Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4397/08.6TBFUN.L1-7
Relator: ANA RODRIGUES DA SILVA
Descritores: SERVIDÃO
ESPAÇO AÉREO
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: · A constituição de uma servidão de atravessamento de espaço aéreo é uma violação do direito de propriedade que determina a atribuição de uma indemnização que se pretende ser justa e reparadora dos danos sofridos;
· Essa servidão produz um dano particularmente grave na esfera jurídica dos proprietários dos prédios (normalmente, terrenos) e que deve ser indemnizável nos termos do art. 8º, nº 2 do Cód. das Expropriações.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
1. Nos presentes autos de expropriação litigiosa que C. move contra A. e mulher A'., relativamente à constituição de uma servidão administrativa de atravessamento de espaço aéreo sobre uma parcela de terreno identificada sob o nº..., com a área de servidão de 258 m2 do imóvel sito na Rua ..., com o nº ... da freguesia de ..., Funchal, recorreram os expropriados da decisão que fixou a indemnização devida.

2. Efectuadas as diligências requeridas foi proferida decisão nos termos da qual foi julgado “procedente o recurso interposto por A. (ora representado pelas sucessoras devidamente habilitadas) e mulher A'., e em consequência atribuo uma indemnização no valor 98.950 euros, acrescida do valor que resultar da aplicação dos índices de preços do consumidor, com exclusão da habitação, desde a data da declaração da utilidade pública (09.08.2000) até ao trânsito em julgado da presente sentença pela constituição da servidão administrativa sobre a parcela de terreno identificada sob o nº ..., com a área de servidão de 258 m2 do imóvel localizado na sito na Rua ..., com o nº..., da freguesia ..., Funchal, inscrito na C.R.P. do Funchal sob o nº2...”.

3. Inconformado, o expropriante recorre dessa decisão, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“1. O tribunal a quo considerou o artigo 8.º, n.º 2, do Código das Expropriações inconstitucional na interpretação de que não abrange servidões administrativas que atinjam a essencialidade das utilidades dos bens impondo-lhes encargos excepcionais, “por violação do princípio da igualdade, da justa indemnização e do Estado de Direito Democrático”.
2. Segundo o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 525/2011, do princípio da repartição igualitária dos encargos públicos, que impõe uma compensação patrimonial reequilibradora do sacrifício grave e especial sofrido pelo titular do prédio sobre que incide a servidão, não decorre necessariamente a aplicação, a todas as servidões non aedificandi, do critério indemnizatório consagrado para as situações de expropriação.
3. Segundo o Tribunal Constitucional, as três situações identificadas no n.º 2 do artigo 8.º do Código das Expropriações estão muito próximas de configurar um esvaziamento do núcleo essencial do direito de propriedade, daí a equiparação de regimes indemnizatórios, em face da similitude de efeitos danosos produzidos.
4. No Acórdão n.º 525/2011, o Tribunal Constitucional afirmou que a perda da aptidão construtiva não contende com a subsistência do direito de propriedade na esfera jurídica do seu titular, nem atinge o conteúdo ou núcleo essencial desse direito de propriedade.
5. O Tribunal Constitucional tem adoptado o entendimento de que o ius aedificandi não inere ao direito de propriedade.
6. Conforme refere o Tribunal Constitucional, a não inclusão das servidões non aedificandi no campo do Código das Expropriações de modo algum implica a denegação de indemnização, apenas afasta esse regime de indemnização.
7. A posição dos particulares é acautelada, nomeadamente, por via do artigo 16.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, que prevê a “indemnização pelo sacrifício”, pelo que não ocorre violação do Princípio da igualdade, da justa indemnização, nem do princípio do Estado de Direito Democrático.
8. É de afastar a aplicação, no caso concreto – de constituição de uma servidão de atravessamento de espaço aéreo, que se materializa na proibição do “seu atravessamento por qualquer meio, objecto, construção, ou plantação de qualquer natureza” –, do regime de indemnização do Código das Expropriações.
9. O tribunal a quo deixou claro que a situação dos autos não se enquadra nas situações previstas no artigo 8.º, n.º 2, do Código das Expropriações e, para aplicar o regime de indemnização previsto no mesmo diploma legal, concluiu que o artigo é inconstitucional, o que contraria o entendimento do Tribunal Constitucional.
10. Não são as componentes de liberdade de uso e fruição e de direito de não ser privado do bem que para efeitos do n.º 2 do artigo 8.º do Código das Expropriações relevam – mas sim, a anulação do valor económico e da sua utilidade global, o que não sucede no caso em concreto.
11. Ao aplicar o regime de indemnização das expropriações, o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.
12. A servidão não é definitiva, o que não foi tido em consideração pelo tribunal.
13. A conclusão de que o terreno era, na sua totalidade, apto para fins construtivos, quando desde logo, não existia construção em 1104 m2 do terreno à data da constituição da servidão aérea, é infundamentada, não corresponde à realidade e assenta numa mera suposição, sem suporte na lei ou em regulamentos.
14. A decisão de considerar o terreno, na sua totalidade, ou seja, nos 1160 m2, apto para fins agrícolas, não é consentânea com a existência de uma moradia com 56 m2 no terreno.
15. No cálculo da desvalorização do terreno, o tribunal a quo trata uma servidão administrativa de 258 m2, que começa 20,45 m acima da cota mais alta do terreno do prédio, como se de uma expropriação de um prédio de 1160 m2 se tratasse, o que constitui uma afronta ao Princípio da Igualdade.
16. Não existe qualquer base legal para a aplicação da percentagem de 25% de desvalorização da moradia.
17. Não existe base legal nem nos autos para a aplicação da percentagem de 5% do custo de construção da moradia e logradouro para o cálculo dos encargos com o projecto e licenças de utilização e funcionamento.
18. Não existe suporte para considerar os encargos referidos no n.º anterior no cálculo da indemnização nos termos do Código das Expropriações.
19. As consequências de redução de intimidade, perturbação do sossego, exposição a acidentes e frequente arremesso de objectos, que servem de fundamentação à desvalorização da moradia, não têm qualquer relação directa com a constituição da servidão, pelo que extravasam o objecto dos presentes autos.
20. A consideração das consequências referidas no ponto antecedente, ainda que por via indirecta, sopesando no cálculo da desvalorização da moradia, implicam a atribuição de indemnização para além do valor real e corrente do bem objecto de servidão, o que choca com o previsto no artigo 23.º do Código das Expropriações.
21. Ainda que fosse de aplicar o regime de indemnização do Código das Expropriações, não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 29.º do mesmo diploma legal, já que em momento algum é, nomeadamente, calculado, separadamente, o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela declaração de utilidade pública, nem em algum momento foi especificado também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte que constitui a servidão de atravessamento de espaço aéreo.
22. Deste modo deverá ser fixada uma indemnização por este Venerando Tribunal com base nos elementos constantes dos autos e pela aplicação do artigo 16.º da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro, nos termos da cláusula geral de indemnização por sacrifício imposto ao particular em razão do interesse público.
23. Na eventualidade de se entender que a indemnização deva ser calculada ao abrigo das disposições legais do Código das Expropriações, a indemnização deve ser recalculada, dado que teve por base pressupostos errados e não foi dado cumprimento aos critérios previstos naquele diploma legal.
24. A sentença recorrida violou os artigos 8.º, 23.º, 26.º e 29.º do Código das Expropriações e o artigo 13º da Constituição da República Portuguesa”.

6. Em contra-alegações, os expropriados pugnaram pela improcedência do recurso.

II. QUESTÕES A DECIDIR

Considerando o disposto nos arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do CPC, nos termos dos quais as questões submetidas a recurso são delimitadas pelas conclusões de recurso, impõe-se concluir que as questões a decidir são:
- da aplicação ao caso dos autos do art. 8º, nº 2 do Cód. das Expropriações;
- do montante atribuído em sede de indemnização.
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III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
         
A decisão recorrida considerou os seguintes factos:

1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o nº ..., o prédio urbano sito na Rua ..., nº ..., da qual consta como "Área total: 1160m2”, “Área coberta: 56 m2”, “Área descoberta:1...”, “matriz nº...” “secção nº ...", “matriz nº ... natureza urbana” e “composição e confrontações: urbana: terra e casa”.
2. O direito de propriedade sob o prédio referido em 1. encontra-se registado a favor de A. e A' pela AP 2... de 1989....
3. Pela Resolução nº 1231/2000 – cujo extracto foi publicado no D.R., II série, n.º 72 de 9 de Agosto de 2000 – foi declarada a utilidade pública e atribuído carácter de urgência à constituição de uma servidão administrativa de atravessamento de espaço aéreo pelo teleférico do Funchal ao longo de todo o trajecto com os seguintes limites:
- Entre a Estação do Funchal localizada no Campo D. Carlos I e a Estação do Monte, localizada ao Caminho das Babosas, freguesia do Monte;
- Na horizontal possui uma largura de seis metros para a direita e seis metros para esquerda a partir do eixo do teleférico;
- Na vertical compreende uma distância de oito metros abaixo do ponto mais baixo da catenária em maior flecha do cabo do teleférico e de 20 metros de altura acima da catenária em menor flecha do cabo do teleférico.
4. Na zona da servidão passa a ser expressamente proibido o seu atravessamento por qualquer meio, objecto, construção ou plantação de qualquer natureza por forma a garantir a segurança de pessoas e bens e permitir a utilização e funcionamento do Teleférico.
5. A servidão referida em 2. incide sobre uma parcela de 258 m2 do prédio referido em 1..
6. A parcela de 258m2 atravessa o prédio sensivelmente ao meio.
7. O ponto da cantenária em maior flecha encontra-se a 28,45 m acima da cota mais alta do terreno do prédio referido em 1.
8. A servidão começa a 20,35m m acima da cota mais alta do terreno do prédio referido em 1..
9. A base da gôndola passa a uma distância de 24,45 m.
10. No prédio está implantada uma moradia unifamiliar, edificada em construção tradicional, de um piso, coberta com telha, com estrutura de betão armado, paredes interiores e exteriores em alvenaria de blocos de betão revestidas e pintadas, caixilharia em madeira.
11. A moradia tem uma área de construção de 56m2.
12. Os encargos com o projecto e licenças de utilização e funcionamento ascendem a 1261,20 euros.
13. O solo possui acesso rodoviário por estrada pavimentada e está servido por redes de distribuição domiciliária de água, rede de energia eléctrica, rede de saneamento, estação depuradora, rede telefónica, regular localização e qualidade ambiental.
14. Os Srs Peritos atribuíram uma desvalorização de 25% do valor da moradia.
15. Com frequência, os passageiros do teleférico gritam e interpelam os elementos da família com insultos.
16. Os membros da família têm receio que as cabines do teleférico caiam em cima de si e sentem-se muito perturbados.
17. Os expropriados pretendiam construir blocos de apartamentos no prédio.
18. O prédio está localizado em zona de média densidade, com índice construtivo de 1,25”.

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IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Visam os presentes autos a fixação de uma indemnização em virtude da constituição de uma servidão administrativa.
O momento pertinente para efeitos de determinação da legislação aplicável é, segundo a posição consensual na doutrina e na jurisprudência, o da data da declaração da utilidade pública, porquanto é nessa altura que surge, para o expropriado, o direito de crédito indemnizatório.
Nos presentes autos, atenta a data da declaração de utilidade pública, impõe-se considerar como relevantes os critérios estabelecidos no Cód. das Expropriações aprovado pelo DL 168/99, de 18 de Setembro (diploma a que aludiremos quando não se fizer menção específica), conforme sempre se considerou ao longo do processo.
Com efeito, através da Resolução nº 1231/2000 – cujo extracto foi publicado no D.R., II série, n.º 72 de 9 de Agosto de 2000 – foi declarada a utilidade pública e atribuído carácter de urgência à constituição de uma servidão administrativa de atravessamento de espaço aéreo pelo teleférico do Funchal ao longo de todo o trajecto com os seguintes limites:
- Entre a Estação do Funchal localizada no Campo D. Carlos I e a Estação do Monte, localizada ao Caminho das Babosas, freguesia do Monte;
- Na horizontal possui uma largura de seis metros para a direita e seis metros para esquerda a partir do eixo do teleférico;
- Na vertical compreende uma distância de oito metros abaixo do ponto mais baixo da catenária em maior flecha do cabo do teleférico e de 20 metros de altura acima da catenária em menor flecha do cabo do teleférico.
A servidão administrativa constitui um “encargo imposto por disposição da lei sobre certo prédio em proveito da utilidade pública duma coisa” (Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, II-1352).
A servidão administrativa pode também ser criada através de um acto administrativo, inserido na competência de um órgão administrativo, mas sempre em proveito da utilidade pública.
A servidão em causa nos autos pertence a esta segunda categoria, encontrando o seu fundamento no art. 8º, nº 1 do Cód. das Expropriações.
Nos termos do art. 8º, nº 1 do Código das Expropriações, “Podem constituir-se sobre imóveis as servidões necessárias à realização de fins de interesse público”, determinando o nº 2 deste preceito que “à constituição das servidões e à determinação da indemnização” se aplica “o disposto no presente Código com as necessárias adaptações, salvo o disposto em legislação especial”.
Decorrência da aplicação do Cód. das Expropriações à constituição das servidões em causa é a necessidade de o acto administrativo que a constitui indicar a utilidade pública específica justificativa da servidão, identificar a área a ela sujeita e especificar os encargos que da mesma decorrem, nos termos dos arts. 10º e ss. do Cód. das Expropriações, o que se verificou no caso vertente, não estando, sequer, tal questão, suscitada nos autos.
Por outro lado, e quanto à determinação da indemnização, prevê o art. 8º, nº 2 do Cód. das Expropriações que “As servidões, resultantes ou não de expropriações, dão lugar a indemnização quando:
a) Inviabilizem a utilização que vinha sendo dada ao bem, considerado globalmente;
b) Inviabilizem qualquer utilização do bem, nos casos em que estes não estejam a ser utilizados; ou
c) Anulem completamente o seu valor económico”.
Alargou a sentença recorrida o âmbito de aplicação deste preceito quando “a servidão imponha aos prédios um encargo de tal forma excepcional que atinja o núcleo essencial das suas utilidades”, interpretação com a qual o apelante não concorda.
Defende o apelante que deve ser fixada uma indemnização “com base nos elementos constantes dos autos e pela aplicação do artigo 16.º da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro, nos termos da cláusula geral de indemnização por sacrifício imposto ao particular em razão do interesse público” e “na eventualidade de se entender que a indemnização deva ser calculada ao abrigo das disposições legais do Código das Expropriações, a indemnização deve ser recalculada, dado que teve por base pressupostos errados e não foi dado cumprimento aos critérios previstos naquele diploma legal”.
A questão em apreço prende-se, pois, com a aplicação aos autos do art. 8º, nº 2 do Cód. das Expropriações.
Entendeu a sentença recorrida que “o disposto no artigo 8º, nº 2 do C.E. deve ser interpretado no sentido de não restringir o direito à indemnização por servidão administrativa apenas ao casos nele previstos expressamente, devendo considerar-se que serão igualmente indemnizáveis os danos decorrentes da servidão expropriativa quando essa servidão imponha aos prédios um encargo de tal forma excepcional que atinja o núcleo essencial das suas utilidades (vide, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22.09.2009 disponível em www.dgsi.pt).
Salvo melhor entendimento, é esta a interpretação que melhor se conforma com os preceitos constitucionais, sob pena de violação do princípio da igualdade, da justa indemnização e dos mais elementares princípios do Estado de Direito Democrático (cfr. artigo 204º da C.R.P.)”.
Parece-nos assistir inteira razão ao tribunal recorrido na apreciação efectuada.
Na verdade, estamos perante uma servidão de atravessamento de espaço aéreo pelo teleférico do Funchal ao longo de todo o trajecto e com a proibição do seu atravessamento por qualquer meio, objecto, construção, ou plantação de qualquer natureza, a qual causa um dano especial, impedindo a fruição total do prédio.
Por esse motivo, entendeu o tribunal recorrido que a aludida servidão, embora não se enquadrando nas alíneas do citado art. 8º, nº 2, merecia a protecção da indemnização atribuída nos termos do Cód. das Expropriações, defendendo que apenas, por essa via, se acautela os princípios constitucionais constantes dos arts. 2º e 61º da CRP.
Para o apelante, esta interpretação não pode ser efectuada, porquanto tem sido defendido pelo Tribunal Constitucional que o princípio da repartição igualitária dos encargos públicos impõe uma compensação patrimonial reequilibradora do sacrifício grave e especial sofrido pelo titular do prédio sobre que incide a servidão, o que invalida a aplicação do art. 8º, nº 2, o qual apenas se aplicará quando há um esvaziamento do núcleo essencial do direito de propriedade.
Ora, a constituição de uma servidão de atravessamento de espaço aéreo é, como decidido em 1ª instância, uma violação do direito de propriedade que determina a atribuição de uma indemnização que se pretende ser justa e reparadora dos danos sofridos.
A única forma de obter o equilíbrio entre essa indemnização e a salvaguarda do direito de propriedade, constitucionalmente garantido, é subsumir a situação dos autos ao preceito em referência. Entender de modo diverso atentaria contra as normas constitucionais.
Tratando situação idêntica à dos autos, entendeu o Ac. TRL de 29-05-2012, proc. 359/08.8TBFUN.L1-1, citado na decisão recorrida (embora com um erro na sua data), que as servidões que “produzem danos especiais e anormais (ou graves) na esfera jurídica dos proprietários dos prédios (normalmente, terrenos) ” devem ser indemnizáveis nos termos do citado art. 8º, nº 2.
Escreveu-se neste aresto e citando Fernando Alves Correia in “Manual de Direito do Urbanismo”, vol. I, 2ª ed., Outubro de 2004, que “…devem dar direito a indemnização todas as servidões administrativas que se apresentam como verdadeiras expropriações de sacrifício ou substanciais, isto é, como actos que produzem modificações especiais e graves (ou anormais) na utilitas do direito de propriedade, em termos tais que ocorreria uma violação do princípio da justa indemnização por expropriação (aqui entendida no sentido de expropriação de sacrifício ou substancial), condensado no artigo 62º, nº 2, da Constituição, do princípio do Estado de direito democrático, consagrado nos artigos 2º e 9º, alínea b), da Lei Fundamental, nos termos do qual os actos do poder público lesivos de direitos ou causadores de danos devem desencadear uma indemnização, e do princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos, ínsito no artigo 13º, nº 1, da Constituição, se o proprietário onerado com essa servidão administrativa não obtivesse uma indemnização.
E as servidões administrativas que produzem danos daquela natureza não se restringem, seguramente, às elencadas no nº 2 do artigo 8º do vigente Código das Expropriações
(…)
De acordo com o critério por nós anteriormente avançado, só não dão direito a indemnização as servidões administrativas que criem limitações ou condicionamentos à utilização e disposição dos bens, designadamente dos solos, que são um mero efeito da função social, da vinculação social (Sozialbindung) ou da vinculação situacional (Situationsgebunenheit) da propriedade que incide sobre aqueles bens, isto é, uma simples consequência da especial situação factual dos bens, da sua inserção na natureza e na paisagem e das suas características intrínsecas, ou cujos efeitos ainda se contenham dentro dos limites ao direito de propriedade definidos genericamente pelo legislador.
Tal como a indemnização por expropriação, também a indemnização pela “servidão administrativa” deve ser justa (cfr. o artigo 62º, nº 2, da Constituição) Ela deve, por isso, consistir numa indemnização integral (volle Entschädigung) ou numa compensação total do dano infligido ao proprietário do prédio serviente». «Além disso, deve a mesma repor a observância do princípio da igualdade violado com a servidão, compensando plenamente o sacrifício especial e anormal suportado pelo proprietário do prédio serviente, de tal modo que o sacrifício que lhe foi imposto seja equitativamente repartido entre todos os cidadãos»
«Ora, tendo em conta que o critério geral da indemnização por expropriação é o do “prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem, de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data” (cfr. o artigo 23º, nº 1, do Código das Expropriações) – critério este que é o do valor de mercado (Verkehrswert), também denominado valor venal, valor comum ou valor de compra e venda do bem expropriado, entendido não em sentido estrito, mas em sentido normativo, isto é, “o valor de mercado normal ou habitual”, despido dos elementos especulativos -, deverá a indemnização pela “servidão administrativa” corresponder à diminuição do valor de mercado do prédio serviente, tendo em conta as circunstâncias e as condições de facto existentes à data da constituição da servidão”.
Parece-nos ser esta a forma correcta de abordar a questão.
Da existência da aludida servidão de atravessamento de espaço aéreo resultam limitações no exercício do direito de propriedade dos expropriados, que merecem a tutela do direito e que conduzem à fixação de uma indemnização.
Ora, se é certo que essas limitações não se subsumem a nenhuma das als. do art. 8º, nº 2, há que atender aos factos provados sob os nºs 6 a 11.
Assim, a parcela em causa atravessa o prédio sensivelmente ao meio; o ponto da catenária em maior flecha encontra-se a 28,45 m acima da cota mais alta do terreno do prédio, a servidão começa a 20,35m m acima da cota mais alta do terreno do prédio; a base da gôndola passa a uma distância de 24,45 m e ainda que, no prédio está implantada uma moradia unifamiliar, edificada em construção tradicional, de um piso, coberta com telha, com estrutura de betão armado, paredes interiores e exteriores em alvenaria de blocos de betão revestidas e pintadas, caixilharia em madeira e com uma área de construção de 56m2.
A tudo isto, acrescem os factos vertidos de 15. a 18., a diminuição de 25% do valor do prédio e ainda uma diminuição efectiva no modo como os expropriados podem fruir o espaço envolvente à moradia.
Da conjugação de todos estes factos resulta, inequivocamente, a existência de danos especialmente gravosos na esfera jurídica dos expropriados e que se reconduzem a mais do que a diminuição do espaço aéreo do prédio em causa ou a uma compensação em virtude do interesse público.
Ora, tais danos têm de ser ponderados na indemnização a fixar, a qual deve ser de acordo com as regras constantes do Cód. das Expropriações, por aplicação do art. 8º, nº 2 deste diploma, sob pena de violação do princípio do Estado de Direito democrático (arts. 2º e 9º, al. b) da CRP), o princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos públicos (art. 13º, nº 1 da CRP) e o princípio da justa indemnização por expropriação, consagrado no art. 62º da CRP.
É ainda importante referir o art. 1344º, nº 1 do CC, nos termos do qual “A propriedade dos imóveis abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo, com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei ou negócio jurídico” e que, no caso dos autos, determina a possibilidade de atribuir uma indemnização nos termos previstos no Cód. das Expropriações.
Este entendimento tem vindo a ser seguido nos tribunais quanto à servidão em causa nos autos (teleférico da cidade do Funchal), sendo particularmente relevante o Ac. TRL supra citado e que aqui se segue de perto.
Ainda assim, sempre se dirá que a presente indemnização não poderia ser atribuída nos termos da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro, seja por a DUP em causa nos autos é anterior à entrada em vigor desta lei, seja por a situação dos autos não se enquadrar no âmbito de aplicação deste diploma.
Concluindo, entende-se que a aplicação do regime de indemnização das expropriações ao caso vertente se mostra correcto, inexistindo qualquer erro de julgamento, como sustentado pelo apelante, o que determina a improcedência, nesta parte, da apelação.

Insurge-se ainda o apelante com o montante indemnizatório atribuído, defendendo que “ a indemnização deve ser recalculada, dado que teve por base pressupostos errados e não foi dado cumprimento aos critérios previstos naquele diploma legal”.
Antes de analisar o caso particular dos autos, importa referir que o art. 1º do Cód. das Expropriações dispõe que “os bens imóveis e direitos a ele inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública, compreendida nas atribuições da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização”.
Esclarece o art. 23º, nº 1 do citado diploma que “A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.
Esta “justa indemnização” visa ressarcir o prejuízo que para os expropriados advém da expropriação, prejuízo este que corresponde, em princípio, ao valor real e corrente dos bens expropriados, entendido em sentido eminentemente objectivo. Sobre esta matéria escreve Alves Correia, in "As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública", Coimbra, 1982, Separata do B.F.D., vol. XXXIII do Suplemento, pág. 129, “entende-se que o dano material suportado pelo expropriado é ressarcido de uma forma integral e justa se a indemnização corresponder ao valor do bem comum do bem expropriado, ou por outras palavras, ao respectivo valor do mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda”. Ou seja, tal valor é a importância que, nas condições normais do mercado, um comprador prudente pagaria de preço pelo prédio (cfr. Ac. STJ, de 31 de Março de 1967, in BMJ, 165, pág. 269).
Como se referiu no Ac. do TC 52/90, in DR, I Série, de 30 de Março de 1990, “a justa indemnização há-de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda que a transferência do bem que lhe acarreta, devendo ter-se em atenção a necessidade de respeitar o princípio da equivalência de valores: nem a indemnização pode ser tão reduzida que o seu montante a torne irrisória ou meramente simbólica, nem, por outro lado, nela deve atender-se a quaisquer valores especulativos ou ficcionados, por forma a distorcer (positiva ou negativamente) a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação”.
Tal como ensina Fernando Alves Correia, in O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Ed. Almedina, 1989, p. 532 e ss., “o significado da expressão justa indemnização inserta no artigo 62.º n.º 2 da CRP, pode ser determinada com base num processo de aproximação sucessivas. São três os parâmetros fundamentais do conceito de justa indemnização: a proibição de uma indemnização meramente nominal, irrisória, simbólica; uma indemnização que respeite a igualdade de encargos; uma indemnização que tenha em conta o interesse público da expropriação”.
São, pois, estes os critérios que devem ser tomados em consideração na fixação da indemnização a que os expropriados têm direito, em conjugação com os factos apurados, sem esquecer que a indemnização deverá respeitar os princípios da igualdade e da proporcionalidade, por forma a ressarcir os danos que resulta do perda do bem expropriado e aqueles que são consequência da expropriação.
Quanto a esta matéria pode ler-se o seguinte na sentença recorrida:
“Importa pois fixar uma indemnização em obediência aos princípios supra referidos.
Ora, os Srs. Peritos vieram no laudo, ao qual aderimos, concluir pela desvalorização em 25% da moradia, em face da perda de segurança, de privacidade e da depreciação das condições ambientais em conjugação com a manutenção da sua localização, infra-estruturas, transportes disponíveis, proximidade de equipamentos urbanos, nível de qualidade arquitectónica e área de construção. Valorados estes elementos, concordamos com os Srs. Peritos quanto à percentagem de desvalorização da moradia.
Acresce que, em face do valor do m2 de construção fixado para o ano de 2000 (data da D.U.P.), a saber, 450,43euros/m2 e da área de construção (56m2) o valor de construção ascende a 25.224,08 euros., ao que acresce o valor dos encargos com projecto e licenças no valor de 1261,20 euros conforme sustentado pelos Srs. Peritos.
Ademais, atendendo às características do solo apto para construção, concordamos com os Srs Peritos quando indicam o valor de 109.724,40 euros para valor do solo de construção.
Perante estes valores e considerando a desvalorização de 25% do valor de construção da moradia e encargos encontramos o valor de 6621,32 euros.
A esse valor acrescerá a desvalorização do terreno do prédio que se encontra na diferença entre o valor do solo apto para construção e o valor do solo para fins agrícolas, o que ascende a 92.324,40 euros (109.724,40 euros –17.400 euros).
Neste contexto, concordamos com o valor da indemnização pela desvalorização do prédio indicado pelos Srs. Peritos no montante de 98.950 euros (arredondado em 4,28 euros)”.
Defende o apelante que este valor não se mostra correcto, alegando, em síntese, que o mesmo se funda em factos que não deveriam ter sido considerados, em particular o facto de a servidão não ser definitiva, o terreno não dever ser considerado, na sua totalidade, apto para fins construtivos, no cálculo da desvalorização do terreno, na percentagem de 25% de desvalorização da moradia e de 5% do custo de construção da moradia e logradouro para o cálculo dos encargos com o projecto e licenças de utilização e funcionamento, que não têm base legal, e ainda que as consequências de redução de intimidade, perturbação do sossego, exposição a acidentes e frequente arremesso de objectos, que servem de fundamentação à desvalorização da moradia, não têm qualquer relação directa com a constituição da servidão, pelo que extravasam o objecto dos presentes autos.
Da leitura das alegações de recurso extrai-se que a discordância do apelante se prende, acima de tudo, com o teor do relatório pericial.
Com efeito, as conclusões 12 a 18 dizem respeito ao modo como o tribunal recorrido valorou os factos dados como assentes, os quais resultaram do relatório pericial constante de fls. 358 e ss..
Ora, da consulta dos autos extrai-se que o apelante não reclamou deste relatório, nem apresentou qualquer pedido de esclarecimento.
Por outro lado, esse relatório, subscrito por todos os Peritos nomeados, assume-se como credível, não existindo quaisquer elementos nos autos que o descredibilizem.
Constitui entendimento unânime na jurisprudência que, no processo de expropriação, a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo Tribunal, não estando o juiz vinculado ao laudo maioritário.
Todavia, face ao carácter técnico do processo de expropriação, quando pretenda afastar-se desse laudo, deve o juiz analisar todos os elementos constantes dos autos de forma critica, apenas afastando o laudo quando possa “concluir com segurança que os peritos assentaram o seu raciocínio em erro manifesto ou critério errado”. Neste sentido, Ac. TRL, de 12-04-2018, proc. 10/10TBVFC.L2-6.
No caso dos autos, constata-se que o laudo pericial se mostra elaborado de acordo com todos os critérios de fundamentação e rigor que subjazem ao caso, inexistindo qualquer motivo para afastar as conclusões nele expressas.
Do que se acaba de referir resulta que os factos a atender nos autos são os que resultam do laudo pericial, o qual refere expressamente os reflexos da servidão administrativa no prédio dos autos, nomeadamente quanto à desvalorização do prédio.
De harmonia com o Cód. das Expropriações importa, para efeitos de indemnização por expropriação, proceder-se primeiro à classificação do terreno a expropriar - cfr. art. 25º - e depois calcular o seu valor - cfr. arts. 26º e 27º.
  Nos termos do art. 25º, nº 1 do Cód das Expropriações, “Para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação, o solo classifica-se em: a) Solo apto para a construção; b) Solo para outros fins.”, dispondo o nº 2 deste preceito que se considera solo apto para a construção:
a) O que dispõe de acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir;
b) O que apenas dispõe de parte das infra-estruturas referidas na alínea anterior, mas se integra em núcleo urbano existente;
c) O que está destinado, de acordo com instrumento de gestão territorial, a adquirir as características descritas na alínea a);
d) O que, não estando abrangido pelo disposto nas alíneas anteriores, possui, todavia, alvará de loteamento ou licença de construção em vigor no momento da declaração de utilidade pública, desde que o processo respectivo se tenha iniciado antes da data da notificação a que se refere o n.º 5 do artigo 10º”.
Por outro lado, e nos termos do nº 3 do preceito em questão, considera-se solo para outros fins o que não se encontra em qualquer das situações previstas no citado nº 2 do art. 25º.
Dispõe o art. 26º do Cód. das Expropriações que “1 - O valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º
2 - O valor do solo apto para construção será o resultante da média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições, ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, efectuadas na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com média anual mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial, corrigido por ponderação da envolvente urbana do bem expropriado, nomeadamente no que diz respeito ao tipo de construção existente, numa percentagem máxima de 10%.
3 - Para os efeitos previstos no número anterior, os serviços competentes do Ministério das Finanças deverão fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na zona e os respectivos valores.
4 - Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n.º 2, por falta de elementos, o valor do solo apto para a construção calcula-se em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes. 5 - Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada.
6 - Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
7 - A percentagem fixada nos termos do número anterior poderá ser acrescida até ao limite de cada uma das percentagens seguintes, e com a variação que se mostrar justificada:
a) Acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente junto da parcela - 1,5%;
b) Passeios em toda a extensão do arruamento ou do quarteirão, do lado da parcela - 0,5%;
c) Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto da parcela - 1%;
d) Rede de saneamento, com colector em serviço junto da parcela - 1,5%;
e) Rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão com serviço junto da parcela - 1%;
f) Rede de drenagem de águas pluviais com colector em serviço junto da parcela - 0,5%;
g) Estação depuradora, em ligação com a rede de colectores de saneamento com serviço junto da parcela - 2%;
h) Rede distribuidora de gás junto da parcela - 1%;
i) Rede telefónica junto da parcela - 1%.
8 - Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno.
9 - Se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos nºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infra-estruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas.
10 - O valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos nºs 4 a 9 será objecto da aplicação de um factor correctivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à actividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação.
11 - No cálculo do valor do solo apto para a construção em áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, legalmente fixadas, ter-se-á em conta que o volume e o tipo de construção possível não deve exceder os da média das construções existentes do lado do traçado do arruamento em que se situe, compreendido entre duas vias consecutivas.
12 - Sendo necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada.”
Nos termos do art. 27º do mesmo diploma, “1 - O valor do solo apto para outros fins será o resultante da média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com média anual mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial e à sua aptidão específica.
2 - Para os efeitos previstos no número anterior, os serviços competentes do Ministério das Finanças deverão fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na zona e os respectivos valores.
3 - Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n.º 1, por falta de elementos, o valor do solo para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo.”
A este propósito, e uma vez que o apelante discorda da qualificação do prédio, há que referir que no relatório pericial consta que:
“A desvalorização do terreno deriva do facto de, em termos formais, o mesmo «perder a aptidão para a construção», admitindo-se que passaria a ter uma mera aptidão agrícola (cultura de produtos agrícolas), se à data da Declaração de Utilidade Pública não existisse a moradia já edificada.
A desvalorização do terreno será, então, igual à diferença entre o valor do solo apto para a construção e o valor do solo agrícola”.
Assim, tem de se concordar com a decisão recorrida quando adere ao relatório pericial e considera que “o solo deixa de ser apto para construção nos termos em que o era, sendo assim adequado considera-lo apto para fins agrícolas e ainda assim com a limitação da altura da cultura que se pretenda efectuar”.
Esta qualificação decorre ainda dos factos provados, em concreto o facto de a servidão incidir sobre uma parcela de 258 m2 do prédio, atravessando-o ao meio e começando a 20,35m m acima da cota mais alta do terreno do prédio, passando a gondola a 24,45 m, circunstâncias que, conjugadas, inviabilizam qualquer futura construção.
Refira-se que o facto de, abstractamente, ser possível a construção ou mesmo que ela não seja admissível por razões urbanísticas, não retira este obstáculo à aptidão construtiva do prédio dos autos, que assim passou a estar onerado, o que se reflecte no seu valor.
Na tese do apelante, o facto de não ter sido expropriado qualquer prédio, total ou parcialmente, nem ter sido constituída uma servidão sobre o solo, mas apenas de atravessamento de espaço aéreo, a qual não é definitiva, não pode levar à indemnização atribuída.
Ora, antes de mais, haverá que dizer que as limitações construtivas de que o prédio passou a padecer são as mesmas, quer a servidão seja sobre o solo, quer seja de atravessamento de espaço aéreo, na medida em que o que releva é essa impossibilidade.
Por outro lado, as limitações decorrentes da servidão não são temporariamente valoradas, esgotando-se na sua concretização. Isto é, o prédio está onerado com a servidão por tempo indeterminado, não permitindo, durante esse período, qualquer construção em altura nos limites da servidão, sendo, pois, irrelevante se a mesma é ou não definitiva.
Por outro lado, importa salientar que a percentagem da desvalorização da moradia decorre dos factos assentes e do laudo pericial, no qual os Srs. Peritos concluíram pela desvalorização em 25% da moradia, considerando a perda de segurança, de privacidade e depreciação das condições ambientais, a que acresce a manutenção da sua localização, infra-estruturas, transportes disponíveis, proximidade de equipamentos urbanos, nível de qualidade arquitectónica e área de construção.
Igual raciocínio se terá de seguir para a aplicação da percentagem de 5% do custo de construção da moradia e logradouro para o cálculo dos encargos com o projecto e licenças de utilização e funcionamento e com a qual o apelante se insurge. Com efeito, esse valor foi dado como provado e deve ser compatibilizado juntamente com o valor do m2 de construção para se chegar a um valor final, tal como sustentado pelos Srs. Peritos, porquanto essa será a única forma de se alcançar um valor de mercado justo e equilibrado.
Alega o apelante que a decisão recorrida não podia atender às “consequências de redução de intimidade, perturbação do sossego, exposição a acidentes, frequente arremesso de objectos, perda de segurança, da privacidade e da depreciação das condições ambientais”, já que não têm qualquer relação directa com a constituição da servidão, extravasando o objecto dos presentes autos e violando o disposto no art. 23º do Cód. das Expropriações.
Relativamente a esta matéria, há que dizer que a indemnização prevista no citado art. 23º pretende “ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.
Por esse motivo, tem sido entendido que não é “constitucionalmente legítimo afastar daquela [indemnização] quaisquer elementos valorativos ou acrescentar-lhe outros que distorçam “(positiva ou negativamente) a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação”, cfr. Ac. TRC de 26-09-2017, proc. 16735/15.0T8LSB.C1, no qual se refere a impossibilidade de atender a danos que provenham da obra efectuada, como é o caso de prejuízos causados pela construção de uma auto-estrada e pelo maior afluxo de trânsito e consequente impacto ambiental e que não resultam do acto expropriativo.
No caso vertente, não estamos perante esta situação, nem o tribunal recorrido fixou qualquer indemnização pelos prejuízos causados pela existência do teleférico e reflexos deste na vida dos expropriados.
Ao invés, a decisão recorrida atendeu a esses factos no apuramento da desvalorização do valor de mercado, entendendo que esses danos têm origem na expropriação, e, por esse motivo, devem ser valorados na desvalorização do prédio.
Consequentemente, face a essa valorização, chega o tribunal recorrido ao valor final, o qual se mostra correcto face a todos os factos dados como assentes e, em particular, ao teor do relatório pericial.
Por último, e no que se refere ao método de cálculo adoptado no cálculo da desvalorização, cumpre recordar que a sentença recorrida chegou ao valor indemnizatório de acordo com os cálculos efectuados pelos Srs. Peritos, os quais não merecem qualquer censura e se enquadram nos critérios previstos no Cód. das Expropriações.
De acordo com o apelante, o tratamento dado à “servidão administrativa de atravessamento do espaço aéreo de um prédio rústico de 106 m2, que começa 13,13 m acima da cota mais alta do terreno do prédio, como se de uma expropriação de um prédio urbano de 106 m2 se tratasse (…) constitui uma afronta ao Princípio da Igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa”.
Antes de mais, haverá que referir que o tribunal recorrido não trata de forma idêntica tais situações, antes valorando autonomamente as consequências da presente servidão no aproveitamento do solo em causa, nomeadamente na impossibilidade de construção, calculando um valor diverso do que seria no caso de uma expropriação total. Ou seja, não se vislumbra qualquer violação do princípio da igualdade no cálculo em causa, sendo a alegação do apelante improcedente.
Alega ainda o apelante que “Ainda que fosse de aplicar o regime de indemnização do Código das Expropriações, não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 29.º do mesmo diploma legal, já que em momento algum é, nomeadamente, calculado, separadamente, o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela declaração de utilidade pública, nem em algum momento foi especificado também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte que constitui a servidão de atravessamento de espaço aéreo”.
O art. 29º do Cód. das Expropriações refere-se às expropriações parciais, sem aplicação ao caso dos autos, já que os mesmos não se referem a uma expropriação parcial mas sim à fixação de uma indemnização em virtude de servidão administrativa de espaço aéreo.

Pelo exposto, entende-se que a sentença recorrida efectuou um correcto enquadramento fáctico-jurídico, sendo improcedente a apelação.

IV. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo apelante.
*
Lisboa, 11 de Julho de 2019

Ana Rodrigues da Silva
Micaela Sousa
Maria Amélia Ribeiro