Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
734/2007-6
Relator: OLINDO GERALDES
Descritores: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
INJUNÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/22/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: CONFLITO COMPETÊNCIA
Decisão: DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA
Sumário: Compete às varas cíveis a preparação e julgamento das acções emergentes de procedimento de injunção com oposição e de valor superior à alçada da Relação, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 97.º da LOFTJ.
(O.G.)
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
O Ministério Público requereu a resolução do conflito negativo de competência suscitado entre o M. mo Juiz da 1.ª Vara Mista e o M. mo Juiz do 5.º Juízo Cível, ambos da Comarca de Sintra, os quais, negando a própria, atribuíram reciprocamente competência para conhecerem da acção ordinária, resultante do procedimento de injunção, relativo a obrigação emergente de transacção comercial, que Auto, Lda., apresentou contra S, Lda., para pagamento da quantia de € 30 092, 29, e em relação ao qual foi apresentada oposição.
Notificados os juízes em conflito para se pronunciarem, nada disseram.
O Ministério Público emitiu parecer, no sentido da competência ser deferida à 1.ª Vara Mista da Comarca de Sintra.

Corridos os vistos legais, e nada obstando, cumpre apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Considera-se provada a seguinte dinâmica processual:
1. Auto, Lda., apresentou na Secretaria do Tribunal Judicial de Sintra, contra S, Lda., procedimento de injunção, relativo a obrigação emergente de transacção comercial, para pagamento da quantia de € 30 092,29.
2. Pela Requerida foi apresentada oposição, sendo os autos remetidos, para distribuição, como acção ordinária.
3. Distribuída acção, à 1.ª Vara Mista da Comarca de Sintra, o M. mo Juiz declarou a incompetência do Tribunal para conhecer da acção, atribuindo, para o efeito, competência aos Juízos Cíveis da Comarca de Sintra.
4. Remetida a acção àqueles, o M. mo Juiz do 5.º Juízo Cível declarou a incompetência deste para conhecer da mesma acção, considerando, para tal, competente a Vara Mista da Comarca de Sintra.
5. Não houve reclamação ou recurso das referidas decisões.

2.2. Delimitada a dinâmica processual relevante, importa agora entrar na resolução do conflito negativo de competência, para o conhecimento da acção emergente de procedimento de injunção com oposição e de valor superior à alçada da Relação.

O caso vertido nos autos corresponde a um verdadeiro conflito negativo de competência, porquanto dois tribunais judiciais de competência específica consideraram-se incompetentes para conhecer da acção emergente do procedimento de injunção com oposição e de valor superior à alçada da Relação (art.º 115.º, n.º 2, do CPC).
Está, pois, controvertida a competência material de cada um dos tribunais da mesma jurisdição, o que exclui, desde logo, qualquer situação de incompetência relativa, que, a verificar-se, tinha já resolvido definitivamente a questão (art.º 111.º, n.º 2, do CPC).
A competência específica dos tribunais encontra-se estabelecida na lei de organização judiciária (art.º 69.º do CPC), sendo aplicável a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (LOFTJ).
Deste diploma releva essencialmente, para a discussão dos autos, os art.º s 97.º e 99.º.
Nos termos da al. a) do n.º 1 do art.º 97.º da LOFTJ, compete às varas cíveis a preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de valor superior à alçada do Tribunal da Relação em que a lei preveja a intervenção do tribunal colectivo.
Por seu turno, compete aos juízos cíveis preparar e julgar os processos de natureza cível que não sejam da competência das varas cíveis e dos juízos de pequena instância cível (art.º 99.º).
Estabelece-se, neste preceito, uma regra de competência residual dos juízos cíveis, nos termos da qual lhes cabe conhecer dos processos que não sejam da competência dos restantes tribunais de competência específica cível.
Segundo a lei processual, se o valor da causa exceder a alçada da Relação, é de empregar o processo ordinário (art.º 462.º do CPC).
Na acção ordinária, a discussão e julgamento são feitos com a intervenção do tribunal colectivo, se ambas as partes assim o tiverem requerido, sem prejuízo, no entanto, da sua inadmissibilidade em certos casos tipificados (art.º 646.º, n.º s 1 e 2, do CPC).

No caso vertente, Auto, Lda., utilizou a injunção, para obter o pagamento da quantia de € 30 092,29, resultante de transacção comercial, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 7.º do DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro.
No procedimento de injunção, porém, foi deduzida oposição.
Nesse contexto, e nos termos do n.º 2 do art.º 7.º do DL n.º 32/2003, os autos de injunção tinham de ser remetidos para o “tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum”.
Ora, sendo o valor superior à Alçada da Relação, a forma de processo comum aplicável tinha de corresponder à do processo ordinário, nos termos dos art.º s 461.º e 462.º, ambos do CPC.
No âmbito do processo ordinário, como se aludiu, está prevista a intervenção do tribunal colectivo, para a discussão e julgamento da causa.
Assim, tratando-se de uma acção ordinária e prevendo-se, em abstracto, a intervenção do tribunal colectivo, a sua preparação e julgamento compete às varas cíveis, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 97.º da LOFTJ.
É irrelevante que, em concreto, venha a efectivar-se a intervenção do tribunal colectivo. Para o efeito, basta apenas a sua previsibilidade, sendo certo que a competência se fixa no momento da proposição da acção (art.º 22.º, n.º 1, da LOFTJ) e que o requerimento para a intervenção do tribunal colectivo é apresentado posteriormente - art.º s 508.º-A, n.º 2, alínea c), e 512,º, n.º 1, ambos do CPC.
Por outro lado, a circunstância da acção provir de procedimento de injunção, nos termos do n.º 2 do art.º 7.º do DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, não justifica qualquer diferenciação em relação ao processo comum ordinário.
No mesmo sentido, decidiu o acórdão desta Relação de 4 de Dezembro de 2006 (Processo n.º 7.997/06-6).

2.3. Em face do que precede, pode extrair-se em síntese:
Compete às varas cíveis a preparação e julgamento das acções emergentes de procedimento de injunção com oposição e de valor superior à alçada da Relação, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 97.º da LOFTJ.

Nestas condições, resolvendo o conflito negativo de competência, cabe à 1.ª Vara Mista da Comarca de Sintra a preparação e julgamento da acção emergente do procedimento de injunção requerido por Auto Lda., contra S, Lda.

2.4. Não há lugar a pagamento de custas, designadamente porque as partes da acção, sendo alheias ao conflito negativo de competência suscitado, não retiram deste qualquer proveito (art.º 446.º, n.º 1, do CPC).

III. DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
Resolver o conflito negativo de competência, julgando a 1.ª Vara Mista da Comarca de Sintra competente para conhecer da acção. Lisboa, 22 de Março de 2007
(Olindo dos Santos Geraldes)
(Ana Luísa de Passos G.)
(Fátima Galante)