Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
585/13.1TCFUN-A.L1-7
Relator: LUIS FILIPE PIRES DE SOUSA
Descritores: PROVA
DOCUMENTO
PRESUNÇÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/17/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I.–Constitui fundamento autónomo de rejeição da junção de documento em recurso de apelação a circunstância de, com tal junção, os apelantes pretenderem deduzir, extemporaneamente, a contradita de testemunhas.

II.–Para a prova da genuinidade da assinatura aposta num aval, além da prova pericial, podem contribuir decisivamente presunções judiciais, máxime os indícios responsio, character e evocatio, acionados pelos depoimentos testemunhais prestados.

III.–Em processo civil, o standard da prova é o da probabilidade prevalecente, segundo o qual deve escolher-se a hipótese fáctica que receba apoio (grau de confirmação lógica) relativamente maior dos elementos de prova conjuntamente disponíveis.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


Maria O... S... ... ..., Maria I... ... ..., Eduardo ... ... ..., Catarina F... ... ..., executados, na qualidade de herdeiros de Henrique ... ..., deduziram embargos à execução interposta por NOVO BANCO, S. A., peticionando que seja se julgue improcedente por falta de legitimidade passiva e se assim não se entender, que a veracidade da assinatura seja submetida e certificada pelos peritos da polícia científica, tudo com as legais consequências.

Alegam para o efeito que são legítimos herdeiros de Henrique ... ..., o qual faleceu em termos que descrevem, o qual terá subscrito o título dada à execução. Não tendo sido partilhada a herança, apenas esta e não os oponentes podem ser parte na execução. A sucessão se verificou antes da instauração da ação executiva. Ainda que assim não se entenda, nunca participaram em vida do seu marido e pai nos negócios deste ou das sociedades que administrava, pelo que não sabem se foi este que assinou o título dado à execução. Não reconhecem a assinatura aposta no verso da livrança como sua, pelo que impugnam a veracidade da mesma, devendo ser sujeita a relatório pericial. Mas ainda que a assinatura fosse legítima, a mesma apresenta menção de caução, pelo que a invocação da causa da obrigação no requerimento inicial era condição necessária para que a mesma possa ser impugnada, deveria ter sido junto o pacto de preenchimento. O negócio jurídico em causa está sujeito a requisitos de forma. Excecionam o preenchimento abusivo da livrança e em consequência a nulidade do suposto aval em causa.

A exequente apresentou contestação, impugnando a matéria da oposição e pugnando pela sua improcedência. Enuncia o contrato na base da subscrição e assinatura da livrança dada à execução, o qual descreve. Impugna o desconhecimento alegado quanto aos negócios em curso, visto que qualquer das oponentes já tinham intervenção e poder decisório nos negócios, nomeadamente da Madeira Rent ora em causa. Acresce que uma das oponentes foi casada com um dos sócios e avalistas, que identifica. As oponentes são parte legítima, sendo que já foi celebrada escritura de habilitação de herdeiros, tendo alegado a sucessão no requerimento executivo. O título em causa é uma livrança, pelo que este é a própria causa de pedir. É falso que a livrança tenha sido abusivamente preenchida ou em violação do pacto de preenchimento, sendo que este pacto consta do contrato, do qual decorre autorização para o preenchimento do título conforme sucedeu. Alega que face ao incumprimento interpelou a subscritora, dando conhecimento a todos os intervenientes, entre os quais os ora oponentes, o que também fez aquando do preenchimento da livrança.

Foi proferido despacho saneador em que se aferiram positivamente todos os pressupostos processuais relevantes, julgando-se improcedente a exceção de ilegitimidade suscitada.

Após julgamento, foi proferida sentença que julgou a oposição improcedente por não provada, determinando o prosseguimento da execução (fls. 187).
*

Não se conformando com a decisão, dela apelaram os requerentes, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:

«Da Violação dos Arts. 6.º, n.º 1, 411.º, 526.º, n.º 1, e 547.º, todos do Código de Processo Civil:
1.-Determinam os Arts. 6.º, n.º 1, 411.º, 526.º, n.º 1, e 547.º, todos do CPC, que, oficiosamente ou a requerimento, incumbe ao Meritíssimo Juiz Julgador o dever de procurar a verdade material.
2.-Ora, no caso vertente, os Recorrentes peticionaram a inquirição como testemunha de Rosa C..., em consequência do depoimento operado pelas testemunhas Marinela G... e Sara A... da S..., que afirmaram ter tido reuniões com aquela pessoa e parte dos Recorrentes, reuniões essas onde se discutiu – alegadamente – o título executivo.
3.-Tal inquirição foi indeferida por irrelevante, sendo certo que na fundamentação da douta Sentença, o Ilustre Tribunal a quo referiu expressamente as tais reuniões em crise.
4.-Não é possível assim olvidar que estamos perante matéria essencial para a descoberta da verdade material nos autos, sendo certo que não foram realizadas todas as diligências razoáveis para a descoberta dessa mesma verdade.
5.-Em consequência, a douta Sentença a quo violou os Arts. 6.º, n.º 1, 411.º, 526.º, n.º 1, e 547.º, todos do CPC, pelo que, com a devida vénia, deverá este Venerando Tribunal isso reconhecer, ordenando em consequência que os autos desçam à 1.ª Instância, para que aí se produza prova testemunhal essencial para a descoberta da verdade, mas indeferida, correspondente à inquirição de Rosa C..., proferindo-se, a final, Sentença que tenha por base todos os factos e provas que sejam legalmente admissíveis.
Do Incorreto Julgamento do Facto 9 da Matéria Julgada como Provada:
Sem prescindir do que supra se escreveu,
6.-No entendimento dos Recorrentes, com a devida vénia, não foi produzida prova suficiente para sustentar como provado:
9. A assinatura que consta no verso da livrança referida em 1., junto da expressão “Bom para aval à firma subscritora”, foi aposta por ... Henrique ....Pois,
7.-A testemunha Marinela C... S... G... não assistiu à assinatura do título executivo, nem do pacto de preenchimento da livrança, pois à data dos factos ainda não era trabalhadora do Recorrido – expressamente se remete para a prova supra melhor identificada.
8.-Da mesma forma, a testemunha Sara A... F... M... S... também não assistiu à assinatura do título executivo, nem do pacto de preenchimento da livrança, pois essas não são as suas funções na estrutura do Recorrido – expressamente se remete para a prova supra melhor identificada.
9.-Do mais que estas testemunhas referiram, nomeadamente quanto à realização de reuniões com os Recorrentes, com a devida, fica inquinado pela impossibilidade de contraposição com a versão dos demais intervenientes nessas reuniões, em consequência de decisão do Ilustre Tribunal a quo que supra já se recorreu.
10.-De igual forma, a testemunha João ... P... de O... não viu Henrique ... ... a assinar o título executivo ou o pacto de preenchimento, e por trabalhar em Lisboa e aquele viver e trabalhar maioritariamente no Funchal sequer estava permanente com Henrique ... ... – expressamente se remete para a prova supra melhor identificada.
11.-Acrescentando-se ainda, quanto a esta testemunha, que a mesma não tem uma posição isenta ou imparcial em relação aos Recorrentes, como expressamente o mesmo declara no seu depoimento, devendo portanto todo o seu depoimento ser tido em consideração sob essa luz.
12.-Continuando, o depoimento da testemunha Paulo S... da L... S..., recorrendo à argumentação que consta da Sentença, foi meio de prova fulcral para assegurar que Henrique ... ... após pelo seu próprio punho a assinatura no título executivo.
13.-Todavia, analisando o depoimento de tal testemunha, verificámos que é bem menos contundente em tal asseveração, referindo por norma ser ele a levar os documentos para ser assinados por Henrique ... ..., não se recordando se especificamente tinha assistido a Henrique ... ... a assinar o título executivo, tendo chegado a essa conclusão por ver a sua rúbrica no documento; rubrica essa que sempre existiria em consequência das funções que essa testemunha exercia; pelo que a razão de ciência invocada pela testemunha não sustenta a sua própria conclusão – expressamente se remete para a prova supra melhor identificada.
14.-Remetendo-se ainda para o que supra se escreve quanto ao requerimento de junção de prova documental na presente fase processual.
15.-Concluindo-se a prova testemunhal, Paulo P... J... P..., tal como consta da douta Sentença sub judice, também não assistiu à assinatura. Sendo que o seu depoimento se resume, grosso modo, à generalidade e à normalidade, o que tendo em conta a excecionalidade dos autos vertentes é sempre de dúvida aplicação e equiparação – expressamente se remete para a prova supra melhor identificada.
16.-Resta assim proceder à análise da prova pericial realizada nos autos, que como resulta dos autos obteve o mais baixo grau de “pode ter sido”.
17.-A acrescer, o exame desenvolvido foi-o com limitações, como os Srs. Peritos referem, nomeadamente por a assinatura de Henrique ... ... ser “parcialmente ilegível”, e de difícil observação por ter sido “aposta sobre um carimbo”, pelo que a prova testemunha se mostra como essencial para sustentar qualquer convicção nos presentes autos.
18.-Ora, tudo compulsado, não se pode olvidar que nos termos do Art.º 374.º do CC, no caso vertente, caberia ao Recorrido fazer a prova do facto que alegava – i. e., a veracidade da assinatura de Henrique ... ... aposta no título executivo.
19.-A prova pericial produzida não é suficiente, por si só, para apresentar uma definição factual aos autos, e a prova testemunhal posteriormente produzida também é insuficiente pois peca sempre pelo desconhecimento direto e pessoal dos factos em discussão. Pois, resumindo-se a inquirição das testemunhas à pergunta: viu Henrique ... ... a assinar na posição de avalista o título executivo? Nenhuma testemunha, com seriedade e certeza, pode afirmar que sim.
20.-Isto é tão mais relevante quando estamos perante um Exequente que não é um amador ou minimamente desconhecer do trato bancário, financeiro ou jurídico. O Exequente era à data dos factos em crise o BANCO ESPÍRITO SANTO, S. A., que se tratava pura e simplesmente da segunda ou terceira maior entidade bancária a operar em Portugal, com décadas de experiência, a fazer um negócio de valores substanciais, tendo o negócio in casu sido conduzido por altos quadros, logo peritos na matéria.
21.-Concluímos assim, e com a devida vénia, que o ponto 9. do elenco dos factos provados deverá ser revogado e substituído pelo seguinte, que melhor reflete o ónus e a prova produzida:
9. A assinatura que consta no verso da livrança referida em 1., junto da expressão “Bom para aval à firma subscritora”, não foi aposta por ... Henrique ....

NESTES TERMOS:
E nos melhores de Direito que certamente suprirá, requer-se a V. Ex.cias que se dignem a julgar procedente o presente recurso de apelação e, em consequência, a:
A)-Ordenar que os autos desçam à 1.ª Instância, para que aí se produza prova testemunhal essencial para a descoberta da verdade, mas indeferida, correspondente à inquirição de Rosa C..., proferindo-se, a final, Sentença que tenha por base todos os factos e provas que sejam legalmente admissíveis;
B)-Caso V. Ex.cias assim não o entendam, subsidiariamente, revogar a douta Sentença recorrida, substituindo-a por outra que determine a procedência dos embargos de executado.»

Contra-alegou o Novo Banco propugnando pela improcedência da apelação, argumentando que as apelantes não observaram o disposto no Artigo 640º do Código de Processo Civil na parte atinente às passagens das gravações, razão pela qual o recurso nessa parte deve ser rejeitado (fls.232).

QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[2]

Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes:
a.- Admissibilidade de inquirição de nova testemunha;
b.- Admissibilidade junção de documento com a apelação;
c.- Impugnação da matéria de facto (facto provado sob 9);
d.- Reapreciação de mérito.

Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença sob recurso considerou como provada a seguinte factualidade:
«1.-Na execução comum para pagamento de quantia certa de que estes autos são um apenso, instaurada pela embargada, foi dada à execução uma livrança subscrita por Madeira Rent – Aluguer de Veículos Automóveis, Lda., no valor facial de 631.068,96€, com data de emissão de 26.05.2004 e de vencimento de 18.10.2013, constando no verso junto à expressão “Dou o meu aval à firma subscritora” a assinatura, entre outras, de ... Henrique ..., cujo teor aqui se dá por reproduzido e integrado para os devidos efeitos, não paga integralmente na data de vencimento nem em momento ulterior.
2.-A referida livrança foi entregue para garantia e segurança do cumprimento das obrigações da "MADEIRA RENT - Sociedade de Aluguer de Veículos Automóveis, Lda. ", emergentes do contrato de financiamento, denominado Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente, n.º 5750 0178 2006, celebrado com a exequente em 26 de Maio de 2004 e sucessivamente renovado e modificado quanto a juros e comissões de gestão até 2012.
3.-Consta da Cláusula 7, sob a epigrafe Garantias, do contrato, que "para garantia do bom pagamento de todas as responsabilidades que advêm para o Cliente do não cumprimento pontual e integral de qualquer obrigação para ele resultante do presente contrato, nomeadamente, e entre outras, o reembolso de capital, o pagamento de juros remuneratórios e moratórios, despesas judiciais e extrajudiciais, honorários de advogados e custas, bem como saldos devedores de quaisquer contas bancárias de que o Cliente seja titular ou contitular que tenham como origem obrigações resultantes para este do presente contrato, o Cliente entregou ao BES uma livrança devidamente subscrita e avalizada pelo (s) Garante (s), podendo o BES acioná-la ou descontá-la caso se verifique o incumprimento das obrigações assumidas.
4.-E que “o BES fica autorizado a preencher a referida livrança nos seguintes termos: a) data de vencimento - posterior ao vencimento de qualquer obrigação ou obrigações que resultem para o Cliente da celebração do presente contrato; b) valor - qualquer quantia devida pelo Cliente ao abrigo do presente contrato. 3. O Garante aceita o acordo de preenchimento acima estabelecido e avaliza a livrança nos seus precisos termos."
5.-No âmbito do contrato supra mencionado e por ordem expressa da "MADEIRA RENT – Sociedade de Aluguer de Veículos Automóveis, Lda.", a exequente disponibilizou a esta o montante total de € 600.000,00, na conta à ordem n.º 5750 0178 2006, tal como previsto nos ns.º 1 e 2 da respetiva Cláusula Terceira do contrato.
6.-A partir de Abril de 2013, a "MADEIRA RENT - Sociedade de Aluguer de Veículos Automóveis, Lda.", deixou de cumprir com o pagamento das prestações acordadas.
7.-Face ao incumprimento, a exequente remeteu carta à MADEIRA RENT - Sociedade de Aluguer de Veículos Automóveis, Lda., em 11 de Junho de 2013, para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento do valor em divida dando conhecimento de tal comunicação a todos os intervenientes, entre os quais a aqui Opoente, Maria O... S... ... ..., na qualidade de cabeça de casal da herança de Henrique ... ..., entretanto já falecido.
8.-E por carta datada de 18.10.2013, a exequente informou a subscritora e avalistas (Henrique ... ... na pessoa da sua cabeça de casal) que havia procedido, nos termos legais e acordados, ao preenchimento da livrança pelos valores então em divida e ai discriminados e que a mesma se encontrava a pagamento até 16/11/2012.
9.-A assinatura que consta no verso da livrança referida em 1., junto da expressão “Bom para aval à firma subscritora”, foi aposta por ... Henrique ....»

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Admissibilidade de inquirição de nova testemunha.

Pretendem os apelantes que o Tribunal da Relação ordene a descida dos autos `a primeira instância para que aí seja inquirida como testemunha Rosa C..., reputando tal inquirição como essencial para a descoberta da verdade.
Ora, a audiência de julgamento decorreu no dia 24.10.2016 e, no decurso da mesma, os apelantes requereram a inquirição da testemunha Rosa C..., invocando para tal o regime dos artigos 7º, nº1 e 411º do Código de Processo Civil bem como o facto da intervenção de tal testemunha ter sido referida no âmbito dos depoimentos das testemunhas Sara A... da S... e Marinela G....
No decurso da audiência, tal requerimento foi objeto de despacho de indeferimento, consoante resulta de fls. 179.
Pretendendo os apelantes recorrer de tal despacho, deviam fazê-lo no prazo de quinze dias nos termos das disposições conjugadas dos Artigos 638º, nº1 e 644º, nº2, al. d), do Código de Processo Civil. Tal prazo findou em 14.11.2016. Porém, apenas em 14.2.2017 e com as alegações da decisão final, é que os apelantes pretenderam impugnar tal despacho.
Termos em que não se admite o recurso neste segmento por ser intempestivo.

Admissibilidade da junção de documento.
Com as suas alegações de recurso, os apelantes juntam um documento, alegadamente correspondente a um mail remetido por Paulo P... e Paulo S... (fls. 203 v.).

Fundamentando o pedido de junção, alegam os apelantes:
«A junção desde documento não foi possível em momento anterior por não se tratar de informação que os Recorrentes tivessem conhecimento direto pois, à data dos factos, não tinham o governo executivo da sociedade em causa, nem exerciam as funções de direção financeira da sociedade em causa (funções que contendem com a razão de ser do próprio documento); e ainda porque tal demonstração factual só se mostra necessária em função do
depoimento da testemunha Paulo S... (que acontece pela primeira e única vez em audiência de julgamento) que apresenta o facto original de ter assistido a todas as assinaturas, e de o Ilustre Tribunal a quo ter dado relevância a tal afirmação na douta Sentença proferida, logo o único momento processual passível de permitir a junção do documento em causa é o presente recurso de apelação.»

O apelado opõe-se à junção, argumentando que os apelantes não alegam e/ou provam que apenas agora tiveram acesso a tal documento, sendo certo que a junção do mesmo não resulta de facto superveniente ou mesmo que a decisão proferida em primeira instância se tenha baseado em meio probatório não oferecido pelas partes.

Apreciando.

Nos termos do Artigo 651º, nº1, do Código de Processo Civil, «As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.» Por sua vez, o Artigo 425º do Código de Processo Civil dispõe que «Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento

No que tange à impossibilidade de apresentação anterior, afirmam Lebre de Freitas et al, Código de Processo Civil Anotado, 2º Vol., Coimbra Editora, 2001, p. 426, que «Constituem exemplos de impossibilidade de apresentação o de o documento se encontrar em poder de terceiro, que só posteriormente o disponibiliza, de a certidão de documento arquivado em notário ou outra repartição pública, atempadamente requerida, só posteriormente ser emitida [superveniência objetiva] ou de a parte só posteriormente ter conhecimento da existência do documento [superveniência subjetiva]. Nos dois primeiros casos, será necessário que se tenham esgotado anteriormente os meios dos arts. 531 a 537 [atuais Artigos 432º a 437º do Código de Processo Civil].» Rui Pinto, Notas ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 2014, p. 265, afirma que: «Os documentos apresentados referem-se a factos já trazidos ao processo, nos articulados normais ou nos articulados supervenientes (cf. artigos 588º e ss.). Portanto, a regra é a de que os documentos supervenientes não trazem ao processo factos supervenientes.»

Quanto à necessidade da junção em virtude do julgamento da primeira instância (Artigo 651º, nº1), «a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da ação (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em primeira instância. O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objeto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida» - Antunes Varela et al, Manual de Processo Civil, 2ª Ed., pp. 533-534. Ainda na doutrina, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, pp. 184-185, afirma que: «Podem ainda ser apresentados documentos quando a sua junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, máxime quando este se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo. / A jurisprudência anterior sobre esta matéria não hesita em recusar a junção de documentos para provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado.» rcia objetiva]alves Rocha, 174/08, que «(..»is ou nos articulados supervenientes ( cf. Refere-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.9.2012, Gonçalves Rocha, 174/08, que «(…) a junção de documentos às alegações da apelação só poderá ter lugar se a decisão da 1ª instância criar pela 1ª vez a necessidade de junção de determinado documento, quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação as partes não contavam.»[3] Visa-se abranger as situações que - pela fundamentação da sentença ou pelo objeto da condenação - tornaram necessário provar determinados factos, cuja relevância a parte não podia, razoavelmente, ter em consideração antes da decisão ter sido proferida.[4]

O regime do Artigo 651º, nº1, não abrange a hipótese da parte pretender juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em 1ª instância.[5]Dito de outra forma, não é admissível a junção, com a alegação de recurso, de um documento potencialmente útil à causa ab initio e não apenas após a sentença,[6] ou seja, não é admissível a junção de documentos para provar factos que já antes da decisão a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado.[7]

Ora, desde logo é manifesto que os apelantes não oferecem qualquer prova da superveniência subjetiva do documento. Por outro lado, é patente que a fundamentação da sentença não tornou necessária a prova de factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida. A razão de ciência das testemunhas em articulação com o facto provado sob 9 constituía matéria que, ab initio, relevava para a decisão de mérito. Note-se que com a pretendida junção do documento, os apelantes pretendem – em primeira linha - atacar a razão de ciência das testemunhas Paulo Pereira e Paulo Silva, nos segmentos dos respetivos depoimentos em que estes se pronunciaram sobre assinaturas apostas por Henrique ... ... (fls.199 v.). Ou seja, com a referida junção o que os apelantes pretendem fazer é deduzir uma contradita de tais depoimentos (artigo 521º do Código de Processo Civil) só que o fazem intempestivamente porquanto a contradita deve ser deduzida quando termina o depoimento (artigo 522º, nº1, do Código de Processo Civil).
Termos em que não se admite a junção do documento.

Da impugnação da matéria de facto.
Pretendem os apelantes que o facto provado sob 9 (“A assinatura que consta no verso da livrança referida em 1., junto da expressão “Bom para aval à firma subscritora”, foi aposta por ... Henrique ...” passe a ter a seguinte redação: “A assinatura que consta do verso da livrança referida em 1., junto da expressão “Bom para aval à firma subscritora” não foi aposta por ... Henrique ....”
Sustentando a sua pretensão, os apelantes invocam segmentos – que transcrevem – dos depoimentos prestados pelas testemunhas Marinela G..., Sara S..., João O..., Paulo S..., sem que – contudo – indiquem as passagens da gravação em que constam tais segmentos de depoimentos.
O apelado opõe-se à admissibilidade da impugnação da matéria de facto, invocando que os apelantes não cumpriram o ónus do Artigo 640º, nº2, al. a), do Código de Processo Civil.

Decidindo.

Nos termos do Artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil,
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)-Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)-Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)-A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

No que toca à especificação dos meios probatórios, incumbe ainda ao recorrente «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).

No que tange à interpretação desta al. a) do nº2 do Artigo 640º não existe uniformidade por parte do Supremo Tribunal de Justiça. Assim, no sentido de uma interpretação mais literal do preceito foram proferidas designadamente as seguintes decisões:
Não cumpre o ónus do art. 640º, nº2, al. a), do Novo Código de Processo Civil, o recorrente que, nas alegações de apelação, invoca diversos depoimentos testemunhais, cujo teor, hora de início e termo da gravação transcreve, mas não indica com exatidão as passagens da gravação em que o recurso se funda (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.11.2015, 2443/11, Sumários);

Não cumpre o disposto no art. 640º, nº2, al. a), do Novo Código de Processo Civil, o recorrente que, na impugnação da matéria de facto, se limite a juntar a transcrição de todos os depoimentos prestados e a indicar o início e o fim de cada uma delas, ao invés de identificar com exatidão das passagens dos vários depoimentos fundamentadoras das alterações pretendidas (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.3.2016, 407/10, Sumários).

–Apelando aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, numa interpretação mais permissiva da norma foram proferidas nomeadamente as seguintes decisões:
Se a falta de indicação exata das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório nem o exame pelo Tribunal da Relação, a rejeição do recurso com tal fundamento constituirá solução excessivamente formal e sem justificação razoável (cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22.9.2015, Pinto de Almeida, 29/12, de 29.10.2015, Lopes do Rego, 233/09);
Na verificação do cumprimento do ónus de alegação previsto no art. 640º do Código de Processo Civil, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28.4.2016, 1006/12);
No que respeita ao requisito previsto no nº2, al. a) do art. 640º, apesar da letra do preceito, justifica-se alguma maleabilidade na aplicação da cominação, em função das especificidades do caso, com relevo, nomeadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.1.2016, 409/12, Sumários).

No caso em apreço, a audiência decorreu durante um dia, sendo nesse dia inquiridas todas as testemunhas. Nesta precisa medida, temos como mais curial a adoção da postura mais permissiva, relevando a irregularidade dos apelantes não terem cumprido textualmente o requisito imposto na al. a) do nº2 do Artigo 640º do Código de Processo Civil.

O tribunal a quo fundamentou a decisão de facto nos seguintes termos:
«Para resposta da forma supra, o Tribunal tomou em consideração todas as provas produzidas e analisadas em audiência de julgamento, formando a sua convicção, fundamentalmente, na conjugação do resultado do exame de escrita, em associação com os demais elementos constantes dos autos e no depoimento das testemunhas ouvidas.
A questão central nos presentes autos reporta-se efetivamente à assinatura da livrança pelo falecido  Henrique ... ....
Foi efetuado exame pericial à letra e assinatura deste, o qual considerou como “pode ter sido” a verificação da hipótese de a escrita ser do punho deste.
A este nível foi fundamental o depoimento de Paulo S..., funcionário bancário da exequente e gestor da subscritora desde a abertura da conta junto desta, o qual acompanhou a subscrição do contrato e da livrança em causa. Esta testemunha foi pessoalmente às instalações do grupo e recolheu as assinaturas, mais concretamente, a de Henrique ... ....
O descrito foi confirmado e reafirmado pela testemunha Paulo Pereira, à data funcionário da executada, o qual, apesar de não ter presenciado a assinatura, participou na negociação com a exequente e acompanhando os termos do contratado, tendo tido conhecimento da conclusão do negócio. Recordava-se, assim, o contrato firmado em causa, na base da livrança, com aval pessoal de Henrique ... ..., o que, segundo afirmou, constituía à data um dos modos usuais de garantia dos contratos bancários que a empresa subscritora e as demais empresas do grupo recorriam e que fruto da credibilidade de que Henrique ... ... era o bastante para a concessão dos financiamentos. Este referiu ainda o acompanhamento que Henrique ... ... efetuava às responsabilidades assumidas, nomeadamente por consulta às responsabilidades pessoais junto do Banco de Portugal e dos mapas mensais que a testemunha efetuava e entregava ao mesmo.
Para além da forma desprendida como depuseram, merecendo como tal credibilidade, em concreto a testemunha Paulo Pereira, recordava-se do contrato em causa por ter sido uma das primeiras operações que efetuaram com a exequente, com a qual não tinham relação estabelecida. Do descrito firmámos, pois, convicção acerca da veracidade do declarado.
Estes elementos foram também articulados com o descrito pela testemunha João Oliveira, gerente da subscritora de 2006 a 2012, que apesar de não ter acompanhado a subscrição do contrato e livrança em causa, conhecia o mesmo e os seus termos, referindo ainda as reuniões e acompanhamento que Henrique ... ... efetuava, o que conhecia.
De acordo com o disposto no artigo 374º, do Código Civil, impugnada a veracidade da letra e assinatura do título incumbia à exequente a prova da sua veracidade, o que esta logrou fazer.
Efetivamente, da associação do resultado da perícia com o depoimento das testemunhas nos termos supra, firmámos convicção da assinatura do título por Henrique ... ....
Adicionalmente ponderou-se o declarado por Marinela G..., funcionária da exequente no Centro de Empresas, a qual acompanhou a partir de 2009 as responsabilidades assumidas pela empresa junto da exequente, a qual, para além de descrever o procedimento adotado à data para a subscrição do contrato e livrança em causa, conhecia as reuniões realizadas no âmbito do incumprimento e ainda prévias ao preenchimento da livrança dada à execução.
A testemunha Sara S..., funcionária da exequente na área de recuperação, referiu igualmente as reuniões e demais contactos, bem como as diversas tentativas de negociação e os termos das mesmas, nomeadamente quanto à informação fornecida acerca dos termos das responsabilidades assumidas por todos os avalistas e subscritores das diversas empresas do Grupo e, no caso por Henrique ... ..., também após a sua morte.
Documentalmente considerou-se ainda o contrato junto, o qual não foi impugnado, nomeadamente quanto ao pacto de preenchimento e cartas de interpelação remetidas.
Quanto aos demais documentos juntos, referentes ao alegado acompanhamento/conhecimento pelas oponentes das atividades da sociedade subscritora, os mesmos não assumiram relevo face à qualidade em que estas participam nos autos, como herdeiras de, e aos tema da prova e em causa nos autos, não constituindo matéria de oposição.»

Argumentam os apelantes que as testemunhas Marinela G..., Sara S..., João O... e Paulo P... não viram Henrique ... ... a assinar o aval. Mais sustentam que a testemunha, tida por fulcral pelo tribunal, Paulo S... não se recordou especificamente de ter assistido à assinatura do aval por Henrique ... .... Mais desvalorizam a prova pericial porquanto o resultado obtido foi o de “pode ter sido”, sendo que os peritos referem que desenvolveram o exame com limitações pelo facto da assinatura ser parcialmente ilegível e de difícil observação por ter sido “aposta sobre um carimbo.”
Ouvidos na íntegra os depoimentos das referidas testemunhas, e com relevância para a resposta ao facto 9, deles ressalta o seguinte.
A testemunha Marinela G... trabalha para o BES/Novo Banco desde janeiro de 2005, com as funções de assistente comercial, passando a desempenhar as funções de gestora de negócios a partir de 2008 e gerente de empresas a partir de 2009. Inquirida, verbalizou designadamente o seguinte:
Chegou a conhecer pessoalmente Henrique ... ... no âmbito das suas funções, a partir de 2009,altura em que passou a acompanhar as responsabilidades da Madeira Rent junto do BES.
O Henrique ... era o rosto de um grupo de empresas em que se inseria a Madeira Rent.
Algumas empresas do grupo evidenciavam dificuldades no pagamento de algumas responsabilidades pelo que o BES solicitou, por diversas vezes, que tais empresas apresentassem propostas de reestruturação da dívida.
Numa outra empresa, foi pedido um aval do Henrique ... porque se tratava do único caso em que não havia aval de garantia do mesmo, tendo sido dito à testemunha que o mesmo não prestaria mais avais. Isto ocorreu uma reunião em 2012 em que intervieram designadamente a testemunha e Isabel ....
A deteção da falta desse aval ocorreu porque foi efetuado um levantamento de todas as responsabilidades das empresas do grupo. Com exceção de tal empresa, todas as responsabilidades das empresas do grupo estavam apenas garantidas por aval e não por garantias reais, sendo o Henrique ... conhecido como uma das famílias mais ricas da Madeira.
No âmbito desses contactos entabulados pela testemunha, nunca lhe foi levantada qualquer objeção quanto à validade do aval dos autos.
Descreveu o procedimento bancário de recolha do aval associado à concessão de crédito.
O Sr. Henrique ... era um cliente que mantinha um contacto direto com a administração do BES, sendo o BES que se dirigia ao mesmo para recolher a assinatura.
Durante 2012, manteve ainda outras reuniões com Isabel ... e Rosa Calado, nova controller do grupo.

A testemunha Sara S... trabalha para o BES/Novo Banco há vinte anos, sendo que em 2004 trabalhava na área comercial. Com relevância para o facto em discussão, verbalizou designadamente o seguinte:
Não assistiu à assinatura do aval;
O banco preencheu a livrança e interpelou a sociedade e os avalistas em outubro de 2013;
Após isso, receberam um e-mail, em janeiro de 2014, da Isabel ... a solicitar a marcação de uma reunião para discussão das responsabilidades que estavam em incumprimento;
Essa reunião ocorreu em janeiro de 2014 e, no âmbito da mesma, foi a Isabel ... interpelada para qual seria a questão do aval do pai, então já falecido, uma vez que o aval do pai abrangia as responsabilidades também de outras empresas;
Em abril de 2014, Isabel ... propôs um financiamento com recurso a uma garantia sobre um imóvel de uma sociedade;
Durante todos estes contactos, a Isabel ... e a Rosa Calado, em momento algum, negaram a existência do aval, sendo certo que os contactos foram posteriores ao preenchimento da livrança e à interpelação para pagamento.

A testemunha João O... foi gerente da Madeira Rent de 2006 a 2012 e desempenhou cargos similares em outras empresas pertencentes ao grupo liderado por ... Henrique. Demitiu-se em 2012, por se entender desautorizado por uma atuação de Isabel ... que inviabilizou a assinatura de um contrato com o BES que a testemunha andou a negociar mais de um ano para regularizar responsabilidades da Vantyx Sistemas de Informação. Verbalizou designadamente o seguinte:
Teve variadíssimas reuniões com Henrique ... ...;
A maior parte das responsabilidades do grupo estavam avalizadas pelo Henrique ... e por outros administradores;
O Henrique ... era uma pessoa de palavra e tinha uma muito boa imagem no mercado;
Ia assiduamente ao Funchal para falar com os acionistas e com os Bancos;
A partir de 2009, os bancos começaram a pedir planos de amortização de contas caucionadas.

A testemunha Paulo S..., trabalha para o BES/Novo Banco desde abril de 1996, sendo que, em 2004, era gerente de empresa no Centro de Empresas. Foi gestor do grupo de empresas da Madeira REnt desde a abertura até à data da sua saída dessas funções, em 2009. Verbalizou o seguinte:
Relatou o procedimento normal associado à celebração deste tipo de contratos, abarcando a assinatura da livrança;
Era fundamental “a participação do senhor Henrique ... nas operações, era condição sine qua non”, sendo o mesmo conhecido como uma das pessoas com mais bens e fortuna na Madeira;
Daí que não fosse associada à operação qualquer outra garantia como hipoteca ou penhor;
Apôs a sua assinatura no contrato em causa de financiamento;
É que foi pessoalmente ao escritório do Henrique ... recolher a sua assinatura no aval, tendo assistido ao mesmo a assinar, achando que não estava mais ninguém presente;
A livrança e o contrato foram assinados na mesma altura.

A testemunha Paulo P... trabalhou para a Madeira Rent em 2005-2006, conhecendo todos os executados. Verbalizou o seguinte:
Henrique ... era membro do conselho superior do BCP e acionista fundador do BPI, sendo uma pessoa esclarecida sobre o que era um aval;
Esteve presente em reuniões com Henrique ... em que concebia contactos com os bancos por causa de responsabilidades pendentes;
Acompanhou a negociação do contrato dos autos;
Acompanhou a assinatura de mais de cem contratos por parte do Henrique ..., sendo que só um não tinha o aval dele;
Fazia mapas com as responsabilidades das empresas do grupo e com as garantias associadas que eram disponibilizados ao Henrique ... com uma periodicidade mensal;
Nesses mapas estava colocada a responsabilidade deste aval;
O Henrique ... tinha o hábito de, pessoalmente, consultar a central de responsabilidades do Banco de Portugal para ver qual era a sua exposição pessoal, a qual chegou a ser em avais de 40 a 45 milhões de euros;
O Henrique ... pedia à testemunha, por vezes, que apurasse qual a origem de algumas responsabilidades que apareciam em tais documentos do Banco de Portugal.
Afirma-se surpreendido com a alegação de que a assinatura do aval é falsa, tanto mais que falou expressamente com o Henrique ... sobre este aval.
Da análise deste conjunto de depoimentos, inferimos que a convicção firmada pelo tribunal a quo quanto à prova do facto 9 não merece reparo.
Com efeito, em primeiro lugar, temos o depoimento direto da testemunha Paulo S... no que tange ao testemunho presencial da assinatura do aval por parte de Henrique ....
Em segundo lugar, os depoimentos prestados constituem factos-base de algumas presunções judiciais que indicam a genuinidade do aval prestado. Assim, no âmbito das negociações entabuladas jamais foi questionada a existência e/ou validade do aval prestado por parte designadamente de Isabel .... Diz-nos o indício responsio que a parte, colocada perante uma natureza agressiva de um estímulo, adota as condutas de resposta em consonância (cf. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova por Presunção no Direito Civil, 2017, p. 243). Assim, caso existissem fundadas dúvidas sobre a existência e/ou validade do aval, os executados – designadamente Isabel ... – teria reagido de forma imediata, não relegando essa defesa tardia para esta oposição. Ou seja, a arguição intempestiva de um vício pode ser, e é no caso, sinónimo da sua inexistência. Por outro lado, conforme resulta do depoimento de Paulo P..., Henrique ... era um homem de negócios responsável, cuidadoso e pormenorizado, o que está exemplarmente demonstrado com o cuidado que tinha em consultar as suas responsabilidades junto do Banco de Portugal. Tal aciona o indício character (Op. Cit., p. 237) que aponta no sentido de que o mesmo assinou o aval em causa porque, se assim não fosse, teria reagido à sua inserção no registo da central de responsabilidades, o que não está evidenciado. Por fim, os sucessivos levantamentos das responsabilidades que foram sendo feitos no intuito de forçar a reestruturação das dívidas aciona o indício evocatio, o qual nos diz que os levantamentos/recapitulações de factos históricos – en passant – servem para enunciar factos ocorridos, no caso a prestação do aval (cf. Op. Cit., p. 258).
A circunstância de o relatório pericial ter concluído em termos de a assinatura imputada a Henrique ... “pode ter sido” produzida pelo seu punho, e não ser assertivo quanto a um grau de probabilidade maior, abona mais uma resposta no sentido dado pelo tribunal a quo (facto provado sob 9) no que no sentido inverso. Isto porque, nos termos desse parâmetro, o grau de admissibilidade positiva da imputação é superior à sua negação. O exame pericial em causa deve ser articulado com a prova testemunhal produzida e com os indícios que esta acionou (cf. supra).
Há que frisar que, no âmbito do processo civil, o standard da prova regra é o da probabilidade prevalecente.
Um standard de prova consiste numa regra de decisão que indica o nível mínimo de corroboração de uma hipótese para que esta possa considerar-se provada, ou seja, possa ser aceite como verdadeira. Um standard deve ser capaz de responder a duas perguntas: quando é que o grau de justificação é suficiente para aceitar um enunciado fáctico como verdadeiro e quais são os critérios objetivos que indicam que se alcançou esse grau de justificação.
O standard de prova é um mecanismo que permite determinar e distribuir os erros judiciais na fixação dos factos provados. Estaremos perante um falso positivo quando uma decisão declara provada uma hipótese, sendo esta falsa. O falso negativo ocorre quando se declara uma hipótese não provada, sendo esta verdadeira. Qualquer uma destas decisões pode ser válida epistemologicamente no sentido de que se fundou corretamente nos elementos de prova disponíveis.
Deste modo, à medida que aumentamos a exigência do standard de prova, aumentam os falsos negativos e diminuem os falsos positivos. É por esta ordem de razões que o standard de prova adotado para a decisão final no processo penal é muito mais elevado que no processo civil: existe uma opção ética no sentido de que é socialmente preferida uma absolvição falsa do que uma condenação falsa.[8] Enquanto no processo civil, a opção é a de tratar as partes de forma igual e reduzir o número global de erros, no processo penal a opção é a de proteger os inocentes tornando mais difícil condenar alguém, o que se faz preferindo os erros favoráveis à absolvição de culpados: é dez vezes pior condenar um inocente que absolver um culpado.[9]
Nesta medida, os standards de prova não são mais do que uma reação do próprio sistema contra a sua falibilidade na determinação do juízo fáctico, facultando modelos de controle das inferências do juiz e submetendo-as, no âmbito do contraditório, a um juízo crítico comum, garantindo a cientificidade da decisão jurídica.[10]
O standard da prova também evidencia que a verdade apurada no processo não é uma verdade absoluta. Conforme refere González Lagier, “Presunción de Inocencia, Verdad y Objetividad”, in García Amado e Raúl Bonorino (coords.), Prueba Y Razonamiento Probatorio en Derecho, Debates sobre Abducción, 2014,  numa perspetiva cognoscitivista ou racional da prova,  «Entre prova e verdade existe uma conexão teleológica (a finalidade da prova é a averiguação da verdade de determinados enunciados) mas não existe um conexão concetual (dizer que um enunciado foi provado não é dizer que é verdadeiro, em termos absolutos, mas que parece verdadeiro à luz da informação disponível) (…)»
Na common law dominam dois standards de prova: o standard “evidence beyond a reasonable doubt” para o processo penal e o “preponderance of evidence” (more-likely-than-not), preponderância de prova, nos casos civis designadamente nos EUA.[11] A preponderância da prova não deve ser lida, precipitadamente, como verificada logo que uma parte logre produzir melhores provas que a contraparte, exigindo-se também que aquela versão dos factos seja também mais provável que a sua negação (cfr. infra.) Em certos casos civis, exige-se uma “clear and convincing evidence”, prova clara e convincente, também explicitada com recurso à expressão “much-more-likely-than-not”. É o que ocorre designadamente nos casos de restrição dos direitos parentais, de negligência profissional, em questões relacionadas com a cidadania e com o conteúdo de um testamento.[12]Em termos de conceção probabilística, o standardde preponderância da prova equivale a uma probabilidade superior a 0,5, o standard de prova clara e convincente equivale a uma probabilidade superior a 0,75 e o standard “evidence beyond a reasonable doubt” equivale a uma probabilidade superior a 0,90.[13]
No Reino Unido, adrian keane indica como standard comum dos casos de direito civil o “balance of probabilities”.[14] Segundo dá nota este autor, em diversas matérias cíveis tem sido exigido um standard mais elevado que nos casos comuns e, independentemente das matérias, também tem sido defendido que quanto mais improvável for o facto alegado, mais forte terá de ser a prova necessária a fixá-lo segundo o “balance of probabilities”. Abrangem-se designadamente as seguintes situações: a prova da intenção de uma parte mudar de domicílio tem de ser clara e inequívoca; os vícios da vontade na celebração do casamento têm de ser provados de forma forte, distinta e satisfatória; nos casos de abusos de crianças no âmbito do poder paternal, quanto mais séria ou improvável foi a alegação de abuso, mais forte terá de ser a prova quer do abuso quer da identidade do abusador; a imposição de tratamento médico pelo tribunal a um inimputável exige uma prova convincente de que o tratamento é medicamente necessário.
Na Alemanha, a doutrina discute os graus ou medidas da prova (Beweismaβ), afirmando-se que para que o juiz se considere convencido segundo a sua consciência, deve alcançar-se uma “verosimilitude objetiva”, e não uma “credibilidade aproximada”, o que equivale a uma “alta probabilidade” (hohe Wahrscheinlichkeit).[15] Tal medida de prova deve ser rebaixada designadamente em casos de difícil prova em que se exige apenas uma “verosimilitude predominante”. Como assinala jordi nieva fenoll, as frases construídas pela doutrina alemã em nada se diferenciam dos standards de prova anglo-saxónicos, sendo a sua finalidade a mesma.[16]
Em Itália, a doutrina e a jurisprudência afirmam que para a afirmação da responsabilidade civil é suficiente a “preponderanza dell’evidenza”, devendo seguir-se o critério do mais provável que não. No sector específico da causalidade civil, salvatore patti admite mesmo a formulação menos exigente da prevalência mínima.[17] Luigi comoglio refere que no que tange à correlação probabilística concreta entre o comportamento ilícito e o evento danoso, se deve seguir a regra da “normalidade causal”, segundo um critério definido como da “preponderanza dell’evidenza”, da probabilidade prevalecente ou do mais provável que não.[18]
Pese embora a existência de algumas flutuações terminológicas, o standard que opera no processo civil é, assim, o da probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”. Este standard consubstancia-se em duas regras fundamentais:
(i)-Entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais;[19]
(ii)-Deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa.
Em primeiro lugar, este critério da probabilidade lógica prevalecente – insiste-se – não se reporta à probabilidade como frequência estatística mas sim como grau de confirmação lógica que um enunciado obtém a partir das provas disponíveis.
Em segundo lugar, o que o standard preconiza é que, quando sobre um facto existam provas contraditórias, o julgador deve sopesar as probabilidades das diferentes versões para eleger o enunciado que pareça ser relativamente “mais provável”, tendo em conta os meios de prova disponíveis. Dito de outra forma, deve escolher-se a hipótese que receba apoio relativamente maior dos elementos de prova conjuntamente disponíveis.
Todavia, pode acontecer que todas as versões dos factos tenham um nível baixo de apoio probatório e, nesse contexto, escolher a relativamente mais provável pode não ser suficiente para considerar essa versão como “verdadeira”. Pelo que para que um enunciado sobre os factos possa ser escolhido como a versão relativamente melhor é necessário que, além de ser mais provável que as demais versões, tal enunciado em si mesmo seja mais provável que a sua negação. Ou seja, é necessário que a versão positiva de um facto seja em si mesma mais provável que a versão negativa simétrica.[20]
Há, assim, um limite mínimo de probabilidade a partir do qual opera a probabilidade lógica prevalecente, que Taruffo situa em 0,51. Há que esclarecer a forma de apresentação do grau de confirmação de hipóteses. Na metodologia proposta por este autor, cada prova concreta é valorável numa escala de 0 a 1 ( grau particular de confirmação). Por sua vez, a representação da valoração do conjunto da probabilidade da hipótese dever fazer-se numa escala de valores 0 → ∞, sem limite máximo (grau global de confirmação).[21] As duas escalas combinam-se para determinar a probabilidade do facto. Os números são aqui uma forma de expressar relações lógicas e não supõem medidas quantitativas de nada. Um grau de confirmação da hipótese superior a 0,50 deve considerar-se como o limite mínimo abaixo do qual não é razoável aceitar a hipótese como aceitável. Uma só prova clara e segura pode ultrapassar esse limite mínimo, podendo igualmente ser racional aceitar a hipótese confirmada por vários provas ditas indiretas convergentes, por exemplo.[22]
Apesar da pertinência de tal limite mínimo de probabilidade, taruffo logo ressalva que podem existir contextos em que seja sensato aplicar a probabilidade lógica prevalecente no seu estado puro, o que equivale a dizer, sem que se exija que a hipótese dotada de grau de probabilidade comparativamente mais alto seja também aceitável segundo o critério que opera quando está em jogo uma só hipótese ( ≥ 0,51). A aplicação do critério no seu estado puro poderá ser pertinente em casos em que não se exija a demonstração da aceitabilidade plena da hipótese, bastando algum elemento de confirmação suscetível de atribuir um mínimo de credibilidade a tal hipótese.[23]
Os elementos probatórios analisados e explanados supra, por serem confluentes e claros, constituem, de facto, arrimo suficiente para que se dê como provado o facto 9, conferindo-lhe uma probabilidade lógica não inferior a 0,70.
Termos em que improcede a impugnação da matéria de facto.

Reapreciação de mérito
Mantendo-se incólume a matéria de facto, nada há a alterar à solução de direito, a qual está correta, sendo que os apelantes não questionam sequer a solução jurídica adotada.

DECISÃO.
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos apelantes (artigo 527º, nº1 e nº2, do Código de Processo Civil).



Lisboa, 17.10.2017


                                 
(Luís Filipe Sousa)                                 
(Carla Câmara)                                  
(Higina Castelo)



[1]Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pp. 84-85.
[2]Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 87.
Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[3]No mesmo sentido, cf. Acórdão da Relação de Guimarães de 24.4.2014, Manuel Bargado, 523/11, www.colectaneadejurisprudencia.com.
[4]Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19.3.2013, Ana Resende, 371/09.
[5]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.2.2003, Azevedo ..., 20/03, www.colectaneadejurisprudencia.com
[6]Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.10.93, Rodrigues Codeço, 6046, www.colectaneadejurisprudencia.com.
[7]CF. Acórdão da Relação de Guimarães de 27.2.2014, Ana Cristina Duarte, 323/12, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.3.2016, Tibério Silva, 2002/11, CJ 2016-I, p. 81-86.
[8]Cfr. Jordi Ferrer Beltrán, La Valoración Racional de la Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2007, p. 143.
[9]Ronald Allen, “Los Estándares de Prueba y los Limites del Análisis Jurídico”, in Cármen Vázquez (ed.), Estándares de Prueba y Prueba Científica, Marcial Pons, Madrid, 2013, p. 49.
Historicamente, a enunciação desta regra foi atribuída a W. Blackstone que, em 1769, terá dito:”For the law holds, that is better ten guilty persons escape, than that one innocent suffer.” apud Nieva Fenoll, La Duda en el Proceso Penal, Marcial Pons, Madrid, 2013, p. 66.
[10]Danilo Knijnik, “Os Standards do Convencimento Judicial: Paradigmas Para o Seu Possível Controle”, acessível em www.abdpc.org.br , pp. 18-19.
[11]O standard da preponderância da prova funciona , ou aparenta funcionar, tendo em vista minimizar erros e maximizar a correção, distribuindo o risco de erro de forma mais ou menos equitativa entre as partes (qualquer das partes podem apresentar a hipótese menos provável e a decisão pode ser errónea) – cfr. Michael Pardo, “Estándares de Prueba y Teoría de la Prueba”, in Carmen Vásquez (ed.), Estándares de Prueba y Prueba Científica, Marcial Pons, Madrid, 2013, p. 103.
O standardbeyond a reasonable doubt” é objeto de larga discussão, havendo apenas acordo na asserção de que o mesmo não equivale a “além de toda a sombra de dúvida” na medida em que, nessa eventualidade, seria necessário descartar por completo qualquer outra versão dos factos distinta da inculpatória, o que não ocorre porquanto se admite - comummente - que o standardbeyond a reasonable doubt” permite a existência de outras hipóteses possíveis apesar de improváveis – cfr. Fernández López, “La Valoración de Pruebas Personales y el Estándar de la Duda Razonable”, http://www.uv.es/cefd/15/fernandez.pdf.
[12] Cfr. Susan Haack, “El Probabilismo Jurídico: Una Disensión Epistemológica”, in Carmen Vásquez (ed.), Estándares de Prueba y Prueba Científica, Marcial Pons, Madrid, 2013, p. 69. Esta autora enfatiza que os standards de prova, mais do que instruir o julgador sobre o grau de confiança que a sociedade crê que ele deve ter sobre a verdade dos factos, reportam-se à qualidade das provas produzidas, ao grau de crença (“warrant”) avalizado pelas provas, o que é uma questão diversa da crença suscitada no julgador (p. 72). Em suma, o que está em causa não é o grau de confiança do julgador mas sim o que é razoável crer à luz das provas produzidas (p. 75). O grau de apoio outorgado pelas provas depende do contributo que estas deem para a integração explicativa das provas-mais-a-conclusão, isto é, de quanto consigam encaixar as provas e a conclusão juntas num relato explicativo (p. 79).
No resumo de kevin m. clermont, “Standards of Proof in Japan and the United States”, Law School Working Paper Series, 2003, Paper 5,http://lsr.nellco.org/cornell/clsops/papers/5, acedido em 8.10.2008, pp. 6-7, os três standards constituem uma inevitabilidade psicológica:” The only sound and defensible hypotheses are that the trier, or triers, of facts can find what (a) probably has happened, or (b) what highly probably has happened, or (c) what almost certainly has happened. No other hypotheses are defensible or can be justified by experience and knowlegde.” Fundamentando a pertinência do standard da probabilidade prevalente, realça este autor que “(…) the preponderance standard is optimal given two conditions that are very plausible. The first condition is that an error in favor or the plaintiff is neither more undesirable nor less desirable than an  error in favor of the defendant, or that a dollar mistakenly paid by the defendant ( a false positive) is just as costly as a dollar mistakenly uncompensated to the plaintiff ( a false negative). The second condition is that the goal is to minimize the sum of expected coasts from these two types or error, that is, the system wants to keep the amounts suffered mistakenly to a minimum. Under these conditions, the preponderance standard performs better than any other standard of proof.” (pp. 7-8). No fundo, a primeira condição referida significa que haverá uma simetria ou indiferença no impacto do erro, isto é, será igualmente desaconselhável beneficiar o autor à custa do Réu como vice-versa.
[13] Michael Pardo, “Estándares de Prueba y Teoría de la Prueba”, in Carmen Vásquez (ed.), Estándares de Prueba y Prueba Científica, Marcial Pons, Madrid, 2013, p. 111.
Veja-se o que será dito infra a propósito da forma de apresentação do grau de confirmação de hipóteses.
[14]Adrian Kean  et al.,  The Modern Law of Evidence, 8ª Ed.,  Oxford University Press, 2010, pp. 106-111.
[15]Michele Taruffo,“Rethinking the sandards of proof”, in American Journal or Comparative Law, 51, 2003, p.6.
[16]La Valoración de la Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2010, p. 92.
[17]Salvatore Patti, Le Prove, Parte Generale, Giuffrè Editore, 2010, p. 232.
[18]Le Prove Civili, Utet Giuridica, Torino, 2010, p. 159.
[19]Cfr. Rivera Morales, La Prueba: Un Análisis Racional y Práctico, Marcial Pons, Madrid, 2011, pp. 307-308.
[20]Michele Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, p. 138.
[21]Refere luigi lombardo, La Prova Giudiziale, Contributo alla Teoria del Giudizio di Fatto nel Processo, Giuffrè Editore, 1999, p. 521, que o grau particular de confirmação, em princípio, é fixado de uma vez por todas e não muda durante o processo. Pelo contrário, o grau global de confirmação é uma noção essencialmente dinâmica na medida em que representa o nível do status cognitivo do juiz, o seu grau de convencimento, que se desenvolve à medida que se dispõe de novos elementos de prova. Deste modo, se uma hipótese está já amplamente confirmada, será baixo o grau particular de confirmação decorrente de uma nova prova; diversamente, será mais elevado se a hipótese ainda não está confirmada por alguma prova ou se foram já produzidas provas que confirmam a hipótese contraposta (provas conflituantes). Ou seja, o grau particular de confirmação que cada prova singular é idónea a conferir à hipótese decresce à medida que se reúnem provas convergentes e, em sentido oposto, cresce progressivamente em presença de provas divergentes.
[22]Michele Taruffo, La Prueba de los Hechos, Editorial Trotta, Madrid, 2002, pp. 277-278, 295-298.
[23]Michele Taruffo, La Prueba de los Hechos, Editorial Trotta, Madrid, 2002, p. 302.