Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
196/12.9TTBRR.2.L1-4
Relator: SÉRGIO ALMEIDA
Descritores: RECURSO
PRAZO DE INTERPOSIÇÃO
INCIDENTE
LIQUIDAÇÃO
SUBSÍDIO DE REFEIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/14/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I.– O prazo para recorrer da sentença num incidente de liquidação que não depende de simples cálculo aritmético e que segue os termos dos art.º 358 e ss do CPC é de 30 e não de 15 dias, não se tratando de um recurso interposto de despacho proferido depois da sentença final.

II.– O subsídio de alimentação, embora assuma, na maioria dos casos, natureza regular e periódica, só é considerado retribuição na parte que exceda os montantes normalmente pagos a esse título, sendo mister para o efeito, por isso, que o trabalhador alegue e prove que o subsídio excedia os valores que normalmente eram pagos a esse título.

III.– Se um instrumento de regulamentação coletiva reduz parcialmente o subsídio de refeição, passando a diferença a integrar a retribuição base, o valor correspondente à redução tem cariz retributivo.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa



O requerente deduziu incidente de liquidação no qual concretizou a quantia em dívida pela requerida, na sequência de sentença condenatória transitada em julgado, no valor de
a)-Deverão as quantias que o A. deixou de auferir desde a data do despedimento declarado ilícito (Março de 2012) até à sua reintegração (11 de Novembro de 2016), a título de retribuições, diuturnidades e subsídios de refeição, ser liquidadas em € 144.075.95, às quais acrescem de juros de mora, desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento.
b)-Sem prejuízo do peticionado na alínea a), deverá à quantia de € 144.075,95 ser deduzido o valor de € 38.574,72, que o A. recebeu a título de subsídios de desemprego e que, nos termos legais, a R. teve que entregar à Segurança Social, pelo que o valor em dívida pela R. ao A., a título de retribuições, diuturnidades e subsídios de refeição, deverá ser liquidado em € 105.501,23;
c)-Deverá ser considerado que, após o pagamento efectuado pela R. em 20 de Janeiro de 2017, as quantias em dívida ao A. a título de retribuições, diuturnidades e subsídios de refeição, liquidadas nos termos peticionados nas alíneas a) e b), passaram a ser de € 72.232,80, às quais acrescem juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento à taxa legal, que se liquidavam, em 01 de Junho de 2018, na quantia de € 3.934,22.
d)-Deverão as quantias que o A. deixou de auferir desde a data do despedimento declarado ilícito (Março de 2012) até à sua reintegração (11 de Novembro de 2016), a título de formação profissional não ministrada durante esse período temporal, ser liquidadas em € 2.607,56, às quais acrescem de juros de mora, desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento, que se liquidavam, em 01 de Junho de 2018, na quantia de € 354,31.
e)-Deverão as quantias que o A. deixou de auferir desde a data do despedimento declarado ilícito (Março de 2012) até à sua reintegração (11 de Novembro de 2016), a título de férias não gozadas durante esse período temporal, ser liquidadas em € 10.610,39, às quais acrescem de juros de mora, desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento, que se liquidavam, em 01 de Junho de 2018, na quantia de € 1.441,11.
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Admitido o incidente de liquidação e declarada renovada a instância foi notificada a R. que deduziu oposição à liquidação, concluindo, a final, pela improcedência da liquidação por já estarem pagas ao requerido todas as quantias devidas ao requerente decorrentes da decisão proferida nos autos.

Para tanto, alega que não decorre da decisão final proferida a condenação da Ré no pagamento dos subsídios de refeição e no pagamento de juros de mora. Ademais, o subsídio de refeição não é considerado legalmente retribuição.

Por outro lado, à quantia global ilíquida que o autor entende ser-lhe devida aplicou taxas de IRS que não decorrem da Lei, tendo aplicado uma retenção na fonte de IRS consoante a taxa aplicável em cada mês a que respeitam as retribuições intercalares. Sendo que a requerida em conformidade com a Lei Tributária e Aduaneira reteve e entregou à Autoridade Tributária os rendimentos pagos ao A. no momento do pagamento, isto é, no momento em que os coloca à disposição do Trabalhador, tendo procedido à entrega à Autoridade Tributária da quantia de € 49.908,00 em Janeiro de 2017 e da quantia de € 2.302,00 em Junho de 2018.

Quanto aos descontos para a Segurança Social a Ré reconstituiu junto da Segurança Social o histórico de contribuições do A., como se o trabalhador nunca tivesse saído da empresa.

Também, resulta do recibo de 20.01.2017 que nessa data foram deduzidas às retribuições intercalares, o montante de € 38.574,22 correspondente ao total auferido pelo autor a título de subsídio de desemprego.

A condenação da Ré não se pronunciou quanto à formação profissional.

Relativamente às férias não gozadas o A. não tem direito a qualquer pagamento de férias não gozadas dado que nesse mês não esteve ao serviço.
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O A. respondeu afirmando ter direito ao subsídio de refeição que de acordo com o CCT aplicável à relação das partes constitui um “valor padrão”.

O direito a juros vence-se a partir da constituição em mora, não sendo necessário que a condenação conste do dispositivo da sentença condenatória, pelo que são devidos juros de mora desde o vencimento de cada uma das prestações em dívida.

A retenção foi indevidamente efectuada pela Ré, porquanto deveria ter procedido à retenção de acordo as taxas de retenção na fonte sucessiva e mensalmente aplicadas de Março de 2012 a Novembro de 2016.
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Efetuado o julgamento, o Tribunal proferiu sentença em que julgou o incidente parcialmente procedente e liquidou o montante a pagar pela requerida ao requerente a título de subsídios de refeição relativos ao período de março de 2012 a novembro de 2016, no montante total ilíquido de € 10.419,82, havendo que deduzir o valor relativo à contribuição para a Segurança Social a cargo do A. e a retenção na fonte, nos termos legais; sobre cada um dos subsídios de refeição em falta acrescem os juros de mora calculados à taxa supletiva, para os juros civis, actualmente de 4% ao ano, vencidos e vincendos desde a data de vencimento de cada uma das prestações em falta até integral pagamento (cfr. artigos 804º, nº. 2, 806º, nº. 1, 805º, nº. 1 e 559º todos do Código Civil e Portaria 291/2003, de 08.04).
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Inconformada, a requerida apelou para esta Relação, concluindo:
1-O Tribunal a quo procedeu à liquidação de sentença, e considerou os subsídios de refeição como parte da decisão e integrou-os nos valores a pagar a título de remunerações intercalares.
2-Na presente decisão assumiu o Tribunal que não feita alusão em sentença à obrigação do pagamento do subsídio de refeição.
3-Para justificar agora a integração de tal pagamento, é referido que quando se fez referência ao termo “quantias” ao invés de “retribuição”, foi com o propósito de incluir os subsídios de refeição exigidos pelo A.
4-Porém, não é compreensível tal distinção, uma vez que a sentença proferida, em sede de fundamentação na parte relativa às consequências da declaração de ilicitude do despedimento aduz o seguinte: “Assim, não resta senão concluir pela ilicitude do despedimento e, consequentemente, nos termos do disposto nos artºs 389º, nº 1, al.b) e 390º do CT. Pela condenação da R. a reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e no pagamento das remunerações intercalares.”
5-Pela previsão legal a fundamentação encontra-se conforme, pelo que a expressão “quantias” é aqui sinónimo de “retribuições”.
6-Todavia, não podia estar a Ré em maior desacordo com a decisão e correspondente liquidação feita pelo Tribunal, visto que não resulta da sentença proferida, qualquer pagamento de subsídios de refeição, e muito menos o pagamento dos juros nessa rubrica.
7-O Tribunal agora obriga-se a fazer uma distinção entre “quantias” e “retribuição,pretendendo com isso abranger em “quantias” os referidos subsídios de refeição.
8-Sucede que a lei é precisa quando determina que em caso de despedimento ilícito e o trabalhador é reintegrado tem direito às retribuições que não auferiu durante o período em que não prestou trabalho efetivo, porque decisões inversas não têm qualquer enquadramento legal, tal como prevê o disposto do n.º 1, do art.º 390.º, do CT.
9-E no que respeita ao subsídio de refeição nos termos do disposto pelos n.ºs 1 e 2, do art. 260.º, do C.T., este subsídio não é considerado retribuição.
10-Não tendo o A. indicado o montante do valor do subsídio de refeição que auferia, mas não alegou nem provou, existir uma parte desse subsídio que excedia os seus gastos normais com a alimentação quando estava a trabalhar.
11-Não houve condenação expressa da inclusão nas retribuições intercalares dos valores referentes aos subsídios de refeição, que a Ré defende que o pagamento de tal subsídio não deve ser incluído nas retribuições intercalares.
12-Da mesma forma que o pagamento dos subsídios de refeição não se encontram expressamente previstos em sentença, também não é feita qualquer menção ao pagamento de juros de mora sobre os mesmos.
13-Perante a ausência de condenação expressa da Ré no pagamento de subsídio de refeição ou juros de mora, estas quantias não poderão ser agora liquidadas, por não serem devidas.

Da liquidação:

14-Ainda assim, a liquidação apresentada não se encontra correta, visto que, o Tribunal limitou-se a contabilizar os dias úteis de cada mês e anos correspondente, sem efetuar os descontos aos pelo menos 22 dias úteis de férias anuais.
15-Para além disso, ignorou o Tribunal todos os outros dias que se encontram previstos no Acordo Coletivo de Trabalho, e que prevêem a dispensa de assiduidade com retribuição, mas que não incluem o pagamento do subsídio de refeição, nomeadamente, os dias de aniversário e o dia 24 de Dezembro.
16-Conclui-se, que nunca a liquidação dos subsídios de refeição poderia ser feita nos termos em que foi, por não contemplar as ausências que são legal e instrumentalmente imutáveis.
17-Tudo visto, impõe-se que seja dado provimento ao recurso, devendo a Decisão em crise ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento dos subsídios de refeição e a liquidação efetuada ser igualmente revogada.
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O recorrido contra-alegou, pedindo a improcedência do recurso e concluindo:
1.-Tal como é consabido, “a liquidação da sentença em condenação genérica que não dependa de simples cálculo aritmético efectua-se em incidente da acção declarativa e não da acção executiva, antes e depois da reforma do CPC (art.º 47.º, n.º 5 do CPC de 1995 e 704.º, n.º 6 do CPC de 2013) (…) Assim, o prazo para a parte recorrer da decisão final nele proferida em processo laboral é de 10 e não de 30 dias, ex vi dos art.º 79.º-A, n.º 2, al. i) e 80.º do CPT e 644.º, n.º 1, al. a) do CPC de 2013 (não sendo aplicável o art.º 98.º-A do CPT e 638.º, n.º 1 do CPC de 2013).” – Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de março de 2016, no processo n.º 3436/07.2TTLSB-A.L1-4, in www.dgsi.pt
2.-Termos em que, tendo as partes sido notificadas da douta sentença por notificação Citius expedida em 5 de outubro de 2020 e tendo a R. interposto recurso em 9 de novembro de 2020, não deverá admitir-se o recurso, porque extemporâneo.

SEM PRESCINDIR:

3.-Sempre se dirá que, se o A. estivesse ao serviço da R., teria recebido subsídio de alimentação;
4.-Pelo que o valor correspondente deve ser contabilizado no cálculo das retribuições, ao abrigo do disposto no artigo 390.º, n.º 1, do CT;
5.-De facto, no cálculo do montante das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, deve atender-se à remuneração base e a todas as outras prestações regulares e periódicas que o trabalhador receberia, não fora o incumprimento contratual por parte da entidade empregadora, onde, necessariamente, se inclui o subsídio de refeição (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de fevereiro de 2006, cit. e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de junho de 2005, no processo n.º 162/05, in www.dgsi.pt);
6.-A douta sentença objeto da liquidação não restringiu os seus efeitos à “retribuição base”, pelo que não poderá sequer a Apelante insinuar que a liquidação extravasou a condenação em apreço;
7.-Necessariamente, bem andou o Tribunal a quo ao considerar na douta sentença de liquidação recorrida que o dispositivo da sentença que declarou a ilicitude do despedimento condenou a R. no pagamento não só da remuneração base, como, também, das diuturnidades e do subsídio de refeição (sendo, para mais, esse o efeito típico da norma do art.º 390.º, n.º 1, do CT) e, em momento algum excluiu tal atribuição;
8.-Ademais, e mesmo que se considere que o subsídio de retribuição não integra o conceito de “retribuição intercalar” previsto no artigo 390.º, n.º 1, do CT, e, por isso, não incluindo na condenação ilíquida proferida nos autos principais, o que se admite, por mera hipótese académica, sempre se dirá, contudo, que resultou demonstrado (Cfr. Factos Provados n.º 11 a 19) que o subsídio de refeição devido ao Apelado constitui um “valor padrão”, tanto que se mostra definido rigidamente pela CCT aplicável (Cfr. Factos Provados n.º 11 e 12);
9.-Ou seja, in casu, o seu pagamento não se mostra justificado pelo acréscimo de despesas que o Apelado, individualmente, suporta com a sua alimentação nos dias de prestação de trabalho;
10.-Trata-se, acima de tudo, de um valor que é pago porque justificado pela prestação de trabalho em si mesma;
11.-Tanto assim é que, conforme a própria Apelante reconheceu nos art.º 39.º a 43.º da sua Oposição e o Tribunal a quo considerou como provado sob os n.º 11 a 18, em 2013, em consequência de negociação coletiva, foi decidida a diminuição nominal do valor do subsídio de refeição do valor do subsídio de refeição de € 11,33, para € 8,15, com a sua consequente integração na retribuição base da diferença entre o valor do subsídio de refeição diário e o valor superior auferido pelos trabalhadores em 1 de junho de 2013, nos termos do n.º 1, da Cláusula 101.ª, do ACT;
12.-Logo, in casu, e ainda que esse Venerando Tribunal ad quem perfilhe do entendimento vertido no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de fevereiro de 2017, citado nas motivações de recurso da R., certo é que, na relação laboral dos autos, os subsídios de alimentação assumem natureza remuneratória, tanto que, por força da CCT e pelos usos, que evidenciam a sua alteração com a consequente integração no conceito de “retribuição base”, tal subsídio seja tido como elemento integrante da retribuição;
13.-Por último, e apesar de modo sumário e subsidiariamente a Apelante se insurgir contra a liquidação dos subsídios de refeição nos dias aniversários do Apelado e nas vésperas de Natal, por considerar que nesses dias tal subsídio nunca seria devido, certo é que tal alegação constitui matéria nova, nunca alegada pela Apelante nos seus articulados, pelo que subtraída aos poderes de cognição da 2.ª instância;
14.-Termos em que, salvo melhor opinião, nenhuma censura merece a douta decisão recorrida;
15.-Ademais, afigura-se desprovida de fundamento a afirmação da Apelante de que, ao não constar do dispositivo a condenação em juros, os mesmos não são devidos, pois tal asserção equivale a afirmar-se que a Apelante poderia pagar quando quisesse (até ao limite da prescrição) sem que lhe fossem exigíveis quaisquer juros;
16.-Com efeito, o direito a juros advém do disposto no art.º 805.º, n.º 2, al. a), do CC, de onde se extrai que há mora do devedor se a obrigação tiver prazo certo, tal como sucede in casu, porquanto se tratam de créditos laborais vencimentos mensal e sucessivamente;
17.-Com efeito, a questão do direito a juros é cristalinamente explicitada no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de maio de 2015, no processo n.º 373/10.7TTPRT.P1.S1, in www.dgsi.pt, onde se decidiu que “ É jurisprudência firmada neste Supremo Tribunal e Secção – como se reitera, v.g. no recente Acórdão de 11.2.2015, tirado na Revista n.º 575/08.6TTVLR.P1.S1, na peugada, inter alia, do Aresto de 18.6.2014, tirado na Revista n.º 5115/07.1TTLSB.L1.S1, citado pelo recorrente – que, sempre que o devedor tenha forma de conhecer e liquidar os quantitativos peticionados e já vencidos, se encontra em mora desde o vencimento das prestações.
(…)
Há, porém, mora, independentemente da interpelação, se a obrigação tiver prazo certo – n.º 2, a), do art. 805.º.
No caso, tratando-se de condenação em retribuições vincendas (ou de tramitação), a pretensa iliquidez (in illiquidis non fit mora), mesmo no caso de haver deduções a fazer, é meramente aparente.
(…)
Não aduzindo a R. razões donde se depreenda que não dispunha de elementos para determinar, ano a ano, no período em causa, o valor das retribuições intercalares, constituiu-se em mora desde o vencimento de cada uma das prestações em dívida (sublinhado e negrito nossos);
18.-Pelo que, necessariamente, são devidos juros de mora desde a data de vencimento de cada um dos créditos remuneratórios intercalares, tal como decidido, e bem, pelo Tribunal a quo;
19.-Termos, pois, em que, por tudo o exposto, deverá julgar-se improcedente o recurso, confirmando-se a douta sentença do Tribunal a quo.
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O DM do MP emitiu parecer no sentido da confirmação da decisão.

Não houve resposta ao parecer.

Os autos foram aos vistos.
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II–Fundamentação

De acordo com as conclusões das alegações a questão submetida ao conhecimento deste Tribunal, constituindo assim o objecto do recurso, consiste em saber se
a)- o recurso é atempado;
b)- a condenação liquidada abrange subsídios de refeição, face aos precisos termos da decisão e como decorre da lei e do IRCT;
c)- são devidos juros de mora.
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Factos provados:

1-Por sentença de 06.08.2015, proferida no processo principal, foi declarada a ilicitude do despedimento do autor RS.......... e condenada a Ré PT Comunicações, S.A.;
1-A reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
2-No pagamento ao A. das quantias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao A. no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, a liquidar em incidente;
Tendo sido a Ré absolvida do demais peticionado, tudo conforme sentença de fls. 962 a 997, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

2-Na sequência de recurso interposto pelo autor e pela Ré foi proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa Acórdão em 12 de Outubro de 2016, que decidiu:
1.- Em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pela Ré, PT. Comunicações, S.A.
2.- Em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Autor, RS.........., alterando a matéria de facto provada e condenado a Ré a pagar-lhe a quantia de € 30.000,00 a título de danos não patrimoniais, tudo conforme Acórdão de fls. 1260 a 1297 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

3-Novo recurso foi interposto pela Ré para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo o autor contra-alegado e interposto recurso subordinado, tendo o Supremo Tribunal de Justiça proferido Acórdão em 26 de Outubro de 2017, com a seguinte decisão:

- Face ao exposto acorda-se em manter o Acórdão recorrido e, consequentemente:
a)-Julgar improcedente a revista principal interposta pela Ré;
b)-Não conhecer da questão relativa aos juros moratórios;
c)-Julgar improcedente a revista subordinada do Autor, tudo conforme Acórdão de fls. 1485 a 1524 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

4-Em 11 de Novembro de 2016 o A foi reintegrado como trabalhador da Ré.
5-À data do despedimento, em 22 de Março de 2012, o autor enquanto Técnico Superior de Nível 5, auferia mensalmente as seguintes quantias:
- Retribuição mensal base no valor de € 2.317,90;
- Diuturnidades no montante mensal de € 200,48;
- Subsídio de refeição no montante diário de € 11,33.

6-O A. recebeu a totalidade do mês de Março de 2012.

7-Em 20 de Abril de 2012 e relativamente ao período de Março de 2012 foram abonados ao autor os seguintes valores:
- Subsídio de férias no valor ilíquido de € 2.518,38;
- Subsídio de Natal no valor ilíquido de € 565,77;
- Férias vencidas e não gozadas no valor ilíquido de € 4.006,51;
- Subsídio de férias ano seguinte o valor ilíquido de € 565,77;

8-Foram ainda, descontados ao autor as seguintes quantias relativas ao período compreendido entre 23 e 31 de Março de 2012:
- Remuneração base a quantia de € 606,78;
- Diuturnidades Empresa a quantia de € 52,38;
- Subsídio de Alimentação a quantia de € 67,98.

9-Em 20.01.2017 a Ré procedeu ao pagamento ao autor da quantia total ilíquida de € 58.944,82, relativa ao período de Março de 2012 a Outubro de 2016, pelas proveniências constantes do recibo de fls.1639 vs. a 1644 vs. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
10-A ré pagou a título de Diuturnidades a quantia de € 200,48, entre Março de 2012 e Junho de 2013, tendo este valor sido actualizado para a quantia de € 202,72 a partir de Julho de 2013.
11-A partir de Junho de 2013 o subsídio diário de refeição passou a ser de € 8,15.
12-Em 2013 resultou da negociação colectiva a diminuição do valor do subsídio de refeição de € 11,33, para € 8,15, que teve por contrapartida a integração na RB da diferença entre o valor do subsídio de refeição diário e o valor superior auferido pelos trabalhadores em 01/06/2013, nos termos do n.º1, da Cláusula 101ª, do ACT.
13-Dispôs ainda no n.º 3, da Cláusula 101ª, do ACT que tal diferença seria progressivamente integrada na RB mensal dos trabalhadores à razão de 1/3 a partir de 20/06/2013, 1/3 a partir de 01/01/2014, e o último 1/3 a partir de 01/12/2014.
14-Sendo que cada terça parte correspondeu à integração da quantia de € 17,49.
15-Portanto, em Junho de 2013 integrou-se o montante de € 17,49 nas RB dos trabalhadores, a que acresceu outro tanto a partir de Janeiro de 2014, e outros € 17,49 em Dezembro de 2014.
16- Deste modo, entre Junho de 2013 e Dezembro de 2014, todos os trabalhadores que auferiam antes um subsídio de refeição diário no montante de € 11,33, viram em Dezembro de 2014 a sua RB aumentar num total de € 52,47.
17-Em Julho de 2013, houve um aumento salarial de 1,1% para todos os trabalhadores com RB inferior a € 2.500.
18-O A., que nessa data auferiria € 2.317,90, deveria ter sido aumentado a sua RB em 1,1%, e portanto veria refletido na sua RB um aumento de € 25,69, desde 20/07/2013.
19-A Ré só mais tarde é que detectou que não havia actualizado a RB do A. aquando da sua reintegração e pagamento das retribuições intercalares em Janeiro de 2017.
20-Em 20/06/2018, procedeu à actualização retroactiva da RB do A. até essa mesma data, procedendo ao pagamento de todas as actualizações.
21-Em 20/06/2018, a Opoente pagou ao A. os aumentos sucessivos da sua RB nos seguintes moldes:
- Em Junho de 2013: pagou € 17,49 correspondente à integração do primeiro terço do subsídio de refeição;
- Entre Julho de 2013 e Dezembro de 2013: pagou um total de € 43,13 correspondente aos €17,49 acrescidos do aumento de 1,1%, ou seja, € 25,69;
- Entre Janeiro de 2014 e Novembro de 2014: pagou um total de € 60,67, que se trata dos supra mencionados € 43,13, acrescidos de mais um terço do subsídio de refeição, ou seja, € 17, 49;
- A partir de Dezembro de 2014 até à actualidade: pagou € 78,16, que corresponde aos supra mencionados € 60,67, acrescidos de mais um terço do subsídio de refeição, ou seja, € 17, 49.
22-Assim, em 20.06.2018 a Ré procedeu ao pagamento ao autor da quantia total ilíquida de € 5.117,19 pelas proveniências constantes do recibo de vencimento de fls.1645 a 1649 vs. cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
23-A ré procedeu á entrega à Autoridade Tributária da quantia de € 49.908,00 em Janeiro de 2017, e da quantia de € 2.302,00 em Junho de 2018.
24-Em 20/01/2017 a Ré deduziu às retribuições intercalares, após desconto dos impostos e obrigações legais que recaem sobre os rendimentos do A., o montante de € 38.574,72, correspondente ao total auferido pelo A. a título de Subsídio de Desemprego.
25-Em 01/01/2012, venceram-se 25 dias de férias ao A.
26-O A. em percebeu, em 20/04/2012, o montante de € 4.006,51, referente a 35 dias de férias vencidas e não gozadas, que se reconduzem a: 6 dias de férias referentes ainda ao ano de 2011, acrescidos de 25 dias de férias vencidos no dia 01/01/2012, e mais 4 dias de férias aos proporcionais do ano de 2012.
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Questão prévia - da extemporaneidade do recurso
Alega a R. que “a liquidação da sentença em condenação genérica que não dependa de simples cálculo aritmético efectua-se em incidente da acção declarativa e não da acção executiva, antes e depois da reforma do CPC (art.º 47.º, n.º 5 do CPC de 1995 e 704.º, n.º 6 do CPC de 2013) (…) Assim, o prazo para a parte recorrer da decisão final nele proferida em processo laboral é de 10 e não de 30 dias, ex vi dos art.º 79.º-A, n.º 2, al. i) e 80.º do CPT e 644.º, n.º 1, al. a) do CPC de 2013 (não sendo aplicável o art.º 98.º-A do CPT e 638.º, n.º 1 do CPC de 2013).” – Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de março de 2016, no processo n.º 3436/07.2TTLSB-A.L1-4, in www.dgsi.pt. Tendo as partes sido notificadas da sentença por notificação Citius expedida em 5.10.2020 e a R. interposto recurso em 9.11.2020, não deverá admitir-se o recurso, por extemporâneo".

Vejamos.

Resulta dos autos que, tendo transitado a decisão final declarativa proferida nos autos, após acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, foi instaurado incidente de liquidação, no qual foi proferida a sentença ora posta em crise, em 01.10.20.

Dessa sentença foram notificadas as partes por notificação via Citius de 5.10.20, a qual se considera efetuada em 8.10.20 (art.º 248/1, CPC).

A R. veio recorrer no dia 9.11.20, ou seja, no 30º dia.

Cabe, pois, apreciar e decidir.

Tem-se entendido que a decisão de que se recorre é posterior à decisão final proferida no autos, e, portanto, aplica-se o prazo de 15 dias (por todos cfr. a decisão singular referida pela Relação de Lisboa de 16.3.16, que decidiu que "I–A liquidação da sentença em condenação genérica que não dependa de simples cálculo aritmético efectua-se em incidente da acção declarativa e não da acção executiva, antes e depois da reforma do CPC (art.os 47.º, n.º 5 do CPC de 1995 e 704.º, n.º 6 do CPC de 2013). II–Assim, o prazo para a parte recorrer da decisão final nele proferida em processo laboral é de 10 e não de 30 dias, ex vi dos art.os 79.º-A, n.º 2, al. i) e 80.º do CPT e 644.º, n.º 1, al. a) do CPC de 2013 (não sendo aplicável o art.º 98.º-A do CPT e 638.º, n.º 1 do CPC de 2013)", que a R. cita, e a da Relação de Guimarães de 23-05-2019, que concluiu que "Da decisão final proferida em incidente de liquidação em processo laboral cabe recurso de apelação, nos termos do art. 79.º-A, n.º 2, al. i) do Código de Processo do Trabalho, o qual, nos termos do art. 80.º, n.ºs 2 e 3 do mesmo diploma, deve ser interposto no prazo de 10 dias, ou, se o mesmo tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, no prazo de 20 dias".

As decisões posteriores à decisão final caraterizam-se por uma certa pontualidade, quer dizer, abrangem questões pontuais, que não se confundem com o julgamento da ação ou procedimento (neste sentido, o melhor exemplo que os comentadores encontram são as questões incidentais surgidas nos procedimentos cautelares após a decisão tida por final (cfr. Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6ª ed., nota 13 ao art.º 644, Geraldes e aut., CPC Anotado, 2ª ed. nota 24 ao mesmo art.º 644).

Cumpriria averiguar se esta é uma decisão posterior à final, sabendo que há uma decisão final transitada na ação principal, de que esta liquidação constitui apenso, como incidente autónomo, com tramitação própria, nos termos dos art.º 358 e ss., CPC, no âmbito do qual foi produzida prova e efetuado julgamento.

Simplesmente, com a reforma de 2019 do Código de Processo do Trabalho (Lei n.º 107/2019, de 09/09), que colhe aplicação nos autos, o art.º 79-A, n.º 1, al. a), do CPT passou a determinar que "cabe recurso de apelação: a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente, retirando-se do art.º 80, n.º  1 e 2, sem margem para dúvidas que o prazo de apelação é de 30 dias.

Neste caso não estamos perante mero incidente para decisão de questão ou mesmo questões pontuais, mas ante um verdadeiro processado autónomo declarativo, com regras próprias e uma tramitação revestida da solenidade e complexidade necessárias à emissão da decisão. Como afirmou o acórdão da Relação de Évora de 08.2.18 (relat. Albertina Pedroso) "tratando-se de liquidação que não depende de simples cálculo aritmético, vigora para a autora o ónus de proceder à liquidação no âmbito do verdadeiro processo de declaração ulterior que o incidente de liquidação constitui (...)".

Desta sorte, o prazo aplicável é o geral de 30 dias (art.º 79-A/1/a e 80/1 e 2, este a contrario, CPT) e não de 15.
Pelo que se declara atempado o recurso.
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De Direito

A condenação liquidada abrange subsídios de refeição, face aos precisos termos da decisão a liquidar e como decorre da lei e do IRCT?

Apreciando, verificamos que a decisão a liquidar é lacónica nesta matéria, limitando-se a determinar o pagamento da retribuições intercalares.

Considerou a sentença ora recorrida:

"Dos subsídios de refeição.
A ré no cálculo das retribuições intercalares não procedeu ao pagamento dos subsídios de refeição do autor, sustentando que o subsídio de refeição não integra a retribuição, só constituindo retribuição na parte que excede os gastos normais que o trabalhador suporta com a sua alimentação quando vai trabalhar. Ademais, afirma que inexiste condenação expressa em inclusão nas retribuições intercalares dos valores referentes aos subsídios de refeição.

Embora, não nos cumpra apreciar, nesta sede, da natureza do subsídio de refeição e sua inclusão nas denominadas retribuições intercalares, não deixaremos de dizer que temos partilhado do entendimento que o subsídio de refeição se inclui no cálculo das retribuições intercalares (pela judiciosa argumentação a propósito de tal questão, veja-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Setembro de 2018, processo nº. 780/17.4T8BRR. L1 – 4ª Secção).

Atendendo à natureza do presente incidente centremo-nos, então, no teor da sentença de proferida nesta instância, relevante nesta matéria.

A referida sentença declarou a ilicitude do despedimento do autor RS.......... e condenou a Ré PT Comunicações- S.A:
1.-A reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
2.- No pagamento ao A. das quantias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao A. no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, a liquidar em incidente;

É certo que o ponto 2 do dispositivo não aludiu ao subsídio de refeição, contudo, também, é certo que não usou a expressão retribuição.

Por outro lado, a sentença proferida, em sede de fundamentação na parte relativa às consequências da declaração de ilicitude do despedimento, aduz tão só o seguinte “ Assim, não resta senão concluir pela ilicitude do despedimento e, consequentemente, nos termos do disposto nos artºs 389º, nº. 1, al. b) e 390º do CT, pela condenação da R. a reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e no pagamento das remunerações intercalares”.

A considerar, ainda, neste quadro o pedido do autor formulado a esse respeito qual seja o de pagamento das retribuições que se venceram no montante mensal base de € 2.317,90, acrescida de diuturnidades no montante mensal de € 200,48 e de subsídio mensal de alimentação mensal de € 249,26 e as vincendas que deixe de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão.

Entende-se, assim, que o dispositivo, que, nesta parte, julgou procedente a acção, ao condenar a Ré no pagamento ao Autor das quantias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, condenou a Ré no pagamento não são da remuneração base, como, também, das diuturnidades e do subsídio de refeição.

Certos que em momento algum excluiu tal atribuição.

Assiste, por conseguinte, razão ao autor, devendo a ré proceder ao pagamento dos subsídios de refeição relativos ao período de 23.03.2012 (dia seguinte ao despedimento) até ao dia 11 de Novembro de 2016 (data da reintegração).

Juros de Mora:

Pretende o Autor o pagamento por banda Ré dos juros de mora vencidos desde a data de vencimento de cada uma das prestações em falta a título de retribuições e que a ré não liquidou aquando dos pagamentos efectuados.

Neste particular, cremos que a razão está do lado da Ré. Porquanto, apesar do Autor ter peticionado a condenação da Ré no pagamento dos juros de mora vencidos desde a data de vencimento de cada uma das prestações em falta (retribuições, diuturnidades e subsídios de refeição), a sentença proferida nesta instância e confirmada nesta parte pela Relação é, totalmente, omissa neste particular. Quer na parte da fundamentação quer na parte do dispositivo.

A sentença em causa transitou em julgado, sem que alguma vez tivesse sido suscitada a omissão de pronúncia quanto ao pedido de juros. Razão pela qual não há que liquidar quaisquer juros, porquanto, inexiste condenação nesse sentido.

Isto sem prejuízo do que se verá infra aquando da liquidação dos subsídios de refeição e condenação da ré nos juros de mora em decorrência da procedência da liquidação nesse particular.

Férias não gozadas:

Pretende o Autor ser “ressarcido” (a expressão é dele) das férias não gozadas no período que mediou entre o seu despedimento e a sua reintegração. Liquidando o valor devido a esse título no total líquido de € 10.610,39. O que a Ré refuta.

A este respeito diremos que nunca o Autor formulou pedido nesse sentido e, assim, nunca tal questão foi apreciada e decidida.

Não cumprindo ao Tribunal em sede de liquidação apreciar tal questão.

Razão pela qual improcede a liquidação efectuada neste particular".

Vejamos, pois.

É difícil descortinar o sentido da sentença, dado o seu laconismo nesta parte.

No entanto, é claro que se referiu ao "pagamento das remunerações intercalares", como, aliás, impõe o n.º 1 do art.º 390 do Código do Trabalho.

Nos termos do art.º 260/2 e 1/a do Código do Trabalho, o subsidio de refeição não tem natureza retributiva, destinando-se a complementar as despesas acrescidas a que o trabalhador tem de fazer face por prestar a atividade fora de casa, e portanto não poder confecionar os seus próprios alimentos.

A lei é, neste ponto, perfeitamente clara: não é retribuição, a menos que o seu montante exceda os limites normais, caso em que existe uma retribuição encoberta.

Neste sentido, por todos, cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26.5.15, proc 373/10.7TTPRT.P1.S1 (relt Fernandes da Silva) "V - O subsídio de alimentação, embora assuma, na maioria dos casos, natureza regular e periódica, só é considerado retribuição na parte que exceda os montantes normalmente pagos a esse título, sendo mister para o efeito, por isso, a alegação e prova, por banda do trabalhador, de que o mesmo excedia os valores que normalmente eram pagos a esse título; e da Relação de Lisboa de 25-09-2013, proc. 729/10.5TTVFX.L1-4 (relt Filomena Manso): "II - No cálculo dos salários intercalares, devem ser incluídas as comissões de venda mas não o subsídio de refeição. III - Os juros de mora são devidos no caso do retardamento culposo por parte do devedor, sendo necessário, para que este se verifique, que a dívida seja certa, líquida e exigível, preconizando o n.º 1, do art. 805, n.º 1, do CC que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido interpelado judicial ou extrajudicialmente para cumprir, acrescentando o n.º 3 que, se o crédito for ilíquido, não há mora, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor"; da mesma Relação (e relt.), de 7.10.15, proc. 1016/14T8SNT.L1-4: "V - No cálculo dos salários intercalares não deve ser incluído o subsídio de refeição, face ao disposto no art. 260,nº2 do CT, a menos que o trabalhador comprove que a prestação que lhe é paga excede as despesas normais por ele efectuadas a esse título, por se tratar de factualidade constitutiva do direito de que se arroga (art. 342, nº1 do CC)"; ainda da Relação de Lisboa de 13.1.10, proc 9/07.0TTSNT.L1-4 (relt. Natalino Bolas): "I - Não constituindo retribuição, não é devido o pagamento do subsídio de refeição no período em que o trabalhador se encontra preventivamente suspenso no decurso do procedimento disciplinar, ao contrário do que acontece com o prémio de produtividade".

Muito claramente não tem caráter retributivo um subsidio de refeição fixado em 2013 em 8,15 €, quantia nada exagerada para suportar o preço (ou mesmo que só parte dele) de uma refeição (esta apreciação é feita em termos inter-subjetivamente válidos, perante as despesas de um trabalhador padrão, e não face aos seus gastos em concreto, mais comprimidos ou mais liberais).

Diz o A.: mas há o IRCT, no qual o subsídio de refeição devido ao Apelado constitui um “valor padrão”, tanto que se mostra definido rigidamente pela CCT aplicável (Cfr. Factos Provados n.º 11 e 12); Ou seja, o seu pagamento não se mostra justificado pelo acréscimo de despesas que o Apelado, individualmente, suporta com a sua alimentação nos dias de prestação de trabalho, sendo um valor que é pago porque justificado pela prestação de trabalho em si mesma; Tanto assim é que, conforme a própria Apelante reconheceu nos art.º 39.º a 43.º da sua Oposição e o Tribunal a quo considerou como provado sob os n.º 11 a 18, em 2013, em consequência de negociação coletiva, foi decidida a diminuição nominal do valor do subsídio de refeição do valor do subsídio de refeição de € 11,33, para € 8,15, com a sua consequente integração na retribuição base da diferença entre o valor do subsídio de refeição diário e o valor superior auferido pelos trabalhadores em 1 de junho de 2013, nos termos do n.º 1, da Cláusula 101.ª, do ACT.

Neste ponto de duas uma: ou o A. se refere à diferença entre o subsidio de refeição fixado em 2013 por IRCT publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º32, 29/08/2013 (mas que o quadro do anexo VI determinou que a alteração do subsidio de refeição de 11,33 € para 8.15 € produziria efeitos a partir de 3.6.2013 - tendo ficado assente nos factos provados a data de 1.6.13), ou seja, ao montante de 3,18 € entre 2012 e 31.5.2013 (porque foi esse montante que as partes usando a autonomia coletiva qualificaram como retribuição, aliás, básica), ou então é manifesta a sua falta de razão, porque aquilo que as partes não reconduziram à retribuição é subsidio de refeição (não retributivo), nada dispondo em contrário o IRCT (que até faz depender o pagamento da prestação de um determinado numero de horas de atividade diária). Por outro lado, e no que toca a partir de junho de 2013, ficou assente que a R. efetuou e pagou as atualizações sucessivas.

Desta sorte, o que importa é liquidar aquele montante no referido período (ano de 2012 e até fim de maio de 2013, 298 dias úteis x 3,18), o que perfaz, seguindo as contas da sentença, 947,64 €.

Assim, face à qualificação operada em sede de contratação coletiva, e ao disposto no art.º 3º/1 do Código do Trabalho, essa diferença tem de ser qualificada, mesmo retroativamente, como retributiva, pelo que se liquida o aludido montante.
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Alega a R. que o Tribunal recorrido não descontou as férias e nem os dias 24 de dezembro e o de aniversário do trabalhador, respondendo o trabalhador que se trata de questão nova.

E é efetivamente, sendo certo que o sistema de recursos visa reapreciar decisões e não questões novas. De resto, estamos perante um incidente de liquidação, pelo que não surpreende ninguém que no seu termo o tribunal declare os montantes em divida face aos elementos disponíveis.

De todo o modo, esta objeção não tem hoje qualquer  pertinência, até porque em 2012 e 2013 apenas estão em causa dez e cinco meses, respetivamente.
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Dos juros

A R. insurge-se quanto à condenação em juros no que toca às quantias liquidadas na sentença.

Mas sem razão, porquanto se trata de obrigações de vencimento em prazo certo, como nota bem a sentença (art.º 805/2/a, CC).

Ou seja, sobre as quantias vencidas em cada mês supra referido de 2012 e 2013, acrescem juros de mora nos termos cominados na sentença.
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III.–Decisão

Termos em que o Tribunal julga o recurso parcialmente procedente e consequentemente:
a)-liquida o montante a pagar pela requerida ao requerente a retribuição em falta relativa ao período de março de 2012 a maio de 2013 inclusive, no montante total ilíquido de (novecentos e quarenta e sete euros e sessenta e quatro cêntimos) 947,64 €, havendo que deduzir o valor relativo à contribuição para a Segurança Social a cargo do A. e a retenção na fonte, nos termos legais;
sobre cada uma das frações de 3,18 € em falta acrescem os juros de mora calculados à taxa supletiva, para os juros civis, actualmente de 4% ao ano, vencidos e vincendos desde a data de vencimento de cada uma das prestações em falta até integral pagamento (cfr. artigos 804º, nº. 2, 806º, nº. 1, 805º, nº. 1 e 559º todos do Código Civil e Portaria 291/2003, de 08.04). 
Custas do recurso e da ação pelas partes na proporção do vencido.


Lisboa, 14 de julho de 2021



Sérgio Almeida
Francisca Mendes
Celina Nóbrega

(tem voto de concordância da Srª Desembª Celina Nóbrega)