Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
454/19.1PEAMD.L1-5
Relator: CID GERALDO
Descritores: RELATÓRIO SOCIAL
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/18/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: «Relatório social» é a informação sobre a inserção familiar e socioprofissional do arguido e, eventualmente, da vítima, elaborado por serviços de reinserção social, com o objectivo de auxiliar o tribunal ou o juiz no conhecimento da personalidade do arguido, para os efeitos e nos casos previstos na lei. 
E para que tal informação seja completa e tenha alguma utilidade, não se pode contentar com meros números que pouco podem dizer, mas fazendo incluir uma caracterização, em termos de comportamentais e de conduta nos vários meios onde o arguido interage.
O relatório social não é uma prova mas tão só meio de prova habilitante do conhecimento da personalidade do arguido que, não tendo o valor de prova pericial, está sujeito ao princípio da livre apreciação da prova.
Para qualquer relatório social para audiência de julgamento é necessário que ao técnico da reinserção social seja facultada cópia da acusação ou do despacho de pronúncia, para desse modo, poder melhor contextualizar e dirigir a abordagem, designadamente, sobre quem deve contactar e sobre que áreas serão mais pertinentes.
- Se, notificado do teor do relatório social no dia 19/10/2020, o recorrente nada questionou nem nada requereu, nem antes, nem depois do início da audiência de julgamento, iniciada em 19/11/2020, se algum vício o relatório social tivesse, tal poderia constituir uma mera irregularidade, para suscitação da qual, o recorrente deixou passar largamente o prazo em que o podia fazer, não tendo, por isso, a virtualidade de determinar a invalidade do ato a que se refere e do termos subsequentes que pudesse afetar notificado do teor do relatório social no dia 19/10/2020, o recorrente nada questionou nem nada requereu, nem antes, nem depois do início da audiência de julgamento, iniciada em 19/11/2020.
- De posse de uma cópia do relatório social, o recorrente conformou-se e aceitou o seu teor quando, se o quisesse, poderia, se fosse o caso, contraditá-lo, pô-lo em causa, requerendo a prodição de prova ou que se lhe aprouvesse, pelo que não existiu qualquer violação do princípio do contraditório, conforme a sua consagração expressa para este efeito no art. 327º nº 2 do Código de Processo Penal.
Decisão Texto Parcial:Acordam, em conferência, na Secção Criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. No processo comum, com intervenção de Tribunal Coletivo nº 454/19.1PEAMD, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste Sintra -.1C Criminal - Juiz 2, foram acusados os arguidos:
1. K … e
2. AC ,
nos termos da douta acusação deduzida pela Digna Magistrada do Ministério Público, a fls. 575 e ss., que imputa:
- ao primeiro arguido, a prática, em coautoria, de dois crimes de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alíneas f) e g), ambos do C. Penal;
- ao segundo arguido, a prática, em coautoria, de um crime de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alíneas f) e g), ambos do C. Penal.
*
Realizado o julgamento, foi proferido acórdão que:
1. Considerou não estar preenchida, em nenhuma das situações dadas por assentes e em relação a nenhum dos arguidos, a circunstância especial qualificativa prevista na alínea g) do n° 2 do artigo 204° do Código Penal.
2. Considerou não estar preenchida, na situação das 3 h 45m, a circunstância especial qualificativa prevista na alínea 1) do n° 2 do artigo 204º do Código Penal.
3. Procedendo à necessária convolação jurídica, condenou o arguido K.  :
a.  pela prática, às 3 h 45m do dia 11/08/2019, em coautoria material, de um crime de roubo, previsto e punível pelos artigos 73°, n° 1 a) c b), 210º n° 1, ambos do Código Penal e artigo 4° do Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de setembro (Regime Especial para Jovens), na pena parcial dc 2 (dois) anos de prisão;
b.  e pela prática, às 5 horas do dia 11/08/2019, em coautoria material, de um crime de roubo, previsto e punível pelos artigos 73º, n° 1 a) e b), 210º n° 1 e nº 2 alínea b) e, ex vi deste, 204º, n° 2 alínea f), todos do Código Penal, e artigo 4° do Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de setembro (Regime Especial para Jovens), na pena parcial de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão;
c. procedendo nos termos dos artigos 77° e 78° do Código Penal, ao cúmulo jurídico das duas penas parcelares aplicadas, condenou o arguido K. pela prática destes dois crimes identificados em a) e b), na pena unitária de 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão (efetiva).
4. Condenou o arguido AC  pela prática, (às 5 horas do dia 11/08/2019) em coautoria material, de um crime dc roubo, previsto e punível pelos artigos 210º n° 1 e n° 2 alínea b) e 204º, nº 2 alíneas O, ambos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (efetiva).
5. Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 16.º, da Lei n.º 130/2015, de 04/09 e 67°-A e 82.°-A, do Código de Processo Penal, condenou os arguidos K. e AC  a pagar, no regime da solidariedade, € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de montante compensatório, ao ofendido WM .
*
 Não se conformando com a decisão, vieram interpor recurso da mesma, com os fundamentos constantes das respectivas motivações:
A – O arguido AC , com as seguintes conclusões:
I. Vem o presente recurso interposto do aliás Douto Acórdão, de fls.(...), proferido nos autos de processo comum, condenando o Arguido, AC ,
“ (...)
4.(...) pela prática, (às 5 horas do dia 11/08/2019) em coautoria material, de um crime de roubo previsto e punível pelos artigos 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alíneas f), ambos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (efetiva);
5. Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 16.°, da Lei n° 130/2015, de 04/09 e 67°-A e 82.°-A, do código do Processo Penal, decide-se condenar os arguidos (...) e AC  a pagar, no regime da solidariedade, € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de montante compensatório, ao ofendido WM ;
(...)”.
II. Não pode o Arguido, ora Recorrente, concordar com tal pena entendendo que, face à prova produzida, a medida da pena aplicada se mostra desadequada, de acordo com o preceituado no artigo 71° do Código Penal.
III. Pelo Tribunal a quo, foi considerado provado que:
(...)
12. No dia 11 de Agosto de 2019, pelas 5.00 horas, os arguidos K. e AC , no âmbito de plano previamente acordado entre ambos, abordaram WM  quando este se encontrava a dormir no interior do seu veículo da marca Ford, modelo Fiesta, com a matrícula 77..., no cruzamento das Ruas de Cabo Verde, São Domingues e São Nicolau, no Bairro da Cova da Moura, Amadora.
13. Os arguidos entraram, de rompante, no veículo, um deles munido com uma arma de fogo que apontaram ao corpo ofendido.
14. De seguida, ordenaram a WM  para que este se sentasse no banco traseiro do veículo, e após darem algumas voltas, ordenaram ao ofendido que saísse do veículo, tendo o mesmo obedecido.
15. Nessa altura, os arguidos entraram no veículo e abandonaram o local, levando consigo o automóvel, bem como, ainda que deles não se tenham apercebido, os objetos que se encontravam no interior do mesmo: um telemóvel da marca Apple, modelo Iphone 7, de cor preta, que operava um cartão da operadora NOS com o número 96 …, uma carteira de pele, de cor preta, com a sua carta de condução e outros documentos pessoais, tudo no valor de cerca de 1.000,00 (mil euros).
(...)”.
IV. Que o arguido, aqui Recorrente “frequentava um estágio para conclusão do curso de formação de Restauração e Bar, que apesar de não o ter concluído, lhe deu a certificação com o 9º ano de escolaridade.”.
V. Que já tinha sido condenado
VI. Que no Estabelecimento Prisional tem tido um comportamento ajustado com as regras e normas com que se deve pautar qualquer pessoa.
VII. Que se inscreveu para frequentar um Curso de Multimédia que lhe dará a equivalência ao 12° ano de escolaridade.
VIII.   Apesar de a testemunha WM  ter declarado reconhecer o Recorrente AC , certo é que só o fez depois de ter dito que no início teve dúvidas.
IX. Para alem de que, admitiu que a vontade de lhe retirarem a viatura automóvel foi imposta ao Recorrente AC.
X. Que foi usada uma arma de fogo mas não pelo Recorrente AC .
XI. Que os bens, que no início pensar que tinham sido roubados, foram recuperados.
XII. Em suma e face de todo o exposto, a pena imposta ao ora recorrente mostra-se, desta forma, excessiva.
XIII.   Foi, assim, violado o artigo 71° do Código Penal.
Face ao exposto e no demais de direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência ser o Douto Acórdão revogado por outro que se mostre adequado, nomeadamente no que diz respeito ao cumprimento da pena, devendo a mesma ser suspensa na sua execução sob o regime de prova, fazendo-se assim, a costumada JUSTIÇA!
*
B – O arguido K. , com as seguintes conclusões:
1. O Relatório Social inserto nos autos extravasa, em larga medida a função imposta pelo art.° 1.° alínea g) do CPP.
2. Os juízos de valor, as referência morais e as pretensas “análises psicológicas” formuladas em Relatório Social, sem qualquer razão de ciência ou substrato válido, não podem ser tidas em conta como integradioras de matéria de facto proavada.
3. Assim “in casu” os pontos de facto números 23,24,25 e 26 da Matéria de Facto provada, não poderiam ter sido considerados provados pela instância. E são estes os pontos de factos os que se consideram incorrectamente julgados (dada a redacção do art.° 412.° n.° 3 alínea a) do CPP.
4. As expressões denegridoras da pessoa do arguido, utilizadas no Relatório Social (parágrafos citados na Motivação) apontando-lhe “fragilidades”, “imaturidade”, “trajetória de vida com factores de risco” “adesão a grupos e pares com comportamentos procriminais”, “ausência de motivações prósociais e associada desvinculação de contextos sociais...” são inválidos como meio de prova por constituírem prova proibida.
5. A utilização de tal caracterização – feita por Técnicos da DGRSP nas costas do arguido – e intrometendo-se em esferas que não são da sua competência como a “análise” a que tais Técnicos procederam das “peças processuais” insertas nos autos, constituem “meio enganoso e prova” previsto no art.° 126.° n.° 1 e 2 alínea a) in fine do CPP.
6. Sendo, por isso, prova proibida.
7: Assim, no douto acórdão não podia elencar tais parágrafos do Relatório Social para concluir pela não possibilidade de um juízo de prognose favorável quanto à evolução do recorrente, impedindo por isso a aplicação de pena de prisão efectiva.
8. O acórdão é, por tal razão, nulo.
9. Ainda assim foi cometido o vício endógeno da insuficiência para a decisão da matéria de facto, contemplado no art.° 410.° n.° 2 alínea a) do CPP
10. Devendo os autos serem remetidos para novo julgamento – afim do mesmo ser reparado - dado o disposto no art.° 426.º do CPP.
11. O douto acórdão – ao considerar como prova válida – todo o conteúdo do relatórios Social violou, por erro dei interpretação, o disposto nos arts 127.º e 355.° do CPP.
12. Não tendo o arguido em audiência – sido confrontado com o teor do Relatório Social – foi violado o disposto no art.° 355.° do CPP e o princípio do contraditório (contraditoriedade) a que faz jus o art.° 327.° do CPP
12. Tendo o arguido – ainda muito jovem, confessado o seu agir ilícito e mostrado arrependimento, deveria o douto Tribunal ter optado pela suspensão da pena de prisão.
13. Ao assim não ter procedido violou por erro de interpretação, o disposto no art.° 50.° 51.° 52.° e 53.° do Código penal.
14. O artº 127º do CPP se interpretado no sentido ou com a dimensão normativa de que vale como meio de prova - suficiente para ser valorado em termos de não ser aplicada a um arguido jovem adulto uma pena suspensa na sua execução - um Relatório Social subscrito por Técnicos que indicam como uma das fontes a análise que fizeram das peças processuais dos autos, - e que fazem referência às qualidades psicológicas do arguido sem nunca o terem periciado - encontra-se ferido de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no artº 32.° n.° 1 2 e 8 da CRP.
