Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2118/10.2TVLSB.L1-2
Relator: MARIA JOSÉ MOURO
Descritores: BANCO
CONTRATO DE PERMUTA DE TAXAS DE JURO "INTEREST RATE SWAP"
DEVER DE INFORMAR
NULIDADE DO CONTRATO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/02/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Os factos provados não nos levam a concluir que o Banco R. não haja cumprido com o dever de informação que sobre ele impendia e, muito menos, que a vontade da A. se encontrasse afectada por erro que recaía sobre os motivos determinantes da vontade ou sobre as circunstâncias que constituíram a base do negócio.
II - Os interest rate swaps são figuras contratuais autónomas e não necessariamente complementares a um contrato de mútuo ou outro tipo de financiamento.
III – O contrato de swap de taxa de juro é um contrato aleatório, mas isso não significa que deva ser qualificado ou equiparado ao contrato de jogo e aposta que é, apenas, um especial tipo de contrato aleatório entre outros.
IV - As prestações aleatórias e recíprocas do swap de taxa de juro são determinadas por facto exterior ao contrato e à vontade das partes (no caso a flutuação da Euribor) não se sabendo no momento da conclusão do mesmo se acabará por verificar-se uma vantagem e a parte que dela beneficiará.
V – É difícil admitir-se que a descida acentuada das taxas de juro não estivesse abrangida pelos riscos próprios do contrato de swap de taxa de juro – trata-se de contrato aleatório no âmbito do qual as partes se expõem ao risco de subida ou descida da taxa de juros; apenas alterações de outras circunstâncias, diversas daquelas cujo risco as partes quiseram assumir, poderão relevar para efeitos do art. 437, nº 1, do CC.
VI – A A. não alegou, nem provou, ter sido fundamento do contrato de swap a circunstância de a Euribor não descer abaixo do limite mínimo nele convencionado, de se manter uma determinada conjuntura do mercado no que aos juros respeita, nem resultou demonstrado o efectivo prejuízo sofrido pela A., que a constituiria em parte lesada dando-lhe a possibilidade de pedir a resolução do contrato.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:


I-Relatório:

                                                                      
I – «I – SCC, Lda.» intentou acção declarativa com processo ordinário contra «BST, SA».

            Alegou a A., em resumo:

A A. contraiu um financiamento junto do R. o qual foi titulado pelo “Contrato de Mútuo com Hipoteca”, datado de 31 de Agosto de 2006; por indicação do R. a A. celebrou um “Contrato Quadro para Operações Financeiras”, ao abrigo e em execução do qual foi outorgado um “Contrato de Permuta de Taxa de Juro” (Interest Rate Swap).

Em 6 de Setembro de 2007, mais uma vez por indicação dos serviços do R. foi celebrado um novo “Contrato de Permuta de Taxa de Juro”, o qual foi designado de “Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juro” e que incompreensivelmente e sem qualquer explicação veio substituir o anterior, acabando por estabelecer condições ainda mais gravosas para a A..

A celebração do referido “Contrato de Permuta de Taxa de Juro” teria ocorrido, alegadamente, para prevenir o risco de elevação das taxas de juro decorrentes do empréstimo à construção, tendo sido expressamente garantido pelo R. que a sua outorga seria o motivo pelo qual os encargos com o crédito anteriormente contraído iriam estabilizar, conduzindo a um reajuste mais vantajoso das condições contratuais para a A., atendendo a que o inicialmente ajustado estaria já desadaptado às condições existentes no mercado - o que não veio a acontecer.

Os contratos foram assinados sem que os seus termos e condições fossem explicados, nem fornecida nenhuma outra instrução relativamente à forma como seriam executados e, atendendo a que a única informação prestada não veio a lograr os efeitos que haviam sido garantidos, estamos perante uma situação de culpa in contrahendo, o que bem se alcança pelo circunstancialismo da A. ter contratado um swap de taxa de juro em Junho de 2007 para um período de 5 (cinco) anos assegurando uma cobertura da taxa de juro que se prolonga por mais 3 (três) anos do que o prazo que subjaz ao Contrato de Mútuo celebrado em Agosto de 2006 - cujo vencimento ocorreu já em Janeiro de 2010 - e ter celebrado Contrato de Permuta de Taxa de Juro quando o outorgado em Agosto de 2006 estava, ao tempo, ainda em vigor.

A A., quando da celebração do “Contrato de Permuta de Taxa de Juro”, não era detentora de uma vontade perfeita e esclarecida, nunca tendo chegado a apreender totalmente o alcance de uma operação de interest rate swap: a sua forma de execução, os benefícios, os custos e os riscos que do contrato outorgado derivariam.

A contratação sem explicações bastantes do risco incorrido pela A. gera hoje um prejuízo trimestral de milhares de euros, prejuízo este que previsivelmente ocorrerá até ao terminus do contrato de swap, em 2012.

A A. nunca pretendeu celebrar com o R. um contrato desta natureza e o R. sabia a essencialidade do motivo que esteve na origem da formação da vontade da A., motivo pelo qual, face às disposições contidas no art. 252 e seguintes do CC o contrato deve ser declarado nulo; ou, se assim não for entendido, deve ser reconhecido à A. o direito à resolução do contrato por alteração imprevisível e anormal das circunstâncias, nos termos do art. 437 do CC.

Pediu a A. que seja declarado nulo o contrato de confirmação de taxa de juro celebrado em 6 de Setembro de 2007 e se reconheça judicialmente que a A . nada deve ao R. ou, em alternativa, na eventualidade destes pedidos não procederem, que seja declarada a resolução do “Contrato de Permuta de Taxa de Juro” com os efeitos reportados à liquidação do contrato de mútuo, nos termos do arte. 437 do CC.

O R. contestou impugnando factualidade alegada pela A., alegando, designadamente, que o contrato de 6 de Setembro não veio alterar ou substituir o contrato de permuta de taxa de juro celebrado em 31 de Agosto de 2006, tendo sido celebradas duas operações de permuta de taxa de juro a 31 de Agosto de 2006 e 6 de Setembro de 2007, as quais foram explicadas aos representantes da A., em reuniões realizadas, tendo o banco R. explicado detalhadamente as características da nova operação a realizar e tendo acompanhado esta explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação.

Concluiu pela improcedência da acção e com a sua absolvição dos pedidos.

O processo prosseguiu vindo, a final, a ser proferida sentença que julgou improcedente a acção absolvendo o R. dos pedidos formulados.

Apelou a A. concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso:

1 - A Recorrente apresentou acção declarativa, peticionando que seja declarado nulo o contrato de confirmação de taxa de juro celebrado em 06 de Setembro de 2007, entre a Sociedade Autora e o Banco R. e se reconheça judicialmente que a A nada deve ao Réu ou, em alternativa, na eventualidade destes pedidos não procederem, que seja declarada a Resolução do Contrato de Permuta de taxa de juro com os efeitos reportados à liquidação do contrato de mútuo, nos termos do art. 437º do C.C.

2 - Nenhum dos pedidos da A. mereceram procedência por parte do Tribunal a quo, decisão com a qual se discorda.

3 - A Recorrente em Agosto de 2006 obteve um financiamento junto da Ré titulado pelo "Contrato de Mútuo com Hipoteca", celebrado em 31 de Agosto de 2006 e que, por indicação da mesma celebrou "Contrato Quadro para Operações Financeiras". Datado do mesmo dia 31 de Agosto mas celebrado posteriormente motivou o Banco R. na A. e criando nesta a convicção de que de um seguro se tratava foi outorgado um "Contrato de Permuta de Taxa de Juro" (Interest Rate Swap).

4 -A 6 de Setembro de 2007, mais uma vez por indicação dos competentes serviços do "BST, S.A.", foi celebrado um novo "Contrato de Permuta de Taxa de Juro", o qual foi designado "Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juro ", que incompreensivelmente e sem qualquer explicação veio substituir o anterior, o qual, no contexto das taxas de juro que então se desenhava, acabou por estabelecer condições ainda mais gravosas para a A, como decorre dos autos.

5- Mais alegou que a celebração do referido "Contrato de Permuta de Taxa de Juro" ocorreu, alegadamente, para prevenir o risco de elevação das taxas de juro decorrentes do empréstimo à construção supra citado, tendo sido expressamente garantido pelo "BST, S.A." que a outorga deste último contrato seria o motivo pelo qual os encargos com o crédito anteriormente contraído iriam estabilizar, outorga esta que conduziria assim a um reajuste mais vantajoso das condições contratuais para a A., atendendo a que o inicialmente celebrado já não servia a A. Contudo, o novo contrato veio a revelar-se desproporcionalmente desastroso para a A., mas sempre garantindo os interesses do Banco.

6 – O Contrato de Financiamento com Hipoteca, com um valor máximo de 3 520 000,00 Euros, sob a forma de abertura de crédito, para construção de edifícios, junto aos autos a fls…, deve ter-se por relacionado, no âmbito do negociado, querido e acordado entre as partes com o Contrato de Permuta de Taxa de Juro” (“Interest Rate Swap”), datado de 31 de Agosto de 2006, contrato junto aos autos a fls….

7 - Não fosse essa alegada garantia de segurança e a oferecida certeza por parte do Banco de que só assim a A. poderia controlar os custos do financiamento, sabendo assim que a sua taxa de juros não subiria e ainda não fosse o facto de nunca lhe terem sido relatados, nem colocados em confronto com cenário de risco do contrato, nunca a A. teria celebrado qualquer contrato de Swap, uma vez que a própria A. desconhecia inteiramente o produto e tinha receio do que não conhecia.

8 - O contrato de Swap foi apresentado pelo Banco como uma barreira protetora perante subidas das taxas de juro de referência, permitindo à Recorrente beneficiar, por meio de tal Contrato, de uma taxa de juro fixa.

9 – Traduzindo-se assim numa redução dos custos financeiros mensais médios da Recorrente, nomeadamente uma redução dos montantes a pagar pela Recorrente a título de juros mensais, a que a mesma estava obrigada em virtude do financiamento de que era devedora.

10 - E foi assim que este produto, “Contrato de Permuta de Taxa de Juro” (“IRS”), foi apresentado pelo BS, à Recorrente I, como sendo uma pretensa forma de gerir o risco de taxa de juro, sendo este o argumento comercial utilizado pelo Banco Exequente para persuadir a sua cliente, a aqui Recorrente.

 11 - E como resultado, tal produto, nunca deveria ter sido comercializado como sendo um produto de cobertura de taxa de juro, argumento que reiteradamente o Banco R. utilizou na angariação de clientela e em concreto com a Recorrente.

12 - Ora, neste “contrato de substituição”, o Banco R. estipulou, não o prazo que faltaria decorrer até ao término do anterior, ou seja 1 ano, mas antes, um prazo de 5 anos a contar daquela data, com término a 10 de Setembro de 2012.

13 - As condições estipuladas no novo contrato foram, pois, bem distintas das anteriores, ou seja muito mais onerosas.

14 - E nele, o Banco Exequente, estipulou que o valor do Swap seria de 2 000 000 Euros, durante a vigência do contrato.

15 - Na realidade, o que o R. apresentou foi um novo contrato, não de substituição, como sempre referira, mas um novo que vigoraria em simultâneo com o anterior.

16 - Refira-se que a ora Recorrente só tomou conhecimento que este contrato era de facto um novo contrato, distinto do primeiro, tempos mais tarde quando se viu confrontado com os elevados prejuízos que tinha e com a exigência de pagamento de avultadas quantias reclamadas pelo Banco.

17 - O Banco R., aqui Recorrente, tem apresentado em sua defesa, na discussão de contratos de Swaps, o argumento que à data em que estes foram feitos, anos de 2006 e de 2007, o mercado apresentava-se estável e nada fazendo prever a hecatombe que depois ocorreu e que na tese da Recorrente motivou grandemente as perdas dos Clientes deste produto, o que efectivamente aconteceu.

18 - Só no contexto de aproveitamento da necessidade de financiamento por parte da A. e má fé do Banco se consegue entender o aconselhamento prestado pelo Banco R., na sua qualidade de intermediário financeiro e instituição de crédito, à sua cliente, a Recorrente.

19 - Por outro lado, mais uma vez, o Banco Santander, propõe este tipo de produto à Inovacil, sem ter conhecimento pleno do real endividamento da mesma, nomeadamente no que diz respeito às condições específicas dos mesmos, relevantes para avaliar se tais financiamentos são ou não passíveis de se fazerem um swap.

