Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
298/18.8YRLSB-4
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: GREVE
GUARDAS PRISIONAIS
SERVIÇOS MÍNIMOS
ALIMENTAÇÃO
COMUNICAÇÃO
VISITA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/30/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I- É legal a fixação dos serviços mínimos por parte do Colégio Arbitral relativamente à greve decretada pelo A para os dias 24, 25, 26 e 27  de Dezembro de 2017  nos estabelecimentos prisionais em causa, no que se refere, nomeadamente, ao funcionamento das padarias, visto o pão ainda continuar a ser a base da alimentação para grande parte da população na nossa sociedade e competir ao recorrente assegurar os serviços mínimos de alimentação da população reclusa.
II - Uma vez que a greve decorreu no aludido período festivo, em que muitos estabelecimentos comerciais encerram mais cedo e em que grande parte deles, nos dias 25 e 26 de Dezembro, nem sequer chega a abrir ao público, nada garantindo que naqueles dias as necessidades dos reclusos, em termos de pão, pudessem ficar asseguradas por entidades externas, tal que poderia colocar seriamente em causa o direito à alimentação e até (eventualmente) o direito à saúde dos reclusos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

1. Relatório
1.1. AAA, não se conformando com o Acórdão do Colégio Arbitral de 19 de Dezembro de 2017, proferido no Processo nº 11/2017/DRCT – ASM, que fixou os serviços mínimos e meios para os assegurar para as greves agendadas para os dias 24, 25, 26 e 27  de Dezembro de 2017, dele veio interpor recurso de apelação, concluindo, em resumo, as suas alegações nos seguintes termos:
-  O recorrente emitiu aviso de pré-aviso de greve para os dias 24, 25, 26 e 27 de Dezembro para os estabelecimentos prisionais de …,…,…,…, …, …,…,  e para os dias 24, 25 e 26 de Dezembro para os restantes estabelecimentos prisionais. 
- O Colégio Arbitral, usando da sua competência legal, decidiu:
1. Nos Estabelecimentos Prisionais:
a) Assegurar uma única visita a realizar no período de greve, de familiares directos ou da pessoa indicada pelo recluso aquando da sua admissão, caso essas mesmas pessoas não tenham feito a visita durante os dias úteis das respectivas semanas, visitas em que será garantido o recebimento e entrega do saco trazido pelos visitantes, nos termos habituais.
b) Garantir que durante os períodos de greve os reclusos possam fazer uma chamada telefónica.
c) Garantir o acesso de todos os reclusos ao trabalho produtivo dentro do estabelecimento prisional e no exterior, nos termos habituais, o qual engloba todas actividades instrumentais necessárias à realização do mesmo.
d) Permitir o funcionamento das padarias nos EP que as possuam, no âmbito dos serviços mínimos de alimentação.
e) Permitir a entrada das empresas para a realização de intervenções de reforço segurança nos seguintes EP: …,…,…,…, …, …,…,.
2. Quanto aos meios:
No seguimento da decisão do Colégio Arbitral de 12-12-2016, confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Abril de 2017, decide-se:
a) Nos dias úteis, deve ser assegurado o efectivo habitualmente escalado para o fim-de-semana;
b) Nos dias úteis, deve ser escalado número efectivos igual ao habitualmente escalado para os dias não úteis, acrescido de 20%.
- O recorrente não se conforma com a decisão arbitral onde se permite durante o período de greve “o funcionamento das padarias nos EP que as possuam, no âmbito dos serviços mínimos de alimentação”.
- Diz que não é por se não fazer pão nos dias 24, 25, 26 e 27 que se coloca em causa o direito à alimentação, até porque nos EP em que há padaria, nos dias em que haja avarias, falhas de electricidade e outras vicissitudes, o pão é fornecido por uma entidade externa. Invoca a decisão arbitral proferida no proc.º 10/2017 relativa à greve decretada pelo …, para o período de 23 a 26 de Dezembro de 2017 e de 29 de Dezembro de 2017 e de 1 de Janeiro de 2018, onde se excluiu a laboração das padarias dos mesmos Estabelecimentos Prisionais.
- Aduz também que relativamente ao vertido nas alíneas a) e b), do n.º 1 da aludida decisão, os serviços mínimos nela fixados em nada se relacionam com a vigilância dos reclusos, a segurança das instalações prisionais, a chefia dos efectivos que estiverem ao serviço ou alimentação, higiene, assistência médica ou medicamentosa dos reclusos. No que concerne à única visita, o recorrente teve o cuidado de marcar a greve para um período que permitisse que a visita se realizasse a 23, possibilitando a deslocação de familiares em dia não útil em que tendencialmente não trabalham, pretendendo seja também revogada a decisão na parte que determina se garanta o recebimento e entrega de saco trazido pelos visitantes, nos termos habituais, pois esse direito não fica prejudicado caso fosse exercido nos dias antes da greve. E quanto ao telefonema, que o mesmo não se encontra salvaguardado legalmente.
- Considera que a dita decisão infringiu o art.º 15.º do DL 3/2014 e os artigos 58.º n.º3 e 60 do Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade
1. 2. A BBB , apresentou contra-alegações, concluindo no sentido da confirmação do acórdão recorrido.
1.3. O recurso foi admitido com o efeito e regime de subida adequados
Cumpre apreciar e decidir  
2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso limitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635.º nº 4 e 639.º do CPC, “ex vi” do nº 1 do artigo 87.º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que conhecimento oficioso ainda não jugadas com trânsito em julgado  -  art.º 608º nº 2 do CPC.
Assim, a questão que o recorrente coloca à apreciação deste tribunal consiste em aquilatar se a definição dos serviços mínimos fixados na decisão do Colégio Arbitral constitui uma compressão do direito à greve (um desequilíbrio do sistema por ser oposta a uma outra decisão referente a greve decretada por outra entidade sindical), sendo ilegal a fixação dos serviços mínimos
3. Fundamentação de facto
Para além dos factos que constantes do relatório que antecede, resultam ainda provados os seguintes:
1– No dia 7 de Dezembro de 2017, o recorrente enviou às entidades competentes um aviso prévio de greve nacional do (…)  das 00h00 do dia 24 às 23h59 do dia 26 de Dezembro de 2017, ininterruptamente sob a forma de paralisação de trabalho, apresentando, para o efeito, os seguintes objectivos e razões da Greve:
- Contra o livre arbítrio do Director Geral
- Contra o novo horário de trabalho
- Pela actualização dos escalões
- Pela alteração do estatuto profissional
2) No dia 11 de Dezembro na BBB, reuniram-se os representantes desta e do AAA, ora recorrente, sendo a ordem dos trabalhos a discussão dos serviços mínimos a fixar relativamente a:
a) Assegurar uma dia de visita aos reclusos no fim-de-semana de greve (sábado e/ou domingo) e uma visita dos familiares directos no dia de Natal, visitas em que será garantido o recebimento e entrega de saco trazido pelo visitantes nos termos habituais;
b) Garantir que os reclusos possam fazer uma chamada telefónica no dia de Natal.
c) Assegurar o funcionamento das padarias que forneçam pão, no âmbito dos contrato de prestação de serviços de alimentação à população reclusa;
d) Nos dias úteis garantir o acesso dos reclusos ao trabalho produtivo nos termos habituais, o qual engloba todas actividades instrumentais necessárias à realização do mesmo.
e) Permitir a entrada das empresas para a realização de intervenções de reforço segurança nos seguintes EP: ………………………………………………………….
f) Assegurar o serviço religioso na época do Natal. 
3 - No dia 12 de Dezembro de 2017, na Direcção-Geral da Administração do Emprego Público reuniram-se os representantes do recorrente e da recorrida   com vista à negociação de um acordo quanto à definição dos serviços mínimos e dos  meios necessários para os assegurar, o que se não logrou obter (fls. 18 a 21).
4 - Foi promovida a constituição de um Colégio Arbitral.
5 - As partes foram notificadas para se pronunciarem, o que fizeram, mantendo as suas posições quanto às matérias controvertidas, razão pela qual quanto às mesmas não se logrou obter acordo.
6 - Em 19 de Dezembro de 2017 o Colégio Arbitral proferiu Acórdão (fls. 105-109), tendo deliberado, por unanimidade, nos termos acima consignados.
7 - Notificado desse acórdão veio o AAA, ao abrigo do disposto no art.º 404.º n.º 5 da Lei do Trabalho em Funções Públicas, solicitar esclarecimentos sobre a referida decisão, finalizando no sentido de que o aludido colégio arbitral crie condições para que a visita ao fim de semana no período de greve ocorra no sábado no dia 23 de Dezembro e que não seja confeccionado pão, como tem acontecido nas grevas anteriores, considerando que não estão em causa necessidades impreteríveis dos reclusos (fls. 101 a 102 verso).
8 - O árbitro presidente respondeu, sustentando que as considerações apresentadas pelo AAA, ora recorrente, não se afiguram enquadráveis no n.º 5 do art.º 404.º da Lei 35/2004, de 20 de Junho, pois não se traduzem em pedido de esclarecimento de qualquer obscuridade ou ambiguidade ou dos fundamentos da decisão (art.º 616.º do CPC actual), nada mais se lhe oferecendo, por isso, dizer (fls. 99 a 100).
4. Fundamentação de Direito
Da compressão do direito de greve e da ilegal fixação dos serviços mínimos
Para melhor compreensão, relembra-se que o referido colégio arbitral decidiu o seguinte:
1. Nos Estabelecimentos Prisionais:
a) Assegurar uma única visita a realizar no período de greve, de familiares directos ou da pessoa indicada pelo recluso aquando da sua admissão, caso essas mesmas pessoas não tenham feito a visita durante os dias úteis das respectivas semanas, visitas em que será garantido o recebimento e entrega do saco trazido pelos visitantes, nos termos habituais.
b) Garantir que durante os períodos de greve os reclusos possam fazer uma chamada telefónica.
c) Garantir o acesso de todos os reclusos ao trabalho produtivo dentro do estabelecimento prisional e no exterior, nos termos habituais, o qual engloba todas actividades instrumentais necessárias à realização do mesmo.
d) Permitir o funcionamento das padarias nos EP que as possuam, no âmbito dos serviços mínimos de alimentação.
e) Permitir a entrada das empresas para a realização de intervenções de reforço segurança nos seguintes EP: ……………………………………………………………………..
2. Quanto aos meios:
No seguimento da decisão do Colégio Arbitral de 12-12-2016, confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Abril de 2017, decide-se:
a) Nos dias úteis, deve ser assegurado o efectivo habitualmente escalado para o fim-de-semana;
b) Nos dias úteis, deve ser escalado número efectivos igual ao habitualmente escalado para os dias não úteis, acrescido de 20%.
 O recorrente não se conforma com a decisão arbitral onde se determina durante o período de greve “o funcionamento das padarias nos EP que as possuam, no âmbito dos serviços mínimos de alimentação”. E no que concerne à única visita, ao telefonema e à entrega de saco.
Vejamos.
Nos termos do art.º 57.º da Constituição da República Portuguesa
1. É garantido o direito à greve
2. Compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito
3. A lei define as condições de prestação, durante a greve, dos serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades impreteríveis”.
O Código do Trabalho, por seu turno, também prevê o direito à greve como um dos direitos dos trabalhadores, nos termos da Constituição (art.º 530.º), consagrando o art.º 537.º do mesmo diploma legal a obrigação da prestação de serviços durante a greve quando esteja em causa a satisfação de necessidades sociais impreteríveis, determinando-se no n.º 5 do art.º 538.º que a “ a definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade”
A propósito do artigo 57.º da Constituição da República Portuguesa, referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, Volume I, 4ª Edição revista, pág. 51: “ Como meio de «acção directa» dos trabalhadores constitucionalmente reconhecido, a greve traduz-se num incumprimento lícito da obrigação de prestação de trabalho, com os prejuízos inerentes para as entidades empregadoras (interrupção da produção, risco de incumprimento de encomendas).
Porém, a greve constitui também um sacrifício para os trabalhadores, que perdem o direito à remuneração pelo trabalho não prestado durante a greve, sem nenhuma garantia no sucesso da mesma.” (…). Referindo também que “Dois elementos fundamentais exige a noção constitucional de greve: a) uma acção colectiva e concertada de trabalhadores; b) a paralisação do trabalho (com ou sem abandono dos locais de trabalho) ou qualquer outra forma típica de incumprimento da prestação de trabalho” ( Ob. Cit, pág. 753)
Sendo um direito fundamental dos trabalhadores, a greve não é, contudo, um direito absoluto ou ilimitado, “pelo que existindo a possibilidade de confronto ou colisão entre o direito de greve e outros direitos fundamentais, também previstos na Constituição, esse direito pode sofrer alguma sorte de restrição nas situações definidas pela lei e com observância de determinados limites” (Cfr. acórdão do TRL de 25.05.2011, processo 88/11.7YRLSB.L1, www.dgsi.pt, relatado pela ora relatora).
Na verdade, como resulta do preceituado no art.º 18.º, n.º 2, da CRP:
 “A lei só pode restringir os direitos (…) nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direito ou interesses constitucionalmente protegidos”.
Sendo que, “As leis restritivas de direitos (…) não podem (…) diminuir a extensão e o alcance da conteúdo essencial dos preceitos constitucionais” (n.º 3, do mesmo preceito).
A propósito deste preceito, aduzem Gomes Canotilho e Vital Moreira:
O primeiro pressuposto material de legitimidade das restrições de direitos, liberdades e garantias (cfr, supra nota VI) consiste na exigência de previsão constitucional expressa da respectiva restrição. (…)
O segundo pressuposto material para a restrição legítima de «direitos, liberdades e garantias» (cfr. nota VI) consiste em que ela só pode se justificar para salvaguardar um outro direito e interesse constitucionalmente protegido.
O terceiro pressuposto material para a restrição legítima de direitos, liberdades e garantias (vide supra nota VI) consiste naquilo que genericamente se designa por princípio da proporcionalidade.
(…). Sustentando, ainda, que “O princípio da proporcionalidade (também chamado princípio da proibição do excesso) desdobra-se em três subprincípios: (a) princípio da adequação (também designado por princípio da idoneidade), isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade), ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias (tornaram-se exigíveis), porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias; c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa «justa medida», impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos” No caso dos serviços mínimos deve ter-se em conta que há uma relação indissociável entre serviços mínimos e necessidades impreteríveis. Ambos os conceitos carecem de densificação abstracta e concreta: a primeira a efectuar por lei (cfr. Cód. Trab., art.º598º), por convenção colectiva, ou por acordo com os representantes; a segunda pressupõe a execução caso a caso das disposições legais ou convencionais (cfr. Cód. Trab., art.º 599º) referente à definição de serviços mínimos. Em qualquer caso as medidas definidoras de serviços mínimos e dos serviços necessários à segurança e manutenção do equipamento e instalações, na medida em que consubstanciam medidas restritivas do direito de greve, devem pautar-se pelos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade. Esta limitação constitucional do direito à greve revela que os direitos dos trabalhadores carecem, como os outros direitos, de tarefas metódicas de concordância prática e de juízos de ponderação e de razoabilidade, não prevalecendo em abstracto contra certos bens constitucionais colectivos, designadamente os que têm a ver com serviços de primacial importância social, como os serviços de saúde, de segurança, de protecção civil, serviços prisionais, de recolha de resíduos urbanos, de abastecimento de água, e de outros serviços de interesse económico geral» de natureza afim, em que a continuidade é um valor em si mesmos (princípio da continuidade dos serviços públicos), além de ser uma dimensão organizatória e processual da garantia e realização de direitos, desde direitos, liberdades e garantias como o direito à vida, à integridade física, à liberdade e à segurança até ao direito à saúde e bens essenciais.” (Ob. Cit. pág. 757).

Assim, porque o direito fundamental à greve pode entrar em confronto com outros direitos fundamentais de igual dignidade constitucional, a defesa destes pode implicar a restrição daquele, de modo a permitir-se a concordância prática entre tais direitos, sem que isso implique a aniquilação de um dos direitos em detrimento do outro. Sendo, por isso, que a definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (Vd. acórdão do TRL de 19.06.2013, proc. 454/13.5YRLSB-4.L1, www.dgsi.pt)
E, se assim deve ser ponderado em termos gerais, importa não esquecer que na presente situação está em causa o exercício do direito de greve, por vários dias, em época festiva, num contexto (muito) particular, visto tratar-se de greve levada a cabo pelo corpo de guarda prisional em vários estabelecimentos prisionais.
De acordo com o n.º 1, do art.º 3.º do “Estatuto do Corpo da Guarda Prisional”, aprovado pelo DL 3/2014, de 9 de Janeiro, alterado pela lei 6/2017, de 2 de Março,
“O CGP é constituído pelos trabalhadores da BBB, armados e uniformizados, integrados nas carreiras especiais de chefe da guarda prisional e de guarda prisional e que têm por missão garantir a segurança e tranquilidade da comunidade prisional, mantendo a ordem e a segurança do sistema prisional, protegendo a vida e a integridade dos cidadãos em cumprimento de penas e medidas privativas da liberdade e assegurando o respeito pelo cumprimento da lei e das decisões judiciais, bem como pelos direitos e liberdades fundamentais desses cidadãos.
Referindo o n.º 2 que “O pessoal do CGP é agente da autoridade quando no exercício das suas funções”.
Enquanto trabalhadores do CGP gozam os mesmos “dos direitos e estão sujeitos aos deveres previstos na lei geral para os demais trabalhadores que exercem funções púbicas em regime de nomeação (…)”,  art.º 5.º.
Estabelecendo-se no art.º 15.º do mesmo diploma que:
1 - Os trabalhadores do … têm direito à greve, nos termos da Constituição e demais legislação aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas.
2 - No decurso da greve são sempre assegurados serviços mínimos, nomeadamente a vigilância dos reclusos, a segurança das instalações prisionais e a chefia dos efetivos que estiverem ao serviço, a qual é da responsabilidade do comissário prisional ou, na sua ausência ou impedimento, do seu substituto legal, assegurando o direito ao descanso e o exercício efetivo do direito à greve.
3 - No decurso da greve é sempre assegurada a apresentação imediata de recluso ou detido ao juiz, quando ordenado nos casos de habeas corpus, nos prazos legais estipulados pelo mesmo, e em todos os casos em que possa estar em causa a libertação de recluso ou detido, bem como a apresentação, no prazo de 24 horas, à autoridade judicial de pessoas que se apresentem em estabelecimentos prisionais e que declarem ter cometido um crime ou que contra eles haja ordem de prisão.
4 - São também assegurados os serviços mínimos de alimentação, higiene, assistência médica e medicamentosa dos reclusos”.

Por seu turno, o art.º 397.º da “Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas” (LGTFP), determina que:
“ 1- Nos órgãos ou serviços que se destinem à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, a associação que declare a greve, ou a comissão de greve, e os trabalhadores aderentes devem assegurar, durante a greve, a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação daquelas necessidades.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se órgãos ou serviços que se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, os que se integram, nomeadamente, em alguns dos seguintes setores:
a) Segurança pública, quer em meio livre quer em meio institucional;
(…)
3 - As associações sindicais e os trabalhadores ficam obrigados a prestar, durante a greve, os serviços necessários à segurança e manutenção do equipamento e instalações
4 - Os trabalhadores que prestem, durante a greve, os serviços necessários à segurança e manutenção do equipamento e instalações e os afetos à prestação de serviços mínimos mantêm-se, na estrita medida necessária à prestação desses serviços, sob a autoridade e direção do empregador público, tendo direito, nomeadamente, à remuneração”.
De acordo com referido enquadramento legal, não restam quaisquer dúvidas que os serviços de segurança prestados pelos trabalhadores do CGP se destinam à satisfação de necessidades sociais impreteríveis e que, enquanto trabalhadores, gozam aqueles, naturalmente, do direito fundamental à greve.
A necessária harmonização a fazer entre os direitos fundamentais que possam ser afectados com o exercício do direito de greve, assume a especificidade de os cidadãos afectados com a greve, os reclusos, se encontrarem dependentes dos serviços que lhes são proporcionados, não sendo susceptíveis de auto satisfação, nem podendo (por regra) ser supridos por meios que não os prestados pelo pessoal prisional.
Anote-se que os reclusos, por força do prescrito no “Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade”, aprovado pela Lei 115/2009, de 2 de Outubro, e alterado nomeadamente pela Lei 94/2017, de 23 de Agosto, mantêm a “titularidade dos direitos fundamentais, salvas as limitações inerentes ao sentido da sentença condenatória ou da decisão de aplicação de medida privativa da liberdade e as impostas, nos termos e limites do presente Código, por razões de ordem e de segurança do estabelecimento prisional”, (art.º 6.º). 
Sendo que a “ execução das penas e medidas privativas da liberdade garante ao recluso, nomeadamente, os direitos:
a)   À protecção da sua vida, saúde, integridade pessoal  (…);
e) A manter contactos com o exterior, designadamente mediante visitas, comunicação à distância ou correspondência, sem prejuízo das limitações impostas por razões de ordem, segurança e disciplina ou resultantes do regime de execução da pena ou medida privativa da liberdade;
 f) À protecção da vida privada e familiar e à inviolabilidade do sigilo da correspondência e outros meios de comunicação privada, sem prejuízo das limitações decorrentes de razões de ordem e segurança do estabelecimento prisional e de prevenção da prática de crimes; 
Visando o direito a receber visitas “manter e promover os laços familiares, afectivos e profissionais do recluso” (art.º 58.º n.ºs 1 e 2)
Ora, sobre os contornos do direito de greve, definição de necessidades sociais impreteríveis e fixação dos serviços mínimos, têm os nossos tribunais se pronunciado em vários processos. E quanto às greves decretadas pelos trabalhadores dos serviços prisionais, nos acórdãos de 14.01.2015, proc. 625/2014, de 16.12.2015, proc. 1239/15.0YRLSB.L1 e de 5.04.2017, processo 232/17.2yrlasb.l1, www.dgsi.pt. 
Sendo inequívoco, como já dito, que está em causa serviço relativo à satisfação de necessidades sociais impreteríveis da população prisional (art.º 397.º n.º 2 alínea a) da LGTFP), importa agora averiguar à luz dos sobreditos critérios, se nas circunstâncias concretas do presente caso, os serviços mínimos fixados estão de acordo com o disposto no dito art.º 15.º do DL 3/2014, de 9 de Janeiro.
 - No que se refere à visita, relembra-se que o colégio arbitral a fixou relativamente aos familiares directos ou pessoa indicada pelo recluso em termos condicionais, ou seja, para as situações em que essas pessoas não a tenham feito durante os dias úteis das respectivas semanas.
Considerando que os dias da greve em causa coincidem com a época natalícia, período de natural reunião e confraternização familiar e afectiva, recebimento e troca de prendas, estando tal visita limitada a uma única para aquele tipo de pessoas e desde que estas não tenham visitado antes o recluso, afigura-se-nos não violar o direito de greve, nem o comprimir excessivamente, que essa visita tenha lugar em tais condições, devendo naturalmente e para aqueles efeitos, ser garantida a entrega e o recebimento do saco nos termos habituais.
Anote-se, ainda, que as visitas para além de constituírem um direito dos reclusos também o são dos seus familiares à luz do art.º 67.º n.º 1 da CRP (“A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros”), sendo que entre tais condições se conta a reunião e o convívio familiar.
- Relativamente à chamada telefónica, uma vez que aos reclusos deve ser garantido a manutenção dos contactos com o exterior (designadamente mediante comunicação à distância), tendo lugar a greve no período natalício em que, como é sabido, ocorre aumento da comunicação entre familiares, amigos e conhecidos, designadamente através do envio de mensagens e de votos de “boas festas”, tratando-se de uma única chamada, não se nos afigura que ao ser assegurado aos reclusos tal direito comunicacional seja posto em causa, de modo desproporcionado, o direito de greve do CGP.
- No que concerne ao funcionamento das padarias, nos EP que as possuam, o recorrente alega que não é por se não fazer pão nos dias da greve que é posto em causa o direito à alimentação, referindo que a decisão destes autos é contrária à proferida no proc.º 10/2017.
Mas não tem razão.
Em primeiro lugar, não se vislumbra ocorrer oposição entre o decidido pelo Colégio Arbitral nestes autos e o que foi decidido no âmbito do aludido proc. 10/2017, no que se refere à greve decretada pelo AAA para o período de 23 a 26 de Dezembro de 2017 e de 29 de Dezembro de 2017 a 1 de Janeiro de 2018. Naqueles autos logrou-se acordo quanto à definição dos serviços mínimos, razão pela qual não se pronunciou sobre tal matéria a decisão arbitral ali proferida.
Em segundo lugar, o funcionamento das padarias permite a confecção e o fabrico do pão, bem esse, que ainda continua a ser a base da alimentação para grande parte da população na nossa sociedade, sendo certo, por outro lado, que compete ao CGP assegurar os serviços mínimos de alimentação, nos termos do citado art.º 15.º do ECGP, e foi determinado na decisão recorrida.
Por fim, tendo a greve lugar no aludido período festivo em que muitos estabelecimentos comerciais encerram mais cedo e em que grande parte deles nem chega a abrir ao público nos dias 25 e 26 de Dezembro, nada garante que nesses dias as necessidades alimentares dos reclusos em termos de pão possam ser asseguradas por entidades externas, podendo, assim, ficar seriamente comprometido o direito à alimentação e até (eventualmente) o direito à saúde dos reclusos.
É, pois, de concluir que a decisão recorrida assentou num justo equilíbrio entre o direito à greve do corpo dos guardas prisionais, por um lado, e os direitos da população reclusa de igual relevância constitucional,  por outro - o que nos reconduz à improcedência da presente questão.

5. Decisão
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a decisão recorrida.
Sem custas, por delas estar isento o recorrente.

Lisboa, 2018.06.30

Albertina Pereira