Ao decidir como peticionado, assim exercerão V.E Venerandos Desembargadores, a melhor e mais equilibrada JUSTIÇA!
*
O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou a sua contra-motivação, concluindo:
Em relação ao recurso interposto pelo arguido AC :
I - A medida concreta da pena mostra-se adequada à medida da culpa e às exigências de prevenção geral, que são muito elevadas, e especial.
II - A pena está próxima do mínimo e nem atinge 1/5 da moldura penal abstracta, não podendo ser mais baixa, sb pena de dar um sinal de impunidade e se esvaziar o seu efeito dissuasor;
III - Deve ser mantida a prisão efectiva, também, atentas as anteriores condenações pelo mesmo crime e a falta de qualquer arrependimento ou sinal de auto-censura ou interiorização sobre a gravidade dos factos;
IV - Mostra-se fielmente interpretado o disposto no art° 71°, do Código Penal.
Pelo exposto, deve o acórdão recorrido ser confirmado. 
Em relação ao recurso interposto pelo arguido K. :
I - A decisão da matéria de facto não merce qualquer reparo;
II - Ainda que, para a boa decisão da causa, o tribunal se socorra, como seu auxiliar, do relatório social e de eventuais expressões valorativas do mesmo constante;
III – Valendo aqui o princípio da livre apreciação da prova;
IV – Não constitui prova proibida a menção no relatório, social de que o técnico consultou para o efeito peças processuais sabendo-se que para a elaboração do relatório deve ser facultado ao técnico cópia da acusação ou do despacho de pronúncia, e que é disso que se trata com aquela menção;
V – Em termos metodológicos e para melhor cumprir a sua função, para abordagem que é necessário fazer, designadamente, quanto à caraterização da personalidade do arguido, é boa prática que seja facultada ao técnico de reinserção social a acusação ou o despacho de pronúncia, não sendo a mesma coisa se o arguido vai ser julgado por um crime contra o património ou por crime sexual;
VI – Foi devidamente cumprido o princípio do contraditório quanto ao relatório social, tendo o arguido ficado com uma cópia cerca de um mês antes do início da audiência, e tendo aceite o seu teor, nada requerendo ou questionando a seu respeito;
VII – Ainda que o relatório tivesse algum vício, tal constituiria mera irregularidade;
VIII-   Inexiste o vício de insuficiência da prova, previsto no art° 410°, n° 1 e n° 2, alínea a), do Código de Processo Penal;
IX- A medida concreta da pena fez uma interpretação fiel do do disposto nos art°s. 50° e 71° do Código Penal;
X - Devendo ser mantida a pena de prisão efectiva aplicada.
Pelo exposto, deve o acórdão recorrido confirmar-se «in totum».
*
Neste Tribunal a Ex.m.ª Procuradora-Geral Adjunta concordou com a resposta do MºPº na 1ª instância, concluindo pela improcedência do recurso
*
2. – O Acórdão recorrido fixou a matéria de facto, e a motivação, enquadramento jurídico-penal e escolha e medida da pena, da seguinte forma:
II — FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
Discutida a causa, o Tribunal considera provados os seguintes factos, com relevância:
1.  No dia 11-08-2019, pelas 031145m, no cruzamento da Rua Principal com a Rua do Alecrim e a Rua da Palmeira, no interior do Bairro da Cova da Moura, na Amadora, K., juntamente com mais três indivíduos, não concretamente identificados, agindo em comunhão de esforços na execução de um plano delineado entre todos, decidiram abordar RP, que aí conduzia a sua viatura da marca Skoda, modelo Fabia, com a matrícula 35…, para se apropriarem desta e dos bens de valor que dentro da mesma se encontrassem.
2.  Para o efeito, K. colocou-se na estrada e acenou à vítima, fazendo-lhe sinal para que encostasse a viatura à berma da estrada, o que esta fez.
3.  Logo que a vítima imobilizou a sua viatura, de imediato, K. e os indivíduos que o acompanhavam entraram dentro da viatura e estes três, pelo menos, começaram a bater-lhe nos braços e na cabeça com os punhos fechados.
4.  Após, por forma não determinada, RP foi encaminhado para fora do carro.
5.  O arguido K. e os três indivíduos não identificados lograram, assim, apoderar-se da referida viatura, que foi, então, conduzida pelo arguido.
6.  E fizeram seu um telemóvel da marca Apple, modelo 1Phone X Max, de cor preta, que ficou na posse de um dos 3 indivíduos não identificados.
7.  A viatura veio a ser recuperada na Rua da Glória, do Bairro da Cova da Moura, na Amadora, pelas 15h14m, do dia 11 de Agosto de 2019.
8.  Em consequência da atuação dos três indivíduos não identificados, nomeadamente ao atingirem, com os punhos fechados a sua cabeça e braços, a vítima sofreu dores assim como sentiu receio pela sua vida.
9.  O arguido K. esses três indivíduos não identificados agiram, da forma descrita, em comunhão de esforços e intentos, com o propósito concretizado de fazerem sua a viatura automóvel do ofendido e o telemóvel da marca Apple, bem como os bens que com ele encontrassem, bem sabendo que a viatura e o telefone não lhes pertenciam e que agiam contra vontade do seu legítimo proprietário.
10.  Para satisfazerem os seus intentos de apropriação, os três indivíduos que acompanhavam K. não se abstiveram de intimidar o ofendido através da força exercida contra a sua integridade lisica.
11.  Ao agir da forma supra descrita, K. e os outros três indivíduos não identificados agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
12.  No dia 11 de Agosto de 2019, pelas 5.00 horas, os arguidos K. e AC , no âmbito de plano previamente acordado entre ambos, abordaram WM  quando este se encontrava a dormir no interior do seu veículo da marca Ford, modelo Fiesta, com a matrícula 77..., no cruzamento das Ruas de Cabo Verde, São Domingues e São Nicolau, no Bairro da Cova da Moura, Amadora.
13.  Os arguidos entraram, de rompante, no veículo, um deles munido com uma arma de fogo que apontaram ao corpo ofendido.
14.  De seguida, ordenaram a WM  para que este se sentasse no banco traseiro do veículo, e após darem algumas voltas, ordenaram ao ofendido que saísse do veículo, tendo o mesmo obedecido.
15.  Nessa altura, os arguidos entraram no veículo e abandonaram o local, levando consigo o automóvel, bem como, ainda que deles não se tenham apercebido, os objetos que se encontravam no interior do mesmo: um telemóvel da marca Apple, modelo lphone 7, de cor preta, que operava um cartão da operadora NOS com o número 96..., urna carteira de pele, de cor preta, com a sua carta de condução e outros documentos pessoais, tudo no valor de cerca de 1.000,00 (mil euros).
16.  Os arguidos atuaram em conjugação de esforços e propósitos, na sequência de prévia combinação efetuada, visando a apropriação dos bens do ofendido, o que lograram conseguir, aproveitando-se da superioridade numérica, recorrendo à força e violência e fazendo uso de anua, o que colocou o ofendido na impossibilidade de se defender.
17.  Os arguidos atuaram de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas criminalmente.
18.  K.  reside desde há vários anos com os avós e um tio, não sendo assinaladas problemáticas relacionais dignas de registo.
19.  O arguido vive na dependência económica dos elementos que constituem o agregado.
20.       Natural de França, o arguido tem dois irmãos mais novos, um uterino e outro consanguíneo, provenientes de relacionamentos que os pais vieram a estabelecer após se terem separado.
21.  Depois desta separação dos pais, K. , que contava cinco anos, ficou entregue aos cuidados da mãe mas, mais tarde, a sua educação acabou por ser assegurada pelos avós.
22. Devido à ausência de adesão ao sistema de ensino aprendizagem e às práticas absentistas, o arguido regista retenções no seu percurso escolar, tendo concluído o 8° ano de escolaridade com dezasseis anos.
23.  Sem ligação a qualquer atividade estruturada, K.  aderiu, após o abandono escolar, a grupos de pares com comportamentos delinquentes e mantinha um modo de vida à margem da normatividade social, sendo este o contexto em que vivia à data em que foi proferida acusação nestes autos.
24.  Como tentativa de o afastar do grupo de pares com comportamentos desviantes, os avós mudaram o local de residência e, durante um determinado período de tempo, o arguido esteve emigrado em França na casa de uns tios, contexto a que não se adaptou.
25.  Não se identificam na história de vida do arguido fatores motivacionais dirigidos ao investimento e pro-atividade na procura de soluções alternativas conducentes à adoção de um modo de vida pró-social, sendo esta uma das áreas em que necessita de intervenção.
26.  Em termos de caraterísticas pessoais, K.  apresenta traços de imaturidade e fracas competências pessoais e sociais.
27.  No entanto, após estimulado, dispõe de recursos que lhe permitem reconhecer o seu envolvimento em comportamentos disruptivos, bem como percecionar os efeitos das suas atitudes nos outros.
28.  O arguido tem manifestado capacidade de adaptação ao confinamento e dispõe de apoio estruturado por parte dos avós.
29.  AC  nasceu em Lisboa e é proveniente de uma família de ascendência africana.
30.  É o mais velho de 2 irmãos germanos.
31.  Os pais separaram-se quando o arguido tinha cerca de 11 anos de idade.
32.  Após a separação, os contactos com o pai passaram a ser esporádicos e a relação entre ambos distante.
33.  Posteriormente, o pai emigrou para a Bélgica, onde ainda se mantém.
34.  A mãe mantêm nova relação marital.
35.  O arguido apresenta um percurso escolar pouco expressivo e com várias retenções.
36.  Manteve um comportamento incorreto em contexto escolar e elevado absentismo.
37.  Antes de ser preso, frequentava um estágio para conclusão do curso de formação de Restauração e Bar, que apesar de não o ter concluído, lhe deu a certificação com o 9° ano de escolaridade,
38.  Antes de ser preso, residia com a sua família próxima, composta por mãe de 42 anos, irmão de 20 anos, padrasto de 42 anos e a filha deste, de 16 anos de idade.
39.  O agregado reside numa habitação arredada, numa zona predominantemente residencial, conotada problemas de marginalidade nas suas imediações.
40.  Em termos económicos, AC , dependia do apoio da família.
41.  A mãe trabalha nas limpezas e aufere o salário mínimo nacional, o padrasto trabalha como técnico de manutenção num hotel e aufere um vencimento de cerca de €700, 00 mensais e o irmão é trabalhador estudante.
42.  O arguido mantinha um estilo de vida sem ocupação estruturada de tempos livres.
43.  Passava o seu tempo no convívio com grupos de pares com as mesmas características.
44.  AC  vivenciava uma situação de autonomia desajustada para a sua idade, não informando a mãe sobre os locais que frequentava, nem o estilo de vida que matinha, demostrando a familia dificuldade em exercer um controlo parental eficaz.
45.  Aparentemente, esta dinâmica parece ter afetado a aquisição de adequadas competências pessoais e sociais e favoreceu a manifestação de características de fragilidade pessoal, imaturidade e permeabilidade a fatores externos e nocivos, nomeadamente de pares com comportamentos pró-criminais.
46.  Neste contexto, o arguido passou a apresentar um percurso que culminou com anteriores contactos com o sistema de justiça penal.
47.  No âmbito do processo 780/17.4PVLSB, em que veio a ser condenado nos termos infra descritos, cumpriu um período de Obrigação de Permanência na Habitação com Vigilância Eletrônica entre 05/04/2018 e 16/05/2019.
48.  Na generalidade, o arguido cumpriu com as regras e obrigações inerentes ao regime de prova impostos nos processos infra descritos.
49. O regime de prova encontrava-se em acompanhamento pela equipa da DGRSP, mas devido ao facto do arguido ter sido preso preventivamente à ordem do processo n° 1019/19.3PWLSB do Juízo Central Criminal de Lisboa, foram enviados relatórios aos respetivos processos, aguardando-se os despachos que sobre os mesmos recaírem.
50. Em meio prisional, tem apresentado um comportamento consentâneo com as normas e regras institucionais.
51.  Reconhecendo a necessidade de adquirir competências a nível escolar, inscreveu-se num curso EFA Nível Secundário de Multimedia, que lhe dará equivalência ao 12° ano de escolaridade.
52.  No Estabelecimento Prisional, ainda não teve visitas da mãe e do irmão.
53.  A família mostra-se disponível para, no futuro, o apoiar no que se mostrar necessário.
54. O arguido K. foi condenado em 30/05/2019, por sentença transitada em 1/07/2019, no processo sumário n° 384/19.7PDAMD, do Juiz 2, do Juízo Local Criminal da Amadora, na pena de 70 dias de multa, pela prática, em 18/05/2019, de um crime de condução sem habilitação legal.
55.  E foi condenado no processo sumaríssimo n° 36/19.8PJAMD, do Juiz 1, do Juízo Local Criminal da Amadora, por sentença de 13/06/2019, na pena de 90 dias de multa, pela prática, em 11/01/2020, de um crime de detenção de arma proibida. Esta pena foi declarada extinta em 18/03/2020.
56. O arguido AC foi condenado em 16/05/2019, por sentença transitada em 17/06/2019, no processo n° 780/17.4PVLSB, do Juiz 19, do Juízo Criminal de Lisboa, na pena única de 4 anos e 3 meses de prisão, pela prática, em julho e 14 de dezembro de 2017, de um crime de roubo qualificado.
57. E foi condenado no processo n° 746/17.4PFLRS, do Juiz 3, do Juízo Local Criminal de Loures, por sentença de 6/12/2019, transitada em 31/1/2020, na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensa por igual período, com imposição de regime da prova, pela prática, em 5/06t2017, de dois crimes de roubo.
Factos que, com relevância para a causa, não se consideraram provados:
a)  Que na situação descrita em 1. tivesse sido usado um chicote.
b) Que, nessas circunstâncias, um desses 3 indivíduos, que acompanhavam o arguido K. , apontasse e encostasse à cabeça de RP um revólver, tendo este, de imediato, saído da sua viatura em corrida.
c) Que RP ao sair do carro, fosse no sentido da estação de comboios da Damaia, onde solicitou ajuda.
d) Que o arguido K. e os três indivíduos que o acompanhavam tivessem feito seus, igualmente, uma bolsa a tiracolo azul e branca da marca "Reebook", que continha no seu interior: duas máquinas para fumar tabaco aquecido da marca IQOS, uma de cor branca e outra de cor preta, as chaves pessoais da vítima; €100,00 (cem euros) em notas do BCE; uma carteira de pele de cor castanha, com a sua carta de condução Suíça; autorização de residência Suíça; cartão de cidadão português; dois cartões Multa anco do Banco "Millenium BCP", um cartão SIM da operadora Suíça Sunrise.
e) Que o arguido K. agisse da forma descrita com esses três indivíduos, com o propósito concretizado de fazerem seus estes objetos.
1) Que a arma de fogo utilizada em ambas as situações fosse um revólver; g) Que na situação ocorrida pelas 5 horas, fosse utilizada, ainda, uma segunda arma.
Motivação da Decisão de Facto
A convicção do tribunal, relativamente à matéria de facto descrita na acusação e que ora se deu por assente, estriba-se no confronto crítico das declarações dos arguidos, com o depoimento produzido por WM , com os documentos juntos aos autos (com especial enfoque nos aditamentos de fls 14, 175 e 223, auto de apreensão de fls. 33, fatura de aquisição de Iphone de fls. 220 e termo de entrega da viatura Skoda Fabia, de fls. 216), autos de reconhecimento pessoal de fls. 364 e 503 e relatórios periciais (de fls. 45, 150, 183, 422, 467, 482 e 599).
O arguido AC remeteu-se ao silêncio, reservando parcas palavras para sede de declarações finais. Aí, para além de declarar concordância com os elementos biográficos constantes do relatório social rd' 17710800, afirma que apenas pintou o cabelo de amarelo em Dezembro, nada mais querendo esclarecer.
Já o arguido K. prestou declarações no inicio, admitindo parte dos factos imputados, ainda que com muitas ressalvas.
Estas declarações são prestadas de forma pouco espontânea e com avanços e recuos evidentes.
Assim, por variadas vezes, de forma reiterada, avança que não se lembrava de quem o acompanhava nas duas situações, naquela madrugada de 11 de agosto de 2019. Mesmo instado a que esclarecesse como é que se havia esquecido de um facto que deveria ser marcante, até por ser desviante dos seus hábitos, reitera-o várias vezes até que o seu II, mandatário solicita uma interrupção para com ele conferenciar.
A partir desse momento e após quase 12 minutos de interrogatório, corrige a sua posição inicial, esclarecendo que, afinal, tem medo de identificar as pessoas que agiram consigo.
As suas declarações, apesar de parcialmente confessorias, são sempre de molde a diminuir a intensidade da sua resolução criminosa e até da sua importância no grupo, que teria de ser de destaque e de liderança, porquanto é ele que, nas duas situações, acaba por ficar na posse das viaturas e de as conduzir.
Sendo que a testemunha WM  faz notar que esta vontade foi imposta ao arguido AC que lhe pedia para conduzir a viatura de que aquela era proprietária.
Assim, e no que diz respeito a esta situação, a primeira descrita na acusação, o arguido, admitindo as circunstâncias de tempo e de lugar, reconhece que foi usada uma arma de fogo, afirmando que se tratava de uma pistola de 9 mm que foi empunhada, ainda que ccnn o seu conhecimento e anuência, pelo indivíduo que o acompanhava.
A testemunha WM  confirma que lhe foi exibida uma pistola pequena, não sendo assertivo quanto à pessoa que o empunhava pelo que, neste confronto de versões apenas se pôde ter por certo que um dos assaltantes empunhou uma arma de fogo e exibiu-a à vítima.
O arguido K. admite, no mais, a dinâmica dos demais factos, nomeadamente que, abordado o WM , ele e o seu companheiro de ocasião ordenaram que este se sentasse no banco traseiro, tendo o primeiro assumido o controlo do veículo e circulado pelo Bairro Cova da Moura e suas imediações, durante 5 minutos, até que ordenaram ao ofendido que saísse. Aí, sempre realçando que quis conduzir a viatura, prosseguiu essa condução.
O arguido assume que, nesta situação, chegou a ver um telemóvel de marca lphone, desconhecendo se a pessoa que o acompanhava ficou com ele.
Depois de se terem deslocado pelo Bairro, acabou por, nele, abandonar a viatura, deixando a chaves no interior, no que vem a ser contrariado, de forma credível, pela testemunha que declara que a viatura foi encontrada sem a chave.
Quanto à segunda situação descrita na douta acusação (mas primeira cronologicamente) K. admite que, quando viu a viatura Skoda Fabia a passar, acenou ao condutor para que a parasse, resultando das suas declarações e do seu discurso atabalhoado, que ainda que não tenha sido previamente acordado, ele e os outros três indivíduos aderiram a um plano que ali se desenhou.
Assim, quando o condutor parou a viatura, os outros indivíduos que não quer identificar entram na viatura e esmurraram o corpo daquele.
Depois, em determinado momento, logram que este saísse da viatura, sendo que o arguido declarante assume o comando desse automóvel, passando a deslocar-se nele até o abandonar. Como reitera, sempre de forma pouco convincente, a sua intenção era conduzir.
Questionado, o arguido esclarece que viu um telemóvel de marca lphone, preto, tal como o descrito na acusação, nas mãos de um dos outros indivíduos que o acompanhavam, já que estes tiraram a vítima do carro para a roubar — "tinham outras intenções" como afirma.
De todo o modo, não afasta que esta ação conjunta permitiu que fosse eliminada a resistência do proprietário da viatura — RP — permitindo-lhe ficar com a posse do veículo e aos demais ficar com o lphone descrito na fatura de aquisição de fls. 220.
Repare-se que ainda que parecendo admitir, num primeiro momento, também neste caso, o uso de uma pistola (e não um revólver) rapidamente esclarece que se pretendia referir à situação do WM .
Mais, o arguido afirma não ter visto ser usado um chicote.
Ora, atenta a impossibilidade de se colher o depoimento de RP - até pelos motivos consignados em ata — e vista a ausência de outro meio de prova que as infirme, as declarações do arguido, mesmo que pouco credíveis e muito desculpabilizadoras, acabam por enformar a matéria de facto.
De todo o modo, o exame pericial de fls. 150 de recolha de vestígios com interesse forense do Skoda Fabia 35…e o exame pericial de fls. 467, de comparação das impressões digitais e palmares de K. com os vestígios lofoscópicos ali encontrados, vieram a revelar que lhe pertencia o vestígio digital encontrado na face externa frontal do lado esquerdo, por cima do puxador, sinal inequívoco de que este arguido abriu a porta do veículo pelo lado do condutor.
O arguido K. admite que, em ambas as situações atuou livre, deliberada e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida por lei.
Ao admitir que abandonou as viaturas no Bairro da Cova da Moura, acaba por reconhecer que atuou com intenção de fazer esses bens coisa sua e atuar como se fosse seu dono, contra a vontade dos respetivos proprietários.
Ora, o depoimento de WM  é prestado de forma credível, espontânea e objetiva.
Esta testemunha acaba por corroborar os factos que foram considerados assentes, salvaguardando que os documentos estavam na viatura, caídos entre os bancos dianteiros, pelo que os voltou a recuperar, tal como aconteceu com o seu lPhone que custaria E 400,00 a e 500,00 e que encontrou debaixo do banco.
Quanto ao veículo, confirmando a sua propriedade, este valeria e 600,00.
O depoente confirma que estava a dormir no interior do carro, pois que havia ingerido bebidas alcoólicas c sabia não se encontrar em condições para exercer a condução
Quando foi abordado pelos dois arguidos, apenas viu uma pistola.
Também a viatura lhe foi restituída como já resultava do aditamento de fls. 14, em que a PSP dá conta da devolução do carro, bem como da carta de condução, da carteira e do Iphone.
No entanto, jamais recuperou a chave, bem como um casaco de fato de treino da marca Nike.
Como resulta das fotografias junto ao auto de exame de fls.45, em que são bem visíveis os danos na pintura, nos espelhos e na grelha frontal, o depoente confirma que a viatura foi devolvida com estragos, afiançando que gastou mais de cem euros na sua reparação.
A testemunha afirma que não tem dúvidas de que o arguido AC acompanhava o arguido K. .
Esclarece que ainda que entre os dois arguidos, tenha tido mais dúvidas quanto ao AC  por causa da cor do cabelo, tem a certeza de que este era um dos dois assaltantes.
O depoente corrobora, assim, as certezas que transportou para os reconhecimentos pessoais dos dois arguidos, reduzidos a auto a fls. 364 e 503.
Repare-se que este reconhecimento é corroborado, de forma segura, pela prova pericial.
Assim, como resulta do confronto do auto de apreensão de fls. 33, com os autos de exame periciais de fls. 45 e 72, foi encontrado, no interior do veículo, no recetáculo junto à porta, um fio de ouro amarelo.
Ora, a fls, 599, encontra-se relatório pericial forense (por reporte ao termo de entrega de fls, 62 e ss) que confirma que os vestígios biológicos encontrados naquele fio, de acordo com a análise de ADN, pertencem ao arguido AC.
Aliás, o relatório pericial de fls. 482, confirma que os outros vestígios biológicos encontrados naquele cordão pertenciam ao arguido K. .
Ora esta prova biológica permite confirmar. em confronto com o depoimento prestado por WM , para além de qualquer dúvida, que o arguido AC atuou em conjunto e em conjugação de esforços com o arguido K. , tendo sido aqueles que depositaram aquele cordão no veículo que subtraíram, com recurso a ameaça com arma de fogo, à vítima.
Os demais relatórios sociais supra nomeados são inequívocos quanto aos vestígios que K. deixou nesta viatura Ford Fiesta.