20 - Denotando-se, assim, um padrão de comportamento na comercialização deste produto, de facilitismo, como se tratasse da subscrição de um simples e comum depósito à ordem.

21 - O Banco Santander “esqueceu-se” de efectuar uma projecção de resultados do novo produto, nos diversos cenários possíveis (subida de taxas de juro, moderadas e acentuadas, bem como, no cenário de descidas de taxas de juro, moderadas e acentuadas), configurando assim uma violação dos deveres legais de informação à aqui Recorrente e seu cliente.

22 - O R. motivou no Cliente uma confiança e um juízo de certeza sobre a segurança que os swaps trariam à sua actividade comercial, que levou a Recorrente de forma quase cega a subscrever um produto com base nas explicações enganosas, diga-se que até ardilosas do Banco R..

23 - Ora, como ficou demonstrado, nenhum dos produtos apresentados, seriam potencialmente vantajosos para a Recorrente, estando esta sempre condenada ao insucesso, ou na eventualidade das taxas de juro efectivamente, terem subido de forma acentuada, o cliente não iria realizar quaisquer ganhos, pois as barreiras colocadas no produto eram extremamente apertadas.

24 - Por tudo quanto até aqui foi exposto conclui-se que o comportamento e actuação do BST ao propor tais contratos de Permuta de Taxa de Juro, configura uma clara violação dos deveres, de actuação com vista à protecção dos legítimos interesses do cliente (artigo 304º do Código de Valores Mobiliários), de fazer prevalecer os interesses dos clientes face aos do próprio Banco em caso de conflito de interesses (artigo 309º do CdVM) e de prestar ao cliente a informação necessária para que este possa tomar uma decisão esclarecida (artigos 312º e 7º do CdVM), o que o Tribunal a quo, contudo, não considerou.

25 - Considerando que o Financiamento total teria que ser liquidado em 36 meses, o Banco R. só teria a certeza do valor final do financiamento, no 24º mês, altura em que o incremento do valor nominal do financiamento cessaria, conforme o contrato estabelecido entre as partes.

26 - Assim, tendo em conta que, para a elaboração de um swap ou produto estruturado de swaps é imperativo que haja uma divida certa a um prazo certo, o Banco apenas poderia propor este produto naquela altura, i.e., no 24º mês, a 30 de Agosto de 2008 e com um prazo nunca superior a 12 meses, pois o vencimento da dívida seria a 30 de Agosto de 2009.

27 - E só assim seria aceitável, pelo menos do ponto de vista utilizado pelo Recorrido, na angariação de clientela, que mais não era do que a da cobertura de risco de taxa de juro do endividamento da A.

28 - Ora sem estas premissas de dívida certa e prazo certo, o produto nunca poderia ter por objectivo a cobertura do risco de taxa de juro num financiamento, tratando-se ao invés, de um produto de pura especulação, que sempre favorecia o Banco.

29 - E nesse caso, então deveria o Banco R. ter cumprido os deveres que lhes são impostos pelo CdVM, no âmbito do conhecimento do seu cliente e demais deveres legais a que estava adstrito, no âmbito da sua actividade.

30 - Realizou assim o Banco uma operação swap de taxa de juro, para cobertura de taxa de juro, de um financiamento com um prazo bastante superior ao verdadeiro prazo do financiamento.

31 - Não sendo legítimo que o Banco proponha ao seu cliente um swap daquela natureza, com um prazo superior ao do próprio financiamento e que o mesmo ainda perdure caso o financiamento seja liquidado.

32 - Por tudo quanto até aqui foi exposto, poder-se-á concluir claramente, que o comportamento e actuação do BST e tais Contratos de Permuta de Taxa de Juro, configuram uma clara violação dos deveres, de actuação com vista à protecção dos legítimos interesses do cliente, a Recorrente (artigo 304º do Código de Valores Mobiliários).

33 - Por tudo quanto até aqui foi exposto, conclui-se igualmente que o comportamento e actuação do BST e tais Contratos de Permuta de Taxa de Juro, configuram uma clara violação dos deveres, de actuação com vista à protecção dos legítimos interesses do cliente, a Recorrente (artigo 304º do Código de Valores Mobiliários), conforme supra referido.

34 – Pois o valor nominal dos Contratos de Permuta de Taxa de Juro foi determinado unicamente pelo Banco R., sem que a A. fosse informada, devidamente esclarecida e/ou consultada.

35 - É assim um facto que o Banco R., sem que ninguém lho transmitisse, arbitrariamente, veio propor ao seu cliente celebrar contratos de swap de taxa de juro, com montantes muito superiores ao seu real endividamento.

36 - E afirmando sempre, sem no entanto trazer aos autos qualquer documento que o comprove que serviriam os mesmos para cobertura do risco de taxa de juro do endividamento da cliente/Recorrente.

37 - O Recorrido num produto de elevado risco e complexo como este, não foi minimamente rigoroso no apuramento das informações do endividamento da cliente/Recorrente e mais no apuramento das modalidades e características de financiamento dos clientes.

38- Até porque, num dos financiamentos beneficiando a Recorrente de uma taxa fixa, sem ser pleno conhecedor do contrato celebrado, veio o Banco Recorrido propor um swap de uma taxa de juro variável por uma taxa de juro fixa, quando não existia, neste caso em particular, qualquer taxa variável para ser trocada, conceito básico e subjacente a um swap.

39 – Como constitui um facto público e notório, o Banco Recorrido vendeu este produto de forma massificada, sem conhecer todas as especificidades do endividamento da cliente/Recorrente, nem de um conjunto alargado de clientes e que seriam verdadeiramente relevantes para realização de tais contratos, quando aplicáveis.

40 - E assim deveria o Banco Recorrido ter sido mais rigoroso na sua análise antes de propor à sua cliente, a ora Oponente a realização de uma operação swap.

41 – Bem como deveria o Banco Recorrido ter cumprido os seus deveres de informação, esclarecendo devidamente o cliente sobre as verdadeiras características do produto em causa, tendo, como resulta da matéria dada provada, (ponto 8, que nada concretiza) o feito de forma genérica.

42 - Assim deveria o Banco Recorrido ter sido mais rigoroso na sua análise antes de propor à sua cliente, a ora Oponente a realização da operação swap, que se discute nestes autos.

43 - Configurando assim, uma clara violação dos deveres, de actuação com vista à protecção dos legítimos interesses do cliente (artigo 304º do Código de Valores Mobiliários) e de fazer   prevalecer os interesses dos clientes face aos do próprio banco em caso de conflito de interesses (artigo 309º do CodVM).

44 – Com efeito, existe um nítido um conflito de interesses do Banco Exequente neste produto que comercializou de forma enganosa junto dos seus clientes.

45 - O Banco R. em nenhum momento da relação de clientela ou antes da relação de clientela, forneceu à Recorrente documentação sobre a Política de Conflito de Interesses, informando sobre a existência de um eventual conflito de interesse, como deveria.

46 - No processo de angariação da Recorrente como cliente, o Banco R., aquando da apresentação do produto, apenas informou a cliente que o produto era destinado unicamente à cobertura do risco de taxa de juro e como tal a única operação que seria efectuada seria a de troca da taxa do financiamento da cliente, que era de taxa variável por uma taxa fixa.

47 - Ora, o que o Banco R. “vendeu” foi um IRS simples.

48 - E caso assim fosse, as vantagens e desvantagens seriam idênticas para ambas as partes, como não acontece no caso concreto, em que o Banco é sempre claramente beneficiado. O Banco R. agiu assim exclusivamente em seu próprio interesse.

49 - No que respeita à apreciação da prova feita pelo Tribunal a quo, esteve mal o Tribunal a quo na apreciação feita, nomeadamente quanto que à apreciação da prova produzida pela A/Recorrente.

50 – É certo que vigora, em sede e apreciação da matéria de facto, o princípio da livre apreciação da prova, devendo o juiz decidir sobre a matéria de facto da causa segundo a sua íntima convicção, formada no confronto dos vários meios de prova. Na apreciação da prova - a regra é, pois, a sua livre apreciação por parte do tribunal, como já dissemos e a excepção reside nos casos em que a lei lhe impõe a conclusão a tirar de certo meio de prova.

51 - No caso dos autos, por não ter existido prova pericial e prova por inspecção, sobra a prova testemunhal trazida pela A. que o Tribunal desvalorizou na apreciação dos factos, o tribunal a quo deveria ter, face às regras da experiência, e às características do produto financeiro em causa, ter valorado de forma diferente a prova em causa, o que não fez.

52 - Contudo o consagrado princípio da livre apreciação da prova também a presenta limitações à objectividade que se impõe perante a prova produzida, ora, no caso dos autos afigura-se que o Tribunal a quo se deixou trespassar pela subjectividade, na sua apreciação da prova. Sabemos que a decisão assenta num juízo valorativo acerca dos factos provados no processo e da consequente atividade probatória expendida. Não esqueçamos que “ as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos” - artigo 341º do C. Civil.

53 - A realidade dos factos foi contudo, distorcida pelo Banco R., através do depoimento testemunhal das testemunhas por si presentadas, mesmo contrariando evidências documentais, o Tribunal a quo considerou-as, no entanto, mais credíveis e assentou nelas a sua decisão, com claro prejuízo para a A, mas olvidando nesse confronto, a restante prova documental carreada para os Autos, nomeadamente apreciação técnica financeira (e não meramente jurídica) efectuada pela CMVM.

54 - Da sentença extraímos que deu o Tribunal a quo como provado o referido em 8 dos factos provados: “Previamente à celebração do contrato referido em 4) representantes do Banco R. (LS..., AS... e VF...) reuniram com representantes da A., explicando as características da nova operação a realizar, tendo acompanhado essa explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação (artigos 20º, 21º e 23º, da contestação).”,resposta essa que se impugna, e que deveria ter sido dada como não provada.

55 – Salvo o devido respeito, não pode o Tribunal considerar, como considerou, para a matéria dada como provada apenas os depoimentos das testemunhas do R., aliás, sem que o Banco R. junte qualquer documento de prova, referente ``as explicações que tinham de ser dadas ao seus clientes quanto às características técnicas dos produtos, pois para explicações de produtos de natureza tão complexa sempre tal careceria de prova documental, nomeadamente a apresentação da brochura técnica do produto, onde estariam descriminados, explicados, exemplificados e elencados todos os riscos inerentes à natureza do contrato, o que não se verificou in casu.

56 - O Banco Recorrido, nunca efectuou junto da Recorrida nenhuma projecção de resultados do novo produto, nos diversos cenários possíveis (subida de taxas de juro, moderadas e acentuadas, bem como, no cenário de descidas de taxas de juro, moderadas e acentuadas), configurando assim uma violação dos deveres de informação ao seu cliente.

57 – E o cumprimento de tais deveres não decorre da factualidade dada como provada no ponto 8 da Sentença, mas apenas e tão somente que “foram explicadas as características da nova operação”. E pergunta-se, em concreto, que características?

58 - As testemunhas do Banco vieram dizer aos autos que haviam prestados esclarecimentos à A., mas sempre sem concretizar que esclarecimentos foram esses e em que medida é que esses esclarecimentos espelhavam cenários de possíveis perdas.

59 - Tal não aconteceu, o único cenário apresentado foi o de mostrar à A. que ficariam protegidos contra possíveis subidas de taxas de juros e nunca se configurando cenários de perdas reais ou potenciais.

60 - Diz o Tribunal que nos depoimentos das referidas testemunhas existiu divergência quanto à compreensão do produto, mas não quanto à apresentação do mesmo, o que não é verdade, pois à A. foi apresentado o contrato de Swap como um seguro que lhes permitiria o controlo sobre os juros a ser pagos, ou seja nunca sairiam das margens definidas, o que se veio a revelar falso.

61 - O Tribunal a quo considerou e bem, nesta parte, em 9 dos factos assente que “Nessa contratação e execução a autora sempre agiu confiando no réu e adoptando aquilo que por este lhe era indicado, considerando que o que lhes era proposto seria o que mais vantagens traria à empresa. (16º bi).

62 - O R. motivou na Recorrente uma confiança e um juízo de certeza sobre a segurança que os swaps trariam à sua actividade comercial, que levou a Recorrente de forma quase cega a subscrever um produto com base nas explicações enganosas, diga-se que até “ardilosas” do Banco R..

63 – Pelo que não deveria ter sido dada a resposta de provado a este quesito, que deve merecer resposta de não provado.

64 - A Recorrente assinou o contrato no entanto, pois, sem que lhe fossem explicados os termos e condições, nem fornecida nenhuma outra instrução relativamente à forma como seria executado, não tendo sido fornecida pelo Banco R. uma única informação relevante, concretamente sobre as reacções do produto em caso de oscilações bruscas de taxa de juro e inerentes riscos para o contratante de um contrato daquela natureza, logrado os efeitos que haviam sido garantidos, pelo que existe culpa in contrahendo e violação do principio da boa fé, nos preliminares contratuais, por parte do Banco aqui Recorrido.

65 - Mais alegou a Recorrente que a essência e as consequências do contrato não foram, pelo R., razoável e convenientemente decifrados à A., não detendo a A., aquando da celebração do contrato, uma vontade perfeita e esclarecida, nunca tendo chegado a apreender totalmente o alcance de uma operação de interest rate swap, a sua forma de execução, os benefícios, os custos e os riscos que do contrato outorgado derivariam.

66- Tendo ocorrido incontornavelmente erro sobre as circunstâncias que constituíram a base do negócio ou sobre os motivos determinantes da vontade, por causa atribuível ao Banco Recorrido que violou o dever de informação a que estava adstrito, não permitindo que a vontade de A. fosse perfeita e esclarecida.

67 - Vem o Tribunal a quo fazendo uso da actual directiva para os mercados financeiros, para dizer que nos dias de hoje, sim, recai sobre o intermediário financeiro um conjunto de rigorosas imposições nas relações que tem com os Clientes, mas que à data dos factos, ou seja em 2007, outro cenário diferente existia, afastando quase que liminarmente qualquer responsabilidade do intermediário financeiro.

68 - Assim não é, contudo, pois na realidade mesmo em 2007 recaiam muitos deveres e obrigações sobre os intermediários financeiros, concedendo-se que estes fossem mais ligeiros que os implementados após a entrada em vigor pela DMIF, mas que mesmos assim deveriam incidir no cabal esclarecimento dos clientes e investidores, acerca das concretas características das aplicações ou produtos financeiros contratualizados, o que não aconteceu no caso concreto.

69 – Nomeadamente, por exemplo, a informação e obtenção do cliente da assunção dos respectivos riscos e da natureza complexa de tais produtos financeiros.

70 - A DMIF apareceu precisamente para controlar o Intermediário Financeiro, que muitas vezes agia sem respeito pelo contraparte e saindo este com ganhos consideráveis e o Cliente com perdas consideráveis, existiu assim a necessidade imperiosa de impor ao intermediário financeiro um elevado respeito pelo seu Cliente.

71 - Nunca foi explicado à A., como deveria ter sido, nem tal resulta provado, que as alegadas barreiras à subida da taxa de juros não o eram, efectivamente, muito pelo contrário.

72 – Deve ser dado como provado pois, que o Banco, enquanto Intermediário Financeiro teve um tipo de conduta censurável e desrespeitadora das normas que consubstanciam a imputação de responsabilidades na contratação e execução da relação jurídica firmada com a Recorrente no que respeita ao produto swap.

73 - O Tribunal a quo peca porque não conforma os conteúdos dos testemunhos, com os documentos juntos aos autos, que esses sim, demonstram a natureza complexa de tais produtos financeiros e seu modo de funcionamento.

74 - O que resulta dos autos e dos testemunhos conjugados de LS..., VF..., AS..., VA..., FA..., são depoimentos contraditórios, e que algumas dúvidas deveria ter suscitado junto do Tribunal a quo, tanto que foi requerida, admitida e feita uma acareação entre estas indicadas testemunhas.

75 - Refere a sentença que foram explicadas as características da nova operação, com documento similar à da primeira operação; como resulta dos depoimentos de LS... (a 13/01/2014 às 10h53m37s até às 12h02m08s) e AS... (a 13/01/2014 às 16h23m54s até 16h56m02s) estes limitaram-se a enfatizar exaustivamente o contrato de crédito de fomento à construção, sem nunca conseguirem precisar o momento, em que circunstancias e o modo como foi introduzido e explicado o contrato de swap à A.

76 - Percebe a A. o porque da imprecisão, porque efectivamente nunca lhe foi explicado nos termos referidos pelas testemunhas, tudo não passou de um documento que aparece posteriormente já após assinatura do contrato de fomento à construção, assinado no escritório da Recorrente, sempre com a garantia de que se estava perante um seguro para a taxa do contrato de fomento não sofrer oscilações no sentido da subida que em muito prejudicariam a A., como bem atestaram as testemunhas VA... (a 13/01/2014 às 14h55m41s até às 16h06m57s) e ainda a testemunha F...B... A... (a 13/01/2014 às 15h56m07s até às 17h27m11s).

77 - O Tribunal a quo entendeu e apreciou, mal, na perspectiva da A., e no confronto com a restante prova documental, que como o primeiro contrato havia já sido explicado e por o segundo ser similar, que as explicações de um aproveitariam ao outro, o que não é razoável.

78 – Vejamos: a acareação de LS..., VF..., AS..., VA..., FA..., CR... - Temporização: 01h 30m e 10s.

79 - Resulta da acareação que esta se centrou primordialmente no momento e lugar de assinatura dos contratos perdendo a subjectividade das imperiosas explicações que tinham que ser dadas à A. sobre o produto.

80 – Resultou da acareação, cuja transcrição se junta, que todas as explicações dadas sobre o produto iam sempre no sentido de segurar – seguro – as taxas de juro e sempre o Banco R. colocando a tónica de que efectivamente era um seguro, sem riscos. A este propósito nunca nenhuma testemunha do Banco refere que riscos foram esses elencados à A. e em que circunstâncias do mercado podiam acontecer, donde facilmente se conclui, com critérios de experiência e razoabilidade, que não existiram explicações sobre a complexidade do produto.

81 - Como resulta da prova gravada, para a qual se remete e cuja transcrição integral se junta, no dia da escritura do contrato de fomento à construção não existiu qualquer explicação relativa a contratos de swap, como bem prova a Recorrente.

82 - Para prova dos factos alegados veio a testemunha VA... juntar aos autos documentos comprovativos de passagem na Ponte Vasco da Gama, pela via verde, bem demonstrando que não existiu qualquer tempo para explicações de contrato de swap e ao contrário do testemunho prestado pela testemunha LS... (13/01/2014 às 13h46m24s até 14h55m34s – transcrição a fls. 90 a 133) que disse que havia tido uma reunião prévia à assinatura do contrato de fomento à construção e depois seguiram todos para o Centro Totta, para assinatura do contrato.

83 - Ora a prova testemunhal e documental colocada à disposição do Tribunal, aceite pelo Tribunal a quo, teria servido para atestar da veracidade dos testemunhos prestados pelas testemunhas VA... e FA.... No entanto, veio o Tribunal a quo formar a sua convicção no sentido de que os testemunhos não haviam sido credíveis e tão pouco foram confirmados com prova documental, pelo que não pode a Recorrente conformar-se com tal decisão, em se de resposta à matéria de facto.

84 - Tão inequívoca prova de veracidade entregue pela testemunha da A. ao Tribunal, sempre teria que servir por um lado para atestar a veracidade das palavras da testemunha da A. e colocando na mesma medida em prejuízo a veracidade das palavras da indicada testemunha do Banco.

85 - Resulta no entanto que existem manifestas contradições entre o momento da assinatura do segundo contrato, o que importa aos autos, que deste não resultaram quaisquer explicações para sua concretização, senão que o existente já não era vantajoso para a A., já não cobria verdadeiramente o risco de subida de taxa de juros.

86 - Diz o Recorrido que o contrato foi assinado em simultâneo pelo Senhor A... e A... e por FA..., facto que se veio a revelar não ser verdadeiro porquanto a testemunha FA... não esteve presente no Almoço referido pelas indicadas testemunhas e consequentemente foi apenas este assinado pelo Senhor AA... sendo posteriormente, dias mais tarde, recolhida a assinatura do FA... no escritório da Recorrente, como resulta da prova gravada, nas passagens da respectivas gravações, junta ao autos.

87 - Neste sentido veio o banco juntar aos autos e-mail que supostamente enviou à sala de mercados no mesmo dia 6 de Setembro de 2007, só que esse documento apresenta-se truncado nas assinaturas. Não obstante a impugnação da A. feita sobre a veracidade do documento que por estar truncado nunca dele se poderia aferir que dois representantes da empresa o haviam assinado no alegado dia 6 de Setembro, o que é certo, é que perante tal impugnação, nunca veio o Banco R. juntar documento integral e original conforme requerido pela A.

88 - Veio posteriormente o Banco dizer que dele não dispunha no momento e que por tal facto não o podia juntar pelo que requereu a A. a inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no artigo 344º, n.º2, remissão feita pelo artigo 471º, n.º 2 ambos do CPC.

89 – No entanto entendeu o Tribunal a quo que tal documento não tinha particular interesse à boa resolução da causa, pelo que indeferiu a requerida inversão do ónus da prova requerida pela A.

80 - Ora, mal esteve o Tribunal a quo, porquanto a junção do original do documento serviria quanto mais não fosse para abalar a credibilidade dos testemunhos prestados pelos Colaboradores do Banco e presentes na acareação, pelo que deveria ter o Tribunal a quo se decidido pela inversão do ónus da prova, o que se requer a Vossas Excelências.

81 - Posto que as versões entre testemunhas do Banco e as da A. foram opostas quanto ao momento de assinatura do contrato, a junção do reclamado original do documento serviria para atestar da veracidade da versão trazida pela A.

82 - Erradamente, no modesto entendimento da A. o Tribunal a quo, entendeu que o documento não merecia importância para a decisão da causa, também nesta parte espera-se que o Venerando Tribunal para quem se recorre em busca de decisão mais justa, venha a apreciar a contrario a não junção do documento por parte do Banco R, com as devidas consequências processuais. Provando-se, nesta parte, como verdadeiras as declarações prestadas pelas testemunhas da Recorrente.

83 - Com a acareação e o que resulta nos autos dos requerimentos apresentados pela A., que por economia se escusa de repetir, sempre permitiria ao Tribunal a quo ter entendimento diverso e considerar os testemunhos do VA... e FA... credíveis e não terem merecido o chumbo do Tribunal tal como mereceram. Ao contrário sim era o que deveria ter ocorrido, o chumbo deveria ter recaído sobre o Banco R. que nunca trouxe aos autos prova cabal da veracidade do que afirma nesta parte.

84 - Pelo exposto esteve mal o Tribunal a quo ao considerar estarem reunidos os pressupostos da responsabilidade in contraindo, não obstante a consideração do Tribunal a quo de que não se encontra reunidos os pressupostos da responsabilidade in contraendo e as suas consequências legais sempre teria que considerar o segundo pedido alternativo da A. a resolução do contrato por alteração anormal das circunstâncias.

85 - O Tribunal a quo vem identificar o que é um swap e as característica do Swap, o que faz a fls. 12 e começo de fls. 13, naturalmente que à Recorrente este apreciação não merece comentário, o problema de tal apreciação é que ela efectivamente não se conforme com o que se encontra no caso concreto em que não se está perante um verdadeiro contrato de swap. Ficando logo prejudicada a tese do Banco R.

86 - O swap dos autos não tem uma natureza de swap simples, que ai sim não mereceria censura, mas sim de um swap meramente especulativo, pois não está a A. na posse de um contrato de swap, a A. assinou um contrato que se assim se chamava e nada mais.

87 - Estamos, pois, perante um contrato de permuta de taxa de juro meramente especulativo.

88 - Reproduz-se, em sumula, o posicionamento do Professor Lebre de Freitas, “Como tal, mesmo que as partes não o invoquem, o tribunal da ação de resolução deve, após contraditoriedade, oficiosamente declará-lo nulo, nos termos dos arts. 281.° e 286.º do Código Civil, com a consequência da absolvição do pedido de resolução, visto que a questão jurídica da validade/nulidade do contrato é prejudicial à apreciação deste pedido.

89 - A não se entender assim, as obrigações decorrentes do contrato estariam sujeitas, como também já frisado, ao regime da obrigação natural. Também esta questão de direito é de conhecimento oficioso, sem prejuízo de igualmente só poder ser conhecida após a observância do art. 3.º-3 do Código de Processo Civil.

90 - Mais entende a Recorrente que esteve mal a decisão recorrida por entender que não se estava perante o instituto da alteração anormal das circunstâncias.

91 - Na apreciação que temos a fazer deste caso concreto que se leva ao Tribunal ad quem há que colocar a questão de saber se o referido regime legal tem aplicação no âmbito de um contrato de swap, atenta a sua natureza aleatória vincada.

92 – O Contrato em causa acarreta um profundo desequilíbrio entre as prestações das partes, em caso de flutuação da taxa de juros, sendo intolerável com boa fé que a A. o suporte.

93 - A crise económica e financeira a meados de 2008, verificou-se a repentina e imprevisível descida acentuada da taxa de juros, refletindo-se diretamente no contrato, cuja celebração visou a estabilização dos encargos financeiros dos financiamentos.

94 - Reproduz-se igualmente aqui o entendimento da CMVM, no âmbito das queixas apresentadas, que esta entidade apreciou e pronunciou-se sobre os contrato de swap do Banco R (iguais aos dos presentes autos). – Informação n.º CAIC/2011/102, com notificação expedida pela CMVM ao BST, S.A (documento junto aos autos pela A. a fls.):

Pelo que da analise de tais contratos em que se inclui o contrato dos autos, verifica-se que:

k) Não Podem ser qualificados como verdadeiros instrumentos financeiros de protecção do risco de taxa de juro;
1) São exclusivamente ou primordialmente instrumentos de especulação com a taxa de juro;
m) Por um lado, estes contratos proporcionam a possibilidade de o cliente obter ganhos (bastante limitados) que apenas servem (potencialmente) para atenuar o spread de eventuais financiamentos que tenham contraído;
n) Por outro lado, abre m um potencial de ganhos muito assimétricos para o BST face aos clientes, nomeadamente em cenários em que o indexante (Eutibor3M ou Euribor 2M) apresente fortes oscilações: O cliente incorre em perdas potenciais máximas ClU e podem ser extremamente elevadas atingindo no limite 5% caso se verifique uma subida da Euribor para valores superiores a 4,90% ou caso a Euribor desça significativamente (como sucedeu a partir do final de 2008);
p) O cliente fica exposto de forma bastante assimétrica ao risco de descida da Euribor;
q) Na maioria dos casos, a data de contratação destes -produtos com os clientes processou-se já em plena crise financeira, mas quando as taxas Euribor ainda estavam em percentagens apelativas à subscrição destes contratos (tendo em conta a contingência das supostas taxas fixas às barreiras da Euribor constantes dos contratos). Poder-se-á assim especular que o BST promoveu a subscrição destes produtos pelos clientes num contexto de mercado que lhes era marginalmente favorável, mas em (11.1e a expectativa (e nalguns casos a própria tendência continuada) de descida das taxas Euribor poderia ser tida como muito provável:
r) Ademais, a maturidade destes produtos é longa, sendo que desde que as taxas Euribor caíram para valores inferiores aos das barreiras os clientes têm vindo a ser penalizados sem qualquer revisão das condições inicialmente contratadas;
s) Sucede porém, sem prejuízo da eventual falta de informação aos clientes quanto à natureza do produto e a realização dos testes de adequação exigidos por lei, alguns dos contratos referem expressamente que se trata de contratos destinados a fazer "gestão de risco de taxa de juro" e não "a cobertura do seu risco” e que o cliente fica sujeito a "perdas financeiras significativas se a evolução das condições de mercado for desfavorável" (sendo inclusivamente quantificada a perda máxima como podendo ascender a 5%);”
95 - Mais apreciou a CMVM que:
“Não foram indicados os riscos em que o cliente incorreria num cenário de descida de taxas de juro em especial quando o valor nominal do swap superasse o valor da dívida, caso em que se está a especular em taxa de juro e não a gerir o risco de taxa de juro. Fixando-a.
A fixação de barreiras pelo BST é feita muito perto do ponto de indiferença ou limitando a margem de ganhos do cliente;
Não resulta claro da informação prestada pelo BST que na estreita margem em que possa ocorrer fixação da taxa de juro esta só ocorreria dentro dos limites definidos pelas barreiras.”

Concluindo esta Entidade que: “Assim, o contrato descreve com precisão o âmbito de cobertura. Porém, a situação de cobertura é a excepção nestes contratos. Ou seja, a falta de cobertura não é um risco mas sim o próprio objecto do contrato que se torna assim num instrumento meramente especulativo.

Concluindo-se igualmente, seguindo aliás as conclusões da CMVM sobre os contratos do aqui Recorrido BST, como é o contrato dos autos, que:

a) Os contratos swap BST não podem ser qualificados como instrumentos de protecção do risco de taxa de juro ao contrário do que é referido nas várias peças contratuais, como resulta da análise referida no Capítulo III.
b) Os clientes celebraram os contratos na convicção de que estavam a proteger-se contra um provável agravamento (era assim apresentado pelo BST) das taxas de juro de contrato de endividamento que julgavam estar subjacente àquele contrato.
c) O contrato celebrado com os reclamantes é um produto especialmente complexo. Porém, a explicação que sobre as suas características é dada aos clientes/reclamantes não é suficiente nem clara face ao seu perfil.
d) Geralmente, não se identificam os riscos e quando se identificam não se faz com a necessária clareza e em muitos casos não há qualquer referência aos mesmos ainda que ambos os contratos (préconfirmação e confirmação) contemplem urna declaração de conhecimento e compreensão dos riscos pelos seus subscritores (na nossa opinião, sem suporte na informação dada).
e) Não ficou demonstrado o cumprimento pelo BST dos especiais deveres de transparência e lealdade a que os intermediários financeiros estão sujeitos no relacionamento com os seus clientes, os elevados padrões de profissionalismo e diligência a que estão vinculados e ainda a desproporção dos riscos e vantagens que os contratos representam para o cliente e para o Banco;
f) Estes contratos foram celebrados entre 2006 e 2009 e a informação previamente prestada pelo BST através de apresentações em powerpoint alude apenas à perspectiva de subida das taxas de juro. Porém, já existia informação sobre uma provável inversão da política de taxa de juro praticada pela FED e pelo BCE sendo que no primeiro caso a tendência descendente já se tinha iniciado.

95 - Ora, o documento que acabamos de reproduzir parcialmente e que foi junto aos autos, não mereceu qualquer comentário por parte do Tribunal a quo, na sentença proferida, chocando na medida em que o Tribunal a quo considerou em quase toda a extensão os depoimentos das testemunhas V... e FA..., PG …como não merecedores de credibilidade, porque entendeu o Tribunal estarem desacompanhados de mais prova que
atesta-se a veracidade das suas palavras.

96 - Tivesse o Tribunal a quo apreciado a prova documental carreada para os autos, nesta parte tivesse lido e tido em consideração as palavras do supervisor CMVM, que facilmente se atestaria e conformaria com os depoimentos das testemunhas Vitor e Fernando Augusto.

97 - Por último, quanto á Resolução do contrato pedia pela Autora, sempre se dira que por via do regime inserto no art.° 434.° n.° 2 do CC, nos contratos de swap a resolução não tem efeitos retroativos.

98 - No entanto pretende a A. / Recorrente que os efeitos da resolução se produzam, assim seguindo, porém, a jurisprudência que decorre do já citado Acórdão do STJ, cumpre atentar no facto de que a crise económica e financeira, que acarreta a alteração anormal das circunstâncias, se repercutiu no contrato aqui visado deverá apurar-se desde o verão de 2008 altura em que as alterações se operaram manifestamentede forma negativa no contrato da A; por conseguinte, a eficácia resolutiva operará desde esse indicado momento em diante.

99 - Mais não se conforma a Recorrente que venha o Tribunal a quo dizer que não se apuraram prejuízos sofridos pela A., por não ter esta junto qualquer prova nesta parte pois que a A. juntou aos autos certidões extraídas dos autos que correram termos junto do Tribunal de Loures, referente à divida que foi paga e que foram juntas aos autos a fls…, provando assim que a A. teve que liquidar a indicada quantia ao Banco R. que a executou, sendo essa a medida do prejuízo da A. e ainda a totalidade das quantias já pagas nos termos do contrato celebrado. Manifesto ficou o desequilíbrio superveniente de posições entre a A., que se viu confrontada com perdas avultadas e o Banco R. que como se viu e bem se provou nos termos do contrato ganharia sempre.

100 - Provou a A. que teve avultados prejuízos que lhe advieram em razão do cumprimento das prestações da operação swap, devendo em consequência ver o contrato resolvido por alteração anormal das circunstâncias.

101 – Face ao exposto, deve ser dada resposta de provado, às alíneas a) b), c), d), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p) e q), conforme decorre dos depoimentos das testemunhas, cujas passagens da gravação se encontram devidamente assinaladas na transcrição dos respectivos depoimentos, ora anexa, AS..., LS..., VF..., bem como de VA... e FA..., conjugados tais depoimentos com os docs. de fls (…) Decisão da CMVM e Certidão do Tribunal de Loures a fls (…), e ainda o panfleto entregue pelo banco, a A., em 2007 a fls (…).

101 - Pelo exposto não se conforma a Recorrente com a apreciação de direito que o Tribunal a quo formula, por dela não poder concordar; nesta parte caso assim o Tribunal ad quem entenda por não atender ao pedido formulado pela A. nulidade do contrato por vício da vontade na formação do contrato, sempre terá que atender ao exposto e considerar a alteração anormal das circunstancias como causa de resolução do contrato fazendo nessa medida justiça substituído a sentença proferida por outra mais justa.

O R. contra alegou nos termos de fls.1338 e seguintes.


*

II – 1 - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:

1) A autora é uma sociedade que se dedica à actividade de construção civil, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim. (A).

2) No âmbito dessa actividade a autora contraiu um financiamento junto da instituição de Crédito réu, titulado pelo "Contrato de Mútuo com Hipoteca" n.º 0090.00495007820, de 31 de Agosto de 2006, dizendo-se neste que era a utilizar na "modalidade de abertura de crédito", contrato esse que foi objecto de dois aditamentos, — doc. 1, 1-A e 1-B a fls. 10 e sgs., 24 e sgs. e 30 e sgs. destes autos.(B)

3) Entre autora e réu foi ainda celebrado um intitulado "Contrato Quadro para Operações Financeiras", ao abrigo e em execução do qual foi outorgado um "Contrato de Permuta de Taxa de Juro" (lnterest Rate Swap) com a referência 1099287/1099288/1099289 — cf. Documentos 1, 2 e 3 juntos à PI.(C).

4) Em 06.09.2007, foi celebrado um novo "Contrato de Permuta de Taxa de Juro" (agora com a referência 4911.001), o qual foi designado "Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juro".(D)

5) Entre autora e réu foi ainda celebrado "título de autorização de preenchimento de livrança-caução para responsabilidades específicas com aval — doc. 2-B junto com a PI, a fls. 57 destes. (E).

6) Os contratos mencionados em 3) e 4) supra foram celebrados por indicação dos competentes serviços do Banco réu. (1°-bi)

7) O contrato mencionado em 4) veio a verificar-se gravoso para a autora. (3º bi, parte)

8) Previamente à celebração do contrato referido em 4) representantes do Banco R. LS..., AS... e VF...) reuniram com representantes da A., explicando as características da nova operação a realizar, tendo acompanhado essa explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação (artigos 20º, 21º e 23º, da contestação).

9) Nessa contratação e execução a autora sempre agiu confiando no réu e adoptando aquilo que por este lhe era indicado, considerando que o que lhes era proposto seria o que mais vantagens traria à empresa. (16º bi ).

*

II – 2 - O Tribunal de 1ª instância julgou não provados os seguintes factos:

a) O contrato mencionado vem 4) veio, incompreensivelmente e sem qualquer explicação substituir o anterior. (2º)
b) No contexto das taxas de juro que então se desenhava, o contrato mencionado em 4) acabou por estabelecer condições ainda mais gravosas para a autora. (3º bi)
c) Foi expressamente garantido à autora pelo Banco réu que a outorga deste último contrato [o mencionado em 4)] seria o motivo pelo qual os encargos com o crédito anteriormente contraído iriam estabilizar (4º bi).
d) A outorga deste conduziria a um reajuste mais vantajoso das condições contratuais para a autora, atento que o inicialmente ajustado estaria já desadaptado às condições então existentes no mercado. (5º bi ).
e) Nenhuma destas situações ocorreu (6º bi).
f) Tais contratos foram assinados pela autora sem que os seus termos e condições lhe fossem explicados, nem fornecida nenhuma outra instrução relativamente à forma como seriam executados. (7º bi).
g) O réu omitiu à autora esclarecimentos sobre a natureza, riscos e custos associados à operação em causa (8º bi).
h) Exemplo dessa omissão de esclarecimento é o facto de a autora ter contratado um swap de taxa de juro em Junho de 2007 para um período de 5 (cinco) anos assegurando uma cobertura da taxa de juro que se prolonga por mais 3 (três) anos do que o prazo que subjaz ao Contrato de Mútuo celebrado em Agosto de 2006 de Crédito, cujo vencimento ocorreu já em Janeiro de 2010 (9º bi).
i) Altura em que o Contrato de Permuta de Taxa de Juro outorgado em Agosto de 2006 estava, ao tempo, ainda em vigor. (10º bi).
j) Sendo o swap um produto financeiro de natureza complexa e não um produto de protecção do risco de taxa de juro, o banco réu não decifrou à autora a sua especial complexidade e elevado risco. (11º bi).

1) Aquando da celebração do contrato a autora não se encontrava detentora de uma vontade perfeita e esclarecida, nunca chegando a apreender totalmente o alcance de uma operação de interest rate swap. (12º bi).
m) Nem a sua forma de execução, os benefícios, os custos e os riscos que do contrato outorgado derivariam (13º pi).
n) Tal contratação sem explicações bastantes do risco incorrido pela autora gera hoje um prejuízo trimestral de milhares de euros, prejuízo este que previsivelmente ocorrerá até ao terminus do contrato de swap, em 2012. (14º bi).
o) Também durante a execução do contrato, apesar dos sucessivos pedidos feitos pela autora, o réu nunca a informou e lhe prestou assistência quanto aos cálculos subjacentes aos fluxos financeiros gerados pelo contrato e justificativos dos montantes cujo pagamento lhe era exigido. (15º bi ).
p) A autora nunca quis celebrar o mencionado contrato de permuta da taxa de Juro que, aliás, nem sequer conhecia, e cuja manutenção em vigor ameaça a própria estabilidade e viabilidade financeira da empresa (17º bi ).
q) Os legais representantes do banco réu não ignoravam, à data da assinatura do contrato, que a vontade dos legais representantes da autora não era esclarecida e que assentava noutros pressupostos. (18º).

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III - São as conclusões da alegação de recurso que delimitam o âmbito da apelação. Assim, tendo em conta o teor das conclusões da apelante, face à sentença proferida nos autos, as questões que essencialmente se colocam são as seguintes: se deverá ser alterada a matéria de facto nos termos propostos pela apelante; se o comportamento do Banco R. configurou uma violação dos seus deveres de actuação para com a A. existindo culpa in contrahendo e se o contrato celebrado em 6-9-2007 é nulo, ocorrendo erro sobre as circunstâncias que constituíram a base do negócio ou sobre os motivos determinantes da vontade;  se face à crise económica e financeira de meados de 2008 deve aquele contrato ser resolvido por alteração anormal das circunstâncias.

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IV – 1 - No ponto 101 das suas conclusões de recurso refere a apelante: «Face ao exposto, deve ser dada resposta de provado, às alíneas a) b), c), d), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p) e q), conforme decorre dos depoimentos das testemunhas, cujas passagens da gravação se encontram devidamente assinaladas na transcrição dos respectivos depoimentos, ora anexa, AS..., LS..., VF..., bem como de VA... e FA..., conjugados tais depoimentos com os docs. de fls (…) Decisão da CMVM e Certidão do Tribunal de Loures a fls (…), e ainda o panfleto entregue pelo banco, a A., em 2007 a fls (…)».

Nos termos do nº 1 do art. 640 do CPC, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

A reapreciação dos meios de prova pelo tribunal da Relação destinar-se-á a diligenciar a correcção de eventuais erros de julgamento na decisão sobre a matéria de facto. Assim, dispõe o nº 2-a) do mesmo art. 640 do CPC que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente indicar com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso - e proceder, se assim o entender, à transcrição de quaisquer excertos.

Diz-nos, a propósito, Abrantes Geraldes ([1]) que relativamente «a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre ao recorrente indicar com exactidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos». Bem como que a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da matéria de facto deve verificar-se na situação de «falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda».

No caso que nos ocupa, a apelante indicou claramente quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (ou seja, as alíneas a), b), c), d), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p) e q) dos factos elencados na sentença como não provados), bem como a decisão que, no seu entender, deveria ser proferida (no seu entender deveria ser dada a esses factos a resposta de provados).

Mencionou, também, quais os concretos meios probatórios constantes do processo e do registo dos depoimentos nele realizada que impunha decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida - os depoimentos das testemunhas AS..., LS..., VF..., bem como de VA... e FA..., conjugados «com os docs. de fls (…) Decisão da CMVM e Certidão do Tribunal de Loures a fls (…), e ainda o panfleto entregue pelo banco, a A., em 2007 a fls (…)».

Sucede que correspondendo a parte essencial dos meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas a depoimentos gravados, incumbia à apelante indicar com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recursoo que não fez - procedendo, se assim entendesse, à transcrição dos mesmos.

Indicar com exactidão as passagens da gravação em que a parte funda o seu recurso, não é simplesmente dizer que a testemunha depôs no dia “Z” das “X” às Y” horas, ou seja durante um certo número de horas e de minutos ([2]). É indicar, relativamente a este ou aquele ponto de facto, concretamente as passagens do depoimento desta ou daquela testemunha que levam o recorrente a concluir diferentemente do Tribunal, com referência de que tal passagem se encontra do minuto “X” ao minuto “Y” da gravação do mesmo depoimento.

E isso não foi feito pela recorrente, nem nas conclusões, nem mesmo no corpo da alegação de recurso; a recorrente remete, em bloco, para o depoimento das testemunhas que identifica. Sendo que a transcrição dos depoimentos (facultativa) a que a apelante procedeu, não substituiu nem evita aquele ónus que a lei lhe impõe.

Rejeita-se, pois, o recurso no que concerne à impugnação da matéria de facto elencada nas alíneas a), b), c), d), f), g), h), i), j), l), m), n), o), p) e q) dos factos não provados, pela falta de indicação exacta das passagens da gravação em que a apelante se funda.

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IV – 2 - O Tribunal de 1ª instância julgou provado o seguinte facto:

«8) Previamente à celebração do contrato referido em 4) representantes do Banco R. (LS..., AS... e VF...) reuniram com representantes da A., explicando as características da nova operação a realizar, tendo acompanhado essa explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação (artigos 20º, 21º e 23º, da contestação)».

No ponto 54) das conclusões da sua alegação de recurso a A. impugna esta resposta, dizendo que tal facto deveria ter sido dado como não provado.

Sucede que a apelante é imprecisa quanto aos meios probatórios em que funda a sua impugnação, não indicando com exactidão – também nesta parte - as passagens da gravação em que funda o seu recurso.

Assim, no ponto 81) das conclusões da alegação de recurso defende a apelante: «Como resulta da prova gravada, para a qual se remete e cuja transcrição integral se junta, no dia da escritura do contrato de fomento à construção não existiu qualquer explicação relativa a contratos de swap, como bem prova a Recorrente».

Pelo do mesmo modo e quanto a esta parte há que rejeitar a impugnação.

*

IV – 3 - Face à junção de documentos por parte do R. veio a A. requerer que este juntasse o original do documento de onde foi extraído o anexo de um e-mail, o que foi deferido pelo Tribunal que determinou aquela junção em dois dias, considerando a data designada para a continuação da audiência de discussão e julgamento.

Nessa data (última sessão daquela audiência) a A. veio requerer a inversão do ónus da prova, tendo em conta a não apresentação pelo R. do aludido original; quanto ao R. foi dito que não juntou o documento por não o haver localizado.

Na sequência, no texto da sentença (fundamentação de facto) foi expresso o seguinte:

«No que se refere ao requerido pela A. na última sessão de audiência, de inversão do ónus da prova, dir-se-á que:

É requerido, a fls 978 e segs, pela A. « ... que o Banco Réu venha juntar aos autos o original do documento de onde foi extraído o alegado anexo do alegado email….» (fls 982).

Refira-se que o mesmo se refere, tal como alegado pelo Banco Réu, a um « ... email enviado pela testemunha AS..., no dia 6 de Setembro de 2007, às 16h50m requerendo o fecho da segunda operação de permuta de taxa de juro, contendo digitalização das condições da operação e, em anexo, o documento « pré-confirmação» composto por uma página designado « contrato de permuta de taxa de juro», indicando data de início 10 de setembro de 2007 e data de vencimento 10 de setembro de 2012 já com as assinaturas de FA... e AA...».

Ora, constata-se que o referido original não se mostra junto aos autos, vindo a informar o Banco Réu que «... O Banco Réu está a levara cabo diligências para tentar localizar o original do documento que foi digitalizado e enviado em anexo ao email datado de 6 de setembro de 2007 e, caso o consiga localizar, juntará o mesmo até à data da audiência de julgamento...».

Assim, na sequência desta falta de junção veio a A. , em acta de audiência, a fls 1023, requerer « ... a inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no artigo n° 344°, n° 2, remissão feita pelo artigo 417-0, n° 2...».

Vejamos:

O envio do email em apreço e seus anexos não é matéria que assuma relevo nestes autos.

Como é aceite por A. e Banco R., o referido contrato foi celebrado, conforme resulta do facto 4) assente, sendo que é da aceitação da sua celebração que a A. peticiona a sua nulidade ou, em alternativa, que se declare a sua resolução, por alteração anormal das circunstâncias.

Neste medida, o apuramento do envio deste email e seus anexos, designadamente para eventual apuramento das datas em que foram apostas as assinaturas que do mesmo constam, não se afigura relevante nestes autos e por isso não se consideraram tais documentos (email e seus anexos).

Defende a apelante mal que «a junção do original do documento serviria quanto mais não fosse para abalar a credibilidade dos testemunhos prestados pelos Colaboradores do Banco e presentes na acareação, pelo que deveria ter o Tribunal a quo se decidido pela inversão do do ónus da prova, o que se requer a Vossas Excelências;» posto «que as versões entre testemunhas do Banco e as da A. foram opostas quanto ao momento de assinatura do contrato, a junção do reclamado original do documento serviria para atestar da veracidade da versão trazida pela A.»; «espera-se que o Venerando Tribunal para quem se recorre em busca de decisão mais justa, venha a apreciar a contrario a não junção do documento por parte do Banco R, com as devidas consequências processuais. Provando-se, nesta parte, como verdadeiras as declarações prestadas pelas testemunhas da Recorrente».

O Tribunal de 1ª instância tem inteira razão quando refere ser aceite pelas partes que o contrato de swap cuja declaração de nulidade ou resolução a A. peticiona havia efectivamente sido celebrado.

A solicitada inversão não operaria para possibilitar a prova de um facto que onerava a A. e impossível de provar sem aquele documento, mas, tão só, para em conjugação com outros elementos de prova, instrumentalmente, permitir ao Tribunal criar uma determinada convicção aspirada pela A..

No caso, não se perspectiva ter o R. culposamente tornado impossível a prova à A. de um facto que a onerava (qual o facto por si alegado que a A. pretende ver elencado entre os factos provados e cuja prova dependia daquele documento?)

Mesmo que se aderisse a um entendimento mais abrangente, tratando-se aquele documento de um elemento a conjugar com outros para, então, se concluir pela realidade de um facto, não havendo lugar à reapreciação da prova é inútil considerar elementos para que sejam consideradas «verdadeiras as declarações prestadas pelas testemunhas da Recorrente» e «abalar a credibilidade dos testemunhos prestados pelos Colaboradores do Banco». É, pois, irrelevante este aspecto da discussão.

Mantém-se, assim, a factualidade provada nos seus precisos termos.

*

IV – 4 - Sabemos que entre a A. e o R. foi celebrado um acordo escrito intitulado «Contrato Quadro para Operações Financeiras», ao abrigo e em execução do qual foi outorgado um «Contrato de Permuta de Taxa de Juro» (lnterest Rate Swap) com a referência 1099287/1099288/1099289. Bem como que em 6-9-2007, foi celebrado um novo «Contrato de Permuta de Taxa de Juro» (agora com a referência 4911.001), o qual foi designado "Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juro" (pontos 3) e 4) dos Factos Provados).

O aludido «Contrato Quadro para Operações Financeiras», datado de 31- 8-2006, encontra-se documentado a fls. 44 e seguintes. Atenta a sua cláusula 1ª aquele contrato quadro destinava-se a «regular as condições gerais a que estão sujeitas todas as operações financeiras a estabelecer doravante entre as Partes»; estando cada operação sujeita a condições particulares, em tudo o que não resultasse expressamente dos seus termos, tais operações financeiras ficariam sujeitas ao estabelecido no contrato quadro; expressamente ficavam abrangidas pelo contrato quadro as operações de «Permutas Financeiras (Swaps)», designadamente de taxas de juros (Interest Rate Swaps – IRS).

Neste contexto é celebrado entre as partes um primeiro «Contrato de Permuta de Taxa de Juro» tendo como data de início 31-8-2006 e como data de vencimento 31-8-2008. De acordo com o documento de fls. 298 e de fls. 492 a A. e o Banco R. comprovam a celebração daquele contrato «que será objecto de confirmação incorporando todos os seus termos e condições particulares». Na sequência é emitida a «Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juros (lnterest Rate Swap)», documentada a fls. 35 e seguintes, datada de 31 de Agosto de 2006, com a referência do Banco 1099287/1099288/1099289.

Posteriormente, surge-nos o segundo contrato supra aludido – aquele que nos interessa nos presentes autos (cuja declaração de nulidade/resolução a A. pretende).

Assim, a fls. 101, encontramos o documento denominado de «Contrato de Permuta de Taxa de Juro», celebrado entre a A. e o Banco R.. Ali é referida a importância nominal de 2.000.000,00 €, a data de início de 10 de Setembro de 2007 e de vencimento de 10 de Setembro de 2012, mencionando-se quanto aos termos do contrato:

«O Banco paga ao Cliente no final de cada período trimestral entre a Data de Início e a Data de Vencimento, a taxa de juro Euribor 3 Meses (fixada no 2º dia útil anterior ao início do respectivo trimestre), calculada sobre a importância Nominal.

Em contrapartida, o Cliente paga ao Banco no final de cada período trimestral entre a Data de Início e a Data de Vencimento, a seguinte taxa de juro (calculada sobre a importância Nominal):

- 4.53% caso a Euribor 3 meses (fixada no 2º dia útil anterior ao início do respectivo trimestre) seja igual ou inferior a 5.35%; ou
- a taxa de juro Euribor 3 meses (fixada no 2º dia útil anterior ao início do respectivo trimestre) deduzida de uma bonificação de 0,20% caso contrário».

Declarando-se sob a epígrafe «Racional do Contrato»:

«O contrato serve um objectivo de gestão de risco de taxa de juro, em que o cliente paga uma taxa de juro fixa, caso a Euribor 3 meses desça, se mantenha ou suba moderadamente durante o período de vida do contrato e desde que não ultrapasse em cada trimestre a Barreira.

Se a Euribor 3 meses subir fortemente, superando relativamente a qualquer trimestre a Barreira, o Cliente terá um ganho no contrato nesse trimestre, correspondente à bonificação. No caso de a Euribor 3 meses descer ou se manter estável, o cliente registará, em princípio, uma perda financeira no respectivo trimestre, dado a taxa de juro a pagar pelo Banco ao Cliente ser então inferior à taxa de juro a pagar pelo Cliente ao Banco».

Relativamente a este acordo está documentado nos autos (fls. 59 e seguintes) a «Confirmação de Contrato de Permuta de Taxa de Juros (lnterest Rate Swap)», referência 4911.001, datada de 6 de Setembro de 2007, em que novamente surge como data de início 10 de Setembro de 2007, data de vencimento 10 de Setembro de 2012 e importância nominal a de 2.000.000,00 €, reafirmando-se o demais, designadamente a taxa fixa de 4.530% e a Barreira de 5.350%.

Para Maria Clara Calheiros os swap «são uma família de contratos, pelos quais se estabelece entre as partes uma obrigação recíproca de pagar, de acordo com modalidades pré-estabelecidas, na mesma divisa ou em diferentes divisas, certas quantias de dinheiro calculadas por referência aos fluxos financeiros ligados a activos e passivos monetários, reais ou fictícios, ditos subjacentes» ([3]).

Numa outra definição o contrato de swap corresponderá àquele pelo qual as partes se obrigam ao pagamento recíproco e futuro de duas quantias pecuniárias, na mesma moeda ou em moedas diferentes, numa ou várias datas predeterminadas, calculadas por referência a fluxos financeiros associados a um activo subjacente, geralmente uma determinada taxa de câmbio ou de juros ([4]).

Já o contrato de swap de taxa de juros, nas palavras de Maria Clara Calheiros ([5]) consiste num acordo de pagamento recíproco de juros baseados em diferentes índices, ou de taxa variável/taxa fixa, por certo período de tempo. Os fluxos de pagamentos são ambos efectuados na mesma moeda, sendo o cálculo do montante dos juros realizado a partir de um dado valor de capital subjacente, que não chega a ser trocado.

O «interest rate swap», na noção que nos é dada por Pedro Boullosa Gonzalez ([6]), corresponde a «um contrato mediante o qual ambas as partes se vinculam reciprocamente, durante período determinado, a realizar prestações pecuniárias periódicas com objectos distintos: assim acontece, num exemplo simples, quando uma das partes, “A” assume a obrigação de pagar à outra, “B” uma taxa de juro (nomeadamente, de tipo fixo, e.g. 3%) e recebe da outra parte uma taxa de juro distinta (que poderá ser de tipo variável, e.g. Euribor a 6 meses), por um período pré-determinado, sobre um montante nocional previamente acordado. Na substância, é uma permuta de taxas de juro cujo valor é calculado atendendo a pressupostos distintos mas com referência a um mesmo montante nocional acordado». Menciona este autor que são «essencialmente três as finalidades pretendidas com a celebração de um contrato de swap e, em particular, interest rate swap: cobertura ou redução de risco, especulação e redução de custos de financiamento. Caracterizando-o do seguinte modo: «enquanto figura contratual e desde logo quanto à estrutura o interest rate swap é um contrato atípico, sinalagmático, duradouro, oneroso e aleatório».

Paulo Mota Pinto entende que ([7]) o swap de taxas de juro é hoje um contrato «social e economicamente típico que tem como conteúdo a constituição de obrigações de pagamento recíproco pelas partes e a prazo, num certo momento ou segundo um calendário acordado, de quantias pecuniárias expressas na mesma divisa, correspondentes à aplicação de taxas de juro (ou se uma fórmula que inclui taxas de juro) a um montante subjacente (o “nocional”), real ou fictício, podendo tais obrigações recíprocas extinguir-se total ou parcialmente mediante compensação».

O denominado «Contrato de Permuta de Taxa de Juro» a que se referem os autos, com início a 10 de Setembro de 2007 enquadra-se, efectivamente, na definição correspondente à sua denominação.

O mesmo seria disciplinado pelas suas cláusulas próprias e pelas do contrato quadro anteriormente celebrado ([8]).
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IV – 5 - Provou-se que a A. contraíra um financiamento junto do R., titulado pelo «Contrato de Mútuo com Hipoteca» n.º 0090.00495007820, de 31 de Agosto de 2006, dizendo-se neste que era a utilizar na "modalidade de abertura de crédito" sendo o montante a utilizar no valor de 3.520.000,00 €, e que foi objecto de dois aditamentos (conforme documentos de fls. 10 a 34), vindo o prazo deste contrato a ser fixado em 48 meses contados de 31-8-2006.

Sabemos que os contratos de swap foram celebrados por indicação dos competentes serviços do Banco R. e que o segundo destes contratos veio a verificar-se gravoso para a A.; bem como que nessa contratação e execução a A. sempre agiu confiando no R. e adoptando aquilo que por este lhe era indicado, considerando que o que lhes era proposto seria o que mais vantagens traria à empresa.

Foi julgado provado, ainda, que previamente à celebração do dito segundo contrato de swap representantes do Banco R. (LS..., AS... e VF...) reuniram com representantes da A., explicando as características da nova operação a realizar, tendo acompanhado essa explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação.

A A. sustenta que o R. violou os seus deveres de prestar à cliente a informação necessária para que esta pudesse tomar uma decisão esclarecida e de protecção dos legítimos interesses da cliente face aos seus próprios interesses.

Consoante prescreve o art. 227 do CC, quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que causar à outra parte.

Temos, pois, que a lei sanciona, em termos gerais a responsabilidade por culpa na formação dos contratos – “culpa in contrahendo” – abrangendo todo o processo genético do acordo, as fases anteriores à celebração do contrato, ou seja, a fase negociatória e a fase decisória.

A aplicação deste artigo não é afastada pela celebração do contrato, sendo ele aplicável tanto no caso de se interromperem as negociações como no de o contrato se realizar ([9]).

A expressão boa fé é aqui usada em sentido objectivo (ou ético), enquanto conjunto de regras de conduta socialmente correctas.

O capítulo I do título VI do RGICSF contém várias normas referentes às regras de conduta das instituições de crédito, seus administradores e funcionários.

Assim, determina o art. 74 daquele Regime Geral que «nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados» ([10]). Diz-nos José Maria Pires ([11]) – e com ele concordamos - que aqui se está a fixar o conteúdo objectivo da boa fé  a qual é um princípio aplicável à generalidade dos negócios jurídicos, tanto na fase preliminar da negociação como na sua conclusão, princípio que deve, ainda, ser observado no cumprimento da obrigação e no exercício do direito respectivo (nº 2 do art. 762 do CC). E que a «boa fé, como regra geral a observar nas relações pessoais entre bancos e clientes impõe obrigações recíprocas de informação, de forma a evitar prejuízos derivados da falta dessa informação». Neste contexto entende que os arts. 74 e 75 do  RGICSF não são meras normas programáticas mas verdadeiros deveres jurídicos que configuram o princípio da boa fé relativamente à actividade bancária ([12]).

O referido art. 75 dispunha que as «instituições de crédito devem informar os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos suportados por aqueles».

Estabelecendo o art. 76 que os «membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direcção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos depositantes, dos investidores e dos demais credores».

Indiscutível é, neste âmbito, a relevância do dever de informar. Salienta Menezes Cordeiro ([13]) que á partida «o dever de informação tenderá a abranger tudo quanto, pela natureza da situação considerada, não seja conhecido pela contraparte. Assim, ele será tanto mais intenso quanto maior for a complexidade do contrato e da realidade, por ele envolvida»; bem como será «tanto mais intenso e extenso quanto mais inexperiente e ignorante for a contraparte». O dever de informar poderá recair sobre o objecto do contrato, sobre aspectos materiais conexos com esse objecto, sobre a problemática jurídica envolvida, sobre perspectivas contratuais, sobre a conduta do próprio obrigado. Realce -se, embora, como sobejamente explicado na sentença recorrida, que ao contrato a que nos reportamos não era aplicável o dl 357-A/2007, de 31-10-2007, que aprovou a transposição para a ordem jurídica interna, com efeitos desde 1-11-2007, da Directiva 2004/39/CE – DMIF.   ([14]).

A A., na p.i., a propósito do dever de informação e da boa fé negocial faz uma alusão genérica à LCCG.

Não se pode negar a frequência da contratação por adesão em contratos celebrados com entidades bancárias e o recurso a cláusulas contratuais gerais incluídas nos negócios singulares.

Como refere José Maria Pires ([15]) os contratos bancários «são normalmente celebrados segundo fórmulas elaboradas pelos próprios bancos e que estes oferecem à adesão dos seus clientes». Nesses casos, para efeito da conclusão esclarecida do contrato a LCCG prevê um dever de informação: o utilizador das cláusulas contratuais gerais deve conceder a informação necessária ao aderido, prestando-lhe os esclarecimentos solicitados (art. 6 da LCCG) - sem prejuízo da devida comunicação das cláusulas.
Todavia, a A. não afirma propriamente que o contrato que pretende que seja declarado nulo foi celebrado por simples adesão da sua parte. Ora, como entendido pelo STJ no seu acórdão de 11-02-2015 ([16]) «previamente à apreciação da validade das alegadas cláusulas contratuais gerais, à luz do regime jurídico da LCCG, tinha de ocorrer a demonstração probatória, a cargo da parte que queria beneficiar da aplicação desse regime … de que se estava em terreno próprio destas, nos moldes do art. 342.º, n.º 1, do CC» ([17]).

No caso dos autos a A. não logrou demonstrar – como alegara – que: os contratos foram assinados pela A. sem que os seus termos e condições lhe fossem explicados, nem fornecida nenhuma outra instrução relativamente à forma como seriam executados; o R. omitiu à A. esclarecimentos sobre a natureza, riscos e custos associados à operação em causa; o Banco R. não decifrou à A. a especial complexidade e elevado risco do produto; quando da celebração do contrato a A. não se encontrava detentora de uma vontade perfeita e esclarecida (o que os representantes do Banco R. não ignoravam), nunca chegando a apreender totalmente o alcance de uma operação de interest rate swap, nem a sua forma de execução, os benefícios, os custos e os riscos que do contrato outorgado derivariam; que a A. nunca quis celebrar o mencionado contrato de permuta da taxa de juro que, aliás, nem sequer conhecia.

Como vimos, anteriormente ao contrato que a A. pretende ver anulado, já a A. havia celebrado com o R. outro contrato de swap de taxas de juro (cerca de um ano antes) bem como acordado no já aludido «Contrato Quadro Para Operações Financeiras». Portanto, em Setembro de 2007 a A. não estava perante algo de completamente novo – antes perante um tipo de contrato que já antes celebrara e que se encontrava em execução. Além de que se provou – como vimos – que previamente à celebração do contrato a que nos reportamos, representantes do Banco R. (LS..., AS... e VF...) reuniram com representantes da A., explicando as características da nova operação a realizar, tendo acompanhado essa explicação com documento similar ao apresentado aquando da primeira operação, adaptado às condições da nova operação.

Deste modo, não dispomos de elementos que nos levem a concluir que o Banco R. não haja cumprido com o dever de informação que sobre ele impendia.

E, muito menos, que a vontade da A. se encontrasse afectada por erro que recaía sobre os motivos determinantes da vontade ou sobre as circunstâncias que constituíram a base do negócio.

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IV – 6 - Defende a apelante que o produto em causa corresponde a «um produto de pura especulação, que sempre favorecia o Banco» configurando a actuação do R. «uma violação dos deveres de actuação com vista à protecção dos legítimos interesses do cliente» - a A.; e que não é legítimo que o Banco proponha ao seu cliente um swap «com um prazo superior ao do próprio financiamento e que o mesmo ainda perdure caso o financiamento seja liquidado» (pontos 24 a 33 das conclusões da alegação de recurso).
Trata-se de argumentação expendida na alegação de recurso e que não fora aventada nos articulados. A matéria, todavia, mostra alguma ligação com a questão de conhecimento oficioso que a apelante agora refere, da nulidade do contrato nos termos dos arts. 281 e 286 do CC (ou, se assim não for, da sujeição das obrigações decorrentes do contrato ao regime das obrigações naturais) quando afirma estarmos «perante um contrato de permuta de taxa de juro meramente especulativo» (pontos 87 a 89 das conclusões da alegação de recurso).

Como vimos, o art. 74 do RGICSF, referindo-se aos administradores e empregados das instituições de crédito, aludia ao respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados.
Também o art. 304 do Código de Valores Mobiliários ([18]) dispõem que  «os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes».

Provou-se que a A. contraíra junto do R. o já mencionado financiamento, titulado pelo "Contrato de Mútuo com Hipoteca" n.º 0090.00495007820, de 31 de Agosto de 2006. Pouco sabemos sobre os concretos termos de ligação entre aquele financiamento e o contrato de swap a que nos reportamos; provando-se embora que ele foi celebrado por indicação do R., não se provou que foi expressamente garantido à A. que a sua outorga seria o motivo pelo qual os encargos com aquele financiamento anteriormente contraído iriam estabilizar. De qualquer modo o contrato de swap não foi celebrado isoladamente – existia aquele contrato de financiamento celebrado entre as mesmas partes. Todavia, o contrato de swap manter-se-ia até 10-9-2012, enquanto o contrato de mútuo tinha um prazo até 31-8-2010. Sendo certo que dos textos escritos que integram o contrato de swap nenhuma expressa menção é feita àquele financiamento.

Lebre de Freitas ([19]) defende que  o swap apareceu «com a função de cobrir o risco inerente a uma operação económica subjacente» - exemplificando com o caso de uma empresa contrair um empréstimo bancário mas recear que a taxa de juro, indexada a um valor variável se lhe torne desfavorável, trocando por isso a taxa de juro variável por uma taxa fixa.  Considerando, embora, que esta finalidade de cobertura de riscos inerentes à atividade económica não exclui finalidades de especulação, na medida em que o swap, tal como os outros derivados, pode permitir realizar aplicações lucrativas com base na antecipação do sentido da evolução do valor dos ativos subjacentes, entende que «por importantes que possam ser no plano da motivação, estas finalidades devem ter-se por secundárias ou complementares, sob pena de descaracterização da figura». Para concluir: «No caso de swap de taxa de juro que não vise cobrir um risco de variação de valor respeitante a determinada ou determinadas operações, económicas ou puramente financeiras, que pura e simplesmente não existem, há um contrato meramente especulativo, em que a troca mais não serve do que uma finalidade de jogo ou aposta. Então, das duas uma: ou o jogo é ilícito e o contrato é irremediavelmente nulo; ou o jogo é lícito e dele resultam apenas obrigações naturais, ressalvada ainda a fraude do credor na execução do contrato (art. 1245º do Código Civil)». Reafirmando, adiante que «quando não exerça a função de cobertura do risco de um dos contraentes, por não haver uma realidade subjacente a que se reporte, o swap, meramente especulativo, não constitui contrato válido».

Em diferente sentido encontramos Pedro Boullosa Gonzalez  ([20]), dizendo: «O interest rate swap autonomiza-se dos demais contratos de swaps precisamente pelo objecto da troca ou permuta: obrigações pecuniárias relativas a taxas de juros ou, mais precisamente, fluxos financeiros associados a obrigações de pagamento de juros. Deve salientar-se, porém, que as obrigações de pagamento de juros são determinadas de forma autónoma, ou seja, sem referência a obrigações de pagamento de capital e tendo como referência um valor meramente nocional determinado pelas partes. Quer isto dizer que os interest rate swaps são figuras contratuais autónomas e não necessariamente complementares a um contrato de mútuo ou outro tipo de financiamento (…). Ainda assim, é típico, ainda que não essencial, que o contrato de interest rate swap esteja na prática associado ou surja na sequência da celebração, por uma ou ambas as partes, respectivamente, de um contrato de mútuo ou de outro tipo de instrumento de financiamento…»

Este sentido foi expressamente acolhido pelo STJ no seu acórdão de 11-2-2015, processo 309/11.8TVLSB.L1.S1 ([21]).

Provou-se que o contrato de swap celebrado em 2007 veio a verificar-se gravoso para a A.. Todavia,  os factos são escassos para que afirmemos que o R. violou os seus deveres de protecção dos legítimos interesses da cliente.

Calvão da Silva ([22]) considera que «cobertura de risco e especulação são o verso (claro) e o reverso (escuro) da mesma medalha, implicando dois agentes de mercado com expectativas opostas acerca do futuro andamento da variável taxa de juro, de que sairá beneficiado aquele que vir as suas expectativas cumpridas».

Mesmo que se admita que o produto em questão tinha uma finalidade especulativa – «podendo a especulação ser definida como a consciente e deliberada exposição às incertezas do mercado, com a intenção de alcançar um benefício económico» ([23]) – não podemos asseverar que quando o contrato foi celebrado apenas seria possível perspectivar uma especulação favorecedora do R. com os inerentes prejuízos da A. e que esta estaria sempre condenada ao insucesso ([24]).

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IV – 7 - Aludimos acima à posição de Lebre de Freitas, posição à qual a apelante adere. Explica aquele Professor que o swap meramente especulativo, continuando a ser um contrato diferencial já não garante a parte contra taxas de juro excessivas (risco exógeno ao contrato), sendo o seu risco, agora, endógeno, isto é, criado pelas partes e por elas pretendido como tal. Acrescentando que «sendo estruturalmente um contrato de jogo ou aposta e apresentando-se como tal, desviado da função que lhe deu origem para constituir um contrato de puro risco, o contrato de swap, por não haver norma específica que neste caso o permita, é nulo (fim contrário à lei: art. 281º do Código Civil), sem que lhe aproveite o princípio da liberdade de negociar e estipular. Trata-se de negócio nulo por ilicitude da causa». E que, a não ser assim, as obrigações decorrentes do contrato estariam sujeitas ao regime das obrigações naturais - «o swap especulativo seria então, em princípio, lícito, mas as obrigações das partes seriam inexigíveis, sem prejuízo de as prestações pagas em execução do contrato não poderem ser repetidas (arts. 402º e 403º do Código Civil) ([25]).

O contrato de swap – designadamente swap de taxas de juro – é maioritariamente caracterizado como sendo um contrato aleatório ([26]). Refere Maria Clara Calheiros ([27]) que «há-se forçosamente reconhecer-se que nos contratos de swap a possibilidade de perda ou de ganho existe sempre para ambas as partes».

Relata a mesma autora ([28]) que o reconhecimento de uma forte componente de aleatoriedade no swap fez temer a sua possível classificação como contrato de jogo e aposta. Menciona, todavia, que o jogo e aposta possuem duas notas caracterizantes: a vontade de contratar ser exclusivamente dominada pelo desejo de submissão à contingência da verificação de um acontecimento incerto; a necessidade de que ambas as partes, e não apenas uma delas, tenham intenção especulativa. Destacando, com interesse para a distinção entre jogo e aposta e especulação, a intenção das partes: enquanto o jogador cria o risco, o especulador utiliza o risco para fins úteis ou procura precaver-se contra ele.

Calvão da Silva ([29]) salienta, a propósito, que as prestações aleatórias e recíprocas do swap de taxa de juro são determinadas por facto exterior ao contrato e estranho à vontade das partes (no caso a flutuação da Euribor), não se sabendo, no momento da conclusão do contrato, se acabará por verificar-se uma vantagem e a parte que dela beneficiará por compensação, e que é esta bilateralidade da álea que caracteriza o swap da taxa de juro. «Sobre ambas as partes corre potencialmente risco de cada uma dever realizar a prestação a favor da outra, embora por compensação das obrigações recíprocas acabe por ser uma a receber o saldo líquido e a outra a pagá-lo». Para concluir: «…não pode o cliente opor validamente ao Banco contraparte, que exige o cumprimento da prestação a que tem direito em virtude das flutuações sucessivas dos juros no mercado (risco exógeno real, e não artificialmente criado pelo contrato), a excepção do jogo e aposta (art. 1245.º do Código Civil): o swap é contrato válido, fonte de obrigações civis, exigíveis, portanto, pela acção de cumprimento, e não reveste a natureza de aposta mesmo que seja especulativa a motivacão de uma parte (ou de ambas) quando não exista uma real operação financeira subjacente…»

Paulo Mota Pinto ([30]) salienta, desde logo, que o facto de o contrato de swap ser aleatório não significa que deva ser qualificado ou equiparado ao contrato de jogo e aposta que é apenas um especial tipo de contrato aleatório entre muitos outros. Considera que é requisito da aplicação do regime previsto no art. 1245 do CC que o contrato seja objectivamente qualificável como sendo um contrato de jogo e aposta e que as partes, ou pelo menos uma delas, actuem com intenção de jogo e/ou de aposta, sendo tal intenção pelo menos reconhecível pela outra parte; bem como que o ónus da prova de tal qualificação impende sobre a parte que pretende qualificar o contrato como sendo de jogo e aposta quando se trate de contrato normalmente celebrado no exercício de uma actividade económica. Conclui que o contrato de swap de taxas de juros, mesmo quando celebrado com objectivos de especulação, não pode ser qualificado como jogo e aposta – quem especula financeiramente não o faz com objectivos lúdicos ou de jogo (sujeitando-se à aleatoriedade da sorte como forma de lucrar) mas antes «como forma de obter rendimento, como um investimento que permite simultaneamente que as contrapartes cubram ou façam a gestão dos seus riscos, e que gera liquidez relevante para a existência do mercado de contratos que permitem essa cobertura e gestão de riscos». Além de que o factor de que depende a aleatoriedade consiste, no caso, numa variável de mercado indispensável á actividade económica das partes».

Igualmente Pedro Boullosa Gonzalez ([31]) afasta o contrato de swap do contrato de jogo e aposta, dizendo que «para além do contexto, as realidades em causa são também em concreto autonomizáveis, desde logo quanto à estrutura e também atendendo às finalidades prosseguidas». Assim, a estrutura do interest rate swap assenta na «ideia de troca ou permuta periódica de prestações pecuniárias cujo valor ou forma de cálculo são predefinidos. No contexto do jogo não existe essa troca ou permuta nem o carácter periódico (e em particular o trato sucessivo) das prestações (…). No que respeita aos fins prosseguidos, os interest rate swaps, embora também enquadráveis no contexto que subjaz aos instrumentos financeiros e valores mobiliários, visam as referidas «finalidades específicas de cobertura ou redução de risco, especulação ou redução de custos de financiamento. O jogo e a aposta, por outro lado, ainda que enquadráveis numa dada perspectiva de especulação, têm inerente a já abordada vertente lúdica ou recreativa que conceptualmente os afasta do contexto típico dos instrumentos
financeiros e valores mobiliários».

Também o STJ no seu já citado acórdão de 11-2-2015, processo 309/11.8TVLSB.L1.S1 entendeu não ser possível considerar os swaps contratos de jogo ou aposta.

Aderindo aos fundamentos que transcrevemos de igual modo entendemos que não estamos perante um contrato de jogo e aposta pelo que as consequências apresentadas pela apelante não se verificam.

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IV – 8 - Discorda a apelante do entendimento do Tribunal de 1ª instância no sentido de não se verificarem os pressupostos que poderiam levar à resolução do contrato por alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar.
Nos termos do nº 1 do art. 437 do CC «se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.».

As circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar são as circunstâncias que determinaram as partes a contratar, de tal modo que se fossem outras, não teriam contratado, ou tê-lo-iam feito, ou pretendido fazer, em termos diferentes.

A alteração deve ser anormal, tratando-se de um requisito que se prende com a imprevisibilidade – a anormalidade conduzirá praticamente à imprevisibilidade ([32]).

As aludidas circunstâncias constituem a base do negócio.

Refere Galvão Telles ([33]) que «a base do negócio no domínio da alteração das circunstâncias tem carácter objectivo, visto não se reconduzir a uma imaginária falsa representação psicológica da manutenção de tais circunstâncias». Por outro lado, «a base do negócio na alteração das circunstâncias é bilateral: respeita simultaneamente aos dois contraentes. A lei…fala, acentuadamente, das circunstâncias em que as partes (plural) fundaram a decisão de contratar; não refere as circunstâncias em que o lesado com a superveniente modificação teria fundado a sua decisão de contratar, proposição destituída de todo o sentido».

Vejamos, pois.

Maria Clara Calheiros ([34]) salientava que «é necessário não esquecer que o art. 437º do CC é extremamente claro ao determinar que fora do âmbito de aplicação ficarão aquelas circunstâncias que correspondem ao risco próprio do negócio (…). Assim, não se vê como possa entender-se que a descida acentuada das taxas de juro não figurava um risco próprio do contrato, pois se é justamente a possibilidade que ocorra esta subida ou descida abrupta que leva à celebração do contrato de swap pelas partes. Com efeito, note-se no modo como expõe Heinrich Hörster o que deve entender-se por risco próprio do contrato: “[…] é aquele que pertence à sua peculiaridade, é o risco ao qual cada parte se sujeita ao concluir o contrato. Este risco constitui a álea normal do contrato e é-lhe intrínseco”».

Também Calvão da Silva ([35]) destacava que «o risco de apreciação ou de depreciação futura (durante o prazo do contrato) das taxas de juro tendo por referência a Euribor (…) constitui a medula do swap: a causa ou função económico-jurídica da sua celebração é justamente a de gerir ou cobrir os riscos conexos às oscilações das taxas de juro durante o período do contrato. (…) se as partes, na negociação e conclusão do contrato, não procederam a uma repartição simétrica (objectiva, de iguais probabilidades e inerentes ganhos ou perdas) do risco da variação das taxas de juro, não pode invocar-se a superveniente onerosidade excessiva da prestação para através da resolução a parte onerada (pela verificação da perda potencial) em consequência da álea própria do contrato (do risco que é o seu sentido e fim, a sua real causa e objecto) se eximir ao (objectivo) risco assimétrico determinado ab origine (com menor taxa fixa a pagar pelo cliente) para perdurar no convencionada constância do contrato duradouro». E, mais adiante: A «volatilidade dos juros é o risco próprio do swap, a não permitir a sua resolução, pois as partes expuseram-se voluntariamente à alteração da Euribor e a descida verificada não decorreu de outos eventos, causas ou circunstâncias (alteração legislativa, guerra, implosão do euro, etc), diferentes e fora da oscilação do mercado como a álea do contrato de troca concretamente firmado (repartição e assunção contratual do risco)».

Nas palavras de Paulo Mota Pinto ([36]) «quando o contrato aleatório, pela sua finalidade, visa expor as partes ao risco em causa, parece claro que apenas alterações de outras circunstâncias, diversas daquelas cujo risco as partes quiseram afetar mediante a celebração do contrato aleatório (circunstâncias já fora da álea contratual) poderão ser relevantes para efeitos do art. 437, nº 1. Já a alteração que consiste justamente na variação dos riscos que as partes quiseram, pela própria finalidade do contrato, assumir quando contrataram, integra os “riscos próprios do contrato” que estão previstos, como elemento negativo da previsão, naquela norma do Código Civil».

Afigura-se-nos, efectivamente, não ser fácil entender-se que a descida acentuada das taxas de juro não estivesse abrangida pelos riscos próprios do contrato.

Deste modo a alteração em causa seria irrelevante.

Acresce que se na alteração das circunstâncias a base do negócio é comum às partes – bilateral, ou, no limite, unilateral notória ou conhecida da outra parte – a A. haveria de ter provado ter sido fundamento do contrato de swap a circunstância de a Euribor não descer abaixo do limite mínimo nele convencionado, de se manter uma determinada conjuntura do mercado no que aos juros respeita ([37]).

No que a tal concerne verifica-se uma ausência de alegação – e logo da correspondente prova - por parte da A..

Além de que não resultou demonstrado o efectivo prejuízo sofrido pela A. – que a constituiria em parte lesada dando-lhe a possibilidade de pedir a resolução do contrato ([38]).

Temos, pois, carência de factos provados susceptíveis de sustentar a pretendida resolução.

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V - Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela apelante.

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Lisboa, 2 de Julho de 2015

Maria José Mouro
Teresa Albuquerque                                                                     
Sousa Pinto


[1]Em «Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2013, pags .126-128.
[2]Se tal se consideraria suficiente na vigência do CPC revogado na versão decorrente do dl 183/2000, de 10-8 (anterior à ultimamente em vigor)) em que o nº 2 do art. 690-A se referia à indicação «dos depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 522º-C», não o é actualmente, atentas as maiores exigências da lei agora em vigor que, como dissemos, se reporta às concretas «passagens da gravação», isto sem prejuízo da parte poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
[3]Ver, designadamente, em «Cadernos de Direito Privado», nº 42, Abril/ Junho de 2013, «O contrato de swap no contexto da actual crise financeira global», pag. 4.
[4]Assim, Engrácia Antunes, «Direito dos Contratos Comerciais», Almedina, pag. 647.
[5]Desta feita em «O Contrato de Swap», Coimbra Editora, pag. 39.
[6]Em «Interest Rate Swap – Perspectiva Jurídica», «Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários - N.º 44 – Abril de 2013», pags. 14, 15 e 22.
[7]Em «Contrato de Swap de taxas de juro, jogo e aposta e alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar», RLJ, ano 143º, nº 3987, Julho/Agosto de 2014, pag. 393.
[8]Tratando-se – o contrato-quadro - de um contrato pelo qual as partes visam regular uma corrente de negócios a estabelecer entre ambas, simplificando desta forma o desenvolvimento ulterior das suas relações» - Maria Clara Calheiros, «O Contrato de Swap», Coimbra Editora, pags. 143 e  seguintes.
[9]Ver, nesse sentido, designadamente, Pires de Lima e Antunes Varela, «Código Civil Anotado», vol. I, pag. 215, Menezes Cordeiro «Da Boa Fé no Direito Civil», Almedina, I vol., pag. 584 e Ana Prata, «Notas Sobre Responsabilidade Pré-Contratual», pag. 180.
[10]Esta é a redacção anterior ao dl 1/2008, de 3-1, em vigor à data da celebração do contrato a que nos reportamos. A mesma redacção será a considerada relativamente aos demais artigos que citarmos.
[11]Em «Elucidário de Direito Bancário», Coimbra Editora, pag. 471.
[12]Menezes Cordeiro diverge desta opinião, entendendo que os arts. 73, 74 e 76 do RGICSF são «meras normas programáticas e de enquadramento» - «Manual de Direito Bancário», Almedina, 3ª edição, pags. 247-248.
[13]«Manual de Direito Bancário», Almedina, 3ª edição, pag. 358-359.
[14]Sendo que os deveres de informação como actualmente desenhados nos arts. 312 e seguintes do Código dos Valores Mobiliários resultaram do dl n.º 357-A/2007. 
[15]Obra citada, pag. 500.
[16]Ao qual se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, processo 877/12.7TVLSB.L1-A.S1.
[17]Mais se referindo ali, citando Menezes Cordeiro: «“A exigência de falta de prévia negociação é um elemento necessário e autónomo, que deve ser invocado e demonstrado”. Ou seja, é ao aderente que compete demonstrar, em primeira mão, que se está perante um contrato de adesão, de acordo com as regras gerais do ónus da prova constantes do art. 342.º do CC».
[18]Versão então em vigor, decorrente do dl 52/2006, de 15-3.
[19]Em «Contrato de Swap meramente Especulativo. Regimes de Validade e de Alteração de Circunstâncias», ROA, ano 72, Out./Dez. 2012, pags. 943 e seguintes.
[20]Artigo citado, pag. 23.
[21]Ao qual se pode aceder em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, processo 309/11.8TVLSB.L1.S1.
[22]Em «Swap de taxa de juro: sua legalidade e autonomia e inaplicabilidade da excepção do jogo e aposta», RLJ ano 142º, nº 3979 (Março-Abril 2013), pag. 263.
[23]Ver Maria Clara Calheiros, «O Contrato de Swap», pag. 70.
[24]Maria Clara Calheiros, em «O Contrato de Swap», pag.73, nota 150 menciona que as «posições de especulação são muitas vezes adoptadas pelos bancos comerciais e de investimento, detentores de grandes carteiras de swaps, que passaram do papel de intermediários para o de partes, procurando exclusivamente tirar proveito da gestão combinada de fluxos financeiros de rotação rápida».
[25]Local citado, pags. 952-955.
[26]O contrato aleatório caracterizar-se-á por ser um contrato oneroso no qual a existência ou valor de uma ou de ambas as prestações depende de um facto futuro e incerto.
[27]Em «O contrato de swap no contexto da actual crise financeira global», «Cadernos de Direito Privado», nº 42 (Abril/Junho de 2013) pag. 6.
[28]«O Contrato de Swap», pags. 92 e seguintes, e «O contrato de swap no contexto da actual crise financeira global», pags. 7 e seguintes1.
[29]Artigo citado, pags. 264-265.
[30]Em «Contrato se swap de taxas de juros, jogo e aposta e alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar», RLJ nº 3988, pags. 14 e seguintes.
[31]Artigo citado, pags. 20-21.
[32]Ver Pires de Lima e Antunes Varela, «Código Civil Anotado», vol. I, pag. 388.
[33]No «Manual dos Contratos em Geral», Coimbra, 4ª edição, pags. 343-345.
[34]Em «O contrato de swap no contexto da actual crise financeira global», «Cadernos de Direito Privado», nº 42 (Abril/Junho de 2013) pags. 12-13.
[35]Em «Swap de taxa de juro: inaplicabilidade do regime de alteração das circunstâncias», na RLJ, ano 143º , nº 3986, pags. 364-366.
[36]«Contrato de swap de taxas de juro, jogo e aposta e alteração das circunstâncias», RLJ, nº 3988, pag. 46.
[37]Refere Paulo Mota Pinto - «Contrato de swap de taxas de juro, jogo e aposta e alteração das circunstâncias», RLJ, nº 3988, pag. 51 – que é necessário sempre demonstrar em concreto, perante o contrato que foi celebrado, que uma das circunstâncias em que as partes fundaram (ainda que implicitamente, pressupondo-a sem a afirmar ou representar) a sua decisão comum de contratar foi, efectivamente, a não ocorrência de uma crise com tais consequências.
[38]Como explica Menezes Cordeiro «Tratado de Direito Civil Português – II Direito das Obrigações», tomo IV, pag. 323, calcula-se que o prejuízo deve ter certa envergadura para desencadear a aplicação do remédio extraordinário do art. 437, subordinando-se o tema à referência feita à boa fé.