando, em suma: (i) a declaração de invalidade da resolução do contrato de fornecimento de produtos celebrado entre a JGR e a Recorrida (doravante designado “Contrato"); e (ii) a condenação da Recorrida no pagamento de uma indemnização, a título de danos emergentes, no valor de 23.247,87 EUR (vinte e três mil duzentos e quarenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos), alegadamente decorrentes da referida resolução contratual. Por sentença transitada em julgado foi declarada inválida a resolução do Contrato operada pela Recorrida, julgando, no entanto, improcedente o pedido de indemnização deduzido pelos então Autores;
5) Em 2015, a Recorrente intentou contra a Recorrida, uma nova ação declarativa de condenação, que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB, no âmbito da qual peticionou a condenação da
Recorrida no pagamento de uma indemnização no valor de 427.638,80 EUR (quatrocentos e vinte sete mil seiscentos e trinta e oito euros e oitenta cêntimos), a título de danos patrimoniais {i.e., lucros cessantes), alegadamente decorrentes da referida resolução contratual, acrescido de juros de mora comerciais no valor de 158.270,22 EUR (cento e cinquenta e oito mil duzentos e setenta euros e vinte e dois cêntimos), e 25.000 EUR (vinte cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais. A sentença proferida em 1 ,a instância determinou a total improcedência da ação, absolvendo a Recorrida de todos os pedidos de indemnização formulados pela Recorrente - decisão que permaneceu inalterada em sede de recurso da sentença interposto pela Recorrente;    
6) Por último, em 2017, - inconformada com as decisões proferidas pelos tribunais - a Recorrente deu entrada da presente ação, a cujo processo foi atribuído o n.° 21034/17.0T8LSB, no âmbito do qual peticionou novamente, à semelhança do que sucedeu com a ação supra descrita (em manifesta evidência de que estamos perante a verificação da exceção dilatória de caso julgado prevista no artigo 577.°, alínea i) do CPC), a condenação da Recorrida no pagamento de uma indemnização, desta feita, no valor de 35.636,50 EUR (trinta e cinco mil seiscentos e trinta e seis euros e cinquenta cêntimos). Por sentença proferida pela Meritíssima Juiz de Direito - a qual foi objeto de recurso pela Recorrente, e a cujas Alegações ora se responde - foi julgada procedente a exceção dilatória de caso julgado, o que determinou a absolvição da Ré (ora Recorrida) da instância, e foi Autora (ora Recorrente) condenada, como litigante de má-fé, no pagamento de uma multa fixada no montante de 4 UC (quatro unidades de conta), e bem assim, no pagamento de uma indemnização à Ré (ora Recorrida), com valor a fixar nos termos do artigo 543.°, n.° 3 do CPC.
E.  Em todas as ações intentadas até à presente data, a Recorrente procura obter o ressarcimento dos danos alegadamente decorrentes da resolução do Contrato por parte da Recorrida. Em concreto, através da presente ação, vem a Recorrente peticionar, de igual modo, a condenação da Recorrida, a título de danos patrimoniais {i.e., lucros cessantes), no montante de 35.636, 50 EUR (trinta e cinco mil seiscentos e trinta e seis euros e cinquenta cêntimos).
F. Tenha-se em conta que, no âmbito do processo que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB, tendo sido declarada ilícita a resolução do Contrato pela Recorrida, a Recorrente ficcíonou um período de 10 (dez) anos - período que, conforme a Recorrida demonstrou em sede de Contestação, se revela despropositado e desprovido de qualquer fundamento que o sustente - por forma a obter um vaior devido a título de lucros cessantes.
G. A única diferença nesta terceira ação é que o valor peticionado teve por referência o período compreendido entre março e dezembro de 2005, e já não o período de 10 (dez) anos (o que determinou, por conseguinte, a redução do valor do pedido formulado) sendo, no demais, a causa que se submete à apreciação jurisdicional neste processo, inteiramente coincidente com a pretensão formulada no âmbito do processo anterior.
H. Desde logo, porque aquilo que não é devido a título de alegados lucros cessantes pelo período de 10 (dez) anos (conforme decisão transitada em julgado no âmbito do processo n.º 503/15.2T8LSB), também não é, nem poderá ser, devido a título de alegados lucros cessantes pelo período de 10 (dez) meses, nem o será por qualquer outro período, por muito que a Recorrente assim almeje.
I. Ainda para mais, porque o período compreendido entre março e dezembro de 2005 (/.&, dez meses) se encontra contido no período de 10 (dez) anos ficcionado no âmbito da ação anteriormente intentada, o que significa que esse período de 10 (dez) meses foi também submetido a apreciação jurisdicional anterior. Estamos, assim, perante a existência de uma plena identidade de pedidos.
J. Assim, a questão que originou esta terceira ação é, na verdade, e para o que aqui releva, inexistente, porquanto a mesma já se encontrava decidida por sentença transitada em julgado - facto que a Recorrente conhecia e não podia ignorar.
K. No entanto, ainda que a pretensão atualmente formulada pela Recorrente não fosse inteiramente coincidente com a formulada em processo anterior (f.e., que não se verificasse a existência de uma plena identidade de pedidos) - o que não se concede, mas por mero dever de patrocínio se equaciona, - seria inevitável não concluir que estamos diante de uma verdadeira repetição de causa.
L.  Veja-se, neste sentido, que o Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.° 503/15.2T8LSB, fez constar do acórdão proferido que; “[o] caso julgado abrange o deduzido e o dedutível, precludindo ao autor a invocação, noutra ação, de factos integradores da causa de pedir da ação anteriormente julgada e que aí foram omitidos Acrescentando ainda que “[a] sentença que julga improcedente a ação preclude ao autor a possibilidade de, em novo processo, invocar outros argumentos, de facto ou de direito, não produzidos no processo anterior
M. Pelo que não colhe a confusão que a Recorrente vem trazendo aos autos, nuns processos peticionando indemnização por danos emergentes, noutros por lucros cessantes, nuns relativos a períodos de 10 (dez) anos, noutros a 10 (dez) meses, referindo-se indiscriminadamente, aos conceitos de rescisão, resolução e denúncia, sempre com os olhos no tão esperado “prémio”,
N.  Aproveite-se também para mencionar que nem poderia colher a ideia de que a indemnização por lucros cessantes derivaria agora não da resolução ilícita, mas de uma denúncia ilícita. É que também quanto a essa hipótese já se pronunciou o Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.° 503/15,2T8LSB, movido pela Recorrente contra a Recorrida, quando determinou que consequentemente, desde o momento em que a declaração denunciativa, in casu, resulta da carta de 7/3/2005, mostra-se amplamente respeitada aquela antecedência, não havendo ilicitude na denúncia operada peia Recorrida
O. Mais acrescentou o Tribunal da Relação de Lisboa no acórdão supra mencionado que "jnja situação concreta, tendo a oposição à renovação ocorrido dentro do prazo exigível no contrato, a denúncia mostra-se temporalmente lícita. VI - Mesmo que assim não fosse, estando em causa um contrato quadro, sem obrigação de exclusividade para nenhuma das partes, os eventuais danos provindos para o fornecedor da cessação do contrato constituiriam um risco deste, não encontrando naquela cessação causa adequada. VII - Porque o caso julgado cobre o deduzido e o dedutível', verifica-se caso julgado entre esta ação e a anterior, na medida em que era possível à A. ter ai invocado os prejuízos para ela resultantes dos ganhos que viu frustrados em função da extinção do contrato (lucros cessantes)."
P.   Ora, com esta ação, a Recorrente coloca o tribunal na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior, em plena contradição com o disposto no n,° 2 do artigo 580.º do CPC, Assim, face ao que antecede, não resta senão concluir que existe plena identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, nos precisos termos do disposto no artigo 581.° do referido diploma legal.
Q.  Sucintamente, e para dirimir quaisquer dúvidas que possam restar, examinemos cada um dos pressupostos previstos no artigo 581.° do CPC:
d)-  Há identidade de sujeitos, na medida em que as partes são as mesmas do ponto de vista da qualidade jurídica em que intervêm nos presentes autos;

e)-Verifica-se identidade de pedidos, porquanto a Recorrente pretende obter o mesmo efeito jurídico que pretendeu obter nas ações anteriores, /.e., a condenação da Recorrida no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais, a título de lucros cessantes;
f)-  Existe identidade de causas de pedir, pois as pretensões deduzidas nas ações procedem do mesmo facto jurídico.
R.  Por tudo quanto foi dito, não resta senão concluir que existe perfeita identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir, nos termos do disposto no artigo 581° do CPC, pelo que decidiu corretamente a douta Sentença, ao dispor que: “no caso concreto, considerando o conspecto factual apurado (no que respeita à ação que correu termos sob o n.° 17429/09.1T2SNT (...)), à ação que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB (...) e à presente ação (em especial por referência à acção que anteriormente correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB), e o que anteriormente se deixou exarado, é manifesto que se verifica a identidade de sujeitos processuais, de causas de pedir e (inclusivamente) de pedidos (não obstante o valor da indemnização ora peticionada se reconduzir à quantia de € 35.636,50, acrescida de juros, peticionada que se mostra a título de lucros cessantes por alegados danos decorrentes da inválida resolução do contrato de fornecimento celebrado entre as partes), pelo que se impõe concluir pela existência de caso julgado."
S.  Mais acrescenta a douta Sentença que "[nos termos da presente acção e os termos das acções que anteriormente correram termos entre as mesmas partes (descriminadas nos factos assentes), em especial no que respeita à acção que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB e à ação sub judice, são, como resulta abundantemente dos autos e dispensa considerações adicionais, nesse sentido, inequívocos. E se assim não se entendesse, o que não é o caso, sempre se verificaria autoridade caso julgado (que não depende da verificação da tríplice identidade). Mas no caso perfilha-se entendimento pela verificação da excepção de caso julgado."
T.  Sendo assim, é manifesto que a pretensão ora formulada (repita-se, peia terceira vez) pela Recorrente não poderia ser objeto de (nova) apreciação jurisdicional.
U. Prossegue a douta sentença, referindo que "a aplicação de um raciocínio diverso se traduziria na admissão pelo sistema, sem limites, da discussão de eternas questões jurídicas, ao que acresce que as sentenças transitadas em julgado não confeririam aos seus beneficiários quaisquer direitos efetivos, ficando eternamente submetidas aos efeitos da litigiosidade”.
V. Termos em que o Tribunal a quo determinou, e bem no entender da Recorrida, a procedência da exceção dilatória de caso julgado invocada peia Recorrida, a qual obsta ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição da instância, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 576.°, n.° 2, 577.°, alínea i) e 578.°, todos do CPC,
W.  Contudo, ainda que a exceção de caso julgado pudesse, por qualquer motivo não se verificar - o que não se concede mas por mero dever de patrocínio se equaciona - sempre se diria que o pedido de indemnização por danos patrimoniais, a titulo de lucros cessantes, deduzido peia Recorrente, não poderia proceder porquanto, do ponto de vista substancial, os moldes contratuais o não permitiriam.
X. Com efeito, e tal como tem sido caracterizado pelos Tribunais nas anteriores ações movidas pela Recorrente contra a Recorrida, o Contrato não passava de um instrumento que definia uma moldura negociai (vulgo, contrato-quadro) dentro do qual a Recorrida, sem qualquer obrigatoriedade, podia encomendar produtos à JGR.
Y. Neste mesmo sentido, concluiu o Tribunal, na sentença proferida no âmbito do processo que correu termos sob o n.° 17429/09.1T2SNT,"(...) não foi desiderato das partes vincular até à aquisição dos produtos fornecidos pelos autores, nem sequer de um volume ou valor mínimo desses produtos, por uma qualquer unidade de tempo.”
Z. Tal decorre, aliás, dos termos expressamente previstos no Contrato, nomeadamente, do seu ponto 1.3. quando determina que “[o] presente contrato não impõe aos estabelecimentos da primeira contraente [Recorrida] qualquer obrigação de compra efetiva da gama de produtos comercializados pela segunda contraente [Recorrentej, obrigação essa que apenas surgirá para cada produto, com a colocação da encomenda junto da segunda contraente [Recorrente].”
AA. Conforme decorre da mera leitura do Contrato, não foi prevista qualquer obrigação de exclusividade na relação entre as partes. Ora, se a Recorrente, alegadamente, trabalhava em regime de exclusividade para a Recorrida, ou se a sua estrutura produtiva foi pensada e construída com vista à satisfação cabal das necessidades da Recorrida, ou se investiu em equipamentos e matérias-primas, fê-lo a seu risco, porque assim entendeu, não se verificando qualquer nexo de causalidade entre esse investimento e o Contrato ou, muito menos, a sua cessação.
BB. Posto isto, conclui-se que poderia a Recorrida nem sequer ter efetuado quaisquer encomendas à Recorrente, sem que isso implicasse, a qualquer título, o incumprimento do Contrato. Tais conclusões resultam, desde logo, da sentença proferida no âmbito do processo n.° 503/15.2T8LSB, por impressivas e determinantes, as quais infra se descrevem: “[o]ra, resultando da prova que os autores investiram em equipamento e matérias-primas, fizeram-no a seu risco e porquanto assim o entenderam, não existindo qualquer nexo de causalidade digno de tutela entre esse investimento e o contrato celebrado com a ré [realce nosso], o qual, como se disse, não os impedia de vender a terceiros, assim como não obrigava a ré a comprar-lhes os seus produtos.
Do mesmo passo, se os autores após a cessação do contrato tiveram uma quebra de receitas, a mesma não pode ser imputada à invalidade da resolução [realce nosso], na medida em que a ré, durante a execução do contrato e sem qualquer incumprimento do mesmo, era livre de não adquirir aos autores os produtos destes, bastando, para tanto, que não dirigisse àquelas quaisquer encomendas (...).
Assim, quando se demonstra que os autores confiaram na durabilidade do contrato com a ré esse investimento de confiança não tem tuteia jurídica [realce nosso], por inexistir qualquer dever que vinculasse a ré a manter os pedidos de fornecimento que ia dirigindo àqueles."
CC. Ora, nos termos da lei, mormente, nos termos do artigo 483.° do Código Civil, a obrigação de indemnizar requer, de entre a verificação cumulativa de outros requisitos, a existência de uma relação causai entre a prática do facto ilícito e o dano produzido - devendo, para o efeito, verificar-se uma causalidade adequada, ou seja, um facto que atue como condição do dano, no sentido em que a conduta do lesante seja tida como causa do resultado obtido,
DD. Manifestamente, por tudo o que já ficou dito, em particular no que respeita aos termos do Contrato celebrado entre as partes, a resolução do Contrato pela Recorrida não foi a causa dos danos alegadamente sofridos pela Recorrente, sendo que, conforme referido, qualquer confiança que a Recorrente pudesse ter na durabilidade do Contrato não merece qualquer tutela jurídica,
EE. Por outro lado sempre se dirá que, ainda que a Recorrente venha agora peticionar, a título de lucros cessantes não decorrentes da resolução ilícita do Contrato, mas sim da sua denúncia ilícita, também nesse caso o pedido não colheria. Não só porque a denúncia foi lícita, tendo-se respeitado amplamente o período de pré-aviso, conforme consta expressamente da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.° 503/15.2T8LSB movido peia Recorrente contra a Recorrida, mas também porque, mesmo que a denúncia fosse ilícita (o que não se concede), ainda assim, os alegados danos constituiriam sempre um risco próprio da Recorrente, conforme consta expressamente da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.° 503/15.2T8LSB.
FF. Prossegue ainda o Acórdão, afirmando que: “(...) a questão em referência reporta-se à indemnização em caso de resolução por não cumprimento de contrato sinalagmático, em função do disposto no n.° 2 do art.801.°CC, e só tem sentido enquanto colocada na pessoa do credor resolvente, pois é ele, quem, pretendendo ressarcir-se em função do incumprimento definitivo da contraparte, caberá optar pela resolução ou não do mesmo."
GG. Concluindo, por fim, a douta sentença que “[n]a situação dos autos quem pretende obter a indemnização pelo interesse contratual positivo é a aqui A., que foi quem incumpriu o contrato - ainda que temporariamente, segundo o entendimento da ação antecedente. No entanto, à mesma nunca se colocou a alternativa de optar pela manutenção do contrato ou pela sua resolução. Foi à aqui R. que se colocou essa opção, perante o incumprimento da aqui A. tendo optado pela resolução do mesmo.”
HH. Nos termos da alínea a) do número 2 do artigo 542.® do CPC, é tido como litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar sendo, justamente, o que sucede no âmbito dos presentes autos.
II. Na sentença proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo n.° 503/15.2T8LSB, foi expressamente determinado, a fls.30 da referida sentença, que: “(...tendo o contrato cessado, não por resolução ilícita, mas por denuncia, não cabe à A. qualquer indemnização, por um lado, porque a Ré teria respeitado o prazo de antecedência que lhe era exigível para proceder a essa denuncia, por outro, e porque, ínelutavelmente, os possíveis danos que advieram à A. da cessão do contrato, em face do mesmo, constituíam sempre um risco do mesmo, não tendo pois causa nessa cessação."
JJ. Isto é, não obstante terem vindo, ao longo do tempo, a ser julgados improcedentes, por sentenças já transitadas em julgado, todos os pedidos de condenação da Recorrida no pagamento de indemnizações por danos patrimoniais, mormente pela inexistência de qualquer nexo de causalidade entre a cessação do Contrato e os alegados danos sofridos pela Recorrente, ainda assim, a Recorrente vem deduzir outro pedido de condenação da Recorrida no pagamento de indemnizações por danos patrimoniais, desta feita, a título de lucros cessantes.
KK. Tendo este pedido já sido expressamente deduzido na ação anterior que a Recorrente intentou contra a Recorrida e que foi liminarmente julgado improcedente, inclusivamente antecipando-se que nem seria devida qualquer indemnização em virtude da denúncia do Contrato pela Recorrida, já que a denúncia era lícita - sendo certo que, em todo o caso, o pedido nunca poderia ser julgado procedente, em virtude da inexistência de qualquer nexo de causalidade entre a cessação do Contrato e os alegados danos sofridos pela Recorrente.
LL. Sabia, também, a Recorrente (não devendo, nem podendo ignorar), que já tinha sido sentenciado que havia caso julgado quanto ao pedido de condenação da Recorrida em indemnização por danos patrimoniais, a título de lucros cessantes, entre a segunda e a primeira ação movidas pela Recorrente contra a Recorrida, porquanto o caso julgado cobre o deduzido e o dedutível.
MM Ainda assim, não devendo (nem podendo) ignorar tudo o que ficou dito, a Recorrente prosseguiu em intentar esta ação. Ora, é por demais evidente que intentar a presente ação constitui, no mínimo, negligência grave por parte da Recorrente, que já viu o seu pedido decidido (de forma improcedente), vindo deduzir uma pretensão cuja falta de fundamento não devia (nem podia) ignorar.
NN Conforme determinado pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão proferido no âmbito do processo n.° 165107/13.2YIPRT.C1: “[atua como litigante de má-fé quem, antes de interposta a ação, estava já munido de elementos que, com grau de segurança, lhe permitiam aferir duma realidade contraposta aquela que subjaz ao pedido, realidade da qual foi interveniente, omitindo a mesma e mantendo essa postura no decurso dos autos."
00 Nestes termos, é indubitável que a Recorrente não podia assim ignorar que a presente ação não tinha qualquer fundamento. Estando munida de elementos, maxime, de diversas sentenças que, com um grau elevado de segurança, lhe permitiriam ter aferido de uma realidade (totalmente) contraposta àquela que subjaz ao pedido que ora deduz, realidade em que foi interveniente, aliás, parte ativa, e a qual parece com esta ação querer omitir, mais, subverter,
PP Ao intentar, pela terceira vez esta ação, a Recorrente mais não faz do que alegar uma realidade que se provou não existir e cuja inexistência forçosamente conhecia. 0 que significa que, conscientemente, pelo menos, com negligência grave, a Recorrente pretende fazer valer uma pretensão cuja falta de fundamento não poderia deixar de conhecer.
QQ Neste sentido, a atuação da Recorrente configura uma conduta reprovável e subversiva dos princípios basilares de acesso ao Direito e administração da Justiça, pelo que urge expurgar os seus efeitos nefastos, permitindo que aqueles que pretendem, efetivamente, fazer valer os seus direitos em juízo, o possam fazer na sua plenitude.
RR. Nestes termos, a Recorrida acompanha o sentido da decisão vertido na douta Sentença, quando se refere que “[é] manifesto que, apesar do desfecho anterior e (já segunda) ação que propôs contra a Ré, e o que se decidiu no douto Acórdão prolatado no âmbito da ação que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB, (...) ainda assim não se coibiu de propor a presente (terceira) ação.
E é reprovável que a Autora proponha a presente (terceira) ação (contra a Ré) salientando apenas os aspetos que lhe interessam das decisões anteriormente proferidas, mas omitindo, embora tenha inteiro conhecimento, o decidido pelo douto Acórdão prolatado na (segunda) ação que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB, entre as mesmas partes, sobre a mesma questão, que, perspectivando os termos da (primeira) acção que correu termos sob o n.° 17429/09.1T2SNT (...) e que, de todo o modo, se pronunciou ainda pela verificação de caso julgado no que respeita a todos os pedidos indemnizatórios formulados,
Nestas condições, conclui-se que a Autora, pelo menos, com negligência grave, deduziu pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar e omitiu factos relevantes para a decisão da causa. Em jeito de síntese, verifica-se a existência de litigância de má-fé, sendo a conduta da Autora merecedora da reprovação e censura éticas bem como de punição."
SS. Com efeito, cumpre descrever em que termos se deverá concretizar a referida indemnização, para efeitos da determinação do seu quantum. Dispõem as alíneas a) e b), do n.° 1, do artigo 543.° do CPC, que a indemnização pode consistir no reembolso das despesas a que “[a] má-fê do litigante
tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários", e no reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má-fé".
TT Deste modo, tanto quanto foi possível à Recorrida apurar, as despesas em que a mesma incorreu ascendem a um montante não inferior a 1 683,00 EUR (mil seiscentos e oitenta e três euros), sendo 0 valor de 612,00 EUR (seiscentos e doze euros) decorrente do pagamento da taxa de justiça liquidada com vista à apresentação de contestação no âmbito dos presentes autos (conforme consta do DUC e comprovativo de pagamento juntos à Contestação), a quantia de 306,00 EUR (trezentos e seis euros) liquidada com vista à apresentação das presentes contra- alegações, conforme consta do DUC e comprovativo de pagamento que ora se juntam aos presentes autos, e o valor de 459,00 EUR (quatrocentos e cinquenta e nove euros), a título de 50% (cinquenta por cento) do somatório das taxas de justiça que a Recorrente pagaria se não tivesse beneficiado (abusivamente) da isenção de pagamento das mesmas em virtude da atribuição de apoio judiciário, para compensação da Recorrida face às despesas com honorários do mandatário judicial (i.e., 918,00 x 0,5 = 459,00 EUR), nos termos previstos no Regulamento de Custas Processuais.
UU. De acordo com os elementos acima descritos deverá a Recorrente ser condenada a pagar à Recorrida uma indemnização em valor não inferior a 1 683,00 EUR (mil seiscentos e oitenta e três euros), porquanto este valor totaliza 0 montante total de despesas que a Recorrida conseguiu apurar. Não obstante, por não dispor a Recorrida de informações que lhe permitam determinar 0 montante total das despesas em que incorreu no decurso do presente processo (além do pagamento das taxas de justiça acima mencionadas) deverá, ao valor supra referido, acrescer 0 montante a fixar de acordo com 0 prudente arbítrio do julgador, nos termos e para os efeitos do disposto no n,° 3 do artigo 543.° do CPC, com as demais consequências legais daí advenientes.
W. Por tudo quanto foi dito, ficou cabalmente demonstrado através das presentes Contra-alegações que a pretensão da Recorrente é manifestamente infundada e desajustada, porquanto pretende responsabilizar a Recorrida pelos danos a que bem sabe não ter direito.
WW. Termos em que, deve a douta Decisão proveniente do Tribunal de 1.a Instância manter-se inalterada e, consequentemente, deverá o recurso interposto pela Recorrente ser considerado integralmente improcedente, devendo a Recorrente ser condenada no pagamento à Recorrida da indemnização em montante não inferior ao supra referido, ao qual deverá acrescer 0 montante a fixar de acordo com o prudente arbítrio do julgador, nos termos e para os efeitos do disposto no n.° 3 do artigo 543.° do CPC, com as demais consequências legais daí advenientes. 
Nestes termos e nos mais de Direito, deverá o recurso apresentado peia Recorrente ser rejeitado, por ser julgado totalmente improcedente, por não provado e não fundamentado, mantendo-se na íntegra a Sentença ora em apreço e fazendo-se assim fazendo V. Exas. a costumada JUSTIÇA!

Em 23-04-2019 foi proferida decisão que fixou em 1.683,00€ (mil seiscentos e oitenta e três euros) o montante da indemnização devida pela autora à ré, a título de litigante de má-fé; na mesma data foi proferido despacho de admissão do recurso interposto pela autora., tudo conforme fls. 245-248, tendo as partes sido notificadas.

II.FUNDAMENTOS DE FACTO

O tribunal de primeira instância deu por provada a seguinte factualidade:

1. Em 2009 A. (aqui Autora), juntamente com RB (ambos sócios da sociedade irregular Z. de A. e RB), intentou contra B., Lda. uma ação declarativa de condenação, com processo ordinário, que correu termos, sob o n.° 17429/09.1T2SNT, pela 1ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, com a alegação constante da petição inicial de fls. 183 a 193, que aqui se dá por integralmente reproduzida, pedindo: a) se considere inexistente justa causa para a resolução do contrato de fornecimento vigente entre os AA. e a R. [pedindo a declaração de invalidade da resolução do contrato operada pela Ré], b) a condenação da Ré a indemnizar os AA. na quantia de € 23.247,87 a título de danos emergentes, c) a condenação da Ré a indemnizar os AA. na quantia de € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais.

2. Por sentença, transitada em julgado, com os fundamentos de facto e de direito constantes de fls. 194 a 199, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, foi decidido julgar o pedido formulado pelos Autores A. e RB parcialmente procedente e declara-se inválida, por falha de fundamento, a resolução do contrato celebrado entre os mesmos e a ré B., Lda. em 2 de Janeiro de 2004. No mais, julgaram-se os pedidos formulados pelos referidos autores improcedentes e dos mesmos se absolveu a Ré.

3. Da sentença proferida no identificado processo n.° 17429/09.1T2SNT, transitada em julgado em 05-11-2012, consta, designadamente, o seguinte:

FACTOS PROVADOS
(...)
1.-  A ré é uma sociedade por quotas, cujo objecto social consiste no comércio retalhista de produtos alimentares e outros [alínea A) dos factos assentes].
2.- Em 2 de Janeiro de 2004, os autores e a ré subscreveram o chamado contrato de fornecimento de produtos alimentares que consta do documento n°
2.-  que aqui se dá por reproduzido [alínea B) dos factos assentes].
3.-  Nele e nos termos do ponto 2.2. os autores obrigavam-se a fornecer à ré pastelaria variada (doces e salgados) para posterior venda nos diversos postos de estabelecimento explorados por esta [alínea C) dos factos assentes].
4.-  Por seu turno a ré obrigava-se a efectuar o pagamento do preço acordado, nos prazos e condições definidas, como previsto no ponto 2.3 desse contrato [alínea D) dos factos assentes).
5.-  No ponto 3.1. refere-se: "( ...) 3.1. Constituem Direitos da Primeira Outorgante:
“3.1.3. sem prejuízo de outros direitos incluindo o de indemnização, proceder à rescisão deste contrato, em caso de incumprimento imputável à Segunda outorgante, de qualquer uma das obrigações assumidas nos termos presente contrato. A rescisão será feita por carta registada com aviso de recepção e produzirá os seus efeitos nos 3 dias posteriores ao envio pelo correio da comunicação.(...)" [alínea E) dos factos assentes].
6.  E no ponto 4.1. as partes estipularam que o contrato vigorava desde a data da sua celebração até ao dia 31.12.2004, com prorrogação expressa ou tácita das partes até à celebração de novo contrato que o substituísse [alínea F) dos factos assentes).
7. Ali se diz que o contrato podia ser livremente denunciado com a antecedência de 30 dias antes da sua renovação, desde que fosse comunicado à outra parte, por meio de carta registada com aviso de recepção - ponto 4.2. [alínea G) dos factos assentes).
8.  Nenhuma das partes comunicou à outra a sua intenção de denunciar o contrato até 30 dias antes daquela data de 31.12.2004 [alínea H) dos factos assentes].
9. As encomendas eram efectuadas tendo em conta o prazo de validade de 24 horas dos produtos [resposta ao art. 37° da base instrutória).
10. Os autores adquiriram produtos de pastelaria para fornecer à ré [resposta ao art. 43°da base instrutória].
11. A partir de determinada altura os autores deixaram de adquirir produtos de pastelaria e a partir daí passaram a produzir tais produtos [resposta ao art. 44°da base instrutória].
12.  Os autores confiavam na durabilidade do contrato e tinham a expectativa de desenvolverem o seu negócio [resposta ao art. 1° da base instrutória].
13. Os autores compraram farinha de trigo, farinha composta, açúcar granulado, margarina espong bolo-rei, magni-minut, margarina espong, placas folhadas, magni extras, magni-muffins, cintas bolo de arroz largas, chocolate pastilha, fondant icopa, magni-muffins, amêndoa granulada, noz em pedaços, doce de ovo magni, aroma de baunilha, aroma de laranja, vitena, chocolate em pó, magni-fermento, magnopan, açúcar moído, ”Ct. Dark Coating U2 ex 10 kg, Cremovo B1, Teg. Muffin Plus, Margarina Aloha, Sintra Sc, LDF Aroma Laranja, Chatypak, Ct. Decorcrem dark B1, Disco Obreia 20 Cm. Clubes, disco do Benfica, Sporting e Porto, Teg. Brioche, Fondant, Brioche 5%, coco ralado, cintas papel bolo arroz” gb bolan fresh, g bel. activa 500 gb maxicreme, gb mufinmix, gb lev. activa 500, gb ferpo, gb lominut e gb natop [resposta aos arts. 6° a 9° da base instrutória].
14. Os autores adquiriram a "V, Lda." doce de ovo, fondant branco, açúcar moído, fruta picada, sultanas turcas, saco pasteleiro, boquilhas lisas, boquilhas frisadas, espátula thermo, vara inox, faca pasteleiro, papel para caixa, corta massas, pincel pastelaria grande e pequeno, forma pasteis nata, forma queque, amêndoa palitos, noz quartos Moldávia, pegas para forno, óleo alimentar, papel vegetal fino, margarina plus folhados, margarina plus bolo-rei, margarina creme barras, pratos cartão, sal, vitena, cintas bolo arroz, corante liquido azul, amarelo, branco negro, vermelho, verde, pratos cartão, naperons rendados n- 45, velas arte n-4/5/6/7/8/9, forma pasteis de nata, canela em pó, canela inteira, chocolate pastilhas, chocolate pastilhas branco, chocolate em pó, chocopan branco, creme chocolate, doce gila especial, fondant branco, forma plissada e naperons rendados n-36/n-40 [resposta ao art. 10° da base instrutória].
15. Os autores compraram a ”JS” margarina leal M folhado, creme de cacau, fondant branco, fruta picada, star line minute cobertura vegetal [resposta ao art. 11° da base instrutória].
16. Os Autores adquiriram fritadeira eléctrica para bolas de Berlim, cortadora de carnes frias, arriões em inox para tabuleiros, estufa inox com entrada de arriões, tabuleiros em ferro para pastelaria, tabuleiros em ferro para pastelaria, armários em inox com gavetas e portas de correr, electro insectos grande, conjunto prateleiras inox, máquina de lavar copos, bancada de cafetaria em inox, pia de lavar as mãos, torradeiras, balança electrónica e porta papéis [resposta ao art. 17° da base instrutória].
17.  A ré comunicou à autora que os produtos de pastelaria tinham má qualidade [resposta ao art. 31° da base instrutória).
18.  Os autores, por diversas vezes, não entregaram os produtos [resposta ao art. 34°da base instrutória].
19. Em Janeiro de 2005 os autores não entregaram produtos de pastelaria durante cerca de duas semanas [resposta ao art. 36° da base instrutória].
20. A ré tentou agendar, por diversas vezes, reuniões com os autores que não se efectivaram [resposta ao art. 38°da base instrutória].
21. A última reunião ficou agendada para o dia 04.03.2005, tendo sido comunicada a impossibilidade de a autora comparecer [respost ao art. 39° da base instrutória].
22.  Os autores tinham conhecimento dos factos referidos em 17, 18, 19 e 20 e sabiam que a ré estava insatisfeita [resposta ao art. 40” da base instrutória].

23.  A ré enviou uma carta aos autores onde se lê: ”(...)
Assunto: Rescisão de contrato
Exmo.(a) Sr.(a),
Nos termos da alínea 3.1.3 do contrato de fornecimento celebrado em 24.03.2004 entre as partes, vem a B. Lda. proceder nesta data à rescisão do mesmo.
Esta nossa decisão tem por base o não cumprimento por parte de V. Exas. dos níveis de serviço acordados para o fornecimento das nossas lojas. (...)” [resposta ao art. 49° da base instrutória).

24.  A carta referida no número anterior tem a data de 7 de Março de 2005 [documento de fls. 30 não impugnado].
25.  Na sequência da cessação do contrato houve produtos que se deterioraram por não terem sido utilizados [resposta aos arts. 13°e 14°da base instrutória].
26. Na sequência da cessação do contrato os autores tiveram uma quebra das suas receitas [resposta ao art. 4°da base instrutória).
27.  Os autores sentiram tristeza pela cessação do contrato e o autor trabalhava cerca de 1O horas por dia [resposta aos arts. 21° e 22° da base instrutória).
28. Os autores estiveram desempregados durante algum tempo e actualmente estão desempregados [resposta ao art. 25° da base instrutória).
(...)

O DIREITO
(...)

Na qualificação, que logicamente se impõe do contrato dado à acção, afigura- se que estamos perante um contrato de fornecimento, figura juridicamente atípica que se distingue por ser uma plataforma ou quadro contratual onde se desenrola um encadeado de actos de compra e venda entre um vendedor/fornecedor de bens ou serviços e o respectivo adquirente. Assim, nos termos do ponto 1.1 do clausulado exarou-se que o contrato estabelecia "as condições gerais a que se deve subordinar qualquer fornecimento de bens a efectuar” pelos autores à ré. No ponto 2.1.1 consagrou-se a obrigação desta última em proceder ao pagamento do preço dos produtos enquanto no ponto 2.2.1 ficou a constar a obrigação de fornecimento à ré dos produtos por esta encomendados. Por fim, no ponto 4.1 estabeleceu-se um período de vigência do contrato, sujeito a eventuais renovações. (...) Importando, ainda, para a discussão que segue caracterizar o contrato de fornecimento junto aos autos nos seus elementos mais decisivos, verifica-se que no ponto 1.3 as partes estipularam "o presente contrato não impõe aos estabelecimentos da primeira contraente qualquer obrigação de compra efectiva da gama de produtos comercializados pela segunda contraente, obrigação essa que apenas surgirá para cada produto, com a colocação da encomenda junto da segunda contraente”. Essa convenção exprime de forma suficientemente clara que não foi desiderato das partes vincular a ré à aquisição dos produtos fornecidos pelos autores, nem sequer de um volume ou valor mínimo desses produtos, por uma qualquer unidade de tempo. Bem diversamente, nos termos da mesma, o contrato de fornecimento dos autos apenas constitui uma "moldura negocial” dentro da qual, a ré, querendo, pode encomendar produtos aos autores, ficando estes obrigados a satisfazer essas encomendas, enquanto aquela outra fica adstrita a pagar-lhes o correspectivo preço. Finalmente, como também se alcança (desta feita, pela negativa) da leitura do contrato, não foi estabelecida qualquer exclusividade na relação entre as partes, podendo os autores e a ré, venderem e comprarem, respectivamente, produtos a terceiros sem que a essa conduta corresponda qualquer violação do pacto entre ambos. (...) O modo de cessação usado pela ré e que se traduziu no envio aos autores da carta a que alude o no 23 da fundamentação de facto é de qualificar juridicamente como uma resolução. (...) Na situação em presença a prestação a cargo dos autores e que consistia, além do mais, em satisfazer com pontualidade (no sentido estrito ou temporal) as encomendas da ré foi claramente incumprida. Para tanto, basta atentar na prova de que os autores, por diversas vezes, não satisfizeram as encomendas e que em Janeiro de 2005 estiveram duas semanas sem entregar os produtos de pastelaria [n°s 18 e 19]. É certo ter-se também provado que a ré comunicou aos autores que os referidos produtos tinham má qualidade [n° 17), mas o facto de essa comunicação ter existido não importa, como é óbvio, que o declarado na mesma fosse verdadeiro. Questiona-se, pois, se nessas datas circunstâncias era legítimo à ré, sem mais, optar pela resolução do contrato, como o fez. (...) No ponto 3.1.3 do contrato celebrado entre as partes figura efectivamente uma previsão sobre o direito de resolução da ré (em tudo semelhante, aliás. a outra gizada para os autores no ponto. 3.2.2) nos seguintes termos: "(...) sem prejuízo de outros direitos incluindo o de indemnização, proceder à rescisão deste contrato, em caso de incumprimento imputável à Segunda outorgante, de qualquer uma das obrigações assumidas nos termos do presente contrato. A rescisão será feita por carta registada com aviso de recepção e produzirá os seus efeitos nos 3 dias posteriores ao envio pelo correio da comunicação. (...)". Sucede, porém, que uma cláusula com essa redacção, pela qual as partes se limitam a prefigurar o direito de resolução, como aí se diz “em caso de incumprimento imputável à Segunda outorgante, de qualquer uma das obrigações assumidas nos termos do presente contrato", por totalmente genérica, nada estipula de novo perante o que decorre da lei, sendo comummente entendida como uma mera ”cláusula de estilo ” [cfr. entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 1999 in RLJ133 ( 2000-2001) pág. 124]. Não existindo, assim, qualquer regime convencional específico para o exercício do direito de resolução do contrato, é forçoso regressar às premissas da lei e em concreto aos pressupostos da convolação da mora em incumprimento definitivo. Perante as falhas da prestação dos autores de que dão contam os n°s 18 e 19 da fundamentação de facto era exigível da ré, à luz do regime predisposto no art. 808°, n.° 1 do Código Civil, que interpelasse os autores para retomar o fornecimento, em prazo, sob pena de o contrato ser resolvido. A autora fez essa interpelação? Desconhece-se. Por outro lado, sabendo-se que uma das falhas de entrega ocorreu em Janeiro de 2005 e que a ré declarou resolver o contrato em 7 de Março de 2005, no período intercorrente entre essas datas, os autores retomaram ou não os fornecimentos de forma regular? Ignora-se. Finalmente, quando se verificaram as outras falhas de entrega a que alude a matéria provada? Também se desconhece. Para dar arrimo a um incumprimento definitivo do contrato não basta que os autores soubessem que a ré estava insatisfeita com a sua prestação, que lhes tivesse sido comunicada uma putativa falta de qualidade dos produtos ou que soubessem que haviam incumprido as entregas a que se haviam comprometido. Era necessário que no momento em que a ré declarou a resolução do contrato aos autores aqueles aspectos de inexecução da prestação não tivessem sido superados ou corrigidos e que o não tivessem sido apesar de a ré ter exigido dos autores essa reparação, em prazo e sob cominação da resolução do contrato. Não se tendo demonstrado que assim sucedeu (...), a resolução do contrato entre autores e ré é de ter como inválida. (...) Com fundamento nessa invalidade os autores enunciam um conjunto de danos que dizem ter tido com a cessação do contrato e que podemos isolar conceptualmente em quatro tipos: custos com as infra- estruturas do negócio, como o sejam os relativos à aquisição de equipamento; custos com a aquisição de matérias-primas, lucros cessantes e danos não patrimoniais. (...) No que concerne à verificação de danos patrimoniais, provou-se que os autores efectuaram a compra de diverso equipamento e matérias-primas, tendo alguns destes produtos se deteriorado por não terem sido utilizados [n°s 13, 14, 15 e 16 da factualidade supra). Tendo-se questionado nos arts.15° e 18° da base instrutória se os autores pagaram aos respectivos fornecedores a compra desses produtos e equipamento, a resposta foi negativa (cfr. folhas 275 verso e 276). A ausência de prova que se desprende da resposta negativa impede liminarmente que se veja na aquisição desses materiais um dano, na justa medida em que se desconhece se a esfera patrimonial dos autores diminuiu por alguma forma com essas compras. Por outro lado, se apenas alguns desses produtos se deterioraram, outros subsistiram que mantiveram o seu valor e aptidão, sendo essa asserção particularmente válida para o equipamento. Podendo esses materiais ser utilizados com outro propósito além do fornecimento de produtos à ré, inexiste no mero facto da sua aquisição qualquer dano. Esta constatação conduz-nos a outras asserções que se pretendem com a não exclusividade do contrato e com a inexistência de uma obrigação da ré em adquirir os produtos dos autores. Conforme acima se viu, as partes não se vincularam a qualquer pacto de exclusividade, persistindo os autores livres para fornecer outros compradores além da ré e esta desobrigada do dever de comprar àqueles, podendo ”colocar ” encomendas junto de quaisquer outros fornecedores. As obrigações das partes têm assim por universo não a duração do contrato, mas cada concreta encomenda: os autores obrigam-se a satisfazer em prazo e com qualidade cada uma das encomendas que a ré lhes dirija e a ré vincula-se a pagar-lhes essas encomendas. Ora, resultando da prova que os autores investiram em equipamento e matérias primas, fizeram-no a seu risco e porquanto assim o entenderam, não existindo qualquer nexo de causalidade digno de tutela entre esse investimento e o contrato celebrado com a ré, o qual, como se disse, não os impedia de vender a terceiros, assim como não obrigava a ré a comprar-lhes os seus produtos. Do mesmo passo, se os autores após a cessação do contrato tiveram uma quebra de receitas, a mesma não pode ser imputada à invalidade da resolução, na medida em que a ré, durante a execução do contrato e sem qualquer incumprimento do mesmo, era livre de não adquirir aos autores os produtos destes, bastando, para tanto, que não dirigisse àqueles quaisquer encomendas [cfr. ponto 1.3 do clausulado negocial]. Assim, quando se demonstra que os autores confiaram na durabilidade do contrato com a ré e sentiram tristeza pela sua cessação, esse investimento de confiança não tem tutela jurídica, por inexistir qualquer dever que vinculasse a ré a manter os pedidos de fornecimento que ia dirigindo àqueles. A finalizar, dir-se-á que a demonstração de que alguns produtos se deterioraram por não terem sido utilizados, apenas poderia equivaler a um dano ressarcível caso os autores tivessem logrado demonstrar um conjunto de circunstâncias que não resultam da prova: o pagamento do preço desses produtos, como acima se disse; que esses produtos haviam sido adquiridos para satisfazer uma concreta encomenda da ré e que essa encomenda se gorou por causa do termo abrupto do contrato. Ante o exposto, conclui-se que sem embargo de proceder a declaração de invalidade da resolução do contrato, terão que soçobrar os demais pedidos formulados, que eram dependência da prova de danos que apresentassem um nexo de causalidade adequada com o ilícito contratual, o que, no caso, salvo melhor juízo, não se verificou.”
DECISÃO
Em face do exposto, julga-se o pedido formulado pelos autores A. e RB parcialmente procedente e, nessa mesma medida, declara-se inválida, por falha de fundamento, a resolução do contrato celebrado entre os mesmos e a ré B., Lda. em 2 de Janeiro de 2004. No mais, julgam-se os pedidos formulados pelos referidos autores improcedentes e dos mesmos se absolve a ré. (...).”

4.  Em 08.01.2015 A. (aqui Autora) intentou contra B., Lda. nova ação declarativa de condenação, com processo comum, que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Cível - J12, com a alegação constante da petição inicial de fls. 142 a 150, que aqui se dá por integralmente reproduzida, a pedir: a) a condenação da Ré no pagamento de € 427.638,80, a título de danos patrimoniais (a título de lucros cessantes), acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 158.270,22, b) € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais; alegadamente decorrentes da resolução mencionada 4).

5. Da sentença proferida no identificado processo n.° 503/15.2T8LSB, transitada em julgado, consta, designadamente, o seguinte:
“No interesse contratual negativo, o qual pode compreender tanto os danos emergentes, como os lucros cessantes, busca-se a situação que o lesado teria se o contrato não tivesse sido, sequer, celebrado [acórdão de 17-05-2007 do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.° 07B746].
Há que distinguir entre os chamados danos positivos ou de cumprimento e os danos negativos ou de confiança; é uma classificação particularmente ligada à responsabilidade contratual pelo que se alude, em correspondência, à violação do interesse contratual positivo e do interesse contratual negativo; a indemnização pelo dano positivo destina-se a colocar o lesado na situação em que se encontraria se o contrato fosse exatamente cumprido; reconduz-se, assim, aos prejuízos que decorrem do não cumprimento definitivo do contrato ou do seu cumprimento tardio ou defeituoso; ao passo que a indemnização do dano negativo tende a repor o lesado na situação em que estaria se não houvesse celebrado o contrato, ou mesmo iniciado as negociações com vista à respectiva conclusão [acórdão de 15-12-2011 do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.° 1807/08.6TVLSB.L1.S1, citando o Prof. Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 9.a edição, pg. 548].
No âmbito do identificado processo n.° n.° 17429/09.1T2SNT, a autora A. peticionou ali a condenação da ré B. no pagamento de uma quantia a título de danos não patrimoniais alegadamente decorrentes da resolução ilícita do referido acordo de 24 de março de 2004, pedido que repetiu nos presentes autos.
Como atrás se anotou, a sentença prolatada no processo n.° n.° 17429/09.1T2SNT julgou improcedente tal pedido indemnizatório a título de danos não patrimoniais.
Assim, relativamente aos presentes autos e ao pedido nele formulado de fixação de uma quantia indemnizatória/compensatória a título de danos não patrimoniais ocorre a violação do caso julgado (material).
Outro tanto não sucede quanto ao pedido indemnizatório a título de danos patrimoniais deduzido nos presentes autos já que, neste caso, tratando-se de uma causa de pedir complexa [e parcialmente diferenciada da causa de pedir alegada no processo n.° 17429/09.1T2SNT], integrando a ilícita resolução do celebrado contrato e os alegados danos positivos ou de cumprimento [a tutela judiciária do interesse contratual positivo, destinada a colocar o lesado na situação em que se encontraria se o contrato fosse exatamente cumprido], não ocorre a denunciada violação do caso julgado nem a denominada autoridade do caso julgado, pois, não está em causa o risco de contradição de decisões judiciais versando o mesmo objeto.
Conclui-se, pois, pela procedência da arguida exceção do caso julgado quanto ao pedido de condenação da ré B. no pagamento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais, improcedendo tal arguição no que respeita à pretensão de condenação da mesma ré no pagamento de uma indemnização a título de danos patrimoniais.
Inexistem outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

IIIA FACTUALIDADE RELEVANTE [PROVADA OU MERAMENTE ALEGADA]
III.a)-os factos alegados na petição inicial que deu início à presente ação;
III.b)- os factos alegados na petição inicial respeitante ao processo n.° 17429/09.1T2SNT;
III.c)-o teor da sentença proferida no processo n.° 17429/09.1T2SNT, já transitada em julgado.
IV- Análise do pedido da autora perante o quadro normativo pertinente.
A autora A. pretende ainda a condenação da ré B., LDA. no pagamento da quantia de "€ 427.638,80, a título de danos patrimoniais, a que acrescerão juros comerciais de mora vencidos, de € 158,270,22
Segundo a autora A., o incumprimento culposo, pela ré B., do acordo de 24 de março de 2004 teve como consequência que a autora deixasse de auferir o indicado montante de € 427.638,80.
Assim, alegou a autora o seguinte.
Se a ré não tivesse cessado o contrato através de rescisão, o mesmo manter-se- ia em vigor até que qualquer uma das partes o denunciasse.
Assim, tendo em conta que a ré ainda existe, com o mesmo objeto social, não tendo denunciado o contrato após a sentença proferida pelo tribunal, seria expectável que o contrato se prolongasse em vigor até aos dias de hoje.
A carta de rescisão tinha a data de 7 de março de 2005 pelo que seria expectável que, após esta data, o contrato celebrado entre a autora e a ré viesse a vigorar por mais 10 anos.
Desde a data do início do contrato, em abril de 2004, até março de 2005, a ré pagou à autora, pelos fornecimento que esta lhe fez, a quantia de 42.763,88. Toma-se, pois, como referência de rendimento anual, por força do contrato celebrado, a importância de € 42.763,88, o que, multiplicado por 10 anos, período expectável de duração do contrato, uma vez que o mesmo nunca foi rescindido formalmente, resultaria num rendimento total de € 427.638,80.
É este o valor aproximado que a autora auferiria até ao presente se não fosse rescindido o contrato ilicitamente.
As razões que ditam a manifesta improcedência da pretensão da autora.
Em primeiro lugar, como alegou a ré B., a declaração de resolução do acordo de 24 de março de 2004, conquanto ilícita enquanto tal, sempre produziria efeitos como declaração de denúncia do mesmo acordo, impedindo a sua renovação.
A invalidade da cláusula resolutiva implica a ilicitude da resolução, mas não a sua ineficácia; recebida pela contraparte a declaração resolutiva, o contrato extingue-se, constituindo a falta de fundamento da resolução um acto ilícito gerador de uma situação de incumprimento, tornando-se o contraente que assim actuou responsável pelo prejuízo que causar à outra parte, fazendo recair sobre si a obrigação de a indemnizar por ter feito cessar ilicitamente o contrato (art. 798º C.Civil); se na declaração de resolução, ilícita enquanto tal, se encontrarem presentes os necessários requisitos formais e substanciais da denúncia, nada impede, como admitido no art. 293º C.Civil, que a declaração que vem qualificada como de resolução se tenha como convertida em declaração de denúncia, com a consequente extinção do contrato, impedindo a renovação [acórdão de 12-10-2010 do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.° 133/2002.L1.S1].
Em segundo lugar, como se realçou na prolatada sentença, no ponto 1.3 as partes estipularam “o presente contrato não impõe aos estabelecimentos da primeira contraente qualquer obrigação de compra efectiva da gama de produtos comercializados pela segunda contraente, obrigação essa que apenas surgirá para cada produto, com a colocação da encomenda junto da segunda contraente”. Essa convenção exprime de forma suficientemente clara que não foi desiderato das partes vincular a ré à aquisição dos produtos fornecidos pelos autores, nem sequer de um volume ou valor mínimo desses produtos, por uma qualquer unidade de tempo. Bem diversamente, nos termos da mesma, o contrato de fornecimento dos autos apenas constitui uma "moldura negocial” dentro da qual, a ré, querendo, pode encomendar produtos aos autores, ficando estes obrigados a satisfazer essas encomendas, enquanto aquela outra fica adstrita a pagar-lhes o correspectivo preço. Finalmente, como também se alcança (desta feita, pela negativa) da leitura do contrato, não foi estabelecida qualquer exclusividade na relação entre as partes, podendo os autores e a ré, venderem e comprarem, respectivamente, produtos a terceiros sem que a essa conduta corresponda qualquer violação do pacto entre ambos.
Assim, nunca tendo existido uma concreta obrigação da ré de adquirir num dado período de tempo um determinado número de produtos à sociedade (irregular) denominada Z de A. e RB, nem uma obrigação de exclusividade, quer por parte da ré quer por parte daquela sociedade, verifica-se que os alegados danos patrimoniais não têm qualquer suporte fáctico ou legal.
Em terceiro lugar, a resolução contratual abre caminho a indemnização apenas pelos danos negativos, reconhecendo-se, contudo, que pode, excecionalmente, ter lugar indemnização por danos positivos, havendo que ponderar os interesses em jogo no caso concreto e, perante eles, conceder ou denegar o caminho, particularmente estreito, da indemnização pelo interesse contratual positivo; nesta ponderação, tem uma palavra a dizer o princípio da boa fé [vide o já citado acórdão de 15-12-2011 do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.° 1807/08.6TVLSB.L1.S1; no mesmo sentido, acórdão de 2904-2014 do Tribunal da Relação do Porto, Proc. n.° 311/12.2TBCNF-B.P1, concluindo, no caso concreto ali analisado, que “Ponderando os interesses em jogo à luz do princípio da boa fé, designadamente o equilíbrio contratual, não se vê qualquer circunstância excepcional que imponha a subsistência do contrato após a sua resolução, e que legitime a indemnização correspondente ao interesse contratual positivo].
Ora, como igualmente se realçou na prolatada sentença, Na situação em presença a prestação a cargo dos autores e que consistia, além do mais, em satisfazer com pontualidade (no sentido estrito ou temporal) as encomendas da ré foi claramente incumprida. Para tanto, basta atentar na prova de que os autores, por diversas vezes, não satisfizeram as encomendas e que em Janeiro de 2005 estiveram duas semanas sem entregar os produtos de pastelaria [n°s 18 e 19].
Isto é, logo no processo n.° 17429/09.1T2SNT se constatou que os ali autores, exercendo o seu comércio por intermédio da sociedade (irregular) denominada Z, incorreram, por várias vezes, no incumprimento da sua obrigação de entrega pontual dos produtos encomendados pela ré.
Acresce que não foram alegados outros factos que, uma vez provados, poderiam servir de suporte à atuação do enunciado princípio da boa fé na execução dos contratos [neste sentido, a aludida sentença: Ora, resultando da prova que os autores investiram em equipamento e matérias-primas, fizeram-no a seu risco e porquanto assim o entenderam, não existindo qualquer nexo de causalidade digno de tutela entre esse investimento e o contrato celebrado com a ré, o qual, como se disse, não os impedia de vender a terceiros, assim como não obrigava a ré a comprar-lhes os seus produtos. Do mesmo passo, se os autores após a cessação do contrato tiveram uma quebra de receitas, a mesma não pode ser imputada à invalidade da resolução, na medida em que a ré, durante a execução do contrato e sem qualquer incumprimento do mesmo, era livre de não adquirir aos autores os produtos destes, bastando, para tanto, que não dirigisse àqueles quaisquer encomendas [cfr. ponto 1.3 do clausulado negocial]. Assim, quando se demonstra que os autores confiaram na durabilidade do contrato com a ré e sentiram tristeza pela sua cessação, esse investimento de confiança não tem tutela jurídica, por inexistir qualquer dever que vinculasse a ré a manter os pedidos de fornecimento que ia dirigindo àqueles].

IVDecisão
Face ao exposto, julgando a ação totalmente improcedente, decide-se:
a)- absolver a ré B., LDA. da instância quanto ao pedido de condenação da mesma no pagamento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais;
b)- absolver a ré B., LDA. do pedido quanto ao pedido de condenação da mesma no pagamento de uma indemnização a título de danos patrimoniais, no montante de € 427.638,80;
c)- absolver a ré B., LDA. do pedido quanto ao pedido de condenação da mesma no pagamento de juros moratórios;
d)condenar a autora A. no pagamento das custas ”.

6.  Contra esta decisão foi pela Autora interposto recurso que foi julgado improcedente, por douto acórdão de fls. 111v a 128, cujos fundamentos de acto e de direito aqui se dão por integralmente reproduzidos, que confirmou a sentença recorrida.

7.  O Tribunal da Relação de Lisboa fez constar do douto acórdão prolatado: (...) "tendo o contrato cessado, não por resolução ilícita, mas por denúncia, não cabe à A. qualquer indemnização, por um lado, porque a Ré teria respeitado o prazo de antecedência que lhe era exigível para proceder a essa denuncia, por outro, e porque, inelutavelmente, os possíveis danos que advieram à A. da cessação do contrato, em face do mesmo, constituíam sempre um risco do mesmo, não tendo pois causa nessa cessação».

(...)

"Não obstante, não deixará de se consignar (...) que sempre se entenderia ocorrer a excepção do caso julgado.
É que a A., ao contrário do que artificiosamente pretende fazer crer nesta acção, podia na primeira, ter invocado, ter sofrido, para além dos danos emergentes que aí invocou, os lucros cessantes que aqui vem invocar, pois que a invocação destes não dependia nem jurídica nem naturalisticamente da efectiva manutenção da relação contratual, como a mesma o parece pretender para fundar a sua "superveniência”. Tão pouco a dicotomia, interesse contratual positivo/interesse contratual negativo, que a A. utiliza nesta acção, confundindo conceitos, altera o que acaba de se dizer - a A. podia ter logo pedido na primeira acção os prejuízos para ela resultantes dos ganhos que viu frustrados em função da extinção do contrato (lucros cessantes) se, na verdade, tivesse fundamento, à luz do concreto contrato, para minimamente fazer crer que «era expectável» que o mesmo se tivesse mantido por 10 anos.
Na verdade, o caso julgado «cobre o deduzido e o dedutível», não apenas relativamente aos meios de defesa do réu, mas também relativamente a todas as possíveis razões do autor. O caso julgado abrange o deduzido e o dedutível, precludindo ao autor a invocação, noutra acção, de factos integradores da causa de pedir da acção anteriormente julgada e que aí foram omitidos. Na mesma linha, Teixeira de Sousa defende que o caso julgado «cobre o deduzido e o dedutível», ficando, por isso, precludida a invocação pelo autor de factos que visem completar o objecto da acção anteriormente apreciada, mesmo que com uma decisão de improcedência. Daí que, segundo tal entendimento, a sentença que julga improcedente a acção preclude ao autor a possibilidade de, em novo processo, invocar outros argumentos, de facto ou de direito, não produzidos no processo anterior. Nas palavras de Lopes do Rego a excepção de caso julgado «tem que ver com um fenómeno de identidade entre relações jurídicas, sendo a mesma relação submetida sucessivamente a apreciação jurisdicional ignorando-se ou desvalorizando-se o facto de esse mesma relação já ter sido, enquanto objecto processual perfeitamente individualizado nos seus aspectos subjectivos e objectivos, anteriormente apreciada jurisdicionalmente, mediante decisão que transitou em julgado» Lembrando que «a essencial identidade e individualidade da causa de pedir não é afectada, nem por via da alteração da qualificação jurídica dos factos concretos em que se fundamenta a pretensão, nem por qualquer alteração ou ampliação factual que não afecte o núcleo essencial da causa de pedir que suporta ambas as acções» e que o pedido se mostra idêntico «quando o efeito prático-jurídico pretendido pelo autor em ambas as acções é substancialmente o mesmo».
A pretensão da A. na acção, e também na presente apelação, não tem assim qualquer fundamento. V - Pelo exposto, acorda este tribunal em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida, na parte em que julgou improcedente a acção e absolveu a R. do pedido [  [2]  ].

8.  Em 27.09.2017 a Autora A. veio propor a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra a Ré B., Lda., nos termos e com os fundamentos constantes da petição inicial de fls. 3 e seguintes, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 35.636,50 (a título de lucros cessantes), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos.

9. Para o efeito alega, em síntese, que: i) em 08/01/2015 intentou uma acção declarativa de condenação contra a Ré pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização por incumprimento contratual, com fundamento em rescisão, sem justa causa, do contrato de fornecimento de produtos celebrado entre Autora e Ré, ii) anteriormente a tal acção a Autora já havia instaurado, contra a Ré, uma outra acção declarativa de condenação pedindo a declaração de invalidade da resolução do contrato operada pela Ré, iii) por decisão, transitada em julgado, no âmbito desse processo o Tribunal julgou procedente o pedido da Autora, declarando inválida, por falta de fundamento, a resolução do contrato, iv) munida da sentença que declarou ilícita a resolução contratual efectuada pela Ré, pretendendo reclamar o ressarcimento dos danos que tal rescisão lhe provocou, intentou a segunda acção, v) no âmbito da segunda acção foi proferida sentença onde se exarou que “a resolução contratual abre caminho a indemnização apenas pelos danos negativos, reconhecendo-se, contudo, que pode, excepcionalmente, ter lugar indemnização por danos positivos, vi) interposto recurso contra esta sentença veio a mesma a ser confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, vii) na fundamentação do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa exarou-se que “uma resolução do contrato ilícita, porque sem fundamento contratual ou legal, implica a destruição retroactiva dessa relação contratual, colocando a parte que a ela recorre em responsabilidade civil pelo incumprimento definitivo do contrato”, viii) responsabilidade civil que com a presente acção se pretende efectivar, reclamando o preço da prestação de serviços não pago em virtude da cessação prematura do contrato, ix) a par dos danos emergentes a indemnização abarca a compensação pelos lucros cessantes, x) a rescisão operada pela Ré foi causa directa e adequada à verificação de todos os danos: a) os lucros que deixou de obter em virtude da cessação ilícita do contrato, b) os danos morais que sofreu.

III.FUNDAMENTOS DE DIREITO

1. Sendo o objeto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela apelante e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras – arts. 635º e 639º do CPC, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem – salientando-se, no entanto, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3.

No caso, ponderando as conclusões de recurso, impõe-se apreciar:
- Da exceção do caso julgado;
- Da verificação dos pressupostos da litigância de má-fé.

2. Os efeitos do caso julgado podem ser vistos numa dupla perspetiva, tratando-se de realidades distintas:
A exceção de caso julgado, exceção dilatória a que alude o art. 577º, alínea i), aferindo-se pela identidade dos sujeitos, pedido e causa de pedir [ [3]  ], nos moldes que resultam do disposto no art. 581º, pressupondo a repetição de uma causa e tendo por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (art. 580º, nºs 1 e 2); trata-se de exceção de conhecimento oficioso e dá origem à absolvição da instância (arts. 578º e 576º, nº2);
A autoridade do caso julgado, que importa a aceitação de decisão proferida anteriormente, noutro processo, cujo conteúdo importa ao presente e que se lhe impõe, assim obstando que uma determinada situação jurídica ou relação seja novamente apreciada, considerando a maioria da jurisprudência e doutrina que, nesta aceção, não se exige a tríplice identidade [ [4] ] [ [5] ].
A decisão recorrida alude expressa e profusamente a esta matéria, podendo dizer-se, de forma ampla, que concordamos genericamente com o que aí se referiu, avançando-se já que temos por evidente que a apelante não tem razão.
Vejamos.
A dinâmica da relação estabelecida entre as partes – sendo que a autora e a ré tiveram intervenção, na mesma posição que ora ocupam, em todos os processos –, ponderando o teor dos articulados, incluindo aqueles juntos aos autos e alusivos aos demais processos, resume- se assim: a autora e a ré estiveram ligadas por um contrato de fornecimento, sendo a autora a entidade que prestava os bens ou serviços e a ré a adquirente, contrato este que cessou por vontade da ré, estando perfeitamente assente, desde a primeira ação (processo nº 17429/09.1T2SNT) a ilicitude dessa cessação porquanto por sentença já transitada foi declarada “inválida, por falta de fundamento, a resolução do contrato celebrado” – cfr. o número 3 dos factos provados.
Assentamos, igualmente, que em todos os (3) processos a autora pretende fazer valer perante a ré o direito à indemnização que se arroga titular, por força dessa cessação ilícita do contrato, de nada valendo à apelante alegar, como faz, que estamos perante diferentes causas de pedir e pedidos.
Reconduzindo-se o pedido a uma pretensão de condenação em quantia pecuniária, é claro que aquele que é formulado neste processo se contém inteiramente naquele que foi formulado na segunda ação (processo 503/15.2T8LSB), pouco interessando que, agora, a autora seja mais contida, deduzindo pedido de valor inferior.

Centremo-nos, então, na estrutura das três ações, no que concerne aos danos invocados:
No processo nº 17429/09.1T2SNT (1ª ação) a autora invoca “danos emergentes resultantes da inexistência de justa causa como fundamento para a resolução do contrato” no montante de 23.247,87€ (art. 28º), correspondendo à soma do preço dos produtos adquiridos para fabrico dos bolos a fornecer à ré que “acabaram por perecer” (art. 44º) e o valor do “investimento” feito “na sua máquina produtiva” (art. 45º); invoca, ainda danos não patrimoniais que computa em 20.000,00€ [ [6]  ].
Assim, pede a condenação da ré “a indemnizar os autores” [ [7] ] nessas quantias (cfr. petição inicial de fls. 183-193, aludida no número 1 dos factos provados);
No processo 503/15.2T8LSB (2ª ação), depois de fazer referência à ação anterior, a autora alega que “a presente acção não tem como objecto a apreciação dos danos emergentes, resultantes da cessação ilícita do contrato, que, apesar de tudo, se quantificam em milhares de euros” (art. 25º); alega que tendo por referência um valor anual, por força do contrato, de 42.763,88€, teria, em 10 anos “período expectável de duração do contrato”, um rendimento total de 427.638,80€, valor este que “a A. auferiria, até ao presente, se não fosse rescindido o contrato ilicitamente” e que é devido, acrescido de juros moratórios comerciais (arts. 34º a 38º), culminando com a seguinte afirmação:
“Para além desta importância, devida a título de lucros cessantes, a Autora terá também direito a uma indemnização por danos não patrimoniais” (art. 39º).
Consequentemente, pede a condenação da ré no pagamento de “€427.638,80, a título de danos patrimoniais”, acrescida de juros e “€25.000,00 a título de danos não patrimoniais” (cfr. petição inicial de fls. 143-150, aludida no número 4 dos factos provados);
Na sentença proferida pela primeira instância absolveu-se a ré da instância – por verificação da exceção de caso julgado – quanto ao pedido alusivo aos danos não patrimoniais e conheceu-se do pedido alusivo aos danos patrimoniais, absolvendo-se a ré do pedido [ [8]  ].     
Na presente ação (3ª ação) a autora qualifica o tipo de danos que invoca como constituindo “lucros cessantes que a Autora deixou de obter com a cessação prematura do contrato” (art. 61º) computando-os nos termos enunciados nos arts. 64º a 67º, a saber: tendo por referência um rendimento anual, por força do contrato, de 42.763,88€, isso “significa que a Autora recebia da Ré, em média, um valor mensal de € 3.563,65, pela contrapartida dos seus serviços”, pelo que, tendo a ré feito cessar o contrato no início de março, nada mais pagando à autora até ao final do ano de 2005, “como deveria ter acontecido, a primeira deveria ter pago à segunda, desde Março até Dezembro de 2005, tendo por referência a média mensal supra indicada, o valor aproximado de € 35.636,50, montante que ora se peticiona” (art. 67).
O que daqui resulta, com inteira evidência, é que, ab inicio, cessado o contrato, podia/devia a autora ter feito valer contra a ré os direitos emergentes da cessação ilícita, porquanto tinha ao seu dispor, ao que resulta da avaliação dos referidos processos, todos os elementos para tal, sendo que nunca a autora invocou a superveniência de qualquer facto ou complexo de factos; se não o fez, sibi impute, porquanto as partes estão representadas por profissionais do foro, técnicos do direito, sendo responsáveis pelos termos em que estruturam as ações, quer quanto à pretensão que formulam, quer quanto à recolha do material fático que entendem pertinente, sendo que o princípio da auto-responsabilidade das partes se associa ao princípio da preclusão e este ao caso julgado.
Como se concluiu no acórdão do STJ de 06-12-206 “[o] princípio da preclusão ou da eventualidade é um dos princípios enformadores do processo civil, decorre da formulação da doutrina e encontra acolhimento nos institutos da litispendência e do caso julgado – art. 580º, nº2, do Código de Processo Civil – e nos preceitos de onde decorre o postulado da concentração dos meios de alegação dos factos essenciais da causa de pedir e as razões de direito – art. 552º, nº1, d) – e das excepções, quanto à defesa – art. 573º, nº1, do Código de Processo Civil [ [9]  ].
Como se sabe, a causa de pedir é constituída pelo conjunto de factos, juridicamente relevantes, que são constitutivos do direito invocado, fundamentando a pretensão formulada (cfr. o art. 581º, nº4 do CPC). Tendo a autora, na segunda ação que instaurou, formulado pedido de indemnização tendo em vista, como resulta do que se expôs, o ressarcimento dos danos patrimoniais aí invocados, na vertente dos lucros cessantes, pedido que foi apreciado e julgado improcedente, não pode, posteriormente, intentar nova ação, para o mesmo efeito, invocando os mesmos danos, ainda que apresentando uma roupagem aparentemente diferente: o facto jurídico é o mesmo, ainda que a realidade que lhe subjaz seja descrita de outra forma. Acrescente-se que o acórdão do TRL aludido no número 7 dos factos provados deu nota, expressamente, dessa orientação que, cremos, não é sequer objeto de discussão na doutrina e jurisprudência, não se coibindo a autora de, ainda assim, instaurar a presente ação.
Em suma, como a primeira instância de forma sugestiva assinalou, “é manifesto que a pretensão ora apresentada (pela terceira vez, não obstante as pretensas “nuances” das várias acções) contra a Ré não pode ser objecto de (nova) apreciação jurisdicional”.
Improcedem as conclusões de recurso.

3. Impõe-se agora apreciar se se justifica a condenação da autora como litigante de má-fé, como entendeu a 1ª instância.
Começamos por delimitar o conceito de litigância de má-fé ponderando o regime jurídico enunciado nos arts. 542º e seguintes.

Dispõe o art.542º:
“Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.
2. Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a)-Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b)-Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c)-Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d)-Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
O novo CPC manteve a disposição constante do art. 456º da anterior lei processual civil, introduzida pelo Dec. Lei 329-A/95 de 12/12, com a redação alterada pelo Dec. Lei 180/96 de 25-09 [ [10] ]; o Dec. Lei 329-A/95 marcou um ponto de viragem muito importante relativamente ao regime anterior, o que foi assinalado no respetivo preâmbulo.
Assim, ampliou-se o conceito de forma a abarcar, não só as condutas dolosas, como até aí acontecia, mas ainda as atuações suscetíveis de subsumir-se à negligência grave, pese embora se discuta, agora, os contornos desta figura [ [11] ].
Por outro lado, para além desse elemento subjetivo, passou a elencar-se, separadamente, as várias condutas que integram a litigância de má-fé, ampliando-se a tipificação estabelecida anteriormente: é assim que, sob a alínea c), se prevê agora a omissão grave do dever de cooperação. Quanto à caracterização das diversas condutas, Meneses Cordeiro assinala “três tipos de actuação substancial e um de conduta processual”, englobando na primeira as previsões das alíneas a), b) e c) e na segunda a da alínea d) [ [12] ].   
Por último, há que notar que a lei não exige a ocorrência de danos para que se julgue verificada a litigância de má-fé, ou seja, o prejuízo não é um elemento do tipo.
Assim delimitado o conceito, afigura-se-nos que, no caso em apreço, a condenação proferida se mostra justificada porquanto a autora, estando representada por profissional do foro, tinha perfeita consciência que – pela terceira vez – suscitava a intervenção de um tribunal de forma indevida, sendo que já no segundo processo instaurado viu paralisada a sua pretensão por via da (mesma) exceção de caso julgado, quanto a determinado tipo de danos, sendo elucidativo o aresto do tribunal da Relação, que confirmou a sentença, nos moldes a que já se aludiu.
A circunstância de se deduzir pretensão sem fundamento, descurando regras elementares de interpretação e aplicação do direito não motiva, como se sabe, perante o disposto no art. 542º, nº2, a formulação de juízo condenatório como litigante de má-fé; aquele que assim atua responsabiliza-se apenas pelo pagamento das inerentes custas processuais o que, no caso, nem sequer será questão que preocupe a autora, que goza do benefício do apoio judiciário, o que significa que litiga utilizando recursos pagos por todos os demais cidadãos deste país [ [13] ]. Aliás, já assim sucedia aquando da propositura das ações anteriores, como resulta da referência ao deferimento do pedido judiciário aposta nas petições iniciais de ambos os processos e documentos juntos (cfr. fls. 150 a 151 e fls. 193). 
A este propósito assinala-se que, nos termos do art. 10º, nº1, alínea d) Lei 34/2004, de 29-07, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28-08, a “protecção jurídica é cancelada, quer na sua totalidade quer relativamente a alguma das suas modalidades”, “[s]e, em recurso, for confirmada a condenação do requerente como litigante de má fé”. O nº 3 do mesmo preceito dispõe que “[a] protecção jurídica pode ser cancelada oficiosamente pelos serviços da segurança social ou a requerimento do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da parte contrária, do patrono nomeado ou do agente de execução atribuído”, sendo sempre ouvido o requerente (nº4).
No caso, porém, a situação ultrapassa em muito a mera falta evidente de razão.
Como bem observou a primeira instância:
“No caso, da análise de todo o contexto processual resulta apurado que a Autora violou as obrigações processuais que sobre si impediam.
Com efeito, compulsado o conspecto factual apurado, é manifesto que, apesar do desfecho da anterior (e já segunda) acção que propôs contra a Ré, e o que se decidiu douto Acórdão prolatado no âmbito da acção que correu termos sob o n.° 503/15.2T8LSB, transitado em julgado (cfr. matéria de facto assente), ainda assim, não se coibiu de propor a presente (terceira) acção.
E é reprovável que a Autora proponha a presente (terceira) acção (contra a Ré) salientando apenas os aspectos que lhe interessam das decisões anteriormente proferidas, mas omitindo, embora tenha inteiro conhecimento, o decidido pelo douto Acórdão prolatado na (segunda) acção que correu termos, sob o n.° 503/15.2T8LSB, entre as mesmas partes, sobre a mesma questão, que, perspectivando os termos da (primeira) acção que correu termos sob o n.° 17429/09.1T2SNT, pela 1a Vara Cível da Comarca de Lisboa, onde expressamente se exarou: “tendo o contrato cessado, não por resolução ilícita, mas por denúncia, não cabe à A. qualquer indemnização, por um lado, porque a Ré teria respeitado o prazo de antecedência que lhe era exigível para proceder a essa denuncia, por outro, e porque, inelutavelmente, os possíveis danos que advieram à A. da cessação do contrato, em face do mesmo, constituíam sempre um risco do mesmo, não tendo pois causa nessa cessação ” e que, de todo o modo, se pronunciou ainda pela verificação de caso julgado no que respeita a todos os pedidos indemnizatórios formulados.
Nestas condições, conclui-se que a Autora, pelo menos, com negligencia grave, deduziu pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar e omitiu factos relevantes para a decisão da causa.
Em jeito de síntese, verifica-se a existência de litigância de má-fé, sendo a conduta da Autora merecedora da reprovação e censura éticas bem como de punição.
Posto que, verificados os pressupostos legais previstos para o efeito, ao abrigo do disposto no artigo 542°, n.°s 1 e 2, alínea a), do Código de Processo Civil, se justifica a condenação da Autora no pagamento de uma multa que se fixa no valor de 4 UC”.
Acrescente-se que causa absoluta perplexidade que a apelante, nas alegações de recurso, considere que “[a] primeira acção mereceu provimento e a segunda acção não foi julgada procedente por razões de mera configuração jurídica, sendo a presente acção apenas uma mera correcção da configuração jurídica da segunda”[[14]],no contexto dos autos, ponderando quer os termos dos articulados apresentados (petição inicial) quer as decisões proferidas.
Em suma, estamos perante uma lide, no mínimo, gravemente negligente, justificando-se a condenação da autora como litigante de má-fé, na multa aludida e em indemnização, nos moldes equacionados na decisão recorrida.
Improcedem, pois, as conclusões de recurso.
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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo a sentença recorrida.
Oportunamente será aberta vista ao M.P. e deve oficiar-se à Segurança Social, para os efeitos tidos por pertinentes em face do disposto no art. 10º, nº1, alínea d) e nº3 da Lei 34/2004, de 29-07, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28-08.
Custas pela apelante.
Notifique.


Lisboa, 2019-10-01

                                       
(Isabel Fonseca)                                       
(Maria Adelaide Domingos)                                       
(Ana Isabel Pessoa)



[1]Da responsabilidade do relator (art. 644º, nº7 do NCPC).
[2]Sublinhado nosso.
[3]Entendendo-se esta, por via da teoria da substanciação, acolhida pelo legislador, como “formada por factos sem qualificação mas com relevância jurídica” (Miguel Teixeira de Sousa, Sobre a Teoria do Processo Declarativo, Coimbra Editora, 1980, Coimbra, 158.
[4]Referem Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (Código de Processo Civil Anotado, vol.2º, 2ª edição, Coimbra Editora, 2008, Coimbra, p.354): “[a] excepção de caso julgado não se confunde com a autoridade de caso julgado; pela excepção, visa-se o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, constituindo-se o caso julgado em obstáculo a nova decisão de mérito; a autoridade do caso julgado tem antes o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível de segunda decisão de mérito (…). Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objecto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida (…). Mas o efeito negativo do caso julgado nem sempre assenta na identidade do objecto da primeira e da segunda acções: se o objecto desta tiver constituído questão prejudicial da primeira (e a decisão sobre ela deva, excepcionalmente, ser invocável) ou se a primeira acção, cujo objecto seja prejudicial em face da segunda, tiver sido julgada improcedente, o caso julgado será feito valer por excepção”.
[5]Como se referiu no ac. TRC de 11-10-2016 (Processo nº 2560/10.9TBPBL.C1 (Relator: Jorge Arcanjo), acessível in www.dgsi.pt) a jurisprudência tem acolhido esta distinção, distinguindo “ambos os institutos da seguinte forma:
A excepção de caso julgado destina-se a evitar uma nova decisão inútil (razões de economia processual), o que implica uma não decisão sobre a nova acção, pressupondo uma total identidade entre ambas as causas.
A autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere, quanto ao seu objecto, no objecto da segunda, visando obstar a que a relação ou situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença (razão de certeza ou segurança jurídica), não se exigindo a tríplice identidade”.
[6]Saliente-se que, nesse processo, o art. 20º da petição inicial tem a seguinte redação:
“Sucede que, a rescisão do contrato em vigor entre os AA. e a R. teve tanto de injustificada como de inesperada, originando que os AA., ao ficarem sem o pagamento resultante do contrato celebrado com a R. , tivessem um prejuízo patrimonial elevado, como adiante se demonstrará”.
[7]Nessa ação era também autor Ricardo Branquinho.
[8]Já o acórdão do TRL, mantendo a sentença, fez ainda outro tipo de apreciação, como resulta da factualidade dada por assente sob o número 7.
[9]Processo: 1129/09.5TBVRL-H.G1.S2 (Relator: FONSECA RAMOS), acessível in www.dgsi.pt. O aresto foi proferido no âmbito de uma ação de embargos de terceiro, considerando-se que “[a] admitir-se que a embargante pudesse invocar, no segundo processo, fundamentos que omitiu, voluntariamente, no primeiro processo de embargos de terceiro com função preventiva, cuja decisão de improcedência transitou em julgado, (visando ambos os processos os mesmos efeitos), seria contornar o efeito preclusivo da invocação factual, desconsiderar o princípio da concentração da defesa e violar a estabilidade do caso julgado”.
[10]O preceito tinha, anteriormente ao Dec. lei 329-A/95, a seguinte redação:
“Diz-se litigante de má fé não só o que tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não ignorava, como também o que tiver conscientemente alterado a verdade dos factos ou omitido factos essenciais e o que tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça ou de impedir a descoberta da verdade”.
Com o Dec. Lei 329-A/95 (na redação dada pelo Dec. Lei 180/96) passou a ter a seguinte:
“Artigo 456.º
Responsabilidade no caso de má fé - Noção de má fé
1- Tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.
2- Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b)-Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c)-Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d)-Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da Justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
3- Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé”.
[11]Aludindo à lide cautelosa, lide simplesmente imprudente, lide temerária e lide dolosa, ainda no âmbito do código de 1939, vide Reis, Alberto (1981), Código do Processo Civil Anotado. Coimbra: Coimbra Editora, vol. II, p.262 (3ª edição); Quanto à redação do Dec. Lei 44 129 de 28/12/1961 e à reforma de 95/96, vide Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (2008), Código do Processo Civil Anotado. Coimbra: Coimbra Editora, vol. 2º, p. 219 (2ª edição).
[12](2006) Litigância de Má fé Abuso do Direito de Acção e Culpa In Agendo. Coimbra: Almedina, p. 25.   
[13]“Todavia, se admitíssemos que o exercício do direito de ação ou de defesa fosse considerado de má-fé e, como tal, sancionado, por uma qualquer falta de fundamento da pretensão ou oposição, ainda que inconscientemente desculpável, tal seria suscetível de eliminar o próprio direito de acesso aos tribunais. No limite sancionar-se-ia a mera sucumbência, dado que esta se deve, em geral, à falta de fundamento com que se intentou a ação ou se defendeu em juízo.
Por tal motivo, o ordenamento jurídico optou por apenas considerar tal falta de fundamento como um comportamento processual de má-fé quando a esta acresça um determinado elemento subjetivo, sendo nos restantes casos o sujeito processual condenado apenas ao pagamento das custas (e, eventual, taxa sancionatória excecional, como veremos) (Borges, Marta Alexandra Frias (2014), Algumas Reflexões em Matéria de Litigância de Má-Fé. Dissertação de Mestrado publicada pela Universidade de Coimbra, acessível https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/28438/1/Algumas%20reflexoes%20em%20materia%20de%20litigancia%20de%20ma-fe.pdf).
[14]Sublinhado nosso.