Os factos assentes em 16 e 17, ainda que intrínsecos à vontade interior do arguido AC  são objetivados pela sua atuação exterior, transmitida pela conjugação das declarações de K. e do depoimento de WM .
Os antecedentes criminais dos arguidos resultaram comprovados dos certificados de registo criminal juntos aos autos, a fls. 571 e ss. do respetivo suporte físico.
Os factos relativos às condições económicas e sociais dos arguidos e respetivos percursos de vida, assentam nos relatórios sociais, juntos a fls. 637 do suporte físico dos autos e sob a referência 17710800, a que já se aludiu.
Os factos que se consideraram não comprovados resultam do que se disse e da falta de quaisquer meios de prova que os comprovassem.
***
III — ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL E MEDIDA DA PENA
1. Dos crimes de roubo.
O arguido K. está acusado da prática, em coautoria, de dois crimes de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n" 2 alínea h) e 204°, n° 2 alíneas 1) e g), ambos do C. Penal;
O arguido AC  está acusado da prática, em coautoria, de um crime de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alíneas 1) e g), ambos do C. Penal.
Estabelece o citado art° 210°, n° 1, que "Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel ou animal alheios, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade fisica, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.".
De acordo com o n° 2 do mesmo preceito, "A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se: (....) b) Se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos ns. 1 e 2 do artigo 204°, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n° 4 do mesmo artigo".
Prevê o artigo 204° do CP circunstâncias modificativas agravantes especiais e, em concreto, no artigo 204, n " 2 1) quando o agente atua sobre coisa móvel alheia (ou animal alheio), "Trazendo, no momento do crime, anua aparente ou oculta" e na alínea g) quando atuar "Como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de, pelo menos, outro membro do bando".
Caso haja concurso de circunstâncias agravantes do artigo 204°, n° 1 e 2 do Código Penal, aplica-se o disposto no artigo 204°, n° 3 do mesmo diploma "Se na mesma conduta concorrerem mais do que um dos requisitos referidos nos números anteriores, só é considerado para efeito de determinação da pena aplicável o que tiver efeito agravante mais forte, sendo o outro ou outros valorados na medida da pena".
O n° 4 prevê que: "Não há lugar à qualificação se a coisa furtada for de diminuto valor".
O artigo 202°, c) do mesmo diploma define valor diminuto como "Aquele que não exceder uma unidade de conta avaliada no momento da prática do facto".
"O roubo é um crime complexo que ofende quer bens jurídicos patrimoniais — o direito de propriedade e de detenção de coisas móveis — quer bens jurídicos pessoais — a liberdade individual de decisão e de acção (em certos casos, a própria liberdade de movimentos) e a integridade física (...) ". Nesse sentido, vide, nomeadamente, Ac. STJ de 1.5 de Fevereiro de 1995, in CJ, Acs. STJ, III, tomo 1, 216.
São elementos objetivos do crime de roubo:
a ilegítima intenção de apropriação;
a subtração ou constrangimento a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia (ou animal alheio);
por meio de violência contra uma pessoa.
O objeto do crime de roubo é, então, no que neste caso interessa, "coisa móvel alheia", sendo que "coisa deve ser valorada mais no sentido que o comum das pessoas (a esfera do valor de uso das palavras referidas a um leigo) empresta a tal vocabulário do que expressão daquilo que o art° 202° do Código Civil define como "coisa ".
Relativamente à "subtração de coisa móvel alheia", deve entender-se a passagem da "coisa móvel" da esfera de domínio do detentor para nova esfera de domínio, contra a vontade daquele ".
Já no que respeita ao conceito de violência, ainda que este esteja longe de ser pacífico, tem-se entendido que, "é equiparada à violência qualquer maneira ardilosa, subreptícia ou similar pela qual o agente, embora sem o emprego da força ou incutimento de medo, consegue privar a vítima do poder de agir" — Ac. STJ de 19 de Dezembro de 1989, BMJ, 392, pág. 251.
Quanto ao tipo subjetivo de ilícito, trata-se de um tipo legal doloso (art° 14° C.P.), pelo que, terá sempre que haver dolo, nem que seja o eventual. "Assim, é suficiente que o agente esteja consciente de que a violência ou a ameaça é adequada a constranger à entrega do bem ou a constranger à tolerância da subtracção do bem, conformando-se com tal resultado ". O tipo exige, ainda, uma intenção ilegítima de apropriação para si ou para terceiro de um bem (que se sabe alheio e sobre o qual se age sem direito legítimo de apropriação). A intenção ilegítima traduz-se na atuação com o conhecimento dos "pressupostos fácticos da valoração", na expressão do Prof. Figueiredo Dias (Crimes contra a Vida e a integridade física, 2" edição, 2007, AAFDL, pág. 354)
Ora, realizando a subsunção dos factos provados à norma incriminadora, atente-se na matéria que se deu por assente relativamente a cada uma das duas situações descritas na acusação, local e temporalmente próximas umas das outras, que aqui se considera reproduzida.
Na primeira situação, pelas 3 h 45m do mesmo dia 11 de agosto de 2019, no cruzamento da Rua Principal com a Rua do Alecrim e a Rua da Palmeira, no interior do Bairro da Cova da Moura, na Amadora, o arguido K., juntamente com mais três indivíduos, agindo em comunhão de esforços na execução de uni plano delineado entre todos, decidiram abordar RP, que aí conduzia a sua viatura da marca Skoda, modelo Fabia, com a matrícula XX-XX-XX, para se apropriarem desta e dos bens dc valor que dentro da mesma aí se encontrassem. K. colocou-se na estrada e acenou à vítima, fazendo-lhe sinal para que encostasse a viatura à berma da estrada e logo que aquela imobilizou a sua viatura, ele e os três indivíduos que o acompanhavam entraram dentro da viatura. Depois, pelo menos, estes 3 indivíduos começaram a agredir o ofendido nos braços e na cabeça com os punhos fazendo com que o ofendido saísse da viatura. Pelo que o arguido K. e esses indivíduos lograram apoderar-se da viatura que apenas veio a ser recuperada na Rua da Glória, do Bairro da Cova da Moura, na Amadora, pelas 15h14m, do mesmo dia. E apoderaram-se, igualmente, de um telemóvel, que ficou na posse de um destes três indivíduos.
Comprovou-se, em suma, que este arguido e indivíduos, atuando em conjunto e em conjugação de esforços, colocaram RP, pela força, na impossibilidade de resistir fazendo seu aqueles bens de valor superior a € 102,00, contra a vontade do dono.
O artigo 4.° do DL 48/95, de 15 de março, diploma que aprovou o Código Penal de 1995, dispõe que "Para efeito do disposto no Código Penal, considera-se arma qualquer instrumento, ainda que de aplicação definida, que seja utilizado como meio de agressão ou que possa ser utilizado para tal fim".
Não obstante a posterior entrada em vigor da Lei 5/2006, de 23 de fevereiro, que aprova o novo regime jurídico das armas e suas munições, aquele artigo 4° mantém atualidade para densificação do conceito de arma, à luz do supra enunciado artigo 204°, n° 2 1), para o qual remete o n° 2 do artigo 210°, ambos do Código Penal.
Aliás, norma semelhante era já encontrada no n.° 1° do artigo 426° do Código Penal de 1852.
Como se defende no Código Penal Anotado de Leal-l-lcnriques e Sintas Santos, 1996, 2° volume, página 443, "o conceito de arma só abrange a que possa ser usada corno meio eficaz de agressão, quer sejam armas ditas próprias destinadas normalmente ao ataque ou defesa e apropriadas a causar ofensas fisicas, quer as impróprias, todas as que têm aptidão ofensiva, se bem que não sejam normalmente usadas com fins ofensivos ou defensivos".
Sem necessidade de fazer um excurso sobre a evolução da jurisprudência e suas divergências, dúvidas inexistem de que se tem considerado unanimemente, pelos Tribunais superiores que o crime de roubo é agravado pela alínea 1) do n° e do artigo 204° do Código Penal quando o agente traz consigo (escondida ou aparente) objeto que possa ser utilizado como instrumento eficaz de agressão.
Aqui, "aparente", adjetivo que é utilizado na alínea 1) por oposição a "oculta" diz respeito ao objeto que aparece ou se mostra.
Ora, realizando a subsunção dos factos provados à norma incriminadora, atente-se não se logrou, nesta situação, demonstrar que qualquer um dos intervenientes do assalto trazia consigo uma arma de fogo.
Realizando a subsunção dos factos provados à norma incriminadora resulta evidente o compromisso do arguido K. com os elementos objetivos do tipo de crime de roubo porquanto ele e as pessoas que consigo atuaram praticaram uma ação voluntária, que diretamente produziu um resultado típico, contido no tipo criminal do artigo 210°, n° 1 do Código Penal.
A violência exigida pelo tipo não tem de ser direta e pode consistir no mero constrangimento a esta ação de subtração, através de urna ameaça com um mal relevante mas, no caso, inexistem dúvidas sobre a existência de mal efetivo sobre o corpo da vítima e sobre o emprego de violência.
Esta violência explícita empregue é causa Sitie gra: non da perda de domínio do veículo pelo seu legítimo possuidor. E contém-se dentro dos limites do tipo já que é exercida de forma a esgotar-se na pretendida subtração patrimonial.
O arguido e esses indivíduos integraram os bens no seu património, usando-os como se fossem seu, ficando aquele comprometido com o tipo criminal de roubo, ainda que apenas tenha ficado na posse da viatura.
Relativamente aos elementos subjetivos do tipo incriminador, resultou provado que o arguido agiu dolosamente, ou seja, com conhecimento e vontade de produzir o resultado verificado, querendo e preenchendo, com a sua conduta, a norma incriminadora do nº 1 do artigo 210°, pretendendo retirar o veiculo e o telemóvel ao ofendido, sabendo este não lhe pertencia e de que atuava contra a vontade do seu proprietário.
Bem sabia o arguido, corno se viu, que tal conduta não lhe era permitida, mas ainda assim, quis livremente agir do modo descrito, atuando com dolo direto, porquanto dispõe o art° 14°, n° 1 do C.P. que "Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, actuar com intenção de o realizar".
E atuou com a especial intenção de subtrair este veículo com recurso violência, mesmo sabendo que sobre ele não podia exercer qualquer direito e que atuava contra a vontade do dono.
A intervenção do arguido e dos indivíduos que o acompanhavam no evento danoso é simétrica e essencial e surge na sequência de um plano comum. O arguido manda parar o carro, os demais acercam-se do ofendido, entram no carro, batem-lhe, forçam-no a sair e ficam com o telemóvel.
Preenchidos os elementos objetivos e subjetivos do tipo legal do crime de roubo simples e inexistindo causas de exclusão da ilicitude do ato ou da culpa do arguido, conclui-se que este cometeu coautoria material (cfr. artigo 26° do Código Penal), o crime previsto no artigo 210°, n° 1 do Código Penal.
A factualidade assim assente não integra, no entanto, por não ter sido usada unia arma "aparente ou oculta" o tipo criminal agravado, previsto e punido pelos artigos 210°, n° 1 e n° 2 b) e, por referência, 204°, n° 2 f) do Código Penal.
Também a segunda agravante imputada, prevista na alínea g) do n° 2 do artigo 204° do CP, aplicável ex- vi do artigo 210°, n° 2 b), não se mostra preenchida.
Na verdade, olhando para toda a matéria que se deu por assente, não se permite inferir do conjunto das duas atuações isoladas, que este arguido tenha atuado como membro de bando.
O "bando" é um grupo social ou institucionalizado com relativa autonomia sociológica e psicológica que, dadas as suas características, pode desaguar na criminalidade (cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 7.3.97, in P.° n.° 10/97) incontrolada, pela 1Slobilidade que lhe é própria).
Um bando não necessita de uma determinada organização, nem de um chefe certo, assim diferindo da associação criminosa (artigo 299° do CP).
No entanto, "o objetivo do bando é a prática repetida de furtos. Não é suficiente, portanto, a associação para cometer um único furto, ainda que na fona continuada. No furto praticado por bando há o eco, a evocação do crime organizado. A sua especial perigosidade deriva de por detrás do crime estar um objetivo comum de um grupo especializado de agentes. Estes cobrem-se mutuamente e a respetiva atividade assenta na divisão do trabalho" (M. Miguez Garcia, na obra o Direito Penal Passo a Passo, volume II, 2015, 2° Edição, Almedina, pág.89).
Ora, inexistem factos assentes que permitam comprovar que, para além da reiteração do modos operandi, e para além da atuação comum do arguido K. nas duas ocasiões subjudice, estamos perante uma atuação de bando.
O bando situa-se para além da mera coautoria que, no caso, já verificámos existir — "O bando, de acordo com as melhores regras interpretativas, situa-se a meio caminho entre a co-autoria e associação (...) mas dentro da fidelidade ao esquema de que o bando é um " minus " , integrante do tipo , relativamente à associação , um grupo desarticulado, em que os seus membros gozam de relativa autonomia, mas visando a prática de crimes em comum, sem líder, distribuição de tarefas e especialização" (Acórdão do STJ, de 12 de setembro, proc. 2605/07, relatado pelo Conselheiro Anuindo Monteiro).
Não se consegue extrapolar dos factos assentes no seu conjunto que qualquer uma das resoluções criminosas assente nesta relação entre dois ou três, ou mais, membros de um bando.
Assim, concluímos que os factos assentes não permitem subsumir a atuação dos arguidos à circunstância agravante prevista nesta alínea g) do n° 2 do artigo 204° do Código Penal.
Quanto à segunda situação, ocorrida pelas 5 horas da manhã, no mesmo Bairro, vale aqui, munias musandi, todo o excurso feito a propósito dos elementos essenciais do tipo de crime de roubo.
Nesta situação, apurou-se que os dois arguidos, K. e AC , no âmbito de plano previamente acordado entre ambos, abordaram WM  quando este se encontrava a dormir no interior do seu veículo da marca Ford, modelo Fiesta, com a matrícula 77..., num arruamento do Bairro da Cova da Moura, Amadora.
Os arguidos entraram no veículo, um deles munido com uma arma de fogo que apontaram ao corpo ofendido. De seguida, ordenaram à vítima para que este se sentasse no banco traseiro do veículo, e após darem algumas voltas, ordenaram ao ofendido que saísse do veículo, tendo o mesmo obedecido. Nessa altura, os arguidos reentraram no veículo e abandonaram o local, levando consigo o veículo, bem como os objetos que se encontravam no interior do mesmo: um telemóvel da marca Apple, modelo lphone 7, de cor preta, que operava um cartão da operadora NOS com o número 96..., urna carteira de pele, de cor preta, com a sua carta de condução e outros documentos pessoais, tudo no valor de cerca de 1.000,00 (mil euros).
Estes dois arguidos atuaram, assim, na execução de uni plano comum e em comunhão de esforços prevista no artigo 26° do Código Penal.
Nesta situação, inexistem dúvidas de que estes arguidos estão, aqui, comprometidos com os elementos objetivos do crime previsto no artigo 210°, n° 1 e n° 2 b) e, por referência, artigo 204°, n° 2 f) do Código Penal, porquanto lograram vencer qualquer resistência do ofendido à subtração do veículo e dos bens que nele se encontravam através da exibição de uma arma de fogo.
Os dois arguidos atuaram com a consciência de que tal conduta não lhes era permitida, mas ainda assim, quiseram livremente agir do modo descrito, atuando com dolo direto, porquanto dispõe o art° 14°, n° 1 do C.P. que "Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, actuar com intenção de o realizar". E agiram, igualmente, com a especial intenção de apropriação ilegítima, pelo que estão comprometidos com os elementos subjetivos do tipo de crime previsto e punível pelo artigo 210°, n° 1 e n° 2 do Código Penal.
Inexistindo causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, os arguidos não podem deixar de ser punidos, aqui, pela prática, em coautoria, de um crime de roubo, previsto e punível pelo artigo 210°, n° 1 e n° 2 b) do Código Penal e, por referência deste, artigo 204º, n° 2 0 do mesmo diploma.
Pela mesma ordem de razões supra apontada, é de excluir o preenchimento da circunstância especial agravante prevista na alínea g) do n° 2 do artigo 204°, ex vi do artigo 210°, n° 2 b) do mesmo diploma.
2. DA REAÇÃO PENAL.
2.1. Escolha e Medida da Pena
O arguido K. é condenado pela prática de um crime de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alínea O. ambos do C. Penal, com pena de prisão de 3 a 15 anos e por um crime de roubo, previsto e punível pelo artigo 210°, n° 1 do Código Penal, na pena de prisão de 1 a 8 anos.
AC  é condenado pela prática, em coautoria material, de um crime de Roubo agravado, p. p. pelo disposto no art.° 210° n° 1 e n° 2 alínea b) e 204°, n° 2 alínea 1), ambos do C. Penal.
Em sede de determinação das consequências jurídicas do crime e da reação criminal adequada, a culpa e a prevenção funcionam como critérios gerais orientadores da medida da pena, tendo esta, sempre, como limite, aquela, que é justamente o seu suporte. Relevantes para encontrar a "medida da culpa", são os próprios ilícitos típicos, enquanto apreciados nas suas consequências típicas, que lhe conferem unia certa "imagem" ou sentido social.
Importa, assim, determinar a medida de cada pena de prisão aplicável a cada um dos crimes, sendo sempre a medida da culpa e as exigências de prevenção a marcar o limite da pena (cfr. art. 71° do CP).
No entanto, verifica-se que os dois arguidos ora condenados eram, ambos, à data dos factos, menores de 21 anos.
Nos termos do art° 9D do Código Penal, "aos maiores de 16 anos e menores de 21 são aplicáveis normas fixadas em legislação especial".
Esta legislação especial está contida no Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de Setembro (Regime Especial para Jovens), e assenta na ideia de que o jovem delinquente é merecedor de um tratamento penal especializado, "não só porque a sua capacidade de ressocialização é mais fácil, por se encontrar no limiar da maturidade, como ainda porque se deve evitar, em princípio, uni tratamento estigmatizante ".
O Decreto-Lei n° 401/82, aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime — n° 1 do art° 1°.
Para efeitos do Decreto-Lei n° 401/82, é considerado jovem o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos — art° 1°, n° 2. É o caso dos dois arguidos ora condenados.
Nos termos do artº' 4° daquele regime, se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73° e 74° do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Analisada a matéria de facto provada, verifica-se que a situação de cada arguido é substancialmente diferente.
Efetivamente, o arguido K.  já contava, à data dos factos, com duas condenações, urna por condução sem habilitação legal e outra por um crime de arma proibida, mas fora, sempre, condenado em pena de multa.
Mais, numa das situações, a decisão condenatória foi proferida em processo sumaríssimo, processo de solenidade diminuída e que uma personalidade jovem poderá não alcançar todas as cambiantes e o peso da condenação.
Este arguido, para além de prestar declarações, ainda que pressionado pela prova biológica e lofoscópica reunida contra si, acabou por admitir parte da factualidade, assumindo, ainda que de uma forma imperfeita, a censurabilidade da sua conduta.
O relatório social, ainda que aponte fragilidades, reconhece que "após estimulado, dispõe de recursos que lhe permitem reconhecer o seu envolvimento em comportamentos disruptivos, bem como percecionar os efeitos das suas atitudes nos outros".
Assim, entende-se que, no caso deste arguido, a aplicação do regime punitivo mais favorável consagrado no DL n° 401/82, de 23 de setembro poderá ser favorável à sua reintegração social.
Já quanto ao arguido AC, a falta da prestação de declarações não permite concluir por um arrependimento ativo e redentor, é certo.
No entanto, atento ao disposto no art.° 342º, n° 1, do CPP e 32°, n° 1, da-CRP, essa ausência de declarações (que até poderiam constituir um facto positivo a atender na determinação da pena) não pode merecer valoração negativa e ser tida em seu prejuízo.
Mas também é verdade que não se encontra, quer na postura do arguido em julgamento, quer na avaliação que se faz do relatório social, na falta de integração social e nos antecedentes criminais, qualquer fator positivo que permita concluir que a aplicação daquele regime consagrado no DL n° 401/82, de 23 de setembro poderá ser favorável à sua reintegração social.
O relatório social evidencia fatores de risco que desaconselham, a par das anteriores condenações, a aplicação do regime especial para jovens delinquentes.
Assim, deverá fazer-se aplicação daqueles normativos do DL. n° 401/82, de 23/09 apenas quanto ao arguido K. .
As altas exigências de prevenção geral dos crimes de roubo, para mais com utilização de arma de fogo são de molde a afastar, quanto a este arguido, a adequação de medida de correção, prevista no artigo 6° do regime especial para jovens, que não satisfará os fins gerais das penas.
Assim, conclui-se, pelo acolhimento, da atenuação especial da pena, prevista no artigo 4º do DL. n° 401/82, de 23/09, pelo que, tendo presente o disposto nas alíneas a) e b) do n° 1 do art° 73° do Código Penal, o limite máximo da pena de prisão é reduzido, no caso do roubo qualificado, a um quinto (porque igual ou superior a 3 anos) e no caso do roubo simples ao mínimo legal de uni mês, enquanto o limite mínimo é reduzido ao mínimo legal. Ou seja, a moldura abstratamente aplicável ao crime de roubo simples passa ser de um mês a 5 anos e 8 meses (cfr. art° 41° do Código Penal) e ao crime de roubo agravado de 7 meses e 6 dias a 10 anos de prisão.
2.1.1. Do arguido K..
O art.° 71° estabelece, no seu n° 1, a orientação base para a medida da pena a aplicar: "A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção".
No nº 2 alude-se às "circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele.".
Assim, valora-se, quanto a este condenado:
a)  O grau de ilicitude dos factos, apreciados dentro dos respetivos tipos criminais em apreço, é elevado, existindo uma relativa homogeneidade das atuações deste arguido.
No caso da vitima WM , em especial, repugna a circunstância de lhe terem coartado a liberdade ambulatória, mantendo-o no veículo, enquanto circulavam com ele, até o terem escorraçado sempre com a ameaça do uso de arma.
No segundo caso, ainda que não tenha ficado comprovada a utilização de uma arma, é usada violência física — socos — perante a vítima, que não conseguiu rechaçar as agressões perpetradas pelo menos por 3 indivíduos.
K. acaba por, em ambas as situações, assumir um papel de liderança manifesto no grupo que integra, já que acaba por ser ele a conduzir as duas viaturas subtraídas.
b)  A culpa do agente, atenta a sua reflexão, já é significativa em ambas as situações. Mas o nível de reflexão ainda é superior na segunda situação, tanto que não satisfeito com a primeira, renova a sua intenção criminosa numa segunda situação, com uma segunda vítima, agora com recurso a arma de fogo, não revelando qualquer remorso inicial.
c)  No plano da prevenção especial, há a assinalar os antecedentes criminais já referidos, em particular a anterior condenação pela prática de um crime de detenção da arma proibida.
Os fatores de risco assinalados no relatório, em particular a permeabilidade a grupos de pares com comportamentos desviantes, permitem concluir que as exigências de prevenção especial são particularmente elevadas.
A conduta deste e do seu coarguido revelam aspetos negativos da sua personalidade e falta de respeito pela liberdade, integridade física e património alheios.
d) As exigências de prevenção geral são elevadas, sendo que se trata de tipo de crime que provoca apreensão e a censura da comunidade.
e)  os aspetos vitimológicos não são em concreto despiciendos, considerando os sentimentos expressos pela vítima ouvida em audiência.
Não se pode deixar de atender, em concreto, à juventude do arguido e à relativa recenda dos factos.
Assim, apesar da gravidade dos factos cometidos pelo arguido, atendendo à grande amplitude deste intervalo entre a pena mínima abstratamente aplicável e a pena máxima, entende-se ser de fixar, em concreto, penas ainda aquém ou junto ao terço da pena.
Pelo exposto, condena-se o arguido K. , na primeira situação — das 3 h 45 m — na pena de 2 anos de prisão e na segunda —das 5 h 00 — na pena de 2 anos e 9 meses de prisão.
2.1.2. Do arguido AC .
Enunciado o critério de determinação da medida da pena e a moldura penal, valora-se, quanto a este arguido, para além dos fatores que são comuns à atuação de ambos os arguidos e que ora se deixaram expressos a propósito da determinação das penas a aplicar ao arguido K. :
a) O grau de ilicitude dos factos, (apreciados dentro do tipo criminal em apreço), é elevado, ainda que este arguido esteja apenas comprometido com a segunda situação.
Repete-se o que foi dito, em particular, quanto à vítima WM .
b)  A culpa do agente, atenta a sua reflexão, considerando a utilização de arma de fogo, é intensa.
c) No plano da prevenção especial, ponderados os antecedentes criminais, a falta de esboço de arrependimento e os fatores de risco assinalados no relatório social, entende-se que as exigências são particularmente elevadas.
d) As exigências de prevenção geral são elevadas, por aquilo que já se deixou expresso.
e)  os aspetos vitimolégicos não são, como se disse, em concreto despiciendos, considerando os sentimentos expresso pela vitima em audiência.
Atende-se, também neste caso, à juventude do arguido.
Valora-se a circunstância do arguido ser primário à data dos factos por não ter sido condenado por decisão transitada em julgado, mas a avaliação que se faz do comportamento anterior e posterior do arguido, etpresso nos antecedentes, não pode deixar de ser negativa e apontar para unia pluriocasionalidade muito preocupante.
Pelo exposto, entendemos ser de condenar o arguido AC  na pena de 4 anos de prisão pela prática do crime de roubo agravado, igualmente aquém do terço da moldura penal.
2.1.3. Da pena unitária a aplicar ao arguido K.  .
Do cúmulo jurídico de penas.
Por ter sido condenados por dois crimes, praticados na mesma ocasião, que são julgados neste mesmo acórdão, e que estão, assim, numa relação de concurso, importa fixar a este arguido K. uma pena única que, de harmonia com o disposto no artigo 77° do Código Penal, deverá ser fixada entre a maior das penas concretamente aplicadas e a soma de todas.
O arguido incorre, assim, por força da aplicação desta regra, numa pena mínima de 2 anos e 9 meses e máxima de 4 anos e 9.
De acordo com os traços de personalidade demonstrados pela sua atuação e evidenciados pelo relatório social e antecedentes criminais, que apontam para unia situação de pluriocasionalidade e as circunstâncias em que foram cometidos os dois crimes, aos constrangimentos e perigo causado às vítimas, vista a relativa homogeneidade da conduta, a colaboração parcial para a descoberta da verdade, a imagem global da ação delinquente, julga-se adequado condenar este arguido na pena única global de 3 anos e 3 meses de prisão, correspondente sensivelmente ao meio da diferença entre a pena máxima aplicada e a soma de ambas.
2.2.Da eventualidade da aplicação de pena substitutiva.
Dispõe o art.° 50 ° do Código Penal, que o "1 - O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior• e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. (...) 5 — O período de suspensão é fixado entre um e cinco anos".
Ora, atenta a medida das penas concretamente aplicadas aos arguidos, está reunido o pressuposto formal de aplicação da pena — pena de prisão inferior a 5 anos.
O relatório social evidencia a existência de fragilidades dos arguidos, no que a um juízo de prognose favorável de reintegração social diz respeito.
Ainda que em prisão preventiva, o arguido AC mostra-se desintegrado socialmente. É destacado que o arguido, antes da sua reclusão, adotou um estilo de vida sem ocupação estruturada de tempos livres o que não permitiu a aquisição de adequadas competências pessoais e sociais e "favoreceu a manifestação de características de fragilidade pessoal, imaturidade e permeabilidade a fatores externos e nocivos, nomeadamente de pares com comportamentos pró-criminais".
Também os fatores de risco associados ao arguido K. são muito elevados: "estamos perante um jovem adulto que, da sua trajetória de vida, apresenta fatores de risco, como sejam, a ligação a grupos de pares com comportamentos proeriminais, a ausência de motivações prosociais e associada desvinculação de contextos sociais estruturados, nomeadamente ao nível profissional.
Ainda que se verifique o pressuposto formal da pena de substituição (pena suspensa), já que estão em causa penas de duração não superior a 5 anos, não se verifica o seu pressuposto material. Na verdade, não se pode concluir que da aplicação da suspensão da execução da pena de prisão a qualquer um dos arguidos se alcançarão, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
A imagem social global das condutas praticadas pelos arguidos desaconselha a aplicação de pena substitutiva, pois que causaram elevadíssimo alarme social. Está em causa um assalto em grupo e um assalto à mão armada, ambas as situações de "carjaeking", fenómeno de violência urbana que é mister combater.
As exigências de prevenção geral são, pois, muito altas.
Não existem fatores que, assim, tendo sido trazidos ao processo, e possam ser sopesados em favor dos arguidos no juízo subjacente à aplicação do n° 1 do artigo 50° do Código Penal, apesar do tratamento penal mais favorável que foi concedido ao arguido K. por força da aplicação do regime especial para jovens delinquentes.
Deste modo, não estando preenchidos os pressupostos formais de outras penas substitutivas, entende-se que, em concreto, é de descartar a suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos, por não estarem reunidos os pressupostos materiais.
Por todo o exposto, os arguidos AC Carsoso e K. deverão, respetivamente, cumprir, de forma efetiva, as penas de 4 anos e de 3 anos e 3 meses de prisão.
*
3. – É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.
O recorrente AC  questiona a medida da pena, concluindo que é excessiva a pena aplicada, por desconformes com o disposto no art° 71°, n° 1, do Código Penal, devendo a mesma ser suspensa na sua execução sob o regime de prova.
O recorrente K. , entende haver deficiente valoração do Relatório social, porquanto os art°s. 23°, 24°, 25° e 26°, dos factos dados como provados por resultarem do relatório social, que aponta conter juízos de valor, referências morais e análises psicológicas sem razão de ciência ou substracto válido, constituem meio enganoso e prova previsto no art.° 126.° n.° 1 e 2 alínea a) in fine do CPP, sendo, por isso, prova proibida.
Consequentemente, às anteriores conclusões, elenca depois a insuficiência para a decisão da matéria de facto, contemplada no art° 410, n° 2, alínea b), do Código de Processo Penal e a violaçãodo princípio do contraditório e o disposto no art° 355°, do Código de Processo Penal.
Questiona, por fim, o recorrente a medida concreta da pena, defendendo que a pena de prisão deveria ter sido suspensa na sua execução.
*
4. Quanto à deficiente valoração do Relatório social, e consequente nulidade do acórdão por utilização de prova proibida.
Alega o recorrente K. , que o Relatório Social inserto nos autos extravasa, em larga medida a função imposta pelo art.° 1º alínea g) do CPP. Os juízos de valor, as referências morais e as pretensas “análises psicológicas” formuladas em Relatório Social, sem qualquer razão de ciência ou substrato válido, não podem ser tidas em conta como integradoras de matéria de facto provada. Assim “in casu” os pontos de facto números 23,24,25 e 26 da Matéria de Facto provada, não poderiam ter sido considerados provados pela instância, considerando estes os pontos de factos incorrectamente julgados (dada a redacção do art.° 412.° n.° 3 alínea a) do CPP, porquanto as expressões denegridoras da pessoa do arguido, utilizadas no Relatório Social (parágrafos citados na Motivação) apontando-lhe “fragilidades”, “imaturidade”, “trajetória de vida com factores de risco” “adesão a grupos e pares com comportamentos procriminais”, “ausência de motivações prósociais e associada desvinculação de contextos sociais...” são inválidos como meio de prova por constituírem prova proibida. Para o recorrente, a utilização de tal caracterização – feita por Técnicos da DGRSP nas costas do arguido – e intrometendo-se em esferas que não são da sua competência como a “análise” a que tais Técnicos procederam das “peças processuais” insertas nos autos, constituem “meio enganoso e prova” previsto no art.° 126.° n.° 1 e 2 alínea a) in fine do CPP, sendo, por isso, prova proibida. Conclui, assim, que o acórdão não podia elencar tais parágrafos do Relatório Social para concluir pela não possibilidade de um juízo de prognose favorável quanto à evolução do recorrente, impedindo por isso a aplicação de pena de prisão efectiva e, por isso, o acórdão é, por tal razão, nulo.
*
Diremos, desde já, que não pode vingar a argumentação expandida pelo recorrente.
Segundo a definição constante do artigo 1.º, n.º 1, alínea g) do Código de Processo Penal, «Relatório social» é a informação sobre a inserção familiar e socioprofissional do arguido e, eventualmente, da vítima, elaborado por serviços de reinserção social, com o objectivo de auxiliar o tribunal ou o juiz no conhecimento da personalidade do arguido, para os efeitos e nos casos previstos na lei. 
O relatório social constitui uma informação elaborada por técnico superior de reinserção social habilitado para o efeito, nas áreas das ciências sociais, para além da formação profissional que lhe é dada.
E para que tal informação seja completa e tenha alguma utilidade, não se pode contentar com meros números que pouco podem dizer, mas fazendo incluir uma caracterização, em termos de comportamentais e de conduta nos vários meios onde o arguido interage.
Aliás, só assim, o relatório social poderá e assumir sua função, e é a própria letra da lei que o diz, ao expressamente definir no art° 1°, alínea g), do Código de Processo Penal, que serve para aferir da inserção sócio-profissional e, para além do mais, auxiliar o tribunal, para além do mais, no conhecimento da personalidade do arguido.
Trata-se portanto, de um meio de prova habilitante do conhecimento da personalidade do arguido que, não tendo o valor de prova pericial, está sujeito ao princípio da livre apreciação da prova.
Uma vez que, como dissemos, o relatório social está sujeito ao princípio da livre apreciação da prova, nada impedia que o tribunal recorrido o tivesse valorado probatoriamente para decidir sobre a prova de factos relevantes para a escolha e determinação da medida das penas a aplicar, nomadamente os pontos 23,24,25 e 26 da Matéria de Facto provada, não constituindo, pois, meios de prova inválidos.
 Do mesmo modo, a argumentação do recorrente de que a utilização de expressões denegridoras da pessoa do arguido, feita por Técnicos da DGRSP – intrometendo-se em esferas que não são da sua competência como a “análise” a que tais Técnicos procederam das “peças processuais” insertas nos autos – constitue “meio enganoso de prova” previsto no art.° 126.° n.° 1 e 2 alínea a) in fine do CPP – sendo, por isso, prova proibida – não pode vingar por duas ordens de razão.
Primeiro, e como foi já referido, quanto à natureza do relatório social, não é uma prova mas tão só meio de prova habilitante do conhecimento da personalidade do arguido que, não tendo o valor de prova pericial, está sujeito ao princípio da livre apreciação da prova.
Em segundo lugar, e como bem salienta o Digno Magistrado do MºPº, cabe esclarecer que para qualquer relatório social para audiência de julgamento é necessário que ao técnico da reinserção social seja facultada cópia da acusação ou do despacho de pronúncia, para desse modo, poder melhor contextualizar e dirigir a abordagem, designadamente, sobre quem deve contactar e sobre que áreas serão mais pertinentes. Não é a mesma coisa se ao arguido é imputado um crime contra o património ou um crime de violência doméstica ou de natureza sexual.
Assim, a menção em causa quer tão só indicar que o técnico superior da reinserção social teve contacto com o teor da acusação, nada mais, sendo em termos metodológicos e para melhor decisão da causa, o mais adequado.
Por ultimo, e ainda que assim não se entendesse, o recorrente nada disse e teve um mês para o fazer, nada pôs em causa.
Com efeito, dispõe o artº 123.º (Irregularidades) que "1 – Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do ato a que se refere e dos termos subsequentes que possa afetar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio ato ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum ato nele praticado. 2 – Pode ordenar-se oficiosamente a reparação de qualquer irregularidade, no momento em que da mesma se tomar conhecimento, quando ela puder afetar o valor do ato praticado".
Ora, notificado do teor do relatório social no dia 19/10/2020, o recorrente nada questionou nem nada requereu, nem antes, nem depois do início da audiência de julgamento, iniciada em 19/11/2020, pelo que, se algum vício o relatório social tivesse, tal poderia constituir uma mera irregularidade, para suscitação da qual, o recorrente deixou passar largamente o prazo em que o podia fazer, não tendo, por isso, a virtualidade de determinar a invalidade do ato a que se refere e do termos subsequentes que pudesse afetar.
*
5. Quanto à insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art° 410, n° 2, alínea b), do Código de Processo Penal).
Salienta o recorrente que “in casu” a douta decisão não podia ancorar o decidido quanto à impossibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável em relação ao arguido, uma vez que pelos apontados motivos “supra” não dispunha o Tribunal de “elementos relevantes “ processualmente existentes no apontado relatório para a apreciação da responsabilidade criminal do arguido” (como já mencionava o douto Ac. do STJ de 15.11.2006 proferido no processo 06P2555 in www.dgsi.pt.).
*
Antes de mais, cumpre sublinhar que o recorrente faz depender o seu inconformismo quanto à decisão da impossibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável em relação ao arguido, da pretendida deficiente valoração do Relatório social, e consequente nulidade do acórdão por utilização de prova proibida, a qual, como acima se demonstrou, não teve provimento.
De qualquer modo, nem deveria ser esse vício a invocar, mas a própria impugnação da matéria de facto, pois que a insuficiência em causa sempre teria de resultar do próprio texto do acórdão, o que manifestamente não seria o caso.
Com efeito, o art. 410º nº 2 do CPP admite o alargamento dos fundamentos do recurso às hipóteses previstas nas suas três alíneas, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só, ou conjugado com as regras da experiência comum.
O vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que alude a al. a) do nº 2 do art. 410º do CPP, verifica-se quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação (e da medida desta) ou de absolvição – cf. Ac do STJ de 06.04.2000, in BMJ nº 496, p.169.
Este vício, na esteira do entendimento exposto no Ac. da Relação do Porto de 26.05.1993, proc. 9350062, sumário disponível in www.dgsi.pt., tributário do princípio do acusatório, tem de ser aferido em função do objecto do processo, traçado naturalmente pela acusação ou pronúncia, pelo que só quando os factos recolhidos pela investigação do tribunal se ficam aquém do necessário para concluir pela procedência ou improcedência da acusação se concretizará tal vício.  
A insuficiência a que se refere a alínea a) do nº 2 do art. 410º do CPP é, no fundo, a que decorre da omissão de pronúncia, pelo Tribunal, sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados, ou como não provados, todos os factos que, sendo relevantes para a decisão da causa, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão.
Este vício não tem a ver com a insuficiência da prova, mas com a falta de averiguação de factos necessários à decisão, e daí que a alínea a) do nº 2 do art. 410º do CPP se refira à insuficiência da matéria de facto provada para a decisão de direito, e não à insuficiência da prova para a matéria de facto provada, questão do âmbito do princípio da livre apreciação da prova (art. 127º do CPP), que é insindicável em reexame da matéria de direito – neste sentido, vide Leal Henriques e Simas Santos, in Código de Processo Penal Anotado, t. II, p. 737, Ed. Rei dos Livros 2004.
No caso, a prova dos factos relativos à situação pessoal, social e económica do arguido tanto se podia fazer por via do relatório social, como por meio de outra prova lícita, designadamente por declarações do próprio arguido.
Perante isto, e quanto à decisão da impossibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável em relação ao arguido, é bem clara a decisão recorrida:
« (…) valora-se, quanto a este arguido, para além dos fatores que são comuns à atuação de ambos os arguidos e que ora se deixaram expressos a propósito da determinação das penas a aplicar ao arguido K. :
a) O grau de ilicitude dos factos, (apreciados dentro do tipo criminal em apreço), é elevado, ainda que este arguido esteja apenas comprometido com a segunda situação.
Repete-se o que foi dito, em particular, quanto à vítima WM .
b) A culpa do agente, atenta a sua reflexão, considerando a utilização de arma de fogo, é intensa.
c) No plano da prevenção especial, ponderados os antecedentes criminais, a falta de esboço de arrependimento e os fatores de risco assinalados no relatório social, entende-se que as exigências são particularmente elevadas.
d) As exigências de prevenção geral são elevadas, por aquilo que já se deixou expresso.
e) os aspetos vitimolégicos não são, como se disse, em concreto despiciendos, considerando os sentimentos expresso pela vitima em audiência.
Atende-se, também neste caso, à juventude do arguido.
Valora-se a circunstância do arguido ser primário à data dos factos por não ter sido condenado por decisão transitada em julgado, mas a avaliação que se faz do comportamento anterior e posterior do arguido, etpresso nos antecedentes, não pode deixar de ser negativa e apontar para unia pluriocasionalidade muito preocupante.
Pelo exposto, entendemos ser de condenar o arguido AC  na pena de 4 anos de prisão pela prática do crime de roubo agravado, igualmente aquém do terço da moldura penal.
(…)
Ora, atenta a medida das penas concretamente aplicadas aos arguidos, está reunido o pressuposto formal de aplicação da pena – pena de prisão inferior a 5 anos.
O relatório social evidencia a existência de fragilidades dos arguidos, no que a um juízo de prognose favorável de reintegração social diz respeito.
Ainda que em prisão preventiva, o arguido AC mostra-se desintegrado socialmente. É destacado que o arguido, antes da sua reclusão, adotou um estilo de vida sem ocupação estruturada de tempos livres o que não permitiu a aquisição de adequadas competências pessoais e sociais e "favoreceu a manifestação de características de fragilidade pessoal, imaturidade e permeabilidade a fatores externos e nocivos, nomeadamente de pares com comportamentos pró-criminais".
Também os fatores de risco associados ao arguido K. são muito elevados: "estamos perante um jovem adulto que, da sua trajetória de vida, apresenta fatores de risco, como sejam, a ligação a grupos de pares com comportamentos proeriminais, a ausência de motivações prosociais e associada desvinculação de contextos sociais estruturados, nomeadamente ao nível profissional.
Ainda que se verifique o pressuposto formal da pena de substituição (pena suspensa), já que estão em causa penas de duração não superior a 5 anos, não se verifica o seu pressuposto material. Na verdade, não se pode concluir que da aplicação da suspensão da execução da pena de prisão a qualquer um dos arguidos se alcançarão, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
A imagem social global das condutas praticadas pelos arguidos desaconselha a aplicação de pena substitutiva, pois que causaram elevadíssimo alarme social. Está em causa um assalto em grupo e um assalto à mão armada, ambas as situações de "carjaeking", fenómeno de violência urbana que é mister combater.
As exigências de prevenção geral são, pois, muito altas.
Não existem fatores que, assim, tendo sido trazidos ao processo, e possam ser sopesados em favor dos arguidos no juízo subjacente à aplicação do n° 1 do artigo 50° do Código Penal, apesar do tratamento penal mais favorável que foi concedido ao arguido K. por força da aplicação do regime especial para jovens delinquentes.
Deste modo, não estando preenchidos os pressupostos formais de outras penas substitutivas, entende-se que, em concreto, é de descartar a suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos, por não estarem reunidos os pressupostos materiais.
Por todo o exposto, os arguidos AC e K. deverão, respetivamente, cumprir, de forma efetiva, as penas de 4 anos e de 3 anos e 3 meses de prisão».
Em suma, não se verifica a falta de factos necessários à prolação da decisão, designadamente para efeitos de fundamentação da determinação da medida e da escolha da sanção, mais concretamente para aferir da possibilidade de suspensão da execução da pena de prisão.
Resta, pois, concluir que a decisão recorrida não padece do invocado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
*
6. Quanto à violaçãodo princípio do contraditório do art.° 327.° do CPP.
Alega o recorrente que, não tendo o arguido em audiência sido confrontado com o teor do Relatório Social, foi violado o disposto no art.° 355.° do CPP e o princípio do contraditório (contraditoriedade) a que faz jus o art.° 327.° do CPP.
Porém, como já atrás foi salientado, não tem o recorrente qualquer razão.
Como é sabido, o art. 32º da Constituição da República Portuguesa reúne os mais importantes princípios substantivos do processo criminal, a comummente designada constituição processual criminal.
Dispõe no seu nº 5 que, o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório.
Relativamente aos destinatários, o princípio do contraditório aqui referido significa:
- O dever e o direito de o juiz ouvir a acusação e a defesa relativamente a matérias objecto da decisão;
- O direito de audiência dos sujeitos processuais que possam ser afectados pela decisão, dessa forma lhes garantindo uma influência no desenvolvimento do processo designadamente, e quanto ao arguido, o direito de este se pronunciar e contraditar todos os meios de prova e argumentos trazidos ao processo;
- A proibição de condenação por crime diferente do acusado, sem o arguido poder contraditar os respectivos fundamentos (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4ª Edição Revista, 2007, Coimbra Editora, pág. 522 e ss.).
Nota Figueiredo Dias, que o que verdadeiramente está em causa no princípio do contraditório e que o torna indispensável para o pleno e eficaz direito de defesa, é a relação entre a Pessoa e o Direito, mais particularmente, a relação entre a pessoa e o «seu» direito. O direito de audiência é a expressão necessária do direito do cidadão à concessão da justiça, das exigências comunitárias inscritas no Estado-de-direito, da essência do Direito como tarefa do homem e, finalmente, do espírito do Processo como «comparticipação» de todos os interessados na criação da decisão. O princípio do contraditório e/ou da audiência traduz, portanto, a existência de uma norma objectiva de condução do processo que deve que deve assegurar ao titular do direito a possibilidade de alegar as suas razões e desse influir no ‘dizer’ do direito (Direito Processual Penal, 1ª Edição, 1974, Reimpressão, pág, 157 e ss.).
A nível infraconstitucional, o princípio do contraditório mostra-se presente em todas as fases do processo penal, ainda que com muito distintas intensidades.
Assim, na fase do inquérito, pela natureza e objecto deste, o princípio apenas se manifesta na tomada de declarações para memória futura, na medida em que podem ser valoradas em julgamento e, por isso, decorrem perante o juiz de instrução (art. 271º, nº 1 do C. Processo Penal).
Na fase da instrução, para além da tomada de declarações para memória futura (art. 294º do C. Processo Penal, alarga-se ao debate instrutório (arts. 298º e 301º, nº 2, do C. Processo Penal).
Na fase do julgamento o princípio alcança a sua máxima amplitude, estando toda a audiência a ele subordinada, como decorre do disposto no art. 323º, nº 1, f) [no que respeita à direcção da diligência pelo juiz], 327º [em especial, para a questão sub judice, o seu nº 2, no que respeita aos meios de prova apresentados na audiência], 360º, nºs 1 e 2 [no que respeita a alegações orais] e 361º, nº 1 [últimas declarações do arguido], todos do C. de Processo Penal.
In casu, o relatório social contém a descrição de «Dados relevantes do processo de socialização», a descrição das «Condições sociais e pessoais» a descrição do «Impacto da situação jurídico-penal» e as «Conclusões».
Uma vez que, como dissemos, o relatório social está sujeito ao princípio da livre apreciação da prova, nada impedia que o tribunal recorrido o tivesse valorado probatoriamente para decidir sobre a prova de factos relevantes para a escolha e determinação da medida das penas a aplicar, nomadamente os pontos 23,24,25 e 26 da Matéria de Facto provada, sendo certo que em tempo oportuno, deu conhecimento ao arguido do seu conteúdo para, querendo, poder exercer o contraditório (cfr. arts. 323º, f) e 327º, nº 2 do C. Processo Penal).
Na verdade, notificado do teor do relatório social no dia 19/10/2020, o recorrente nada questionou nem nada requereu, nem antes, nem depois do início da audiência de julgamento, iniciada em 19/11/2020. De posse de uma cópia do relatório social, o recorrente conformou-se e aceitou o seu teor quando, se o quisesse, poderia, se fosse o caso, contraditá-lo, pô-lo em causa, requerendo a prodição de prova ou que se lhe aprouvesse.
Não se verifica, assim, qualquer violação do princípio do contraditório e a sua consagração expressa para este efeito no art. 327º nº 2 do Código de Processo Penal.
*
7. Quanto à medida da pena
Alga o arguido AC tão só, que a pena imposta se mostra excessiva, tendo sido violado o artigo 71° do Código Penal, pelo que deve o acórdão recorrido ser revogado por outro que se mostre adequado, nomeadamente no que diz respeito ao cumprimento da pena, devendo a mesma ser suspensa na sua execução sob o regime de prova.
Por sua vez o recorrente K.  entende que, quanto à não suspensão da pena de prisão, o que o douto acórdão recorrido estatui a pág.. 25 e 25 verso acerca da impossibilidade de aplicação de pena suspensa, radica, “ad substantia” na conclusão do citado Relatório sobretudo nos seguintes parágrafos e páginas 25 e 25 verso, que “hoc et nunc” se transcrevem:
O relatório social evidencia a existência de fragilidades dos arguidos no que a um juízo de prognose favorável de reintegração social diz respeito” - PAG 25V." da douta sentença 3º parágrafo, e mais adiante: “Também os factores de risco associados ao arguido Kyliam são muito elevados: “estamos perante um jovem adulto que da sua trajetória de vida, apresenta factores de risco, como sejam, a ligação a grupos de pares com comportamentos procriminais, a ausência de motivações prosociais e associada desvinculação de contextos sociais estruturados nomeadamente a nível profissional”. Nesta conformidade, entende o recorrente que mal andou a decisão recorrida e que atenta a confissão dos factos pelo arguido e o seu arrependimento manifesto o Tribunal a quo podia – e devia – ter lançado mão do instituto da suspensão da pena de prisão, estando em condições de sobre este jovem arguido poder ainda assim emitir um juízo de prognose favorável, a que não será concerteza indiferente o seu bom comportamento (quer no EP), quer, de há meses a esta parte, no cumprimento da Prisão Domiciliária.
*
Antes de mais, cumpre sublinhar que o recorrente K.  faz depender o seu inconformismo quanto à decisão da impossibilidade de formulação de um juízo de prognose favorável em relação ao arguido, da pretendida deficiente valoração do Relatório social, e consequente nulidade do acórdão por utilização de prova proibida, a qual, como acima se demonstrou, não teve provimento.
Quanto à pena aplicada ao recorrente AC , que o mesmo considera excessiva, deverá ter-se presente que, quanto à aplicação da pena, é sabido que visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, não podendo, em caso algum, a pena ultrapassar a culpa – art.º 40.°, n.° 1 e 2, do Código Penal.
Dispõe o n.° 1 do artigo 71° que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. E o nº 2 manda atender àquelas circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
É de elevada intensidade o grau de ilicitude dos factos, consumada com elevado grau de culpa, traduzida no modo de execução do crime, na perspectiva dos meios utilizados para executar o roubo, tendo coartado a liberdade ambulatória da vitima WM , mantendo-o no veículo, enquanto circulavam com ele, até o terem escorraçado sempre com a ameaça do uso de arma, merecedora de um juízo de censura acentuado.
Agiu com dolo directo, intenso.
Por fim, sendo finalidade das penas, a protecção de bens e valores jurídicos e a reintegração do agente delituoso na sociedade (prevenção geral e prevenção especial, respectivamente), há que buscar um ajustado equilíbrio entre elas, equilíbrio esse que não inibe que, perante o caso concreto, uma dessas finalidades possa e deva prevalecer sobre a outra.
Importa ainda salientar que as necessidades de prevenção especial que se fazem sentir, in casu, também são particularmente elevadas, face aos antecedentes criminais, à falta de esboço de arrependimento e os fatores de risco assinalados no relatório social.
 Quanto às necessidades de prevenção geral as mesmas são elevadas, considerando a natureza dos bens jurídicos tutelados no tipo legal do crime pelo qual o arguido foi condenado, a sua importância para a ordem jurídica, pois está aqui em causa um assalto em grupo, em situação de "carjaeking", um tipo de criminalidade que provoca invariavelmente forte alarme social e que reclama uma forte reposição da eficácia da norma jurídica e dos bens jurídicos afectados.
Atendeu-se, também neste caso, à juventude do arguido e valorou-se a circunstância do arguido ser primário à data dos factos por não ter sido condenado por decisão transitada em julgado, mas a avaliação que se faz do comportamento anterior e posterior do arguido, etpresso nos antecedentes, não pode deixar de ser negativa e apontar para uma pluriocasionalidade muito preocupante.
Ora, ponderando a factualidade apurada, sem perder de vista o bem jurídico ofendido nos crimes da natureza do dos autos, atenta a moldura penal em causa, a natureza do crime e tendo presente as exigências de prevenção geral e especial, a pena de 4 anos de prisão pela prática do crime de roubo agravado, não ultrapassa a medida da sua culpa e também não extravasa os limites dentro dos quais a justiça relativa tinha de ser procurada, mostrando-se equilibrada, justa, proporcional e razoável e não deixa ficar comprometida a crença da comunidade na validade da norma incriminadora violada.
*
Quanto à possibilidade de suspensão da execução da pena de prisão.
Nesta matéria o tribunal recorrido decidiu da seguinte forma:
« (…) Ora, atenta a medida das penas concretamente aplicadas aos arguidos, está reunido o pressuposto formal de aplicação da pena — pena de prisão inferior a 5 anos.
O relatório social evidencia a existência de fragilidades dos arguidos, no que a um juízo de prognose favorável de reintegração social diz respeito.
Ainda que em prisão preventiva, o arguido AC mostra-se desintegrado socialmente. É destacado que o arguido, antes da sua reclusão, adotou um estilo de vida sem ocupação estruturada de tempos livres o que não permitiu a aquisição de adequadas competências pessoais e sociais e "favoreceu a manifestação de características de fragilidade pessoal, imaturidade e permeabilidade a fatores externos e nocivos, nomeadamente de pares com comportamentos pró-criminais".
Também os fatores de risco associados ao arguido K. são muito elevados: "estamos perante um jovem adulto que, da sua trajetória de vida, apresenta fatores de risco, como sejam, a ligação a grupos de pares com comportamentos proeriminais, a ausência de motivações prosociais e associada desvinculação de contextos sociais estruturados, nomeadamente ao nível profissional.
Ainda que se verifique o pressuposto formal da pena de substituição (pena suspensa), já que estão em causa penas de duração não superior a 5 anos, não se verifica o seu pressuposto material. Na verdade, não se pode concluir que da aplicação da suspensão da execução da pena de prisão a qualquer um dos arguidos se alcançarão, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
A imagem social global das condutas praticadas pelos arguidos desaconselha a aplicação de pena substitutiva, pois que causaram elevadíssimo alarme social. Está em causa um assalto em grupo e um assalto à mão armada, ambas as situações de "carjaeking", fenómeno de violência urbana que é mister combater.
As exigências de prevenção geral são, pois, muito altas.
Não existem fatores que, assim, tendo sido trazidos ao processo, e possam ser sopesados em favor dos arguidos no juízo subjacente à aplicação do n° 1 do artigo 50° do Código Penal, apesar do tratamento penal mais favorável que foi concedido ao arguido K. por força da aplicação do regime especial para jovens delinquentes.
Deste modo, não estando preenchidos os pressupostos formais de outras penas substitutivas, entende-se que, em concreto, é de descartar a suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos, por não estarem reunidos os pressupostos materiais.
Por todo o exposto, os arguidos AC Carsoso e K. deverão, respetivamente, cumprir, de forma efetiva, as penas de 4 anos e de 3 anos e 3 meses de prisão».      
.No caso, os antecedentes criminais do arguido arguido AC, já com condenações anteriores pelo mesmo crime, revela uma personalidade vincadamente desconforme ao direito, o que levou o tribunal a concluir pela inviabilidade da formação de um juízo de prognose no sentido de que a ameaça da prisão e a censura do facto sejam suficientes para alcançar, relativamente ao arguido, as finalidades da punição, mormente dissuadi-lo da prática de novos ilícitos criminais, ou ainda, não ter mostrado qualquer sinal de arrependimento ou que tenha interiorizado a gravidade dos seus actos ou que tenha feito algum juízo de auto-censura.
Quanto ao arguido K. , como salienta a decisão recorrida, estamos perante um jovem adulto que, da sua trajetória de vida, apresenta fatores de risco, como sejam, a ligação a grupos de pares com comportamentos proeriminais, a ausência de motivações prosociais e associada desvinculação de contextos sociais estruturados, nomeadamente ao nível profissional.
E, como bem observa o Digno Magistrado do MºPº, a sua postura em audiência de julgamento, com avanços e recuos, admitindo parte dos factos, mas de modo a suavizar e amenizar a gravidade dos factos que praticou, em nada abona a favor do recorrente e da confiança que pretende lhe devia ser depositada, não dando uma genuína e sincera interiorização do mal que fez e da repercussão para os outros, mas tao só uma admissão parcial dos factos interessada na sua desvalorização.
A imagem social global das condutas praticadas pelos arguidos desaconselha a aplicação de pena substitutiva, pois que causaram elevadíssimo alarme social, estando em causa um assalto em grupo e um assalto à mão armada, ambas as situações de "carjaeking", fenómeno de violência urbana que é mister combater, exigências que são ainda mais acentuadas por ocorrerem em local assolado pela criminalidade e pela insegurança, como é a Cova da Moura e a Amadora.
Não sendo possível um juízo de prognose positiva sobre o seu comportamento futuro só compreenderão o desvalor dos seus actos e a comunidade sentirá que o respeito pela norma jurídica em questão se mantem, se lhes for aplicada uma pena efectiva de prisão, não se apresentando, por isso, como bem decidiu a decisão recorrida, adequada a suspensão da execução da pena de prisão, porque a simples ameaça da aplicação de uma pena de prisão efectiva não acautela as finalidades da punição.
Considerando a factualidade em causa, observamos que nenhum juízo de censura nos merece a decisão recorrida, quando decidiu não aplicar, ao caso, a suspensão da execução da pena de prisão ou qualquer outra pena de substituição.
No mesmo sentido, vide Figueiredo Dias, in “As Consequências do Crime”, Editorial Notícias, 1993, pág. 227 e ss., “entendemos que, a medida da pena há-de ser dada fundamentalmente pela necessidade de tutela dos bens jurídicos em face do caso concreto. Entendemos que é a prevenção geral positiva de integração que fornece um “espaço de liberdade ou de indeterminação”, o qual abrange o ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias e o limiar mínimo em que tal tutela é ainda efectiva e consistentemente assegurada, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr em causa de uma forma irremediável a sua função tutelar.”
Aqui chegados, cumpre concluir pelo pleno acerto da decisão recorrida, a qual não merece qualquer censura, nem reparo, uma vez que ficou demonstrado que a pena privativa da liberdade é necessária, proporcional e ajustada às finalidades de prevenção geral e especial do crime, que, no caso dos recorrentes se fazem sentir com especial acuidade e exigência de reeducação e interiorização da gravidade e perigos decorrentes do crime em apreço.       
Não se justifica, pois, a suspensão da execução da pena, nem qualquer outra pena de substituição da pena de prisão. 
*
8. Em conformidade com o exposto, acordam os Juízes da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos e confirmar a douta decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em quatro (4) UCs, a cada um.
                                    
Lisboa, 18 de Maio de 2021
Cid Geraldo
Ana Sebastião    
Decisão Texto Integral: