Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2444/13.9P8LSB-A.L1-9
Relator: MARIA DO CARMO FERREIRA
Descritores: PODER DISCRICIONÁRIO
RECURSO
ADMISSIBILIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/14/2014
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REJEITADO
Sumário: I - o arguido pretende recorrer de uma decisão de indeferimento inexistente, já que no despacho recorrido o tribunal não indefere a diligência por si requerida, antes relega o seu conhecimento (do requerido) para momento adequado - o julgamento.

II - este despacho, cujo objectivo é gerir o processado, está dentro dos poderes discricionários do juiz titular do processo.

III - é, pois, insusceptível de controlo, desde que, obviamente, não lese interesses da defesa ou não constitua exercício abusivo de poderes.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Processo n°. 2444/ 13.9P8I.SB-A.L1           

DECISÃO SUMÁRIA.

RR..., arguido nos presentes autos, veio interpor recurso do despacho judicial proferido em 7/3/2014, no processo supra identificado, da 8ª. Vara Criminal de Lisboa.

Motivou o recurso, concluindo o seguinte:

A. O poder de gestão de prova conferido ao Tribunal pelo artigo 340 do CPP, é uma faculdade regulada, estando os seus limites contidos nos números 3 e 4 do mesmo artigo sendo eles os de a prova ser "legalmente inadmissível", ser "irrelevante ou supérflua", ser "inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa ou destinar-se a concretizar expediente dilatório, como se pode observar dos

B. Do n°. 1 do referido artigo 340 do Código de Processo Penal, resulta a obrigatoriedade de o Tribunal concretizar o seu juízo de desnecessidade da prova;

C. Tal juízo de desnecessidade deve ser proferido à luz dos critérios contidos nos números 3 e 4 do mesmo preceito, devendo ainda ser condicionado pelos direitos de defesa do arguido e pelos factos por este invocados para requerer prova, além das circunstâncias concretas do processo;

D. O despacho recorrido não contém qualquer justificação para o indeferimento, na prática, da prova requerida porquanto, relega a apreciação da pertinência da sua produção para a audiência de julgamento;

E. E constitui na prática, um indeferimento, em concreto, da mesma por a prova requerida ser de morosa produção e o arguido se encontrar sujeito a confinamento, com pulseira eletrónica, não devendo o prazo do seu julgamento ser prolongado.

F. O despacho recorrido impede, na prática, o arguido de se defender, violando os princípios constitucionais do contraditório, das garantias de defesa do processo criminal e do julgamento no mais curto prazo possível, previstos nos artigos 29 e 32 da CRP

G. E é hábil a prolongar a execução de uma pena de privação de liberdade, cruel, degradante e desumana, por injusta.

H. Além dos preceitos constitucionais violados, o despacho recorrido vicia o disposto nos números. 1, 3 e 4 do artigo 340 do CPP.

I. Pelo que deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que determine a realização da prova requerida.

J. Deve caber efeito suspensivo ao presente recurso, por a sua retenção prejudicar o julgamento, cuja validade eficácia dele depende e por prejudicar, na prática, a situação de confinamento com pulseira eletrônica do Arguido.

Do despacho recorrido consta:

" Fls. 504 a 507: nada mais se impõe por ora determinar para além do já decidido a Fls. 492. Com efeito, entende o tribunal que sem se iniciar a audiência de julgamento e sem se dar início à produção de prova testemunhal, ainda não é possível aferir da pertinência da diligência de prova requerida pelo arguido.

Atento o disposto no artigo 340 n.º 1 do C.P.P., o tribunal, atento o objecto do presente processo, delimitado pelos factos constantes da acusação, factos cuja prova incumbe ao Ministério Público, entende que no presente momento ainda não é possível formular um juízo que permita concluir que as diligências de prova requerida pelo arguido se revelará relevante para a descoberta da verdade material ou boa derisão da causa".

Conhecendo.

Como resulta claro, e, contrariamente ao alegado pelo arguido, o despacho em questão não indefere qualquer diligência de prova requerida pelo arguido. Tão só relega o seu conhecimento para a audiência de julgamento. O que, desde logo, faz deste despacho um despacho cujo objectivo é gerir o processado, ou seja, está dentro dos poderes discricionários do juiz titular do processo.
Como refere Simas Santos e Leal Henriques "Estas decisões, na medida em que materializam uma opção entre várias possíveis, todas elas juridicamente válidas, são, pois, insusceptíveis de controlo, desde que, obviamente, não lesem interesses da defesa ou não constituam exercício abusivo de poderes."

Como define Paulo Pinto de Albuquerque, discricionário é o poder que é exercido de acordo com o critério de decisão da conveniência e que não é sindicável por outra autoridade.
Ora, no caso o arguido pretende recorrer de uma decisão de indeferimento inexistente, já que no despacho recorrido o tribunal não indefere a diligência por si requerida, antes relega o seu conhecimento (do requerido) para momento adequado - o julgamento. Usou os poderes de discricionariedade que a lei lhe confere e, não pode ser a interpretação subjectiva que o arguido quer dar ao despacho judicial a fundamentar um eventual direito ao recurso.

E, sempre se dirá que a questão da morosidade invocada é um argumento reversível, uma vez que o arguido na fase do inquérito não esteve impedido de requerer as diligências que quisesse.

Sem necessidade de mais, dada a singeleza da questão, nos termos do disposto no artigo 400 n°. 1 b) do C.P.P. conclui-se que não é a decisão em causa, passível de recurso para este Tribunal.
A decisão da lª.Instância, que admitiu o recurso não vincula este Tribunal, conforme se estabelece no artigo 414- 3 do C.P.P.

Assim se decidindo, temos por prejudicado o conhecimento das questões colocadas no recurso.

DECIDINDO.

Em face do exposto e, ao abrigo do disposto nos arts. 414.º, n.°s 2 e 3, 417.º, n.° 6, alínea b) e 420.º, n.° 1, alínea h), e 2, todos do Código de Processo Penal, decide-se pela rejeição do recurso interposto por inadmissibilidade legal do mesmo.

Fixo em 3Ucs a taxa de justiça devida (513.º, n.° 1, e 524.º, do C.P.P., e 8.º, n.° 9, do Regulamento das Custas Processuais), acrescendo ainda 3Ucs da taxa a que alude o art. 420.°, n.° 3, do C.P.P..

Notificações.

Elaborado em computador e revisto pelo relator (art.º 94°/ 2 do CPP).

Lisboa, 14 de Julho de 2014

Maria do Carmo Ferreira