Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
69/19.4PFLRS.L1-9
Relator: GUILHERME CASTANHEIRA
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
CURSO DE PREVENÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/08/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I- A concordância do Ministério Público, quer no aspecto adjectivo e substantivo é necessário, quer, quanto à fase de instrução em que cabe determinar a suspensão do processo, quer, no decurso da execução do plano homologado, ao momento em que cumpra avaliar de, eventuais, mas concretas condições que, por via de “novas circunstâncias”, possam importar alteração, designadamente, do prazo e regras de conduta/injunções impostas - cf. Código de Processo Penal, artigos, conjugados, 307.°, n.° 2, e 281.° do C.P.P.;
II- A alteração de tais injunções, com a eliminação posterior da frequência do curso de prevenção de violência doméstica pelo arguido através de despacho judicial posterior, em virtude de este pretender emigrar, com a discordância do MºPº, não ficam satisfeitas as expectativas comunitárias que,necessariamente, estavam subjacentes à solução de consenso encontrada;
III- Não há motivo para se prescindir de injunção primordial para afastamento dos perigos de recaída em idênticos comportamentos de violência doméstica, pelo simples motivo de o arguido pretender emigrar, até porque, se o arguido se tratasse dum emigrante à data em que foi proferida a decisão instrutória, a SPP não teria obtido acordo, tratando-se em suma apenas duma escolha a efectuar pelo arguido: emigra, não frequenta o curso e sujeita- se a ir a julgamento, o mencionado imperativo legal não é observado pelo decidido in judice, na medida em que, contrariando posição discordante expressa pelo Ministério Público, “isenta o arguido de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica”, o que era, como se nota, “uma das injunções” que lhe “tinha sido imposta com vista a beneficiar da suspensão provisória do processo;
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

 I - RELATÓRIO:
No nuipc 69/19.4PFLRS.L1, que correu termos no Tribunal de Instrução Criminal de Loures - Jl, foram proferidos: - “despacho, de 26 de Junho de 2020, constante de fls. 277” pelo qual se deferiu “o requerido velo arguido a fls. 257, dispensando-o de frequentar as acções de formação,na sequência do pedido de aclaração de fls. 281 dos autos”, em requerimento formulado pelo Ministério Público, com referência a “competente sanação do lapso verificado”, despacho pelo qual a “Mma. JIC\ decidiu, de novo, “e não obstante o último parágrafo da promoção de fls. 268”, com referência à injunção antes aplicada,isentar o arguido de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica
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Inconformado, recorreu o Ministério Público formulando as seguintes conclusões:
“a) a aplicação do instituto da SPP em fase de instrução acha-se dependente do acordo do MP, seja aquando da prolação da decisão instrutória, seja em fase ulterior, acaso surjam novas circunstâncias que possam importar alterações ao cumprimento das condições já. impostas;
b) ante a discordância manifestada pelo MP em que seja postergada uma das injunções aplicadas ao arguido com vista à SPP, a magistrada judicial não podia decidir eximir o arguido do cumprimento da injunção, em oposição ao entendimento do MP, antes necessitando do seu expresso acordo para viabilizar qualquer alteração nos "termos" da SPP já aplicada;
c) ao decidir postergar o cumprimento duma das injunções inicialmente impostas, quando o MP já expressara o seu desacordo face a uma tal solução, a Mma. JIC decidiu contra legem, violando o preceituado no n.° 2 do art.° 307.°, do CPP”
Termina por ser dado “provimento ao presente recurso, revogando a decisão da Mma. JIC a quo que o eximiu do cumprimento da injunção da
frequência do curso de prevenção de violência doméstica antes aplicada”.
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Não se observa resposta.
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Neste Tribunal, a Ex.a Procuradora-geral Adjunta apôs, em 2020.10.01, “visto” nos autos.
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II - FUNDAMENTAÇÃO:
1. Conforme entendimento pacífico nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respectiva motivação que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos submetidos à apreciação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
No presente caso, a questão suscitada pelo recorrente e submetida à apreciação deste Tribunal resume-se a saber se a “Mª. JIC” poderia, sem o acordo do Ministério Público, deferir o requerido pelo arguido no sentido de o dispensar de frequentar as acções de formação e, assim, ficar eximido do cumprimento da, antes aplicada, injunção da frequência do curso de prevenção de violência doméstica.
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2. Cumpre observar os despachos recorridos, do seguinte teor:
- Despacho de 2020.06.26 (reportado ao requerimento, do arguido a fls 257")
“Atenta a informação antecedente prestada pela DGRS, e a posição assumida pelo M°P° a fls. 268, defiro o requerido pelo arguido a fls. 257, dispensando-o de frequentar as acções de formação, o que se determina no pressuposto de que o arguido se encontra na eminência de ir trabalhar para o estrangeiro, devendo o arguido informar os autos do seu contacto telefónico e da. morada, onde poderá ser contactado em Inglaterra
- Despacho de 2020.07.02 {reportado ao “pedido de aclaracão de fls. 28 J dos autos ”, do M. °P. °) l
“Requerimento apresentado pelo M°P° a fls. 281:
Nestes autos decidiu-se, em sede de decisão instrutória, aplicar ao arguido o instituto da suspensão provisória do processo, pelos fundamentos de facto e de direito plasmados na acta de fls. 216-222.
Entre o mais, o arguido ficou obrigado a frequentar um curso de prevenção de violência doméstica.
Mediante requerimento de fls. 257, alegando estar na iminência de ir trabalhar para o estrangeiro, juntando cópia do contrato de trabalho, o arguido requereu a dispensa da frequência do curso aqui em causa, face à inviabilidade por parte da DGRS, de lho ministrar à distância.
A fls. 268, não obstante o M°P° ter reconhecido a vigente situação de desemprego que assola o país, opôs-se a que o arguido ficasse dispensado de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica.
Cumpre apreciar e decidir:
Resulta dos autos que o arguido procedeu ao pagamento da quantia de € 200,00 a favor da APAV (cfr. Fls. 255); não existe notícia de que o arguido
tenha incumprindo com a obrigação de não maltratar física e psicologicamente a assistente e seus familiares; o arguido sugeriu frequentar o curso à distância, o que não é possível por falta de meios da DGRS, pelo que entendo que essa impossibilidade (por falta de meios da DGRS) não lhe sendo imputável, não pode ser decidida em seu desfavor.
Em suma, verificando que se mostra salvaguardada a segurança da assistente, não tendo o arguido incumprido quanto à mesma; que o arguido já procedeu ao pagamento da quantia a que se obrigou (mesmo antes do prazo que lhe foi determinado), e que sugeriu frequentar o curso à distância, o que não mereceu o desacordo do M°P°, mas que não é possível por falta de meios da DGRS, entendo que essa impossibilidade, não sendo imputável ao arguido, não o pode prejudicar tanto mais que o mesmo tem tido um comportamento que denota preocupação e cuidado em cumprir as injunções a que ficou obrigado.
Assim sendo, e não obstante o último parágrafo da promoção de fls. 268, sopesando tudo o acima referido, entendo que a inexequibilidade de realizar o curso à distância, não sendo imputável ao arguido, e tendo o mesmo apresentado cópia do contrato de trabalho celebrado entre si e uma empresa Inglesa, que não suscitou qualquer dúvida quanto à sua autenticidade, decido isentar o arguido de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica, para que o mesmo não perca a oportunidade de trabalho no estrangeiro. O emprego é um importante contributo para a paz social, tanto mais atendendo ao actual contexto de desemprego com que Portugal se depara, não se prevendo que o mesmo melhore nos próximos tempos, tal como admitido pelo M°P° a fls. 268
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3. Apreciação dos fundamentos do recurso:
Cumpre, desde já, assinalar, por referência à matéria sub judice, a razão que, de jure constituto, assiste ao recorrente, como, com reflexo nos autos, emana do motivado, por onde, e bem, se explana o seguinte:
Os presentes autos respeitam à prática dum crime de violência doméstica.
Face à factualidade vertida na acusação constante de fls. 86 a 92 dos autos, constata-se que a actuação do arguido não se tratou dum mero acto isolado, mas sim duma conduta reiterada.
Assim, logo ressalta tratar-se dum caso em que há necessidade dum esforço de "reeducação " do arguido, para que não recaia na prática do mesmo tipo legal de crime.
De resto, fora justamente o reconhecimento de que tal reeducação tinha aqui um papel essencial para a prevenção da prática de futuros crimes, que levara a magistrada titular do inquérito a fundamentar a não opção pela aplicação da suspensão provisória do processo, por vir verificando que a DGRSP se acharia a efectuar um deficiente/insuficiente acompanhamento naquele tipo de situações.
Tendo sido aberta a instrução a requerimento do arguido, por decisão de 8 de Novembro de 2019, foi decidido aplicar-lhe o instituto da suspensão provisória do processo, pelo prazo de dois anos, mediante as seguintes injunções:
Abster-se de maltratar física e psicologicamente a ofendida, bem como outros elementos familiares ou próximos com os quais a ofendida conviva;
- Prestar a quantia de € 200,00 (duzentos euros) à A.P.A. V., no prazo de 5 (cinco) meses, comprovando-o nos autos, até 10 (dez) dias após o termo do prazo concedido, mediante recibo emitido pela Instituição que deverá conter a menção expressa de "cumprimento de injunção pecuniária no âmbito de processo penal”; e
- Frequentar um curso de prevenção de violência doméstica, devendo contactar- se a D.G.R.SP para os devidos efeitos. "
Conforme bem resulta da acta de leitura da decisão instrutória de fls. 216 e seguintes, inicialmente foram propostas apenas duas injunções pela Mma. JIC, sendo que só mediante a cumulação da injunção da frequência de curso para prevenção de violência doméstica a cargo da DGRSP, e o aumento do donativo a prestar à AP A V dos iniciais €100 para €200, foi possível obter a concordância da assistente.
No decurso do prazo da SPP, por requerimento de 7 de Junho, veio o arguido informar que se achava-se desempregado em razão das dificuldades surgidas na sequência do estado de pandemia, bem como que estava em vias de emigrar para a Grã-Bretanha, onde arranjara trabalho que lhe permitiria angariar meios de subsistência e dar melhores condições de vida à sua família.
Referiu ainda que tal poderia vir a não ser consentâneo com a frequência do curso da DGRSP, por se desconhecer quando esta retomaria o seu funcionamento normal, sendo que a verificar-se tal, se trataria de facto que lhe não era imputável.
Notificados o MP e o Patrono da assistente para se pronunciarem, o último nada disse, sendo que o MP a Jls. 268 dos autos manifestou a sua compreensão face à invocada necessidade do arguido emigrar.
Contudo, antecipando que a DGRSP não tivesse meios para proceder a cursos à distância, logo adiantou: "(...) Desde ja nos pronunciamos
referindo que, acaso não se mostre viável a freqnência da formação, seja por motivos que se prendam com o arguido, seja por impossibilidade da DGRSP em assegurar-lhe a formação à distância, nos opomos a qualquer solução aue passe pela postergação da injunção da frequência da formação em causa."
Assim, logo ficou claro nos autos que, fosse qual fosse o motivo que determinasse que, estando emigrado, o arguido ficasse impossibilitado de frequentar o curso, o M.P. não concordaria com a manutenção da SPP com postergação da frequência do curso em causa.
Como a DGRSP, a fls. 276, viesse informar que não dispunha de meios tecnológicos para a realização da formação à distância, por despacho de 26 de Junho de 2020, constante de fls. 277, a Mma. JIC, veio a proferir a seguinte decisão:
"Atenta a informação antecedente prestada pela DGRS, e a posição assumida pelo M.°P.° a fls. 268, defiro o requerido pelo arguido a fls. 257, dispensando-o de frequentar as acções de formação, o que se determina no pressuposto de que o arguido se encontra na eminência de ir trabalhar para o estrangeiro, devendo o arguido informar os autos do seu contacto telefónico e da morada onde poderá ser contactado em Inglaterra. "
Ora, verificando que o fundamento invocado ("a posição assumida pelo MP a fls, 268") estava em oposição com o decidido, tornando a decisão incongruente, o M.P. requereu, a fls. 281, uma aclaração da mesma, ou a competente sanação do lapso verificado, pois que da leitura da decisão ficava-se com a impressão de que a Mma. JIC entendera que o MP aceitava que viesse a ser preterida a exigência do cumprimento da última injunção imposta ao arguido.
Na sequência de tal requerimento do MP, veio a Mma. JIC a decidir que o arguido ficaria eximido de frequentar o curso de prevenção da violência doméstica, postergando desse modo uma das injunções impostas, assim decidindo em clara oposição ao entendimento do MP.
Para tal estribou-se, em resumo, no facto de o arguido já ter procedido à entrega do donativo, estar salvaguardada a segurança da assistente e não ser assacável ao mesmo a impossibilidade de frequentar o curso de prevenção da violência doméstica.
O que se pretende com a frequência do curso de prevenção da violência doméstica é, não a salvaguarda duma vítima concreta, mas sim de todas as possíveis vítimas.
Com efeito, é consabido que os agressores em contexto de violência doméstica usualmente não vitimizam uma única companheira, mas sim, que vitimizam as várias companheiras que têm ao longo da vida.
E justamente por que um tal tipo de violência tem raízes profundas, impõe-se que se proceda a um trabalho profissional com vista a alterar crenças e posturas comportamentais, tudo de modo a que seja possível fazer um prognóstico favorável quanto a uma alteração futura do comportamento.
Deste modo, ao contrário do que parece transparecer do despacho posto em crise, não importa apenas a salvaguarda da assistente destes autos,
importa, isso sim, que sejam quais sejam os relacionamentos futuros em que o arguido se envolva, aquele não recaia na prática de actos idênticos, vitimizando outras companheiras.
Acresce que o prazo de duração da presente SPP é de dois anos, pelo que não é a situação de pandemia que justifica a impossibilidade de o arguido frequentar o curso, mas sim o facto de ter decidido emigrar.
Ora, se não é de pôr em causa o direito do arguido emigrar e, assim, obter melhores condições de vida, a verdade é que não se vê por que motivo se há-de prescindir de injunção primordial para afastamento dos perigos de recaída em idênticos comportamentos, pelo simples motivo de o arguido pretender emigrar.
Com efeito, acaso o arguido se tratasse de um emigrante à data em que foi proferida a decisão instrutória, a SPP não teria obtido acordo.
Assim, trata-se apenas duma escolha a efectuar pelo arguido: emigra, não frequenta o curso e sujeita-se a ir a julgamento.
Mas, na verdade, o que aqui se acha em causa, não é aquilatar da bondade da decisão da Mma. JIC face às circunstâncias concretas do caso, mas sim aquilatar da sua lesalidade.
Dispõe o artigo n.° 2 do art.° 307.°, do CPP, que o JIC, aquando do encerramento da fase de instrução, se pode decidir pela aplicação da Suspensão Provisória do Processo, mediante o acordo do MP.
Ora, muito naturalmente, um tal acordo não se refere apenas à aplicação em abstracto daquele instituto, antes respeitando ainda às concretas condições para a aplicação da SPP, como sejam o respectivo prazo e as regras de conduta impostas.
Acresce ainda, que um tal acordo não é exigido apenas aquando da proposta inicial da SPP em fase de encerramento da fase de instrução, sendo também existido quando, no decurso do prazo da SPP, se suscitem novas circunstâncias que possam importar numa alteração, seja do prazo de duração fixado, seja das injunções impostas.
Deste modo, ao decidir postergar uma das injunções que tinha sido imposta ao arguido com vista a beneficiar da SPP, contrariando a posição discordante expressa pelo MP, a decisão da Mma. JIC é ilegal, por violação da imposição contida nessa norma lesai do art. ° 307. ° n. ° 2, do CPP'\
Como sublinhado, as, pela “Mma. JIC a quo, inicialmente propostas duas injunções não obtiveram, desde logo, a legalmente necessária concordância, v.g. da assistente, o que, como refere o recorrente, apenas sucedeu “mediante a cumulação da injunção da frequência de curso para prevenção de violência doméstica a cargo da DGRSP, e o aumento do donativo a prestar à A PA V dos iniciais €100 para € 200
Aliás, pelo despacho de 2020.01.21, foi homologado, por com o mesmo se concordar “inteiramente”, o, inerente, “plano para suspensão provisória do processo, do arguido AA suspensão provisória do processo, pelo prazo de 24 meses (com términos previsto em 13-11-2021), durante o qual o arguido” ficou “sujeito a cumprir injunções”, notando-se que todo o decidido em causa transitou em julgado.
De resto, para lá da “letra da lei” e dos elementos sistemático, histórico e actualístico de interpretação da mesma, sempre, por reporte à situação in judice, se teria de aferir ao complexo normativo “a preocupação primeira do legislador, de que com a suspensão provisória do processo não fique defraudado o interesse comunitário na perseguição penal ou, se quisermos, que a suspensão provisória do processo não contribua para um descrédito geral no que respeita à validade da norma indiciariamente violada” - cf. Fernando Pinto Torrão, in A Relevância Político-Criminal da Suspensão Provisória do Processo, Almedina, Coimbra, 2000, p. 216.
Nesse contexto, adjectivo e substantivo, “a concordância do Ministério Público” tem, óbvio, referente quer à fase de instrução em que cabe determinar a suspensão do processo, quer, no decurso da execução do plano homologado, ao momento em que cumpra avaliar de, eventuais, mas concretas condições que, por via de “novas circunstâncias”, possam importar alteração, designadamente, do prazo e regras de conduta/injunções impostas - cf. Código de Processo Penal, artigos, conjugados, 307.°, n.° 2, e 281.°.
Ora - e para lá de não ficarem satisfeitas as expectativas comunitárias que, necessariamente, estavam subjacentes à solução de consenso encontrada, aludindo-se que “não se vê por que motivo se há-de prescindir de injunção primordial para afastamento dos perigos de recaída em idênticos comportamentos, pelo simples motivo de o arguido pretender emigrar”, até porque “acaso o arguido se tratasse dum emigrante à data em que foi proferida a decisão instrutória, a SPP não teria obtido acordo”, tratando-se “apenas duma escolha a efectuar pelo arguido: emigra, não frequenta o curso e sujeita- se a ir a julgamento” -, o mencionado imperativo legal não é observado pelo decidido in judice, na medida em que, contrariando posição discordante expressa pelo Ministério Público, “isenta o arguido de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica”, o que era, como se nota, “uma das injunções” que lhe “tinha sido imposta com vista a beneficiar da suspensão provisória do processo
Deste modo, visto o circunstancialismo, desde logo processual, em referência nos autos - e independentemente de, também, se não mostrarem observados pelo decidido em análise os pressupostos e requisitos que o teriam de estruturar, em vista dos fins do instituto da suspensão provisória do processo e da ratio das normas que o formatam (e a que não são alheias as exigências, v.g. de prevenção, que no caso se fazem sentir e que, sem mais, só com o integral cumprimento das injunções fixadas, se considera ser possível alcançar, pois só com ele se mostra salvaguardada a decretada suspensão e, assim, a confiança da comunidade na validade e eficácia do normativo em apreço), observa-se suporte fáctico-legal em ordem à pretensão jurisdicional formulada pelo Ministério Público, a qual, sem outras, por desnecessárias, considerações, deve ser deferida.
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III-DECISÃO:
Em conformidade com o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em conceder provimento aos recursos in judice e, assim, em revogar os despachos recorridos, a deverem ser substituídos por outro que, atentos à oposição do Ministério Público, v.g. ao “último parágrafo da promoção de fls. 268” e ao “requerimento apresentado a fls. 281”, indefira o requerimento formulado a fls. 257 e, assim, seja mantida a injunção, antes aplicada, de o arguido ter de frequentar o curso de prevenção de violência doméstica.
Notifique.

Lisboa, 2020.10.08.
Guilherme Castanheira
Calheiros da Gama