Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
82/14.8TBSRQ-A.L1-8
Relator: ANTÓNIO VALENTE
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
GUARDA DE MENOR
RESIDÊNCIA ALTERNADA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: - Mostra-se preferível, no tocante a menor de três anos de idade, cujos pais estão divorciados, estabelecer um regime que atribua a guarda da menor a um dos progenitores com quem a menor residirá habitualmente.
- Um regime de residência alternada, ora na casa da mãe ora na casa do pai, gera necessariamente uma situação de instabilidade e constantes alterações na vida da criança que, na ausência de motivos excepcionais, deve ser evitada.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:



RELATÓRIO:



O Requerente T..., veio instaurar a presente providência tutelar cível para regulação do exercício das responsabilidades parentais a favor da menor, sua filha, M..., nascida em 12 de Março de 2012, sendo requerida a mãe da menor, C....

Para o efeito, alegou, em síntese, que a menor é filha de ambos e que o casal decidiu pôr fim ao matrimónio que os unia.

O casal acordou verbalmente a guarda da filha, através da qual a menor ficou confiada a ambos os progenitores, em regime de guarda partilhada e semanalmente intercalada.

Porém, no período subsequente àquele em que a menor se encontra confiada, o requerente veio a denotar inúmeras variações no estado emocional e comportamental da menor, derivadas ao facto da progenitora se encontrar psicologicamente instável, por razões de quebra do dever de fidelidade ao seu marido, praticando poliandria, ameaça de tentativa de suicídio em 05 de Fevereiro de 2013 e manutenção de relacionamentos instáveis com outros companheiros, o que projecta maior insensibilidade na menor quando regressa a casa do progenitor, após passar uma semana com a progenitora.

Por isso, o requerente entende que o acordo provisório que tem vindo a ser executado - por acordo verbal entre os progenitores e que coincide com o acordo que ambos assinaram e entregaram na Conservatória - não salvaguarda o superior interesse da menor, pelo que propõe a fixação do regime de responsabilidades parentais a cargo do progenitor, no âmbito do qual, em síntese, a menor ficará confiada à guarda do pai, devendo esta passar com a progenitora um fim-de-semana de quinze em quinze dias, indo a progenitora buscar a menor à escola, no final do dia lectivo de sexta-feira, e entregando a menor até às 19:00 horas do domingo seguinte na casa do Requerente.
 
Citada, a requerida não compareceu às conferências de pais que se designaram. Subsequentemente, a requerida apresentou alegações, nos termos das quais, em síntese, refutou a volatilidade emocional da menor em função de quaisquer comportamentos da requerida - que, de resto, rejeitou que correspondessem ao que o requerido alegou -, explicando que se viu obrigada a ir para o continente terminar os seus estudos, momento em que acordou com o requerente um regime de regulação das responsabilidades parentais.

Rejeita que a guarda da menor aos cuidados do pai satisfaça o interesse e necessidades da menor, sendo todavia alcançado tal desiderato se for observado o regime acordado por ambos e constante do documento que juntou.

Posteriormente, em julgamento, sustentou que a guarda da criança deveria ser fixada junto de si e quanto muito se tal não fosse entendimento do Tribunal, ser mantida a residência alternada em regime semanal.

Foram elaborados relatórios sociais sobre a situação dos requeridos e da menor.

Designada data para audiência de discussão e julgamento, veio a mesma a realizar-se, vindo a ser proferida decisão com o seguinte teor: 

“Nos termos conjugados dos artigos 1905° e 1906° do Código Civil e 180° da Organização Tutelar de Menores, decido regular o exercício das responsabilidades parentais relativo à menor M..., da forma seguinte:

1 - O exercício das responsabilidades parentais da menor M... é cumprido conjuntamente por ambos os progenitores e só por ambos decididas as questões de particular importância, sendo as demais questões resolvidas pelo progenitor com quem a menor momentaneamente se encontre (artigo 1906.°, nº 1 do Código Civil);
2 - A menor ficará aos cuidados do pai, residindo junto dele, competindo-lhe a si o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da filha, sem prejuízo da intervenção da progenitora não-residente, durante o período de tempo em que a filha esteja consigo, de intervir na vida desta de modo que, contudo, não contrarie as orientações educativas mais relevantes do pai;
3 - A mãe pode estar e ter a menor consigo sempre que quiser, mediante prévio aviso e acordo com o pai, sem prejuízo dos horários escolares e de descanso da menor, sendo sempre garantido um mínimo de três dias úteis em que a mãe poderá ir buscar a criança à escola, findas as actividades curriculares e extracurriculares e entrega-la ao pai até às 19:30 h.
4 - A menor ficará aos cuidados da mãe em fins-de-semana alternados, iniciando-se cada fim-de-semana no final das actividades curriculares e extracurriculares de sexta-feira até às 19: 30 h, de Domingo,
5 - A menor passará ainda metade dos períodos de férias de verão com cada um dos progenitores, sendo garantido um período mínimo de quinze dias de férias ininterruptos, devendo cada um deles informar o outro sobre o período em que o pretende fazer; em caso de sobreposição, o período correspondente será rateado entre ambos por sorteio; as férias serão fixadas até ao início do mês de Junho,
6 -  A residência da menor é fixada na Ilha do Pico e as viagens para o continente ou estrangeiro devem ser previamente comunicadas ao outro progenitor;
7 - O Natal e o fim de ano (bem como as vésperas) serão passados alternadamente com o pai e com a mãe, o mesmo se aplicando ao dia de páscoa ou outros dias festivos, feriados nacionais ou locais,
8 - No dia de aniversário da menor, este tomará uma refeição com cada um dos progenitores, de forma alternada;      
9 - O dia de aniversário do pai e o dia do pai será passado pela menor com o pai e o dia de aniversário da mãe e o dia da mãe será passado por aquela com a mãe, sem embargo da pernoita se manter fixada conforme fixado;
10 - As funções de encarregado de educação, quando da entrada da menor no sistema obrigatório de ensino, serão exercidas pelo pai, ficando este obrigado a comunicar à mãe todos e quaisquer dados de relevância educacional (registos em caderneta, notas em período escolar ou faltas dadas);
11 - O regime de visitas ou de contactos pessoais entre os progenitores e a menor, bem como outras circunstâncias aqui não regulamentadas, podem ser alterados mediante acordo entre os progenitores;
12 - Os progenitores devem gradualmente favorecer a pernoita da M... em casa da mãe fora do fim-de-semana garantido, quando razões de ordem prática o aconselhem, embora sempre por acordo prévio (como, por exemplo, em vésperas de feriado ou em períodos de estadia do progenitor fora da ílha) ,
13 -  Os progenitores devem fomentar os contactos entre a menor e a restante família alargada;
14 - As despesas extraordinárias médicas e medicamentosas e de educação referentes à menor, são a cargo de ambos os progenitores igualitariamente.

Foram dados como assentes os seguintes factos:

1)A menor M... nasceu em 12/03/2012 e é filha de T... e de C...
2)Os pais da menor casaram entre si a 22/07/2011 e dissolveram o matrimónio em 03/11/2014.
3)Após a separação do casal, em Fevereiro de 2013, os pais da menor acordaram verbalmente uma regulação conjunta das responsabilidades parentais da menor, com residência alternada da menor a uma rotatividade semanal (a menor passaria uma semana com de cada um dos progenitores), sem prejuizo de garantirem também um regime aberto de contactos regulares com o progenitor momentaneamente não residente.
4)Em Agosto/Setembro de 2013, a requerida, debatendo-se com uma situação de desemprego, foi residir para o continente a fim de completar o ensino secundário no período de 1 ano, em ensino alternativo, pois no arquipélago teria de estudar os 3 anos que compõem o ensino secundário.
5)No continente a progenitora viveu em habitação pertencente à família alargada e aí beneficiou de apoio da irmã que a auxiliava e ainda dos seus progenitores que iam liquidando algumas das contas da vida corrente.
6)Previamente a seguir para o continente, a progenitora da menor confiou a guarda da criança ao pai.
7)A progenitora ousou permitir que a guarda da criança durante tal período ficasse encarregue do progenitor por nele reconhecer capacidade e idoneidade para desempenhar a função parental mesmo face à tenra idade da menor.
8)A progenitora regressou à ilha do Pico em Julho/Agosto de 2014, deixando em falta uma disciplina para completar os estudos secundários, momento em que os progenitores retomaram o regime aludido em 3).
9)Durante o período em que a requerida esteve no continente, foram estabelecidos contactos frequentes entre requerida/menor, favorecidos pelo requerente, através de video conferência pelo sistema Skype.
10)O requerente chegou a deslocar-se a Lisboa, levando consigo a menor, favorecendo o contacto desta com a progenitora.
11)Ao longo do período em que o requerente teve a menor exclusivamente aos seus cuidados, a criança beneficiou da atenção e cuidados próprios para a sua idade, tendo por via disso, vindo a apresentar um desenvolvimento harmonioso, equilibrado e adequado à idade.
12)Durante o período da ausência da progenitora da Ilha do Pico, o progenitor potenciou o contacto da menor com a família alargada materna e paterna.
13)O requerente é Gerente de profissão nas empresas AgroComb e TMC (empresas proprietárias do núcleo familiar) e aufere uma remuneração anual (bruta) do seu trabalho na ordem dos € 21.528,99, auferindo ainda € 72.711,27 anuais de outros rendimentos (vendas, subsídios, prestações de serviços e outros rendimentos).
14)Vive na vila das Lajes do Pico com a menor, em propriedade da sua família, numa habitação de tipologia 13, com boas condições e quarto próprio para a menor, pese embora esta pernoite no quarto do seu progenitor em berço que identifica como "cama da M...".
15)A criança reconhece a habitação do progenitor como a "sua" casa e vê no progenitor bem como nos avós paternos, figuras com as quais partilha amor, carinho e compreensão.
16)O requerente beneficia de apoio familiar nos cuidados prestados à M... através dos seus pais (avós da menor) sempre que necessário.
17)Na execução do seu trabalho, o requerente tem flexibilidade de horários, que lhe permitem adequar a situação laboral aos horários da menor.
18)O requerente tem as despesas normais da vida corrente na ordem mensal dos € 1.421,14 e despesas específicas com a criança na ordem dos € 306,10.
19)Existe uma sólida relação de cumplicidade pai-filha, sendo que o progenitor desenvolve esforços para compreender e satisfazer as necessidades da menor.
20)A menor manifesta prazer em habitar a casa do pai, que conhece e concebe como a sua casa.
21)A progenitora reside com os pais, em casa destes, em habitação de tipologia T4, com boas condições, asseada e quarto próprio para a menor quando esta está aos cuidados da mãe.
22)A mãe da menor encontra-se actualmente em situação de desemprego e sem auferir qualquer subsídio/rendimento, sendo auxiliada pelos seus progenitores.
23)Ainda não completou os estudos secundários que se propôs a realizar na sua ida para o continente, faltando completar uma disciplina.
24)Beneficia de igual auxílio dos seus progenitores para executar tarefas do quotidiano da menor quando tal se revela necessário.
25)Existe um relacionamento de mútuo desejo/amor entre mãe-filha.
26)A menor manifesta igualmente prazer em habitar a casa da mãe que igualmente conhece e concebe como a "sua".
27)A distância das habitações do requerente e requerida é inferior a 1 (um) km, ambas sitas nas Lajes do Pico.
28)A M... frequenta a creche, suportada pelo pai e tem um percurso normal.
29)Pese embora exista uma fraca comunicação interparental, estes conseguem conversar para resolver as questões do interesse da menor quando necessário.                                                      
30)Não se registando alterações significativas nos comportamentos e atitudes da criança após a separação dos progenitores, a M..., embora com reacção positiva à presença de ambos, apresenta algumas caracteristicas de instabilidade.
31)O progenitor não concebe a manutenção da residência alternada - embora interiorize o seu cumprimento, como acordado, até decisão judicial - por entender que a execução desse regime tem-se revelando prejudicial para o desenvolvimento harmonioso da menor, potenciando a instabilidade aludida em 30).
32)Ambos os progenitores evidenciam forte motivação para que a filha não seja prejudicada pela separação dos pais, demonstrando capacidade de compreensão para a necessidade de partilha afectiva da menor com cada um dos progenitores.
33)Ambos os progenitores evidenciam motivação e desejo em ter a filha junto do seu seio familiar.

Inconformada, recorre a requerida, concluindo que:

-O presente recurso é delimitado à matéria constante dos pontos nºs 2, 3, 5, 6 e 14 da decisão que se recorre, com a qual a apelante não se pode conformar.
-Desde a volta da apelante para a ilha do Pico até ao final do ano de 2014, a menor viveu no regime da residência alternada com ambos os progenitores.
-Quando chamado a decidir, este tribunal retrocedeu no regime que era praticado pelos progenitores, optando por atribuir a residência da menor na morada do pai.
-Com esta decisão, alegando mais estabilidade para a menor, pretere o regime que ambos praticavam.
-Ora, não ficou demonstrado que o regime fosse fonte de instabilidade para a menor ou que não funcionasse.
-Não procedendo, igualmente, a alegação respeitante à idade da menor, pois é actualmente a realidade dos menores de tenra idade.
-Acresce o facto de ambas as casas distarem menos de um km de distância uma da outra, tal como não poderá proceder a consideração da afirmação 'cama da M...' dado que a menor não foi ouvida, sendo essa frase dita em sede de audiência pelo pai, ora apelado.
-Também sendo certo que a menor, durante os meses antecedentes à decisão teve duas camas e não uma, não ficando demonstrado que tal regime acarretasse instabilidade para a menor.
-É importante que ambos os progenitores tenham salutar convivência com a menor em todas as horas do dia.
-A decisão que ora se recorre amputa essas horas da menor com a mãe, relegando a convivência mãe/filha para duas horas em três dias da semana.                            
-A apelante considera que a sentença recorrida. nesta parte, não corresponde à prossecução dos interesses da sua filha. pois esta necessita de pai e mãe, da presença de ambos na sua vivência diária e não só do pai.                                                                                                                
-O regime imposto pela decisão não é o que melhor prossegue os interesses, presentes e futuros, e salutar desenvolvimento da menor, defendendo que a imposição da residência alternada ou um regime alargado de visitas como o estabelecido com três dias semanais com pernoita da menor com a apelante, resulta no melhor interesse da M....
-Entendimento contrário viola directamente a noção legal de responsabilidade parental e o art. 1878.º e seguintes do CC.
-Relativamente à repartição das férias da menor, a apelante concorda com o tempo de repartição, considerando, no entanto, que faltou a menção de 'férias escolares' englobando assim as férias escolares do Natal e da Páscoa, sob pena de a regulação decretada não estar completa.
-Também relativamente ao que ficou regulado quanto às viagens da menor, estas devem ser autorizadas pelo outro e sempre que possível, realizadas em datas em que o próprio progenitor está com a menor, devendo estes aspectos constarem do teor do número correspondente.
-Por fim, no que respeita à decisão de contribuição de cada um dos progenitores, em 50%, nas despesas médicas e escolares, entende a apelante que tal contribuição deve observar o disposto no art. 2004, nº 1 do CC, ou seja, deverá ser prestada na proporção dos rendimentos de cada um.
-Face à matéria dada como provada, relativamente à proporção dos rendimentos da apelante e do apelado deve ser excluída a proporção de 50% para cada um patente na sentença, sob pena de violação do supra citado preceito.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência deve ser revogada a decisão recorrida, alterando-se, em consequência e conforme peticionado, matéria constante dos pontos nº 2,3, 5,6 e 14 da decisão.

Cumpre Apreciar:

O recurso da requerida não põe em causa a matéria de facto dada como provada mas sim diversos pontos da decisão que regula o exercício das responsabilidades parentais relativamente à menor M....
Nomeadamente, são postos em causa os nºs 2, 3, 5, 6 e 14 dessa decisão.
 
O art. 180º nº 1 da OTM, estabelece que “na sentença, o exercício do poder paternal será regulado de harmonia com os interesses do menor, podendo este, no que respeita ao seu destino, ser confiado à guarda de qualquer dos pais, de terceira pessoa ou de estabelecimento de educação ou assistência”.

Deveremos ainda levar em conta o disposto no art. 1905º nº 2, na parte que estipula que “na falta de acordo, o tribunal decidirá de acordo com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com o progenitor a quem não seja confiado (...)”.

No caso dos autos, os progenitores haviam acordado um regime de guarda partilhada e semanalmente intercalada. A presente decisão reporta-se ao requerimento do pai da menor que entende que lhe deverá ser confiada a guarda da mesma.

A decisão recorrida anuiu a tal pretensão, pese embora não tenham sido dados como provados os factos invocados pelo requerente relativamente à instabilidade emocional e de vida da requerida mãe da menor.

Esta pretende que sejam alterados diversos pontos da decisão. Iremos assim abordá-los um a um.

Nº 2:
“A menor ficará aos cuidados do pai, residindo junto dele, competindo-lhe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da filha, sem prejuízo da intervenção da progenitora não-residente, durante o período de tempo em que a filha se encontre consigo, de intervir na vida desta de modo que, contudo, não contrarie as orientações educativas mais relevantes do pai”.

Ficou dado como provado no nº 30 da matéria de facto que não se registam alterações significativas no comportamento e atitudes da menor após a separação dos progenitores, mas que a M..., embora reaja positivamente à presença de ambos, apresenta algumas características de instabilidade.

No relatório do Instituto de Segurança Social dos Açores, ao serem apresentados os resultados da observação feita à menor, não é mencionada a aludida instabilidade. Contudo, é ponderada a ligação da M...com o pai, descrita como “uma relação de proximidade comunicacional (...) que se traduz na cumplicidade e qualidade da interação com o referido elemento, que identifica como cuidador”.

Do relatório resulta uma forte ligação quotidiana da menor com o pai e no modo como este se dedica aos cuidados com a filha. Não se quer com isto dizer que a menor não tenha uma óptima relação com a mãe, mas apenas que existe uma proximidade maior com o pai, devido talvez ao período em que a mãe teve de vir estudar para o continente (cerca de um ano, entre Agosto/Setembro de 2013 e Julho/Agosto de 2014) período esse em que a menor ficou a viver com o pai e à guarda deste.

É bom ter presente que a M... nasceu em 12/03/2012, tendo neste momento três anos de idade.

Concordamos com a perspectiva do Mº juiz a quo  de que não favorece a estabilidade e o desenvolvimento de uma criança de tão tenra idade um regime de residência alternada com cada um dos progenitores, como vinha sucedendo.

E tendo em atenção os cuidados, a dedicação que o pai mostra relativamente à M...e à profunda relação existente entre pai e filha, entendemos que a solução de atribuir a guarda da menor ao pai, com quem a criança residirá, é a que melhor defende os seus interesses.

Contudo, há que assegurar uma presença importante da mãe na vida da menor, como aspecto essencial de um são desenvolvimento afectivo.

É claro que não podemos concordar com a recorrente quando esta refere na alínea i) das conclusões da apelação que “é importante que ambos os progenitores tenham salutar convivência com a menor em todas as horas do dia”. A recorrente parece esquecer que está divorciada do recorrido e que não vivem juntos, o que torna inviável essa convivência permanente.

O regime de visitas estabelecido, embore procure alcançar um certo equilíbrio, parece-nos contudo limitar desnecessariamente a presença da mãe na vida quotidiana da menor. O Mº juiz a quo fixou um regime de 3 dias por semana em que a mãe irá buscar a menor à escola, devendo entregá-la ao pai até às 19.30h. Pensamos ser mais adequado um regime que assegure a possibilidade de a mãe estar diariamente com a menor, de segundo a sexta feira durante esse período. Insistimos que, sendo embora um regime de residência alternada menos aconselhável, na medida em que imporia à M... uma situação de constante mudança e alternância que não se afigura solução mais adequada com vista a garantir uma estabilidade na sua vida, a presença da mãe na vida da menor é essencial e deve ocorrer diariamente.

Assim, altera-se nesta parte a decisão recorrida cujo nº 3 passa a ter a seguinte redacção:

“A mãe pode estar e ter a menor consigo sempre que quiser, mediante prévio aviso e acordo com o pai, sem prejuízo dos horários escolares e do descanso da menor, sendo-lhe sempre garantido que de segunda a sexta-feira a mãe poderá ir buscar a criança à escola, findas as actividades curriculares e extracurriculares e entregá-la ao pai até às 19.30h.”

Quanto ao pedido de a menor pernoitar em casa da mãe, entendemos que, durante a semana, não seria a melhor solução. Já está fixado no regime estabelecido na sentença recorrida que a mãe terá consigo a menor em fins-de-semana alternados de sexta-feira a domingo, pelo que a M... dormirá dois dias em casa da mãe nesses períodos. Não faz sentido obrigar a menor, durante a semana, a mudar de cama, de quarto, constantemente. Trata-se de uma situação que seria incómoda, mesmo para um adulto, não sendo desejável que a M...cresça numa atmosfera que lhe não permite a estabilidade do seu espaço próprio.

Quanto à situação das férias, é verdade que não foi feita referência às férias escolares do Natal e da Páscoa.
Inclui-se assim um número 5A na regulação de fls. 165, com o seguinte teor:

“A menor passará metade das férias escolares do Natal e da Páscoa com cada um dos progenitores”.

Aceita-se igualmente que é necessário criar um regime mais rigoroso quanto às viagens. Uma vez que rejeitámos o regime de residência alternada pretendido pela recorrente, não se afigura relevante a parte final da alínea O) das conclusões do recurso.
A razão de ser de se exigir a anuência do outro progenitor é óbvia: durante as viagens ao continente ou estrangeiro com um dos progenitores, o outro progenitor ficará privado da convivência com a menor. O comum acordo dos pais neste aspecto é a solução mais justa, até para evitar desnecessárias crispações ou até abusos. A menor é filha de ambos, recorrente e recorrido, e viagens mais extensas, em que um deles ficará vários dias sem poder ver a filha deverão ser por ele autorizadas.

Altera-se assim o nº 6 da decisão, nos seguintes termos:

“A residência da menor é fixada na Ilha do Pico e as viagens para o continente ou estrangeiro devem ser previamente comunicadas ao outro progenitor e obter a anuência deste”.

Finalmente e quanto às despesas médicas e escolares da menor, é certo que a situação económica do pai - ver nº 13 da decisão factual - é muito superior à da mãe que se encontra actualmente desempregada.

Não esqueçamos contudo que o recorrido prescindiu de alimentos para a filha, pelo que é ele sozinho que assegura o sustento da menor.

As despesas médicas e medicamentosas ou de educação a que alude o nº 14º da decisão, são despesas extraordinárias, ou seja, despesas que poderão ocorrer ocasionalmente, tal como o ilustram os exemplos dados na sentença recorrida, como seja a compra de óculos, visitas de estudo ao continente etc.

Será justo que a recorrente comparticipe em tais despesas, mas não na proporção fixada de 50%, desajustada à realidade económica e às possibilidades de cada um dos progenitores. Uma comparticipação de 75% do pai e 25% da mãe é mais equitativa, pelo menos até que a ora recorrente arrange emprego e obtenha um rendimento regular.

Altera-se pois o nº 14 da decisão que passa a ter a seguinte redacção:

“As despesas extraordinárias médicas e medicamentosas e de educação referentes à menor ficam a cargo de ambos os progenitores na proporção de 75% (o pai da menor) e 25%  (a mãe da menor).”

Conclui-se assim e em síntese que:

-Mostra-se preferível no tocante a menor de três anos de idade, cujos pais estão divorciados, estabelecer um regime que atribua a guarda da menor a um dos progenitores com quem a menor residirá habitualmente.
-Um regime de residência alternada, ora na casa da mãe ora na casa do pai, gera necessariamente uma situação de instabilidade e constantes alterações na vida da criança que, na ausência de motivos excepcionais, deve ser evitada.

Termos em que se julga a apelação parcialmente procedente, alterando-se os nºs 3, 6 e 14 da decisão que regula o exercício das responsabilidades parentais, e aditando-se à mesma um nº 5A, nos termos atrás enunciados.
Confirmando-se no mais a decisão recorrida.
Custas por recorrente e recorrido em partes iguais.

LISBOA, 12/11/2015

António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais
Decisão Texto Integral: