Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
147/18.7T8SRQ.L1-7
Relator: MICAELA SOUSA
Descritores: PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
MENOR
PERIGO
MEDIDA DE CONFIANÇA A INSTITUIÇÃO COM VISTA A FUTURA ADOPÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/05/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1 – Qualquer intervenção no âmbito do processo de promoção e protecção da criança em perigo deve sujeitar-se aos princípios orientadores consagrados no artigo 4º da Lei de Protecção das Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 3 de Setembro), desde logo, ao princípio do interesse superior da criança, entendido como o direito desta ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
2 – Um dos princípios a observar na intervenção a efectuar é o da prevalência da família, atento o direito e o dever dos pais constitucionalmente consagrado de educar e manter os filhos, não podendo deles ser separados, excepto quando não cumpram os seus deveres fundamentais para com aqueles e sempre mediante decisão judicial, tal como emerge do disposto no artigo 36º, n.ºs 5 e 6 da Constituição da República Portuguesa.
3 – Quando a família biológica é ausente ou apresenta disfuncionalidades de tal ordem que comprometem o estabelecimento de uma relação afectiva gratificante e securizante para a criança é também imperativo constitucional que seja salvaguardado o interesse desta, designadamente através da adopção, por ser esta a resposta mais adequada e que mais se aproxima da família natural.
4 – Não obstante a relação afectiva que a progenitora mantém com o menor, tal não obsta à aplicação da medida de confiança judicial a instituição com vista à adopção, quando se comprove que estão seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação, ou seja, quando apesar dessa relação aquela não se revela capaz de cuidar da segurança, da saúde física e do bem-estar emocional da criança, assumindo integralmente essa responsabilidade, nem logrou se orientar pessoal, profissional e emocionalmente para integrar um projecto de vida para o menor, apesar dos apoios de que beneficiou.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízas na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO requereu a abertura de processo judicial de promoção e protecção a favor do menor A , filho de B e de C , nascido em 17 de Julho de 2017, nos termos dos artigos 3º, n.ºs 1 e 2, c) e f), 11º, n.º 1, c), 38º, 72º, 73º, n.º 1, b) e 105º da Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo[1]), solicitando a abertura da fase de instrução para aplicação das necessárias medidas de promoção e protecção, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 34º, a) e b) e 106º da LPCJP (cf. Ref. Elect. 2612969).
Em 16 de Maio de 2018 foi proferido despacho que declarou aberta a instrução e ordenou a elaboração de inquérito às condições morais, habitacionais e económicas do agregado familiar do menor A Filipe Furtado e agendou data para a tomada de declarações aos progenitores, avós paternos e técnicas da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da Madalena e da Equipa Multidisciplinar de Apoio aos Tribunais (EMAT).
Em 30 de Maio de 2018 foi elaborado relatório pela EMAT que deu conta da saída da progenitora, com o menor, em 24 de Maio de 2018, da habitação que partilhavam com o progenitor da criança, ingressando em casa de acolhimento para mulheres em situação de risco (cf. Ref. Elect. 2639477).
Em 15 de Junho de 2018 foi realizada conferência em que foram tomadas declarações às técnicas, aos progenitores e aos avós da criança, tendo sido alcançado um acordo para aplicação da medida de apoio junto da mãe (cf. Ref. Elect. 2693266), homologado nos termos do art. 112º da LPCJP (cf. Ref. Elect. 46672473), sendo proferido despacho em 10 de Julho de 2018, que fixou o prazo de aplicação da medida em seis meses, nos termos dos art.ºs 35º, n.º 1, a), 112º-A, 55º, 56º, 60º e 62º da LPCJP (cf. Ref. Elect. 46785838).
Em 3 de Agosto de 2018 foi apresentado o primeiro relatório social da Equipa de Assessoria Técnica aos Tribunais no âmbito do acompanhamento da execução da medida, elaborado nessa data, dando conta do modo como decorreu a visita do progenitor e da avó ao menor e revelando a dificuldade de separação deste da mãe, ficando acertada a deslocação quinzenal do pai à ilha do Faial, onde se encontra a criança, para a realização de visitas, sendo ainda mencionada a inconstância da progenitora que tanto pretende deslocar-se à ilha do Pico para visitar a irmã, como decide não ir para poder continuar a beneficiar do programa para concluir o 9º ano com frequência da Rede Valorizar (cf. Ref. Elect. 2738705).
Em 7 de Setembro de 2018 foi apresentado novo relatório descrevendo as visitas do progenitor e concluindo pela necessidade de estas serem mais frequentes, ainda que com a presença de técnica da EMAT, face à imaturidade e conflitos existentes entre os progenitores (cf. Ref. Elect. 2771850).
Em 7 de Dezembro de 2018 foi apresentado o relatório de acompanhamento da execução da medida elaborado em 5 de Dezembro de 2018, que refere o incumprimento pela mãe da frequência do curso de habilitações básicas de 9º ano, da adesão a processos de intervenção psicológica e psicoeducacional para reforço das competências pessoais e parentais, o que poderá determinar a cessação da prestação de rendimento social de inserção, realçando a postura e atitude imaturas da requerida Iara Raposo, revelando um abandono progressivo das acções propostas desde que iniciou um relacionamento com novo companheiro e descurando os cuidados do filho, sendo previsível o seu abandono da Casa Abrigo do Faial para integrar a casa do namorado, que coabita com os progenitores, assim com se refere a escassez de visitas do progenitor ao menor (cf. Ref. Elect. 2922729).
Em 4 de Janeiro de 2019 foi proferida decisão que determinou a prorrogação da execução da medida de apoio aos pais (mãe), por mais seis meses, nos termos do art.ºs 62º, n.ºs 1 e 3, c) e 35º, n.º 1, a) da LPCJP (cf. Ref. Elect. 47516918).
Em 7 de Janeiro de 2019 foi junto relatório elaborado em 4 de Janeiro de 2019 que dá conta da comunicação efectuada pela educadora de infância do menor A informando sobre a higiene descuidada deste e saúde debilitada, tendo sido encaminhado para o serviço de urgência, ficando internado no Hospital da Horta (cf. Ref. Elect. 2958297).
Após promoção nesse sentido do Ministério Público (cf. Ref. Elect. 47540844), em 9 de Janeiro de 2019 foi proferida decisão judicial que, reconhecendo a existência de situação de risco imediato para a criança, determinou, nos termos dos art.ºs 92º, 35º, n.º 1, f) e 37º da LPCJP, a aplicação provisória, pelo período de dois meses, da medida de acolhimento em instituição a favor de A, em instituição a indicar pela EMAT, vindo o menor a ingressar na Casa de Infância de Santo António (cf. Ref. Elect. 47542054 e 2972058).
Em 6 de Fevereiro de 2019 foi junto relatório elaborado em 5 de Fevereiro de 2019 que dá conta da dificuldade inicial de adaptação o menor ao contexto residencial, que tem vindo a melhorar com os convívios diários com a mãe; esta revela que considera ser uma medida adequada o filho permanecer no acolhimento durante os dois meses, face à sua fragilidade emocional, tendo solicitado apoio psicológico, tendo sido acertadas com a progenitora acções que deveria cumprir (reintegração no curso de aquisição de competências mínimas e comparecer nas consultadas para encaminhamento para a especialidade de psiquiatria) (cf. Ref. Elect. 3009829).
Em 11 de Fevereiro de 2019 foi realizada conferência em que foi considerado existir a possibilidade de acordo quanto à aplicação ao menor da medida de acolhimento residencial pelo período de três meses (cf. Ref. Elect. 47713717), vindo a ser determinada a sua elaboração em conferência de 8 de Março de 2019 (cf. Ref. Elect. 47847430), tendo sido junto, assinado pelos progenitores, em 21 de Março de 2019 (cf. Ref. Elect. 3079666) e homologado por despacho de 26 de Março de 2019 (cf. Ref. Elect. 47932226).
Em 18 de Junho de 2019 foi remetido aos autos novo relatório que dá conta da situação de grande instabilidade da progenitora, que prioriza a relação com o companheiro em detrimento de um investimento no cumprimento das acções para a sua autonomização e, bem assim, a demissão das funções parentais por parte do progenitor, concluindo pela não verificação de condições para o regresso de A a casa da progenitora (cf. Ref. Elect. 3206018).
Em 18 de Junho de 2019 foi realizada conferência com audição dos progenitores, avós, técnicas da EMAT e namorado da progenitora (cf. Ref. Elect. 48330562).
Em 9 de Agosto de 2019 o Ministério Público considera dever ser aplicada ao menor a medida de confiança tendo em vista a adopção solicitando a designação de data para conferência com os progenitores (cf. Ref. Elect. 48454463).
Em 22 de Agosto de 2019 foi realizada a conferência não sendo obtida uma solução negociada, tendo sido determinado o encerramento da instrução e o prosseguimento dos autos para a fase de debate judicial, mantendo-se em vigor a medida de acolhimento residencial até que possa ser melhor reavaliada (cf. Ref. Elect. 48534667).
Em 16 de Outubro de 2019 o Ministério Público apresentou as suas alegações concluindo pela aplicação da medida de promoção e protecção de confiança da criança a instituição com vista à sua futura adopção e ainda pela inibição das responsabilidades parentais dos progenitores do menor e proibição das visitas por parte da família natural (cf. Ref. Elect. 3359813).
Os progenitores dos menores não apresentaram alegações.
Realizado o debate judicial, em 28 de Fevereiro de 2020 foi proferido acórdão em que, considerando estar comprometida a vinculação afectiva entre o menor A e a mãe e inexistente a vinculação com o pai, decidiu pela aplicação ao menor A da medida de promoção e protecção de acolhimento residencial com vista a futura adopção, permanecendo o menor na Casa de Infância de Santo António onde se encontra actualmente acolhido e, bem assim, decretar a inibição das responsabilidades parentais dos progenitores e proibir as visitas ao menor por parte da sua família natural, tendo sido nomeada curadora provisória do menor, D (cf. Ref. Elect. 49440088).
Notificado o progenitor C desta decisão, e com ela não se conformando, dela interpôs o presente recurso de apelação, concluindo a respectiva alegação do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 3584499):
A) Ora, a justificação principal para a douta decisão do tribunal a quo é a imaturidade tanto da progenitora como do progenitor.
B) E da existência de alegados maus-tratos ao menor, mas como o próprio tribunal afirma desconhece se os alegados maus-tratos foram efectuados pela progenitora.
C) A decisão de aplicar a medida de promoção e protecção, de acolhimento residencial com vista a futura adopção deverá ser, como indicado no douto acórdão “Apenas quando a família falha no seu papel de prestação de cuidados necessários às crianças que a integram, com comprometimento do seu são desenvolvimento e ajustamento social a que tem direito, em defesa da infância, também constitucionalmente protegida, se permite a restrição daquele direito.”
D) Ora, cremos que no presente processo chegamos ainda não chegamos a esse facto.
E) Como tal o menor deve ficar à guarda da progenitora, conforme estabelecido no Proc. 491/17.0T8VPV que decorreu Juízo Local Cível da Praia da Vitória
Conclui pela procedência do recurso.
A requerida B apresentou resposta em que acompanha as alegações do progenitor C, sustentando que o acórdão recorrido não teve em conta o superior interesse da criança, assim como o facto de a família do seu actual marido estar receptiva ao ingresso do menor na sua habitação, pelo que tal decisão não respeita o estatuído no art. 1978º do Código Civil e o art. 36º, n.ºs 5 e 6 da Constituição da República Portuguesa (cf. Ref. Elect. 3614785).
Contra-alegou o Ministério Público concluindo do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 3618598):
= o recorrente não põe em causa a factualidade dada como provada;
= no entender do Ministério Público, da factualidade provada resulta a incapacidade e inadequação os progenitores de A para a parentalidade;
= não é correcto que se diga que a douta decisão recorrida apelou unicamente à imaturidade dos progenitores, fundando-se em diferentes e concomitantes factores;
= pois que, em primeira linha, e quanto à mãe, fundou-se em “situação de maus-tratos físicos que a requerida, independentemente de não ser a sua autora, não foi capaz de acautelar, revelando, com isso, negligência grave na garantia da segurança do filho e do seu bem-estar físico e psíquico”;
= “de negligência também a nível dos cuidados básicos prestados ao menor quanto à sua higiene e adequação de vestuário”;
= “permanente irregularidade nos cuidados e atenção que dispensa ao filho”;
= “exposição do menor a situações de violência e pela sua sujeição a ambientes agressivos e inseguros”;
= “na inconstância emocional e pessoal” da progenitora, “afigurando-se ser permeável ao que neste campo lhe é incutido pelos seus parceiros ou determinada pelos seus humores de momento.”;
= “a desconsideração da necessidade de proteger e cuidar do filho devidamente e a constante alteração dos seus projectos de vida, ora aderindo ora recusando medidas de apoio, revelando total imaturidade e irresponsabilidade no desempenho dos seus deveres parentais”;
= E da parte do progenitor, a douta decisão recorrida refere, “a sua absoluta imaturidade”, mas também a “incapacidade de interiorização do conteúdo funcional das suas responsabilidades parentais”;
= “Em concreto, importa sublinhar que o reduzido período de vivência do menor com este pai, logo após o nascimento, foi marcado pela falta de condições proporcionadas pelo progenitor e pelo seu agregado e, em particular, pela instabilidade e agressividade no relacionamento de C com a B, com registo de dois episódios de violência doméstica participados por esta e que justificaram o seu acolhimento e do A em casa abrigo.”;
= “O requerido não tinha, nem tem, uma situação profissional e pessoal estável, residindo com a sua mãe e mostrando-se ambos dependentes de prestações sociais para a sua própria subsistência e pouco empenhados em alterar tal situação, ainda que em prol do menor.”;
= “A sua postura perante a intervenção dos técnicos de apoio social foi sempre de recusa e de adversidade.”;
= “Não se propôs a assumir em pleno os cuidados do menor, não pugnando sequer para que lhe fosse conferida a guarda do filho, antes se demarcando da possibilidade de ser uma alternativa estável”;
= Sendo, portanto, “ainda mais marcante a inexistência da vinculação afectiva própria da parentalidade relativamente a este progenitor.”;
= De tudo o exposto resulta o justo e fundamentado apelo, na douta decisão recorrida à reiterada incapacidade, de ambos os progenitores, para assegurar os cuidados e afeição necessários a uma criança de tenra idade, como é o caso do A, incapacidade largamente verificada, em concretos factos e atitudes positivas e omissivas da parte de ambos, e também referidos na douta decisão recorrida.
Conclui pela confirmação da decisão recorrida e aplicação ao A da medida de promoção e protecção de acolhimento residencial com vista a futura adopção.
*
II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil[2], é pelas conclusões do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635º, n.º 3, do CPC), contudo o respectivo objecto, assim delimitado, pode ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (cf. n.º 4 do mencionado art. 635º). Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.
Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não podendo o tribunal ad quem pronunciar-se sobre questões novas não submetidas à apreciação do Tribunal a quo - cf. A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016, 3ª edição, pág. 97.
Face às conclusões da alegação de recurso apresentado pelo apelante, o objecto da presente apelação está circunscrito à apreciação da adequação da medida de protecção aplicada pelo tribunal recorrido em face das circunstâncias de facto apuradas nos autos.
Colhidos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
*
III - FUNDAMENTAÇÃO
3.1. – FUNDAMENTOS DE FACTO
Na primeira instância foram considerados como provados os seguintes factos:
1. B e C estabeleceram relação amorosa quando B tinha 16 anos e beneficiava, ela própria, de processo de promoção e protecção instaurado pela CPCJ da Horta.
2. B, que é a quinta de uma fratria de 7 irmãos, é órfã de pai e de mãe, vivendo à data na cidade da Horta com a sua tia materna, de nome Cidália ……., e com o marido desta.
3. B frequentava então o 7.º ano de curso profissional quando conheceu C e se decidiu a ir residir com este e com os seus pais na ilha do Pico.
4. Após alguns meses de coabitação, nasceu, em 17 de Julho de 2017, no Hospital da Horta, A, registado como natural da freguesia e concelho de Madalena, na ilha do Pico.
5. A mereceu a instauração de processo de promoção e protecção pela CPCJ de Madalena por haver a indicação que, enquanto ainda permanecia no hospital, a progenitora B não o amamentava, situação ultrapassada, contudo, no período de internamento hospitalar.
6. Saído do hospital a 21/07/2017, A ingressou no agregado familiar de seus pais, então composto por estes e pelos avós paternos, de nome Aurélio ……. e Maria …………… .
7. A 31 de Julho de 2017, com apenas 14 dias, A residia na habitação do referido agregado, sita em Cabo Branco, Madalena, aí residindo ainda um outro inquilino.
8. A referida habitação não era ventilada e tinha bolor nas paredes.
9. Durante o dia, A permanecia numa sala com cheiro a tabaco, por ali fumarem os adultos da casa e onde restavam cinzeiros com beatas.
10. A pernoitava no quarto de seus pais, que era igualmente abafado, sem ventilação, e que estava sujo e desorganizado.
11. Dormia num parque que não tinha colocados lençóis e que era usado também para guardar a sua roupa.
12. A habitação dispunha unicamente de uma casa de banho, que não se encontrava limpa.
13. Naquele mesmo dia 31/07/2017 não tinha sido ainda lavada a roupa que A usara na maternidade.
14. Ambos os progenitores estavam desempregados, e o Rendimento Social de Inserção de C havia sido cancelado por ter desistido da frequência da escola profissional.
15. O agregado familiar de A subsistia com os rendimentos do avô paterno, Aurélio ….., que auferia pensão de invalidez no valor de 311,74 €, e de Madalena ……, avó paterna, que auferia subsídio de desemprego no valor de 379,02€.
16. Apresentavam cerca de 660 € de despesas mensais fixas.
17. Nos dias 31/07/2017 e 11/08/2017, a Caritas forneceu bens alimentares e produtos de higiene para o A.
18. No dia 1/11/2017, Iara denunciou que, na sequência de discussão e quando se encontrava com A ao colo, C lhe disse “Não prestas para nada!”, “filha de uma grandessíssima puta!” e “não cuidas do teu filho!”, tendo-a agredido no rosto e empurrado contra uma parede e que, ao querer bater-lhe, tinha atingido A.
19. Nessa sequência, e por intervenção do Polo Local de Prevenção e Combate à Violência Doméstica na Ilha do Pico, B e A foram deslocados de urgência e em segredo para Casa Abrigo sita na Ilha Terceira.
20. As responsabilidades parentais relativas a A foram reguladas no âmbito do processo 491/17.0T8VPV (apenso A destes autos), que correu termos no Juízo Local Cível da Praia da Vitória, tendo ficado estabelecido, por acordo homologado por sentença, obtido em conferência de pais a 13/12/2017, que A residiria com a progenitora, que exerceria as responsabilidades parentais no que aos actos da vida corrente dissesse respeito, ficando o progenitor obrigado ao pagamento da quantia de 50€ a título de pensão de alimentos, que, todavia, nunca pagou.
21. Por seu turno, por acordo celebrado entre os progenitores e a CPCJ da Madalena, no dia 14/11/2017 foi aplicada a A a medida de apoio junto da mãe.
22. Em Janeiro de 2018, B saiu voluntariamente da Casa Abrigo da Terceira e regressou à Ilha do Pico com o filho, passando novamente a residir com C e com os pais deste, ainda que não tenham reatado a relação amorosa.
23. No dia 16/02/2018 Iara retirou o consentimento para intervenção da CPCJ.
24. No dia 2/05/2018 B comunicou às autoridades policiais que, naquele dia, cerca das 20h00, na residência onde habitava, estando com A ao colo, C a empurrou por três vezes e de uma forma violenta contra uma parede.
25. No dia 25 de Maio de 2018, na sequência de pedido de intervenção junto do PLPCVD do Pico, B ingressou em casa abrigo da UMAR, no Faial, onde passou a residir com A.
26. Aí, beneficiou da rede de apoio estabelecida pelas técnicas da casa e pelas demais utentes ali residentes, apoio, designadamente, ao nível do exercício das competências parentais.
27. A Casa Abrigo prestou ainda apoio na organização da vida de Iara, encaminhando-a para o requerimento de RSI, para a inscrição na Agência para a Qualificação e Emprego e, bem ainda, motivando-a a encontrar trabalho.
28. Nas mesmas circunstâncias, e por forma a facilitar a inserção laboral de B, A foi inscrito em creche, na Casa de Santo António, a partir de Setembro de 2018.
29. B foi ainda apoiada pela UMAR, recebendo géneros alimentares e produtos de higiene.
30. Da parte da equipa de Serviço Social, B foi encaminhada para a frequência do programa escolar “Aquisição Básica de Competências”, que decorreria em 300 horas, entre Outubro de 2018 e Janeiro de 2019 e, findo o qual, receberia a equivalência ao 9.º ano.
31. Foi, nesta altura, igualmente encaminhada para a frequência do projecto de vinculação afectiva empreendido pelo ISSA denominado VINCA.
32. Em contexto de entrevista, verificou-se que entre B e A existia então bom relacionamento filio-parental, sendo que B denotava desconforto ao ouvir A chorar e acudia imediatamente ao filho, que junto de si se sentia confortado e parava de chorar.
33. Em Maio/Junho de 2018 C verbalizou perante as técnicas de assistência social sentimentos positivos face à parentalidade, reconhecendo dificuldades de ajustamento às funções e ao papel de pai, traduzidas, nas palavras do próprio, em desinteresse e afastamento no período que antecedeu o nascimento de A e nos seus primeiros meses de vida.
34. C centrava, contudo, o exercício das suas funções parentais na satisfação das necessidades básicas de A, como sejam a alimentação e a habitação, e reconheceu terem ocorrido momentos em que a família não foi capaz de suprir estas necessidades.
35. C identificou então a requerida B como a principal cuidadora de A, mas que esta apenas teria condições de assegurar os cuidados do filho mediante supervisão de terceiros.
36. Em 15 de Junho de 2018 foi obtido acordo de promoção e protecção em que foi aplicada a A a medida de apoio junto da mãe.
37. Na mesma data foi estabelecido que o progenitor e os avós paternos poderiam conviver com A uma vez por mês, nas instalações da Segurança Social da Ilha do Pico.
38. O regime de visitas foi fixado nestes termos porque no âmbito de processo por violência doméstica fora aplicada a medida de proibição de contactos de C com B, passando mais tarde tais visitas a ocorrer já no Faial.
39. No início das visitas, A chorava e apontava para a porta, só se acalmando quando era chamada a mãe e na presença desta, manifestando ansiedade da separação da mãe, identificando-a como figura de referência e securizante.
40. Com o decorrer das visitas, A passou a interagir com maior espontaneidade e a chamar C de “pai”, e foi demonstrando atitude cada vez mais próxima e satisfatória com o pai.
41. C acudia, então, com assiduidade às visitas.
42. Os convívios, em relatórios elaborados pelo ISSA em Agosto e Setembro de 2018, foram reportados como satisfatórios para A e benéficos para o estímulo e reforço da relação da filio-parental, reconhecida como positiva, e estabelecendo-se a partir de então com periodicidade quinzenal, atento também o facto de A estar no Faial e o progenitor no Pico.
43. Na visita agendada para o dia 28 de Setembro de 2018 C solicitou apoio económico junto da técnica de RSI do Pico para as deslocações, pois que deixara de auferir rendimentos do trabalho por se ter despedido.
44. Já no decurso da visita C alterou-se com B, dado que C fez menção de beijar o filho enquanto B o amamentava, culminando com vozearia de C.
45. A partir dessa altura o progenitor deixou de diligenciar pelas visitas ao filho, só retomadas após o acolhimento residencial do menor.
46. Por outra banda, o relatório de avaliação do projecto Vinca (cuja frequência integrava o plano de execução da medida de apoio à progenitora que então vigorava), datado de 14 de Setembro de 2018, conclui “que a progenitora mantém uma relação afetiva com a criança pautada por grande proximidade, carinho, atenção, afeto, mostrando-se atenta às necessidades da criança, sendo capaz de acalmar o filho quando este se mostra agitado e impaciente (…) B revela conhecimentos adequados acerca da prestação de cuidados básicos de higiene, alimentação e segurança, verificando-se uma boa relação de apego à criança (…) No entanto, revela maiores fragilidades no que respeita à concretização de alguns cuidados de higiene, conhecimentos acerca da saúde, imposição de regras e limites e utilização de práticas educativas adequadas.”
47. A partir de Outubro/Novembro de 2018, B assumiu relação de namoro com E, sendo que a partir desta altura passou a ir buscar o A à escola às 18 horas quando antes o fazia às 16 horas, tendo pernoitado algumas vezes fora da Casa Abrigo do Faial.
48. Contemporaneamente, surgiram dificuldades de integração de B na Casa abrigo e de conformação às suas regras, designadamente quanto à higiene do quarto, cumprimento dos horários e de realização das tarefas adstritas da Casa, tendo B, em consequência, recebido dois avisos.
49. Também na mesma altura, foram apontadas fragilidades das práticas parentais de B, que coincidiram com necessidade de intervenção hospitalar urgente de A, nos seguintes termos: 14 de Outubro de 2018: dermatite; 2 de Novembro de 2018: diarreia; 5 de Novembro de 2018: conjuntivite; 9 de Novembro de 2018: tosse; 11 de Novembro de 2018: pneumonia bacteriana.
50. Em 18 de Novembro de 2018 B soube que estava grávida de E, sendo que se tratava de gravidez planeada e desejada, mas que cessou involuntariamente em 29 de Novembro de 2018.
51. Relativamente à frequência do projecto Vinca, B faltou injustificadamente às sessões de 19 e 23 de Novembro.
52. Quanto à frequência escolar, que decorria na escola profissional da Horta, tendo em vista a obtenção de equivalência ao 9.º ano, em 2 de Novembro de 2018 B foi chamada ao director para ser alertada quanto à adequação do seu comportamento em sala de aula e quanto às faltas injustificadas dadas.
53. Em 27 de Novembro de 2018 B foi excluída da formação por falta de assiduidade, empenho, motivação, e por comportamentos desadequados na sala de aulas.
54. Em 3 de Dezembro de 2018 a Casa Abrigo deliberou expulsar B da Casa, com efeitos a partir de 7 de Dezembro.
55. De acordo com relatório da UMAR, datado de 18 de Novembro de 2018, “volvidos 5 meses (…) A permanece grande parte do tempo com roupa suja, depois das refeições fica com comida na roupa e cabelo, sai dessa mesma forma para a rua. (…) ao nível da alimentação a introdução de alimentos sólidos vai a um ritmo moroso (…) cingindo-se a alimentação a base de papas, leite materno e sopas. (…) o espaço quarto está permanentemente sujo, embalagens de bolachas, pão, fraldas sujas, pensos higiénicos, dejetos na sanita. (…) A criança tem problemas de bronquite asmática, os cuidados devem ser redobrados, tal não acontece. A utente não acata algumas sugestões, reagindo de modo defensivo a qualquer intervenção, pondo em causa o seu bem-estar e da criança.”
56. Assim, e desde o dia 7 de Dezembro, A acompanhou a progenitora, tendo esta passado a residir com E e com os pais deste, de nome Maria …. e José ….., na Rua do Pasteleiro, n.º …., em Angústias, Horta.
57. Trata-se de casa unifamiliar murada, composta de dois pisos e um anexo, com 4 quartos e adequadamente mobilada, com boas condições de habitabilidade e higiene.
58. Do sistema de consulta da Segurança Social resulta que E trabalhou sob as ordens e direcção de “Monte Carneiro” entre 17 de Julho e 18 de Setembro de 2018.
59. Em Fevereiro de 2019 era acompanhado no Centro de Aditologia do Hospital da Horta, onde realizava tratamento de substituição de heroína, fazia acompanhamento em psiquiatria e tomava antidepressivos, tratamento que ainda mantém.
60. Em Dezembro de 2018, B beneficiava da prestação de RSI, no valor de 280€, e de 152,54€ de abono de família, nada recebendo a título dos alimentos devidos por C dado que este, como referido, nunca pagou tal prestação.
61. No decurso do mês de Dezembro de 2018, após saída da Casa abrigo da UMAR, A frequentava a creche, revelando-se então B uma mãe presente e preocupada com o filho.
62. A comparecia na creche com vestuário e higiene adequados, trazendo muda de roupa na mochila.
63. B também cumpriu com as consultas de saúde infantil.
64. Entre A e B parecia existir uma relação de vinculação segura, pautada pela afectividade e grande proximidade emocional, passando A grande parte do tempo ao colo da mãe, que também utilizava a amamentação para o acalmar.
65. A vinha estabelecendo uma boa relação afectiva com E.
66. No entanto, no dia 23 de Dezembro de 2018, A foi encaminhado pelas educadoras de infância da creche da casa de Santo António para a urgência do Hospital da Horta, por apresentar alterações na mão esquerda, dado que, alegadamente, teria entalado a mão no sofá.
67. No dia 3 de Janeiro de 2019, tendo 15 meses de idade, A compareceu na creche com estado de higiene deficitário, com odor no vestuário, eritema na zona da fralda, vestuário desadequado para a estação, sem meias e trajando uma blusa de manga comprida pouco quente, denotando falta de cuidado, o que vinha acontecendo desde finais de Dezembro.
68. Na mesma data, foi conduzido à urgência do hospital da Horta pelas técnicas da segurança social, de nome Joana ….e Cláudia ….., onde compareceu ansioso e choroso, e com queixas quando se manipulavam as mãos.
69. Após observação médica, verificou-se que A evidenciava as seguintes lesões:
- Exposição de equimose na região malar direita;
- Edema duro em ambas as mãos, com descamação da polpa dos dedos e fissuras da face palmar das falanges, algumas com crosta, nas zonas das articulações interfalângicas;
- ferida incisa em fase de crosta, linear, na face posterior do pavilhão auricular direito, com cerca de 4 cm de dimensão;
- equimose da região malar direita com edema, ocupando toda a hemiface direita;
- equimose subaxilar direita (hemotórax direito);
- presença de sangue seco na narina direita.
70. Conclui-se na mesma observação médica que tais lesões derivavam de traumatismo, acidental ou infligido, tendo a pediatra que assistiu ao menor, Dr.ª Dora Gomes, assumido em audiência a sua convicção de que resultariam de maus-tratos físicos.
71. A permaneceu internado entre 3 de Janeiro e 9 de Janeiro de 2019.
72. No registo da observação feita pela pediatra foi considerado também existirem sinais de negligência ao nível da higiene e cuidados de saúde primários, sendo de notar que os inchaços existentes nas mãos do bebé desde Novembro desapareceram com o internamento.
73. Confrontada pela pediatra relativamente ao estado de saúde de A e à origem das lesões, a progenitora mostrou-se defensiva e ofereceu explicações diversas.
74. Assim, atribuiu o edema das mãos ao facto de A recorrentemente entalar as mãos no sofá; a equimose e edema da face a queda por cima de brinquedos, na véspera do internamento; e a ferida na face posterior do pavilhão auricular direito, ao contacto da pele atópica com o champô para piolhos.
75. Em face do ocorrido, foi aplicada, em 9 de Janeiro de 2019, medida cautelar de acolhimento em Lar de Infância e Juventude, a saber, a Casa de Santo António, onde A se encontra a residir desde então.
76. Na sequência da separação da progenitora, o processo adaptativo de A ao contexto residencial revelou-se inicialmente difícil e pesaroso, e A, nas duas primeiras semanas, apresentou semblante triste, chorou frequentemente sem causa aparente e chamou recorrentemente pela mãe, sendo que só a presença da mãe teve efeito apaziguador e satisfatório.
77. Na sequência de conferência que teve lugar em 11 de Fevereiro de 2019, foi alcançado acordo de promoção e protecção, posteriormente subscrito pelos progenitores e homologado por despacho de 26/03/2019, aplicando-se a A a medida de acolhimento residencial pelo período de 3 meses, comprometendo-se os progenitores, concreta e designadamente, nos termos do acordo a:
- B  
- Diligenciar pela integração no curso de aquisição de competências mínimas (9.º ano) na AGQE da Horta, a iniciar em 22 de fevereiro de 2019, assumindo comportamento adequado na sala de aula;
- Diligenciar pela comparência em consulta aberta na USI do Faial para encaminhamento na consulta de psiquiatria/psicologia do hospital da Horta.
- Cumprir as consultas de acompanhamento psicoterapêutico que se vierem a considerar;
- Comparecer diariamente às visitas ao filho no contexto de acolhimento residencial;
- Cumprir com as sessões que forem delineadas no âmbito do projeto VINCA, aplicadas em contexto de acolhimento residencial pelas Técnicas da Casa; (…)
- colaboração e articulação com as técnicas da EMAT nas ações delineadas e acordadas; - comunicação de possíveis alterações nas situações acordadas, bem como das que interferem diretamente com auferimento da prestação de RSI.
- C:
- comparecer às visitas ao filho bimensalmente;
- manter afastamento da progenitora;
- Comparência assídua ao curso “Restauração” promovido pela AGQ;
- colaboração e articulação com as técnicas da EMAT nas ações delineadas e acordadas;
- comunicação de possíveis alterações nas situações acordadas.
78. Das 28 visitas diárias agendadas para o mês de Fevereiro, B faltara a 12, sendo que, em Março, acordou com a EMAT proceder a visitas em dias intercalados, entre as 16 h e as 17 horas.
79. Ainda assim, em 12 visitas efectuadas neste regime a progenitora não permaneceu a integralidade dos 60 minutos com A em 5 delas, ausentando-se ou comparecendo 30 minutos mais tarde ou mais cedo.
80. No dia 30 de Março de 2019, B dirigiu requerimento ao processo no qual expressa, referindo-se ao A, “gostaria muito de passar as férias da Páscoa com ele em casa se for possível”.
81. Na sequência de tal requerimento, a EMAT, em 10 de Abril de 2019, emitiu parecer negativo à pretensão da progenitora, informando também que B não comparecera às consultas agendadas na USIF, de psiquiatria e psicologia.
82. Em face de tal parecer foi apenas autorizada a permanência de A junto da mãe fora do contexto do acolhimento residencial no domingo de Páscoa.
83. Em 4 de Abril de 2019 foi cessada a prestação de RSI, no valor de 189,66€, única fonte de rendimento auferida pela progenitora, porquanto B ainda não se inscrevera na AGQE da Horta.
84. Relativamente ao progenitor, na sequência da separação dos avós paternos de A, C passou a residir em habitação T1, na rua Symaria, n.º .., Madalena do Pico.
85. Marco pernoitava no sofá, na sala.
86. [Este número não existe na enunciação dos factos]
87. C e a sua mãe frequentavam ambos cursos profissionais da área de restauração, auferindo a quantia de € 230,00 mensais a título de bolsa de formação profissional.
88. Recorreram pontualmente a ajudas económicas da Acção Social do Pico.
89. Tendo decorrido cinco momentos de convívio com A entre 16 de Fevereiro de 2019 e 16 de Abril de 2019, C comparecera somente a dois, juntamente com a sua progenitora e avó de A, que foi quem mais interagiu com A no decurso das visitas.
90. Além do mais, e fora dos convívios, C não estabeleceu contactos telefónicos com o lar de infância e juventude, designadamente para se inteirar quanto ao bem-estar e rotinas de A.
91. Em Maio de 2019, B agendou consultas médicas de psicologia; compareceu regularmente às visitas a A, sendo evidente a ligação entre ambos; frequentou as sessões do programa VINCA, embora evidenciando alguma disfuncionalidade nos termos em que exerceu a parentalidade.
92. Com efeito, B revelou certa dificuldade de diferenciação de papéis equiparando-se ou, por excesso, reagindo contra a criança, elevando a voz e dizendo “tu és feio!... não gosto mais de ti!... se não comeres vou-me embora!... tens mesmo o focinho do teu pai!... ele é um pedófilo!...”.
93. Entre 15 de Maio e 14 de Junho de 2019 as técnicas da Direcção de Acção Social do Faial (DASF) tentaram inúmeras vezes o contacto telefónico com B, sem que esta atendesse ou devolvesse as chamadas.
94. Na sequência de denúncia por violência doméstica, B deixou a habitação que partilhava com E no dia 14 de Junho de 2019, expressando à DASF vontade de autonomização.
95. Para o efeito, solicitou apoio integral para pagamento de renda no valor de € 350,00, mas, verificando-se que tal era inviável, manifestou intenção de passar a residir transitoriamente com um tio na Freguesia de Castelo Branco.
96. Não obstante, no dia 16 de Junho de 2019, B  e E reconciliaram-se.
97. Posteriormente B apresentou queixa contra E, invocando que no dia 16 de Julho de 2019 E lhe apertou o pescoço e a pontapeou e, agarrando-a por uma das pernas, arrastou-a pelas escadas da residência até ao exterior, e que no dia 18 de Julho de 2019, E a esbofeteou e lhe cuspiu, e colocou todos os seus pertences e objectos pessoais na rua.
98. Pelas 22 horas do dia 18 de Julho de 2019, e na sequência de denúncia por violência doméstica no processo 262/19.0PBHRT, B Santos deu nova entrada na casa abrigo da UMAR do Faial.
99. No dia 22 de Julho de 2019 foi realizado o plano individual que prevê apoio psicológico e jurídico, assumindo B a permanência na Casa Abrigo como uma oportunidade para recuperar o seu filho.
100. Todavia, no dia 25 de Julho de 2019, após ausências prolongadas, que justificou com o facto de se encontrar a fazer limpezas em casa na freguesia de Castelo Branco, B deixou a Casa Abrigo, sem qualquer comunicação e sem atender os telefonemas que lhe foram dirigidos pelas técnicas da casa.
101. Neste período, B cumpriu com o plano de visitas semanais e com o plano de consultas médicas de A, sendo que no dia 26 de Julho e em datas posteriores se fez frequentemente acompanhar de E aquando da visita a A.
102. B e E casaram em 30 de Julho de 2019.
103. No que respeita à prestação de cuidados básicos de higiene e alimentação de A, B  possui os conhecimentos necessários.
104. Todavia, apresenta uma personalidade imatura, instabilidade emocional, distanciamento e fraca percepção da realidade e de responsabilidade, e observa défices para lidar com os comportamentos mais difíceis de A, nem sempre empregando tom de voz adequado e recorrendo a frases excessivamente punitivas para o mesmo.
105. No decurso do debate judicial, em que prestou declarações em duas sessões distintas, apresentou na primeira uma atitude colaborante e na segunda uma postura defensiva, apresentando justificações diferentes para os factos sobre os quais foi questionada.
106. Atribuiu ao requerido C falhas e defeitos, designadamente invocando ser o mesmo consumidor de estupefacientes e consumir na presença do menor.
107. No entanto, em termos de projecto de vida para o A e de regulação futura das responsabilidades parentais, expressou concordância em que o progenitor tivesse o menor consigo em períodos de férias.
108. Também o requerido C evidenciou uma postura defensiva quando ouvido no debate judicial, sendo evasivo ou invocando autojustificações para a sua instabilidade laboral e falta de adesão às obrigações decorrentes da atribuição de prestações sociais.
109. Mais expressou desagrado e censura pelo facto de o tribunal ter determinado o acolhimento residencial do A na sequência dos incidentes que ocorreram com o menor quando este estava à guarda da requerida B, sem considerar a sua posição e qualidade de pai.
110. Mais sublinhou a falta de competência da requerida como mãe.
111. Todavia, quando questionado sobre o projecto de vida a estabelecer para o menor e futura regulamentação das responsabilidades parentais, sugeriu um regime de guarda partilhada, em que o menor se mantinha a residir com a progenitora, numa perspectiva de equalização dos papéis parentais.
*
O Tribunal a quo deu como não provado o seguinte:
a) B o seja a mais nova de uma fratria de 5 irmãos;
b) Que os motivos de instauração de processo de promoção e protecção pela CPCJ de Madalena se tenham prendido com recusa da progenitora a amamentar A e a prestar-lhe os cuidados básicos;
c) Que após o programa escolar aludido em 30) se perspectivasse, a médio prazo, que B, tendo o 9.º ano completo, pudesse ingressar no exército para seguir carreira militar.
*
3.2. – APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO
O recorrente insurge-se contra a decisão que aplicou a medida de confiança do A à Casa de Infância de Santo António, com vista a adopção e determinou a inibição do exercício das responsabilidades parentais aos progenitores, considerando que o tribunal recorrido efectuou uma errada apreciação dos factos e que a prova produzida teria de conduzir a decisão diversa, tanto mais que a justificação principal invocada é a imaturidade dos progenitores e a existência de maus-tratos ao menor, que se desconhece se terão sido praticados pela mãe; mais sustenta que os autos não revelam que a família tenha falhado na prestação de cuidados necessários, comprometendo o são desenvolvimento da criança, pelo que o menor deve ficar à guarda da progenitora, conforme fixado no acordo de regulação das responsabilidades parentais.
Importa ter presente, como realçou o Ministério Público nas suas contra-alegações, que o recorrente não colocou em crise os factos provados e não provados, pelo que a factualidade a atender para ponderação da adequação da medida de promoção e protecção aplicada se encontra cristalizada.
O tribunal recorrido fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
“Volvendo à situação que nos ocupa nos presentes autos, e por confronto dos factos que resultaram apurados, afigura-se que o menor A se encontra em situação de perigo, por referência às indicadas previsões legais.
Com efeito, este menor encontra-se acolhido residencialmente, tendo essa medida de acolhimento residencial sido aplicada na sequência de assistência hospitalar, pela verificação de lesões físicas, com relevo especial para hematomas na face e inchaço inexplicável de ambas as mãos, com fundado indício, de acordo com a própria pediatra assistente, de origem em maus-tratos físicos infligidos por terceiro.
Essa assistência hospitalar foi despoletada pelas educadoras do jardim-de-infância que frequenta, com intervenção da assistência social, perante a constatação de tais lesões e a inconsistência e implausibilidade das justificações apresentadas pela progenitora.
Existiu, assim, uma situação de maus-tratos físicos que a requerida, independentemente de não ser a sua autora, não foi capaz de acautelar, revelando, com isso, negligência grave na garantia da segurança do filho e do seu bem-estar físico e psíquico.
Nessa mesma ocorrência foram patenteados sinais de negligência também a nível dos cuidados básicos prestados ao menor quanto à sua higiene e adequação de vestuário para a época do ano e condições climatéricas, apresentando-se o A com assaduras de fralda e com roupa suja e que não o protegia devidamente do frio.
Registou-se igualmente um acentuar da deficiente prestação dos cuidados ao menor a esse nível por parte da progenitora em período temporal anterior e próximo a tal ocorrência, bem como alguma falta de assiduidade no jardim-de-infância, demonstrativos de maior desleixo nos cuidados que lhe deveriam ser assegurados.
É igualmente de sublinhar que a requerida B tem registado ao longo do tempo permanente irregularidade nos cuidados e atenção que dispensa ao filho, tendo condições para os prestar de forma adequada e conseguindo fazê-lo em determinados momentos em que ela própria está pessoalmente mais estável (ainda que tendo carecido ou podendo carecer de algum acompanhamento ou intervenção exterior), mas descurando no cuidar do A e sobrepondo os seus interesses pessoais e os seus relacionamentos ao interesse do filho.
A instabilidade destes relacionamentos, quer com o progenitor do A, quer com o seu atual marido, as suas interrupções, justificadas pela própria com situações de violência doméstica de relativa gravidade no momento da rutura, mas pouco depois desvalorizadas, suscitam igualmente alarme, pela exposição do menor a situações de violência e pela sua sujeição a ambientes agressivos e inseguros, além de se traduzirem em constantes alterações de residência e de referências pessoais e afetivas para esta criança.
Por outro lado, a postura desta jovem mãe relativamente à intervenção e ajuda institucional é também condicionada pela sua inconstância emocional e pessoal, afigurando-se ser permeável ao que neste campo lhe é incutido pelos seus parceiros ou determinada pelos seus humores de momento.
Sublinhe-se, ainda, a sua posição quanto ao exercício das responsabilidades parentais, apontando falhas e incapacidades ao progenitor, imputando-lhe, designadamente, problemas de dependência e consumo de estupefacientes, mas não retirando daí consequências com vista à proteção do menor.
Há, assim, uma situação de perigo para o A resultante da falta de capacidade da progenitora na prestação, que se impõe constante, dos cuidados que lhe são devidos.
Neste ponto cumpre sublinhar como facto ilustrativo do perigo existente e do impacto negativo da instabilidade vivencial do A quando a cargo da requerida, o registado atraso de desenvolvimento do menor, recuperado após ter sido inserido em ambiente institucional. Na perspetiva deste tribunal, tal demonstra que o menor esteve de facto exposto a situações comprometedoras do seu bem-estar e desenvolvimento integral.
E, sendo inegável que existe marcada afetividade entre o A e a sua mãe, sendo esta uma figura de referência para aquele, tal relação afetiva não se pode considerar como a vinculação afetiva própria duma relação parental.
Esta exigiria por parte da progenitora o instinto de proteção do filho de agressão exterior, de não sujeição a ambientes nefastos e inseguros e a procura, se necessário, nessa perspetiva de proteção maternal, de apoio externo. Ora, o comportamento da B enquanto mãe tem sido o oposto – a desconsideração da necessidade de proteger e cuidar do filho devidamente e a constante alteração dos seus projetos de vida, ora aderindo ora recusando medidas de apoio, revelando total imaturidade e irresponsabilidade no desempenho dos seus deveres parentais.
Entende-se, pois, que há efetivo comprometimento da vinculação afetiva que deveria existir entre o menor A e a sua mãe, nos termos em que a lei a pressupõe e exige.
Por seu turno, a posição do requerido C é de absoluta imaturidade e incapacidade de interiorização do conteúdo funcional das suas responsabilidades parentais, assumindo as mesmas como um direito dos pais e não como um poder-dever na prossecução daqueles que são os direitos fundamentais e primordiais da própria criança.
Em concreto, importa sublinhar que o reduzido período de vivência do menor com este pai, logo após o nascimento, foi marcado pela falta de condições proporcionadas pelo progenitor e pelo seu agregado e, em particular, pela instabilidade e agressividade no relacionamento de C com a B, com registo de dois episódios de violência doméstica participados por esta e que justificaram o seu acolhimento e do A em casa abrigo.
O requerido não tinha, nem tem, uma situação profissional e pessoal estável, residindo com a sua mãe e mostrando-se ambos dependentes de prestações sociais para a sua própria subsistência e pouco empenhados em alterar tal situação, ainda que em prol do menor.
A sua postura perante a intervenção dos técnicos de apoio social foi sempre de recusa e de adversidade.
Verbalizando o seu entendimento que perante as falhas e situações criadas pela progenitora o tribunal deveria ter presente o facto de o A ter também um pai, facto é que não se propôs a assumir em pleno os cuidados do menor, não pugnando sequer para que lhe fosse conferida a guarda do filho, antes se demarcando da possibilidade de ser uma alternativa estável, propondo, ao invés, que o menor ficasse também ao cuidado da progenitora, com mero reforço dos períodos de vivência com o filho como forma de controle do seu bem-estar.
É, pois, ainda mais marcante a inexistência da vinculação afetiva própria da parentalidade relativamente a este progenitor.
O retorno do A ao seu agregado familiar biológico não se apresenta, então, como projeto de vida viável e adequado, inexistindo também outras opções de recurso na família alargada.
Pelo exposto, é de concluir que, sendo a medida proposta uma solução de última ratio, é, no caso presente, a que se impõe e que prossegue o efetivo interesse do menor, permitindo-lhe, enquanto sujeito autónomo de direitos, a concretização do seu interesse próprio, com a integração futura num ambiente familiar que lhe possa proporcionar a estabilidade das suas condições de vida e dos seus vínculos afetivos e a ausência de descontinuidades graves na prestação dos cuidados devidos e do seu acompanhamento educacional.”
Transcorrida a factualidade apurada e a fundamentação vertida na decisão recorrida há que concluir pela justeza e adequação do nela decidido, não se aferindo que outra medida de promoção e protecção deva ser aplicada em substituição da determinada pela 1ª instância, perante a manifesta ausência de competências parentais revelada pelos progenitores e familiares mais próximos da criança aqui em referência e a falta manifesta de empenhamento na sua aquisição.
Conforme resulta do disposto no art. 100º da LPCJP o processo de promoção dos direitos e protecção das crianças e jovens em perigo é um processo de jurisdição voluntária, que se rege, para além das suas normas específicas, pelo regime previsto nos art.ºs 986º a 988º do CPC.
Como é sabido, no âmbito destes processos o Tribunal, mais do que se orientar por critérios estritamente jurídicos, irá proferir um juízo de oportunidade ou conveniência sobre os interesses em causa.
A este propósito, J. Alberto dos Reis explicava:
“Um julgamento pode inspirar-se em duas orientações ou em dois critérios diferentes: critério de legalidade, critério de equidade. No primeiro caso o juiz tem de aplicar aos factos da causa o direito constituído; tem de julgar segundo as normas jurídicas que se ajustem à espécie respectiva, ainda que, em sua consciência, entenda que a verdadeira justiça exigiria outra solução.
No segundo caso o julgador não está vinculado à observância rigorosa do direito aplicável à espécie vertente; tem a liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa. É exactamente o que, para os processos de jurisdição voluntária, determina o art. 1449º.
Quer dizer, o juiz funciona como um árbitro, ao qual fosse conferido o poder de julgar ex aequo et bono […]” – cf. Processos Especiais, volume II – Reimpressão, 1982, pág. 400.
No domínio da jurisdição voluntária, os tribunais podem investigar livremente os factos que entendam necessários à decisão (artigo 986º, n.º 2 do CPC), recolher as informações e as provas que entendam pertinentes, rejeitando as demais (mesmo 986º, nº 2), decidir segundo critérios de conveniência e de oportunidade (artigo 987º), e, na generalidade dos casos, adaptar a solução definida à eventual evolução da situação de facto (artigo 988º, nº 1).
Por regra, os filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade (que ocorre aos 18 anos de idade) ou emancipação – cf. art.ºs 1877º, 122º a 124º, 130º e 132º do Código Civil.
A Constituição da República Portuguesa estabelece princípios jurídico-constitucionais que estruturam as directrizes normativas de protecção da família, da infância e da juventude, consagrando que os direitos fundamentais dos pais à educação e manutenção dos filhos só podem ser restringidos em situações especialmente previstas na lei e sempre em prol da defesa dos direitos fundamentais da criança e sempre sujeitos às exigências de proporcionalidade e da adequação (cf. artigos 36º, nºs 5 e 6, 7º, 69º e 70º).
Em concretização desse princípio constitucional, o art.º 1878.º, n.º 1 do Código Civil prescreve que compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens.
As regras sobre a atribuição das responsabilidades parentais são de ordem pública, ficando os pais automaticamente investidos na respectiva titularidade, independentemente da sua vontade e por mero efeito da filiação, não podendo a elas renunciar nem a qualquer dos direitos que especialmente lhes conferem, sem prejuízo do que legalmente se dispõe a propósito da adopção – cf. art.º 1882º do Código Civil.
As responsabilidades parentais são um meio de suprimento da incapacidade de exercício de direitos por parte da criança (cf. art.º 124º do Código Civil) e são preenchidas por um complexo conjunto de poderes e deveres funcionais atribuídos legalmente aos progenitores para a prossecução dos interesses pessoais e patrimoniais de que o filho menor não emancipado é titular. São assim configuradas com a estrutura de um poder-dever, em conformidade com o que dispõe o art. 36º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa[3] – cf. neste sentido, Estrela Chaby, Código Civil Anotado, coordenação de Ana Prata, Volume II, 2017, pág. 781.
Do “carácter funcional das responsabilidades parentais, resulta que o exercício dos direitos e deveres que o integram, não tendo a ver com a realização de interesses próprios dos progenitores, encontra-se particularmente vinculado à salvaguarda, promoção e realização do interesse da criança e que se traduz na realização das tarefas quotidianas do filho.” – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2-05-2017, relator Pedro Brigthon, processo n.º 897/12.1T2AMD-F.L1-1 disponível na Base de Dados Jurídico-documentais do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP em www.dgsi.pt[4].
A Convenção sobre os Direitos da Criança assinada em Nova Iorque a 26 de Janeiro de 1990, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 20/90, de 8-06 consagra o princípio de que ambos os pais têm uma responsabilidade comum na educação e no desenvolvimento da criança e de que constitui sua responsabilidade prioritária a educação e o bem-estar global da criança – cf. art.ºs 18º, n.º 1 e 27º, n.º 2 da Convenção.
Constitui compromisso dos Estados Partes nessa Convenção a adopção de todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à protecção da criança contra todas as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus-tratos ou exploração, incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada – cf. artigo 19º, n.º 1 da Convenção.
Simultaneamente, consagra-se na Convenção o direito à protecção e assistência do Estado às crianças que sejam temporária ou definitivamente privadas do seu ambiente familiar ou que nele não possam permanecer, atento o seu interesse superior, passando a protecção alternativa, designadamente, pela adopção.
O n.º 1 do art. 3º da LPCJP fixa os pressupostos de legitimidade da intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança em perigo, ou seja, a intervenção é limitada às situações de risco que ponham em perigo a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança ou do jovem.
A criança pode encontrar-se em situação de perigo induzida pelos pais, representante legal ou por quem tenha a sua guarda de facto, podendo ainda resultar de acção ou omissão de terceiros, em que aqueles não actuam para o afastar.
O perigo necessário enquanto pressuposto da legitimação da intervenção traduz-se numa situação de facto que ameace a segurança do menor sob as suas várias vertentes, afectando os seus direitos individuais, sociais e económicos e culturais, sendo que basta a criação de um real ou muito provável perigo, não sendo necessária a efectiva lesão da segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento – cf. Tomé D`Almeida Ramião, Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo Anotada e Comentada, 8ª Edição, pág. 31.
Tal como resulta do estatuído nos art.ºs 4º, e) e 111º da LPCJP, a situação de perigo tem de ser actual, ou seja, se tal situação deixar de se verificar o processo de promoção e protecção deve ser arquivado.
O n.º 2 do art. 3º da LPCJP enuncia algumas das situações em que se entendeu que a criança está em perigo e, por consequência, se torna legítima a intervenção, entre as quais, figura a não prestação de cuidados ou afeição adequados à idade e situação pessoal da criança, onde se integra a falta de higiene, alimentação desadequada, ausência ou deficiente investimento afectivo, falta de cuidados especiais de saúde, seja por negligência dos pais ou incapacidade de facto, por manifesta falta de recursos, de capacidade ou maturidade ou de saúde mental – cf. alínea c).
A intervenção e, nomeadamente, a que tem lugar no processo de promoção e protecção deve sujeitar-se aos princípios orientadores consagrados no art. 4º da LPCJP, que se baseiam no respeito pelos direitos da criança enquanto cidadão de pleno direito.
Entre esses princípios figura, desde logo, o interesse superior da criança e do jovem (cf. alínea a)), isto é, “a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto. O interesse superior da criança deve ser entendido como “o direito da criança ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.”” – cf. art. 4º, a) da LPCJP; Tomé d`Almeida Ramião, Regime Geral do Processo Tutelar Cível Anotado e Comentado, 3ª edição, pág. 23.
A Convenção sobre os Direitos da Criança impõe também que se atenda ao “superior interesse da criança” dispondo no seu art.º 3º, n.º 1: “Todas as decisões relativas a crianças, adoptadas por instituições públicas ou privadas de protecção social, por tribunais, autoridades administrativas, ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança.”
Enquanto conceito vago e genérico, o interesse da criança deverá ser um conceito a respeitar com discricionariedade e bom senso, de modo a salvaguardar o exercício efectivo dos direitos da criança.
Como bens e interesses prioritários da criança identificam-se a vida, a sobrevivência, a integridade física e psíquica e a liberdade; como bens ou interesses protegidos, a integridade moral, a identidade pessoal, a autonomia e o desenvolvimento da personalidade, a liberdade pessoal, e bem assim o interesse em serem educados pelos pais e a viver com eles (cf. art.ºs 25º, 26º, n.º 1, 27º, n.º 1 e 2 e 36º, n.ºs 5 e 6 da Constituição da República Portuguesa).
A intervenção rege-se também pelo princípio da proporcionalidade e actualidade (alínea e)), isto é, deve ser necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontra no momento da decisão, interferindo-se na sua vida e da sua família apenas na medida do estritamente necessário ao afastamento do perigo.
Tal significa que, como decorre quer do art. 36º, n.ºs 5 e 6 da Constituição, quer do art. 9º da Convenção sobre os Direitos da Criança, os pais têm o direito e o dever de educar e manter os filhos, deles não podendo ser separados, excepto quando não cumpram os seus deveres fundamentais para com aqueles e sempre mediante decisão judicial.
Releva também o princípio da prevalência da família, isto é, deve ser dada prevalência às medidas de promoção e protecção que integrem a criança em família, seja a biológica, seja uma família adoptiva ou outra forma de integração familiar, em detrimento do acolhimento residencial.
No entanto, “não sendo viável uma solução que privilegie a manutenção da criança ou jovem na sua família biológica e considerando que a resposta mais adequada e que melhor satisfaz os interesses e necessidades da criança ou do jovem, por ser a que mais se aproxima da sua família natural, deverá optar-se pela medida que promova a sua adoção” – cf. Tomé D`Almeida Ramião, Lei de Protecção…, pág. 42.
Assim, o que se pretende é a manutenção da criança no contexto familiar (natural ou substitutivo), tomando-se a família como elemento preponderante da sociedade e fundamental no processo de socialização e desenvolvimento dos menores.
Quando a criança ou o jovem integrem uma família disfuncional importa, antes de mais, tentar recuperar e apoiar esse ambiente familiar. Quando tal não seja possível, então haverá que encontrar uma família substitutiva para a criança, ao invés da sua institucionalização/lar residencial.
As medidas de promoção e protecção – tipificadas no art. 35º da LPCJP[5] - têm por objectivo afastar o perigo em que a criança ou jovem se encontram, proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral, e, tratando-se de crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso, garantir a sua recuperação física e psicológica - cf. art. 34º da LPCJP.
A medida de confiança a instituição com vista a futura adopção é aplicável quando se verifique alguma das situações previstas no art. 1978º do Código Civil, consistindo na colocação da criança ou jovem sob a guarda de instituição com vista a futura adopção – cf. art. 38º-A, b) da LPCJP.
A validade da aplicação desta medida depende de, em concreto, se verificar qualquer uma das situações previstas no art. 1978º do Código Civil, que regula a confiança judicial com vista a futura adopção.
De entre as situações elencadas no n.º 1 do art. 1978º do Código Civil releva, in casu, a prevista na alíneas d) (se os pais, por acção ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança).
Pressuposto comum a todas as situações enunciadas no aludido normativo legal e requisito autónomo que cumpre provar, é a não existência ou o sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação, tal com previsto no corpo do artigo, sendo que a comprovação há-de resultar da verificação objectiva de qualquer uma das situações referidas no n.º 1 do art. 1978º do Código Civil.
Considera-se, pois, que a verificação dessas situações não está associada a um comportamento censurável dos pais, ou seja, de culpa na actuação destes, podendo o perigo advir objectivamente da situação detectada, como a que decorre dos casos em que o progenitor padece de doença mental.
No caso da alínea d) supra mencionada, a situação de perigo grave para a segurança, saúde e formação do menor deve resultar de acção ou omissão dos pais, que de modo positivo ou negativo, censurável ou não, colocam o menor numa situação objectiva de perigo grave, no que se incluem as situações de toxicodependência ou alcoolismo.
O recorrente pugna pela revogação da medida de promoção e protecção aplicada ao menor considerando que, tal como se reconheceu na decisão recorrida, a sua necessidade só tem lugar quando a família falha na prestação dos cuidados necessários à criança, comprometendo o seu são desenvolvimento, o que, no caso, entende que não se verifica, até porque o tribunal recorrido apenas convocou a imaturidade dos progenitores para sustentar a sua decisão.
Na decisão recorrida considerou-se que o menor se encontra em situação de perigo, nos termos dos art.ºs 3º, n.ºs 1 e 2, b) e c) e 38º-A, n.º 1, d) da LPCJP, quer pela circunstância de o seu acolhimento em residência ter tido por origem a constatação de que apresentava lesões físicas (que a pediatra que o viu em ambiente hospitalar admitiu poderem ter como origem maus-tratos infligidos por terceiro), quer pela detectada negligência na prestação de cuidados básicos, quer ainda pela sujeição da criança a ambientes de instabilidade e violência, desde logo porque a própria mãe revela incapacidade para se comprometer com a adopção das condutas necessárias à melhoria das suas condições pessoais, sociais e económicas para poder assumir o filho e protegê-lo de agressões externas.
Os factos apurados permitem, com efeito, delinear uma concreta situação de risco que colocou a segurança, saúde, educação e desenvolvimento do A em perigo, sendo que este se basta com a criação de uma situação real ou muito provável de afectação da segurança do menor, sob as suas várias vertentes, sem que se torne necessário que ocorra uma efectiva lesão.
Atente-se, pois, na seguinte factualidade:
- Logo após o seu nascimento, a comissão de protecção instaura um processo de promoção e protecção em benefício do A atenta a circunstância de haver indicação de a mãe não amamentar, o que, porém, foi ultrapassado ainda no hospital;
- A criança foi viver com a mãe e o pai, na habitação do agregado familiar deste, onde se incluem os seus pais, avós do menor e que se apurou não ser ventilada, ter bolor nas paredes, permanecendo o bebé numa sala com cheiro a tabaco, sendo que o quarto onde dormia também não tinha ventilação, estava sujo e desorganizado;
- Dormia num parque que não tinha colocados lençóis e que era usado também para guardar a sua roupa;
- Ambos os progenitores estavam desempregados e o pai viu cancelado o Rendimento Social de Inserção por ter desistido da frequência da escola profissional, sendo os avós, com pensão e subsídio de desemprego, nos valores de € 311,74 e de € 379,02, respectivamente, quem provia às necessidades do agregado familiar;
- Em Novembro de 2017, cerca de quatro meses após o nascimento do menor, a mãe denunciou o progenitor por agressões, quando tinha o filho ao colo, pelo que foram ambos, mãe e filho, deslocados para uma casa de abrigo, na ilha Terceira;
- Nessa altura, por acordo celebrado entre os progenitores e a comissão de protecção, foi aplicada uma medida de promoção e protecção, de apoio junto da mãe;
- Não obstante isto, em Janeiro de 2018, a mãe saiu dessa casa de abrigo e retornou à casa de C, progenitor do menor, ainda que sem reatar a relação amorosa e retirou o consentimento para a intervenção da comissão de protecção;
- Logo em Maio de 2018, apresenta nova queixa por agressão do progenitor e no final desse mês ingressa na casa de abrigo da UMAR, no Faial, onde passou a residir com o A e onde recebeu apoio para a organização da sua vida e para se motivar a encontrar trabalho, tanto mais que em Setembro desse ano o menor ingressou na creche, na Casa de Santo António;
- Revelava-se então um bom relacionamento filio-parental, sendo que o menor ficava confortado junto da mãe e em 15 de Junho de 2018 foi obtido acordo de promoção e protecção em que foi aplicada a A a medida de apoio junto da mãe;
- Foi fixado um regime de visitas para o progenitor e avós que nas primeiras vezes correu bem, ainda que com a necessidade da presença da mãe, mas em Setembro de 2018 existiu uma altercação entre os progenitores, com alteração de voz por parte do pai que, a partir de então, deixou de realizar as visitas, o que apenas retomou após o acolhimento residencial do menor;
- Também nessa altura, em Setembro de 2018, a mãe revelava conhecimentos adequados para prestar cuidados básicos de higiene ao menor, mas, posteriormente, a partir de Setembro/Outubro de 2018, iniciou uma relação de namoro com E e passou a ir buscar o A à escola mais tarde e a pernoitar, por vezes, fora da casa de abrigo, surgindo então dificuldades no cumprimento das regras, manutenção da higiene do quarto, cumprimento dos horários e de realização das tarefas;
- Surgem também as suas fragilidades no cumprimento das obrigações parentais, com necessidade de intervenção hospitalar urgente relativamente ao A: 14 de Outubro de 2018: dermatite; 2 de Novembro de 2018: diarreia; 5 de Novembro de 2018: conjuntivite; 9 de Novembro de 2018: tosse; 11 de Novembro de 2018: pneumonia bacteriana;
- Faltou às sessões do programa VINCA e à escola profissional, de que veio a ser excluída por falta de assiduidade, empenho, motivação, e por comportamentos desadequados na sala de aulas;
- Em 3 de Dezembro de 2018 a Casa Abrigo deliberou expulsar B da Casa, com efeitos a partir de 7 de Dezembro, o que sucedeu porque a mãe não cuidava da higiene do menor, mantinha o espaço sujo e desarrumado, limitava a alimentação do menor a papas, sopas e leite materno e não tinha os cuidados com a saúde da criança, que padece de bronquite asmática;
- Em Dezembro de 2018 a mãe e o filho passaram a residir com E e com os pais deste, numa casa unifamiliar adequadamente mobilada, com boas condições de habitabilidade e higiene;
- E trabalhou entre 17 de Julho e 18 de Setembro de 2018 e em Fevereiro de 2019 era acompanhado no Centro de Aditologia do Hospital da Horta, onde realizava tratamento de substituição de heroína, fazia acompanhamento em psiquiatria e tomava antidepressivos, tratamento que ainda mantém;
- O A continuou a frequentar a creche e a mãe era presente e preocupada e levava-o às consultas de saúde infantil, mas ainda nesse mês de Dezembro, a educadora do menor sinaliza alterações na mão esquerda deste, que é encaminhado para a urgência do Hospital da Horta;
- No dia 3 de Janeiro de 2019, A compareceu na creche com estado de higiene deficitário, com odor no vestuário, eritema na zona da fralda, vestuário desadequado para a estação, sem meias e trajando uma blusa de manga comprida pouco quente, denotando falta de cuidado, o que vinha acontecendo desde finais de Dezembro;
- Conduzido ao hospital constatou-se: exposição de equimose na região malar direita; edema duro em ambas as mãos, com descamação da polpa dos dedos e fissuras da face palmar das falanges, algumas com crosta, nas zonas das articulações interfalângicas; ferida incisa em fase de crosta, linear, na face posterior do pavilhão auricular direito, com cerca de 4 cm de dimensão; equimose da região malar direita com edema, ocupando toda a hemiface direita; equimose subaxilar direita (hemotórax direito); presença de sangue seco na narina direita.
- Confrontada pela pediatra relativamente ao estado de saúde de A e à origem das lesões, a progenitora mostrou-se defensiva e ofereceu explicações diversas: atribuiu o edema das mãos ao facto de A recorrentemente entalar as mãos no sofá; a equimose e edema da face a queda por cima de brinquedos, na véspera do internamento; e a ferida na face posterior do pavilhão auricular direito, ao contacto da pele atópica com o champô para piolhos;
- Em 9 de Janeiro de 2019, foi aplicada medida cautelar de acolhimento em Lar de Infância e Juventude, a saber, a Casa de Santo António, onde A se encontra a residir desde então;
- Na sequência da separação da progenitora, o processo adaptativo de A ao contexto residencial revelou-se inicialmente difícil e pesaroso, e A, nas duas primeiras semanas, apresentou semblante triste, chorou frequentemente sem causa aparente e chamou recorrentemente pela mãe, sendo que só a presença da mãe teve efeito apaziguador e satisfatório;
- Em 11 de Fevereiro de 2019, foi alcançado acordo de promoção e protecção, aplicando-se a A a medida de acolhimento residencial pelo período de 3 meses, comprometendo-se os progenitores, concreta e designadamente, nos termos do acordo, genericamente, a mãe, a integrar curso para aquisição de competências mínimas, comparecer em consulta de psiquiatria/psicologia no hospital da Horta, comparecer às visitas ao filho, cumprir as sessões do projecto VINCA, e o pai, a comparecer às visitas, comparecer ao curso de restauração e colaborar com as técnicas da EMAT;
- A mãe faltou a 12 das 28 visitas agendadas para o mês de Fevereiro de 2019 e em Março passou as visitas para dias intercalados, em cinco das quais não permaneceu os 60 minutos previstos;
- Em 4 de Abril de 2019 foi cessada a prestação de RSI, no valor de 189,66€, única fonte de rendimento auferida pela progenitora, porquanto B ainda não se inscrevera na AGQE da Horta;
- O pai compareceu a apenas dois convívios, entre Fevereiro e Abril de 2019;
- A mãe revelou certa dificuldade de diferenciação de papéis equiparando-se ou, por excesso, reagindo contra a criança, elevando a voz e dizendo “tu és feio!... não gosto mais de ti!... se não comeres vou-me embora!... tens mesmo o focinho do teu pai!... ele é um pedófilo!...”;
- Apresentou denúncia por violência doméstica contra E, em Junho de 2019, reconciliou-se com este, e em Julho apresentou nova queixa, dando entrada na casa de abrigo da UMAR, no Faial, sendo realizado o plano individual que prevê apoio psicológico e jurídico, assumindo B a permanência na Casa Abrigo como uma oportunidade para recuperar o seu filho;
- Mas, entretanto, após ausências, no dia 25 de Julho de 2019, a progenitora deixou a Casa Abrigo, sem qualquer comunicação e sem atender os telefonemas que lhe foram dirigidos pelas técnicas da casa, comparecendo às visitas ao menor na companhia de E, com quem casou em 30 de Julho de 2019;
- A mãe revela uma personalidade imatura, instabilidade emocional, distanciamento e fraca percepção da realidade e de responsabilidade, e observa défices para lidar com os comportamentos mais difíceis de A, nem sempre empregando tom de voz adequado e recorrendo a frases excessivamente punitivas para este;
- O pai, B foi evasivo e invocou autojustificações para a sua instabilidade laboral e falta de adesão às obrigações decorrentes da atribuição de prestações sociais; revelou desagrado pelo acolhimento residencial do filho, mas não pretendeu assumir essa responsabilidade.
O circunstancialismo descrito revela, com toda a evidência, a falta de estruturação familiar adequada e cabal por parte dos progenitores para assegurar as necessidades materiais, afectivas e de formação do menor, sequer para garantir um aconchego mínimo para um recém-nascido que, regressado do hospital, é colocado a dormir num parque, sem lençóis, no que isso revela de falta de conforto, para além de ali ser mantida a sua roupa, que ninguém foi capaz de acondicionar num outro local.
Dizer-se, como pretende o recorrente, que a família, os pais, não falharam nos seus deveres de assegurar as condições básicas ao menor e que o desenvolvimento deste nunca esteve em perigo é uma conclusão que não encontra qualquer arrimo na factualidade apurada.
Atente-se nos seguintes dados objectivos:
- O A tem dois anos e meio e neste curto período da sua existência não teve qualquer estabilidade familiar, habitacional, educacional e emocional, sendo certo que apenas encontrou um local seguro e estável para residir a partir do momento em que foi aplicada a medida de acolhimento residencial;
- No primeiro ano de vida, o A conheceu quatro locais diferentes como sendo a sua habitação: primeiro no agregado familiar do pai, onde não tinha condições básicas de higiene, nem eram garantidas condições ambientais seguras para a sua saúde; depois na casa abrigo, na ilha Terceira; depois novo retorno à casa do progenitor; seguido de ingresso em casa de abrigo, no Faial; passados uns meses, saída desta para passar a residir com a mãe na casa do namorado desta;
- Nenhum dos progenitores apresenta condições económicas seja para se sustentar a si próprio, seja para sustentar o menor; ao longo destes dois anos e meio não lhes foi conhecida qualquer actividade remunerada com consistência; viveram do apoio dos avós do menor, depois dos pais do namorado da mãe, do rendimento social de inserção e do abono de família;
- O menor foi exposto a ambientes de violência, física e verbal, quiçá a comportamentos aditivos (estando demonstrado que o actual marido da mãe, E , beneficia ainda de tratamento de substituição de heroína, acompanhamento em psiquiatria e toma de antidepressivos), tendo a mãe sido agredida pelos companheiros, no caso do progenitor, quando o filho estava ao seu colo; além disso, o discurso da mãe com o filho é revelador da desadequação de linguagem e, até de comportamento, tal como se retira do facto descrito no ponto 92.;
- O A tem sido alvo de negligência nos cuidados que lhe são devidos: negligência na higiene que lhe é dispensada, no vestuário que lhe é aplicado, na alimentação, que a mãe manteve restringida a papas, sopas e leite materno, sem introdução de alimentos sólidos quando tal já se revelava necessário e, sobremaneira, na saúde, originando idas às urgências do Hospital da Horta, que, podendo tratar-se de doenças insusceptíveis de controlo por parte dos pais, não deixam, neste caso, de revelar desatenção e falta de cuidado da mãe, designadamente no que concerne a dermatite e conjuntivite (cf. ponto 49.);
- O A apresentava, em Janeiro de 2019, depois de no final de Dezembro de 2018 ter sido também atendido na urgência por apresentar alterações na mão esquerda (segundo a mãe, por ter entalado a mão no sofá), equimose na região malar direita, edema duro das mãos, com descamação da polpa dos dedos e fissuras na face palmar das falanges, ferida no pavilhão auricular direito, equimose da região malar direita com edema, equimose subaxilar direita e sangue seco na narina direita; esta condição física, ainda que não comprovadamente imputável a uma acção de terceiros, não deixa de revelar a falta de cuidados no tratamento da problemática identificada nas mãos e as justificações diversas apresentadas pela mãe para a sua verificação revelam uma preocupação superior com a origem das lesões mais do que com a alegação e demonstração dos cuidados que empreendeu para as tratar;
- Esta criança beneficiou já de diversas medidas de promoção e protecção, sendo que desde o início se apostou no apoio à mãe, na sua formação pessoal e na criação de competências parentais, mas cujo cumprimento por parte desta foi sempre errático, variando em função da sua própria instabilidade e humores de ocasião e, sobremaneira, apurando-se o desregramento quando inicia um novo relacionamento, que passa a priorizar; a mãe retirou o consentimento à intervenção da comissão de protecção; posteriormente, existiu novo acordo para a medida de apoio à mãe; após ter ingressado na casa de abrigo cumpriu inicialmente as regras, mas escassos meses depois abandonou-as; os progenitores, após a aplicação da medida cautelar de acolhimento residencial, acabam por acordar na aplicação dessa mesma medida, por três meses, mediante o cumprimento de obrigações que nenhum deles respeitou integralmente, levando à apresentação da proposta para aplicação da medida de confiança judicial a instituição, com vista a futura adopção.
Contrariamente ao sustentado pelo recorrente, e tal como se concluiu na decisão recorrida, evidencia-se uma situação de perigo para a segurança, saúde, bem-estar, formação e desenvolvimento do A, o que é tanto mais premente se se atentar nas lesões físicas e danos na saúde deste que nenhum dos progenitores, sobremaneira a mãe, foi capaz de evitar ou, pelo menos, menorizar, mediante a prestação de cuidados atempados e adequados, para além da evidente incapacidade para colocarem os interesses da criança em primeiro lugar, prestando-lhe a assistência necessária, estando em causa uma criança de tenra idade, totalmente dependente de terceiros para a sua sobrevivência.
Antes de se avançar, retome-se os pressupostos da aplicação da medida de confiança judicial a instituição, com vista a futura adopção, seja quanto ao requisito autónomo previsto no corpo do art. 1978º, n.º 1 do Código Civil – “quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação” - seja quanto à verificação objectiva de uma das situações elencadas nas suas diversas alíneas, designadamente na alínea d), ou seja, a colocação em perigo grave da segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança, a propósito do que se pronunciou o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-03-2019, desta secção, relator José Capacete, processo n.º 1/16.7T1VFC.L1-7, onde se discorreu de modo amplamente esclarecedor:
“[…] para a avaliação do tipo de ações e omissões causadores do perigo grave, é mister compreender que o incumprimento, ou o deficiente cumprimento, do exercício das responsabilidades parentais resulta, vastas vezes, não de atos conscientes e voluntários dos pais mas por motivos atinentes a mera incapacidade, a falta de empenho, à simples inexperiência, a determinados parâmetros culturais, a doença, a desvios comportamentos ou, ainda, em razão da dependência de determinadas substâncias, como estupefacientes ou álcool.
[…] a verificação das condições previstas em qualquer uma das alíneas do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil se deve operar na ótica da primordial consideração dos direitos e interesses da criança, o que, de resto, resulta do n.º 2 daquele artigo 1978.º.
Tal significa que o julgador deve atender mais à situação concreta da criança, ao perigo em que a mesma se encontra e as respetivas causas, do que aos fatores concretos que permitiram a imputação subjetiva, através do conceito de culpa, dos comportamentos dos pais.
Em abono desta posição pode chamar-se à colação o disposto no artigo 1915.º do Código Civil onde se prevê como fundamento da inibição do exercício das responsabilidades parentais, ao lado da infração culposa dos deveres para com os filhos, a falta de condições para cumprir tais deveres por inexperiência, enfermidade, ausência, ou outras razões.
Ou seja, além das situações de violação culposa daqueles deveres que os pais têm para com os filhos, a lei permite que os progenitores sejam inibidos do exercício das responsabilidades parentais em determinados quadros factuais para as quais em nada contribuíram de modo voluntário e consciente: vejam-se os casos de doença e de inexperiência.
O fundamento que subjaz a tal previsão normativa é, obviamente, a necessidade de proteção do pólo mais débil da relação pais-filhos, sendo o interesse destes prevalecente face ao eventual interesse dos progenitores em manter tal relação. […]
A família é hoje um espaço de igualdade em que os respetivos membros, enquanto sujeitos de direitos, não se inter-relacionam já num estrito plano hierárquico, outrossim num plano mais afetivo e emocional.
Daí que o exercício responsável da parentalidade implique uma vivência altruísta dos pais no sentido de fazerem prevalecer os interesses dos filhos sobre os seus próprios interesses, de colocarem as tarefas de cuidado e de acompanhamento das crianças à frente das suas necessidades, das suas preferências e das suas prioridades.
A par disso, esse exercício implica disponibilidade (de tempo, mas também emocional), capacidade de comunicar, afetividade, serenidade, bem como adoção de comportamentos equilibrados e sensatos, mas também normativos (no sentido de respeito pelas normas sociais e pelas leis) que possam servir de arquétipo e de bom exemplo para os filhos. […]
Efetivamente, é sobejamente sabido que o normal desenvolvimento da criança se processa sob a forma de identificação aos modelos parentais com quem é suposto ter relações objectais privilegiadas nos primeiros anos de vida. […]
É do senso comum que não há modelos ideais de boas mães ou de bons pais. As mães e os pais, de resto, são todos diferentes, mas todos imprescindíveis, desde que capazes, competentes e disponíveis.
Como é evidente, a capacidade biológica de gerar e dar à luz um filho nada diz quanto à efetiva capacidade de o educar, de o amar, de o proteger e de o fazer uma criança feliz e um adulto responsável, equilibrado e com ferramentas para enfrentar a vida.
A capacidade de ser mãe no sentido ora exposto e as respetivas competências têm de ser avaliadas, obviamente, de acordo com a história pessoal da mãe, com a sua personalidade, com o modo como se relaciona com o filho e também com a sua ligação ao pai da criança e até aos seus próprios progenitores.
No entanto, nessa avaliação, não se poderá perder de vista o meio sociocultural em que a mãe está inserida pois que, como alerta João Seabra Diniz é natural que as deficiências de uma capacidade materna sejam encobertas e compensadas num meio favorável e se tornem dramaticamente evidentes em condições externas muito negativas. No entanto, também há mães nas condições económicas mais deploráveis que nunca hesitam na sua consciente atitude materna em relação ao filho.
Do expendido e para além de qualquer dúvida razoável, decorre que a mera incapacidade de exercício responsável dos deveres de cuidado parentais pode fundamentar uma confiança judicial com vista a futura adoção posto que tal incapacidade coloque a criança em perigo, como, de resto, as mais das vezes acontecerá de modo claro.
Esse perigo […] não deriva apenas de eventuais lesões físicas podendo ter também a sua génese na falta de cuidados, na falta de afeto, na incapacidade de os progenitores interagirem com os seus filhos, na incapacidade de compreenderem e sentirem as necessidades dos filhos.
É que a experiência que a criança tem dos seus pais – adotivos ou não – é a dos cuidados e afeto. É a partir do desempenho da função parental que se organiza a relação.
[…] o tónico fulcral da previsão legal desta alínea d). do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil consiste na demonstração factual da existência de um perigo grave para a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança causado pelos respetivos progenitores, ainda que por mera falta de qualidade funcional.
A definição do que seja esse perigo grave remete-nos para o elenco vertido nas alíneas do n.º 2 do artigo 3.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo. […]
No âmbito desta alínea d) do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil cabem, como é bom de ver, os casos de maus-tratos a crianças e jovens, qualquer que seja a sua modalidade e categoria: o mau-trato físico, a negligência, o abuso sexual, o mau-trato psicológico, a síndroma de Munchausen por procuração. […]
A negligência consiste na incapacidade de proporcionar à criança a satisfação das suas necessidades de cuidados básicos de higiene, alimentação, afeto e saúde, indispensáveis ao seu crescimento e desenvolvimento normais. Pode ser exercida de forma ativa, com a intenção de causar dano à criança ou de forma passiva, geralmente resultante de incompetência dos pais em assegurar aqueles cuidados.
A negligência é uma forma muito frequente de maus-tratos, insidiosa e de graves repercussões para a criança, nomeadamente, o risco de morte, acidentes, atraso de crescimento e de desenvolvimento e alterações de comportamento.
Nem sempre é fácil identificar situações de negligência. É através dos relatórios das Equipas Multidisciplinares de Apoio aos Tribunais da Segurança Social que o julgador melhor se poderá aperceber que está perante pais negligentes, sem prejuízo, obviamente, dos elementos recolhidos em consequência de outros meios de prova, nomeadamente, testemunhais. (...)
(...) o julgador deverá ter em atenção, na identificação dos progenitores maltratantes, os seguintes factores de risco: antecedentes de maus-tratos na própria infância; idade inferior a vinte anos; características de personalidade imatura e impulsiva; maior vulnerabilidade ao stresse; fraca tolerância às frustrações; atraso mental; mudanças frequentes de companheiros e de residência; antecedentes de criminalidade; hábitos de alcoolismo e toxicodependência.
No entanto, como é de linear clareza, só os casos mais graves e mais ostensivos justificarão que o tribunal decrete a medida de confiança com vista a futura adoção, posto que se mostrem – e nunca é demais lembrá-lo – irremediavelmente comprometidos os vínculos próprios da filiação.”
A descrição daquela que tem sido a vivência desta criança desde que nasceu é reveladora da conduta errante e volúvel da família biológica e, em concreto, da mãe, sendo clamorosa a incapacidade desta para cumprir as funções parentais.
Sendo evidente a sua imaturidade (aferível, aliás, pela rapidez com que muda as suas opções de vida) quer pela própria idade, quer, certamente, pelas falhas que terão existido na sua própria formação (determinadas seguramente pela orfandade que cedo a atingiu – cf. ponto 2.), seguro é que, ao contrário do afirmado pelo recorrente, não foi esse o factor determinante da decisão proferida em 1ª instância, mas sim, como bem realça o Ministério Público, a incapacidade de ambos os progenitores para assegurar os cuidados e afeição necessários a uma criança de tenra idade, como é o caso do A.
Atente-se na óbvia fragilidade emocional da mãe, que transita de um relacionamento para outro, em escassos meses, ingressando em agregados familiares que não são os seus, sujeitando-se à dependência de terceiros que, por sua vez, não possuem, eles próprios, quaisquer condições de se sustentarem e menos ainda a um outro elemento, com uma criança.
Realce-se também a agressividade física e verbal coexistente em ambos os companheiros, concretizada em eventos reais de violência que apesar da sua recente ocorrência, não são suficientemente alarmantes para que a progenitora recentre as suas prioridades e se focalize nas suas necessidades e nas do filho, cumprindo as obrigações que lhe permitiriam o acesso a uma residência adequada para si e para o menor, com ajudas alimentares e, bem assim, com um acompanhamento na melhoria das suas competências básicas e parentais.
Foram concedidas diversas oportunidades para a mãe cumprir a formação escolar em que havia ingressado e, não obstante, não cuidou de manter um comportamento adequado, comparecer às aulas e cumprir o plano programado, vindo a ser excluída do curso, o que impediu a aquisição de uma valência que lhe permitiria mais facilmente alcançar um posto de trabalho (aliás, a progenitora não foi admitida numa empresa de limpeza que presta serviços no aeroporto da Horta, porque não completou o inquérito relativo às suas actividades profissionais anteriores, tendo a responsável da empregadora percebido a sua dificuldade para se recordar de datas e moradas e, bem assim, ao nível da escrita, sendo esta uma condição fundamental para os registos das limpezas que se fazem nos avisões – cf. relatório junto em 17-01-2020 – Ref. Elect. 3492193).
Tal como se registou na decisão recorrida, a instabilidade que perpassa na vida da progenitora, quer pelas suas escolhas, quer pelo seu envolvimento em situações de violência, agressividade, maus-tratos e pela ausência de investimento sério na mudança do seu comportamento, com empenho em alcançar uma formação básica que lhe permita almejar a algo mais, repercute-se de modo claro nos cuidados que dispensa ao filho, pois que se inicialmente se detectam (ao menos no período subsequente ao ingresso na casa de abrigo, no Faial) uma vontade e capacidade de seguir as orientações das técnicas e competências suficientes para prestar cuidados de higiene e alimentação ao menor, rapidamente essa conduta se altera, assim que perspectiva a possibilidade de um novo relacionamento, levando-a a abandonar a casa e a passar a residir com o filho no agregado familiar do novo namorado, sujeitando a criança, novamente, a ambientes de violência, suspeitando-se do infligir de maus-tratos face a lesões objectivamente detectadas no menor e que podem ter sido causadas por terceiros.
É certo que os factos indicam a existência de uma relação afectiva entre a progenitora e a criança, estando aquela atenta às necessidades desta, transmitindo-lhe carinho e afecto, com conhecimentos adequados para a prestação de cuidados básicos de higiene, alimentação e segurança, o que foi aferido no período em que permaneceu na casa de abrigo, no Faial, mas esses dados são obnubilados pelo evoluir da situação, pelas mudanças na vida da progenitora e pelas suas próprias opções.
Se se revela uma mãe atenta e preocupada, permite, simultaneamente, que a criança frequente a creche com o vestuário sujo e desadequado para a estação, com eritema na zona da fralda e lesões nas mãos e na face, que carecem de intervenção hospitalar.
Além disso, foi a própria progenitora que, após a aplicação da medida cautelar de acolhimento residencial, em Janeiro de 2019, reconheceu que não tinha condições, no momento, para receber o menor em sua casa, carecendo ela própria de apoio psicológico – que solicitou - atenta a sua fragilidade emocional (cf. relatório social de 5 de Fevereiro de 2019 - Ref. Elect. 3009829), o que veio a conduzir ao estabelecimento de um acordo quanto à aplicação de medida de acolhimento residencial pelo prazo de três meses, mediante o cumprimento pelos progenitores de diversas obrigações.
No entanto, se foi a própria progenitora que reconheceu a sua debilidade para assegurar ao menor os cuidados necessários, parecendo estar decidida a modificar o seu comportamento e a aderir ao curso de aquisição de competências mínimas, bem como comparecer a consulta de psicologia, visitar o filho e cumprir as sessões no âmbito do projecto VINCA, aplicadas em acolhimento residencial, foi ainda ela quem, transcorridos poucos meses, se alheou do cumprimento de tais obrigações, designadamente, no que diz respeito às visitas ao menor, tendo em Fevereiro cumprido apenas cerca de metade das agendadas e em Março, reduzido, em algumas delas, o período de duração.
Ainda que exista uma ligação entre a mãe e o menor e este se sinta reconfortado na sua presença, certo é que após a separação e o seu ingresso na casa de acolhimento residencial, ultrapassado um período inicial conturbado, o menor foi-se adaptando a essa sua nova realidade e ainda que as visitas da mãe tenham sido inicialmente gratificantes, veio a revelar mais tarde alguma revolta perante a mãe, rejeitando-a, designadamente, quando esta pretendia dar-lhe a alimentação, o que revela a insegurança do menor perante a figura materna (cf. registos atinentes ao Projecto para o Desenvolvimento da Vinculação Afectiva (VINCA), data de 31 de Maio de 2019, junto no decurso da audiência de julgamento, em 9-12-2019 – Ref. Elect. 49057145).
E se a mãe parece querer reunir condições para acolher o filho e assegurar a manutenção dessa ligação maternal e de afecto, tanto se apresta a assumir obrigações nesse sentido, como rapidamente as rejeita ou incumpre, desinvestindo na melhoria das suas condições.
Para além de repetir quadros comportamentais de agressividade e instabilidade no seu próprio percurso emocional, não se revela capaz de extrair as consequências que deles advêm, seja para si, seja, principalmente, para o seu filho, e não se coíbe de fazer opções que manifestamente prejudicam o bem-estar deste, desvalorizando a relevância dessas situações, de tal modo que a sua relação com o actual marido conduziu-a de novo ao ingresso em casa de abrigo, de que a breve trecho se ausentou, ignorando os telefonemas das técnicas, revelando desse modo que a sua prioridade não é, claramente, reunir condições estáveis para receber o filho em sua casa.
Na verdade, todo o seu comportamento é uma teia de instabilidade emocional, irresponsabilidade, fraco ou nenhum empenhamento na aquisição de competências para o trabalho, revelando ainda défice para lidar com os comportamentos da criança, não tendo recursos para o acalmar ou para evitar frases punitivas e manifestamente desadequadas na relação filial.
Não se vislumbra, assim, de que modo pretende o recorrente sustentar que os cuidados básicos necessários nunca faltaram ao seu filho e menos ainda como pode propugnar pela confiança do menor à guarda da mãe, que, até ao momento, decorridas todas as oportunidades que lhe foram concedidas, as desaproveitou a todas, sendo incapaz de melhorar a situação pessoal e social que apresentava, seja à data do nascimento do A, seja à data em que este foi colocado em acolhimento residencial.
Sendo este o conspecto factual, seguro é concluir que os autos revelam:
- a colocação do menor, por acção e omissão, em perigo grave para a sua segurança, saúde (física e mental), formação, educação e desenvolvimento;
- o insucesso das medidas de apoio encetadas;
- a permanente inconstância da mãe,
o que, em conjunto, inviabiliza qualquer juízo de prognose favorável, no sentido de que tal situação se venha a alterar, não sendo expectável que no tempo útil da criança, os progenitores, designadamente a mãe (posto que o pai se revela um progenitor ausente da sua vida, incapaz até de cumprir com o plano de visitas), alterem as características de personalidade que ao longo destes dois anos não conseguiram modificar apesar das intervenções de que beneficBm.
E se isto é assim, seguro é também que se mostram seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação, que enquanto conceito jurídico deve ser densificado quer pela psicologia, quer pelos princípios jurídicos aplicáveis, ou seja, ponderando que os pais não podem ser separados dos filhos senão quando não cumpram os deveres fundamentais para com eles e considerando que esses deveres são os inerentes ao exercício empenhado das responsabilidades parentais, de tal modo que o comprometimento da vinculação filial será aferido em função do modo como são cumpridos os deveres parentais e do envolvimento emocional e relacionamento afectivo entre pais e filhos.
Os factos acima elencados permitem dilucidar o modo como a progenitora se relaciona com o menor, a sua capacidade (ou falta dela) para comunicar com a criança, para a compreender, para atender às suas necessidades ou para erigir a sua protecção como bem essencial orientador das suas opções de vida.
A ligação afectiva que a requerida B estabeleceu com o filho surge aqui como algo inato, natural ou inerente à própria maternidade em si, algo que emana espontaneamente mas que não logrou frutificar no sentido de levar a progenitora a investir nesse vínculo de afectividade, pois que educar, amar e cuidar é muito mais do que dar colo. Esse amparo afectivo é extremamente positivo mas não chega e o vínculo filial depende da segurança, da estabilidade emocional, da satisfação das necessidades que os progenitores estejam em condições e queiram propiciar aos filhos.
A mãe do menor não quis ou não foi capaz de priorizar as necessidades físicas, sociais, cognitivas e afectivas da criança, de com ela comunicar, de a compreender e com ela estabelecer empatia, nem se comporta em termos de servir de exemplo socialmente adequado ou sequer competente para lidar com o stress, a agressividade e a frustração do menor, apesar de todas as ajudas de que beneficiou.
O incumprimento dos deveres inerentes ao exercício capaz das responsabilidades atinge, neste caso, um grau intolerável e um ponto de irreversibilidade que impõe que se conclua, tal como fez a 1ª instância, pelo comprometimento sério dos vínculos próprios da filiação.
E esta conclusão não pode, como é natural, ser arredada pela argumentação vertida pela progenitora nas suas alegações, ou seja, de que, afinal, estariam reunidas as condições para receber o menor na sua habitação, porque a sua sogra, a cunhada, o actual marido terão afirmado estarem disponíveis para receber o menor e lhe dar todo o apoio (facto que não figura entre os apurados nos autos), sequer pelo facto de a habitação onde reside com o marido ser adequada (cf. ponto 57.), pois que não são as condições económicas e habitacionais os dados relevantes da questão, mas sim a falta de predisposição da progenitora para assegurar a prestação de todos os cuidados que o A requer e que até ao momento não foi capaz de dispensar, apesar de ter beneficiado – ou ter podido beneficiar – do apoio psicopedagógico, social e ajuda económica, que ora reclama e a que teve acesso e de que pelas suas próprias opções prescindiu.
Não basta amar. É necessário cuidar, acolher, preocupar-se, investir, sobretudo investir o seu tempo, a sua atenção, o seu desvelo, não deixando recair sobre terceiros responsabilidades que são suas.
Uma mãe dedicada e protectora há muito teria dado um rumo ao seu percurso de vida, teria investido muito mais para adquirir competências de trabalho, e, mais do que isso, teria estado presente e teria, ela própria, assegurado que os problemas de saúde que afectaram o A tivessem sido rapidamente atendidos.
E se esta conclusão de comprometimento do vínculo afectivo se impõe relativamente à progenitora, igualmente se detecta em relação ao pai, ora recorrente, que, insurgindo-se contra a medida aplicada, não se perfila, a ele próprio, como alternativa securizante e credível para o menor.
Atente-se que o apelante nem sequer aduz a existência de laços afectivos entre si e o filho, assim como não foi capaz de indicar, em concreto, de que modo, perante a revogação da medida aplicada, seria assegurada a sobrevivência, a segurança, a habitação, a saúde, a formação do A, face à manifesta ausência de condições económicas, sejam suas (que nunca pagou a prestação acordada em sede de regulação de responsabilidades parentais), sejam as da progenitora.
E o apelante, que se demite de integrar o projecto de vida do filho ou pelo menos de aventar essa possibilidade, propondo pelo menos a sua colaboração para o efeito, não se prefigura, na verdade, como alternativa viável para tanto.
Com efeito, tenha-se presente os seguintes dados:
- À data do nascimento do A, ambos os progenitores estavam desempregados e o pai, C , viu cancelado o rendimento social de inserção porque desistiu da frequência da escola profissional;
- O agregado familiar subsistia com os rendimentos dos avós (pensão e subsídio de desempregado que, no total, não atingiu € 700,00;
- Em Novembro de 2017, o progenitor agrediu a mãe, quando esta tinha o menor ao colo, dizendo-lhe: “Não prestas para nada!”, “filha de uma grandessíssima puta!” e “não cuidas do teu filho”;
- Em Maio de 2018, após a mãe ter regressado ao agregado familiar do progenitor, este torna a agredi-la;
- O pai reconheceu que ocorreram momentos em que a família não foi capaz de suprir as necessidades básicas do filho, como alimentação e habitação;
- Manteve o plano de visitas enquanto o menor residia com a mãe na casa de abrigo, no Faial, até que em Setembro de 2018 desentendeu-se com a mãe e deixou de diligenciar pelas visitas ao filho, que apenas retomou após o acolhimento residencial deste, o que sucedeu em Janeiro de 2019;
- Os avós paternos do menor separaram-se e o progenitor passou a viver numa habitação T1, onde pernoitava no sofá, na sala;
- O progenitor frequentava um curso profissional da área de restauração, auferindo € 230,00 mensais, assim como o fazia a avó, tendo ambos recorrido pontualmente a ajudas económicas da acção social do Pico;
- Entre Fevereiro e Abril de 2019 decorreram cinco momentos de convívio entre o menor e o pai e a avó, tendo progenitor comparecido apenas a dois, sendo a avó quem mais interagiu com o A;
- O progenitor não estabeleceu contactos telefónicos com o lar de infância e juventude, designadamente, para se inteirar quanto ao bem-estar e rotinas do A;
- O progenitor invoca autojustificações para a sua instabilidade laboral e falta de adesão às obrigações decorrentes da atribuição de prestações sociais;
- O próprio reconhece a falta de competência da requerida como mãe e, não obstante, sugere um regime de guarda partilhada, mantendo-se o menor a residir com a progenitora.
Para além da incapacidade que o recorrente reconhece ao nível da satisfação das necessidades habitacionais e até de alimentação do seu filho, resulta notória a sua falta de investimento na relação afectiva com o filho, de cujas visitas abdicou, seja por conflitos com a mãe, seja, posteriormente, já com o menor acolhido em residência, por razões que não resultaram concretamente apuradas.
E se se podem aceitar dificuldades na deslocação entre uma ilha e outra para a concretização dessas visitas, atenta a carência económica do progenitor, certo é que essa distância poderia ser encurtada se este revelasse interesse em conhecer as rotinas do menor, a sua evolução ao nível de desenvolvimento, até as suas preferências ou gostos, para o que bastaria ter mantido contacto com as técnicas responsáveis na instituição de acolhimento.
Mais do que isso, quisesse efectivamente o recorrente integrar o projecto de vida do menor teria certamente orientado a sua vida no sentido de aproveitar, também ele, as oportunidades que lhe foram dadas, seja ao nível de aquisição de competências, seja no cumprimento dos pressupostos para beneficiar de ajudas de que dispôs e que pela sua atitude perdeu.
Ademais, note-se que nem em sede de recurso, insurgindo-se contra a medida aplicada, o recorrente se predispõe a constituir essa alternativa de vida para o menor, pretendendo confiá-lo à guarda da mãe, a quem ele próprio imputa falta de competência para o exercício de tais funções.
Não se pode reconhecer a existência de uma vinculação afectiva com um pai que pouco ou nada fez para manter, desenvolver ou incrementar os laços de filiação com o seu filho, que jamais assegurou as suas necessidades, que cumpriu algumas visitas e outras ignorou, que não procura informar-se sobre a situação do menor, sobre o seu dia-a-dia ou até sobre a sua saúde, quando é evidente que esta tem sido recorrentemente afectada.
Ainda que seja dada prevalência às medidas de promoção e protecção que integrem a criança em família, seja a biológica, seja uma família adoptiva ou outra forma de integração familiar, como resulta do acima expendido, importa não deixar de ter presente que essa integração nem sempre é possível, ou nem sempre é aconselhável, surgindo antes, por vezes, como resposta mais adequada e que melhor satisfaz os interesses e necessidades da criança, a opção por uma medida que promova a sua adopção.
Nessa avaliação e ponderação, como é sabido, o tribunal tem de atender prioritariamente aos interesses do menor, decretando a medida de confiança a instituição, com vista a futura adopção, designadamente para evitar que a criança veja protelada a definição da sua situação face aos pais biológicos e para obter com a maior rapidez possível a sua integração numa nova família promovendo a sua adaptação e são desenvolvimento, em consonância, aliás, com o estatuído na Convenção dos Direitos da Criança, ao dispor que «a criança temporária ou definitivamente privada do seu ambiente familiar ou que, no seu interesse superior, não possa ser deixada em tal ambiente tem direito à protecção e assistência especiais do Estado» (artigo 20º).
No caso concreto, não se vê que outra medida, de entre as enumeradas no art. 35º, n.º 1 da LPCJP pudesse salvaguardar os interesses do menor de forma satisfatória que não a aplicada pelo tribunal recorrido.
Com efeito, não se antevê qualquer familiar do menor em condições de o acolher e a quem pudesse ser prestado apoio para o efeito, não tendo, aliás, o recorrente identificado em que termos tal medida poderia ser gizada, limitando-se a propugnar pela atribuição da guarda à mãe, o que já se viu ser inviável.
De todo o modo, atente-se nos seguintes dados:
- À data do nascimento do A os avós paternos, para cuja casa aquele foi viver, beneficiavam de uma pensão de invalidez e do subsídio de desemprego;
- Os pais do menor recorreram a ajuda da Caritas que forneceu bens alimentares e produtos de higiene para o menor;
- A avó efectuou algumas visitas ao menor, juntamente com o progenitor,
- Não há notícia de que o avô tenha efectuado qualquer visita;
- Entretanto, os avós paternos separaram-se e a avó frequentou, tal como o pai, um curso de restauração, auferindo € 230,00 por mês, não estando apurado onde reside a avó, mas sabendo-se que quer esta, quer o progenitor recorreram pontualmente a ajudas económicas da acção social do Pico.
Não existe, pois, a possibilidade de aplicação de medida de apoio junto de outro familiar, quando nenhum familiar se predispôs a acolher a criança e o próprio pai não o indica nas suas alegações, nem logrou identificar quem o pudesse fazer, para além da mãe, durante os 16 meses em que perdura o acolhimento residencial.
Em síntese, importa não olvidar que as medidas de promoção e protecção visam salvaguardar o interesse das crianças, sendo que este não se confunde com o interesse dos pais.
Conceder à mãe uma outra oportunidade de se organizar para receber o seu filho, quando não o conseguiu fazer ao longo de dois anos, apesar das diversas oportunidades de que beneficiou, seria admitir o protelar da institucionalização do menor sem expectativa de sucesso, o que redundaria num evidente prejuízo para este, que permaneceria, aí sim, com um projecto de vida indefinido, em eventual acolhimento residencial que apenas serviria para agravar a problemática da sua vinculação afectiva e da ligação emocional a uma figura de referência.
A relação afectiva que a mãe mantém com o filho não obsta à aplicação da medida em causa, porque não basta que haja relação afectiva entre pais e filhos, é necessário demonstrar esse amor e que ele é próprio da filiação e pais «são aqueles que cuidam dos filhos no dia a dia, são aqueles que cuidam da segurança, da saúde física e do bem estar emocional das crianças, assumindo na íntegra essa responsabilidade» - cf. acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 7-05-2019, relatora Maria Cecília Agante, processo n.º 2545/16.1T8PRD.P1.
Está comprovado que os pais, por falta de capacidade, por negligência ou desinteresse, não têm condições para velar pela segurança, saúde e bem-estar do filho e de lhe garantir um futuro harmonioso.
De nada adiante um sentimento maternal perante o filho se não é capaz de lhe fazer corresponder actos materiais eficazes, com prestação dos cuidados necessários ao seu desenvolvimento harmonioso e saudável.
O primado da família biológica demanda que se opte, em primeiro lugar, pelo apoio às famílias disfuncionais, mas este pressupõe que se prenuncie a possibilidade de aquelas alcançarem o equilíbrio, não podendo aguardar-se indefinidamente, ultrapassando aquele que é o tempo útil da criança, que a mãe se focalize, antes de mais em si própria, na sua autonomia e, por inerência, na satisfação das necessidades do filho.
Conclui-se, assim, não existir para o A um projecto de vida em meio natural, sendo adequada a aplicação da medida de confiança judicial à instituição em que se encontra acolhido, com vista à adopção, por outra não se revelar adequada à salvaguarda dos seus interesses.
Com efeito, como se disse já, os interesses das crianças sobrepõem-se aos da família que, apesar de as desejar no seu seio, é incapaz de exercer convenientemente os poderes-deveres que a lei lhe confere.
No conflito entre a família natural e os interesses das crianças, prevalecem estes últimos, aferindo-se, no caso presente, que a sua protecção só será alcançada fora dos laços de família natural, que não lhes propiciou nem tem capacidade para lhes assegurar um desenvolvimento equilibrado.
Resta, pois, concluir pelo bem fundado do acórdão recorrido quanto à medida de promoção e protecção aplicada ao menor A Filipe e pela sua consequente confirmação, mantendo-se de igual modo a decretada inibição dos progenitores do exercício das responsabilidades parentais e a proibição de visitas por parte da família natural, nos termos do disposto no art. 1978º-A do Código Civil e do art. 62º-A, n.º 6 da LPCJP.
*
Das Custas
De acordo com o disposto no art. 527º, n.º 1 do CPC, a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito. O n.º 2 acrescenta que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
Nos termos do art. 1º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais, considera-se processo autónomo para efeitos de custas, cada recurso, desde que origine tributação própria.
Contudo, estatui o art. 4º, n.º 2, f) deste diploma legal que ficam isentos de custas “os processos de confiança judicial de menor, tutela e adopção e outros de natureza análoga que visem a entrega do menor a pessoa idónea, em alternativa à institucionalização do mesmo”.
Quanto à abrangência desta isenção objectiva, isto é, motivada pelo interesse de acesso ao direito e aos tribunais, refere Salvador da Costa quenão é evidente a sinalização dos processos de natureza análoga aos primeiramente enunciados. Propendemos a considerar tratar-se dos processos de protecção de crianças e jovens em perigo, quando estiver em causa a aplicação das referidas medidas de promoção, ou seja, a entrega do menor a pessoa idónea em alternativa à institucionalização ou acolhimento residencial” – cf. As Custas Processuais, Salvador da Costa, 7ª edição, pp. 124-125.
Uma vez que está em causa a aplicação de uma medida de promoção de confiança a instituição com vista à adopção, deve aceitar-se a natureza análoga dos autos aos enunciados na mencionada alínea f) do n.º 2 do art. 4º do Regulamento das Custas Processuais, pelo que não há lugar a condenação em custas.
*
IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam as juízas desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em julgar improcedente a apelação, mantendo, em consequência, a decisão recorrida.
Sem custas.
*
Lisboa, 5 de Maio de 2020[6]
Micaela Sousa
Cristina Silva Maximiano
Maria Amélia Ribeiro
_______________________________________________________
[1] Adiante designada pela sigla LPCJP.
[2] Adiante designado pela sigla CPC.
[3]Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos.”
[4] Todos os arestos adiante mencionados sem indicação de origem encontram-se acessíveis na Base de Dados Jurídico-documentais do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP em www.dgsi.pt.
[5] Não é legalmente possível aplicar outras medidas de promoção e protecção que não as enunciadas no art. 35º da LPCJP, preceito onde se consagra o princípio da tipicidade das medidas, que são enumeradas pela sua ordem de preferência e prevalência, ou seja, com preponderância das medidas a executar no meio natural de vida sobre as medidas executadas em regime de colocação.
[6] Acórdão assinado digitalmente – cf. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.