Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
293/21.0YUSTR.L1-PICRS
Relator: MARIA DA LUZ TELES MENESES DE SEABRA
Descritores: CONTRAORDENAÇÃO
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRA-ORDENACIONAL
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
CMVM
MEDIDA DE RESOLUÇÃO
INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
DEVER DE INFORMAÇÃO
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIAL PROVIMENTO A UM DOS RECURSOS - TOTALMENTE IMPROCEDENTES OS DEMAIS
Sumário: I. As decisões proferidas pelo Tribunal de 1ª Instância, que tenham recaído sobre questões processuais, ao longo do julgamento do recurso de impugnação judicial, que não façam parte da sentença ou despacho final que conheça do mérito do recurso interposto da decisão da autoridade administrativa, são irrecorríveis.
II. Também não é admissível recurso, para o Tribunal da Relação, de qualquer uma das decisões judiciais previstas no art. 55º nº 1 e 3 do RGCO, porquanto, embora as decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas no decurso da fase administrativa do procedimento contraordenacional sejam susceptíveis de impugnação judicial por parte do arguido, competente para as decidir é o tribunal de 1ª Instância, que delas decidirá em última instância.
III. Atentos os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM, de garantir a execução efetiva da política europeia destinada a assegurar a integridade dos mercados financeiros, impõe-se aplicar a suspensão do prazo de prescrição prevista na nova redação do art. 418º do CdVM, aos processos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes da sua entrada em vigor.
IV. Para a violação do princípio ne bis in idem, o circunstancialismo fáctico idêntico deve assumir também o mesmo desvalor jurídico, afastando-se a violação daquele princípio quando haja um desvalor plúrimo, um concurso real de contraordenações, ainda que os factos sejam substancialmente os mesmos.
V. O disposto no artigo 17.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25/3 (Regime Jurídico do Papel Comercial) não desonera o intermediário financeiro do cumprimento, junto dos investidores, dos parâmetros de qualidade do dever de informação exigidos pelo artigo 7.º do CdVM.
VI. O BP, quando transferiu os ativos do B..., para o banco de transição, por força da Medida de Resolução imposta ao B..., não excluiu dessa transferência a responsabilidade de índole contraordenacional do BEl..., Ne bis in idem,
VII. Só pode invocar o princípio da confiança, o sujeito que se comporta de acordo com a norma de cuidado.
(elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes que compõem esta Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
                                                           *
I. RELATÓRIO.
Haitong Bank SA., AA, BB, CC, DD, EE e FF  apresentaram Recurso de  Impugnação Judicial da decisão proferida pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que os havia condenado, entre outros arguidos, nos seguintes termos:
a) O Recorrente Haitong:
i. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;.
ii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, (quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram o papel comercial da R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
iii) Por referência às anteriores coimas singulares, na coima única no montante de € 300.000,00 (trezentos mil euros), suspensa parcialmente no montante de € 100.000,00, pelo prazo de dois anos.
b) O Recorrente AA:
a) Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
i. Numa coima de € 300,000, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii. Numa coima de € 350.000, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iii. Numa coima de € 350.000,00 pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iv. Numa coima de € 750.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A:
v. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vi. Numa coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vii. Numa coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
viii. Numa coima de € 600.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros).
d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 5 (cinco) anos.
c) O Recorrente BB:
a) Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
i. Numa coima de € 250.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iv. Numa coima de € 500.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A:
v. Numa coima de € 250.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vi. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.;
viii. Numa coima de € 500.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contraordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
c) Por referência às anteriores coimas singulares, numa coima única no montante de € 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil euros);
d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as atividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 4 (quatro) anos.
d)  O Recorrente CC:
a) Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
i. Numa coima de € 250.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
ii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
iv. Numa coima de € 600.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
b) Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A
v. Numa coima de € 250.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vi. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
vii. Numa coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.;
viii. Numa coima de € 500.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
c) Por referência às coimas singulares anteriores, numa coima única no montante de € 900.000,00 (novecentos mil euros).
d) Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 4 (quatro) anos.
e) O Recorrente DD:
i. Numa coima de € 150.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A entre Novembro e Dezembro de 2013), o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;.
ii. Numa coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, (quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram o papel comercial da R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui, nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, a prática de uma contra-ordenação muito grave, sancionável com coima de €25.000,00 a €5.000.000,00, nos termos do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
iii. Por referência às coimas singulares anteriores, numa coima única no montante de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros).
iv. Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (art. 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos.
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Por sentença proferida a 15.02.2022 foi a referida Impugnação Judicial julgada, quanto aos aqui Recorrentes, nos seguintes termos:
“1. Totalmente improcedentes as questões prévias, nulidades e inconstitucionalidades suscitadas contra a decisão administrativa recorrida, proferida pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) pelos Recorrentes HAITONG BANK S.A., AA, BB, CC, DD, EE e FF apreciadas por este tribunal (exceptuando-se, por isso, todas as questões que se consideraram de apreciação prejudicada);
2. No demais, totalmente improcedente a impugnação apresentada pelo Recorrente HAITONG BANK S.A. e, em consequência, decido condená-lo:
2.1 pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros);
2.2 pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros);
2.3 Operando ao cúmulo jurídico das coimas supra referidas, na coima única conjunta de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros);
2.4 Suspender parcialmente a execução da coima única conjunta cominada de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), no montante de € 200.000,00 (duzentos mil euros) pelo período de 2 (dois) anos;
3. No demais, improcedente a impugnação apresentada pelo Recorrente AA e, em consequência, decido condená-lo:
3.1 pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros);
3.2 pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros);
3.3 pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros);
3.4 pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil euros);
3.5 pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros);
3.6 pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 330.000,00 (trezentos e trinta mil euros);
3.7 pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 330.000,00 (trezentos e trinta mil euros);
3.8 pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 580.000,00 (quinhentos e oitenta mil euros);
3.9 Operando ao cúmulo jurídico das coimas supra referidas, na coima única conjunta de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros);
3.10 Na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 5 (cinco) anos, contabilizados desde o trânsito em julgado da presente decisão;
4. No demais, parcialmente improcedente a impugnação apresentada pelo Recorrente BB e, em consequência, decido:
4.1 Absolvê-lo da prática dolosa da violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
4.2 Absolvê-lo da prática dolosa da violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
4.3 Absolvê-lo da prática dolosa da violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
4.4 Absolvê-lo da prática dolosa da violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
4.5 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 50.000,00 (cinquenta mil euros);
4.6 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
4.7 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
4.8 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 100.000,00 (cem mil euros);
4.9 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros);
4.10 Condená-lo pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
4.11 Condená-lo pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
4.12 Condená-lo pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros);
4.13 Operando ao cúmulo jurídico das coimas supra referidas, condená-lo na coima única conjunta de € 500.000,00 (quinhentos mil euros);
4.14 Suspender parcialmente a execução da coima única conjunta cominada de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) pelo período de 2 (dois) anos;
4.15 Condená-lo na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 2 (dois) anos, contabilizados desde o trânsito em julgdo da presente decisão;
5. No demais, parcialmente improcedente a impugnação apresentada pelo Recorrente CC e, em consequência, decido:
5.1 Absolvê-lo da prática dolosa, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
5.2 Absolvê-lo da prática dolosa, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
5.3 Absolvê-lo da prática dolosa, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
5.4 Absolvê-lo da prática dolosa, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
5.5 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 50.000,00 (cinquenta mil euros);
5.6 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
5.7 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
5.8 Condená-lo, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 100.000,00 (cem mil euros);
5.9 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros);
5.10 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
5.11 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
5.12 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros);
5.13 Operando ao cúmulo jurídico das coimas supra referidas, condená-lo na coima única conjunta de € 500.000,00 (quinhentos mil euros);
5.14 Condená-lo na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos, contabilizados desde o trânsito em julgado da presente decisão;
6. No demais, parcialmente procedente a impugnação apresentada pelo Recorrente DD e, em consequência, decido:
6.1 Absolvê-lo da prática da contra-ordenação consubstanciada na violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
6.2 Condená-lo, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros);
6.3 Condená-lo na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 1 (um) ano, contabilizados desde o trânsito em julgado da presente decisão;
7. No demais, totalmente procedente a impugnação apresentada pelo Recorrente EE e, em consequência, decido:
7.1 Absolvê-lo da prática da contra-ordenação consubstanciada na violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
7.2 Absolvê-lo da prática da contra-ordenação consubstanciada na violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
8. No demais, totalmente procedente a impugnação apresentada pelo Recorrente FF e, em consequência, decido absolvê-lo da prática da contra-ordenação consubstanciada na violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
Custas pelos Recorrentes HAITONG BANK S.A., AA, BB, CC e DD, operando, de acordo com o artigo 8.º, n.º 7 do RCP e Tabela III, anexa ao mesmo, em função do decaimento e complexidade das questões suscitadas, à correcção da taxa de justiça devida pela impugnação e fixando a taxa de justiça em 5 (cinco) Unidades de Conta para cada um dos Recorrentes, com excepção do Recorrente DD, cuja taxa de justiça fixo em 4 (quatro) Unidades de Conta – artigo 513.º do CPP, a contrário, ex vi do artigo 92.º, n.º 1 do RGCO e artigo 93.º, n.º 3 do mesmo RGCO – sem prejuízo de outros montantes anteriormente já liquidados (eventualmente nos termos do n.º 8 do artigo 8.º do RCP), que não deverão ser descontados ao valor aqui fixado.
Deposite e notifique, incluindo a CMVM
Processei e revi.”
*
Inconformados com tal decisão, vieram os arguidos Haitong Bank SA., AA, BB, CC e DD da mesma interpôr recurso para este Tribunal da Relação, seguindo-se as respectivas conclusões

Conclusões (Haitong Bank, SA)
DO OBJECTO DO RECURSO
A. Vem o presente Recurso interposto da Sentença proferida em 15.02.2022, nos termos da qual se decidiu, entre o mais, condenar o ora Recorrente numa coima única no valor de € 400.000,00, pela prática, em concurso real e efetivo de duas contraordenações, ao abrigo do disposto nos artigos 7.º, 388.º, n.º 1, alínea a) e 389.º, n.º 1, alínea a) do CdVM a qual, por assentar em pressupostos errados, ser violadora dos direitos dos arguidos e por ser proferida no âmbito de um processo não equitativo, deve ser revogada.
II. DA FALTA DE FUNDAMENTO PARA IMPUTAÇÃO DAS INFRAÇÕES AO HAITONG BANK
A) DA IMPUTAÇÃO A TÍTULO OBJETIVO
(i) O artigo 7.º do CdVM não é fonte autónoma de deveres de informação
B. A norma constante do artigo 7.º do CdVM não configura uma fonte autónoma de deveres de informação, sendo antes uma norma de conduta incompleta e carecendo, por conseguinte, de ser articulada ou complementada, com outras normas que estabeleçam deveres concretos de prestação de informação;
C. Esta interpretação ― a de que o artigo 7.º não consagra quaisquer deveres de informação ― é a que resulta da própria letra da lei (cfr. artigo 9.º do Código Civil): a letra da lei nada diz ou enuncia quanto a deveres ou responsabilidade pela informação. E é também a interpretação que resulta da intenção e do pensamento do próprio legislador (cfr. artigo 9.º do Código Civil), conforme devidamente explicados pelos membros da comissão que procedeu à elaboração do CdVM, nomeadamente pelo respetivo presidente, GG, e depois por HH;
D. O artigo 7.º do CdVM não pode valer como norma de proteção ― não só porque tal entendimento é desconforme com lei expressa (nem tem, como se disse, qualquer correspondência no espírito do legislador), como sempre levantaria problemas de delimitação da aplicação da norma (a entender-se o artigo 7.º do CdVM como uma norma de proteção, não haveria quaisquer limites para o alargamento da responsabilidade);
E. É inusitado fazer uma interpretação peregrina da norma, criando deveres de informação e consequente responsabilidade que a lei e a jurisprudência cíveis não reconhecem, quando se está no âmbito do direito sancionatório, sendo absolutamente inconcebível que, numa situação como a presente, não haja responsabilidade civil, mas haja responsabilidade contraordenacional;
F. O artigo 7.º do CdVM, se interpretado no sentido de estabelecer autonomamente deveres de informação e no sentido de constituir fundamento de responsabilidade civil e, conjugado com outras normas, fundamento de responsabilidade contraordenacional, é inconstitucional, por ofensa ao princípio da legalidade, ao princípio da culpa e ao direito fundamental de livre iniciativa económica (consagrado no artigo 61.º, n.º 1, da CRP e, com a designação de liberdade de empresa, no artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia).
G. Assim sendo, deve tal norma, assim interpretada, ser desaplicada, nos termos do artigo 204.º da Constituição, preferindo-se uma interpretação conforme à Constituição, ou seja, uma interpretação da norma que se retira do artigo 7.º do CdVM no sentido de que a mesma não consubstancia de per se, e sem ser articulada e complementada com outras normas, uma norma de imputação de responsabilidade contraordenacional, por não indicar quem é que está obrigado ao cumprimento de deveres de informação, em que termos e com que limites. Inconstitucionalidade que desde já que se suscita nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do 280.º da Constituição da República Portuguesa e no n.º 2 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional.
H. Sendo o artigo 7.º do CdVM é uma “norma incompleta”, carecendo de ser complementada com uma norma prescritora de deveres de informação, é certo que, no caso concreto do HAITONG BANK, inexiste qualquer norma que lhe imponha deveres de informação perante os investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, seja na lei geral (i.e., no regime dos deveres de informação impostos pelo CdVM aos intermediários financeiros), seja na lei especial (i.e., nos deveres de informação impostos pelo Regime Jurídico do Papel Comercial no que às notas informativas diz respeito). Senão vejamos:
(ii) A responsabilidade pelo conteúdo das Notas Informativas: a lei especial constante do Regime Jurídico do Papel Comercial
I. O papel comercial é regido por lei especial, nomeadamente, pelo Regime Jurídico do Papel Comercial, o qual é expresso ao atribuir ao emitente do papel comercial no âmbito de ofertas particulares (e só ao emitente) a responsabilidade pela informação contida nas respetivas notas informativas, sobre o emitente (e só sobre o emitente) recaindo, por conseguinte, o respetivo dever de informar;
J. Tenha-se presente, a este propósito, que o papel comercial em questão foi emitido e subscrito ao abrigo de programas de emissão de papel comercial por oferta particular de
subscrição, na modalidade de colocação direta (e com um montante mínimo de subscrição
porcliente de EUR 100.000), em conformidade com o disposto no artigo 12.º do Regime Jurídico do Papel Comercial;
K. É absolutamente pacífico que, por força do artigo 17.º do Regime Jurídico do Papel Comercial, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 52/2006, de 15 de Março, em vigor à data dos factos (e no artigo 20.º-A do mesmo diploma, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto- lei n.º 28/2014), a informação constante da Nota Informativa do papel comercial é da exclusiva responsabilidade da entidade emitente, sendo, por conseguinte, sobre a entidade emitente que recai o correspondente dever de informação (e de controlo de informação);
L. As próprias Notas Informativas deixavam claro que eram as emitentes ― a EI..., S.A e a R..., S.A ― que assumiam a exclusiva responsabilidade pelo respetivo conteúdo das mesmas (cfr. página 3 das Nota Informativas juntas como Documentos n.ºs 18 e 19 com o Recurso de Impugnação Judicial do HAITONG BANK) (cfr. também Facto Provado n.º 640);
M. Tal regime encontra-se igualmente plasmado, aliás, na letra dos Contratos de Organização, nomeadamente nas respetivas Cláusulas 12.ª/a), Cláusulas 12.ª/e) e Cláusulas 12.ª/d), e em especial, nas Cláusulas 13.ª/1/ a);
N. O HAITONG BANK não estava, pois, obrigado a verificar a qualidade da informação inserida pelas entidades emitentes nas notas informativas, nem podia substituir-se às entidades emitentes na elaboração, seleção e/ou atualização da informação contida nas Notas Informativas, sendo claro que essa responsabilidade é exclusiva das entidades emitentes (cfr. artigo 17.º, n.º 1 do Regime Jurídico do Papel Comercial, na redação então vigente);
O. Em suma: nos termos da lei especial ― o Regime Jurídico do Papel Comercial ―, não recaía sobre o HAITONG BANK qualquer dever de prestação de informação aos investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, não estando obrigado a verificar/controlar a qualidade da informação inserida nas Notas Informativas pelas entidades emitentes. É esta a regra que resulta do Regime Jurídico do Papel Comercial;
P. E sendo aqui aplicável o Regime Jurídico do Papel Comercial, enquanto norma especial, é por demais evidente que o regime geral constante do CdVM é absolutamente irrelevante para o efeito que nos ocupa. E mesmo que assim não fosse ― o que só por extrema cautela se equaciona e a título meramente subsidiário ―, o certo é que nem o regime geral do CdVM impõe ao HAITONG BANK quaisquer deveres e/ou responsabilidades pela informação prestada aos investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A. Senão vejamos, ainda que subsidiariamente:
(iii) O HAITONG BANK não estava sujeito aos deveres de informação que recaem sobre os intermediários financeiros.
Q. O facto de o HAITONG BANK estar registado junto da CMVM como intermediário financeiro, encontrando-se autorizado a exercer a atividade de intermediação financeira, não significa que, em concreto, e no âmbito de uma relação jurídica concreta, tenha exercido essa mesma atividade;
R. O HAITONG BANK não procedeu à colocação de papel comercial, não prestou quaisquer serviços de registo de titularidade de papel comercial, de custódia ou de liquidação financeira, junto de investidores ― tais serviços foram prestados, isso sim, por outras instituições financeiras (nomeadamente e para o que ora importa, o B...) (cfr. Factos Provados n.ºs 283 a 291, 301, 304 a 311, 318 e 320);
S. As funções desempenhadas pelo HAITONG BANK enquanto “instituição registadora” não se confundem com os serviços de registo e depósito de instrumentos financeiros a que alude o artigo 291.º, alínea a) do CdVM, ao contrário do que parece ter entendido o Tribunal a quo (cfr. linhas 20526 a 20530 da Sentença recorrida);
T. De facto, enquanto “instituição registadora”, ao HAITONG BANK apenas cabia proceder ao registo de cada emissão137 de papel comercial, nos termos e para efeitos do artigo 8.º do Regime Jurídico do Papel Comercial, o qual não se confunde com o registo da titularidade do papel comercial, o qual esse sim, seria mantido em contas de registo individualizado pelo B..., através da prestação do serviço de registo e depósito de valores mobiliários junto dos eventuais subscritores (nos termos do artigo 68.º do CdVM) (cfr. Facto Provado n.º 318 da Sentença) ― era, pois, o B... quem procedia ao registo e depósito de instrumentos financeiros a que alude o artigo 291.º, alínea a) do CdVM, e não o HAITONG BANK;
U. As designações de “líder e agente” ou de “Instituição Registadora e de Agente Pagador” não são funções tipificadas ou, dito de outro modo, não são conceitos legais suscetíveis de ser subsumidos a uma qualquer atividade de intermediação financeira;
V. Com efeito, olhando para o elenco dos serviços e atividades de intermediação financeira previstos no artigo 289.º, n.º 1 do CdVM e melhor concretizados nos artigos seguintes do mesmo Código, facilmente se constata que ser “líder” ou “agente pagador” não consubstancia, por si, um serviço ou atividade de intermediação financeira, havendo, portanto, que olhar para as funções efetivamente desempenhadas pelo HAITONG BANK no âmbito das operações de papel comercial em apreço e aferir se as mesmas se enquadram
ou não nalguma das previsões de tais normas;
W. In casu, as funções desempenhadas pelo HAITONG BANK no âmbito dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, tal como apuradas nos autos, foram, tão só, as constantes dos Factos Provados n.ºs 307 e 313, 315 a 318 e 296 da Sentença recorrida, as quais não são suscetíveis de ser subsumidas a qualquer dos serviços ou atividades de intermediação financeira previstos nos artigos 298.º e seguintes do CdVM;
X. O HAITONG BANK não atuou, pois, nas operações de emissão de papel comercial dos autos na qualidade de intermediário financeiro ― esta questão já se encontra discutida e decidida à saciedade, inclusive, pelos tribunais cíveis em diversas ações judiciais na qual é parte o HAITONG BANK, tendo os Tribunais (incluindo os Tribunais Superiores) se pronunciado no sentido ora expresso;
Y. O HAITONG BANK não estava, pois, sujeito aos deveres de informação que os intermediários financeiros estão sujeitos perante os seus clientes ― em especial, o HAITONG BANK não estava sujeito aos deveres de informação constantes do artigo 312.º, n.º 1, alínea d) do CdVM, que o Tribunal a quo refere como sendo a norma que espoleta a aplicação do artigo 7.º do mesmo Código (cfr. linhas 19815 a 19819) ― mal tendo andado o Tribunal a quo, portanto, ao decidir em sentido contrário. Tal registo de emissão continha única e exclusivamente a informação constante do artigo 44.º do CVM (ou seja, a identificação do emitente, características do valor mobiliário, quantidade de valores mobiliários emitidos, montante e data dos pagamentos, etc).
Z. Mesmo que o HAITONG BANK tivesse atuado nessa qualidade de intermediário financeiro (e é manifesto que não atuou!), o certo é que não há qualquer norma no CdVM que estabeleça deveres e/ou responsabilidades relativos ao controlo da qualidade da informação constante das notas informativas de papel comercial;
AA. Mais ― subsidiariamente ―, para além de não existir uma norma no CdVM a estabelecer tal dever ou responsabilidade, o HAITONG BANK nem tinha uma relação jurídica (comercial, contratual ou qualquer outra) com os investidores. E como é evidente, um dever de informação sempre implicaria a existência de uma relação de clientela entre o intermediário financeiro e o cliente, que, no que diz respeito ao HAITONG BANK, pura e simplesmente não existiu;
BB. O que reforça a conclusão de que o CdVM não impõe sobre o HAITONG BANK quaisquer deveres e/ou responsabilidades relativos ao controlo da qualidade da informação constante das notas informativas de papel comercial.
CC. Mais ainda, não se pode deixar de reiterar, por fim, que mesmo que o HAITONG BANK houvesse atuado como intermediário financeiro nas operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A (e não atuou) e houvesse uma qualquer norma do CdVM a estabelecer deveres e responsabilidade relativos ao controlo da qualidade da informação prestada aos investidores (e não há), o certo é que, ainda assim, tal regime geral (que como se disse não existe), jamais seria aplicável, por existir uma lei especial ― o Regime Jurídico do Papel Comercial ― que sobre ele prevaleceria, nos termos que já se deixaram expostos.
B) DA IMPUTAÇÃO A TÍTULO OBJETIVO E SUBJETIVO ATRAVÉS DO CONCEITO EXTENSIVO DE AUTORIA
DD. O dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, por referência ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e ao papel comercial emitido pela R..., S.A, não recaía sobre o HAITONG BANK, tendo o Tribunal a quo entendido que o HAITONG BANK, então BEl..., é responsável pela prática das contraordenações por que vem condenado por via da participação que assumiu nas Notas Informativas relativas ao papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A – ou seja, pelo contributo alegadamente causal que o mesmo deu à prática das infrações em apreço, ao abrigo do artigo 401.º, n.º 2, do CdVM e dos artigos 419.º, n.º 1 do CdVM e 16.º do RGCO.
EE. O artigo 401.º consagra um modelo amplo de imputação do facto contraordenacional ao ente coletivo, mas é um modelo de heterorresponsabilidade (a pessoa coletiva responde por atos realizados por terceiros, pessoas físicas, que a ela se ligam), sendo a jurisprudência vasta e a doutrina portuguesa unívoca neste sentido (exemplificativamente, MARIA MASCARENHAS, Jurista, Departamento de Assuntos Jurídicos e Contencioso da CMVM, AUGUSTO SILVA DIAS, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE e SUSANA AIRES DE SOUSA).
FF. Daqui decorre, desde logo, que é nas pessoas físicas cujas funções se convocam para sustentar a imputação objetiva dos factos que têm de se verificar os elementos subjetivos que sustentam o dolo da pessoa coletiva.
GG. De forma ilegal, a Sentença considerou, de forma isolada, a prática do facto e a sua representação, imputando objetivamente a prática dos factos aos trabalhadores e retirando o dolo de outras pessoas físicas distintas, sem que entre elas houvesse qualquer orientação ou comunicação, considerando que
(i) a Direção de Mercado de Capitais praticou os factos de onde, objetivamente, se retira o contributo causal fundamento da responsabilidade do HAITONG BANK (linhas
21362 a 21364 e Factos Provados n.ºs 449 a 473), – embora reconheça, e bem, que esta não tinha conhecimento de que a informação disponibilizada pelas sociedades emitentes e constante das Notas Informativas, estruturadas pelo HAITONG BANK, não era verdadeira, completa, atual e lícita (no caso da EI..., S.A) e não era completa, atual e lícita (no caso da R..., S.A) (cfr. linhas 21435 e ss.)
(ii) três dos Administradores do BEl... (AA, BB e DD) tinham o conhecimento de onde, subjetivamente, se retira o dolo fundamento da responsabilidade do HAITONG BANK (linhas 21320 a 21361 e Factos Provados n.ºs 66 a 68) – embora reconheça, e bem, que estes não agiram nem praticaram qualquer ato no âmbito dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A – no exercício das suas funções enquanto administradores não executivos do HAITONG BANK ou em nome e por conta do HAITONG BANK (linhas 21372 e ss.).
HH. A Sentença recorrida faz uma cisão (ilegal) entre a imputação objetiva e a imputação subjetiva das infrações ao HAITONG BANK, por forma a ultrapassar um verdadeiro obstáculo à possibilidade de sancionar o HAITONG BANK pela prática das infrações em apreço, quando a conclusão que se impõe é diversa: tendo em conta que nenhum dos intervenientes do HAITONG BANK nos programas de papel comercial tinha, à data dos factos, conhecimento de que a informação constante das Notas Informativas não era verdadeira, completa, atual, ou lícita, não se verificam os pressupostos previstos no n.º 1 do artigo 402.º do CdVM, de que depende a imputação dos ilícitos aqui em causa à pessoa coletiva.
II. Note-se que a própria base da decisão da CMVM procedia à imputação ao HAITONG BANK com base em dois factos: (a) em sede de imputação objetiva (Pontos 137 e 334, a fls. 1019 e 1064 da decisão da CMVM): “(…) a decisão de celebração dos Contratos de Organização e Colocação do Papel Comercial (…) foi decidida pelos órgãos de administração do Haitong (administradores AA, BB e DD) e executada por titulares de cargos de direção do HAITONG e demais funcionários”; (b) em sede de imputação subjetiva (Ponto 145, a fls. 1021): “O HAITONG, através da sua Direção de Mercado de Capitais (da qual parte da equipa trabalhava na sede do B..., juntamente com a equipa do DFME, e deste recebia instruções) elaborou as notas informativas do papel comercial”. Sucede que nenhum destes factos foi dado como provado na Sentença recorrida (tendo sido, ao invés, dado como provada a matéria constante do Facto Provado n.º 645 e como não provada a matéria constante do Facto Nâo Provado n.º 1).
JJ. Assim, impõe-se concluir que o HAITONG BANK foi sancionado em termos puramente objetivos, o que é violador do princípio da culpa enquanto pressuposto e limite de qualquer sanção, mesmo a uma pessoa coletiva.
KK. Ademais, o artigo 401.º é, no plano da autoria, uma norma que alarga a responsabilidade à pessoa coletiva, pelo que afasta outras normas que se destinem a ampliar (de novo) o círculo de autoria, como a prevista nos artigos 419.º do CdVM e 16.º do RGCO, sob pena de um inadmissível alargamento (em cadeia) do conceito de autoria.
LL. O HAITONG BANK não agiu enquanto intermediário financeiro no âmbito das operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A: desempenhou tarefas meramente administrativas, de organização (sem qualquer correspondência com as atividades de intermediação financeira elencadas no artigo 289.º, n.º 1 do CdVM), não tendo tido qualquer contacto com investidores e não tendo elaborado, nem tendo assumido quaisquer responsabilidades relacionadas ou decorrentes da informação constante das Notas Informativas, não tendo igualmente o HAITONG BANK prestado, portanto, informação a investidores, nem comunicou ou divulgou informação (como a Decisão recorrida reconhece) – pelo que a sua conduta não se encontra objetivamente abrangida pela norma em apreço.
MM. O artigo 7.º do CdVM (caso seja norma fundamentadora, o que não se concede) tem como destinatários: (i) em primeira linha, as sociedades emitentes do papel comercial (EI..., S.A e R..., S.A) – que deveriam prestar informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita; e, (ii) em segunda linha, eventualmente, os intermediários financeiros do papel comercial (B..., Bbt..., SA e Baç..., SA) – que tinham uma relação jurídica com os investidores, ao abrigo da qual poderia ser invocado um dever de prestação de informação com qualidade - não fora, reitere-se de novo, a circunstância de o Regime Jurídico do Papel Comercial afastar expressamente a existência desse dever.
NN. O artigo 17.º, n.º 1 do Regime Jurídico do Papel Comercial estatui de forma forma expressa que é da exclusiva responsabilidade da entidade emitente (EI..., S.A e R..., S.A) a preparação da nota informativa e o HAITONG BANK apenas estruturou as mesmas para serem completadas pelas sociedades emitentes (EI..., S.A e R..., S.A) com a informação relevante em falta ― a conduta do HAITONG BANK não é enquadrável no âmbito objetivo da norma: o HAITONG BANK não é destinatário direto da norma, não é intraneus, não é titular do dever violado, não tem o dever legal de controlar e verificar a informação que lhe fora disponibilizada pelas entidades emitentes, nem assumiu contratualmente esse dever ou qualquer outro dever semelhante.
OO. Sem prejuízo, a Sentença recorrida imputa a conduta relevante ao HAITONG BANK (também) por força do “conceito extensivo de autoria” que, nas palavras de AUGUSTO SILVA DIAS, é uma conceção “extremamente ampla, inadequada e inoperante, pois contributos causais todos dão, mesmo quem intervém numa fase muito recuada na cadeia causal, sendo impossível efetuar distinções com base nela” e contrário à previsão expressa do n.º 2 do artigo 389.º do CdVM, por referência à al. a) do seu n.º 1: “[i]nclui-se na alínea a) do número anterior a prestação de informação aos seus clientes por qualquer entidade que exerça atividades de intermediação”, pelo que a especificidade da norma “vincula o conceito de autoria à realização do específico conteúdo de ilícito vazado no tipo, tornando-o menos receptivo a considerações causais” – não tendo o HAITONG BANK o domínio do facto, deverá o mesmo ser absolvido das infrações que lhe vêm imputadas.
PP. Mesmo que assim se não considere, e se pugne pelo conceito extensivo de autoria de base causal adotado, ainda assim carece de fundamento a Sentença proferida, pois que a única forma de sancionar o HAITONG BANK pelas infrações em apreço é convocar o disposto nos artigos 419.º do CdVM e 16.º do RGCO e nele fundamentar a comunicabilidade do dever que recai sobre outrem, o que é inviabilizado pelo facto de ser necessário convocar o artigo 401.º do CdVM, que é uma extensão da responsabilidade às pessoas coletivas, sob pena de um inadmissível alargamento (em cadeia) do conceito de autoria.
QQ. Por outro lado, a extensão ou comunicabilidade do dever do comparticipante intraneus a um outro comparticipante extraneus, em matéria sancionatória, é interpretada com cautela pela doutrina e tem o seu âmbito de aplicação limitado a pessoas físicas – e não é diretamente imputavel as pessoas coletivas enquanto tal - e sempre da prova de que o comparticipante extraneus tinha o domínio do facto sob alguma das modalidades admitidas de autoria (autoria mediata, coautoria, instigação) – o que não se verifica.
RR. O HAITONG BANK – menos ainda as pessoas físicas que praticaram os atos objetivamente relevantes – nunca teve o domínio dos factos objeto dos autos (i) não tinha domínio sobre a prática das infrações em causa; (ii) não tinha na sua disponibilidade realizar ou não realizar a infração; (iii) não era o destinatário do dever em causa; (iv) não era autor nem titular da informação em causa, pelo que errou a Sentença recorrida ao invocar os artigos 419.º do CdVM e 16.º do RGCO para estender ao HAITONG BANK, enquanto pessoa coletiva, um dever alheio, que apenas sobre o B... recaía - seguindo o raciocínio do Tribunal a quo, o qual, contudo, não se acompanha (já que só por absurdo se pode considerar que tal deveria poderia efetivamente recair mesmo sobre o B..., na medida em que não é isso que resulta do Regime Jurídico do Papel Comercial, como já se explicou) –, razão pela qual se impõe a revogação da Sentença recorrida.
SS. Ademais, é inconstitucional a norma que se extrai dos artigos 7.º, 389.º, 401.º e 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, no sentido em que permite condenar como autor uma pessoa coletiva por extensão em cadela da responsabilidade, i.e., fazendo funcionar mais que um mecanismos de extensão de responsabilidade, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade, da proporcionalidade e da culpa, vertidos nos artigos 1.º, 18.º, n.º 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição, sendo ainda inconstitucional a norma que se extrai dos artigos 7.º, 389.º, 401.º, 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, no sentido em que permite condenar como autor, na aceção ampla do conceito extensivo de autoria, uma pessoa coletiva por comunicação de um dever de outra pessoa coletiva, e não por comunicação de um dever de uma determinada pessoa individual, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade, da proporcionalidade e da culpa vertidos nos artigos 1.º, 18.º, n.º 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição.
TT. Se da interpretação destes artigos resultar uma norma jurídica, em sentido amplo, que tem como estatuição normativa a aplicação de uma coima a uma pessoa coletiva, e que tem como elemento da previsão normativa não apenas os critérios de imputação da conduta das pessoas singulares à pessoa coletiva, mas também, e em simultâneo, os critérios de extensão ou comunicabilidade do dever do comparticipante intraneus a um outro comparticipante extraneus em conjugação, com o acolhimento de um conceito extensivo de autoria, então essa norma será inconstitucional por violação dos supra citados princípios e normas constitucionais; se, pelo contrário, se desconsiderar a existência desta norma ampla, considerando que o problema está apenas no artigo 16.º do RGCO – construção jurídica mais fácil de apreender, mas menos sofisticada, pois deste artigo não resulta uma estatuição normativa autónoma (uma coima), mas apenas um dos elementos da previsão normativa (um dos critérios de imputação) –, então a inconstitucionalidade residirá nesse artigo 16.º do RGCO, o que se requer que seja declarado.
UU. Pelo que, desde já, se suscitam as supra referida inconstitucionalidades, nos termos e para os efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição e do n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional, devendo V. Exas., nos termos do artigo 204.º da Constituição, desaplicar a norma que se extrai artigos 7.º, 389.º, 401.º, 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, em qualquer das interpretações avançadas, o que se requer.
C) DA IMPUTAÇÃO A TÍTULO SUBJETIVO ASSENTE NA TEORIA DO RISCO DA ORGANIZAÇÃO
(i) Do risco de organização, enquanto risco de inadequado tratamento interno da informação ― o Sistema de Controlo Interno e de Gestão de Risco
 VV. A “teoria do risco da organização” invocada pelo Tribunal a quo não tem consagração nem suporte na lei. O conhecimento da pessoa coletiva (in casu, do HAITONG BANK) deve ser aferido por referência ao regime do artigo 401.º do CdVM. No âmbito da responsabilidade contraordenacional em apreciação é esta (o artigo 401.º do CdVM) a base legal na qual deve ser aferido o conhecimento.
WW. De todo o modo, sempre se siga que, mesmo considerando a “teoria do risco da organização, o entendimento do Tribunal a quo se releva errado. Desde logo, porque a imputação de conhecimento por via da “teoria do risco da organização”, nos moldes que vêm propugnados na Sentença recorrida, tem como pressuposto a não adoção, pela pessoa coletiva, de sistemas adequados de tratamento de informação, como forma de mitigar o risco decorrente da fragmentação do conhecimento;
XX. Porém, e em primeiro lugar, nos presentes autos não foram apurados quaisquer factos que permitissem concluir que o HAITONG BANK não dispunha de uma organização interna e de procedimentos adequados a mitigar o risco decorrente da fragmentação de conhecimento ― ou seja, que permitisse concluir que foi por culpa da organização do HAITONG BANK que o conhecimento dos referidos administradores não lhe foi transmitido;
YY. Aliás, a Sentença recorrida é totalmente omissa quanto a tal matéria de facto. E sendo omissa quanto a tal matéria de facto, não poderia o Tribunal a quo ter retirado as ilações que retirou, ao nível do direito, quanto à dita imputação de conhecimento, incorrendo num manifesto vicio de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – cfr. artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO;
ZZ. Ao imputar o conhecimento dos administradores ao HAITONG BANK sem quaisquer factos apurados que permitissem concluir pela culpa do HAITONG BANK ― ou que este não havia cumprido o seu dever de organização ―, o Tribunal a quo operou uma imputação objetiva do conhecimento, que nem a própria teoria do risco da organização admite;
AAA. É que, além do mais, o HAITONG BANK dispunha efetivamente de um sistema de controlo interno e de gestão de risco eficiente e adequado ― implementado em plena conformidade com o Aviso do Banco de Portugal n.º 5/2008 ―, suscetível de assegurar o bom tratamento da informação e de acautelar os riscos decorrentes para o HAITONG BANK das operações em que intervinha (como é o caso, entre outros, das operações de papel comercial);
BBB. Os factos relativos ao sistema de controlo interno do HAITONG BANK poderiam, inclusive, ter sido alegados e demonstrados nos autos caso o Tribunal a quo tivesse dado direito ao contraditório ao HAITONG BANK sobre tal matéria, o que não fez. Dito de outra forma, o Tribunal a quo não deu ao HAITONG BANK a oportunidade de “(…) opor ao terceiro o cumprimento do dever de organização interna para afastar a imputação do conhecimento”(o que, como se verá infra, redunda numa inevitável nulidade da Sentença);
CCC. Em segundo lugar, o conhecimento da real situação económico e financeira das entidades emitentes do papel comercial não era um conhecimento juridicamente exigível no contexto.  Sistema de Controlo Interno esse que compreendia um conjunto de sistemas, processos, políticas e procedimentos definidos pelo seu órgão de administração, destinados a garantir (i) um desempenho eficiente e rentável da atividade, no médio e longo prazo; (ii) a existência de informação financeira e de gestão completa, pertinente, fiável e tempestiva, que suporte as tomadas de decisão e processos de controlo, tanto a nível interno como externo; e (iii) o respeito pelas disposições legais e regulamentares aplicáveis, bem como das normas e usos profissionais deontológicos, de modo a proteger a reputação da instituição e evitar que esta seja alvo de sanções. E Sistema de Controlo Interno esse que obedecia, de acordo com as melhores práticas, ao princípio das “Três Linhas de Defesa” (tomada de risco nas Unidades de Negócio, Controlo de Risco e Auditoria), o qual estabelece de forma clara a delegação de poderes e os canais de comunicação. FERREIRA GOMES e COSTA GONÇALVES, op. cit., pp. 100 e 101 dos serviços prestados pelo HAITONG BANK nas operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A ― tal significando, por conseguinte, que, tampouco era exigível ao HAITONG BANK que se organizasse internamente de forma a obter tal informação;
DDD. Note-se que no âmbito das operações de papel comercial em apreço o HAITONG BANK apenas desempenhou tarefas meramente administrativas, de back-office, não implicando tais operações qualquer risco de crédito para o HAITONG BANK (tendo as mesmas, inclusive, uma remuneração de € 3.500,00 e que, por isso, isoladamente não tinham relevância económica);
EEE. Não tendo assumido qualquer risco de crédito (sendo tais operações meramente rotineiras), sobre o HAITONG BANK não recaía qualquer obrigação de se organizar de molde a que a informação relativa a tais operações fosse veiculada dentro da organização.
FFF. Repare-se que os sistemas internos de circulação de informação apenas se devem cingir à informação relevante para a gestão do risco (risk management). Fazer circular informação irrelevante é criar ruído, diminuindo a eficácia do sistema de controlo interno.
GGG. Ou seja, os administradores e gestores do HAITONG BANK tinham o dever de não incluir a informação sobre a situação financeira dos emitentes de papel comercial no seu sistema de controlo interno, porque tal informação não era relevante para a gestão de risco (risk management) do Banco. Apenas poderiam e deveriam incluir a informação relevante para a gestão de risco (risk management) do Banco.
HHH. De novo, estes aspetos poderiam ter sido facilmente alegados e demonstrados nos autos caso o Tribunal a quo tivesse dado direito ao contraditório ao HAITONG BANK sobre esta matéria, o que não aconteceu e inquina, conforme melhor se verá infra, a Decisão proferida.
III. Em suma, estamos perante um conhecimento inexigível ao HAITONG BANK à luz da própria teoria do risco da organização, que não integra a esfera de risco que deve ser suportada pela sociedade, não lhe podendo, também por isso, ser imputado.
(ii) Da impossibilidade de imputação do conhecimento adquirido fora do exercício de funções no HAITONG BANK
 JJJ. Na Sentença recorrida, o Tribunal a quo procedeu à imputação ao HAITONG BANK do conhecimento adquirido pelos administradores AA, BB e DD no exercício de outras funções (que não as de administradores do então BEl...), e noutras sociedades – na EI..., S.A e na R..., S.A –, que não o HAITONG BANK;
KKK. Tal significa, portanto, que estamos perante um conhecimento (i) privado dos referidos administradores, na medida em que como supra se explicou, não era um conhecimento exigível ao HAITONG BANK, e (ii) fortuito, na medida em que foi adquirido no exercício de funções alheias àquelas que exerciam na HAITONG BANK.
LLL. Mesmo à luz da teoria do risco da organização, tal conhecimento não pode ser imputado ao HAITONG BANK, e em primeiro lugar, porque nenhum dos referidos administradores teve qualquer participação ou intervenção na matéria relacionada com os programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A enquanto administradores do HAITONG BANK e no exercício dessas funções, sendo que a nenhum desses administradores estavam acometidas, aliás, quaisquer funções ou pelouros relacionados com os programas de papel comercial da EI..., S.A ou da R..., S.A e/ou com as emissões de papel comercial realizadas ao abrigo dos mesmos (cfr., inter alia, os Factos Provados n.ºs 74 a 78, 224, 258 a contrario e 645 da Sentença);
MMM. Estamos, portanto, perante o conhecimento adquirido por administradores que não intervieram, nem tinham de intervir, nos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A no âmbito das suas funções do HAITONG BANK ― tal significando, por conseguinte, que o seu conhecimento não pode, sem mais, ser imputado à sociedade.
NNN. Nessas circunstâncias, e em segundo lugar, para que tal conhecimento ― conhecimento adquirido fora do exercício das funções, por quem não interveio nem tinha que intervir ―pudesse ser imputado ao HAITONG BANK era necessário que sobre os referidos administradores recaísse um dever de comunicação desse mesmo conhecimento, em virtude de tal informação ser necessária ao exercício das suas funções próprias no HAITONG BANK.;
OOO. Ora, in casu, o conhecimento dos três administradores quanto à real situação económico-financeira das emitentes não era relevante para as funções por si desempenhadas no âmbito do HAITONG BANK, como já se disse;
PPP. Por outro lado, também não sendo a informação quanto à real situação económico-financeira das emitentes exigível ao HAITONG BANK, face aos concretos serviços por este prestados no âmbito das operações de papel comercial em apreço, como supra se explanou, forçoso é concluir que sobre os referidos administradores não recaía qualquer dever de comunicação ao HAITONG BANK no que a tal informação diz respeito;
QQQ. Não se descura que sobre os administradores (não executivos) de uma sociedade recai um dever geral de vigilância. Tal dever de vigilância não pode, porém, ser levado a um extremo, ao ponto de exigir dos administradores a vigia de todos e quaisquer atos praticados no seio da sociedade.
RRR. E a esse propósito importa não perder de vista o caso concreto: as as operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A sub judice eram operações meramente rotineiras e de âmbito exclusivamente operacional e administrativo, nas quais o HAITONG BANK não assumia qualquer risco de crédito e pelas quais o valor da comissão cobrada se cingiu a apenas EUR 3.500,00 por emissão140, similares, portanto, a centenas de outras que o HAITONG BANK levava a cabo na sua atividade diária enquanto banco de investimento. A participação do HAITONG BANK em tais operações foi decidida e concretizada exclusivamente cfr. Cláusulas 19.ª dos Contratos de Organização juntos como Documentos n.ºs 4 e 7.no âmbito da atividade corrente da sua Direção de Mercado de Capitais (cfr. Factos Provados n.ºs 74 a 78, 224, 258 a contrario e 645 da Sentença), não tendo estas matérias dimensão suficiente para serem levadas à Comissão Executiva, onde tinham assento todos os administradores executivos, e muito menos ao Conselho de Administração;
SSS. Não é, pois, exigível a administradores não executivos, sem qualquer pelouro relacionado com tais matérias, que vigiem centenas de operações rotineiras, das quais não resulta risco para o banco. As questões de lana caprina aqui em apreço nem sequer eram objeto do dever de vigilância dos administradores executivos sobre os patamares inferiores da empresa. Muito menos eram objeto do dever de “vigilância geral” dos administradores não executivos (artigo 407.º, n.º 8, do Código das Sociedades Comerciais)
TTT. Entender que tais administradores não executivos tinham um qualquer dever de vigilância neste tipo de operações seria, na realidade, consagrar uma verdadeira responsabilidade objetiva, não permitida por lei;
UUU. Como se vê, sobre os administradores AA, BB e DD não recaía, portanto, qualquer dever de comunicação ao HAITONG BANK no que respeita à informação acerca da real situação económico-financeira da EI..., S.A e da R..., S.A, não podendo o seu conhecimento quanto a tal matéria, por conseguinte, ser imputado à sociedade;
VVV. Em terceiro lugar, também não resultou apurado nos autos qualquer ato comunicativo por meio do qual os referidos administradores tivessem transmitido ao HAITONG BANK a informação quanto à real situação económico-financeira da EI..., S.A e da R..., S.A de que tinham conhecimento;
WWW. Em quarto lugar, não se pode descurar que no presente caso, tais administradores sempre estariam legalmente impedidos de transmitir tal informação ao HAITONG BANK, em virtude do dever de reserva e sigilo que sempre se encontrariam adstritos perante a EI..., S.A, a R..., S.A ou até mesmo o B... (cfr. artigo 64.º do CSC);
XXX. Desde logo, enquanto administradores executivos do B..., tinham o dever de não revelar ao HAITONG BANK a informação de que tivessem conhecimento relativamente ao B... à qual não tivesse sido dada publicidade e que fosse suscetível de influenciar o valor das ações por este emitidos, como seria o caso da informação em causa (cfr. artigo 449.º do CSC). E enquanto membros do órgão de administração da EI..., S.A, sociedade de direito ..., também se lhes aplica igualmente o dever de confidencialidade previsto no artigo 66.º Lei das sociedades comerciais (Loi du 10 août 1915 concernant les sociétés commerciales). Tais administradores, note-se, estariam provavelmente sujeitos a punição criminal por abuso de informação privilegiada, caso transmitissem a informação em causa ao HAITONG BANK;
YYY. Os administradores deviam, portanto, reserva e sigilo quanto aos factos por si conhecidos no exercício das suas funções noutras sociedades. E nessa medida, tal conhecimento ―porque objeto de um dever de reserva e sigilo ― não é, nem pode ser, imputado à sociedade, verificando-se aquilo a que a teoria do risco de organização apelida de “bloqueio de imputação”;
ZZZ. Para que tal conhecimento objeto de dever de reserva pudesse ser imputado era necessário que houvesse um efetivo ato comunicativo, o qual, como acima já se disse, não se verificou;
AAAA. Em quinto lugar, o facto de, no presente caso, o conhecimento dos administradores AA, BB e DD ter sido adquirido no seio de sociedades relacionadas, à data dos factos, com o HAITONG BANK, também não pode servir de pretexto para imputar tal conhecimento a este último;
BBBB. Ao imputar-se o conhecimento a uma determinada sociedade, está-se também a imputar-lhe o risco decorrente desse mesmo conhecimento. E nessa medida, não pode deixar de valer aqui o princípio da separação de patrimónios e de atribuição da personalidade jurídica às sociedades.
CCCC. Ou seja, independentemente de nos encontrarmos perante sociedades relacionadas, o princípio da separação de patrimónios e de atribuição da personalidade jurídica às sociedades continua a vigorar: tal relação não anula a individualidade das sociedades, as quais continuam a ser centros de imputação jurídica distintos e com esferas patrimoniais autónomas;
DDDD. Não se desconhece que em certos casos de domínio total se tem entendido que o conhecimento da sociedade filha pode ser imputado à sociedade mãe, na medida em que esta última dispõe do poder de dar instruções vinculantes à sociedade-filha e, além do mais, existe, por força da própria lei, uma certa diluição da autonomia das respetivas esferas patrimoniais (cfr. artigos 501.º e 503.º CSC). Tal imputação, porém, nunca poderia funcionar no sentido inverso, ou seja, no sentido de imputar o conhecimento da sociedade-mãe à sociedade-filha, na medida em que as razões que justificam a imputação de conhecimento da sociedade-filha à sociedade-mãe não procedem no sentido descendente;
EEEE. Por outro lado, imputar à sociedade-filha o conhecimento da sociedade-mãe significaria criar um risco adicional na esfera da sociedade-filha, em consequente prejuízo dos credores sociais (e, caso haja, dos sócios minoritários);
FFFF. Sem a segregação de esferas de risco de informação estar-se-ia, necessariamente, a expor ao risco do conhecimento um universo de sujeitos ― in casu, os credores da sociedade filha ― que beneficiam da segregação e da autonomia patrimonial da sociedade envolvida. Tais sujeitos ficariam, dessa forma, sujeitos a um risco (de conhecimento) não desejado pelo ordenamento jurídico;
GGGG. A necessidade de tutela dos credores da sociedade-filha face aos riscos decorrentes da esfera de conhecimento da sociedade-mãe é ainda mais premente no presente caso, por estar em causa uma instituição de crédito, em que o interesse prevalente não é o dos sócios, mas sim o dos credores e, sobretudo, o de uma classe particular de credores: os depositantes ― cfr., inter alia, os artigos 139.º, n.º 1 e 145.º-A do RGICSF;
HHHH. Assim, e porque a imputação ao HAITONG BANK do conhecimento proveniente das esferas jurídicas da EI..., S.A, da R..., S.A e/ou do B... resultaria num risco (para o HAITONG BANK) não desejado pelo ordenamento jurídico, há que fazer valer aqui uma segregação das esferas de risco de informação, não podendo tal conhecimento ser-lhe imputado;
IIII. Mais ainda, aqui o conhecimento é originado na EI..., S.A e na R..., S.A, que não estavam numa relação de domínio total com o HAITONG BANK (na altura, BEl...), o que reforça sobremaneira a incorreção da imputação do conhecimento ao HAITONG BANK.
JJJJ. Assim, face aos critérios legais e doutrinários em vigor, é insustentável a imputação ao HAITONG BANK do conhecimento dos administradores AA, BB e DD.
D) DA VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DE DEFESA E CONTRADITÓRIO
KKKK. A Decisão recorrida procedeu a uma cisão entre a norma de imputação objetiva e subjetiva da infração e sancionou o HAITONG BANK pela violação do chamado “risco de organização”, assente nomeadamente nos seguintes pressupostos: o dever de manter um sistema de controlo interno (pág. 842 da Sentença) e a responsabilidade pela nomeação dos seus Administradores (pág. 843 da Sentença). Nenhum destes fatores foram considerados pela CMVM na decisão que se impugnou perante o Tribunal a quo – e, por conseguinte, os mesmos nunca foram tidos em consideração pelo HAITONG BANK na estruturação da sua defesa.
LLLL. Da Decisão da CMVM (págs. 661 e seguintes), no que à alegada atuação consciente e voluntária do HAITONG BANK diz respeito, resulta que (i) a imputação objetiva ao HAITONG se deve à decisão de participação nos contratos de papel comercial ter sido tomada por AA, BB e DD, e (ii) a imputação subjetiva ao HAITONG dos factos objeto dos presentes autos se reconduz o conhecimento e vontade do HAITONG BANK assentam no conhecimento, por AA, BB e DD, administradores do HAITONG BANK, da real situação financeira da EI..., S.A e da R..., S.A, bem como (iii) a uma receção de instruções da equipa do HAITONG por parte do DFME do B... – primeiro e último factos estes que, aliás, não foram dados como provados na Decisão sub judice (reitere-se)
MMMM. Já nos pontos 15268 e seguintes da Sentença recorrida, por referência aos factos dados como provados n.ºs 478 e 479, o Tribunal a quo considerou que o conhecimento da pessoa coletiva assenta no critério “risco da organização”, operando uma cisão entre os elementos objetivos e subjetivos da infração e fazendo recair os mesmos sobre pessoas diversas no seio da pessoa coletiva. Aduz ainda que os Administradores tinham um dever de transmitir informação e que o HAITONG BANK é responsabilizável por ser lhe exigível a implementação de um sistema de controlo interno (que tinha) e por correr por sua conta um “defeito” na seleção dos seus administradores, assente num dever de diligência na seleção dos mesmos.
NNNN. O Tribunal a quo faz assentar, assim, o conhecimento do HAITONG BANK em factos sobre os quais o Recorrente não teve oportunidade de se pronunciar, pois que, não constando da Decisão da CMVM, se apresentam como totalmente novos.
OOOO. Caso tivesse tido a oportunidade de exercer o seu direito de defesa, o HAITONG BANK teria alegado e provado que possuía um adequado sistema de controlo interno, desde logo porque: (a) dispunha de um sistema de controlo interno e de gestão de risco eficiente e adequado, implementado em plena conformidade com o Aviso do Banco de Portugal n.º 5/2008, suscetível de assegurar o bom tratamento da informação e de acautelar os riscos decorrentes para o HAITONG BANK das operações em que intervinha; (b) o Sistema de Controlo Interno do HAITONG BANK compreendia um conjunto de sistemas, processos, políticas e procedimentos definidos pelo seu órgão de administração, destinados a garantir (i) um desempenho eficiente e rentável da atividade, no médio e longo prazo; (ii) a existência de informação financeira e de gestão completa, pertinente, fiável e tempestiva, que suporte as tomadas de decisão e processos de controlo, tanto a nível interno como externo; e (iii) o respeito pelas disposições legais e regulamentares aplicáveis, bem como das normas e usos profissionais deontológicos, de modo a proteger a reputação da instituição e evitar que esta seja alvo de sanções; e (c) Sistema de Controlo Interno do HAITONG BANK obedecia, de acordo com as melhores práticas, ao princípio das “Três Linhas de Defesa” (tomada de risco nas Unidades de Negócio, Controlo de Risco e Auditoria), o qual estabelece de forma clara a delegação de poderes e os canais de comunicação.
PPPP. Sobre o argumento da culpa in eligendo, o HAITONG BANK teria alegado e provado que os mencionados três administradores eram, à data da sua designação, pessoas com um perfil, uma capacidade técnica e uma reputação inquestionáveis, e como tal eram reconhecidos pelo Banco de Portugal e por diversas outras entidades, nomeadamente argumentando que:
(a) os três mencionados administradores foram devidamente aprovados no âmbito do procedimento fit and proper do Banco de Portugal e do Banco Central Europeu; (b) AA era o banqueiro português com maior reputação internacional; (c) em 1992, AA foi nomeado ... do ano pela Associação Portuguesa de ...; (d) em 2005, AA foi condecorado com a “...” da República ...; (e) AA tinha dezenas de anos de experiência como administrador de instituições de crédito, muitos deles como CEO; e (f) DD tinha muitos anos de experiência como administrador de instituições de crédito, muitos deles como CFO.
QQQQ. Também no que à imputação objetiva das infrações em apreço diz respeito foi o HAITONG BANK surpreendido com uma linha de argumentação totalmente inovadora e sobre a qual em momento algum teve possibilidade de se pronunciar, e que se afastou da imputação efetuada na Decisão da CMVM (ponto 137 da página 1019), nos termos da qual a decisão de celebração dos Contratos de Organização e Colocação do Papel Comercial a elaboração das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A teria sido tomada pelos órgãos de administração do HAITONG.
RRRR. Perante esta imputação, sustentou o Recorrente, em sede de impugnação judicial, que AA, BB e DD não tiveram qualquer participação nem intervenção nos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A ―no exercício das suas funções enquanto administradores não executivos do HAITONG BANK ou em nome e por conta deste – tendo a participação do HAITONG BANK sido decidida e concretizada pela sua Direção de Mercado de Capitais, no âmbito da respetiva atividade corrente e posteriormente reportada ao CCR, não tendo sido aprovada nem dada a conhecer ao Conselho de Administração, nem sequer à Comissão Executiva.
SSSS. A Sentença recorrida abandona os fundamentos em que a CMVM fez assentar a imputação das infrações em apreço e avança com uma nova linha de argumentação (linhas 21370 e seguintes), nos termos da qual concede que os administradores do HAITONG BANK não tiveram intervenção alguma na prática dos factos objeto dos presentes factos, passando a sustentar a imputação objetiva dos mesmos ao Recorrente na elaboração das notas informativas pela DMC, pese embora sustentando a imputação subjetiva dos mesmos no conhecimento, pelos referidos administradores, da real situação financeira da EI..., S.A e da R..., S.A, numa alegada deficiência de organização do HAITONG BANK, e no risco que este deve suportar inerente a um pretenso dever de diligência na seleção dos seus administradores.
TTTT. O Tribunal a quo faz, assim, assentar a imputação quer objetiva, quer subjetiva, das infrações ao Recorrente em fundamentos totalmente distintos dos constantes da Decisão da CMVM, em torno dos quais o Recorrente estruturou a sua defesa, trazendo à colação uma linha de argumentação sobre a qual o HAITONG não teve, em momento algum, possibilidade de se pronunciar, numa manifesta violação dos seus direitos de defesa, assim como do princípio do contraditório, da proibição da indefesa e do processo justo e equitativo, plasmados nos artigos 32.º, n.º 10 e 20.º, n.º 4 da Constituição e no artigo 6.º da CEDH, razão pela qual deve a Sentença recorrida ser revogada.
UUUU. A Sentença recorrida é afetada pelos vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto, já que não foram articulados factos suficientes para permitir retirar as ilações que sustentam os pressupostos em que assenta a condenação do HAITONG BANK e não foram articulados factos suficientes para permitir imputar a infração ao HAITONG BANK – a título objetivo e subjetivo -, nos termos dos artigos 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, mas também nula, por não prever factualidade manifestamente relevante para imputação da infração ao HAITONG BANK, nos termos da leitura conjugada dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º n.º 1, alínea a) do CPP.
VVVV. A prática dos factos e os estados de espírito relevantes têm de ser imputados a pessoas físicas individualizadas e concretas que, ao abrigo das normas aplicáveis (mormente artigo 401.º, n.º 2 do CdVM), possam considerar-se como vinculantes da pessoa colectiva para efeitos de imputação da responsabilidade contraordenacional – o que não é feito na Sentença recorrida, que imputa objetivamente os factos ao HAITONG BANK porque praticados pela sua “Direcção de Mercado de Capitais”, que “elaborou as Notas Informativas do papel comercial”, e conclui que o HAITONG BANK “agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos”, porque “conhecia”, “sabia” e “quis” (factos provados 471 a 479).
WWWW. Do mesmo vício padecia a Decisão da autoridade administrativa impugnada perante o Tribunal a quo: também nos factos nada se refere quanto às concretas pessoas que vincularam o HAITONG BANK a título objetivo e subjetivo; refere-se apenas que as Notas Informativas foram elaboradas pela Direção de Mercado de Capitais e que o HAITONG “conhecia”, “sabia” e “quis” (factos provados n.ºs 517 a 533 - páginas 323 a 329 da Decisão administrativa) – a CMVM não procedeu a um verdadeiro juízo de imputação subjetiva nem indagou sobre os pressupostos necessários à responsabilidade contraordenacional do HAITONG BANK, o que sempre implica que a Decisão administrativa seja declarada nula, ao abrigo do disposto nos artigos 58.º do RGCO e 283.º, 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP, ex vi artigo 41.º do RGCO, o que se requer.
XXXX. Sendo nula a Decisão administrativa, é nula também a Decisão proferida pelo Tribunal a quo, porque não aditou aos factos provados a factualidade necessária para que as contraordenações em apreço pudessem ser imputadas ao HAITONG BANK – tal só poderia suceder por recurso ao disposto nos artigos 358.º e 359.º do CPP, o que se não verificou in casu – e, bem assim, porque essa factualidade foi incluída, de forma travestida, na parte da fundamentação da Sentença (em detalhe, capítulo II. D) supra), pelo que se impõe a sua revogação, ao abrigo do disposto nos artigos 410.º, n.º 2, alínea a), 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP, aplicáveis ex vi artigo 41.º do RGCO, o que se requer.
III. DA PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL
YYYY. O ora Recorrente vem condenado pela prática de contraordenações que se consideram consumadas em 11.12.2013 e 24.02.2014 – porém, os factos relevantes para a imputação das contraordenações em apreço tiveram lugar em 15.10.2013 e 16.01.2014, datas das últimas Notas Informativas do papel comercial cuja elaboração é imputada ao HAITONG BANK, respetivamente, da EI..., S.A e da R..., S.A, ou, no limite, nos dias 09.09.2013 e 09.01.2014, data da prestação da informação, pelo B..., aos seus clientes.
ZZZZ. De acordo com o artigo 3.º, n.º 1 do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, está a ter-se em consideração o quadro legislativo em vigor à data dos factos – CdVM, na versão da Lei n.º 28/2009, de 19 de junho; RGCO, na versão da Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro; e CPP, na versão da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro –, pelo que quaisquer redações posteriores dos referidos diplomas legais não devem considerar-se aplicáveis, a não ser que concretamente mais favoráveis ao HAITONG BANK (cfr. n.º 2 do artigo 3.º do RGCO), sob pena de aplicação retroativa da lei em termos desconformes aos artigos 2.º e 29.º, n.º 1 e 4 da Constituição.
AAAAA. Os pressupostos em que a Sentença recorrida faz assentar a contagem do prazo prescricional das infrações em apreço – (i) os prazos de prescrição estiveram suspensos por força das medidas excecionais adotadas em decorrência da pandemia, operando-se uma suspensão por 86 dias + 74 dias; e (ii) os prazos de prescrição estiveram suspensos, nos termos do artigo 27.º-A, n.º 2 do RGCO, por um período de 6 meses – não podem ter-se como bons.
BBBBB. Ainda que se aceitasse o primeiro pressuposto como bom – o que não se concede – a verdade é que a Sentença recorrida incorreu num erro de cálculo quanto ao segundo pressuposto, por referência ao período pelo qual se encontraram suspensos os prazos de prescrição por imposição do artigo 27.º-A do RGCO – considerou o prazo legal máximo (n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO) e não o período em que a causa de suspensão efetivamente se verificou.
CCCCC. A suspensão prevista na alínea c) do número 1 do artigo 27.º-A do RGCO determina que a prescrição do procedimento por contraordenação se suspende durante o tempo em que este estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso – in casu, de 19.10.2021 a 15.02.2022, pelo que o processo esteve pendente não pelo período de 6 meses considerado na Sentença (linhas 617 a 619), mas por 3 meses e 27 dias.
DDDDD. Assim, e admitindo, em tese, as datas de consumação consideradas pela Sentença recorrida, a contraordenação relacionada com a EI..., S.A prescreveu em 15.03.2022, razão pela qual deverá a mesma ser declarada prescrita, o que se requer.
EEEEE. Para além do referido erro de cálculo, a contagem dos prazos prescricionais efetuada pelo Tribunal a quo assenta noutro pressuposto errado: as normas relativas à suspensão de prazos constantes da Lei n.º 1-A/2020 diz respeito não poderão considerar-se aplicáveis aos factos objeto dos presentes autos, por força do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, do RGCO, 2.º, n.º 4, do CP, e 5.º, n.º 2, al. a) do CPP, que consagram o princípio da aplicação da lei mais favorável, bem como por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1 e 4, da CRP, que consagra o princípio da não aplicação retroativa da lei penal, aplicável ao domínio contraordenacional, enquanto ramo de direito de natureza sancionatória.
FFFFF. Em face do exposto, são materialmente inconstitucionais as normas que se extraem do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, na redação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 e Março, dos artigos 6.º-B, n.ºs 3 e 4 da Lei n.º 1-A/2020 aditados pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, do artigo 6.º, n.º 2 da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, dos artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, bem como do artigo 4.º da Lei n.º 4-B/2021, tal como aplicadas pelo Tribunal a quo, segundo as quais a suspensão dos prazos neles prevista é também aplicável ao prazo substantivo de prescrição do procedimento contraordenacional em processos pendentes, cujo prazo de prescrição havia sido definido pela lei vigente à data da prática dos factos e se encontrava em curso, por violação dos artigos 2.º e 29.º, n.º 1 e 4 da CRP, pelo que deve a aplicação dessas normas ser recusada pelo Tribunal, tendo em conta o disposto no artigo 204.º da CRP, sendo a presente inconstitucionalidade suscitada nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional.
GGGGG. Assim, devendo ser recusada a aplicação das normas acima identificadas relativas à suspensão de prazos constantes da Lei n.º 1-A/2020 e tendo por referência as datas de 15.10.2013 e 16.01.2014 (datas das últimas Notas Informativas do papel comercial cuja elaboração é imputada ao HAITONG BANK) verifica-se que o procedimento contraordenacional relativo à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da:
a. EI..., S.A prescreveu em 16.04.2021;
b. R..., S.A prescreveu em 17.07.2021.
HHHHH. Ou, considerando a data da prestação da informação, pelo B..., aos seus clientes, o procedimento contraordenacional relativo à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da:
a. EI..., S.A prescreveu em 11.03.2021;
b. R..., S.A prescreveu em 10.07.2021.
IIIII. Ou, no limite, nos termos da Sentença recorrida – ou seja, considerando a consumação como tendo ocorrido em 11.12.2013 e 24.02.2014 –, respetivamente, em 11.06.2021 e 24.08.2021.
JJJJJ. Não se aplicando, em qualquer dos casos, a suspensão prevista no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c) do RGCO, pois que, no momento em que se verificou o facto determinante da referida suspensão (isto é, o despacho de admissão do recurso de impugnação judicial), já o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional quanto às referidas infrações se havia esgotado, pelo que, por tudo o exposto, se requer a V. Exas. se dignem declarar extinto o procedimento contraordenacional, por decurso do prazo de prescrição.
KKKKK. Por fim, e a propósito da menção feita pelo Tribunal a quo na nota de rodapé n.º 3, constante da página 27 da Sentença recorrida, quanto à ressalva da aplicabilidade da norma constante do n.º 2 do artigo 418.º do CdVM, sempre importa dizer que esta norma não constava da redação do CdVM em vigor à data da prática dos factos, pelo que convocar a sua aplicação por referência aos factos objeto dos presentes autos, datados de 2013 e 2014, sempre redundaria na aplicação retroativa de uma norma prejudicial ao Recorrente, em termos desconformes aos artigos 2.º e 29.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição.
LLLLL. A norma constante do n.º 2 do artigo 418.º do CdVM é inconstitucional, na interpretação efetuada pelo Tribunal a quo e constante da referida nota de rodapé, no sentido de que a suspensão do prazo de prescrição dela constante é aplicável a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, por violação dos artigos 2.º e 29.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição, inconstitucionalidade que, desde já, se suscita, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional, devendo o Tribunal recusar a sua aplicação, nos termos do disposto no artigo 204.º e preferir uma interpretação da norma constante do n.º 2 do artigo 418.º segundo a qual a mesma só se aplica a factos ocorridos após a sua entrada em vigor.
IV. DA EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE DO HAITONG BANK, POR FORÇA DA MEDIDA DE RESOLUÇÃO DE 3 DE AGOSTO DE 2014 DO BANCO DE PORTUGAL
a) Da admissibilidade de transmissão da responsabilidade contraordenacional
MMMMM. No seu Recurso de Impugnação Judicial, o HAITONG BANK invocou, enquanto fundamento da sua defesa, que da deliberação de 3 de agosto de 2014 do Banco de Portugal, posteriormente clarificada e ajustada através de deliberação de 11 de agosto de 2014 (doravante, “Medida de Resolução”), resulta a exclusão de quaisquer responsabilidades do HAITONG BANK decorrentes da violação de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais, razão pela qual o HAITONG BANK não poderia ser condenado pela prática das infrações que lhe vêm imputadas nos autos.
NNNNN. O Tribunal a quo, porém, julgou a argumentação do HAITONG BANK totalmente improcedente, partindo, para o efeito, do pressuposto de que a responsabilidade contraordenacional não é passível de ser transmitida, dado o princípio da não transmissibilidade da responsabilidade criminal consagrado nos artigos 127.º e 128.º do Código Penal, ex vi artigo 32.º do RGCO (cfr. linhas 938-943 da Sentença).
OOOOO. Sucede, porém, que o entendimento do Tribunal a quo viola as normas injuntivas constantes do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (“RGICSF”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, na versão em vigor à data da Medida de Resolução, oriundo da transposição do texto da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014 (“Diretiva 2014/59/EU”), que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento, bem como as normas injuntivas constantes dos artigos 112.º, alínea a), e 120.º do Código das Sociedades Comerciais (“CSC”), resultante da transposição do texto da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017 relativa a determinados aspetos do direito das sociedades (“Diretiva (UE) 2017/1132”),
PPPPP. Com efeito, é absolutamente pacífico que as operações de reorganização societária, como as fusões, as cisões e as medidas de resolução bancária, podem ter, e têm, repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional.
QQQQQ. Nesse sentido aponta, inequivocamente, no que diz respeito às fusões, o exposto nos artigos 112.º, alínea a), do CSC (norma legal injuntiva) e 105.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132, donde resulta claramente que a fusão determina a transmissão de todos os direitos e responsabilidades para a sociedade incorporante, sem que tal esteja impedido por qualquer princípio de intransmissibilidade da responsabilidade contraordenacional ― o qual está pensado para as pessoas físicas e não para as sociedades comerciais.
RRRRR. É precisamente o que também resulta do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 5/2004, de 2 de junho de 2004, no qual se fixou a seguinte jurisprudência: “[a] extinção, por fusão, de uma sociedade comercial, com os efeitos do artigo 112.º, alíneas a) e b), do Código das Sociedades Comerciais, não extingue o procedimento por contra-ordenação praticada anteriormente à fusão, nem a coima que lhe tenha sido aplicada”.
SSSSS. O mesmo se diga em relação às operações de cisão, que também importam a transmissão de responsabilidades, incluindo as contraordenacionais, à sociedade incorporante ou à nova sociedade, sem prejuízo de se estabelecer uma responsabilidade solidária da sociedade cindida, nos termos do exposto nos artigos 122.º, n.º 1, do CSC (norma legal injuntiva). E 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132.
TTTTT. Como é também indiscutível, uma medida de resolução bancária, na modalidade de banco de transição, consiste precisamente numa cisão sujeita a um regime especial injuntivo, que segrega totalmente os direitos e responsabilidades não tóxicos, que são transmitidos para o banco de transição (nova sociedade), dos direitos e responsabilidades tóxicos que permanecem no banco resolvido (sociedade cindida) conforme resulta inequívoco do artigo 145.º-G do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução, resultante do Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto (artigo 145.º-O, na versão atual) ― inexistindo, por isso, qualquer razão ou fundamento legal para negarmos no presente caso a transmissibilidade da responsabilidade contraordenacional que resulta da própria natureza e regime da cisão.
UUUUU. Não tem qualquer cabimento a afirmação do Tribunal a quo segundo a qual “o Banco de Portugal não tem o condão de, por mero acto administrativo, operar à extinção da responsabilidade contra-ordenacional de pessoas físicas ou jurídicas”, porquanto tais poderes resultam expressamente da lei, nomeadamente do artigos 145.º-G do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução (atual artigo 145.º-O), que proceda à transposição dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU.
VVVVV. Esta modalidade de resolução bancária (banco de transição) tem necessariamente repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional, que, enquanto responsabilidade tóxica, permanece no banco resolvido (sociedade cindida), não sendo transmitida para o banco de transição (nova sociedade) ― tudo ao abrigo, reitere-se, de normas legais injuntivas, que visam proteger a estabilidade do sistema financeiro (conforme artigo 145.º-A do RGICSF na versão em vigor à data e artigo 145.º-C na versão atual).
WWWWW. No caso da Medida de Resolução do B..., o Banco de Portugal cindiu o estabelecimento comercial consolidado do B..., segregando os ativos e passivos tóxicos dos ativos e passivos não tóxicos. De tal modo que os ativos e passivos não tóxicos ficaram colocados no perímetro consolidado de um banco de transição – o Nv.... Ao passo que os ativos e passivos tóxicos, onde se incluem expressamente as responsabilidades no domínio contraordenacional, permaneceram no perímetro consolidado do B....
XXXXX. Daqui se retira que a responsabilidade contraordenacional imputada ao HAITONG BANK nos presentes autos integra forçosamente o conjunto de responsabilidades expressamente excluídas da transmissão para o perímetro consolidado do banco de transição (Nv...). Pelo que o então BEl... (atualmente, HAITONG BANK), enquanto ativo não tóxico transmitido para o Nv..., foi transmitido livre das responsabilidades contraordenacionais.
YYYYY. Assim, contrariamente ao que o Tribunal recorrido entendeu, a Medida de Resolução teve, efetivamente, repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional do HAITONG BANK, porquanto determinou a exclusão da mesma do conjunto de ativos e passivos que transitaram para o perímetro consolidado do Nv... ― devendo o HAITONG BANK, por conseguinte, ser absolvido da contraordenação que lhe é imputada nos autos, por força da exclusão de responsabilidades constante da Medida de Resolução de 3 de agosto de 2014 do Banco de Portugal, mal tendo andado o Tribunal recorrido em decidir em sentido contrário.
ZZZZZ. A interpretação que o Tribunal a quo faz dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal, ex vi artigo 32.º do RGCO, no sentido de a responsabilidade contraordenacional não poder ser transmitida, é ilegal porque violadora dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1 alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 e dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU e, consequentemente, violadora do primado do Direito Europeu, devendo o Tribunal desaplicar a norma que se extrai da interpretação dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), no sentido de impossibilitar a transmissão de responsabilidades contraordenacionais no âmbito de uma fusão, cisão ou medida de resolução.
AAAAAA. Pelo exposto, suscita-se, para todos os efeitos legais, e nomeadamente para os efeitos dos artigos 8.º, n.º 4 e 204.º da CRP, a ilegalidade, com fundamento na violação dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1 alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 e dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU, da norma que se extrai da interpretação dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), se interpretada no sentido de impossibilitar a transmissão de responsabilidades contraordenacionais no âmbito de uma fusão, cisão ou medida de resolução.
BBBBBB. Consequentemente, ao abrigo do disposto nos artigos 8.º, n.º 4 e 204.º da CRP, solicita-se que o Tribunal desaplique a norma que se extrai da interpretação dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), se interpretada no sentido de impossibilitar a transmissão de responsabilidades contraordenacionais no âmbito de uma fusão, cisão ou medida de resolução.
CCCCCC. Admite-se, em abstrato, que o tribunal possa ter dúvidas na interpretação do direito da União, e mais concretamente quanto às implicações dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1 alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 e dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU na matéria que nos ocupa.
DDDDDD. Dado que tais dúvidas constituiriam uma questão prejudicial, requer-se muito respeitosamente ao Venerando Tribunal ad quem que proceda ao reenvio prejudicial para o TJUE ― o qual, in casu, é obrigatório, encontrando-se preenchidos os respetivos pressupostos ―, das seguintes questões pertinentes de interpretação de direito da União Europeia, nos termos do 3.º parágrafo do artigo 267.º do TFUE:
i) Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma fusão ou de uma cisão, são compatíveis com os artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132
do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017?
ii) Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma medida de resolução, são compatíveis com os artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014?
b) Da interpretação da Medida de Resolução
EEEEEE. A Sentença recorrida viola, ainda, o regime da própria Medida de Resolução, nos termos da qual o Banco de Portugal determinou transmissão parcial dos ativos e passivos do B... para um banco de transição constituído para o efeito, o Nv..., ao abrigo do artigo 145.º-G, n.º 5 do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução, resultante do Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto.
FFFFFF. Ainda nos termos da Medida de Resolução, todos os ativos e passivos não expressamente listados seriam transferidos do B... para o Nv..., sendo excluídos dessa transmissão os ativos e passivos com as características expressamente previstas na lista constante do Anexo 2 da Medida de Resolução, sendo que, ao abrigo do disposto na citada alínea (a) desse anexo, o BEl... (atualmente HAITONG BANK) foi transferido para o banco de transição, integrando o conjunto de ativos e passivos não tóxicos (cfr. Anexo 2, alínea (a) e alínea (b), subalíneas (v) e (vii) da Medida de Resolução).
GGGGGG. Tendo as responsabilidades ora imputadas ao HAITONG BANK natureza contraordenacional, têm as mesmas cabimento no elenco de passivos excecionados da transmissão para o perímetro consolidado do banco de transição (cfr. Anexo 2, alínea (b), subalíneas (v) e (vii) da Medida de Resolução).
HHHHHH. Uma interpretação da Medida de Resolução segundo a qual a transmissão do atual HAITONG BANK para o Nv... incluísse as respetivas responsabilidades contraordenacionais seria contrária à letra e à teleologia da Medida de Resolução, na medida em que o objetivo da transmissão foi precisamente o de criar um banco novo, que passaria a deter os ativos e passivos não tóxicos que anteriormente eram detidos pelo B..., deixando no B... os ativos e passivos tóxicos, de modo a assegurar a continuidade deste banco de transição e a proteger o sistema bancário português de risco sistémico.
IIIIII. A interpretação que aqui se faz da Medida de Resolução é a única interpretação possível à luz das regras de interpretação contidas no artigo 9.º do Código Civil ― nomeadamente, dos elementos literal, histórico, sistemático e teleológico ― que, apesar de direcionadas para a interpretação da lei, assumem também relevância nesta sede;
JJJJJJ. Ademais, a interpretação da Medida de Resolução que ora se defende terá sido inicialmente perfilhada pela própria CMVM relativamente ao Bbt..., SA e ao Baç..., SA, uma vez que só uma interpretação da Medida de Resolução nos termos expostos poderá justificar ou explicar que tais entidades não tenham sido constituídas arguidas no presente processo contraordenacional, atendendo a que, quer o Bbt..., SA, quer o Baç..., SA intervieram nas operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A que aqui se discutem, tendo assumido a qualidade de entidades colocadoras, assumindo funções de intermediação financeira, e que quer o Bbt..., SA, quer o Baç..., SA tinham também administradores em comum com o B... e, ainda, que quer o Bbt..., SA, quer o Baç..., SA eram, à data da Medida de Resolução, entidades subsidiárias do B..., tal como o BEl... (HAITONG BANK).
c) Da inconstitucionalidade e da contrariedade ao Direito da União Europeia da
interpretação da Medida de resolução adotada pelo Tribunal a quo
KKKKKK. A interpretação da Medida de Resolução sufragada pelo Tribunal a quo revela-se, ainda, claramente desconforme com a CRP e com o Direito da União Europeia, conduzindo a um tratamento discriminatório dos investidores privados que adquiriram os ativos e passivos do BEl... (atualmente HAITONG BANK) face aos que adquiriram os demais ativos e passivos do Nv..., incluindo o Bbt..., SA e o Baç..., SA (agora Nba...).
LLLLLL. Desde logo, mostra-se desconforme com o princípio da igualdade, já que teria então como efeito que, não obstante o HAITONG BANK integrar o perímetro consolidado de ativos não tóxicos que transitaram para o banco de transição, o mesmo seria alienado à Haitong International Holdings Limited com as responsabilidades contraordenacionais e outras previstas nos pontos (v) e (vii) da alínea (b) do Anexo 2 da Medida de Resolução, ao passo que os restantes ativos não tóxicos detidos pelo Nv... foram alienados à L..., através da sua subsidiária N..., SGPS, S.A., livres destas responsabilidades ― tal interpretação trataria, portanto, de forma desigual situações objetivamente iguais, atribuindo uma desvantagem ilegítima ao investidor privado que adquiriu o HAITONG BANK, não consentida pela letra e pelo espírito da Medida de Resolução, e sem qualquer justificação que a sustente;
MMMMMM. Além do mais, tal interpretação é igualmente violadora do princípio da boa-fé, na sua vertente da tutela da confiança, porquanto consubstancia uma atuação injustificadamente imprevisível sobre quem, de boa-fé, procedeu à aquisição do HAITONG BANK, desconhecendo uma tão grave contingência subjacente a essa aquisição.
NNNNNN. A interpretação que foi perfilhada na Sentença recorrida consubstancia igualmente uma violação do direito fundamental de livre iniciativa económica consagrado no artigo 61.º, n.º 1, da CRP e, com a designação de liberdade de empresa, no artigo 16.º da CDFUE, na vertente de liberdade de investimento.
OOOOOO. In casu, a restrição àquele direito é ilegítima porquanto: i) não assenta em qualquer salvaguarda outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” (cfr. artigo 18.º, n.º 2, da CRP) ou “objetivos de interesse geral reconhecidos pela União” (cfr. artigo 52.º, n.º 1, da CDFUE); ii) não reveste caráter geral e abstrato (artigo 18.º, n.º 3, da CRP); nem se encontra definida textualmente em termos suficientemente pormenorizados de modo a tornar antecipável e previsível a aplicação da medida restritiva (cfr. artigos 18.º, n.º 2 e 61.º, n.º 1, da CRP).
PPPPPP. Assim, suscita-se, para todos os efeitos legais, e nomeadamente para os efeitos dos artigos 280.º, n.º 1, alínea b) da Constituição e 72.º, n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade, com fundamento na violação dos artigos 13.º, 18.º, n.º 1 e 2, 61.º, n.º 1 e 101.º pelos motivos acima explicitados, da norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do RGICSF, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto, se interpretada no sentido de consentir uma medida de resolução que, determinando a transferência de ativos e passivos de uma instituição de crédito para outra, com a exclusão de passivos resultantes de contingências de tipo contraordenacional, possa ser interpretada no sentido de essa exclusão apenas se aplicar à instituição de crédito de transição e não às instituições de crédito que esta última possa deter na sua totalidade.
QQQQQQ. Consequentemente, ao abrigo do disposto nos artigos 204.º da Constituição, solicita-se que o Tribunal desaplique a norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do RGICSF, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto, se interpretada no sentido de consentir uma medida de resolução que, determinando a transferência de ativos e passivos de uma instituição de crédito para outra, com a exclusão de passivos resultantes de contingências de tipo contraordenacional, possa ser interpretada no sentido de essa exclusão apenas se aplicar à instituição de crédito de transição e não às instituições de crédito que esta última possa deter na sua totalidade.
RRRRRR. Por outro lado, em nome dos princípios da interpretação conforme e do primado, qualquer tribunal nacional deverá rejeitar uma interpretação de uma disposição nacional que se revele incompatível com o direito da União, desaplicando-a se não houver interpretação compatível que dela se possa retirar,
SSSSSS. Assim, face à aplicabilidade do artigo 16.º da CDFUE no presente caso e ao efeito direto de princípios gerais de direito como o princípio da segurança jurídica, suscita-se, para todos os efeitos legais, e nomeadamente para os efeitos dos artigos 8.º, n.º 4 e 204.º da CRP, a ilegalidade, com fundamento no artigo 16.º da CDFUE, da norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do RGICSF, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto, se interpretada no sentido de consentir uma medida de resolução em que, determinando a transferência de ativos e passivos de uma instituição de crédito para outra, com a exclusão de passivos resultantes de contingências de tipo contraordenacional, essa exclusão apenas se aplique à instituição de crédito de transição e não às instituições de crédito que esta última possa deter na sua totalidade.
TTTTTT. Consequentemente, ao abrigo do disposto nos artigos 8.º, n.º 4 e 204.º da CRP, solicita-se que o Tribunal desaplique a norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do RGICSF, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto, se interpretada no sentido de consentir uma medida de resolução em que, determinando a transferência de ativos e passivos de uma instituição de crédito para outra, com a exclusão de passivos resultantes de contingências de tipo contraordenacional, essa exclusão apenas se aplique à instituição de crédito de transição e não às instituições de crédito que esta última possa deter na sua totalidade.
UUUUUU. Uma vez mais, admite-se que, em abstrato, o tribunal possa ter dúvidas na interpretação do direito da União, mais concretamente sobre se a compatibilidade da interpretação que ora se impugna com o artigo 16.º da CDFUE, razão pela qual se impõe que, também aqui, ao abrigo do 3.º parágrafo do artigo 267.º do TFUE que o Tribunal ad quem proceda ao reenvio prejudicial para o TJUE ― o qual no presente caso, como já se disse, é obrigatório ―, das seguintes questões:
i. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, transfira para o banco de transição uma subsidiária do banco resolvido e não transfira para o banco de transição determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira do banco resolvido, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira da subsidiária permaneçam na esfera da subsidiária, em vez de ficarem no perímetro consolidado do banco resolvido?
ii. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, não transfira para o banco de transição e para algumas subsidiárias determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira de outras subsidiária permaneçam na esfera dessas subsidiárias?
VVVVVV. Por todo o exposto, conclui-se que a Medida de Resolução determina a exclusão de responsabilidade contraordenacional do conjunto de ativos e passivos que transitaram para o perímetro consolidado do Nv..., incluindo o HAITONG BANK, pelo que a interpretação dos artigos 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017 e artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto feita pelo Tribunal de 1.ª Instância está em clara contradição com o Direito da União Europeia.
E) Síntese quanto ao pedido de reenvio prejudicial obrigatório
WWWWWW. Como supra se explicou em maior detalhe e para onde, por uma questão de economia processual se remete, admite-se, em abstrato, que o tribunal possa ter dúvidas na interpretação do Direito da União, e mais concretamente quanto às implicações dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (EU) 2017/1132, dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU ou do artigo 16.º da CDFUE e do princípio da segurança jurídica, dúvidas essas que, também como supra se explicou, constituem questões prejudiciais,
XXXXXX. Assim, encontrando-se preenchidos os pressupostos previstos no 3.º parágrafo do artigo 267.º do TFUE, o Venerando Tribunal ad quem encontra-se obrigado a proceder ao respetivo reenvio prejudicial.
YYYYYY. Nestes termos, e para esse mesmo efeito o Recorrente HAITONG BANK permite-se sugerir as seguintes questões prejudiciais a dirigir ao Tribunal de Justiça da União Europeia, nos termos e para os efeitos do mencionado preceito:
i. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO),na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma fusão ou de uma cisão, são compatíveis com os artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132
do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017?
ii. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma medida de resolução, são compatíveis com os artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014?
iii. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, transfira para o banco de transição uma subsidiária do banco resolvido e não transfira para o banco de transição determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira do banco resolvido, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira da subsidiária permaneçam na esfera da subsidiária, em vez de ficarem no perímetro consolidado do banco resolvido?
iv. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, não transfira para o banco de transição e para algumas subsidiárias determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira de outra subsidiária permaneçam na esfera dessa subsidiária?
V. OUTROS FUNDAMENTOS DE RECURSO
ZZZZZZ. Em sede do presente processo contraordenacional, o Recorrente interpôs autonomamente os seguintes recursos:
a. Recurso de impugnação judicial interposto a 12.08.2021 do Despacho proferido pela CMVM datado de 30.07.2021;
b. Recurso interposto a 04.11.2021 da Decisão proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão em 19.10.2021;
c. Recurso interposto a 25.02.2022 da Decisão proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão em 15.02.2022; e
d. Recurso interposto a 07.03.2022 do Despacho proferido pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão em 22.02.2022.
AAAAAAA. Nenhum dos recursos foi objeto de decisão final, transitada em julgado, mas o Tribunal a quo tem vindo a proferir decisões de não admissão de recurso por se considerar que as questões devem ser suscitadas no recurso da decisão final, pelo que se recorre expressamente das seguintes decisões interlocutórias, com os seguintes fundamentos:
DA PRORROGAÇÃO DO PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE RECURSO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL (RECURSO DA DECISÃO PROFERIDA PELA CMVM A 30.07.2021)
BBBBBBB. O presente recurso vem interposto do Despacho proferido pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (“CMVM”) que indeferiu o requerimento apresentado pelo ora Recorrente, nos termos do qual foi requerida a prorrogação do prazo previsto no artigo 59.º, n.º 3 do RGCO para apresentação de recurso de impugnação judicial da decisão condenatória proferida pela CMVM nos presentes autos.
CCCCCCC. No Despacho recorrido, a CMVM defende, entre o mais, que «(…) encontrando-se o prazo de impugnação judicial fixado na lei, a CMVM não pode prorrogar o prazo nos termos requeridos pelo Arguido Haitong, sob pena de desrespeitar o princípio da legalidade processual consagrado no artigo 43.º, n.º 1, do RGCO (e bem assim o princípio da competência que constrange a CMVM, na qualidade de pessoa coletiva de direito público, em todas as vertentes da sua atuação), na medida em que tal prorrogação não encontra assento legal.»,
DDDDDDD. O ora Arguido considera que o Despacho recorrido carece de fundamento, atendendo, entre o mais, à complexidade dos presentes autos.
EEEEEEE. O presente processo de contraordenação prende-se com as operações de emissão e de comercialização do papel comercial da EI..., S.A. (“EI..., S.A”) e da R..., S.A. (“R..., S.A”) junto de clientes do B..., no período compreendido entre setembro de 2013 e fevereiro de 2014, tendo sido instaurado contra 11 arguidos distintos, 8 dos quais foram condenados administrativamente pela prática de contraordenações muito graves:
− Violação das regras sobre conflito de interesses quanto ao papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, nomeadamente, das normas constantes dos artigos 309.º, n.ºs 1 a 3 do CVM;
− Violação de deveres relativos à qualidade da informação prestada aos clientes que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, nomeadamente, da norma
constante do artigo 7.º do CVM.
FFFFFFF. Foram aplicadas coimas num montante total de EUR 5.750.000,00 (acrescidas, quanto a alguns dos arguidos, de sanções acessórias).
GGGGGGG. Em sede de Decisão Final, a CMVM condenou o Recorrente pela (alegada) prática de duas contraordenações muito graves, consubstanciadas (i) na violação, a título doloso, do dever.Sendo admitido o presente recurso quanto a estas questões, o Recorrente desistirá, naturalmente, dos recursos interlocutórios interpostos a este propósito.de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do Papel Comercial da EI..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram papel comercial desta entidade entre setembro e dezembro de 2013 e (ii) na violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, quanto à informação divulgada nas Notas Informativas do Papel Comercial da R..., S.A aos clientes que subscreveram papel comercial desta entidade entre 9 de janeiro e 24 de fevereiro de 2014, aplicando-lhe uma coima única no valor de EUR 300.000,00,
HHHHHHH. Por, na qualidade de líder e agente dos programas de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, ter elaborado as respetivas Notas Informativas sem que delas fizesse constar informação completa, atual e verdadeira quanto à situação financeira da EI..., S.A nos exercícios de 2010, 2011, 2012 e nos primeiros nove meses de 2013 (dívida titulada, passivo, capital próprio), bem como quanto à informação respeitante à situação financeira da R..., S.A decorrente dos impactos da aquisição, por esta entidade, de uma participação de 49,26% na E..., S.A.
IIIIIII. A Decisão Condenatória estende-se por 1197 páginas – ascendendo os factos provados e não provados nela elencados a cerca de 700 -, sendo o culminar da fase administrativa de um processo de contraordenação que conta já com mais de 20.700 páginas e cujo inquérito se prolongou por mais de 4 anos e no qual foram ouvidas cerca de 50 testemunhas e vários Arguidos.
JJJJJJJ. A própria CMVM necessitou (compreensivelmente) de cerca de um ano para, após o término da produção da prova, analisar de forma estruturada e cabal os elementos recolhidos, concatenar factos e a prova produzida e, por fim, proferir a Decisão condenatória.
KKKKKKK. O prazo geral de 20 dias úteis previsto no RGCO para a impugnação judicial de decisões administrativas em sede de procedimento contraordenacional – concebido tendo como pressuposto a simplicidade e diminuto impacto das sanções aplicadas neste tipo de processos, pressupostos que, claramente, não se verificam in casu – é completamente desadequado e desajustado à complexidade do presente processo e à severidade das sanções nele aplicadas e inviabiliza o cabal exercício dos direitos de defesa dos Arguidos - violando de forma grave e flagrante os princípios constitucionais do processo justo e equitativo e os direitos de defesa e de audiência do arguido em processo contraordenacional e, dessa forma, o próprio direito de acesso aos Tribunais e à Justiça, plasmados nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa.
LLLLLLL. Para que pudesse exercer cabalmente o seu direito de defesa, por meio de recurso de impugnação judicial da Decisão proferida, o Recorrente teria que analisar cuidadosamente a Decisão condenatória, concatenando-a com toda a prova testemunhal e documental produzida e, bem assim, analisar diversas questões de direito distintas, para que possa exercer o seu Direito à Defesa, com a agravante de que grande parte dos factos que a CMVM imputa ao Recorrente não eram do seu conhecimento, nem foram por si praticados.
MMMMMMM. O que é tanto mais relevante quanto se tenha em conta que (i) no presente processo contraordenacional foram ouvidas cerca de 50 testemunhas e prestaram depoimento vários arguidos, cujas declarações e depoimentos terão de ser detalhadamente analisados e avaliados para efeitos do recurso de impugnação judicial que se pretende apresentar, assim como que (ii) os documentos constantes do processo ― cuja análise e avaliação se impõem igualmente para o mesmo efeito ― ascendem a milhares.
NNNNNNN. De facto, impõe-se concluir que o prazo consagrado no artigo 59.º n.º 3 do RGCO se mostra manifestamente desadequado num processo com esta complexidade e caraterísticas – o que é revelado pelo facto de este prazo ser substancialmente inferior ao prazo de 30 dias (úteis) que foi concedido pela CMVM, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 414.º-A do CdVM, para apresentação de defesa escrita.
OOOOOOO. Os processos de contraordenação têm vindo a assumir uma crescente complexidade e robustez, refletidas até na crescente severidade das coimas e sanções acessórias aplicadas, bem como na vasta área de intervenção, o que tem potenciado a crescente necessidade de se instituírem garantias robustas de salvaguarda da posição dos arguidos pois que o RGCO - datado de 1982, tendo sido alterado, pela última vez, em 2001 – não foi aprovado neste contexto e, enquanto diploma de aplicação subsidiária, não oferece, como é o caso, uma resposta adequada aos problemas atuais dos processos contraordenacionais.
PPPPPPP. Atendendo à natureza e complexidade dos presentes autos e bem assim à gravidade das condutas nele descritas e à severidade das sanções aplicadas, o prazo para apresentação de recurso de impugnação judicial da decisão condenatória proferida no final da fase administrativa dos autos não poderia ter sido inferior a 60 dias úteis,
QQQQQQQ. Um prazo inferior a 60 dias úteis implicaria um encurtamento inadmissível – porque desproporcionado, excessivo e desadequado (em violação do artigo 18.º, n.º 2, CRP) – das possibilidades de defesa dos arguidos, violaria o direito ao processo equitativo previsto no artigo 6.º da CEDH e equivaleria a um justo impedimento para praticar o ato em questão,
RRRRRRR. Sendo que os princípios da legalidade e da tipicidade terão também eles de ser articulados e sopesados face aos demais princípios e direitos aplicáveis, como sejam os princípios e os direitos fundamentais de acesso aos Tribunais e à Justiça e a um processo justo e equitativo (em especial, na sua vertente do direito à defesa efetiva do arguido) – sendo aqueles preponderantes face a qualquer pretensão de segurança jurídica subjacente à aplicação estrita do prazo de 20 dias legalmente previsto.
SSSSSSS. Nos termos do artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa, os Tribunais (e, de igual modo, as entidades administrativas no âmbito de processos contraordenacionais) têm o dever de não aplicar normas inconstitucionais, devendo igualmente preferir interpretações normativas em conformidade com a Constituição em detrimento de interpretações normativas violadoras da Constituição,
TTTTTTT. Sendo inconstitucional, por desconforme aos artigos 32.º, n.º 10, 20.º n.º 1 e 4 e 18.º, n.º 2 da Constituição a norma constante do artigo 59.º n.º 3 do RGCO, quando interpretada no sentido em que, em processos contraordenacionais de elevada complexidade, como o que ora nos ocupa, não é violadora dos direitos de defesa do arguido, assim como com o seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva, a previsão de um prazo de 20 dias úteis para apresentação de recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa -inconstitucionalidade que, desde já, se suscita, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional
UUUUUUU. Caso assim se não entenda, sempre se deveria ter considerado que, no limite e ao contrário do que entendeu a CMVM no Despacho sob recurso, a prorrogação de prazo requerida sempre deveria ter sido concedida ao Arguido Recorrente por via do disposto no artigo 107.º, n.º 6 do CPP, aplicável subsidiariamente ex vi artigos 407.º do CdVM e 41.º, n.º 1 do RGCO, verificando-se uma evidente lacuna no RGCO que importa colmatar,
VVVVVVV. À aplicação subsidiária do artigo 107.º, n.º 6 do CPP, não obsta a diferença de regimes legais entre os recursos ou os ramos do direito contraordenacional e penal: infrações qualificadas internamente como administrativas ou disciplinares e mesmo coimas aplicadas quando o montante em causa é de tal modo elevado que assume natureza penal foram já reconhecidas pelo Tribunal Europeu como merecedoras da proteção do artigo 6.º da CEDH, sendo que o legislador teve em conta a diferença de regimes, ao consagrar, de forma expressa, que a aplicação subsidiária se faz com a devida adaptação dos preceitos a aplicar (artigo 41.º do RGCO),
WWWWWWW. Cabendo essa competência à CMVM em razão da natureza do prazo ou, em caso de a mesma se considerar incompetente, às instâncias judiciais a quem o peticionado deveria, nesta circunstância, ter sido remetido conforme requerido pelo Recorrente.
XXXXXXX. O artigo 107.º, n.º 6 do CPP admite a prorrogação dos prazos para apresentar contestação (cível e penal), requerimento de abertura de instrução e recurso – ou seja, prazos manifestamente essenciais para exercício de direitos de defesa e acesso aos tribunais, pelo que também a ratio legis do preceito imporia a sua aplicação ao caso presente.
YYYYYYY. E tendo em conta que, como se deixou exposto, o presente processo reveste-se de especial complexidade, seja pela dimensão dos elementos que o compõem, seja pela complexidade e tecnicidade das matérias técnicas e jurídicas que envolve - o que se refere também por referência ao disposto no artigo 215.º, n.º 3 do CPP, cujos critérios são transponíveis para o processo contraordenacional, e, em particular, para o caso em apreço.
ZZZZZZZ. Por outro lado, o conteúdo do princípio do processo equitativo tem vindo a ser densificado através de princípios como o direito à igualdade de armas e posições no processo e o direito a prazos razoáveis de ação ou recurso – sendo que a disparidade de prazos atribuído à entidade administrativa para proceder à preparação da acusação e prolação da decisão final – veja-se, 4 anos (!) - e ao Recorrente para apresentação de defesa e de recurso – note-se, 20 dias (!) - ofendem, manifestamente, o princípio da igualdade de armas.
AAAAAAAA. O prazo que o RGCO prevê para o efeito é manifestamente insuficiente para que esses direitos sejam exercidos, nos presentes autos, de forma condigna e no (mínimo) da igualdade de armas.
BBBBBBBB. É, por isso, inconstitucional, por desconforme aos artigos 32.º, n.º 10, 20.º, n.ºs 1 e 4 e 18.º, n.º 2 da Constituição, a norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 41.º, n.º 1 do RGCO, 107.º, n.º 6 do CPP e 59.º, n.º 3 do RGCO, segundo a qual é insuscetível de prorrogação o prazo para apresentação de recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, previsto no artigo 59.º n.º 3 do RGCO, mesmo quando o processo contraordenacional se revista de excecional complexidade - inconstitucionalidade que, desde já, se suscita, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional.
CCCCCCCC. Não restando dúvidas da aplicabilidade subsidiária do artigo 107.º, n.º 6 do CPP, a verdade é que o prazo máximo de 30 dias ali previsto para efeitos de prorrogação se revela manifestamente insuficiente para fazer face à complexidade dos presentes autos, redundando numa compressão inadmissível – porque desproporcionada, excessiva e desadequada (em violação do artigo 18.º, n.º 2, CRP) – das possibilidades de defesa dos arguidos, saindo violados os seus direitos de defesa e de garantia de um processo justo e equitativo,
DDDDDDDD. Pelo que impõe-se ao julgador que, pautando-se pelos referidos princípios constitucionais, interprete a norma do artigo 107.º, n.º 6 do CPP de forma conforme aos princípios constitucionais do processo justo e equitativo e aos direitos de defesa do arguido em processo contraordenacional, plasmados nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa, concedendo, desse modo, ao Arguido uma prorrogação de 60 dias úteis do prazo para apresentação de recurso de impugnação judicial, razão pela qual se requer a revogação do Despacho recorrido e a substituição do mesmo por outra Decisão que assim o determine.
EEEEEEEE. É inconstitucional, por desconforme aos artigos 32.º, n.º 10, 20.º, n.ºs 1 e 4 e 18.º, n.º 2 da Constituição, a norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 41.º, n.º 1 do RGCO, 107.º, n.º 6 do CPP e 59.º, n.º 3 do RGCO, segundo a qual é insuscetível de prorrogação superior a 30 dias o prazo para apresentação de recurso impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, previsto no artigo 59.º n.º 3 do RGCO, mesmo quando o processo contraordenacional se revista de excecional complexidade.
FFFFFFFF. Caso assim se não entenda, deverá considerar-se manifestamente imprescindível ao cabal exercício dos direitos de defesa do Arguido que a prorrogação requerida tivesse sido concedida no prazo previsto para o efeito no artigo 107.º, n.º 6 – isto é, por 30 dias.
GGGGGGGG. Em face de tudo o exposto, requer-se que seja a Decisão proferida pela CMVM revogada e substituída por outra que, em conformidade com a CRP, conceda um prazo de prorrogação que permita ao Recorrente exercer os seus direitos de defesa em termos razoáveis, conforme por si devidamente requerido perante a CMVM e por esta indeferido na Decisão de que ora se recorre,
HHHHHHHH. E bem assim requer-se igualmente a V. Exas. sejam revogados todos os actos subsequentes e, consequentemente, a Sentença recorrida, por ser a mesma proferida no âmbito de um processo inquinado por violação do direito à defesa, ao contraditório e ao processo justo e equitativo, nos termos dos artigos 32.º, n.ºs 1 e 10, 20.º, n.º 1, 3 e 4 e 18.º, n.º 2 da CRP.
DA PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL – (RECURSO DO DESPACHO PROFERIDO PELO TCRS A 19.10.2021)
IIIIIIII. O presente Recurso vem interposto da Decisão de fls. …, datada de 19.10.2021, proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (Ref.ª Citius ...), que indeferiu a inquirição de duas das testemunhas arroladas pelo HAITONG BANK em sede de recurso de impugnação judicial da decisão final administrativa proferida pela CMVM.
JJJJJJJJ. Após ser proferida decisão final administrativa pela CMVM, interpôs o Recorrente recurso de impugnação judicial, tendo, nessa sede, arrolado quatro testemunhas: II; JJ; KK; e LL.
KKKKKKKK. Esclareceu o Recorrente, logo em sede de recurso de impugnação judicial, que os depoimentos das duas testemunhas inquiridas na fase administrativa do processo (KK e LL) versariam sobre factos novos, com os quais as testemunhas não haviam sido concretamente confrontadas na fase administrativa, e/ou manifestamente necessários à prova e contraprova a realizar – tendo especificado os factos concretos e demonstrado a essencialidade da sua inquirição em sede judicial.
LLLLLLLL. O Tribunal a quo indeferiu a inquirição requerida das sobreditas duas testemunhas, ao abrigo do disposto no artigo 72.º, n.º 2 do RGCO, o que é manifestamente violador dos seus direitos à defesa, ao recurso, ao contraditório, de acesso aos Tribunais e a um processo justo e equitativo, todos constitucionalmente consagrados nos artigos 20.º, n.ºs 1, 3 e 4 e 32.º, n.ºs 1 e 10, da Constituição da República (“CRP”) e nos artigos 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (“CEDH”),
MMMMMMMM. Com efeito, o artigo 72.º, n.º 2 tem de consubstanciar-se num poder-dever não discricionário cujo exercício será necessariamente limitado pelos Direitos de Defesa dos sujeitos processuais, e no quadro da sua competência para delimitar o âmbito da prova a produzir, porquanto o Juiz só deve indeferir a prova oferecida pelos sujeitos processuais quando esta se revelar ilegal, irrelevante ou supérflua, inadequada ou com uma finalidade dilatória (assim, também, artigo 340.º, n.º 4, do CPP), determinando a produção de toda a prova que vislumbre necessária para a descoberta da verdade material.
NNNNNNNN. Ao HAITONG BANK só lhe será possível exercer cabalmente os seus direitos de defesa, num contexto de real acesso à justiça, de tutela jurisdicional efetiva e de igualdade de armas, caso lhe seja dada a oportunidade de produzir prova útil, pertinente e necessária à descoberta da verdade material e boa decisão da causa,
OOOOOOOO. E do depoimento das testemunhas, ambos colaboradores do HAITONG BANK e com conhecimento real de muitos dos factos objeto do presente processo, sempre resultaria esclarecida, de forma clara e objetiva, a intervenção do HAITONG BANK nos programas de papel comercial da EI..., S.A e do R..., S.A, bem como os efeitos sobre o HAITONG BANK da Medida de Resolução do B..., permitindo, com certeza, desconstruir a Decisão condenatória sob impugnação. Ora,
PPPPPPPP. É manifestamente impossível, à luz da Decisão administrativa proferida e do Recurso de impugnação judicial interposto, considerar despiciendo, ilegal, irrelevante ou supérfluo inquirir as testemunhas arroladas pelo ora Recorrente, pelo que andou mal o Tribunal a quo ao indeferir a prova requerida pelo HAITONG BANK, com fundamento no facto de as matérias já haverem sido abordadas pelas próprias testemunhas na fase administrativa e na circunstância de outros meios de prova haverem sido produzidos.
QQQQQQQQ. O HAITONG BANK esclareceu, logo em sede de recurso de impugnação judicial, que os respetivos depoimentos versariam sobre factos novos, com os quais as testemunhas não haviam sido concretamente confrontadas na fase administrativa, e/ou indispensáveis à boa decisão da causa.
RRRRRRRR. No que respeita à testemunha KK, sublinhe-se que a decisão proferida pela CMVM se baseia numa interpretação errónea das declarações prestadas pela testemunha na fase administrativa, o que sempre imporia a sua inquirição na fase judicial do processo ― é o caso da a decisão da CMVM quanto à matéria constante do Facto Provado n.º 95, relativamente à qual a CMVM distorce completamente as palavras da mencionada testemunha durante a sua inquirição na fase administrativa, por forma a “poder” dar como provado que a equipa da Direção de Mercado de Capitais do HAITONG BANK “recebia instruções” da equipa de DFME do B... (e para daí conseguir extrapolar uma “influência” do B... sobre o HAITONG BANK e, em última linha, o conhecimento deste último quanto à real situação económico-financeira da EI..., S.A e da R..., S.A).
SSSSSSSS. O depoimento da testemunha é contrário ao de outras testemunhas ouvidas no processo e desconsideradas pela CMVM na Decisão proferida, estando claramente preenchido o conceito utilizado na Decisão sob recurso: o sentido do depoimento da testemunha (tal como estabelecido pela CMVM) gera dúvidas, pelo que a inquirição desta testemunha é essencial para o apuramento da verdade material (fim último e primacial de qualquer processo).
TTTTTTTT. Por outro lado, a testemunha foi ouvida na fase administrativa também em momento prévio à apresentação das Defesas escritas por parte dos Arguidos, estando o seu depoimento registado nos autos por escrito (fls. 3978-3993, 9325-9335), o que, por si só, é circunstância atendível para a inquirição que o HAITONG BANK quer seja realizada perante um Tribunal, sob pena de violação do princípio da presunção de inocência, do contraditório e das garantias de defesa do HAITONG BANK.
UUUUUUUU. Por outro lado, a testemunha KK é uma testemunha essencial para prova dos factos da Defesa e contraprova dos factos constantes da Decisão administrativa em crise, tendo sido indicada, precisamente, para prova dos factos constantes dos pontos 130.º, 136.º a 147.º, 149.º, 150.º, 153.º, 154.º, 160.º a 164.º, 174.º a 177.º, 181.º a 183.º, 186.º, 191.º, 193.º, 200.º e 203.º do recurso de impugnação judicial do Recorrente.
VVVVVVVV. O depoimento desta testemunha é, pois, da maior relevância na demonstração, entre o mais, do papel que o Recorrente desempenhou na operação de montagem e colocação do papel comercial, nomeadamente na demonstração de que o Recorrente não atuou enquanto intermediário financeiro e de que o seu papel se cingiu à estruturação de minutas-base das Notas Informativas, tarefa em que a testemunha KK teve intervenção direta;
WWWWWWWW. Assim como na demonstração de que nenhum dos demais Arguidos ― em especial, AA, BB e DD (cujo suposto conhecimento a CMVM pretende imputar ao Arguido) ― atuou em nome ou por conta do HAITONG BANK no âmbito dos programas de papel comercial em apreço ou em qualquer tomada de decisão relacionada com os mesmos,
XXXXXXXX. E, bem assim, na demonstração de que quem efetivamente interveio e tomou decisões em nome e por conta do Recorrente no âmbito de tais programas nenhum conhecimento tinha quanto à real situação económico-financeira da EI..., S.A e da R..., S.A.
YYYYYYYY. Por outro lado, os factos sobre os quais o HAITONG BANK pretendia que a mencionada testemunha seja inquirida não só são absolutamente essenciais à defesa que o HAITONG BANK pretende fazer valer nos autos, como encerram em si matéria nova que não foi abordada (ou, no limite, não foi abordada nos concretos termos em que vem que alegada pelo HAITONG BANK no seu recurso de impugnação) durante a inquirição da testemunha em sede administrativa.
ZZZZZZZZ. Tudo quanto se deixou exposto se aplica, mutatis mutandis, quanto à testemunha LL e à matéria sobre a qual o HAITONG BANK pretende inquiri-la, designadamente, a matéria constantes dos pontos 14.º, 18.º a 22.º, 24.º, 25.º, 27.º, 29.º, 47.º, 50.º a 53.º, 127.º a 129.º, 131.º, 137.º a 140.º, 143.º, 144.º, 149.º, 153.º, 160.º a 164.º, 166.º, 168.º, 169.º, 177.º a 179.º, 186.º, 191.º, 193.º e 194.º, 196.º a 198.º, 200.º e 201.º do recurso de impugnação judicial do HAITONG BANK.
Desde logo, e a título de exemplo:
− não foi a testemunha concretamente inquirida sobre se as funções acometidas ao HAITONG BANK no âmbito dos programas de papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A incluíam ou não o registo da titularidade de papel comercial a que alude o artigo 291.º CVM (como invoca a CMVM, inclusive, nas suas alegações) ou se tal registo continha única e exclusivamente a informação constante do artigo 44.º do CVM ― o que releva para a matéria alegada no ponto 137.º do recurso de impugnação;
− não foi a testemunha concretamente inquirida sobre se no âmbito dos programas de papel comercial em apreço, o HAITONG BANK tinha ou não contacto com os investidores em papel comercial ― o que releva para a matéria alegada nos pontos 138.º e 139.º do recurso de impugnação judicial;
− não foi a testemunha concretamente inquirida sobre se o HAITONG BANK tinha ou não funções de avaliação de risco das entidades emitentes no âmbito dos programas de papel comercial sub judice
― o que releva para a matéria alegada nos pontos 140.º, 144.º, 149.º, 150.º, 153.º do recurso de impugnação;
− não foi a testemunha concretamente inquirida sobre quais as comissões habitualmente cobradas pelo HAITONG BANK nas operações em que o mesmo intervinha, e sobre se tais comissões variavam ou não em função da existência de um risco de crédito ― o que releva também para a matéria alegada nos pontos 144, 149.º, 150.º e 153.º do recurso de impugnação;
− não foi a testemunha concretamente inquirida sobre o procedimento típico de decisão e de aprovação/análise de operações numa instituição como o HAITONG BANK, tal como vem alegado nos pontos 160.º a 164.º;
− não foi a testemunha inquirida sobre os concretos termos da reunião de 08.10.2013 do Conselho de Crédito e Risco do HAITONG BANK, onde foram apresentados os programas de papel comercial em apreço ― o que releva para a matéria alegada nos pontos 162.º a 164.º, 181.º a 183.º do recurso de impugnação;
− nem foi a testemunha questionada com detalhe sobre se a mesma tinha ou não conhecimento da real situação económica e financeira das emitentes da EI..., S.A e R..., S.A (e, por conseguinte, da alegada desconformidade das respetivas Notas Informativas) ― o que é tanto mais relevante quanto se tenha em conta que foi KK quem, de forma central e absolutamente decisiva, atuou por conta e em representação do HAITONG BANK no âmbito dos programas de papel comercial em apreço (cfr. ponto 186.º do recurso de impugnação).
Com efeito, e a título de exemplo, durante a inquirição da testemunha em sede administrativa:
− não foi a testemunha questionada quanto à matéria constante dos pontos 14.º, 18.º a 22.º, 24.º, 25.º, 27.º, 29.º, 47.º, 50.º a 53.º, acerca da venda dos ativos do B... (entre os quais, o ora HAITONG BANK) a terceiros investidores, matéria essa que tampouco foi aflorada na fase administrativa
AAAAAAAAA. Com a inquirição destas testemunhas, poderia também o Tribunal a quo ter esclarecido os pressupostos errados em que acabou por fazer assentar a imputação das infrações ao HAITONG BANK.
BBBBBBBBB. Por outro lado, nenhuma das testemunhas foi arrolada, na fase administrativa, pelo HAITONG BANK, pelo que o âmbito da matéria a que foram questionadas estava, naturalmente, circunscrito ao âmbito factual das Defesas dos Arguidos que as indicaram.
CCCCCCCCC. Em suma, em causa estão duas testemunhas com conhecimento direto dos factos alegados pelo HAITONG BANK, cada uma delas com um conhecimento direto particularmente intenso – com protagonismo – sobre determinados factos, pelo que deveria a sua inquirição na fase judicial do processo ter sido deferida, sob pena de manifesta violação de direitos fundamentais do HAITONG BANK, mormente, direito à defesa, direito ao recurso, direito ao contraditório, direito de acesso aos Tribunais e direito a um processo justo e equitativo (artigos 20.º, n.ºs 1 e 4 e 32.º, n.º 10 da Constituição e artigo 6.º da CEDH).
DDDDDDDDD. Note-se, por outro lado, que o HAITONG BANK se limitou a arrolar 4 testemunhas, num processo com a enorme complexidade como o presente – ou seja, apenas as que considerou absolutamente indispensáveis à descoberta da verdade material e boa decisão da causa. ACRESCE QUE,
EEEEEEEEE. Se, por um lado, o Tribunal considera inútil a reinquirição das testemunhas arroladas pelo HAITONG BANK, indeferindo-a, por outro, admite a inquirição das três testemunhas arroladas pela CMVM, pese embora esta não tenha indicado o que pretende provar com as testemunhas em causa, e bem sabendo o Tribunal – como aliás denota a advertência feita neste sentido – que as referidas “testemunhas” não têm qualquer conhecimento direto dos factos objeto dos presentes autos, o que não pode deixar de inquinar o presente processo processo ― sendo que tal matéria se revela absolutamente essencial para efeitos do argumento da exclusão da responsabilidade do HAITONG BANK por força da Medida de Resolução (cfr. pontos 2.º a 85.º do recurso de impugnação judicial do HAITONG BANK);
− não foi a testemunha questionada quanto ao facto de o HAITONG BANK não ter desempenhado quaisquer funções de avaliação de risco das emitentes ― que releva para a matéria alegada nos pontos 140.º, 144.º, 149.º, 150.º, 153.º do recurso de impugnação ― e que, como se disse, também não foi objeto de prova na fase administrativa do processo, nem sequer de forma meramente lateral;
− não foi a testemunha questionada quanto ao facto de o HAITONG BANK não ter desempenhado quaisquer funções de registo no sentido a que alude o artigo 291.º CVM ― o que releva para a matéria alegada no ponto 137.º do recurso de impugnação; e
− não foi também a testemunha LL questionada em detalhe sobre se a mesma tinha ou não conhecimento da real situação económica e financeira das emitentes da EI..., S.A e R..., S.A (e, por conseguinte, da alegada desconformidade das respetivas Notas Informativas) ― o que é sobremaneira relevante por a mencionada testemunha ter também atuado por conta do HAITONG BANK no âmbito dos programas de papel comercial em apreço ― relevando, portanto, para a matéria constante do ponto 186 do recurso de impugnação judicial, por violação do princípio do processo justo e equitativo e do princípio da igualdade de armas (artigo 6.º da CEDH e artigo 20.º, n.º 4 da CRP).
FFFFFFFFF. Em suma: ao HAITONG BANK tem de ser dada a possibilidade efetiva de colocar em causa, perante um Tribunal imparcial, a decisão da autoridade administrativa, sendo, para tal, fulcral que lhe seja dada a possibilidade de produzir prova perante uma instância judicial imparcial e, bem assim, de contraditar a prova já produzida na fase administrativa.
GGGGGGGGG. O recurso a uma via jurisdicional tem de ser efetivo, não podendo ser um mero pro forma – e só se estará perante um verdadeiro recurso judicial se for permitido ao arguido exercer cabalmente o seu direito de defesa, contraditório e acesso aos tribunais, em toda a sua extensão.
HHHHHHHHH. Por outro lado, é essencial que a produção de prova testemunhal – e, em particular, de testemunhas centrais para a boa decisão da causa – decorra perante um Tribunal, pois só quando confrontado com a pessoa que preste declarações, poderá o Juiz ter a seu favor – a favor da formação das suas convicções – todos os sentidos que permitem apreender, apreciar ou ajuizar da realidade factual que a pessoa tenta transmitir em discurso. SEM PREJUÍZO,
IIIIIIIII. A norma que se retira do artigo 72.º, n.º 2, do RGCO, nos termos do qual “compete ao juiz determinar o âmbito da prova a produzir” carece de um mínimo de densificação normativa.
JJJJJJJJJ. Com efeito, a recusa de prova só é constitucionalmente aceitável em face dos princípios do acesso aos Tribunais, da tutela jurisdicional efetiva e da igualdade de armas se for absolutamente excecional e for balizada por limites legalmente fixados e constitucionalmente autorizados.
KKKKKKKKK. O Tribunal Constitucional já reconheceu, aliás, que o Tribunal só pode “rejeitar liminarmente as diligências probatórias notoriamente irrelevantes, supérfluas, inadequadas ou meramente dilatórias”.
LLLLLLLLL. Ora, o certo é que a norma que se retira do n.º 2 do artigo 72.º do RGCO não prevê qualquer baliza limitadora da atuação judicial, deixando inteiramente nas mãos do Tribunal a decisão sobre a aceitação ou não dos meios de prova requeridos pelas partes.
MMMMMMMMM. Essa amplitude sem limites da norma legal, torna-a uma norma carente de um mínimo de concretização e de densificação e, como tal, inconstitucional por violação do princípio da determinabilidade das leis, bem como dos princípios da confiança e da segurança jurídica que, em última análise, se retiram do princípio do Estado de Direito, como de resto já foi reafirmado pelo Tribunal Constitucional.
NNNNNNNNN. Com efeito, no âmbito do poder legislativo, compete ao legislador emitir normas que limitem o poder administrativo, mas também o poder judicial a atuarem dentro dos limites da legalidade e da constitucionalidade, algo que inexiste face ao teor do disposto no n.º 2 do artigo 72.º do RGCO que prevê uma norma em branco, transferindo para o Tribunal um poder do legislador.
OOOOOOOOO. A norma em apreço não define ou delimita critérios materiais mínimos no que respeita à prova a produzir na fase de julgamento de processo de contraordenação, não sendo capaz de estabelecer regras de atuação e/ou de controlo para os tribunais, deixando ao inteiro critério do “juiz avaliar em função da complexidade do processo e das concretas necessidades de prova, se se mostra necessário ouvir todas as testemunhas arroladas”., o que resulta na atribuição de um mandato em branco, ilimitado e insindicável por parte do legislador ao tribunal, que conflitua com os princípios da precisão ou determinabilidade das leis, da segurança, do processo justo e equitativo e das garantias de defesa dos arguidos, consagrados nos artigos 2.º, 13.º, 20.º, n.º 4, 32.º, n.º 10 da Lei Fundamental e 6.º da CEDH.
PPPPPPPPP. A demonstração de como esta norma não fornece qualquer credencial determinada e balizada face ao agir dos tribunais encontra-se no exemplo do caso aqui em apreço, e onde o Tribunal, precisamente ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 72.º do RGCO indeferiu prova testemunhal indicada a factos novos, assim expressamente indicados e justificados pela Parte, dessa forma esvaziando totalmente a faculdade de defesa através da alegação e prova de factos novos que o Tribunal, de resto, nem sequer se deu ao trabalho de considerar serem notoriamente irrelevantes, supérfluas, inadequadas ou meramente dilatórias.
QQQQQQQQQ. Face ao exposto suscita-se a inconstitucionalidade da norma que se retira do artigo 72.º, n.º 2 do RGCO em termos processualmente adequados em termos de estar o Tribunal - nos termos do n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional - obrigado a dela conhecer.
RRRRRRRRR. Deve, assim, o Tribunal, nos termos do artigo 204.º da Constituição, desaplicar a referida norma, aplicando, ao invés, o disposto no artigo 315.º, n.º 4 do CPP que, na decisão proferida por este Ilustre Tribunal, este só não considerou ser aplicável por virtude da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 72.º do RGCO.
SSSSSSSSS. Ora, sendo desaplicada por inconstitucionalidade a norma que se retira do n.º 2 do artigo 72.º, deixa de haver motivo para não se aplicar – em face de lacuna – o disposto no artigo 315.º, n.º 4 do CPP.
TTTTTTTTT. Pelo que deve considerar-se admissível “O rol [apresentado] com o máximo de 20 testemunhas (…)”, limite que “apenas pode ser ultrapassado desde que tal se afigure necessário para a descoberta da verdade material, designadamente quando tiver sido praticado algum dos crimes referidos no n.º 2 do artigo 215.º ou se o processo se revelar de excecional complexidade, devido ao número de arguidos ou ofendidos ou ao caráter altamente organizado do crime” (alínea d) do n.º 3 e nos n.os 7 e 8 do artigo 283.º e artigo 315.º, n.º 4, ambos do CPP).POR FIM, SEMPRE SE SUBLINHE:
UUUUUUUUU. É certo que o momento de prolação da decisão administrativa foi manifestamente protelado pela CMVM, fazendo com que o prazo de prescrição do procedimento seja uma questão real.
VVVVVVVVV. Não obstante, não pode o HAITONG BANK ser castigado ou limitado por factos que lhe são alheios - e não lhe pode ser denegado o direito a um processo justo, pelo simples facto da Autoridade Administrativa, que tinha o domínio do processo, o “atirar” para Tribunal à beira da prescrição – o que os Tribunais, no seu poder de sindicância, têm de assegurar, não permitindo que o direito de defesa seja coartado e que não se apure a verdade material por uma razão meramente formal exclusivamente imputável à CMVM.
POR FIM E NO REFERENTE À FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO JUDICIAL PROFERIDA
WWWWWWWWW. O dever de fundamentação das Decisões é uma garantia integrante do conceito de Estado de Direito Democrático, previsto no artigo 205.º, n.º 1 da CRP e, entre o mais, no artigo 97.º, n.º 5 do Código do Processo Penal.
XXXXXXXXX. O Tribunal a quo indeferiu a inquirição das testemunhas arroladas pelo HAITONG BANK, sem indicar os concretos e precisos fundamentos para a decisão tomada, tendo sido proferida uma verdadeira decisão judicial “em branco”,
YYYYYYYYY. Razão pela qual deverá a Decisão recorrida ser declarada nula, ao abrigo do disposto nos artigos 97.º, n.º 1, alínea b) e n.º 5 do CPP, ex vi artigos 41.º e 74.º, n.º 4 do RGCO, por violação dos artigos 20.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1 e 10, e 205.º, n.º 1, da CRP e artigo 6.º, § 1, CEDH ex vi artigo 8.º CRP, o que se requer.
ZZZZZZZZZ. E, em face de tudo o exposto, requer-se a V. Exas. se dignem revogar a Decisão recorrida e, por conseguinte, ordenem o reenvio do processo para novo julgamento, admitindo a inquirição, em sede judicial, das testemunhas KK e LL, por serem estas diligências imprescindíveis ao cabal exercício dos direitos de defesa do HAITONG BANK e à descoberta da verdade material.
PRORROGAÇÃO DO PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DA SENTENÇA - (RECURSO DO DESPACHO PROFERIDO PELO TCRSA 15.02.2022)
AAAAAAAAAA. Vem o presente recurso interposto do Douto Despacho proferido pelo Tribunal a quo em 15.02.2022, com a referência Citius ... (“Decisão Recorrida”), que julgou parcialmente improcedente a requerida prorrogação do prazo para interposição de recurso da sentença pelo período adicional de 15 dias, no qual o Tribunal a quo respondeu aos fundamentos deduzidos pelo Mandatário do Recorrente AA e secundados por todos os demais Recorrentes, incluindo o Mandatário do ora Recorrente, referindo que o prazo normal para interposição de recurso é de 10 dias, como resulta do artigo 74.º, n.º 1 do RGCO,
BBBBBBBBBB. O que significa que, a ser admitido o prazo requerido de 15 dias, seria concedido um prazo superior ao dobro do legalmente previsto e, no entendimento do Tribunal a quo, tal não seria admissível.
CCCCCCCCCC. Concluiu, assim, o Tribunal a quo que um período adicional de 10 dias seria razoável e adequado para garantir o efetivo direito de defesa dos recorrentes. Porém, a escassa argumentação apresentada pelo Tribunal a quo para justificar tal entendimento assenta em pressupostos insuficientes e desconsidera os mais elementares direitos do Recorrente em sede de processo contraordenacional.
DDDDDDDDDD. Ora, de acordo com o artigo 74.º, n.º 1 do RGCO, o prazo para interposição de recurso da decisão da impugnação judicial de uma decisão administrativa que tenha aplicado uma sanção é de 10 dias.
EEEEEEEEEE. Relativamente ao referido prazo, o Tribunal a quo considerou verificar-se uma situação de excecional complexidade, para a qual contribui a extensão dos autos, entendendo que: “deverá, efetivamente, proceder-se a uma prorrogação do prazo para interposição do recurso, como aliás, se tem vindo a conceder no âmbito de outros processos de nível III”.
FFFFFFFFFF. E, bem assim, andou o Tribunal ao considerar o prazo contante do 74.º, n.º 1 do RGCO desconforme aos artigos 32.º, n.º 10, 20.º n.º 1 e 4 e 18.º, n.º 2 da CRP, considerando que em processos contraordenacionais de elevada complexidade (nível III), como o sub judice, a previsão de um prazo de apenas 10 dias para apresentação de recurso de impugnação judicial da sentença é violadora dos direitos de defesa e de recurso do arguido, assim como do seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva, a ao contraditório e a um processo equitativo.
GGGGGGGGGG. Não obstante, considerou o Tribunal a quo que não seria razoável permitir uma prorrogação do prazo de interposição de recurso por um prazo superior ao dobro do legalmente previsto, tendo concedido apenas uma prorrogação de prazo por 10 dias -prorrogação essa manifestamente insuficiente para salvaguarda dos direitos e preceitos constitucionais acima mencionados.
HHHHHHHHHH. Estamos perante uma sentença composta por 953 (novecentas e cinquenta e três) páginas, proferida no âmbito de um processo composto por 56 volumes, cujo valor foi fixado em €4.750.000,00, pelo que é por demais evidente extensão e complexidade do presente processo, no âmbito do qual são discutidas inúmeras questões jurídicas altamente complexas e sofisticadas, em específico quanto ao Arguido, estão em causa contraordenações praticadas por referência a 4 anos (exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013) e por referência à situação patrimonial, económica e financeira de entidades terceiras (EI..., S.A e R..., S.A), que não o próprio Arguido.
IIIIIIIIII. Questões jurídicas essas que implicam a análise e subsunção ao direito dos 801 (oitocentos e um) factos dados com provados na sentença em causa.
JJJJJJJJJJ. É inequívoca e incontestável a complexidade e extensão da matéria em discussão no presente processo, abrangendo vertentes e questões tão distintas como sejam (i) a estrutura orgânico-funcional de diferentes entidades (B..., Haitong Bank, EI..., S.A, R..., S.A) e (ii) a participação de cada um dos demais Arguidos nessa mesma estrutura, (iii) os contratos de organização e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A e as concretas emissões efetuadas ao abrigo dos mesmos, (iv) os procedimentos de organização e colocação do papel comercial em apreço aos balcões do B..., (v) a situação financeira da EI..., S.A nos exercícios de 2010, 2011 e 2012 e o agravamento dessa mesma situação durante o ano de 2013, (vi) a reestruturação do G... e a operação de aquisição pela R..., S.A de uma participação qualificada na E..., S.A, (vii) a informação prestada aos clientes do B... relativamente às entidades emitentes (EI..., S.A e R..., S.A) e à sua atividade, através das Notas Informativas (viii) a concreta participação de cada um dos Arguidos em tais matérias e factos em causa, entre várias outras.
KKKKKKKKKK. Esta complexidade é dobrada pela extensão das questões jurídicas a abordar, como sejam (i) o regime jurídico do papel comercial e a inerente responsabilidade pela informação, (ii) o regime geral da intermediação financeira e a inerente responsabilidade pela informação, (iii) a natureza do artigo 7.º do CVM como norma de responsabilidade ou como mera parcela de norma, (iv) o regime de organização das sociedades comerciais e, em particular, das instituições de crédito, (v) o regime dos sistemas controlo interno das sociedades comerciais e, em particular, das instituições de crédito, (vi) o tipo objetivo contraordenacional, (vii) o tipo subjetivo contraordenacional, (viii) a teoria do risco de organização, os critérios de imputação do conhecimento às sociedades comerciais e os critérios que barram essa imputação do conhecimento, com particular destaque para o tema do conhecimento ao abrigo de mandatos duplos distintos, (ix) a imputação da responsabilidade contraordenacional às pessoas coletivas, (x) o regime específico de autoria e comparticipação na responsabilidade contraordenacional, (xi) a admissibilidade de cumular o regime específico de autoria e comparticipação na responsabilidade contraordenacional com a imputação da responsabilidade contraordenacional às pessoas coletivas, operando uma duplicação de normas de extensão da imputabilidade, (xii) a dissociação entre o suposto contributo causal e a suposta imputação do conhecimento, (xiii) a medida de resolução bancária e os seus efeitos erga omnes, (xiv) o regime das fusões e cisões societárias e a sua repercussão na responsabilidade contraordenacional.
LLLLLLLLLL. Assim, impõe-se concluir que a prorrogação por apenas 10 dias do prazo consagrado no artigo 74.º n.º 1 do RGCO se mostra manifestamente desadequada ao presente processo de contraordenação com a complexidade que este ocupa.
MMMMMMMMMM. Note-se que o Tribunal a quo compreendeu que o prazo legal é irrisório neste tipo de contraordenações complexas. Contudo, foi bastante restritivo quanto à prorrogação concedida, argumentando que se jogam apenas questões jurídicas. Com o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo não se apercebeu da quantidade e complexidade de questões jurídicas envolvidas – que sintomaticamente não foram devidamente fundamentadas na Sentença, nomeadamente as questões prejudiciais (e essenciais, in casu) de Direito dos Valores Mobiliários, de Direito das Sociedades e de Direito Bancário.
NNNNNNNNNN. É inconstitucional, por desconformidade com os artigos 32.º, n.º 10, 20.º n.º 1 e 4 e 18.º,n.º 2 da Constituição, a norma constante do artigo 74.º n.º 1 do RGCO, no sentido em que, em processos contraordenacionais de elevada complexidade, como o que ora nos ocupa, não é violadora dos direitos de defesa e recurso do arguido, assim como com o seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva, a previsão de um prazo de 10 dias para interposição de recurso da sentença,
OOOOOOOOOO. Devendo ser interpretada a norma que se retira do artigo 41.º n.º 1 do RGCO no sentido de que a mesma permite a aplicação subsidiária do CPP, nomeadamente do disposto no n.º 6 do artigo 107.º do CPP, em conformidade com a Constituição, em especial com o disposto no artigo 32.º, n.º 10 da Constituição, e com o disposto no artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição.
PPPPPPPPPP. O artigo 41.º, n.º 1 do RGCO estabelece que, subsidariamente, sempre que o contrário não resulte deste diploma, aplicar-se-ão os preceitos reguladores do processo criminal e os princípios gerais do processo penal, onde se integram as normas constitucionais sobre essa matéria.
QQQQQQQQQQ. Assim, é subsidiariamente aplicável, devidamente adaptado, o disposto no artigo 107.º, n.º 6, do CPP, de acordo com o qual, revelando-se o procedimento de excecional complexidade, nos termos da parte final do n.º 3 do artigo 215.º, o juiz, a requerimento do arguido, pode prorrogar os prazos previstos nos artigos 78.º, 287.º e 315.º e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 411.º, até ao limite máximo de 30 dias, o que significa que o prazo inicial pode ser acrescido de mais 30 dias.
RRRRRRRRRR. Fica, por conseguinte, afastado o único argumento deduzido pelo Tribunal a quo, segundo o qual não seria razoável permitir uma prorrogação do prazo de interposição de recurso por um prazo superior ao dobro do legalmente previsto - a lei permite a prorrogação por um período adicional até ao limite máximo de 30 dias e o Tribunal a quo limitou tal prorrogação a 1/3 do limite máximo previsto na lei, ficando aquém do período adicional requerido pelo Recorrente – de apenas 15 dias adicionais, metade do limite máximo previsto na lei.
SSSSSSSSSS. É importante realçar que o aludido prazo legal de 10 dias para interposição de recurso é aplicável quer estejam em causa coimas simples e de valor reduzido (como por exemplo as resultantes de multas de estacionamento), quer estejam em causa coimas de milhares ou milhões de euros e de elevada complexidade (como a dos presentes autos).
TTTTTTTTTT. Salienta-se ainda que existe uma lacuna no CPP, no que diz respeito aos fundamentos relevantes para a prorrogação do prazo de interposição de recurso, que deverá, nos termos do artigo 4.º daquele Código, ser integrada com recurso à previsão homóloga contemplada nas normas do processo civil.
UUUUUUUUUU. O CPP concebe a excecional complexidade atendível para efeitos de prorrogação do prazo à luz das causas previstas para justificar a extensão da duração máxima da prisão preventiva, referindo-se “nomeadamente, ao número de arguidos ou de ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime” (cfr. artigo 215.º, n.º 3 in fine do CPP para o qual remete o n.º 6 do artigo 107.º do mesmo Código), pelo que, tendo em atenção a concreta inserção da norma que prevê a caracterização da excecional complexidade processual, tal disposição deverá ser aplicada com as necessárias adaptações quando no âmbito de requerimento para prorrogação de prazo respeitante ao exercício da defesa do arguido.
VVVVVVVVVV. A “devida adaptação” do regime da prorrogabilidade do prazo à concreta estrutura e finalidades do processo contraordenacional impõe que conjuguemos os fundamentos que justificam a sua concessão em sede de processo criminal com os fundamentos que a justificam no âmbito das normas do processo civil, ou seja, do motivo ponderoso que impeça ou dificulte anormalmente ao réu ou ao seu mandatário judicial a organização da defesa (cfr. artigo 569.º, n.º 5 do CPC). Por esta razão e nesta medida, serão também aplicáveis ao caso as disposições do CPC.
WWWWWWWWWW. O caso sub judice apresenta características peculiares (nas palavras do Tribunal a quo “sua complexidade e a sua extensão”) que justificam a necessidade de prorrogação do prazo de interposição de recurso por mais 15 dias, além dos 10 legalmente previstos.
XXXXXXXXXX. Uma decisão em sentido contrário apenas poderá ocorrer no caso de se interpretar a norma que se retira do artigo 41 n.º 1 do RGCO no sentido de que a mesma não permite a aplicação subsidiária do CPP, nomeadamente do disposto no n.º 6 do artigo 107.º do CPP, o que redundará numa interpretação dessa mesma norma (e posterior aplicação) em desconformidade com a Constituição, em especial com o disposto no artigo 32.º, n.º 10 da Constituição, e com o disposto no artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição.
YYYYYYYYYY. Face ao exposto, fica claro que o prazo de interposição de recurso razoável e adequado no presente caso seria, no mínimo, de 25 dias, nos termos de uma correta interpretação dos artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 107.º, n.º 6 do CPP ex vi do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO.
ZZZZZZZZZZ. Uma diferente interpretação dos referidos normativos seria inconstitucional, por ofensa ao disposto nos artigos 20.º e 32.º, n.º 10 da CRP. Por cautela, para os efeitos dos artigos 204.ºda CRP e 70.º, n.º 1, a) e b) da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, suscita-se a inconstitucionalidade, com fundamento na violação dos artigos 32.º, n.º 10, 20.º, n.ºs 1 e 4 e 18.º, n.º 2 da CRP, da norma que se extrai da interpretação isolada ou conjunta dos artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 107.º, n.º 6 do CPP ex vi do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO, se interpretados no sentido de (i) não admitir uma prorrogação do prazo de interposição de recurso da sentença superior a 10 dias; e/ou (ii) admitir que um prazo inferior a 25 dias para interposição de recurso é suficientemente razoável para o efetivo exercício do direito de defesa dos arguidos numa ação de excecional complexidade como a que está em causa nos presentes autos.
AAAAAAAAAAA. Atenta a necessidade de garantir, de forma efetiva, o exercício dos direitos constitucional e legalmente conferidos aos arguidos em processos contraordenacionais, requer-se a V. Exas. se dignem revogar a Decisão em apreço, substituindo-a por outra que conceda a requerida prorrogação do prazo de interposição de recurso pelo período adicional de 15 dias, nos termos de uma correta interpretação dos artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 107.º, n.º 6 do CPP ex vi do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO, ordenando o reenvio do processo para o Tribunal a quo para o efeito e concedendo-se novo prazo para recurso ao ora Recorrente.
INÍCIO DO PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DA SENTENÇA (RECURSO DO DESPACHO PROFERIDO PELO TCRS A 22.02.2022)
BBBBBBBBBBB. O presente recurso vem interposto da Decisão Recorrida, de 22.02.2022, que indeferiu o Requerimento apresentado pelo HAITONG BANK em 21.02.2022, no qual se requereu que o início do prazo de interposição de recurso da Decisão, se iniciasse no dia 16.02.2022.
CCCCCCCCCCC. No entender do Recorrente, não se pode considerar o dia de depósito da sentença na secretaria (i.e. 15.02.2022), como o dia a partir do qual se contabiliza o início do prazo de interposição de recurso.
DDDDDDDDDDD. A interpretação correta dos artigos 411.º, n.º 1, alínea b) do CPP e 74.º, n.º 1 do RGCO, é aquela que entende que o prazo de interposição de recurso se deve iniciar apenas a partir do momento em que as partes têm a efetiva possibilidade de tomar conhecimento do teor integral da sentença.
EEEEEEEEEEE. Resulta também dos princípios e regras gerais de direito, com reflexo nos artigos 306.º, n.º 1 e 329.º do Código Civil, que o prazo de exercício de direitos só se pode iniciar a partir do momento em que os direitos podem ser legalmente exercidos pelos seus titulares.
FFFFFFFFFFF. As partes não lograram aceder ao teor integral da sentença no momento do seu putativo depósito por vários motivos. Em concreto:
GGGGGGGGGGG. Primeiro, a sentença não constava da plataforma eletrónica Citius no dia 15.02.2022, não tendo os mandatários conseguido aceder à mesma eletronicamente.
HHHHHHHHHHH. Segundo, no momento de encerramento da audiência de discussão e julgamento (18 horas e 10 minutos), a secretaria encontrava-se fechada, pelo que não era possível às partes e aos mandatários obterem uma cópia física da sentença.
IIIIIIIIIII. E mesmo que assim não fosse, afigura-se uma restrição inadmissível do direito de as partes condicionar o acesso a uma sentença (e, por conseguinte, o início do prazo de interposição de recurso) aos horários da secretaria.
JJJJJJJJJJJ. Neste sentido, o artigo 19.º, n.º 1 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto exige que a sentença deve ser disponibilizada via Citius no momento do seu alegado depósito – e não o foi.
KKKKKKKKKKK. Terceiro, o momento de leitura da sentença não pode equivaler ao momento no qual as partes e os mandatários tomaram conhecimento da mesma, por não terem acedido ao seu integral teor. De facto, em sede de audiência de discussão e julgamento apenas foi lida a súmula da sentença.
LLLLLLLLLLL. Nestes termos, não houve possibilidade de aceder ao teor integral da sentença no dia 15.02.2022, mas apenas no dia 16.02.2022. Este deve ser, pois, o momento de início da contagem do prazo de interposição de recurso.
MMMMMMMMMMM. Acresce que as normas que se retiram dos artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 411.º, n.º 1, al. b) do CPP, interpretadas no sentido de que o prazo de interposição de recurso se inicia com o mero depósito da sentença, ainda que seja impossível às Partes e respetivos Mandatários obter uma cópia física ou eletrónica da sentença no dia desse depósito, é inconstitucional, por violação dos artigos 20.º e 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa.
NNNNNNNNNNN. Esta inconstitucionalidade é aqui suscitada nos termos dos artigos 280.º, n.º 1, alínea b) da Constituição da República Portuguesa e 70.º, n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional.
OOOOOOOOOOO. Por este motivo, deve o Venerando Tribunal desaplicar a norma na interpretação perfilhada pelo Tribunal a quo, e preferir uma interpretação conforme à Constituição das normas supra referidas que entenda que a norma que se retira dos artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 411.º, n.º 1, al. b) do CPP, implica que o início de contagem do prazo de interposição de recurso apenas se conte desde o momento em que é possível aceder ao conhecimento efetivo do teor integral da sentença que se pretende recorrer, ainda que esse momento seja posterior ao depósito da sentença na secretaria.
PPPPPPPPPPP. A impossibilidade de acesso ao integral teor da sentença impede que os recorrentes conheçam as razões de facto e de direito que fundamentam a aplicação das contraordenações a que é condenado.
QQQQQQQQQQQ. Acresce que, os recorrentes não podem preparar recurso da sentença (seu único meio de defesa e de resposta às contraordenações que lhe são imputadas) quando não conhecem o seu integral teor.
RRRRRRRRRRR. Deste modo, não se pode aplicar os artigos 74.º, n.º 1 do RGCO e 411.º, n.º 1, al. b) do CPP a situações em que os recorrentes se encontrem incapazes de exercer o seu direito de defesa, como é o caso dos autos, no qual apenas se toma conhecimento do teor da sentença em momento ulterior e se encurta o prazo de preparação do recurso.
SSSSSSSSSSS. A existência de leitura de sentença in casu não assegura que o Recorrente tenha conhecido do integral teor da sentença e possa cabalmente exercer o seu direito de defesa, por só ter sido lida uma súmula num caso de especial complexidade. De facto, a leitura de uma súmula não é idónea a dar a conhecer todos os fundamentos de facto e de direito que justificam a condenação do Recorrente (em especial, numa sentença de 953 páginas).
TTTTTTTTTTT. Reitera-se que esta interpretação é também contrária ao princípio transversal de que o prazo de exercício de direitos só se pode iniciar a partir do momento em que os direitos podem ser legalmente exercidos pelos seus titulares, com apoio nos artigos 306.º, n.º 1 e 329.º do Código Civil.
UUUUUUUUUUU. Decorre do exposto que o prazo de interposição de recurso deve iniciar-se no momento em que os Recorrentes tiveram acesso efetivo a uma cópia eletrónica ou em papel da sentença.
VVVVVVVVVVV. Em face do exposto, requer-se a V. Exas. se dignem revogar a Decisão em apreço, substituindo-a por outra que determine que a contabilização do prazo de interposição de recurso apenas se inicia no dia em que for possível aos recorrentes terem acesso efetivo a uma cópia eletrónica ou em papel da sentença, ordenando o reenvio do processo para o Tribunal a quo para o efeito e concedendo-se novo prazo para recurso ao ora Recorrente.

Concluiu, formulando os seguintes pedidos:
a. Determinar a realização da audiência prevista no artigo 411.º, n.º 5, do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO;
b. Conhecer dos pedidos de reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia;
c. Conhecer das inconstitucionalidades suscitadas;
d. Revogar a Sentença proferida pelo Tribunal a quo em 15.02.2022, absolvendo o HAITONG BANK das contraordenações por que vem condenado;
e. Revogar a Decisão proferida pela CMVM em 30.07.2021, substituindo-a por outra que, em conformidade com a CRP, conceda um prazo de prorrogação para interposição de recurso de impugnação judicial que permita ao HAITONG BANK exercer de forma cabal os seus direitos de audiência, de defesa e de recurso;
f. Revogar a Decisão judicial interlocutória proferida pelo Tribunal a quo em 19.10.2021 e, por conseguinte, admitir a inquirição, em sede judicial, das testemunhas KK e LL, por serem estas diligências
imprescindíveis ao cabal exercício dos direitos de audiência, de defesa e de recurso do HAITONG BANK e à descoberta da verdade material;
g. Revogar a Decisão judicial proferida pelo Tribunal a quo em 15.02.2022, substituindo-a por outra que conceda a prorrogação do prazo para interposição de recurso judicial da Sentença proferida, pelo período adicional de 15 dias;
h. Revogar a Decisão judicial proferida pelo Tribunal a quo em 22.02.2022, substituindo-a por outra que determine que o prazo de interposição de recurso judicial da Sentença proferida se iniciou no dia 16.02.2022.
*
Conclusões (AA)
1. O presente recurso é interposto da Sentença Recorrida que condenou o ora Recorrente pela alegada prática de oito contra-ordenações, seis relativas à pretensa violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, previstas no artigo 309.º do CVM e duas pela suposta violação do dever de qualidade da informação, previsto no artigo 7.º do CVM.
2. Com base nos fundamentos ora expostos, requer-se que o presente recurso seja julgado procedente e, em consequência, a Sentença Recorrida seja revogada e, caso assim não se entenda (sem conceder), seja determinada a suspensão e redução da coima aplicada ao ora Recorrente.
VÍCIOS DA SENTENÇA EM VIRTUDE DA VIOLAÇÃO DA LEI NA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
3. Atenta a letra do artigo 73.º do RGCO, ainda que as decisões judiciais interlocutórias sejam, por regra, autonomamente irrecorríveis, i.e., logo aquando da sua prolação (sem conceder), tal não obsta a que a questão interlocutória seja suscitada ou recolocada no recurso da decisão final, na medida em que tenha tido reflexo nessa decisão final.
4. No caso concreto, são suscitadas no presente recurso da Sentença Recorrida várias questões interlocutórias por corresponderem a vícios processuais que inquinam a mesma.
ILEGALIDADE DO DESPACHO DE 19 DE OUTUBRO DE 2021, NO SEGMENTO EM QUE INDEFERIU A REINQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS JÁ OUVIDAS NA FASE ADMINISTRATIVA DOS AUTOS, E DO DESPACHO DE 25 DE NOVEMBRO DE 2021
5. Por força do disposto no artigo 20.º, n.º 4 e do artigo 32.º, n.º 5, aplicável ex vi artigo 32.º, n.º 10, todos da CRP, também no processo contra-ordenacional, os arguidos têm o direito de exercer o contraditório sobre todas as incidências fundamentais do processo, no que se incluem os meios de prova a produzir em julgamento, não sendo lícito que o tribunal decida quaisquer questões de direito ou de facto sem que os arguidos tenham tido a oportunidade de se pronunciarem sobre as mesmas.
6. O Tribunal, no Despacho de 19 de Outubro de 2021, não podia ter indeferido a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente já ouvidas na fase administrativa, sem que lhe tivesse sido dada a oportunidade de se pronunciar previamente sobre a relevância ou pertinência da inquirição de tais testemunhas.
7. Contrariamente ao que resulta do Despacho de 19 de Outubro de 2021, não era exigível que o Recorrente, logo no recurso de impugnação judicial, indicasse as razões de ciência de cada uma das testemunhas por si indicadas, nem as matérias sobre as quais pretende que incida a inquirição de cada testemunha, e muito menos os motivos pelos quais pretendia que as testemunhas já inquiridas pela CMVM fossem novamente inquiridas pelo Tribunal.
8. Primeiro, porque nem o CVM, nem o RGCO, nem o CPP impõem ao arguido, ora Recorrente, tal obrigação.
9. Segundo, porque a praxis judiciária seguida por este Tribunal noutros processos em que o Recorrente é parte é de, aquando do recebimento dos recurso de impugnação judicial, ou até posteriormente, o Recorrente ser convidado pelo Tribunal a esclarecer (i) a razão pela qual pretendia a reinquirição de testemunhas já ouvidas, se for o caso; (ii) os concretos factos, tendo por referência os pontos da matéria de facto provada da decisão impugnada e/ou do seu recurso, sobre os quais pretendia que as testemunhas indicadas prestassem depoimento; (iii) e as razões de ciência relativas aos factos objecto dos depoimentos.
10. Esta prática judicial gerou, no ora Recorrente, a expectativa legítima de que, após o recebimento dos recursos de impugnação judicial pelo Tribunal, lhe seria concedida a oportunidade de apresentar ao Tribunal as razões que determinam a inquirição e reinquirição das testemunhas por si arroladas, e que fundamentam que a produção de tal prova se revele necessária e relevante para o esclarecimento da matéria controvertida e o objecto dos recursos.
11. A decisão do Tribunal vertida no Despacho de 19 de Outubro de 2021 e confirmada pelo Despacho de 25 de Novembro de 2021, configura, por isso, uma verdadeira decisão-surpresa.
12. Assim, o Tribunal violou o direito de defesa do ora Recorrente e, em particular, o disposto no artigo 20.º, n.º 4, da CRP, e no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que consagram, como direito fundamental, a exigência de um processo equitativo bem como o direito ao contraditório e o direito de audição e defesa do arguido, previsto no artigo 32.º, n.º 10, da CRP.
13. O artigo 72.º, n.º 2 do RGCO, conjugado com o artigo 416.º, n.º 5 do CVM, interpretados e aplicados no sentido em que o Tribunal pode indeferir o pedido de reinquirição de testemunhas já ouvidas na fase administrativa, sem conceder ao Recorrente a oportunidade de se pronunciar sobre tal decisão e sem que o Recorrente tenha a possibilidade de esclarecer as razões que determinam a pertinência e a relevância da reinquirição de tais testemunhas é inconstitucional, por violação do direito fundamental a um processo equitativo, do princípio do contraditório e do direito de audição e defesa do arguido, previstos no artigo 20.º, n.º 4, no artigo 6.º da CEDH, e no artigo 32.º, n.º 10, da CRP, respectivamente, o que, desde já, se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional.
14. Em face de todo o exposto, o Despacho de 19 de Outubro de 2021, na parte em que indeferiu a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente que já foram inquiridas na fase administrativa do processo, e o Despacho de 25 de Novembro de 2021, no segmento em que confirma a validade daquele Despacho, estão feridos de NULIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d) 2.ª parte, e 122.º do CPP ex vi
artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, por ter configurado uma decisão surpresa, e, em consequência, ter violado o princípio do contraditório, o direito do Recorrente a um processo equitativo e o direito de defesa do ora Recorrente, previstos no artigo 20.º, n.º 4, no artigo 6.º da CEDH e no artigo 32.º, n.º 10, da CRP.
15. Caso assim não se entenda (sem conceder), o Despacho de 19 de Outubro de 2021 e o Despacho de 25 de Novembro de 2021 enfermam de IRREGULARIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 - in fine, e 123.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 232.º do RGICSF, por violação dos artigos 20.º, n.º 4, no artigo 6.º da CEDH e 32.º, n.º 10, da CRP.
16. Tal nulidade ou, subsidiariamente, irregularidade, reflecte-se na invalidade e nulidade da Sentença Recorrida e, em consequência, o Despacho de 19 de Outubro de 2021, o Despacho de 25 de Novembro de 2021 e a Sentença Recorrida devem ser revogados e, por conseguinte, deve ser ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância, concedendo ao ora Recorrente o direito a pronunciar-se sobre as testemunhas que pretende que sejam ouvidas e, se for caso disso, para que seja admitida e agendada a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente e que foram inquiridas na fase administrativa do processo, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 75.º do RGCO, para sanação do aludido vício.
17. Acresce que o Despacho de 19 de Outubro de 2021 enferma de NULIDADE ou, pelo menos, de IRREGULARIDADE no segmento em que o Tribunal indeferiu a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente que já foram inquiridas na fase administrativa do processo porquanto configurou a omissão de diligências probatórias que se reputam – ou, pelo menos, podem reputar-se – essenciais para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa.
18. A decisão final proferida por este Tribunal configura a primeira apreciação judicial realizada no processo pelo que o Tribunal de 1.ª instância tem poderes de jurisdição plena, não podendo estar condicionado ou vinculado pelos termos em que a autoridade administrativa conduziu o processo na fase administrativa.
19. O facto de o ora Recorrente ter arrolado dezassete testemunhas que foram inquiridas na fase administrativa do processo perante a CMVM não invalida que o depoimento destas testemunhas possa ser admitido pelo Tribunal, se reconhecida a essencialidade e pertinência da inquirição destas testemunhas nesta sede.
20. Aliás, só estaremos perante um verdadeiro recurso de jurisdição plena se for permitido ao arguido exercer, plenamente, o seu direito de defesa em toda a sua extensão.
21. Donde, a circunstância de parte das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente terem sido ouvidas na fase administrativa do processo não pode, por si só, determinar o indeferimento do seu depoimento, o que, de resto, não é invalidado pelo artigo 416.º, n.º 5, do CVM.
22. Para além disso, só agora na fase judicial, após ter sido notificado da Decisão, na qual são identificados especificamente os meios de prova que fundamentam a prova dos factos alegados pela CMVM, é que o Recorrente está em condições de verdadeiramente inquirir as testemunhas, de forma a poder infirmar os factos que lhe são desfavoráveis e contraditar as provas constantes dos autos e, assim, exercer, efectivamente, o seu direito de defesa.
23. A total ausência de referência à prova na Acusação – que, de resto, conduz à nulidade da mesma – fez com que o ora Recorrente não tivesse podido contraditar cabalmente os factos aí imputados e a respectiva prova na fase da Defesa, pois não lhe foi possível alcançar qual teria sido a prova que suportou as imputações feitas na Acusação da CMVM.
24. Acresce que a reinquirição das dezassete testemunhas arroladas pelo ora Recorrente, que foram ouvidas na fase administrativa, é necessária e pertinente para o objecto dos autos.
25. Por um lado, tendo em conta que MM, NN, KK, OO e PP não foram indicadas pelo Recorrente na sua Defesa, o Recorrente não teve a oportunidade de inquirir livre e plenamente estas testemunhas na fase administrativa, uma vez que o interrogatório foi conduzido pelos mandatários dos arguidos que arrolaram as mencionadas testemunhas.
26. Em todo o caso, a pertinência da inquirição das aludidas testemunhas e a manifesta essencialidade para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa resulta da razão de ciência daquelas testemunhas.
27. Por outro lado, a necessidade e pertinência de reinquirição das restantes doze testemunhas arroladas pelo ora Recorrente (QQ, RR, SS, TT, UU, VV, WW, XX, YY, ZZ, AAA, BBB) resulta evidente da razão de ciência das aludidas testemunhas.
28. Em face de todo o exposto, o Despacho de 19 de Outubro de 2021 está ferido de NULIDADE, na parte em que indeferiu a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente que já foram inquiridas na fase administrativa do processo, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d) 2.ª parte, e 122.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, por ter determinado a omissão de diligências probatórias que se reputavam – ou, pelo menos, podem reputar-se – essenciais para a descoberta da verdade, em violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP e artigo 340.º do CPP.
29. Esta nulidade foi invocada tempestivamente perante a 1.ª Instância (através do requerimento apresentado via citius em 28 de Outubro de 2021, com a Ref:ª 55588) e aqui se invoca em sede de recurso para o Tribunal da Relação, para que seja deferida.
30. Caso assim não se entenda (sem conceder), o Despacho de 19 de Outubro de 2021 enferma de IRREGULARIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 – in fine, e 123.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 232.º do RGICSF, por violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP e artigo 340.º do CPP.
31. Tal nulidade ou, subsidiariamente, irregularidade reflecte-se na invalidade e nulidade do Despacho de 25 de Novembro de 2021 e da Sentença Recorrida e, em consequência, o Despacho de 19 de Outubro de 2021, o Despacho de 25 de Novembro de 2021 e a Sentença Recorrida devem ser revogados e deve ser ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância, concedendo ao ora Recorrente o direito a pronunciar-se sobre as testemunhas que pretende que sejam ouvidas e, se for caso disso, para que seja admitida e agendada a reinquirição das testemunhas arroladas pelo ora Recorrente e que foram inquiridas na fase administrativa do processo, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 75.º do RGCO, para sanação do aludido vício.
ILEGALIDADE DO DESPACHO DE 15 DE NOVEMBRO DE 2021, NO SEGMENTO EM QUE INDEFERIU A INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS, E DO DESPACHO DE 16 DE DEZEMBRO DE 2021
32. O Despacho de 15 de Novembro de 2021 ao decidir indeferir a inquirição da testemunha CCC violou, de forma flagrante e efectiva, o direito do ora Recorrente a um processo equitativo, e, em particular, os princípios do contraditório e da igualdade de armas, assim como o direito de defesa do ora Recorrente.
33. Em primeiro lugar, do teor dos artigos 1.176, 1277, 1348, 1354, 1497 a 1504 e 1507-1510 do recurso de impugnação judicial não resultam quaisquer conjugações entre o depoimento da testemunha com outros elementos de prova para concluir em determinado sentido que afastem a necessidade de uma reinquirição da testemunha por parte do tribunal.
34. Ainda que se admita que a testemunha CCC já tenha (alegadamente) prestado o seu depoimento sobre estes factos (sem conceder), a defesa do ora Recorrente não esteve presente na data em que tal depoimento foi realizado perante a CMVM, nem teve a oportunidade ou possibilidade de contra inquirir a testemunha sobre estas questões na fase administrativa, muito menos de lhe colocar quaisquer outras questões sobre o objecto dos presentes autos.
35. Em segundo lugar, os factos que constam dos artigos 1.233 a 1.240 do recurso de impugnação judicial sobre os quais o ora Recorrente pretende que incida o depoimento desta testemunha são relevantes uma vez que evidenciam que, ao contrário do que refere a Decisão Recorrida, o Recorrente nunca deu instruções, a quem quer que fosse, para ocultar ou subavaliar o passivo da EI..., S.A, nas contas desta sociedade.
36. Em terceiro lugar, ao ter indeferido o depoimento da testemunha CCC, o Despacho de 15 de Novembro de 2021 colocou o ora Recorrente numa situação de clara desvantagem em relação à CMVM, em violação do artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, e do artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que consagram, como direito fundamental, a exigência de um processo equitativo.
37. Apesar da testemunha CCC ter prestado o seu depoimento na fase administrativa, perante a CMVM, esse depoimento foi prestado na fase pré-acusatória do processo, antes da notificação aos Arguidos da acusação administrativa, e sem que estes pudessem estar presentes e exercer o respectivo contraditório, contra interrogar a testemunha ou formular quaisquer questões directamente sobre a matéria dos autos.
38. A Constituição e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem impõem que a acusação e a defesa tenham a oportunidade de produzir a sua prova nas mesmas condições e nos mesmos termos, sem que um sujeito processual se veja, em momento algum, numa posição de vantagem ou desvantagem face ao outro.
39. A diferença de tratamento do Tribunal, ao impedir o ora Recorrente de inquirir e contra interrogar uma testemunha que depôs perante a CMVM sem que o Recorrente tivesse a oportunidade e possibilidade de exercer o respectivo contraditório, é claramente arbitrária e discriminatória.
40. O contra interrogatório a uma testemunha arrolada pela acusação não pode ser dispensado e substituído pela mera possibilidade de, em sede de recurso, a defesa discutir ou contestar o depoimento prestado pela testemunha ou de interpretar do depoimento em causa e a conjugá-lo com outros meios de prova para concluir em sentido diverso do constante da acusação, sob pena de subversão absoluta das regras da oralidade e da imediação e violação do direito de audição e defesa do arguido.
41. Em quarto lugar, ao decidir pelo indeferimento da reinquirição da testemunha CCC, que foi ouvida na fase administrativa, perante a CMVM, numa fase anterior à notificação da acusação ao ora Recorrente, o Despacho de 15 de Novembro de 2021 preteriu, ainda, o direito ao contraditório e o direito de audição e defesa do arguido, previsto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição.
42. No presente caso, o acusado, ora Recorrente, não teve o direito de interrogar ou fazer interrogar uma testemunha de acusação, vendo o seu direito de defesa e o seu direito ao contraditório coarctados.
43. O artigo 72.º, n.º 2 do RGCO, conjugado com o artigo 416.º, n.º 5 do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que o Tribunal pode indeferir o pedido de reinquirição de uma testemunha ouvida na fase administrativa, antes da notificação da acusação ao arguido e sem a sua presença, sem que ao arguido seja dada a oportunidade de contra inquirir a testemunha em causa, nas mesmas condições em que esta foi inquirida pela autoridade administrativa é inconstitucional, por violação do direito fundamental a um processo equitativo, dos princípios do contraditório e da igualdade de armas e do direito de audição e defesa do arguido, previstos no artigo 20.º, n.º 4, no artigo 6.º da CEDH, no artigo 13.º da CRP e no artigo 32.º, n.º 10, da CRP, respectivamente, o que, desde já, se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional.
44. Em face de todo o exposto, o Despacho de 15 de Novembro de 2021, na parte em que indeferiu a reinquirição da testemunha CCC, e o Despacho de 16 de Dezembro de 2021, no segmento em que confirma a validade daquele Despacho, estão feridos de NULIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d) 2.ª parte, e 122.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, por ter violado os princípios do contraditório e da igualdade de armas, o direito do Recorrente a um processo equitativo e o direito de defesa do ora Recorrente, previstos nos artigos 20.º, n.º 4, 13.º e 32.º, n.º 10 da CRP e no artigo 6.º da CEDH.
45. Caso assim não se entenda (sem conceder), o Despacho de 19 de Outubro de 2021 e o Despacho de 25 de Novembro de 2021 enfermam de IRREGULARIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 - in fine, e 123.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 232.º do RGICSF, por violação dos artigos 20.º, n.º 4, 13.º e 32.º, n.º 10 da CRP e do artigo 6.º da CEDH.
46. Tal nulidade ou, subsidiariamente, irregularidade reflecte-se na invalidade e nulidade da Sentença Recorrida e, em consequência, o Despacho de 15 de Novembro de 2021, o Despacho de 16 de Dezembro de 2021 e a Sentença Recorrida devem ser revogados e, por conseguinte, deve ser ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância, para que seja admitida e agendada a reinquirição da testemunha CCC, arrolada pelo ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 75.º do RGCO, para sanação do aludido vício.
47. Acresce que, e em qualquer caso, a decisão de indeferimento da inquirição das testemunhas CCC, DDD, EEE, FFF e GGG configurou a omissão de um acto essencial e necessário para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa.
48. A decisão final proferida por este Tribunal configura a primeira apreciação judicial realizada no processo pelo que o Tribunal de 1.ª instância tem poderes de jurisdição plena, não podendo estar condicionado ou vinculado pelos termos em que a autoridade administrativa conduziu o processo na fase administrativa.
49. O facto de o ora Recorrente ter arrolado testemunhas que foram inquiridas na fase administrativa do processo perante a CMVM não invalida que o depoimento destas testemunhas possa ser admitido pelo Tribunal, se reconhecida a essencialidade e pertinência da inquirição destas testemunhas nesta sede.
50. Aliás, só estaremos perante um verdadeiro recurso de jurisdição plena se for permitido ao arguido exercer, plenamente, o seu direito de defesa em toda a sua extensão.
51. A circunstância da testemunha CCC já ter sido ouvida na fase administrativa do processo não pode, por si só, determinar o indeferimento do seu depoimento, o que, de resto, não é invalidado pelo artigo 416.º, n.º 5, do CVM.
52. Acresce que a inquirição das cinco testemunhas arroladas pelo ora Recorrente (CCC, DDD, EEE, FFF e GGG) é necessária e pertinente para o objecto dos autos como resulta da razão de ciência daquelas testemunhas.
53. Em face de todo o exposto, o Despacho de 15 de Novembro de 2021 está ferido de NULIDADE, na parte em que indeferiu a inquirição das testemunhas CCC, DDD, EEE, FFF e GGG arroladas pelo ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º
1, e 120.º, n.º 2 - al. d) 2.ª parte, e 122.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, por ter determinado a omissão de diligências probatórias que se reputavam – ou, pelo menos, podem reputar-se – essenciais para a descoberta da verdade, em violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP e artigo 340.º do CPP.
54. Esta nulidade foi invocada tempestivamente perante a 1.ª Instância (através do requerimento apresentado via citius em 22 de Novembro de 2021, com a Ref.ª ...69) e aqui se invoca em sede de recurso para o Tribunal da Relação, para que seja deferida.
55. Caso assim não se entenda (sem conceder), o Despacho de 15 de Novembro de 2021 enferma de IRREGULARIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 - in fine, e 123.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 232.º do RGICSF, por violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP e artigo 340.º do CPP.
56. Tal nulidade ou, subsidiariamente, irregularidade, reflecte-se na invalidade e nulidade do Despacho de 16 de Dezembro de 2021 e da Sentença Recorrida e, em consequência, o Despacho de 15 de Novembro de 2021, o Despacho de 16 de Dezembro de 2021 e a Sentença Recorrida devem ser revogados e, por conseguinte, deve ser ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância, para que seja admitida e agendada a inquirição das testemunhas CCC, DDD, EEE, FFF e GGG arroladas pelo ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 75.º do RGCO, para sanação do aludido vício.
ILEGALIDADE DOS DESPACHOS DE 10 DE FEVEREIRO DE 2022 E DE 15 DE FEVEREIRO DE 2022
57. O Despacho de 10 de Fevereiro de 2022 proferido pelo Tribunal a quo, ao indeferir prova testemunhal suplementar requerida pelo ora Recorrente, por requerimento de 9 de Fevereiro de 2022 no seguimento de uma decisão de alteração de factos (vertida no Despacho de 4 de Fevereiro de 2022), padece de invalidade.
58. Primeiro: é inquestionável o direito que o Arguido, ora Recorrente, tinha o direito a produzir prova na sequência da comunicação da alteração não substancial de factos prevista no artigo 358.º, n.º 1, in fine, do CPP.
59. Segundo: o fundamento para a produção da prova testemunhal suplementar que o ora Recorrente indicou era por demais evidente e dispensava justificações adicionais uma vez que estava em causa a produção de prova sobre os factos que foram alegados numa fase posterior do processo, i.e., no requerimento de contraditório de 9 de Fevereiro de 2022.
60. Terceiro: contrariamente ao entendido pelo Tribunal a quo, a inquirição da testemunha indicada pelo Recorrente (HHH) era útil e pertinente e ia para além da demais prova produzida.
61. Aliás, se a potencial alteração não substancial dos factos só foi comunicada ao ora Recorrente em 4 de Fevereiro de 2022, nunca poderia o ora Recorrente ter logrado fazer a prova dos factos que foram alegados no requerimento de contraditório de 9 de Fevereiro de 2022 em momento anterior, nem através da prova testemunhal já produzida.
62. Quarto: a única prova concreta que o aludido Despacho de 10 de Fevereiro de 2022 invocou, para efeitos de indeferir a inquirição da testemunha HHH, foi o depoimento da testemunha RR, sendo as demais referências à prova “abundante”, completamente genéricas e vagas.
63. Na verdade, a prova testemunhal de RR não se sobrepõe, não substitui, nem tem a mesma finalidade, do que a inquirição da testemunha HHH requerida pelo Recorrente.
64. Assim, deveria ter sido produzida a prova arrolada pelo ora Recorrente, por forma a permiti-lo infirmar a opinião do Tribunal.
65. Em face do exposto, o Despacho de 10 de Fevereiro de 2022 e o Despacho de 15 de Fevereiro de 2022, enfermam de NULIDADE pela omissão da prática de diligências que se reputavam, ou poderiam reputar, essenciais para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, 120.º, n.º 2 - al. d) in fine, e 122.º do CPP e também por violação do artigo 358.º, n.º 1, do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM.
66. Caso assim não se entenda (sem conceder), o Despacho de 10 de Fevereiro de 2022 e do Despacho de 15 de Fevereiro de 2022, enfermam de IRREGULARIDADE pela omissão da prática de diligências que se reputavam, ou poderiam reputar, essenciais para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 2 in fine, e 123.º do CPP, por violação dos artigos 340.º, n.º 1, e 358.º, n.º 1, do CPP todos ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e ainda do direito de defesa previsto no artigo 59.º, n.os 1 e 2, do RGCO.
67. Tal nulidade ou, subsidiariamente, irregularidade, reflecte-se na invalidade e nulidade da Sentença Recorrida e, em consequência, a Sentença Recorrida deve ser revogada e, por conseguinte, deve ser ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância, para que seja admitida e agendada a inquirição da testemunha HHH, arrolada pelo ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 75.º do RGCO, para sanação do aludido vício.
VÍCIOS DA MATÉRIA DE FACTO DA SENTENÇA RECORRIDA (ARTIGO 410.º/2 CPP)
68. A Sentença Recorrida padece de um conjunto de vícios no que diz respeito à matéria de facto que devem ser apreciados pelo Tribunal da Relação, nos termos do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1, e 74.º, n.º 4, do RGCO.
DO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA: AS DECLARAÇÕES DE III
69. A Sentença recorrida incorreu em erro notório da apreciação da prova, no que diz respeito à consideração dos depoimentos de III, na qualidade de testemunha, o que releva nos termos e para os efeitos do disposto na al. c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, RGCO e 407.º do CVM.
70. O vício do erro notório na apreciação da prova recai, directamente, sobre as imputações que a decisão recorrida fez ao ora Recorrente, em sede de matéria de facto, quanto à emissão de instruções para alteração das contas da EI..., S.A nos exercícios de 2008 a 2012, com vista à ocultação de passivo desta sociedade.
71. É que, para efeitos de dar como provado, que o ora Recorrente teria ordenado, pessoal e directamente, a ocultação do passivo da EI..., S.A nos exercícios de 2008 a 2012, a decisão recorrida assentou, exclusivamente, nos depoimentos contraditórios e incongruentes prestados por uma única testemunha directa: III (ainda que, posteriormente, tente colmatar as evidentes falhas com recurso a outros depoimentos, sem qualquer fundamento).
72. Isto resulta, inclusivamente, da própria estrutura da matéria de facto que ficou, incorrectamente, provada na decisão recorrida.
73. Com efeito, na matéria de facto fixada na decisão recorrida, a 1.ª Instância considerou provado que as alterações das contas da EI..., S.A (com vista à ocultação do passivo) teriam sido ordenadas pelo ora Recorrente em reuniões, exclusivamente, havidas entre este, III e JJJ, tal como resulta dos factos provados 113 a 118, 491 a 494 da Sentença Recorrida.
74. Portanto, em tese e por definição, apenas haveria três meios de prova directa – saliente-se: prova directa – que pudesse suportar estes factos dados como provados na decisão recorrida(sem nunca conceder).
75. Em particular: (i) uma confissão do ora Recorrente; (ii) depoimento de JJJ; (iii) depoimento de III (repita-se: sem nunca conceder) .
76. Ora, como é notório, não houve confissão do ora Recorrente (até porque tais imputações são falsas).
77. Sucede que, ao longo do tempo, III já foi capaz de contar, pelo menos, nove versões diferentes dos factos relativos às contas da EI..., S.A, as quais são manifestamente incongruentes entre si.
78. Ora, assentar as imputações ao ora Recorrente de que teria sido este a ordenar a ocultação de € 1,3 mil milhões no passivo das contas da EI..., S.A, num processo com a complexidade dos presentes autos, essencialmente apenas numa testemunha que apresentou NOVE VERSÕES DIFERENTES sobre estes factos, consubstancia um erro notório na apreciação da prova, nos termos e para os efeitos da al. c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.
79. Mais: acreditar em alguém que tem NOVE VERSÕES DIFERENTES sobre os mesmos factos configura um “juízo ilógico e arbitrário”, que traduz um “um erro de tal modo patente que não escapa à observação do cidadão comum”.
80. Não obstante as NOVE VERSÕES DIFERENTES, a decisão recorrida imputou ao ora Recorrente a ocultação do passivo nas contas da EI..., S.A, designadamente ao dar como provados os factos provados 113 a 118, 491 a 494 da Sentença Recorrida.
 Note-se que a testemunha CCC não constitui prova directa quanto às imputações feitas ao ora Recorrente a este propósito, porquanto o mesmo referiu que apenas falaria com III sobre as alterações às contas da EI..., S.A.
81. E a única prova directa de que dispôs, para este efeito, foram as nove versões incongruentes da “testemunha” III.
82. Com efeito, note-se que, pese embora numa uma tentativa vã de dar “credibilidade” a um depoimento que não tem credibilidade possível, a Sentença Recorrida tenha procurado sustentar os factos aqui imputados igualmente nos depoimentos de JJJ e CCC, a verdade é que tais depoimentos não corroboram o depoimento de III.
83. ACRESCE QUE, na fundamentação dos factos aqui em causa a Sentença Recorrida viola manifestamente o princípio in dubio pro reo, uma vez que valorou a prova em manifesto prejuízo do ora Recorrente (cfr. páginas 418, 419, 421, 424 a 428 da Sentença Recorrida).
84. Com efeito, não obstante reconhecer poder questionar-se se era mesmo o ora Recorrente que solicitava alterações às contas da EI..., S.A ou se era III que o faria por sua própria iniciativa, a Sentença Recorrida recorre a juízos valorativos, que manifestamente excedem os juízos de experiência comum, para concluir em prejuízo do ora Recorrente.
85. É que, como é lógico, os juízos de experiência comum não permitem que se conclua que em alturas de crise os administradores cometem fraudes nem que se afirme que a prática de fraudes a favor da empresa por meros funcionários seja uma situação menos comum, o que, aliás, nem sequer consubstancia uma verdadeiro juízo de experiência comum.
86. E, muito menos, permitem dar como provados os factos em causa aqui nos autos, com recurso a uma testemunhas que prestou depoimentos com nove versões diferentes e que não merece qualquer credibilidade.
87. Em suma, é por demais evidente que a Sentença Recorrida incorreu numa violação do princípio in dubio pro reo e num erro notório na apreciação da prova.
88. Em face do exposto, a Sentença Recorrida deve ser anulada – incluindo nomeadamente os factos provados 113 a 118, 491 a 494 da Sentença Recorrida serem dados como não provados –, por força de vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos e para os efeitos do disposto na al. c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, o que determinará que a baixa do processo ao Tribunal de 1.ª instância, para sanação deste vício.
DO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA: A REESTRUTURAÇÃO DA R..., S.A
89. No facto provado 516 da Sentença Recorrida, o Tribunal considerou provado que “Ao participar na tomada de decisão emanada do Conselho Superior do G..., de 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente AA previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade”.
90. Sucede que da fundamentação da prova deste facto que consta da página 625 da Sentença Recorrida, resulta que o Tribunal de 1.ª Instância valorou a prova em violação do princípio in dubio pro reo, uma vez que equaciona que o plano de reestruturação poderia vir a ser obstaculizado pela Cde... ou pelo Banco de Portugal, o que poderia ser motivo bastante para que o ora Recorrente “não tivesse acautelado a transmissão correcta aos investidores do que lá fora decidido”, mas em qualquer caso conclui “que a prova acaba por ser incipiente para que se possa, de facto, afirmar que esse foi o motivo”.
91. Tal consubstancia um vício de erro notório da apreciação da prova, pelo que Sentença Recorrida deve ser anulada – incluindo nomeadamente o facto provado 516 da Sentença ser dado como não provado –, nos termos e para os efeitos do disposto na al. c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, o que determinará que a baixa do processo ao Tribunal de 1.ª instância, para sanação deste vício.
A CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA: A ATRIBUIÇÃO DE RATING DA EI..., S.A PELO DRG DO B... EM SETEMBRO DE 2013
92. Ao dar como provados os factos 642 e 654 da Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância entrou em contradição.
93. Por um lado, a Sentença dá como assente que, ao comercializar papel comercial da R..., S.A e da EI..., S.A, o B... se terá limitado a prestar aos seus clientes a informação que constava das respectivas Notas Informativas.
94. Ou seja, a contrario sensu, o B... não teria prestado qualquer outra informação aos seus clientes, além daquela incluída nas Notas Informativas referentes aos programas do papel comercial da R..., S.A e EI..., S.A.
95. Por outro lado, o Tribunal de 1.ª instância deu como provado que, em Setembro de 2013 foi concluído o processo de atribuição de rating à EI..., S.A, pelo DRG do B....
96. Este processo de atribuição de rating à EI..., S.A tinha subjacente a avaliação do risco da EI..., S.A e da qualidade da informação que fora incluída nas Notas Informativas relativas ao papel comercial.
97. Portanto, da prova deste facto resulta que o B... avaliou a qualidade da informação prestada sobre a EI..., S.A que constava das Notas Informativas.
98. Esta contradição entre o facto provado 642 e o facto provado 654 gera o vício previsto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, e 74.º, n.º 4, do RGCO e artigo 407.º do CVM, porquanto está em causa uma contradição insanável da fundamentação da decisão recorrida.
99. Nesta medida, a Sentença Recorrida deve ser revogada e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.
A CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA: O DESTINO DOS CRÉDITOS DETIDOS PELA R..., S.A SOBRE A EI..., S.A E SOBRE A E... Limited APÓS A OPERAÇÃO DE REESTRUTURAÇÃO DO G...
100. No facto provado 643 da Sentença também se verifica uma contradição insanável da matéria de facto, uma vez que o Tribunal de 1.ª instância tanto afirma que a R..., S.A deixou de ter créditos sobre a EI..., S.A e sobre a E... Limited, como de seguida refere que a EI..., S.A e a E... Limited não estavam em condições de pagar os seus créditos.
101. No final de contas, ou se diz que os créditos já não existiam, e a EI..., S.A e a E... Limited nada deviam à R..., S.A ou que os créditos existiam, mas a EI..., S.A e a E... Limited não estavam em condições de pagar os créditos que a R..., S.A detinha sobre as mesmas.
102. Existindo uma contradição insanável na matéria de facto provada na Sentença Recorrida, a mesma deve ser revogada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.
A CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA: O DESTINO DOS CRÉDITOS DETIDOS PELA R..., S.A SOBRE A EI..., S.A E SOBRE A E... Limited APÓS A OPERAÇÃO DE
REESTRUTURAÇÃO DO G...
103. O teor dos factos provados 182 e 186 da Sentença também assinala uma manifesta contradição insanável na fundamentação de facto da Sentença, uma vez que se afirma que foi decidido pelo B... que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a colocar directamente junto dos clientes do B....
104. As entidades emitentes do papel comercial foram a EI..., S.A e a R..., S.A e o B... interveio única e exclusivamente na qualidade de intermediário financeiro.
105. Nestes termos, pela própria natureza da qualidade de cada entidade, o B... nunca poderia ter decidido que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, uma vez que tal decisão é, pela própria natureza das coisas, uma decisão da própria entidade emitente.
106. Existindo uma contradição insanável na matéria de facto provada na Sentença Recorrida, a mesma deve ser revogada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.
A CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA: A INCERTEZA DA OPERAÇÃO DA R..., S.A
107. Nas páginas 784 e 785 da Sentença Recorrida, a propósito da fundamentação da matéria de facto provada, também se assinala uma contradição insanável da fundamentação da Sentença.
108. Isto porque a Sentença Recorrida tanto reconhece que a operação de reestruturação do G... ainda não estava concluída, existindo uma margem de incerteza, como depois conclui que a mesma deveria ter sido divulgada, o que é, em si mesmo, incompatível.
109. Existindo uma contradição insanável na fundamentação na Sentença Recorrida, a mesma deve ser revogada, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e, em consequência, ser ordenada a baixa do processo com vista à sanação deste vício.
NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA POR ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DE FACTOS NÃO COMUNICADA AO RECORRENTE E POR IMPUTAÇÃO DE FACTO COM RECURSO A JUÍZOS CONCLUSIVOS E VALORATIVOS
110. Na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância deu como provado um novo facto, que não constava da Decisão da CMVM, a propósito das condições pessoais do ora Recorrente: “[o Recorrente AA] Granjeou com a sua actividade profissional a confiança da sua numerosa família e a confiança do mercado financeiro internacional e do mercado português, que viu nele a segurança e a estabilidade necessárias para o reassumir de funções à frente do B..., que foi, até antes de 2014, um sinal de prestígio e robustez” (facto provado 767 da Sentença Recorrida).
111. Este facto não deveria constar do elenco de factos provados da Sentença, por dois motivos.
112. Primeiro: a introdução do facto 767 no elenco de factos provados da Sentença constituiu uma alteração não substancial à matéria de facto fixada pela CMVM na sua Decisão condenatória.
113. Esta alteração não deriva de qualquer facto alegado pelo ora Recorrente no recurso de impugnação judicial.
114. Assim, o aditamento deste facto trata-se, evidentemente, de uma alteração não substancial da matéria de facto provada, visto que permitiu fundamentar o agravamento do grau de culpa do ora Recorrente, para efeitos da determinação da medida concreta da coima a aplicar ao mesmo (cfr. páginas 891, 892 e 896 da Sentença).
115. Ora, na medida em que o Tribunal de 1.ª instância decidiu promover este aditamento à matéria de facto provada, em desfavor da posição do ora Recorrente, deveria ter dado conhecimento da sua intenção de aditar este novo facto ao Recorrente.
116. Como já referido supra, o Tribunal de 1.ª instância não comunicou o aditamento deste facto ao arguido, ora Recorrente, nem lhe concedeu qualquer prazo para se pronunciar sobre o mesmo, ou para preparar a sua defesa, face a este novo facto.
117. Ao operar uma alteração não substancial da matéria de facto nos termos acima expostos, a Sentença Recorrida violou o disposto no n.º 1 do artigo 358.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, o que implicará a nulidade da Sentença.
118. Em face do exposto, é forçoso concluir que a Sentença Recorrida deve ser declarada nula e revogada, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 358.º e alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM e, em consequência, ser ordenada a baixa dos autos, para sanação dos vícios resultantes da alteração não substancial da matéria de facto, sem notificação prévia ao ora Recorrente.
119. Segundo: o facto provado 767 da Sentença configura matéria conclusiva e valorativa e que, em rigor, não poderá consubstanciar matéria de facto objectiva e concreta.
120. Na verdade, este “facto” tem carácter subjectivo e valorativo e é absolutamente conclusivo, que decorre de uma afirmação e valoração feita pelo Senhor Professor KKK sobre a pessoa do ora Recorrente.
121. Não se pode dizer que está em causa um acontecimento concreto da vida ou um dado da experiência.
122. Assim, a matéria do facto provado 767 – de natureza conclusiva, vaga e genérica – não podia ser dada como provada na Sentença Recorrida, porquanto nem sequer está em causa matéria de facto.
123. A matéria de facto provada apenas terá por objecto factos, devidamente circunstanciados no tempo e no espaço.
124. A respeito da inclusão de factos conclusivos nos factos provados na decisão penal, o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se no sentido de que os factos conclusivos ou de ordem jurídica incluídos na fundamentação de facto se devem ter como “não escritos”, com fundamento no artigo 646.º, n.º 4 do anterior Código de Processo Civil.
125. Pelo exposto, ao dar como provada a matéria do facto provado 767, a Sentença Recorrida violou o disposto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e nos artigos 374.º, n.º 2, e 283.º, n.º 3 - al. b), do CPP, ex vi artigo 407.º do CVM e artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e em consequência, a Sentença Recorrida deve ser declarada NULA.
A INADMISSIBILIDADE DA ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS NA SENTENÇA RECORRIDA FACE À DECISÃO DA CMVM
126. Por Despacho de 4 de Fevereiro de 2021, o Tribunal de 1.ª instância notificou o ora Recorrente a propósito de uma alteração “não substancial” dos factos para, querendo, exercer o respectivo contraditório e requerer a produção de prova.
127. Não obstante a oposição do ora Recorrente a esta alteração, na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª Instância procedeu, efectivamente à alteração e aditamento de factos, os quais passaram a constar do elenco de factos provados da Sentença Recorrida.
128. Esta alteração é manifestamente ilegal:
129. Em primeiro lugar, a alteração e aditamento dos factos provados 347 e 350 da Sentença Recorrida não se afigura possível, uma vez que visa colmatar uma nulidade por falta de imputação de factos concretos de que enferma o facto provado 362. da Decisão da CMVM, alterando a expressão vaga “muito superior” para o montante de “cerca de 2.3 mil milhões de euros”.
130. No entanto, nem a Sentença Recorrida, nem o mecanismo da alteração não substancial de factos previsto no artigo 358.º do CPP, podem ser usados para sanar e “compor” nulidades constantes da decisão administrativa, incluindo vícios resultantes da falta de imputação de factos concretos.
131. Em segundo lugar¸ a matéria constante dos factos provados 356A e 356B da Sentença, nos respectivos segmentos a que se reportam a activos, consubstancia uma factualidade totalmente nova face à factualidade provada na Decisão da CMVM e, por conseguinte, não integra sequer o objecto dos presentes autos.
132. Em terceiro lugar, a matéria do facto provado 370 da Sentença Recorrida configura, igualmente, uma inadmissível alteração dos factos, mesmo que com base no artigo 358.º do CPP.
133. A matéria relativa ao real e efectivo âmbito do Conselho Superior do G... e seus poderes constituiria (sem conceder) elemento essencial do ilícito típico que a Decisão da CMVM imputou ao ora Recorrente, a propósito da colocação do papel comercial da R..., S.A (inter alia com base em informação incompleta).
134. É que, sem isto, é de todo impossível imputar ao ora Recorrente qualquer ilícito-típico contra- ordenacional, até porque a operação de aquisição da E..., S.A pela R..., S.A nem foi concretizada aquando da reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014 e, após esta reunião, foram tomadas decisões que, sem as quais, não teria sido possível concretizar tal operação.
135. Ora, como já se disse acima, o mecanismo do artigo 358.º do CPP não visa, nem pode ser usado, para colmatar lacunas da Decisão da CMVM, pelo que a alteração preconizada no facto provado 370 da Sentença Recorrida, não se afigura possível, e o ora Recorrente opôs-se à mesma.
136. Por outro lado, a matéria constante do facto provado 370 da Sentença Recorrida contém matéria vaga e genérica – v. as expressões “para-societário”, “negócios estratégicos”, “centro decisório” e “sendo-lhe reconhecido poder para, de facto” –, que nem sequer consubstancia factos concretos.
137. Em face do exposto, é forçoso concluir que a alteração visada ao aditar o facto provado 370 à Sentença Recorrida não é sequer permitida, contém matéria jurídica e, em todo o caso, sempre configuraria uma alteração substancial dos factos, a que o ora Recorrente se opôs veementemente, pelo que sempre estaria vedada, por força do artigo 359.º do CPP.
138. Acresce que mesmo do ponto de vista meramente lógico, dizer que “algo” “para-societário” tem poder de decisão face às sociedades a que respeita é, inclusivamente, contraditório em si mesmo, tal como é o facto provado 370 da Sentença Recorrida.
139. Em quarto lugar, a alteração da matéria que foi dada como provada nos factos provados 516 a 519 da Sentença Recorrida tão-pouco se afigura inadmissível e, em qualquer caso, o ora Recorrente opôs-se à alteração visada nestes factos provados 516 a 519.
140. Os factos provados 516 a 519 da Sentença Recorrida contêm imputações subjectivas, a nível da culpa, que não constam da Decisão da CMVM e, em particular, excedem o âmbito dos factos provados 565., 566. e 568. da Decisão da CMVM.
141. Sem as imputações subjectivas inovadoras constantes dos factos provados 516 a 519 da Sentença Recorrida, não se afigura possível a imputação de qualquer ilícito ao ora Recorrente, a propósito da colocação do papel comercial da R..., S.A.
142. Assim, seja porque não está em causa uma alteração não substancial dos factos, seja porque o ora Recorrente não aceita a eventual alteração substancial dos factos que se possa entender estar vertida nos factos provados 516 a 519 da Sentença Recorrida, o ora Recorrente opôs-se a esta alteração.
143. Em quinto lugar, diga-se que o facto provado 633 da Sentença Recorrida contém uma impossibilidade fáctica, porquanto em 9 de Janeiro de 2014 nem sequer era sequer era seguro que a aquisição da E..., S.A pela R..., S.A seria concretizável, porquanto os contratos ainda não estavam fechados, não havia decisão das sociedades intervenientes no negócio e nem estavam obtidas a autorizações de terceiros (Cde...) que eram necessárias para tal operação.
144. Em sexto lugar, os factos provados 641 e 642 aditados à Sentença Recorrida são, igualmente, falsos, porquanto era informação pública e que tinha sido divulgada através da CMVM em 23 de Janeiro de 2014 que, em 22 de Janeiro de 2014, a R..., S.A havia adquirido a E..., S.A, através da Esa... SGPS S.A (cfr. fls. 9102 e 9103 do Volume 21).
145. Ora, como acabado de referir, nos novos factos provados 370, 516 a 519 da Sentença Recorrida estão em causa alterações substanciais dos factos previstos na decisão condenatória administrativa, porque se tratam de factos essenciais para o preenchimento dos ilícitos contra-ordenacionais imputados ao ora Recorrente a propósito da comercialização do papel comercial da R..., S.A.
146. No entanto, o Tribunal de 1.ª Instância procedeu às alterações substanciais dos factos da decisão condenatória administrativa elencadas supra, sem que tivesse obtido o acordo do ora Recorrente.
147. Em face do exposto, é forçoso concluir que, ao operar a alteração substancial da matéria de facto nos termos acima expostos, a Sentença recorrida violou o disposto no n.º 1 do artigo 359.º ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM.
148. Tudo sob pena de violação do direito de defesa do Recorrente, tal como se encontra consagrado no artigo 32.º, n.º 10, da CRP.
149. Assim, os artigos 359.º e 379.º, n.º 1, alínea b) do CPP, aplicados ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, interpretados no sentido de que as restrições aplicáveis à alteração substancial de factos descritos na decisão condenatória administrativa proferida em processo contra-ordenacional não se aplicam ao tribunal judicial que aprecia o recurso de impugnação judicial apresentado pelo arguido desse processo violam os artigos 2.º, 20.º, n.os 1 e 4, 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio de Estado de Direito que tem ínsitos os princípios da confiança e segurança jurídicas, acesso à tutela jurisdicional efectiva e as garantias do arguido em processo contra-ordenacional.
150. Por conseguinte, a Sentença Recorrida deve ser declarada nula e revogada, por violação do n.º 1 do artigo 359.º e n.º 1 do artigo 379.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO NE BIS IN IDEM: PROCESSO 58/... DO BANCO DE PORTUGAL (PROCESSO 182/16....)
DAS CONTRA-ORDENAÇÕES DE CONFLITOS DE INTERESSES PELA COLOCAÇÃO DE PAPEL COMERCIAL DA EI..., S.A
151. Nos presentes autos, a CMVM condenou o Recorrente pela alegada prática de três contra- ordenações por suposto conflito de interesses, na colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A em clientes do B... (cfr. parágrafo 19 da página 1168 da Decisão Recorrida).
152. A CMVM alega que o Recorrente teria, alegadamente, incorrido na prática destas contra- ordenações, porque, à data dos factos em causa, era, simultaneamente, administrador da EI..., S.A e do B... e, ao ter decidido que o B... colocasse papel comercial da EI..., S.A, junto dos seus clientes, terá causado e contribuído para uma situação de conflito de interesses, em que os interesses do B..., Epi..., S.A e os próprios interesses individuais daqueles teriam prevalecido sobre os interesses dos clientes do B... que investiram em papel comercial.
153. Também no processo de contra-ordenação n.º 58/... do Banco de Portugal foram imputados ao ora Recorrente alegados factos que determinaram a sua responsabilização contra-ordenacional pela alegada violação das regras de conflito de interesses, alegadamente consubstanciada na colocação de dívida da EI..., S.A, em clientes do B..., o que é do perfeito conhecimento da CMVM, quer no âmbito dos presentes autos, quer por dever de ofício (cfr. fls. 1.556 e 1.559 a 1.561 do Volume 4).
154. Donde resulta que, nos presentes autos, a CMVM volta a condenar o ora Recorrente pela alegada prática de três contra-ordenações por suposto conflito de interesses, ainda que por força da aplicação do artigo 309.º do CVM.
155. Esta circunstância determina que as imputações que, nos presentes autos, são dirigidas ao ora Recorrente, pela actuação em conflito de interesses impliquem um novo julgamento por grande parte dos factos pelos quais já foi julgado e condenado no âmbito daquele processo n.º 182/16...., o que viola o princípio ne bis in idem, previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP da CRP.
156. Contrariamente ao alegado na Decisão Recorrida, o facto de estarem em causa regimes sancionatórios diferentes não obsta à aplicação do princípio ne bis in idem, pois o que releva é a conduta do agente, ou seja, o facto praticado e já não a sua qualificação ou valoração jurídica, independentemente do regime sancionatório ou penal em que se integra.
157. Na verdade, este princípio vale na sua integralidade no âmbito do processo contra- ordenacional, por força da remissão prevista no artigo 32.º, n.º 10, da CRP e a sua violação é notória porquanto:
158. EM PRIMEIRO LUGAR, há identidade do agente, na medida em que o ora Recorrente foi acusado e condenado no referido processo de contra-ordenação 58/... e volta a ser confrontado com a imputação dos mesmos factos, na Acusação e, posterior Decisão Recorrida, dos presentes autos.
159. EM SEGUNDO LUGAR, há identidade dos factos legalmente relevantes, até porque uma parte substancial dos factos que serviram e base à decisão no processo n.º 58/... repetem-se nos presentes autos, nomeadamente, e com particular relevância para as contra-ordenações aqui em causa:
a) os factos societários relativos à EI..., S.A e ao seu enquadramento no G..., a composição do conselho de administração da EI..., S.A, as referências às funções de III e JJJ na EI..., S.A, as referências às ligações da Es... à EI..., S.A, as referências à Ec..., S.A., as referências relativas à E..., S.A e à R..., S.A,
b) os factos relativos à alegada intervenção nas decisões da EI..., S.A e, ainda, à preparação e acompanhamento da situação contabilística, financeira e da tesouraria da EI..., S.A e subavaliação do seu passivo correspondem à versão;
c) os factos relativos à colocação de dívida da EI..., S.A na carteira do fundo Elz... e, indirectamente, em clientes do B... (e a alteração ao RJOIC pelo Decreto-Lei n.º 63-A/2013);
d) os factos relativos ao procedimento de aprovação de colocação do papel comercial da EI..., S.A em clientes do B... (que se seguiu à redução de dívida EI..., S.A no fundo Elz...);
e) os factos relativos à identificação da situação da EI..., S.A no ETRICC 2 (incluindo a alegada intervenção do Recorrente) e suspensão da colocação de papel comercial da EI..., S.A;
f) os factos relativos às qualidades do Recorrente, enquanto administrador da EI..., S.A e do B..., e a uma alegada situação de conflito de interesses na intervenção do processo de colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B...;
g) os factos relativos à alegada condução da actividade e tomada de decisões quanto à EI..., S.A (incluindo quanto à emissão de dívida), pelo Recorrente.
160. Resulta, assim, evidente que os factos integradores da contraordenação por conflito de interesses no presente processo são, essencialmente, os mesmos factos integradores da contraordenação por conflito de interesses no processo n.º 58/... do Banco de Portugal.
161. De resto, como a CMVM bem sabe, no processo de contra-ordenação 58/..., também foram imputados ao ora Recorrente alegados factos que determinaram a sua responsabilização contra-ordenacional pela alegada prática de actos em conflito de interesses.
162. Neste contexto, note-se que a CMVM confunde factos praticados pelo agente com a consequência da conduta do agente (sem conceder): uma coisa é o facto praticado pelo agente; outra, muito diferente, mas irrelevante para a aplicação do princípio ne bis in idem, é a valoração jurídica (i.e., consequência) desse facto, o que, como vimos, não obsta à aplicação do princípio ne bis in idem.
163. EM TERCEIRO LUGAR, verifica-se igualmente a identidade do bem jurídico: a proibição do conflito de interesses previsto nas aludidas normas do RGICSF e do CVM visa a protecção daqueles que confiam nas instituições financeiras, ou seja, tutela-se o princípio da confiança.
164. A circunstância de estarem em causa ilícitos de perigo abstracto torna ainda mais evidente a violação do princípio ne bis in idem.
165. O Recorrente já foi julgado e condenado pela criação do perigo que está também em causa nos presentes autos: o perigo de lesar a confiança daqueles que podem ser prejudicados pela existência dos conflitos de interesses, que, no caso em questão, seriam os clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A (sem nunca conceder).
166. A confiança depositada no funcionamento do sistema é apenas uma e é indivisível por sectores de regulação.
167. O perigo criado a essa confiança é necessariamente o mesmo, quer as normas em causa tenham sido pensadas para preservar directamente os interesses dos investidores e de quem se move no mercado, quer tenham sido pensadas para regular o funcionamento da própria instituição e, apenas consequentemente, preservar os interesses dos investidores e de quem se move no mercado (sem nunca conceder).
168. Em suma, o ora Recorrente já foi acusado pelos factos que fundamentam as três contra-ordenações indicadas no parágrafo 19 da página 1168 da Decisão Recorrida, pelo que a imputação daquelas contra-ordenações viola o princípio ne bis in idem consagrado no n.º 5 do artigo 29.º da CRP.
DA CONTRA-ORDENAÇÃO RELATIVA À VIOLAÇÃO DA QUALIDADE DE INFORMAÇÃO NA COLOCAÇÃO DE PAPEL COMERCIAL DA EI..., S.A
169. A violação do princípio ne bis in idem estende-se igualmente à imputação feita ao Recorrente, quanto à contra-ordenação pela alegada violação dos deveres relativos à qualidade de informação prestadas aos clientes do B..., respeitante ao papel comercial da EI..., S.A (cfr. subalínea iv) do parágrafo 19 da página 1168 da Decisão Recorrida).
170. É que, no aludido processo n.º 58/..., foram imputados ao Recorrente alegados factos que determinaram a sua responsabilização contra-ordenacional pela colocação de papel comercial da EI..., S.A, em clientes do B..., com base na utilização e divulgação de contas deste emitente, com o seu passivo sub-avaliado em cerca de € 1,3 milhões, por referência a 31 de Dezembro de 2012 (sem conceder), o que motivou a condenação do ora Recorrente pela alegada prática de contra-ordenação de gestão ruinosa, prevista e punida, à data dos factos, na al. l) do artigo 211.º do RGICSF (na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de Agosto).
171. Esta condenação (sem conceder), pela alegada contra-ordenação de gestão ruinosa, abrange o desvalor jurídico subjacente à alegada contra-ordenação relativa à suposta violação do artigo 7.º do CVM.
172. O que determina que as imputações que, nos presentes autos, são dirigidas ao Recorrente, pela alegada violação dos deveres relativos à qualidade de informação prestada aos clientes do B..., respeitante ao papel comercial da EI..., S.A, implique um novo julgamento, pelos mesmos factos, o que, mais uma vez, viola o princípio ne bis in idem.
173. EM PRIMEIRO LUGAR, em ambos os processos o agente visado pela responsabilidade contra-ordenacional é o ora Recorrente, na sua qualidade de administrador do B..., pelo que há identidade do agente.
174. EM SEGUNDO LUGAR, há identidade dos factos legalmente relevantes, porquanto serviram de fundamento à referida condenação do ora Recorrente os mesmos factos que servem de fundamento à contra-ordenação no âmbito do presente processo (nomeadamente, os factos referentes ao conhecimento da real situação financeira da EI..., S.A e os factos relativos às notas informativas do papel comercial a EI..., S.A, em que foram divulgadas as contas de 31 de Dezembro de 2012, com o passivo subavaliado em € 1,3 mil milhões).
175. EM TERCEIRO LUGAR, também existe identidade do bem jurídico, porquanto em ambos os casos está em causa a salvaguarda da segurança e confiança das operações e investimentos que os clientes das instituições financeiras fazem através destas, neste caso do B..., enquanto intermediário financeiro.
176. Também aqui, não se exigindo uma lesão concreta do bem jurídico tutelado, mas antes apenas o perigar desse bem jurídico, então o perigo alegadamente criado é necessariamente uno e comum a todos os sectores regulados pelos diferentes reguladores.
177. Resulta, assim, demonstrado que o ora Recorrente já foi acusado pelos factos que fundamentam a contra-ordenação de que foi condenado na subalínea iv) do parágrafo 19 da página 1168 da Decisão Recorrida, pelo que, a imputação daquela contra-ordenação viola o princípio ne bis in idem consagrado no n.º 5 do artigo 29.º da CRP.
NULIDADE DA DECISÃO FINAL POR IMPUTAÇÃO GENÉRICA DE FACTOS E CONSEQUENTE NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA
178. Andou mal a Sentença Recorrida ao ter indeferido a nulidade da Acusação e Decisão da CMVM, por falta de concretização dos elementos de facto em que assentavam as imputações dirigidas aos arguidos.
179. Nos termos dos artigos n.º 1 do artigo 50.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, artigo 410.º- A, n.º 2, do CVM e 283.º, n.º 3 – al. b), do CPP, aplicável ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, a decisão condenatória deve indicar elementos de facto e as circunstâncias de modo, tempo e lugar dos factos imputados.
180. Até porque a imputação de matéria ou “factos” genéricos e não circunstanciados impede os arguidos de poderem rebater, efectivamente, as imputações, sendo simplesmente impossível exercer o contraditório, de forma efectiva e concreta, a imputações genéricas, o que viola o direito de defesa consagrado no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa.
181. Algumas das imputações feitas nestes autos ao Recorrente pela CMVM e, agora, pelo Tribunal, são feitas de forma absolutamente genérica e com recurso a variados conceitos vagos e indeterminados.
182. Neste contexto, importa salientar que não obstante as contra-ordenações aqui em causa não assentarem, directamente, na adulteração das contas da EI..., S.A, este facto – imputado ao ora Recorrente pela CMVM – fundamenta, efectivamente, a imputação das contra-ordenações aqui em causa ao ora Recorrente.
183. Assim, a forma como os factos relacionados com as contas da EI..., S.A são imputados ao ora Recorrente na Decisão da CMVM e na Sentença Recorrida são relevantes para os presentes autos.
184. Ora, a verdade é que, no que diz respeito ao ora Recorrente, os factos relacionados com as contas da EI..., S.A são todos, sem excepção, genéricos e conclusivos, não se imputando uma concreta actuação ao ora Recorrente. É o que sucede nos factos provados 114., 117., 119., 120., 127., 128. a 131., 137., 544. a 549., 553. a 555., 557., 558.º, 562., 563. e 565. da Decisão da CMVM e que correspondem aos factos provados 101, 104, 106, 107, 114 a 118, 124, 490 a 495, 499 a 501, 503, 504, 508 e 509, 511 da Sentença.
185. A título de exemplo, nesses factos são utilizadas expressões como “acompanhamento da situação patrimonial” e “acompanhava e apreciava a situação financeira”, sem, porém, se concretizar minimamente como alegadamente teria sido feito esse acompanhamento e essa apreciação.
186. Acresce que nem sequer é concretizado de que forma, como, quando, onde é que tal “acompanhamento” e “apreciação” teria sido feito.
187. É igualmente imputado o reporte de informações sem que alguma vez se concretize o “como”, “quando”, “em que termos” e “onde” tais reportes seriam feitos e qual a informação que seria reportada.
188. O que vai exposto vale igualmente para as pretensas decisões imputadas ao ora Recorrente: não é, em caso algum, concretizado minimamente em que termos, onde, quando, como, tais decisões seriam alegadamente adoptadas.
189. Aliás, na generalidade dos casos nem sequer é imputada uma actuação do Recorrente, o que, aliás, bem se compreende, pois a mesma não é concretizada, por qualquer forma.
190. Do exposto resulta, portanto, que a CMVM proferiu a Decisão Recorrida sem que tenha sido assegurado um efectivo direito de defesa do ora Recorrente.
191. E o facto de o Recorrente ter exercido – nas condições de que dispunha – o direito de defesa e de recurso não é suficiente para suprir a violação de lei de que padece a Decisão condenatória da CMVM.
192. A sanção pela falta do requisito da descrição dos factos imputados na decisão condenatória, previsto no artigo 414.º-A, n.º 2, do CVM e na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CVM, é a nulidade da decisão.
193. Em face do exposto, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 283.º e no n.º 1 do artigo 122.º, ambos do CPP (por remissão dos artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM), a da Decisão Recorrida deve ser declarada NULA, por falta de concretização dos factos imputados ao Recorrente, em violação do disposto no artigo 58.º, n.º 1, do RGCO e no artigo 414.º-A, n.º 2, do CVM.
NULIDADE DO PROCESSO POR UTILIZAÇÃO DE PROVA PROIBIDA E NULA PRODUZIDA NO PROCESSO N.º 58/...
194. O presente processo e, consequentemente, a Acusação e Decisão Final aqui proferidas e, bem assim, a Sentença Recorrida são nulas, por a CMVM ter utilizado prova proibida e nula que foi produzida no processo de contra-ordenação n.º 58/... promovido pelo Banco de Portugal.
195. EM PRIMEIRO LUGAR, a prova obtida pela CMVM, no âmbito do presente processo, foi completamente condicionada e dependente da prova produzida no processo de contra-ordenação n.º 58/..., a qual, porém, padecia de nulidade.
196. O aludido processo n.º 58/... foi “transportado” ou “integrado”, com todos os seus elementos (e vícios) até à data da respectiva Acusação, para os presentes autos em 6 de Agosto de 2015 (fls. 1.554, Volume 4), numa fase muito incipiente e quando ainda nenhuma prova havia sido carreada para os presentes autos, nem havia sido realizada qualquer diligência probatória.
197. A importação do processo n.º 58/... guiou e condicionou as diligências probatórias realizadas nos presentes autos.
198. Em virtude do conhecimento que teve das inquirições feitas no processo n.º 58/..., a CMVM promoveu a inquirição das seguintes testemunhas em comum: III, JJJ e EE (tendo este vindo a ser acusado), VV, TT, XX, UU, CCC, KK e YY.
199. Imediatamente na sequência da “incorporação” do processo n.º 58/..., a CMVM procedeu à extracção de documentos e elementos que constavam daquele processo, tendo-os replicado nos presentes autos uma segunda vez.
200. Em virtude do conhecimento que a CMVM teve das diligências de prova do processo n.º 58/..., a CMVM procedeu a pedidos de informação e elementos a terceiros, com vista à sua incorporação nos presentes autos.
201. A circunstância de a incorporação do processo n.º 58/... nos presentes autos ter sido realizada ao abrigo de mecanismos de cooperação lícitos e legalmente previstos (sem conceder), não transforma a prova “incorporada”, originariamente nula, em prova lícita.
202. EM SEGUNDO LUGAR, o processo n.º 58/... contém prova proibida e nula − anterior à prolação da Acusação nesses autos.
203. POR UM LADO, a fls. 708 (Volume 4) do processo n.º 58/... (cfr. DVD de fls. 1.561 dos presentes autos) foi junto um CD que contém o registo fonográfico das reuniões do chamado “Conselho Superior do G...”, cujas gravações inicialmente o ora Recorrente desconhecia e, em qualquer caso, nunca consentiu na sua utilização / divulgação.
204. Com a gravação não consentida, desde o início, e/ou com a divulgação nunca consentida, foi praticado, por um dos participantes nas reuniões gravadas, o crime de gravações ilícitas, previsto e punido no artigo 199.º do Código Penal.
205. O Banco de Portugal decidiu admitir a junção ao processo n.º 58/... daquelas gravações (ou, pelo menos, utilização) ilícitas, tendo a CMVM, por sua vez, “importado” este vício para os presentes autos, através da “incorporação” do processo n.º 58/....
206. Esta prova está ferida de nulidade, por ter, a montante, a prática de crimes, não sendo admissível, nem passível de valoração, nos termos dos artigos 125.º, 126.º, n.º 3, e 167.º do Código de Processo Penal (ex vi artigos 407.º do CVM e 41.º, n.º 1, do RGCO).
207. Todas as provas que tiverem sido alcançadas por via do registo áudio em causa são igualmente prova afectada pela nulidade e proibição de valoração inicial, tal como consagra o artigo 122.º do Código de Processo Penal, o que, aliás, afecta, a título de exemplo, a matéria imputada nos artigos 386. a 410., 541., 570., 578., 592., 599., 609., 616., 619., 626., 613., 638., 640. e 661. da Acusação, nos factos provados 383. a 408., 538., 566., 587., 604., 613., 623. da Decisão Final e os factos provados 369., 372., 373., 379., 380., 484. e 512. da sentença da 1.ª Instância.
208. POR OUTRO LADO, toda a prova produzida no processo n.º 58/... assentou e dependeu de duas inquirições, nulas, feitas no início da fase administrativa desse processo, nomeadamente das aí “testemunhas” III e JJJ, que condicionaram e contaminaram toda a actividade instrutória ulterior daquele processo e, mediante a incorporação desse processo nos presentes autos, também toda a actividade probatória promovida pela CMVM, após fls. 1.561 dos presentes autos.
209. Primeiro, não obstante III ter reconhecido que falsificou as contas da EI..., S.A, desde 2009 a 2013 (por referência aos exercícios de 2008 a 2012) e que sabia que a dívida desta sociedade era colocada nos fundos Elz... e Eren..., num primeiro momento, e directamente nos clientes do B..., num segundo momento (mesmo com a falta de credibilidade e inúmeras incongruências dos seus depoimentos), o mesmo manteve sempre a qualidade de “testemunha” no processo n.º 58/....
210. Apesar de a “testemunha” III ter reconhecido que cometeu ilícitos penais e contra-ordenacionais (desde logo, com relevância à luz do RGICSF), o que imporia a sua constituição como arguido, acusação e condenação, III nem sequer foi constituído arguido no processo n.º 58/....
211. Tudo, não obstante a constituição de arguido ser um acto vinculado e legalmente obrigatório, nos termos do disposto nas als. a) e d) n.º 1 do artigo 58.º do CPP, aplicável com as devidas adaptações ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
212. O Banco de Portugal quis utilizar e utilizou III no processo n.º 58/... como um (falso) delator premiado, o que é inadmissível na ordem jurídica portuguesa.
213. Esta circunstância é, ainda, mais clara e evidente, quando se tem em conta que III surgiu no processo n.º 58/... através da proximidade e conhecimento pessoal do Dr. LLL, que foi nomeado instrutor do processo n.º 58/... escassos dias depois de integrar o Banco de Portugal.
214. Não tendo III sido formalmente constituído arguido no processo n.º 58/... durante a sua inquirição pré-acusação nesse processo, foram violados os limites previstos no n.º 4 do artigo 103.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do CPP, o que determina a sua invalidade.
215. Os depoimentos de III no processo n.º 58/... que foram incorporados nos presentes autos são nulos e constituem um elemento de prova proibida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 126.º, n.os 1 e 2 - al. a), do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
216. Segundo, o mesmo vale para a inquirição da “testemunha” JJJ, de fls. 580 a 601 de nesse mesmo processo, cujo auto foi junto a fls. 1.561, mediante a “incorporação” do processo n.º 58/....
217. Apesar de a inquirição de JJJ a fls. 580 a 601 do processo n.º 58/... auto-imputar a prática de alegados factos ilícitos, com relevância contra-ordenacional, aquele não foi constituído arguido pelo Banco de Portugal, em contrapartida de imputar alegados factos ilícitos ao ora Recorrente.
218. Não tendo JJJ sido formalmente constituído arguido na sua inquirição pré-acusação no processo n.º 58/..., foram violados os limites previstos no n.º 4 do artigo 103.º do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do CPP.
219. Na inquirição de JJJ de fls. 580 a 601 do processo n.º 58/..., este não foi advertido pelo Banco de Portugal que poderia recusar responder às questões se daí lhe adviesse responsabilidade contra-ordenacional ou penal.
220. Na inquirição desta mesma testemunha na fase pós-acusatória do processo n.º 58/..., o Banco de Portugal fez essa advertência e JJJ recusou responder às questões da Defesa do ora Recorrente.
221. Após da inquirição de JJJ antes da prolação da acusação no processo n.º 58/..., o Banco de Portugal remeteu o respectivo auto de inquirição desta “testemunha” para o Ministério Público, tendo, por força da inquirição feita no processo n.º 58/..., JJJ sido constituído arguido no processo crime n.º 324/14.....
222. EM TERCEIRO LUGAR, a junção do processo n.º 58/... aos presentes autos – incluindo toda a prova produzida, e aí incluindo prova nula − fez com que toda a prova produzida nos presentes autos daí por diante seja, igualmente, nula, por força da doutrina ou teoria dos frutos da árvore envenenada.
223. Essa nulidade atinge a Acusação deduzida pela CMVM, a Decisão Final e a Sentença Recorrida.
224. Primeiro, existe uma evidente dependência cronológica, lógica e valorativa entre os elementos de prova obtidos no processo n.º 58/... e os presentes autos.
225. Segundo, o facto de a prova em causa não ter sido declarada nula no processo n.º 58/... não impede que seja declarada nula no âmbito dos presentes autos.
226. O vício resultante da proibição de prova não se encontra abrangido pelo caso julgado.
227. Os presentes autos não podem, simultaneamente, ser autónomos ao ponto de permitir a subsunção de um mesmo comportamento do Recorrente a tipos de ilícito contra-ordenacional diferentes dos do processo n.º 58/... (sem nunca conceder) e não serem autónomos ao ponto de permitir uma nova valoração da mesma prova.
228. Terceiro, não é aplicável in casu nenhum dos limites à teoria dos frutos da árvore envenenada, em particular o invocado pela CMVM e pela 1.ª Instância.
229. Por um lado, pelos menos relativamente à prova obtida através do CD que contém o registo fonográfico das reuniões do “Conselho Superior do G...”, a CMVM limitou-se a incorporar essa prova, sem mais.
230. A CMVM não realizou qualquer diligência “independente” para obtenção desse meio de prova.
231. Por outro lado, a CMVM não é uma entidade independente para este efeito, porquanto foi condicionada pelo conhecimento que obteve mediante a incorporação dos autos n.º 58/... numa fase muito incipiente do presente processo.
232. No presente caso, não há uma fonte independente, desde logo, porque não há qualquer meio de prova anterior que permitisse induzir, probatoriamente, o mesmo que resultou do meio de prova inválido.
233. Recorde-se que os elementos probatórios relativos ao processo de contra-ordenação n.º 58/... foram integrados nos presentes autos numa fase em que a CMVM nem sequer tinha expedido qualquer notificação para qualquer testemunha.
234. A prova proibida e ilegal acima identificada foi conditio sine qua non da descoberta dos novos factos pela CMVM e contaminou, de forma essencial e irremediável, todo o rumo e actividade instrutória dos presentes autos, a partir de fls. 1.559 a 1.561 (inclusive).
235. Quarto, a nulidade por utilização de prova nula, atento o seu efeito à distância, verifica-se também na Decisão Final e na Sentença Recorrida e em quaisquer actos subsequentes à diligência probatória.
236. EM FACE DO EXPOSTO, a prova produzida a partir de fls. 1.559 a 1.561 (inclusive) e, bem assim, a Acusação e Decisão Final formuladas contra o ora Recorrente a Sentença Recorrida são nulas, por utilização de prova proibida, nos termos do disposto no artigo 126.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E MÉTODOS PROIBIDOS DE PROVA
237. A Acusação, a Decisão Final e, agora, a sentença de 1.ª Instância são ainda nulas, porquanto violam, de forma flagrante, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP, dado que, perante os mesmos meios de prova, a CMVM decidiu (e a 1.ª Instância ratificou-o), de forma absolutamente arbitrária, imputar a alegada prática de uma contra-ordenação ao ora Recorrente, mantendo os demais supostos intervenientes, como testemunhas, em violação do disposto nas als. d) e e) do n.º 2 do artigo 126.º do CPP.
238. EM PRIMEIRO LUGAR, não se compreende como foi imputada ao Recorrente a prática de uma contra-ordenação pela alegada violação dos deveres relativos à qualidade de informação prestadas aos clientes do B..., respeitante ao papel comercial da EI..., S.A e, simultaneamente, III, JJJ e CCC não foram sequer constituídos arguidos nos presentes autos, imputando-lhes a prática da mesma contra-ordenação (sem conceder).
239. Se com base nos depoimentos de III, JJJ e CCC, a CMVM entendeu que existiria fundamento para imputar a aludida contra-ordenação ora Recorrente, então, com base nesses mesmos depoimentos e indícios, deveria tê-la imputado também aos próprios III, JJJ e CCC.
240. A serem verdade as circunstâncias relatadas por III nos seus depoimentos, JJJ e CCC teriam, necessariamente, de saber que III falsificou as contas da EI..., S.A, desde 2009 a 2013 (por referência aos exercícios de 2008 a 2012).
241. JJJ e CCC teriam também de saber que a dívida da EI..., S.A era colocada nos fundos Elz... e Eren..., num primeiro momento, e directamente nos clientes do B..., num segundo momento.
242. A considerarem-se provados factos que permitissem imputar uma contra-ordenação ao ora Recorrente (sem conceder), os mesmos factos determinariam que essa mesma contra- ordenação fosse imputada a III, JJJ e CCC.
243. III, JJJ e CCC intervieram neste processo apenas como testemunhas, com a agravante de o ora Recorrente ter sido impedido de contraditar os depoimentos das referidas “testemunhas”.
244. A constituição de arguido é um acto vinculado e legalmente obrigatório, nos termos do disposto nas als. a) e d) do n.º 1 do artigo 58.º do CPP, aplicável com as devidas adaptações ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
245. A CMVM omitiu a prática de um acto vinculado.
246. Não se trata aqui de o Recorrente exigir que as referidas testemunhas sejam constituídas arguidas; do que se trata é de o Recorrente alegar que foram preteridos actos obrigatórios e de essa preterição determinar a nulidade dos actos praticados após a Acusação e após a Decisão Final.
247. Perante os mesmos elementos de prova e os mesmos indícios, a CMVM proferiu diferentes juízos em casos idênticos: uma acusação e condenação num caso e a não constituição de arguidos noutro caso.
248. A actuação (ou omissão) da CMVM, que foi ratificada pela 1.ª Instância, é violadora do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da CRP e contamina os actos praticados de nulidade.
249. EM SEGUNDO LUGAR, III, JJJ e CCC mantiveram a sua qualidade de testemunha em contrapartida de prestarem depoimento no presente processo.
250. Em substância, a CMVM utilizou III, JJJ e CCC neste processo como (falsos) delatores premiados, o que é inadmissível na ordem jurídica portuguesa à luz do disposto no artigo 126.º, n.os 1 e 2 - als. d) e e), do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
251. Tudo, para que III, JJJ e CCC não tivessem qualquer constrangimento em imputar factos ilícitos ao ora Recorrente, sabendo aqueles de antemão que beneficiariam da contrapartida e promessa inadmissível que nunca deixariam de ser apenas testemunhas.
252. Ao omitir a prática de um acto vinculado e legalmente obrigatório consubstanciado na constituição de III, JJJ e CCC como arguidos, no presente processo, as suas inquirições aqui realizadas são nulas e enfermam de nulidade toda a prova produzida, nos presentes autos de contra-ordenação promovidos pela CMVM, por força do disposto nos artigos 58.º, n.º 1 - als. a) e d), 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d), do CPP, aplicáveis com as devidas adaptações ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
253. Os artigos 385.º, n.º 1 - al. a) e 407.º do CMV, artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e o artigo 126.º, n.os 1 e 2 - als. d) e e), do CPP, se interpretados e aplicados no sentido de que a CMVM pode ouvir uma pessoa como testemunha num processo de contra-ordenação, com a faculdade de não a constituir arguida, para recolher indícios suficientes para aí deduzir acusação, quando, pelos mesmos indícios factuais, aquela testemunha é constituída arguida em processo-crime, violam os artigos 1.º, 2.º e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e do Estado-de-Direito, e as garantias de defesa em processo contra-ordenacional e, por isso, são inconstitucionais.
254. A Acusação e, em consequência, a Decisão Final e a sentença da 1.ª Instância, no segmento em que imputaram e condenaram o ora Recorrente pela alegada prática de uma contra-ordenação por suposta violação dos deveres relativos à qualidade de informação prestadas aos clientes do B..., respeitante ao papel comercial da EI..., S.A, são nulas, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da CRP.
DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA CCC E NULIDADE DA ACUSAÇÃO, DA DECISÃO FINAL E DA SENTENÇA RECORRIDA
255. Na sequência da junção do processo n.º 58/... aos presentes autos (a fls. 1.559 a 1.561), em 11 de Dezembro de 2015, o Conselho de Administração da CMVM deliberou proceder à inquirição da testemunha CCC, no quadro da cooperação com a instituição congénere da ... – FINMA (cfr. fls. 2.035 e ss.).
256. Conforme resulta de fls. 4.487, em 12 de Abril de 2016, deu entrada nos presentes autos um Ofício da FINMA - Autorité Fédérale de Surveillance des Marchés Financiers, sobre o assunto “Your request for international assistance in the matter of the hearing of Mr CCC”, encontrando-se junto em anexo documento redigido em francês intitulado “Audition de CCC du 5 avril 2016 à 9 heures” (cfr. fls. 4.489 e ss.).
257. A alegada inquirição de CCC suscita, desde logo um vício, porquanto nos presentes autos, não constam quaisquer pedidos de cooperação internacional remetidos pela CMVM para a FINMA e, muito menos, qualquer pedido de cooperação internacional, de 15 de Janeiro de 2016.
258. Esta circunstância consubstancia uma nulidade–ou, subsidiariamente, uma irregularidade –, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d), do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 407.º do CVM.
259. Caso assim não se entenda, sempre estaríamos perante uma preterição do direito de defesa do Recorrente, em evidente violação do disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.
260. É que a falta da documentação do pedido de cooperação internacional consubstancia a insuficiência do inquérito/instrução, pela falta da prática de um acto legalmente obrigatório.
Vejamos.
261. EM PRIMEIRO LUGAR, a não junção aos autos do pedido de cooperação internacional consubstancia, efectivamente, a falta da prática de um acto legalmente obrigatório, porquanto vigora no âmbito do IOSCO MMoU – tal como na Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal – o princípio da especialidade.
262. O próprio IOSCO MMoU prevê que os pedidos de cooperação têm de ser feitos por escrito, contendo determinadas informações, apenas podendo a informação obtida através do mesmo ser utilizada para fins específicos (cfr, parágrafos 8 e 10 do IOSCO MMoU).
263. Existem regras e procedimentos específicos que têm de ser cumpridos e que visam tutelar os interesses das partes, designadamente, dos arguidos.
264. Aliás, neste contexto em particular, saliente-se que tanto a Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal (aprovada pela Lei n.º 144/99 , de 31 de Agosto) como o próprio CPP são, evidentemente, aplicáveis aos presentes autos, desde logo, nos termos do artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
265. Como a própria Sentença reconhece, pelo menos a notificação para o exercício do direito de audiência e defesa do arguido (artigos 414.º-A, n.º 1, do CVM e 50.º do RGCO) é um acto legalmente obrigatório na fase administrativa dos processos de contra-ordenação, enquanto corolário do direito fundamental de defesa dos arguidos em processos contra-ordenacionais.
266. Está em causa mais do que controlar o conteúdo da prova ou realizar a contra-inquirição das testemunhas: está também e desde logo em causa a possibilidade de o arguido confirmar que a prova foi obtida de forma legítima e em conformidade com as regras legais aplicáveis.
267. O que, naturalmente, pressupõe que seja transmitido ao arguido todos os elementos e documentos que lhe permitam exercer o seu direito de defesa, incluindo o direito a controlar a validade da prova, pelo que é irrelevante que o IOSCO MMoU não consigne qualquer norma que determine a obrigatoriedade de os pedidos de auxílio mútuo constarem do processos (cfr. parágrafo 79, da pá. 45, da Decisão Recorrida).
268. O que releva é que a inclusão de tal pedido é um elemento necessário para que a notificação a para o exercício do direito de audiência e defesa do arguido (artigos 414.º-A, n.º 1, do CVM e 50.º do RGCO) – acto legalmente obrigatório na fase administrativa dos processos de contra- ordenação – seja cumprido.
269. Ora, ao não juntar aos autos o pedido de cooperação internacional, o Recorrente encontra-se, em absoluto, impedido de controlar e sindicar tour court a forma como a prova foi obtida.
270. O que configura uma violação insanável do direito de defesa do ora Arguido, em violação do disposto nos artigos 414.º-A, n.º 1, do CVM, 50.º do RGCO e, ainda, 32.º, n.º 10, da CRP.
271. Aliás, os artigos 414.º-A, n.º 1, do CVM e 50.º do RGCO, interpretados no sentido de que o pedido de cooperação internacional enviado a autoridade judiciária estrangeira para efeitos de produção de prova em processo contra-ordenacional não tem que constar do processo ou não tem que ser especificamente notificado ao arguido em processo contra-ordenacional, é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
272. EM SEGUNDO LUGAR, a afirmação de que o pedido dirigido à FINMA consiste numa formalidade que não apresenta qualquer relação com a produção da prova testemunhal propriamente dita não tem qualquer fundamento, uma vez que é desse pedido que decorre a concreta produção desta prova testemunhal, sem o qual a mesma não tinha sido produzida.
273. EM TERCEIRO LUGAR, a invalidade da prova de fls. 4.492 a 4.508 afecta a própria Acusação e, consequentemente, a Decisão Final e, ainda, a Sentença Recorrida.
274. Com efeito, a Acusação é um acto processual que, logicamente, está dependente da prova produzida em fase anterior, pelo que a nulidade em causa não afecta apenas a prova de fls. 4.492 a 4.508, mas também a própria Acusação.
275. O que vai exposto é, de resto, comprovado pela circunstância de serem os factos dados como provados na Decisão Final e na Sentença Recorrida com base naquele depoimento.
276. EM QUARTO LUGAR, caso se entenda que a invalidade ora suscitada não consubstancia uma nulidade, mas sim uma irregularidade, a mesma nunca se poderia considerar sanada.
277. Na Defesa Escrita foram desde logo suscitadas as invalidades aqui em causa (cfr. artigos 378.º a 413.º da Defesa Escrita).
278. Mas ainda que assim não fosse, sem conceder, a verdade é que, atenta a extensão do direito de impugnação judicial dos arguidos em processo contra-ordenacional, a invalidade aqui em causa não se sanaria pela simples circunstância de não ter sido suscitada na Defesa Escrita.
279. Com efeito, a impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa em sede de processo de contra-ordenação – como aquela que deu causa aos presentes autos – tem sido unanimemente classificada pela doutrina e jurisprudência nacionais como um recurso de jurisdição plena, no qual o tribunal tem plenos poderes para decidir do mérito da causa em toda a sua extensão.
280. Isto implica que, em linha com o sentido unânime da Jurisprudência, o Recorrente em processo contra-ordenacional pode, no limite, optar por não deduzir qualquer tipo de defesa na fase administrativa do processo e concentrar toda a sua defesa na fase judicial, sem que lhe possa ser aposta qualquer intempestividade no exercício de direitos por esse facto.
281. Portanto, a questão da irregularidade da prova de fls. 4.492 a 4.508 e, bem assim, da Acusação formulada nos presentes autos e, consequentemente, da Decisão Final foi suscitada, de forma tempestiva, no recurso de impugnação judicial interposto pelo ora Recorrente da decisão condenatória proferida pela CMVM.
282. Por conseguinte, a Acusação e, consequentemente, a Decisão Final e a Sentença Recorrida, enfermam de nulidade – ou, subsidiariamente, de irregularidade –, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.º 1, e 120.º, n.º 2 - al. d), do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 407.º do CVM, bem como por violação do disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.
VIOLAÇÃO DO DIREITO DE DEFESA E NULIDADE POR FALTA DE PRODUÇÃO DE PROVA: INDEFERIMENTO DA INQUIRIÇÃO DA TESTEMUNHA CCC
283. Na fase pré-acusatória dos presentes autos, a CMVM procedeu à inquirição da testemunha CCC, em 5 de Abril de 2016, através dos mecanismos de cooperação internacional, cujo respectivo auto de inquirição foi inicialmente juntos aos autos em francês, tendo o ora Recorrente apenas sido notificado da junção aos autos da respectiva tradução para português em Junho de 2021.
284. Na sequência daquela notificação, o ora Recorrente, tendo agora finalmente apreendido o conteúdo do depoimento daquela testemunha, requereu a inquirição da mesma, para efeitos de contraditório, o que foi indeferido pela CMVM.
285. A Sentença Recorrida também indeferiu a nulidade e, subsidiariamente, a irregularidade, da Decisão Final, por violação insanável do direito de defesa do ora Recorrente, em violação do disposto no artigo 50.º do RGCO e, ainda, 32.º, n.º 10, da CRP, invocada no recurso de impugnação.
286. Ora, o indeferimento da inquirição da testemunha CCC constitui uma violação elementar do direito de defesa do Recorrente que, por causa daquela decisão, se viu privado de produzir prova, assim determinando a NULIDADE e, subsidiariamente, IRREGULARIDADE, dessa decisão e de todos os actos subsequentes, incluindo a Decisão Final e agora a Sentença Recorrida.
287. EM PRIMEIRO LUGAR, o facto de a CMVM ter promovido a tradução do depoimento da testemunha CCC e de o ter notificado ao ora Recorrente é a prova provada de que a CMVM deveria ter, desde o início, procedido à tradução daquele documento e deveria tê-la notificado ao ora Recorrente para que este pudesse exercer o direito de contraditório.
288. EM SEGUNDO LUGAR, ao não ter procedido à tradução do depoimento da testemunha CCC, a CMVM violou, efectivamente, o direito de defesa do ora Recorrente.
289. Desde logo, a norma do artigo 410.º-A do CVM , invocada pela CMVM, não é aplicável ao caso dos presentes autos, porquanto apenas entrou em vigor após a notificação da Acusação deduzida nestes autos ao ora Recorrente, pelo que a CMVM estava, efectivamente, obrigada a proceder à tradução daquele depoimento.
290. São aplicáveis, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, o disposto nos artigos 92.º, n.os 1 e 6, e 166.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, os quais impunham que o depoimento da testemunha CCC tinha que ter sido traduzido.
291. Tratando-se da Acusação deduzida contra o Recorrente e de documento que sustenta os factos que lhe são imputados, não há dúvidas que o mesmo não poderia encontrar-se no processo em língua estrangeira, desacompanhado de tradução, pelo que a Acusação contra o Recorrente está irremediavelmente ferida de nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 120.º do Código de Processo Penal.
292. Em todo o caso, ainda que se entendesse não ser aplicável o artigo 92.º do CPP, aplicável ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM (sem conceder), sempre se terá que concluir que, por aplicação do artigo 166.º do CPP, aquele depoimento devia ter sido traduzido antes da dedução da Acusação.
293. EM TERCEIRO LUGAR, também não assiste qualquer razão à Sentença quanto ao pretenso conhecimento ou domínio, pelo Recorrente, da língua em que se encontra o depoimento da testemunha CCC, pois, por um lado, nem a lei, nem os tribunais, fazem depender a necessidade de tradução prevista no artigo 166.º, n.º 1, do CPP, na perspectiva puramente subjectiva do conhecimento / domínio da língua por parte da Defesa.
294. Por outro lado, o artigo 166.º, n.º 1, do CPP exige ainda que o documento possa valer como defesa em todos os momentos processuais, que se estendem muito além do momento inicial de análise e resposta à Acusação.
295. Assim, a circunstância de a CMVM não ter procedido à tradução do depoimento da testemunha CCC, antes da notificação da Acusação ao Recorrente, impediu-o, efectivamente, de conhecer o depoimento da referida testemunha e, consequentemente, de requerer diligências probatórias, nomeadamente, a inquirição da respectiva testemunha, porquanto o ora Recorrente apenas poderia requerer o depoimento daquela testemunha caso tivesse conhecido e compreendido o seu depoimento.
296. EM QUARTO LUGAR, para compreender o conteúdo da prova em caso de não tradução, a língua francesa também deve ser dominada pelos mandatários ora signatários do Recorrente.
297. EM QUINTO LUGAR, a falta de tradução para português dos documentos de fls. 4.487 a 4.520 impediu, efectivamente, a sindicância e, bem assim, o exercício do direito de defesa do Recorrente, o que viola o disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.
298. Não havendo de que, na tese da própria Acusação e agora da Decisão da CMVM, estamos perante um depoimento essencial que sustenta, a título meramente exemplificativo, os factos provados 109., 111., 113., 116., 118., 120., 121., 123., 124., 125., 126., 127., 129., 133., 136., 137., 138., 157., 417., 436., 437., 438., 440. da Decisão da CMVM.
299. De resto, a própria Sentença Recorrida assume a relevância do depoimento daquela testemunha, ao referir que a mesma “apresenta uma posição fulcral no cenário da contabilidade da EI..., S.A, tendo conhecimento acerca da sua adulteração” (cfr. pág. 385 da Sentença Recorrida).
300. O depoimento de CCC é, inclusivamente, utilizado para tentar credibilizar (sem sucesso) as várias versões falsas do depoimento de III (cfr. pág. 422 da Sentença Recorrida).
301. Ora, se a própria CMVM e agora a Sentença Recorrida reputaram aquele depoimento como relevante para imputar ao Recorrente as contra-ordenações aqui em causa, então tal depoimento é essencial para a Defesa do Recorrente, desde logo, para rebater as falsas imputações a si dirigidas.
302. Nessa medida, constituindo prova directa e essencial da Acusação, imputada ao Recorrente, o referido depoimento tinha que ter sido traduzido, ao abrigo dos artigos 92.º, n.os 1 e 6, e 166.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, aplicáveis ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e artigo 407.º do CVM, antes da dedução da Acusação.
303. E a verdade é que, não o tendo sido feito, a falta de tradução para português dos documentos de fls. 4.487 a 4.520 impediu a sindicância e, bem assim, o exercício do direito de defesa do Recorrente, o que viola o disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.
304. EM SEXTO LUGAR, o facto de o Recorrente ter apresentado Defesa Escrita e recurso de impugnação não afasta, nem sana, o vício suscitado, como parece ser o entendimento da Sentença, desde logo, porque o ora Recorrente suscitou esta questão na Defesa Escrita, estando, em qualquer caso, em causa uma nulidade de conhecimento oficioso adveniente da violação de norma imperativa, que gera uma nulidade insanável, que dá lugar à anulação da acusação deduzida pela CMVM e à baixa dos autos à entidade administrativa para reparação do vício em causa.
305. EM SÉTIMO LUGAR, o que vai exposto vale igualmente para a circunstância de o Recorrente se ter pronunciado, por escrito, sobre o depoimento após a notificação da respectiva tradução, porquanto o exercício efectivo do direito de defesa pressupõe que possa exercer o contraditório, contraditar a própria testemunha.
306. EM OITAVO LUGAR, a circunstância de a CMVM ter fundamentado a sua decisão de não admissão da inquirição da testemunha CCC na sequência da notificação da tradução para português do respectivo depoimento é irrelevante para o que aqui se discute.
307. O argumento de que a admissão da inquirição da testemunha CCC na sequência da notificação da tradução para português do respectivo depoimento compromete o princípio da celeridade podendo apresentar uma eficácia meramente dilatória não tem qualquer fundamento. Aliás, como é que uma única inquirição pela Defesa de uma testemunha que foi considerada relevante pela “Acusação” e pelo Tribunal pode ser considerada meramente dilatória?
308. Desde logo, depois de a CMVM ter ficado mais de 4 anos com o processo retido na fase administrativa desde a notificação da Acusação ao ora Recorrente, a celeridade não pode, de forma alguma, ser argumento para atropelar a Defesa do ora Recorrente, ainda para mais, quando, a razão de ser de apenas agora ter sido requerida a inquirição da testemunha CCC ser exclusivamente imputável à própria CMVM.
309. Acresce que, a circunstância de a admissão de inquirição de testemunhas a pedido do arguido que não foram arroladas no momento processual adequado poder “apresentar um eficácia meramente dilatória” não é fundamento para ser rejeitado um meio de prova, apenas pode ser se efectivamente tiver, o que não foi sustentado pela CMVM.
310. EM NONO LUGAR, a verdade é que a inquirição desta testemunha afigurava-se (e afigura-se), absolutamente, essencial para o exercício do direito de defesa do ora Recorrente, porque contribuiria para demonstrar que o Recorrente nunca deu instruções, a quem quer que fosse, para ocultar ou subavaliar passivo da EI..., S.A.
311. É que, como se constata na Decisão Recorrida, são vários os factos dados como provados na Decisão Recorrida com base no depoimento da testemunha CCC: designadamente, os factos provados 109., 111., 113., 116., 118., 123., 124., 125., 126., 127., 129., 136., 137., 157., 417., 418., 419., 435., 436., 437., 438., 440., 441., 442., 443., 445., 446., 447., 448., 450., 453., 495., 507., 508., 515., 516., 545., 552., 555., 557., 558., 561., 562., 563., 568., 569. Da Decisão da CMVM.
312. E isto independentemente de outras testemunhas poderem, ou não, já ter confirmado ou infirmado o depoimento daquela testemunha.
313. Ao negar-se a inquirição da testemunha CCC, bem sabendo que a respectiva inquirição não foi anteriormente requerida por não ter sido junta aos autos a tradução do respectivo depoimento, ficou obstruída a defesa do Recorrente e obrigatoriamente violado o seu direito a evitar a condenação nos autos em apreço.
314. Sendo sempre forçoso concluir que a decisão da CMVM e a Sentença Recorrida violaram o direito fundamental a um processo equitativo, que está consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da CRP ex vi artigo 32.º, n.º 10, da CRP.
315. EM FACE DO EXPOSTO, verifica-se uma violação insanável do direito de defesa do ora Recorrente, em violação do disposto no artigo 50.º do RGCO e, ainda, 32.º, n.º 10, da CRP.
316. Aliás, o artigo 50.º do RGCO, interpretado no sentido de que pode ser recusada ao arguido em processo contra-ordenacional a possibilidade de contra inquirir uma ou mais testemunhas que tenham sido unilateralmente inquiridas pela entidade administrativa na fase pré-acusatória é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
317. E, ainda, o artigo 50.º do RGCO, interpretado no sentido de que pode ser recusada ao arguido em processo contra-ordenacional a possibilidade de contra inquirir uma ou mais testemunhas que tenham sido inquiridas unilateralmente pela entidade administrativa na fase pré-acusatória, quando a(s) referida(s) testemunha(s) tenha(m) sido considerada(s) central(ais) na fundamentação da decisão condenatória (proferida pela entidade administrativa ou pelo Tribunal), é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
318. Por conseguinte, a Decisão Final enferma de NULIDADE, ou, subsidiariamente, de IRREGULARIDADE e, em consequência, a Sentença Recorrida deve ser revogada e, consequentemente, deve ser declarada a NULIDADE e, subsidiariamente, a IRREGULARIDADE, da Decisão Final, a qual deve ser REVOGADA.
PROIBIÇÃO DE VALORAÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL POR VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL AO CONTRADITÓRIO (DIREITO DE DEFESA)
319. A Decisão Final da CMVM é manifestamente ilegal, porquanto atenta contra o direito de defesa do Recorrente previsto nos artigos 414.º-A do CVM, 50.º do RGCO e no n.º 10 do artigo 32.º da CRP e contra o artigo 356.º, n.º 6, do CPP, como suscitado no recurso de impugnação.
320. Com efeito, na fase pré-acusatória, a CMVM procedeu à inquirição e tomada de declarações das testemunhas UU, III e JJJ, sem a presença ou contraditório dos Mandatários dos arguidos (que foram constituídos nesta qualidade, antes da Acusação), motivo pelo qual as aludidas testemunhas foram arroladas na fase pós-acusação.
321. Sucede que, o ora Recorrente viu-se impedido de exercer o respectivo direito de defesa, designadamente pelo controlo da aludida prova, porquanto, por um lado, a testemunha JJJ veio a falecer a 26 de Fevereiro de 2020, antes de ter tido possibilidade de prestar depoimento nos presentes autos e, por outro lado, as testemunhas UU e III, recusaram-se, efectivamente, a responder às questões que lhes foram formuladas, com fundamento na sua constituição como arguidos no processo-crime n.º 324/14.....
322. Assim, os depoimentos das testemunhas UU, III e JJJ não podiam ser valorados pela CMVM para efeitos da Decisão da CMVM o que, porém, sucedeu, surgindo 795 referências aos mesmos na Decisão da CMVM.
323. EM PRIMEIRO LUGAR, nos termos do artigo 50.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e ainda artigo 32.º, n.º 10 da CRP, o direito fundamental de defesa dos arguidos em processos contra- ordenacionais promovidos pela CMVM inclui o direito à produção de prova, que, por sua vez, tem ínsito o exercício do contraditório à prova produzida na fase administrativa pré- acusatória.
324. É pacífico que o exercício do direito de defesa pressupõe, necessariamente, que seja facultada ao arguido a possibilidade de este controlar e contraditar a prova do processo, nomeadamente, os depoimentos prestados pelas testemunhas na fase administrativa pré-acusatória – trata-se de uma das vertentes fundamentais e inalienáveis do direito de defesa de qualquer arguido,
incluindo nos processos contra-ordenacionais, por referência aos artigos 16.º, n.º 1, 20.º, n.º 4, e 32.º, n.º 10, da CRP.
325. A faculdade de contraditar os depoimentos prestados pelas testemunhas na fase administrativa pré-acusatória implica, necessariamente, realizar o respectivo contra-interrogatório.
326. O direito de controlar e contraditar a prova integra igualmente o direito a um processo equitativo, assegurado pelo artigo 6.º, n.º 2 – al. d) da CEDH (ex vi n.º 2 do artigo 8.º da CRP e n.º 1 do artigo 6.º do Tratado da União Europeia).
327. Resulta, assim, de todo o exposto, que, ao contrário do que foi entendimento na Sentença Recorrida, estando o ora Recorrente impossibilitado de inquirir as testemunhas UU, III e JJJ e, por conseguinte, de contraditar a prova produzida pela CMVM, a mesma não pode ser valorada contra o Recorrente.
328. EM SEGUNDO LUGAR, a norma do n.º 6 do artigo 356.º do CPP (aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407º do CVM), aplicada com as devidas adaptações ao caso concreto, determina igualmente a impossibilidade de valoração tout court dos depoimentos prestados pelas testemunhas UU e III de fls. 4194 a 4213, fls. 9170 a 9182, fls. 2009 a 2031, fls. 9215 a 9225, na fase administrativa pré-acusatória, na decisão final, ao contrário do que fez a Decisão da CMVM e a Sentença Recorrida.
329. Uma das finalidades do n.º 6 do artigo 356.º do CPP é, precisamente, salvaguardar o direito de defesa e de contraditório do arguido, o que não foi observado, no caso concreto.
330. Por conseguinte, a Decisão Final, assim como a Sentença Recorrida, violou o disposto no n.º 6 do artigo 356.º do CPP, aplicável com as devidas adaptações ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM.
331. EM TERCEIRO LUGAR, o n.º 4 do artigo 356.º do CPP (ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM) aplicada com as devidas adaptações ao caso concreto, a contrario, determina igualmente a impossibilidade de valoração tout court dos depoimentos prestados pela testemunha JJJ de fls. 3847 a 3874 e fls. 9258 a 9266, na fase administrativa pré-acusatória, na decisão final, ao contrário do que fez a Decisão da CMVM.
332. Nos termos daquela norma, apenas é permitida a reprodução ou leitura de declarações prestadas no caso de os declarantes não tiverem podido comparecer por falecimento, quando tais declarações tiverem sido prestadas perante a autoridade judiciária.
333. In casu, quando muito, para efeitos do disposto no artigo 356.º, n.º 4, do CPP, o Conselho de Administração da CMVM poderia ser equipado à autoridade judiciária (in casu, o Ministério Público), ao passo que os Coordenador Executivo e Técnicos da CMVM – perante quem foram prestados os depoimentos da testemunha JJJ, serão, quanto muito equiparáveis a funcionários judiciais ou órgãos de polícia criminal, prestando assistência à autoridade judiciária.
334. EM QUARTO LUGAR, circunstância idêntica à que ora se verifica já motivou que o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em sentença de 30 de Abril de 2018, não considerasse nem valorasse a prova produzida na fase administrativa pré-acusatória através de testemunhas que, nas fases ulteriores, se recusaram a responder às questões formuladas pelas defesas, com fundamento no princípio da auto-incriminação.
335. EM QUINTO LUGAR, diga-se que a circunstância de, in casu, nos termos dos artigos 416.º, n.º 5, do CVM e 72.º, n.º 2, do RGCO, não vigorar o princípio da oralidade nem da imediação em nada afasta o que se encontra exposto.
336. O que está aqui em causa é, tão-somente, o núcleo mínimo e essencial do direito de defesa do ora Recorrente em sede contra-ordenacional.
337. Ora, ao não lhe ter sido possível contra-inquirir as testemunhas aqui em causa, em cujos depoimentos a Decisão Final e agora a Sentença Recorrida assentam a condenação do ora Recorrente, é forçoso concluir que o Recorrente foi impedido de efectivamente se defender.
338. EM SEXTO LUGAR, o artigo 50.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e 356.º, n.os 4 e 6, do CPP (ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CMV) aplicados e interpretados no sentido de que o depoimento de testemunha prestado na fase pré-acusatória de processo contra-ordenacional pode ser valorado, para efeitos de formular a decisão final, ainda que a testemunha se recuse e/ou fique impossibilitada de responder a questões na fase pós-acusatória, é inconstitucional, por violação do n.º 10 do artigo 32.º da CRP, que consagra o direito de defesa do arguido.
339. De igual modo, os artigos 50.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, e 356.º, n.os 4 e 6, do CPP (ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CMV) aplicados e interpretados no sentido de que o indeferimento do contra-interrogatório de uma testemunha ouvida na fase pré-acusatória do processo contra-ordenacional não viola o direito de contraditório do arguido é inconstitucional, por violação do n.º 10 do artigo 32.º da CRP, que consagra o direito de defesa do arguido.
340. POR CONSEGUINTE, ao terem valorado os depoimentos prestados pelas testemunhas UU, III e JJJ, de fls. 4.194 a 4.213, fls. 9.170 a 9.182, fls. 2.009 a 2.031, fls. 9.215 a 9.225, fls. 3.847 a 3.874 e fls. 9.258 a 9.266, na fase administrativa pré-acusatória, nos termos em que o fizeram, a Decisão da CMVM e a Sentença Recorrida padecem de NULIDADE, por violação do direito fundamental de defesa do Recorrente, consagrado no artigo 50.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM e no artigo 32.º, n.º 10, da CRP e violação do artigo 356.º, n.os 4 e 6, do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO e artigo 407.º do CVM.
VIOLAÇÃO DO DIREITO DE DEFESA E NULIDADE POR FALTA DE PRODUÇÃO DE PROVA
INDEFERIMENTO DA INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS EEE E FFF ATRAVÉS DE MEIOS DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL
341. Na Defesa Escrita apresentada nos presentes autos, o ora Recorrente requereu a inquirição das testemunhas EEE e FFF, ambas através de videoconferência abrigo dos instrumentos de cooperação internacional aplicáveis.
342. Por despacho fls. 16.280, a CMVM admitiu a inquirição das aludidas testemunhas e agendou a respectiva inquirição, tendo requerido a assistência da entidade congénere, CSSF, para realização da videoconferência, ao abrigo do regime de cooperação aplicável.
343. Na sequência da recusa do pedido de cooperação para a inquirição das testemunhas, a CMVM decidiu notificá-las para comparecerem, pessoalmente, perante a CMVM (fls. 18.380 e ss.).
344. Sucede que, chegados aos dias agendados para o efeito (após sucessivos reagendamentos), as testemunhas EEE e FFF não compareceram, tendo a testemunha EEE invocado estar impedido de prestar depoimento por encontrar-se sujeito a segredo profissional fls. 18.535 e fls. 18.772.
345. Por requerimento de fls. 18.837 e segs., o ora Recorrente (i) declarou não prescindir da inquirição da testemunha EEE, por a respectiva diligência probatória se afigurar absolutamente essencial para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, (ii) requereu, uma vez mais, a inquirição das referidas testemunhas, por carta rogatória e (iii), subsidiariamente, requereu a substituição das aludidas testemunhas pelas testemunhas II e CCC, o que foi indeferido pela CMVM (fls. 18.959 e ss.)
346. Ao contrário do que decidiu a CMVM, a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro através de videoconferência ao abrigo de meios de cooperação internacional ou de carta rogatória é admissível em processos contra-ordenacionais e, em especial, nos presentes autos,
347. No recurso de impugnação judicial que interpôs, o ora Recorrente arguiu a nulidade e, subsidiariamente, a irregularidade, do processo com fundamento na inquirição das aludidas testemunhas por inviabilização da produção de prova nos termos a que esta Defesa tem direito.
348. Chegados à Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª Instância indeferiu as invalidades arguidas pelo Recorrente.
349. EM PRIMEIRO LUGAR, a Sentença Recorrida pretende fazer crer que, ao ter procurado defender-se, através da interposição do recurso de impugnação judicial, o ora Recorrente ficaria impedido de suscitar a violação do seu direito de defesa na fase administrativa, o que, simplesmente, não tem qualquer apoio na letra do RGCO, do CVM e, muito menos, da CRP.
350. EM SEGUNDO LUGAR, a CMVM ordenou o depoimento das testemunhas EEE e FFF, tendo, inclusivamente, desenvolvido as diligências necessárias à realização, no quadro da cooperação com a entidade congénere CSSF, da inquirição das aludidas testemunhas.
351. Donde resulta que a CMVM reconheceu a relevância dos depoimentos das testemunhas EEE e FFF para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.
352. À excepção do decurso do tempo – o que é irrelevante para este efeito – não ocorreram quaisquer circunstâncias supervenientes que tornasse a inquirição das aludidas testemunhas inúteis ou impertinentes quando anteriormente a CMVM já havia reconhecido a sua utilidade e pertinência.
353. EM TERCEIRO LUGAR, as inquirições das testemunhas EEE e FFF em causa, com domicílio no estrangeiro, são absolutamente essenciais e reputam-se (ou, no mínimo, podem reputar-se) essenciais para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, pelo menos (saliente-se: pelo menos), por referência à matéria de facto indicada nos artigos 663. a 676., 716., 747., 748., 749 da Defesa Escrita do ora Recorrente, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, para os devidos efeitos legais.
354. O facto de sobre a matéria de facto indicada pelo ora Recorrente terem sido eventualmente produzidos outros meios de prova no processo é irrelevante e não pode justificar o indeferimento da inquirição das aludidas testemunhas: o que releva é que o arguido tem direito a apresentar os meios de prova que consideram mais adequados à prova da sua tese.
355. Acresce que, ao contrário do que se encontra exposto na Sentença Recorrida, não foi produzida “prova testemunhal variada” sobre esta matéria, sendo os depoimentos das testemunhas SS, WW e MMM irrelevantes para este efeito.
356. EM QUARTO LUGAR, ao contrário do que sustenta a Sentença, de forma manifestamente contraditória, as normas em matéria de instrumentos de cooperação internacional –designadamente, dos artigos 111.º, n.º 3, alínea b) e artigo 229.º e ss., do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, artigos 1.º, n.º 3; 9.º, n.º 3; e 10.º, n.os 1 e 3, do Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia do Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal e artigos 1.º, n.º 3; 23.º, n.º 1, alínea d); 26.º, n.º 2, alínea e); 145.º, n.º 2, alíneas b) e d); e 152.º, n.os 1 e 7, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto – são efectivamente aplicáveis ao presente caso.
357. Aliás, a prova de que a inquirição das aludidas testemunhas por carta rogatória é necessária é que a cooperação entre a CMVM e a sua congénere no país de residência das testemunhas foi infrutífera.
358. De resto, os mecanismos de cooperação internacional, em particular, Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia do Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, são aplicáveis ao processo contra-ordenacional.
359. Na verdade, não há a menor dúvida de que a inquirição de testemunhas por videoconferência, promovida por carta rogatória, ao abrigo dos instrumentos de cooperação internacional identificados é admissível à luz do regime aplicável à fase administrativa do processo de contra-ordenação da competência da CMVM.
360. Primeiro, existem normas legais internas e instrumentos internacionais de que Portugal é parte que permitem, expressamente, a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro, através de videoconferência e cartas rogatórias, em processo de contra-ordenação, nada obstando à sua aplicação subsidiária e com as devidas adaptações ao caso concreto, ex vi artigo 229.º do CPP e artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
361. Por um lado, a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro por carta rogatória ou videoconferência “oficial”, no âmbito de processos contra-ordenacionais, resulta da conjugação dos artigos 1.º, n.º 3; 9.º, n.º 3; e 10.º, n.os 1 e 3, do Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia do Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal.
362. Por outro lado: a Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto (Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal), também é aplicável aos processos contra-ordenacionais e prevê a utilização de cartas rogatórias e teleconferência, nos termos dos artigos 1.º, n.º 3; 23.º, n.º 1, alínea d); 26.º, n.º 2, alínea e); 145.º, n.º 2, alíneas b) e d); e 152.º, n.os 1 e 7, da Lei n.º 144/99.
363. Por sua vez: a Lei n.º 88/2017, de 21 de Agosto, que regula a “emissão, transmissão, reconhecimento e execução de decisões europeias de investigação em matérias penal”prevê a aplicação de mecanismos de investigação de cooperação internacional, nos processos de contra-ordenação, conforme resulta da conjugação dos artigos 3.º, alínea c) - ii),
364. Acresce que: o artigo 230.º do CPP, que regula a expedição de cartas rogatórias ao estrangeiro, é igualmente aplicável ao processo contra-ordenacional ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
365. Aliás, a realização das diligências necessárias à obtenção dos testemunhos requeridos é essencial para o cumprimento do direito à defesa do arguido em processo contra-ordenacional (cfr. n.º 10 do artigo 32.º da CRP), e não apenas em sede de processo penal.
366. Segundo, é entendimento do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República (Parecer n.º PGRP00000994, de 12 de Junho de 1997) que os mecanismos de cooperação internacional típicos do processo penal são igualmente vigentes no processo contra-ordenacional (disponível em www.dgsi.pt).
367. Terceiro, não há outra forma de alcançar o resultado que se visa alcançar com o depoimento das cinco testemunhas em causa, senão através de videoconferência, ao abrigo dos mecanismos de cooperação internacional e expedição de cartas rogatórias, afigurando-se estas como essenciais para provar a matéria de facto em causa.
368. Quarto, utilização das cartas rogatórias ou da videoconferência ao abrigo de mecanismos de cooperação internacional é perfeitamente compatível com a tramitação dos processos contra-ordenacionais.
369. Resulta claro do artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, a aplicação subsidiária do CPP ao processo contra-ordenacional “sempre que o contrário não resulte deste diploma”.
370. O direito de defesa previsto no RGCO implica que o arguido tenha o direito de produzir prova testemunhal sempre que ela se afigure pertinente para o exercício desse mesmo direito, sendo que o RGCO nada diz ou proíbe quanto ao meio de obter essa prova testemunha.
371. A CMVM negou o exercício do direito de defesa do Recorrente, um direito fundamental que se encontra previsto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP, que está integrado no Capítulo I atinente aos “Direitos, liberdades e garantias pessoais” do Título II da Parte I da CRP, sob a epígrafe “Direitos e Deveres Fundamentais”.
372. Estamos, assim, perante uma decisão, manifestamente infundada, que contende com um direito fundamental do Recorrente, i.e., o seu direito de defesa que, in casu, se manifesta na aplicação subsidiária das disposições do CPP, por remissão do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO, por forma a admitir a aplicação do artigo 230.º do CPP, o qual prevê a possibilidade de expedição de cartas rogatórias para audição de testemunhas residentes no estrangeiro através de videoconferência ao abrigo dos mecanismos de cooperação internacional (isto, sem prejuízo da legislação especial acima referida).
373. Quinto, o valor da coima única aplicada ao ora Recorrente de EUR 2.000.000, a complexidade das matérias envolvidas e a inclusão de factos que envolvem várias jurisdições diferentes, são exemplos de que este processo contra-ordenacional não pode ser tramitado, nem equiparado, como um processo contra-ordenacional estradal em que esteja em discussão “bagatelas” contra-ordenacionais.
374. Negar a expedição de cartas rogatórias no presente processo contra-ordenacional é pôr em causa o direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua defesa, tal como se encontra consagrado no n.º 10 do artigo 32.º da CRP.
375. Os artigos 111.º, n.º 3, al. b), do CPP, 229.º e 230.º, do CPP ex vi, artigos 407.º do CVM e 41.º, n.º 1, do RGCO, e artigos 50.º e 72.º, n.º 2, do RGCO, interpretados e aplicados no sentido de que é inadmissível nos processos de contra-ordenação a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro através de cartas rogatórias ou videoconferência ao abrigo dos mecanismos de cooperação internacional, é inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP, que consagra o direito de defesa do arguido, em processo de contra-ordenação, que inclui o princípio de tutela jurisdicional efectiva através de um processo justo e equitativo consagrado no artigo 20.º, n.os 1 e 4, da CRP.
376. De igual modo, os artigos 1.º, n.º 3, 23.º, n.º 1 - al. d), 26.º, n.º 2 - al. e), 145.º, n.º 2 - als. b) e d) e 152.º, n.os 1 e 7, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, interpretados no sentido de que não é aplicável a obtenção de prova testemunhal, através dos mecanismos de cooperação internacional – maxime carta rogatória ou videoconferência –, na fase administrativa de processo contra-ordenacional, é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
377. EM QUINTO LUGAR, recusar a inquirição da testemunha EEE com fundamento na circunstância de a mesma se ter recusado a depor com fundamento no segredo profissional, é contraditório com decisões anteriormente tomadas pela CMVM nestes autos, as quais transitaram em julgado e têm força de caso julgado formal.
378. É que, como a própria CMVM reconheceu nestes autos, e resulta do artigo 135.º do CPP –incluindo da sua localização sistemática neste diploma – ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, a oportunidade para, eventualmente, uma testemunha invocar o segredo profissional é na própria diligência probatória, quando esta se já encontra perante a “autoridade judiciária” (neste caso, com as devidas adaptações, perante a CMVM) e a testemunha é confrontada com questões concretas.
379. Sendo certo que, conforme já foi reconhecido pelo Tribunal da Relação de Évora, no Acórdão de 6 de Junho de 2017, o incidente de quebra de segredo profissional pode ser suscitado através dos instrumentos de cooperação internacional aplicáveis (proc. n.º 615/16.5T9LLE- A.E1, www.dgsi.pt).
380. EM SÉTIMO LUGAR, o eventual risco de prescrição não pode ser usado para constranger o direito de defesa do arguido, através da produção de prova, até porque o ora Recorrente não é responsável pela tramitação do recurso.
381. Aliás, eventuais constrangimentos impostos ao direito de defesa por força do risco de prescrição geram interpretações normativas inconstitucionais.
382. O ora Recorrente não é responsável pelo facto de a CMVM ter demorado 7 anos na fase administrativa para proferir decisão final.
383. Aliás, os artigos 111.º, n.º 3, al. b), do CPP, 229.º e 230.º, do CPP ex vi, artigos 407.º do CVM e 41.º, n.º 1, do RGCO, e artigos 50.º e 72.º, n.º 2, do RGCO, interpretados e aplicados no sentido de que é inadmissível nos processos de contra-ordenação a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro através de cartas rogatórias ou videoconferência ao abrigo dos mecanismos de cooperação internacional, é inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 10, da CRP, que consagra o direito de defesa do arguido, em processo de contra-ordenação, que inclui o princípio de tutela jurisdicional efectiva através de um processo justo e equitativo consagrado no artigo 20.º, n.os 1 e 4, da CRP.
384. De igual modo, os artigos 1.º, n.º 3, 23.º, n.º 1 - al. d), 26.º, n.º 2 - al. e), 145.º, n.º 2 - als. b) e d) e 152.º, n.os 1 e 7, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, interpretados no sentido de que não é aplicável a obtenção de prova testemunhal, através dos mecanismos de cooperação internacional – maxime carta rogatória ou videoconferência –, em processo contra-ordenacional, é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
385. Ademais, os artigos 111.º, n.º 3, al. b), do CPP, 229.º e 230.º, do CPP ex vi, artigos 407.º do CVM e 41.º, n.º 1, do RGCO, e artigos 50.º e 72.º, n.º 2, do RGCO interpretados e aplicados no sentido de que a entidade administrativa e/ou o tribunal judicial pode rejeitar a obtenção de prova testemunhal, através dos mecanismos de cooperação internacional – maxime carta rogatória ou videoconferência –, com fundamento no risco de prescrição do processo contra- ordenacional, é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
386. Também os artigos 1.º, n.º 3, 23.º, n.º 1 - al. d), 26.º, n.º 2 - al. e), 145.º, n.º 2 - als. b) e d) e 152.º, n.os 1 e 7, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto interpretados e aplicados no sentido de que a entidade administrativa e/ou o tribunal judicial pode rejeitar a obtenção de prova testemunhal, através dos mecanismos de cooperação internacional – maxime carta rogatória ou videoconferência –, com fundamento no risco de prescrição do processo contra-ordenacional, é inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 20.º, n.º 4, in fine, e 32.º, n.º 10, da CRP, que consagram, respectivamente, o princípio da confiança e segurança jurídica (subjacente ao Estado-de-Direito), os direitos fundamentais a um processo equitativo e de defesa do arguido em processo de contra-ordenação.
387. EM FACE DO EXPOSTO, a decisão de indeferir as inquirições das testemunhas EEE e FFF por videoconferência, promovida através de carta rogatória, ao abrigo dos instrumentos de cooperação internacional aplicáveis decidido no Despacho de fls. 18959 e ss. é NULA ou, subsidiariamente, IRREGULAR, nos termos dos artigos 118.º, n.os 1 e 2, e 120.º, n.os 1 e 2 - al. d), 122.º e 123.º do CPP ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM, o que se requer que seja declarado (por violação do artigo 318.º, n.os 1 e 8, do CPP, artigos 145.º, n.º 2 - als. b) e d), e 150.º e ss. da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto, artigo 50.º do RGCO e artigo 414.º-A do CVM, artigo 32.º, n.º 10, da CRP e, ainda, do Segundo Protocolo Adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, que remete inter alia para o artigo 14.º da Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal).
388. Por conseguinte, a Decisão Final e a Sentença Recorrida, devem ser revogadas.
INDEFERIMENTO DA INQUIRIÇÃO DA TESTEMUNHA NNN
389. No recurso de impugnação judicial que interpôs, o ora Recorrente arguiu a nulidade e, subsidiariamente, a irregularidade, do processo com fundamento no indeferimento da inquirição da testemunha NNN, por inviabilização da produção de prova nos termos a que esta Defesa tem direito.
390. Chegados à Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª Instância indeferiu as invalidades arguidas pelo Recorrente, aderindo, em larga medida, aos fundamentos previamente invocados pela CMVM, os quais são manifestamente improcedentes e assentam em erros de direito.
391. EM PRIMEIRO LUGAR, a circunstância de o ora Recorrente ter interposto recurso de impugnação judicial, através do qual procurou discutir os fundamentos de mérito do indeferimento, também não afasta a falta de fundamento de tal indeferimento.
392. Com efeito, o que é relevante é que, ao indeferir a inquirição da testemunha NNN, a CMVM inviabilizou o exercício efectivo do direito de defesa pelo ora Recorrente.
393. A Sentença Recorrida pretende fazer crer que, ao ter procurado defender-se, através da interposição do recurso de impugnação judicial, o ora Recorrente ficaria impedido de suscitar a violação do seu direito de defesa na fase administrativa, o que, simplesmente, não tem qualquer apoio na letra do RGCO, do CVM e, muito menos, da CRP.
394. EM SEGUNDO LUGAR, a circunstância de, em sede de recurso de impugnação judicial, o ora Recorrente não ter requerido a inquirição da testemunha NNN em nada afasta a invalidade suscitada.
395. EM TERCEIRO LUGAR, o fundamento invocado pela CMVM para dar sem efeito a inquirição da testemunha NNN – de que a testemunha OOO tinha sido inquirida –carece de razão de ser e é, aliás, contraditório com a decisão anteriormente tomada.
396. Com efeito, no respectivo despacho de admissão, CMVM não condicionou, por qualquer forma, a realização da inquirição da testemunha NNN à não realização da inquirição da testemunha OOO (nem vice-versa).
397. De resto, foi sobejamente demonstrado nos presentes autos que existem razões sérias para pôr em causa o depoimento da testemunha OOO, o que, justificava, evidentemente, que se mantivesse a realização do depoimento da testemunha NNN.
398. Assim, ao dar sem efeito o depoimento da testemunha NNN, o Despacho de fls. 18.575 e ss. preteriu o direito de defesa do Recorrente e determinou a omissão de diligência probatória que se reputa – ou, pelo menos, pode reputar-se – essencial para a descoberta da verdade.
399. EM QUARTO LUGAR, a lei não prevê que a licença de maternidade de uma testemunha seja motivo de dispensa da respectiva inquirição.
400. Por um lado, apenas poderia haver adiamento (e não dispensa) da inquirição da testemunha NNN se esta tivesse apresentado atestado médico no sentido de que a própria estaria impedida de depor, em razão de haver dado à luz, o que não sucedeu.
401. Por outro lado, a licença de maternidade é um instituto de natureza laboral e não constitui causa de falta à inquirição de testemunha.
402. Por conseguinte, o Despacho de fls. 18.575 e ss., no segmento que deu sem efeito o depoimento da testemunha NNN, enferma de NULIDADE e, subsidiariamente, de IRREGULARIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.os 1 e 2 , e 120.º, n.os 1 e 2, alínea d), 2.ª parte, 122.º, 123.º e 340 do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 407.º CVM, o que se requer que seja declarado.
403. Por conseguinte, a Decisão Final e a Sentença Recorrida devem ser REVOGADAS.
INDEFERIMENTO DA ACAREAÇÃO ENTRE AS TESTEMUNHAS LLL E OOO
404. No recurso de impugnação judicial que interpôs, o ora Recorrente arguiu a nulidade e, subsidiariamente, a irregularidade, do processo com fundamento no indeferimento da acareação das testemunhas LLL e OOO, por inviabilização da produção de prova nos termos a que esta Defesa tem direito.
405. Salvo o devido respeito, os argumentos aduzidos pela 1.ª Instância para indeferir tais invalidades são manifestamente improcedentes e assentam em erros de direito.
406. EM PRIMEIRO LUGAR, a circunstância de o ora Recorrente ter interposto recurso de impugnação judicial, através do qual procurou discutir os fundamentos de mérito do indeferimento, também não afasta a falta de fundamento de tal indeferimento.
407. A Sentença Recorrida pretende fazer crer que, ao ter procurado defender-se, através da interposição do recurso de impugnação judicial, o ora Recorrente ficaria impedido de suscitar a violação do seu direito de defesa na fase administrativa, o que, simplesmente, não tem qualquer apoio na letra do RGCO, do CVM e, muito menos, da CRP.
408. EM SEGUNDO LUGAR, a circunstância de, em sede de recurso de impugnação judicial, o ora Recorrente não ter requerido a acareação das testemunhas LLL e OOO em nada afasta a invalidade suscitada.
409. EM TERCEIRO LUGAR, a acareação, enquanto meio de produção de prova testemunhal, é plenamente aplicável em sede de processo contra-ordenacional.
410. EM QUARTO LUGAR, os requisitos para a realização de acareação entre as testemunhas LLL e OOO encontram-se plenamente verificados.
411. Por um lado, verifica-se uma efectiva contradição frontal e directa entre os depoimentos das aludidas testemunhas, porquanto, a testemunha LLL detalhou que falou com a sua Mãe para contactar a Mãe de III, com vista a obter o contacto deste e seu Advogado, ao passo que a testemunha OOO negou, expressamente, as declarações da testemunha LLL.
412. De resto, a circunstância de a testemunha OOO ter aventado uma versão alternativa não afasta o facto de a mesma ter negado expressamente as declarações da testemunha LLL.
413. Por outro lado, a produção da prova por acareação tem uma clara utilidade para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa.
414. Note-se que não está aqui em causa avaliar, em si, a inquirição da testemunha III no processo de contra-ordenação n.º 58/... do Banco de Portugal, mas sim aquilatar dos efeitos da invalidade por contaminação da prova neste processo, por efeito da incorporação do processo de contra-ordenação n.º 58/... do Banco de Portugal nestes autos.
415. Assim, ao indeferir a acareação das testemunhas LLL e OOO, requerida pelo ora Arguido, o Despacho de fls. 18.575 e ss., enferma de NULIDADE, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 118.º, n.os 1 e 2 , e 120.º, n.os 1 e 2, alínea d), 2.ª parte, 122.º, 123.º e 340 do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e artigo 407.º do CVM, o que se requer que seja declarado.
416. Por conseguinte, a Decisão Final e a Sentença Recorrida devem ser REVOGADAS.
FALTA DA IMPUTAÇÃO DE FACTOS CONCRETOS NO ALEGADO CONFLITO DE INTERESSES RELATIVO AO PAPEL COMERCIAL DA R..., S.A
417. Para tentar estender a imputação de uma alegada contra-ordenação quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A ao ora Recorrente, a Sentença Recorrida sustentou a imputação da suposta violação de conflito de interesses no facto de a R..., S.A ser uma sociedade dominada pela EI..., S.A, da qual o ora Recorrente era administrador, à data em que foi aprovada a colocação de papel comercial da R..., S.A, em Clientes do B... (cfr. factos provados 413, 417, 515, alíneas v. e vi. e 519, da Sentença Recorrida).
418. No entanto, tal afigura-se, manifestamente, insuficiente para imputar a violação de regras de conflitos de interesses ao ora Recorrente, pois o facto de a EI..., S.A dominar a R..., S.A não implica, necessária e automaticamente, que um administrador da EI..., S.A esteja em conflito em todas e quaisquer operações que a R..., S.A intervenha com outra sociedade (neste caso, o B...), que tenham em comum administradores da EI..., S.A.
419. Aliás, não sendo o ora Recorrente administrador da R..., S.A, não participou na decisão daquela de emitir papel comercial, sendo certo que também não participou na decisão de colocação de papel comercial foi ratificada em reunião da Comissão Executiva do B..., de 2 de Outubro de 2013 (cfr. fls. 78-f a 83-v do Livro de Actas da Comissão Executiva do B... n.º 81 que consta de fls. 4.870-v a fls. 4.876 da Pasta 11).
420. Ora, tal como sucedia com a Acusação e a Decisão da CMVM, a Sentença não imputa ao ora Recorrente qualquer facto concreto que lhe permita imputar as contra-ordenações aqui em causa por alegado conflito de interesses na colocação de papel comercial a R..., S.A.
421. Com efeito, dos factos provados 413, 417, 515, alíneas v. e vi. e 519, da Sentença Recorrida não resulta qualquer imputação de factos próprios ao ora Recorrente, que permita sustentar uma qualquer intervenção do ora Recorrente na colocação de papel comercial, pela R..., S.A.
422. É, por isso, forçoso concluir que não há uma única imputação devidamente individualizada na Sentença Recorrida ao ora Recorrente, que esteja devidamente circunstanciada, a propósito da sua alegada participação ou intervenção na decisão de colocação do papel comercial da R..., S.A em Cliente do B..., o que determina, por si só, a absolvição do ora Recorrente.
423. De resto, o simples facto da Sentença Recorrida dar como provado que o ora Recorrente era administrador da EI..., S.A e que sabia que a EI..., S.A era accionista única da R..., S.A não é suficiente para imputar ao agente a prática de uma contra-ordenação.
424. É obrigatório imputar ao agente um facto próprio / individualizado, o que não sucede nos presentes autos quanto ao ora Recorrente.
425. A Sentença Recorrida tinha de concretizar e circunstanciar a actuação e a culpa concreta do ora Recorrente, fundamentando em que medida a conduta do ora Recorrente contribuiu causalmente, para o facto típico, o que não resulta da Sentença.
426. Por conseguinte, as imputações relativas à alegada violação das regras de conflitos de interesses quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A, em Clientes do B..., são manifestamente improcedentes, devendo a Sentença Recorrida ser revogada e o ora Recorrente ser absolvido, nesses precisos termos.
SEM CONCEDER: PRESCRIÇÃO DA RESPONSABILIDADE CONTRA-ORDENACIONAL
427. Tanto a suposta violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, previstas respectivamente nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM, como a suposta violação do dever de qualidade da informação (artigo 7.º, n.º 1, do CVM), imputadas ao ora Recorrente já prescreveram.
428. A sentença de 1.ª Instância improcede ao entender que a legislação pandémica atinente à suspensão dos prazos prescricionais é aplicável ao presente caso e ao entender que opera aqui a causa de suspensão prevista no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c), do RGCO.
429. EM PRIMEIRO LUGAR, as regras excepcionais previstas no artigo 7.º, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020 (na sua redacção original) – entretanto revogado pela Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, com entrada em vigor em 3 de Junho –, e no artigo 6.º-B, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020, na redacção dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro – entretanto revogado pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril, com entrada em vigor em 6 de Abril – não são aplicáveis, retroactivamente, a processos contra-ordenacionais pendentes no início da vigência desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados, desde logo, antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020 e 22 de Janeiro de 2021, respectivamente, sob pena de violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP e os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.
430. Aqueles preceitos, interpretados e aplicados no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquelas leis, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020 e 22 de Janeiro de 2021, respectivamente, violam as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.
431. Não houve nem há suspensão da prescrição do presente procedimento de contra-ordenação à luz da redacção atribuída pela Lei n.º 16/2020 ou pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril à Lei n.º 1-A/2020.
432. Por um lado, a al. e) do n.º 6 do artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, na redacção da Lei n.º 16/2020, não contém qualquer remissão nem para o n.º 4, nem para o n.º 5 desta norma.
433. Por outro lado, a al. e) do n.º 7 do artigo 6.º-E da Lei n.º 1-A/2020, na redacção da Lei n.º 13-B/2021, não contém qualquer remissão nem para o n.º 4, nem para o n.º 5 desta norma.
434. Aqueles preceitos, interpretados e aplicados no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquelas leis, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020 e 22 de Janeiro de 2021, respectivamente, violam as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP
435. EM SEGUNDO LUGAR, a causa de suspensão de prazos prescricionais que se encontra descrita no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c) e n.º 2, do RGCO também não é aplicável aos presentes autos porque o despacho de aceitação das impugnações judiciais destes autos foi notificado ao Recorrente em 25 de Outubro de 2021 e nessa data já se encontravam esgotados os prazos prescricionais que lhe são aplicáveis (e que por isso não podiam ser suspensos).
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO RELATIVO À ALEGADA VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE O CONFLITO DE INTERESSES DO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO (ARTIGO 309.º DO CVM)
436. São imputadas ao ora Recorrente seis contra-ordenações pela alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, previstas respectivamente nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, previstas e punidas no artigo 397.º, n.º 2 – al. b), do CVM.
437. A imputação das referidas contra-ordenações ao ora Recorrente assenta (i) na decisão e conhecimento da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, pelo B..., junto dos seus clientes e (ii) na não adopção de medidas para pôr termo à comercialização de tal papel comercial.
438. Decorre da matéria de facto provada que a colocação e comercialização do papel comercial da EI..., S.A decorreu entre Setembro e 4 Dezembro de 2013,
439. Decorre igualmente da matéria de facto provada que a colocação e comercialização do papel comercial da R..., S.A decorreu entre 7 de Outubro de 2013 e 24 de Fevereiro de 2014.
440. Tendo por referência a data da prática dos factos imputados ao ora Recorrente, a prescrição das três supostas contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A ocorreu em 4 de Junho de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 4 de Dezembro de 2013), o que deve ser declarado e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.
441. Já a prescrição das três supostas contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A ocorreu em 24 de Agosto de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 24 de Fevereiro de 2014), o que deve ser declarado e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO RELATIVO À ALEGADA FALTA DE QUALIDADE DE INFORMAÇÃO (ARTIGO 7.º DO CVM)
442. A Decisão Recorrida imputa ainda ao ora Recorrente a alegada prática de duas contra-ordenações pela violação do dever de qualidade da informação, previsto no artigo 7.º do CVM, previstas e punidas no artigo 397.º, n.º 2 – al. b), do CVM.
443. A imputação destas contra-ordenações ao Recorrente assenta na (i) na decisão e conhecimento da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, pelo B..., junto dos seus clientes e (ii) na não adopção de medidas para pôr termo à comercialização de tal papel comercial.
444. Decorre da matéria de facto provada que a colocação e comercialização do papel comercial da EI..., S.A decorreu entre Setembro e Dezembro de 2013 e que a colocação e comercialização do papel comercial da R..., S.A decorreu entre 7 de Outubro de 2013 e 24 de Fevereiro de 2014.
445. Tendo por referência a data da prática dos factos imputados ao ora Recorrente, a prescrição da suposta contra-ordenação pela violação do dever de qualidade da informação, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A ocorreu em 4 de Junho de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 4 de Dezembro de 2013), o que deve ser declarado e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.
446. A prescrição da suposta contra-ordenação pela violação do dever de qualidade da informação, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A ocorreu em 24 de Agosto de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 24 de Fevereiro de 2014), o que deve ser declarado e, em consequência, o ora Recorrente deve ser absolvido.
A VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE CONFLITO DE INTERESSES CONSUBSTANCIA A PRÁTICA DE UMA ÚNICA CONTRA-ORDENAÇÃO POR CADA PRETENSA VIOLAÇÃO DAS REGRAS PREVISTA NO ARTIGO 309.º DO CVM
447. A Sentença Recorrida imputa ao ora Recorrente a prática de três contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e outras três contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A.
448. Sucede que as infracções alegadamente praticadas pelo ora Recorrente não têm autonomia entre si, pelo que tão-pouco poderão configurar mais do que uma contra-ordenação por cada uma das normas alegadamente violadas.
449. Por um lado, a pretensa actuação do ora Recorrente consubstanciadora das aludidas contra- ordenações é a mesma: a aprovação do papel comercial (sem conceder).
450. Tanto que o próprio facto provado n.º 489 da Sentença Recorrida abarca a aprovação do papel comercial emitido por ambas as emitentes.
451. Por outro lado, o bem jurídico em causa nestas supostas contra-ordenações consiste na protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.
452. Assim, quanto muito, está em causa uma única actuação que permite a imputação ao ora Recorrente, de uma única contra-ordenação, por cada uma das normas pretensamente violadas.
453. Caso assim não se entenda, sem conceder, sempre será forçoso concluir estar em causa contra-ordenações continuadas.
454. A contra-ordenação continuada também se aplica quando está em causa a realização plúrima de vários tipos que protejam o mesmo bem jurídico (sem conceder).
455. Nas contra-ordenações imputadas apenas está em causa a alegada mesma decisão de colocação, pelo B..., do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A junto de clientes: alegadamente adoptada na reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013.
456. Por conseguinte, está em causa uma única contra-ordenação, ainda que possa ser configurada como uma contra-ordenação continuada, o que releva para fixar a medida da sanção, mas nunca para efeitos de imputar diferentes contra-ordenações.
457. Em face do exposto, as supostas violações das regras de conflitos de interesses previstas no artigo 309.º do CVM, no que respeita à colocação, pelo B..., do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, junto de clientes, imputadas ao ora Recorrente, nestes autos, nunca poderiam configurar a prática de contra-ordenações autónomas respeitantes ao papel comercial de cada entidade emitente.
458. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação das regras prevista no artigo 309.º do CVM, devendo a Sentença Recorrida ser revogada e alterada em consequência com o ora exposto (sem conceder).
CONCURSO APARENTE DE CONTRA-ORDENAÇÕES
459. A Sentença Recorrida andou mal ao entender que existiria um concurso efectivo entre seis contra-ordenações alegadamente praticadas pelo ora Recorrente pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, previstas respectivamente nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, previstas e punidas no artigo 397.º, n.º 2 – al. b), do CVM.
460. Igualmente, também errou a Sentença ao imputar ao ora Recorrente a alegada prática de duas contra-ordenações pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, como previsto no artigo 7.º do CVM, previstas e punidas no artigo 397.º, n.º 2 – al. b), do CVM.
461. Com efeito, e contrariamente ao decidido na Sentença, as alegadas contra-ordenações não podiam ter sido simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente, nos termos que se seguem.
A RELAÇÃO DE CONSUMPÇÃO ENTRE AS SEIS CONTRA-ORDENAÇÕES IMPUTADAS E CONSUBSTANCIADAS NA ALEGADA VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE O CONFLITO DE INTERESSES DO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO (ARTIGO 309.º DO CVM)
462. A Sentença imputa ao ora Recorrente a prática de seis contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, das quais três pela colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A, e outras três pela colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A.
463. A verdade é que não se podia ter reconduzido tal imputação pela colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A a uma alegada dupla violação pelo ora Recorrente de cada um dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM.
464. E não o podia ter feito uma vez que se verifica, no caso concreto, um concurso aparente.
465. Em primeiro lugar, a pretensa conduta imputada ao ora Recorrente é a expressão de uma única resolução típica (sem conceder), a qual, no entendimento da CMVM, teria produzido diferentes resultados, mas que se consubstanciou num único facto típico: a conduta alegadamente praticada pelo ora Recorrente reconduz-se à decisão da colocação de papel comercial tomada de decisão do intermediário financeiro B... de emissão, colocação e comercialização do papel comercial emitido pela entidade EI..., S.A.
466. Em segundo lugar, as normas alegadamente violadas pelo ora Recorrente com a sua conduta – os n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM – visam salvaguardar o mesmo bem jurídico, associado às normas sobre conflitos de interesses: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.
467. As normas do artigo 309.º do CVM visam, em termos gerais e abstractos, protecção dos investidores (todos e não investidores específicos) em termos de prevenção de gestão de conflitos de interesses.
468. Assim, e sem conceder quanto ao que já foi exposto supra, as seis contra-ordenações pela violação dos n.os 1 a 3 do artigo 309.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente.
469. Posto isto, saliente-se que existe uma relação de consumpção entre os n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM.
470. Com efeito, as circunstâncias previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 309.º do CVM apenas ocorrerão caso se verifica uma situação de conflito de interesses, o que importa, necessariamente, a violação da previsão normativa do n.º 1 daquele preceito.
471. Nesta medida, é forçoso concluir que o desvalor jurídico pela violação do n.º 1 do artigo 309.º do CVM já se encontra abrangido pelo desvalor da violação dos n.os 2 e 3 do artigo 309.º deste diploma, pelo que, ao preencher um tipo legal mais grave – i.e., o n.º 3 do artigo 309.º do CVM –, este consome ou inclui o preenchimento de outro tipo legal menos grave (i.e., os n.os 1 e 2 do artigo 309.º do CVM).
472. Assim, na Sentença Recorrida não se podia ter imputado ao ora Recorrente a prática, em cúmulo jurídico, de seis contra-ordenações pela violação, pelo mesmo facto, do n.º 1, n.º 2 e n.º 3 do artigo 309.º da CVM, tendo, para este efeito, sido violado o princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
473. Em face do exposto, caso se considere que o Recorrente praticou a aludida infracção (sem conceder), a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada, no sentido de apenas poder, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, pela pretensa violação da regra prevista no n.º 3 do artigo 309.º do CVM.
A RELAÇÃO DE SUBSIDIARIEDADE ENTRE O N.º 1 DO ARTIGO 309.º DO CVM E OS N.OS 2 E 3 DO ARTIGO 309.º DESTE DIPLOMA
474. Ainda que assim não se entenda, a Sentença sempre deveria ter concluído que existe uma relação de subsidiariedade entre o n.º 1 do artigo 309.º do CVM e os n.os 2 e 3 do artigo 309.º deste diploma.
475. Se, por um lado, as infracções pela violação do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 309.º do CVM correspondem a contra-ordenações de perigo concreto ou, no limite, abstracto-concreto, por outro lado, a infracção pela violação do disposto no n.º 3 do artigo 309.º do CVM corresponde, necessariamente, a uma contra-ordenação de perigo concreto.
476. Ao consubstanciar uma contra-ordenação de perigo concreto, a violação do n.º 3 do artigo 309.º do CVM consubstancia uma forma mais grave de violação do bem jurídico protegido nas três normas sobre o conflito de interesses: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.
477. Por sua vez, as contra-ordenações previstas nos n.os 1 e 2 do artigo 309.º do CVM consubstanciam uma violação menos grave do bem jurídico em causa, porquanto não pressupõem que tal bem jurídico tenha efectivamente sido posto em perigo.
478. Assim, na Sentença Recorrida não se podia ter imputado ao ora Recorrente a prática, em cúmulo jurídico, de seis contra-ordenações pela violação, pelo mesmo facto, do n.º 1, n.º 2 e n.º 3 do artigo 309.º da CVM, tendo, para este efeito, sido violado o princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
479. Em face do exposto, caso se considere que o Recorrente praticou a aludida infracção (sem conceder), a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada, no sentido de apenas poder, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, pela pretensa violação da regra prevista no n.º 3 do artigo 309.º do CVM.
A RELAÇÃO DE CONSUMPÇÃO ENTRE AS QUATRO CONTRA-ORDENAÇÕES IMPUTADAS E CONSUBSTANCIADAS NA ALEGADA VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE O CONFLITO DE INTERESSES DO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO PREVISTAS NOS N.OS 2 E 3 DO ARTIGO 309.º DO CVM
480. Ainda que assim não se entenda, sempre será forçoso concluir que existe uma relação de consumpção entre o n.º 2 do artigo 309.º do CVM e os n.º 3 daquele preceito.
481. Quando está em causa um conflito de interesses dito pessoal – i.e. entre os interesses do cliente e os do intermediário financeiro e/ou de quaisquer uma das pessoas com ele equiparadas nos termos do n.º 3 do artigo 309.º do CVM –, a violação do dever previsto no n.º 3 do artigo 309.º do CVM pressupõe e incluirá a violação do dever disposto no n.º 2 do mesmo artigo.
482. Na verdade, se por um lado, nos termos do n.º 2 deste artigo 309.º do CVM, numa situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro está obrigado a actuar de forma imparcial, não devendo privilegiar nem prejudicar nenhum dos seus clientes, por outro lado, a regra, no caso de se tratar de uma das pessoas indicadas no artigo 309.º, n.º 3 do CVM, será a da prioridade do interesse do cliente.
483. Na medida em que tal regra consumirá a regra e o dever do tratamento equitativo em caso de conflito de interesses, o preenchimento do n.º 3 do artigo 309.º do CVM implica a sua sobreposição e a consequente exclusão da aplicação do n.º 2 do mesmo artigo.
484. Por conseguinte, não podem ser simultaneamente imputadas, em cúmulo jurídico, quatro contra-ordenações pela violação do n.º 2 e do n.º 3 do artigo 309.º do CVM, pelo mesmo facto por se encontrarem numa relação de concurso aparente, por consumpção.
485. É, portanto, forçoso concluir que as alegadas duas contra-ordenações pela suposta violação do n.º 2 do artigo 309.º do CVM, estão em concurso aparente com as supostas duas contra-ordenações relativas à alegada violação do n.º 3 do artigo 309.º do CVM.
486. Como tal, na Sentença Recorrida, não se poderia ter imputado simultaneamente, quatro contra-ordenações pela violação do n.º 2 e do n.º 3 do artigo 309.º do CVM, reconduzidas ao mesmo facto, tendo, para este efeito, sido violado o princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
487. Em face do exposto, caso se considere que o Recorrente praticou a aludida infracção (sem conceder), a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada, no sentido de apenas poder, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, pela pretensa violação da regra prevista no n.º 3 do artigo 309.º do CVM.
EM QUALQUER CASO, O CONCURSO APARENTE ENTRE AS CONTRA-ORDENAÇÕES CONSUBSTANCIADAS NA ALEGADA VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE O CONFLITO DE INTERESSES RELATIVAMENTE À COLOCAÇÃO PELO B... DO PAPEL COMERCIAL EMITIDO PELA EI..., S.A E PELA R..., S.A
488. Ainda que assim não se entenda (sem conceder), a Sentença Recorrida deveria ter concluído pela existência de um concurso aparente, por consumpção entre cada uma das três contra-ordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e cada uma das três contra-ordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A.
489. O desvalor jurídico por cada pretensa violação dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM, no caso da colocação do papel comercial da EI..., S.A, já está abrangido pelo desvalor por cada pretensa violação dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CVM, no caso da colocação do papel comercial da R..., S.A, e vice-versa.
490. O preenchimento de cada um daqueles tipos legais pela colocação do papel comercial de uma daquelas entidades emitentes, consome ou inclui o preenchimento de tais tipos pela colocação do papel comercial da outra entidade emitente.
491. Como tal, na Sentença Recorrida, não se poderia ter imputado ao ora Recorrente a prática, em cúmulo jurídico, de duas contra-ordenações por cada pretensa violação, pelo mesmo facto, do n.º 1, n.º 2 e n.º 3 do artigo 309.º da CVM, tendo, para este efeito, sido violado o princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
492. Por conseguinte, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder), a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada, no sentido de apenas poder, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, por cada pretensa violação das regras prevista no artigo 309.º do CVM.
EM QUALQUER CASO, O CONCURSO APARENTE ENTRE AS CONTRA-ORDENAÇÕES CONSUBSTANCIADAS NA ALEGADA VIOLAÇÃO DO ARTIGO 309.º, N.º 3, DO CVM E O ARTIGO 7.º, N.º 1, DO CVM
493. A Sentença Recorrida imputa ao ora Recorrente a alegada prática de duas contra-ordenações pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e ao da R..., S.A, previsto no artigo 7.º do CVM, previstas e punidas no artigo 397.º, n.º 2 – al. b), do CVM.
494. A verdade é que não se podia ter reconduzido tal imputação pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e ao da R..., S.A a uma alegada dupla violação pelo ora Recorrente do artigo 7.º do CVM, uma vez que se verifica, no caso concreto, um concurso aparente.
495. Em primeiro lugar, a pretensa conduta imputada ao ora Recorrente é a expressão de uma única resolução típica (sem conceder), a qual, no entendimento da CMVM, teria produzido diferentes resultados, mas que se consubstanciou num único facto típico: a conduta alegadamente praticada pelo ora Recorrente reconduz-se à decisão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A ou a R..., S.A junto de clientes do B....
496. Em segundo lugar, as normas alegadamente violadas pelo ora Recorrente com a sua conduta – o artigo 309.º, n.º 3, do CVM, como o artigo 7.º do CVM – visam salvaguardar o mesmo bem jurídico: a protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado.
497. Assim, e sem conceder quanto ao que já foi exposto supra, as duas contra-ordenações pela violação do n.º 3 do artigo 309.º do CVM e as duas contra-ordenações pela violação do artigo 7.º do CVM não podem ser simultaneamente imputadas ao ora Recorrente por se encontrarem numa relação de concurso aparente.
498. Nesta medida, é evidente que a pretensa violação da norma do artigo 309.º, n.º 3 do CVM consume a norma do artigo 7.º do CVM, pelo que, ao preencher um tipo legal mais grave – i.e., o n.º 3 do artigo 309.º do CVM –, este consome ou inclui o preenchimento de outro tipo legal menos grave (i.e., artigo 7.º do CVM).
499. Assim, na Sentença Recorrida não se podia ter imputado ao ora Recorrente a prática, em cúmulo jurídico, de quatro contra-ordenações pela violação do n.º 3 do artigo 309.º do CVM e do artigo 7.º do CVM, tendo, para este efeito, sido violado o princípio ne bis in idem previsto no artigo 29.º, n.º 5, da CRP.
500. Por conseguinte, caso se considere que o ora Recorrente praticou a aludida infracção (sem conceder), a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada, no sentido de apenas poder, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, pela pretensa violação da regra prevista no n.º 3 do artigo 309.º do CVM.
501. EM FACE DE TODO O EXPOSTO, caso se considere que o Recorrente praticou as aludidas infracções (sem conceder) apenas poderá, no limite, ser imputada a prática de uma única contra-ordenação ao Recorrente, pela pretensa violação da regra prevista no n.º 3 do artigo 309.º do CVM, relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e ao papel comercial R..., S.A.
502. POR CONSEGUINTE, a Sentença Recorrida deve ser revogada e alterada em conformidade com o ora exposto (sem conceder).
RELEVÂNCIA DO FACTO IMPEDITIVO DO RESULTADO NÃO INCLUÍDO NO TIPO CONTRA-ORDENACIONAL
503. Contrariamente ao sustentado na Sentença Recorrida, as contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente nestes autos configuram contra-ordenações de perigo concreto.
504. Nos casos das contra-ordenações imputadas em causa, pressupõe-se, tal como nos crimes de perigo concreto, a verificação do perigo real resultante da violação da qualidade da informação e das regras de conflito de interesses, caso a caso, não se bastando com a suposição do perigo abstracto.
505. No limite, quer no caso da violação do artigo 7.º do CVM, quer no caso da violação do artigo 309.º do CVM, estaremos sempre perante contra-ordenações de perigo abstracto-concreto (excepto na hipótese do n.º 3 do artigo 309.º do CVM, que não se admite outra hipótese senão a de estarmos perante uma contra-ordenação de perigo concreto).
506. Ora, sendo certo que os tipos das contra-ordenações em causa não exigem a imputação de um efectivo “resultado” negativo na esfera dos Clientes, em última análise, este é o “resultado não incluído no tipo” que se pretende evitar ao consagrar, por antecipação, as contra- ordenações de violação da qualidade de informação (artigo 7.º do CVM) e das regras de conflitos de interesses (artigo 309.º do CVM).
507. Neste contexto, a conduta do agente destinada a evitar o “resultado” não previsto no tipo tem relevância jurídica.
508. No caso concreto, a conduta do ora Recorrente visou, efectivamente, obstar à verificação do “resultado” não previsto nos tipos contra-ordenacionais; tanto que, durante o período em que o ora Recorrente permaneceu enquanto CEO do B..., os Clientes não institucionais ou não qualificados deste banco que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A foram sendo, sempre, reembolsados.
509. Sendo que o incumprimento relevante do reembolso destes instrumentos financeiros apenas ocorreu após a cessação de funções do ora Recorrente, enquanto CEO do B....
510. Assim, no limite e sempre sem conceder, é evidente que a conduta do ora Recorrente foi no sentido de se esforçar, seriamente, para evitar ou obstar à concretização do resultado não contido nos tipos contra-ordenacionais.
511. Estas circunstâncias relevam, desde logo, porque resulta de uma interpretação extensiva do artigo 14.º e 15.º do RGCO (ex vi artigo 407.º do CVM) que a conduta do agente destinada a evitar o resultado não contido no tipo releva, para efeitos de afastar as exigências de punibilidade.
512. Como tal, a conduta do ora Recorrente destinada a evitar o “resultado” não previsto, i.e., a salvaguardar os interesses dos Clientes e a garantir o reembolso do investimento dos clientes não institucionais do B... em papel comercial deveria ter sido devidamente relevada pela CMVM, pelo que a Sentença Recorrida deve ser revogada e o ora Recorrente deve ser absolvido da prática das contra-ordenações que lhe foram imputadas nos presentes autos.
INCONSTITUCIONALIDADE DA MEDIDA DA COIMA PREVISTA NAS NORMAS CONTRA- ORDENACIONAIS INVOCADAS
INCONSTITUCIONALIDADE DA MOLDURA ABSTRACTA DA COIMA APLICÁVEL: VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
513. A Sentença Recorrida condenou o ora Recorrente pela prática de oito contra-ordenações, cada uma das quais punidas com coimas de € 25.000,00 a € 5.000.000,00 (artigo 388.º, n.º 1 – al. a) do CVM).
514. Por força da aplicação das regras de cúmulo jurídico, previstas no artigo 19.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, a coima máxima que se poderia, em abstracto, aplicar ao ora Recorrente, nestes autos, ascende o valor exorbitante de 10 milhões de euros, para além de eventuais sanções acessórias.
515. É, pois, manifesta a desproporcionalidade da moldura abstracta da coima em causa, pela prática de “meros” ilícitos contra-ordenacionais (sem conceder), em violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.
516. EM PRIMEIRO LUGAR, o valor desta coima única, aplicável em cúmulo jurídico, corresponde a mais de 22 vezes o limite máximo da multa única aplicável, em cúmulo jurídico, no âmbito do direito penal, onde o limite máximo da multa é de 450 mil euros (interpretação conjugada dos artigos 47.º, n.º 2, e 77.º, n.º 2, do Código Penal).
517. EM SEGUNDO LUGAR, por maioria de razão, o valor máximo abstractamente aplicável por cada uma das oito contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente, ultrapassa – em muito – o limite máximo da multa aplicável a uma pessoa singular, pela prática de um único crime.
518. Com efeito, da conjugação dos n.os 1 e 2 do artigo 47.º do Código Penal resulta que o limite máximo da pena de multa supletiva aplicável a uma pessoa singular, pela prática de um crime, corresponde a € 180.000,00, o que corresponde apenas a 3,6% do valor da coima abstracta mais elevada que poderá ser aplicada ao ora Recorrente (i.e. € 5 milhões).
519. Mais: mesmo se se considerar o limite máximo da pena de multa previsto em alguns crimes especiais qualificados ou agravados, o valor máximo da pena de multa aplicável a cada um destes crimes é inferior à coima máxima abstractamente aplicável ao ora Recorrente, pela CMVM.
520. Com efeito, mesmo nos casos dos crimes de furto qualificado, abuso de confiança agravado (i.e., apropriação de coisa de valor elevado), dano qualificado, burla qualificada, burla relativa a seguros agravada (que envolva prejuízo de valor elevado), insolvência dolosa, receptação, o limite máximo
521. EM TERCEIRO LUGAR, a violação do princípio da proporcionalidade – aqui suscitada – não resulta do mero facto de os tipos de ilícito contra-ordenacionais previstos no CVM preverem uma sanção pecuniária mais elevada do que um qualquer tipo de ilícito criminal, como, por exemplo, um crime de injúria.
522. Trata-se antes, por um lado, de que os artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular possa ser punida com uma coima, em cúmulo jurídico, de 10 milhões de euros, levará a que a coima aplicável ao ora Recorrente possa superar o limite máximo da pena de multa aplicável, em caso de concurso de crimes.
523. E, por outro lado, que a coima abstractamente aplicável ao ora Recorrente (em resultado da interpretação normativa dos aludidos artigos do CVM e do RGCO) é desproporcional face à natureza de “censura formal” dos ilícitos de mera ordenação social, sobretudo porque se assume com uma discrepância gritante face aos limites máximos da pena de multa aplicáveis a certos tipos de crime, que implicam uma censura material e ético-jurídica mais grave.
524. EM QUARTO LUGAR, a violação do princípio da proporcionalidade é tão mais evidente se considerarmos que o ora Recorrente é uma pessoa singular e não uma pessoa colectiva, o que releva, pelo menos, em dois aspectos.
525. Por um lado, uma única pessoa singular não tem de per se a possibilidade de gerar rendimentos e lucros como, em princípio, uma pessoa colectiva.
526. Por outro lado, ao contrário do que sucede com a responsabilidade penal das pessoas singulares, a panóplia de crimes pelos quais as pessoas colectivas são puníveis é restrita aos casos, expressamente, previstos na lei, o que poderá justificar a aplicação de coimas relevantes a estas, em casos excepcionais.
527. EM CONCLUSÃO, a coima abstractamente aplicável, em cúmulo jurídico, ao ora Recorrente no presente caso é, manifestamente, desproporcional e viola o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.
528. Assim, os artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que, em caso de concurso de contra-ordenações, uma pessoa singular possa ser punida com uma coima única superior ao limite máximo abstracto da pena de multa previsto na lei penal (€ 500 x 600 dias), em caso de concurso de crimes, violam o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP, que consagra o princípio da proporcionalidade e serão, nessa medida, inconstitucionais.
529. Mais: os artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que, em caso de concurso de contra-ordenações, uma pessoa singular possa ser punida com uma coima única igual à coima aplicável a uma pessoa colectiva, pela prática da mesma contra- ordenação, violam o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP, que consagra o princípio da proporcionalidade, e serão, nessa medida, inconstitucionais.
530. De resto, os artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular possa ser punida, pela prática de cada uma das contra-ordenações ali previstas, com uma coima superior ao limite máximo abstracto da pena de multa previsto na lei penal (€ 500 x 600 dias), violam o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP, que consagra o princípio da proporcionalidade, e serão, nessa medida, inconstitucionais.
531. Em face do exposto, requer-se que seja declarada a inconstitucionalidade dos artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, interpretados e aplicados nos sentidos normativos acima referidos, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da LOTC, o que determina a revogação da Sentença Recorrida.
INCONSTITUCIONALIDADE DA MOLDURA ABSTRACTA DA COIMA APLICÁVEL PELA SUA INDETERMINAÇÃO:
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE CONTRA-ORDENACIONAL
532. As normas legais em questão, – o artigo 388.º, n.º 1 – al. a), conjugado com os artigos 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM – nas quais estão previstas as coimas aplicadas ao ora Recorrente, são claramente inconstitucionais, por violação do princípio da legalidade das sanções, na medida em que prevêem uma indeterminação praticamente total do montante da coima a aplicar ao arguido.
533. Com efeito, o artigo 388.º, n.º 1 – al. a) do CVM, ao estabelecer a respectiva moldura infraccional entre € 25.000 e € 5.000.000, para as contra-ordenações qualificadas como muito graves, por um lado, não permite aos destinatários prever a sanção que lhes poderá ser aplicada e, por outro lado, atribuí à CMVM um poder excessivo na determinação da coima.
534. A este propósito, note-se que, no seu Acórdão n.º 547/2001, o Tribunal Constitucional considerou que o artigo 670.º do CVM era violador do princípio da legalidade contra-ordenacional, justamente pela indeterminação excessiva da sua moldura penal, que ia de 500 a 300 000 escudos, sendo que, no presente caso, a variação entre o montante mínimo (€25.000) e o montante máximo da coima (€ 5.000.000) é muito superior.
535. Não há dúvida que se verifica uma excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo da coima aplicável nos presentes autos, prevista no artigo 388.º, n.º 1 – al. a) do CVM.
536. Em face do exposto, requer-se que seja declarada a inconstitucionalidade do artigo 388.º, n.º 1 – al. a), interpretados e aplicados nos sentidos normativos acima referidos, por violação do princípio da legalidade da sanção, previsto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 29.º e do n.º 1 do artigo 30.º da Constituição, aplicável no direito de mera ordenação social, o que determina a revogação da Sentença Recorrida.
CÚMULO JURÍDICO: A ERRADA DETERMINAÇÃO DA MEDIDA CONCRETA DA COIMA DO ERRO DA SENTENÇA RECORRIDA QUANTO À APRECIAÇÃO DA IMPUTAÇÃO AO ORA RECORRENTE DE UMA ACTUAÇÃO A TÍTULO DE DOLO EVENTUAL QUANTO À COLOCAÇÃO DO PAPEL COMERCIAL DA R..., S.A
537. Nos termos da Sentença Recorrida, entendeu o Tribunal da 1.ª instância alterar a Decisão da CMVM e, no que concerne a colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, imputar ao ora Recorrente a prática de uma conduta a título de dolo eventual.
538. Assim, na Sentença, o Tribunal de 1.ª instância considerou que o ora Recorrente não terá agido com a forma mais agravada de dolo, o dolo direito, como tinha sido imputado pela CMVM, mas com dolo eventual, i.e. com uma intenção mais mitigada.
539. Ora, na forma do dolo eventual o conteúdo da culpa é necessariamente menor que nas restantes modalidades do dolo.
540. No entanto, na Sentença não é retirado qualquer efeito jurídico ou consequência prática desta alteração da actuação do Recorrente com dolo directo para uma imputação a título de dolo eventual.
541. As coimas parcelares foram ligeiramente reduzidas mas, ao fazer o cúmulo jurídico das coimas, a Sentença Recorrida concluiu que a Decisão da CMVM não merecia qualquer censura e que teria ponderado correctamente a medida concreta da coima única, tendo confirmado integralmente a coima única aplicada pela CMVM ao ora Recorrente (cfr. páginas 899 e 900 da Sentença).
542. Nesta medida, na determinação da medida da coima concreta a aplicar ao ora Recorrente, o Tribunal da 1.ª instância desconsiderou por completo o facto de que o ora Recorrente actuou com dolo eventual e não com dolo directo.
543. Uma vez que o Tribunal concluiu que o ora Recorrente actuou com dolo eventual, tal determinaria não só a redução das coimas parcelares aplicadas pela CMVM relativamente às infracções relacionadas com a colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A, como, necessariamente, a atenuação da coima única aplicável.
544. Nestes termos, a Sentença Recorrida deverá ser revogada e deverá ser reformulado o cúmulo jurídico das coimas parcelares concretamente aplicadas ao ora Recorrente, tendo em conta a redução das coimas parcelares das contra-ordenações relativamente ao papel comercial emitido pela R..., S.A feita na Sentença e o menor grau de culpa do agente e, em consequência, a medida concreta da coima única deverá ser reduzida.
A INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA E O ERRO DA SENTENÇA RECORRIDA QUANTO AOS BENEFÍCIOS OBTIDOS PELO ORA RECORRENTE
545. A Sentença Recorrida errou ao considerar como elemento relevante na determinação da medida da coima concretamente aplicável que o ora Recorrente obteve qualquer benefício com os factos (cfr. parágrafos 22629 e seguintes da página 892 da Sentença), por duas ordens de razão:
546. Por um lado, da mera leitura da Sentença Recorrida não constam quaisquer factos provados concretos que permitam concluir que o ora Recorrente tenha obtido qualquer benefício da prática das contra-ordenações imputadas na decisão.
547. Muito menos resulta dos factos provados na Sentença uma qualquer quantificação do benefício supostamente auferido pelo ora Recorrente.
548. Logo, o Tribunal de 1.ª instância não deu como provados factos que permitam sustentar a imputação formulada contra o ora Recorrente, a título conclusivo, nos parágrafos 22629 e seguintes da página 892 da Sentença Recorrida de que este obteve um benefício com a prática da infracção.
549. Em rigor, está em causa uma insuficiência da matéria de facto, que resulta da mera leitura da própria Sentença Recorrida, e que releva, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2 - al. a), do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1, e 74.º, n.º 4, do RGCO.
550. Pelo exposto, a insuficiência da matéria de facto provada resultante da falta de factos provados na Sentença Recorrida que permitam sustentar que o Recorrente obteve um benefício com as condutas ilícitas praticadas configura um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, devendo a mesma ser revogada, ordenando- se a baixa do processo para correcção do vício, o que se REQUER.
551. Por outro lado, a mera titularidade de órgãos sociais de uma sociedade não permite, por si só, retirar qualquer benefício para o agente.
552. De facto, os “interesses” que o agente alegadamente tenha – enquanto titular de órgãos sociais de várias entidades do G... – de captar para a EI..., S.A e para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G..., não se traduzem num benefício obtido pelo agente.
553. Nestes termos, não podia a Sentença Recorrida ter considerado como critério relevante para a determinação da medida concreta da coima que o ora Recorrente obteve qualquer benefício com os factos e, por conseguinte, a Sentença Recorrida deverá ser revogada e deverá ser reponderada e reformulada a determinação do valor global da coima aplicada ao ora Recorrente pelo Tribunal de 1.ª instância.
A INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA: A FALTA DE PONDERAÇÃO DOS ACTOS DO ORA RECORRENTE DESTINADOS A REPARAR OS DANOS OU OBVIAR AOS PERIGOS CAUSADOS PELAS INFRACÇÕES
554. Na Sentença Recorrida, concluiu o Tribunal de 1.ª instância que desconhecia a existência de actos do ora Recorrente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção (cfr. parágrafos 22635 e 22636 da Sentença).
555. A Sentença Recorrida não fez a ponderação correcta desta questão, uma vez que, de facto, no recurso de impugnação judicial o ora Recorrente foram alegados factos que demonstram que a conduta do ora Recorrente visou obviar aos supostos perigos causados pela infracção, em concreto, obstar ao não reembolso aos Clientes do B... do investimento feito em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A.
556. Durante o período em que o ora Recorrente permaneceu enquanto CEO do B... (até 13 de Julho de 2014), os Clientes não institucionais ou não qualificados do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A foram sendo, sempre, reembolsados.
557. Como referido no recurso de impugnação judicial, em particular, nos artigos 2461 a 2469, entre 30 de Junho de 2014 e 31 de Dezembro de 2013 verificou-se uma redução de € 1.355 milhões no papel comercial emitido por estas duas entidades colocado nos Clientes não institucionais do B..., ou seja, houve uma redução de 70% do papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A colocado em Clientes institucionais do B..., que foi reembolsado durante esse período.
558. Assim, o reembolso da dívida titulada emitida pela EI..., S.A e pela R..., S.A que foi sendo realizado durante o ano de 2014 (até à medida de resolução do B...) demonstra a preocupação do B... e dos seus administradores com a protecção e salvaguarda dos principais interesses dos clientes do B....
559. Se o Tribunal de 1.ª instância considera – e bem! – relevante a existência de actos da iniciativa do ora Recorrente que se destinem a reparar os danos ou a obviar aos perigos causados pelo ilícito alegadamente praticado, enquanto atenuante para a determinação da medida da coima a aplicar ao arguido, não poderia ter desconsiderado por completo estes factos alegados no
recurso de impugnação judicial do Recorrente.
560. Uma vez que a matéria de facto referida supra, invocada no recurso de impugnação judicial foi ignorada pela Sentença Recorrida, na qual se considerou que se desconhecia a existência de actos do ora Recorrente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção, é forçoso concluir que se verifica uma insuficiência da matéria de facto para a decisão, prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, que se requer seja declarada.
561. Em consequência, a Sentença Recorrida deve ser revogada e ser ordenada a baixa dos autos ao Tribunal de 1.ª Instância, nos termos e para os efeitos do artigo 75.º, n.º 2, alínea b) do RGCO, com vista à sanação deste vício e à apreciação, pela 1.ª Instância, dos reembolsos da dívida titulada emitida pela EI..., S.A e pela R..., S.A que foram realizados durante o ano de 2014 enquanto actos destinados a obviar aos perigos causados pelo ilícito.
DO ERRO DA SENTENÇA QUANTO À EXISTÊNCIA DE ANTECEDENTES CONTRA-ORDENACIONAIS
562. Nos parágrafos 22657 e seguintes da página 893 e parágrafos 22664 e seguintes da página 894 da Sentença Recorrida, é destacado que o ora Recorrente tem antecedentes contra-ordenacionais, por violação de normas em que está em causa o regulador Banco de Portugal, mas que afectam igualmente o mercado financeiro, uma vez que foi condenado, no âmbito do processo n.º 182/16...., mediante sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, transitada em julgado em 6 de Novembro de 2020.
563. Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão à Sentença Recorrida.
564. Em primeiro lugar, a condenação do ora Recorrente no âmbito do processo n.º 182/16...., por sentença transitada em julgado, não pode relevar enquanto antecedente contra-ordenacional, por que os factos relevantes naquele processo não são anteriores aos factos destes autos.
565. Muito menos se tivermos em consideração que naqueles autos estão em causa os mesmos factos imputados ao ora Recorrente nestes autos, nas mesmas circunstâncias de tempo e de lugar.
566. Em qualquer caso, as infracções ali imputadas ao ora Recorrente terão sido alegadamente praticadas ao tempo da alegada prática das infracções aqui arguidas.
567. A lógica de graduar a coima do agente tendo em conta os seus antecedentes contra-ordenacionais tem subjacente as necessidades de prevenção especial, relacionadas com a dissuasão do agente condenado em relação à reincidência.
568. No entanto, não está aqui em causa uma actuação posterior ilícita do ora Recorrente, uma vez que os factos em causa na decisão condenatória do processo n.º 182/16.... não são anteriores aos da Sentença Recorrida.
569. Em segundo lugar, a relevância dada à condenação do ora Recorrente no âmbito do processo n.º 182/16.... afigura-se totalmente contraditória e incongruente com a posição adoptada pelo Tribunal de 1.ª instância quanto à inexistência de violação do princípio ne bis in idem na Sentença Recorrida.
570. Nestes termos, a Sentença deve ser revogada e alterada, devendo-se concluir pela ausência de antecedentes contra-ordenacionais do ora Recorrente e, em consequência, ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.
O ERRO NA PONDERAÇÃO DA SITUAÇÃO ECONÓMICA DO ORA RECORRENTE NA DETERMINAÇÃO DA COIMA APLICÁVEL
571. Na Sentença Recorrida, a maioria dos factos alegados pelo Recorrente no seu recurso relativos à sua situação e condição económica, com relevância para a determinação adequada da coima, foram dados como provados, conforme constam dos factos provados 757 a 779 das páginas 350 a 354 da Sentença.
572. No entanto, Tribunal não retira de tal aditamento qualquer efeito ou consequência prática, com reflexo na medida da coima aplicada, tendo confirmado na íntegra a coima única aplicada pela CMVM ao ora Recorrente, pela alegada prática das oito contra-ordenações pela violação das regras de conflitos de interesses e falta de qualidade da informação prestada relativa à comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A.
573. Em bom rigor, se estes factos se afiguram relevantes para a Sentença, então deveriam ter sido relevados e, em consequência, o Tribunal deveria ter concluído que a medida da coima única aplicada pela CMVM não era proporcional, nem adequada à condição do ora Recorrente e, como tal, deveria ter determinado a redução da coima única aplicada ao ora Recorrente.
574. E, com efeito, perante a matéria de facto provada na Sentença, é forçoso concluir que o ora Recorrente não dispõe de património ou meios financeiros próprios relevantes, pelo que a coima única aplicada pela Sentença Recorrida violou o disposto no n.º 4 do artigo 405.º do CVM.
575. Pelo exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e reformulada, devendo ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao Recorrente tendo em consideração a situação económica do ora Recorrente, dada como provada na Sentença Recorrida e, em consequência, deverá ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.
O ERRO NA PONDERAÇÃO DA SITUAÇÃO PESSOAL DO ORA RECORRENTE NA DETERMINAÇÃO DA COIMA APLICÁVEL
576. Na mesma linha, na Sentença Recorrida, o Tribunal de 1.ª instância deu como provado que actualmente o ora Recorrente tem um diagnóstico clínico compatível com a doença de ... (facto provado 780), tendo reconhecido que tal facto mitigaria as exigências de prevenção especial (cfr. página 895 da Sentença Recorrida).
577. Apesar de sublinhar que o diagnóstico clínico de ... do ora Recorrente mitigar as exigências de prevenção especial, o Tribunal de 1.ª instância manteve a coima única aplicada pela CMVM.
578. Ora, como é bom de ver, o diagnóstico acima referido afigurava-se relevante para a boa decisão da causa, porquanto permitia valorar as condições pessoais do ora Recorrente, impondo que, a manter-se a condenação do ora Recorrente (sem de forma alguma conceder) a coima aplicada tivesse sido objecto de redução na Sentença Recorrida.
579. As necessidades de prevenção – gerais e especiais – são tanto menores quando se verifica que o arguido não tem a capacidade de compreender a totalidade da sanção.
580. É, precisamente, o que se verifica nos presentes autos, como resulta do diagnóstico clínico da doença de ... feito ao ora Recorrente, pelo que sempre será forçoso concluir que, a manter-se a condenação do ora Recorrente (sem de forma alguma conceder), a coima aplicada terá de ser objecto de uma manifesta redução à luz das circunstâncias pessoais do ora Recorrente.
581. Com efeito, na determinação da medida concreta da coima a aplicar ao ora Recorrente, a Sentença Recorrida deveria ter ponderado correctamente que, tanto a doença mental cognitiva que lhe foi diagnosticada como a idade avançada do Recorrente – 78 anos – concorrem para mitigar as exigências de prevenção geral e especial e, em consequência, as necessidades da sanção.
582. Desde logo, porque a capacidade cognitiva do ora Recorrente para compreender o alcance da coima que lhe é aplicada está arredada e afectada ou, pelo menos, diminuída.
583. Pelo exposto, a Sentença Recorrida deve ser revogada e reformulada, devendo ser devidamente ponderada a determinação do valor global da coima aplicada ao Recorrente tendo em consideração a situação pessoal do ora Recorrente, dada como provada na Sentença Recorrida e, em consequência, deverá ser reduzida a coima aplicada ao ora Recorrente.

Concluiu, pedindo que o presente recurso seja julgado inteiramente procedente e ser declarada a extinção do presente processo, por prescrição.
Em qualquer caso (sem conceder), requer-se que o presente recurso seja julgado integralmente procedente com base nos fundamentos e quanto às questões acima suscitadas no corpo das alegações e respectivas conclusões (que aqui se dão por reproduzidas, por economia processual), a Sentença Recorrida seja revogada e, em consequência, o ora Recorrente seja absolvido das contra-ordenações que lhe foram imputadas na Sentença Recorrida ou, caso assim, não se entenda determinada a baixa do processo para sanação dos vícios aqui suscitados quanto à Sentença Recorrida ou, caso assim não se entenda, que sejam reduzidas as coimas aplicadas ao ora Recorrente.
*
Conclusões (BB)
§   1. O Recorrente vinha condenado pela prática, a título doloso, de 8 (oito) contra-ordenações, na coima única no montante de € 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil euros), e na sanção acessória de inibição do exercício de funções por 4 (quatro) anos.
§ 2. Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo condenou o Recorrente pela prática das mesmas 8 (oito) contra-ordenações, 4 (quatro) delas a título de dolo (eventual), e as restantes 4 (quatro) a título de negligência, na coima única no montante de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), parcialmente suspensa na sua execução, pelo período de 2 (dois) anos, mantendo a sanção acessória, reduzindo-a para 2 (dois) anos.
§ 3. Apesar de não se conformar com a Sentença recorrida, por força do disposto no artigo 75.º, n.º 1, do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, o Recorrente vê-se obrigado a limitar o presente Recurso a matéria(s) de Direito, designadamente aos vícios processuais e erros de direito que, no seu entender, são suficientes para inquinar a Sentença, e, a final, determinar a sua revogação e substituição por outra que o absolva, in totum, da prática das contra-ordenações por que vem condenado.
DA (DUPLA)VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO NE BIS IN IDEM
§ 4. O presente processo corresponde a uma violação do princípione bisin idem, consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, no artigo 14.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, no artigo 4.º, n.º 1, do Protocolo n.º 7 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e, ainda, no artigo 50.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o qual tem plena aplicação no âmbito contra-ordenacional.
§ 5. O ne bis in idem constitui garantia de que ninguém pode ser submetido a processo sancionatório mais do que uma vez pelo mesmo conjunto de factos concretos, acontecimentos histórico-naturalísticos, independentemente do tipo legal, qualificação jurídica, lei aplicável, sistema sancionatório ou autoridade competente, proibindo a dupla punição/penalização, bem como a dupla perseguição/prossecução.
§ 6. Os factos sub judice i.e., a (suposta) intervenção do Recorrente na operação de emissão e colocação, pelo B..., de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A não só foram já sancionados pelo Banco de Portugal no processo de contra-ordenação n.º 58/..., como foram objecto de acusação criminal no processo n.º 324/14...., actualmente em fase de instrução junto do Tribunal Central de Instrução Criminal.
§ 7. A Decisão proferida pela CMVM, econfirmada pela Sentença, respeita, essencialmente, (i) à comercialização de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A em alegado prejuízo dos interesses dos clientes do B..., e (ii) à disponibilização de informação sobre as entidades emitentes alegadamente não correspondente com a realidade.
§ 8. Os factos referentes ao papel comercial emitido pela EI..., S.A são em tudo coincidentes com os constantes da decisão proferida pelo Banco de Portugal no referido processo de contra-ordenação, o qual teve por objecto a desconformidade dos registos contabilísticos da EI..., S.A, a ausência de sistemas e procedimentos de gestão de risco, e, ainda, os alegados conflitos de interesses na comercialização de papel comercial da EI..., S.A.
§ 9. A alegada falta de qualidade da informação constante das Notas Informativas da EI..., S.A é resultado directo da falsificação das respectivas contas eda obnubilaçãoda sua situação económica, facto esse já sancionado no processo movido pelo Banco de Portugal.
§ 10. Já os factos relativos ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, surgem igual e integralmente vertidos na acusação deduzida no referido processo-crime: (i) a falsificação das demonstrações financeiras da EI..., S.A e a colocação de papel comercial pela mesma emitido nessas circunstâncias, maxime o teor das respectivas Notas Informativas; (ii) a operação de reestruturação do G..., o respectivo alegado impacto na situação da R..., S.A, e a continuação da colocação de papel comercial pela mesma emitido após a concretização da referida operação, não reflectida nas respectivas Notas Informativas; e (iii) a emissão e comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, aprovada na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, em alegado conflito de interesses e consequente prejuízo dos interesses dos clientes do B....
§ 11. A circunstância de as infracções imputadas, as sanções aplicadas, e as entidades competentes serem diversas [ou, de resto, a distinção/autonomia entre os sistemas sancionatórios, sectores de actividade e/ou os interesses jurídicos em causa (ainda que, em todo o caso, os mesmos)] é perfeitamente irrelevante.
§ 12. Em conformidade com a jurisprudência nacional e europeia, o conceito relevante para o efeito corresponde a um conceito histórico-naturalístico, em função do concreto acervo factual, espácio e temporalmente delimitado, e não da lei aplicável, da autoridade competente, dos tipos legais, ou do bem jurídico tutelado.
§ 13. O mesmo facto reconduz-se, assim, ao mesmo conjunto de circunstâncias factuais concretas, indissociavelmente ligadas no tempo e no espaço, arredadas do nomen juris ou da inserção sistemática das infracções eventualmente em causa.
§ 14. Estando em causa o mesmo conjunto de decisões, alegadamente tomadas em conflito de interesses, que conduziram à emissão e (continuação da) comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, e à disponibilização, nesse contexto, de informações (também alegadamente) sem qualidade, os factos são rigorosamente os mesmos, respeitam aos mesmos agentes e às mesmas condutas, e, em todo o caso, aos mesmos interesses jurídicos (clientes, investidores, mercado).
§ 15. O que materializa as infracções imputadas é o mesmo processo factual associado à operação global de comercialização do papel comercial (no qual se inclui a informação disponibilizada para o efeito)  já objecto de decisão final definitiva pelo Banco de Portugal, e, mais recentemente, de acusação no referido processo-crime.
§ 16. A circunstância de estarmos perante infracções nele não apreciadas pelo regulador no referido antecedente processo contra-ordenacional não releva para efeitos da proibição em causa, na medida em que esta abrange toda a matéria cognoscível.
§ 17. Prevendo o artigo 37.º do RGCO regras para a resolução de conflitos de competência, é, igualmente, irrelevante o facto de estarmos perante entidades competentes diversas, tendo, à luz do disposto no artigo 79.º, n.º 1, do RGCO, o Banco de Portugal esgotado o ius puniendi relativamente aos factos referentes à EI..., S.A, precludindo, assim, a possibilidade de a CMVM exercer o seu próprio poder punitivo sobre os mesmos.
§ 18. Por fim, sendo os factos em causa susceptíveis de constituir, simultaneamente, a prática de crimes, é aplicável o postulado no artigo 20.º do RGCO, e não o (especialmente) disposto no artigo 420.º, n.º 1, do CdVM  o qual, sob pena de inconstitucionalidade por violação do artigo 29.º, n.º 5, da CRP, deve ser interpretado restritivamente no sentido de excluir os casos de concurso aparente, e, por isso, o presente caso.
§ 19. Num e noutro(s) processo(s), estão em causa, além dos mesmos factos, a mesma alegada conduta, o mesmo alegado comportamento global, hipoteticamente dominado por um único (ou preponderante) sentido social autónomo de ilicitude ou desvalor jurídico, independentemente do número de resoluções do agente e/ou de bens jurídicos violados (critério há muito ultrapassado para a aferição da unidade ou pluralidade de infracções), inexistindo, de resto, qualquer relação de complementaridade entre os processos em causa, antes de exclusividade, quando não consunção.
§ 20. Por conseguinte, verificando-se, alegadamente, concurso entre crime e contra-ordenação, deve, nos termos conjugados dos artigos 20.º e 38.º, n.os 1 e 2, ambos do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, ser determinada a remessa dos presentes autos ao Tribunal Central de Instrução Criminal, o que expressamente se requer.
§ 21. De resto, tendo a Decisão proferida pela CMVM, e confirmada pelo Tribunal a quo, incidido sobre factos susceptíveis de constituir, simultaneamente, crime pelos quais foi, aliás, já deduzida acusação criminal, e pela autoridade competente para o efeito , a mesma padece de nulidade insanável, por violação das regras de competência [cfr. artigo 119.º, alínea e), do CPP [aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO)], nulidade que se deixa, desde já, expressamente invocada para os devidos efeitos legais.
§ 22. Em face do que, deve, por força do disposto nos artigos 119.º, alínea e), e 122.º, ambos do CPP (aplicáveis ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO), e, bem assim, nos artigos 20.º e 38.º, n.os 1 e 2,do RGCO, aplicávelex viartigo 407.º do CdVM, serdeclarada a nulidade da Decisão proferida pela CMVM, por violação das regras de competência, mais determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal Central de Instrução Criminal.
§ 23. A interpretação normativa resultante da conjugação dos artigos 20.º e 38.º, n.os 1 e 2, do RGCO, e 401.º, 408.º, n.º 1, e 420.º, n.º 1, todos do CdVM, no sentido de que a autoridade administrativa pode apreciar, investigar, instruir processos, acusar e condenar por factos susceptíveis de constituir, simultaneamente, crime, e objecto de acusação em processo criminal, é materialmente inconstitucional por violação do princípio ne bis in idem, consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, inconstitucionalidade que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
§ 24. Caso assim não se entenda, sempre deverá o Recorrente ser absolvido da prática das 4 (quatro) contra-ordenações imputadas por referência ao papel comercial da EI..., S.A, cujos factos subjacentes foram já objecto de decisão final por parte do Banco de Portugal.
§ 25. A interpretação normativa resultante da conjugação dos artigos 79.º, n.º 1, do RGCO, 401.º, e 408.º, n.º 1, ambos do CdVM, no sentido de que a autoridade administrativa pode apreciar, investigar, instruir processos, acusar e condenar por factos já objecto de decisão final definitiva por outra autoridade administrativa, é materialmente inconstitucional por violação do princípio ne bis in idem, consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, inconstitucionalidade que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
DO PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
§ 26. Conforme resultou provado, pese embora o Recorrente fosse administrador da EI..., S.A, a verdade é que a mesma não prosseguia um verdadeiro objecto social, para além, naturalmente, da gestão de participações sociais (cfr. ponto 84 da matéria de facto provada constante da Sentença), nem, por isso, o respectivo Conselho de Administração se apresentava subdividido em pelouros, muito menos executivos e não executivos.
§ 27. No que concerne à R..., S.A, o Recorrente nela nunca exerceu qualquer cargo (cfr. ponto 139 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 28. Já no respeitante à Epi..., S.A, o Recorrente era administrador não executivo da mesma, integrando o respectivo Comité de Investimentos, responsável, nomeadamente, pelo acompanhamento e gestão dos Fundos Epi..., S.A, incluindo o Fundo Elz....
§ 29. No B..., o Recorrente era responsável, nomeadamente, pelos pelouros dos Departamentos de ... e de... (cfr. ponto 521 da matéria de facto provada constante da Sentença), sendo que as valências e funções por si mais desempenhadas, na prática, tinham que ver, principalmente, com a angariação e manutenção de clientes (private), e com a representação externa do Banco, actuando quase como um “relações públicas” daquele (cfr. ponto 782 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 30. Ao Recorrente não cabia, nem nunca coube, a gestão de assuntos financeiros, de contabilidade, tesouraria, estratégia de investimento, política de crédito/financiamento, jurídicos, de compliance, risco, marketing, informação ao mercado, auditoria ou inspecção e afins  nem no B..., nem na EI..., S.A, nem na R..., S.A (ou, de resto, em qualquer outra sociedade do Grupo) assuntos esses que são os que aqui estão em causa.
§ 31. Tais matérias estavam acometidas a outras pessoas, a outros administradores que não o Recorrente, nomeadamente aos Arguidos AA, FF, EE e DD (cfr., aliás, pontos 13 e seguintes da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 32. Quaisquer informações e propostas (maxime deliberativas), incluindo no que respeita aos temas abordados na Sentença (designadamente relativas à emissão e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A), quando eram apresentadas em reunião do Conselho de Administração ou da Comissão Executiva do B... (ou, de resto, do Conselho Superior do G...), vinham preparadas e visadas pelos respectivos departamentos.
§ 33. O Recorrente não procedia, por isso, ao controlo e sindicância das opções e decisões tomadas nessa sede, das quais tinha conhecimento quando abordadas nas referidas reuniões, e, nesse âmbito, nos precisos e exactos moldes em que eram apresentadas.
§ 34. Neste contexto, entre os seus pares o Recorrente era e é visto como uma pessoa que confia e é de confiança, que exerceu as suas funções com sentido de responsabilidade e rectidão, procurando respeitar os interesses dos clientes, investidores, colaboradores e demais stakeholders e honrando o nome da sua família, não sendo considerado um profissional tecnicamente muito dotado (cfr. ponto 783 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 35. O Recorrente confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do G... fossem apresentadas ou tomadas pelo Arguido AA, bem como no modelo de repartição de tarefas instituído, cingindo a sua actuação no dia-a-dia do G... às funções supra descritas (cfr. ponto 786 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 36. O Arguido AA, líder incontestado do B... (e do G...) há mais de 20 (vinte) anos, era o principal responsável pela sua gestão estratégica, financeira e de risco, sendo pessoa a quem todos reconheciam grande competência e capacidade de liderança, com o qual o Recorrente tinha relação pessoal e profissional de grande proximidade.
§ 37. O Recorrente não tinha, sob a sua responsabilidade, funções relativas à colocação de dívida e/ou à gestão da oferta comercial do Banco, tendo confiado que o processo de comercialização do Papel Comercial não contendia com os interesses dos subscritores, e, bem assim, que as Notas Informativas continham informação com qualidade.
§ 38. O Recorrente actuou, pois, ao abrigo do princípio da confiança aqui com plena aplicabilidade, porquanto qualquer imputação subjectiva ao Recorrente só poderá, quando muito, ter lugar a título de negligência (isto porque este princípio quando não exclui, por completo, qualquer imputação objectiva, obsta, pelo menos, a uma imputação dolosa)  segundo o qual cada pessoa e ente colectivo podem legitimamente esperar que os outros cumpram as suas funções de modo diligente, respeitando os seus próprios deveres de cuidado, sem que tenham de responder caso isso não suceda.
§ 39. Numa estrutura e organização complexas, é normal e expectável a divisão de tarefas entre administradores, conferindo-lhes pelouros dos quais se encarregam, aos quais se dedicam e para os quais direccionam as suas responsabilidades.
§ 40. Em sociedades comerciais tão complexas quanto o B... ou no contexto de um Grupo como o G..., não era possível que cada administrador soubesse, em detalhe e/ou a todo o momento, o que ocorre nas áreas da responsabilidade dos demais administradores.
§ 41. No âmago de estruturas complexas, e na vida em geral, cada pessoa pode legitimamente esperar que os outros cumpram as suas funções de modo diligente, respeitando os seus próprios deveres de cuidado, sem que tenham que responder na eventualidade de terceiros, em quem depositam legítima confiança, praticarem actos ilícitos.
§ 42.Se a actuação inadequada ou ilícita de um sujeito tem origem em comportamento de terceiros, merecedores de confiança, o agente não precisa e não tem de entrar em linha de conta com esse risco, podendo legitimamente confiar que esses terceiros são eles próprios (auto)responsáveis e que se comportam de modo fiel ao Direito.
§ 43. Assim, e salvo situações excepcionais, aqui não verificadas, no âmbito das quais o agente tenha fundadas razões para não confiar no comportamento de terceiros, ou se tomar conhecimento do incumprimento de determinado dever de cuidado, o agente que confia em terceiros merecedores de confiança legítima, tem direito a fazê-lo.
§ 44. A confiança depositada pelo Recorrente nos seus pares era uma confiança institucional, de estrutura, de acordo com a divisão de funções, e, sempre e a cada momento, fundada, não se verificando, por isso, qualquer excepção ao princípio da confiança.
§ 45. Imputar ao Recorrente responsabilidades por não ter antecipado a possibilidade de uma conduta dolosa por parte de quem era inteiramente merecedor da sua confiança, é negar o princípio da confiança, mas, sobretudo, o princípio da auto-responsabilidade.
§ 46. Acresce que, o Recorrente, por carácter, hábito e formação, sempre delegou bastante, confiando quer nos colegas, quer nas estruturas e serviços, razão pela qual não lhe era habitual nem frequente olhar com desconfiança para as informações que lhe eram transmitidas, sindicar as actuações a que assistia, ou questionar, exaustivamente, o histórico de tudo quanto lhe era comunicado ou chegava ao seu poder.
§ 47. Em particular, atendendo ao complexo modelo organizativo que caracterizava o B..., era legítimo ao Recorrente confiar que o processo de emissão e comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinha sido levado a cabo dentro da legalidade, bem como que a informação disponibilizada reflectia a realidade da situação das entidades emitentes.
§ 48. Com efeito, e por razões de comércio jurídico, praticabilidade, segurança e razoabilidade, mas também de uso, formação e tradição, os sucessivos depósitos de confiança pelo Recorrente em terceiros, nomeadamente colegas, encontram perfeita justificação, até porque o eram em pessoas que se encontravam, quando não no mesmo plano hierárquico do Recorrente, em plano superior ou distinto.
§ 49. Não só o princípio da confiança tem igual aplicação relativamente a pares, no mesmo plano hierárquico, como, em todo o caso, o Recorrente não partilhava do mesmo conhecimento (ou competências) que os demais administradores que se encontravam nesse mesmo plano.
§ 50. Em suma, o Recorrente sempre actuou ao abrigo (i) da repartição de funções estabelecida, tendo em conta a formação, habilitações e experiência de cada membro do Conselho de Administração do B..., e, de resto, (ii) da confiança recíproca de enos seus colegas, e de que estes cumpriam com diligência as funções que lhes competiam.
§ 51. Pelo que ao Recorrente não pode ser imputada a prática de qualquer contra-ordenação relativa à emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, seja por alegado conflito de interesses na respectiva tomada de decisão e concretização, seja por alegada falta de qualidade da informação para tanto divulgada.
DA ALEGADA VIOLAÇÃO DAS REGRAS SOBRE CONFLITOS DE INTERESSES
§ 52. Vem o Recorrente condenado pela alegada violação, por três vezes, do disposto no artigo 309.º do CdVM, mais concretamente pela (também alegada) prevalência de determinados putativos interesses na colocação, pelo B..., de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, face aos interesses dos respectivos subscritores.
§ 53. Desde logo, não pode ser imputada a violação, em simultâneo, dos números 2 e 3 do citado preceito legal, uma vez que os deveres de gestão dos conflitos de interesses neles previstos são um único dever, não tendo o dever de dar prevalência aos interesses do cliente autonomia face ao dever de tratamento transparente e equitativo.
§ 54. Considerá-los deveres autónomos seria admitir a possibilidade de um intermediário financeiro não dar prevalência ao interesse do cliente, e, ainda assim, estar a tratá-lo equitativamente o que é um evidente contra-senso, pois que a violação do referido número 3 implica, sempre e necessariamente, a violação do referido número 2.
§ 55.    Ao informar do alegado conflito de interesses (como pugna o Tribunal a quo), sempre o intermediário financeiro já estará a dar prevalência aos interesses dos investidores.
§ 56. Estamos perante uma única norma tipificadora, e, por isso, uma alegada violação de um só dever, uma única possível infracção.
§ 57. A interpretação normativa do artigo 309.º, n.os 2 e 3, do CdVM como normas contra-ordenacionais autónomas isto é, no sentido de que podem consubstanciar duas infracções dissociáveis e cumulativamente imputáveis ao agente é materialmente inconstitucional, por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 29.º, n.os 1 e 3, da CRP, o que se invoca para todos os efeitos legais.
§ 58. A Decisão erra, também, ao imputar ao Recorrente duas violações do número 1 do artigo 309.º do CdVM, uma por referência ao papel comercial da EI..., S.A e outra por referência ao Papel Comercial da R..., S.A, porquanto o dever de estabelecer uma organização idónea à identificação, prevenção e redução dos riscos associados à ocorrência de potenciais situações de conflitos de interesses constitui um dever genérico.
§ 59. A alegada ausência de semelhante organização corresponde a uma única omissão, resultante de uma única alegada conduta ou resolução (omissiva), à luz do respectivo comportamento global espácio e temporalmente determinado, consubstanciando, por isso, uma única alegada violação do correspondente dever (i.e., uma única infracção).
§ 60. O ilícito contra-ordenacional em causa consuma-se com a falta de implementação, pelo intermediário financeiro, de um sistema de organização apto a diminuir o risco de ocorrência de conflitos de interesses, e não com eventuais (e tantas quantas) situações de conflitos de interesses que emerjam dessa falta de organização, as quais não integram já o tipo contra-ordenacional, e não consubstanciam novas consumações do mesmo.
§ 61. As duas alegadas situações de conflito de interesses objecto do presente processo a emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A  sempre resultariam de um unico alegado defeito organizativo, uma única alegada omissão, uma única resolução, uma mesma decisão/deliberação, e num mesmo fórum, a reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013.
§ 62. E isto independentemente dos bens jurídicos tutelados, ainda que coincidentes: não a protecção dos interesses dos investidores da R..., S.A e a protecção dos interesses dos investidores da EI..., S.A, mas, antes e ao invés, a protecção dos potenciais investidores, em geral, e a sua percepção do mercado e respectivo regular funcionamento.
§ 63. Termos em que deve o Recorrente ser absolvido das 2 (duas) contra-ordenações relativas à alegada violação do número 3 do artigo 309.º do CdVM, e, ainda, de 1 (uma) contra-ordenação relativa à alegada violação do número 1 do artigo 309.º do CdVM.
§ 64. Sem prescindir, e em todo o caso, a verdade é que ao Recorrente não pode ser imputada qualquer violação das regras sobre conflitos de interesses, muito menos nos termos propugnados pelo Tribunal a quo.
§ 65. A ratio subjacente às disposições legais referentes aos conflitos de interesses é a garantia de que não existirá, em determinadas circunstâncias, uma sobreposição dos interesses dos intervenientes decisores com os da instituição financeira e/ou dos seus clientes, sobreposição essa que é aferida não pelas aparências, mas pela substância.
§ 66. As meras posições societárias e/ou funções exercidas do/pelo Recorrente não bastam para que se verifique conflito de interesses, quando, no caso concreto, e em termos objectivos, inexistem razões para que o tipo contra-ordenacional esteja preenchido.
§ 67. Não obstante ser administrador do B... (e das demais sociedades referidas a este propósito na Sentença), o Recorrente não tinha qualquer interesse pessoal, mormente concorrente, na colocação, pelo B..., junto dos seus clientes, de dívida da EI..., S.A ou da R..., S.A, constituindo a aprovação da correspondente decisão, na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, mera manifestação de apoio formal e institucional.
§ 68. E o mesmo sucedeu com a sua votação favorável ao plano de reestruturação do G... na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, porquanto, desde logo, e entre o mais, o Recorrente não integrou o grupo de trabalho especialmente constituído para o efeito (cfr. ponto 375 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 69. Em nenhum momento a sua posição indirecta na EI..., S.A e nas suas subsidiárias  ou, inversamente, a sua posição enquanto administrador do Banco influíram em qualquer tomada de decisão do Recorrente contrária aos seus deveres funcionais.
§ 70. Consequentemente, não seria exigível ao Recorrente que tivesse adoptado qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização do papel comercial nas alegadas (inexistentes, desconhecidas ou por ele não partilhadas) condições, nem o Recorrente tinha o poder ou competência, muito menos isoladamente, de promover a sua adopção.
§ 71. Acresce que, o Tribunal a quo, à semelhança do que já havia feito a CMVM, confunde e mistura o alegado conflito de interesses com a alegada falta de qualidade da informação, fazendo o primeiro basear-se na segunda  ou seja, sustentando haver conflito de interesses pela circunstância de a informação veiculada aos investidores relativamente às entidades emitentes não ter, alegadamente, qualidade , com o que, de um lado, descaracteriza, por completo, o conflito de interesses, e, do outro, promove uma dupla valoração do(s) mesmo(s) factos, que, como se sabe, é proibida.
§ 72. De outro passo, os órgãos sociais das sociedades em causa tinham uma composição plural, com vários (e muitos) membros que não pertenciam à família Es..., que não integravam outros órgãos sociais, ou seja, membros independentes, e, também eles, não objectaram, por forma alguma, às decisões em causa nos presentes autos.
§ 73. Mais, a estrutura accionista e a composição dos órgãos das sociedades do Grupo sempre foi conhecida e aceite pelas autoridades competentes, constituindo um factor acrescido de confiança do Recorrente na licitude e rectidão da sua conduta, sendo que, atendendo à natureza preventiva do regime do conflito de interesses, qualquer situação susceptível de consubstanciar tal conflito teria, inevitavelmente, que ter surgido antes.
§ 74. Aliás, o B... estava, efectivamente, organizado (e, no caso concreto, organizou-se) por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência, desde logo ao nível da divisão de pelouros e responsabilidades entre o Departamento de Compliance, o Departamento de Risco Global, e o Departamento de Auditoria e Inspecção, a par do Sistema de Controlo Interno e respectiva Unidade de Gestão, sendo que os procedimentos internos concluíram pela inexistência de qualquer conflito de interesses (inexistindo, por isso, também, quaisquer deveres de gestão do mesmo a cumprir).
§ 75. Não há organização, por mais sofisticada que seja, que resista à deliberada ocultação de informação, na medida em que as irregularidades constantes das contas da EI..., S.A não correspondem a informação obtida por um dos administradores do Banco que, através da adopção de práticas adequadas de tratamento de dados, poderia ter sido colocada à disposição dos demais, antes se trata de um facto próprio do Arguido AA e propositadamente omitido dos demais administradores, incluindo do Recorrente.
§ 76. Termos em que ao Recorrente não pode ser imputada a violação, por nenhuma vez, do disposto no artigo 309.º do CdVM, nem mesmo por força do disposto no artigo 16.º, n.º 1, do RGCO, ou, de resto, no artigo 401.º, n.º 4, do CdVM.
§ 77. Também (ou mais ainda) no Direito de Mera Ordenação Social vale um conceito restritivo de autor, considerando o seu carácter sancionatório e sujeição aos princípios da legalidade e tipicidade das infracções.
§ 78. Ainda que assim não fosse, qualquer conceito extensivo de autoria sempre não prescindiria da ideia de titularidade do dever, sobretudo num cenário de estrutura orgânica e divisão de funções e delegação de poderes.
§ 79. Concretamente no que respeita ao Papel Comercial da R..., S.A, o Recorrente não era o titular ou o destinatário do dever, não tinha o domínio dos factos, não estava na sua disponibilidade realizar ou não as infracções imputadas, nem, tão-pouco, era autor ou titular da informação em causa.
§ 80. Ademais, nunca poderia o Recorrente, atenta a sua esfera e poder de actuação, ter dado qualquer contributo causal no sentido de acção ou omissão sem a qual não se teria verificado o resultado, muito menos relevante.
§ 81. No que especialmente concerne ao Papel Comercial da EI..., S.A, sobre o Recorrente não recaía qualquer dever de evitar o alegado resultado típico, dever esse que não emerge da sua mera pertença aos órgãos sociais das entidades em causa, maxime por referência ao disposto no artigo 305.º-D do CdVM, ou, de resto, no artigo 401.º, n.º 4, do mesmo código, sob pena de se cair numa responsabilização objectiva e acrítica, independentemente da divisão de pelouros, das qualidades e competências de cada administrador, e, bem assim, das circunstâncias específicas da sua individual actuação.
§ 82. A posição de garante tem de ser analisada em função das circunstâncias do caso concreto, dependendo da possibilidade do alegado omitente poder intervir em termos reais no nexo de causação/evitação do resultado, intervenção essa que exige as necessárias capacidades, competências e qualidades (que o Recorrente não reunia, sobretudo no que respeita ao Papel Comercial da EI..., S.A, na medida em que não era responsável pela preparação da contabilidade da sociedade, nem tinha conhecimento das respectivas irregularidades).
§ 83. A posição de garante não decorre da mera titularidade do cargo, é delimitada pelas específicas competências, funções e deveres de cada administrador, e pela capacidade/possibilidade de cumprimento de tais deveres.
§ 84. Finalmente, ainda no que ao Papel Comercial da EI..., S.A diz particularmente respeito, sobre o Recorrente não recaía, na acepção do disposto no artigo 401.º, n.º 4, do CdVM, qualquer dever de conhecimento da alegada infracção, considerando o quadro da estrutura empresarial B..., a sua complexidade, hierarquia e divisão de tarefas, por sectores ou departamentos específicos e especializados.
§ 85. O Recorrente não estava em qualquer posição privilegiada para evitar a situação em causa, porquanto, desde logo, não acompanhava a contabilidade da sociedade, mais confiando em quem efectivamente o fazia, do que e de quem nunca teve quaisquer razões para duvidar, sobre ele não recaindo qualquer dever de garante quanto ao conteúdo e qualidade da informação vertida nas Notas Informativas, maxime da EI..., S.A.
DO ALEGADO INCUMPRIMENTO DO DEVER DE QUALIDADE DA INFORMAÇÃO
§ 86. Vem, ainda, o Recorrente condenado pela alegada violação, por duas vezes (uma pela EI..., S.A e outra pela R..., S.A), do dever de qualidade da informação previsto no artigo 7.º do CdVM, mais concretamente pelo facto de as Notas Informativas da EI..., S.A e da R..., S.A não reflectirem, também alegadamente, a real/verdadeira situação das entidades emitentes.
§ 87. O artigo 7.º do CdVM em conformidade com a sua inserção sistemática  define o critério geral aplicável a toda a informação difundida no mercado, não sendo constitutivo de deveres autónomos na prestação de informação pelos intermediários financeiros, apenas operando em articulação com o disposto noutras disposições do CdVM, concretamente aplicáveis a um determinado fluxo de informação.
§ 88. Pese embora o complemento normativo aplicável in casu seja, em primeira linha, o disposto na alínea d) do número 1 do artigo 312.º do CdVM, este não só não define o que são informações necessárias, como faz depender o correspondente dever de informação do concreto instrumento financeiro em causa, aqui o papel comercial.
§ 89. Do que resulta a necessária aplicação do disposto no Regime Jurídico do Papel Comercial, designadamente o respectivo artigo 17.º, sob a epígrafe «Nota informativa», não sendo, por isso, o cumprimento dos deveres de informação pelo intermediário financeiro independente do veículo utilizado, neste caso as Notas Informativas.
§ 90. Não só o Recorrente não era responsável pela elaboração ou disponibilização dos referidos documentos, como não detinha, em qualquer das entidades emitentes (nem no B...), os pelouros relativos às matérias em causa, designadamente a vertente técnica da organização e gestão da oferta comercial das várias entidades do G....
§ 91. Tais documentos, bem como a definição e estruturação dos produtos financeiros em causa, foram elaborados pelos departamentos e colaboradores responsáveis, designadamente pelo DGP e pelo DFME do B... (os mais directamente envolvidos na execução dos factos que constituem objecto do presente processo  cfr. pontos 39 e seguintes da matéria de facto provada constante da Sentença),, em conjunto com a Direcção de Mercado de Capitais do BEl... (que o Recorrente também não integrava), e, subsequentemente, validados pelo DAJ e pelo Departamento de Compliance do B....
§ 92. E sobre o Recorrente não impendia o dever de conferir, analisar e comparar todas as demonstrações financeiras dos emitentes cujos valores eram colocados pelo B..., nem avaliar a configuração técnica e a estrutura ou conteúdo dos produtos financeiros em causa, sob pena de inutilização da estrutura de divisão de funções implementada.
§ 93. Ainda que ao Recorrente não coubesse a recolha, análise, e, no limite, confirmação da informação constante das Notas Informativas, este não exercia, sequer, funções relacionadas com a informação alegadamente não verdadeira, não completa, não actual e não lícita das mesmas constante, designadamente no que respeita à contabilidade ou situação económico-financeira e/ou patrimonial das entidades emitentes, quer no que respeita à EI..., S.A, cuja contabilidade era preparada pela Es... (com a exclusiva intervenção do Arguido AA, de JJJ, de III e de CCC ( cfr., aliás, ponto 101 da matéria de facto provada constante da Sentença), quer no que respeita à R..., S.A, porque nela não exercia qualquer cargo.
§ 94. Em síntese, o Recorrente não só não participou no processo de elaboração das Notas Informativas, ou, de resto, determinou o respectivo conteúdo, como, tanto quanto era do seu conhecimento, a informação nelas vertida era não mais do que actual, completa, verdadeira, e, de resto, lícita, não lhe incumbindo a respectiva confirmação, pelo que jamais poderia ter adoptado qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas alegadas (mas por ele desconhecidas) condições, muito menos isoladamente.
§ 95. No que respeita à EI..., S.A, a alegada informação sem qualidade é resultado directo da falsificação das contas e da obnubilação da situação económica da sociedade, que, conforme resultou provado, o Recorrente desconhecia, nem tal lhe era exigível.
§ 96. Atentas as suas efectivas funções, competências e capacidades, o Recorrente sempre fez fé no que constava das demonstrações financeiras da EI..., S.A, tendo sempre confiado nas pessoas responsáveis pela preparação e acompanhamento da contabilidade da sociedade, desconhecendo quaisquer instruções, alterações, irregularidades, ocultações ou omissões, razão pela qual não objectou, ao longo dos anos, à aprovação das mesmas, quando, depois de preparadas, apresentadas pelos administradores responsáveis.
§ 97. No que concerne à R..., S.A, na qual não exercia quaisquer funções, o Recorrente não tinha conhecimento ou acesso, muito menos em detalhe, à respectiva informação financeira, nem, de resto, intervenção em quaisquer decisões de gestão (incluindo as relativas à emissão do papel comercial ou à concretização da operação de reestruturação do G...).
§ 98. Em todo o caso, não obstante ao Recorrente não coubesse a recolha, análise ou confirmação da informação constante das respectivas Notas Informativas, incluindo a relativa à situação da sociedade, sempre se dirá que a inclusão da informação relativa à operação de aquisição, pela R..., S.A, das participações sociais da E..., S.A não era sequer exigível, ou, de resto, necessária à tomada de uma decisão de investimento esclarecida.
§ 99. Na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014 foi apenas apresentada uma proposta/versão inicial do plano de reestruturação do G..., discutida em termos gerais e estratégicos, tendo ficado acordado que esse plano deveria ser debatido ao nível das sociedades nele envolvidas.
§ 100. Tanto que a essa reunião sucederam-se várias outras, incluindo em sede do mesmo Conselho Superior do G..., tal como à proposta/versão inicialmente apresentada sucederam-se várias outras, até à versão final que veio a ser aprovada e implementada.
§ 101. A operação em causa foi concretizada em 22 de Janeiro de 2014 (ou seja, em data posterior a todas as Notas Informativas da R..., S.A, pelo que a informação nelas contida era actual e completa), e, aliás, apenas ratificada pelo Conselho de Administração da R..., S.A em 25 de Fevereiro de 2014, já após a cessação da comercialização do Papel Comercial, e sob termos e condições que não constavam da primeira versão.
§ 102. Essa versão inicial configurava, efectivamente, uma mera proposta, pelo que qualquer divulgação a 7 de Janeiro de 2014 seria, isso sim, informação sem qualidade.
§ 103. De resto, tal operação (i) foi imediata e amplamente divulgada no mercado incluindo por comunicado da própria CMVM, com data de 23.01.2014  cfr., aliás, ponto 392 da matéria de facto provada constante da Sentença, e objecto de larga cobertura pela imprensa nacional e outros meios de comunicação], constituindo informação acessível a e por qualquer potencial investidor, (ii) é posterior às últimas contas da R..., S.A, e (iii) das referidas Notas Informativas constava, nomeadamente, uma detalhada (mas, note-se, não exaustiva) descrição dos factores de riscos associados ao investimento no produto financeiro em causa (cfr., aliás, pontos 651 e seguintes da matéria de facto provada constante da Sentença), pelo que os investidores estavam plenamente advertidos relativamente às vicissitudes que os instrumentos de dívida poderiam sofrer, maxime por efeito de operações societárias como as sub judice.
§ 104. No mais, a operação de reestruturação do G..., imposta pelo próprio Banco de Portugal no contexto do ETRICC  em cujo plano o Recorrente não participou, e cujo grupo de trabalho não integrou, tendo-se limitado à sua aprovação formal e institucional ao nível do Conselho Superior do G..., não só erado conhecimento público, como se reflectia, como aliás reconhecido pelo Tribunal a quo, positivamente no balanço global e posição financeira da R..., S.A (pela posição maioritária no B..., por via da aquisição das acções da E..., S.A), não constituindo, pois, informação exigível e/ou necessária.
§ 105. Não só nenhuma deliberação do Conselho Superior do G... assumia, a 7 de Janeiro de 2014, estabilidade e definitividade que obrigasse à sua divulgação, como a informação em causa não era susceptível de ter repercussões na decisão dos investidores.
§ 106. A relevância da informação para o efeito depende, necessariamente, da susceptibilidade de afectação da capacidade da entidade emitente para reembolsar o instrumento financeiro em causa, capacidade essa não afectada, na medida em que a operação em causa contribuiu para o aumento do activo da R..., S.A, para a diversificação do seu portfólio, e, ainda, para a sua capacidade/poder de renegociação da dívida contraída.
§ 107. E isto independentemente do respectivo impacto em termos de solvabilidade e/ou liquidez de curto prazo, face ao valor total dos activos e capitais próprios da sociedade, solvabilidade essa atestada, aliás, pela certificação das contas da R..., S.A, a 21 de Março de 2014, bem como por várias entidades externas e independentes no âmbito do ETRICC 2, tudo em momento posterior à concretização da operação em causa.
§ 108. A informação constante das Notas Informativas da R..., S.A era actual, porque correspondente à informação constante dos últimos relatórios, contas e demonstrações financeiras da R..., S.A aprovadas e publicadas, e, de resto, completa, porque relativa a todos os elementos legalmente exigidos e contextualmente relevantes/essenciais, designadamente as características, natureza e riscos do instrumento financeiro em causa, riscos esses, recorde-se, não exaustivamente descritos nas Notas Informativas.
§ 109. Assim, constando das Notas Informativas as últimas demonstrações financeiras, aprovadas e publicadas, da R..., S.A (até porque as contas referentes ao exercício de 2013 foram apenas fechadas e aprovadas em Março de 2014, já depois da cessação da comercialização do Papel Comercial da R..., S.A), bem como os factores de risco, suficientemente abrangentes e genéricos, e, enfim, todos os indicadores relativos à situação da sociedade, tal informação era, não só actual, completa, e lícita, como a efectivamente exigível para a tomada de decisão esclarecida por parte dos investidores.
§ 110. De resto, sempre se dirá, a título subsidiário, que a obrigação de elaboração das Notas Informativas recaía sobre as entidades emitentes, as quais, no limite, corresponderiam aos agentes da alegada infracção, e não o B..., não sendo, por isso, tal imputável ao Recorrente na qualidade de administrador daquele.
§ 111. Termos em que ao Recorrente não pode ser imputada qualquer violação do dever previsto no artigo 7.º do CdVM, nem, por isso, a prática de qualquer contra-ordenação a esse respeito, tanto menos por força, repita-se, do disposto nos artigos 16.º do RGCO, e 305.º-D e 401.º, n.º 4, ambos do CdVM  valendo aqui o que supra se deixou dito a propósito do dito conceito extensivo de autor, e, bem assim, da inexistência de qualquer dever de garante e/ou conhecimento da alegada infracção no referente ao Papel Comercial da EI..., S.A, para o que, sob pena de nos repetirmos, necessariamente se remete.
DAS SANÇÕES
§ 112. Não obstante a justa redução dos valores das coimas parcelares inicialmente fixadas pela CMVM (e, consequentemente, da coima única a final determinada), o Recorrente não pode, ainda assim, conformar-se com a sanção determinada pelo Tribunal a quo.
§ 113. Ainda que ao Recorrente pudesse ser imputada a prática das contra-ordenações em causa que, como se viu, não pode, a verdade é que sempre se justificaria a aplicação da sanção de mera admoestação, ou, no limite, de uma coima correspondente ao mínimo legal aplicável, em todo o caso totalmente suspensa na sua execução.
§ 114. Por cada uma das contra-ordenações imputadas ao Recorrente, a Sentença determina, a final, a sua condenação, em concurso de contra-ordenações, no pagamento da (elevada) coima única de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), em resultado da aplicação de coimas parcelares manifestamente desproporcionais, excessivas e inadequadas, maxime no que respeita às contra-ordenações respeitantes ao Papel Comercial da R..., S.A.
§ 115. Não obstante o Recorrente ser uma pessoa singular, que não exerce quaisquer funções no sector bancário há sensivelmente 7 (sete)anos, e que, entretanto, sofreu um Acidente Vascular Cerebral que o deixou física e psiquicamente muitíssimo debilitado (cfr. pontos 784 e 785 da matéria de facto provada constante da Sentença), o Tribunal a quo determinou, para sancionamento (i) da alegada violação das regras sobre conflitos de interesses, duas coimas no valor de € 60.000,00 (sessenta mil euros), uma coima no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), duas coimas no valor de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), uma coima no valor de € 200.000,00 (duzentos mil euros), e, para sancionamento (ii) da alegada violação do dever de prestação de informação, uma coima no valor de € 100.000,00 (cem mil euros) e uma coima no valor de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros).
§ 116. A final, o Tribunal a quo considerou que as finalidades da coima se encontrariam suficientemente satisfeitas com a determinação de uma coima única no valor de € 500.000,00(quinhentos mil euros), parcialmente suspensa na sua execução, no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros), pelo período de 2 (dois) anos.
§ 117. A coima, enquanto sanção principal no âmbito do processo contra-ordenacional, não deve ser perspectivada como uma mera punição, alheia a quaisquer exigências preventivas, antes deve ser proporcional e adequada, tanto mais quando o momento da sua determinação constitui uma fase de particular discricionariedade do julgador.
§ 118. Considerando a escassez ou ausência de conhecimentos técnicos especializados do Recorrente para participar nas operações em causa, designadamente relacionadas com a colocação de dívida ou gestão da oferta comercial por parte do B..., e a circunstância de ter confiado, plena e justificadamente, na actuação e intervenção de outros administradores, só pode concluir-se pela reduzida ilicitude concreta do facto.
§ 119. Sendo, para o efeito, irrelevantes os interesses/bens jurídicos alegadamente violados (maxime os ditos crédito e confiança no mercado e nas instituições que nele actuam), porque já considerados pelo legislador na qualificação das contra-ordenações em causa como muito graves, com o inerente reflexo na moldura abstracta aplicável.
§ 120. Assumindo a culpa como limite inultrapassável da medida da coima, tendo as infracções em causa sido imputadas, no que respeita ao Papel Comercial da EI..., S.A, a título de negligência, e, no que concerne ao Papel Comercial da R..., S.A, a título de dolo eventual, que corresponde à forma menos intensa de dolo, qualquer hipotética culpa do Recorrente sempre seria diminuta.
§ 121. Especialmente atendendo à ausência de conhecimentos especializados por parte do Recorrente nas matérias em causa, e, bem assim, à circunstância de, conforme resultou provado, ter confiado nas estratégias perfilhadas pelo Arguido AA, com as respectivas consequências ao nível da teoria da infracção e da imputação.
§ 122. A manifesta desproporcionalidade das coimas parcelares evidencia-se ainda por força da natureza (singular) do Recorrente, por comparação com as coimas parcelares aplicadas ao Arguido Haitong, pessoa colectiva, não existindo uma diferença substancial entre as mesmas, antes pelo contrário.
§ 123. De outro passo, o Recorrente não praticou quaisquer actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta das alegadas infracções, as quais consubstanciam, quando muito, infracções pontuais, no exclusivo e temporalmente delimitado contexto da operação de emissão e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A.
§ 124. Acresce que o Recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais (cfr. ponto 789 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 125. Ainda, no que se refere à apreciação do nível de responsabilidade, âmbito das funções e esfera de acção do Recorrente no B..., sempre seria de considerar os únicos pelouros que lhe estavam acometidos, e, bem assim, a confiança que este depositava nos seus pares, e/ou “superiores hierárquicos”, directores e serviços do Banco, sobre o mesmo não recaindo qualquer dever, muito menos especial, de não cometer as infracções.
§ 126. De resto, o Recorrente não obteve, nem teve intenção de obter, quaisquer benefícios económicos, nem causar quaisquer danos com a prática das alegadas infracções, tendo, aliás, apresentado, logo em 2014, um pedido de desculpas em sede de Comissão Parlamentar de Inquérito (cfr. ponto 787 da matéria de facto provada constante da Sentença).
§ 127. No mais, também a situação económica do Recorrente não foi devidamente considerada na Decisão, na medida em que toma por referência a última declaração anual de rendimentos do Recorrente, quando o seu património mobiliário e imobiliário, bem como a sua pensão de reforma (exceptuado o valor correspondente a três salários mínimos nacionais) que corresponde à quase totalidade do seu rendimento actual , tem estado arrestado à ordem do processo-crime n.º 324/14...., e o valor remanescente, efectivamente na disponibilidade do Recorrente, sido afecto, quase na totalidade, às despesas a que a sua actual condição de saúde obrigam.
§ 128. Por fim, sempre se dirá que as exigências de prevenção  sobretudo especial, às quais não podem sobrepor-se necessidades de prevenção geral  se revelam aqui por demais reduzidas, atendendo, nomeadamente, ao estado de saúde do Recorrente, à sua incapacidade de compreender sequer a sanção aplicada (maxime a sua gravidade), ao seu afastamento da actividade bancária há quase oito anos, ao tempo decorrido desde os factos, e, ainda, à circunstância de ter apresentado desculpas institucionais públicas na Assembleia da República, sendo residual (para não dizer nulo) o risco de repetição das alegadas condutas infractoras.
§ 129. Acresce que, as coimas concretamente determinadas e aplicadas ao Recorrente são, sobretudo, desnecessárias, porquanto o Recorrente, no debilitado estado de saúde em que se encontra, não tem sequer capacidade de alcançar a gravidade da sanção aplicada, ou, tão-pouco, mesmo que tivesse praticado os ilícitos em causa o que não sucedeu, de reorientar a sua conduta para o cumprimento do Direito.
§ 130. Pelo que, não obstante a qualificação, em abstracto, das contra-ordenações aqui imputadas como muito graves, forçoso é de concluir que, in casu, a gravidade subjectiva das mesmas é manifestamente reduzida, tal como o é qualquer juízo de censura (culpa) que ao mesmo possa, hipoteticamente, ser assacado.
§ 131. Em face do exposto, a eventual punição do Recorrente a manter-se, deverá limitar-se a uma mera admoestação, ao abrigo do disposto no artigo 51.º, n.º 1, do RGCO, aplicável exviartigo407.º do CdVM, desde logo pelo facto de as alegadas infracções serem apenas imputadas a título de negligência e dolo eventual, pela circunstância de o Recorrente ter apresentado desculpas institucionais públicas, pela reduzida gravidade concreta das alegadas contra-ordenações, ou mesmo pelas reduzidas exigências de prevenção.
§ 132. A aplicação de uma mera admoestação cumpre com as exigências de prevenção inerentes ao regime sancionatório em causa, sendo perfeitamente suficiente para evitar possíveis futuras infracções, a tanto não obstando a mera qualificação/classificação legal (abstracta) das contra-ordenações imputadas, pois que o juízo de gravidade da infracção para este efeito deve ser feito casuisticamente, e em concreto.
 § 133. Se fosse intenção do legislador condicionar a possibilidade de aplicação da sanção em causa à qualificação abstracta da contra-ordenação certamente que o teria deixado inequivocamente expresso, o que não fez.
§ 134. Subsidiariamente, e entendendo-se sem nunca conceder que deve ser aplicada uma coima ao Recorrente, sempre a mesma deverá coincidir com o limite mínimo da moldura sancionatória abstractamente aplicável, senão especialmente atenuada nos termos do artigo 72.º, n.º 2, alínea d), do Código Penal, aplicável ex vi artigo 32.º do RGCO, nomeadamente considerando o tempo decorrido desde os factos (e, também, desde a instauração do presente processo), a boa conduta e postura de disponibilidade e colaboração adoptada pelo Recorrente.
§ 135.  Tais circunstâncias são independentes do grau de ilicitude e da culpa (ainda que aqui reduzido), antes contribuindo para a diminuição acentuada da necessidade da pena (aqui por demais inexistente), com a consequente redução dos limites mínimo e máximo da moldura sancionatória, nos termos do artigo 18.º, n.º 3, do RGCO.
§ 136. Por fim, se e quando, sem conceder, determinada a aplicação de uma coima ao Recorrente, perto do respectivo mínimo legal, e especialmente atenuada, sempre deverá a mesma ser, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 415.º do CdVM, totalmente suspensa na sua execução, na medida em que a simples censura do facto e a ameaça da sanção realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal).
§ 137. A este propósito, é de recordar as meramente residuais exigências de prevenção, mormente especial, reclamadas pelo caso concreto, atendendo ao actual estado de saúde do Recorrente, e, bem assim, à circunstância de ter apresentado desculpas institucionais públicas, ou, de resto, à ausência de antecedentes contra-ordenacionais.
§ 138. Sendo, pois, possível realizar um juízo de prognose social favorável relativamente ao comportamento futuro do Recorrente, reportado ao momento da Sentença, considerando o carácter e personalidade do Recorrente, a sua conduta anterior e posterior às alegadas infracções, as circunstâncias da sua alegada prática, ou, enfim, a sua idade já avançada.
§ 139.  Sempre que seja possível formular tal juízo, sobre o julgador recai um verdadeiro poder-dever de decretar a suspensão da execução da coima.
§ 140.  Em suma, entendendo-se ser de aplicar ao Recorrente alguma sanção que não a mera admoestação — o que não se concede e apenas por extrema cautela de patrocínio se equaciona —, deve a mesma ser fixada em valor próximo do seu mínimo legal, especialmente atenuada, e, em todo o caso, totalmente suspensa na sua execução.
§ 141.  Finalmente, também a sanção acessória de inibição do exercício de funções cumulativamente aplicada ao Recorrente é profundamente inadequada e desnecessária (máxime face às exigências de prevenção), atendendo ao estado de saúde a que o Recorrente se encontra votado, do qual há muito que se tem conhecimento nos presentes autos, a par da reduzida ilicitude concreta dos factos, da diminuta culpa (se alguma) do Recorrente, da inexistência de benefícios obtidos, das reduzidas exigências de prevenção, da boa conduta pelo mesmo adoptada, e, enfim, da sua idade já avançada.
§ 142.  Inexistindo, por isso, qualquer perigo de novas suspeições pelo exercício, por parte do Recorrente, de semelhantes funções no mercado, ou, de resto, quaisquer fins de prevenção, incluindo geral, que o justifiquem, pelo que deve tal sanção ser revogada.

Concluiu, formulando os seguintes pedidos:
a) deve, desde logo, nos termos conjugados dos artigos 119.º, alínea e), e 122.º, ambos do CPP (aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do rgco), e 20.º e 38.º, n.os 1 e 2, do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, ser declarada a nulidade da decisão proferida pela CMVM, mais determinando-se a remessa dos presentes autos ao tribunal central de instrução criminal;
sem prescindir,
b) deve, em todo o caso, o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, a sentença revogada e substituída por outra que absolva integralmente o recorrente da prática dos ilícitos contra-ordenacionais por que vem  condenado;
apenas caso assim não se entenda,
c) deverá, ao abrigo do disposto no artigo 51.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, ser aplicada ao recorrente a sanção de mera admoestação;
caso assim (também)não se entenda,
d) sempre deverá qualquer coima (parcelar, e consequentemente, única), nos termos conjugados dos artigos 18.º, n.º 3, do RGCO, e 72.º do Código Penal, aplicável ex vi artigo 32.º do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, ser substancialmente reduzida e especialmente atenuada, fixando-se no respectivo mínimo legal, e, em todo o caso, nos termos do disposto no artigo 415.º do CdVM, totalmente suspensa na sua execução.
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Conclusões (CC)
1ª. Circunscrito, por imposição da lei, à matéria de Direito [artigo 75º, n.º 1 do RGCO], inviabilizando-se assim, salvo na parte admitida pelo n.º 2 do artigo 410º do CPP, que não está emcausa vistos os critériosjurisprudenciais respeitantes à interpretação do âmbito de aplicação das respectivas alíneas, o presente recurso abrange apenas a parte da decisão recorrida que negou a suspensão da execução da coima que havia sido suscitada em sede de impugnação.
2ª. A suspensão da execução da coima em matéria de ilicitude contraordenacional no domínio dos valores mobiliários (i) estando prevista em sede da fase administrativa do processo respectivo, tal como resulta do artigo 415º do Código dos Valores Mobiliários (ii) é possível por decisão judicial em fase de recurso, nos termos do artigo 50º do Código Penal, por via da dupla remissão, a do artigo 32º do RGCO e do artigo 415º do CdVM (iii) e assim foi entendido na sentença recorrida, que a aplicou a benefíciio de um dos recorrentes.
3ª. A decisão recorrida, ao não ter decretado a suspensão da execução da coima que impôs ao ora recorrente, enferma de erro de Direito, na interpretação e aplicaçaão do estatuído no artigo 50º do Código Penal, aplicável ao ilícito contraordenacional por via da remissão estatuída, por um lado no artigo 32º do RGCO e por outro no artigo 415º do CdVM, porquanto (i) estão adquiridos no caso circunstâncias de facto que justificariam a aplicabilidade de tal medida de modo a serem acauteladas as finalidades da punição e (ii) as razões encontradas pela decisão recorrida para não decretar a mencionada suspensão, salvo o merecido respeito, não colhem.
4ª. Em termos da gravidade objectiva e subjectiva da conduta sentenciada, naquilo em que tem de ser convocado para aferir, em juízo de prognose, da eficácia de uma suspensão da execução coima tendo em vista a salvaguarda das finalidades a prosseguir pelo ilícito de mera ordenação social, importa considerar que, se a decisão recorrida abrange, em cúmulo jurídico, coimas aplicáveis a várias infracções contraordenacionais [linhas 24034 e seguintes da sentença], as mesmas relevam de dois núcleos essenciais de condutas homogéneas, atinentes, respectivamenete, às emissões EI..., S.A e R..., S.A, valoradas na dupla vertente da qualidade de informação e da salvaguarda do conflito de interesses;
5ª. Na mesma vertente trata-se de condutas de perfil omissivo nisso incluindo a que é imputada a título de dolo eventual;
6ª. Releva também a circunstância de a actuação do ora recorrente se ter desenvolvido no quadro de uma relação de confiança relativamente a AA [linhas 23387/2... da decisão recorrida e se dá como adquirido como facto 793, linhas 9139-9142], cujo perfil de actuação se acha detalhadamente descrito no elenco dos factos provados, o que a própria decisão em causa considera que «baixa, embora de forma mitigada a culpa»;
7ª. Em idêntico registo, a sentença recorrida deu como provado que [factos 793-794, linhas 9139/9142] o ora recorrente não actuava no âmbito do “ramo financeiro” do G..., sim do ramo “não financeiro”, estando aquele a cargo de AA;
8ª. Em termos devaloração da conduta global do ora recorrente, cotejando ocatálogo de coimas que a CMVM imputava em decisão sancionatória ao ora recorrente com o que decorre da sentença, verificaram-se quatro situações em que foi decretada a absolvição [linhas 24013 da decisão recorrida, pontos 5.1. a 5.4].
9ª. Está factuamente adquirido na sentença que, ante o crash do G... e a necessidade de se proceder à sua reestruturação – a qual passou por uma nova arquitectura societária em que a R..., S.A assumiria a função de holding de topo do grupo, substituindo-se à EI..., S.A – o ora recorrente chamou a si a manutenção do cargo de Presidente do Conselho de Administração daquela, no que porfiou ante a debandada dos demais membros da administração, atitude do maior relevo porquanto demonstra vontade de garantir a continuidade do G... e, por essa forma, os interesses daqueles que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial em causa.
10ª. Na mesma perspectiva, há que relevar a conduta do recorrente [reconhecida pela decisão recorrida], quando dá como assente que [facto 791, linhas 9133/9136], o mesmo acorreu ao aumento de capital da Ec..., S.A. [Ec..., S.A.] com o valor de três milhões de euros, dando [inclusivamente] de garantia o imóvel de sua residência ao Montepio, o qual viria a perder, ficando, assim, privado do local da sua própria habitação, tudo isto no quadro da reestruturação do G... e com o propósito de acorrer com meios financeiros líquidos necessários à sua sobrevivência e, como se disse, por essa forma, salvaguarda os interesses dos que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial.
11ª. É também critério a ter em conta numa lógica de suspensão da pena que a própria decisão recorrida reconhece [factos 790 e 792, respectivamente linhas 91391/9132 e 9137/9138] que o ora recorrente presentemente (i) não aufere rendimentos e (ii) tem o quinhão hereditário emergente da morte de um tio e de sua mãe, arrestado à ordem de um processo-crime no qual é arguido, estando assim privado de meios financeirosque lhe permitam opagamentoda coima.
12ª. Enfim, a própria decisão recorrida dá como assente que o ora recorrente não tem antecedentes contraordenacionais [facto 795, linha 4193].
13ª. Em termos de critério de prevenção especial [conformado o mesmo à natureza do ilícito em apreço] importa ter em consideração que o ora recorrente não desempenha qualquer função do tipo daquelas que teve a cargo, não só pelo que decorre da sanção acessória, como também em virtude de estar na prática e por razões reputacionais, a que este processo não é alheio, impossibilitado de levar a cargo qualquer actividade na área da administração de empresas, nomeadamente das que tenham actuaação no mercado de capitais.
14ª. Em termos de prevenção geral, vista a impossibilidade de o ora recorrente ter meios financeiros que lhe permitam pagar a coima em causa, por razões que a própria sentença recorrida aceitou, é alternativa ao perdurar de uma decisão punitiva inconsequente na sua eficácia, uma suspensão da sua execução que funcione como solene advertência e prevenção disuasória condutas futuras com a natureza da que está em causa.
15ª. Tudo visto, a mera ameaça da punição realiza os propósitos que o Direito contraordenacional almeja prosseguir, e é essa o tónus característico do instituto da suspensão que se suscita.

Concluiu, pedindo que a sentença recorrida seja revogada na parte em que negou ao ora recorrente a possibilidade de suspensão da coima e substituída por outra que lhe conceda tal suspensão por prazo que se tenha como compatível com as finalidades prosseguidas pelo ilícito de mera ordenação social.
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Conclusões (DD)
1ª. O Tribunal a quo condenou injusta e ilegalmente DD pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), contraordenação prevista e punida nos termos do artigo 389º n.º 1 alínea a) do CdVM e do artigo 388º n.º 1 alínea a) do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros) e na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representaçãode quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as atividades de intermediação em valores mobiliários ou outros  instrumentos financeiros (artigo 404º n.º 1 alínea c) do CdVM), pelo período de 1 (um) ano, contabilizado desde o trânsito em julgado da decisão.
2ª. O presente recurso tem assim por objeto essa decisão condenatória, cuja revogação se impõe por incorrer em diversos vícios decisórios, quer de natureza substantiva, quer de natureza processual.
3ª. Do ponto de vista processual, a sentença recorrida padece de nulidade por insuficiente fundamentação, nos termos concatenados nos artigos 374º n.º 2 do CPP e 379º n.º 1 alínea a) do CPP, por o Tribunal a quo ter omitido a fundamentação quanto aos factos provados 632, 633 e 642 (no que concerne à comercialização do papel comercial da R..., S.A), não permitindo reconstituir o processo lógico-racional por si seguido nem alcançar a perceção das razões pelas quais decidiu dessa maneira.
4ª. A decisão recorrida padece ainda de quatro insuficiências para a decisão da matéria de facto provada, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, por o Tribunal a quo não ter apurado factos relevantes para a decisão da causa¸ nomeadamente factos subjetivos relativamente a DD correspondentes à factualidade objetiva que o Tribunal a quo aditou e deu como provada e bem assim factos sobre a atual situação económica do Recorrente, essenciais para a correta determinação da sanção aplicável.
5ª. A sentença recorrida padece também do vício de contradição insanável da fundamentação, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, por o Tribunal a quo ter assumido posições antagónicas e racionalmente inconciliáveis na fundamentação da decisão, com referência aos factos provados 369, 370 e 633, por um lado, e ao facto provado 749, por outro.
6ª. Ainda em sede de vícios processuais, a sentença recorrida padece de erro notório na apreciação da prova, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, quanto à decisão de considerar provados os factos 369, 370, 579 e 583.
7ª. Não obstante a sentença recorrida padecer dos aludidos vícios processuais, as consequências processuais daí decorrentes – reenvio do processo para novo julgamento ou baixa dos autos ao Tribunal a quo para suprimento da nulidade em causa – redundariam na prática de atos inúteis e, como tal, proibidos por lei, já que a factualidade julgada provada pelo Tribunal a quo não permite concluir pela verificação da contraordenação em causa, pelo que a decisão não pode deixar de ser a absolvição do Recorrente.
8ª. Efetivamente, a condenação do Recorrente DD resulta de uma errónea aplicação do Direito mesmo à luz da factualidade julgada provada, impugnando-se a solução apresentada pelo Tribunal a quo em sede de aplicação do Direito aos concretos factos apurados.
9ª. Na versão do RJPC vigente à data da prática dos factos em causa, as ofertas particulares de papel comercial apenas faziam impender o dever de informação sobre as sociedades emitentes e não sobre os intermediários financeiros por opção deliberada do legislador, pelo que não é aplicável o regime geral consagrado no CdVM.
10ª. Em face do específico instrumento financeiro comercializado atravésde ofertas particulares, o dever de informação imposto pelo artigo 17º do RJPC sobrepõe-se ao dever geral de prestação de informação por parte dos intermediários financeiros consagrado nos artigos 7º e ou 312º do CdVM, por evidente relação de especialidade normativa, sendo certo que o legislador optou por fazer impender esse dever exclusivamente sobreas sociedades emitentes do papel comercial, não o impondo aos intermediários financeiros.
11ª. Assim, em face do específico instrumento financeiro comercializado através de ofertas particulares e à luz das normas vigentes à data da prática dos factos, não impendia sobre o intermediário financeiro B... o dever de informação consagrado nos artigos 7º e ou 312º do CdVM por opção do legislador que ao aplicador apenas cumpre respeitar.
12ª. Ora, não impendendo o dever em causa sobre o B..., à data da ocorrência dos factos em causa (conclusão que juridicamente se impõe, não obstante a condenação deste por decisão não impugnada e, como tal, transitada em julgado), daí decorre naturalmente a absolvição do Recorrente DD.
13ª. Mas ainda que V. Exas. assim não o entendessem, considerando – tal como o fez o Tribunal a quo na sentença recorrida – que impendia sobre o B... o dever de informação consagrado nos artigos 7º e ou 312º do CdVM (no que evidentemente não se concede e apenas por dever de patrocínio se equaciona), ainda assim DD deveria ser absolvido, pelas razões que seguidamente se expõem.
14ª. A intervenção de DD na reunião do Conselho Superior de 7.01.2014 não implicou um contributo causal revelante para a prática do ilícito contraordenacional praticado pelo intermediário financeiro B..., respeitante à prestação de informação sem qualidade aos seus Clientes por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, pelo que se impõe a sua absolvição.
15ª. A interpretação das disposições conjugadas dos artigos 16º n.º 1 do RGCO e 389º n.º 1 alínea a) do CdVM no sentido de poder ser punido como (com)participante no ilícito contraordenacional mesmo quem não tenha dado um contributo causal relevante para a sua realização, é inconstitucional por violar o artigo 29º da CRP.
16ª. A factualidade julgada provada não sustenta a integração normativa do preenchimento do elemento subjetivo do tipo contraordenacional pelo qual o Recorrente foi condenado, pois teria de resultar dos factos julgados provados que DD, no momento em que “(…)apresentou, juntamente com RR, na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, discutida e aprovada nessa reunião”, teria representado mentalmente que tal apresentação constituiria um contributo causal relevante para a eventual prestação, por parte do B..., de informação sem qualidade aos subscritores do papel comercial da R..., S.A e se teria conformado com essa possibilidade.
17ª. Os factos julgados provados não permitem sustentar que o Recorrente DD – cuja última intervenção nesta matéria foi a aludida apresentação em 7 de janeiro de 2014 – previra como possível, na sequência dessa apresentação, que a informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelasse a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial e se conformara que a mesma fosse nesses termos prestada aos Clientes do B....
18ª. A factualidade julgada provada apenas permite sustentar que haveria–quanto muito–uma divergência entre a realidade e o que o recorrente representou mentalmente quanto à factualidade típica em causa nos autos, o que nos reconduziria a erro sobre a factualidade típica, previsto no artigo 8º n.º 2 do RGCO, que determina a exclusão do dolo, ficando contudo ressalvada a punibilidade por negligência nos termos gerais.
19ª. Sucede, porém, que não foram apurados factos demonstrativos da existência de uma apreciação negligente por parte de DD e a negligência não se presume, pelo que se impõe – também por esta razão – a absolvição de DD.
20ª. Em última análise, sempre se imporia a absolvição de DD à luz do disposto no artigo 9º n.º 1 do RGCO, por quanto este, conhecedor da «Advertência aos Investidores» constante das Notas Informativas enãosendojurista, estaria convictodaveracidade doque nela expressamente se afirma quanto à exclusão da responsabilidade do B... pela qualidade da informação constante dessas mesmas Notas Informativas e/ou pela obrigação de atualização dessa mesma informação, o que sempre configuraria – pelo menos – uma situação de falta de consciência da ilicitude, por erro não censurável.

Concluiu, pedindo que o presente recurso seja julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida e absolvendo-se DD da prática da contraordenação por que foi condenado ou, subsidiariamente,  anulando-se o   julgamento  e ordenando-se a baixa dos autos à primeira instância para repetição do julgamento ou, num duplo grau de subsidiariedade, revogando-se a decisão condenatória.
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Admitidos os recursos, respondeu a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM),  apresentando as seguintes
Conclusões
Dos recursos de decisões interlocutórias
Do recurso da decisão proferida pela CMVM a 29.07.2021 relativa ao indeferimento do pedido de prorrogação do prazo para a apresentação de recurso de impugnação judicial
II. O recurso interposto pelo Recorrente Haitong, na parte em que tem por objeto a Deliberação da CMVM de 29.07.2021, não deve ser considerado admissível, não podendo ser apreciado pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, porquanto, o mesmo deveria ter sido apresentado no Recurso de Impugnação Judicial da Decisão (final) da CMVM, como, aliás, referiu o TCRS na sua douta Sentença de 22.09.2021.
III. Não o tendo feito, a questão sub judice não foi apreciada na douta Sentença, não podendo o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa apreciar o recurso nos termos do disposto no artigo 73.º, n.º 1 do RGCO.
IV. Acresce que a referida decisão da CMVM não violou quaisquer direitos do Recorrente, porquanto: (i) o prazo de 20 dias úteis previsto no artigo 59.º, n.º 3, do RGCO não pode ser prorrogado, sob pena de violação do princípio da legalidade; (ii) o prazo de 20 dias úteis é adequado ao processo que corre termos nos presentes autos, respeitando integralmente o direito ao recurso e à tutela jurisdicional efetiva do arguido; (iii) não é aplicável, em sede de processo de contraordenação, o disposto no artigo 107.º, n.º 6, do CPP, sendo que, em qualquer caso, esta norma legal nunca permitiria a concessão de um prazo tão alargado como o pretendido pelo arguido.
V. Importa notar que o Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 378/2021, a propósito do prazo de 15 dias úteis de impugnação judicial das decisões proferidas pelo Banco de Portugal em sede de processo de contraordenação fixado no artigo 228.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras [prazo, portanto, mais curto do que o prazo de 20 dias úteis previsto no RGCO], considerou que o referido prazo, sem possibilidade de prorrogação, é suficientemente amplo para o arguido exercer o seu direito de defesa.
VI. Acresce ainda que, tendo em conta a data da notificação da decisão ao Recorrente e a data em que foi efetuada a última notificação da mesma aos demais arguidos, o Arguido, ora Recorrente, beneficiou, na prática, de um prazo de recurso de 44 dias úteis, ou seja, mais do dobro do prazo que se encontra previsto no artigo 59.º, n.º 3, do RGCO.
Dos recursos do Despacho proferido pelo TCRS a 19.10.2021 relativo ao indeferimento do pedido de reinquirição de testemunhas arroladas pelos Recorrentes Haitong e AA em sede de recurso de impugnação judicial e do Despacho proferido pelo TCRS a 25.11.2021
VII. O Tribunal a quo entendeu, ao abrigo do disposto no artigo 72.º, n.º 2 do RGCO, não reinquirir as testemunhas já inquiridas na fase administrativa com contraditório dos Arguidos por tal diligência probatória não se revelar necessária para a descoberta da verdade material, inexistindo qualquer ilegalidade a apontar ao douto Despacho de 19.10.2021.
VIII. Assim, não assiste qualquer razão à alegação apresentada pelo Recorrente Haitong na medida em que: (i) a discordância sobre a apreciação que a CMVM fez do depoimento datestemunha KK não justifica a repetição do depoimento, pois o mesmo consta dos autos e o Tribunal pôde livremente apreciá-lo (artigo 127.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO, ex vi artigo 407.º do CdVM); (ii) o depoimento prestado pela testemunha KK corresponde às suas declarações prestadas em discurso direto, reduzido a escrito por um dos técnicos da CMVM presentes, e, a final, revisto e assinado pela testemunha, assim como pelo seu Mandatário presente na inquirição (o qual era, aliás, à data, Mandatário também do Recorrente); (iii) a testemunha KK foi ouvida nos autos por 3 vezes; (iv) os factos sobre os quais pretende ouvir as testemunhas KK e LL ou não são matéria nova ou não relevam para o objeto dos autos ou já foi produzida prova bastante, nomeadamente documental.
IX. O Tribunal a quo não interpretou nem aplicou o artigo 72.º, n.º 2 do RGCO no sentido alegado pelo Recorrente, porquanto, quando indeferiu a reinquirição das testemunhas já ouvidas na fase administrativa após apresentação das defesas dos Arguidos ao abrigo daquela norma, fê-lo por tal diligência de prova se revelar supérflua ou despicienda.
X. Acresce que o fundamento para o indeferimento da referida reprodução de prova não foi o caráter urgente do processo – que não constitui requisito de aplicação do disposto no artigo 72.º, n.º 2 do RGCO – mas, sim, a inutilidade da diligência para a descoberta da verdade, encontrando-se o douto despacho devidamente fundamentado, tendo o Tribunal tido o cuidado de responder a cada um dos argumentos apresentados pelo Recorrente.
XI. Do mesmo modo, não assiste qualquer razão à alegação do Recorrente AA, na medida em que (i) o douto Despacho não configura uma decisão surpresa, uma vez queadecisão denão deferirainquirição detestemunhas cujo depoimento já foi produzido na fase administrativa do presente processo de contraordenação tem suporte expresso na lei e é sustentada pela Doutrina e pela Jurisprudência, não podendo deixar de ser expectável para o Recorrente enquanto uma das possíveis soluções jurídicas para o problema; (ii) a reinquirição das testemunhas arroladas pelo Recorrente não se revela essencial para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa, sendo que o Recorrenteteveoportunidadedeinquirirlivree plenamente tais testemunhas enão logrou esclarecer o Tribunal em que medida se justificava reinquiri-las.
Da alegada ilegalidade do Despacho proferido pelo TCRS a 15.11.2021, no segmento que indeferiu a inquirição de testemunhas e do Despacho proferido pelo TCRS a 16.12.2021
XII. Improcede a alegação apresentada pelo Recorrente AA, não enfermando o despacho referido de qualquer nulidade ou irregularidade, porquanto (i) com a inquirição da testemunha CCC o Recorrente não pretende, em bom rigor, produzir prova, mas antes colocar em causa a valoração por parte da CMVM da prova produzida, o que manifestamente não constitui causa justificativa para a reinquirição da testemunha, pois odepoimento consta dos autos e o Tribunal pode livremente apreciá-los (cf. artigo 416.º, n.º 5 do CdVM e artigo 127.º do CPP), não necessitando de produzir prova adicional; (ii) a prova que o Recorrente pretende produzir não é necessária para a descoberta da verdade sendo este o critério que deve presidir à admissibilidade da produção de todos os meios de prova (cf. artigo 340.º do CPP); (iii) não se mostram violados o direito a um processo equitativo, nem dos princípios do contraditório, da igualdade de armas e do direito de defesa do Recorrente, pois o direito de contraditar a prova não prescinde de um juízo de necessidade sobre a prova a produzir, necessidade essa da qual o Recorrente não logrou convencer o Tribunal.
XIII. Improcede igualmente a alegada inconstitucionalidade, uma vez que o Tribunal não interpretou o artigo 72.º, n.º 2 do RGCO, conjugado com o artigo 416.º, n.º 5 do CdVM nos termos alegados pelo Recorrente, porquanto o Tribunal indeferiu a reinquirição da testemunha CCC, na medida em que a mesma não revela relevante para a descoberta da verdade.
XIV. Improcede também a nulidade invocada pelo Recorrente AA relativamente ao indeferimento da inquirição das testemunhas DDD, EEE, FFF e GGG, uma vez que, não tendo o Recorrente logrado demonstrar a necessidade da sua inquirição para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa – atendendo designadamente à matéria sobre a qual as mesmas iriam ser ouvidas, que não carece de outra prova, ou à ausência, por parte de tais testemunhas, deconhecimento direto dos factos em questão –não resulta daí qualquer omissão de um ato necessário muito menos essencial para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa, nem qualquer nulidade ou irregularidade do despacho em causa.
Da alegada ilegalidade dos Despachos proferidos pelo TCRS a 10.02.2022 e a 15.02.2022
XV. Improcede a nulidade ou irregularidade invocada pelo Recorrente AA, porquanto (i) o cumprimento do disposto no artigo 358.º, n.º 1 do CPP não prescinde de um juízo sobre a necessidade da prova; (ii) a inquirição da testemunha HHH não é necessária, muito menos essencial, à descoberta da verdade, na medida em que já foi produzida prova (testemunhal e documental) abundante sobre o facto relativamente ao qual o Recorrente pretende inquirir a testemunha, cabendo ao Tribunal, entretanto, apreciá-la livremente (cf. artigo 416.º, n.º 5 do CdVM e artigo 127.º do CPP).
Do recurso do despacho proferido pelo TCRS a 15.02.2022 relativo ao indeferimento do pedido de prorrogação do prazo para interposição de recurso da sentença
XVI. Não assiste razão ao Recorrente Haitong, mostrando-se a prorrogação de 10 dias deferida pelo Tribunal a quo manifestamente razoável e adequada considerando que: (i) o recurso da sentença encontra-se limitado a matéria de direito (cf. artigo 75.º do RGCO), mesmo que o recurso tenha por fundamentos os vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 do CPP; (ii) no que toca às questões de direito levantadas, grande parte dessa matéria, foi já deveras reanalisada pelos Recorrentes quer em sede de defesa quer em sede de impugnação judicial.
XVII. Acresce que, no Acórdão n.º 378/2021, o Tribunal Constitucional considerou conforme com a Constituição a interpretação da norma do artigo 228.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, no sentido de que é de 15 dias úteis o prazo para apresentação de impugnação judicial das decisões proferidas pelo Banco de Portugal sem possibilidade de prorrogação, pelo que não se pode deixar de admitir, por maioria derazão, como igualmente conformecom aConstituição ainterpretação doartigo 74.º, n.º 1 do RGCO, no sentido em que o prazo de recurso de 10 dias prorrogado por mais 10 dias, perfazendo um prazo total de 20 dias (computando, assim, um prazo superior aos 15 dias referidos supra, para um recurso que se restringe a matéria de direito), é adequado ao exercício dos direitos de defesa e de recurso do Recorrente.
XVIII. Termos em que se impõe concluir que o Tribunal interpretou corretamente o disposto no artigo 74.º, n.º 1 do RGCO e que inexiste qualquer violação do direito de defesa e do direito a uma tutela jurisdicional efetiva do Recorrente, para além de que a alegada inconstitucionalidade da norma constante do artigo 74.º n.º 1 do RGCO, invocada pelo RecorrenteHaitong, carecer, em absoluto, desentido considerando queo Tribunal deferiu a prorrogação do prazo.
Do recurso do despacho proferido pelo TCRS a 22.02.2022 relativo ao indeferimento do pedido de que prazo de interposição do recurso da Sentença se iniciasse a 16.02.2022
XIX. Não assiste qualquer razão ao Recorrente Haitong, porquanto como resulta do douto Despacho de 22.02.2022: (i) a Sentença foi lida publicamente no dia 15.02.2022; (ii) os Mandatários do Recorrente Haitong requereram assistir à leitura da Sentença através da plataforma cisco webex; (iii) a Sentença foi depositada no dia 15.02.2022; (iv) não consta dos autos que o Recorrente Haitong tenha solicitado cópia da Sentença e que a mesma não lhe tenha sido fornecida; (v) a Sentença foi disponibilizada a todos os Recorrentes por e-mail do dia 16.02.2022.
XX. Decorre do disposto no artigo 411.º, n.º 1, al. b), do CPP (aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 do RGCO, ex vi artigo 407.º do CdVM), que o prazo para interposição do recurso conta-se a partir da data do depósito na secretaria e não da data em que a sentença aparece ou não no sistema citius.
XXI. A inconstitucionalidade invocada também padece da ausência de qualquer fundamento considerando que não consta dos autos que o Recorrente tivesse solicitado cópia da sentença no dia 15.02.2022 e tal lhe tivesse sido negado, pelo que a interpretação dos normativos invocados nem sequer foi aplicada por este Tribunal.
Da alegada prescrição do procedimento
Do dies a quo da contagem dos prazos de prescrição
XXII. As infrações em causa nos presentes autos, relativas à violação do dever de qualidade da informação são de natureza permanente, porquanto o momento da consumação ou lesão primária do bem ou interesse jurídico, que ocorre com o início da comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A e R..., S.A, e consequente prestação da informação constante das respetivas Notas Informativas aos clientes do B..., seguiu-se um período de consumação material, em que o bem ou interesse jurídico continua a ser lesado por vontade do autor (persistência da lesão do bem jurídico por vontade do autor), o qual perdurou até ao termo da comercialização da(s) última(s) emissão(ões) de papel comercial da EI..., S.A/R..., S.A por parte do B....
XXIII. Donde, o dies a quo a considerar, é, conforme bem decidiu o Tribunal a quo, quanto à infração relativa à prestação de informação sem qualidade relativa ao papel comercial emitido pela EI..., S.A, o dia 11 de dezembro de 2013, e quanto à infração relativa à prestação de informação sem qualidade relativa ao papel comercial emitido pela R..., S.A, o dia 24 de fevereiro de 2014, na medida em que as referidas datas correspondem aos dias até aos quais ocorreu a comercialização, pelo B..., dos respetivos instrumentos financeiros (papel comercial).
XXIV. A contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação material do facto ilícito e não com a prática do(s) contributo(s) causal(ais) de cada um dos agentes para a realização do mesmo, importando ter presente que no Direito de Mera Ordenação Social vigora o conceito extensivo de autor, o qual se encontra previsto n.º 1 do artigo 16.º do RGCO, que dispõe que, “[s]e vários agentes comparticipam no facto, qualquer deles incorre em responsabilidade por contraordenação mesmo que a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependam de certas qualidades ou relações especiais do agente e estas só existam num dos comparticipantes”.
Da suspensão do prazo de prescrição nos termos do disposto na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março
XXV. Tendo ocorrido, nos presentes autos, vários factos interruptivos e suspensivos da prescrição antes de sobre a data da prática dos factos terem decorrido cinco anos, deve considerar-se que esta apenas se verificará uma vez decorridos sete anos e meio (artigo 418,º, n.º 1, do CdVM, 27º-A, 28º, nºs 1 e 3 do RGCO) sobre a data da prática dos factos, acrescidos de 160 dias [86 dias (artigo 27.º-A do RGCO, conjugado com artigo 7.º, n.º 1 da Lei n.º 1-A/2020, e com os artigos 8º e 10º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio) + 74 dias (no artigo 27.º-A do RGCO, conjugado com o artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, e com os artigos 6.º e 7.º da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril)].
XXVI. Improcede a alegada inconstitucionalidade dos n.os 1 e 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março (na sua redação original), e bem assim, do artigo 6.º-C, nºs 1 e 3, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro.
XXVII. A suspensão do prazo para a prática dos atos ditada pelo artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que impede o prosseguimento do procedimento contraordenacional, não traduz qualquer inércia do Estado no exercício dos ius puniendi, sendo, antes, um fator exógeno e não removível pela autoridade competente. O que aliás, resulta bem patente nos presentes autos, tendo a CMVM, à luz da situação pandémica vivida, e mesmo antes da publicação da o Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, decidido, logo em 13 de março de 2020, dar sem efeito as diligências de prova agendadas para as datas compreendidas entre 18 e 24 de março de 2020 (cf. fls. 17751-17795) – na sequência, aliás, de requerimento apresentado pelo Arguido AA solicitando o cancelamento das diligências agendadas, precisamente com fundamento na situação pandémica (cf. fls. 17742-17750) – e, em 26 de março de 2020, já após a publicação da o Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, dado sem efeito, pelos mesmos fundamentos, as diligências de prova agendadas para as datas compreendidas entre 30 de março e 7 de abril de 2020 (cf. fls. 17876-17921). Aliás, as referidas diligências de prova, apenas se vieram a realizar entre os dias 17 de junho de 2020 (fls. 18068-18070) e 11 de setembro de 2020 (fls. 18801-18803), depois da entrada em vigor da pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, que veio revogar o artigo 7º da Lei n.º 1-A/2020.
XXVIII. A conformidade da aplicação da suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, aos processos de contraordenação da competência da CMVM pendentes à data da entrada em vigor das referidas disposições foi já afirmada, pelo Tribunal Constitucional, nos Acórdãos n.º 500/2021, n.º 660/2021 e n.º 798/2021. E tal jurisprudência, versando sobre o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, é integralmente aplicável ao disposto ao artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março de 2020, na redação dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, dada a identidade tanto do teor da norma, como da situação fáctica que a determinou – a designada “segunda vaga” da pandemia.
XXIX. Em sentido concordante com a jurisprudência constitucional vinda referir encontra-se a jurisprudência proferida pela Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa – vejam-se os Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa nos processos 164/19.0YUSTR.L1, 124/18.8YUSTR.L2, 309/20.7YUSTR.L1, 178/20.7YUSTR.L1 e 290/20.2YUSTR.L1.
Da suspensão do prazo de prescrição nos termos do disposto no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c) do RGCO
XXX. Resulta claro da mera leitura do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO, o prazo de prescrição suspende-se desde a data da notificação aos sujeitos processuais do despacho proferido queprocede ao exame preliminar do recurso – a qual tevelugar, como refere o Recorrente, em 19.10.2021 – até à decisão final do recurso, a qual não teve ainda lugar, pois que se encontram pendentes os Recursos a que ora se responde.
XXXI. A referência a “decisão final do recurso” não se refere à decisão proferia, em primeira instância, pelo Tribunal a quo, mas à última decisão que venha a ser proferida nos presentes autos. Isso mesmo foi afirmado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2011, nos termos do qual “A suspensão do procedimento por contra-ordenação cuja causa está prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, inicia-se com a notificação do despacho que procede ao exame preliminar da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa e cessa, sem prejuízo da duração máxima imposta pelo n.º 2 do mesmo artigo, com a última decisão judicial que vier a ser proferida na fase prevista no capítulo IV da parte II do Regime Geral das Contra-Ordenações.” (realce e sublinhado nosso).
Da suspensão do prazo de prescrição nos termos do artigo 418.º, n.º 2 do CdVM
XXXII. A suspensão da contagem do prazo de prescrição num processo contraordenacional por força do disposto no artigo 418.º, n.º 2 do CdVM não corresponde a um caso de retroatividade legal ou constitucionalmente proibida, na medida em que tal disposição não vem alterar o prazo de prescrição da lei antiga, mas apenas criar um regime especial de suspensão da contagem do prazo de prescrição. Essa possibilidade de uma lei especial suspender a prescrição está antecipadamente prevista nos artigos 120.º, n.º 1, do Código Penal, e no artigo 27.º-A, n.º 1, do RGCORD, desde, respetivamente, 1982 e 1995.
XXXIII. A suspensão do prazo de prescrição prevista no artigo 418.º, n.º 2, do CdVM é uma lei especial de natureza processual: não está sujeita ao regime do artigo 29.º da CRP (está fora da sua letra, objeto e ratio), mas sim ao artigo 32.º da CRP e aos princípios fundamentais do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP).
XXXIV. A contagem da suspensão a partir da prolação da sentença recorrida constitui um caso de retroconexão e não de um caso de retroatividade proibida. Este regime legal é, assim, perfeitamente compatível com os valores do Estado de Direito: legalidade, igualdade, proporcionalidade, previsibilidade e segurança jurídica e garantias de defesa no processo, como, aliás, foi já decidido por este Venerando Tribunal ad quem, perante norma semelhante do RGICSF – o seu artigo 209.º - pelo Acórdão de 2 de dezembro de 2021 no âmbito do Processo n.º 127/19.5YUSTR.L1, e, ainda, no processo 249/17.7YUSTR.L3, por Despacho ali proferido (neste caso, tendo por base norma do artigo 166º da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto).
Da alegada exclusão da responsabilidade do Haitong Bank por força da medida de resolução tomada em 3 de agosto de 2014 pelo Banco de Portugal
Da alegada transmissão da responsabilidade contraordenacional
XXXV. A responsabilidade pela prática de um determinado ilícito contraordenacional tem natureza pessoal, sendo, por regra, intransmissível – cf. artigo 30º, n.º 3 da CRP, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 201/2014 –, não sendo, consequentemente, possível tal princípio ser postergado por ato administrativo – como o é a deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014 que determinou a aplicação de uma medida de resolução ao B....
XXXVI. A alegação do Arguido a propósito do sentido da natureza e da ratio da medida de resolução (segregar os ativos não tóxicos do B..., colocá-los num banco de transição e, posteriormente, aliená-los a investidores privados) em nada releva no que concerne à não transmissão das responsabilidades previstas no ponto (v) da alínea b) do Anexo 2 da Deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014, pois que tais responsabilidades – e, em concreto, a responsabilidade contraordenacional – não foram objeto de transmissão desde logo porque a mesma sempre se afiguraria contraria à Constituição da República Portuguesa e à Lei.
XXXVII. Se não era possível, por força da medida de resolução, proceder à transmissão das responsabilidades contraordenacionais do B... (o sujeito destinatário da medida de resolução), obviamente também não poderia ter havido qualquer transmissão das responsabilidades (contraordenacionais) do Haitong (então BEl...) para terceiro, quando o Haitong nem sequer foi objeto da medida de resolução.
Do pedido de reenvio prejudicial obrigatório
As questões que o Arguido pretende sejam colocadas perante o TJUE, a título prejudicial, nos termos do artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, não são suscetíveis de, uma vez respondidas pelo TJUE, orientar a decisão do caso concreto, desde logo porque a validade do princípio da pessoalidade ou intransmissibilidade da responsabilidade contraordenacional afigura-se indiscutível à luz do Direito vigente.
Da inconstitucionalidade dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.os 1, 2 e 3 e 145.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras
XXXIX. Improcede a alegada inconstitucionalidade, com fundamento na violação dos artigos 13.º , 18.º , n.º 1 e 2 e 61.º, n.º 1 da CRP, da norma que se extrai da interpretação conjugada dos artigos 145.º-G, n.º 1, 145.º-H, n.ºs 1, 2 e 3 e 145.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na redação em vigor à data da Medida de Resolução, dada pelo Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto, na medida em que (i) nem a CMVM nem o Tribunal a quo aplicou nem interpretou, nos presentes autos, as disposições legais cuja inconstitucionalidade é invocada pelo Arguido, (ii) em bom rigor, a alegação do Arguido diz respeito à interpretação das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal enão dequalquer disposição legal constante do RegimeGeraldas Instituições deCréditoeSociedadesFinanceiras, ao abrigo das quais tais deliberações foram tomadas, pelo que, não está sequer em causa a interpretação de qualquer norma em sentido técnico (artigos 204º da CRP e 70º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional).
Das alegadas nulidades da Decisão da CMVM
Da alegada nulidade por violação do princípio ne bis in idem
XL. As entidades que decidam exercer atividades sujeitas a regulação e supervisão públicas ficam sujeitas ao cumprimento de normas de conduta setoriais, bem sabendo que o seu incumprimento é suscetível de gerar responsabilidade, a qual pode ser, consoante a natureza dos ilícitos, contraordenacional ou penal.
XLI. Os Recorrentes AA e BB exerceram funções de administração numa entidade que era simultaneamente uma instituição de crédito (sujeita à supervisão do Banco de Portugal) e um intermediário financeiro e emitente de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado (sujeita à supervisão da CMVM) – o acervo de normas que sobre si recaiam são produto das atividades (de natureza distinta) que voluntariamente decidiram exercer, constituindo a consequência necessária do privilégio de acesso as mesmas. Nos casos em que o agente acede, por livre iniciativa, ao exercício de duas (ou mais) atividades económicas, estabelecendo com diferentes autoridades administrativas distintas relações jurídicas de supervisão, sujeitando-se, como correlato da possibilidade de exercício de atividade económica cujo acesso está condicionado, a um complexo de deveres e a um quadro sancionatório próprio de cada setor regulado, com o que não é legítimo que espere não ser punido pela violação daquelas normas.
XLII. Sendo a coexistência de processos sancionatórios um resultado próprio da coexistência de diferentes setores de atividade, com diferentes interesses jurídicos, e bem assim da diferente resposta jurídica a diferentes desvalores sociais da conduta dos Arguidos (cf. n.º 298/2021), pelo que o princípio ne bis in idem não pode ser convocado para decidir o caso apreço, atenta a autonomia existente entre os diferentes regimes sancionatórios.
XLIII. Para que se possa afirmar a existência de um julgamento múltiplo pela prática dos mesmos factos, vedada pelo princípio ne bis in idem, adaptando-a ao Direito das contraordenações, terá que existir identidade do ilícito, a qual pressupõe a possibilidade de afirmar (e demonstrar) a existência de identidade relativamente (i) ao autor, (ii) à conduta e (iii) ao interesse jurídico tutelado pelo tipo de crime objeto de anterior julgamento.
XLIV. Os factos que estão em causa nos presentes autos e no processo de contraordenação do Banco de Portugal n.º 58.14.CO não são os mesmos, quer relativamente à contraordenação referente à violação das regras dos conflitos de interesses, quer relativamente à contraordenação referente à violação do dever de informação na colocação do papel comercial da EI..., S.A.
XLV. A distinção dos factos em apreço é confirmada, aliás, pela diversidade dos interesses jurídicos afetados pelas condutas que estão em causa num e noutro processo.
XLVI. No que respeita à alegação do Recorrente BB, quanto à suposta identidade de objeto processual entre o presente processo e o processo n.º 324/14...., para além de o processo crime ora invocado pelo Arguido BB não ter sido objeto de qualquer decisão transitada em julgado (o que, desde logo, afasta a aplicação do princípio ne bis in idem enquanto proibição de repetição de julgados), a verdade é que não existe identidade de factos entre o presente processo de contraordenação e o processo crime que corre termos no TCIC sob o n.º 324/14.....
XLVII. Mesmo que se entenda que estamos perante um concurso entre crime e contraordenação, o que não se concede, aos processos de contraordenação da CMVM não é aplicável o disposto no artigo 20.º do RGCO, mas sim o disposto no artigo 420, n.º 1 do CdVM, que consagra um regime específico de concurso de infrações quando os factos em causa constituam simultaneamente contraordenação e crime, do qual resulta não só a imposição do processamento autónomo das duas categorias de infrações, como também a exigência legal de que a resposta sancionatória a cada uma delas seja tratada separadamente.
 Assim, FREDERICO DA COSTA PINTO, “A tutela dos mercados de valores mobiliários e o regime do ilícito de mera ordenação social”, em Direito dos Valores Mobiliários, vol. I, Coimbra, 1999, p. 305.
XLVIII. Em todo o caso, para além da inaplicabilidade do princípio ne bis in idem ao caso em apreço e da existência de factos distintos em ambos os processos, a verdade é que tal princípio não tem o sentido e alcance que lhe é atribuído pelos Recorrentes AA e BB, na medida em que o princípio da proibição da dupla condenação não tem por efeito proibir a dupla valoração do facto, i.e., a extração de efeitos e consequências jurídicas distintas em diversas ordens do sistema jurídico, quando o mesmo apresente desvalor plúrimo (cf. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 263/94.
XLIX. Improcede a inconstitucionalidade dos artigos 408.º, n.º 1, e 401.º, do CdVM, alegada pelo Recorrente BB, porquanto, desde logo, a interpretação normativa sindicanda não foi aplicada nos presentes autos pela CMVM porquanto o objeto do presente processo de contraordenação não é constituído por factos que foram já objeto de uma decisão final por outra autoridade de supervisão. Ademais, ainda que assim não sucedesse, a existência de processos sancionatórios duais não é vedada pela Constituição de acordo com a jurisprudência constitucional citada, sendo uma resposta legislativa legítima a diferentes aspetos desvaliosos da conduta dos arguidos.
Da alegada nulidade da Decisão da CMVM por imputação genérica de factos e consequente nulidade da sentença recorrida
L. Tal como decidiu o Tribunal a quo, o disposto no artigo 283.º, n.º 3, al. b) do CPP, que disciplina o conteúdo da acusação pelo Ministério Público em processo penal, não é aplicável aos processos de contraordenação. Com efeito, o conteúdo da decisão condenatória proferida pela autoridade administrativa no âmbito de processo de contraordenação encontra-se regulado no artigo 58.º do RGCO, cuja aplicação afasta, nos termos do disposto no artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, a necessidade (e admissibilidade) de recurso aos preceitos do processo penal.
LI. Não corresponde à verdade a alegação do Arguido no sentido de a CMVM não concretizar ou não proceder à circunstancialização dos factos provados 114 a 120, 127 a 131, 544 a 549, 553 a 555, 557, 558, 562, 563 e 565 da Decisão administrativa. Com efeito, como decidiu o Tribunal a quo, a CMVM procedeu a uma descrição exaustiva e devidamente circunstanciada de todos os factos constantes da Decisão, e, em concreto, dos que são referidos pelo Arguido, sendo que os mesmos se encontram descritos e circunstanciados na Decisão, permitindo a qualquer leitor médio compreender o contexto e os termos em que foram praticados.
LII. Os factos descritos na Decisão da CMVM invocados pelo Arguido AA para sustentar a respetiva falta de circunstancialização não se revelam, de forma alguma, “genéricos e conclusivos”, sendo certo que os mesmos não podem deixar de ser lidos em conjunto com os demais factos constantes da Decisão e no contexto em que na mesma surgem (e não de forma descontextualizada como pretende o Arguido AA).
LIII. Sem prejuízo do que fica dito, não se pode deixar de salientar que a alegação do Arguido AA no sentido de que todos os factos da Decisão deviam incluir o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, está para além do que é exigido pelo próprio artigo 283.º, n.º 3, do CPP no quadro dos processos de natureza penal. É que, mesmo no regime processual penal previsto no artigo 283.º, n.º 3 do CPP – que como se explicou acima não é aplicável aos processos de contraordenação –, apenas se exige que a acusação contenha a indicação do lugar, do tempo e da motivação da sua prática, se tal for possível (cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 18.12.2018, proc. n.º 417/17.1PHGNV.P1).
Da nulidade do processo por utilização de prova proibida e nula
LIV. O Tribunal a quo indeferiu a nulidade suscitada pelo Recorrente AA, tendo fundamentado esta sua decisão no facto de (i) a validade da prova obtida pelo Banco de Portugal no âmbito do processo de contraordenação n.º 58/... ter já sido afirmada, com trânsito em julgado, no âmbito do referido processo, sendo que essa decisão tem força de caso julgado no presente processo; (ii) a integração no presente processo dos elementos carreados do processo de contraordenação n.º 58/..., do Banco de Portugal está legitimada à luz das normas que regulam a cooperação entre a CMVM e o Banco de Portugal, e (iii) o presente processo é autónomo do processo do Banco de Portugal, nenhuma censura merecendo a douta Sentença recorrida.
Da alegada violação do princípio da igualdade e métodos proibidos de prova
LV. O douto Tribunal a quo decidiu que estando devidamente fundamentada a não constituição das testemunhas III, JJJ e CCC como arguidos nestes autos e não sendo objeto da presente impugnação judicial apurar a bondade dessa decisão, a decisão da CMVM não se mostra arbitrária e, portanto, não atenta contrao princípio da igualdade. A clareza e acerto do decidido pelo Tribunal a quo, resultante da mera leitura da Sentença é suficiente para concluir pela improcedência da questão suscitada pelo Recorrente AA.
Dos alegados vícios relativos ao depoimento da testemunha CCC e consequente nulidade da Acusação, da Decisão da CMVM e da Sentença Recorrida
LVI. A nulidade invocada pelo Arguido – a insuficiência do inquérito – constitui um vício previsto no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do CPP, que não é aplicável ao processo de contraordenação.
LVII. Independentemente da posição a assumir quanto à aplicabilidade do catálogo de nulidades previstas no CPP ao processo de contraordenação, sempre se dirá que, ainda que tal catálogo devesse ser aplicado, jamais se verificaria a invocada “nulidade” da Acusação deduzida pela CMVM, pois que a nulidade, no processo criminal, de insuficiência do inquérito só existe quando ocorre a omissão de um ato que a lei prescreve como obrigatório (e desde que a lei não preveja diferente sanção para tal omissão).
LVIII. A documentação do pedido de cooperação internacional feito pela CMVM à FINMA no âmbito da inquirição da testemunha CCC nunca constituiria, por falta de previsão legal expressa, um ato legalmente obrigatório, nos termos eparaos efeitos do artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do CPP – o que, desde logo, afasta a conclusão no sentido de se verificar a respetiva nulidade. Assim é que, na economia do CdVM e do RGCO (à luz de uma eventual adaptação da regra das nulidades), para além da decisão de arquivamento ou condenatória, o único e verdadeiro ato legalmente obrigatório na fase administrativa dos processos de contraordenação da CMVM é a notificação para exercício do direito de audiência e defesa do arguido (artigos 414.º-A, n.º 1, do CdVM e 50.º do RGCO), posteriormente à imputação do ilícito, por via da acusação.
LIX. A inquirição de testemunhas no processo de contraordenação em apreço é regulada pelo artigo 409.º do CdVM e, subsidiariamente, pelas disposições do RGCO e do CPP, sendo que à data da realização da diligência, o artigo 409.º do CdVM não regulava expressamente a inquirição de testemunhas residentes fora do território nacional168, impondo-se, por isso, o recurso aos mecanismos de cooperação internacional aplicáveis ao processo de contraordenação.
LX. Ora, conforme consta dos autos, a inquirição de CCC ocorreu ao abrigo do IOSCO MMoU, como refere o ofício da FINMA de 6 de abril de 2016, junto aos autos a fls. 4487 e ss., sendo que o IOSCO MMoU não consigna qualquer norma que determine a obrigatoriedade de os pedidos de auxílio mútuo constarem dos processos da Parte Requerente, o que desde já permite concluir pela ausência de preterição de qualquer ato legalmente obrigatório por parte da CMVM, ao invés do alegado pelo Arguido.
Sobre este caso, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Regime Geral das Contra-ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 1.ª edição, Universidade Católica Editora, 2011, página 178, anotação ao artigo 43.º do RGCO, ponto 32.
Repare-se que, na sua redação atual, o artigo 409.º, n.os 4 e 5,estabelecem que “[a] CMVM pode também proceder à realização de diligências, designadamente, a tomada de declarações, depoimentos ou esclarecimentos, por videoconferência, quando o interveniente processual esteja domiciliado ou temporariamente deslocado no estrangeiro” e que “[a] realização das diligências referidas no número anterior é efetuada no estrito cumprimento da lei e no quadro dos mecanismos legais e ou institucionais de cooperação entre a CMVM e as instituições congéneres da União Europeia ou de Estados terceiros”.
LXI. O ofício da FINMA de 6 de abril de 2016, junto aos autos a fls. 4487 e ss., permite ao arguido AA sindicar o meio de obtenção de prova e os próprios meios de prova obtidos, no quadro da inquirição de CCC, pois que o mesmo, bem como o respetivo auto de inquirição, descrevem os termos pelos quais se regeu a diligência de prova em causa, designadamente, (i) que foi produzida de acordo e com respeito pelo IOSCO MMoU, (ii) na sequência de um pedido de assistência da CMVM dirigido à sua congénere FINMA, (iii) que CCC foi ouvido na qualidade de testemunha, (iv) que a diligência foi dirigida pelos colaboradores da FINMA, estando também presentes colaboradores da CMVM, (v) que a informação e documentos recolhidos no âmbito da inquirição da testemunha apenas podem ser utilizados ou transmitidos a outras autoridades, tribunais ou organismos para os fins previstos no pedido de assistência.
LXII. Ainda que – por mera hipótese de raciocínio, que não se concede – a ausência nos autos do pedido dirigido pela CMVM à FINMA gerasse alguma invalidade, jamais teria o efeito que o Arguido AA lhe pretende assacar (a nulidade ou irregularidade da provaedaacusação), pois que, no sistemalegal português, por força do disposto no artigo 122.º, n.º 1 do CPP, a declaração de invalidade de um ato só implica a invalidade derivada dos atos subsequentes ao ato nulo que tenham um nexo de dependência cronológica, lógica e valorativa com o ato nulo. A lei não consagra o efeito da invalidade sucessiva dos atos prévios ao nulo.
LXIII. Não merecendo, por isso, qualquer censura a douta Sentença recorrida, quando decidiu, nos termos constantes das pp. 107 a 113 da mesma, considerar improcedente a nulidade invocada pelo Recorrente AA.
Da alegada nulidade da Decisão por violação do direito de defesa e por falta de produção de prova: o indeferimento da inquirição da testemunha CCC
LXIV. Relativamente ao indeferimento do requerimento de inquirição da testemunha CCC, importa sublinhar que inexiste qualquer violação do direito de defesa do Recorrente AA. Com efeito, CMVM já tinhaprocedido, em momento prévio àdedução daAcusação, à inquirição nos presentes autos datestemunha CCC, tendo o Arguido AA tido a possibilidade de se pronunciar sobre o referido depoimento, exercendo o seu direito ao contraditório, bem como o direito de requerer o que tivesse por conveniente relativamente a tal diligência.
LXV. O regime processual aplicável aos presentes autos prevê um momento próprio para que o Arguido requeira a produção de prova testemunhal – o momento da apresentação da Defesa – no qual o Arguido AA não requereu a inquirição da testemunha CCC, não obstante ter tido acesso e compreendido o teor da sua inquirição constante dos autos em momento prévio à dedução da acusação. Ora, a admissão da realização de diligências probatórias que não foram requeridas no momento processual adequado apenas deve ocorrer em situações excecionais, impostas pelos demais princípios estruturantes do processo contraordenacional, como seja o princípio do inquisitório, o princípio da legalidade processual, o princípio da verdade material e o princípio da investigação, sendo que tal excecionalidade não se verifica quanto à reinquirição da testemunha CCC, como bem decidiu o Tribunal a quo.
Da alegada nulidade da Decisão por valoração de prova testemunhal em violação do direito ao contraditório
LXVI. A investigação e instrução previstas no artigo 59.º, n.º 2 do RGCO são atividades da autoridade administrativa que podem ocorrer antes ou depois da dedução da acusação. Pelo que, toda a prova produzida na fase administrativa do processo de contraordenação – independentemente do momento em que a mesma é recolhida (i.e., em momento prévio ou posterior à notificação da acusação ao arguido) – pode e deve ser valorada na decisão condenatória proferida na fase administrativa, assim como na fase judicial.
LXVII. O facto de testemunhas terem sido ouvidas antes da dedução da acusação e de, após a notificação da mesma, se terem negado a responder a determinadas perguntas alegando que das respostas resultaria a sua responsabilidade criminal (o que sucedeu com as testemunhas III e UU que, entre um momento e outro, foram constituídos arguidos em processo crime) ou não terem podido depor (que é o caso da testemunha JJJ, que faleceu) não determina a proibição de valoração dessa prova nem, muito menos, a sua invalidade. A prova testemunhal produzida nesses termos pode e deve ser valorada, sem prejuízo de dever ser livremente apreciada pelo julgador (cf. artigo 127.º CPP), como o foi pelo Tribunal a quo.
LXVIII. Tal regime não põe em causa o direito de defesa (ou de contraditório) do arguido: desde logo, ao Arguido AA foi dada, nos presentes autos, a possibilidade, de apresentar defesa, requerer a produção de prova e tudo o mais que tivesse por conveniente, e depois, os depoimentos contra cuja valoração ora se insurge foram validamente obtidos, no estrito respeito das normas processuais aplicáveis, sendo que a circunstância de, posteriormente, as testemunhas terem invocado o direito ao silêncio ou falecido não afeta a validade nem a possibilidade de valoração dos respetivos depoimentos. Note-se que toda a prova produzida na fase administrativa é válida tanto na fase administrativa como na fase judicial do processo de contraordenação, sendo que, se pode ser valorada na fase judicial, mesmo sem ter sido produzida perante o julgador, então, por maioria de razão, pode ser atendida na fase administrativa para efeitos da decisão.
Da alegada violação do direito de defesa do Arguido e da suposta nulidade por falta de produção de prova
Do indeferimento das inquirições das testemunhas EEE FFF através de meios de cooperação internacional
LXIX. Ao indeferir a inquirição das testemunhas EEE e FFF através de videoconferência ou carta rogatória, através dos meios de cooperação internacional, a CMVM não preteriu o direito de defesa do Arguido AA nem omitiu qualquer diligência probatória essencial para descoberta da verdade, como bem decidiu o Tribunal a quo.
Do indeferimento da inquirição a testemunha NNN
LXX. Ao dar sem efeito o depoimento da testemunha NNN, a CMVM não preteriu o direito de defesa do Arguido AA nem omitiu qualquer diligência probatória essencial para descoberta da verdade, como bem decidiu o Tribunal a quo.
Do indeferimento da acareação entre as testemunhas LLL e OOO
LXXI. Ao indeferir a acareação das testemunhas LLL e OOO, a CMVM não preteriu o direito de defesa do Arguido AA nem omitiu qualquer diligência probatória essencial para descoberta da verdade, como bem decidiu o Tribunal a quo.
Da alegada nulidade da Decisão por imputação genérica de factos quanto ao conflito de interesses relativo ao papel comercial da R..., S.A
LXXII. A Sentença recorrida (tal, como, aliás, a Decisão da CMVM) não imputa ao Recorrente AA a violação das regras relativas ao conflito de interesses, quanto ao papel comercial da R..., S.A, pelo simples facto de a R..., S.A ter como acionista única a EI..., S.A, da qual era administrador. As infrações em causa são imputadas ao Recorrente porquanto este contribuiu causalmente para que o B..., conhecendo os interesses em conflito, decidisse que a R..., S.A deveria emitir papel comercial a colocar pelo B... junto dos seus clientes, de forma a fazer face à limitação imposta pelo NRJOIC de concentração de dívida emitida pela R..., S.A, permitindo, por um lado, reembolsar o papel comercial que se encontrava naquele fundo, por outro, manter junto do grupo B... os recursos dos clientes que detinham unidades de participação no fundo.
LXXIII. Acresce que o Recorrente AA contribuiu causalmente ainda para que o B..., depois ter potenciado a situação de conflito de interesses, colocasse o papel comercial da R..., S.A conhecendo a reestruturação do G... que afetou a estrutura societária e a situação financeira da R..., S.A, não informando os clientes desse facto, fazendo prevalecer, assim, por um lado, os interesses da R..., S.A, por outro, aos seus próprios interesses, aos interesses daESAF edos administradores AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH em detrimento dos interesses dos clientes subscritores do papel comercial.
Das alegadas nulidades da sentença recorrida
Das alegadas nulidades por omissão de fundamentação
LXXIV. Para se verificar a nulidade da sentença cominada pelo disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP será necessário que falte, em absoluto, a fundamentação quanto aos aspetos indicados no n.º 2 do artigo 374.º do CPP.
LXXV.Ora, pela mera leitura da sentença, pode concluir-se que a mesma dá inteiro cumprimento ao dever defundamentação ínsito no n.º 2 do artigo374.º do CPP,não padecendo amesma das nulidades que lhe pretendem assacar os Recorrentes Haitong e DD.
LXXVI. Quanto às nulidades invocadas pelo Recorrente Haitong, importa referir que a teoria do “risco da organização” constitui matéria de direito, sendo um critério de imputação do conhecimento dos factos ilícitos à pessoa coletiva, pelo que não determinou (nem tinha de determinar) o aditamento de quaisquer factos pelo Tribunal.
LXXVII. No que toca, em particular, ao elemento subjetivo, partindo da teoria do “risco da organização”, o Tribunal a quo imputou ao Recorrente Haitong o conhecimento dos vícios daqualidadedeinformação das notas informativas do papel comercial emitido pela EI..., S.A e das notas informativas de 6 e 16 de janeiro de 2014 do papel comercial emitido pela R..., S.A através do conhecimento dos referidos vícios por parte dos administradores do Haitong AA, BB e DD.
LXXVIII. Acresce que, conforme se deixou supra exposto, a matéria de facto provada constante da sentença preenche os elementos objetivo e subjetivo do tipo de ilícito previsto nos termos conjugados dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a) do CdVM, independentemente de se aplicar ou não a teoria do “risco de organização”: o Haitong elaborou as notas informativas conhecendo a falta de qualidade da informação nelas constante por via dos seus administradores AA, BB e DD.
LXXIX. Relativamente à alegada da nulidade por não identificação das pessoas físicas da Direção de Mercado de Capitais que elaboraram as notas informativas, a mesma também deverá improceder, na medida em é doutrinal e jurisprudencialmente pacífico que o artigo 401.º, n.º 1 do CdVM consagra um critério de imputação autónoma, nos termos do qual e a imputação às pessoas coletivas não está dependente da identificação das pessoas singulares concretas que praticaram os factos em questão, sendo que, de qualquer modo, a douta Sentença ao identificar a Direção de Mercado de Capitais do Haitong como quem praticou os factos – in casu, a elaboração das notas informativas com informação sem qualidade – procedeu à identificação funcional do agente da pessoa coletiva.
LXXX. Não assiste também qualquer razão ao Recorrente DD quanto à nulidade que invoca, pois, a fundamentação dos factos provados 632, 633 e 642 consta precisamente a linhas 17874 a 17897.
Da alegada nulidade por violação dos direitos de defesa e contraditório
LXXXI. Improcede a alegação apresentada pelo Recorrente Haitong, porquanto, a teoria do “risco da organização” constitui matéria de direito, sendo um critério de imputação do conhecimento dos factos ilícitos à pessoa coletiva e, como tal, não determinou o aditamento de quaisquer outros factos pelo Tribunal a quo sobre os quais o Recorrente se devesse pronunciar para além dos que já constam da matéria de facto provada na douta Sentença (sobre os quais o Recorrente teve oportunidade de se pronunciar).
LXXXII. Por outro lado, quanto à matéria de facto para efeitos da imputação subjetiva ao Haitong, não se vislumbra divergência entre a Decisão da CMVM e a douta Sentença: o Tribunal a quo, tal como a CMVM, imputou ao Recorrente Haitong o conhecimento dos vícios da qualidade de informação das notas informativas do papel comercial emitido pela EI..., S.A e das notas informativas de 6 e 16 de janeiro de 2014 do papel comercial emitido pela R..., S.A, através do conhecimento dos referidos vícios por parte dos administradores do Haitong AA, BB e DD.
LXXXIII. Do mesmo modo, também não se consegue descortinar por que razão é que, segundo o Recorrente, a Sentença, no que toca à imputação objetiva, assumiu uma linha de argumentação inovadora face à Decisão daCMVM: o Tribunal a quo, tal como aCMVM, considerou provado que DD decidiu a celebração do contrato do dia 3 desetembro de2013; o Tribunal a quo, tal como a CMVM, assentou a imputação objetiva ao Haitong no facto deesteter elaborado as notas informativas eno facto de este conhecer a falta de qualidade da informação.
LXXXIV. Acresce que, a diferença notada pelo Recorrente entre a Decisão da CMVM e a douta Sentença não tem o condão de afastar o preenchimento do elemento objetivo do tipo de ilícito, na medida em que basta para o referido preenchimento o facto de o Haitong ter elaborado as notas informativas com informação que sabia não ter a qualidade legalmente exigida.
Da alegada nulidade por alteração não substancial de factos não comunicada ao Recorrente AA e por imputação de facto com recurso a juízos conclusivos e valorativos
LXXXV O Recorrente invoca uma nulidade decorrente do aditamento de facto que, na verdade, foi ele próprio alegou (cf. artigo 2564 da sua Impugnação Judicial).
LXXXVI Nos termos conjugados do disposto nos artigos 339.º, n.º 4 e 358.º, n.º 2 do CPP, inexiste qualquer dever de comunicação de alteração não substancial dos factos na medida em que a alteração derivou dos factos alegados pela Defesa do Recorrente.
LXXXVII O facto provado 767 não corresponde a um juízo conclusivo ou valorativo nos termos em queo Recorrente pretendeassacar, namedidaem quenão encerraem si matérianormativa ou integra qualquer afirmação que dê resposta a uma questão jurídica.
Da alegada inadmissibilidade da alteração não substancial dos factos da Sentença Recorrida face à Decisão da CMVM
LXXXVIII. Relativamente aos factos provados 347 e 350, por um lado, o “montante de cerca de 2.3 mil milhões deeuros”encontra-se concretizado nos factos provados 364 e 365 da Decisão da CMVM, e, mesmo que tal montante não se encontrasse concretizado, tal não importaria qualquer nulidade, na medida em que a matéria de facto provada preenche os elementos objetivo e subjetivo dos tipos de ilícito em discussão nos presentes autos; por outro lado, tais factos nada trazem de novo quanto a esse aspeto, tratando-se dos mesmos factos escritos por outras palavras, o que, em rigor, nem importaria qualquer dever de comunicação de alteração dos factos pelo Tribunal a quo, e, mesmo que assim não fosse, decorrem da discussão da causa e da prova produzida, pelo que, sendo meras concretizações, também por essa via se encontram legitimamente aditados nos termos do disposto no artigo 339.º, n.º 4 do CPP.
LXXXIX. Quanto aos factos provados 656A e 356B, os mesmos resultaram da discussão da causa e da prova produzida (cf. linhas 13361 a 13634 da Sentença) e que, ao contrário do que é defendido pelo Recorrente, fazem parte do objeto dos autos, pelo que se encontram legitimamente aditados, nos termos do disposto no artigo 339.º, n.º 4 do CPP
XC. Quanto ao facto provado 370, o mesmo não corresponde a um facto novo, na medida em que resulta da fundamentação da Decisão da CMVM, pelo que o Tribunal a quo, em boa verdade, nem tinha o dever de o ter comunicado previamente à prolação da Sentença, sendo que as expressões nele utilizadas e contra as quais o Recorrente se insurge constituem realidades perfeitamente apreensíveis e compreensíveis pelo intelecto humano, pelo que não se reconduzem a juízos conclusivos, cuja inserção na matéria de facto se encontra vedada.
XCI. Relativamente aos factos provados 516 a 519, a alteração operada pela douta Sentença respeita apenas a uma alteração da modalidade de dolo (de direto, como constava da Decisão da CMVM, para eventual, como passou a constar na douta Sentença), não constituindo sequer uma alteração não substancial, na medida em que respeita apenas a uma “degradação” da modalidade de dolo, sendo que o dolo eventual já se encontra integrado no dolo direto, pelo que, em rigor, é uma alteração que nem teria de ser comunicada.
XCII. Relativamente ao facto provado 633, o que pretende o Recorrente com a sua alegação é alterar a matéria de facto dada como provada pela douta Sentença, o que lhe está vedado nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1 do RGCO e no artigo 410.º, n.º 2 do CPP.
Dos alegados vícios da decisão recorrida previstos no n.º 2 do artigo 410.º do CPP Da alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada
XCIII. A previsão do artigo 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, limita-se às situações em que a sentença recorrida sustenta a decisão de direito em factos que não foram dados como provados, isto é, quando a conclusão extravasa as premissas.
XCIV. Na Sentença recorrida, não há qualquer lacuna factual: o Tribunal a quo não se quedou do seu dever de indagar os factos em vista da descoberta da verdade material e a matéria de facto provada permite, em exata medida, suportar o raciocínio «lógico-subsuntivo» que é, corretamente, feito pelo Tribunal recorrido: as conclusões (de direito) do Tribunal recorrido não extravasam as premissas (de facto).
XCV. Improcede a alegação apresentada pelo Recorrente Haitong, uma vez que, independentemente de se aplicar ou não a teoria do “risco da organização”, resulta da matéria de facto provada (cf. linhas 7481 a 7534 da douta Sentença) factos que se subsumem no elemento objetivo e subjetivo do tipo de ilícito previsto nos termos conjugados dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a) do CdVM e que são suficientes para importar a imputação de um contributo causal ao Haitong para que o B... divulgasse aos clientes informação sem qualidade.
XCVI. Improcede igualmente a alegação apresentada pelo Recorrente DD, na medida em que, relativamente aos factos provados 509 e 510, tais factos são meras concretizações dos factos provados 509 e 510 que constam da Decisão da CMVM; na douta Sentença, encontram-se provados factos que preenchem quer o elemento objetivo quer do elemento subjetivo do tipo de ilícito previsto nos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a), do CdVM, relativamente ao contributo causal dado pelo Recorrente DD; o que parece que o Recorrente pretendia ver na douta Sentença era uma correspondência ipsis verbis dos factos objetivos imputados ao B... nos seus factos subjetivos, que não é possível, porquanto, os factos 633 e 632 são factos objetivos próprios do B....
XCVII. Quanto aos alegados vícios relacionados com factos provados 370 e 641, tais factos constituem meras concretizações de outros factos provados que constam da douta Sentença (cf. facto provado 369) e já constavam da Decisão da CMVM (cf. facto provado 383), e não é desses factos que resulta o preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do tipo de ilícito previsto nos termos conjugados dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a), do CdVM e o contributo causal dado Recorrente DD para a divulgação pelo B... de informação sem qualidade aos seus clientes, mas sim dos factos provados 578 a 583 referidos supra.
XCVIII. Acresce que não corresponde à verdade que o Tribunal a quo não tenha apurado factos quanto à situação económica do Recorrente DD, porquanto o Tribunal a quo notificou o Recorrente para vir juntar aos autos documentação atualizada sobre a sua situação económico-financeira e, na douta sentença, sob a epígrafe “Factos respeitantes às condições pessoais e económicas do Recorrente DD”, consta como facto provado (cf. facto provado 797) que o Recorrente DD, no ano de 2020, não teve rendimentos.
Das alegadas contradições insanáveis da fundamentação
XCIX. Para que se verifique o vício de contradição insanável da fundamentação, tem que existir uma contradição (patente na decisão de que se recorre) na própria fundamentação (na medida em que conduz a conclusões contraditórias entre si) ou entre a fundamentação e a decisão (porquanto a fundamentação deveria conduzir a decisão contrária daquela que ficou firmada na decisão).
C. Devendo ainda salientar-se que a contradição, para ser juridicamente relevante, à luz do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, tem de consistir numa contradição que não pode ser ultrapassada pelo próprio texto da decisão recorrida.
CI. No caso em apreço, não existe qualquer contradição insanável na fundamentação da sentença, nem, ainda, contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, pois o Tribunal a quo enumera claramente os factos (provados e não provados) e procede a um exame crítico da prova, sendo que tal exame crítico mostra-se coordenado com os factos provados (e não provados) e o iter percorrido pelo julgador é perfeitamente apreensível e coerente – ou seja, não existe no seio da fundamentação da sentença qualquer contradição entre os diferentes elementos que a compõem, e a decisão proferida mostra-se coerente com a fundamentação apresentada, não apresentando qualquer elemento contraditório.
CII. O Tribunal a quo não chegou foi às conclusões que os Recorrentes pretendem, mas não há nisso qualquer vício.
Da atribuição de rating da EI..., S.A pelo DRG do B... em setembro de 2013
CIII. O facto provado 642, no qual consta que o B... se limitou a prestar aos seus clientes a informação que constava nas notas informativas, não tem o sentido que o Recorrente AA lhe pretende dar, pois quando se refere que o B... se limitou a prestar aos seus clientes a informação que constava nas notas informativas o que se quer dizer é que o B..., para além da informação que constava nas notas informativas, não prestou nenhuma outra, isto é, cingiu-se à informação que constava nas referidas notas, e, não, como parece fazer crer o Recorrente, que o B... nada fez para averiguar a qualidade da informação sobre a EI..., S.A.
Do destino dos créditos detidos pela R..., S.A sobre a EI..., S.A e sobre a E... Limited após operação de reestruturação do G...
CIV. Não se vislumbra qualquer contradição no facto provado 643, conforme alegado pelo Recorrente AA, pois resulta da matéria de facto provada que a R..., S.A tinha créditos sobre a EI..., S.A e sobre a E... Limited e que para pagamento parcial do preço de aquisição das ações da E..., S.A cedeu à Esa... SGPS S.A tais créditos e, portanto, a R..., S.A deixou de ter tais créditos, permitindo a aquisição das ações da E..., S.A à EI..., S.A um encontro de contas entre os créditos que a R..., S.A detinha sobre a EI..., S.A e sobre a E... Limited e o preço de aquisição das ações da E..., S.A que eram detidas pela EI..., S.A.
CV. Inexiste também a contradição alegada pelo Recorrente AA na fundamentação dos factos provados 182 e 186, pretendendo o Recorrente, na verdade, alterar a matéria de facto provada, o que lhe está vedado atento o disposto nos artigos do disposto nos artigos 75.º do RGCO e 410.º, n.º 2, do CPP.
CVI. Com efeito, resultou provado nos factos 182 e 186 que o B... decidiu que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam emitir papel comercial a colocar pelo B... junto dos seus clientes e o Recorrente insurge-se, simplesmente, contra a prova desse facto.
Da incerteza da operação da R..., S.A e dos factos provados 369, 370, 633 e 749
CVII. Ao contrário do defendido pelos Recorrentes, nem os factos 369, 370 e 633, por um lado, e o facto 749, por outro, nem a respetiva fundamentação, são contraditórios entre si, na medida em que os factos em questão não são inconciliáveis e o Tribunal a quo é claro na explicitação das razões pelas quais entende que a decisão do Conselho Superior do G... de 7 de janeiro de 2014 tinha caráter definitivo e que era suscetível de afetar a decisão dos investidores de papel comercial, pelo que deveria ter sido comunicada aos clientes do B....
Dos alegados erros notórios na apreciação da prova
Do sentido e alcance do vício “erro notório na apreciação da prova”
CVIII. Para que exista erro notório na apreciação da prova é requisito que o vício resulte do texto da decisão recorrida.
CIX. No caso em apreço, o que os Recorrentes pretendem não é que seja sindicada um putativo erro notório de apreciação da prova, mas, sim, que seja reapreciada ex novo a prova em violação do disposto nos artigos 75.º do RGCORD e 410.º, n.º 2, do CPP.
CX. Os Recorrentes pretendem com a sua alegação é que o Tribunal da Relação confronte determinados factos dados como provados com certos elementos probatórios constantes dos autos, por forma a concluir que determinados documentos ou depoimentos imporiam conclusão diferente quanto à matéria de facto, o que não é admissível porquanto ultrapassa claramente os fundamentos do recurso previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, na medida em que, como resulta claro desta norma, o erro notório na apreciação da prova tem que resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”.
CXI. Não deve, por isso, o Tribunal conhecer da questão suscitada pelos Recorrentes por a mesma extravasar os seus poderes de cognição tal como estão definidos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP.
Do erro notório na apreciação da prova quanto aos factos provados 113 a 118 e 491 a 494
CXII. Resulta desde logo do próprio teor da alegação apresentada pelo Recorrente AA que a mesma consubstancia uma discordância da apreciação do depoimento da testemunha III levada a cabo pelo Tribunal a quo e com base na qual aquele pretende alterar a matéria de facto, o que não é permitido atento o disposto nos artigos 75.º do RGCO e 410.º, n.º 2, do CPP.
CXIII. Sem prejuízo do exposto, não existe qualquer erro, muito menos notório, na apreciação do depoimento prestado pela testemunha III: a douta Sentença encontra-se abundantemente fundamentada, em especial quanto aos factos colocados em causa pelo Recorrente, bem sustentada nos elementos probatórios constantes dos autos (que estão longe de respeitarem exclusivamente ao depoimento de III) e nas regras da experiência comum (cf. linhas 11842 e 11858), dela não resultando de forma alguma, qualquer erro – muito menos notório ou manifesto – de avaliação da provaproduzida,indicadaeapreciadapelo Tribunal a quo,que importasse uma conclusão diferente daquela a que o Tribunal chegou.
CXIV. Resulta ainda da fundamentação dos factos provados 113 a118, 491 a494, queo Tribunal apreciou criticamente o depoimento de III (em conjunto com a demais abundante prova constante dos autos), nomeadamente confrontando-o com cada um dos argumentos apresentados pelo Recorrente AA (entre os quais, o argumento das alegadas versões contraditórias dos factos apresentadas pela testemunha), não resultando daí qualquer erro.
Do erro notório na apreciação da prova quanto ao facto provado 516
CXV. As passagens da fundamentação da douta Sentença citadas pelo Recorrente AA surgem no contexto em que o Tribunal a quo aprecia a imputação subjetiva da conduta ao Recorrente, ponderando se a mesma deverá ser a título de dolo direto (como se entendeu na Decisão da CMVM) ou a título de dolo eventual, tendo-se decidido, na dúvida, pelo dolo eventual.
CXVI. O que é referido na douta Sentença é que a eventual obstaculização do plano de reestruturação do G... pela Cde... ou pelo Banco de Portugal poderia ser motivo bastante para que o Recorrente AA não tivesse acautelado a transmissão do decidido na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014 aos investidores do papel comercial da R..., S.A, “querendo, efectivamente, AA que aquela informação não fosse transmitida”.
CXVII. Entendeu o Tribunal a quo, contudo, que a prova não é suficiente para afirmar que o Recorrente AA agiu com dolo direto – querendo, efetivamente que a informação não fosse transmitida aos investidores – considerando, diferentemente do que se entendeu na Decisão da CMVM, que a conduta do Recorrente se enquadra no dolo eventual.
Do erro notório na apreciação da prova quanto aos factos provados 369, 370, 579 e 583
CXVIII. O Recorrente pretende é que se proceda a uma reapreciação dos elementos probatórios constantes dos autos, reconhecendo-se uma determinada força probatória a um determinado documento ou depoimento, tendo em vista afastar a prova de factos que foram dados como provados na Sentença recorrida, o que não é possível atento o disposto nos artigos 75.º do RGCO e 410.º, n.º 2, do CPP.
CXIX. Por outro lado, como se referiu supra, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, a existência de um erro notório na apreciação da prova exige que no texto da decisão se verifique um vício claro para qualquer pessoa no sentido de impor conclusão diversa daquela a que foi alcançada pelo Tribunal.
Ora, in casu, nem o Recorrente identificano texto daSentença apassagem de onde resulta o alegado erro nem resulta da douta Sentença qualquer vício evidente que imponha uma conclusão diferente da exposta pelo Tribunal.
CXX. O que sucede é que o Tribunal a quo, apreciando os documentos e depoimentos referidos pelo Recorrente, deles retirou conclusões diferentes das do Recorrente, sobretudo quando apreciados com a demais prova testemunhal produzida
CXXI. Acresce que a convicção probatória expressa pelo Tribunal a quoquanto ao facto provado 583 em nada viola o princípio in dubio pro reo, porquanto, ao contrário do que o Recorrente DD pretende fazer crer, no excerto da Sentença citada pelo Recorrente, o Tribunal a quo não se está a referir à ponderação da conduta ilícita a título de dolo eventual – recorde-se que DD foi condenado pela Tribunal a quo por dolo eventual enquanto a CMVM o condenou por dolo direto – mas a título de dolo direto, tendo entendido o Tribunal a que a prova é incipiente para imputar a conduta ao Recorrente a título de dolo direto (isto é, para se poder afirmar que DD queria efetivamente que aquela informação não fosse transmitida aos investidores) – como fez a CMVM – entendendo, porém, que a conduta configura a forma de dolo eventual.
Dos alegados erros de direito da sentença recorrida
Da alegada atuação dos Arguidos sendo o princípio da confiança
CXXII. O princípio da confiança, nos termos descritos na doutrina penalista portuguesa, tem aplicação no âmbito do tipo deilícito negligente: com efeito, nomeadamenteem situações de divisão de tarefas no seio de uma equipa, o princípio da confiança permite afirmar a não responsabilidade do agente que atua de forma negligente, quando este pudesse legitimamente confiar que outros cumpririam os respetivos deveres de cuidado.
CXXIII. O princípio da confiança não legitima que os superiores hierárquicos deixem de exercer as suas próprias funções ou que as exerçam sem o respeito pelos deveres de cuidado. Isto significa que, no caso da atividade de intermediação financeira, os titulares do órgão de administração dos intermediários financeiros não podem deixar de exercer – com o cuidado devido – as suas funções de controlo pelo cumprimento dos deveres previstos na legislação mobiliária (cfr., v.g., arts. 304.º, n.º 5, e 305.º-D, do CdVM, e arts. 64.º, n.º 1, e 405.º do Código das Sociedades Comerciais).
CXXIV. A confiança de que outros cumpram os seus deveres não impede nem o cuidado devido nas circunstâncias concretas em que se atua se existirem razões para tal (e existiam, como se demonstra na presente Decisão) nem o cumprimento dos deveres de cuidado a que pessoalmente se está obrigado pela natureza dos cargos, pelas matérias em que se intervém e pela necessidade de cumprir a lei vigente.
Da autoria e do conceito extensivo de autor
CXXV. O conceito extensivo de autor encontra-se expressamente consagrado no ordenamento jurídico português no quadro do Direito de Mera Ordenação Social – cf. o art. 16.º, n.º 1, do RGCO (cf. Acórdão n.º 45/2014 do Tribunal Constitucional) –, sendo pacífica a sua aceitação na doutrina nacional.
CXXVI. Tal critério de autoria, expressamente previsto no domínio do Direito de Mera Ordenação Social, e que é distinto do Direito Penal, não viola qualquer norma constitucional: a Constituição não impõe ao legislador a consagração de um conceito restritivo de autor no Direito de Mera Ordenação Social, sendo que é o próprio Tribunal Constitucional que, como referimos, reconhece a existência de um conceito extensivo de autor e a sua conformidade com a Constituição.
CXXVII. A Sentença recorrida não merece censura no que respeita à imputação ao Recorrente BB das contraordenações por violação das regras relativas aos conflitos de interesses (artigo 309.º do CdVM).
CXXVIII. No que respeita à alegação do Recorrente DD, pese embora o critério da relevância do contributo não conste do texto legal, a verdade é que, como bem se decidiu na Sentença recorrida, os factos praticados pelo Recorrente DD que traduzem o seu contributo causal para a prática da contraordenação por que foi condenado, são de molde a qualificar tal contributo como relevante.
CXXIX. Improcede, igualmente, a inconstitucionalidade suscitada pelo Recorrente DD, na medida em que, desde logo, a norma cuja inconstitucionalidade é invocada (artigos 16º n.º 1 do RGCO, conjugado com o artigo 389º n.º 1 alínea a) do CdVM) não foi interpretada nem aplicada pelo Tribunal a quo no sentido invocado.
Dos critérios de imputação das contraordenações à pessoa coletiva
CXXX. No quadro legal vigente nas contraordenações do mercado de valores mobiliários eoutros instrumentos financeiros (cf. artigo 401.º do CdVM), é pacífico que a imputação de uma contraordenação à pessoa coletiva – incluindo a imputação dos factos que consubstanciam o conhecimento e a vontade de realização dos tipo-de-ilícito – não depende da individualização de uma atuação da pessoa singular171.
CXXXI. A responsabilidade (autónoma) contraordenacional da pessoa coletiva dispensa (ao contrário do que sucede no Direito Penal) a intermediação das pessoas singulares e dos factos de conexão por elas praticados. Na verdade, para a imputação dos factos ilícitos ao Recorrente Haitong torna-se necessário demonstrar – como se demonstrou na Sentença recorrida, assim como na Decisão da CMVM – a participação do Arguido, enquanto organização empresarial, nos factos em causa e, neste contexto, no respetivo acesso à informação necessária para orientar a sua conduta de acordo com o Direito.
CXXXII. Ou seja, torna-se necessário demonstrar que a conduta da pessoa coletiva (no caso, o Recorrente Haitong) desconforme com o Direito resulta de um defeito estrutural da organização empresarial que estava na sua disponibilidade evitar. Ora, resulta dos factos provados que o Recorrente Haitong atuou, no quadro da emissão e colocação de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, na qualidade de intermediário financeiro, tendo assumido contratualmente as funções de Líder, Entidade Registadora e Agente dos Programas de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A
CXXXIII. Não obstante a verificação dos pressupostos da imputação autónoma da responsabilidade contraordenacional ao Recorrente Haitong, importa sublinhar que, como o próprio Arguido reconhece, na Sentença são identificadas as pessoas singulares, titulares dos órgãos sociais que atuaram por conta e em nome do Arguido – os Recorrentes AA, BB e DD, administradores (não executivos) do BEl... –, sendo que os factos em causa nos autos foram praticados, no exercício das respetivas funções ou em seu nome ou por sua conta, pelos titulares dos seus órgãos sociais no quadro do exercício da norma atividade do Recorrente Haitong (a de intermediário financeiro) e dentro dos exatos limites do respetivo objeto social e bem assim das atividades para cujo exercício se encontrava registado junto da CMVM.
CXXXIV. No que respeita à invocação do Recorrente Haitong de que a teoria do risco da organização, a que o Tribunal a quo alude na Sentença recorrida não tem consagração legal, a mesma é totalmente desprovida de sentido, pois que a designada teoria do risco da organização é uma construção dogmática, destinada a fornecer um critério de imputação do conhecimento dos factos ilícitos àpessoa coletiva, assumindo especial valia ao nível da afirmação da culpa do agente, sendo que tratando-se de um modelo de imputação, a mobilização de tal teoria não está dependente nem demanda qualquer aditamento ou alteração à factualidade estabelecida, antes partindo desta.
CXXXV. Soçobra a inconstitucionalidade invocada pelo Recorrente, pois que o critério de imputação do facto à pessoa coletiva acolhido no artigo 401.º, n.º 2, do CdVM constitui uma opção de política legislativa legítima, porquanto é necessária, adequada e proporcional às especificidades do Direito das contraordenações no mercado de valores mobiliários, como já decidiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 566/2018.
Da alegada errada interpretação do âmbito de aplicação objetivo e subjetivo do artigo 7.º do CdVM
CXXXVI. Quem divulga (ou participa na divulgação) informação sem qualidade pratica a infração que resulta da conjugação do artigo 7.º com a alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do CdVM. E, de acordo com o conceito extensivo de autor a todos os agentes que deem um contributo causal para a divulgação de informação sem a qualidade exigida pelo artigo 7.º do CdVM é imputada a conduta ilícita, considerando o disposto no artigo 419.º, n.º 1, do CdVM e na segunda parte do n.º 1 do artigo 16.º do RGCO.
CXXXVII. O dever de prestação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, impendia, assim, quer sobre o Arguido B..., na qualidadedeintermediário financeiro que se encontrava a colocar papel comercial junto dos seus clientes, quer sobre o Recorrente Haitong, na qualidade de intermediário financeiro líder e agente dos programas de papel comercial, quer ainda sobre os Arguidos pessoas singulares, na qualidade de membros do Conselho de Administração de um intermediário financeiro (cfr. artigos 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, do CdVM).
CXXXVIII. O dever de prestação de informação com qualidade impõe-se, desde logo, ao intermediário financeiro, independentemente de este estar obrigado a divulgar a determinada informação: a partir do momento em que o intermediário financeiro decide divulgar ou prestar informação aos investidores, deve, sem qualquer limitação, observar os requisitos de qualidade previstos no artigo 7.º do CdVM. Isto significa que se o intermediário financeiro presta informação aos seus clientes sobre um determinado instrumento financeiro e respetivo emitente, deve prestá-la de forma verdadeira, completa, clara, objetiva e lícita – independentemente, por exemplo, de a elaboração das notas informativas de papel comercial se encontrar a cargo do emitente ou de esse dever estar contratual ou legalmente previsto em diploma específico.
CXXXIX. Conhecendo o B... (e, bem assim, o Haitong e os Arguidos pessoas singulares) que a informação que constava das Notas Informativas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, que divulgou aos seus clientes, não era verdadeira, completa, atual, nem lícita, violou o disposto no artigo 7.º do CdVM, independentemente de o artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de março, prever que a elaboração das notas informativas é da responsabilidade das emitentes.
CXL. O intermediário financeiro que decide divulgar ou prestar informação não está legitimado a prestar informação falsa, incompleta ou desatualizada pelo facto de aquela divulgação ou prestação de informação não resultar do cumprimento de um dever legal (nomeadamente, do disposto no artigo 17.º do Decreto-lei n.º 69/2004) ou contratual ou, simplesmente, de o regime jurídico do papel comercial prever determinadas obrigações de informação para as ofertas públicas e não para as ofertas particulares.
CXLI. Quanto à alegação do Recorrente Haitong de que não atuou na qualidade de intermediário financeiro, tal alegação é manifestamente improcedente e, diga-se mesmo, inadmissível, mostrando uma absoluta incompreensão, por parte do Arguido, das funções de intermediação financeira que assumiu no quadro da emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A (para as quais, aliás, se encontra registado junto da CMVM e continua a exercer), como, aliás, bem decidiu o Tribunal a quo.
Da alegada atualidade, completude e licitude da informação constante das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A
CXLII. Os argumentos apresentados pelo Recorrente BB não são idóneos a afastar a conclusão pela prestação de informação sem qualidade (não completa, não atual e não lícita) aos clientes que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A,pois queoalegado pelo Arguido não afastaaprovados pontos 452 a 564 dos Factos Provados.
CXLIII. O facto de a operação de reestruturação do G..., que incluiu a aquisição pela R..., S.A da participação social na E..., S.A ter sido divulgada ao mercado através de um comunicado da E..., S.A no site da CMVM a 23 de janeiro 2014, não torna inexigível ou desnecessário que essa informação constasse nas Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A, desde logo atendendo à função desempenhada pela nota informativa no contexto da emissão e colocação de papel comercial: concentrar num só documento a informação relevante para decisão de investimento por parte dos investidores, sem que os mesmos tenham de procurar tal informação noutras fontes ou, muito menos, aferir da atualidade, completude e licitude da informação constante naquele documento em confronto com outras fontes de informação
CXLIV. Dos factos provados resulta que a aquisição da participação social da E..., S.A pela R..., S.A era já do conhecimento do B... e, nomeadamente, do Arguido BB, desde 7 de janeiro de 2014, data em que foi efetivamente decidida pelo Conselho Superior do G..., pelo que, pelo menos desde essa data, que a informação relativa à aquisição da participação social da E..., S.A pela R..., S.A deveria ter passado a constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A, o que não sucedeu.
CXLV. Relativamente à alegação apresentada pelo Arguido BB de que a operação de aquisição pela R..., S.A da participação social da E..., S.A é posterior às últimas contas da R..., S.A, a mesma é irrelevante, na medida em que resulta dos Factos Provados, bem com da correspondente fundamentação,que o B... conhecia, mesmo antes da operação de reestruturação se encontrar decidida ou formalmente aprovada, que a mesma produziria um impacto financeiro significativo nas demonstrações financeiras da R..., S.A e que, por conseguinte, a informação sobre as demonstrações financeiras que constava nas Notas Informativas que o B... divulgava aos clientes subscritores do papel comercial da R..., S.A não era atual, não era completa, nem era lícita.
CXLVI. De acordo com os elementos probatórios constantes dos autos, aaquisição daparticipação de 49,6% do capital social da E..., S.A teve um impacto sobre a “estrutura da dívida financeira da R..., S.A” e, em especial, do seu passivo corrente, situação que naturalmente tem impacto na exposição ao risco assumido pelos clientes do B... subscritores de papel comercial. Ora, tendo em conta que o papel comercial é um valor mobiliário de natureza monetária, representativo de dívida, emitido por prazo a inferior a um ano (à data dos factos) – reconduzindo-se, assim, a dívida de curto prazo –, é manifesto que para um investidor em papel comercial é fundamental o conhecimento da situação económico-financeira da sociedade emitente e, em especial, quer o seu nível de endividamento no curto prazo quer a sua capacidade de solver a dívida de curto prazo.
Da alegada relevância do facto impeditivo do resultado não incluído no tipo contraordenacional
CXLVII. As infrações imputadas nos presentes autos aos Arguidos – como de resto, a generalidade dos tipos contraordenacionais que assentam em normas de dever – configuram, quanto à conduta, ilícitos de mera atividade, posto que o tipo contraordenacional se preenche “através da mera execução de um determinado comportamento”. Assim, nenhum dos tipos contraordenacionais em apreço pressupõe a produção de um evento como consequência objetivamente imputável à conduta do agente – seja esse evento um resultado de dano ou de perigo –, bastando-se, pois, com a mera ação proibida.
CXLVIII. Ao contrário do que alega o Arguido AA, as infrações em apreço não configuram infrações de perigo concreto, nem de perigo abstrato-concreto, mas sim infrações de perigo abstrato – basta-se a realização da conduta proibida sem a necessidade de produção de qualquer resultado perigo, nem de um juízo de aptidão para a produção de perigo.
CXLIX. Tratando-se de infrações de mera atividade, de perigo abstrato e na forma consumada, improcede a alegação do Arguido quanto à alegada existência de uma conduta destinada a obstar à produção de resultados não compreendidos no tipo, conducente à uma situação de desistência juridicamente relevante, por aplicação do artigo 14.º do RGCO, pois que o conceito de «resultado não compreendido no tipo» aplica-se apenas à desistência em crimes tipicamente formais, em que apesar da consumação formal o agente evite a lesão material do interesse protegido – o que não é o presente caso.
CL. Sem prejuízo do exposto, importa sublinhar que o regime da desistência voluntária encontra-se erigido no artigo 14.º do RGCO, tal como nos artigos 24.º e 25.º do CP, para desistência da tentativa, sendo que, para que esta modalidade de desistência voluntária operasse seria necessário, desde logo, que a produção do resultado não compreendido no tipo não tivesse ocorrido, o que, manifestamente, não sucedeu no caso em apreço.
Da alegada inexistência de dolo ou negligência
CLI. Quanto à alegada insuficiência dos factos provados para sustentar que o Recorrente DD previra como possível, na sequência da apresentação na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014, que a informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelasse a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial e se conformara que a mesma fosse nesses termos prestada aos Clientes do B..., a mesma é claramente desmentida pelo teor dos factos provados (cf. factos provados 562, 563, 567, 568, 569, 571, 577, 578, 579, 580, 581, 582 e 583) e, bem assim, da douta sentença recorrida.
CLII. A alegação de que o Recorrente DD seria conhecedor da «Advertência aos Investidores» constante das Notas Informativas e não sendo jurista, estaria convicto daveracidadedo quenela expressamenteseafirma quanto àexclusão daresponsabilidade do B... pela qualidade da informação constante dessas mesmas Notas Informativas e/ou pela obrigação de atualização dessa mesma informação, não afasta a adequação típica da conduta.
CLIII. O Recorrente DD era administrador executivo do B... e administrador do BEl..., com extensa experiência em matérias de intermediação financeira e de mercados de instrumentos financeiros, conhecedor dos deveres que impendem sobre os intermediários financeiros; conhecia, pois que coordenou a sua “montagem”, a operação de colocação, pelo B..., do papel comercial emitido pela R..., S.A, assim como o teor das notas informativas; conhecia a desconformidade entre a realidade e a informação constante das notas informativas, pelo menos deste 7 de janeiro de 2014, e consequentemente sabia que a informação que estava a ser prestada aos clientes do B... não tinha a qualidade devida. Do que resulta inexistirem quaisquer factos provados que permitam afirmar que o Recorrente DD atuou em erro.
CLIV. Sem conceder, ainda que o Tribunal ad quem desse como provado que o Arguido atuou em erro (no que se não concede) – é manifesto que tal erro é censurável e, como tal, não exclui a culpa.
Das infrações em concurso
Do número de contraordenações praticadas em violação do artigo 309.º do CdVM
CLV. O artigo 309.º do CdVM consagra um conjunto de deveres e não apenas um dever, o incumprimento pelo Recorrente de vários deveres importa a prática do mesmo número de contraordenações. Assim é que, (i) nos termos do artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, “[o] intermediário financeiro deve organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e atuar de modo a evitar ou reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência”; (ii) o n.º 2 do mesmo artigo 309.º do CdVM dispõe que “[e]m situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro deve agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo”; e (iii) nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 309.º do CdVM173, “[o] intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses do cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais (…)”.Como é bom de ver, estamos perante diferentes deveres, perfeitamente tipificados, sendo que a violação de cada um dos referidos deveres faz o agente incorrer na prática de uma contraordenação.
CLVI. Quanto à alegação dos Recorrentes AA e BB no sentido de que a violação dos mesmos deveres respeitantes aos conflitos de interesses relativamente ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e ao papel comercial emitido pela R..., S.A importa a violação de um só dever, e por conseguinte, de uma só contraordenação, prevêo artigo 30.º, n.º 1, 2.ª parte, do Código Penal que“[o] número de crimes determina-se (…) pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente”.
CLVII. Os factos ilícitos respeitantes ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e ao papel comercial emitido pela R..., S.A não são os mesmos e foram praticados em momentos diferentes, não obstante terem preenchido o mesmo tipo de ilícitos, assim expressando diferentes resoluções ilícitas. Tendo preenchido o mesmo tipo de ilícito várias vezes, os Recorrente incorreram na prática de igual número de contraordenações.
Das alegadas relações de comsumpção e de subsidiariedade entre as normas do artigo 309.º do CdVM
CLVIII. Improcede o alegado pelos Recorrentes AA e BB, porquanto as infrações imputadas aos Recorrentes encontram-se em concurso efetivo, inexistindo qualquer unidade normativa, sendo que a relação de consumpção e de subsidiariedade entre normas surge no concurso aparente de normas. Ao contrário do que é defendido pelos Recorrentes, entre as normas previstas nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CdVM não existe concurso aparente, porque umas não excluem as outras.
CLIX. Basta atentar ao teor das normas constantes dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 309.º do CdVM para se perceber que jamais poderia existir um concurso aparente entre elas, visto pretenderem regular aspetos diversificados do problema do conflito de interesses – ora a sua prevenção, ora a sua gestão – impondo comportamentos distintos ao intermediário financeiro destinatário.
CLX. Ao contrário do que alegam os Arguidos, os deveres (normas de conduta) consagrados nos n.os 1,2 e3 do artigo 309.º do CdVM pressupõem precisamente queestejamos perante situações distintas entre si. Não há, por conseguinte, concurso aparente, na medida em que este pressupõe unidade de norma ou lei, isto é, concorrência de normas aplicáveis a um só facto, algo que não se verifica na situação em apreço, em que estão em causa deveres distintos, aplicáveis a factos distintos e em momentos temporais diferenciados.
CLXI. Os tipos contraordenacionais invocados pelo Recorrente não violam o princípio da legalidade, porquanto estatuem deveres (autónomos) de forma clara, expressa e determinável, encontrando-se vigentes no momento da prática do facto, sendo que o Tribunal Constitucional já asseverou que a técnica legislativa da remissão material a que recorre o regime contraordenacional do CdVM não ofende a Constituição (cf. Acórdão n.º 85/2012, o Tribunal Constitucional). Por seu turno, a circunstância de o agente ser punido em concurso efetivo pela realização de dois tipos contraordenacionais autónomos não ofende qualquer parâmetro constitucional, resultando das regras do concurso vigentes e consolidadas no ordenamento jurídico português.
Do alegado concurso aparente entre as contraordenações consubstanciadas na violação do artigo 309.º, n.º 3 do CdVM e do artigo 7.º do CdVM
CLXII. Improcede a argumentação dos Recorrentes AA e BB, inexistindo qualquer relação de concurso aparente entre as contraordenações imputadas aos Arguidos pela violação do dever de o intermediário financeiro dar prevalência aos interesses dos seus clientes em relação aos seus próprios interesses (artigo 309.º, n.º 3 do CdVM) e as contraordenações pela violação do dever de prestação de informação com qualidade (artigo 7.º do CdVM), pois que entre as normas previstas no n.º 3 do artigo 309.º e no artigo 7.º do CdVM não existe qualquer concurso aparente, já que nenhuma destas normas exprime já de forma bastante o desvalor de todo o comportamento de modo a excluir (consumir) a aplicação da outra.
CLXIII. O artigo 309.º, n.º 3 do CdVM e o artigo 7.º do CdVM não só não preveem um mesmo dever para o intermediário financeiro, como naquelas duas normas estão em causa condutas típicas distintas. O artigo 309º, n.º 3, do CdVM consagra o dever de o intermediário financeiro dar prevalência aos interesses dos seus clientes em relação aos seus próprios interesses, ao passo que o artigo 7º do CdVM prevê o dever de o intermediário financeiro prestar informação (respeitante a instrumentos financeiros) com determinadas qualidades, designadamente ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita.
CLXIV. Nas contraordenações cometidas pelo Arguido, não está em causa um único facto típico no que toca à violação do artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, e do artigo 7.º do CdVM. Com efeito, no que respeita à violação do dever de prestação de informação com qualidade, o facto típico é a divulgação da informação com os vícios legalmente tipificados, já no que respeita à violação do dever de o intermediário dar prevalência aos interesses dos seus clientes em relação aos seus próprios interesses, o facto típico é a decisão do B... de, no momento da colocação do papel comercial da EI..., S.A e do papel comercial da R..., S.A, dar prevalência aos seus próprios interesses em relação aos interesses dos seus clientes.
CLXV. O facto de alguns dos contributos causais do Arguido AA para a prática das contraordenações em causa serem comuns a qualquer das contraordenações não significa que se esteja perante uma situação de concurso aparente. É que para aferir da existência de uma situação de concurso aparente, haverá que considerar os factos típicos da infração e não os contributos causais dos diversos agentes para a prática de tais factos.
CLXVI. Acresce, que não há identidade do bem jurídico tutelado pelas normas ínsitas no artigo 309º, n.º 3, do CdVM, e no artigo 7.º do CdVM: no artigo 7.º do CdVM o interesse jurídico protegido é a (qualidade) informação no mercado de instrumentos financeiros, já no artigo 309.º, n.º 3, o interesse jurídico protegido corresponde aos interesses e património dos clientes de um intermediário financeiro.
Da alegada existência de contraordenações continuadas
CLXVII. São, fundamentalmente, três os pressupostos para que se possa concluir pela existência de um crime continuado: (a) a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que protejam o mesmo bem jurídico; (b) uma conduta tendencialmente homogénea; e (c) uma conduta praticada no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
CLXVIII. Ainda que se considerasse aplicável, sem mais, no domínio do Direito de Mera Ordenação Social o disposto no artigo 30º, n.º 2, do Código Penal, a verdade é que jamais estariam preenchidos, in casu, os pressupostos para a verificação de uma infração continuada. Desde logo, não se pode afirmar que as condutas imputadas aos Arguidos nos presentes autos foram praticadas no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente: a circunstância de terem sido colocadas diversas emissões de papel comercial da EI..., S.A, e bem assim, de papel comercial emitido pela R..., S.A, e de, em todas elas, o B... – com o contributo causal dos demais Arguidos – ter violado os comandos ínsitos no artigo 309.º do CdVM, agravam, nomeadamente, pela reiteração da conduta e o número e natureza dos clientes afetados, o grau de culpa dos Arguidos.
CLXIX. Acresce que, também não se verifica o pressuposto da execução tendencialmente homogénea dos factos, desde logo porquanto a conduta que integra a factualidade típica não se realiza no mesmo momento, no que respeita à violação do disposto no artigo 309.º, n.º 1 (violação do dever de o intermediário financeiro organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos deinteresses atuar demodo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da ocorrência deconflitos deinteresses) edaviolação do disposto no artigo 309.º, n.º 2 (violação do dever de, em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo) e do disposto no artigo 309.º, n.º 3 (violação do dever de o intermediário dar prevalência aos interesses do(s) cliente(s) em relação aos seus próprios interesses). Sendo que, também não existe coincidência temporal entre as condutas violadoras dos três tipos contraordenacionais previstos no artigo 309º do CdVM no que respeita, por um lado, à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e, por outro lado, à emissão de papel comercial emitido pela R..., S.A.
Das sanções aplicadas
Da errada determinação da medida concreta da coima aplicada ao Arguido AA
CLXX. Como o próprio Recorrente AA reconhece, o Tribunal a quo reduziu o montante das coimas aplicadas ao Recorrente pela prática das contraordenações respeitantes à colocação de papel comercial da R..., S.A, com fundamento na degradação da modalidade do dolo imputada ao Recorrente no que respeita às contraordenações em causa (dolo eventual). No entanto, contrariamente ao alegado pelo Recorrente AA, a circunstância de o Tribunal a quo ter imputado à prática das contraordenações relativas à comercialização de papel comercial emitido pela R..., S.A a título de dolo eventual e não de dolo direto, como decidiu a CMVM, não determina, de per si, uma redução do montante da coima única, pois que a sua determinação obedece ao disposto no artigo 19.º do RGCO, o qual foi integralmente observado na Sentença recorrida, não merecendo a mesma qualquer censura.
CLXXI. O Tribunal a quo, na determinação da medida da coima aplicada ao Recorrente AA, tomou em consideração todos os fatores previstos no artigo 405.º do CdVM, como consta das páginas 889 a 896 da Sentença recorrida. Mostrando-se a Sentença, no que respeita à determinação das sanções aplicadas ao Recorrente AA basta e adequadamente fundamentada, nos termos expostos supra, improcedem necessariamente as questões suscitadas pelo Recorrente AA.
Do alegado erro de direito na interpretação e aplicação do artigo 50.º do Código Penal quanto à decisão de não suspender a execução da coima única aplicada ao Recorrente CC
CLXXII. O Tribunal, na determinação da medida da coima aplicada ao Recorrente CC, tomou em consideração todos os fatores previstos no artigo 405.º do CdVM, como consta das páginas 920 a 925 da Sentença recorrida, tendo apreciado, especificamente, a aplicabilidade, in casu do instituto da suspensão da execução da sanção, tendo concluído que se não verificavam os seus pressupostos (cf. págs. 940-941), pelo que improcede o recurso do Recorrente CC.
Da alegada desproporcionalidade, excesso e inadequação da(s) coima(s) aplicada(s) ao Recorrente BB
CLXXIII. O Tribunal a quo, na determinação da medida da coima aplicada ao Recorrente BB, tomou em consideração todos os fatores previstos no artigo 405.º do CdVM, como consta das páginas 909 a 914 da Sentença recorrida. Designadamente, o Tribunal a quo considerou e valorou as circunstâncias pessoais e patrimoniais atuais do Recorrente, assim como considerou que as exigências de prevenção especial eram, in casu, reduzidas, o que contribuiu para a determinação de uma coima única de montante substancialmente inferior àquele que havia sido aplicado pela CMVM. Simplesmente, como bem decidiu o Tribunal a quo, a ponderação dos demais fatores de determinação da medida da sanção, assim como a consideração dos critérios de determinação da coima única, impunham a aplicação de uma coima única no montante de € 500.000,00.
CLXXIV. O Tribunal a quo aplicou uma coima única muito próxima do limite mínimo da moldura concursal aplicável, assim tendo dado o devido valor às circunstâncias do caso. Ademais, o Tribunal a quo apreciou a possibilidade de suspensão das sanções aplicadas aos Arguidos, assim como da possibilidade de aplicação de uma admoestação ao Recorrente BB. (pp. 938 a 942), nenhuma censura merecendo, quanto a este ponto, a Sentença recorrida.
Da alegada inadequação e desnecessidade da sanção acessória aplicada ao Arguido BB
CLXXV. A aplicação da sanção acessória ao Arguido BB não merece qualquer censura pois assentou numa ponderação específica da gravidade da conduta do arguido, do seu grau de culpa, bem como das exigências de prevenção, em estreita observância do disposto nos artigos 404.º e 405.º do CdVM e do artigo 21.º do RGCO. Tal como consta da Sentença recorrida, o Tribunal a quo entendeu aplicar ao Arguido BB uma sanção acessória por a mesma se revelar adequada e necessária.
Da alegada inconstitucionalidade das medidas das coimas previstas no CdVM
CLXXVI. O Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a constitucionalidade do artigo 388.º do CdVM, que fixa a moldura sancionatória das contraordenações previstas no CdVM, tendo decidido pela conformidade constitucional da mesma. Assim é que tem sido reiteradamente defendido pelo Tribunal Constitucional que o legislador ordinário goza de uma “livre margem de decisão quanto à fixação do legal do montante das coimas a aplicar” (Vejam-se os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 304/94, 574/95, 547/00, 62/2011, 132/2011, 360/2011, 400/2017 e 397/2019), só sendo de censurar, quanto ao princípio da proporcionalidade das sanções, “as soluções legislativas que cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou manifesta e claramente excessivas, pois tal o proíbe o artigo 18º, nº 2, da Constituição”.
CLXXVII. No caso em apreço, está em causa a prática de infrações relacionadas com a tutela da qualidade da informação (cf. artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM) e do regime do conflito de interesse (cf. artigo 397.º, n.º 2, alínea b), pilares essenciais do regular funcionamento do mercado de valores mobiliários e de instrumentos financeiros. Por esse motivo, as condutas que realizam os tipos contraordenacionais em apreço constituem condutas muito graves, atentatórias dos bens e interesses protegidos pelo Direito dos valores mobiliários, pelo que as sanções devem ser adequadas a tal gravidade.
CLXXVIII. O legislador jusmobiliário consagrou no artigo 405.º do CdVM um regime próprio de determinação da coima concreta em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos, das exigências de prevenção, da natureza singular ou coletiva do agente, da situação económica do agente e da conduta anterior e posterior do agente. Pelo que a apreciação da proporcionalidade da moldura abstrata não pode deixar de levar em linha de conta a existência de critérios de determinação da medida concreta da coima, permitindo que a mesma seja adequada ao caso concreto.
CLXXIX. Quanto ao fundamento de inconstitucionalidade alegado pelo Recorrente AA, referente à questão de uma pessoa singular poder ser punida com uma coima superior ao limite máximo da pena de multa da lei penal, quer esteja em causa uma única contraordenação ou um concurso de contraordenações, há, desde logo, que ter em conta que as coimas, nomeadamente as previstas no CdVM, e a pena de multa prevista na lei penal são realidades materialmente distintas e têm regimes legais bem distintos. - cf. Acórdão n.º 336/08.

Terminou, pugnando pela total improcedência dos recursos e manutenção da Sentença recorrida.
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O Ministério Público também respondeu, apresentando, as seguintes
Conclusões
1ª Deverá ser oficiosamente declarado prescrito o procedimento contraordenacional relativamente a cada uma das duas contraordenações pp pelo art. 397º, n.º 2, b) e 388.º, n.º 1, a) do CvM, uma por violação do dever previsto no art. 309º, nº 1 do CvM quanto ao papel comercial da EI..., S.A e outra por violação deste mesmo dever quanto ao papel comercial da R..., S.A.
2ª Deverá ser reformulado o cúmulo jurídico das coimas aplicadas aos arguidos AA, BB e CC.
3ª O recurso do arguido CC deverá ser parcialmente provido.
4ª Cada um dos demais quatro arguidos deverá ser julgado improcedente, assim se fazendo Justiça.
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Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Senhor Procurador Geral Adjunto, emitiu parecer, nada acrescentando à posição assumida pelo Ministério Público em 1ª instância, mantendo-a integralmente.
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Foram colhidos os vistos.
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II. Fundamentação de Facto.
 Com interesse para a boa decisão da causa, foram considerados provados pelo tribunal de 1ª instância, os seguintes factos:
Secção I – Factos gerais:
Subsecção I – O B...: caracterização do intermediário financeiro e da participação dos Recorrentes nos seus órgãos de gestão:
1. O B... era, à data da prática dos factos que constituem objecto do presente processo de contra-ordenação (anos de 2013 e 2014), um intermediário financeiro registado na CMVM para o exercício das seguintes actividades de intermediação financeira:
(a) Execução de ordens (desde 29 de julho de 1997);
(b) Recepção e transmissão de ordens por conta de outrem (desde 29 de Julho de 1997);
(c) Negociação por conta própria de valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1997);
(d) Gestão de carteiras por conta de outrem (desde 20 de Outubro de 2005);
(e) Registo e depósito de instrumentos financeiros (desde 27 de Março de 1992);
(f) Serviço de câmbios e aluguer de cofres (desde 29 de Julho de 1991);
(g) Consultadoria sobre estrutura de capital (desde 29 de Julho de 1991);
(h) Assistência em oferta pública de valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
(i) Consultadoria para investimento (desde 29 de Julho de 1991);
(j) Depositário de valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
(k) Concessão de crédito (desde 29 de Julho de 1991);
(l) Tomada firme e colocação em oferta pública (desde 29 de Julho de 1991);
2. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o B... fazia parte do G... (doravante, G...);
3. O G... foi criado em 1975 pela família Es... e era constituído por um conjunto de sociedades que se dedicavam a actividades do ramo financeiro e do ramo não financeiro;
4. A 30 de Junho de 2013, o B... tinha um capital social de 5.040.124.063,26 euros representado por 4.017.928.471 acções;
5. A 30 de Junho de 2013, eram titulares de participações qualificadas no B... as seguintes entidades:
a) E..., S.A (doravante E..., S.A), que detinha uma participação de 37,10%, correspondente a uma participação directa de 1,07% e a três participações indirectas: uma de 35,29%, através da Bs..., S.A. [sociedade dominada pela E..., S.A., que por sua vez era participada em 100% pela E..., S.A]; outra de 0,18%, através dos membros dos seus órgãos de Administração e Fiscalização; e outra de 0,56%, através de empresas por si dominadas directa e indirectamente e/ou elementos dos seus órgãos de Administração e Fiscalização;
b) Cra..., S.A., que detinha uma participação de 10,81%;
c) Sil... Limited, que detinha uma participação de 5,64%;
d) Brp..., S.A., que detinha uma participação de 4,83%;
e) Cma..., que detinha uma participação de 2,56%;
a) Pt..., S.A., que detinha uma participação de 2,10%, resultante de duas participações indirectas: uma de 2,09%, através da PT Prestações-Mandatária de Aquisições e Gestão de Bens, S.A.; e outra de 0,01%, através dos membros dos órgãos de Administração e Fiscalização do Grupo PT;
6. A 31 de Dezembro de 2013, o B... tinha um capital social de 5.040.124.063,26 representado por 4.017.928.471 acções;
7. A 31 de Dezembro de 2013, eram titulares de participações qualificadas no B... as seguintes entidades:
b) E..., S.A, que detinha uma participação de 36,85%, correspondente a uma participação directa de 1,38% e a duas participações indirectas: uma de 35,29%, através da Bs..., S.A. [sociedade dominada pela E..., S.A., que por sua vez era participada em 100% pela E..., S.A]; e outra de 0,18%, através dos membros dos seus órgãos de Administração e Fiscalização;
c) Cra..., S.A., que detinha uma participação de 10,81%;
d) Sil... Limited, que detinha uma participação de 5,67%;
e) Brp..., S.A., que detinha uma participação de 4,83%;
f) Cma..., que detinha uma participação de 4,14%;
g) Pt..., S.A., que detinha uma participação de 2,10%, correspondente a duas participações indirectas: uma de 2,09%, através da PT Prestações-Mandatária de Aquisições e Gestão de Bens, S.A.; e outra de 0,01%, através dos membros dos órgãos de Administração e Fiscalização do Grupo PT;
h) B..., Inc., que detinha uma participação de 2,00%.
8. A 30 de Junho de 2013, o capital social da E..., S.A era representado por 2.000.000.000,00 de acções sem valor nominal, sendo o capital subscrito na referida data detido da seguinte forma:
a) em 43,82 % pela E..., S.A. (doravante EI..., S.A), através de uma participação directa de 33,79% e de uma participação indirecta de 10,03%, através da Esa... SGPS S.A.;
b) em 56,18% por outros accionistas;
9. A 31 de Dezembro de 2013, 49,2% do capital social da E..., S.A – sociedade que detinha, directa e indirectamente, 36,85% do capital social do B... – era detido pela EI..., S.A através de uma participação qualificada indirecta;
10. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Conselho de Administração do B... tinha a seguinte composição:
a. RRR (Presidente);
b. AA;
c. SSS (Vice-Presidente);
d. BB;
e. TTT;
f. UUU;
g. VVV;
h. CC;
i. QQQ;
j. FF;
k. EE;
l. PPP;
m. DD;
n. WWW;
o. XXX;
p. HHH;
q. YYY;
r. ZZZ;
s. AAAA;
t. BBBB;
u. CCCC;
v. DDDD;
w. DDD;
x. EEEE;
y. FFFF.
11. Os referidos membros do Conselho de Administração do B... exerceram as funções de administradores do B... entre as seguintes datas:
a. RRR: entre Fevereiro de 2006 e 3 de Agosto de 2014;
b. AA: entre Setembro de 1991 e 13 de Julho de 2014;
c. SSS: entre Abril de 2010 e 3 de Agosto de 2014;
d. BB: entre Abril de 1992 e13 de Julho de 2014;
e. TTT: entre Novembro de 1990 e 30 de Julho de 2014;
f. UUU: entre Julho de 1993 e 3 de Agosto de 2014;
g. VVV: entre Abril de 1992 e 3 de agostou de 2014;
h. CC: entre Março de 1994 e 31 de Maio de 2014;
i. QQQ: entre Março de 1999 e 13 de Julho de 2014;
j. FF: entre Março de 2000 e 30 de Julho 2014;
k. EE: entre Março de 2000 e 30 de Julho de 2014;
l. PPP: entre Março de 2002 e 31 de Julho 2014;
m. DD: entre Março de 2004 e 3 de Agosto de 2014;
n. WWW: entre Fevereiro de 2006 e 3 de Agosto de 2014;
o. XXX: entre Setembro de 2006 e 3 de Agosto de 2014;
p. HHH: entre Março de 2008 e 31 de Julho de 2014;
q. YYY: entre Março de 2008 e 3 de Agosto de 2014;
r. ZZZ: entre Março de 2008 e 30 de Julho de 2014;
s. AAAA: entre Julho de 2010 e 3 de Agosto de 2014;
t. BBBB: entre Maio 2011 e 3 de Agosto de 2014;
u. CCCC: entre Março de 2012 e 3 de Agosto de 2014;
v. DDDD: entre Março de 2012 e 3 de Agosto de 2014;
w. DDD: entre Março de 2012 e 30 de Julho de 2014;
x. EEEE: entre Março de 2012 e 3 de Agosto de 2014;
y. FFFF: entre Novembro de 2012 e 3 de Agosto de 2014;
12. À data da prática dos factos que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação, a Comissão Executiva do B..., que reunia semanalmente, às quartas-feiras, era composta pelos seguintes membros:
a. AA;
b. BB;
c. TTT;
d. UUU;
e. QQQ;
f. FF;
g. EE;
h. DD;
i. GGGG;
j. DDDD.
13. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente AA desempenhava os seguintes cargos no B...:
a. Vice-presidente do Conselho de Administração;
b. Presidente da Comissão Executiva;
14. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, na qualidade de Presidente da Comissão Executiva do B..., o Recorrente AA era responsável pelos seguintes pelouros:
i. Presidência da Comissão Executiva, do Conselho Financeiro e de Crédito e do ALCO;
ii. Departamento de ...;
iii. Departamento de ...;
iv. Departamento de ...;
v. Gabinete de ...;
vi. Secretariado-Geral da Comissão Executiva;
vii. Esf..., SA;
viii. Bbt..., SA;
ix. Est..., SA;
x. Ese..., SA;
xi. Comité ....
15. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente AA exercia ainda os seguintes cargos:
a. Presidente do ... do BEl....;
b. Membro da ... do BEl....;
c. Membro do Conselho de Administração do Banque..., S.A.;
d. Presidente do Conselho de Administração do Ba... S.A.;
e. Membro do Conselho de Administração do E..., S.A;
f. Presidente do Conselho de Administração do Bbt..., SA.;
g. Presidente do Conselho de Administração da Est..., SA.;
h. Presidente do Conselho de Administração da Epi..., S.A;
i. Presidente do Conselho de Administração da Es...;
j. Presidente do Conselho de Administração da Ev..., S.A.;
k. Membro do Conselho de Administração do Banque P..., SA;
l. Presidente do Conselho de Administração da Bs..., S.A.;
m. Presidente do Conselho de Administração da C..., S.A.;
n. Vice-Presidente do ... da Es..., S.A.;
o. Presidente do Conselho de Administração da Eb... Limited;
p. Membro do Conselho de Administração da Ec..., S.A.;
q. Presidente do Conselho de Administração da E..., S.A.;
r. Presidente do Conselho de Administração da E..., S.A;
s. Membro do Conselho de Administração da EI..., S.A.;
t. Membro do Conselho de Administração da E... Limited;
u. Membro do Conselho de Administração do Es....;
v. Presidente do Conselho de Administração da P..., S.A.;
w. Presidente do Conselho de Administração da Spn..., S.A.;
16. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente BB desempenhava os seguintes cargos no B...:
a. Membro do Conselho de Administração;
b. Membro da Comissão Executiva;
17. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B..., o Recorrente BB era responsável pelos seguintes pelouros:
i. Departamento ...;
ii. Departamento ...;
iii. Sucursal ...;
iv. Sucursal V... (função partilhada com DD);
v. Sucursal Lu... (função partilhada com DD);
vi. Departamento de Residentes no Estrangeiro (excepto segmento de residentes ...);
vii. Centro ... B...;
viii. Comité de ....
18. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente BB desempenhava ainda os seguintes cargos:
a. Membro do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b. Membro do ... do BEl....;
c. Membro da ... do BEl....;
d. Membro do Conselho de Administração do Ba... S.A.;
e. Membro do Conselho de Administração da Epi..., S.A;
f. Membro do Conselho de Administração do Banque..., S.A.;
g. Presidente do Conselho de Administração do Banque P..., SA.;
h. Membro do Conselho de Administração da Bs..., S.A.;
i. Presidente do Conselho de Administração da Cs..., S.A.;
j. Membro do Conselho de Administração da Eb... Limited;
k. Membro do Conselho de Administração da Ec..., S.A..;
l. Vice-Presidente da E..., S.A.;
m. Vice-Presidente da E..., S.A;
n. Membro do Conselho de Administração da EI..., S.A.;
o. Membro do Conselho de Administração da E... Limited;
p. Membro do Conselho de Administração da Es.....;
q. Membro do Conselho de Administração da Eur..., S.A.;
r. Gerente da Pa..., Lda.;
s. Presidente do Conselho de Administração da R..., Ltd;
t. Presidente do Conselho de Administração da Ri..., S.A..
19. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente CC era membro do Conselho de Administração do B...;
20. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente CC desempenhava ainda os seguintes cargos:
a. Presidente do Conselho Administrativo Não Executivo da AM...;
b. Membro do Conselho de Administração da Bt..., S.A.;
c. Membro do Conselho de Administração da Bs..., S.A.;
d. Membro do Conselho de Administração da Ec..., S.A..;
e. Membro do Conselho de Administração E..., S.A.;
f. Presidente do Conselho de Administração da Ehc... S.A.;
g. Presidente do Conselho de Administração da Ein..., S.A.;
h. Membro do Conselho de Administração da EI..., S.A.;
i. Presidente do Conselho de Administração da Esa... SGPS S.A.;
j. Membro do Conselho de Administração da E... Limited.;
k. Presidente do Conselho de Administração da E... Limited;
l. Membro do Conselho de Administração da Es....:
m. Presidente do Conselho de Administração da Et..., S.A.;
n. Presidente do Conselho de Administração da Ef..., Inc.;
o. Presidente do Conselho de Administração da Ef..., Inc.;
p. Presidente do Conselho de Administração da H..., S.A.;
q. Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A.;
r. Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A;
s. Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A;
t. Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A.;
u. Membro do Conselho de Administração da Ssg..., S.A.;
v. Membro do Conselho de Administração da Sc..., S.A.;
21. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente DD desempenhava os seguintes cargos no B...:
a. Membro do Conselho de Administração;
b. Membro da Comissão Executiva;
22. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B..., o Arguido DD era responsável pelos seguintes pelouros:
i. Departamento ...;
ii. Controlo de Gestão (função partilhada com o Presidente da Comissão Executiva);
iii. Comité ...;
iv. Gabinete ...;
v. Departamento ...;
vi. Departamento ...;
vii. Sucursal L...;
viii. Sucursal N...;
ix. Sucursal E...;
x. Sucursal V... (função partilhada com BB);
xi. Sucursal Lu... (função partilhada com BB);
xii. B... Limited;
xiii. Ba... S.A;
xiv. Abk...;
xv. Bang..., SARL;
xvi. M..., S.A;
xvii. Bcv...;
xviii. Escritórios de representação no estrangeiro;
xix. A..., S.A;
xx. Esr...;
xxi. Bv..., SA;
xxii. E..., S.A;
xxiii. Bcy...;
xxiv. BEl...;
xxv. Bb...;
xxvi. Bg...;
xxvii. Conselho Financeiro e de Crédito.
23. À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente DD desempenhava ainda os seguintes cargos:
a. Presidente do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b. Membro do ... do BEl....;
c. Membro da ... do BEl....;
d. Membro do Conselho de Administração do Bo..., S.A.;
e. Presidente do Conselho de Administração do EI..., S.A;
f. Membro do Conselho de Administração do Bv..., SA;
g. Membro do Conselho de Administração do Ba... S.A.;
h. Membro do Conselho de Administração do E..., S.A;
i. Presidente do Conselho de Administração do Bii... Limited;
j. Membro do Conselho de Administração do Est..., SA.;
k. Membro do Conselho de Administração do Epi..., S.A.;
l. Membro do Conselho de Administração do Es...;
m. Membro do Conselho de Administração do Epl...;
n. ... da Es... Limited;
o. Vice-Presidente do Conselho de Administração do M..., S.A;
p. Membro do Conselho de Administração da Pt..., S.A.;
24. Antes de ser eleito membro do Conselho de Administração do B... em Março de 2004, o Recorrente DD foi director geral e assessor do Conselho de Administração do B..., tendo, entre 1996 e aquela data, assumido as funções de Director Coordenador do Departamento ...;
25. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente EE desempenhava os seguintes cargos no B...:
a. Membro do Conselho de Administração;
b. Membro da Comissão Executiva;
26. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B..., o Recorrente EE era responsável pelos seguintes pelouros:
a. Departamento de ...;
b. Departamento de ...;
c. Departamento de ...;
d. Departamento de ... (função partilhada com QQQ);
e. Departamento ...;
f. Gabinete ...;
g. Universidade B...;
h. Departamento ...;
i. Esrc ...;
j. Departamento ...;
k. Departamento ...;
l. Ein ...;
m. O..., SA;
n. Bse..., SA;
o. Co..., SA;
p. Gabinete ...;
q. Conselho Financeiro e de Crédito;
27. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente EE exercia ainda os seguintes cargos:
a. Membro do Conselho de Administração da A..., S.A.;
b. Membro do Conselho de Administração do Bv..., SA;
c. Presidente do Conselho de Administração da Rc...;
d. Presidente do Conselho de Administração da Ein...;
e. Membro do Conselho de Administração da Ev..., S.A.;
f. Presidente do Conselho de Administração da O..., SA.;
g. Presidente do Conselho de Administração Bse..., SA.;
h. Presidente do Conselho de Administração Ede..., S.A.;
i. Membro do Conselho de Administração da Gli..., S.A.;
j. Membro do Conselho de Administração da Pt..., S.A..
28. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente FF desempenhava os seguintes cargos no B...:
a. Membro do Conselho de Administração;
b. Membro da Comissão Executiva.
29. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B..., o Recorrente FF era responsável pelos seguintes pelouros:
i. Departamento ...;
ii. Departamento de ...;
iii. Departamento de ...;
iv. Gabinete Corporativo.
30. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o Recorrente FF desempenhava ainda os seguintes cargos:
a. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da A..., S.A.;
b. Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Bcv...;
c. Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Baç..., SA.;
d. Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Bbt..., SA.;
e. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Cma..., S.A.
f. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Est..., SA.;
g. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Esf..., SA.
h. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Eai..., S.A..;
i. Presidente da Mesa da Assembleia Geral Da Eim..., S.A.;
j. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Efp..., S.A.;
k. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Egp..., S.A.;
l. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Epi..., S.A.;
m. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ev..., S.A.;
n. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da O..., SA.;
o. Sócio Gerente da Sociedade de Administração de Bens Cba..., Lda.;
p. Sócio Gerente da Sociedade de S..., Lda.;
q. Vogal do Conselho Fiscal da Companhia de ....;
r. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Bse..., SA.;
s. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Bs..., S.A.;
t. Secretário da Mesa da Assembleia Geral da C..., S.A.;
u. Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ese..., SA.;
v. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Esu..., S.A.;
w. Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Eur..., S.A.;
x. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da P..., S.A.;
y. Presidente da Mesa da Assembleia Geral da ....
31. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a estrutura orgânico-funcional do B... era composta por:
a. Comités de Acompanhamento;
b. Gabinetes de Apoio e outros;
c. Unidades Centrais de Marketing e de Produto;
d. Unidades Comerciais;
e. Unidades Centrais Operativas;
f. Unidades Centrais de Negócio e Risco;
g. Unidades Centrais de Suporte.
32. Os Comités de Acompanhamento subdividiam-se em:
i. Comités de Acompanhamento das Unidades de Negócio, que eram os seguintes:
• Estratégia e Coordenação Internacional;
• Private;
• Retalho (Particulares e Negócios);
• Wholesale & Banca de Investimentos.
ii.         Comités Transversais, que eram os seguintes:
• ALCO (Activos e Passivos);
• Conselho Financeiro e de Crédito;
• Informática, Operações, Qualidade e Custos;
• Risco;
• Liquidez;
• Sustentabilidade.
33. Os Gabinetes de Apoio e Outros eram os seguintes:
i. Corporativo;
ii. Relações com Investidores;
iii. Reorganização Estratégica;
iv. Secretariado-Geral da Comissão Executiva.
34. As Unidades Centrais de Marketing e de Produto eram constituídas pelos departamentos seguintes:
i. Crédito a Particulares e Cartões;
ii. Gestão da Poupança;
iii. Leasing & Factoring;
iv. Marketing, Inovação e Canais;
v. Marketing de Empresas e Institucionais;
vi. Monetização do Crédito a Empresas.
35. As Unidades Comerciais eram constituídas pelos departamentos seguintes:
i. Acompanhamento de Clientes de Imobiliário;
ii. Acompanhamento de Empresas;
iii. Corporate Banking;
iv. Empresas (Norte & Sul);
v. International Business & Private Banking;
vi. Internacional Premium;
vii. Municípios e Institucionais;
viii. Retalho (Norte & Sul);
ix. Private Banking;
x. Universidades.
36. As Unidades Centrais Operativas eram constituídas pelos departamentos seguintes:
i. Operações;
ii. Técnico de Imobiliário.
37. As Unidades Centrais de Negócio e Risco eram constituídas pelos departamentos seguintes:
i. Desenvolvimento Internacional;
ii. Dinamização de Promotores Externos;
iii. Estruturação de Empresas;
iv. Financeiro, Mercado e Estudos;
v. Gestão Imobiliária;
vi. Recuperação de Crédito;
vii. Residentes no Estrangeiro;
viii. Risco Global.
38. As Unidades Centrais de Suporte eram constituídas pelos departamentos seguintes:
i. Assuntos Jurídicos;
ii. Auditoria Interna;
iii. Compliance;
iv. Comunicação;
v. Gestão e Coordenação de Segurança;
vi. Informação de Gestão;
vii. Marketing Estratégico;
viii. Marketing de Comunicação e Estudos do Consumidor;
ix. Negociação e Controlo de Custos;
x. Organização e Qualidade;
xi. Planeamento e Contabilidade;
xii. Recursos Humanos;
xiii. Research;
39. Entre as unidades da estrutura orgânico-funcional do B... mais directamente envolvidas na execução dos factos que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação, destacam-se os seguintes departamentos:
a. Departamento Financeiro, de Mercados e Estudos (DFME);
b. Departamento de Gestão da Poupança (DGP).
40. O DFME tinha por função executar o plano de financiamento e gerir a tesouraria do Grupo B... nos mercados financeiros;
41. Ao DFME competia também a gestão e coordenação da actividade de negociação de instrumentos financeiros e promoção e desenvolvimento de estudos de âmbito macroeconómico, sobre mercados financeiros e activos;
42. Em concreto, o DFME era o departamento responsável (i) pela gestão dos riscos de mercado do Grupo B... (risco de taxa de juro, risco cambial, risco de crédito, risco de preço de acções, commodities, global markets); (ii) pelo controlo e gestão de liquidez e de actuação junto dos mercados monetários (aplicando os excedentes de tesouraria e tomando os fundos para suprir necessidades de tesouraria de curto prazo); e (iii) pela chamada “originação de financiamento” (gerindo as necessidades de financiamento de médio e longo prazo do balanço);
43. O DFME estava organizado nas seguintes áreas:
a. Área de mercados, que era composta pelas várias mesas de risco de mercado (mesa de risco de taxa de juro, mesa de risco cambial, mesa de risco de crédito, mesa de risco de preço de acções, mesa de commodities e mesa de global markets), que tomavam risco e que geriam risco de mercado oriundo do balanço. Esta área de mercados compreendia ainda uma subárea de controlo e gestão de liquidez e de actuação junto dos mercados monetários (aplicação de excedentes de tesouraria e tomada de fundos para suprir necessidades de tesouraria de curto prazo) e a área de originação, que geria as necessidades de financiamento de médio e longo prazo do balanço;
b. Área de clientes, que tratava da relação com os clientes e da desintermediação, fazendo a ponte com o DGP e a ligação com os gestores de clientes sobretudo na área dos produtos de risco-sala (derivados de taxa de juro, operações cambiais);
c. Área de middle-office, que, por sua vez, era composta pelas seguintes áreas: (i) a que fazia a reconciliação e a valorização das posições tomadas e geridas pela sala de mercados e que procedia à reconciliação das mesmas com a contabilidade; (ii) a de risco, que tratava de calcular o risco ex ante das operações a realizar ou fazer o pricing das operações para os clientes; (iii) e a que tratava da informação de gestão das unidades internacionais e do respetivo reporte regulamentar;
d. Área de back-office, que fazia a liquidação e confirmação das operações com as contrapartes.
44. A par destas áreas, o DFME incluía ainda um gabinete de apoio às reuniões do Comité ALCO, denominado Gabinete ALCO, que procedia ao tratamento de informação e à preparação de um relatório de suporte às reuniões do Comité ALCO;
45. À data da prática dos factos, o DFME tinha, como Directora-Coordenadora, UU;
46. O DGP desenvolvia, implementava e geria a oferta de produtos orientados para a poupança, dirigidos aos vários segmentos de clientes do B... e distribuídos através dos diferentes canais do Banco;
47. Em concreto, o DGP era o departamento responsável pela concepção de produtos financeiros na área da poupança e investimento, procedendo depois à sua operacionalização (operacionalização ao nível de sistemas, validação da informação associada aos produtos, desenvolvimento ou participação de projectos relacionados com o tema da área de poupança e investimento, produção de informação de gestão);
48. O DGP, através de um seu representante, participava nas Comissões Executivas Itinerantes, no Comité ALCO, no Comité de Retalho, no Comité de Wholesale & Banca de Investimentos, e no Comité de Informática, Operações, Qualidade e Custos.;
49. O DGP tinha, à data da prática dos factos, como Diretora, TT;
50. Para além do DGP e do DFME, estiveram também directamente envolvidos na execução dos factos que constituem objecto do presente processo de contra-ordenação os seguintes comités ou órgãos/centros de decisão do B...:
a. Comité ALCO;
b. Comité de Retalho;
51. O Comité ALCO (Assets & Liabilities Committee) era um comité que se reunia mensalmente e no qual participavam os membros da Comissão Executiva do B..., as direcções do DFME, do DGP, do Departamento de Research, das Unidades Centrais de Marketing e de Produto e das Unidades Comerciais;
52. O Comité ALCO tinha por missão analisar a informação macroeconómica das principais regiões económicas internacionais e de Portugal, contribuindo para a perspectivação dos respectivos impactos a prazo sobre a actividade bancária;
53. O Comité ALCO analisava também a evolução do balanço consolidado do Grupo B... e de cada uma das suas principais unidades, quer em termos de saldos de crédito e recursos de clientes, quer de margens, facultando à Comissão Executiva os elementos necessários para a definição de objectivos estratégicos em matéria de crescimento da actividade creditícia e de captação de recursos de clientes, estratégia de financiamento (gestão do mismatch do balanço) e de preços/margens;
54. A este Comité competia igualmente acompanhar e analisar a oferta de bancos concorrentes, bem como, no quadro da estratégia estabelecida, aprovar a oferta de produtos de recursos e os respectivos preços a praticar;
55. As reuniões do Comité ALCO estruturavam-se, em regra, da seguinte forma:
a. Enquadramento macroeconómico e dos mercados financeiros;
b. Análise da composição dos activos e passivos do banco;
c. Proposta de novos produtos a serem comercializados pelo Banco.
56. As apresentações que serviam de suporte às reuniões do Comité ALCO eram, em regra, enviadas aos respectivos participantes com antecedência relativamente à reunião;
57. O Comité de Retalho acompanhava a evolução da actividade respeitante a cada um dos principais segmentos de Clientes (Afluentes, Pequenas Empresas e Empresários em Nome Individual e outros Particulares) e promovia o negócio cross-segment com outras áreas de negócio (designadamente, Médias e Grandes Empresas);
58. O Comité de Retalho acompanhava, ainda, a actividade de assurfinance, promovendo a captação e fidelização ao B... de clientes da Companhia de Seguros...;
59. No Comité de Retalho participavam os departamentos de marketing, o Departamento de Marketing Estratégico, o DGP, os Departamentos de Retalho Norte e Sul, o Departamento de Organização e Qualidade, o Departamento de Crédito a Particulares e Cartões, o Departamento de Residentes no Estrangeiro, o Bv..., SA, um representante da ..., o Gabinete de Assurfinance, o Departamento de Dinamização de Promotores Externos, o Departamento de Comunicação, o Departamento de Informação de Gestão, o Arguido AA e os outros membros da Comissão Executiva com os pelouros dos departamentos de ... e dos ....
*
Subsecção II – O Haitong: caracterização e participação dos Recorrentes nos seus órgãos de gestão:
60. O Haitong Bank, S.A. (denominado, à data da prática dos factos, BEl... - BEl...) era, à data da prática dos factos que constituem objecto do presente processo de contra-ordenação, um intermediário financeiro registado na CMVM para o exercício das seguintes actividades de intermediação financeira:
i. Execução de ordens (desde 5 de Maio de 1993);
ii. Receção e transmissão de ordens por conta outrem (desde 5 de Maio de 1993);
iii. Negociação por conta própria em valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
iv. Gestão de carteiras por conta de outrem (desde 3 de Janeiro de 2005);
v. Registo e depósito de instrumentos financeiros (desde 8 de Novembro de 1993);
vi. Serviço câmbios e aluguer de cofres (desde 29 de Julho de 1991);
vii. Consultoria sobre a estrutura de capital (desde 29 de Julho de 1991);
viii. Assistência em oferta pública de valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
ix. Consultoria para investimento (desde 29 de Julho de 1991);
x. Depositário de valores mobiliários (desde 8 de Novembro de 1993);
xi. Concessão de crédito (desde 29 de Julho de 1991);
xii. Tomada firme e Colocação em oferta pública (desde 29 de Julho de 1991);
xiii. Elaboração de estudos de investimento/análise (desde 31 de Dezembro de 2007).
61. Em assembleia geral universal realizada a 7 de Setembro de 2015, o BEl... deliberou alterar a sua denominação social para Haitong Bank, S.A.;
62. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o BEl... integrava o G...;
63. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a totalidade do capital social do BEl... era detida pelo B...;
64. O Conselho de Administração do BEl..., eleito na Assembleia Geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016, tinha a seguinte composição:
a. AA (Presidente);
b. QQQ (Vice-Presidente);
c. II (Vice-Presidente);
d. HHHH (Vice-Presidente);
e. IIII (Vice-Presidente);
f. PPP (Vice-Presidente);
g. JJJJ;
h. KKKK;
i. LLLL;
j. MMMM;
k. NNNN;
l. BB;
m. OOOO;
n. PPPP;
o. QQQQ;
p. DD;
q. RRRR;
r. SSSS;
s. TTTT;
t. UUUU;
u. VVVV;
v. HHH;
w. WWWW.
65. À data da prática dos factos que constituem o objecto do presente processo, a Comissão Executiva do BEl... era composta pelos seguintes membros:
i. QQQ (Presidente);
ii. II (Vice-Presidente);
iii. HHHH;
iv. IIII
v. PPP;
vi. WWWW;
vii. KKKK;
viii. LLLL;
ix. RRRR;
x. UUUU;
xi. OOOO;
xii. SSSS;
xiii. PPPP;
xiv. QQQQ;
66. À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente AA era Presidente do Conselho de Administração do BEl...;
67. À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente BB era membro do Conselho de Administração do BEl...;
68. À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente DD era membro do Conselho de Administração do BEl...;
69. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a estrutura orgânico-funcional do Recorrente Haitong (antes BEl...) era composta por Comités, Direcções, Departamentos e Unidades;
70. O BEl... tinha os seguintes comités:
(a) Comité de Activos e Passivos;
(b) Conselho de Crédito e Riscos;
(c) Comité de Gestão Global;
(d) Comité Operacional;
(e) Comités de Produto;
(f) Comités de Geografia.
71. As Direcções do BEl... eram as seguintes:
i. Clientes;
ii. Clientes particulares;
iii. Serviços financeiros;
iv. Médias empresas;
v. Acquisition Finance e Outros Financiamentos;
vi. Project Finance e Securitização;
vii. Mercado de Capitais;
viii. Renda Fixa;
ix. Tesouraria;
x. Assessoria em Estrutura de Capitais;
xi. Sindicação de Créditos;
xii. Global Markets;
xiii. Acções;
xiv. Gestão de Activos;
72. Os Departamentos do BEl... eram os seguintes:
(a) Compliance;
(b) Comunicação e Imagem;
(c) Contabilidade;
(d) Informação;
(e) Informação e Controlo de Gestão;
(f) Informática;
(g) Jurídico;
(h) Operações;
(i) Organização e Meios;
(j) Planeamento e Desenvolvimento Estratégico;
(k) Recursos Humanos;
(l) Risco, o qual se decompunha nas duas unidades seguintes:
a. Análise de Risco de Crédito; e
b. Controlo de Risco.
73. A estrutura orgânico-funcional do BEl... integrava ainda a Unidade de Project Management Office & Change Management;
74. Dentro da estrutura orgânico-funcional do BEl..., esteve directamente envolvida na execução dos factos que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação a Direcção de Mercado de Capitais, que era quem detinha o poder de decidir e executar a realização do tipo de operações que foi realizada pelo BEl... (agora Haitong) em causa nos autos;
75. A Direção de Mercado de Capitais era responsável pela actividade de organização, estruturação e implementação de produtos de dívida e equity direcionados e estruturados para o mercado;
76. A “Área de Originação de Operações de Ações” desta Direcção desenvolvia trabalhos de organização, montagem e colocação em bolsa de empresas em processos de Privatização, Ofertas Públicas Iniciais (IPOs), Aumentos de Capital, Ofertas Públicas de Aquisição (OPAs), Private Placements e Block Trades, bem como de produtos equity-linked, como as obrigações convertíveis e produtos derivados sobre ações para clientes empresas;
77. Na vertente de dívida, esta Direção era responsável pela estruturação e montagem de vários produtos de dívida, tais como emissões de dívida sénior para mercado, emissões high yield, private placements de dívida emitida por clientes corporate ou entidades estatais ou empresas públicas e municípios, produtos híbridos, project finance bonds e papel comercial;
78. A Direção de Mercado de Capitais implementava ainda operações de financiamento que envolviam a estruturação e colocação de emissões de obrigações;
79. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contraordenação, a Direção de Mercado de Capitais tinha como directora JJ;
80. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contraordenação, parte da equipa da Direção de Mercado de Capitais do BEl... trabalhava na sede do B..., juntamente com a equipa do DFME;
81. A equipa da Direcção de Mercado de Capitais integrada no B..., reportava ao BEl..., em concreto à sua Directora, JJ;
82. Grande parte do trabalho da referida equipa, de que é exemplo a preparação da montagem e o agenciamento de programas de papel comercial e de emissões de obrigações, tinha origem no DFME do B..., de quem essa equipa recebia indicações, em termos de interacção mútua, atenta a proximidade física dos departamentos;
*
Subsecção III – A EI..., S.A: caracterização e participação dos Recorrentes nos seus órgãos de gestão:
83. A EI..., S.A era uma sociedade anónima, de direito ..., constituída em 17 de Junho de 1975;
84. A EI..., S.A tinha por objecto social o exercício, quer no Lu..., quer no estrangeiro, de todas e quaisquer actividades, fossem elas industriais, comerciais, financeiras, mobiliárias ou imobiliárias, relativas, directa ou indirectamente, à criação, à gestão e ao financiamento, fosse sob que forma fosse, de quaisquer empresas e sociedades tendo por objecto qualquer actividade, fosse ela qual fosse, bem como a gestão e a exploração, a título permanente ou temporário, do investimento criado para tal efeito, na medida em que a Sociedade fosse considerada, segundo as disposições aplicáveis, como uma “Sociedade de Participações Financeiras;
85. À data dos factos objeto do presente processo de contra-ordenação, a EI..., S.A tinha como principais activos:
(a) Uma participação social (directa e indirecta) de 44% na E..., S.A, sociedade detentora de participações sociais em sociedades que integravam o ramo financeiro do G...;
(b) Uma participação social de 100% na sociedade R..., S.A. (doravante R..., S.A), sociedade detentora de participações sociais em sociedades que integravam o ramo não financeiro do G...;
(c) Uma participação social de 100% na sociedade E... Limited (doravante E... Limited).
86. A EI..., S.A limitava a sua actividade ao acompanhamento do desempenho dos seus activos, dos quais se destacavam as mencionadas participações sociais na E..., S.A e na R..., S.A;
87. A E..., S.A era uma sociedade de direito ..., detentora de participações sociais nas sociedades que integravam o ramo financeiro do G... e tinha por actividade a prestação de serviços bancários, centrados no B..., e de seguros vida e não-vida, desenvolvidos pela ... e através da bancassurance do B...;
88. A E..., S.A era uma sociedade aberta com ações admitidas à negociação nos mercados regulamentados seguintes: ... (no Lu...), ... (em ...) e ... (em ...);
89. A R..., S.A era uma sociedade de direito ..., de participações financeiras, e integrava investimentos em diferentes sectores da actividade não financeira do G..., como a actividade imobiliária, o turismo, a agropecuária, a saúde, as energias renováveis e outras participações em empresas diversificadas;
90. A EI..., S.A integrava o G...;
91. A EI..., S.A era, à data da prática dos factos objeto do presente processo, detida em 56% do seu capital social pela Ec..., S.A..;
92. A Ec..., S.A. era a holding de topo do G...;
93. À data da prática dos factos objeto do presente processo, o Conselho de Administração da EI..., S.A era composto pelos seguintes membros, não existindo comissão executiva ( ):
(a) XXXX (Presidente);
(b) YYYY (Vice-Presidente);
(c) AA;
(d) BB;
(e) CC;
(f) QQQ;
(g) PPP;
(h) HHH;
(i) ZZZZ;
(j) AAAAA;
(k) BBBBB;
(l) CCCCC;
(m) VVV;
(n) DDDDD;
(o) EEEEE;
(p) FFFFF;
(q) GGGGG.
94. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a EI..., S.A tinha como comissaire aux comptes, III;
95. E como senior manager JJJ, responsável pela gestão da tesouraria da EI..., S.A e de todo o G...;
96. A EI..., S.A, para além do comissaire aux comptes III e do senior manager JJJ, não dispunha de recursos humanos, sendo os serviços administrativos, contabilísticos e jurídicos necessários ao desenvolvimento da sua atividade assegurados pela empresa Es.... (doravante Es...);
97. O Conselho de Administração da Es... era composto por AA, BB, CC, XXXX e YYYY;
98. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a Es... tinha, como directores, III, CCC e JJJ;
99. No exercício das suas funções na Es... e na EI..., S.A, III tinha, como superiores hierárquicos directos, o Recorrente AA, o Recorrente CC e JJJ;
100. No exercício das suas funções na Es..., CCC tinha, como superiores hierárquicos, III, no que respeitava à contabilidade, e JJJ, no que respeitava à tesouraria e aos restantes assuntos;
101. O acompanhamento da situação patrimonial e financeira e da actividade da EI..., S.A era feito pelo Recorrente AA, por JJJ, por III e por CCC;
102. CCC, na qualidade de director da Es..., enviava, mensalmente, por e-mail, a JJJ um documento denominado situation des engagements, no qual constava o valor total da dívida da EI..., S.A (na qual se incluía uma relação de todos os produtos financeiros emitidos e a respetiva data de vencimento), das suas holdings subsidiárias não financeiras (R..., S.A e E... Limited) e o cash flow consolidado;
103. A partir de 2013, CCC enviava ainda, semanalmente, por e-mail, a JJJ informação sobre os movimentos ocorridos na tesouraria em cada semana;
104. JJJ reportava ao Recorrente AA informação sobre a situação da tesouraria da EI..., S.A, cabendo a este último decidir da sua gestão e da emissão de instrumentos financeiros para fazer face às necessidades de tesouraria da EI..., S.A;
105. CCC comunicava a JJJ as necessidades de tesouraria, indicando-lhe quando ocorriam vencimentos de instrumentos financeiros representativos de dívida emitidos pela EI..., S.A para reembolso dos quais a EI..., S.A não dispunha de liquidez, sendo AA informado por JJJ, semanalmente, do valor total do passivo da EI..., S.A, bem como das necessidades de refinanciamento desse passivo;
106. Quando a EI..., S.A não tinha capacidade de captação de fundos para esse reembolso, JJJ solicitava, para esse efeito, a colaboração do DFME do B... e do Recorrente AA;
107. O DFME do B... e o Recorrente AA diligenciavam no sentido de a EI..., S.A obter os fundos de que necessitava, concretamente dando a indicação de que esta deveria emitir notes ou papel comercial para se financiar;
108. Após isso, os aspetos formais das emissões das notes ou do papel comercial eram tratados directamente entre o DFME e CCC;
109. As emissões de papel comercial por parte da EI..., S.A eram registadas contabilisticamente no passivo da EI..., S.A sob a rubrica “Notes”;
110. CCC preparava ainda, trimestralmente, o balanço, a demonstração de resultados e o cash flow consolidado da EI..., S.A e holdings subsidiárias não financeiras (R..., S.A e E... Limited), os quais eram depois enviados, por e-mail, a JJJ;
111. Na contabilidade da EI..., S.A era reflectida, diariamente, por CCC a informação constante dos extractos bancários que a EI..., S.A recebia do Banque P..., SA e da Efin... S.A (Efin... S.A.);
112. Pelo menos quanto aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, as demonstrações financeiras anuais da EI..., S.A eram elaboradas, no final de Janeiro de cada ano, por CCC em forma de draft e enviadas por este, por e-mail, a III;
113. Este draft era depois apresentado, em ..., por III, ao Recorrente AA e a JJJ;
114. Nessas reuniões, o Recorrente AA solicitou a III a alteração das contas de final do ano, pelo menos no que diz respeito às contas referentes aos anos de 2008 a 2012;
115. Tal solicitação visava ocultar uma parte do passivo da EI..., S.A;
116. Depois destas reuniões, III remetia a CCC o resultado da apreciação do draft feita pelo Recorrente AA;
117. CCC elaborava um draft final das demonstrações financeiras anuais da EI..., S.A, o qual era, mais uma vez, apresentado por III ao Recorrente AA e por este aprovado;
118. Posteriormente, com base nas demonstrações financeiras aprovadas pelo Recorrente AA, a Es... elaborava um rapport de gestion (demonstrações financeiras anuais da EI..., S.A a serem assinadas por dois administradores) para ser aprovado, em primeiro lugar, pelo Recorrente CC e por XXXX, como o foram designadamente no que tange aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
119. O rapport de gestion era, depois, aprovado pelo Conselho de Administração da EI..., S.A;
120. A aprovação das demonstrações financeiras anuais da EI..., S.A pelo seu Conselho de Administração era feita através da recolha de assinaturas dos respectivos administradores, não havendo lugar a reuniões do Conselho de Administração;
121. Para esse efeito, as demonstrações financeiras anuais da EI..., S.A eram enviadas pela Es... à secretária do Recorrente AA e esta ou JJJ recolhiam as referidas assinaturas dos administradores da EI..., S.A;
122. As referidas demonstrações financeiras eram depois novamente enviadas para a Es... e, depois ainda, para o Lu... para depósito no Registo de Comércio Lu...;
123. O Conselho de Administração da EI..., S.A não fez aprovar, nem publicar contas consolidadas referentes aos exercícios findos em 2010, 2011 e 2012;
124. Porém, III elaborava, anualmente, um balanço consolidado da EI..., S.A, em formato pró-forma, apenas para informação interna da EI..., S.A, do qual dava conhecimento ao Recorrente AA e a JJJ;
125. Para efeito da elaboração do balanço consolidado pró-forma da EI..., S.A, a Es... elaborava as contas individuais de cada uma das entidades que consolidava na EI..., S.A;
126. A EI..., S.A veio a ser declarada insolvente em 27.10.2014;
*
Subsecção IV – A R..., S.A: caracterização do emitente e da participação do Recorrente CC nos seus órgãos de gestão:
127. A R..., S.A. (R..., S.A) era uma sociedade anónima, de direito ..., constituída em 11 de Dezembro de 2007, sob a denominação de E... Limited., tendo sido objecto de redenominação em 22 de Julho de 2009;
128. A R..., S.A tinha por objecto social o exercício, quer no Lu..., quer no estrangeiro, de todas e quaisquer actividades, fossem elas industriais, comerciais, financeiras, mobiliárias ou imobiliárias, relativas, directa ou indirectamente, à criação, à gestão e ao financiamento, fosse sob que forma fosse, de quaisquer empresas e sociedades tendo por objecto qualquer actividade, fosse ela qual fosse, bem como a gestão e a exploração, a título permanente ou temporário, do investimento criado para tal efeito, na medida em que a Sociedade fosse considerada, segundo as disposições aplicáveis, como uma “Sociedade de Participações Financeiras;
129. Até 31 de Dezembro de 2013, a R..., S.A funcionava como uma sociedade de investimentos, detendo participações sociais em empresas, em Portugal, no ..., no ... e em ..., actuando nos segmentos do imobiliário, turismo, saúde, agricultura e energia;
130. Até 31 de Dezembro de 2013, a R..., S.A limitava a sua actividade ao acompanhamento do desempenho dos seus activos, dos quais se destacavam as participações sociais nas seguintes sociedades:
- Esp... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 100% do capital social);
- Esp... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 67% do capital social);
- Ess... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 45% do capital social);
- ... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 100% do capital social);
- Ev... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 100% do capital social);
- H..., S.A (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 56% do capital social);
- Pay... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 90% do capital social);
- Cbo... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 100% do capital social);
- Agr... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 50% do capital social);
- Cb... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 98% do capital social);
- Mz... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 60% do capital social);
- G-l... Geofísicos (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 28% do capital social);
- Agp... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 33% do capital social);
- Eer... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 49% do capital social);
- Lu... (sociedade na qual detinha uma participação correspondente a 96% do capital social).
131. Com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a R..., S.A adquiriu a totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A. (Esa... SGPS S.A);
132. Também com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a Esa... SGPS S.A adquiriu à EI..., S.A a participação social por esta detida na E..., S.A, correspondente a 39,23% do seu capital social;
133. Na referida data de 31 de Dezembro de 2013, a Esa... SGPS S.A detinha já uma participação qualificada correspondente a 10,03% do capital social da E..., S.A;
134. Assim, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, depois da aquisição à EI..., S.A da participação social que esta detinha na E..., S.A, a Esa... SGPS S.A passou a deter uma participação qualificada no capital social da E..., S.A, correspondente a 49,26% da E..., S.A;
135. E, com efeitos reportados a 31 de Dezembro de 2013, a R..., S.A passou a deter a totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A;
136.     Assim, a partir de 31 de Dezembro de 2013, a actividade da R..., S.A passou a incluir o acompanhamento do desempenho das suas participadas Esa... SGPS S.A e E..., S.A;
137. A R..., S.A teve sempre como accionista única a EI..., S.A;
138. A R..., S.A integrava o denominado “G...”;
139. À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Conselho de Administração da R..., S.A era composto pelos seguintes membros:
355. CC (Presidente);
356. HHHHH (Vice-Presidente);
357. IIIII;
358. JJJJJ;
359. KKKKK;
360. III;
361. LLLLL;
362. NN;
363. MMMMM.
140. À data da prática dos factos que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação, a Comissão Executiva da R..., S.A era composta pelos seguintes membros:
(a) LLLLL (Presidente);
(b) NN;
(c) MMMMM.
141. O Administrador executivo NN (doravante, apenas NN) era o administrador executivo com o pelouro ..., ou Chief Finantial Officer (CFO), da R..., S.A;
142. À data da prática dos factos objeto do presente processo de contra-ordenação, a R..., S.A não dispunha de autonomia de tesouraria, quer ao nível da definição das suas fontes de financiamento, quer ao nível da aplicação dos seus excedentes de tesouraria;
143. A gestão de tesouraria da R..., S.A era tratada, ao nível da EI..., S.A, pela equipa financeira chefiada por JJJ;
144. A R..., S.A contratou com a Es... a gestão operacional da sua tesouraria;
145. O CFO da R..., S.A, NN, reportava, funcionalmente, a JJJ, responsável pela gestão financeira do denominado “G...”;
146. O CFO e o ... da R..., S.A, respectivamente NN e BBB, participavam em reuniões mensais de programação de tesouraria da R..., S.A e das suas subsidiárias, em que estava presente JJJ;
147. O total da dívida da R..., S.A era incluída por CCC no documento denominado situation des engagements, que era por este enviado, mensalmente, por e-mail, a JJJ;
148. Os administradores executivos da R..., S.A, LLLLL e NN, reuniam periodicamente, pelo menos quinzenalmente, com o presidente e o vice-presidente do conselho de administração da R..., S.A, respectivamente, CC e HHHHH;
149. Nessas reuniões, o CFO da R..., S.A apresentava a posição de tesouraria da R..., S.A;
150. O Recorrente CC representava, no Conselho de Administração da R..., S.A, a accionista única EI..., S.A;
151. A R..., S.A veio a ser declarada insolvente em 08.12.2014;
*
Secção II – Da comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A junto de clientes B...:
Subsecção I – Do processo de decisão da emissão de papel comercial por parte da EI..., S.A e da R..., S.A e da sua colocação pelo B...:
152. Pelo menos desde 2008, para financiamento das suas actividades, bem como de todo o denominado “G...”, a EI..., S.A emitia instrumentos financeiros representativos de dívida de curto prazo;
153. Pelo menos desde 2009, para financiamento das suas actividades, bem como de todo o denominado “G...”, a R..., S.A emitia instrumentos financeiros representativos de dívida de curto prazo;
154. Até Setembro de 2013, parte desses instrumentos financeiros emitidos pela EI..., S.A e pela R..., S.A estavam colocados no fundo especial de investimento Elz..., actualmente denominado Elz... (doravante Elz...);
155. O fundo Elz... era um fundo especial de investimento aberto de duração indeterminada;
156. A constituição do fundo Elz... foi autorizada pela CMVM em 29 de junho de 2011, tendo iniciado a sua actividade em 28 de julho de 2011;
157. A entidade gestora do fundo Elz... era a Eim..., S.A., actualmente denominada Gsfi..., S.A. (doravante simplesmente Epi..., S.A), que se mantém como entidade gestora do fundo Elz...;
158. A totalidade do capital social da Epi..., S.A era, no ano de 2013, detida pela Epi..., S.A – Esf..., SA. (doravante simplesmente Epi..., S.A), sociedade esta detida, na mesma época, em 90%, pelo B...;
159. O B... era o depositário do fundo Elz...;
160. O B... era igualmente uma das entidades comercializadoras das unidades de participação do fundo Elz...;
161. As unidades de participação do fundo Elz... eram comercializadas junto dos balcões do B..., tendo um mínimo de subscrição de € 500,00 (quinhentos euros);
162. A rendibilidade das unidades de participação do fundo Elz... foi, em 2012, de 4,36%;
163. Em Junho de 2013 e por referência aos 12 meses anteriores, a rendibilidade das unidades de participação do fundo Elz... era de 3,78%;
164. No mês de Agosto de 2013 o B... oferecia aos seus clientes particulares as seguintes alternativas de aplicações financeiras:
165. A rendibilidade máxima das aplicações financeiras com prazo até um ano, alternativas ao fundo Elz..., oferecidas pelo B... aos seus clientes particulares, em Agosto de 2013 era, assim, de 2,55%;
166. A rendibilidade das unidades de participação do fundo Elz... era, assim, superior à rendibilidade das alternativas de aplicações financeiras com prazo até um ano oferecidas pelo B... aos seus clientes particulares;
167.     As unidades de participação do fundo Elz... eram, de entre os produtos oferecidos aos clientes do B..., um dos produtos de maior sucesso comercial;
168.     Em 31 de Agosto de 2013, o montante total de papel comercial da EI..., S.A detido pelo Fundo Elz... era de € 988.454.527,08;
169.     Em 31 de Agosto de 2013, o montante total de papel comercial da R..., S.A detido pelo Fundo Elz... era de € 364.998.379,66;
170.     Em 31 de Agosto de 2013, o montante total de papel comercial emitido pelas sociedades compreendidas no perímetro de consolidação da R..., S.A (a Esp..., a Ev... e a ...) – com exclusão da própria R..., S.A – era de € 133.984.598,58;
171.     Na mesma data, o valor líquido global do fundo Elz... era de € 2.234.454.134,62, sendo o valor total de activos detidos pelo fundo de € 2.242.248.653,02;
172.     O montante de papel comercial da EI..., S.A detido pelo Fundo Elz... representava, assim, a 31 de Agosto de 2013, 44,08% do valor total de activos detidos pelo fundo e 44,24% do valor líquido global do fundo;
173.     O montante de papel comercial da R..., S.A detido pelo Fundo Elz... representava, assim, a 31 de Agosto de 2013, 16,28% do valor total de activos detidos pelo fundo e 16,33% do valor líquido global do fundo e, em termos consolidados, 22,25% do valor total de ativos detidos e 22,33% do valor líquido global do fundo pelo fundo;
174.     Na sequência da publicação do Novo Regime Jurídico dos Organismos de Investimento Colectivo (doravante, NRJOIC), em 10.05.2013, a exposição das carteiras dos fundos especiais de investimento a dívida emitida por entidades relacionadas com as respectivas sociedades gestoras passou a estar limitada a 20% do seu valor líquido global (artigo115º, n.º 1, do NRJOIC) ( );
175.     O NRJOIC entrou em vigor a 9 de Setembro de 2013 (120 dias após a publicação do NRJOIC, nos termos do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei n.º 63-A/2013, de 10 de maio), sendo que a composição das carteiras dos fundos especiais de investimento teria de estar conforme à nova legislação até 9 de Novembro de 2013 (dois meses após a entrada em vigor do NRJOIC, nos termos do disposto no artigo 6º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 63-A/2013, de 10 de maio) ( );
176.     Ainda antes da publicação do NRJOIC, foi discutido, no Conselho de Administração da Epi..., S.A, com a presença, entre outros, dos Recorrentes AA, DD e BB, o impacto do novo regime jurídico no fundo Elz...;
177.     Na sequência da sua publicação, o NRJOIC foi objecto de análise, em sede de reunião do Comité ALCO do B..., realizada no início do verão de 2013, onde estiveram presentes designadamente os Recorrentes AA, BB, DD e EE;
178.     Nessa reunião, o Recorrente DD e os representantes da Epi..., S.A afirmaram que as novas regras que se iam aplicar ao Elz... levariam a limitações de investimento no papel comercial do G..., que era o activo essencial da carteira do fundo, o que, por sua vez, conduziria a uma redução da rentabilidade do fundo Elz...;
179.     Na referida reunião do Comité ALCO do início do Verão de 2013, os representantes das estruturas comerciais do B... manifestaram preocupação com a perspetiva de redução da rendibilidade do fundo Elz... e com o consequente risco de os clientes detentores de unidades de participação do fundo Elz... virem a resgatar essas unidades de participação, aplicando os fundos resultantes desses resgates fora do Grupo B...;
180.     Os representantes das estruturas comerciais do B... reiteraram essa preocupação nas reuniões subsequentes do Comité ALCO;
181.     Na referida reunião do Comité ALCO do início do verão de 2013, foi discutida a possibilidade de comercializar directamente junto dos clientes do B... papel comercial do grupo G..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial detido pelo fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
182.     Na sequência das discussões havidas tanto em sede do Comité ALCO do B..., como em sede de Conselho de Administração da Epi..., S.A, foi decidido pelo B... que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a colocar directamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B....
183.     No final do mês de Junho de 2013, o Recorrente DD, na qualidade de Administrador do B... com os pelouros do ... e do ... e de Administrador do BEl..., convocou para uma reunião UU, directora-coordenadora do DFME, TT, directora do DGP, e YY, administrador da Epi..., S.A;
184.     Nessa reunião, DD solicitou aos referidos UU, TT e YY que analisassem a operacionalização da colocação, directamente nos clientes, da dívida emitida pelas sociedades do G..., representada pelo papel comercial que se encontrava colocado no fundo Elz...;
185.     No seguimento dessas diligências, o B... decidiu proceder à comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A sob a modalidade de ofertas particulares;
186.     Depois de decidido, pelo B..., que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a Directora Coordenadora do DFME, UU, convocou uma reunião com JJJ, na qualidade de representante do G...;
187.     Esta reunião teve como objectivo informar JJJ que o B... estava a preparar um programa de emissão e colocação de dívida de algumas sociedades do G... junto dos clientes do B..., bem como apresentar-lhe as pessoas que, do lado do B... e do BEl... coordenariam a operação – as referidas TT e KK;
188.     Durante os meses de Julho e Agosto de 2013, prosseguiram os trabalhos de preparação do programa de emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, tendo o DGP, sobre a orientação de TT, procedido à preparação do modelo de ficha técnica e à definição dos procedimentos de comercialização;
189.     No mesmo período de tempo, o BEl..., sob a coordenação de KK, prosseguiu com a preparação da minuta dos contratos a celebrar com a EI..., S.A, a R..., S.A e o B..., bem como das notas informativas do programa de papel comercial;
190.     No final de Agosto de 2013, DD solicitou a TT que levasse à próxima reunião do Comité ALCO do B... a aprovação da comercialização de papel comercial a emitir pelas sociedades do denominado “G...” directamente junto de clientes do B...;
191.     A 4 de Setembro de 2013, na reunião do Comité ALCO do B..., TT procedeu à apresentação da proposta de comercialização, pelo B..., de papel comercial a emitir pela EI..., S.A;
192.     Na referida reunião do Comité ALCO, no quadro da apresentação da oferta do B... para o mês de Setembro de 2013, TT comunicou que estaria disponível, nos dias subsequentes, para comercialização junto dos clientes do B..., uma emissão de papel comercial da EI..., S.A, identificando o prazo e taxa de juro da referida emissão, bem como o montante mínimo de subscrição de € 50.000,00;
193.     A apresentação feita por TT teve por base um slide, integrado na apresentação em powerpoint preparada pelo DGP para a reunião do Comité ALCO;
194.     O referido slide não foi disponibilizado previamente aos participantes do Comité ALCO, ao contrário da restante apresentação preparada pelo DGP, que foi enviada por e-mail aos referidos participantes em data anterior a 4 de Setembro de 2013;
195.     No contexto da referida apresentação, TT referiu que a nova oferta comercial do B... (o papel comercial a emitir pela EI..., S.A) surgia no contexto da publicação do NRJOIC, designadamente devido às limitações à composição da carteira do fundo Elz... daí decorrentes;
196.     Na reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013 estiveram presentes os Recorrentes AA, BB, DD e EE;
197.     A acta da reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião, foi levada a ratificação da Comissão Executiva do B..., realizada em 2 de Outubro de 2013;
198.     Na reunião da Comissão Executiva do B... de 2 de Outubro de 2013 estiveram presentes os Recorrentes BB, EE e FF;
199.     Na sequência da reunião do Comité ALCO do B... de 4 de setembro de 2013, o B... passou a disponibilizar a todos os seus segmentos comerciais de clientes a possibilidade de subscreverem papel comercial emitido pela EI..., S.A e, mais tarde, da R..., S.A;
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Subsecção II – Dos contratos de organização e colocação de papel comercial celebrados entre a EI..., S.A, o BEl... e o B... e das emissões de papel comercial da EI..., S.A realizadas ao abrigo dos mesmos:
200. A 3 de Setembro de 2013 foi celebrado um contrato denominado “Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial” entre a EI..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador;
201. Em representação da EI..., S.A subscreveram o contrato XXXX, presidente do Conselho de Administração da sociedade e o Recorrente CC, vogal do mesmo Conselho de Administração;
202.     Pelo referido Contrato, os contraentes estabeleceram as regras relativas à organização, emissão e colocação das emissões de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, até a um limite máximo de € 1.000.000.000,00 (mil milhões de euros), no prazo de cinco anos;
203.     Nos termos definidos na cláusula 5ª, n.º 2 do Contrato, “Cada emissão será organizada e liderada pelo Agente [o BEl...], o qual desempenhará igualmente as funções de Instituição Registadora e de Agente Pagador”;
204.     Nos termos definidos na cláusula 5ª, n.º 3 e 4 do Contrato, “Cabe ao B... desenvolver os seus melhores esforços, nos termos do presente Contrato, no sentido de colocar o papel comercial emitido ao abrigo do Programa junto dos investidores” e
“O disposto no número anterior não configura qualquer compromisso ou obrigação por parte do B... de subscrição ou de assegurar a subscrição por terceiros do PAPEL COMERCIAL emitido ao abrigo do PROGRAMA, não podendo, em caso algum, o B... ser responsabilizado pela subscrição, salvo no caso de essa não subscrição resultar, salvo no caso de essa não subscrição resultar exclusivamente da conduta dolosa ou gravemente culposa do B...”.
205.     Na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, os contraentes estabeleceram o seguinte:
“1. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, a Emitente pagará ao BEl..., na Data de Subscrição de cada Emissão, uma Comissão de Agente de € 3.500 (três mil e quinhentos euros) por cada Emissão a realizar ao abrigo do Programa, com um valor máximo anual de € 100.000,00 (cem mil euros).
2. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, o B... poderá ainda cobrar à Emitente uma Comissão de Colocação no valor máximo de 1% (um por cento) ao ano sobre o montante e Prazo de Emissão de cada Emissão.”;
206.     Em anexo ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial encontram-se minutas da ficha técnica de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A, bem como da notificação a enviar pela EI..., S.A previamente a cada emissão;
207.     A minuta do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial foi elaborada pelo BEl..., com o apoio do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...;
208.     Ao abrigo deste Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, a EI..., S.A procedeu a uma única emissão de papel comercial com a designação “EI..., S.A 18/12/13”, com data de subscrição de 18/09/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 18/12/2013) taxa de juro anual nominal de 4,25%;
209.     O montante total da emissão foi de € 106.100.000,00;
210.     O montante total da emissão foi colocado pelo B... junto dos seus clientes identificados na listagem junta à decisão administrativa como Anexo A, que aqui se dá por reproduzido;
211.     O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) emitidos era de € 50.000,00;
212.     O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 50.000,00;
213. Com referência à referida emissão, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
214. O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à EI..., S.A;
215.     A referida emissão venceu-se a 18 de dezembro de 2013, data em que os titulares do papel comercial foram reembolsados, tendo o Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial sido revogado por acordo subscrito a 14 de março de 2014, tendo os contraentes feito retroagir os efeitos da revogação a 18 de dezembro de 2013;
216. Do considerando g) do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial consta que “a Emitente entregou ao Agente a seguinte documentação. (…) (v), legal opinion emitida pela Llp..., ...”;
217. Contudo, na data da celebração do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial não havia sido emitida qualquer legal opinion pela Llp..., ...;
218.     Sucede que, uma vez que o B... pretendia avançar no início de Setembro de 2013 com a colocação, junto dos seus clientes, de uma primeira emissão de papel comercial da EI..., S.A, foi decidido pelo Recorrente DD, que o comunicou a TT, Directora do DGP, proceder à celebração do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial mesmo antes de ter sido emitida a referida legal opinion;
219. A sociedade de advogados Llp..., ... condicionou a emissão de uma legal opinion à imposição de um limite mínimo de subscrição de € 100.000,00, bem como um limite máximo de 150 subscritores de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A;
220. Na sequência desta condição imposta pela sociedade de advogados Llp..., ... foi necessário proceder à elaboração e assinatura de um novo Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
221. Assim, a 9 de Setembro de 2013 foi celebrado um novo Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, entre a EI..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador;
222.     A minuta do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro de 2013 foi igualmente elaborada pelo BEl..., com o apoio do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...;
223. O Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de setembro de 2013 foi assinado, em representação da EI..., S.A, por XXXX, presidente do Conselho de Administração da sociedade e pelo Recorrente CC, vogal do mesmo Conselho de Administração;
224. Em representação do BEl... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da referida sociedade, KK e NNNNN;
225. Em representação do B... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da sociedade, OOOOO e PPPPP, ambos funcionários do DFME do B...;
226.     O conteúdo do referido contrato é idêntico ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 3 de setembro de 2013, com exceção do disposto nos nºs 1, 4 e 5 da cláusula 5ª do mesmo;
227.     Nos termos do disposto no n.º 1 da cláusula 5ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial o de 9 de setembro, ficou estabelecido que cada emissão de papel comercial a emitir pela EI..., S.A apenas poderia ser subscrita por um número máximo de 150 subscritores ou por investidores qualificados;
228.     Nos termos do disposto no n.º 4 da cláusula 5ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de setembro, o montante mínimo de subscrição e/ou aquisição em mercado secundário ou fora de mercado, por cada subscritor, foi fixado em € 100.000,00 e em múltiplos de € 50.000,00;
229.     Nos termos do disposto no n.º 5 da cláusula 5.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro, ficou estabelecido um mesmo montante mínimo de € 100.000,00 e em múltiplos de € 50.000,00 para revendas de papel comercial emitido pela EI..., S.A;
230.     Ao abrigo deste Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de setembro a EI..., S.A procedeu às seguintes emissões de papel comercial:
(i) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/01/2014”, com data de subscrição de 18/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 20/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(ii) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/01/2014”, com data de subscrição de 20/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 20/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iii) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/01/2014”, com data de subscrição de 24/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 24/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iv) Emissão com a designação “EI..., S.A 21/01/2014”, com data de subscrição de 23/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 21/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(v) Emissão com a designação “EI..., S.A 22/01/2014”, com data de subscrição de 24/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 22/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(vi) Emissão com a designação “EI..., S.A 23/01/2014”, com data de subscrição de 25/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 23/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(vii) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/01/2014”, com data de subscrição de 26/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 24/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(viii) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/03/2014”, com data de subscrição de 27/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 26/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(ix) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/03/2014”, com data de subscrição de 25/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 24/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(x) Emissão com a designação “EI..., S.A 31/03/2014”, com data de subscrição de 30/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 31/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xi) Emissão com a designação “EI..., S.A 01/04/2014”, com data de subscrição de 30/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 01/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35;
(xii) Emissão com a designação “EI..., S.A 29/01/2014”, com data de subscrição de 01/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 29/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xiii) Emissão com a designação “EI..., S.A 30/01/2014”, com data de subscrição de 02/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 30/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xiv) Emissão com a designação “EI..., S.A 31/01/2014”, com data de subscrição de 03/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 31/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25;
231. Os montantes totais de cada uma das emissões identificadas no ponto anterior foram de respetivamente:
(i)        € 27.800.000,00;
(ii)       € 54.900.000,00;
(iii)      € 29.850.000,00;
(iv)      € 29.600.000,00;
(v)       € 43.200.000,00;
(vi)      € 35.500.000,00;
(vii)     € 18.650.000,00;
(viii)    € 38.500.000,00;
(ix)      € 43.650,00;
(x)       € 23.200.000,00;
(xi)      € 17.600.000,00;
(xii)     € 43.250.000,00;
(xiii)    € 27.350.000,00;
(xiv)    € 25.400.000,00;
232.     Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo B, que aqui se dá por reproduzido;
233.     O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) era de € 50.000,00;
234. O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 100.000,00;
235. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
236.     O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à EI..., S.A;
237. Em 19 de Setembro de 2013 foi celebrado um Aditamento ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, pelo qual aderiram ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro de 2013, assumindo posição idêntica à aí assumida pelo B..., o Bbt..., SA. (Bbt..., SA) e o Baç..., SA. (Baç..., SA);
238. Ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro, na redacção resultante do Aditamento de 19 de Setembro de 2013, a EI..., S.A procedeu às seguintes as emissões de papel comercial:
(i) Emissão com a designação “EI..., S.A 02/04/2014”, com data de subscrição de 04/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 02/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(ii) Emissão com a designação “EI..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 08/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iii) Emissão com a designação “EI..., S.A 07/04/2014”, com data de subscrição de 09/10/2014, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 07/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(iv) Emissão com a designação “EI..., S.A 09/04/2014”, com data de subscrição de 11/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 09/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(v) Emissão com a designação “EI..., S.A 14/04/2014”, com data de subscrição de 14/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(vi) Emissão com a designação “EI..., S.A 16/01/2014”, com data de subscrição de 18/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 16/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25;
(vii) Emissão com a designação “EI..., S.A 16/04/2014”, com data de subscrição de 18/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 16/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(viii) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/10/2014”, com data de subscrição de 21/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 20/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%;
(ix) Emissão com a designação “EI..., S.A 22/10/2014”, com data de subscrição de 23/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 22/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%;
(x) Emissão com a designação “EI..., S.A 23/01/2014”, com data de subscrição de 25/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento 23/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xi) Emissão com a designação “EI..., S.A 21/01/2014”, com data de subscrição de 23/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses, com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xii) Emissão com a designação “EI..., S.A 23/04/2014”, com data de subscrição de 25/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 23/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
239. Os montantes totais de cada uma das emissões identificadas no ponto anterior foram de respetivamente:
(i)        € 26.050.000,00;
(ii)       € 25.350.000,00;
(iii)      € 29.550.000,00;
(iv)      € 33.700.000,00;
(v)       € 33.900.000,00;
(vi)      € 8.850.000,00;
(vii)     € 26.900.000,00;
(viii)    € 16.350.000,00;
(ix)      € 24.500.000,00;
(x)       € 8.650.000,00;
(xi)      € 27.500.000,00;
(xii)     € 30.200.000,00;
240.     Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo C, que aqui se dá por reproduzido;
241.     O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) emitidos era de € 50.000,00;
242. O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 100.000,00;
243. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
244.     O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à EI..., S.A;
245. Em 14 de Outubro de 2013 foi celebrado um segundo Aditamento ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, pelo qual o montante máximo do programa de emissões de papel comercial da EI..., S.A foi fixado em € 1.500.000.000,00, produzindo este Aditamento efeitos a partir de 15 de Outubro de 2013;
246. Ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro, na redacção resultante do Aditamento de 14 de Outubro de 201, a EI..., S.A procedeu às seguintes as emissões de papel comercial:
(i) Emissão com a designação “EI..., S.A 27/10/2014”, com data de subscrição de 28/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 27/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
(ii) Emissão com a designação “EI..., S.A 29/01/2014”, com data de subscrição de 30/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 29/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iii) Emissão com a designação “EI..., S.A 30/04/2014”, com data de subscrição de 01/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 30/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(iv) Emissão com a designação “EI..., S.A 03/11/2014”, com data de subscrição de 04/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 03/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
(v) Emissão com a designação “EI..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 07/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(vi) Emissão com a designação “EI..., S.A 07/05/2014”, com data de subscrição de 08/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 07/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(vii) Emissão com a designação “EI..., S.A 06/02/2014”, com data de subscrição de 08/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 06/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(viii) Emissão com a designação “EI..., S.A 10/11/2014”, com data de subscrição de 11/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
(ix) Emissão com a designação “EI..., S.A 12/02/2014”, com data de subscrição de 14/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 12/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(x) Emissão com a designação “EI..., S.A 14/05/2014”, com data de subscrição de 15/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xi) Emissão com a designação “EI..., S.A 19/11/2014”, com data de subscrição de 20/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 19/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
(xii) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/05/2014”, com data de subscrição de 25/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 26/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xiii) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/11/2014”, com data de subscrição de 27/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 26/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
(xiv) Emissão com a designação “EI..., S.A 02/06/2014”, com data de subscrição de 02/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 02/06/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xv) Emissão com a designação “EI..., S.A 28/02/2014”, com data de subscrição de 29/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 28/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xvi) Emissão com a designação “EI..., S.A 10/12/2014”, com data de subscrição de 11/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%;
247. Os montantes totais de cada uma das emissões identificadas no ponto anterior foram de respetivamente:
(i)        € 25.350.000,00;
(ii)       € 44.000.000,00;
(iii)      € 36.950.000,00;
(iv)      € 24.100.000,00;
(v)       € 31.750.000,00;
(vi)      € 33.250.000,00;
(vii)     € 25.050.000,00;
(viii)    € 18.700.000,00;
(ix)      € 34.950.000,00;
(x)       € 30.550.000,00;
(xi)      € 28.500.000,00;
(xii)     € 28.250.000,00;
(xiii)    € 21.550.000,00;
(xiv)    € 25.350.000,00;
(xv)     € 14.000.000,00;
(xvi)    € 15.650.000,00;
248. Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo D, que aqui se dá por reproduzido;
249. O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) emitidos era de € 50.000,00;
250. O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 100.000,00;
251. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
252.     O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à EI..., S.A;
253. Entre Setembro de 2013 e Dezembro de 2013, o B... procedeu à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A junto dos seus clientes no montante total de € 1.294.000.000,00;
254.     A comercialização do papel comercial da EI..., S.A pelo B... junto dos clientes identificados nos Anexos A a D da decisão administrativa, acima dados como reproduzidos, realizou-se sob a forma de ofertas particulares de subscrição;
255. O Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro de 2013, aditado pelos Aditamentos de 19 de Setembro de 2013 e 14 de Outubro de 2013 foi resolvido pelo BEl... em 20 de Julho de 2015;
*
Subsecção III – Do contrato de organização e colocação de papel comercial celebrado entre a R..., S.A, o BEl... e o B... e das emissões de papel comercial da R..., S.A realizadas ao abrigo do mesmo:
256. A 18 de Setembro de 2013 foi celebrado um contrato denominado “Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial” entre a R..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador e o Bbt..., SA, como Colocador;
257.     Em representação da R..., S.A subscreveram o contrato NN e HHHHH, respetivamente vogal e vice-presidente do Conselho de Administração;
258. Em representação do BEl... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da referida sociedade, KK e NNNNN;
259. Em representação do B... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da sociedade, OOOOO e PPPPP, ambos funcionários do DFME do B...;
260. Em representação do Bbt..., SA subscreveram o contrato, na qualidade de administradores da sociedade, QQQQQ e RRRRR;
261. Pelo referido Contrato, os contraentes estabeleceram as regras relativas à organização, emissão e colocação das emissões de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, até a um limite máximo de € 600.000.000,00, no prazo de cinco anos;
262. Nos termos definidos na cláusula 5ª, n.º 2 do Contrato, “Cada emissão será organizada e liderada pelo Agente [o BEl...], o qual desempenhará igualmente as funções de Instituição Registadora e de Agente Pagador”;
263. Nos termos definidos na cláusula 5ª, n.º 3 do Contrato, “Cabe ao B... e ao Bbt..., SA desenvolver os seus melhores esforços, nos termos do presente Contrato, no sentido de colocar o papel comercial emitido ao abrigo do Programa junto dos investidores”;
264. Na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, os contraentes estabeleceram o seguinte:
“1. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, a Emitente pagará ao BEl..., na Data de Subscrição de cada Emissão, uma Comissão de Agente de € 3.500 (três mil e quinhentos euros) por cada Emissão a realizar ao abrigo do Programa, com um valor máximo anual de € 100.000,00 (cem mil euros).
“2. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, o B... e/ou o Bbt..., SA poderão ainda cobrar à Emitente uma Comissão de Colocação no valor máximo de 1.00% (um por cento) ao ano sobre o montante e Prazo de Emissão de cada Emissão.”;
265. Em anexo ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial encontram-se minutas da ficha técnica de cada emissão de papel comercial da R..., S.A, bem como da notificação a enviar pela R..., S.A previamente a cada emissão;
266.     A minuta do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial foi elaborada pelo BEl..., com o apoio do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...;
267.     Ao abrigo deste Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 18 de Setembro a R..., S.A procedeu às seguintes emissões de papel comercial, colocadas pelo B...:
(i)        Emissão com a designação “R..., S.A 04/02/2014”, com data de subscrição de 07/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 04/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(ii)       Emissão com a designação “R..., S.A 07/02/2014”, com data de subscrição de 10/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 07/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iii)      Emissão com a designação “R..., S.A 10/02/2014”, com data de subscrição de 11/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 10/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(iv)      Emissão com a designação “R..., S.A 14/01/2014”, com data de subscrição de 16/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 14/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(v)       Emissão com a designação “R..., S.A 15/01/2014”, com data de subscrição de 17/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 15/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(vi)      Emissão com a designação “R..., S.A 22/01/2014”, com data de subscrição de 24/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 22/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25;
(vii)     Emissão com a designação “R..., S.A 03/02/2014”, com data de subscrição de 06/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 03/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(viii)    Emissão com a designação “R..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 07/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(ix)      Emissão com a designação “R..., S.A 14/05/2014”, com data de subscrição de 15/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(x)       Emissão com a designação “R..., S.A 20/02/2014”, com data de subscrição de 22/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 20/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xi)      Emissão com a designação “R..., S.A 27/02/2014”, com data de subscrição de 29/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 27/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xii)     Emissão com a designação “R..., S.A 10/12/2014”, com data de subscrição de 11/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%;
(xiii)    Emissão com a designação “R..., S.A 16/06/2014”, com data de subscrição de 16/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 16/06/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xiv)    Emissão com a designação “R..., S.A 18/03/2014”, com data de subscrição de 18/12/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 18/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%;
(xv)     Emissão com a designação “R..., S.A 16/09/2014”, com data de subscrição de 20/12/2013, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 16/09/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,40%;
(xvi)    Emissão com a designação “R..., S.A 23/12/2014”, com data de subscrição de 27/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 23/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50;
(xvii)   Emissão com a designação “R..., S.A 01/07/2014”, com data de subscrição de 31/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 01/07/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%;
(xviii)  Emissão com a designação “R..., S.A 15/07/2014”, com data de subscrição de 16/01/2014, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 15/07/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,10%;
(xix)    Emissão com a designação “R..., S.A 20/10/2014”, com data de subscrição de 22/01/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 20/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
(xx)     Emissão com a designação “R..., S.A 03/11/2014”, com data de subscrição de 03/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 03/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15;
(xxi)    Emissão com a designação “R..., S.A 31/10/2014”, com data de subscrição de 04/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 31/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
(xxii)   Emissão com a designação “R..., S.A 06/11/2014”, com data de subscrição de 10/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 06/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15;
(xxiii)  Emissão com a designação “R..., S.A 07/11/2014”, com data de subscrição de 10/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 07/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
268. Os montantes totais de cada uma das emissões identificadas no ponto anterior foram de, respectivamente:
(i)        € 14.000.000,00;
(ii)       € 18.500.000,00;
(iii)      € 13.900.000,00;
(iv)      € 20.700.000,00;
(v)       € 9.800.000,00;
(vi)      € 34.400.000,00;
(vii)     € 30.700.000,0;
(viii)    € 21.000.000,00;
(ix)      € 5.900.000,00;
(x)       € 34.000.000,00;
(xi)      € 27.500.000,00;
(xii)     € 16.300.000,00;
(xiii)    € 26.100.000,00;
(xiv)    € 39.550.000,00;
(xv)     € 31.250.000,00;
(xvi)    € 31.250.000,00;
(xvii)   € 30.000.000,00;
(xviii)  € 36.400.000,00;
(xix)    € 30.500.000,00;
(xx)     € 28.300.000,00;
(xxi)    € 40.800.000,00;
(xxii)   € 20.200.000,00;
(xxiii)  € 24.400.000,00;
(xxiv)  € 7.950.000,00;
269.     Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo E, que se considera integralmente reproduzido;
270.     O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) emitidos era de € 50.000,00;
271. O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 100.000,00;
272. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à R..., S.A da comissão prevista na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
273.     O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à R..., S.A;
274. Em 14 de Fevereiro de 2014 foi celebrado um Aditamento ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, pelo qual aderiram ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 18 de Setembro de 2013, assumindo posição idêntica à aí assumida pelo B... e pelo Bbt..., SA, o Baç..., SA. (Baç..., SA);
275. Ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 18 de Setembro, na redacção resultante do Aditamento de 14 de Fevereiro de 2014, a R..., S.A procedeu às seguintes as emissões de papel comercial, colocadas pelo B...:
(i)        Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
(ii)       Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15;
(iii)      Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
(iv)      Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%;
276. Os montantes totais de cada uma das emissões identificadas no ponto anterior foram de, respectivamente:
(i)        € 14.350.000,00;
(ii)       € 19.150.000,00;
(iii)      € 18.600.000,00;
(iv)      € 5.000.000,00;
277.     Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados na listagem junta à decisão administrativa como Anexo F, que se considera integralmente reproduzido;
278.     O valor nominal dos valores mobiliários representativos de dívida (papel comercial) emitidos era de € 50.000,00;
279. O montante mínimo de subscrição por cliente foi de € 100.000,00;
280.     Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à R..., S.A da comissão prevista na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
281.     O B... não cobrou qualquer comissão de colocação à R..., S.A;
282. O Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 18 de Setembro de 2013, aditado pelo Aditamento de 14 de Fevereiro de 2014 foi resolvido pelo BEl... em 20 de Julho de 2015;
*
Subsecção IV – Do procedimento de organização e colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A junto dos balcões do B...:
283.     A documentação de suporte à comercialização por parte do B... do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A foi definida pelo DGP, validada pelo Departamento de Compliance e pelo Departamento de Assuntos Jurídicos do B... e aprovada pelo administrador com o pelouro do ..., o Recorrente DD;
284.     A possibilidade de subscrição de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A foi apresentada aos clientes do B..., preferencialmente os clientes dos segmentos Private e ... que fossem já subscritores de unidades de participação do Elz...;
285.     Para o efeito, os comerciais do B... tinham ao seu dispor as Fichas Técnicas do Produto, disponíveis na intranet do B..., preparadas pelo DGP, as quais continham os seguintes campos:
a) “Definição do Produto”, do qual constavam os subcampos “Código”, “Família do Produto: Títulos”, “Período Comercialização”, “Definição”, “Validade Condições”;
b) “Caracterização e Enquadramento”, do qual constavam os subcampos “Titularidade” e “Enquadramento da Oferta”;
c) “Detalhes da Oferta”, do qual constavam os subcampos “ISIN”, “Código Interno”, “Moeda”, “Emitente”, “Montantes/Entregas”, “Preço de Compra”, “Prazo”, “Liquidação Financeira”, “Data de Maturidade”, “Data de Pagamento Cupão”, “Características Especiais (Inclui Deveres de Informação e Fatores de Risco)”, “Classificação DMIF”, “Diretiva da Poupança”;
d) “Condições de Remuneração”, do qual constavam os subcampos “Remuneração” e “Pagamento, Cálculo e Regime Juros”;
e) “Preçário Aplicável”, do qual constavam os subcampos “Comissões” e “Outros Custos”;
f) “Fiscalidade”, do qual constava o subcampo “Regime Fiscal”;
g) “Comunicação a Clientes”;
h) “Documentos de suporte”;
i) “Aplicação Informática”
286.     Para a subscrição de papel comercial por parte dos clientes, estes deveriam preencher e assinar um boletim de subscrição, com a designação “Operações sobre Instrumentos Financeiros”, do qual constavam os seguintes campos:
a) Identificação do cliente (nome, nº de contribuinte, nº de conta, e-mail e telemóvel);
b) Identificação da operação (estando pré-preenchidos os campos “Compra/Subscrição”, “OTC” e “Papel Comercial” e Moeda:EUR” e devendo ser preenchidos os campos “Identificação do valor mobiliário”, “Código ISIN”, “Montante pretendido”, “Quantidade/Valor Nominal”, “Preço”, “Valor de Liquidação” e “Data de Liquidação”);
287. Os clientes deveriam, ainda, datar e assinar o boletim de subscrição, que era igualmente assinado por um representante do balcão ou unidade comercial do B... responsável pela colocação;
288. Aquando da subscrição, o comercial do B... deveria carregar a ordem de subscrição do papel comercial formalizada pelo cliente na plataforma informática B... Ordens;
289.     A plataforma informática B... Ordens era uma aplicação de front-office, de utilização exclusiva pelos comerciais do B..., concebida para a subscrição, pelos clientes, de instrumentos financeiros (obrigações ou papel comercial) e de produtos compósitos (depósitos a prazo ligados seguros);
290.     Da plataforma informática B... Ordens constavam os vários instrumentos financeiros em comercialização pelo B..., os montantes disponíveis e a informação sobre as emissões;
291. Uma vez carregada, pelo comercial do B..., a ordem de subscrição do cliente de papel comercial, a plataforma informática B... Ordens disponibilizava automaticamente, para impressão, uma ficha técnica e uma nota informativa;
292.     Por cada emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A foi elaborada, pelo DGP, uma ficha técnica, da qual constava:
a) a identificação da emitente de papel comercial (a EI..., S.A ou a R..., S.A);
b) a modalidade de subscrição (oferta particular de subscrição);
c) a identificação do programa de papel comercial;
d) a moeda do papel comercial (euro);
e) o período de subscrição da emissão em causa;
f) as datas de subscrição e reembolso do papel comercial;
g) o prazo da emissão;
h) o valor nominal dos títulos;
i) o montante mínimo de subscrição;
j) a taxa, forma de cálculo e data de pagamento dos juros;
k) o montante do reembolso (capital subscrito e juros);
l) o regime fiscal aplicável;
m) a identificação da instituição colocadora (o B...) e da instituição líder e agente do programa (o BEl...);
n) o código ISIN da emissão;
o) a menção à lei aplicável (a lei portuguesa)
p) uma síntese dos fatores de risco identificados na nota informativa;
q) informação sobre o direito de revogação da ordem, prazo e forma de exercício do mesmo.
293. No final do documento ficha técnica constava, ainda, a seguinte menção:
“Recebi e tomei conhecimento das condições constantes do presente documento e da respetiva Nota Informativa, que recebi em momento anterior à subscrição da oferta particular de Papel Comercial EI..., S.A.”;
294. O cliente deveria datar e assinar a ficha técnica, preenchendo, ainda, os campos “Nº Conta” e “Balcão”;
295. No que respeita às emissões de papel comercial da R..., S.A realizadas no ano de 2014, as fichas técnicas passaram a conter, para além das menções identificadas nos pontos anteriores, as seguintes informações:
a) a identificação da emitente de papel comercial (a R..., S.A), com a seguinte menção “É uma sociedade de investimentos registada no Lu... que detém participações em várias empresas não cotadas, localizadas sobretudo em Portugal, no ..., no ... e em ..., que atuam nos segmentos do imobiliário, turismo, saúde, agricultura e energia.”;
b) informação adicional sobre a emitente de papel comercial com o seguinte teor “A sociedade R..., S.A. não está sujeita a supervisão prudencial e não tem rating atribuído”.
296. As Notas Informativas dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A foram elaboradas pelo BEl..., com as informações que lhe foram disponibilizadas pela sociedade emitente;
297. No que respeita ao programa de papel comercial da EI..., S.A de 3 de Setembro de 2013, foi elaborada, para ser divulgada junto dos clientes, aquando da subscrição das emissões de papel comercial ao abrigo do referido programa, uma nota informativa, da qual constavam as seguintes menções:
A. Na capa do documento:
a) a identificação da Emitente (firma, sede, capital social e registo comercial);
b) o montante máximo do programa (€ 1.000.000.000,00);
c) a identificação da entidade colocadora (o B...) e do líder e agente pagador (BEl...);
d) a data da Nota Informativa (setembro de 2013);
B. No corpo do documento:
e) uma “Advertência aos Investidores”;
f) informação sobre os “Fatores de Risco”, nomeadamente, “Riscos Inerentes ao papel comercial”, “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respetiva Atividade”;
g) informações sobre a Emitente, designadamente os seus elementos de identificação (denominação social, sede social, objeto social, capital social, matrícula comercial, capital social e sua forma de representação, identificação do acionista maioritário, lei pessoal da emitente, composição do Conselho de Administração e identificação do Comissaire aux Comptes);
h) breve descrição da atividade da emitente, identificada como “uma sociedade de participações financeiras, sedeada no Lu..., cujos principais ativos são uma participação (direta e indireta) de 44% na E..., S.A. e de 100% na R..., S.A. Com ativos de € 4,3 mil milhões, EI..., S.A assume-se como um investidor de referência no triângulo económico do ... (..., ... e ...)”:
i) descrição das atividades da E..., S.A. e da R..., S.A.;
j) demonstrações financeiras individuais da Emitente, relativas a 2010 (balanço e demonstração de resultados), 2011 e 2012 (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa);
k) os “Termos e Condições do Programa”, com os seguintes elementos; “Entidade Emitente”, “Modalidade”, “Montante Máximo do Programa”, “Prazo do Programa”, “Líder e Agente”, “Representação”, “Realização”, “Preço de Emissão”, “Reembolso”, “Contagem de Dias”, “Tomada de Fundos”, “Modalidade de Colocação”, “Modo de Funcionamento”, “Taxa de Juro”, “Vencimento Antecipado”, “Covenants” e “Regime Fiscal”.
298.     No que respeita ao programa de papel comercial da EI..., S.A de 9 de Setembro de 2013, foram elaboradas, para serem divulgadas junto dos clientes, aquando da subscrição das emissões de papel comercial ao abrigo do referido programa, três notas informativas, das quais constavam as seguintes menções:
A. Na capa de cada um dos três documentos:
a) a identificação da Emitente (firma, sede, capital social e registo comercial);
b) o montante máximo do programa (€ 1.000.000.000,00, nas Notas Informativas de “setembro de 2013” e de “25 de setembro de 2013”, e € 1.500.000.000,00, na Nota Informativa de “15 de outubro de 2013”);
c) a identificação da entidade colocadora (o B..., nas Notas Informativas de “setembro de 2013” e de “25 de setembro de 2013”, e o B..., O Baç..., SA e o Bbt..., SA, na Nota Informativa de “15 de outubro de 2013”) e do líder e agente pagador (BEl...);
d) a data da Nota Informativa (“setembro de 2013”, “25 de setembro de 2013” e “15 de outubro de 2013”);
B. No corpo de cada um dos documentos:
e) uma “Advertência aos Investidores”;
f) informação sobre os “Fatores de Risco”, nomeadamente, “Riscos Inerentes ao papel comercial”, “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respetiva Atividade”,;
g) informações sobre a Emitente, designadamente os seus elementos de identificação (denominação social, sede social, objeto social, capital social, matrícula comercial, capital social e sua forma de representação, identificação do acionista maioritário, lei pessoal da emitente, composição do Conselho de Administração e identificação do Comissaire aux Comptes);
h) breve descrição da atividade da emitente, identificada como “uma sociedade de participações financeiras, sedeada no Lu..., cujos principais ativos são uma participação (direta e indireta) de 44% na E..., S.A. e de 100% na R..., S.A. Com ativos de € 4,3 mil milhões, EI..., S.A assume-se como um investidor de referência no triângulo económico do ... (..., ... e ...)”:
i) descrição das atividades da E..., S.A. e da R..., S.A.;
j) demonstrações financeiras individuais da Emitente, relativas a 2010 (balanço e demonstração de resultados), 2011 e 2012 (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa);
k) os “Termos e Condições do Programa”, com os seguintes elementos; “Entidade Emitente”, “Modalidade”, “Montante Máximo do Programa”, “Prazo do Programa”, “Líder e Agente”, “Representação”, “Realização”, “Preço de Emissão”, “Reembolso”, “Contagem de Dias”, “Tomada de Fundos”, “Modalidade de Colocação”, “Modo de Funcionamento”, “Taxa de Juro”, “Vencimento Antecipado”, “Covenants” e “Regime Fiscal”;
299. No que respeita ao programa de papel comercial da R..., S.A de 18 de Setembro de 2013, foram elaboradas, para serem divulgadas junto dos clientes, aquando da subscrição das emissões de papel comercial ao abrigo do referido programa, três notas informativas, das quais constavam as seguintes menções:
A. Na capa de cada um dos documentos:
a) a identificação da Emitente (firma, sede, capital social e registo comercial);
b) o montante máximo do programa (€ 600.000.000,00);
c) a identificação das entidades colocadoras (o B... e o Bbt..., SA) e do líder e agente pagador (BEl...);
d) a data da Nota Informativa (“25 de setembro de 2013”, “6 de janeiro de 2014” e “16 de janeiro de 2014”);
B. No corpo do documento:
e) uma “Advertência aos Investidores”;
f) informação sobre os “Fatores de Risco”, nomeadamente, “Riscos Inerentes ao papel comercial”, “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respetiva Atividade”;
g) informações sobre a Emitente, designadamente os seus elementos de identificação (denominação social, sede social, objeto social, capital social, matrícula comercial, capital social e sua forma de representação, identificação da acionista única, lei pessoal da emitente, composição do Conselho de Administração e do Órgão de Fiscalização);
h) breve descrição da atividade da emitente, identificada como “uma sociedade de investimentos que detém participações em várias empresas não cotadas, localizadas sobretudo em Portugal, no ..., no ... e em ..., que atuam nos segmentos do imobiliário, turismo, saúde, agricultura e energia. Detém ainda participações minoritárias em duas sociedades cotadas no .... Com ativos consolidados de €2,8 mil milhões, a R..., S.A assume-se como um investidor de referência no triângulo económico do ....”:
i) descrição dos principais ativos da R..., S.A, por referência aos setores “Imobiliário”, “Turismo”, “Saúde” e “Agricultura”, “Energia”;
j) demonstrações financeiras consolidadas (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa) e individuais (balanço e demonstração de resultados) da Emitente, relativas a 2010, 2011 e 2012;
k) os “Termos e Condições do Programa”, com os seguintes elementos; “Entidade Emitente”, “Modalidade”, “Montante Máximo do Programa”, “Prazo do Programa”, “Líder e Agente”, “Representação”, “Realização”, “Preço de Emissão”, “Reembolso”, “Contagem de Dias”, “Tomada de Fundos”, “Modalidade de Colocação”, “Modo de Funcionamento”, “Taxa de Juro”, “Vencimento Antecipado”, “Covenants” e “Regime Fiscal”.
300. Foi ainda elaborada, no que respeita ao programa de papel comercial da R..., S.A de 18 de Setembro de 2013, mas não divulgada junto dos clientes do B... aquando da subscrição das emissões de papel comercial ao abrigo do referido programa, uma nota informativa, com data de “14 de Fevereiro de 2014”, da qual constavam as seguintes menções:
A. Na capa de cada um dos documentos:
a) a identificação da Emitente (firma, sede, capital social e registo comercial);
b) o montante máximo do programa (€ 600.000.000,00);
c) a identificação das entidades colocadoras (o B..., o Bbt..., SA e o Baç..., SA) e do líder e agente pagador (BEl...);
d) a data da Nota Informativa (“14 de fevereiro de 2014”);
B. No corpo do documento:
e) uma “Advertência aos Investidores”;
f) informação sobre os “Fatores de Risco”, nomeadamente, “Riscos Inerentes ao papel comercial”, “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respetiva Atividade”, compreendendo alterações, face às notas informativas referidas no ponto anterior, no que respeita ao “risco cambial”, ao “risco de preço, ao “risco de taxa de juro”, ao “risco de crédito”, ao “risco operacional” e ao risco de liquidez”;
g) informações sobre a Emitente, designadamente os seus elementos de identificação (denominação social, sede social, objeto social, capital social, matrícula comercial, capital social e sua forma de representação, identificação da acionista única, lei pessoal da emitente, composição do Conselho de Administração e do Órgão de Fiscalização);
h) breve descrição da atividade da emitente, identificada como “uma sociedade de investimentos que detém participações em várias empresas não cotadas, localizadas sobretudo em Portugal, no ..., no ... e em ..., que atuam nos segmentos do imobiliário, turismo, saúde, agricultura e energia. Detém ainda participações em sociedades cotadas, nomeadamente 49% no [sic] E..., S.A e participações minoritárias na Ma... e ....”:
i) descrição dos principais ativos da R..., S.A, por referência aos setores “Serviços Financeiros”, “Imobiliário”, “Turismo”, “Saúde” e “Agricultura”, “Energia”;
j) demonstrações financeiras consolidadas (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa) e individuais (balanço e demonstração de resultados) da Emitente, relativas a 2010, 2011 e 2012, com a advertência de que “As demonstrações financeiras relativas aos exercícios de 2013 estão em fase final de preparação e auditoria. É no entanto de referir que, face a 2012, existem alterações significativas e materiais decorrentes da aquisição de uma participação de 49% no [sic] E..., S.A.”;
k) os “Termos e Condições do Programa”, com os seguintes elementos; “Entidade Emitente”, “Modalidade”, “Montante Máximo do Programa”, “Prazo do Programa”, “Líder e Agente”, “Representação”, “Realização”, “Preço de Emissão”, “Reembolso”, “Contagem de Dias”, “Tomada de Fundos”, “Modalidade de Colocação”, “Modo de Funcionamento”, “Taxa de Juro”, “Vencimento Antecipado”, “Covenants” e “Regime Fiscal”.
301. A subscrição, pelos clientes do B..., de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A apenas se completava, assim, com:
a) o preenchimento e assinatura, pelo cliente, do boletim de subscrição;
b) o carregamento da ordem de compra do cliente, pelo comercial do B..., na plataforma B... Ordens;
c) a entrega ao cliente da ficha técnica de cada emissão e a divulgação da nota informativa em vigor à data da subscrição;
d)        a assinatura, pelo cliente, da ficha técnica e a sua devolução ao B....
302. As fichas técnicas e as notas informativas foram enviadas pelo DGP ao Departamento de Marketing de Particulares, tendo este carregado os referidos documentos na plataforma B... Ordens e na intranet do B...;
303. O Departamento de Marketing, Inovação e Canais (DMIC) procedeu, ainda, à divulgação do novo produto da oferta comercial do B... junto dos departamentos comerciais do B..., previamente ao início da comercialização da primeira emissão de papel comercial da EI..., S.A ao abrigo do programa de 3 de Setembro de 2013;
304. A comercialização da primeira e única emissão de papel comercial da EI..., S.A ao abrigo do programa de 3 de Setembro de 2013, com a designação “EI..., S.A 18/12/13”, com data de subscrição de 18/09/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 18/12/2013) taxa de juro anual nominal de 4,25%, junto dos clientes do B... teve lugar entre 9 e 13 de Setembro de 2013;
305. No que respeita às emissões de papel comercial da EI..., S.A ao abrigo do programa de 9 de Setembro de 2013, a comercialização das mesmas pelo B... teve lugar nos seguintes períodos:
(i) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/01/2014”, com data de subscrição de 18/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 20/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 11 e 13 de setembro de 2013;
(ii) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/01/2014”, com data de subscrição de 20/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 20/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 12 e 17 de setembro de 2013;
(iii) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/01/2014”, com data de subscrição de 24/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 24/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 13 e 19 de setembro de 2013;
(iv) Emissão com a designação “EI..., S.A 21/01/2014”, com data de subscrição de 23/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 21/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 16 e 18 de setembro de 2013;
(v) Emissão com a designação “EI..., S.A 22/01/2014”, com data de subscrição de 24/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 22/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 17 e 19 de setembro de 2013;
(vi) Emissão com a designação “EI..., S.A 23/01/2014”, com data de subscrição de 25/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 23/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 18 e 20 de setembro de 2013;
(vii) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/01/2014”, com data de subscrição de 26/09/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 24/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 19 e 23 de setembro de 2013;
(viii) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/03/2014”, com data de subscrição de 27/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 26/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 20 e 24 de setembro de 2013;
(ix) Emissão com a designação “EI..., S.A 24/03/2014”, com data de subscrição de 25/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 24/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 18 e 20 de setembro de 2013;
(x) Emissão com a designação “EI..., S.A 31/03/2014”, com data de subscrição de 30/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 31/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 23 e 25 de setembro de 2013;
(xi) Emissão com a designação “EI..., S.A 01/04/2014”, com data de subscrição de 30/09/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 01/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 23 e 25 de setembro de 2013;
(xii) Emissão com a designação “EI..., S.A 29/01/2014”, com data de subscrição de 01/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 29/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 24 e 26 de setembro de 2013;
(xiii) Emissão com a designação “EI..., S.A 30/01/2014”, com data de subscrição de 02/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 30/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 25 e 27 de setembro de 2013;
(xiv) Emissão com a designação “EI..., S.A 31/01/2014”, com data de subscrição de 03/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 31/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 26 e 30 de setembro de 2013;
(xv) Emissão com a designação “EI..., S.A 02/04/2014”, com data de subscrição de 04/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 02/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 27 de setembro e 1 de outubro de 2013;
(xvi) Emissão com a designação “EI..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 08/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 1 e 3 de outubro de 2013;
(xvii) Emissão com a designação “EI..., S.A 07/04/2014”, com data de subscrição de 09/10/2014, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 07/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 2 e 4 de outubro de 2013;
(xviii) Emissão com a designação “EI..., S.A 09/04/2014”, com data de subscrição de 11/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 09/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 4 e 8 de outubro de 2013;
(xix) Emissão com a designação “EI..., S.A 14/04/2014”, com data de subscrição de 14/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 7 e 9 de outubro de 2013;
(xx) Emissão com a designação “EI..., S.A 16/01/2014”, com data de subscrição de 18/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 16/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 8 e 15 de outubro de 2013;
(xxi) Emissão com a designação “EI..., S.A 16/04/2014”, com data de subscrição de 18/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 16/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 11 e 15 de outubro de 2013;
(xxii) Emissão com a designação “EI..., S.A 20/10/2014”, com data de subscrição de 21/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 20/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%: entre 14 e 16 de outubro de 2013;
(xxiii) Emissão com a designação “EI..., S.A 22/10/2014”, com data de subscrição de 23/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 22/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%: entre 15 e 18 de outubro de 2013;
(xxiv) Emissão com a designação “EI..., S.A 23/01/2014”, com data de subscrição de 25/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento 23/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 15 e 22 de outubro de 2013;
(xxv) Emissão com a designação “EI..., S.A 21/01/2014”, com data de subscrição de 23/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses, com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 16 e 18 de outubro de 2013;
(xxvi)  Emissão com a designação “EI..., S.A 23/04/2014”, com data de subscrição de 25/10/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 23/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 18 e 22 de outubro de 2013;
(xxvii) Emissão com a designação “EI..., S.A 27/10/2014”, com data de subscrição de 28/10/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 27/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 21 e 23 de outubro de 2013;
(xxviii) Emissão com a designação “EI..., S.A 29/01/2014”, com data de subscrição de 30/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 29/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 23 e 25 de outubro de 2013;
(xxix)  Emissão com a designação “EI..., S.A 30/04/2014”, com data de subscrição de 01/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 30/04/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 25 e 29 de outubro de 2013;
(xxx)   Emissão com a designação “EI..., S.A 03/11/2014”, com data de subscrição de 04/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 03/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 28 e 30 de outubro de 2013;
(xxxi)  Emissão com a designação “EI..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 07/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 30 de outubro e 4 de novembro de 2013;
(xxxii) Emissão com a designação “EI..., S.A 07/05/2014”, com data de subscrição de 08/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 07/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 1 e 5 de novembro de 2013;
(xxxiii) Emissão com a designação “EI..., S.A 06/02/2014”, com data de subscrição de 08/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 06/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 31 de outubro e 5 de novembro de 2013;
(xxxiv) Emissão com a designação “EI..., S.A 10/11/2014”, com data de subscrição de 11/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 4 e 6 de novembro de 2013;
(xxxv) Emissão com a designação “EI..., S.A 12/02/2014”, com data de subscrição de 14/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 12/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 6 e 11 de novembro de 2013;
(xxxvi) Emissão com a designação “EI..., S.A 14/05/2014”, com data de subscrição de 15/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 8 e 12 de novembro de 2013;
(xxxvii) Emissão com a designação “EI..., S.A 19/11/2014”, com data de subscrição de 20/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 19/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 11 e 15 de novembro de 2013;
(xxxviii) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/05/2014”, com data de subscrição de 25/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 26/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 15 e 20 de novembro de 2013;
(xxxix) Emissão com a designação “EI..., S.A 26/11/2014”, com data de subscrição de 27/11/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 26/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 18 e 22 de novembro de 2013;
(xl) Emissão com a designação “EI..., S.A 02/06/2014”, com data de subscrição de 02/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 02/06/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 22 e 27 de novembro de 2013;
(xli) Emissão com a designação “EI..., S.A 28/02/2014”, com data de subscrição de 29/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 28/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 25 e 26 de novembro de 2013;
(xlii) Emissão com a designação “EI..., S.A 10/12/2014”, com data de subscrição de 11/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,5%: entre 2 e 6 de dezembro de 2013;
306. No que respeita às emissões de papel comercial da R..., S.A ao abrigo do programa de 18 de Setembro de 2013, a comercialização das mesmas pelo B... teve lugar nos seguintes períodos:
(i)        Emissão com a designação “R..., S.A 04/02/2014”, com data de subscrição de 07/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 04/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 30 de setembro e 2 de outubro de 2013;
(ii)       Emissão com a designação “R..., S.A 07/02/2014”, com data de subscrição de 10/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 07/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 3 e 7 de outubro de 2013;
(iii)      Emissão com a designação “R..., S.A 10/02/2014”, com data de subscrição de 11/10/2013, código ISIN ..., prazo de 4 meses (vencimento a 10/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 4 e 8 de outubro de 2013;
(iv)      Emissão com a designação “R..., S.A 14/01/2014”, com data de subscrição de 16/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 14/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 9 e 11 de outubro de 2013;
(v)       Emissão com a designação “R..., S.A 15/01/2014”, com data de subscrição de 17/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 15/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 10 e 14 de outubro de 2013;
(vi)      Emissão com a designação “R..., S.A 22/01/2014”, com data de subscrição de 24/10/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 22/01/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 17 e 21 de outubro de 2013;
(vii)     Emissão com a designação “R..., S.A 03/02/2014”, com data de subscrição de 06/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 03/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 24 de outubro e 1 de novembro de 2013;
(viii)    Emissão com a designação “R..., S.A 05/02/2014”, com data de subscrição de 07/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 05/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 31 de outubro e 4 de novembro de 2013;
(ix)      Emissão com a designação “R..., S.A 14/05/2014”, com data de subscrição de 15/11/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 14/05/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 7 e 12 de novembro de 2013;
(x)       Emissão com a designação “R..., S.A 20/02/2014”, com data de subscrição de 22/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 20/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 13 e 19 de novembro de 2013;
(xi)      Emissão com a designação “R..., S.A 27/02/2014”, com data de subscrição de 29/11/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 27/02/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 20 e 26 de novembro de 2013;
(xii)     Emissão com a designação “R..., S.A 10/12/2014”, com data de subscrição de 11/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 10/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%: entre 28 de novembro e 6 de dezembro de 2013;
(xiii)    Emissão com a designação “R..., S.A 16/06/2014”, com data de subscrição de 16/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 16/06/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 5 e 11 de dezembro de 2013;
(xiv)    Emissão com a designação “R..., S.A 18/03/2014”, com data de subscrição de 18/12/2013, código ISIN ..., prazo de 3 meses (vencimento a 18/03/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,25%: entre 10 e 13 de dezembro de 2013;
(xv)     Emissão com a designação “R..., S.A 16/09/2014”, com data de subscrição de 20/12/2013, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 16/09/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,40%: entre 12 e 16 de dezembro de 2013;
(xvi)    Emissão com a designação “R..., S.A 23/12/2014”, com data de subscrição de 27/12/2013, código ISIN ..., prazo de 12 meses (vencimento a 23/12/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,50%: entre 17 e 19 de dezembro de 2013;
(xvii)   Emissão com a designação “R..., S.A 01/07/2014”, com data de subscrição de 31/12/2013, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 01/07/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,35%: entre 20 e 23 de dezembro de 2013;
(xviii)  Emissão com a designação “R..., S.A 15/07/2014”, com data de subscrição de 16/01/2014, código ISIN ..., prazo de 6 meses (vencimento a 15/07/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,10%: entre 9 e 13 de janeiro de 2014;
(xix)    Emissão com a designação “R..., S.A 20/10/2014”, com data de subscrição de 22/01/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 20/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 16 e 17 de janeiro de 2014;
(xx)     Emissão com a designação “R..., S.A 03/11/2014”, com data de subscrição de 03/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 03/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 28 e 30 de janeiro de 2014;
(xxi)    Emissão com a designação “R..., S.A 31/10/2014”, com data de subscrição de 04/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 31/10/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 28 e 30 de janeiro de 2014;
(xxii)   Emissão com a designação “R..., S.A 06/11/2014”, com data de subscrição de 10/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 06/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 3 e 5 de fevereiro de 2014;
(xxiii)  Emissão com a designação “R..., S.A 07/11/2014”, com data de subscrição de 10/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 07/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 3 e 5 de fevereiro de 2014;
(xxiv)  Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 13 e 24 de fevereiro de 2014;
(xxv)   Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 13 e 24 de fevereiro de 2014;
(xxvi)  Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 14 e 24 de fevereiro de 2014;
(xxvii) Emissão com a designação “R..., S.A 25/11/2014”, com data de subscrição de 27/02/2014, código ISIN ..., prazo de 9 meses (vencimento a 25/11/2014), com taxa de juro anual nominal de 4,15%: entre 17 e 24 de fevereiro de 2014;
307. Quanto a cada uma das emissões de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A ao abrigo dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, comercializadas pelo B..., previamente ao início do período de subscrição da emissão, o BEl... solicitou à Interbolsa a atribuição de um código ISIN para cada uma das emissões, tendo para o efeito procedido à elaboração de uma ficha técnica, da qual constava os seguintes elementos:
a) Identificação da Emitente;
b) Designação do título;
c) Datas da emissão e subscrição;
d) Forma e data do reembolso;
e) Quantidade e montante da emissão;
f) Valor nominal dos títulos, preço de emissão e valor do reembolso;
g) Periodicidade e taxa de juro;
h) Forma de subscrição;
i) Regime fiscal;
j) Identificação da entidade colocadora e da instituição domiciliaria.
308.     Uma vez obtido o ISIN da emissão e inserido o mesmo na ficha técnica, durante o período de subscrição de cada emissão, os comerciais do B... contactaram os clientes do B...;
309. Os clientes do B... contactados foram principalmente aqueles que eram já subscritores de unidades de participação do Elz...;
310.     Durante esse período, os comerciais do B... recolheram as ordens de subscrição dos clientes, entregando-lhes o boletim de subscrição, a ficha técnica da emissão e divulgando a nota informativa em vigor;
311.     Depois de preenchidos e assinados, pelo cliente, os boletins de subscrição e a ficha técnica da emissão, as ordens de subscrição emitidas pelos clientes foram registadas, pelos comerciais do B... na plataforma informática B... Ordens;
312.     Após o termo do período de subscrição de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A e uma vez apurado, pelo DGP do B..., o montante global subscrito pelos clientes do B..., o mesmo foi remetido ao BEl..., juntamente com a listagem dos clientes subscritores;
313.     O BEl... solicitou, para cada uma das emissões, à Interbolsa a alteração do montante da emissão constante da ficha técnica remetida à Interbolsa para efeitos de atribuição do código ISIN;
314. O BEl... procedeu, em seguida, para cada uma das emissões, à comunicação da referida ficha técnica ao Banco de Portugal, para efeitos estatísticos;
315. O BEl... enviou, ainda, para cada uma das emissões, ao Departamento Estratégico de Operações (DEO) do B... a mesma ficha técnica, para actualização da parametrização do título nos sistemas informáticos e de liquidação do B...;
316.     O BEl... informou então as Emitentes (EI..., S.A e R..., S.A), quanto a cada uma das emissões, do montante colocado na emissão em causa, o prazo da mesma, o prazo, datas de emissão e vencimento e taxa de juro da emissão;
317.     A EI..., S.A e a R..., S.A procederam, para cada uma das emissões, ao preenchimento da minuta de Notificação em anexo aos contratos dos programas de emissão de papel comercial, que foi, em todas as emissões, assinado por dois dos seus administradores;
318. Na data de subscrição constante da ficha técnica da emissão, foram registados, pelo DEO do B..., nas contas dos clientes subscritores do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A os montantes de papel comercial por estes subscritos;
319. Previamente à data de vencimento de cada emissão, o BEl... notificou a EI..., S.A e a R..., S.A de que, na data do vencimento da emissão, procederia ao débito, na conta da Emitente junto do B..., do montante total de reembolso;
320. Também previamente à data de vencimento de cada emissão, o BEl... notificou o DEO do B... para proceder, na data de reembolso, à liquidação financeira do reembolso aos clientes do B...;
321.     Os montantes de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A adquirido pelos clientes do B... entre Setembro de 2013 e Fevereiro de 2014 foram reportados nas reuniões mensais do Comité ALCO posteriores a 4 de Setembro de 2013;
322.     Os montantes de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A adquirido pelos clientes do B... entre Setembro de 2013 e Fevereiro de 2014 foram igualmente reportados nas reuniões do Comité de Retalho e nas reuniões do Comité Private havidas após 4 de Setembro de 2013, tendo nestas últimas participado o Recorrente BB;
*
Subsecção V – Dos factos que levaram à suspensão da comercialização de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A:
323.     Entre Maio e Julho de 2013, o Banco de Portugal conduziu uma acção especial de inspecção às carteiras de crédito dos oito maiores grupos bancários nacionais, com referência a 30 de Abril de 2013 que consistiu num “Exercício Transversal de Revisão da Imparidade da carteira de Crédito dos principais grupos bancários nacionais (“ETRICC”)”;
324. Um dos referidos oito maiores grupos bancários nacionais objecto do ETRICC era o E..., S.A;
325. Por ter identificado, durante o ETRICC, um conjunto de mutuários com exposições de natureza material aos grupos bancários objeto da ação especial de inspeção, para os quais o nível de imparidade se encontrava dependente dos fluxos de caixa (cash-flows) estimados para os projetos e negócios associados ao financiamento, o Banco de Portugal decidiu conduzir um exercício de análise dos planos de negócio de doze desses mutuários, com referência a 30 de Setembro de 2013 (ETRICC 2);
326. O ETRICC2 tinha, assim, como objetivo determinar se cada um dos doze grupos económicos selecionados pelo Banco de Portugal para efeitos do ETRICC2 tinha condições, através da geração de cash-flows futuros, para responder à totalidade das suas responsabilidades perante todo o sistema bancário nacional;
327. Os trabalhos do ETRICC2 foram realizados pela Pwa..., S.A. (doravante simplesmente “Pwa..., S.A”), com base em termos de referência e orientações definidas pelo Banco de Portugal, que acompanhou esses trabalhos;
328. Os trabalhos do ETRICC2 iniciaram-se no terceiro trimestre de 2013;
329. O denominado “G...” foi um dos doze grupos económicos com maior exposição ao sistema bancário português selecionados pelo Banco de Portugal para efeitos do ETRICC2;
330. Numa primeira fase, apenas as sociedades do ramo não financeiro do G... foram selecionadas para efeitos do ETRICC2, tendo o Banco de Portugal decidido, no decurso dos trabalhos do ETRICC2, estender a análise também às sociedades do ramo financeiro do B...;
331. No contexto dos trabalhos do ETRICC2, no início do terceiro trimestre de 2013, o Banco de Portugal solicitou ao B... a prestação de informações respeitantes ao denominado “G...”, designadamente uma projeção de cash-flows futuros, bem como o detalhe da dívida do mesmo, por referência a 30 de Setembro de 2013;
332. Para efeitos de coordenação da recolha e tratamento da informação a fornecer ao Banco de Portugal no contexto do ETRICC2, a Comissão Executiva do B... designou VV, Director-Coordenador do Departamento de ... como responsável pela recolha e tratamento da informação;
333. Para efeitos do ETRICC2, VV reportava a EE, Administrador Executivo do B..., com o pelouro do Departamento de ...;
334. Para efeitos de recolha da informação necessária à preparação da informação a reportar ao Banco de Portugal, VV convocou para uma reunião JJJ, III, NN e BBB;
335. JJJ e III foram convocados na qualidade de representantes das holdings do G... (designadamente, a EI..., S.A e a E... Limited) e NN e BBB foram convocados na qualidade de representantes da R..., S.A;
336.     A referida reunião teve lugar no dia 28 de Outubro de 2013;
337.     Nesta reunião esteve presente, além dos referidos VV, JJJ, III, NN e BBB, OO, da equipa do B... responsável pelo acompanhamento do ETRICC2;
338. Nessa reunião, VV solicitou aos representantes da R..., S.A os cash-flows das empresas do G... dos últimos três anos, bem como uma projeção dos cash-flows das mesmas empresas a dez anos;
339. Na mesma reunião, VV solicitou a JJJ e III informação sobre o valor total da dívida financeira das holdings do G..., reportada a 30 de Setembro de 2013, com o detalhe da moeda, das maturidades, dos spreads ou taxas de juro fixas e da tipologia de crédito;
340. VV comunicou, ainda, que o prazo para a prestação das informações solicitadas pelo Banco de Portugal terminava no final da primeira quinzena de Novembro de 2013, pelo que os elementos solicitados teriam de ser disponibilizados ao B... antes daquela data;
341. Nos dias seguintes à reunião de 28 de outubro de 2013, os responsáveis da R..., S.A remeteram os elementos solicitados pelo B...;
342. No entanto, nem JJJ, nem III remeteram a informação que lhes havia sido solicitada pelo B...;
343. Perante a ausência de elementos respeitantes ao endividamento das holdings do G..., VV insistiu verbalmente junto de JJJ e de III;
344. Como nem JJJ, nem III deram resposta às insistências de VV, este solicitou a OO que reiterasse, por escrito, o pedido dos aludidos elementos;
345. Cerca de duas semanas após a reunião de 28 de Outubro de 2013, JJJ e III comunicaram a VV que não estavam em condições de fornecer os elementos que lhes haviam sido solicitados e que a referida informação teria de ser solicitada ao Recorrente AA;
346.     Na sequência desta comunicação, ainda em data anterior a 15 de Novembro de 2013, realizou-se uma reunião com a presença de VV, JJJ, III e do Recorrente AA;
347. Nessa reunião, III apresentou aos presentes na referida reunião folhas de papel soltas com a dívida das holdings do denominado G..., reportada a 30 de Junho de 2013;
348. O montante global da dívida constante dos documentos apresentados por III era muito superior ao montante conhecido por referência a 30 de Dezembro de 2012;
349. Foi então esclarecido por III que o aumento do passivo se devia a problemas na EI..., S.A;
350. Foi verificado por VV, na mesma reunião, que o montante do aumento da dívida contraída era de cerca de 2.3 mil milhões de euros ( );
351. Desse valor, o que foi posteriormente apurado (já em Dezembro de 2013) foi que o montante de cerca de € 1.300.000.000,00 correspondia ao efeito acumulado da ocultação no balanço da EI..., S.A, desde o exercício de 2008, de parte da dívida emitida por aquela sociedade, que havia correspondido, em 2008, a 180 milhões de euros, em 2009, a 148 milhões de euros, em 2010, a 400 milhões de euros, em 2011, a 228 milhões de euros e em 2012, a 375 milhões de euros;
352. A reunião foi interrompida e retomada nos dois dias seguintes, tendo os intervenientes discutido sobre as possíveis justificações para o aumento do passivo da EI..., S.A;
353. III a certa altura referiu que existiam emissões de dívida não registadas da EI..., S.A, sem, contudo apresentar evidências;
354. A 15 de Novembro de 2013, VV comunicou a EE os elementos de que dispunha para comunicar ao Banco de Portugal e à Pwa..., S.A no contexto do ETRICC2;
355. Informou-o, pelo menos, dos termos por si apurados na reunião anterior a 15 de Novembro de 2013 (factos n.ºs 346 a 350);
356. Posteriormente, a 18 e 19 de Novembro de 2013, foi remetida à equipa de VV detalhes da dívida da EI..., S.A com o montante total dessa dívida a 30 de Setembro de 2013, informação que foi remetida, pelo B..., ao Banco de Portugal e à Pwa..., S.A a 19 de Novembro de 2013 ( );
356A. Em data não concretamente apurada, mas posterior a 19 de Novembro e anterior a 27 de Novembro de 2014, EE teve conhecimento acerca desse detalhe da dívida da EI..., S.A, de onde resultava, apesar de um aumento de dívida de cerca de 2.3 mil milhões de euros, uma situação líquida semelhante à anteriormente conhecida através das contas fechadas a 31.12.2012, por força de um análogo aumento do activo, situação que foi reportar ao Banco de Portugal em 27.11.2013; ( )
356B. Porém, posteriormente, não foi descoberta evidência de grande parte desse activo que permitia concluir pelo alinhamento do passivo com o activo ( );
357. No dia 2 de Dezembro de 2013 ( ), o Recorrente AA chamou para uma reunião, entre outras pessoas, o Recorrente DD e UU, tendo-lhes comunicado que no balanço da EI..., S.A a 31 de Dezembro de 2012 não estava reflectido o montante de 1.3 mil milhões de euros de dívida da EI..., S.A;
358. Na referida reunião estavam também presentes, entre outras pessoas, JJJ, III e EE;
359. A 4 de dezembro de 2013, em reunião ordinária da Comissão Executiva do B..., com a presença de todos os seus membros com excepção de TTT e do Recorrente DD, e em que estiveram presentes, também, os membros da Comissão de Auditoria do B..., EE e o Recorrente AA apresentaram aos demais presentes na reunião um ponto de situação sobre o ETRICC2;
360.     Nessa reunião, AA declarou que “no contexto do referido exercício ... em curso foi identificada a necessidade de um ajustamento de ca. 1,3 mil milhões € nas contas da EI..., S.A referentes a 31 de Dezembro de 2012 (Anexos 9 e 10), tendo o BdP, numa reunião no passado dia 27 manifestado alguma preocupação relativamente a essa questão. Nessa reunião foi proposto ao BdP que fosse realizada uma auditoria às contas consolidadas da EI..., S.A à data de 30 de Setembro p. p. por parte da K.... Este trabalho deverá decorrer em duas fases, com a primeira a ser concluída ate 7 de fevereiro próximo e a segunda, mais aprofundada, a terminar até ao final de Março de 2014. O Dr. AA referiu que o BdP está a acompanhar atentamente esta situação, tendo vindo a solicitar informações frequentes à E..., S.A e ao B..., as quais têm vindo a ser paulatinamente respondidas. Adicionalmente, foi dada nota da intenção de realizar um aumento de capital por parte da EI..., S.A, num montante de mil milhões € e a concretizar por etapas até 2015 (incluindo uma primeira parte de 200 milhões € ainda em 2013), estando a iniciar-se presentemente os trabalhos com vista à sua operacionalização.  O Dr. AA informou ainda a Comissão Executiva de que se tinha deslocado na véspera ao BdP, juntamente com o Dr. BB, o Dr. QQQ e o Dr. CC, para analisar com o Senhor Vice-Governador, Dr. QQQQQ, uma proposta de resolução da situação. Esta proposta irá ser aprofundada e debatida em maior detalhe com o BdP, esperando-se que da parte desta entidade prevaleça um espírito construtivo que permita, com a reserva que a questão exige, concretizar de forma bem sucedida as operações e os ajustamentos que se venham a revelar necessários.”;
361. Na sequência desta intervenção do Recorrente AA, “a Comissão Executiva deliberou que fosse suspendida a venda de papel comercial emitido pela EI..., S.A a clientes do B..., não se procedendo à colocação renovada do que for atingindo a maturidade”;
362. Tendo o B... decidido suspender a colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A, esta sociedade deixou, a partir de Dezembro de 2013, de emitir e colocar dívida junto dos clientes do B..., o que colocou em causa o seu financiamento, bem como do denominado “G...”;
363. A 18 de dezembro de 2013, em reunião ordinária da Comissão Executiva do B..., com a presença de todos os seus membros, e em que estiveram presentes, também, os membros da ... apresentou aos demais presentes na reunião um novo ponto de situação sobre o ETRICC2;
364. Na respectiva acta da referida reunião da Comissão Executiva do B... ficou a constar o seguinte:
“O Dr. AA informou em seguida a Comissão Executiva da carta enviada pela E..., S.A ao Banco de Portugal (BdP) no passado dia 10, em que se dá nota do novo plano de desalavancagem apresentado pela EI..., S.A (EI..., S.A) e das ações propostas pelo E..., S.A para responder às questões anteriormente suscitadas pelo BdP sobre esta matéria, v.g. na carta enviada para aquela instituição no passado dia 3. Na carta enviada pela E..., S.A ao BdP na referida data, consta que a EI..., S.A se propõe reduzir a sua dívida total em 1,5 mil milhões € e 3,5 mil milhões €, respetivamente até ao final de 2014 e de 2018, atingindo em 2023 um valor total dos activos de 3,5 mil milhões € e uma dívida 2 mil milhões €. Este esforço muito significativo inicia-se com um conjunto de iniciativas que, nos próximos 6 meses, irão eliminar uma exposição directa e indirecta ao E..., S.A. No seu conjunto, estas iniciativas, que incluem um aumento de capital e outras entradas de fundos, bem como a alienação das participações na ..., ..., ... e ... – sem que existam financiamentos ou garantias concedidas pelo E..., S.A – permitirão à EI..., S.A liquidar um total de 1.450 milhões € de papel comercial, reduzindo a correspondente exposição total para 247 milhões € em Maio p.f..”;
365.     A 31 de Janeiro de 2014, em reunião ordinária do Conselho de Administração do B..., com a presença de todos os seus membros com excepção de SSS e VVV, e em que esteve presente, também, uma representante do Revisor Oficial de Contas do B..., a K..., o Recorrente EE apresentou aos demais presentes uma síntese das conclusões do ETRICC2;
366. Nessa reunião do Conselho de Administração, o seu Presidente, RRR, informou os demais presentes que “no início de Dezembro, foi chamado a uma reunião com o Senhor Vice-Governador do Banco de Portugal, Prof. Dr. QQQQQ, e, dois dias depois, com o próprio Senhor Governador daquela instituição, Dr. SSSSS, em que lhe foi dado a conhecer que, em resultado dos trabalhos levados a efeito no âmbito do referido ETRICC, havia sido detectado na EI..., S.A (EI..., S.A) – empresa do G... não incluída no perímetro de consolidação da E..., S.A – um expressivo crescimento do passivo.”;
367. Na referida reunião, AA prestou os seguintes esclarecimentos:
“EI..., S.A, sociedade fechada, não cotada em bolsa, do G... que agrega as participações das suas áreas financeira e não financeira, não dispunha até então de contas auditadas, tendo-se procedido a um exercício de consolidação pro forma das suas contas individuais com as das suas participadas, v.g. da E... Limited [sic], incluindo análise integrada dos passivos abrangendo as responsabilidades directas e indirectas colocadas junto de Clientes em Portugal e no exterior. Constatou-se, na preparação para o exercício do ETRICC existir uma disparidade nas contas da EI..., S.A, ocorrência esta tornada possível em resultado da fragilidade da equipa de gestão daquela sociedade, a qual se verificou ser inadequada para detectar o problema e gerir financeiramente a empresa.
Face a esta constatação, a E..., S.A informou de imediato o Banco de Portugal da situação, tendo este tomado um conjunto de medidas, comunicadas à E..., S.A através de cartas, já antes mencionadas pelo Senhor Presidente do Conselho de Administração, com vista a evitar que da referida disparidade pudessem eventualmente resultar impactos no B... ou nos clientes do B....
Na altura existia um total de aproximadamente 1,7 mil milhões € de papel comercial emitido pela EI..., S.A e vendido a clientes da rede de Retalho do B..., tendo o Banco de Portugal decidido suspender de imediato a colocação do papel comercial e proceder ao reembolso do existente, nas respectivas datas de vencimento, até que esteja cabalmente clarificada e resolvida a situação da EI..., S.A. Em virtude dessa decisão, tomada na reunião da Comissão Executiva do B... de 4 de Dezembro p.p. foi já amortizada ca, 45% do referido montante de papel comercial existente em clientes de retalho do Banco, devendo o remanescente ser reembolsado nos vencimentos no decurso dos próximos meses.”;
368.     O Recorrente AA esclareceu ainda os demais presentes na referida reunião do Conselho de Administração do B... que “o G... iniciou já um processo de reestruturação aprofundada, v.g. de modo a i) simplificar a sua estrutura de participações, ii) separar mais claramente as áreas financeira e não financeira e iii) reforçar na medida do necessário a equipa de meios de controlo de gestão nas principais entidades que o integram.”;
369. No contexto da referida reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, o Conselho Superior do G... decidiu, em 7 de Janeiro de 2014, estando presentes, designadamente, os Recorrentes AA, BB, CC e DD, a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
370. O Conselho Superior do G... era constituído por representantes dos cinco acionistas de controlo do G..., sendo um órgão para-societário, onde eram tomadas decisões sobre os negócios estratégicos para o grupo pelos seus principais accionistas, que se assumia como um centro decisório desse grupo, sendo-lhe reconhecido poder para, de facto, determinar que as sociedades integradas no grupo agissem de acordo com as decisões que tomava ( );
371.     À data da prática dos factos em causa no presente processo de contra-ordenação, o Conselho Superior do G... era composto pelas seguintes pessoas:
(i)        XXXX (Presidente);
(ii)       YYYY;
(iii)      AA;
(iv)      BB;
(v)       CC;
(vi)      QQQ;
(vii)     HHH;
(viii)    PPP;
(ix)      AAAAA.
372. As reuniões do Conselho Superior do G... eram secretariadas por JJJ;
373.     A proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, discutida e decidida na referida reunião do Conselho Superior do G... foi apresentada pelo Recorrente DD e por TTTTT, Directora do Gabinete de Reorganização Estratégica do B...;
374.     A referida reestruturação visava transformar a R..., S.A na holding das participações sociais do denominado “G...” na área financeira e não financeira, de acordo com o seguinte esquema:
375.     A referida proposta foi preparada por uma equipa composta por RR, JJJ, NN e PP (doravante simplesmente PP), funcionário da E... Limited. e subordinado hierárquico de JJJ;
376.     A participação de RR na referida equipa foi solicitada pelo Recorrente DD, tendo-lhe sido transmitido por este que o objetivo da constituição dessa equipa era o de analisar os impactos e as necessidades de financiamento da operação de concentração, pela R..., S.A, da participação do denominado “G...” na E..., S.A;
377. A referida equipa preparou a sua proposta durante a segunda metade do mês de Dezembro de 2013 e a primeira semana de Janeiro de 2014;
378. Em algumas das reuniões de preparação da proposta participaram, para além dos referidos RR, JJJ, NN e PP, os Recorrentes AA, BB, DD e EE, bem como UU, LLLLL, VV e colaboradores do BEl....
379. A referida proposta, aprovada na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, continha já a descrição dos contratos a celebrar, nomeadamente quanto aos preços das compras e vendas e impactos financeiros dos mesmos ao nível da R..., S.A;
380. As minutas dos contratos celebrados em execução da decisão tomada no Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2017 foram preparadas com a colaboração do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...;
381. A operação de aquisição da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A implicou a celebração dos seguintes contratos:
(i) Aquisição, pela R..., S.A à Ein..., S.A. (Ein..., S.A), da totalidade do capital social e suprimentos da Ein..., S.A., pelo preço de € 364.340.000,00;
(ii) Aquisição, pela R..., S.A à Ein..., S.A, da totalidade do capital social, suprimentos e prestações acessórias da Esc..., S.A., pelo preço de € 72.999.659,24;
(iii) Aquisição, pela R..., S.A à E... Limited, da totalidade do capital social e suprimentos da B... SGPS, S.A., pelo preço de € 106.060.000,00;
(iv) Aquisição, pela R..., S.A à E... Limited, de uma participação social correspondente a 8,3% e prestações suplementares do capital social da Esa... SGPS S.A, pelo preço de € 100.884.007,00;
382. A 31 de Dezembro de 2013:
(i) a Ein..., S.A. detinha uma participação social equivalente a 43,3% do capital social da Esa... SGPS S.A;
(ii) a Esc..., S.A. detinha uma participação social equivalente a 24,7% do capital social da Esa... SGPS S.A;
(iii) a B... SGPS, S.A. detinha uma participação social equivalente a 23,7% do capital social da Esa... SGPS S.A;
383.     O preço global pago pela R..., S.A pela aquisição, directa e indirecta, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A foi, assim, de € 644.283.666,24;
384.     O preço total fixado para a aquisição, pela Esa... SGPS S.A, da referida participação social correspondente a 39,23% do capital social da E..., S.A foi de € 1.711.552.445,75, correspondente a uma valorização de cada acção da E..., S.A a € 21,07;
385.     Para pagamento parcial do referido preço, a R..., S.A cedeu à Esa... SGPS S.A, também com referência a 31 de Dezembro de 2013, a totalidade dos créditos que, naquela data, detinha sobre a EI..., S.A e sobre a E... Limited, nos valores de, respectivamente, € 553.675.321,12 e € 368.878.341,98;
386.     E, para pagamento do remanescente do preço, a R..., S.A emitiu dívida de curto prazo;
387.     Em resultado das operações descritas, a R..., S.A aumentou de forma significativa o seu passivo corrente, tendo diminuído, também de forma acentuada, o seu activo corrente;
388. E, consequentemente, em resultado das operações descritas, a liquidez de curto-prazo da R..., S.A passou a ser negativa;
389. E o rácio de solvabilidade da R..., S.A sofreu também uma redução acentuada;
390.     Assim, em resultado das operações descritas, a capacidade da R..., S.A de liquidar os seus compromissos de curto prazo foi afectada;
391. Para além dos impactos financeiros, na sequência das operações realizadas, a R..., S.A passou a estar exposta aos riscos inerentes ao ramo financeiro do G...;
392.     A 23 de Janeiro de 2014, a E..., S.A comunicou ao mercado, através do ... (...) da CMVM o seguinte:
“(i) On 22 January 2014 Esa... SGPS S.A. (“Esa... SGPS S.A”) bought 81,231,725 E..., S.A shares, equivalent to 39.23% of E..., S.A issued capital and voting rights, from EI..., S.A. (“EI..., S.A”).
(ii) As at that date Esa... SGPS S.A already held 20,763,911 shares, corresponding to 10.03% of E..., S.A issued capital and voting rights. After the purchase of the additional shares Esa... SGPS S.A holds 101,995,636 shares equivalent to 49.26% of E..., S.A issued capital and voting rights.
(iii) Esa... SGPS S.A has been and continues to be 100% held, indirectly, by EI..., S.A. Esa... SGPS S.A voting rights are 100% held by R..., S.A. which in turn is held 100% by EI..., S.A.
(iv) Consequently as at 22 January 2014, 49.26% of E..., S.A voting rights continue to be held indirectly by EI..., S.A.” ( )
393. O objectivo da concentração, na R..., S.A, da participação do denominado “G...” na E..., S.A era o de permitir obter financiamento para o denominado “G..., através da emissão de dívida por parte da R..., S.A;
394. A 14 de Fevereiro de 2014, o Banco de Portugal proibiu a comercialização de dívida de entidades do ramo não financeiro do G... junto de clientes de retalho;
*
Secção III – Do(s) conflito(s) de interesses na colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A:
Subsecção I – Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
395. Na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, o B... não apresentou uma estrutura capaz de identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, QQQ e HHH e os interesses dos clientes do B...;
396. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era gerido pela Epi..., S.A, sociedade dominada pelo B...;
397. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
398. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a dar cumprimento às obrigações assumidas perante esta sua cliente nos “Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial” celebrados entre a EI..., S.A, o BEl... e o B...;
399. A Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era por si gerido;
400. A EI..., S.A tinha interesse que o B... colocasse o papel comercial por si emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do seu papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como assegurar o seu financiamento, bem como de todo o denominado “G...”;
401. Os Recorrentes AA, BB e CC e também QQQ e HHH, administradores do B... e da EI..., S.A, tinham interesse em captar para a EI..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G...;
402. Os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da EI..., S.A;
403. Na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, o B... não assegurou aos seus clientes que subscreveram esse papel comercial um diálogo e um trato transparente e recto ( );
404. O B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, deu prevalência aos interesses da EI..., S.A (em que o B... colocasse o papel comercial por si emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do seu papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o seu financiamento, bem como de todo o G...) face aos interesses dos seus outros clientes que subscreveram o referido papel comercial (em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da EI..., S.A);
405. Na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, o B... deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como aos interesses da Epi..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (os Recorrentes AA, BB e CC e também de PPP, QQQ e HHH igualmente administradores da EI..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
Subsecção II – Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A:
406.     Na tomada de decisão de prosseguir a comercialização ( ) de papel comercial a emitir pela R..., S.A, o B... não apresentou uma estrutura capaz de identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., nem tão pouco actuou de modo a evitar ou reduzir ao mínimo o risco da ocorrência desses conflitos de interesses;
407. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela R..., S.A, de forma a assegurar à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era gerido pela Epi..., S.A, sociedade dominada pelo B...;
408. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela R..., S.A, de forma a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
409. O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela R..., S.A, de forma a dar cumprimento às obrigações assumidas perante esta sua cliente no “Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial” celebrados entre a R..., S.A, o BEl... e o B...;
410. A Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela R..., S.A, de forma a assegurar à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era por si gerido;
411. A R..., S.A tinha interesse que o B... colocasse o papel comercial por si emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do seu papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o seu financiamento, bem como de todo o denominado “G...”;
412. O Recorrente CC, administrador do B... e da R..., S.A, tinha interesse em captar para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da R..., S.A e de todo o denominado “G...”;
413. Os Recorrentes AA e BB e também QQQ e HHH, administradores do B... e da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A, tinham interesse em captar para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da R..., S.A e de todo o denominado “G...”;
414.     Os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da R..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da R..., S.A divulgadas aos clientes que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014;
415. Na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, o B... não garantiu aos seus clientes que subscreveram esse papel comercial um tratamento transparente e recto ( );
416. O B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, deu prevalência aos interesses da R..., S.A (em que o B... colocasse o papel comercial por si emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do seu papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o seu financiamento, bem como de todo o G...) face aos interesses dos seus outros clientes que subscreveram o referido papel comercial (em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da R..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da R..., S.A);
417 Na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, o B... deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como aos interesses da Epi..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (o Recorrente CC, igualmente administrador da R..., S.A, bem como os Recorrentes AA e BB e também PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
*
Secção IV – Da informação prestada aos clientes que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A:
Subsecção I – A informação respeitante ao papel comercial da EI..., S.A:
418. No âmbito do processo de comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A, o B... disponibilizou aos clientes que subscreveram o referido papel comercial, identificados nos Anexos A a D da decisão administrativa (que acima se consideraram reproduzidos), as Notas Informativas identificadas nos pontos 297 e 298 supra;
419. Na pág. 15 das referidas Notas Informativas constavam as demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A relativas aos anos de 2010, 2011 e 2012 com o seguinte conteúdo:

*
a) Dos valores constantes das demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A sob as rubricas “Notes”, “Passivo” e “Capital Próprio”:
420. Nas demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A constantes da pág. 15 das Notas Informativas encontram-se registados sob a rubrica “Notes”, os seguintes valores:
(i)        Quanto ao ano de 2010, o valor de € 808.065.000,00;
(ii)       Quanto ao ano de 2011, o valor de € 1.043.548.000,00; e
(iii)      Quanto ao ano de 2012, o valor de € 1.569.063.000,00.
421. Os valores registados sob a rubrica “Notes”, constantes da pág. 15 das Notas Informativas, não correspondem aos valores reais das “Notes” emitidas pela EI..., S.A nos anos de 2010, 2011 e 2012, sendo inferiores;
422. Designadamente, nas referidas demonstrações financeiras, não estão registados sob a rubrica “Notes”, devendo estar por serem os valores reais das “Notes” emitidas pela EI..., S.A nas respectivas datas, os seguintes valores:
(i)        Quanto ao ano de 2010, o valor de € 1.536.065.000,00;
(ii)       Quanto ao ano de 2011, o valor de € 1.999.802.000,00; e
(iii)      Quanto ao ano de 2012, o valor de € 2.900.105.000,00;
423. Entre os valores que constam das referidas demonstrações financeiras sob a rubrica “Notes” e os valores que efectivamente deviam aí constar verifica-se uma diferença de:
(i)        € 728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011; e
(iii)      € 1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012;
424. Em suma, as notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A entre 09/09/2013 e 06/12/2013 contêm informação:
a. Em que o valor real da rubrica “Notes” era superior ao valor constante das notas informativas, sendo, em 2010, € 1.536.065.000,00 (e não € 808.065.000,00), em 2011, € 1.999.802.000,00 (e não € 1.043.548.000,00), e, em 2012, € 2.900.105.000,00 (e não € 1.569.063.000,00);
b. Em que na rubrica “Notes” não constam € 728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010, € 956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011e € 1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012.
425. Nas demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A constantes da pág. 15 das notas informativas encontram-se registados sob a rubrica “Passivo” os seguintes valores:
(i)        € 2.341.432.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 2.488.896.000,00, relativamente ao ano de 2011; e
(iii)      € 3.353.497.000,00, relativamente ao ano de 2012.
426. Os valores registados sob a rubrica “Passivo”, constantes das notas informativas não correspondem ao valor real do Passivo da EI..., S.A nos anos de 2010, 2011 e 2012, sendo inferiores;
427. Designadamente, nas referidas demonstrações financeiras constantes da pág. 15 das notas informativas não estão registados sob a rubrica “Passivo”, devendo estar por serem os valores reais do passivo da EI..., S.A nas respetivas datas, os seguintes valores:
(i)        € 3.069.432.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 3.445.150.000,00, relativamente ao ano de 2011; e
(iii)      € 4.684.539.000,00, relativamente ao ano de 2012;
428. Entre os valores que constam das referidas das demonstrações financeiras sob a rubrica “Passivo” e os valores que efectivamente deviam aí constar verifica-se uma diferença de:
(i)        € 728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011; e
(iii)      € 1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012;
429. As notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A entre 09/09/2013 e 06/12/2013 contêm informação:
a. Em que o valor real da rubrica “Passivo” era superior ao valor constante das notas informativas, sendo, em 2010, € 3.069.432.000,00 (e não € 2.341.432.000,00), em 2011, € 3.445.150.000,00 (e não € 2.488.896.000,00), e em 2012, € 4.684.539.000,00 (e não € 3.353.497.000,00);
b. Em que na rubrica “Passivo” não constam €728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010, €956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011 e €1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012;
430. Nas demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A constantes da pág. 15 das notas informativas encontram-se registados sob a rubrica “Capital Próprio”, os seguintes valores:
(i)        € 1.172.745.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 867.288.000,00, relativamente ao ano de 2011;
(iii)      € 854.580.000,00, relativamente ao ano de 2012.
431. Os valores registados sob a rubrica “Capital Próprio”, constantes das notas informativas, não correspondem ao valor real do Capital Próprio da EI..., S.A nos anos de 2010, 2011 e 2012, sendo superiores;
432. Designadamente, nas referidas demonstrações financeiras constantes da pág. 15 das notas informativas não estão registados sob a rubrica “Capital Próprio”, devendo estar por serem os valores reais do capital próprio da EI..., S.A nas respetivas datas, os seguintes valores:
(i)        € 444.745.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       €– 88.966.000,00, relativamente ao ano de 2011;
(iii)      €– 476.462.000,00, relativamente ao ano de 2012.
433. Entre os valores que constam das referidas das demonstrações financeiras sob a rubrica “Capital Próprio” e os valores que efectivamente deviam aí constar verifica-se uma diferença de:
(i)        € 728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010;
(ii)       € 956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011;
(iii)      € 1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012.
434. As notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A entre 09/09/2013 e 06/12/2013 contêm informação:
a. Em que o valor (real) da rubrica “Capital Próprio” era inferior ao valor constante das notas informativas, sendo, em 2010, €444.745.000,00 (e não €1.172.745.000,00), em 2011, - €88.966.000,00 (e não €867.288.000,00), e em 2012, – €476.462.000,00 (e não €854.580.000,00);
b. Em que na rubrica “Capital Próprio” não constam €728.000.000,00, relativamente ao ano de 2010, €956.254.000,00, relativamente ao ano de 2011 e €1.331.042.000,00, relativamente ao ano de 2012;
*
b) Do agravamento da situação financeira da EI..., S.A durante o ano de 2013:
435. A informação financeira da EI..., S.A constante nas Notas Informativas disponibilizadas aos clientes subscritores de papel comercial reportava-se aos exercícios findos em 31/12/2010, 31/12/2011 e 31/12/2012;
436. Durante os nove primeiros meses de 2013, a EI..., S.A emitiu notes no montante de € 1.056.366.000,00;
437.     Durante o mesmo período (nove primeiros meses de 2013), a EI..., S.A contraiu empréstimos e acréscimos e diferimentos no total de €543.910.000,00;
438. A emissão de notes no valor de €1.056.366.000,00 e a contracção de empréstimos e acréscimos e diferimentos no valor de €543.910.000,00 agravaram o passivo da EI..., S.A em mais €1.600.276.000,00 durante esse período;
439.     Parte da dívida contraída pela EI..., S.A nos primeiros nove meses de 2013 destinava-se à realização de investimentos, pela EI..., S.A e pela Esr..., junto da sociedade Eurf...;
440. As Notas Informativas do papel comercial, duas delas datadas de “setembro de 2013”, outra datada de “25 de setembro de 2013” e outra datada de “15 de outubro de 2013”, não continham referência ao agravamento do passivo da EI..., S.A em € 1.600.276.000,00 ocorrido durante os primeiros três trimestres de 2013;
441. O agravamento do passivo da EI..., S.A em € 1.600.276.000,00, durante o ano de 2013, não foi divulgado aos clientes que subscreveram papel comercial desta sociedade entre 09/09/2013 e 06/12/2013;
442. O agravamento do passivo da EI..., S.A em €1.600.276.000,00, durante os três primeiros trimestres de 2013, tinha importância significativa para a actividade da EI..., S.A e era susceptível de afectar a sua rentabilidade;
443.     À data de início da colocação de papel comercial, em face do agravamento do passivo durante os nove primeiros meses de 2013 e do valor de € 1.331.042.000,00 que não constava da rubrica “Notes” respeitante ao exercício findo em 31/12/2012 constante das demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A, como se demonstrou anteriormente,
a) o valor total de notes emitido pela EI..., S.A era já de € 3.956.471.000,00, quando nas Notas Informativas disponibilizadas aos clientes do B... constava apenas o valor de € 1.569.063.000,00;
b) o valor total de empréstimos e acréscimos e diferimentos era já de €2.385.719.000,00, quando nas Notas Informativas constava apenas o valor de €1.841.809.000,00;
c) o valor do passivo total da EI..., S.A era já de €6.342.190.000,00, quando nas Notas Informativas constava apenas o valor de €3.410.872.000,00;
444.     E ainda que não se verificasse a referida ocultação do valor de €1.331.042.000,00 da rubrica “Notes” respeitante ao exercício findo em 31/12/2012, à data de início da colocação de papel comercial,
a) a EI..., S.A tinha dívida emitida no valor total de 2.625.429.000,00 €, mais €1.056.366.000,00 em relação ao valor registado sob a rubrica “Notes” em 31/12/2012, que era de €1.569.063.000,00 e que se encontrava divulgado nas referidas Notas Informativas aos clientes subscritores de papel comercial;
b) a EI..., S.A tinha contraído um total de € 2.385.719.000,00 em empréstimos e acréscimos e diferimentos, mais € 543.910.000,00, em comparação com o valor registado sob essas rubricas e que se encontrava divulgado nas referidas Notas Informativas aos clientes subscritores de papel comercial, que era de € 1.841.809.000,00;
c) ou seja, o passivo total (empréstimos, notes e acréscimos e diferimentos) da EI..., S.A era de € 5.011.148.000,00, mais €1.600.276.000,00 face ao valor do passivo total (empréstimos, notes e acréscimos e diferimentos) registado no exercício findo em 31/12/2012 e apresentado nas demonstrações financeiras individuais constantes das referidas Notas Informativas que era de € 3.410.872.000,00;
445. Considerando o valor total do passivo da EI..., S.A, em Setembro de 2013, que era pelo menos de € 5.011.148.000,00, a situação patrimonial da EI..., S.A era negativa, o que comprometia a sua capacidade para reembolsar a dívida emitida;
446. Em suma, as notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A entre 09/09/2013 e 06/12/2013 contêm informação que:
a. não contém a referência ao agravamento do passivo da EI..., S.A durante os nove primeiros meses de 2013;
b. não reflecte o agravamento do passivo da EI..., S.A, respeitante à emissão de notes por parte desta sociedade no valor de € 1.600.276.000,00, durante os nove primeiros meses de 2013, não revelando a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A, à data da emissão do papel comercial, nem à data da sua comercialização junto dos clientes do B...;
*
Subsecção II – A informação respeitante ao papel comercial da R..., S.A prestada pelo B... aos clientes que o adquiriram entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014:
447. No âmbito do processo de comercialização de papel comercial emitido pela R..., S.A, entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, o B... disponibilizou aos clientes que subscreveram o referido papel comercial, identificados nos Anexos E e F, da decisão administrativa que se consideram reproduzidos, as notas informativas de “6 de Janeiro de 2014” e de “16 de Janeiro de 2014”, melhor identificadas no ponto 299 supra;
448. Nas páginas 6 a 9 das referidas notas informativas consta a identificação e descrição dos “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respectiva Actividade”, designadamente “Deterioração dos mercados financeiros e do ambiente económico”, “Risco de Mercado”, “Risco cambial”, “Risco de Preço”, “Risco de Taxa de Juro”, “Risco de Crédito”, “Risco Operacional” e “Risco de Liquidez”;
449. Nas páginas 9 a 14 das referidas notas informativas consta “Informação sobre a Entidade Emitente”, sendo que nas páginas 11 a 14 consta uma descrição dos sectores de actividade em que a R..., S.A actuava;
450. Nas páginas 15 a 17 das referidas notas informativas constam as demonstrações financeiras consolidadas da R..., S.A, relativas a 2010, 2011 e 2012;
451. Nas páginas 18 e 19 das referidas notas informativas constam as demonstrações financeiras individuais da R..., S.A, relativas a 2010, 2011 e 2012;
*
a) Da informação respeitante aos riscos relacionados com a Emitente e a respectiva actividade:
452.     A aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A, teve impacto ao nível dos “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respectiva Actividade”, designadamente ao nível do “Risco cambial”, “Risco de Preço”, “Risco de Taxa de Juro”, “Risco de Crédito”, “Risco Operacional” e “Risco de Liquidez”;
453.     Das notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A, entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, não constam os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível do “Risco Cambial”, do “Risco de Preço”, do “Risco de Taxa de Juro”, do “Risco de Crédito”, do “Risco Operacional” e do “Risco de Liquidez”;
454.     Em suma, as notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 contêm informação que:
- não contém os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível dos “Riscos Relacionados com a Entidade Emitente e a Respectiva Actividade”, designadamente quanto ao “Risco Cambial”, ao “Risco de Preço”, ao “Risco de Taxa de Juro”, ao “Risco de Crédito”, ao “Risco Operacional” e ao “Risco de Liquidez”;
- não reflecte os factores de risco inerentes à emitente e às suas actividades à data da emissão do papel comercial, nem à data da comercialização do papel comercial junto dos clientes do B...;
*
b) Da informação sobre a Emitente e a sua actividade:
455. A aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A teve impacto ao nível da actividade da R..., S.A;
456. Em resultado da aquisição, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A, a R..., S.A passou a actuar no sector de actividade dos “Serviços Financeiros”;
457. Das notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A, entre, peo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, não constam, devendo constar, os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível da descrição da actividade da Emitente, nem ao nível da descrição dos sectores de actividade em que a R..., S.A investia;
458. Em suma, as notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 contêm informação que:
a. não contém a referência à participação qualificada detida pela R..., S.A na E..., S.A, nem ao sector de actividade dos “Sectores Financeiros”, em que esta participada da R..., S.A actuava;
b. não descreve todas as actividades da R..., S.A nem todos os sectores de actividade (omitindo o sector de actividade dos “Serviços Financeiros) em que a mesma investia à data da emissão do papel comercial, nem à data da comercialização do papel comercial junto dos clientes do B...; e
c. não contém a descrição de todas as actividades da emitente e todos os sectores de actividade em que a mesma investia;
*
c) Da informação sobre as Demonstrações Financeiras Consolidadas e Individuais da Emitente:
459.     A aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, representou um aumento do activo total da R..., S.A;
460.     As transacções levadas a cabo pela R..., S.A, tendentes à aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, implicaram, igualmente, uma diminuição do activo corrente e um aumento do passivo total;
461.     Em consequência da aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a liquidez de curto prazo da R..., S.A, passou a ser negativa;
462.     Em consequência da aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a solvabilidade da R..., S.A, foi afectada, tendo o rácio de solvabilidade sofrido uma redução de 23%, passando de 52%, em 31 de Dezembro de 2012, para 29%;
463.     Das notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não consta uma advertência de que existem alterações significativas e materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A;
464.     Em suma, as notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 contêm informação que:
a. não contém uma advertência de que existem alterações materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49, 26% do capital social da E..., S.A;
b. não reflecte a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A e, consequentemente a real situação financeira e patrimonial da sociedade à data da emissão do papel comercial, nem à data da sua comercialização junto dos clientes do B...;
*
Secção V – Da participação dos Recorrentes nos factos em causa nos presentes autos: ( )
Subsecção I – O Recorrente Haitong:
465. O Haitong decidiu celebrar com a EI..., S.A e o B... dois Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial;
466. O Haitong decidiu celebrar com a R..., S.A e o B... um Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
467. O Haitong assumiu contratualmente as funções de entidade líder e agente do programa de papel comercial emitido pela EI..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
468. O Haitong assumiu contratualmente as funções de entidade líder e agente do programa de papel comercial emitido pela R..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a R..., S.A, o B... e o BEl...;
469. Nessa qualidade de Líder e Agente do programa de papel comercial emitido pela EI..., S.A, o Haitong, através da sua Direcção de Mercado de Capitais, elaborou as Notas Informativas do papel comercial;
470. O Haitong introduziu nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A as demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, de acordo com a informação transmitida pelo Emitente;
471.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A informação sobre os montantes totais da dívida titulada, do passivo e do capital próprio da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
472. O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A a informação respeitante ao aumento do passivo da EI..., S.A, no montante de € 1.600.276.000,00, ocorrido nos primeiros nove meses do ano de 2013;
473. Na qualidade de Líder e Agente do programa de papel comercial emitido pela R..., S.A, o Haitong, através da sua Direcção de Mercado de Capitais, elaborou as Notas Informativas do papel comercial;
474. O Haitong introduziu nas Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A as demonstrações financeiras consolidadas (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa) da R..., S.A, relativas a 2010, 2011 e 2012 e as demonstrações financeiras individuais (balanço e demonstração de resultados) da R..., S.A, de acordo com a informação transmitida por esta emitente;
475. O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 a informação respeitante aos impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível do “risco cambial”, do “risco de preço”, do “risco de taxa de juro”, do “risco de crédito”, do “risco operacional” e do risco de liquidez”;
476.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 a informação respeitante a referência à participação qualificada detida pela R..., S.A na E..., S.A, nem ao sector de actividade dos “Sectores Financeiros”, em que esta participada da R..., S.A actuava;
477.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 uma advertência de que existiam alterações significativas e materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A;
478.     O Recorrente agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos;
479.     Com efeito, o Recorrente Haitong:
a. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
b. Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
c. Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
d. Todavia:
(a) quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre setembro e dezembro de 2013, fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada;
(b) quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre Janeiro e Fevereiro de 2014 fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada;
Subsecção III – Do Recorrente AA:
480.     O Recorrente AA foi Administrador do B... e presidente da sua Comissão Executiva entre Setembro de 1991 e 13 de Julho de 2014;
481. Na qualidade de presidente da Comissão Executiva do B... tinha, à data da prática dos factos, para além de outros pelouros, a presidência do Comité ALCO;
482. Foi eleito Presidente do Conselho de Administração do BEl... na assembleia geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016;
483. Era, à data da prática dos factos, administrador da EI..., S.A;
484. Era, à data da prática dos factos, membro do Conselho Superior do G...;
485. O Recorrente AA era, à data da prática dos factos, administrador da Es...;
486. Era, à data da prática dos factos, enquanto administrador da Es... e da EI..., S.A superior hierárquico directo de III;
487.     O Recorrente AA participou na reunião do Comité ALCO do B... realizada no início do verão de 2013 em que foi avançada a possibilidade de ser oferecida aos clientes do B... a oportunidade de subscreverem o papel comercial de sociedades do G... (EI..., S.A e R..., S.A), de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidade de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
488. Participou nas reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A em que se discutiu a possibilidade da EI..., S.A e da R..., S.A emitirem papel comercial a colocar junto de clientes do B... de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz...;
489. Participou na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, que aprovou o início da comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A junto dos clientes do B...;
490.     Participou nas reuniões do Comité ALCO subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A colocados em clientes do B...;
491.     Anualmente, após a preparação do draft das demonstrações financeiras da EI..., S.A por CCC, III apresentava esse draft, em ..., ao Recorrente AA e a JJJ;
492.     Na sequência das reuniões anuais de apresentação do draft das contas entre III e o Recorrente AA, este último solicitou, pelo menos no que diz respeito às contas referentes aos anos de 2008 a 2012, a III a alteração das contas de final do ano;
493.     Tal solicitação visava ocultar uma parte do passivo da EI..., S.A;
494. Após a introdução das alterações por si ordenadas, AA aprovou, em cada ano, o draft das demonstrações financeiras da EI..., S.A;
495. O Recorrente AA, na qualidade de administrador da EI..., S.A, acompanhava e apreciava a situação financeira da EI..., S.A, juntamente com JJJ, III e CCC;
496. O Recorrente AA, na qualidade de administrador da EI..., S.A, era superior hierárquico de III e JJJ;
497. Era o administrador da EI..., S.A responsável pela gestão da tesouraria da EI..., S.A e de todo o denominado grupo “G...”;
498. O Recorrente AA era informado por JJJ, semanalmente, do valor total do passivo da EI..., S.A, bem como das necessidades de refinanciamento desse passivo;
499. JJJ reportava ao Recorrente AA informação sobre a situação da tesouraria da EI..., S.A, cabendo a este último decidir da sua gestão e da emissão de instrumentos financeiros para fazer face às necessidades de tesouraria da EI..., S.A;
500. Quando a EI..., S.A não tinha capacidade de captação de fundos para esse reembolso, JJJ solicitava, para esse efeito, a colaboração de UU, na qualidade de diretora do DFME do B... e do Recorrente AA;
501. O DFME do B... e o Recorrente AA diligenciavam, então, no sentido da EI..., S.A obter os fundos de que necessitava, concretamente dando a indicação de que esta deveria emitir notes ou papel comercial para se financiar;
502.     O Recorrente AA era a pessoa de contacto da EI..., S.A no B...;
503. O Recorrente AA decidiu, no decurso dos primeiros nove meses de 2013, que a EI..., S.A deveria emitir dívida titulada e contrair empréstimos no montante de cerca de € 1.600.276.000,00;
504. Decidiu o destino a dar pela EI..., S.A a este montante angariado pela EI..., S.A, destinando-se parte do mesmo a investimentos da EI..., S.A e Esr... na sociedade Eurf...;
505. Foi, ainda alertado, no segundo trimestre de 2013, por JJJ, para o agravamento da situação financeira da EI..., S.A, resultante desse aumento do seu endividamento para fazer face aos investimentos na Eurf...;
506. Em data anterior a 15 de novembro de 2013, numa reunião com a presença de VV, JJJ e do Recorrente AA, III apresentou folhas de papel soltas com a dívida das holdings do G..., reportada a 30 de Setembro de 2013;
507. III elaborava, anualmente, um balanço consolidado da EI..., S.A, em formato pró-forma, apenas para informação interna da EI..., S.A;
508. Nas reuniões anuais de apresentação do draft das contas, III apresentava ao Recorrente AA um balanço consolidado “pro-forma” da EI..., S.A;
509. O Recorrente AA tomou a decisão de não serem elaboradas e aprovadas contas consolidadas da EI..., S.A;
510. O Recorrente AA participou na reunião da Comissão Executiva do B..., realizada a 4 de Dezembro de 2013, que deliberou a suspensão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A;
511. Participou em algumas das reuniões de preparação da proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações;
512. Participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
513. O Recorrente AA, para além de ter praticado os factos descritos, não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas (com excepção da sua participação na reunião da Comissão Executiva do B..., de 4 de Dezembro de 2013);
514. O Recorrente AA agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos ( );
515.     Com efeito, o Recorrente AA:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre 9 de Setembro e 6 de Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, disponibilizando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A;
iii. Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não reveleva a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...; 
iv. Sabia que o B... comercializou, entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
v. Sabia que era administrador da EI..., S.A e participou na decisão do B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
vi. Sabia que a EI..., S.A era a acionista única da R..., S.A;
vii. Sabia que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, não tinha uma estrutura capaz de identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
viii. Sabia que o B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
ix. Sabia que a Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
x. Sabia que a EI..., S.A e a R..., S.A tinham interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial por elas emitido;
xi. Sabia que os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A e da R..., S.A;
xii. Sabia que o B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto;
xiii. Sabia que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da EI..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (o Recorrente CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os Recorrentes AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
xiv. Todavia:
(i) quis que o B... colocasse papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 a informação supra identificada, nos exatos termos em que esta foi prestada;
(ii) quis, a partir de, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes;
(iii) quis participar na decisão de o B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
(iv) quis que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, não lograsse organizar-se de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
(v) quis que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto;
(vi) quis que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (o arguido CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os arguidos AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
(vii) quis não adotar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
516. Ao participar na tomada de decisão emanada do Conselho Superior do G..., de 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente AA previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
517. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, AA previu como possível que o B..., na tomada de decisão de continuação da comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
518. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, AA previu como possível que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
519. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, AA previu como possível que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
*
Subsecção IV – Do Recorrente BB:
520. O Recorrente BB foi Administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva entre Abril de 1992 e 13 de Julho de 2014;
521. Na qualidade de membro da Comissão Executiva do B... tinha, para além de outros, os pelouros dos Departamentos de ... e de...;
522. Foi eleito Administrador do BEl... na assembleia geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016;
523. O Recorrente BB era, à data da prática dos factos, administrador da EI..., S.A;
524. Era, à data da prática dos factos, membro do Conselho Superior do denominado “G...”;
525. Era, à data da prática dos factos, administrador da Es...;
526. O Recorrente BB participou na reunião do Comité ALCO do B... realizada no início do Verão de 2013 em que foi avançada a possibilidade de ser oferecida aos clientes do B... a oportunidade de subscreverem o papel comercial de sociedades do denominado “G...”, de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
527. Participou nas reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A em que se discutiu a possibilidade de a EI..., S.A emitir papel comercial a colocar junto de clientes do B... de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz...;
528. Participou na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, que aprovou o início da comercialização do papel comercial junto dos clientes do B...;
529. Participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 2 de Outubro de 2013, na qual foi ratificada a acta da reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião;
530.     Participou nas reuniões do Comité ALCO subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B...;
531. BB participou nas reuniões do Comité Private subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B....;
532. O Recorrente BB, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, aprovou as contas individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
533. O Recorrente BB, na qualidade de Administrador do B... com os pelouros dos ... e de ..., acompanhou o processo de comercialização do papel comercial da EI..., S.A junto dos clientes de tais Departamentos do B...;
534. Participou na reunião da Comissão Executiva do B..., realizada a 4 de Dezembro de 2013, que deliberou a suspensão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A;
535. Participou em algumas das reuniões de preparação da proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações;
536. Participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
537. Não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas (com excepção da sua participação na reunião da Comissão Executiva do B..., de 4 de Dezembro de 2013);
538. O Recorrente BB agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos ( );
539. Com efeito, o Recorrente BB:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, disponibilizando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A;
iii. Sabia que o B... comercializou, entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
iv. Sabia que era administrador da EI..., S.A e participou na decisão do B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
v. Sabia que a EI..., S.A era a acionista única da R..., S.A;
vi. Sabia que o B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
vii. Sabia que a Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
viii. Sabia que a EI..., S.A e a R..., S.A tinham interesse em que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial por elas emitido;
ix. Sabia que os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A e da R..., S.A;
x. Quis participar na decisão de o B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
xi. Quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
540. Ao participar na tomada de decisão emanada do Conselho Superior do G..., de 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente BB previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
541. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B..., na tomada de decisão de continuação da comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
542. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
543. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (o Recorrente CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os Recorrentes AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
543.A O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B... estar a colocar papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
543.B O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se ter organizado de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... AA, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
543.C O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B... não estar a assegurar aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
543.D O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, ter dado prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (o arguido CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os arguidos AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
*
Subsecção V – Do Recorrente CC:
544. O Recorrente CC foi Administrador do B... entre Março de 1994 e 31 de Maio de 2014;
545. Era, à data da prática dos factos, administrador da EI..., S.A;
546. Era, à data da prática dos factos, Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A;
547. Era, à data da prática dos factos, membro do Conselho Superior do G...;
548. Era, à data da prática dos factos, administrador da Es...;
549. Era, à data da prática dos factos, enquanto administrador da Es... e da EI..., S.A, superior hierárquico directo de III;
550. O Recorrente CC assinou, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, os Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
551. Assinou, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, as notificações da EI..., S.A ao BEl... para todas as emissões de papel comercial ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
552. O Recorrente CC, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, assinou os rapports de gestion respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
553. O Recorrente CC, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, aprovou as contas individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
554. O Recorrente CC participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
555. O Recorrente CC não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
556. O Recorrente CC agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos ( );
557. Com efeito, o Recorrente CC:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, disponibilizando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A;
iii. Sabia que o B... comercializou, entre, pelo menos, 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
iv. Sabia que era administrador da EI..., S.A e da R..., S.A e participou na decisão de o B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
v. Sabia que a EI..., S.A era a acionista única da R..., S.A;
vi. Sabia que o B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
vii. Sabia que a Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
viii. Sabia que a EI..., S.A e a R..., S.A tinham interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial por elas emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial emitido por aquelas sociedades que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o financiamento da EI..., S.A e da R..., S.A, bem como de todo o G...;
ix. Sabia que os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A e da R..., S.A;
x. Quis participar na decisão do B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
xi. Quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
558. Ao participar na tomada de decisão emanada do Conselho Superior do G..., de 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente CC previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
559. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, o Recorrente CC previu como possível que o B..., na tomada de decisão de continuação da comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
560. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
561. Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (o arguido CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os arguidos AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
561.A O Recorrente CC ao não ter conhecimento sobre o facto do B... estar a colocar papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
561.B O Recorrente CC ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, não se ter organizado de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... AA, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
561.C O Recorrente CC ao não ter conhecimento sobre o facto do B... não estar a assegurar aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A um diálogo e um trato transparente e recto não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
561.D O Recorrente CC ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, ter dado prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (o Recorrente CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os Recorrentes AA, BB e também PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação ( );
*
Subsecção VI – Do Recorrente DD:
562. O Recorrente DD foi Administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva entre Março de 2004 e 3 de Agosto de 2014;
563. O Recorrente DD, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B... tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, os pelouros do DFME e do DGP;
564. O Recorrente DD foi eleito Administrador do BEl... na assembleia geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016;
565.     Participou na reunião do Comité ALCO do B... realizada no início do verão de 2013 em que foi avançada a possibilidade de ser oferecida aos clientes do B... a oportunidade de subscreverem o papel comercial de sociedades do denominado “G...”, de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz...;
566. Participou nas reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A em que se discutiu a possibilidade de a EI..., S.A e a R..., S.A emitirem papel comercial a colocar junto de clientes do B... de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidade de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
567. Coordenou, na qualidade de Administrador executivo do B..., com o pelouro do ... e do ..., o processo de aprovação interna da comercialização, pelo B... do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A;
568. Aprovou a documentação de suporte à comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, que foi definida pelo DGP;
569. No final de Agosto de 2013, o Recorrente DD deu indicações a TT que levasse à próxima reunião do Comité ALCO do B... a aprovação da comercialização de papel comercial a emitir pelas sociedades do denominado “G...” diretamente junto de clientes do B...;
570. O Recorrente DD decidiu proceder à celebração do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 3 de Setembro de 2013, apesar de naquela data não ter sido emitida a legal opinion solicitada à sociedade Llp..., ...;
571. Participou na reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que aprovou a comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A junto dos clientes do B...;
572.     Participou nas reuniões do Comité ALCO subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A colocados em clientes do B...;
573. Foi informado numa reunião, realizada no dia 2 de Dezembro de 2013, em que estiveram presentes, além do próprio, AA, JJJ, III e UU, de que nas contas individuais da EI..., S.A referentes a 2012, na rubrica do passivo “Notes” não estava refletido um montante adicional de cerca de 1,3 mil milhões de euros;
574. Foi informado, na referida reunião, que o montante inscrito na rubrica “Passivo” das contas individuais da EI..., S.A respeitantes ao exercício de 2012, não correspondia ao montante total do passivo da EI..., S.A naquela data;
575. O Recorrente DD recebia de UU, ..., um reporte regular de todos os instrumentos de dívida da EI..., S.A custodiados junto de entidades do Grupo B...;
576. Acompanhava, na qualidade de Administrador com o pelouro do ..., todas as colocações de dívida emitida pela EI..., S.A e colocada pelas sociedades do Grupo B...;
577. O Recorrente DD solicitou a RR que integrasse, juntamente com JJJ, NN e PP, uma equipa com o objetivo de analisar os impactos e as necessidades de financiamento da operação de concentração, pela R..., S.A, da participação do denominado “G...” na E..., S.A;
578. Participou em reuniões de preparação da proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações;
579. DD apresentou, juntamente com RR, na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, discutida e aprovada nessa reunião;
580. O Recorrente DD, para além de ter praticado os factos descritos, não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
581. O Recorrenteo DD agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos ( );
582. Com efeito, o Recorrente DD:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, disponibilizando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A;
iii. Sabia, pelo menos, desde 2 de Dezembro de 2013 ( ), que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
iv. Sabia que o B... comercializou, entre Janeiro e Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
v. quis, não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
583. Ao levar ao Conselho Superior do G..., em 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, a qual viu ser aprovada naquela sede, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente DD previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade ( );
*
Subsecção VII – Do Recorrente EE:
584. O Recorrente EE foi Administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva entre Março de 2000 e 30 de Julho de 2014;
585. Na qualidade de membro da Comissão Executiva do B... tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, o pelouro do ... (...);
586. Participou na reunião do Comité ALCO do B... realizada no início do Verão de 2013 em que foi avançada a possibilidade de ser oferecida aos clientes do B... a oportunidade de subscreverem o papel comercial de sociedades do denominado “G...”, de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidade de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
587. EE participou na reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que aprovou a comercialização do papel comercial junto dos clientes do B...;
588. Participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 2 de Outubro de 2013, na qual foi ratificada a acta da reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião;
589. Participou nas reuniões do Comité ALCO subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B...;
590. O Recorrente EE participou nas reuniões do Comité de Retalho subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B....
591. O Recorrente EE foi informado em 15 de Novembro de 2013, por VV, de que III lhe tinha apresentado umas folhas de papel soltas com a dívida das holdings do G..., reportada a 30 de Setembro de 2013, onde o montante global da dívida constante era muito superior ao montante conhecido por referência a 30 de Dezembro de 2012, que havia verificado que o montante do aumento da dívida contraída era de cerca de 2.3 mil milhões de euros e que aquele também lhe tinha referido que o aumento do passivo se devia a problemas na EI..., S.A;
591A. Em data não concretamente apurada, mas posterior a 19 de Novembro e anterior a 27 de Novembro de 2013, EE teve conhecimento acerca do detalhe da dívida da EI..., S.A, de onde resultava, apesar de um aumento de dívida de cerca de 2.3 mil milhões de euros, uma situação liquida semelhante à anteriormente conhecida através das contas fechadas a 31.12.2012, por força de um análogo aumento do activo, situação que foi reportar ao Banco de Portugal em 27.11.2013;
591.B Foi informado numa reunião, realizada no dia 2 de Dezembro de 2013, de que nas contas individuais da EI..., S.A referentes a 2012, na rubrica do passivo “Notes” não estava refletido um montante adicional de cerca de 1,3 mil milhões de euros;
591.C  Foi informado, na referida reunião, que o montante inscrito na rubrica “Passivo” das contas individuais da EI..., S.A respeitantes ao exercício de 2012, não correspondia ao montante total do passivo da EI..., S.A naquela data;
592. O Recorrente EE participou na reunião da Comissão Executiva do B..., realizada a 4 de Dezembro de 2013, que deliberou a suspensão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A;
593. EE participou, antes de 7 de Janeiro de 2014, em reuniões com a equipa constituída com o objectivo de analisar os impactos e as necessidades de financiamento da operação de concentração, pela R..., S.A, da participação do G... na E..., S.A, no contexto da reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações;
594. O Recorrente EE não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas, o mesmo se passando com o da EI..., S.A, até, pelo menos, o dia 2 de Dezembro de 2013;
595. O Recorrente EE:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, divulgando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial;
iii. Sabia, desde data não concretamente apurada, mas entre 19 e 27 de Novembro que a EI..., S.A tinha aumentado o seu passivo por referência ao passivo conhecido nas contas fechadas a 31.12.2012, para cerca de 2.3 mil milhões de euros, apesar do mesmo surgir como compensado por via de um aumento do activo, o que se traduzia numa situação liquida semelhante à conhecida ( );
iv. Sabia, pelo menos desde 2 de Dezembro de 2013, que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B..., também por referência às contas individuais referentes a 2012;
v. Sabia que o B... comercializou, entre Janeiro e Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
vi. O Recorrente EE quis, também a partir de 15 de Novembro de 2013 e até ao dia 2 de Dezembro de 2013, que o B... continuasse a colocar papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes nos moldes que vinha fazendo;
vii. Quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes;
viii. Quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo a essa comercialização, o mesmo se passando com o da EI..., S.A, até, pelo menos, o dia 2 de Dezembro de 2013;
*
Subsecção VIII – Do Recorrente FF:
596. O Recorrente FF foi Administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva entre Março de 2000 e 30 de Julho de 2014;
597. O Recorrente FF, na qualidade de membro da Comissão Executiva do B... tinha, à data da prática dos factos, para além de outros, o pelouro do Departamento de ...;
598. Na qualidade de Administrador com o pelouro do ..., interveio na aprovação da documentação de suporte à comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, incluindo as Notas Informativas;
599. O Recorrente FF participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 2 de Outubro de 2013, na qual foi ratificada a acta da reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião;
600. O Recorrente FF participou na reunião da Comissão Executiva do B..., realizada a 4 de Dezembro de 2013, que deliberou a suspensão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A;
601. O Recorrente FF não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas (com excepção da sua participação na reunião da Comissão Executiva do B... de 4 de Dezembro de 2013);
602.     O Recorrente FF:
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Janeiro e Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
iii. quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes;
iv. quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo a essa comercialização;
*
- OUTROS FACTOS COM RELEVO PARA A BOA DECISÃO DA CAUSA:
- Da actuação do B... enquanto intermediário financeiro:
603. O B..., através do seu Comité ALCO, decidiu que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam emitir papel comercial, a comercializar junto dos clientes do B..., de forma a substituir o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A colocado no fundo Elz... até Agosto de 2013, bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
604. Decidiu celebrar com a EI..., S.A e o BEl... dois Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial;
605. O B... assumiu contratualmente as funções de entidade colocadora do papel comercial emitido pela EI..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
606. O B... assumiu contratualmente a obrigação de “desenvolver os seus melhores esforços (…) no sentido de colocar o papel comercial emitido ao abrigo do Programa junto dos investidores”;
607. O B... decidiu celebrar com a R..., S.A e o BEl... um Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial;
608. Assumiu contratualmente as funções de entidade colocadora do papel comercial emitido pela R..., S.A ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrado entre a R..., S.A, o B... e o BEl...;
609. O B... assumiu contratualmente a obrigação de “desenvolver os seus melhores esforços (…) no sentido de colocar o papel comercial emitido ao abrigo do Programa junto dos investidores”;
610.     O B..., através do seu Comité ALCO, decidiu, em Setembro de 2013, dar início à colocação, junto dos seus clientes, do papel comercial emitido pela EI..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
611. O B... comercializou, junto dos seus clientes, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
612.     O B..., através do seu Comité ALCO, decidiu, em Setembro de 2013, dar início à colocação, junto dos seus clientes, do papel comercial emitido pela R..., S.A ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrado entre a R..., S.A, o B... e o BEl...;
613. O B... comercializou, junto dos seus clientes, entre Setembro de 2013 e Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrado entre a R..., S.A, o B... e o BEl...;
614. O B..., através do DGP, definiu os procedimentos a seguir pelos comerciais na comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A;
615. O B..., através do DGP, definiu a documentação de suporte à comercialização do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A;
616. O B..., através do DGP, do DFME e do Departamento de Assuntos Jurídicos, colaborou com o BEl... na elaboração das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A;
617. O B... reviu as Notas Informativas elaboradas pelo BEl...;
618. O B..., através dos seus departamentos comerciais, disponibilizou junto dos clientes que subscreveram, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A, as quais continham informação nos moldes que se deram como provados supra;
619. Para além da informação não constar das Notas Informativas, o B... também não prestou aos seus clientes que subscreveram papel comercial da EI..., S.A, aquando da comercialização, informação sobre os montantes totais da dívida titulada, do passivo e do capital próprio da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
620. Para além da informação não constar das Notas Informativas, o B... também não prestou aos seus clientes que subscreveram papel comercial da EI..., S.A, entre Setembro e Dezembro de 2013, aquando da comercialização, informação sobre o aumento do passivo da EI..., S.A nos primeiros nove meses do ano de 2013;
621. O B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, não se organizou de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
622. Com efeito, o B... decidiu, através dos Recorrentes AA, BB, CC, administradores comuns ao B... e à EI..., S.A, que a EI..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
623.     O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até setembro de 2013, no fundo Elz..., que era gerido pela Epi..., S.A, sociedade dominada pelo B...;
624.     O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
625.     O B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a dar cumprimento às obrigações assumidas perante esta sua cliente nos “Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial” celebrados entre a EI..., S.A, o BEl... e o B...;
626.     A Epi..., S.A tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era por si gerido;
627.     A EI..., S.A tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o seu financiamento, bem como de todo o denominado “G...”;
628.     AA, BB, CC, PPP QQQ e HHH, administradores do B... e da EI..., S.A tinham interesse em captar para a EI..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G...;
629.     Os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da EI..., S.A;
630. O B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto;
631. O B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...), da EI..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH igualmente administradores da EI..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
632. O B..., através dos seus departamentos comerciais, divulgou junto dos clientes que subscreveram, entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e 16 de Janeiro de 2014, as quais continham a informação que se deu como provada supra;
633. O B... não informou os clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 que a R..., S.A iria adquirir ou que tinha adquirido ( ), com efeitos a 31 de dezembro de 2013, uma participação qualificada de 49,26% da E..., S.A;
634. O B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, apresentou uma estrutura incapaz de identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
635. Com efeito, o B... decidiu, através (i) do Recorrente CC (administrador do B... e da R..., S.A) e (ii) dos Recorrentes AA e BB (administradores do B... e da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) que a R..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
636. O B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto;
637. O B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...), da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da R..., S.A e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
638. O B... agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos;
639. Com efeito, o B...:
(a) Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios em que participou;
(b) Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
(c) Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
(d) Sabia que AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH eram administradores da EI..., S.A;
(e) Sabia que CC era administrador da R..., S.A;
(f) Sabia que a EI..., S.A era a acionista única da R..., S.A;
(g) Sabia que a Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A e à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., que era por gerido por aquela sociedade;
(h) Sabia que a EI..., S.A e a R..., S.A tinham interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial por elas emitido, de forma a assegurar os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial emitido por aquelas sociedades que estava colocado, até setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a assegurar o financiamento da EI..., S.A e da R..., S.A, bem como de todo o G...;
(i) Sabia que os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A e da R..., S.A, não revelada nas notas informativas do papel comercial da EI..., S.A disponibilizadas aos clientes que subscreveram papel comercial entre 9 de Setembro de 2013 e 6 de Dezembro de 2013, e nas notas informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de janeiro de 2014, disponibilizadas aos clientes que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014;
(j) Todavia:
(i) quis prestar aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 a informação supra identificada nos exatos termos em que esta foi prestada;
(ii) quis prestar aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre Setembro de 2013 e Fevereiro de 2014 a informação supra identificada nos exatos termos em que esta foi prestada;
(iii) quis não se organizar de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., bem como não atuar de modo a evitar ou reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência;
(iv) quis decidir, através de AA, BB e CC, administradores comuns ao B... e à EI..., S.A, que a EI..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
(v) quis decidir, através (i) de CC (administrador do B... e da R..., S.A) e (ii) de AA e BB (administradores do B... e da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) que a R..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...;
(vi) quis colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, de forma a assegurar à EI..., S.A e à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial emitido por estas que estava colocado, até Setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B...;
(vii)     quis, na colocação de papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, dar prevalência, aos seus próprios interesses, bem como os interesses da EI..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
(viii)    quis, na colocação de papel comercial emitido pela R..., S.A junto dos seus clientes, dar prevalência, aos seus próprios interesses, bem como os interesses da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
*
- Outros factos:
640. Nas Notas Informativas relativa à colocação do papel comercial em causa da EI..., S.A e da R..., S.A constava que a divulgação não envolvia qualquer compromisso ou garantia por parte do BEl.... e do B.... quanto à suficiência, veracidade, objectividade e actualidade do conteúdo da Nota Informativa, ou qualquer juízo de valor quanto à situação económica e financeira da Entidade Emitente, à sua viabilidade ou à qualidade dos valores que constituem o Programa e as Emissões ou, ainda, à oportunidade e validade do investimento nos mesmos;
641. O Conselho de Administração da R..., S.A ratificou no dia 25 de Fevereiro de 2014 a proposta de reestruturação do G..., a qual se traduziu na aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A ( );
642. Na comercialização do papel comercial quer da R..., S.A, quer da EI..., S.A, o B... limitou-se sempre a prestar aos seus clientes a informação que constava vertida nas respectivas Notas Informativas ( );
643. Após a operação de reestruturação, a R..., S.A deixou de ter créditos sobre a EI..., S.A (553 milhões de euros) e sobre a E... Limited (368 milhões de euros), que estas sociedades do G... não estavam em condições de pagar, e passou a ser dona de participações sociais sobre a E..., S.A, que era a sociedade controladora de vários Bancos, entre os quais o B..., ou seja dona de participações sociais com valor e com alguma liquidez, pois a E..., S.A e o B... estavam cotados em bolsa, sendo assumida como uma operação com certos benefícios para a R..., S.A, à data;
644.     As contas consolidadas e auditadas da R..., S.A, reportadas a 31/12/2012 atestam um capital próprio de € 966.938 milhões – e a 31/12/2013 (que já incluíam a operação de aquisição da participação na E..., S.A) atestam um capital próprio de € 932,015 milhões;
645. Nas operações em que interveio o Recorrente Haitong não foi necessária uma prévia decisão por parte da sua Comissão Executiva, tendo os trabalhos realizados considerados pela equipa que os decidiu e executou como meramente rotineiros, a par de outros que estavam em curso, não tendo sido realizada qualquer análise de risco às sociedades emitentes EI..., S.A e R..., S.A, por parte da primeira;
646. O DGD do B..., no que concerne à sua intervenção nos factos dos autos, utilizou todas as regras de sign-off de ofertas de novos produtos apesar de estas não serem aplicáveis ao papel comercial que foi colocado junto dos clientes, já que a norma de sign-off em vigor no B... não abrangia a colocação de instrumentos financeiros de dívida de terceiros;
647. De acordo com a norma interna NP 143/2006 do B..., em vigor à data, eram requeridas as seguintes actividades e intervenientes para o “sign off” em causa:
• Coordenação global do processo de “Sign Off” (Sponsor da Oferta): cabia ao DGP;
• Análise e implementação do processo operacional: cabia ao DGP, DEO, DPC, DMIC, DIG e DMCE;
• Análise e implementação dos Requisitos Legais e Regulamentares: cabia ao DGP, DAJ e DCOMPL;
• Outras Intervenções previstas face ao produto e impactos identificados: cabia ao DFME, BEl..., ES Informática; e
• Aprovação da Oferta: cabia ao Comité ALCO.
648. Antes da decisão do B... de emissão, colocação e comercialização do papel comercial da EI..., S.A  da R..., S.A, foi realizada uma reunião com a sociedade de  advogados ..., em que intervieram KK, em representação do BEl..., UU e PPPPP, ambos do DFME do B..., TT, do DGP e YY, da Epi..., S.A, reunião que tinha como objectivo analisar a viabilidade legal da colocação, directa, pelo B... de papel comercial de terceiros nos seus clientes;
649. Nessa sede, o escritório de advogados não suscitou qualquer obstáculo legal à emissão, colocação e comercialização de papel comercial em causa;
650.     O DAJ do B... também analisou sob o ponto de vista legal a emissão, colocação e comercialização do papel comercial em causa antes da tomada de decisão e também não apontou quaisquer impedimentos legais ao mesmo;
651.     Quer nas Notas Informativos, quer nas Fichas Técnicas do papel comercial em causa nos autos era referido que a entidade Emitente admitia que factores que indicava podiam afectar a sua capacidade de cumprir as obrigações resultantes da emissão de papel comercial, que a maioria destes factores eram contingências que podiam, ou não, ocorrer e que à entidade emitente não lhe era possível formular um juízo quanto ao grau de probabilidade de que tais factores pudessem vir a verificar-se;
652. Assim, era referido que a entidade emitente poderia ficar incapacitada de pagar juros, capital ou outros montantes devidos aos titulares de papel comercial por outras razões e, consequentemente, não garantia nem podia garantir que os factores que descrevia estavam exaustivamente descritos:
653.     A. Riscos inerentes ao papel comercial
“O papel comercial pode não ser um investimento adequado para todos os investidores.
(...)
“Papel comercial constitui obrigação apenas da Entidade Emitente
A aquisição de papel comercial envolve uma confiança na capacidade de crédito da Entidade Emitente. O papel comercial não é garantido por qualquer entidade. Além disso, a aquisição de papel comercial envolve o risco de que mudanças posteriores na capacidade real ou percebida pelo mercado, de crédito da Entidade Emitente possam afectar negativamente o valor de mercado do papel comercial”;
654.     Em Setembro de 2013, o DRG do B... concluiu os trabalhos que tinha iniciado em meados do ano para atribuição do rating à EI..., S.A, tendo sido utilizada a ferramenta “SPV Rating Tool”, estimando-se a atribuição de um rating entre “bb-” e “b+”, tendo a possibilidade de incumprimento da EI..., S.A sido estimada entre 1,10% a 1,96%;
655.     No decurso da tramitação de certificação da atribuição do rating à EI..., S.A, a K... solicitou apenas a rectificação de um mero lapso material de escrita numa carta de conforto emitida pela Ec..., S.A., por dívidas de outras sociedades do grupo, incluindo a “Ein..., S.A.”;
656. À data dos factos em causa, na estrutura do B..., a actividade relativa a “produtos financeiros suportados em valores mobiliários” encontrava-se regulada, internamente, pela NP 0161/2006;
657. No parágrafo 1. da NP 0161/2006 (sob a epígrafe “Objectivos e Âmbito”), previa-se o seguinte:
“A presente norma visa estabelecer procedimentos uniformes para apoio às solicitações de Clientes no que respeita à subscrição de produtos estruturados (produtos financeiros complexos), à compra e venda de produtos estruturados em mercado secundário e ao processo de venda de títulos.
Para o efeito, pretende-se regular a atividade da estrutura comercial e dos departamentos centrais com vista a acautelar o cumprimento das exigências legais, nomeadamente da Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros (DMIF ou MIFID), informar os Clientes das características e riscos dos instrumentos financeiros em que pretendem investir e estabelecer os meios operativos que permitam a correta concretização das ordens de Clientes.
Os intervenientes no processo são as Áreas Comerciais (Balcões), o Departamento Executivo de Operações (DEO), o Departamento de Gestão de Poupança (DGP), o DFME (Departamento Financeiro, Mercados e Estudos) e os Departamentos de Marketing dos respetivos segmentos.
658.     Conforme resulta do último ponto do parágrafo 2.1. da NP 0161/2006, este normativo abrangia a colocação de “papel comercial”, que foi aí definido nos seguintes termos: “Papel Comercial - Valor mobiliário transmissível, representativo de dívida e emitido por empresas, funcionando como fonte de financiamento a curto prazo, sendo os prazos mais habituais, 1, 3 e 6 meses.
“Sendo um produto de dívida de curto prazo, permite às empresas emitentes financiarem-se, diretamente, no mercado, sem terem de recorrer a crédito bancário”.
659. A NP 0161/2006 consagrava, expressamente, a salvaguarda da: (i) qualidade de informação relativa ao papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A e cumprimento dos deveres de informação perante os clientes; e (ii) conflitos de interesses;
660. Nos termos do parágrafo 3 da NP 0161/2006 (sob a epígrafe, “Deveres de Informação”), em vigor à data dos factos, estava previsto o seguinte:
“Deveres de informação:
o Genericamente, o Gestor deverá preocupar-se em fornecer informação de qualidade aos Clientes:
- Dar informações completas, verdadeiras, atuais, claras, objetivas, lícitas, concisas e em linguagem facilmente compreensível para o investidor médio;
- Não dar ênfase a quaisquer benefícios potenciais sem dar igualmente uma indicação correcta e clara de quaisquer riscos relevantes” (fls. 1.958).
661.     A página 8 da NP 0161/2006, em vigor à data dos factos, estava prevista a salvaguarda do conflito de interesses, mesmo em casos em que a intermediação apenas implicasse a execução de uma ordem de compra, como era o papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A, salientando-se aí o seguinte:
“Na prestação do serviço de “receção e transmissão ou execução de ordens” (ex.: execução de ordem de compra ou venda de um instrumento financeiro) não é necessário avaliar o caráter adequado da operação, mas apenas desde que estejam preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
(…)
4. O Banco cumpra os deveres em matéria de conflito de interesses”.
662.     Até 1 de Outubro de 2013 (data em que foi publicada a NG ...7/2013), o Sistema de Controlo Interno do B... era regulado pelo Normativo NG ...0/2006; a elaboração e revisão de manuais de controlo interno de negócio eram reguladas pelo Normativo NG 0007/2012; e a elaboração e revisão de manuais de controlo interno de controlos gerais era regulado pelo Normativo NG 0031/2012;
663.     Nos termos do NG ...0/2006, o Sistema de Controlo Interno do Grupo B... assentava nos métodos, regras e procedimentos operativos e de controlo adoptados para assegurar a eficaz e eficiente conduta dos negócios do Grupo;
664.     O SCI institucionalizou uma cultura e prática de controlo, para o reforço/eficácia dos procedimentos operativos, mitigando os riscos inerentes ao exercício da actividade, incluindo nomeadamente:
- controlo dos riscos da actividade das instituições do Grupo B...;
- a existência de uma completa, fiável e tempestiva informação contabilística e financeira, em particular no que respeita ao seu registo conservação e disponibilidade;
- a prestação de informação financeira fiável, completa e tempestiva às autoridades de Supervisão;
- a adequação das operações realizadas pelo Banco às disposições legais, regulamentares e estatutárias aplicáveis, às normas internas, às orientações dos órgãos sociais, ás normais e aos usos profissionais e deontológicos e a outras regras relevantes para o Banco;
665. Entre outros objectivos, o NG ...0/2006 estabelecia que o SCI visava garantir, igualmente, a segregação ou separação de funções entre a autorização, execução o registo, guarda de valores e o controlo, no quadro de uma relação custo/benefício que optimize os meios.
666. Para estes efeitos, o NG ...0/2006 determinou a criação do Manual de Controlo Interno de Controlos Gerais, que consistia num template próprio que incorporava, após consideração dos objectivos de controlo de um determinado processo de boas práticas para a gestão de Tecnologias da Informação (COBIT) e dos respectivos riscos inerentes, os controlos existentes para a sua mitigação, a avaliação da qualidade do desenho dos controlos, etc.
667. Para este efeito, nos termos estipulados no NG ...0/2006, após um levantamento inicial e identificação dos riscos e controlos, haveria que proceder à avaliação do desenho dos controlos e o Manual de Controlo Interno seria validado pelo respectivo dono do processo (sponsor), sendo, posteriormente monitorizado e a documentação relevante arquivada;
668. Nos termos do NG ...0/2006, a gestão do Sistema do Controlo Interno era suportada por uma estrutura organizativa integrada e transversal que se completava, destacando-se as seguintes estruturas enquanto responsáveis pela monotorização regulada do Sistema de Controlo Interno:
(i) Departamento de Compliance, através da Unidade de Gestão do Sistema de Controlo Interno (UGSCI);
(ii) Departamento de Auditoria e Inspecção (DAI);
(iii) Departamento de Risco Global (DRG).
669. Em 2005, o Departamento de Compliance criou a estrutura autónoma, denominada Unidade de Gestão do Sistema de Controlo Interno (UGSCI), à qual cabia a gestão, eficácia e eficiência do Sistema de Controlo Interno (“SCI”), a monitorização de riscos e controlos e o relato interno e reporte externo sobre as diversas entidades regulamentares, nacionais e internacionais, tendo uma visão de conjunto e uma gestão integrada do SCI;
670. A atribuição desta competência visava assegurar a fiabilidade da informação financeira, a salvaguarda dos activos e a prevenção dos riscos;
671. O NG ...0/2006 pretendia garantir um conhecimento transversal da actividade da UGSCI, a quem cabia emitir um relatório mensal interno, dirigido aos Departamentos ou Estruturas com ligação ao SCI.
672. Nos termos do NG ...0/2006, a actividade da UGSCI abrangia todo o Grupo B..., gozando de autonomia e especialização.
673. Em 2012 e 2013, o Departamento de Compliance contou com 56 colaboradores, sendo, então, coordenado pelo Dr. WW, com ampla experiência em auditoria, visto que foi partner da Pwa..., S.A;
674. O Departamento de Auditoria e Inspecção (DAI) era, desde logo, responsável pela avaliação da adequação e eficácia das diversas componentes do SCI, bem como do sistema como um todo, das sociedades do Grupo B... incluídas no seu perímetro de actuação;
675. No âmbito das competências do DAI, salienta-se a avaliação da adequação e eficácia dos sistemas de governo, dos sistemas de gestão dos riscos e dos sistemas de controlo do cumprimento das obrigações legais e outros deveres, bem como o reporte periódico para a Comissão Executiva das situações que pudessem evidenciar tendências de deterioração do Sistema de Controlo Interno e do acompanhamento das respectivas recomendações formuladas para a sua correcção.
676. O DAI do B... estava integrado nas Unidades Centrais de Suporte e, em 2012, teve 82 colaboradores;
677. Quanto ao Departamento do Risco Global (DRG), cabia-lhe, desde logo, centralizar a função de risco do Grupo B..., tendo como principais funções:
– Identificar, avaliar e controlar os diferentes tipos de risco assumidos, de forma a permitir a gestão do risco global de todas as instituições do Grupo B...;
– Implementar as políticas de risco definidas pela Comissão Executiva, homogeneizando princípios, conceitos e metodologias, em todas as unidades do Grupo; e
– Contribuir para os objectivos de criação de valor, através do aperfeiçoamento de ferramentas de apoio à estruturação, pricing e decisão de operações, bem como do desenvolvimento de técnicas de avaliação de performance e de optimização da base de capital.
678. O DRG integrava as Unidades Centrais de Negócio e Risco;
679. Em 2012 e 2013, o DRG integrou 132 trabalhadores;
680. Para além das estruturas do Departamento de Compliance, DAI e do DRG, eram, ainda, responsáveis pelo funcionamento e correcta manutenção do Sistema de Controlo Interno os seguintes departamentos:
– Departamento de Organização: gestão da eficiência operativa do Grupo B..., dos catálogos de processos e de aplicações de em geral, sendo uma das estruturas responsáveis pela documentação dos processos e por assegurar um fluxo de informação que garantisse a sua actualidade;
– Departamento de Qualidade de Serviço: centralização das reclamações apresentadas pelos clientes;
– Departamento de Gestão e Coordenação da Segurança: coordenação da aplicação das políticas e acções no domínio da segurança interna, planos de contingência, continuidade de negócio e de Disaster Recovery.
681.     Por outro lado, o Sistema de Controlo Interno continha uma tipificação das unidades existentes na estrutura organizativa do B..., incluindo, nomeadamente: (i) Unidades Centrais de Risco (que acompanhavam e dinamizavam segmentos e/ou produtos específicos); e (ii) Unidades Centrais de Marketing e de Produto (concepção de produtos destinados à comercialização nas Unidades Comerciais e/ou em actividades de Marketing em apoio das Unidades comerciais);
682. Em termos orgânicos, o B... dispunha de uma estrutura modelada de acordo com os critérios de vocação de complementaridade funcional e orgânica, com órgãos de primeiro nível, que se apresentavam como unidades executivas, designados por Departamentos (alguns dos quais já foram índicos acima);
683. Acresce que a estrutura do B... contemplava, ainda, diversas Unidades Centrais de Marketing e Produto, das quais se destaca, nomeadamente, o Departamento de Gestão da Poupança (DGP), responsável pelo desenvolvimento, implementação e gestão da oferta de produtos orientados para poupança, dirigidos aos vários segmentos e distribuídos através dos vários canais do Banco;
684. Em 2012, o DGP integrou 31 colaboradores; em 2013, este número passou para 28;
685.     Relativamente às Unidades Centrais de Suporte, para além do DAI, integravam os seguintes departamentos:
– Departamento de Informação de Gestão: implementação e manutenção do sistema de informação do Grupo B..., enquanto apoio adequado às decisões dos gestores;
– Departamento de Assuntos Jurídicos: identificação e gestão do risco jurídico que decorresse da actividade do Grupo B..., alinhando-se com os objectivos do Grupo e alocando eficientemente os recursos internos e externos, para prevenir o risco jurídico;
– Departamento de Compliance: assegurava que Grupo B..., em todas as suas vertentes de negócio e jurisdições, os membros dos órgãos sociais, directores e colaboradores, cumpram, no âmbito da sua actividade, todas as exigências legais, estatutárias, operacionais, tutelares, éticas, e de conduta que que lhes são aplicáveis, dentro do ambiente de controlo e supervisão institucional, pelas entidades reguladoras competentes;
– Departamento de Planeamento e Contabilidade: assegurava o registo e controlo das operações contabilísticas, define e coordena as políticas de aprovisionamento e amortizações.
– Departamento de Gestão e Coordenação de Segurança: assegurava o desenvolvimento, entrega e manutenção do Programa de Segurança do Banco e do Grupo, que tem como objectivo garantir a protecção dos seus activos e respectiva infra-estrutura, continuidade do negócio, etc.
686. Quanto às Unidades Centrais Operativas estas integravam, entre outros, o Departamento Executivo de Operações, que era responsável pela execução operativa dos principais processos bancários, nomeadamente operações documentárias, transferências, etc.;
687. A NG 0031/2012 definia os procedimentos a ser seguidos nas Revisões do Sistema de Controlo Interno, conduzidas pela UGSI do Departamento de Compliance, e consequente elaboração ou revisão de Manuais de Controlo Interno de Controlos Gerais.
688.     Apesar de a área funcional de “Desintermediação Passiva” tratar da venda de produtos de terceiros – como é, precisamente, o caso do papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A –, salientava se no B... que «a grande maioria dos produtos têm a marca Es…”, pelo que esta área funcional, para além do peso nos resultados, está sujeita a risco reputacional» (sublinhado e realçado nossos;
689. Por outro lado, o Departamento do Risco Global era responsável por produzir informação desde os órgãos mais operacionais (p. ex., as Comissões de Crédito) aos de nível mais estratégico (p. ex. a Comissão Executiva).
690. Esta informação visava ser utilizada para diversos fins, incluindo monitorização do risco;
691. Por outro lado, o DRG era responsável por centralizar a função de Risco do Grupo B..., que visava identificar, avaliar, acompanhar e controlar todos os riscos a que cada instituição do GBES se encontrava sujeita, tanto interna como externamente;
692.     Assim, no que respeita a esta função, estava previsto que o DRG fosse responsável por:
– Identificar, avaliar e controlar os diferentes tipos de risco, de forma a permitir a gestão do risco global do Grupo;
– Implementar as políticas de risco definidas pela Comissão Executiva, homogeneizando princípios, conceitos e metodologias em todas as unidades do Grupo B...;
– Contribuir para os objectivos de criação de valor através do aperfeiçoamento de ferramentas de apoio à estruturação, pricing e decisão de operações;
693. Por forma a assegurar a eficiência e o cumprimento das suas funções, em particular, a centralização do risco do Grupo B..., estava previsto o seguinte:
 – A independência do DRG face a outras áreas do Grupo B..., nomeadamente aos departamentos comerciais;
– Integração de todos os riscos, a sua gestão global;
– Incorporação consistente dos conceitos de risco e capital na estratégia e nas decisões de todo o Grupo B..., assegurando total transversalidade nas comparações directas entre o risco e rendibilidade e uma visão única de risco;
694. Nesta sua função, o DRG reportava a QQQ, enquanto membro da Comissão Executiva responsável pelo pelouro do risco, que, a partir de 2013, partilhou o pelouro com EE;
695. O Sistema de Controlo Interno atribuía amplos poderes ao Departamento de Auditoria Interna, para efeitos de proceder à verificação independente da adequação e do cumprimento das políticas e procedimentos definidos pelo Conselho de Administração;
696. Neste quadro, o Sistema de Controlo Interno previa que “os auditores internos, no exercício das suas funções, têm acesso ilimitado a toda a documentação e informação utilizada ou produzida pelas estruturas ou processos auditados”;
697. Quer o B..., quer o BEl... preparavam e submetiam os relatórios anuais de Controlo Interno, em cumprimento do Regulamento da CMVM n.º 2/2007 (com as alterações introduzidas pelo Regulamento da CMVM n.º 3/2008), assim como do Aviso do Banco de Portugal n.º 5/2008, de 25 de Junho;
698. Em 1 de Outubro de 2013, o B... publicou uma norma geral (NG ...7/2013) cuja elaboração foi coordenada pelo Departamento de Compliance e subscrita pelo Departamento de Auditoria e Inspecção, pelo Departamento de Gestão e Coordenação da Segurança, pelo Departamento de Planeamento e Contabilidade e pelo departamento de Risco Global;
699. O Sistema de Controlo Interno fundamentava-se numa organização transversal que se baseava num modelo de três linhas de defesa.
700. Assim, a Norma Geral ...7/2013 dispunha o seguinte:
(a) 1.ª Linha: Estruturas de negócio e de suporte operativo, a quem competia a identificação e avaliação de riscos
(i) assegurando que as actividades eram executadas de forma eficaz;
(ii) avaliando os riscos materiais inerentes a um determinado processo ou ambiente de IT;
(iii) garantindo a suficiência dos controlos executados;
(iv) identificando soluções para mitigar riscos detectados;
(v) implementando políticas e procedimentos internos.
(b) 2.ª Linha: Estruturas com funções de Controlo de Riscos, a quem competia a gestão de riscos.
(i) avaliando e controlando os diferentes tipos de riscos;
(ii) implementando políticas de risco homogéneas nos seus princípios, conceitos e metodologias em todas as unidades do Grupo;
(iii) monitorizando os riscos materiais e avaliando a suficiência dos controlos executados;
(iv) monitorizando e mantendo o Programa Global de Segurança do Grupo B...;
(v) gerindo a eficiência operativa, através da identificação e revisão dos processos;
(vi) gerindo o risco associado à emissão de reportes financeiros;
(vii) reportando, interna e externamente, as deficiências detectadas.
(c) 3.ª Linha: Auditoria Interna e Externa a quem competia a monitorização de riscos:
(i) procedendo a avaliação independente e objectiva da eficácia da governação, da gestão de riscos e dos controlos internos;
(ii) avaliando os níveis de eficácia com que as estruturas, nomeadamente os responsáveis pela gestão de riscos, alcançam os objectivos de gestão;
(iii) comunicando aos órgãos de gestão os resultados das avaliações efectuadas por auditores internos e externos.
701. Ao abrigo desta NG ...7/2013, o Sistema de Controlo Interno do B... traduzia-se na consagração de funções independentes de controlo de cumprimento, de gestão de riscos e de auditoria interna, de que foram encarregados serviços com actividade autónoma e orgânica própria na dependência hierárquica da Comissão Executiva;
702.     Nos termos da página 123 do relatório e contas de 2013 do B..., a Comissão Executiva era responsável por definir o perfil de risco objectivo através da fixação de limites globais e específicos. Compete-lhe igualmente fixar os princípios gerais de gestão e controlo de riscos, assegurando que o Grupo detém as competências e recursos necessários para tal;
703. De resto, ainda nos termos da página 123 do relatório e contas de 2013 do B..., o órgão de fiscalização do B..., é responsável pela apreciação do funcionamento do Sistema de Controlo Interno, nomeadamente, das funções de gestão de riscos, de compliance e de auditoria interna que lhe estão subjacentes e do respectivo ajustamento às necessidades do B...;
704. Como ocorria anteriormente, a função de controlo de cumprimento a cargo do Departamento de Compliance visava, inter alia, verificar o efectivo cumprimento dos deveres legais e regulamentares; a função de gestão de riscos, que incumbia ao Departamento de Risco Global (DRG), assegurava a apropriada gestão dos riscos inerentes às actividades desenvolvidas, contribuindo para a estabilidade do B... e do sistema financeiro e a função de auditoria interna, de que se encarregava o Departamento de Auditoria e Inspecção (DAI) consistia na avaliação periódica e de modo complementar dos procedimentos adoptados pelo controlo de cumprimento e pela gestão de riscos.
705. De acordo com a Norma Geral ...7/2013 do B..., era ainda responsável pelo funcionamento e correcta manutenção do SCI o Departamento de Planeamento e Contabilidade (DPC).
706. O DPC tinha a seu cargo, designadamente, assegurar a produção e divulgação das demonstrações financeiras individuais e consolidadas das entidades integradas na lógica de serviços partilhados e exercer o controlo de gestão do B... individual e consolidado do Grupo B....
707. Por seu turno, o Departamento de Organização e Qualidade (DOQ) tinha como função, entre outras, a gestão do processo de avaliação, revisão e publicação dos «conteúdos normativos do B...» assegurando «a actualidade e comunicação dos mesmos» e o Departamento de Gestão e Coordenação da Segurança (DGCS) a quem competia, nomeadamente, «a dinamização de uma cultura de segurança ao nível de todas as unidades do Grupo B...».
708. Conforme já se verificava, quanto à função de controlo de cumprimento e o Departamento de Compliance, competia à função de controlo de cumprimento superintender, com independência e de forma permanente, a observância de todas as obrigações e deveres legais e regulamentares a que se encontravam sujeitas as sociedades do Grupo B..., avaliando e monitorizando regularmente a adequação e eficácia das medidas adoptadas para assinalar riscos de incumprimento e fazer recomendações ao Conselho de Administração, no domínio das deficiências descobertas.
709. O Departamento de Compliance actuava sobre o B... e respectivas sucursais e estendia a sua intervenção às empresas que pertenciam ao perímetro do Grupo B....
710. Todos os colaboradores afectos ao Departamento de Compliance exerciam funções em exclusividade para o Departamento e sem qualquer ligação a outra unidade ou serviço do Grupo B... e o respectivo relacionamento com estas unidades ou serviços efectuava-se directamente ou através das estruturas das subsidiárias que possuíam meios próprios para o exercício da função de controlo de cumprimento.
711.     O Departamento de Compliance dispunha de sete unidades: a Unidade de Gestão do Sistema de Controlo Interno (UGSCI); a Unidade de Prevenção e Detecção do Branqueamento de Capitais (UPDBC) (Análise das Contrapartes e Análise das Transacções); a Unidade de Prevenção e Detecção do Branqueamento de Capitais (Intelligence e Reporting); a Unidade de Suporte, Desenvolvimento e Comunicação; a Unidade de Business Ethics; a Unidade de Intermediação Financeira e Mercados (UIFM); e a Unidade de Actividade Internacional.
712. A Unidade de Gestão do Sistema de Controlo Interno (UGSCI) estruturava e publicava Manuais de Controlo Interno (MCI) que documentavam o SCI e respeitavam a áreas de negócios ou a controlos gerais.
713. Os MCI que incidiam sobre áreas de negócio correspondiam a um documento que adoptava um modelo específico («template») que analisava os processos de negócio, as actividades com risco, a identificação dos riscos de acordo com a metodologia do Modelo de Avaliação de Riscos do Banco de Portugal e que enunciava os controlos existentes para a respectiva mitigação, avaliava a qualidade de tais supervisões, classificava o grau de exposição ao risco e na eventualidade de ser o caso recomendava medidas correctoras.
714. Os MCI que recaíam sobre os controlos gerais correspondiam a um documento que adoptava, do mesmo modo, um modelo próprio («template») que examinava o processo operacional da área informática ou da infraestrutura, o funcionamento do processo, o inventário dos controlos existentes e respectivos objectivos de acordo com o COBIT e na eventualidade de ser o caso, enunciava as recomendações aplicáveis.
715.     Os MCI procuravam identificar e revelar as deficiências e enunciar e propor remédios.
716.     A Unidade de Prevenção e Detecção de Branqueamento de Capitais (UPDBC) tinha como missão criar os mecanismos que permitissem ao B... descobrir e prevenir a possibilidade de o Banco ser utilizado para actividades de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo.
717.     A Unidade de Prevenção e Detecção do Branqueamento de Capitais (Intelligence e Reporting) comunicava às autoridades competentes as situações detectadas que revelassem a existência de razões fundadas para suspeitar de risco de branqueamento de capitais ou de financiamento de terrorismo.
718.     A Unidade de Intermediação Financeira e Mercados tinha por objecto a gestão da relação com a CMVM no âmbito do controlo de cumprimento das actividades de intermediação financeira nos termos do Regulamento da CMVM 2/2007 (alterado pelo Regulamento 3/2008), para além da verificação da adequação e eficácia das medidas e procedimentos adoptados pelo Banco para descobrir qualquer risco de incumprimento dos deveres de intermediário financeiro e da definição de medidas destinadas a corrigir eventuais deficiências.
719. A Unidade de Business Ethics avaliava e propunha a resolução de situações de eventual conflito de interesses, acompanhava a aplicação e revisão do Código de Conduta, recolhia e analisava a informação sobre os membros dos órgãos sociais para aferir do cumprimento dos requisitos legais e regulamentares.
720.     Com o fim de gerir e mitigar os riscos intrínsecos inerentes ao exercício das atividades de intermediação financeira, o B... adotou, respetivamente: em 2002, um Código de Conduta; em 2006, um Regulamento Interno no Âmbito das Atividades de Intermediação Financeira, objeto de uma profunda reformulação em fevereiro de 2009; também em 2006, uma Política de Prevenção e Gestão de Conflitos de Interesses no Âmbito das Atividades de Intermediação Financeira; por último, em 1 de novembro de 2007, o B... adoptou uma Política de Execução de Ordens”;
721. No final de 2008, o B... celebrou com a Actimize um contrato de fornecimento e implementação das soluções informáticas para monitorização de práticas de Manipulação de Mercado, Abuso de Informação Privilegiada e Prevenção de Conflitos de Interesse;
722. Por outro lado, a Unidade de Actividade Internacional supervisionava a função de controlo de cumprimento e a organização dos serviços de Compliance, nos países em que o Grupo B... estava presente, tendo como objectivo assegurar tanto quanto possível a adopção de metodologias comuns e a divulgação da regulamentação portuguesa junto das jurisdições estrangeiras, identificando e estudando a respectiva adequabilidade.
723. A função de gestão de riscos estava a cargo do Departamento de Risco Global (DRG) que era a principal fonte de informação de risco no Grupo B....
724. Ao DRG cabia ainda apurar e controlar os requisitos do capital regulamentar e avaliar a adequação do capital interno (ICAAP- Internal Capital Adequacy Assessment Process) e controlar os testes de esforço (stress tests). Foi criado no B... em 2000, reportava hierarquicamente à Comissão Executiva e constituía uma unidade autónoma, dotada de independência em face das outras áreas do Grupo, designadamente das operacionais, não tendo poder de decisão relativamente a operações concretas.
725. Em 2014, trabalhavam neste Departamento 132 pessoas, das quais 20 eram quadros directivos e 110 quadros técnicos especializados, com formação qualificada.
726. O DRG estendia a sua intervenção a todas as empresas que pertenciam ao perímetro do Grupo B... e compreendia seis Direcções: Direcção de Risco de Crédito; Direcção de Monitorização de Risco de Crédito; Direcção de Planeamento e Controlo de Risco de Capital; Direcção de Risco de Mercado; Direcção de Risco Operacional e Direcção de Gestão Estratégica de Risco.
727.     O risco de crédito traduz-se na possibilidade da ocorrência de perdas financeiras resultantes de incumprimentos por clientes ou contrapartes das instituições e é um dos mais significativos a que se encontram expostas as Instituições de Crédito.
728.     A Direcção do Risco de Crédito criou e utilizou um sistema de identificação, avaliação e quantificação do risco de crédito que assentava em várias medidas. Designadamente na adopção de modelos de concessão de crédito, com a consequente diminuição da subjectividade na apreciação e decisão de concessão, na incorporação de sinais de alerta comportamental nos sistemas de «rating» e nos sistemas de informação, com a disponibilização das diferentes variáveis inerentes à avaliação do risco de crédito, de modo a permitir a consulta dos processos por todos os intervenientes.
729. A Direcção de Risco de Crédito tinha como principais encargos a atribuição dos «ratings» internos; a análise de operações de crédito e a emissão de pareceres técnicos; a análise de portfolios de crédito; a classificação de garantias e a projecção de perdas potenciais.
730. A Direcção de Monitorização de Risco de Crédito acompanhava e supervisionava o risco de crédito e definia medidas aplicáveis às situações que indiciassem uma deterioração de risco e tinha como principais encargos organizar e liderar o Comité de Imparidade, que examinava as imparidades de clientes que apresentassem variações mensais significativas; acompanhava as actividades de supervisão das carteiras de crédito levadas a cabo pelas entidades de supervisão e acompanhava as áreas comerciais na identificação antecipada de sinais de risco.
731.     A Direcção de Planeamento e Controlo de Risco de Capital centrava a sua actividade, essencialmente, na análise dos requisitos de capital da instituição e no provisionamento e tinha como funções principais desenvolver os cálculos dos requisitos de fundos próprios para cobertura do risco de crédito de acordo com as regras dos Acordos de Basileia II e III; desenvolvia a metodologia do cálculo das perdas por imparidade do crédito e planeava mensalmente o processo de determinação de perdas e de custo de provisionamento; e assegurava o reporte dos grandes riscos regulamentares.
732.     A Direcção de Risco de Mercado supervisionava o risco de mercado que consistia, em termos gerais, na possibilidade de perdas resultantes de uma alteração adversa do valor dos instrumentos financeiros em consequência da variação de taxas de juros, taxas de câmbio, preços de acções, preços de mercadorias, volatilidade e «spread» de crédito. A esta Direcção competia, entre outras funções, a identificação de novas metodologias, procedimentos e ferramentas de análise destes riscos, o reporte dos mesmos, nomeadamente, ao Banco de Portugal, ao Financial Services Authority e às agências de «rating» (Ms... e Sp...) e a gestão do risco de liquidez.
733. A Direcção de Risco Operacional controlava a eventualidade de ocorrência de factos com repercussão negativa, nos resultados ou no capital, resultantes do desajustamento ou deficiência de procedimentos, dos sistemas de informação, do comportamento de pessoas ou de acontecimentos externos e tinha como tarefa principal delinear, acompanhar e manter o Sistema de Gestão de Risco Operacional (SGRO) que visava uniformizar, sistematizar e assegurar as actividades de monitorização e confinamento do risco operacional nas unidades mais relevantes do Grupo B....
734.     A Direcção de Gestão Estratégica de Risco analisava todos os tipos de risco, de perspectiva transversal e do ponto de vista das metodologias, modelos de avaliação e políticas de risco. Subdividia-se na Unidade de Investigação e Desenvolvimento, que executava modelos para quantificação dos vários tipos de risco e analisava os desenvolvimentos metodológicos produzidos externamente e na Unidade de Políticas de Risco e Processos que propunha políticas de risco e desenvolvia modelos para identificar indícios de incumprimento e de suporte às acções comerciais de prevenção de risco para clientes particulares e empresas.
735. A Direcção de Gestão Estratégica de Risco colaborava estreitamente com a Unidade de Validação Independente que verificava e testava de modo contínuo os modelos e parâmetros de risco e tinha a seu cargo a articulação com o Banco de Portugal em matéria de confirmação dos modelos de risco de crédito.
736. A função de auditoria interna cabia ao Departamento de Auditoria e Inspecção (DAI), que dependia hierarquicamente do Conselho de Administração do B... e reportava funcionalmente à Comissão de Auditoria do B....
737. O DAI constituía uma unidade autónoma, dotada de independência em face das outras áreas do Grupo, designadamente das operacionais, não tendo poder de decisão relativamente a operações concretas e os auditores, no exercício das suas funções, tinham acesso a toda a informação e documentação utilizada e elaborada pelas estruturas ou processos auditados.
738.     Em 2014, trabalhavam neste Departamento 79 pessoas, das quais 27 tinham a seu cargo a auditoria a estruturas comerciais e 16 a serviços centrais, sucursais e participadas.
739.     O DAI estendia a sua intervenção a todas as empresas que pertenciam ao perímetro do Grupo B... e compreendia o Gabinete Técnico; a Auditoria a Estruturas Comerciais; a Auditoria a Serviços Centrais, Sucursais e Participadas; a Auditoria Informática; a Auditoria de Fraude e Ética; a Auditoria do Bha....
740.     O Gabinete Técnico tinha a seu cargo a área de suporte à actividade de auditoria, designadamente o desenvolvimento de metodologias e competências de consultoria, tratamento de informação, planeamento anual e manutenção e evolução dos programas de auditoria, reporte interno e externo, avaliação do desempenho interno, seguimento das recomendações e deficiências reveladas.
741. A Auditoria a Estruturas Comerciais era responsável por realizar auditorias em todas as redes comerciais do B... e do Baç..., SA.
742. A Auditoria aos Serviços Centrais, Sucursais e Participadas tinha a seu cargo a realização de auditorias a processos, estruturas e actividades em todas as áreas centrais do B... e às Sucursais e Filiais em Portugal e no estrangeiro. Na sequência do Aviso do BdP de 5/2008, era ainda responsável pela coordenação e supervisão da função de auditoria interna no âmbito da E..., S.A e neste domínio acompanhava as actividades de auditoria interna das entidades que consolidavam com aquela, quer estas possuíssem auditoria própria quer a realizassem em regime de «outsourcing», uniformizando procedimentos e procurando assegurar a eficiência do respectivo SCI.
743.     A Auditoria Informática efectuava as auditorias a todos os componentes dos Sistemas de Tecnologia e Informação, nomeadamente às infraestruturas, aplicações, segurança e controlos gerais.
744. A Auditoria de Fraude e Ética desenvolvia auditorias contínuas com vista a identificar riscos de fraude e incumprimentos do Código de Conduta.
745. A Inspecção tinha competência para averiguar e apurar factos e investigar responsabilidades no âmbito da fraude interna e externa;
746.     De acordo com o relatório do ETRICC 2 G..., o montante total dos cash flows que se estimavam distribuir à R..., S.A no período de 2014-2023 era de 1.546 milhões de euros;
747.     Mesmo com a operação de compra das acções da E..., S.A, a R..., S.A Investments, S.A. não apresentava desvios de imparidades;
748.     Após um contacto da Esa... SGPS S.A com o D...Bank em finais de 2013, em 20 de Janeiro de 2014, esta instituição financeira manifestou, formalmente, a sua disponibilidade para promover o financiamento da compra das acções da E..., S.A, pela R..., S.A à EI..., S.A, até € 400 milhões, através de um financiamento à Esa... SGPS S.A;
749.     A alienação pela EI..., S.A das acções da E..., S.A estava dependente do consentimento da Cde..., em virtude da existência de um penhor financeiro e da anuência do Banco de Portugal;
750.     Depois de ter caído para 2,18% em Maio de 2013, a taxa média praticada pelos bancos portugueses nos depósitos até um ano de prazo baixou, em Junho de 2013, para 2%, o que, nessa altura, registou o nível mais baixo desde Setembro de 2010;
751. Já quanto aos juros da dívida pública, a taxa brutal anual que vigorou, a partir de Agosto/Setembro de 2013, foi de 3,189%;
752. No período em causa nos presentes autos, o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A apresentava uma taxa de juro anual nominal de 4,25% p.a.;
*
- Factos respeitantes às condições particulares e económicas do Recorrente Haitong:
753. O Recorrente Haitong Bank foi, em momento posterior à data da prática dos factos, objeto dos presentes autos (maxime, no ano de 2015), objecto de alienação, tendo actualmente uma diferente estrutura acionista e estando hoje dotado de uma nova organização;
754. O Recorrente Haitong tem averbados os seguintes antecedentes contraordenacionais:
- Foi condenado, em 29/06/2017, numa coima de € 27.500,00, no processo de contraordenação n.º ...10, por violação do dever de defesa do mercado, consagrado no artigo 311.º do CVM (o que constitui contraordenação muito grave, nos termos do artigo 398.º, alínea d), do CdVM);
- Foi condenado, em 13/09/2018, numa admoestação, no processo de contraordenação n.º ...18, por violação do dever de comunicação à CMVM, até ao 3º dia útil do mês seguinte a que respeita, da informação sobre os valores mobiliários propriedade de outrem por si geridos, consagrado na norma número 1, ponto 1.2, da Instrução da CMVM n.º 4/2011 (o que constitui contraordenação muito grave, nos termos do artigo 389.º, 1, alínea c), do CdVM).
- Foi condenado, em 12/08/2019, numa coima de € 25.000,00, no processo de contraordenação n.º ...18, por violação do dever de informar imediatamente a CMVM sobre factos que possam vir a ser qualificados como crime contra o mercado de valores mobiliários, previsto no artigo 382.º, n.º 2 do CVM (o que constitui a prática de um contraordenação grave, punível com uma coima de € 12.500,00 a € 2.500.000,00, nos termos do disposto nos artigos 400.º, alínea b) e 388.º, n.º 1, alínea b), ambos do CdVM);
- Foi condenado, mediante sentença transitada em julgado em 22/06/2018, proferida por este tribunal no âmbito do processo nº 354/17.0YUSTR, pela prática de vinte e oito (28) contraordenações, a título doloso e em concurso efetivo, pela violação do dever de defesa de mercado, previstas e punidas pelos artigos 311.º, n.º 1, e n.º 2, alínea a), 388.º, n.º 1, alínea a), e 398.º, alínea d), do Código dos Valores Mobiliários, na redação vigente à data dos factos, em coimas parcelares no montante de vinte e cinco mil euros (€ 25.000,00) para cada uma das infrações e na coima única de trinta mil euros (€ 30.000,00);
755. O Recorrente Haitong, por referência ao ano de 2020, apresentou resultados apurados após impostos, negativos de 12.033.897,00, cifrando um capital social de € 588.941.612,00, passivos de € 1.350.271.994,00 e activos liquidos de € 1.939.213.606,00;
756. Tinha ao seu serviço 279 pessoas;
*
- Factos sobre condições pessoais e económicas do Recorrente AA:
757.     O Recorrente AA nasceu em ... a .../.../1944;
758. Bisneto de QQQ, fundador de um negócio de serviços financeiros com origem na “caza de câmbios” com estabelecimento na Rua ... e cujos primeiros registos contabilísticos a datarem de 1869, se firmavam em actos de compra e venda de obrigações, títulos de crédito nacionais e estrangeiros, empréstimos de dinheiro, operações de câmbios, e revenda de lotaria espanhola, AA frequentou o Ensino Secundário no ... e em 1969 concluiu a licenciatura em ... no ...;
759.     Terminada a licenciatura, cumpriu o Serviço Militar ..., no Curso de Formação de ... (15º ...), após o qual se juntou à equipa do então Bcl... onde, em 1972, assumiu a direcção do Gabinete de ... e posteriormente a ..., onde ficou até 1975. Em paralelo e no mesmo período de tempo, assumiu já um lugar na administração da Companhia de Seguros ...;
760.     Com a nacionalização da banca em 1975, o Bcl... tornou-se um de muitos bancos públicos que mais tarde foram alvo do processo de privatização e AA arrancou para uma segunda fase da sua vida agora sediada momentaneamente no estrangeiro;
761.     Em 1976 fundou e foi Director Superintendente e Director Presidente do Banco Bo…, S.A no ..., cargo que manteve até 1982;
762.     Em 1980 negociou com o Grupo Ma... a cedência de 50% do capital do Banco Bo…, S.A, e em 1981 negocia a cedência de 50% da posição ... no Banco Bo…, S.A ao Jmo...;
763.     Em 1982 Integrou a Comissão Executiva da ComE... em ... e em 1985 participou na transacção de aquisição pelo Cae... da posição de 50% do Jmo... no Banco Bo..., S.A;
764.     Em 1986 a E..., S.A e o Cae... fundaram o Bicr... em ... e a E..., S.A é admitida à cotação na ...;
765. Em 1990 assumiu a presidência do Conselho de Administração da P..., S.A, holding que passou a deter a maioria do capital da Companhia de Seguros... que tinha sido, entretanto, reprivatizada;
766. Em 1991 foi eleito Presidente do Conselho de Administração da E..., S.A - Lu... e da Bs..., S.A Portugal, e em 1992, após a segunda fase da privatização do Bcl... foi nomeado Vice-presidente do Conselho de Administração e Presidente da Comissão Executiva do B&....
767.     Granjeou com a sua actividade profissional a confiança da sua numerosa família e a confiança do mercado financeiro internacional e do mercado português, que viu nele a segurança e a estabilidade necessárias para o reassumir de funções à frente do B..., que foi, até antes de 2014, um sinal de prestígio e robustez;
768. Em 1996, AA foi admitido como membro do ... (...), e foi nomeado para o seu ... em 2003, assumindo mesmo a sua presidência em 2006, onde logo nesse ano presidiu às reuniões de ... e ...;
769. Em 1997 foi eleito administrador não Executivo, para um mandato de três anos, do Banco Bo..., S.A. (...) o qual foi posteriormente adquirido pelo Banco Br..., e em 1998 / 1999 participou no processo de segregação de funções entre as ... e ... entre os negócios à vista e sobre derivados, levado a cabo sob o patrocínio da CMVM;
770.     Mais tarde, e fruto do tempo que vivia de modernização da forma organizacional dos mercados organizados de bolsa, participou no processo de privatização das duas Bolsas, e na fusão das ... e ... (constituindo-se então a BVLP), sendo, em Dezembro de 1999, nomeado seu Presidente;
771. Em 2002, associando-se ao irrevogável processo de internacionalização e integração de mercados, participou na integração da BVLP na Euronext, sendo nomeado para o ... da ... (...), e em 2006 participou na fusão da Euronext com o ... (...), tendo feito parte do seu Conselho como membro não Executivo até 2011.
772.     Posteriormente foi eleito Administrador não Executivo do Banco Br... (...);
773. O seu prestígio era reconhecido não só em Portugal mas também além-fronteiras, tendo sido agraciado com a atribuição de condecorações, das quais se destacam a ordem de ... [ ], o “...", pelo Presidente da ... [ ], a de ... da República ... [ ] e a de ..., atribuída pelo ... da República ... em 2012 [ ].
774. Na sua qualidade de cidadão e de ..., angariou também vários prémios e distinções como sejam a de nomeado ... do Ano, em 1992 pela Associação Portuguesa de ..., em 2001 foi nomeado Personalidade do Ano pela ..., em ..., em 2008 foi reconhecido pela ... pelos altos serviços prestados, em 2011 foi-lhe atribuído o ..., e em 2012 foi distinguido com o prémio de ... pelo júri do ..., prémio nacional instituído pela ... em parceria com o ...;
775. Mais tarde, em 2008, a Associação ... distinguiu-o com a distinção de Vetus Alumnus Anno, podendo ler-se no diploma então lavrado: “Pela sua capacidade empreendedora e de liderança no desenvolvimento do projecto do B... (B...), após a reprivatização em 1992. O B... é notoriamente reconhecido como um caso de sucesso competitivo no sistema bancário português, tendo a sua quota de mercado passado de 9% em 1992 para 20% em 2007, com crescimento sustentado de criação de valor. O B..., em múltiplas iniciativas, é um parceiro do ... sob o estímulo de AA, o que muito contribui, também, para o prestígio da Escola”;
776. O B..., antes de 2014 e sob o comando de AA era um exemplo de liderança e de visão de quem conhecia o negócio, tendo as relações nacionais e internacionais certas, sendo visto entre os seus pares, antes de 2014, como fazendo uma gestão sensata e sendo-lhe reconhecida confiança;
777. O B... era amiúde, ao longo dos últimos anos, um dos títulos que se destacavam na bolsa portuguesa pela baixa volatilidade;
778. Todo o património do Recorrente AA está arrestado à ordem do processo-crime n.º 324/14.... e tem cauções no valor total de EUR 3 milhões prestadas nos processos-crime n.º 324/14.... e n.º 207/11...., em virtude das quais passou a auferir uma reforma e um complemento de reforma mensal líquido no total actualmente de cerca de € 1.900,00;
779. As contas bancárias do Recorrente na ..., detidas conjuntamente com a sua mulher, foram inicialmente arrestadas pelas autoridades ... e, posteriormente, também passaram a estar arrestadas pelo Tribunal Central de Instrução Criminal no NUIPC 324/14...., num montante de cerca de ... 9.000.000, equivalentes a cerca de EUR 8.540.316,90;
780. Actualmente, o Recorrente tem um diagnóstico clínico compatível com a doença de ...;
781.     O Recorrente AA foi condenado, no âmbito do processo n.º 182/16...., mediante sentença proferida por este tribunal transitada em 06/11/2020, nos seguintes termos:
a) a título de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de informação e comunicação adequados no B..., prevista nos art.ºs 19º e 20º do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de quatrocentos mil euros (€400.000,00);
b) a título de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente no B... quanto à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, prevista nos art.ºs 10º, 11º, n.ºs 1 a 3, 13º, n.ºs 1 e 2, 15, n.º2, alínea c) e 18º, n.ºs 1 e 2 do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de quatrocentos mil euros (€400.000,00);
c) a título de dolo necessário, no que concerne à prática da contra-ordenação de actos dolosos de gestão ruinosa em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea l) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de um milhão e novecentos mil euros (€1.900.000,00);
d) a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação de prestação de falsas informações ao Banco de Portugal que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea r) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de um milhão de euros (€1.000.000,00);
e) a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação consubstanciada na violação das normas de conflitos de interesses prevista no art.º 86º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea i) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de setecentos mil euros (€ 700.000,00);
f) Em cúmulo jurídico das coimas parcelares, de harmonia com o disposto no art.º 19º do Regime Geral das Contra-Ordenações, aprovado pelo DL 433/82 de 27.10, aplicável ex vi art.º 232º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima única de três milhões e setecentos mil euros (€3.700.000,00).
g) Foi ainda condenado nas sanções acessórias de: i. publicação pelo Banco de Portugal da punição definitiva a expensas do infractor, num dos jornais nacionais generalistas de maior tiragem; ii. inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento ou instituições de moeda electrónica, por um período de oito anos (8) anos;
*
- Factos sobre condições pessoais e económicas do Recorrente BB:
782. As valências e funções mais desempenhadas, na prática, pelo Recorrente BB dentro do B... tinham que ver, principalmente, com a angariação e manutenção de clientes (private) e, em certa medida, também, com a representação externa do Banco, actuando quase como um “relações públicas” daquele;
783. Entre os seus pares era e é visto como uma pessoa que confia e é de confiança, que exerceu as suas funções com sentido de responsabilidade e rectidão, procurando respeitar os interesses dos clientes, investidores, colaboradores e demais stakeholders e honrando o nome da sua família, mas não sendo considerado um profissional tecnicamente muito dotado;
784. O Recorrente BB não exerce actualmente quaisquer funções no sector bancário, há sensivelmente 7 anos;
785.     Sofreu um Acidente Vascular Cerebral que o deixou física e psiquicamente debilitado, sem capacidade de locomoção, com períodos de desorientação no tempo e no espaço, estando, previsivelmente em definitivo, física e psiquicamente incapacitado para o exercício de funções semelhantes às que estão em causa nos autos;
786.     O Recorrente confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do denominado “G...” fossem apresentadas ou tomadas por AA e confiava no modelo de repartição de tarefas instituído, cingindo a sua actuação no dia a dia do denominado “G...” às funções descritas no primeiro ponto deste grupo de factos;
787. Logo em 2014, o Recorrente pediu desculpas públicas institucionais aos clientes do B...;
788. O Recorrente BB, por referência ao ano de 2020, apresentou rendimentos a título de trabalho dependente e/ou pensões, no valor de € 463.117,76 e rendimentos a título de rendas com imóveis no valor de € 8.306,40;
789.     Não lhe são conhecidos antecedentes contra-ordenacionais;
*
- Factos respeitantes às condições pessoais e económicas do Recorrente CC:
790. O Recorrente CC não exerce actividade profissional, não auferindo rendimentos;
791. O impugnante acorreu ao aumento de capital da Ec..., S.A. com o valor de três milhões de euros, o qual obteve através de empréstimo hipotecário junto do Montepio, dando de garantia o imóvel da sua residência, o qual perdeu, por não ter sido possível reembolsar o mutuante, vistos os acontecimentos subsequentes que levaram à crise do G...;
792. Em virtude de determinação proferida em processo-crime no qual é arguido, encontra-se arrestado o quinhão hereditário existente por morte de sua mãe e de um seu tio;
793. Confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do denominado “G...” fossem apresentadas ou tomadas por AA e confiava no modelo de repartição de tarefas instituído, arredando-se das decisões de gestão (incluindo financeira) da EI..., S.A e da Es...;
794. O ramo no denominado “G...” a que se dedicava, de facto, era o ramo “não financeiro”;
795. Não lhe são conhecidos antecedentes contra-ordenacionais;
*
- Factos respeitantes às condições pessoais e económicas do Recorrente DD:
796. O Recorrente DD foi condenado, a título de dolo eventual, no âmbito do processo n.º 182/16...., mediante sentença proferida por este tribunal transitada em 06/11/2020:
a) No que concerne à omissão de implementação de sistemas de informação e comunicação adequados no B..., prevista nos art.ºs 19º e 20º do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de €.200.000,00;
b) No que concerne à omissão de implementação de sistemas de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente no B... quanto à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, prevista nos art.ºs 10º, 11º, n.ºs 1 a 3, 13º, n.ºs 1 e 2, 15, n.º2, alínea c) e 18º, n.ºs 1 e 2 do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de € 300.000,00;
c) Em cúmulo jurídico das coimas parcelares, de harmonia com o disposto no art.º 19º do Regime Geral das Contra-Ordenações, aprovado pelo DL 433/82 de 27.10, aplicável ex vi art.º 232 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima única de € 350.000,00;
d) foi ainda condenado nas sanções acessórias de: i. publicação pelo Banco de Portugal da punição definitiva a expensas do infractor, num dos jornais nacionais generalistas de maior tiragem; ii. inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento ou instituições de moeda electrónica, por um período de um (1) ano.
797.     O Recorrente DD, no ano de 2020, não teve rendimentos;
*
- Factos respeitantes às condições pessoais e económicas do Recorrente EE:
798.     Por referência ao ano de 2020, o Recorrente EE apresentou um rendimento global de € 574.285,73;
799.     Não lhe são conhecidos antecedentes contra-ordenacionais;
*
- Factos respeitantes às condições pessoais e económicas do Recorrente FF:
800. O Recorrente FF, por referência ao ano de 2020, apresentou a título de rendimentos por trabalho dependente e/ou pensões, o valor de € 161.000,00;
801.     Não lhe são conhecidos antecedentes contra-ordenacionais.
***
FACTOS NÃO PROVADOS:
Subsecção II – O Haitong: caracterização e participação dos Recorrentes nos seus órgãos de gestão:
1. A equipa da Direcção de Mercado de Capitais do BEl... recebia instruções ou ordens, do DFME do B..., que conformavam de forma obrigatória o serviço àquela equipa destinado, em termos de relação de subordinação da primeira para com o segundo;
Subsecção V – Dos factos que levaram à suspensão da comercialização de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A:
2. Por referência ao facto provado n.º 347 e 506, foi um detalhe de dívida que foi apresentado por III e por referência a Setembro de 2013;
3. Por referência ao facto provado n.º 348 (O montante global da dívida constante do documento apresentado por III era muito superior ao montante conhecido por referência a 30 de Dezembro de 2012), era perceptível logo nesse documento que o aumento da dívida era por referência à EI..., S.A;
4. Na reunião dada como provada nos factos n.ºs 346 e ss, III esclareceu que o aumento do passivo se devia não apenas a dívida contraída nos três primeiros trimestres de 2013, como também a dívida contraída nos exercícios anteriores a 2013, que não estava reflectida no balanço da EI..., S.A referente a 2012;
5. III comunicou, na mesma reunião (dos factos provados n.ºs 346 e ss), que o montante da dívida contraída pela EI..., S.A nos exercícios anteriores a 2013, que não estava reflectida no balanço da EI..., S.A referente a 2012, ascendia a cerca de € 1.300.000.000,00;
6. Por referência ao facto provado n.º 352, também foi discutido sobre as possíveis justificações para a omissão do registo de parte da dívida emitida pela EI..., S.A no balanço da EI..., S.A a 31 de Dezembro de 2012;
7. Por referência ao facto n.º 353, III levou uma listagem das emissões de dívida da EI..., S.A, da qual constavam as emissões não registadas no balanço da EI..., S.A e referiu que essas emissões de dívida não registadas (tal como provado) se reportavam a dívida não constante nas contas fechadas de 2012;
8. Por referência ao facto provado n.º 355, dos elementos informados também constava o montante exacto e total da dívida da EI..., S.A a 30 de Setembro de 2013 e estava discriminada a dívida contraída nos exercícios anteriores a 2013 que não estava reflectida no balanço da EI..., S.A referente a 2012;
9. Por referência ao facto n.º 356, na informação remetida ao Banco de Portugal e à Pwa..., S.A também continha discriminada a dívida contraída nos exercícios anteriores a 2013 que não estava reflectida no balanço da EI..., S.A referente a 2012;
10. Por referência ao facto provado n.º 357 e 573, a reunião dada como provada ocorreu em data anterior a 18 de Novembro de 2013;
Subsecção III – Do Recorrente AA:
11. O Recorrente AA sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
12. O Recorrente AA sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial;
13. AA sabia que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizou de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
14. AA sabia que o B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um tratamento transparente e equitativo;
15. AA sabia que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
16. AA quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... prestasse a informação contida nas Notas Informativas do papel comercial emitido pela R..., S.A junto dos seus clientes, nos exactos termos em que esta foi prestada;
17. AA quis que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
18. AA quis que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um tratamento recto e transparente;
19. AA quis que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
Subsecção IV – Do Recorrente BB:
20. O Recorrente BB foi informado, por III, na Primavera de 2013, durante uma viagem de avião para ..., de que a EI..., S.A se encontrava em situação de falência técnica;
21. O Recorrente BB sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A não revelavam a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
22. O Recorrente BB sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
23. O Recorrente BB sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial;
24. O Recorrente BB sabia que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se organizou de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
25. BB sabia que o B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, um diálogo transparente e um trato recto;
26. BB sabia que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como aos interesses da Epi..., S.A, da EI..., S.A e da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
27. O Recorrente BB quis que o B... colocasse papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada, agindo de forma livre e consciente;
28. O Recorrente BB quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes, prestando-lhes informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada;
29. O Recorrente BB quis que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... AA, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., agindo quanto à situação da EI..., S.A de forma livre e consciente;
30. O Recorrente BB quis que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, um tratamento transparente e equitativo, agindo de forma livre e consciente quanto à situação da EI..., S.A;
31. O Recorrente BB quis que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, o B... desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (o arguido CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os arguidos AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, agindo de forma livre e consciente quanto à situação da EI..., S.A;
Subsecção V – Do Recorrente CC:
32. O Recorrente CC foi informado, por diversas vezes desde o ano de 2008, por III, de que a EI..., S.A se encontrava em falência técnica;
33. O Recorrente CC foi informado por III, no ano de 2012, de que nas demonstrações financeiras da EI..., S.A não constava a totalidade do passivo daquela sociedade;
34. O Recorrente CC foi informado, por JJJ, do aumento do passivo da EI..., S.A durante os nove primeiros meses de 2013, no montante de cerca de mil milhões de euros;
35. O Recorrente CC sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A não revelavam a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
36. O Recorrente CC sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
37. O Recorrente CC sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial;
38. O Recorrente CC sabia que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se organizou de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B...;
39. O Recorrente CC sabia que o B... não assegurou aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, um tratamento transparente e equitativo;
40. O Recorrente CC sabia que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, deu prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial;
41. O Recorrente CC quis que o B... colocasse papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 a informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada;
42. O Recorrente CC quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes, prestando-lhes informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada, nos exactos termos em que esta foi prestada;
43. O Recorrente CC quis que o B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... AA, BB, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., actuando de forma voluntária e consciente na situação do papel comercial da EI..., S.A;
44. O Recorrente CC quis que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, um tratamento recto e transparente, actuando de forma voluntária e consciente na situação do papel comercial da EI..., S.A;
45. O Recorrente CC quis que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B..., AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, actuando de forma voluntária e consciente na situação do papel comercial da EI..., S.A;
Subsecção VI – Do Recorrente DD:
46. Era, pelo menos, desde Novembro de 2013 que, tal como provado, o Recorrente DD sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
47. O Recorrente DD sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
48. O Recorrente DD sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
49. O Recorrente DD quis, a partir de Novembro de 2013, que o B... continuasse a colocar papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, com prestação de informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A, nos exactos termos em que esta foi prestada;
50. O Recorrente DD quis, a partir de 9 de Janeiro de 2014, que o B... continuasse a colocar papel comercial da R..., S.A junto dos seus clientes com prestação de informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A, nos exactos termos em que esta foi prestada;
Subsecção VII – Do Recorrente EE:
51. O Recorrente EE foi informado, por VV, em 15 de Novembro de 2013 de que nas contas individuais da EI..., S.A referentes a 2012, na rubrica do passivo “Notes” não estava reflectido um montante adicional de cerca de 1,3 mil milhões de euros;
52. O Recorrente EE foi informado, na referida reunião de 15 de Novembro de 2013, que o montante inscrito na rubrica “Passivo” das contas individuais da EI..., S.A respeitantes ao exercício de 2012, não correspondia ao montante total do passivo da EI..., S.A naquela data;
53. O Recorrente EE foi ainda informado, na mesma reunião, de que o aumento do passivo da EI..., S.A, por referência ao decurso dos primeiros nove meses de 2013, se cifrava precisamente num montante de cerca de € 1.056.366.000,00;
54. O Recorrente EE não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições apuradas;
55. Era desde, pelo menos, 15 de Novembro de 2013, que, tal como provado, o Recorrente EE tinha conhecimento de que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
56. O Recorrente EE sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
57. O Recorrente EE sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
58. O Recorrente EE, a partir de 15 de Novembro de 2013 e até data não concretamente apurada mas entre 19 e 27 de Novembro, quis que o B... prestasse informação aos seus clientes no âmbito do papel comercial da EI..., S.A que não revelasse a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B..., agindo de forma consciente e voluntária (passivo omitido nas contas fechadas de 2012 e aumento do passivo no ano de 2013);
58. A O Recorrente EE, a partir de data não concretamente apurada mas entre 19 e 27 de Novembro, quis que o B... prestasse informação aos seus clientes no âmbito do papel comercial da EI..., S.A que não revelasse a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A, no que toca às contas individuais daquela sociedade referentes a 2012, à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B..., agindo de forma consciente e voluntária;
59. O Recorrente EE quis que o B..., a partir de 9 de Janeiro de 2014, passasse a prestar informação aos seus clientes, no âmbito da colocação de papel comercial da R..., S.A, de onde não constasse a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B..., agindo de forma consciente e voluntária;
60. O Recorrente EE quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo a essa comercialização;
Subsecção VIII – Do Recorrente FF:
61. O Recorrente FF, na qualidade de Administrador com o pelouro do ..., interveio na elaboração das minutas dos contratos celebrados em execução da operação de concentração, pela R..., S.A, da participação do G... na E..., S.A, no contexto da reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações;
62. O Recorrente FF sabia do exacto conteúdo das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A que estavam em vigor nas datas de comercialização de papel comercial emitido por esta sociedade entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (Notas de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014);
63.       O Recorrente FF sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A em vigor à data da comercialização deste papel comercial entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 (de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014) continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B...;
64.       O Recorrente FF quis que o B..., a partir de 9 de Janeiro de 2014, passasse a prestar informação aos seus clientes, no âmbito da colocação de papel comercial da R..., S.A, de onde não constasse a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos clientes do B..., agindo de forma consciente e voluntária.
*                                                          
III. Fundamentação de Direito.
O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. os artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2 e 410º, n.º 2, als. a), b) e c) do Código de Processo Penal).
Estando em causa o recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75º n.º 1 do DL n.º 433/82, de 27/10 (RGCO) estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal apenas conhece de matéria de direito.
Sem prejuízo de este Tribunal da Relação não poder reapreciar a matéria de facto julgada pelo Tribunal recorrido, pode tomar conhecimento das nulidades previstas no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, segundo o qual “mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
 a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
 c) erro notório na apreciação da prova.
Acontece que, tal como se extrai do referido preceito legal, aqueles vícios tem de resultar do texto da decisão recorrida e não de elementos processuais a ela estranhos, ainda que produzidos no âmbito da discussão judicial do caso, pelo que, designadamente a insuficiência da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação, ou contradição entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova devem resultar de per si do texto da decisão recorrida e ser analisados em função do aí consignado.
*
Questões a decidir.
I- Recurso Haitong Bank, SA
1ª - Da falta de fundamento para imputação das infrações ao Haitong Bank 
1.1- Da imputação a título objectivo:
1.1.1 o art. 7º do CdVM não é fonte autónoma de deveres de informação;
1.1.2 a responsabilidade pelo conteúdo das Notas Informativas- a lei especial constante do Regime Jurídico do Papel Comercial;
1.1.3 o Haitong Bank não estava sujeito aos deveres de informação que recaem sobre os intermediários financeiros;
1.2- Da imputação a título objectivo e subjectivo atarvés do conceito extensivo de autoria;
2ª- Da imputação a título subjectivo assente na Teoria do Risco da Organização:
2.1 O risco de organização enquanto risco de inadequado tratamento interno da informação- o Sistema de Controlo Interno e de Gestão de Risco;
2.2 Da impossibilidade de imputação do conhecimento adquirido fora do exercício de funções no Haitong Bank;
3ª- Da violação dos direitos de defesa e contraditório;
4ª- da prescrição do procedimento contraordenacional;
5ª- Da exclusão da responsabilidade do Haitong Bank, por força da Medida de Resolução de 3 de Agosto de 2014 do Banco de Portugal;
6ª -Pedido de Reenvio Prejudicial obrigatório;
7ª- Recursos interpostos autonomamente:
7.1 Da prorrogação do prazo para apresentação de recurso de impugnação judicial ( recurso da decisão proferida pela CMVM a 30/7/2021);
7.2 Da produção de prova testemunhal ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 19/10/2021);
7.3 prorrogação do prazo para interposição de recurso da sentença ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 15/2/2022);
7.4 Início do prazo de interposição de recurso da sentença ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 22/2/2022)

II- Recurso AA:
1ª Vícios da sentença em virtude da violação da lei na tramitação do processo:
1.1-Ilegalidade do despacho de 19/10/2021, no segmento em que indeferiu a reinquirição de testemunhas já ouvidas na fase administrativa dos autos, e do despacho de 25/11/2012;
1.2 – Ilegalidade do despacho de 15/11/2021, no segmento em que indeferiu a inquirição de testemunhas, e do despacho de 16/12/2021;
1.3- Ilegalidade dos despachos de 10/2/2022 e de 15/2/2022;
2ª- Vícios da matéria de facto da sentença recorrida ( art. 410º nº 2 do CPP):
2.1. Erro notório na apreciação da prova: declarações de III e, a reestruturação da R..., S.A;
2.2. contradição insanável da fundamentação da sentença recorrida:
 i)- contradição entre os factos provados 642 e 654;
ii)-contradição entre os factos vertidos no facto provado 643;
iii)-contradição entre os factos 182 e 186;
iv)-contradição da fundamentação nas páginas 784 e 785 da sentença;
3ª- Nulidade da sentença recorrida por alteração não substancial de factos não comunicada ao recorrente e por imputação de factos com recurso a juizos conclusivos e valorativos;
4ª- Inadmissibilidade da alteração não substancial dos factos na sentença recorrida face á decisão da CMVM;
5ª- Violação do princípio Ne Bis In Idem: Processo 58/... do Banco de Portugal( Processo 182/16....);
6ª- Nulidade da decisão final por imputação genérica de factos e consequente nulidade da sentença recorrida;
7ª- Nulidade do processo por utilização de prova proibida e nula produzida no ...;
8ª- Violação do principio da igualdade e métodos proibidos de prova;
9ª- Vícios relativos ao depoimento da testemunha CCC e nulidade da acusação, da decisão final e da sentença recorrida;
10ª- Violação do direito de defesa e nulidade por falta de produção de prova:
i)indeferimento da inquirição da testemunha CCC;
ii) indeferimento da inquirição das testemunhas EEE e FFF através de meios de cooperação internacional;
iii) indeferimento da inquirição da testemunha NNN;
iv)indeferimento da acareação entre as testemunhas LLL e OOO;
11ª- Proibição de valoração de prova testemunhal por violação do direito fundamental ao contraditório ( direito de defesa);
12ª-Falta da imputação de factos concretos no alegado conflito de interesses relativo ao papel comercial da R..., S.A;
13ª- Prescrição da responsabilidade contraordenacional;
14ª- A violação das regras de conflito de interesses consubstancia a prática de uma única contraordenação por cada pretensa violação das regras prevista no art. 309º do CdVM;
15ª- Concurso aparente de contraordenações:
i) relação de consumpção entre as 6 contraordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro ( art. 309º do CdVM);
ii) relação de subsidiariedade entre o nº 1 do art. 309º do CdVM e os nºs 2 e 3 do art. 309º do CdVM;
iii) relação de consumpção entre as 4 contraordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre conflito de interesses do intermediário financeiro previstas nos nºs 2 e 3 do art. 309º do CdVM;
iv) concurso aparente entre as contraordenações consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses relativamente á colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
v) concurso aparente entre as contraordenações consubstanciadas na alegada violação do art. 309º nº 3 do CdVM e o art. 7º nº 1 do CdVM;
16ª-Relevância do facto impeditivo do resultado não incluído no tipo contraordenacional;
17ª-Inconstitucionalidade da medida da coima prevista nas normas contraordenacionais invocadas:
17.1. Inconstitucionalidade da moldura abstrata da coima aplicável: violação do princípio da proporcionalidade;
17.2. Inconstitucionalidade da moldura abstrata da coima aplicável pela sua indeterminação: violação do princípio da legalidade contraordenacional;
18ª- Cúmulo jurídico: a errada determinação da medida concreta da coima:
18.1. Do erro da sentença recorrida quanto á apreciação da imputação ao ora recorrente de uma actuação a título de dolo eventual quanto á colocação do papel comercial da R..., S.A;
18.2. insuficiência da matéria de facto provada e o erro da sentença recorrida quanto aos benefícios obtidos pelo ora recorrente;
18.3. insuficiência da matéria de facto provada: a falta de ponderação dos actos do ora recorrente destinados a reparar os danos ou obviar aos perigos causados pelas infrações;
18.4. erro da sentença quanto á existência de antecedentes contraordenacionais;
18.5. erro na ponderação da situação econíomica do ora recorrente na determinação da coima aplicável;
18.6. erro na ponderação da situação pessoal do ora recorrente na determinação da coima aplicável.

III- Recurso de BB
1ª- Da dupla violação do princípio Ne Bis In Idem;
2ª- Do princípio da confiança;
3ª- Da alegada violação das regras sobre conflito de interesses;
4ª- Do alegado incumprimento do dever de qualidade da informação;
5ª- Das sanções:
5.1 Admoestação;
5.2 redução da coima/atenuação especial;
5.3 suspensão da execução da coima;
5.4 revogação da sanção acessória de inibição do exercíco de funções.

IV- Recurso de CC
1ª- Suspensão da execução da coima.

V- Recurso de DD
- Vícios processuais:
1ª- Nulidade da sentença por insuficiente fundamentação e carácter subsidiário da baixa do processo;
2ª- Vícios do art. 410º nº 2 do CPP:
2.1 insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
2.2 contradição insanável da fundamentação;
2.3 erro notório na apreciação da prova;
- Vícios substantivos:
3ª-errónea solução jurídica dada pelo tribunal a quo à luz dos factos considerados provados:
3.1 RJPC- as ofertas particulares de papel comercial apenas faziam impender o dever de informação sobre as entidades emitentes;
3.2 a intervenção do recorrente na reunião do Conselho Superior de 7/1/2014 não implicou um contributo causal relevante para a prática do ilícito contraordenacional;
3.3 a factualidade provada não sustenta a integração normativa do preenchimento do elemento subjectivo do tipo contraordenacional;
3.4 erro sobre a factualidade típica que determina a exclusão do dolo;
 3.5 falta de consciência da ilicitude por erro não censurável.
*
Por uma questão de simplificação de leitura do presente Acórdão, apesar de algumas das questões em apreciação terem sido suscitadas por mais do que um dos Recorrentes, procederemos ao seu conhecimento em termos individualizados.
*
Cumpre decidir:
I- Recurso Haitong Bank, SA
1ª- Da falta de fundamento para imputação das infrações ao Haitong Bank 
1.1- Da imputação a título objectivo:
1.1.1. o art. 7º do CdVM não é fonte autónoma de deveres de informação;
1.1.2. a responsabilidade pelo conteúdo das Notas Informativas- a lei especial constante do Regime Jurídico do Papel Comercial;
1.1.3. o Haitong Bank não estava sujeito aos deveres de informação que recaem sobre os intermediários financeiros.
Todas estas questões suscitadas pelo recorrente têm de ser necessariamente decididas, como sempre, socorrendo-nos da matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo quanto à integração dos elementos objectivos e subjectivos dos ilícitos contraordenacionais que lhe foram imputados e pelos quais foi condenado.
O aqui recorrente, na sentença recorrida, foi assim condenado:
1- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros);
2- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros);
3- Operando ao cúmulo jurídico das coimas supra referidas, na coima única conjunta de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros);
4- Suspender parcialmente a execução da coima única conjunta cominada de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), no montante de € 200.000,00 (duzentos mil euros) pelo período de 2 (dois) anos.
Vejamos a matéria de facto que foi dada como provada, com relevo para a participação do aqui recorrente, nos factos subjacentes à prática dos ilícitos contraordenacionais pelos quais foi condenado:
802. O Haitong Bank, S.A. (denominado, à data da prática dos factos, BEl.... - BEl...) era, à data da prática dos factos que constituem objecto do presente processo de contra-ordenação, um intermediário financeiro registado na CMVM para o exercício das seguintes actividades de intermediação financeira:
xiv. Execução de ordens (desde 5 de Maio de 1993);
xv. Receção e transmissão de ordens por conta outrem (desde 5 de Maio de 1993);
xvi. Negociação por conta própria em valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
xvii. Gestão de carteiras por conta de outrem (desde 3 de Janeiro de 2005);
xviii. Registo e depósito de instrumentos financeiros (desde 8 de Novembro de 1993);
xix. Serviço câmbios e aluguer de cofres (desde 29 de Julho de 1991);
xx. Consultoria sobre a estrutura de capital (desde 29 de Julho de 1991);
xxi. Assistência em oferta pública de valores mobiliários (desde 29 de Julho de 1991);
xxii. Consultoria para investimento (desde 29 de Julho de 1991);
xxiii. Depositário de valores mobiliários (desde 8 de Novembro de 1993);
xxiv. Concessão de crédito (desde 29 de Julho de 1991);
xxv. Tomada firme e Colocação em oferta pública (desde 29 de Julho de 1991);
xxvi. Elaboração de estudos de investimento/análise (desde 31 de Dezembro de 2007)- facto provado 60;
803. Em assembleia geral universal realizada a 7 de Setembro de 2015, o BEl... deliberou alterar a sua denominação social para Haitong Bank, S.A.- facto provado 61;
804. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, o BEl... integrava o G...- facto provado 62;
805. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a totalidade do capital social do BEl... era detida pelo B...- facto provado 63;
806. O Conselho de Administração do BEl..., eleito na Assembleia Geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016, tinha a seguinte composição:
x.         AA (Presidente);
y.         QQQ (Vice-Presidente);
z.         II (Vice-Presidente);
aa.       HHHH (Vice-Presidente);
bb.       IIII (Vice-Presidente);
cc.       PPP (Vice-Presidente);
dd.      JJJJ;
ee.       KKKK;
ff.        LLLL;
gg.       MMMM;
hh.       NNNN;
ii.         BB;
jj.         OOOO;
kk.       PPPP;
ll.         QQQQ;
mm.     DD;
nn.       RRRR;
oo.       SSSS;
pp.       TTTT;
qq.       UUUU;
rr.        VVVV;
ss.        HHH;
tt.        WWWW- facto provado 64;
807. À data da prática dos factos que constituem o objecto do presente processo, a Comissão Executiva do BEl... era composta pelos seguintes membros:
xv.       QQQ (Presidente);
xvi.      II (Vice-Presidente);
xvii.     HHHH;
xviii.    IIII
xix.      PPP;
xx.       WWWW;
xxi.      KKKK;
xxii.     LLLL;
xxiii.    RRRR;
xxiv.    UUUU;
xxv.     OOOO;
xxvi.    SSSS;
xxvii.   PPPP;
xxviii.  QQQQ- facto provado 65;
808.     À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente AA era Presidente do Conselho de Administração do BEl...- facto provado 66;
809.     À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente BB era membro do Conselho de Administração do BEl...- facto provado 67;
810.     À data da prática dos factos objecto do presente processo, o Recorrente DD era membro do Conselho de Administração do BEl...- facto provado 68;
811.     À data da prática dos factos objecto do presente processo de contra-ordenação, a estrutura orgânico-funcional do Recorrente Haitong (antes BEl...) era composta por Comités, Direcções, Departamentos e Unidades- facto provado 69;
812.     O BEl... tinha os seguintes comités:
(g)       Comité de Activos e Passivos;
(h)       Conselho de Crédito e Riscos;
(i)        Comité de Gestão Global;
(j)        Comité Operacional;
(k)       Comités de Produto;
(l)        Comités de Geografia- facto provado 70;
813.     As Direcções do BEl... eram as seguintes:
xv.       Clientes;
xvi.      Clientes particulares;
xvii.     Serviços financeiros;
xviii.    Médias empresas;
xix.      Acquisition Finance e Outros Financiamentos;
xx.       Project Finance e Securitização;
xxi.      Mercado de Capitais;
xxii.     Renda Fixa;
xxiii.    Tesouraria;
xxiv.    Assessoria em Estrutura de Capitais;
xxv.     Sindicação de Créditos;
xxvi.    Global Markets;
xxvii.   Acções;
xxviii.  Gestão de Activos- facto provado 71;
814.     Os Departamentos do BEl... eram os seguintes:
(m)      Compliance;
(n)       Comunicação e Imagem;
(o)       Contabilidade;
(p)       Informação;
(q)       Informação e Controlo de Gestão;
(r)        Informática;
(s)        Jurídico;
(t)        Operações;
(u)       Organização e Meios;
(v)       Planeamento e Desenvolvimento Estratégico;
(w)      Recursos Humanos;
(x)       Risco, o qual se decompunha nas duas unidades seguintes:
c.         Análise de Risco de Crédito; e
d.         Controlo de Risco- facto provado 72;
815. A estrutura orgânico-funcional do BEl... integrava ainda a Unidade de Project Management Office & Change Management- facto provado 73;
816. Dentro da estrutura orgânico-funcional do BEl..., esteve directamente envolvida na execução dos factos que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação a Direcção de Mercado de Capitais, que era quem detinha o poder de decidir e executar a realização do tipo de operações que foi realizada pelo BEl... (agora Haitong) em causa nos autos- facto provado 74;
817. A Direção de Mercado de Capitais era responsável pela actividade de organização, estruturação e implementação de produtos de dívida e equity direcionados e estruturados para o mercado- facto provado 75;
818. A “Área de Originação de Operações de Ações” desta Direcção desenvolvia trabalhos de organização, montagem e colocação em bolsa de empresas em processos de Privatização, Ofertas Públicas Iniciais (IPOs), Aumentos de Capital, Ofertas Públicas de Aquisição (OPAs), Private Placements e Block Trades, bem como de produtos equity-linked, como as obrigações convertíveis e produtos derivados sobre ações para clientes empresas- facto provado 76;
819. Na vertente de dívida, esta Direção era responsável pela estruturação e montagem de vários produtos de dívida, tais como emissões de dívida sénior para mercado, emissões high yield, private placements de dívida emitida por clientes corporate ou entidades estatais ou empresas públicas e municípios, produtos híbridos, project finance bonds e papel comercial- facto provado 77;
820. A Direção de Mercado de Capitais implementava ainda operações de financiamento que envolviam a estruturação e colocação de emissões de obrigações- facto provado 79;
821. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contraordenação, a Direção de Mercado de Capitais tinha como directora JJ- facto provado 80;
822. À data da prática dos factos objecto do presente processo de contraordenação, parte da equipa da Direção de Mercado de Capitais do BEl... trabalhava na sede do B..., juntamente com a equipa do DFME- facto provado 81;
823. A equipa da Direcção de Mercado de Capitais integrada no B..., reportava ao BEl..., em concreto à sua Directora, JJ- facto provado 82;
824. Grande parte do trabalho da referida equipa, de que é exemplo a preparação da montagem e o agenciamento de programas de papel comercial e de emissões de obrigações, tinha origem no DFME do B..., de quem essa equipa recebia indicações, em termos de interacção mútua, atenta a proximidade física dos departamentos- facto provado 83;
825. A 3 de Setembro de 2013 foi celebrado um contrato denominado “Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial” entre a EI..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador- facto provado 200;
826. Pelo referido Contrato, os contraentes estabeleceram as regras relativas á organização, emissão e colocação das emissões de papel comercial a emitir pela EI..., S.A, até a um limite máximo de €1.000.000.000,00 ( mil milhões de euros), no prazo de cinco anos- facto provado 202;
827. Nos termos definidos na cláusula 5ª, n.º 2 do Contrato, “Cada emissão será organizada e liderada pelo Agente [o BEl...], o qual desempenhará igualmente as funções de Instituição Registadora e de Agente Pagador”- facto provado 203;
828. Na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, os contraentes estabeleceram o seguinte:
“1. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, a Emitente pagará ao BEl..., na Data de Subscrição de cada Emissão, uma Comissão de Agente de € 3.500 (três mil e quinhentos euros) por cada Emissão a realizar ao abrigo do Programa, com um valor máximo anual de € 100.000,00 (cem mil euros).
2. Durante todo o período de vigência do presente Contrato, o B... poderá ainda cobrar à Emitente uma Comissão de Colocação no valor máximo de 1% (um por cento) ao ano sobre o montante e Prazo de Emissão de cada Emissão.”-facto provado 205;
829. Em anexo ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial encontram-se minutas da ficha técnica de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A, bem como da notificação a enviar pela EI..., S.A previamente a cada emissão- facto provado 206;
830. A minuta do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial foi elaborada pelo BEl..., com o apoio do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...- facto provado 207
831. Ao abrigo deste Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, a EI..., S.A procedeu a uma única emissão de papel comercial com a designação “EI..., S.A 18/12/13” com data de subscrição de 18/09/2013, código ISIN ..., no prazo de 3 meses (vencimento a 18/12/2013) taxa de juro anual nominal de 4,25%- facto provado 208;
832. Com referência à referida emissão, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial- facto provado 213;
833. Do considerando g) do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial consta que “a Emitente entregou ao Agente a seguinte documentação. (…) (v), legal opinion emitida pela Llp..., ...”- facto provado 216;
834. Contudo, na data da celebração do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial não havia sido emitida qualquer legal opinion pela Llp..., ...- facto provado 217;
835.     Sucede que, uma vez que o B... pretendia avançar no início de Setembro de 2013 com a colocação, junto dos seus clientes, de uma primeira emissão de papel comercial da EI..., S.A, foi decidido pelo Recorrente DD, que o comunicou a TT, Directora do DGP, proceder à celebração do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial mesmo antes de ter sido emitida a referida legal opinion- facto provado 218;
836. A sociedade de advogados Llp..., ... condicionou a emissão de uma legal opinion à imposição de um limite mínimo de subscrição de € 100.000,00, bem como um limite máximo de 150 subscritores de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A- facto provado 219;
837. Na sequência desta condição imposta pela sociedade de advogados Llp..., ... foi necessário proceder à elaboração e assinatura de um novo Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial- facto provado 220;
838. Assim, a 9 de Setembro de 2013 foi celebrado um novo Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, entre a EI..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador- facto provado 221;
839. A minuta do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro de 2013 foi igualmente elaborada pelo BEl..., com o apoio do Departamento de Assuntos Jurídicos do B...- facto provado 222;
840. Em representação do BEl... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da referida sociedade KK e NNNNN- facto provado 224;
841. O conteúdo do referido contrato é idêntico ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 3 de setembro de 2013, com exceção do disposto nos nºs 1, 4 e 5 da cláusula 5ª do mesmo- facto provado 226;
842. Ao abrigo deste Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de setembro a EI..., S.A procedeu às seguintes emissões de papel comercial: (…)- facto provado 230;
843. Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo B, que aqui se dá por reproduzido- facto provado 232;
844. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19.ª do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial- facto provado 235;
845. Em 19 de setembro de 2013 foi celebrado um Aditamento ao Contrato de Organização e Colocação de papel Comercial pelo qual aderiram ao Contrato de Organização e Colocação de papel Comercial de 9 de setembro de 2013, assumindo posição idêntica à aí assumida pelo B..., o Bbt..., SA (Bbt..., SA) e o Baç..., SA (Baç..., SA)- facto provado 237;
846. Ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de papel Comercial de 9 de setembro, na redação resultante do Aditamento de 19 de Setembro de 2013, a EI..., S.A procedeu ás seguintes emissões de papel comercial:(…)- facto provado 238;
847. Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes forma colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo C, que aqui se dá por reproduzido- facto provado 240;
848. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu á cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de papel Comercial- facto provado 243;
849. Em 14 de Outubro de 2013 foi celebrado um segundo Aditamento ao Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial, pelo qual o montante máximo do programa de emissões de papel comercial da EI..., S.A foi fixado em €1.500.000.000,00 produzindo este Aditamento efeitos a apartir de 15 de Outubro de 2013- facto provado 245;
850. Ao abrigo do Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de setembro , na redação resultante do Aditamento de 14 de Outubro de 2013, a EI..., S.A procedeu às seguintes emissões de papel comercial (…)- facto 246;
851. Os montantes totais das emissões identificadas nos pontos antecedentes foram colocados pelo B... junto dos seus clientes identificados nas listagens juntas à decisão administrativa como Anexo D que aqui se dá por reproduzido- facto provado 248;
852. Com referência a cada uma destas emissões, o BEl... procedeu à cobrança à EI..., S.A da comissão prevista na cláusula 19ª do Contrato de Organização e Colocação de papel Comercial- facto provado 251;
853. Entre Setembro de 2013 e Dezembro de 2013 o B... procedeu à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A junto dos seus clientes no montante total de €1.294.000.000,00- facto provado 253;
854. A comercialização do papel comercial da EI..., S.A pelo B... junto dos clientes identificados nos Anexos A a D da decisão administrativa, acima dados como reproduzidos, realizou-se sob a forma de ofertas particulares de subscrição- facto provado 254;
855. O Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial de 9 de Setembro de 2013, aditado pelos Aditamentos de 19 de Setembro de 2013 e 14 de Outubro de 2013 foi resolvido pelo BEl... em 20 de Julho de 2015- facto provado 255;
856. A 18 de Setembro de 2013 foi celebrado um contrato denominado “Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial” entre a R..., S.A., como Emitente, o BEl...., como Líder e Agente, e o B...., como co-Líder e Colocador e o Bbt..., SA (Bbt..., SA), como Colocador- facto provado 256;
857. Em representação do BEl... subscreveram o contrato, na qualidade de procuradores da referida sociedade KK e NNNNN- facto provado 258;
858. Pelo referido contrato os contraentes estabeleceram as regras relativas á organização, emissão e colocação das emissões de papel comercial a emitir pela R..., S.A, até um limite máximo de €600.000.000,00 no prazo de cinco anos- facto provado 261;
859. Nos termos definidos na cláusula 5ª nº 2 do Contrato, “cada emissão será organizada e liderada pelo Agente [o BEl...], o qual desempenhará igualmente as funções de Instituição Registadora e de Agente Pagador”- facto provado 262;
860. As Notas Informativas dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A foram elaboradas pelo BEl..., com as informações que lhe foram disponibilizadas pela sociedade emitente- facto provado 296;
861. Quanto a cada uma das emissões de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A ao abrigo dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, comercializadas pelo B..., previamente ao início do período de subscrição da emissão, o BEl... solicitou à Interbolsa a atribuição de um código ISIN para cada uma das emissões, tendo para o efeito procedido à elaboração de uma ficha técnica, da qual constava os seguintes elementos:
k) Identificação da Emitente;
l) Designação do título;
m) Datas da emissão e subscrição;
n) Forma e data do reembolso;
o) Quantidade e montante da emissão;
p) Valor nominal dos títulos, preço de emissão e valor do reembolso;
q) Periodicidade e taxa de juro;
r) Forma de subscrição;
s) Regime fiscal;
t) Identificação da entidade colocadora e da instituição domiciliaria- facto provado 307;
862.     Durante esse período, os comerciais do B... recolheram as ordens de subscrição dos clientes, entregando-lhes o boletim de subscrição, a ficha técnica da emissão e divulgando a nota informativa em vigor- facto provado 310;
863.     Após o termo do período de subscrição de cada emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A e uma vez apurado, pelo DGP do B..., o montante global subscrito pelos clientes do B..., o mesmo foi remetido ao BEl..., juntamente com a listagem dos clientes subscritores- facto provado 312;
864.     O BEl... solicitou, para cada uma das emissões, à Interbolsa a alteração do montante da emissão constante da ficha técnica remetida à Interbolsa para efeitos de atribuição do código ISIN- facto provado 313;
865. O BEl... procedeu, em seguida, para cada uma das emissões, à comunicação da referida ficha técnica ao Banco de Portugal, para efeitos estatísticos- facto provado 314;
866. O BEl... enviou, ainda, para cada uma das emissões, ao Departamento Estratégico de Operações (DEO) do B... a mesma ficha técnica, para actualização da parametrização do título nos sistemas informáticos e de liquidação do B...- facto provado 315;
867.     O BEl... informou então as Emitentes (EI..., S.A e R..., S.A), quanto a cada uma das emissões, do montante colocado na emissão em causa, o prazo da mesma, o prazo, datas de emissão e vencimento e taxa de juro da emissão- facto provado 316;
868. Previamente à data de vencimento de cada emissão, o BEl... notificou a EI..., S.A e a R..., S.A de que, na data do vencimento da emissão, procederia ao débito, na conta da Emitente junto do B..., do montante total de reembolso- facto provado 319;
869. Também previamente à data de vencimento de cada emissão, o BEl... notificou o DEO do B... para proceder, na data de reembolso, à liquidação financeira do reembolso aos clientes do B...- facto provado 320;
870. O Haitong decidiu celebrar com a EI..., S.A e o B... dois Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial- facto provado 465;
871. O Haitong decidiu celebrar com a R..., S.A e o B... um Contrato de Organização e Colocação de Papel Comercial- facto provado 466;
872. O Haitong assumiu contratualmente as funções de entidade líder e agente do programa de papel comercial emitido pela EI..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...- facto provado 467;
873. O Haitong assumiu contratualmente as funções de entidade líder e agente do programa de papel comercial emitido pela R..., S.A ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a R..., S.A, o B... e o BEl...- facto provado 468;
874. Nessa qualidade de Líder e Agente do programa de papel comercial emitido pela EI..., S.A, o Haitong, através da sua Direcção de Mercado de Capitais, elaborou as Notas Informativas do papel comercial- facto provado 469;
875. O Haitong introduziu nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A as demonstrações financeiras individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, de acordo com a informação transmitida pelo Emitente- facto provado 470;
876. O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A informação sobre os montantes totais da dívida titulada, do passivo e do capital próprio da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012- facto provado 471;
877. O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A a informação respeitante ao aumento do passivo da EI..., S.A, no montante de € 1.600.276.000,00, ocorrido nos primeiros nove meses do ano de 2013- facto provado 472;
878. Na qualidade de Líder e Agente do programa de papel comercial emitido pela R..., S.A, o Haitong, através da sua Direcção de Mercado de Capitais, elaborou as Notas Informativas do papel comercial- facto provado 473;
879. O Haitong introduziu nas Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A as demonstrações financeiras consolidadas (balanços, demonstrações de resultados e demonstrações de fluxos de caixa) da R..., S.A, relativas a 2010, 2011 e 2012 e as demonstrações financeiras individuais (balanço e demonstração de resultados) da R..., S.A, de acordo com a informação transmitida por esta emitente- facto provado 474;
880.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 a informação respeitante aos impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível do “risco cambial”, do “risco de preço”, do “risco de taxa de juro”, do “risco de crédito”, do “risco operacional” e do risco de liquidez”- facto provado 475;
881.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 a informação respeitante a referência à participação qualificada detida pela R..., S.A na E..., S.A, nem ao sector de actividade dos “Sectores Financeiros”, em que esta participada da R..., S.A actuava- facto provado 476;
882.     O Haitong não fez constar das Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 uma advertência de que existiam alterações significativas e materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A- facto provado 477;
883.     O Recorrente agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos- facto provado 478;
884.     Com efeito, o Recorrente Haitong:
e. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
f. Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
g.         Sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes;
h.         Todavia:
(c) quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre setembro e dezembro de 2013, fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada;
885. quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre Janeiro e Fevereiro de 2014 fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada- facto provado 479;
*
1.1.1. O art. 7º do CdVM não é fonte autónoma de deveres de informação.
Sob as Conclusões B. a H. o recorrente sustenta que a norma constante do artigo 7.º do CdVM não configura uma fonte autónoma de deveres de informação, sendo antes uma norma de conduta incompleta e carecendo, por conseguinte, de ser articulada ou complementada, com outras normas que estabeleçam deveres concretos de prestação de informação, não podendo valer como norma de proteção ― não só porque tal entendimento é desconforme com lei expressa (nem tem, como se disse, qualquer correspondência no espírito do legislador), como sempre levantaria problemas de delimitação da aplicação da norma (a entender-se o artigo 7.º do CdVM como uma norma de proteção, não haveria quaisquer limites para o alargamento da responsabilidade), sendo absolutamente inconcebível que, numa situação como a presente, não haja responsabilidade civil, mas haja responsabilidade contraordenacional.
Sustenta ainda que, o artigo 7.º do CdVM, se interpretado no sentido de estabelecer autonomamente deveres de informação e no sentido de constituir fundamento de responsabilidade civil e, conjugado com outras normas, fundamento de responsabilidade contraordenacional, é inconstitucional, por ofensa ao princípio da legalidade, ao princípio da culpa e ao direito fundamental de livre iniciativa económica (consagrado no artigo 61.º, n.º 1, da CRP e, com a designação de liberdade de empresa, no artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia), pelo que, deve tal norma, assim interpretada, ser desaplicada, nos termos do artigo 204.º da Constituição, preferindo-se uma interpretação conforme à Constituição, ou seja, uma interpretação da norma que se retira do artigo 7.º do CdVM no sentido de que a mesma não consubstancia de per se, e sem ser articulada e complementada com outras normas, uma norma de imputação de responsabilidade contraordenacional, por não indicar quem é que está obrigado ao cumprimento de deveres de informação, em que termos e com que limites.
Conclui que, sendo o artigo 7.º do CdVM uma “norma incompleta”, carecendo de ser complementada com uma norma prescritora de deveres de informação, no caso concreto do HAITONG BANK, inexiste qualquer norma que lhe imponha deveres de informação perante os investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, seja na lei geral (i.e., no regime dos deveres de informação impostos pelo CdVM aos intermediários financeiros), seja na lei especial (i.e., nos deveres de informação impostos pelo Regime Jurídico do Papel Comercial no que às notas informativas diz respeito).
Nesta sub-questão o recorrente aglutina argumentos que depois, como veremos, repisa nas questões seguintes, com outros enquadramentos, sempre com o propósito de ver excluída a sua responsabilidade por entender que não há uma única norma legal que lhe imponha deveres de informação perante os investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, fazendo tábua raza da matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo, ou pretendendo questioná-la de forma ínvia, não podendo ignorar que este Tribunal não pode sindicar nem a matéria de facto consolidada nos autos, nem reapreciar os meios de prova ou argumentos utilizados pelo tribunal a quo para a fundamentar.
Quanto a esta questão em particular, salienta-se que o recorrente foi condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (quer por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A quer pelo emitido pela R..., S.A), que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
Na imputação ao recorrente da violação de deveres de informação, o art. 7º do CdVM não foi aplicado de forma isolada, nem assim deve ser analisado, porquanto, impondo de forma evidente e inquestionável que “a informação  respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, deverá ser conjugado com os preceitos do CdVM que concretizam os destinatários da norma e, as consequências para a sua violação.
De facto, os deveres de informação são acentuados no âmbito da intermediação financeira, perante a evidência da assimetria de informação que, por regra, existe entre os agentes que actuam no mercado financeiro e os investidores (mormente os não qualificados), resultando do CdVM uma preocupação na prevenção de actos ilícitos, de natureza civil, penal ou contraordenacional, no prosseguimento dos objectivos assinalados na DMIFI e II ( ex. art. 90º nº 2 al. b) e nº 3 al. d), com o fim último da eficiência do mercado e da proteção dos interesses do investidor, investidor esse que só pode tomar uma decisão de investimento ponderada se estiver na posse de informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita.
Esses são deveres de informação, essencialmente pré-contratuais, que funcionam como deveres acessórios de conduta e que se impõem a quem preste informação sobre instrumentos financeiros, quer o faça a coberto de um contrato de intermediação financeira, quer não.
E, coordenam-se com os deveres de diligência, lealdade e transparência legalmente exigíveis a quem interage nesse mercado, como é o caso dos intermediários financeiros ( art. 304º do CdVM).
Nos arts. 304º e 312º do CdVM  concretizam-se os princípios e deveres a que se encontra vinculada a actividade de intermediação financeira, designadamente quanto aos deveres de informação.
Segundo o art. 304º  nºs 1, 2 e 5 do CdVM, “os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado.
Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração e às pessoas que dirigem efectivamente a actividade do intermediário financeiro ou do agente vinculado e aos colaboradores do intermediário financeiro, do agente vinculado ou de entidades subcontratadas, envolvidos no exercício ou fiscalização de actividades de intermediação financeira ou de funções operacionais que sejam essenciais à prestação de serviços de forma contínua e em condições de qualidade e eficiência.”
Especificamente quanto aos deveres de informação a investidores, os mesmos surgem elencados no art. 312º do CdVM, estabelecendo-se uma obrigação de o intermediário financeiro prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada.
Sendo assim, da conjugação dos referidos preceitos legais resulta que o dever de divulgar informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, aplica-se a qualquer pessoa ou entidade que divulgue aquele tipo de informação, respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes, isto é,  impõe-se a todos os sujeitos envolvidos na prestação daqueles serviços, com o amplo leque consagrado no art. 304º nº 5 do CdVM.
Através da imposição da DMIF II o âmbito subjectivo do dever de informação foi ampliado, sendo que “a lei fez abranger por tais deveres também outros sujeitos integrados na órbita do intermediário financeiro”, como dispõe o art. 304º nº 5 do CdVM.
Por último, o art. 7º do CdVM deve ser articulado com os arts. 389º e 388º do CdVM que consagram, respectivamente, a qualificação como contraordenação da violação do dever de informação e a sanção correspondente à prática desse ilícito de mera ordenação social de natureza especial.
Segundo o art. 389º nº 1 al. a) do CdVM constitui contraordenação muito grave a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação, que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita ( especificando quem é o destinatário do dever, qual o dever violado e qual a forma que pode assumir essa violação).
Da articulação dos referidos preceitos legais- art. 7º, 304º, 312º, 388º e 389º do CdVM- resulta o tipo de ilícito de natureza contraordenacional por violação do dever de informação com qualidade, pelo qual o recorrente foi condenado.
Assim sendo, toda e qualquer pessoa ou entidade que comunica ou divulga informação sem qualidade, nomeadamente sobre instrumentos financeiros, atividades de intermediação financeira e emitentes, comete a infração que resulta da conjugação do artigo 7.º com a alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do CdVM, estando abrangido o recorrente nesse grupo de entidades pelas funções que desempenhou na organização e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, tendo actuado no mercado de valores mobiliários.
No Acórdão TC n.º 85/2012,  lê-se o seguinte:
“ Restará saber se o tipo previsto no 389º n.º 1 alínea a) do CdVM viola as exigências mínimas de determinabilidade no ilícito contraordenacional. A norma qualifica como contraordenação muito grave “a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita”. Ora, apesar de o Decreto-lei n.º 52/2006, de 15 de março ter eliminado a referência ao objeto da informação – até aí expressamente delimitado como constituindo informação relativa a valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros –  nem por isso se pode considerar que o tipo de ilícito tenha passado a ser demasiado amplo ou pouco claro, como alega o recorrente.
De facto, a norma objeto do presente recurso conjuga-se com outras disposições do CdVM, que concorrem para delimitar o âmbito do ilícito. Tais normas são, por um lado, o artigo 7.º e, por outro, o artigo 388.º n.º 1 alínea a) do CdVM.
Ora, deve desde logo sublinhar-se que o simples facto de o tipo contraordenacional dever ser lido em conjugação com outras normas presentes no mesmo diploma não viola, por si só, qualquer princípio constitucional. Trata-se de uma técnica de tipificação dos ilícitos contraordenacionais através de remissões materiais, em que o tipo sancionatório remete para deveres tipificados no próprio Código. Neste contexto, “ao contrário da generalidade dos tipos incriminadores que preveem condutas proibidas e, em imediata conexão com elas, uma pena, a técnica legislativa no Direito de mera ordenação social não tem de obedecer a este paradigma rígido da tipicidade. Pelo contrário, nesta área as funções heurística e motivadora das normas não se identificam com a norma de sanção, mas sim com a norma de conduta. Neste sentido, algumas funções da tipicidade penal são, no Direito de mera ordenação social, assumidas pelas próprias normas substantivas que impõem deveres, (…). Assim, a técnica de tipificação no Direito de mera ordenação social pode inclusivamente ser mais precisa para o destinatário da norma, já que descreve expressamente as normas de conduta (nos ‘pré-tipos’), ao contrário do que acontece nos tipos penais onde as normas de conduta surgem, na generalidade dos casos, apenas implícitas na matéria da proibição”. Em suma, “a exigência de tipicidade não tem no Direito de mera ordenação social de obedecer à mesma técnica dos tipos penais incriminadores” (Frederico da Costa Pinto, O novo regime dos crimes e contraordenações no Código dos valores mobiliários, Almedina, 2000, p. 28).
(…) A norma do artigo 389º n.º 1 alínea a) deve ser lida, em primeiro lugar, em conjugação com a do artigo 7.º do CdVM.
Essa norma estabelece um dever de qualidade de informação a cargo das entidades que atuam no mercado de valores mobiliários. Ela prescreve que “a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita”. Essas exigências aplicam-se, nos termos do n.º 2, seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco. Ora, desde logo cumpre esclarecer que, no contexto do presente diploma e dos deveres que o mesmo estabelece sobre as entidades bancárias, o conceito de “informação” não pode, contrariamente ao que alega o recorrente, ser considerado como indeterminado, nem tão pouco como vago ou pouco claro, encontrando-se perfeitamente circunscrito no artigo 7.º do CdVM, que delimita não só o conteúdo abrangido pela mesma (informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes), como os veículos da mesma (informação inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou notação de risco)».
Tal como o tipo contraordenacional respeitante à alínea a) do n.º 1 do artigo 399.º do CdVM, apreciado no Acórdão n.º 85/2012, também o relativo à alínea c) do mesmo artigo e número, em causa no presente recurso, é integrado pelo conceito de informação «completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita»: ali, veda-se a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, de informação sem essas características; aqui, sanciona-se a prestação à CMVM de informação que não reúna tais propriedades.”
Os comportamentos proibidos pelo art. 389º do CdVM e sancionados pelo art. 388º do CdVM podem e devem ser conjugados com os arts 7º, 304º e 312º do CdVM, para o que aqui interessa e, a articulação dessas normas de conduta/normas de sanção são adequadas  a orientar os destinatários dessas normas a evitar as condutas que os violem.
Da conjugação das referidas normas, entre elas as normas mencionadas na condenação do recorrente (art. 7º e 389º nº 1 al. a) do CdVM) resulta a  concretização dos deveres de informação e os destinatários desses deveres, a qualidade da informação exigida e o âmbito de aplicação, ficando a norma de conduta perfeitamente complementada pela norma de sanção que estabelece em que contexto a violação daqueles deveres de informação consubstancia contraordenação e quem está sujeito ao cumprimento desse dever.
Isso mesmo nos diz André Alfar Rodrigues, na anotação ao art. 389º do CdVM, que “ a CMVM já tinha notado que para saber se um certo facto é uma contraordenação e que tipo de sanção lhe pode caber é necessário identificar a norma de dever de natureza substantiva e a norma de sanção que contempla a consequência da infração à primeira. No Código de Valores Mobiliários essa identificação está facilitada pela organização das normas de sanção de acordo com as matérias em causa e pela existência de um tipo residual que garante a tutela sancionatória onde ela não existia de forma específica ( cfr. Artigos 389º a 400º do CVM).”
 O próprio Tribunal Constitucional já validou o uso de normas com expressões genéricas, vagas ou imprecisas na definição dos tipos contraordenacionais, desde que haja um mínimo de determinabilidade no conteúdo do tipo, se necessário com recurso a outras normas concretizadoras, sem que essa técnica legislativa viole qualquer princípio constitucional, mormente o principio da legalidade ( ver Acórdãos TC nº 76/2016 e nº 270/2020).
Mesmo no Acórdão do TC nº 500/2021, pode ler-se que “ Relativamente ao diploma anterior, o CdVM aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, alterou a técnica seguida no âmbito da tipificação dos ilícitos de mera ordenação social, abandonando «a simples remissão para as normas que consagram os deveres» em benefício da «sua delimitação autónoma» (ponto 22 do respetivo Preâmbulo).
Assim, a par da enumeração dos deveres relativos à qualidade da informação a prestar pelos intervenientes no mercado dos valores mobiliários, elencados no artigo 7.º, o artigo 389.º do CdVM descreve e qualifica as condutas conexas com relevância contraordenacional, integrando na categoria das contraordenações muito graves (n.º 1) «a prestação de informação à CMVM que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita ou a omissão dessa prestação» (alínea c)).”
Assim sendo, tendo o recorrente sido condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (quer por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A quer pelo emitido pela R..., S.A), que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, e tendo-o sido enquanto comparticipante do intermediário financeiro B..., entidade que participou na divulgação de informação sobre as emitentes do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, sendo um dos destinatários das referidas normas, está perfeitamente determinada a fonte legal dos deveres cuja violação é imputada ao recorrente.
Quanto ao Regime Especial do Papel Comercial, como veremos, embora o recorrente insista em trazer à colação tal regime, tem obrigação de saber que não foi ao abrigo desse regime que foi condenado, mas enquanto comparticipante do intermediário financeiro, ele próprio envolvido em funções operacionais ao lado daquele, obrigado ao cumprimento dos deveres de informação consagrados no CdVM.
Ainda que as emitentes do papel comercial possam ser responsabilizadas pelas informações inverídicas apostas nas Notas Informativas do papel comercial, isso não invalida que quem tenha agido como interveniente no mercado de valores mobiliários no âmbito da organização (recorrente) e na colocação daquele papel pelo intermediário financeiro (B...) ao violar o dever de informação (sabendo da falta de completude e verdade das referidas informações) fique isento da respectiva responsabilidade, sendo autónomas tais responsabilidades.
O recorrente insurge-se relativamente ao facto de se interpretar tais preceitos legais de forma a imputar-lhe responsabilidade contraordenacional, quando os tribunais têm concluido pela exclusão de responsabilidade civil, no entanto o recorrente não pode ignorar que o regime da responsabilidade contraordenacional tem especificidades que não se verificam no âmbito da responsabilidade civil (delitual ou obrigacional) consagrada no CdVM, designadamente à luz do art. 304-A do CdVM, desde logo porque o art. 419º do CdVM só tem aplicabilidade na responsabilidade criminal ou contraordenacional e permite estender essa responsabilidade a terceiros comparticipantes de forma não prevista em sede de responsabilidade civil.
Em suma, o art. 7º do CdVM foi aplicado articulado com o art. 389º do CdVM, podendo e devendo haver conjugação entre os preceitos legais do CdVM que definem o âmbito e destinatários do dever de informação, como o foi na sentença recorrida, existindo fundamentos de facto apurados nos autos que permitem considerar que o recorrente estava abrangido por aqueles deveres na função que exerceu na colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, como veremos melhor mais à frente.
A aplicação das normas do CdVM assim efectuada não enferma de qualquer das insconstitucionalidades apontadas pelo recorrente, designadamente o principio da legalidade, estando devidamente identificadas as normas legais violadas pelo recorrente que já existiam à data da prática dos factos ilícitos, nem os princípios da culpa e o direito fundamental de livre iniciativa económica foram postos em causa na sentença recorrida porquanto o recorrente foi condenado em função da sua culpa enquanto omissão de cumprimento do dever objectivo de cuidado, de imputação do facto à responsabilidade do recorrente.
Improcede este segmento recursivo.

1.1.2. A responsabilidade pelo conteúdo das Notas Informativas- a lei especial constante do Regime Jurídico do Papel Comercial.
Sob as Conclusões I. a P. sustenta o recorrente que o papel comercial é regido por lei especial, nomeadamente, pelo Regime Jurídico do Papel Comercial(Lei n.º 52/2006, de 15 de Março, em vigor à data dos factos), o qual é expresso no art. 17º ao atribuir ao emitente do papel comercial no âmbito de ofertas particulares (e só ao emitente) a responsabilidade pela informação contida nas respetivas notas informativas, sobre o emitente (e só sobre o emitente) recaindo, por conseguinte, o respetivo dever de informar (e de controlo de informação).
Mais alegou que,  as próprias Notas Informativas deixavam claro que eram as emitentes ― a EI..., S.A e a R..., S.A ― que assumiam a exclusiva responsabilidade pelo respetivo conteúdo das mesmas (cfr. página 3 das Nota Informativas juntas como Documentos n.ºs 18 e 19 com o Recurso de Impugnação Judicial do HAITONG BANK) (cfr. também Facto Provado n.º 640) e, que tal regime encontra-se igualmente plasmado, aliás, na letra dos Contratos de Organização, nomeadamente nas respetivas Cláusulas 12.ª/a), Cláusulas 12.ª/e) e Cláusulas 12.ª/d), e em especial, nas Cláusulas 13.ª/1/ a).
Conclui que não estava obrigado a verificar a qualidade da informação inserida pelas entidades emitentes nas notas informativas, nem podia substituir-se às entidades emitentes na elaboração, seleção e/ou atualização da informação contida nas Notas Informativas, sendo essa responsabilidade exclusiva das entidades emitentes, considerando o regime geral constante do CdVM absolutamente irrelevante para o efeito que nos ocupa.
E mesmo que assim não fosse, entende que nem o regime geral do CdVM impõe ao HAITONG BANK quaisquer deveres e/ou responsabilidades pela informação prestada aos investidores em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A. 
Não se ignorou na sentença recorrida que existe um regime especial para o papel comercial, estabelecido no DL nº 69/2004 de 25/3, que regula a disciplina aplicável aos valores mobiliários de natureza monetária designados por papel comercial, que consagra os requisitos de emissão e reembolso de papel comercial,  regime esse que prevê a existência de uma Nota Informativa, impondo a elaboração dessa nota e determinados deveres de informação- no art. 17º- às entidades emitentes ( deveres actualmente mais desenvolvidos no art. 20º-A), no entanto, aquele regime especial nem atribui responsabilidade exclusiva às emitentes na divulgação da informação contida nessas Notas Informativas, nem exclui a possibilidade da informação nelas contida ser divulgada por outrem, designadamente por intermediário financeiro, como foi o caso.
Da sentença recorrida consta o seguinte:
“Novamente chamamos a atenção para o facto de nem o B... nem o Haitong terem sido condenados por ter praticado qualquer contra-ordenação por respeito a Notas Informativas e à necessidade das mesmas conterem informação verdadeira ou necessitarem de ser actualizadas.
Partindo de uma perspectiva normativa, o que está em causa é o facto do B... e do Haitong (então BEl...) terem prestado informação que não era verdadeira aos seus clientes, limitando-se a informar o que constava nas deficientes Notas Informativas sobre a situação económica e financeira da EI..., S.A e da R..., S.A, sabendo que essa informação não cumpria as características a que alude o artigo 7.º e artigo 312.º, n.º 1, al. d) e n.º 2 do CdVM. Ou seja, a questão das Notas Informativas apenas surge porque tanto o B..., como o BEl... se limitaram a cumprir o alegado dever de informação para com os clientes com base no que constava nas ditas Notas Informativas, sabendo da deficiência das mesmas em termos de qualidade de informação.
Contudo, o conteúdo de uma Nota Informativa é uma realidade distinta do dever de lealdade que o intermediário financeiro tem para com o seu cliente, traduzido num dever de informação.
As Notas Informativas são sujeitas ao regime que decorre do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de Fevereiro, na versão que estava em vigor à data da prática dos factos em causa, normas essas que em relação àqueles documentos são dirigidas aos emitentes e não aos intermediários financeiros.
O dever de informação dos intermediários financeiros está contemplado no CdVM, nos moldes que já vêm sendo dissecados.
Portanto, os regimes são distintos e não podem ser confundidos, sendo que o Recorrente Haitong está acusado tanto por ser intermediário financeiro, como por via do conceito extensivo de autoria a que alude o artigo 16.º do RGCO na prática da infracção de violação do dever de informação por parte do B....
Com efeito, a CMVM considerou que o Haitong interveio na qualidade de intermediário financeiro, mas também afirma que o Haitong contribuiu causalmente para a prática da infracção pelo B....
Na verdade e com todo o respeito que temos pelas doutas decisões que têm sido proferidas sobre o assunto (vide decisões que foram juntas nos autos pela Recorrente Haitog, mediante o requerimento entrado em juízo em 21.12.2021 e que resulta também a título de exemplo do douto acórdão do STJ de 27.09.2017, processo n.º 3499/16.0T8VIS.S1, in ECLI:PT:STJ:2017:3499.16.0T8VIS.S1.F2), consideramos que assiste razão à CMVM quando afirma que o Haitong interveio também na qualidade de intermediário financeiro.
O papel comercial, em causa nestes autos, é um valor mobiliário de natureza monetária, regulado pelo Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de Março, o qual foi sujeito a um programa de emissão por oferta particular de subscrição, conforme decorre do respectivo contrato, na modalidade de colocação directa – vide artigo 12º daquele diploma.
Apesar de não estar dependente da intervenção de intermediário financeiro, legalmente habilitado para o efeito, por não estar em causa uma oferta pública de papel comercial, como decorre do n.º 1 do artigo 15.º daquele diploma legal, a contrario, certo é que, existindo, como existiu, a intervenção de intermediário financeiro, este continua sujeito às regras que disciplinam a actividade de intermediação financeira.”
Conforme decorre da matéria de facto dada como provada nestes autos as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A nem sequer foram elaboradas pelas emitentes, mas pelo recorrente (embora com base em informações fornecidas pelas emitentes), no entanto, relevante é ter  havido a intervenção de intermediário financeiro na sua divulgação, intermediário esse que está inelutavelmente sujeito aos deveres de informação consagrados no CdVM, seja de quem for a responsabilidade pela emissão das Notas Informativas.
Ora, se o intermediário financeiro presta informação aos investidores sobre um determinado instrumento financeiro e respetivo emitente, deve prestá-la de forma verdadeira, completa, clara, objetiva e lícita, independentemente do conteúdo das Notas Informativas, ou da responsabilidade pela sua elaboração estar atribuída às emitentes por qualquer diploma especial.
O disposto no artigo 17.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25/3, não desonera o intermediário financeiro do cumprimento dos requisitos de qualidade do dever de informação exigidos pelo artigo 7.º do CdVM junto dos investidores.
A partir do momento em que se deu como provado que o B... e o recorrente assumiram contributos causais na falta de divulgação de informação com qualidade, que, embora incluída nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A elaborada com base nas informações prestadas pelas emitentes, sabiam não ser verdadeira, que não mencionavam factores de risco importantes para uma decisão de investimento ponderada e esclarecida, sabendo que estavam obrigados a prestar tal informação com qualidade nos termos previstos no artigo 7.º do CdVM, violaram o dever de informação, incorrendo na prática da contraordenação prevista no art. 389º do CdVM.
Resultou provado sob os factos provados 465 a 479,  que o recorrente sabia que a informação constante das Notas Informativas não tinha a qualidade legalmente exigida e, mesmo assim quis divulga-la, quando tinha o dever de informar os investidores de forma clara, verdadeira e completa, pelo que,  incorreu na violação dos deveres de informação consagrados no CdVM na medida em que foi comparticipante do intermediário financeiro (B...) na prática da infração, não estando esta sua responsabilidade afastada pelo regime especial do Papel Comercial.
Assim sendo, improcede também este segmento recursivo.

1.1.3. O Haitong Bank não estava sujeito aos deveres de informação que recaem sobre os intermediários financeiros.
Sob as Conclusões Q. a CC. sustenta o recorrente que, o facto de estar registado junto da CMVM como intermediário financeiro, encontrando-se autorizado a exercer a atividade de intermediação financeira, não significa que, em concreto, e no âmbito de uma relação jurídica concreta, tenha exercido essa mesma atividade,  não tendo procedido à colocação de papel comercial, não prestou quaisquer serviços de registo de titularidade de papel comercial, de custódia ou de liquidação financeira, junto de investidores ― tais serviços foram prestados, isso sim, por outras instituições financeiras (nomeadamente e para o que ora importa, o B...) (cfr. Factos Provados n.ºs 283 a 291, 301, 304 a 311, 318 e 320) e, as funções desempenhadas enquanto “instituição registadora” não se confundem com os serviços de registo e depósito de instrumentos financeiros a que alude o artigo 291.º, alínea a) do CdVM, ao contrário do que parece ter entendido o Tribunal a quo (cfr. linhas 20526 a 20530 da Sentença recorrida), porquanto, enquanto “instituição registadora”, apenas lhe cabia proceder ao registo de cada emissão de papel comercial, nos termos e para efeitos do artigo 8.º do Regime Jurídico do Papel Comercial, que não se confunde com o registo da titularidade do papel comercial, o qual esse sim, seria mantido em contas de registo individualizado pelo B..., através da prestação do serviço de registo e depósito de valores mobiliários junto dos eventuais subscritores (nos termos do artigo 68.º do CdVM) (cfr. Facto Provado n.º 318 da Sentença) ― concluindo que era o B... quem procedia ao registo e depósito de instrumentos financeiros a que alude o artigo 291.º, alínea a) do CdVM.
Mais alega que as designações de “líder e agente” ou de “Instituição Registadora e de Agente Pagador” não são conceitos legais suscetíveis de ser subsumidos a uma qualquer atividade de intermediação financeira tomando por referência o elenco dos serviços e atividades de intermediação financeira previstos no artigo 289.º, n.º 1 do CdVM e melhor concretizados nos artigos seguintes do mesmo Código, facilmente se constata que ser “líder” ou “agente pagador” não consubstancia, por si, um serviço ou atividade de intermediação financeira, havendo, portanto, que olhar para as funções efetivamente desempenhadas pelo HAITONG BANK no âmbito das operações de papel comercial em apreço e aferir se as mesmas se enquadram ou não nalguma das previsões de tais normas.
E que as funções por si desempenhadas no âmbito dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, tal como apuradas nos autos, foram, tão só, as constantes dos Factos Provados n.ºs 307 e 313, 315 a 318 e 296 da Sentença recorrida, as quais não são suscetíveis de ser subsumidas a qualquer dos serviços ou atividades de intermediação financeira previstos nos artigos 298.º e seguintes do CdVM, não tendo atuado nas operações de emissão de papel comercial dos autos na qualidade de intermediário.
Mais alegou que, não estava, pois, sujeito aos deveres de informação que os intermediários financeiros estão sujeitos perante os seus clientes ― em especial, não estava sujeito aos deveres de informação constantes do artigo 312.º, n.º 1, alínea d) do CdVM, que o Tribunal a quo refere como sendo a norma que espoleta a aplicação do artigo 7.º do mesmo Código (cfr. linhas 19815 a 19819).
Conclui que, mesmo que tivesse atuado nessa qualidade de intermediário financeiro não há qualquer norma no CdVM que estabeleça deveres e/ou responsabilidades relativos ao controlo da qualidade da informação constante das notas informativas de papel comercial, nem tinha uma relação jurídica (comercial, contratual ou qualquer outra) com os investidores.
Como vimos, parte dos argumentos do recorrente já foram rebatidos no conhecimento das questões anteriores, designadamente irrelevância do regime do papel comercial para afastar a responsabilidade do recorrente, a imputação da responsabilidade enquanto interveniente no mercado de valores mobiliários e comparticipante do B... na colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, sendo destinatário do dever consagrado no art. 7º do CdVM, e quanto ao demais convém relembrar o que a esse propósito ficou assertivamente vertido na sentença recorrida:
 “Os contratos de intermediação financeira constituem negócios jurídicos celebrados entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor) relativos à prestação de actividades de intermediação financeira, encontrando-se estas previstas no n.º 1 do artigo 289.º, do CdVM, como sendo:
“a) Os serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros;
“b) Os serviços auxiliares dos serviços e actividades de investimento;
“c) A gestão das seguintes instituições de investimento coletivo: i) Organismos de investimento coletivo em valores mobiliários; ii) Organismos de investimento alternativo em valores mobiliários e organismos de investimento em ativos não financeiros; iii) Organismos de investimento imobiliário; iv) Organismos de investimento em capital de risco, organismos de empreendedorismo social e organismos de investimento alternativo especializado; e v) Fundos de titularização de créditos;
“d) O exercício das funções de depositário dos instrumentos financeiros que integram o património das instituições de investimento coletivo referidas na alínea anterior.”
Consta das Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, elaboradas pelo Recorrente Haitong para serem disponibilizadas aos clientes do B..., subscritores do papel comercial emitido por aquelas entidades, que o Haitong (então BEl...) era o Líder e Agente Pagador, assumindo-se, assim perante os clientes do B... também ele como um intermediário financeiro.
Na verdade, quem adquiriu o papel comercial em causa, acabou por estabelecer também uma relação contratual com o BEl..., na medida em que este era o anunciado “Líder e Agente Pagador”.
Com relevo também, decorre das cláusulas 5.ª, n.º 2 dos Contratos que “cada emissão será organizada e liderada pelo Agente [o BEl...], o qual desempenhará igualmente as funções de Instituição Registadora e de Agente Pagador”.
Ora, o artigo 291.º do CdVM especifica precisamente o que são os serviços auxiliares dos serviços e actividades de investimento, a que alude a citada al. b) do n.º 1 do artigo 289.º do CdVM, sendo certo que o registo (e depósito) de valores mobiliários é precisamente um dos designados serviços auxiliares dos serviços e actividades de investimento, configurando, por conseguinte, uma actividade própria e exclusiva dos intermediários financeiros.
Assim sendo, independentemente do BEl... ter realizado aquilo que denomina por meros serviços administrativos, o certo é que também ele se assumiu perante os clientes do B... como um intermediário financeiro e prestou serviços essa qualidade (serviços auxiliares dos serviços) estando por isso obrigado a deveres de fidelidade e boa-fé para com os investidores.
Mais. Independentemente do que consta das Notas Informativas que são elaboradas pelo emitente, tal não obstaculiza o dever de informação que recai sobre o intermediário financeiro, se tiver conhecimento acerca de um facto relevante não contido nas mesmas. A isso impõem os citados deveres de honestidade e lealdade.
Assim sendo, a partir do momento em que o BEl... conhece, como conhecia, porque tal se mostra provado, que as informações que constam das Notas Informativas são totalmente insuficientes para que os clientes lograssem tomar uma decisão consciente, fundamentada e livre, tinha o dever de informar os investidores dessa situação.
Este sentido é precisamente defendido pelo acórdão da Relação de Lisboa de 06.04.2017, processo n.º 519/10.5TYLSB-H, in www.dgsi.pt, de onde se extrai que o intermediário financeiro não deixa de estar adstrito ao cumprimento do dever de informação, apenas porque presta serviços auxiliares.
Para além disso, ainda que não se considerasse o BEl... um intermediário financeiro nesta concreta situação, importa referir que tal não obstaria à sua responsabilização.
No presente caso, a conduta em termos de contributo causal do Haitong para as infracções que foram imputadas ao B... traduz-se no facto do mesmo ter elaborado Notas Informativas sem qualidade informativa.
Com a informação disponibilizada pela emitente, é certo (tal como está provado), sem ter a obrigação de due diligence, como exaustivamente se ouviu falar em sede de audiência de discussão e julgamento, também é certo (vide o regime que decorre do artigo 17.º, a contrario do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de Fevereiro), sem que lhe competisse actualizar as mesmas Notas Informativas (vide artigo 17.º, a contrario do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de Fevereiro), também é certo, mas também não é menos certo que tinha o Haitong conhecimento de que as Notas Informativas que iam ser disponibilizadas aos clientes do B... não iam verter a completa e verdadeira situação patrimonial dos emitentes EI..., S.A e R..., S.A, o que contribuiu causalmente, de forma inequivoca para a realização típica.
Na verdade, apesar dos tipos de contra-ordenação em apreço serem especificamente dirigidos aos intermediários financeiros (ainda que a Haitong assim não fosse considerada), esta circunstância não afasta a condenação daqueles que se assumem lideres e agentes num programa de emissão de papel comercial, quando estes ajam em comparticipação com aqueles primeiros, por força das regras da comunicação da ilicitude previstas nos artigos 16.º, nº 1 do RGC e 419.º, nº 1, do CdVM.
 “Como decorre pacificamente deste regime legal, vigora no direito contraordenacional português um amplo regime de comunicação da ilicitude que se traduz no facto de a punibilidade da infração ser extensível a qualquer comparticipante, desde que um dos comparticipantes possua certa qualidade ou relação pessoal que fundamente a ilicitude ou grau de ilicitude de um facto.” – vide acórdão da Relação de Lisboa de 14.05.2014, processo n.º 46/12.6YQSTR.L1 – 3, in www.dgsi.pt.
Nestes termos, sendo o B..., enquanto intermediário financeiro, titular do dever de prestação de informação de qualidade aos seus clientes, se o líder e agente promove a prestação de informação sem qualidade por parte do primeiro, ainda que por meio de Notas Informativas cujos elementos lhe foram facultados pelo emitente, é comparticipante do intermediário financeiro na prática da infracção e, por isso mesmo, lhe deve ser imputada essa prática.
Veja-se que se mostra provado que o Haitong elaborou as Notas Informativas com os elementos que lhe foram disponibilizados pelos emitentes. Contudo, sabia que essas Notas Informativas não revelavam a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes e que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes.
Ainda assim, o Haitong quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 fosse a que estava nas Notas Informativas em causa e quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre Janeiro e Fevereiro de 2014 fosse também a supra identificada nos exatos termos em que esta foi prestada.
Se bem que não foi pelo que constava nas Notas Informativas que o B... foi condenado, o certo é que as Notas Informativas coadjuvaram à prestação de uma informação manifestamente insuficiente aos clientes que subscreveram o papel comercial em causa, contribuindo indubitável e causalmente para a prática dos ilícitos.
Da fattispecie provada acima mencionada resulta que existiu comparticipação entre o BEl..., agora Haitong e o B..., gerando, assim, a aplicabilidade do regime de comunicação da ilicitude entre comparticipantes, previsto no artigo 419.º, nº 1, do CdVM e no artigo 16º, n.º 1, do RGCO.
O Recorrente apela ainda à cláusula de exclusão de responsabilidade pela qualidade da informação prestada em sede dos contratos de organização e colocação. Contudo, se bem que essa cláusula de exclusão da responsabilidade pode funcionar em termos de responsabilidade contratual, a responsabilidade contra-ordencional não pode ser excluída por vontade das partes, na medida em que estamos perante um direito público, de cariz sancionatório.
Nestes termos e atentos os factos provados, deverá O Recorrente Haitong ser condenado, a título de dolo directo (n.º 1 do artigo 14.º do Código Penal), pela prática das duas infracções de que vinha acusado.”
Em face dos factos apurados nos autos, é inegável que o recorrente participou na colocação do papel comercial que estava atribuída ao B..., participou na elaboração das Notas Informativas que incumbia às emitentes, tendo celebrado um contrato de organização com o B... e a EI..., S.A e a R..., S.A, no âmbito do qual prestou serviços respeitantes àquelas actividades, tendo comparticipado na divulgação da informação dessas Notas Informativas, sabendo que a mesma não era de todo suficiente, desde logo porque não era completa e verdadeira quanto à situação económica e financeira das emitentes, sabendo que com essa participação junto dos investidores violava os deveres de informação que o CdVM impõe a todos os sujeitos envolvidos na prestação daqueles serviços ( com o amplo leque consagrado no art. 304º nº 5 do CdVM), querendo isso mesmo, não encontrando a posição defendida pelo recorrente qualquer arrimo na factualidade apurada.
O recorrente esteve envolvido no exercício de actividades de intermediação financeira,  de funções operacionais essenciais à prestação de serviços de intermediação inerentes à organização e divulgação de informação do papel comercial identificado nos autos.
Caso a intervenção do recorrente se tivesse limitado a actividades meramente administrativas, como alega, a celebração dos contratos denominados “Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial entre a EI..., S.A como emitente ( depois também a R..., S.A), o BEl... como Líder e Agente e o B... como co-Líder e Colocador seriam manifestamente inúteis, bastaria à EI..., S.A/R..., S.A elaborar as Notas Informativas e ao B... assumir todas as funções como intermediário financeiro, mas não foi isso que aconteceu, tendo sido atribuídas contratualmente funções ao aqui recorrente de manifesta colaboração e comparticipação na organização e colocação do papel comercial, pelas quais inclusivamente foi remunerado.
Sendo assim, em função das funções atríbuidas pelos referidos contratos e efectivamente desenvolvidas pelo recorrente na organização e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, o recorrente estava sujeito aos deveres de informação consagrados no CdVM, que não se esgotam nos intermediários, mas que de todo o modo se lhe aplicariam, enquanto comparticipante do intermediário financeiro B....
Improcede este segmento recursivo.
1.2- Da imputação a título objectivo e subjectivo através do conceito extensivo de autoria.
Sob as Conclusões DD. a UU. o recorrente sustenta que, o Tribunal a quo entendeu que o então BEl..., é responsável pela prática das contraordenações por que vem condenado, por via da participação que assumiu nas Notas Informativas relativas ao papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A – ou seja, pelo contributo alegadamente causal que o mesmo deu à prática das infrações em apreço, ao abrigo do artigo 401.º, n.º 2, do CdVM e dos artigos 419.º, n.º 1 do CdVM e 16.º do RGCO.
Mais alegou que, o artigo 401.º consagra um modelo amplo de imputação do facto contraordenacional ao ente coletivo, mas é um modelo de heterorresponsabilidade (a pessoa coletiva responde por atos realizados por terceiros, pessoas físicas, que a ela se ligam), pelo que,  é nas pessoas físicas cujas funções se convocam para sustentar a imputação objetiva dos factos que têm de se verificar os elementos subjetivos que sustentam o dolo da pessoa coletiva, porém,  de forma ilegal, a Sentença considerou, de forma isolada, a prática do facto e a sua representação, imputando objetivamente a prática dos factos aos trabalhadores e retirando o dolo de outras pessoas físicas distintas, sem que entre elas houvesse qualquer orientação ou comunicação, considerando que,
(i) a Direção de Mercado de Capitais praticou os factos de onde, objetivamente, se retira o contributo causal fundamento da responsabilidade do HAITONG BANK (linhas 21362 a 21364 e Factos Provados n.ºs 449 a 473), – embora reconheça, e bem, que esta não tinha conhecimento de que a informação disponibilizada pelas sociedades emitentes e constante das Notas Informativas, estruturadas pelo HAITONG BANK, não era verdadeira, completa, atual e lícita (no caso da EI..., S.A) e não era completa, atual e lícita (no caso da R..., S.A) (cfr. linhas 21435 e ss.).
(ii) três dos Administradores do BEl... (AA, BB e DD) tinham o conhecimento de onde, subjetivamente, se retira o dolo fundamento da sua responsabilidade (linhas 21320 a 21361 e Factos Provados n.ºs 66 a 68) – embora reconheça, e bem, que estes não agiram nem praticaram qualquer ato no âmbito dos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A – no exercício das suas funções enquanto administradores não executivos do HAITONG BANK ou em nome e por conta do HAITONG BANK (linhas 21372 e ss.).
Sustenta que a Sentença recorrida faz uma cisão (ilegal) entre a imputação objetiva e a imputação subjetiva das infrações, por forma a ultrapassar um verdadeiro obstáculo à possibilidade de o sancionar pela prática das infrações em apreço, quando a conclusão que se impõe é diversa: tendo em conta que nenhum dos intervenientes do HAITONG BANK nos programas de papel comercial tinha, à data dos factos, conhecimento de que a informação constante das Notas Informativas não era verdadeira, completa, atual, ou lícita, não se verificam os pressupostos previstos no n.º 1 do artigo 402.º do CdVM, de que depende a imputação dos ilícitos aqui em causa à pessoa coletiva.
Conclui que foi sancionado em termos puramente objetivos, o que é violador do princípio da culpa enquanto pressuposto e limite de qualquer sanção, mesmo a uma pessoa coletiva.
Ademais, alegou que o artigo 401.º é, no plano da autoria, uma norma que alarga a responsabilidade à pessoa coletiva, pelo que afasta outras normas que se destinem a ampliar (de novo) o círculo de autoria, como a prevista nos artigos 419.º do CdVM e 16.º do RGCO, sob pena de um inadmissível alargamento (em cadeia) do conceito de autoria e, como não agiu enquanto intermediário financeiro no âmbito das operações de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A: desempenhou tarefas meramente administrativas, de organização (sem qualquer correspondência com as atividades de intermediação financeira elencadas no artigo 289.º, n.º 1 do CdVM), não tendo tido qualquer contacto com investidores e não tendo elaborado, nem tendo assumido quaisquer responsabilidades relacionadas ou decorrentes da informação constante das Notas Informativas, não tendo prestado, portanto, informação a investidores, nem comunicou ou divulgou informação (como a Decisão recorrida reconhece) – pelo que a sua conduta não se encontra objetivamente abrangida pela norma em apreço.
Segundo o recorrente, o artigo 17.º, n.º 1 do Regime Jurídico do Papel Comercial estatui de forma expressa que é da exclusiva responsabilidade da entidade emitente (EI..., S.A e R..., S.A) a preparação da nota informativa, tendo-se limitado a estruturar as mesmas para serem completadas pelas sociedades emitentes (EI..., S.A e R..., S.A) com a informação relevante em falta ― pelo que não é destinatário direto da norma, não é intraneus, não é titular do dever violado, não tem o dever legal de controlar e verificar a informação que lhe fora disponibilizada pelas entidades emitentes, nem assumiu contratualmente esse dever ou qualquer outro dever semelhante.
Conclui que, nunca teve o domínio dos factos objeto dos autos (i) não tinha domínio sobre a prática das infrações em causa; (ii) não tinha na sua disponibilidade realizar ou não realizar a infração; (iii) não era o destinatário do dever em causa; (iv) não era autor nem titular da informação em causa, pelo que errou a Sentença recorrida ao invocar os artigos 419.º do CdVM e 16.º do RGCO para estender ao HAITONG BANK, enquanto pessoa coletiva, um dever alheio, que apenas sobre o B... recaía.
Para o recorrente, é inconstitucional a norma que se extrai dos artigos 7.º, 389.º, 401.º e 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, no sentido em que permite condenar como autor uma pessoa coletiva por extensão em cadeia da responsabilidade, i.e., fazendo funcionar mais que um mecanismo de extensão de responsabilidade, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade, da proporcionalidade e da culpa, vertidos nos artigos 1.º, 18.º, n.º 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição, sendo ainda inconstitucional a norma que se extrai dos artigos 7.º, 389.º, 401.º, 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, no sentido em que permite condenar como autor, na aceção ampla do conceito extensivo de autoria, uma pessoa coletiva por comunicação de um dever de outra pessoa coletiva, e não por comunicação de um dever de uma determinada pessoa individual, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade, da proporcionalidade e da culpa vertidos nos artigos 1.º, 18.º, n.º 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição.
Mais uma vez se salienta que, as considerações tecidas pelo recorrente esbarram frontalmente com a matéria de facto dada como provada nestes autos, relativa à sua participação na violação dos deveres de informação, estando suficientemente apurados os factos respeitantes quer aos elementos objectivos, quer subjectivos dos ilícitos contraordenacionais pelos quais foi condenado.
Convém desde logo precisar que, em sede de contraordenações, a culpa apresenta-se mais objectivada do que a culpa penal, não propriamente associada a uma reprovação ética, mas a uma censura ou advertência social.
Neste sentido, Augusto Silva Dias entende que, “a culpa da contra-ordenação consiste, como vincámos atrás, num desvio do agente relativamente ao papel social que constitui o padrão do sector de actividade em que aquele opera. O que se censura na culpa é assim o incumprimento do dever em distonia com a hipotética actuação do papel no caso concreto. ”( )
Quanto ao fundamento do dolo “reside na atitude ética do agente de hostilidade ou acomodação ou indiferença perante o dever-ser jurídico-penal”(…).
O conteúdo volitivo do dolo eventual deve ser detectado na passividade do agente de não querer desencadear os mecanismos volitivos que levassem a evitar, quer a acção principal intencionalmente querida, quer os resultados adjacentes que aquela acção provavelmente desencadearia. O elemento configurador da censurabilidade da negligência reside na capacidade de cumprimento do dever objectivo de cuidado.”( )
Ora, no ilícito de contraordenação a culpa traduz-se na imputação do facto à responsabilidade social do respectivo agente, não se fundando na censura ética do agente (como acontece no ilícito criminal).
Tal como sustenta Paulo Pinto de Albuquerque, “Portanto, o dolo contraordenacional reside no conhecimento intelectual dos elementos do tipo e no desrespeito pelas proibições ou obrigações legais tuteladas pelas normas contra-ordenacionais”
Isso mesmo resulta da matéria de facto dada como provada nos referidos factos provados 465 a 479, estando demonstrado o desvio do recorrente relativamente ao padrão dos deveres impostos a quem divulga informação respeitante a valores mobiliários, face à passividade ou indiferença demonstrada quanto à  divulgação completa da real situação das emitentes do papel comercial, sabendo que as Notas Informativas continham informação distorcida da realidade, não sendo suficiente para uma decisão ponderada de investimento, desrespeitando as obrigações legais tuteladas pelos arts. 7º e 389º do CdVM.
Em caso de comparticipação, de acordo com o conceito extensivo de autor,  a todos os agentes que no mercado de instrumentos financeiros dêem um contributo causal para a divulgação de informação sem a qualidade exigida pelo artigo 7.º do CdVM é imputada a conduta ilícita, face ao disposto no artigo 419.º, n.º 1 do CdVM e na segunda parte do n.º 1 do artigo 16.º do RGCO.
O RGCO consagra um conceito extensivo de autor, bastando para a imputação da contraordenação a verificação de um contributo causal da conduta do agente para o facto, afastando-se a teoria do domínio do facto e, consagra o regime da comunicação da ilicitude, bastando que a qualidade ou relação especial se verifique em qualquer um dos agentes que contribuíram para o resultado ou tentativa para que todos sejam punidos pela moldura da contraordenação específica (neste sentido Paulo Pinto de Albuquerque, Figueiredo Dias e Gonçalves da Costa).
O mesmo ocorre nas contraordenacões específicas de valores mobiliários, conforme art. 419º do CdVM.
Refere Frederico da Costa Pinto, a propósito das infrações de dever, como é o caso das infrações em causa: “Nestes ilícitos, o intraneus enquanto titular do dever tem uma posição de garante relativamente ao cumprimento desse dever. Mas a violação desse dever pode ocorrer por actos próprios ou alheios. Para além deste aspecto – relativo à delimitação da autoria – subsiste o problema de saber como valorar as condutas de terceiros que lesam o dever. Faltando-lhes a qualidade típica que consiste na titularidade do dever os terceiros extranei são agentes inidóneos por falta de uma qualidade típica e não podem, por isso, ser autores singulares. Contudo, estes podem no sistema português ser comparticipantes, dado o regime de comunicação de ilicitude estabelecido no art. 16º da lei geral das contra-ordenações (a art. 28º, nº 1, do Código Penal). Existindo, para além do que se expôs, uma concertação de vontades estaremos perante uma situação de comparticipação. (...)”.
Como vimos, vigora no direito contraordenacional um amplo regime de comunicação da ilicitude que se traduz no facto de a punibilidade da infração ser extensível a qualquer comparticipante, desde que um dos comparticipantes possua certa qualidade ou relação pessoal que fundamente a ilicitude de um facto, a isso não obstando a falta de identificação das pessoas singulares que no âmbito da pessoa colectiva actuaram, nem se terem densificado os elementos subjectivos relativos às mesmas.
Com interesse também para esta questão veja-se o Ac RL de 6/4/2011 (Proc. Nº 1724/09.2TFLSB.L1, relativo à imputação de contraordenações no âmbito dos valores mobiliários a pessoas coletivas:
“A pessoa colectiva, sendo um ente jurídico, é dotada de vontade própria que nasce e vive do encontro de vontades individuais dos seus membros, que não pode confundir-se com a vontade singular de cada um deles em particular. É uma nova realidade. (…)
É a entidade coletiva que tem responsabilidade contraordenacional e é a vontade coletiva que está em discussão no elemento subjetivo do ilícito contraordenacional. Dito de outra forma, a autonomia da responsabilidade da pessoa coletiva face à responsabilidade de pessoa(s) singular(es) implica, também, uma autonomia ao nível da respetiva imputação subjetiva.
Daqui resulta que não é necessária a identificação (e, menos ainda, a responsabilização) da pessoa concreta do universo dos recursos humanos da pessoa coletiva que praticou os factos.
A lei não o exige e, ao contemplar a possibilidade de a pessoa coletiva responder pela violação dos deveres a que está sujeita sem que haja também responsabilidade de pessoas individuais, está a afirmar exatamente o oposto: o dolo da pessoa coletiva resulta da sua forma de atuação ou omissão e não necessariamente, ou apenas, do dolo de pessoas singulares.”
De todo o modo, mais uma vez se frisa que, a matéria de facto dada como provada é clara, arredando qualquer um dos fundamentos invocados pelo recorrente para afastar a sua responsabilidade contraordenacional, porquanto, sob os factos provados 200, 203, 205, 465 a 479 ficou demonstrado que o recorrente participou na organização e colocação do papel comercial através de contratos celebrados com o B... e as emitentes, cada emissão de papel foi organizada e liderada pelo recorrente, que assumiu as funções de lider e agente do programa de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, desempenhou igualmente as funções de instituição registadora e de agente pagador, nessa qualidade elaborou as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, não fazendo constar informações importantes sobre a situação patrimonial, económica e financeira das emitentes, agiu consciente e voluntariamente na prática dos referidos factos, conhecia-os porque se tratavam de factos próprios, em que participou, e quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A fosse aquela, nos exactos termos em que esta foi prestada.
O inconformismo do recorrente quanto à sua condenação não tem a virtualidade de alterar os factos apurados, que por si bastam para a imputação das infrações pelas quais foi condenado a título objectivo e subjectivo, ainda que através do conceito extensivo de autoria, permitido no âmbito contraordenacional e especificamente previsto também nas contraordenações relativas a valores mobiliários.
Por força daquele conceito extensido de autoria o dever de prestação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, impendia quer sobre o B..., na qualidade de intermediário financeiro que se encontrava a colocar papel comercial junto dos seus clientes, quer sobre o Recorrente, na qualidade de líder e agente dos programas de papel comercial, quer ainda sobre os membros do Conselho de Administração do intermediário financeiro (cfr. artigos 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, do CdVM) que também faziam parte dos orgãos sociais do recorrente.
Com efeito, o dever de prestação de informação com qualidade, consagrado no artigo 7.º do CdVM, impõe um conjunto de requisitos de qualidade da informação que têm de ser observados por todos aqueles agentes ou entidades que prestam serviços no mercado de valores mobiliários.
O artigo 401.º do CdVM estabelece a responsabilidade autónoma das pessoas coletivas, em conjunto ou separadamente das pessoas singulares ( nº 5), consoante o seu envolvimento na prática dos factos, sendo que a falta da identificação da pessoa singular que tenha sido o autor do facto ilícito e culposo não impede a imputação desse mesmo facto directamente à pessoa colectiva, a título de culpa efectiva e não pelo risco, como foi o caso em apreço.
Frederico Costa Pinto refere que, “Mantém-se no CdVM de 1999 o modelo da imputação autónoma da responsabilidade por ilícitos de mera ordenação social a entes colectivos e entes singulares ( art. 401º nº 1) e a regra da imputação funcional dos factos de pessoas singulares às pessoas colectivas, nos termos do art. 401º nº 2. Ou seja, os factos que constituem contra-ordenação podem ser imputados alternativa ou cumulativamente a pessoas singulares e a pessoas colectivas. Estes regimes pressupõem as regras gerais de atribuição e individualização da responsabilidade, nomeadamente no plano da imputação subjectiva ( art. 402º nº 1 em conjugação com o art. 8º do RGCords) e nunca excluem a responsabilidade dos agentes individuais.”
A responsabilidade das pessoas coletivas é, aliás, a regra no direito das contraordenações, responsabilidade essa também já consagrada no art.7º do RGCO.
Acresce que, no âmbito das contraordenações previstas no CdVM, no mercado de valores mobiliários e outros instrumentos financeiros, é pacífico que a imputação de uma contraordenação à pessoa coletiva, incluindo a imputação dos factos que consubstanciam o conhecimento e a vontade de realização dos tipo de ilícito, não depende da individualização de uma atuação da pessoa singular.
Essa questão também foi apreciada de forma adequada na sentença recorrida, nos seguintes termos:
“(…) para efeitos de imputação da responsabilidade contra-ordenacional, a pessoa colectiva expressa-se nas pessoas singulares que representam a sua vontade e nos funcionários ou trabalhadores que actuam no exercício das suas funções ou por causa delas. Tal implica que os factos praticados por estas pessoas se transferem para a pessoa colectiva, excepto se se demonstrar que o agente actuou contra ordens ou instruções expressas desta ou que actuou exclusivamente no seu próprio interesse.
(…) ao contrário do que é defendido pelo Recorrente, não se mostra necessário que a decisão identifique o concreto agente que praticou os factos objectivos em questão.
(…)
Assim sendo, consideramos não ser necessária a identificação concreta da pessoa física que praticou, por acção ou omissão, a infracção, sob pena de se criar vácuos punitivos quando é certo que a infracção foi necessariamente cometida no seio da organização. Se se exigisse a identificação da pessoa singular, chegar-se-ia ao absurdo de quanto mais complexa fosse a organização colectiva, mais possibilidade teria a mesma de sair impune das infracções cometidas (porque um acto poderá passar por mais de um órgão ou pessoa singular) e vice versa”.
Já o Tribunal Constitucional havia decidido no Acórdão n.º 566/2018, que “a pessoa coletiva detém um domínio sobre a totalidade dos factos ilícitos que lhe são imputados, e que os mesmos se encontram devidamente descritos quanto aos aspetos relevantes para tal imputação na decisão administrativa condenatória, em especial quanto à necessidade da colaboração de pessoas singulares que ocupam uma posição de liderança e no respeitante aos resultados de tal colaboração materializados nas diversas modalidades de apoio aos GOA. Deste modo, a omissão nessa decisão da indicação das pessoas singulares que concretamente agiram em nome e por conta da pessoa coletiva não é impeditiva da imputação das condutas verificadas à própria pessoa coletiva e, por isso, também não é indispensável à garantia do respetivo direito de defesa, em especial, do seu direito ao contraditório.”
A este propósito, a Recomendação do Conselho da Europa de 20 de Outubro de 1988, citada na sentença recorida, já recomendava a responsabilização das pessoas coletivas nos seguintes termos: “a empresa deve ser responsável haja ou não identificação da pessoa física que praticou os factos ou omissões constitutivos da infração (...)”.
No mesmo sentido vai o Parecer do Conselho Consultivo da PGR n.º 11/2013, de 10 de julho de 2013, ao considerar que “o artigo 7º do Regime Geral das Contraordenações adota a responsabilidade autónoma, tal como os regimes especiais em matéria (...) de valores mobiliários (artigo 401º do Código dos Valores Mobiliários), (...) pelo que não é necessária a identificação concreta do agente singular que cometeu a infração para que a mesma seja imputável à pessoa coletiva”.
Para a imputação dos factos ilícitos ao Recorrente bastava ficar demonstrado, como ficou, a sua participação, enquanto organização empresarial, nos factos em causa e, que assumiu de facto uma actividade de divulgação de informação sobre instrumentos financeiros e respectivos emitentes, desviando-se do dever que lhe é imposto.
No caso sub judice, perante a matéria de facto apurada resulta inequívoco que o recorrente deu um contributo causal relevante para a prática da infração, sendo considerado, por isso, autor da contraordenação que lhe foi imputada por efeito do conceito extensivo de autor previsto no art. 16º do RGCO.
O conhecimento por parte do recorrente da real situação financeira da EI..., S.A, e de que, consequentemente, a mesma não se encontrava refletida nas notas informativas do papel comercial, extrai-se com meridiana clareza dos factos provados, atendendo a que o B... detinha a totalidade do capital social do recorrente (então BEl...), o administrador AA (administrador do B... e do BEl...) participou na decisão de emissão e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A pelo B..., conhecendo a real situação da EI..., S.A e sabendo que a mesma não se encontrava refletida nas notas informativas divulgadas aos clientes subscritores do papel comercial, tendo determinado a conduta do B... para que este colocasse o papel comercial emitido pela EI..., S.A ( factos provados 480, 482, 483, 489, 491 a 506), tendo sido o recorrente quem, através da sua Direção de Mercado de Capitais (da qual parte da equipa trabalhava na sede do B..., juntamente com a equipa do DFME, a qual reportava à directora do BEl... e daquele recebia indicações), elaborou as notas informativas do papel comercial (factos provados 80, 82, 469 e 473), destinadas a divulgar junto de investidores as caracteristicas do instrumento financeiro a comercializar e respectiva emitente.
Assim como conhecia a reestruturação do G... que afetou a estrutura societária e a situação financeira da R..., S.A, sabendo que tal informação não se encontrava refletida nas notas informativas do papel comercial, atendendo a que a proposta de reestruturação foi preparada por uma equipa designada pelo Administrador DD, foi discutida em reuniões nas quais participaram administradores do BEl... (AA, BB e DD) e colaboradores do BEl..., foi apresentada ao Conselho Superior do G... para aprovação pelo administrador do BEl... DD e aprovada pelos administradores do BEl..., entre os quais AA e BB numa das reuniões do Conselho Superior do G....
Em resumo, a participação do recorrente (então BEl...) no processo de emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A resulta de um processo decisório em que participaram os arguidos AA, BB e DD, que eram seus administradores, e com a participação da sua estrutura organizacional, designadamente o DMC.
O Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 566/2018, afirmou que, “Este é um corolário da responsabilidade direta das pessoas coletivas consagrada no artigo7.º,n.º 2, do RGCO: as condutas daqueles que agem em nome e por conta da pessoa coletiva vinculando-a – ou seja, daquelas pessoas ao serviço da pessoa coletiva cujas funções implicam uma posição de liderança – constituem atos próprios da pessoa coletiva. Esta atua por via daquelas pessoas, de tal modo que as condutas de tais pessoas são tidas como condutas da própria pessoa coletiva. Daí que, para efeitos de responsabilidade, seja suficiente o conhecimento apenas daquelas condutas: a indicação da pessoa singular que praticou o facto correspondente à contraordenação é dispensável, a partir do momento em que tal facto é próprio da pessoa coletiva. A responsabilidade desta não depende prévia ou concomitantemente da responsabilidade das pessoas singulares cujas condutas lhe são (direta e autonomamente) imputadas.”
Essas considerações são transversais ao regime específico previsto no art. 401.º n.º 2, do CdVM, o qual também não enferma de qualquer desconformidade com a CRP, mormente no que diz repeito ao princípio da legalidade, na medida em que tal critério de imputação à pessoa coletiva estava já previsto expressamente no CdVM préviamente à prática dos factos pelo recorrente.
Em face da matéria de facto dada como provada, repete-se, é totalmente ireelevante a alegação de que o recorrente nunca teve o domínio dos factos objeto dos autos,  que não tinha na sua disponibilidade realizar ou não realizar a infração, porquanto podia pura e simplesmente não ter tido qualquer intervenção na operação em causa, sabendo como sabia que a informação a ser divulgada aos clientes do B... não seria verdadeira, completa, lícita e, no entanto deu cum contributo causal relevante para que a informação dada aos investidores não tivesse sido clara, completa e lícita.
Também não pode dizer que não era o destinatário do dever em causa, porquanto actou enquanto comparticipante de um intermediário financeiro, assumindo funções (operacionais) que caberiam aquele, estando, pois, correcta a aplicação do 419.º do CdVM e 16.º do RGCO para estender ao recorrente, pessoa coletiva, um dever que recaía sobre o B....
Pelas razões acima expostas, não se vislumbra a alegada inconstitucionalidade dos artigos 7.º, 389.º, 401.º e 419.º do CdVM e do artigo 16.º do RGCO, por violação dos princípios da legalidade, da tipicidade, da proporcionalidade e da culpa, vertidos nos artigos 1.º, 18.º, n.º 2 e 29.º, n.º 1 da Constituição, porquanto estava legalmente prevista a responsabilidade da pessoa colectiva, a extensão da autoria, sem necessidade de individualização das pessoas singulares que actuaram no seio da pessoa colectiva, a comparticipação na ilicitude, estando apurada nos autos a culpa do recorrente, porquanto sabia e quis pôr em circulação informação sem qualidade, desvirtuando as regras de transparência e lealdade, imputando-se o acto á responsabilidade social do recorrente resultante das regras de conduta que o CdVM lhe impunha, sendo como é pacífico que em matéria de ilícito de mera ordenação social há uma autonomia dogmática que se manifesta também em matéria de princípio da culpa e dos demais princípios acima aflorados ( Ac TC nº 297/2016 e Ac TC nº 201/2014, entre outros).
Improcede, assim, este segmento recursivo.

2ª- Da imputação a título subjectivo assente na Teoria do Risco da Organização:
2.1. O risco de organização enquanto risco de inadequado tratamento interno da informação- o Sistema de Controlo Interno e de Gestão de Risco;
2.2.Da impossibilidade de imputação do conhecimento adquirido fora do exercício de funções no Haitong Bank.

2.1. O risco de organização enquanto risco de inadequado tratamento interno da informação- o Sistema de Controlo Interno e de Gestão de Risco.
Sob as Conclusões VV. a III. O recorrente sustenta que,  a “teoria do risco da organização” invocada pelo Tribunal a quo não tem consagração nem suporte na lei, sendo que o conhecimento da pessoa coletiva deve ser aferido por referência ao regime do artigo 401.º do CdVM.
Mais alegou que, de todo o modo a imputação de conhecimento por via da “teoria do risco da organização”, nos moldes que vêm propugnados na Sentença recorrida, tem como pressuposto a não adoção, pela pessoa coletiva, de sistemas adequados de tratamento de informação, como forma de mitigar o risco decorrente da fragmentação do conhecimento, porém, nos presentes autos não foram apurados quaisquer factos que permitissem concluir que o HAITONG BANK não dispunha de uma organização interna e de procedimentos adequados a mitigar o risco decorrente da fragmentação de conhecimento ― ou seja, que permitisse concluir que foi por culpa da organização do HAITONG BANK que o conhecimento dos referidos administradores não lhe foi transmitido, sendo a Sentença recorrida totalmente omissa quanto a tal matéria de facto.
Conclui que, sendo omissa quanto a tal matéria de facto, não poderia o Tribunal a quo ter retirado as ilações que retirou, ao nível do direito, quanto à dita imputação de conhecimento, incorrendo num manifesto vicio de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – cfr. artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, até porque o recorrente tinha efetivamente um sistema de controlo interno e de gestão de risco eficiente e adequado ― implementado em plena conformidade com o Aviso do Banco de Portugal n.º 5/2008 ―, suscetível de assegurar o bom tratamento da informação e de acautelar os riscos decorrentes das operações em que intervinha (como é o caso, entre outros, das operações de papel comercial), factos esses relativos ao sistema de controlo interno que poderiam, inclusive, ter sido alegados e demonstrados nos autos caso o Tribunal a quo tivesse dado direito ao contraditório sobre tal matéria, o que não fez, dando-lhe a oportunidade de “(…) opor ao terceiro o cumprimento do dever de organização interna para afastar a imputação do conhecimento”(o que redunda numa inevitável nulidade da Sentença).
Alegou ainda que, o conhecimento da real situação económico e financeira das entidades emitentes do papel comercial não era um conhecimento juridicamente exigível no contexto, porquanto no âmbito das operações de papel comercial em apreço apenas desempenhou tarefas meramente administrativas, de back-office, não implicando tais operações qualquer risco de crédito para si , logo, não recaía qualquer obrigação de se organizar de molde a que a informação relativa a tais operações fosse veiculada dentro da organização.
Grande parte dos argumentos suscitados pelo recorrente já foram tratados nas questões anteriores a esta, partindo o recorrente, como  vimos, de premissas factuais erradas, em total oposição à matéria de facto dada como provada a esse propósito, sendo ainda de salientar que não foi por via da teoria do risco de organização que o recorrente foi condenado, consubstanciando apenas mais uma linha argumentativa do tribunal a quo, que concluiu que o recorrente agira como intermediário financeiro, comparticipante do B....
Independentemente de se aplicar ou não a teoria do risco da organização, resulta da matéria de facto provada, factos que se subsumem ao elemento objetivo e subjetivo do tipo de ilícito previsto nos termos conjugados dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a) do CdVM, sendo suficientes para imputar ao recorrente um contributo causal na divulgação aos clientes do B... de informação sem qualidade, factualidade essa que não pode ser sindicada por este Tribunal, nem os meios de prova ou argumentos utilizados pelo tribunal a quo na sua motivação, por não resultar evidente do texto da sentença erro na sua apreciação, vício que nem sequer é assacado por este recorrente.
O único vício suscitado pelo recorrente foi o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ( art. 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO).
O vício da insuficiência da matéria de facto provada ocorre quando a matéria de facto é insuficiente para fundamentar a decisão de direito e, só existe quando o tribunal deixa de investigar o que devia e podia, tornando a matéria de facto insusceptível de adequada subsunção jurídica, concluindo-se pela existência de factos não apurados que seriam relevantes para a decisão da causa.
 Nas palavras de Simas Santos, trata-se de uma “lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito” , o que, como vimos, não é manifestamente o caso, uma vez que a matéria de facto apurada é suficiente para fundamentar a decisão de direito vertida na sentença recorrida.
A alegação deste vício da sentença terá de soçobrar, porquanto é totalmente irrelevante apurar se o recorrente tinha efetivamente um sistema de controlo interno e de gestão de risco eficiente e adequado, suscetível de assegurar o bom tratamento da informação e de acautelar os riscos decorrentes das operações em que intervinha, como alegou o recorrente, porquanto se existia então falhou, de todo o modo não foi condenado por qualquer falha organizacional a esse nível, mas por força da comparticipação no facto ilícito praticado pelo intermediário financeiro B....
Sustenta o recorrente que o conhecimento da real situação económico e financeira das entidades emitentes do papel comercial não era um conhecimento juridicamente exigível e, que o conhecimento dos referidos administradores não lhe foi transmitido, no entanto, está dado como provado que o recorrente sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes, sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes, matéria de facto incontornável e que traduz precisamente o conhecimento que insiste em escamotear.
Improcede este segmento recursivo.

2.2.Da impossibilidade de imputação do conhecimento adquirido fora do exercício de funções no Haitong Bank.
Sob as Conclusões JJJ. a JJJJ o recorrente sustenta que, o Tribunal a quo procedeu à imputação ao HAITONG BANK do conhecimento adquirido pelos administradores AA, BB e DD no exercício de outras funções (que não as de administradores do então BEl...), e noutras sociedades – na EI..., S.A e na R..., S.A –, que não o HAITONG BANK, o que significa que estamos perante um conhecimento (i) privado dos referidos administradores, na medida em que como supra se explicou, não era um conhecimento exigível ao HAITONG BANK, e (ii) fortuito, na medida em que foi adquirido no exercício de funções alheias àquelas que exerciam na HAITONG BANK.
Alegou ainda que, mesmo à luz da teoria do risco da organização, tal conhecimento não lhe pode ser imputado, em primeiro lugar, porque nenhum dos referidos administradores teve qualquer participação ou intervenção na matéria relacionada com os programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A enquanto administradores do HAITONG BANK e no exercício dessas funções, sendo que a nenhum desses administradores estavam acometidas, aliás, quaisquer funções ou pelouros relacionados com os programas de papel comercial da EI..., S.A ou da R..., S.A e/ou com as emissões de papel comercial realizadas ao abrigo dos mesmos (cfr., inter alia, os Factos Provados n.ºs 74 a 78, 224, 258 a contrario e 645 da Sentença), estando-se perante o conhecimento adquirido por administradores que não intervieram, nem tinham de intervir, nos programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A no âmbito das suas funções do HAITONG BANK ― tal significando, por conseguinte, que o seu conhecimento não pode, sem mais, ser imputado à sociedade.
Mais alegou que, para que tal conhecimento ― conhecimento adquirido fora do exercício das funções, por quem não interveio nem tinha que intervir ―lhe pudesse ser imputado era necessário que sobre os referidos administradores recaísse um dever de comunicação desse mesmo conhecimento, em virtude de tal informação ser necessária ao exercício das suas funções próprias no HAITONG BANK, porém, o conhecimento dos três administradores quanto à real situação económico- financeira das emitentes não era relevante para as funções por si desempenhadas no âmbito do HAITONG BANK, e também aos referidos administradores não recaía qualquer dever de comunicação ao HAITONG BANK no que a tal informação diz respeito.
Concluiu que também não resultou apurado nos autos qualquer ato comunicativo por meio do qual os referidos administradores lhe tivessem transmitido a informação quanto à real situação económico-financeira da EI..., S.A e da R..., S.A de que tinham conhecimento, assim como tais administradores sempre estariam legalmente impedidos de transmitir tal informação em virtude do dever de reserva e sigilo que sempre se encontrariam adstritos perante a EI..., S.A, a R..., S.A ou até mesmo o B... (cfr. artigo 64.º do CSC).
Sustenta, assim, que é insustentável a imputação ao HAITONG BANK do conhecimento dos administradores AA, BB e DD.
A esse propósito consta o seguinte na sentença recorrida, cujo acerto de reconhece:
“Ora, no presente caso importa referir que a partilha de informação pelos administradores àqueles que estavam encarregues de cumprir o dever, para além de ser possível, era exigível, sob um prisma de risco controlável mediante a adopção de uma adequada organização.
Com efeito, competia ao BEl..., agora Haitong, organizar-se internamente, de forma adequada, de molde a assegurar que a informação relevante que fosse do conhecimento, por exemplo, de um órgão de administração, fosse devidamente veiculada dentro da organização, chegando àquele que, dentro da repartição de funções previamente delimitada, era chamado a cumprir determinada norma.
Contudo, importa questionar até que ponto é que existe um dever de comunicação por parte dos administradores que obtêm informação relevante para o exercício da actividade da sociedade mas fora do exercício dessas especificas funções e até que ponto é que esse dever de comunicação está relacionado com o risco de organização e com o dever de adequada organização por parte da sociedade, no sentido de assegurar um fluxo interno de informações relevantes para a sua actividades obtida pelos actores que dentro da sua estrutura se integram.
Se o facto é relevante para o exercício das funções do agente singular, integrado na estrutura organizacional da sociedade, não releva o modo como obteve a informação para que o conhecimento dessa informação relevante possa ser imputado à sociedade. Na verdade, integra o dever de adequada organização da sociedade, operar a uma adequada selecção dos agentes que utiliza na prossecução da sua actividade, devendo correr o risco inerente à selecção desses agentes.
No vertente caso, sobre os administradores AA, DD e BB impendia um especial dever de comunicação dos factos relevantes à sociedade BEl..., na medida em que sobre os mesmos recai uma obrigação de diligente administração do BEl... (Haitong), decorrente, desde logo, da al. a) do n.º 1 do artigo 64.º do Código das Sociedade Comerciais.
Nos termos deste dispositivo legal, “os gerentes ou administradores da sociedade devem observar deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado (…)”.
Ora, este dever de diligência implica, tal como defende Carneiro da Frada, in “O dever de legalidade: um novo (e não escrito) dever fundamental dos administradores, DSR, 8 (2012), pág. 65 e ss, um dever de legalidade. Tal implica que devem os administradores adoptar condutas conformes com a lei e adoptar condutas de modo a que a sociedade de que são administradores também prima pelo cumprimento da lei.
Se um administrador tem conhecimento de determinado facto relevante no cumprimento de determinado dever da sociedade, independentemente do modo como obteve esse conhecimento, tem o dever de promover dentro da sociedade todos os procedimentos necessários para cumprir a legalidade, já que nas suas funções está intrínseco o dever de rumar a actividade da sociedade no sentido da legalidade, porque a isso impõe o dever de diligência.
Se o administrador que é seleccionado pela estrutura organizativa da sociedade não cumpre esse dever, existe um defeito na selecção dos seus agentes, devendo esse risco na selecção dos agentes ser à sociedade imputado. Na verdade, muitas vezes, os agentes são escolhidos para exercer determinadas funções dentro da sociedade, tendo em vista os seus conhecimentos obtidos pela sua experiência profissional e os seus conhecimentos académicos, acervo este de conhecimentos que a sociedade beneficia, pelo que outros conhecimentos que sejam detidos por estes agentes que sejam relevantes para o cumprimento das suas funções (mormente sob uma bitola de diligente administração, cuidando do cumprimento da legalidade por parte da sociedade), deverão ser igualmente imputados à sociedade.
Neste sentido, vide também, José Ferreira Gomes e Diogo Costa Gonçalves, in “A Imputação de Conhecimento às Sociedades”, Almedina, pág. 113 e ss.  e pág. 127 e ss, onde se escreveu o seguinte:
“A inexistência de partilha da informação, quando possível e desejável, é um rico que deve ser suportado por aquele que, através de uma organização adequada, podia e devia ter garantido o conhecimento relevante na formação de um concreto negócio.
“O risco de organização, como critério de imputação, exige que o conhecimento de A (agente singular) seja imputado a P (sociedade), não obstante a colegialidade do órgão, o seu modo de funcionamento e o regime de vinculação da sociedade.”
Ora, estas considerações implicam que o conhecimento de quem elaborou as Notas Informativas, que não tinha conhecimento da deficiência das mesmas, no que tange à qualidade da informação nelas veiculada, no seio do BEl... (agora Haitong) se agrega ao conhecimento que os administradores desta última sociedade tinham acerca, por um lado, da omissão de passivo nas contas da EI..., S.A por referência ao ano de 2012 e do aumento inusitado de passivo por referencia a 2013 (no que tange ao administrador AA) e por outro, da realização de uma operação de reestruturação do G..., com implicações na actividade da R..., S.A (por parte dos três administradores em causa). Esta agregação forma o próprio conhecimento imputado à Haitong.”
Mais uma vez, o que se realça é que, resulta dos factos provados, que o Recorrente, no quadro da emissão e colocação de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, assumiu contratualmente as funções de Líder, Entidade Registadora e Agente dos Programas de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, figurou como Líder e Agente Pagador nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, por si elaboradas para serem disponibilizadas aos clientes do B..., subscritores do papel comercial emitido por aquelas entidades, funções essas assumidas  e executadas no seio da sua organização empresarial, da qual faziam parte os administradores AA, BB e DD (que faziam parte do Conselho de Administração), os quais estavam na posse da informação necessária para orientar a conduta do recorrente de acordo com o cumprimento dos deveres de informação por cuja violação foi condenado.
“(…) as pessoas colectivas são também destinatárias das normas de conduta, por disporem de órgãos que podem e devem entender os mandados de conduta e, por isso, também capazes de agir em conformidade com as mesmas. 
De que vale ao recorrente insistir que estamos perante um conhecimento privado dos referidos administradores, na medida em que não era um conhecimento exigível ao HAITONG BANK, e fortuito, na medida em que foi adquirido no exercício de funções alheias àquelas que exerciam na HAITONG BANK, ou que nenhum dos referidos administradores teve qualquer participação ou intervenção na matéria relacionada com os programas de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, não lhes estando acometidas quaisquer funções ou pelouros relacionados com os programas de papel comercial, quando está dado como provado que, o recorrente agiu consciente e voluntariamente na prática dos referidos factos, conhecia-os porque se tratavam de factos próprios, em que participou, sabia que as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes, sabia que as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e de 16 de Janeiro de 2014 continham informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, nem da sua comercialização junto dos seus clientes e, todavia, quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre setembro e dezembro de 2013, fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada, assim como quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre Janeiro e Fevereiro de 2014 fosse a supra identificada nos exactos termos em que esta foi prestada.
De acordo com os factos dados como provados na sentença recorrida, o contributo causal do Recorrente para a prática das infrações em causa consubstancia-se na prática de actos realizados no seio da sua organização empresarial, no exercício da sua atividade, ao executar funções auxiliares do  intermediário financeiro B..., independentemente de quem foi a pessoa singular que no seio da organização do Recorrente praticou os diferentes factos que permitem afirmar o seu contributo causal para a prática das contraordenações em causa, estando demonstrado nos autos que tinha conhecimento de que a informação prestada aos investidores não era completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita e mesmo assim quis que a informação a prestar fosse aquela.
A alegada impossibilidade de imputação do conhecimento dos administradores ter sido adquirido fora do exercício de funções no recorrente torna-se inócua quando contraria frontalmente a matéria de facto apurada nos autos, da qual se extrai o conhecimento necessário á imputação dos factos ao recorrente, matéria de facto essa cuja reapreciação está vedada a este Tribunal de recurso.
Deste modo, improcede este segmento recursivo.

3ª- Da violação dos direitos de defesa e contraditório.
Sob as Conclusões KKKK. a XXXX. o recorrente sustenta que, o Tribunal a quo faz assentar a imputação quer objetiva, quer subjetiva, das infrações ao Recorrente em fundamentos totalmente distintos dos constantes da Decisão da CMVM, em torno dos quais o Recorrente estruturou a sua defesa, trazendo à colação uma linha de argumentação sobre a qual o HAITONG não teve, em momento algum, possibilidade de se pronunciar, numa manifesta violação dos seus direitos de defesa, assim como do princípio do contraditório, da proibição da indefesa e do processo justo e equitativo, plasmados nos artigos 32.º, n.º 10 e 20.º, n.º 4 da Constituição e no artigo 6.º da CEDH, razão pela qual deve a Sentença recorrida ser revogada.
Mais alegou que, a Sentença recorrida é afetada pelos vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto, já que não foram articulados factos suficientes para permitir retirar as ilações que sustentam os pressupostos em que assenta a condenação do HAITONG BANK e não foram articulados factos suficientes para permitir imputar a infração ao HAITONG BANK – a título objetivo e subjetivo -, nos termos dos artigos 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, mas também nula, por não prever factualidade manifestamente relevante para imputação da infração ao HAITONG BANK, nos termos da leitura conjugada dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º n.º 1, alínea a) do CPP, sustentando que, a prática dos factos e os estados de espírito relevantes têm de ser imputados a pessoas físicas individualizadas e concretas que, ao abrigo das normas aplicáveis (mormente artigo 401.º, n.º 2 do CdVM), possam considerar-se como vinculantes da pessoa colectiva para efeitos de imputação da responsabilidade contraordenacional – o que não é feito na Sentença recorrida, que imputa objetivamente os factos ao HAITONG BANK porque praticados pela sua “Direcção de Mercado de Capitais”, que “elaborou as Notas Informativas do papel comercial”, e conclui que o HAITONG BANK “agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos”, porque “conhecia”, “sabia” e “quis” (factos provados 471 a 479).
Segundo o recorrente, do mesmo vício padecia a Decisão da autoridade administrativa impugnada perante o Tribunal a quo: também nos factos nada se refere quanto às concretas pessoas que vincularam o HAITONG BANK a título objetivo e subjetivo; refere-se apenas que as Notas Informativas foram elaboradas pela Direção de Mercado de Capitais e que o HAITONG “conhecia”, “sabia” e “quis” (factos provados n.ºs 517 a 533 - páginas 323 a 329 da Decisão administrativa) – a CMVM não procedeu a um verdadeiro juízo de imputação subjetiva nem indagou sobre os pressupostos necessários à responsabilidade contraordenacional do HAITONG BANK, o que sempre implica que a Decisão administrativa seja declarada nula, ao abrigo do disposto nos artigos 58.º do RGCO e 283.º, 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP, ex vi artigo 41.º do RGCO, o que se requer.
Conclui que, sendo nula a Decisão administrativa, é nula também a Decisão proferida pelo Tribunal a quo, porque não aditou aos factos provados a factualidade necessária para que as contraordenações em apreço pudessem ser imputadas ao HAITONG BANK – tal só poderia suceder por recurso ao disposto nos artigos 358.º e 359.º do CPP, o que se não verificou in casu – e, bem assim, porque essa factualidade foi incluída, de forma travestida, na parte da fundamentação da Sentença (em detalhe, capítulo II. D) supra), pelo que se impõe a sua revogação, ao abrigo do disposto nos artigos 410.º, n.º 2, alínea a), 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP, aplicáveis ex vi artigo 41.º do RGCO.
Como já atrás decidido, discordamos rotundamente do recorrente, porquanto a matéria de facto provada constante da sentença é suficiente para considerar preenchidos os elementos objetivo e subjetivo do tipo de ilícito pelo qual foi condenado, previsto nos termos conjugados dos artigos 7.º e 389.º, n.º 1, al. a) do CdVM, resultando dos factos provados 420 a 446, que as Notas Informativas divulgadas junto dos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A continham informação que não era verdadeira, não era completa, não era atual e não era lícita e, que o recorrente elaborou as notas informativas conhecendo a falta de qualidade da informação nelas constante por via dos seus administradores AA, BB e DD, conhecia tais factos porque se tratavam de factos próprios, em que participou, e quis que a informação a prestar aos clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A fosse aquela, nos exactos termos em que foi prestada, estando mais do que demonstrado que ao recorrente não foi feita uma imputação objectiva dos factos ilícitos.
Conforme se discorreu anteriormente, de forma exaustiva, não era necessário, como sustenta o recorrente, que a prática dos factos e os estados de espírito relevantes tivessem de ser imputados a pessoas físicas individualizadas e concretas para efeitos de imputação da responsabilidade contraordenacional, pelo que nenhuma omissão ou insuficiência para a decisão da matéria de facto existe na sentença recorrida (sendo esta e não a decisão administrativa o objecto deste recurso), não tendo sido violado o arts 374.º, n.º 2 e , consequentemente não se verifica a apontada nulidade prevista no 379.º n.º 1, alínea a) do CPP.
Encontrando-se provados factos bastantes para preencherem os elementos objetivo e subjetivo do tipo de ilícito em causa, conforme resulta dos autos, inexiste qualquer omissão de factos que o tribunal devesse ter apurado para poder decidir como decidiu, não se verificando a apontada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada prevista no art. 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO.
Relativamente à questão da teoria do “risco de organização” mencionada na sentença, já atrás mencionamos que não foi determinante para a condenação do recorrente, foi apenas mais uma linha argumentativa suscitada pelo tribunal a quo em sede de matéria de direito, sempre com base nos factos dados como provados e já vertidos na decisão administrativa, não implicando essa análise de direito o aditamento de qualquer matéria de facto, tratando-se apenas de uma mera análise da factualidade apurada à luz das várias soluções de direito admissíveis, não tendo sido violados os direitos de defesa e contraditório do aqui recorrente, direito a um processo equitativo e justo, porquanto conhecia os factos que lhe eram imputados, deles se pode defender, esgrimindo os argumentos que considerou relevantes, não podendo ignorar a faculdade de os factos poderem ser analisados pelo tribunal á luz das várias soluções de direito admissíveis.
Improcede este segmento recursivo.
                                                            
4ª- Prescrição do procedimento contraordenacional
O Recorrente Haitong Bank, SA suscitou a questão da prescrição do procedimento contraordenacional nas Conclusões YYYY a LLLLL, nos seguintes moldes:
-O ora Recorrente vem condenado pela prática de contraordenações que se consideram consumadas em 11.12.2013 e 24.02.2014 – porém, os factos relevantes para a imputação das contraordenações em apreço tiveram lugar em 15.10.2013 e 16.01.2014, datas das últimas Notas Informativas do papel comercial cuja elaboração é imputada ao HAITONG BANK, respetivamente, da EI..., S.A e da R..., S.A, ou, no limite, nos dias 09.09.2013 e 09.01.2014, data da prestação da informação, pelo B..., aos seus clientes.
-Os pressupostos em que a Sentença recorrida faz assentar a contagem do prazo prescricional das infrações em apreço – (i) os prazos de prescrição estiveram suspensos por força das medidas excecionais adotadas em decorrência da pandemia, operando-se uma suspensão por 86 dias + 74 dias; e (ii) os prazos de prescrição estiveram suspensos, nos termos do artigo 27.º-A, n.º 2 do RGCO, por um período de 6 meses – não podem ter-se como bons.
-Ainda que se aceitasse o primeiro pressuposto como bom – o que não se concede – a verdade é que a Sentença recorrida incorreu num erro de cálculo quanto ao segundo pressuposto, por referência ao período pelo qual se encontraram suspensos os prazos de prescrição por imposição do artigo 27.º-A do RGCO – considerou o prazo legal máximo (n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO) e não o período em que a causa de suspensão efetivamente se verificou, de 19.10.2021 a 15.02.2022, tendo estado o processo pendente não pelo período de 6 meses considerado na Sentença (linhas 617 a 619), mas por 3 meses e 27 dias, pelo que, admitindo, em tese, as datas de consumação consideradas pela Sentença recorrida, a contraordenação relacionada com a EI..., S.A prescreveu em 15.03.2022.
-Para além do referido erro de cálculo, a contagem dos prazos prescricionais efetuada pelo Tribunal a quo assenta noutro pressuposto errado: as normas relativas à suspensão de prazos constantes da Lei n.º 1-A/2020 diz respeito não poderão considerar-se aplicáveis aos factos objeto dos presentes autos, por força do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, do RGCO, 2.º, n.º 4, do CP, e 5.º, n.º 2, al. a) do CPP, que consagram o princípio da aplicação da lei mais favorável, bem como por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1 e 4, da CRP, que consagra o princípio da não aplicação retroativa da lei penal, aplicável ao domínio contraordenacional, enquanto ramo de direito de natureza sancionatória.
- são materialmente inconstitucionais as normas que se extraem do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, na redação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 e Março, dos artigos 6.º-B, n.ºs 3 e 4 da Lei n.º 1-A/2020 aditados pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, do artigo 6.º, n.º 2 da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, dos artigos 8.º e 10.º da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, bem como do artigo 4.º da Lei n.º 4-B/2021, tal como aplicadas pelo Tribunal a quo, segundo as quais a suspensão dos prazos neles prevista é também aplicável ao prazo substantivo de prescrição do procedimento contraordenacional em processos pendentes, cujo prazo de prescrição havia sido definido pela lei vigente à data da prática dos factos e se encontrava em curso, por violação dos artigos 2.º e 29.º, n.º 1 e 4 da CRP, pelo que deve a aplicação dessas normas ser recusada pelo Tribunal, tendo em conta o disposto no artigo 204.º da CRP, sendo a presente inconstitucionalidade suscitada nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da CRP e no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional.
-Concluiu que deve ser recusada a aplicação das normas acima identificadas relativas à suspensão de prazos constantes da Lei n.º 1-A/2020 e tendo por referência as datas de 15.10.2013 e 16.01.2014 (datas das últimas Notas Informativas do papel comercial cuja elaboração é imputada ao HAITONG BANK) o procedimento contraordenacional relativo à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A prescreveu em 16.04.2021 e da R..., S.A prescreveu em 17.07.2021.
- Ou, considerando a data da prestação da informação, pelo B..., aos seus clientes, o procedimento contraordenacional relativo à informação divulgada nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A prescreveu em 11.03.2021 e da R..., S.A prescreveu em 10.07.2021.
- Ou, no limite, nos termos da Sentença recorrida – ou seja, considerando a consumação como tendo ocorrido em 11.12.2013 e 24.02.2014 –, respetivamente, em 11.06.2021 e 24.08.2021, não se aplicando, em qualquer dos casos, a suspensão prevista no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c) do RGCO, pois que, no momento em que se verificou o facto determinante da referida suspensão (isto é, o despacho de admissão do recurso de impugnação judicial), já o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional quanto às referidas infrações se havia esgotado.
- A propósito da menção feita pelo Tribunal a quo na nota de rodapé n.º 3, constante da página 27 da Sentença recorrida, quanto à ressalva da aplicabilidade da norma constante do n.º 2 do artigo 418.º do CdVM, alegou que esta norma não constava da redação do CdVM em vigor à data da prática dos factos, pelo que convocar a sua aplicação por referência aos factos objeto dos presentes autos, datados de 2013 e 2014, sempre redundaria na aplicação retroativa de uma norma prejudicial ao Recorrente, em termos desconformes aos artigos 2.º e 29.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição, pelo que, a norma constante do n.º 2 do artigo 418.º do CdVM é inconstitucional, na interpretação efetuada pelo Tribunal a quo e constante da referida nota de rodapé, no sentido de que a suspensão do prazo de prescrição dela constante é aplicável a factos ocorridos antes da sua entrada em vigor, por violação dos artigos 2.º e 29.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição.
Vejamos se ocorreu a prescrição do procedimento contraordenacional.
O Recorrente foi condenado, por decisão judicial proferida pelo TCRS, datada de 15/2/2022, nos seguintes termos:
1- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
2- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
Estabelecia o art. 418º nº 1 do CdVM (na redação em vigor à data da prática dos factos) que o procedimento por aquele tipo de contraordenações extingue-se por efeito da prescrição no prazo de cinco anos.
A prescrição corre a partir da data da prática dos factos (art.º 27º RGCO) e suspende-se ou interrompe-se, nas condições referidas nos artigos 27º-A e 28º do RGCO.
Independentemente disso, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade - art.º 28º nº 3 do RGCO.
Desta norma resulta, em conjugação com o disposto no art.º 27º-A n.º2 do RGCO quanto ao prazo da suspensão (6 meses), que no caso de o prazo de prescrição ser de cinco anos, o prazo máximo de prescrição será de sete anos e seis meses, a que poderá acrescer 6 meses por causa suspensiva ocorrida designadamente nos termos do art. 27º-A nº 1 al. c) e nº 2 do RGCO, no máximo de oito anos.
Segundo o disposto no art. 27º do RGCO o início de contagem do prazo de prescrição é o do momento da prática da contraordenação, sendo que o art. 5º do RGCO esclarece que o facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido.
Assim não será se estivermos perante contraordenações permanentes, caso em que os prazos se contam desde o dia em que cessa a respectiva consumação, uma vez que o agente cria uma situação antijurídica cuja manutenção depende da sua vontade , como sustentou o tribunal a quo e cujo entendimento se sufraga, sendo que nenhum dos Recorrentes se insurge contra a qualificação das infrações como permanentes.
A discordância do aqui Recorrente, quanto à decisão de indeferimento de prescrição proferida pelo tribunal a quo, centra-se quanto às datas consideradas pelo tribunal para o início de contagem do prazo de contagem e, quanto à inaplicabilidade quer da suspensão de 6 meses prevista no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO, quer das causas de suspensão decorrentes das Leis temporárias nº 1-A/2020 e nº 4-B/2021, quer da nova redação do art. 418º nº 2 do CdVM.
Quanto ao início do prazo de contagem da prescrição a decisão recorrida perfilhou o seguinte entendimento:
“Nestes termos, no caso da colocação do papel comercial da EI..., S.A, relativamente à contra-ordenação por violação do dever de divulgação de informação com qualidade (artigo 7.º do CdVM), nos termos em que foi imputada aos Recorrentes, é uma infração permanente, já que resulta da violação do dito dever, que se mostra materializado em diversas condutas, desde Setembro a Dezembro de 2013, através das quais o bem jurídico protegido pela norma violada foi sendo estreitado de forma sucessiva, por vontade dos agentes.
Assim, as infracções consumaram-se no dia 11 de Dezembro de 2013, data até à qual foi comercializado, pelo B... (facto que não é colocado em causa pelos Recorrentes), o papel comercial, com a prestação da informação com base apenas no que constava nas Notas Informativas.
No caso da colocação do papel comercial da R..., S.A, relativamente ao dever de divulgação de informação com qualidade (artigo 7.º do CdVM), as infracções, igualmente permanentes, consumaram-se no dia 24 de Fevereiro de 2014, data até à qual foi comercializado, pelo B..., o papel comercial (facto que não é refutado pelos Recorrentes), com a prestação de informação apenas com base no que constava nas Notas Informativas.
Apesar do Banco de Portugal ter determinado a suspensão da comercialização desse papel comercial, em data anterior, certo é que ainda assim o B... não se logrou organizar, mantendo a comercialização até àquele dia.
Por outro lado, ao contrário do que parece ser o entendimento do Haitong, o facto do BEl... (agora Haitong) não ter sido o intermediário financeiro responsável pela colocação do papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A e, consequentemente, pela prestação de informação aos investidores (clientes do B...) que o adquiriram, em nada contende com o cálculo da data de prescrição do procedimento contra-ordenacional, na medida em que resulta da decisão administrativa que a mesma considera que aquele Banco Recorrente (e também o Recorrente AA) deram um contributo causal para a prestação de informação sem qualidade por parte do B... aos seus clientes, sendo aplicado o conceito extensivo de autoria que resulta do n.º 1 do artigo 16.º do RGCO.
Nestes termos, a contagem dos prazos de prescrição do presente procedimento contra-ordenacional iniciou-se nos aludidos prazos e não, como pretende o Arguido Haitong, em 15 de Outubro de 2013 (data da última Nota Informativa do papel comercial da EI..., S.A em causa nos presentes autos) e 16 de Janeiro de 2014 (data da última Nota Informativa do papel comercial da R..., S.A em casa nos presentes autos). Veja-se que, as Notas Informativas apenas foram um veículo de transmissão de informação, sendo que, após a última emissão, continuou a ser comercializado papel comercial sem que a informação prestada fosse de qualidade. Como melhor se explicará infra, o tipo objectivo que foi imputado à Haitong nada tem que ver com a redacção ou necessidade de actualização de Notas Informativas, mas antes com a violação de um dever de prestar informação de qualidade por parte do intermediário financeiro, independentemente do veículo de transmissão dessa informação.
(…) a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação do facto ilícito e não com a prática do(s) contributo(s) causal(ais) de cada um dos agentes para a realização do mesmo.
Tal extrai-se do próprio n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal que determina que “o prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado”, esclarecendo ainda o n.º 3 do mesmo artigo 119.º do Código Penal que “no caso de cumplicidade atende-se sempre, para efeitos deste artigo, ao facto do autor”.
Relativamente ao início de contagem do prazo de prescrição secundamos o raciocínio perfilhado pelo tribunal a quo, face á qualificação das infrações cometidas pelo aqui Recorrente como contraordenações permanentes, pelas razões acima melhor expostas e que aqui se reproduziram por uma questão de simplificação.
Por recurso, subsidiariamente, ao disposto no art. 119º nº 2 al. a) do CP ( ex vi art. 407º CdVM e art. 32º do RGCO), articulado com o teor dos factos dados como provados, designadamente nos pontos 230, 238, 246, 253, 267, 275, 305, 306, 359 a 362, os prazos de prescrição ter-se-ão iniciado em 04.12.2013, 11.12.2013 e 24.02.2014, pelo que, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 25.10.2021, em circunstâncias normais já se mostraria esgotado o prazo máximo de prescrição de sete anos e meio.
Porém, assim não aconteceu, porquanto se entende que àqueles prazos de prescrição deverão somar-se os dois períodos de suspensão da prescrição consagrados pelas Lei nº 1-A/2020 e nº 4-B/2021, regime decorrente das medidas excepcionais adoptadas na situação de pandemia por Covid 19 que assolou o país.
Senão vejamos.
A Lei 1-A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, no artigo 7.º, nºs 3 e 4, determinou a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos, desde 9 de Março de 2020.
Uma vez que a Lei 16/2020, de 29 de Maio, revogou o artigo 7.º da Lei 1-A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, pondo termo à suspensão dos aludidos prazos de prescrição e caducidade (cf. artigo 8.º da Lei 16/2020), a partir do dia 3 de junho de 2020 os prazos de prescrição e caducidade que haviam ficado suspensos por força da Lei 1-A/2020 retomaram a respetiva contagem.
Segundo o artigo 6.º da Lei 16/2020, os prazos de prescrição e caducidade que “deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas por tal lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão”.
Assim sendo, no caso em apreço, ao aludido prazo de prescrição de sete anos e meio, acresce o prazo em que foi determinada a mencionada nova causa de suspensão decorrente da situação de emergência nacional e de calamidade determinada pela pandemia causada pelo Covid19, que por força da Lei nº 1-A/2020 é de 86 dias (entre 9/3/2020 e 2/6/2020) e que abrangeu o procedimento dos autos uma vez que o prazo de prescrição nessa altura ainda não se esgotara.
Posteriormente, pela Lei nº 4-B/2021 de 1/2 foi aditado o art. 6º-B nº 3 e 4 da Lei nº 1-A/2020, voltando a suspender os prazos de prescrição com efeitos reportados a 22/1/2021 até 5/4/2021 (Lei nº 13-B/2021 de 5/4), no total de 74 dias, e que abrangeu o procedimento dos autos uma vez que o prazo de prescrição nessa altura também ainda não se esgotara.
Tendo ficado expressamente previsto no referido art. 6º-B nº 4 que, “prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, aos quais acresce o período de tempo em que vigorar a suspensão”.
A aplicabilidade destes prazos de suspensão tem sido reiteradamente aceite por este Tribunal da Relação-Secção PICRS , no seguimento dos consistentes entendimentos nesse sentido do Tribunal Constitucional, que enjeita qualquer das inconstitucionalidades invocadas pelos Recorrentes, designadamente a alegada violação dos arts. 2º e 29º nº 1 e 4 da CRP, como deu conta o tribunal a quo, nos seguintes termos:
“Os Recorrentes Haitong e AA defendem que não têm aplicação, no vertente caso, as suspensões do prazo de prescrição, em decorrência da pandemia por covid-19, tendo em conta a data da prática das infracções imputadas e a data da entrada em vigor das citadas leis, sob pena de violação do princípio da proibição da aplicação retroactiva da lei menos favorável aos Arguidos.
Sucede, porém, que o próprio Tribunal Constitucional, chamado que foi para verificar a conformidade das normas em apreço quando interpretadas no sentido de poderem ser aplicadas a infracções cometidas antes da entrada em vigor dos diplomas em causa, já se pronunciou pela conformidade constitucional das mesmas normas.
Na verdade, no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 500/2021 foi decidido o seguinte:
“Não julga inconstitucional o artigo 7.º, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência.”
Já o acórdão do mesmo Colendo Tribunal, com o n.º 660/2021 decidiu o seguinte:
“Não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido “de que a causa de suspensão dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista se aplica aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontram já em curso”.
De acordo com aquele primeiro acórdão:
“A medida constante dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 — já o notámos — insere-se no âmbito de legislação temporária e de emergência, aprovada pela Assembleia da República para dar resposta à crise sanitária originada pela pandemia associada ao coronavírus SARS-CoV-2 e à doença COVID-19.
“No cumprimento do seu dever de proteção da vida e da integridade física dos cidadãos (artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, da Constituição, respetivamente), o Estado adotou um conjunto de medidas destinadas a conter o risco de contágio e de disseminação da doença, baseado na implementação de um novo modelo de interação social, caracterizado pelo distanciamento físico e pela diminuição dos contactos presenciais.
“No âmbito da administração da justiça — vimo-lo também —, o cumprimento desse dever de proteção conduziu à excecional contração da atividade dos tribunais, concretizada através da sujeição dos atos e diligências processuais ao regime das férias judiciais referido no n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, e, após as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, à regra da suspensão, pura e simples, de todos os prazos processuais previstos para aquele efeito. Para os processos urgentes, começou por estabelecer-se um regime especial de suspensão dos prazos para a prática de atos, ainda que com exceções (artigo 7.º, n.º 5, da Lei n.º 1-A/2020), que a Lei n.º 4-A/2020 acabou por modificar, impondo a sua normal tramitação desde que fosse possível assegurar a prática de atos ou a realização de diligências com observância das regras de distanciamento físico.
“Por força desta paralisação da atividade judiciária, que se estendeu à justiça penal, os atos processuais interruptivos e suspensivos da prescrição deixaram de poder praticar-se no âmbito dos procedimentos em curso, pelo menos nas condições em que antes o podiam ser. Relativamente aos procedimentos criminais, assim sucedeu com a dedução da acusação, a prolação da decisão instrutória e a apresentação do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo (artigos 120.º, n.º 1, alínea b), e 121.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal), a declaração de contumácia (artigos 120.º, n.º 1, alínea c), e 121.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal) e a constituição de arguido (121.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal). Já no âmbito dos procedimentos contraordenacionais, o mesmo se verificou, pelo menos, com a prolação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima (artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c), e 28.º do RGCO), a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomadas ou qualquer notificação (artigo 28.º, n.º 1, alínea a), do RGCO), a realização de quaisquer diligências de prova (artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO) e a prolação da decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima (artigo 28.º, n.º 1, alínea d), do RGCO).
“É este particular e especialíssimo contexto que está subjacente à fixação, por lei parlamentar, de uma causa de suspensão da prescrição que não somente é transitória, como se destinou a vigorar apenas e só durante o período em que se mantivesse — se manteve — o condicionamento à atividade dos tribunais determinado pela situação excecional de emergência sanitária e pelo concomitante imperativo de proteção da vida e da saúde dos operadores e utentes do sistema judiciário: suspendeu-se o decurso do prazo de prescrição porque se suspenderam os prazos previstos para a prática dos atos suscetíveis de obstar à sua verificação; suspenderam-se os prazos previstos para a prática desses (e de outros) atos processuais porque se suspendeu a atividade normal dos tribunais de modo a prevenir e conter o risco de infeção dos intervenientes no sistema de administração da justiça, incluindo dos próprios arguidos.
“Como bem notou o Tribunal recorrido, encontramo-nos, pois, diante de um «mecanismo normativo […] instrumental», destinado a fazer face a uma «situação de rutura e anormalidade», em estreita e indissociável relação com o já designado «“lockdown” da justiça penal» (Gian Luigi Gatta, “Lockdown da justiça penal, suspensão da prescrição do crime e princípio da irretroatividade: um curto-circuito”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 30, n.º 2, maio-agosto de 2020, p. 297 e ss.) originado pela crise sanitária, que afetou em intensa medida — ou mesmo eliminou — a possibilidade de serem praticados os atos processuais suscetíveis de interromper e de suspender a prescrição.
“Não é demais sublinhar que se trata de uma suspensão, e não de uma interrupção, do prazo prescricional: o tempo de prescrição já decorrido desde a data da consumação do ilícito típico não é inutilizado; apenas o seu decurso é paralisado pelo tempo correspondente à paralisação do normal processamento dos termos ulteriores dos processos em curso.
“Neste contexto, é evidente que a causa de suspensão da prescrição estabelecida no n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 apenas se encontraria apta a cumprir aquela função se pudesse aplicar-se aos procedimentos pendentes por factos anteriores ao início da sua vigência. Como refere Gian Luigi Gatta a propósito de norma congénere aprovada em Itália (artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020), «[t]rata-se de uma disposição temporária pensada precisamente para os processos em curso e, como tal, para ter eficácia retroativa. Suspende-se uma atividade em curso por força da impossibilidade do seu prosseguimento, determinando-se um prazo para o seu reatamento, congelando-se o intervalo de tempo entretanto volvido. A suspensão é forçada: não é imputável a ninguém e não há razão para que beneficie quem quer que seja» (loc. cit., p. 303).
“Esta última afirmação é especialmente relevante: conforme se verá em seguida, ela sintetiza, na verdade, as duas razões que explicam a impossibilidade de reconduzir a causa de suspensão prevista no artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, à ratio da proibição da retroatividade in pejus, consagrada no artigo 29. º, n.ºs 1, 3 e 4, da Constituição.
“ Dizer-se que a suspensão «não é imputável a ninguém» é o mesmo que dizer-se que a suspensão não é imputável ao Estado.
“Tendo em conta os fundamentos inerentes ao princípio da legalidade penal, tal constatação, para além de correta, é particularmente esclarecedora.
“A suspensão do decurso do prazo de prescrição dos procedimentos sancionatórios pendentes durante o período em que vigoraram as medidas de emergência adotadas na Lei n.º 1-A/2020 não se destinou a permitir que o Estado corrigisse ou reparasse os efeitos da sua inércia pretérita no âmbito do exercício do poder punitivo de que é titular. Destinou-se apenas e tão só a responder aos efeitos de uma superveniente e não evitável paralisação do sistema de administração da justiça penal, imposta pela necessidade de controlar e conter a disseminação de um vírus potencialmente letal. Tratando-se de uma causa de suspensão e não de interrupção do prazo de prescrição, cuja vigência não excedeu o lapso temporal durante o qual se verificou a afetação ou condicionamento da atividade dos tribunais, nem conduziu — reticus, não tinha sequer a virtualidade de conduzir — à reabertura dos prazos prescricionais já integralmente decorridos, a sua aplicação aos procedimentos pendentes não exprime qualquer excesso, arbítrio ou abuso por parte do Estado contra o qual faça sentido invocar as garantias inerentes à proibição da retroatividade in pejus: ao determinar a aplicação a procedimentos pendentes da suspensão da prescrição em razão da pandemia então em curso, a solução adotada limita-se, na verdade, a assegurar «a produção do efeito útil da norma de emergência» (idem, p. 313), não ingressando no âmbito da esfera defensiva que é assegurada pelo princípio da legalidade.
“Não é diferente a conclusão a que se chega se encararmos a proibição da retroatividade in pejus a partir da proteção da confiança, como fez o Tribunal recorrido.
 “Se tal proibição visa garantir ao destinatário uma previsibilidade razoável das consequências com que se deparará ao violar o preceito penal, é relativamente evidente, quando se trate de estender o respetivo âmbito de incidência para além dos limites traçados pela letra dos n.ºs 1, 3 e 4, do artigo 29.º, que a sua invocação deixará de ter fundamento se o evento em causa se situar no mais elevado grau daquilo que não é por natureza antecipável, como sucede com a paralisação do sistema de administração da justiça penal ditada pelo súbito e inesperado surgimento de uma pandemia à escala global.
“Contra o que acaba de dizer-se, pode argumentar-se, é certo, que a antecipação em lei contemporânea da prática dos factos da causa de suspensão da prescrição que veio a constar do conjunto de medidas de emergência aprovadas pelo Parlamento teria sido, em rigor, possível. Bastaria que o legislador português tivesse integrado no elenco das causas de suspensão da prescrição previstas no artigo 120.º, n.º 1, do Código Penal, uma disposição idêntica à que consta do artigo 159.º do Código Penal italiano, que prevê a suspensão do decurso do prazo de prescrição do procedimento criminal nos «casos em que a suspensão do procedimento ou do processo penal é imposta por uma disposição especial da lei».
“Do ponto de vista da invocabilidade das garantias inerentes à proibição da retroatividade, a diferença entre o ordenamento jurídico português e o Direito italiano não é, porém, determinante: apesar de ter conhecimento de que o decurso do prazo de prescrição se suspenderá se e quando vier a ser determinada em lei posterior a suspensão do processo ou do procedimento, o agente que deva ser punido segundo o direito italiano não sabe, no momento em que decide praticar o ilícito-típico, se essa suspensão virá efetivamente a ocorrer, nem sobre durante quanto tempo vigorará na hipótese de vir a ser determinada, nem sobre as caraterísticas do facto ou do acontecimento que venham a ditar essa eventual opção.
“Perante a causa de suspensão que veio a constar do artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020, a posição do agente italiano não é, por isso, muito diferente daquela em que se encontra o agente português em face da causa de suspensão da prescrição constante do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020: tal como este não podia saber, no momento em que praticou o facto criminoso, que a suspensão da prescrição do procedimento instaurado viria a ser imposta pela Assembleia da República em consequência do lockdown da justiça penal originado pelo súbito avanço da pandemia, também aquele não podia ter conhecimento, quando tomou a decisão de praticar o crime, de que a suspensão do processo — e, com ela, a suspensão do prazo de prescrição — viria a ser determinada em norma posterior, editada no mesmo exato contexto.
“É por isso que, apesar de o Tribunal Constitucional italiano ter atribuído relevância à existência de uma norma de intermediação como a constante do proémio do artigo 159.º do respetivo Código Penal para concluir pela compatibilidade da norma constante do artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020, com a proibição da retroatividade (Acórdão n.º 278 de 2020), não existe entre uma e outra solução qualquer diferença que possa ser considerada decisiva ou determinante do ponto vista da proteção da confiança: em ambos os casos, a causa da suspensão do prazo de prescrição é integralmente determinada em lei ulterior ao momento da prática do ilícito-típico, sem que possa dizer-se, tendo em conta o carácter totalmente imprevisível dos acontecimentos que a determinaram, que a sua aplicação aos procedimentos pendentes frustre aquela exigência de previsibilidade das consequências da violação da norma penal a que responde a proibição da retroatividade in pejus.
No mesmo sentido, vide também o recentíssimo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 798/2021.”
Assim sendo, ao referido prazo de prescrição das contraordenações em causa nestes autos, acresceram o/os período(s) de tempo em que vigorou a suspensão, por força dos referidos regimes de suspensão da Lei nº 1-A/2020 (com as apontadas alterações), num total de 160 dias.
Deste modo, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 25.10.2021 ainda não se completara o prazo de prescrição de nenhuma das infrações em causa e, nesse momento iniciou-se novo período de suspensão do prazo de prescrição de 6 meses, previsto no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO.
 A propósito deste prazo de suspensão insurge-se o recorrente Haitong por ele ter sido contabilizado em 6 meses pelo tribunal a quo, quando o referido art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO menciona que a prescrição do procedimento por contraordenação suspende-se durante o tempo que estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até á decisão final do recurso, decisão essa que no caso em apreço foi proferida em 15.02.2022, antes de atingido o prazo máximo dos 6 meses previsto no nº 2 do referido preceito legal, devendo ser só contabilizado o período de suspensão de 3 meses e 27 dias.
Contudo, não tem razão o Recorrente, porquanto a expressão “decisão final do recurso” reporta-se à última decisão judicial que vier a pôr fim ao processo contraordenacional e não à decisão em primeira instância do recurso de impugnação judicial da decisão administrativa, conforme Ac STJ de fixação de jurisprudência nº 4/2011) , pelo que, efectivamente devem acrescer os 6 meses de suspensão uma vez que a sentença recorrida não foi a decisão final do recurso, como este recurso sob apreciação é sinal evidente.
Para além desse acréscimo do prazo de suspensão de prescrição, entendemos também ser de aplicar a nova causa de suspensão do prazo de prescrição prevista no actual art. 418º nº 2 do CdVM introduzido pela Lei n.º 28/2017, de 30/05.
Senão vejamos.
O aqui Recorrente foi condenado, por decisão proferida pela CMVM, pela prática das referidas contraordenações previstas e punidas pelo art. 389º nº 1 al. a) do CdVM.
Inconformado com a referida decisão proferida pela CMVM, o aqui recorrente dela interpôs Recurso de Impugnação Judicial, tendo sido proferido despacho de recebimento desse recurso pelo TCRS em 25.10.2021.
Foi precisamente a partir da notificação daquele despacho- despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima- que se iniciou o prazo de suspensão da prescrição do procedimento relativo às referidas contraordenações consagradas no CdVM, prevista no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO.
Nessa mesma data já se encontrava em vigor a nova redação do art. 418º do CdVM, introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30/05- que revê o regime sancionatório do direito dos valores mobiliários [transpõe a Diretiva 2014/57/UE, do Parlamento e do Conselho, de 16 de abril de 2014, a Diretiva de Execução (UE) 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, e parcialmente a Diretiva 2013/50/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, e adapta o direito português ao Regulamento (UE) n.º 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, procedendo à alteração ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, e ao Decreto-Lei n.º 357-C/2007, de 31 de outubro], a qual introduziu significativas alterações ao CdVM, nomeadamente no regime da prescrição, passando o art. 418º a ter o seguinte teor:
“1 - O procedimento contraordenacional prescreve:
a) No prazo de oito anos, nas contraordenações muito graves; e
b) No prazo de cinco anos, nas contraordenações graves e menos graves.
2 - Sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação.
3 - A suspensão prevista no número anterior cessa em relação às infrações imputadas em que seja proferida, em sede de recurso, uma decisão de absolvição.
4 - No caso das infrações sucessivas ou simultâneas referidas no artigo 402.º-A, o prazo de prescrição do procedimento por contraordenação conta-se a partir da data de execução do último ato praticado.
5 - O prazo de prescrição das sanções é de cinco anos a contar do dia em que se torna definitiva ou transita em julgado a decisão que determinou a sua aplicação.”
Os ilícitos contraordenacionais previstos no CdVM e, pelos quais o aqui Recorrente foi condenado, continuaram a ser punidos nos termos dessa legislação, apenas se impuseram algumas alterações em função da necessidade de transposição das mencionadas Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho.
Parte dos argumentos utilizados para a admissão da aplicação da nova causa de suspensão do prazo de prescrição introduzida pela Lei nº 1-A/2020, são transponíveis para a decisão de admissão desta nova causa de suspensão do prazo de prescrição estabelecida na nova redação do art. 418º nº 2 do CdVM com plena aplicabilidade aos procedimentos contraordenacionais em curso, apesar da prática dos factos ser anterior à entrada em vigor  daquela Lei nº28/2017, de 30/05
Como vimos, o art. 27º-A nº 1 do RGCO admite outras causas de suspensão do prazo de prescrição para além das hipóteses ali previstas (não contendo enunciado taxativo), nos casos especialmente previstos na lei, admitindo outras causas de suspensão que só sejam consagradas por lei posterior, como é o caso.
Na génese da Lei nº28/2017, de 30/05, está a Proposta de Lei nº 53/XIII de 12.1.2017, com vista à alteração do CdVM, em cuja Exposição de Motivos se pode ler que, “O Programa do XXI Governo Constitucional estabelece o objetivo de assegurar uma regulação eficaz, particularmente sobre o setor financeiro. Casos recentes ocorridos no sistema financeiro português, alguns relacionados com a prática de ilícitos, além de evidenciarem falhas na supervisão e regulação financeiras, provocaram sérios prejuízos diretos e indiretos para a economia nacional, para as finanças públicas e, sobretudo, para os portugueses. Na maioria daqueles casos, a ausência ou demora na obtenção de uma sanção efetiva dos responsáveis afetou a credibilidade e reputação das entidades encarregues da regulação e supervisão do setor financeiro, assim como a confiança no sistema judicial e na realização da justiça.
O reforço da eficácia dos poderes de supervisão, de fiscalização e de sanção de infrações, tendo em vista a proteção dos direitos e interesses dos consumidores de produtos e serviços financeiros, aconselha o estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão.
A adaptação do direito português ao Regulamento (UE) n.º 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativo ao abuso de mercado (regulamento abuso de mercado), e a transposição da Diretiva n.º 2014/57/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa às sanções penais aplicáveis ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado (abuso de mercado), e da Diretiva de Execução (UE) n.º 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, relativa à comunicação de infrações, constituem o momento oportuno para proceder a uma revisão do regime sancionatório dos valores mobiliários – que vigora há cerca de 25 anos, desde o Código dos Mercados de Valores Mobiliários de 1991 –, num esforço de melhoria de soluções processuais e substantivas já consagradas e na previsão de novos regimes.”
O alargamento dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional e a introdução da causa de suspensão mostra-se assim justificada:
(…) consagra-se uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação judicial, total ou parcial, da decisão administrativa, à semelhança do modelo já acolhido no Código Penal. O novo regime fundamenta-se no facto de, nestes casos, o prolongamento da tramitação processual não se dever a qualquer inércia do Estado no exercício do poder sancionatório. Também por isso, a suspensão cessa em função da prolação de uma decisão subsequente de absolvição.”
Foi propósito expresso do legislador consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação da condenação administrativa por tribunal de 1ª Instância, em moldes já previstos no CP, uma vez que, se terá considerado ser de dar prevalência aos poderes punitivos do Estado, na medida em que os direitos de defesa dos arguidos nessa fase estavam já adequadamente protegidos face à análise judicial efectuada em sede de impugnação judicial da decisão administrativa, justificando-se que, perante aquela confirmação por decisão judicial condenatória a prescrição em curso se suspendesse até que a decisão judicial transitasse, só voltando o prazo de prescrição a correr caso seja proferida sentença de absolvição no recurso da 2ª Instância( igual suspensão já vigorava no art. 120º nº 1 al. e) do CP).
“É preciso não esquecer que, em virtude da permanente alteração das dinâmicas sociais e económicas, quantas vezes de forma imprevisível, o legislador se vê frequentemente confrontado com a necessidade de interferir nos efeitos futuros de situações jurídicas constituídas no passado- o que faz, em nome da prossecução de interesses públicos de grande relevância e ao abrigo da normal revisibilidade das soluções legais e da liberdade de conformação que lhe cabe, enquanto poder democraticamente legitimado. Proibir em absoluto a modificação de efeitos vindouros de todas e quaisquer situações jurídicas já existentes no momento da emanação da lei (restritiva) nova constituiria uma solução demasiado rígida, susceptível de tolher a liberdade de movimentos de que o legislador precisa para adptar a ordem jurídica às constantes mutações da realidade.”( Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Vol. I, p. 285/286).
Ora, afigura-se-nos que, atentos os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM, de garantir a execução efetiva da política europeia destinada a assegurar a integridade dos mercados financeiros, (estabelecida no Regulamento (UE) nº 596/2014) e nomeadamente as finalidades que conduziram à nova redação do art. 418º do CdVM- estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão- impõe-se aplicar a suspensão do prazo de prescrição aí prevista aos processos contraordenacionais pendentes na autoridade administrativa e que deram entrada em tribunal após a sua publicação, como é o caso dos autos.
Ao período de suspensão da prescrição do procedimento por contraordenação previsto no art. 27º-A nº 2 al. c) do RGCO ex vi do art. 407º do CdVM, que se iniciou a partir da notificação do despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima até à decisão final do recurso- que no regime geral das contraordenações (RGCO) não podia ultrapassar seis meses- no caso das contraordenações previstas no CdVM (regime especial) acresce a suspensão do prazo de prescrição caso haja confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância da decisão administrativa de condenação.
Não estamos perante um caso de violação do princípio da retroactividade da lei mais desfavorável, como exaustivamente foi tratado nos mencionados Ac TC nº 500/2021, nº 660/2021 e nº 798/2021, mais não seja porque não se está a aplicar retroativamente a lei, mas a aplicar-se para futuro a processo contraordenacional ainda pendente, embora os factos tenham sido cometidos no passado.
Tal como entende Frederico de Lacerda da Costa Pinto, ( embora o faça no contexto da aplicação das Leis Covid, mas cujos argumentos são transversais) “o regime adoptado incide sobre a suspensão do prazo de prescrição em curso e a sua contagem futura, constitui um caso de retroconexão (criação de um regime para o presente e o futuro a partir de um facto pressuposto anterior) e não está abrangido pela proibição de retroatividade da lei penal nem pelo princípio da aplicação da lei penal mais favorável ao arguido em caso de sucessão de leis penais no tempo- regimes estes que se reportam ao facto, à sua imputação e à pena, mas não ao regime processual de suspensão da prescrição.”
Essa aplicação imediata aos processos pendentes não ofende de forma arbitrária, inesperada ou desproporcional expectativas do arguido- não violando os princípios da segurança, confiança e proporcionalidade- porquanto o legislador, em matéria contraordenacional tem mais amplos poderes de conformação da legislação em função de relevantes interesses de ordem pública que estão subjacentes à punição daquele tipo de ilícios contraordenacionais, como acima deixamos exarado, tendo sido o legislador a entender por bem consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de suspensão da prescrição na fase judicial do processo contraordenacional desse tipo de ilícitos, entendendo que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação, suspensão essa que acresce às demais previstas na lei, pois que se aplica sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição.
O princípio da confiança também não impõe, como exemplarmente se pode ler dos já mencionados Acórdãos do Tribunal Constitucional, a exacta cognoscibilidade de todas as causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional no momento em que o arguido comete o ilícito.
Cumpre também referir que “ a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal, que dá origem a um sistema punitivo próprio, com espécies de sanção, com procedimentos punitivos e agentes sancionadores distintos, obsta a que se proceda a uma transposição automática e imponderada para o direito de mera ordenação social dos princípios constitucionais que regem a legislação penal. Tais ilícitos não se distinguem apenas pelo diferente tipo de cominação- uma coima ou uma pena-mas sobretudo por um critério material que atende à diferença de bens jurídicos protegidos e à diferente ressonância ética dos ilícitos.
A submissão do direito das contraordenações às garantias essenciais do direito penal, isto é, as garantias relativas á segurança, certeza, confiança e previsibilidade dos cidadãos, não significa que as normas e princípios constitucionais em matéria penal tenham que ser aplicados ao domínio contraordenacional com a mesma intensidade e com as mesmas exigências.
(…) No domínio contraordenacional, cabe ainda na margem de conformação do legislador a configuração em concreto da dimensão processual do instituto da prescrição do procedimento e, deste modo, a determinação do tempo necessário para o adequado desenvolvimento do mesmo procedimento com vista à prossecução das referidas finalidades.”( Ac TC nº 297/2016).
Neste conspecto, tem sido entendimento sufragado, de forma reiterada e consistente, pelo Tribunal Constitucional, designadamente nos referidos Acórdãos, que a nova lei que consagre uma nova causa de suspensão da prescrição (como acontece, como vimos, quanto à aplicação da nova causa de suspensão do prazo da prescrição promovida pela lei nº 1-A/2020) é imediatamente aplicável aos processos de contraordenação pendentes, ainda que a data da prática do facto ilícito seja anterior, a isso não obstando os princípios constitucionais cuja violação foi apontada pelos recorrentes.
Senão vejamos.
No Acórdão do TC nº 500/2021( já atrás citado) ficou decidido, “não julgar inconstitucional o artigo 7º nº 3 e 4 da lei nº 1-A/2020 de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência.
Dele se extraem, com especial relevo para o caso em apreço, os seguintes enxertos:
“Em suma: para além de absolutamente congruente com o mais amplo critério seguido na jurisprudência do TEDH e do TJUE, a norma extraída dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, interpretados no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência, não se encontra abrangida, nem pela letra, nem pela ratio da proibição da retroatividade in pejus a que a Constituição, no seu artigo 29.º, n.ºs 1, 3 e 4, sujeita a aplicação das leis que definem as ações e omissões puníveis e fixam as penas correspondentes. 
(…)A circunstância de a interpretação sindicada se cingir aos procedimentos contraordenacionais pendentes por factos anteriores ao início da vigência da Lei n.º 1-A/2020 apenas serve para tornar mais evidente a conclusão que acima se alcançou. Com efeito, apesar de o direito das contraordenações, enquanto direito sancionatório público, ser influenciado ou “matizado” pelos princípios constitucionais do direito penal, a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal obsta a que tais princípios possam ser transpostos deste para aquele de forma automática ou imponderada ou que possam aí valer com a mesma exata extensão ou com o mesmo grau de intensidade (cf. Acórdão n.º 76/2016; no mesmo sentido, a propósito da liberdade de conformação do legislador na modelação do instituto da prescrição, v.Acórdão n.º 297/2016). No que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto.
Resta concluir, assim, que, ao proibir que qualquer cidadão seja «sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão» ou sofra pena que não esteja expressamente cominada «em lei anterior» ou mais grave do que a prevista «no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos», o artigo 29.º da Constituição, respetivamente nos seus n.ºs 1, 3 e 4, não se opõe à aplicação de uma causa de suspensão da prescrição com a função e o recorte daquela que foi prevista no artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2000, a procedimentos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes do início da respetiva vigência.”
Também no Acórdão do TC nº 660/2021 (atrás citado) com relevo para o caso concreto, dele pode ler-se o seguinte:
“ (…)é reconhecido na jurisprudência constitucional que inexiste suporte explícito na Lei Fundamental que consagre a regra da imprescritibilidade do procedimento criminal e que são valores como a certeza e a paz jurídica, ínsitos ao princípio do Estado de direito democrático, que reclamam que o instituto da prescrição, em sede criminal, seja ponderado e perspetivado como valor constitucional (cfr. Acórdãos 483/2002 e 629/2005).
Igualmente nesta senda, tem sido afirmado que o princípio da proibição da imprescritibilidade das penas ou das sanções equiparáveis não ancora um direito subjetivo do arguido à prescrição (cfr. Acórdãos n.º 483/2002 e 366/2018), sendo lícito ao legislador estabelecer causas de suspensão e de interrupção da prescrição, ou prever limites máximos temporais a causas de suspensão, desde que isso não implique, em concreto, a ineficácia do instituto de que o arguido possa vir a beneficiar.
Como tem sido evidenciado pela jurisprudência constitucional acima elencada, para além de não existir um direito subjetivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela Assembleia da República, o que se verifica neste caso (cfr. Acórdão n.º 449/2002).
Assim, consideramos que a aplicação imediata desta causa de suspensão a processos em curso não colide com as garantias asseguradas pelo princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, quando, como é o caso, no momento da sua entrada em vigor, o prazo de prescrição já se tinha iniciado e, apesar de se encontrar em curso, não se havia ainda extinto – aliás, encontra-se fora do respetivo âmbito de proteção (v., de novo, o Acórdão n.º 500/2021).
Quer isto dizer que, na linha de pensamento de GIAN LUIGI GATTA, quando o prazo de prescrição não tenha ainda atingido o seu fim, ao determinar o prolongamento – como no caso da suspensão motivada pela pandemia –, a lei superveniente não torna punível um facto não punível: ela limita-se a conceder ao Estado, por qualquer motivo, neste caso por força de uma emergência sanitária, mais tempo para apurar os factos e a responsabilidade criminal. O direito de defesa não resulta, de modo algum, comprometido e o Estado não abusa do poder punitivo, nem frustra aquela exigência de previsibilidade das consequências da violação da norma penal: como mostra a própria disciplina da prescrição do crime (…) o momento em que se cumpre a prescrição é, na verdade, variável e em boa medida imprevisível antes da prática do facto, quando o agente nem sequer sabe se alguma vez será alvo de um procedimento criminal (cfr. “Lockdown da justiça penal, suspensão da prescrição do crime e princípio da irretroatividade: um curto-circuito”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Separata, Ano 30, n.º 20, maio-agosto 2020, Gestlegal, pág. 312 e 313).
(…) A construção perfilhada pelo TJUE, nos dois arestos da Saga Taricco, posiciona-se na mesma linha jurisprudencial do TEDH, no sentido de a proibição da retroatividade em matéria de prescrição poder ter por referência o terminus do prazo de prescrição, previsto na lei em vigor à data da prática dos factos, uma vez que o artigo 7.º da CEDH não impede a aplicação imediata aos procedimentos em curso das leis que estendem prazos de prescrição, quando os factos imputados ainda não tenham prescrito e quando essa extensão não seja arbitrária (cfr. Acórdão de 22 de junho de 2000, proferido no Caso Coëme and Others v. Belgium; Acórdão de 8 de dezembro de 2009, proferido no Caso Cesare Preveti v. l’Italie; ponto 22 do Acórdão n.º 500/2021; e Gatta, Gian Luigi, Ob. Cit. pág. 316).
Muito embora a apreciação da conformidade constitucional da aplicação da causa de suspensão da prescrição prevista nos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 aos procedimentos em curso se tenha feito por referência à sua natureza criminal, os argumentos que sustentam o presente juízo de não inconstitucionalidade são replicáveis para os procedimentos de natureza contraordenacional. Com efeito, e não obstante a jurisprudência do Tribunal se encontrar estabilizada no sentido de os princípios constitucionais com relevo em matéria penal não serem transponíveis, com a mesma extensão e intensidade, para o domínio contraordenacional (cfr. entre outros Acórdãos n.ºs 344/93, 278/99, 160/04, 537/2011, 85/2012, 76/2016, 297/2016 e 175/2021), é para nós claro, na senda do decidido no Acórdão n.º 500/2021, que, “no que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio da legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto”.
Assim, pelos fundamentos e considerações jurídicas acima expendidas, concluímos que a interpretação extraída do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido de ser aplicável a causa de suspensão da prescrição do procedimento aí prevista aos procedimentos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquele diploma, não viola o princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal in malam partem, consagrado no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP.”
Já mesmo anteriormente, no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 449/2002, havia ficado decidido que, para além de não existir um direito subjectivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela AR.
Deste modo, considerando o Tribunal Constitucional conforme à Constituição da República Portuguesa a aplicação da lei nova, que cria uma nova causa de suspensão da prescrição, aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência, aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontravam já em curso, não vemos qualquer obstáculo à aplicação da actual redação do art. 418º nº 2 do CdVM aos presentes autos.
Estar-se-á a aplicar aos processos pendentes de natureza contraordenacional outra causa de suspensão do prazo da prescrição, a um prazo que ainda está a decorrer, que não se havia esgotado à luz da lei anterior, não se tratando de uma causa de interrupção, pois que não se inutiliza o tempo decorrido até à sua entrada em vigor.
Assim sendo, na senda do que tem vindo a ser doutamente decidido pelo Tribunal Constitucional, não se vislumbram obstáculos constitucionais à aplicação imediata da causa de suspensão do prazo de prescrição  prevista no nº 2 do art. 418º do CdVM ao procedimento contraordenacional em curso relativamente às contraordenações pelas quais foram condenados os aqui recorrentes e que são objecto destes autos.
Salienta-se que argumentos semelhantes, especificamente no que se refere à aplicação de lei nova aos processos pendentes, quanto ao alargamento ou introdução de novas causas de suspensão da prescrição, foram já sustentados por este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, designadamente no Acórdão proferido no Proc. Nº249/17.7YUSTR.L3 e 127/19.5YUSTR.L1, embora a propósito de ilícitos contraordenacionais de natureza distinta e sujeitos a regimes também eles distintos, mas cuja razão de ser tem aqui plena similitude.
Deve, pois, considerar-se adequada e conforme aos princípios constitucionais a aplicação, ao caso sub judice, do prazo de suspensão da prescrição estabelecido no actual art. 418º nº 2 do CdVM, e consequentemente declarar-se não se verificar a prescrição, uma vez que quando a sentença recorrida foi proferida pelo tribunal de 1ª Instância em 15/2/2022 ainda não se havia esgotado o prazo de prescrição, tendo o tribunal a quo confirmado a decisão administrativa de condenação quanto aos aqui recorrentes.
Assim decidindo, conclui-se que o prazo de prescrição do presente procedimento contraordenacional está suspenso desde 15/2/2022 e só se retomará se vier a ser proferida decisão de absolvição em sede do presente recurso (art. 418º nº 3 do CdVM).
Improcede, pois, este segmento recursivo.
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5ª - Da exclusão da responsabilidade do Recorrente por força da Medida de Resolução de 3 de Agosto de 2014 do Banco de Portugal.

Sob as Conclusões MMMMM a VVVVVV o Recorrente sustenta que da Deliberação de 3 de Agosto de 2014 do Banco de Portugal resulta a sua exclusão de quaisquer responsabilidades decorrentes da violação de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais, o que impede a sua condenação pela prática das infrações que lhe foram imputadas nos autos.
Para tanto e, em síntese, invocou como argumentos desta posição que, “é absolutamente pacífico que as operações de reorganização societária, como as fusões, as cisões e as medidas de resolução bancária, podem ter, e têm, repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional.
Nesse sentido aponta, inequivocamente, no que diz respeito às fusões, o exposto nos artigos 112.º, alínea a), do CSC (norma legal injuntiva) e 105.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132, donde resulta claramente que a fusão determina a transmissão de todos os direitos e responsabilidades para a sociedade incorporante, sem que tal esteja impedido por qualquer princípio de intransmissibilidade da responsabilidade contraordenacional ― o qual está pensado para as pessoas físicas e não para as sociedades comerciais.
É precisamente o que também resulta do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 5/2004, de 2 de junho de 2004, no qual se fixou a seguinte jurisprudência: “[a] extinção, por fusão, de uma sociedade comercial, com os efeitos do artigo 112.º, alíneas a) e b), do Código das Sociedades Comerciais, não extingue o procedimento por contra-ordenação praticada anteriormente à fusão, nem a coima que lhe tenha sido aplicada”.
O mesmo se diga em relação às operações de cisão, que também importam a transmissão de responsabilidades, incluindo as contraordenacionais, à sociedade incorporante ou à nova sociedade, sem prejuízo de se estabelecer uma responsabilidade solidária da sociedade cindida, nos termos do exposto nos artigos 122.º, n.º 1, do CSC (norma legal injuntiva). E 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132.
Como é também indiscutível, uma medida de resolução bancária, na modalidade de banco de transição, consiste precisamente numa cisão sujeita a um regime especial injuntivo, que segrega totalmente os direitos e responsabilidades não tóxicos, que são transmitidos para o banco de transição (nova sociedade), dos direitos e responsabilidades tóxicos que permanecem no banco resolvido (sociedade cindida) conforme resulta inequívoco do artigo 145.º-G do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução, resultante do Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto (artigo 145.º-O, na versão atual) ― inexistindo, por isso, qualquer razão ou fundamento legal para negarmos no presente caso a transmissibilidade da responsabilidade contraordenacional que resulta da própria natureza e regime da cisão.
Não tem qualquer cabimento a afirmação do Tribunal a quo segundo a qual “o Banco de Portugal não tem o condão de, por mero acto administrativo, operar à extinção da responsabilidade contra-ordenacional de pessoas físicas ou jurídicas”, porquanto tais poderes resultam expressamente da lei, nomeadamente do artigos 145.º-G do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução (atual artigo 145.º-O), que proceda à transposição dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU.
Esta modalidade de resolução bancária (banco de transição) tem necessariamente repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional, que, enquanto responsabilidade tóxica, permanece no banco resolvido (sociedade cindida), não sendo transmitida para o banco de transição (nova sociedade) ― tudo ao abrigo, reitere-se, de normas legais injuntivas, que visam proteger a estabilidade do sistema financeiro (conforme artigo 145.º-A do RGICSF na versão em vigor à data e artigo 145.º-C na versão atual).
No caso da Medida de Resolução do B..., o Banco de Portugal cindiu o estabelecimento comercial consolidado do B..., segregando os ativos e passivos tóxicos dos ativos e passivos não tóxicos. De tal modo que os ativos e passivos não tóxicos ficaram colocados no perímetro consolidado de um banco de transição – o Nv.... Ao passo que os ativos e passivos tóxicos, onde se incluem expressamente as responsabilidades no domínio contraordenacional, permaneceram no perímetro consolidado do B....
Daqui se retira que a responsabilidade contraordenacional imputada ao HAITONG BANK nos presentes autos integra forçosamente o conjunto de responsabilidades expressamente excluídas da transmissão para o perímetro consolidado do banco de transição (Nv...). Pelo que o então BEl... (atualmente, HAITONG BANK), enquanto ativo não tóxico transmitido para o Nv..., foi transmitido livre das responsabilidades contraordenacionais.
Assim, contrariamente ao que o Tribunal recorrido entendeu, a Medida de Resolução teve, efetivamente, repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional do HAITONG BANK, porquanto determinou a exclusão da mesma do conjunto de ativos e passivos que transitaram para o perímetro consolidado do Nv... ― devendo o HAITONG BANK, por conseguinte, ser absolvido da contraordenação que lhe é imputada nos autos, por força da exclusão de responsabilidades constante da Medida de Resolução de 3 de agosto de 2014 do Banco de Portugal, mal tendo andado o Tribunal recorrido em decidir em sentido contrário.”
Concluiu que, “ a interpretação que o Tribunal a quo faz dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal, ex vi artigo 32.º do RGCO, no sentido de a responsabilidade contraordenacional não poder ser transmitida, é ilegal porque violadora dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1 alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 e dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU e, consequentemente, violadora do primado do Direito Europeu, devendo o Tribunal desaplicar a norma que se extrai da interpretação dos artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), no sentido de impossibilitar a transmissão de responsabilidades contraordenacionais no âmbito de uma fusão, cisão ou medida de resolução.”
Ainda a esse propósito, tece argumentos interpretativos da Medida de Resolução que conduzem, em seu entender, a essa mesma conclusão, assim sintetizados:
“A Sentença recorrida viola, ainda, o regime da própria Medida de Resolução, nos termos da qual o Banco de Portugal determinou transmissão parcial dos ativos e passivos do B... para um banco de transição constituído para o efeito, o Nv..., ao abrigo do artigo 145.º-G, n.º 5 do RGICSF, na sua versão em vigor à data da Medida de Resolução, resultante do Decreto-Lei n.º 114-A/2014, de 1 de agosto.
Ainda nos termos da Medida de Resolução, todos os ativos e passivos não expressamente listados seriam transferidos do B... para o Nv..., sendo excluídos dessa transmissão os ativos e passivos com as características expressamente previstas na lista constante do Anexo 2 da Medida de Resolução, sendo que, ao abrigo do disposto na citada alínea (a) desse anexo, o BEl... (atualmente HAITONG BANK) foi transferido para o banco de transição, integrando o conjunto de ativos e passivos não tóxicos (cfr. Anexo 2, alínea (a) e alínea (b), subalíneas (v) e (vii) da Medida de Resolução).
Tendo as responsabilidades ora imputadas ao HAITONG BANK natureza contraordenacional, têm as mesmas cabimento no elenco de passivos excecionados da transmissão para o perímetro consolidado do banco de transição (cfr. Anexo 2, alínea (b), subalíneas (v) e (vii) da Medida de Resolução).
Uma interpretação da Medida de Resolução segundo a qual a transmissão do atual HAITONG BANK para o Nv... incluísse as respetivas responsabilidades contraordenacionais seria contrária à letra e à teleologia da Medida de Resolução, na medida em que o objetivo da transmissão foi precisamente o de criar um banco novo, que passaria a deter os ativos e passivos não tóxicos que anteriormente eram detidos pelo B..., deixando no B... os ativos e passivos tóxicos, de modo a assegurar a continuidade deste banco de transição e a proteger o sistema bancário português de risco sistémico.
 Concluiu que, “a interpretação que aqui se faz da Medida de Resolução é a única interpretação possível à luz das regras de interpretação contidas no artigo 9.º do Código Civil ― nomeadamente, dos elementos literal, histórico, sistemático e teleológico ― que, apesar de direcionadas para a interpretação da lei, assumem também relevância nesta sede”.
A propósito desta questão, na sentença recorrida foi perfilhado o seguinte entendimento:
“Em 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal deliberou a aplicação ao B... de uma medida de resolução, posteriormente clarificada e ajustada através de nova deliberação de 11 de Agosto de 2014 (a mencionada “Medida de Resolução”), nos termos e com o conteúdo constante do documento n.º 1 junto com a impugnação judicial do Recorrente Haitong, de fls. 23495 e ss. (vol. 54.º), que aqui se considera integralmente reproduzida.
Em 7 de Setembro de 2015, o Nv..., mediante instruções do Fundo de Resolução, alienou a totalidade do capital social do BEl... à Haitong International Holdings Limited, tendo, nessa sequência, sido alterada a sua firma para HAITONG BANK, S.A., conforme o teor do documento n.º 2 que foi junto com a impugnação judicial da Recorrente Haitong, de fls. 23516 (vol. 54.º), que aqui se considera integralmente reproduzido.
Em 31 de Março de 2017, 75% do capital social do Nv... foi alienado ao grupo norte-americano L..., através da sua subsidiária N..., SGPS, S.A., nos termos do documento n.º 3 junto com a impugnação judicial do Recorrente Haitong, de fls. 23518 (vol. 54.º) que aqui se considera integralmente reproduzido.
Vejamos.
Decorre do exposto que, em 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal deliberou a aplicação ao B... de uma medida de resolução. Nessa sede, o mesmo Banco de Portugal procedeu à transmissão parcial dos activos e passivos do B... para um banco de transição constituído para o efeito e denominado por “Nv...”, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 145.º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF).
Para além disso, aquando da aplicação da Medida de Resolução em causa, a totalidade do capital social do Recorrente Haitong (antes, BEl...) era detido pelo B..., constituindo, assim, um activo desse B....
Por via dessa situação, o Recorrente Haitong (antes BEl...) passou a ser detido, na integralidade do seu capital social, pelo Nv....
Contudo, estão em causa pessoas jurídicas completamente distintas. O facto do Nv... ter passado a deter o capital social integral da BEl... (agora Haitong) não significa que tenha existido qualquer tipo de medida que tivesse visado, por inerência, a pessoa colectiva BEl... (Haitong) que, após a Medida de Resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao B..., continuou a ter os mesmos direitos e deveres jurídicos que lhe estavam anteriormente encabeçados, apenas tendo alterado a sua estrutura accionista, deixando se ser composta pelo B... e passando a ser composta pelo Nv....
Contudo, entre a estrutura accionista do Recorrente e a própria Recorrente apenas existe uma relação de organicidade que é pressuposta pela própria natureza das pessoas colectivas, na medida em que estas terão de agir sempre por intermédio de "órgãos". Independentemente de alterações que possam ser operadas na primeira (na estrutura accionista), enquanto um centro institucionalizado de poderes funcionais, o segundo (o Recorrente enquanto pessoa colectiva) continua a ser um centro de imputação de direitos e obrigações, os quais não se alteram em função das modificações operadas no seio da primeira.
Porque assim é, quando foi operada a Medida de Resolução do B..., em 03.08.2014, pelo Banco de Portugal, o que se verificou foi que o Nv... passou a ser o accionista único do Haitong (então BEl...), mas nenhum outro fenómeno ocorreu na esfera jurídica deste, que continuou a ser titular dos mesmos direitos e dos mesmos deveres que já tinha antes da Medida em causa.
Com efeito, em primeiro lugar, não podemos olvidar que a Medida de Resolução do B... operou precisamente em relação a esta instituição bancária e não em relação a qualquer outra pessoa colectiva.
Em segundo lugar, não é pelo facto do Banco de Portugal ter qualificado os direitos que o B... tinha sobre o BEl... (Haitong) como um activo não tóxico, que tal pode pura e simplesmente determinar a extinção da responsabilidade contra-ordenacional desse sujeito autónomo.
Com efeito, o Banco de Portugal não tem o condão de, por mero acto administrativo, operar à extinção da responsabilidade contra-ordenacional de pessoas físicas ou jurídicas. A extinção da responsabilidade contra-ordenacional apenas ocorre nos casos a que alude o artigo 127.º do Código Penal (ex vi do artigo 32.º do RGCO).
Quando o Banco de Portugal segregou as responsabilidades tóxicas e não tóxicas do B..., incluindo nas não tóxicas os direitos do B... sobre o BEl... (Haitong), a medida que aplicou foi ao B... e não a qualquer outra entidade terceira. Logo, ao incluir o BEl... nas responsabilidades não tóxicas, tal não poderia implicar que, no seio do próprio BEl... também o Banco de Portugal pudesse realizar uma semelhante segregação, já que, reforçamos, estão em causa distintas sociedades, com personalidades jurídicas igualmente distintas.
Como entidade jurídica própria, distinta do sócio Nv... (banco de transição), o BEl... é em si mesmo um sujeito de direito, face àquele. Daí que a inclusão de direitos e deveres no acervo patrimonial do BEl... não os tornam qua tale direitos e deveres do sócio Nv.... Nesta conformidade, quando o BEl... foi incluído nos activos não tóxicos do banco de transição foram os direitos do B... sobre o BEl..., enquanto seu sócio, que se transferiram para o Nv..., permanecendo imaculado o acervo patrimonial da pessoa colectiva autónoma BEl..., em termos de direitos, mas também de deveres.
Em terceiro lugar, o Banco de Portugal também não tem o condão de, por mero acto administrativo (que nem sequer se dirigia ao Recorrente Haitong – antes BEl... – mas apenas ao B...), proceder à transferência de responsabilidade contra-ordenacional.
Na verdade, e como refere a CMVM em alegações escritas, por um lado, tal consta precisamente do Ponto Dois da Medida de Resolução, conjugado com o seu Anexo n.º 2, em que se refere que as “responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contra-ordenacionais” do próprio sujeito da medida, ou seja, o B..., não foram transmitidas para o Nv....
Por outro lado, e fundamentalmente, a responsabilidade contra-ordenacional não é sequer passível de ser transmitida.
Com efeito, o princípio da não transmissibilidade da responsabilidade criminal consagrado nos artigos 127.º e 128.º do Código Penal, aplica-se também no âmbito do direito contra-ordenacional por força do disposto no artigo 32.º do RGCO, ainda que de forma mais ténue por contraposição ao que sucede no âmbito do direito penal.
Salvo melhor e mais aturada opinião, tal não é vedado pelo douto acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 5/2004, de 02/06/2004, publicado no Diário da República n.º 144, Série I-A, de 21/06/2004, onde se decidiu o seguinte: “A extinção, por fusão, de uma sociedade comercial, com os efeitos do artigo 112.º, alíneas a) e b) do Código das Sociedades Comerciais, não extingue o procedimento por contra-ordenação praticada anteriormente à fusão, nem a coima que lhe tenha sido aplicada”.
Primeiramente, importa referir que este acórdão foi proferido antes das alterações introduzidas no Código Penal, por via da Lei n.º 59/2007, de 04/09 e que introduziram o n.º 8 do artigo 11.º, que passou a reflectir legalmente o entendimento vertido naquele aresto.
Em segundo lugar, apesar de, na fusão ou cisão de entes colectivos, se manterem os substratos pessoais e materiais, para além de tais actos, ainda que diversos dos anteriormente existentes, o certo é que, tanto na fusão como na cisão existe a extinção da sociedade incorporada ou da sociedade cindida (se for um caso de cisão nos termos das al. b) e c) do artigo 118.º do CSC).
Como nos parece evidente, com o devido respeito por melhor entendimento, a situação no vertente caso é totalmente distinta, na medida em não é por o BEl... alterar a sua estrutura accionista que passa a ser uma pessoa jurídica distinta do que era anteriormente (não tendo sido, obviamente, extinto). Logo, não faz sentido apelar a uma transferência de responsabilidade contra-ordenacional do BEl... para o B..., quando não há qualquer fundamento legal para o efeito.
Se a participação do B... no BEl... foi considerada um activo não tóxico, tal não implica, não pode implicar, que tudo o que seja passivo / dívidas / obrigações / responsabilidades desta entidade não intervencionada se extinga automaticamente pela Medida de Resolução do B.... Apenas significa que, na ponderação que foi feita, as acções que o B... detinha sobre o BEl... eram consideradas um activo não tóxico porque, apesar do passivo / dívidas / obrigações / responsabilidades do BEl..., englobado em todo um património autónomo, tratava-se de um activo para o qual existiam compradores e, como resultado, apresentava ainda um valor claro.
Assim, com todo o respeito, em face do que fica exposto, mostra-se totalmente despiciendo analisar os argumentos da Recorrente quando invoca questões relacionadas com a interpretação da medida de resolução, da consideração da natureza e da ratio dessa medida de resolução, porque a mesma não teve como sujeito o Recorrente, não afectando a responsabilidade contra-ordenacional que ao mesmo pode ser imputada, enquanto centro autónomo de imputação de direitos e obrigações.”
Afigura-se-nos que o tribunal a quo tem razão quanto ao cerne da questão, ao ter entendido que não decorre da Medida de Resolução aplicada pelo BP ao B... a exclusão da responsabilidade contraordenacional do Haitong (então BEl...).
Senão vejamos.
Nos termos do art. 139º do RGICSF, o Banco de Portugal pode, tendo em vista a salvaguarda da solidez financeira de uma instituição de crédito, os interesses dos depositantes e a estabilidade do sistema financeiro, adotar uma de três medidas: a intervenção corretiva, a administração provisória ou uma medida de resolução.
Não existe apenas uma medida de resolução, oferecendo o art. 145º-C do RGICSF um elenco de quatro possíveis medidas: a) a alienação parcial ou total da actividade; b) a transferência parcial ou total da actividade para instituições de transição; c) segregação e transferência parcial ou total da actividade para veículos de gestão de activos; d) recapitalização interna.
“Nos termos do artigo 145º-H do RGICSF, antes da aplicação de uma medida de resolução ou do exercício dos poderes previstos no artigo 145º-I, o Banco de Portugal designa uma entidade independente, a expensas da instituição de crédito objecto de resolução, para, em prazo a fixar por aquele, avaliar de forma justa, prudente e realista os ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais da instituição em causa. Tal avaliação visa assegurar que todos os prejuízos da instituição em causa sejam conhecidos quando sejam aplicadas medidas de resolução e, deste modo, fundamentar a decisão do banco de Portugal quanto à verificação das condições de aplicação das medidas de resolução. Ao mesmo tempo ela é fundamental para qual das medidas de resolução é adequada à concreta instituição de crédito e à situação por ela vivenciada, bem como para determinar os direitos e obrigações, que constituam ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, a transferir no âmbito da aplicação de medidas de resolução e o valor da eventual contrapartida a pagar à instituição de crédito objecto de resolução ou aos acionistas e titulares de outros títulos representativos do capital social, nos termos do nº 2 do artigo 145º-H RGICSF.
(…) o Banco de Portugal pode determinar a transferência parcial ou total de direitos e obrigações de uma instituição de crédito que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão, e a transferência da titularidade das acções ou de outros títulos representativos do seu capital social para instituições de transição para o efeito constituídas, com o objectivo de permitir a sua posterior alienação. Trata-se agora de outra medida, prevista no art. 145º-O RGICSF, a exigir a constituição de um banco de transição, uma pessoa colectiva autorizada a exercer as actividades relacionadas com os direitos e obrigações transferidos, cujo capital é detido pelo Fundo de Resolução.
A decisão do BP de transferir total ou parcialmente os direitos e obrigações de uma instituição financeira para outra constituída para o efeito ( instituição de transição) produz o efeito, ex lege, de transmissão da titularidade dos direitos e obrigações da primeira para a segunda e, (…) a decisão produzirá efeitos independentemente de qualquer disposição legal ou contratual em contrário.
O critério de seleção dos ativos e passivos objecto de transmissão deve obedecer a três vectores essenciais. Em primeiro lugar, deve garantir a reposição da estabilidade sem a qual o sistema financeiro deixa de ter condições para atuar; em segundo lugar, deve salvaguardar os diversos envolvidos e o erário público; em terceiro lugar, deve procurar responsabilizar aqueles (se os houver) que estiveram na base da situação de impossibilidade para cumprir os requisitos de manutenção da autorização de exercício da actividade financeira.
(…) se o Banco de Portugal não pudesse atuar discricionariamente para, em função das circunstâncias específicas do caso concreto, decidir que ativos e passivos devem ser transferidos, de nada valeria a medida resolutiva em específico, porque ele ficaria impossibilitado de isolar os instrumentos financeiros que provocassem a exposição acima do risco normal ao mercado de capitais.” 
Este constitui o contexto normativo no âmbito do qual foi aplicada uma Medida de Resolução pelo Banco de Portugal ao B..., uma das principais instituições de crédito do sistema bancário português, devido à situação financeira e ao risco sério e grave de aquele não cumprir as suas obrigações.
Aquela medida foi adoptada ao abrigo da legislação nacional em matéria de resolução de instituições de crédito (RGICSF), conforme resulta do DL nº 31-A/2012 de 10/2, por reunião extraordinária de 3 de Agosto de 2014 do Conselho de Administração do Banco de Portugal, que deliberou proceder à constituição de um banco de transição-o Nv...- ao abrigo do nº 5 do art. 145º-G do RGICSF, tendo determinado no Ponto Dois que seriam transferidos para o Nv... nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do art. 145º-H do RGICSF, conjugado com o art. 17º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os ativos, passivos, elementos patrimoniais e ativos sob gestão do B... que constam dos Anexos 2 e 2A à deliberação.
Constam do Anexo 1 os Estatutos do Nv..., de acordo com os quais trata-se de um banco constituído nos termos do nº 3 do art. 145º-G do RGICSF, que tem por objecto a administração dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos do B... para o Nv... e o desenvolvimento das actividades transferidas, tendo em vista as finalidades enunciadas no art. 145º-A do RGICSF e com o objectivo de permitir uma posterior alienação dos referidos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão para outra ou outras instituições de crédito.
Já nos Considerandos dessa deliberação do BP, sob o ponto 16 havia ficado consignado que, “com esta deliberação de manifesto e urgente interesse público, procura afastar-se os riscos para a estabilidade financeira, liberta-se o Nv... dos ativos de má qualidade que levaram à actual situação, expurgando-se incertezas sobre a composição do respectivo balanço e, abre-se assim o caminho para a venda da instituição a investidores privados”.
Daqui decorre, com relativa clareza, que um dos propósitos da constituição do Nv... foi efectuar uma separação entre os ativos de boa qualidade, dos activos de má qualidade pertencentes ao B...,SA, transferindo os primeiros para um banco de transição que os gerisse com o objectivo de os vender a investidores privados, assim colmatando o passivo e eventualmente devolvendo ao B... o remanescente do produto da alienação, prosseguindo com as actividades transferidas, evitando no entretanto riscos sistémicos no sistema financeiro.
Acontece que, apesar do Anexo 2 ter servido o propósito de descrever os ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do B... objecto de transferência para o Nv..., não o foi de molde a evitar dúvidas e equívocos, essencialmente quanto ao perímetro do passivo e responsabilidades transferidas, o que conduziu a que o Banco de Portugal tenha vindo com duas novas deliberações, uma destinada a clarificar e ajustar determinados aspectos do âmbito daquela transferência (reunião extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014) e outra relativa a “transferências, retransmissões e alterações e clarificações ao Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto de 2014” (reunião extraordinária do Conselho de Administração do banco de Portugal de 29 de Dezembro de 2015).
Quanto aos ativos do B... transferidos, a transferência abrangeu todos os ativos com exceção dos ativos enumerados na alínea (a) do Anexo 2 à deliberação de 3 de Agosto, tendo posteriormente o BP ampliado os ativos transferidos para o Nv... por deliberação de 11/8/2014, incluindo neles os direitos de crédito do B... sobre as entidades referidas nas subalíneas (ii) e (iii)- B... Limited ( ...) e Amb...).
Daqui podemos extrapolar que, as acções representativas do capital social das sociedades detidas pelo B... que não foram expressamente excluídas no Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto de 2014 (com as modificações introduzidas pelas deliberações de 11/8/2014 e 29/12/2015) foram transferidas para o Nv..., incluindo-se nessa transferência as acções representativas da totalidade do capital social do BEl... (BEl...) que até então era detido a 100% pelo B... e que integrava o G....
Com essa transição para o Nv..., o B... deixou de ser acionista do BEl..., tendo posteriormente o banco de transição alienado as acções que o B... nele detinha para uma outra sociedade (Haitong International Holdings Limited) que, em assembleia geral realizada a 7/9/2015 alterou a denominação social do BEl... para Haitong Bank, SA, sem que tenha existido qualquer outra alteração societária, designadamente por fusão, cisão, dissolução ou liquidação, mantendo-se a mesma pessoa colectiva com o NIP ...32.
Com a Medida de Resolução e constituição do banco de transição, a totalidade do capital social do BEl... transferiu-se para o Nv... enquanto ativo do B..., tal qual existia, mantendo-se incólume o Eai..., S.A. (não tendo sido extinto, ou objecto de qualquer transformação societária), tendo as acções daquela instituição financeira ( que outrora era detida a 100% pelo B...) sido transferidas com o activo e passivo que aquela sociedade detinha à data e, consequentemente com todos os direitos e todas as responsabilidades resultantes da sua actividade, designadamente enquanto intermediário financeiro registado na CMVM para o exercício das actividades de intermediação financeira elencadas no ponto 60 dos factos provados, uma vez que os poderes de resolução do BP só visavam o B....
 Seguidamente o Nv...  recebeu aquelas acções que constituíam o capital social do BEl... e, cumprindo a sua função de banco de transição, alienou-as a outra instituição financeira que se dispôs a comprá-las e, que acto contínuo, procedeu à sua redenominação social- alteração do nome comercial.
Se essa redenominação social não tivesse existido, apesar da mudança de acionista, estaríamos ainda a falar do BEl... e não do Haitong, Bank, SA, sendo certo como é, que a pessoa colectiva era e sempre foi a mesma.
Ora, o Banco de Portugal, no âmbito da Medida de Resolução imposta ao B..., acto permitido pelo art. 145º-G do RGICSF, e regido pelas disposições subsequentes desse diploma legal, transferiu para o Nv... ( banco de transição) todas as responsabilidades do B... perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste, com algumas exceções, entre as quais (Passivos Excluídos) as responsabilidades ou contingências nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais daquele.
Resulta claro que, através da Medida de Resolução imposta ao B..., o BP operou a transferência de alguns activos e de algumas responsabilidades próprias do B..., SA para um banco de transição- o Nv..., estando contabilizado como um desses activos as acções que constituíam o capital social do BEl....
Na medida de resolução, cabe ao BP, com grande amplitude, a seleção dos ativos, passivos e responsabilidades (direitos e obrigações) da instituição objecto de resolução, a transferir para o banco de transição, contudo essa atribuição tem necessariamente limites, desde logo porque os poderes de intervenção estão limitados à esfera do banco objecto da resolução , não podendo interferir ou introduzir qualquer modificação nos ativos a transferir, designadamente operando qualquer modificação/eliminação do passivo e responsabilidades inerentes às sociedades que constituem alguns desses ativos, apenas podendo selecionar qual é o passivo ou responsabilidade da instituição objecto de resolução que vai transitar para o banco de transição.
É certo que, entretanto, o art. 145º- AB do RGICSF (aditado pela Lei nº 23-A/2015 de 26/3) passou a especificar com maior amplitude uma série de poderes de resolução conferidos ao BP, tendo em vista tornar mais eficaz essa medida tendo por fim último a salvaguarda da estabilidade do sistema financeiro.
De entre esses poderes de resolução, passou a fazer-se menção à possibilidade de poder garantir, sem prejuízo do disposto no art. 145º-AD e dos direitos de indemnização, que uma transferência de direitos e obrigações, que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão e da titularidade de acções ou de outros títulos representativos do capital social produza efeitos sem qualquer responsabilidade ou ónus sobre os mesmos, no entanto essa garantia terá de ser prestada de forma expressa, face às implicações que tem, o que nos leva a concluir, a contrario sensu, não estando demonstrado que tenha sido dada esse tipo de garantia na transferência de ativos, estes são transferidos com todas as responsabilidades (inclusivamente penais e contraordenacionais).
Deste modo, deve concluir-se que o BP não transferiu, para o banco de transição, o ativo BEl... excluindo dessa transferência qualquer passivo deste ou qualquer responsabilidade ou contingência do BEl..., designadamente de índole contraordenacional.
Para além do mais, por força daquela Medida de Resolução que recaiu apenas e só sobre o B... e não também sobre o BEl... ou outra sociedade do grupo B... (como poderia ter acontecido face ao disposto no art. 145º-G nº 2 do RGICSF), não ocorreu qualquer cisão entre sociedades, designadamente uma cisão entre o B... e o BEl... (o BEl... sempre existiu como sociedade autónoma, pessoa jurídica distinta do B..., e assim permaneceu), nem sequer entre o B... e o Nv....
Contrariamente ao sustentado pelo Recorrente, não resulta do art. 145º-G do RGICSF que uma medida de resolução bancária, com recurso a um banco de transição consista numa cisão, que segrega totalmente os direitos e responsabilidades não tóxicos que são transmitidos para o banco de transição ( nova sociedade) dos direitos e responsabilidades tóxicos que permanecem no banco resolvido (sociedade cindida) e, que por isso há transmissibilidade da responsabilidade contraordenacional que resulta da própria natureza e regime da cisão.
A cisão, constituindo, tal como a fusão, uma modalidade de reestruturação societária, opera uma divisão da sociedade em duas ou mais sociedades, com a divisão e transmissão de parte ou da totalidade do património da sociedade cindida para uma sociedade beneficiária.
Ambas as figuras- fusão e cisão- partilham a característica de serem processos de reestruturação de sociedades, operando modificações nas sociedades envolvidas, o que não ocorreu no caso em apreço.
O Nv... era um banco de transição, com capital social próprio, não tendo incorporado o património do B... por via de qualquer cisão (de natureza societária), mas por via de uma medida de resolução (de natureza bancária), sendo que a cisão prevista no CSC e a medida de resolução regida pelo RGICSF consubstanciam figuras jurídicas distintas, que se regem por regimes distintos, sendo a medida de resolução aplicada por acto administrativo da competência do Banco de Portugal.
A este propósito, já entendeu o STJ em Acórdão de 29/10/2020, que «A medida de resolução tomada pelo Banco de Portugal não pode coordenar-se a uma cisão, no sentido do art. 118º nº 1 al. a) do Código das Sociedades Comerciais.»
Na esfera jurídica do B... permaneceu a sua responsabilidade contraordenacional e, na esfera jurídica do BEl... permaneceu a responsabilidade contraordenacional deste, que não foi excluída aquando da transferência decorrente da Medida de Resolução do B..., tal como não foram excluídos os direitos e obrigações inerentes às acções que constituem o seu capital social, pois embora constituísse ativo do B..., constituía uma pessoa colectiva distinta e autónoma daquele (com a particularidade de ser detido a 100% pelo B...- sociedade em relação de domínio total que cessou com a transferência).
Apenas foram transferidas para o Nv... a totalidade das acções que constituíam o capital social do BEl... para serem alienadas a outra instituição financeira (como veio a acontecer), permanecendo o BEl..., durante todo esse tempo, a mesma pessoa colectiva,  com os ativos, passivos e responsabilidades próprias dele (BEl...), incluindo-se a sua responsabilidade contraordenacional por actos próprios no seu património passivo.
Sustenta o Recorrente que a responsabilidade contraordenacional que lhe é imputada nestes autos, pela prática de ilícitos contraordenacionais ocorridos antes da Medida de Resolução de que foi objecto o B..., não foi transferida para o Nv..., já que foi transferido livre de quaisquer responsabilidades dessa natureza (como ativo não tóxico), concluindo que se a sua eventual responsabilidade contraordenacional não foi transferida para o Nv..., também não foi transferida para o Haitong, Bank, SA.
Esse raciocínio só pode conduzir a dois resultados: ou considera que a sua responsabilidade contraordenacional foi extinta pelo BP, ou que se transmitiu para o B... (ficou no B...).
Ora, nem o Recorrente sustenta ter sido extinta a sua responsabilidade contraordenacional, nem tal decorre da Medida de Resolução, sendo que o BP apenas mencionou que a responsabilidade contraordenacional do B... permanecia na esfera jurídica do B..., impedindo que a mesma transitasse para o Nv..., não aludindo a qualquer extinção de responsabilidade contraordenacional, nem do B..., nem de qualquer outra sociedade do grupo B... cujas acções tenham sido transmitidas como ativo.
Perguntas que se impõem:
Da transferência para o Nv... só foi excluída a responsabilidade contraordenacional do B..., por actos da sua exclusiva responsabilidade (a qual  permaneceu na esfera jurídica do B..., não se tendo transmitido ao Nv...), ou a Medida de Resolução deve ser interpretada no sentido de também ter sido excluída da transferência a eventual responsabilidade contraordenacional do então BEl...?
E nesta segunda hipótese, a responsabilidade contraordenacional do BEl... ficou com o B...?
Desde já salienta-se que, não foram só transferidos para o Nv... os activos bons, como parece sustentar o Recorrente, foram transferidas todas as responsabilidades do B... perante terceiros que constituam passivos deste, apenas tendo sido excecionados dos passivos transferidos os elencados na alínea (b) do Anexo2 da Deliberação de 3 de Agosto de 2014 (Passivos Excluídos), entre os quais, quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais deste (B...), não se encontrando no texto da Medida de Resolução, um mínimo de correspondência verbal que permita interpretá-la no sentido de também terem ficado na esfera jurídica do B... responsabilidades contraordenacionais próprias do BEl....
Nos presentes autos, para além da responsabilidade contraordenacional imputada ao B..., SA, por factos praticados por este e que permaneceram na sua esfera jurídica (passivo excluído da transferência para o Nv...), pelos quais foi definitivamente condenado, está também imputada responsabilidade contraordenacional ao Haitong, SA ( anteriormente denominado BEl...) por factos por ele praticados como intermediário financeiro e pelos quais, não fosse a Medida de Resolução imposta ao B..., certamente nenhuma questão se colocaria quanto à sua imputação ao BEl....
Tendo ficado provado que o BEl... praticou factos que consubstanciam ilícitos contraordenacionais, nos termos que constam da sentença recorrida, não tendo o mesmo sido sujeito a qualquer Medida de Resolução, nem sujeito a qualquer fusão ou cisão que implicasse extinção ou transmissão dessa responsabilidade contraordenacional, tendo permanecido a mesma pessoa colectiva (apenas tendo sido alterada a estrutura acionista e a denominação social), afigura-se-nos que nenhum fundamento existe para se considerar excluída a sua responsabilidade contraordenacional por força da Medida de Resolução imposta ao B....
Se o Banco de Portugal pode ou não pode, por acto administrativo, fazer extinguir responsabilidade contraordenacional (argumento suscitado pelo tribunal a quo) não é questão que deva ser apreciada nestes autos, mais não seja porque para o seu conhecimento são competentes os tribunais administrativos, não podendo os tribunais de jurisdição comum apreciar da validade das deliberações do BP ou até questionar o perímetro de transferência da Medida de Resolução, só podendo este tribunal interpretar o alcance da decisão proferida pela entidade supervisora BP. 
De todo o modo, esse argumento (utilizado pelo tribunal a quo) acaba por ser despiciendo, desde logo porque o BP não extinguiu qualquer responsabilidade contraordenacional, pelo contrário, ficou expressamente consignado por Deliberação de 3/8/2014- que tinha como sujeito o B... (não o grupo B... ou qualquer uma das sociedades detidas pelo B...)-que a responsabilidade contraordenacional daquele permanecia na sua esfera jurídica, não era nem extinta, nem transferida para o banco de transição.
Torna-se, também, despiciendo discorrer sobre a questão da possibilidade legal de transmissão de responsabilidade contraordenacional, mormente por força de uma fusão, cisão ou medida de resolução, ou impossibilidade legal de transmissão de responsabilidade contraordenacional por força dos arts. 127º e 128º do CP ex vi do art. 32º do RGCO, uma vez que a questão que importa decidir restringe-se em saber se decorre da concreta Medida de Resolução imposta ao B... por deliberação do BP de 3/8/2014 a exclusão da transferência da responsabilidade contraordenacional  do Recorrente que lhe é imputada neste autos, por força da sua transferência para o Nv... como um activo do B..., sendo irrelevante para a decisão se, em tese geral, a responsabilidade contraordenacional é ou não passível de transmissão.
Ainda que se sustente a admissibilidade, por força de uma fusão , cisão ou medida de resolução, de transmissão da responsabilidade contraordenacional, essa problemática não é, nem foi, determinante para o julgamento do aqui Recorrente, pois que, independentemente de ser ou não admissível a transmissibilidade da responsabilidade contraordenacional naquelas situações, o aqui recorrente não foi sujeito a nenhum daqueles actos.
De todo o modo, seguindo-se o raciocínio do próprio Recorrente, este entende que a resolução bancária (na modalidade de banco de transição) tem necessariamente repercussões ao nível da responsabilidade contraordenacional, que enquanto responsabilidade tóxica, permanece no banco resolvido (sociedade cindida), não sendo transmitida para o banco de transição (nova sociedade)- ao abrigo do art. 145º-A do RGICSF na versão em vigor à data e art. 145º-C na versão actual.
Ainda que não se esteja perante uma cisão, como acima se disse, e nem se conceda que a exclusão da responsabilidade contraordenacional possa ocorrer por mero efeito de uma medida de resolução, certo é que, no caso concreto a responsabilidade contraordenacional do banco resolvido (B...) permaneceu efectivamente no banco resolvido, não tendo sido transmitida para o banco de transição (Nv...), porém, isso não significa que se possa daí extrapolar que toda e qualquer responsabilidade contraordenacional de outra sociedade do grupo do banco resolvido (que não se confunde com o banco resolvido), também tenha ficado no banco resolvido.
Contrariamente ao defendido pelo Recorrente, no caso da Medida de Resolução do B..., não se pode concluir, nem do texto nem por razões teleológicas, que o BP tenha determinado que permaneciam no B... todas as responsabilidades do domínio contraordenacional de qualquer uma das sociedades que constituíam o grupo B... (ou “estabelecimento comercial consolidado do B...”, como apelidou o Recorrente), apenas e só determinou que estavam excluídas da transferência para o Nv... quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes da violação de disposições contraordenacionais que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais do B....
Apenas permaneceram na esfera jurídica do B... as suas próprias responsabilidades contraordenacionais.
Ora, como vimos, não se extrai da referida Medida de Resolução que a transferência do BEl... como ativo do B... para o Nv... tenha acarretado qualquer consequência ao nível do núcleo de ativos, passivos e responsabilidades próprias do BEl..., ou qualquer consequência ao nível das responsabilidades de índole contraordenacional desta última instituição: a transferência para o Nv... não foi mais do que isso, uma transferência como ativo, para um banco de transição, para ser alienado tal como anteriormente existia, sem extinção de qualquer direito e, muito menos sem extinção de qualquer dever, passivo ou responsabilidade.
Nem a letra da Medida de Resolução permite outra leitura, nem a mesma se pode extrair dos poderes de resolução conferidos pelo RGICSF ao BP na redação do art. 145º-G com a redação vigente à data da medida.
Na Medida de Resolução de 3/8/2014, Anexo 2, alínea (b) ponto (v) onde se lê “as responsabilidades do B... perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste serão transferidos na sua totalidade para o Nv..., com exceção dos seguintes ( “Passivos Excluídos”):quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais”, não se pode ler como estando excluídas também as responsabilidades contraordenacionais do BEl... ou de qualquer outra sociedade do grupo, ainda que em relação de domínio total.
Isso seria possível se o BP tivesse exercido a faculdade prevista no art. 145º.-G nº 2 do RGICSF “O Banco de Portugal pode ainda determinar a transferência, parcial ou total, dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão de duas ou mais instituições de crédito incluídas no mesmo grupo para um ou mais bancos de transição, com a mesma finalidade prevista no número anterior”, o que manifestamente não aconteceu.
Repare-se que, ainda que todo o capital social do BEl... fosse detido pelo B... aquele não foi objecto também de uma medida de resolução, pelo contrário, foi transferido como ativo para ser alienado a outrem.
Este foi, no essencial, o entendimento sufragado pelo tribunal a quo e agora secundado por este Tribunal da Relação, o qual não viola, contrariamente ao sustentado pelo Recorrente, nem o art. 145º-G do RGICSF, oriundo da transposição do texto da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, nem muito menos os arts. 112º alínea a) e 120º do CSC resultante da transposição do texto da Diretiva (EU) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho, desde logo porque nem o B..., nem muito menos o BEl..., foram sujeitos a uma reorganização societária como ocorre na fusão ou cisão, nem o BEl... foi sujeito a uma medida de resolução bancária, para lhe serem aplicáveis tais regimes.
Em suma, afigura-se-nos que a interpretação que o Recorrente faz da Medida de Resolução de 3 de Agosto de 2014 do Banco de Portugal não encontra arrimo nem no texto, nem na razão de ser daquela medida legal, a qual nem sequer lhe é dirigida, não existindo suporte legal que permita ao Recorrente sustentar que da Medida de Resolução em apreço resulte a exclusão da sua responsabilidade contraordenacional aquando da sua transferência para o banco de transição.
O entendimento sufragado na sentença recorrida não violou o regime da própria Medida de Resolução, conforme sustenta o Recorrente, não sendo contrário à letra da Medida (pelo contrário, é o que melhor respeita a letra da Medida de Resolução) nem contrário à sua teleologia, tendo a medida de resolução respeitado os poderes de resolução previstos no então art. 145º-G do RGICSF, no âmbito dos quais foi efectuada a segregação do passivo “tóxico” apenas da instituição objecto da resolução.
A interpretação da Medida de Resolução sufragada pelo tribunal a quo também não padece de qualquer desconformidade com os princípios constitucionais, ou com o Direito da União Europeia, designadamente do invocado art. 13º da CRP (principio da igualdade), não existindo evidência factual nos autos que permita afirmar que tenha havido qualquer tratamento discriminatório dos investidores privados que adquiriram os ativos e passivos do BEl... face aos que adquiriram os demais ativos e passivos, incluindo o Bbt..., SA e o Baç..., SA.
Não consta dos autos que a L... tenha adquirido aqueles ativos livres de responsabilidades contraordenacionais, assim como se desconhece se o Bbt..., SA e o Baç..., SA cometeram quaisquer ilícitos contraordenacionais que lhe sejam ou venham a ser imputados, não estando demonstrado qualquer tratamento desigual de situações iguais, muito menos pelo tribunal a quo na sentença recorrida.
Quanto à questão da interpretação que o tribunal a quo fez da Medida de Resolução violar o princípio da boa-fé e da confiança do adquirente do BEl... no negócio de aquisição do mesmo, como é evidente, esta não é a instância competente para conhecer dos contornos do negócio de aquisição do BEl... pela Haitong.
A interpretação perfilhada na sentença também não violou os direitos fundamentais de livre iniciativa económica e de liberdade de empresa, na vertente de liberdade de investimento, nem foram restringidos quaisquer direitos, liberdades ou garantias dessa natureza, porquanto aquele direito tem que se harmonizar com o interesse público que preside à implementação da figura da medida de resolução, de salvaguarda da estabilidade do sistema financeiro.
Em conclusão, não foram violados os direitos constitucionalmente consagrados nos arts. 13º(princípio da igualdade), 18º nº 1 e 2 (direitos, liberdades e garantias), 61º nº 1( iniciativa económica privada) e 101º(sistema financeiro) da CRP ou o consagrado no art. 16º da CDFUE.
Independentemente da interpretação que o tribunal a quo tenha feito dos arts. 127º e 128º do CP ex vi do art. 32º do RGCO, convocados para argumentar a impossibilidade de transmissão da responsabilidade contraordenacional, certo é que o Recorrente foi condenado, não porque se tenha entendido que não é admissível a transmissão da responsabilidade contraordenacional nas situações de cisão, fusão ou medida de resolução, mas porque se entendeu que a concreta Medida de Resolução imposta ao B... pelo BP datada de 3/8/2014 não excluiu a responsabilidade contraordenacional do BEl..., aquando da transferência deste para o banco de transição, tendo permanecido na esfera jurídica deste.
E, aquela interpretação, contrariamente ao afirmado pelo Recorrente, também não é incompatível com o Direito da União, designadamente com os preceitos invocados pelo Recorrente:
 -não foi violado o art. 105º nº 1 al. a) e 151º nº 1 al. a) da Diretiva (EU) 2017/1132 (relativa a determinados aspetos do direito das sociedades) por não estar em causa o regime da fusão ou cisão de sociedades, não tendo sido aplicado o regime ali estabelecido e transposto para o CSC, conforme acima se deixou dito;
- não foram violados os arts. 40º nº 1 alínea b) e 63º nº 1 al. d) da Diretiva 2014/59/EU(que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento) porquanto a questão a decidir não se prende com o âmbito dos poderes de resolução, poderes esses transpostos nos artigos 145º ss do RGICSF, apenas sobre a interpretação do perímetro de transferência da Medida de Resolução concretamente aplicada ao B... ;
-não tendo sido violado o art. 16º da CDFUE, ou o primado do Direito Europeu, não padecendo a sentença recorrida, das alegadas ilegalidades por violação dos referidos preceitos legais, não existindo qualquer das inconstitucionalidades invocadas pelo Recorrente, nem sendo caso para desaplicar os arts. 127º e 128º do CP, ao abrigo dos arts. 8º nº 4 e 204º da CRP, porquanto os referidos preceitos legais não foram utilizados para a decisão de condenação do Recorrente, a eles se fez alusão na sentença recorrida apenas a título argumentativo.
Pelos fundamentos acima explanados, improcede este segmento recursivo.
*
6ª -Pedido de Reenvio Prejudicial
Relacionado com a questão da interpretação da Medida de Resolução perfilhada pelo tribunal a quo, quanto à exclusão da responsabilidade contraordenacional do Recorrente, e sua contrariedade ao Direito da União Europeia, está colocado pelo Recorrente o pedido de reenvio prejudicial, para que o TJUE responda a determinadas questões prejudiciais, invocando em síntese o seguinte nas Conclusões WWWWWW a YYYYYY:
Admite-se, em abstrato, que o tribunal possa ter dúvidas na interpretação do Direito da União, e mais concretamente quanto às implicações dos artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (EU) 2017/1132, dos artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU ou do artigo 16.º da CDFUE e do princípio da segurança jurídica, dúvidas essas que, também como supra se explicou, constituem questões prejudiciais,
XXXXXX. Assim, encontrando-se preenchidos os pressupostos previstos no 3.º parágrafo do artigo 267.º do TFUE, o Venerando Tribunal ad quem encontra-se obrigado a proceder ao respetivo reenvio prejudicial.
YYYYYY. Nestes termos, e para esse mesmo efeito o Recorrente HAITONG BANK permite-se sugerir as seguintes questões prejudiciais a dirigir ao Tribunal de Justiça da União Europeia, nos termos e para os efeitos do mencionado preceito:
i. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO),na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma fusão ou de uma cisão, são compatíveis com os artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017?
ii. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma medida de resolução, são compatíveis com os artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014?
iii. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, transfira para o banco de transição uma subsidiária do banco resolvido e não transfira para o banco de transição determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira do banco resolvido, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira da subsidiária permaneçam na esfera da subsidiária, em vez de ficarem no perímetro consolidado do banco resolvido?
iv. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, não transfira para o banco de transição e para algumas subsidiárias determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira de outra subsidiária permaneçam na esfera dessa subsidiária?
Dispõe o artigo 267.º do TFUE que:
“O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial:
a) Sobre a interpretação dos Tratados;
b) Sobre a validade e a interpretação dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-Membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal que sobre ela se pronuncie.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal.”
O Tratado consagra um instrumento de cooperação judiciária pelo qual o juiz nacional e o juiz da União Europeia são chamados, no âmbito das competências próprias, a contribuir para uma decisão que assegure a interpretação e aplicação uniformes do Direito da União Europeia no conjunto dos Estados Membros, em consonância com o princípio do primado do Direito da União sobre o Direito Nacional.
O reenvio prejudicial é um mecanismo do Direito da União Europeia que visa garantir a interpretação e a aplicação uniformes deste direito na União, oferecendo aos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros um instrumento que lhes permite submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia, a título prejudicial, questões relativas à interpretação do direito da União ou à validade dos atos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União (cfr. Ponto 1 das Recomendações à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais relativas á apresentação de processos prejudiciais- 2019/C 380/01).
Constitui pressuposto de intervenção desse instrumento que se imponha no processo a interpretação e aplicação de normas da UE e que estas sejam relevantes para o julgamento da causa.
Só se justifica que o tribunal nacional submeta uma questão prejudicial ao TJUE com recurso ao mecanismo do reenvio prejudicial se o direito da União for aplicável ao processo, não quando a decisão passa apenas pela interpretação das regras de direito nacional.
Neste sentido, conforme entendimento perfilhado por Luísa Lourenço, (…)ao Tribunal de Justiça compete a interpretação das normas ou, se for o caso, a apreciação da validade, não devendo estender a sua decisão à aplicação do direito ao caso concreto, função esta que está reservada ao juiz nacional; em contrapartida, a decisão do TJ é vinculativa para os tribunais nacionais, que a devem respeitar na sua posição doutrinária ou interpretativa.
(…)no que toca à possibilidade de recorrer ao TJUE, o pedido de decisão prejudicial não pode, em caso algum, incidir sobre questões de direito interno, sobre as quais os órgãos nacionais detêm jurisdição exclusiva (ainda que se ponha a questão de uma norma de direito português que resulta da implementação de uma Diretiva, será sempre quanto à interpretação desta última que irá pronunciar-se o TJUE); o mesmo se aplica à validade de direito primário, uma vez que este sai da esfera de competência do TJUE” , entendimento este que se secunda.
Cumulativamente só será de submeter uma questão prejudicial ao TJUE, se essa questão for necessária ao julgamento da causa.
No ponto 5 das Recomendações à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais, relativas à apresentação de processos prejudiciais  esclarece-se que:
“(…) 5. Os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros podem submeter uma questão ao Tribunal de Justiça sobre a interpretação ou a validade do direito da União se considerarem que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa (ver artigo 267.º, segundo parágrafo, do TFUE). Um reenvio prejudicial pode revelar-se particularmente útil nomeadamente quando for suscitada perante o órgão jurisdicional nacional uma questão de interpretação nova que tenha um interesse geral para a aplicação uniforme do direito da União ou quando a jurisprudência existente não dê o necessário esclarecimento num quadro jurídico ou factual inédito.”
O Recorrente alegadamente suscita questões de interpretação de duas Diretivas (Diretiva (EU) 2017/1132 e Diretiva 2014/59/EU) e da CDFUE.
Vejamos se está em causa nestes autos a aplicação de normas dessas Diretivas, ou normas de direito interno resultantes da transposição dessas Diretivas, cuja interpretação suscite dúvidas e a aplicação seja determinante para o julgamento da causa.
As duas primeiras questões prejudiciais colocadas pelo Recorrente são as seguintes:
i. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO),na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma fusão ou de uma cisão, são compatíveis com os artigos 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017?
ii. Os artigos 127.º e 128.º do Código Penal (aplicáveis ex vi do artigo 32.º do RGCO), na interpretação de que as responsabilidades contraordenacionais não são passíveis de ser transmitidas no âmbito de uma medida de resolução, são compatíveis com os artigos 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014?
Como resulta evidente, o que se pretende obter com estas questões não é mais do que uma interpretação de normas de direito nacional (arts. 127º e 128º do CP), se são ou não compatíveis com aquelas Diretivas, interpretação que está vedada ao TJUE, só lhe podendo ser apresentadas questões relativas à interpretação do Direito da União.
 A este propósito, Ana Maria Guerra Martins, “Escapam à competência prejudicial de interpretação e de apreciação de validade do TJ, entre outros, os seguintes casos:
a) A apreciação da conformidade do Direito nacional com o Direito da União Europeia- o TJ não pode apreciar o Direito nacional (…);
b) As situações puramente internas- as situações sem conexão com o Direito da União estão excluídas do âmbito de interpretação do TJ, de acordo com o artigo 267º do TJUE”.
De todo o modo, como já ficou anteriormente decidido, não é necessário para o julgamento da causa a aplicação dos arts. 127º e 128º do CP, nem muito menos a questão da sua compatibilidade com os arts. 105.º, n.º 1, alínea a) e 151.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho de 14 de junho de 2017 e, arts. 40.º, n.º 1, alínea b) e 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, sendo que também estes últimos não foram convocados para o julgamento da questão em apreciação.
 O direito nacional que transpôs aquelas Diretivas observou os referidos princípios normativos, vertendo-os nos arts. 112º alínea a) e 120º do CSC e, nos arts. 145º-G do RGICSF, não se suscitando qualquer dúvida quanto à sua interpretação, quer porque não está em apreciação a figura da fusão ou cisão de sociedades, quer porque não se questionam os poderes de resolução do BP em sede de medidas de resolução, restringindo-se a questão em apreciação à interpretação do âmbito de aplicação da Medida de Resolução emanada do BP deliberada em 3/8/2014 (de que foi objecto o B...), quanto à sua repercussão na transferência da responsabilidade contraordenacional do BEl..., como acima ficou exaustivamente tratado.
Vejamos as restantes duas questões:
iii. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, transfira para o banco de transição uma subsidiária do banco resolvido e não transfira para o banco de transição determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira do banco resolvido, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira da subsidiária permaneçam na esfera da subsidiária, em vez de ficarem no perímetro consolidado do banco resolvido?
iv. É compatível com o artigo 16.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o princípio da segurança jurídica e o artigo 63.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Maio de 2014, uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, não transfira para o banco de transição e para algumas subsidiárias determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira de outra subsidiária permaneçam na esfera dessa subsidiária?
Mais uma vez  o que se pretende não é dissipar qualquer dúvida sobre a interpretação do art. 63º nº 1 al. d) da Diretiva 2014/59/EU ou do art. 16º da CDFUE, porquanto as questões apresentadas pelo Recorrente abordam uma eventual incompatibilidade genérica, formulada em tese geral, de uma medida de resolução bancária que, na segregação de ativos tóxicos e não tóxicos, transfira para o banco de transição uma subsidiária do banco resolvido e não transfira para o banco de transição determinadas responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira do banco resolvido, mas determine que as correspondentes responsabilidades contraordenacionais por intermediação financeira da subsidiária permaneçam na esfera da subsidiária, em vez de ficarem no perímetro consolidado do banco resolvido.
Ora, a resposta à questão concretamente colocada nos autos não decorrerá da interpretação dos referidos preceitos da União, nem a norma do art. 63º nº 1 al. d) da Diretiva2014/59/EU é determinante para a decisão a proferir no caso concreto.
Senão vejamos.
Refere o art. 63º nº 1 al. d) da Diretiva2014/59/EU o seguinte:
“Poderes de resolução
Artigo 63.º
Poderes gerais
1. Os Estados-Membros asseguram que as autoridades de resolução disponham de todos os poderes necessários para aplicar os instrumentos de resolução às instituições e entidades a que se refere o artigo 1.º, n.º 1, alíneas b), c) ou d), que cumpram as condições aplicáveis para a resolução. As autoridades de resolução devem dispor, nomeadamente, dos seguintes poderes de resolução, que podem exercer isoladamente ou em conjunto:
d) Poderes para transferir para outra entidade, com o consentimento dessa entidade, direitos, ativos e passivos de uma instituição objeto de resolução;”
À data da Medida de Resolução de 3/8/2014 vigorava o art. 145º-G do RGICSF que consagrava o seguinte:
“Artigo 145.º-G
Transferência parcial ou total da actividade para bancos de transição
1 - O Banco de Portugal pode determinar a transferência, parcial ou total, de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão de uma instituição de crédito para um ou mais bancos de transição para o efeito constituídos, com o objectivo de permitir a sua posterior alienação a outra instituição autorizada a desenvolver a actividade em causa.”
É inquestionável que o BP tem os poderes de resolução consagrados no 63º nº 1 al. d) da Diretiva 2014/59/EU e que os exerceu quanto ao B... na Medida de Resolução de 3/8/2014 objecto de interpretação, não se suscitando quaisquer dúvidas sobre essa questão.
As dúvidas a ultrapassar prendem-se apenas com a interpretação da referida Medida quanto à repercussão na responsabilidade contraordenacional do aqui Recorrente, questão essa que não se decide por recurso àquele preceito da Diretiva 2014/59/EU.
Em síntese, não está em causa nos autos a aplicabilidade dos arts. 127º e 128º do CP, nem se suscita qualquer dúvida que seja necessário que o TJUE sane, sobre a interpretação dos arts. 105º nº 1 alínea a) e 151º nº 1 al. a) da Diretiva (EU) 2017/1132 ou dos arts. 40º nº 1 al. b) e 63º nº 1 da Diretiva 2014/59/EU, pois que nem esses preceitos legais, nem os artigos do CSC relativos á fusão e cisão que resultaram da respectiva transposição, ou os artigos relativos aos poderes de resolução previstos no RGICSF e que resultaram da transposição são determinantes para a decisão a proferir nos autos.
Sendo a questão em apreciação apenas a de interpretação da Medida de Resolução tomada pelo BP de 3/8/2014, não se vislumbrando qualquer norma de Direito da União que careça de interpretação, designadamente as invocadas no pedido de reenvio formulado pelo Recorrente, conclui-se ser desnecessário para a decisão da causa colocar ao TJUE as questões prejudiciais apresentadas pelo Recorrente.
Neste mesmo sentido, Ac STJ de 19/10/2021: “Não se colocando nenhuma questão de interpretação de normas de direito europeu, cujo esclarecimento prévio, pelo TJUE, fosse determinante para o sentido da decisão a dar ao caso concreto, o reenvio prejudicial é desnecessário e impertinente.”
Desde o Acórdão Cilfit (proferido em 6/10/1982, no processo nº 283/81) que o TJUE vem admitindo que a obrigação de suscitar, nos casos de reenvio obrigatório, a questão prejudicial de interpretação pode ser dispensada nas seguintes situações:
1) quando a questão de direito da União Europeia suscitada não for necessária nem pertinente para a resolução do litígio concreto;
2) quando o TJUE já se tiver pronunciado, de forma firme, sobre a questão a reenviar em caso análogo, ou quando existir sobre a mesma jurisprudência consolidada do TJUE;
3) quando o tribunal nacional considere que as normas da União Europeia aplicáveis não suscitam dúvidas interpretativas ou são suficientemente claras e determinadas, aptas para serem aplicadas imediatamente, sendo que a clareza das normas aplicáveis deve resultar da sua interpretação teleológica e sistemática e da referência ao contexto histórico, social e económico em que foram adoptadas( “doutrina do acto claro). 
No que diz respeito às duas questões ditas prejudiciais que contendem com o art. 16º da CDFUE, dir-se-á também que de acordo com o art. 51º nº 1 da CDFUE, a Carta vincula os Estados-Membros apenas quando estes apliquem o Direito da União Europeia, o que não é o caso, como vimos.
 “(…) uma ressalva deve ser feita relativamente à aplicação da Carta de Direitos Fundamentais (“Carta”). Este instrumento, dotado de força jurídica de direito primário, é aplicável apenas quando a situação em apreço esteja dentro do âmbito de aplicação de direito da União. Com efeito, o artigo 51.º da Carta estabelece claramente que as disposições deste instrumento se dirigem às “instituições, órgãos e organismos de União, (...) bem como [a]os Estados-Membros, apenas quando apliquem direito da União.” O número 2 desta norma reitera, com efeito, que a Carta não estende nem modifica o âmbito de aplicação do direito da União, algo que é afirmado já no número 2 do artigo 6.º do TUE. Assim, quando se levantem questões relativas à violação de direitos fundamentais previstos neste instrumento, um pedido de decisão prejudicial será admissível apenas se a alegada violação for abrangida por outra norma de direito da União. Não basta, para tal, que o órgão jurisdicional de reenvio considere que o litígio no processo principal é abrangido pelo âmbito de aplicação de direito da União, na medida em que um dos direitos em questão seja reconhecido pela Carta; deve demonstrar-se, por outro, que há outro ato de direito da União para além da Carta que se aplica ao dito litígio (Ver, entre outros, o despacho no processo C-333/17, Caixa Económica Montepio Geral, EU:C:2017:810, parágrafos 12 a 19, especialmente parágrafo 18)”.
Em conformidade com as referidas considerações, afigura-se-nos que a decisão sob recurso no segmento em apreciação apenas interpretou uma Medida de Resolução imposta pelo BP no uso dos poderes de resolução conferidos pelo direito nacional (RGICSF), não tendo sido aplicada no segmento da decisão recorrida agora sob escrutínio norma de direito da União que suscite dúvidas e cuja interpretação seja necessária para o julgamento da causa, nem estando a alegada violação do direito de empresa previsto no art. 16º da CDFUE abrangida por outra norma de direito europeu que tenha sido aplicada ou devesse ser aplicada.
Conclui-se, pois, que não estando verificados os pressupostos mencionados no art. 267º do TFUE, carece de fundamento legal, in totum, o pedido de reenvio prejudicial suscitado pelo Recorrente.
Improcede, também, este segmento recursivo.
*
7ª- Recursos interpostos autonomamente:
7.1. Da prorrogação do prazo para apresentação de recurso de impugnação judicial ( recurso da decisão proferida pela CMVM a 30/7/2021).
Sob as Conclusões ZZZZZZZ a HHHHHHHH veio o recorrente recorrer de uma decisão proferida pela CMVM a 30.07.2021, que indeferiu o requerimento apresentado pelo Recorrente, nos termos do qual havia sido requerida a prorrogação do prazo previsto no artigo 59.º, n.º 3 do RGCO para apresentação de recurso de impugnação judicial da decisão condenatória proferida pela CMVM.
O recorrente suscitou esssa questão prévia no Recurso de Impugnação Judicial da decisão condenatória da CMVM junto do TCRS, sem que esta questão tenha sido apreciada pelo tribunal a quo, no despacho de admissão do referido recurso.
A omissão de pronúncia sobre essa questão, que devia ter sido proferida no despacho liminar de admissão dos recursos de Impugnação Judicial porque implicava com a possibilidade de ser prorrogado o prazo de apresentação desse mesmo recurso, constitui uma mera irregularidade ( art. 118º nº 2 do CPP) que devia ter sido arguida no prazo referido no art. 123º nº 1 do CPP, pelo que, não o tendo sido está sanada, por falta de oportuna arguição.
De todo o modo, mesmo que sobre essa questão tivesse recaído despacho de indeferimento pelo tribunal a quo, dele também não seria admissível recurso para o Tribunal da Relação, porquanto, embora as decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas no decurso do processo sejam susceptíveis de impugnação judicial por parte do arguido, competente para o decidir é o tribunal de 1ª Instância que decidirá em última instância (art. 55º nº 1 e 3 do RGCO).
Não pode o recorrente em sede de recurso da sentença final proferida pelo Tribunal de 1ª Instância interpor recurso de uma decisão proferida pela CMVM, pois que competente para o decidir era em exclusivo aquele tribunal, sob pena de subversão das regras de recurso em procedimentos contraordenacionais.
O presente entendimento não padece de qualquer desconformidade com princípios constitucionalmente consagrados, porquanto não está constitucionalmente consagrada a garantia de um duplo grau de recurso sobre toda e qualquer decisão proferida pela autoridade administrativa.
Deste modo, não se conhece deste segmento recursivo.

7.2. Da produção de prova testemunhal ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 19/10/2021).
Sob as Conclusões IIIIIIII a ZZZZZZZZZ veio o Recorrente interpor recurso da Decisão datada de 19.10.2021, proferida pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (Ref.ª Citius ...), que indeferiu a inquirição de duas das testemunhas arroladas pelo HAITONG BANK em sede de recurso de impugnação judicial da decisão final administrativa proferida pela CMVM.
Desse despacho o aqui recorrente interpôs recurso interlocutório, que não foi admitido pelo tribunal a quo por despacho proferido a 10.11.2021 ( Ref.ª Citius ...).
Desse despacho de não admissão do recurso, o aqui recorrente apresentou Reclamação, que foi objecto de Decisão pela Sra Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa que a indeferiu.
Essa decisão tornou-se definitiva, porquanto o recurso que dela foi interposto para o Tribunal Constitucional mostra-se findo por decisão proferida a 27/4/2022, que julgou o mesmo inadmissível.
Acontece que, não tendo sido admitido o recurso interlocutório, por decisão superior, embora a questão tenha sido renovada em sede deste recurso da Sentença final, este Tribunal da Relação não pode conhecer deste segmento recursivo.
A questão aqui suscitada pelo recorrente diz respeito a uma questão processual suscitada pelo arguido durante o julgamento do Recurso de Impugnação Judicial da decisão administrativa condenatória proferida pela CMVM, sobre a qual recaiu o despacho acima mencionado proferido pelo tribunal a quo, de indeferimento de duas testemunhas.
No âmbito do regime geral das contraordenações vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões, só sendo recorríveis as decisões cuja impugnação esteja expressamente prevista.
Da articulação do disposto nos arts. 63.°, 64.° e 73.° do RGCO (este último sob a epígrafe Decisões judiciais que admitem recurso), resulta que apenas admitem recurso para o Tribunal da Relação a sentença ou o despacho judicial que conheçam do Recurso de Impugnação Judicial da decisão da autoridade administrativa, ou do despacho liminar que tiver rejeitado o recurso (por extemporaneidade ou inobservância de exigências de forma).
Relativamente às decisões proferidas pelo tribunal de 1ª Instância que tenham recaído sobre questões suscitadas pelos recorrentes ao longo do julgamento do recurso de impugnação, que não façam parte da sentença ou despacho final que conheça do mérito do recurso interposto da decisão da autoridade administrativa, não poderão ser apreciadas por este Tribunal da Relação, sendo irrecorríveis.
“São irrecorríveis as decisões interlocutórias de natureza estritamente processual, que não afetem direitos das pessoas, como, por exemplo, o despacho interlocutório que negue a realização e produção de meio de prova (acórdão do TC n.º 522/2008), o despacho de indeferimento de uma inspeção judicial requerida pelo arguido na audiência de julgamento (decisão do vice-presidente do TRL de, de 27.06.2001, In CJ, XXVI, 3, 134) o despacho de indeferimento de expedição de uma carta rogatória (decisão do presidente do TRC, de 18.05.2007, processo 111/07), o despacho de indeferimento de arguição de nulidade processual (…) proferido na pendência da fase judicial de impugnação (acórdão do TRE, de 28.6.2005, in CJ, XXX, 3, 269)”. 
No mesmo sentido, na Doutrina e Jurisprudência, a título exemplificativo: Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 2ª edição, p. 414 e Augusto Silva Dias, Direito das Contra-Ordenações, p. 255, bem como Ac RL de 02.05.2019, Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1 e Ac RL27.01.2022, Proc. Nº 127/19.5YUSTR.L1 (este último disponível em www.dgsi.pt).
No Ac TC nº659/2006 de 28.11.2006 pode ler-se que “ em processo contra-ordenacional não é constitucionalmente imposta a consagração da possibilidade de recurso de todas as decisões judiciais proferidas no decurso da impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória”.
O  Tribunal Constitucional  já esclareceu que “a interpretação do artigo 73.º do RGCO, no sentido de não permitir recurso do despacho que indeferiu uma diligência de prova requerida pela arguida no processo de contra-ordenação, não é incompatível com a Constituição, nomeadamente, com as garantias de defesa que o artigo 32.º, n.º 1 consagra para o processo penal e que sejam extensíveis ao processo de contra-ordenação”.
Segundo o entendimento do Tribunal Constitucional, o artigo 32.º, n.º 1, da CRP ao dispor que o processo penal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, não atribui um direito ilimitado de impugnação de toda e qualquer decisão judicial proferida em processo penal, prevendo um duplo grau de jurisdição quanto a decisões penais condenatórias e quanto às decisões respeitantes à situação do arguido que contendam com a privação da liberdade ou outros direitos fundamentais, não havendo motivos para divergir de tal entendimento no âmbito contraordenacional.
Isso mesmo nos diz Augusto Silva Dias, relativamente ao regime das contraordenações, o qual considera justificada a limitação do direito ao recurso no âmbito de despachos interlocutórios mesmo que contendam com direitos e garantias do arguido, “por um lado porque o direito ao recurso não significa direito a um duplo grau de jurisdição e, por outro, porque a impugnação judicial funciona, de certo modo já como um recurso. Faz sentido por isso, limitar o recurso para a Relação às situações mais graves.”
Deste modo, a questão suscitada pelo Recorrente no decurso do processo, respeitante à admissão ou não pelo tribunal a quo de meios de prova ou diligências probatórias, como é o caso do indeferimento da inquirição de testemunhas arroladas pelo recorrente no recurso de impugnação judicial, que foi decidida pelo despacho autónomo mencionado pelo recorrente, datado de 19/10/2021 ( Ref. Citius ...) proferido antes da prolação da sentença final, consubstancia uma decisão irrecorrível.
E, se aquela decisão é irrecorrível, como ficou superiormente decidido, também não pode ser conhecida no âmbito do recurso da decisão final sob pena de se subverter completamente o regime dos recursos em sede contraordenacional.
Este entendimento, como acima se mencionou, não padece de qualquer inconstitucionalidade, nomeadamente das inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente, não violando o direito de defesa, ao recurso, ao contraditório, de acesso aos Tribunais e a um processo equitativo, salientando-se  que as garantias constitucionalmente consagradas são mais mitigadas em sede de procedimento contraordenacional, não estando constitucionalmente consagrada a garantia de um duplo grau de recurso sobre toda e qualquer decisão proferida no recurso de impugnação judicial de decisão administrativa, que assume especificidades que não se compadecem com uma aplicação acrítica e automática das disposições do processo penal.
Deste modo, não se conhece deste segmento recursivo.

7.3. Prorrogação do prazo para interposição de recurso da sentença ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 15/2/2022).
7.4. Início do prazo de interposição de recurso da sentença ( recurso do despacho proferido pelo TCRS a 22/2/2022).
Estes dois últimos segmentos recursórios consubstanciam a repetição das alegações de recurso apresentadas em sede de recursos autónomos, admitidos depois de deferidas as respectivas reclamações e, sobre os quais já recaiu decisão autónoma deste Tribunal, tendo-se esgotado nesse âmbito o poder jurisdicional.
Deste modo, não se conhece destes segmentos recursivos.
*    
Pelo exposto, improcede totalmente o recurso quanto a este Recorrente, mantendo-se a sentença recorrida no que a ele diz respeito.
*
II- Recurso AA:

1ª- Vícios da sentença em virtude da violação da lei na tramitação do processo:
1.1-Ilegalidade do despacho de 19/10/2021, no segmento em que indeferiu a reinquirição de testemunhas já ouvidas na fase administrativa dos autos, e do despacho de 25/11/2012.
1.2– Ilegalidade do despacho de 15/11/2021, no segmento em que indeferiu a inquirição de testemunhas (CCC, DDD, EEE, FFF e GGG), e do despacho de 16/12/2021.
1.3- Ilegalidade dos despachos de 10/2/2022 e de 15/2/2022.

Estas três questões suscitadas pelo recorrente sob as Conclusões 3 a 67 dizem respeito a questões processuais suscitadas pelo arguido durante o julgamento do recurso de impugnação judicial da decisão administrativa condenatória proferida pela CMVM, sobre as quais recairam os despachos acima mencionados proferidos pelo tribunal a quo, cuja sindicância o recorrente pretende efectuar em sede deste recurso da sentença final dirigido ao Tribunal da Relação.
No âmbito do regime geral das contraordenações vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões, só sendo recorríveis as decisões cuja impugnação esteja expressamente prevista.
Da articulação do disposto nos arts. 63.°, 64.° e 73.° do RGCO (este último sob a epígrafe Decisões judiciais que admitem recurso), resulta que apenas admitem recurso para o Tribunal da Relação a sentença ou o despacho judicial que conheçam do Recurso de Impugnação Judicial da decisão da autoridade administrativa, ou do despacho liminar que tiver rejeitado o recurso (por extemporaneidade ou inobservância de exigências de forma).
Relativamente às decisões proferidas pelo tribunal de 1ª Instância que tenham recaído sobre questões suscitadas pelos recorrentes ao longo do julgamento do recurso de impugnação, que não façam parte da sentença ou despacho final que conheça do mérito do recurso interposto da decisão da autoridade administrativa, não poderão ser apreciadas por este Tribunal da Relação, sendo irrecorríveis.
“São irrecorríveis as decisões interlocutórias de natureza estritamente processual, que não afetem direitos das pessoas, como, por exemplo, o despacho interlocutório que negue a realização e produção de meio de prova (acórdão do TC n.º 522/2008), o despacho de indeferimento de uma inspeção judicial requerida pelo arguido na audiência de julgamento (decisão do vice-presidente do TRL de, de 27.06.2001, In CJ, XXVI, 3, 134) o despacho de indeferimento de expedição de uma carta rogatória (decisão do presidente do TRC, de 18.05.2007, processo 111/07), o despacho de indeferimento de arguição de nulidade processual (…) proferido na pendência da fase judicial de impugnação (acórdão do TRE, de 28.6.2005, in CJ, XXX, 3, 269)”. 
No mesmo sentido, na Doutrina e Jurisprudência, a título exemplificativo: Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 2ª edição, p. 414 e Augusto Silva Dias, Direito das Contra-Ordenações, p. 255, bem como Ac RL de 02.05.2019, Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1 e Ac RL27.01.2022, Proc. Nº 127/19.5YUSTR.L1 (este último disponível em www.dgsi.pt).
No Ac TC nº659/2006 de 28.11.2006 pode ler-se que “ em processo contra-ordenacional não é constitucionalmente imposta a consagração da possibilidade de recurso de todas as decisões judiciais proferidas no decurso da impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória”.
O  Tribunal Constitucional  já esclareceu que “a interpretação do artigo 73.º do RGCO, no sentido de não permitir recurso do despacho que indeferiu uma diligência de prova requerida pela arguida no processo de contra-ordenação, não é incompatível com a Constituição, nomeadamente, com as garantias de defesa que o artigo 32.º, n.º 1 consagra para o processo penal e que sejam extensíveis ao processo de contra-ordenação”.
Segundo o entendimento do Tribunal Constitucional, o artigo 32.º, n.º 1, da CRP ao dispor que o processo penal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso, não atribui um direito ilimitado de impugnação de toda e qualquer decisão judicial proferida em processo penal, prevendo um duplo grau de jurisdição quanto a decisões penais condenatórias e quanto às decisões respeitantes à situação do arguido que contendam com a privação da liberdade ou outros direitos fundamentais, não havendo motivos para divergir de tal entendimento no âmbito contraordenacional.
Isso mesmo nos diz Augusto Silva Dias, relativamente ao regime das contraordenações, o qual considera justificada a limitação do direito ao recurso no âmbito de despachos interlocutórios mesmo que contendam com direitos e garantias do arguido, “por um lado porque o direito ao recurso não significa direito a um duplo grau de jurisdição e, por outro, porque a impugnação judicial funciona, de certo modo já como um recurso. Faz sentido por isso, limitar o recurso para a Relação às situações mais graves.”
Deste modo, as questões suscitadas pelo Recorrente no decurso do processo, respeitantes à admissão ou não pelo tribunal a quo de meios de prova ou diligências probatórias, mormente o indeferimento da reinquirição de testemunhas já ouvidas na fase administrativa dos autos, o indeferimento da inquirição de outras testemunhas arroladas pelo recorrente no recurso de impugnação judicial, o indeferimento de produção de prova testemunhal suplementar à matéria da alteração não substancial de factos comunicada pelo tribunal e, o indeferimento dos requerimentos de arguição de nulidades ou irregularidades dessas mesmas decisões, suscitadas perante o tribunal a quo na pendência da fase judicial, que foram decididas pelos despachos autónomos mencionados pelo recorrente, datados respectivamente de 19/10/2021 ( Ref. Citius ...), 25/11/2021 ( Ref. Citius ...), 15/11/2021( Ref. Citius ...), 16/2/2022 (Ref Citius ...)  e 10/2/2022 (Ref. Citius ...),  e 15/2/2022, proferidos antes da prolação da sentença final, são  decisões irrecorríveis.
E, se aquelas decisões são irrecorríveis, também não podem ser conhecidas no âmbito do recurso da decisão final sob pena de se subverter completamente o regime dos recursos em sede contraordenacional.
Este entendimento, como acima se mencionou, não padece de qualquer inconstitucionalidade, nomeadamente das inconstitucionalidades suscitadas pelo recorrente, não violando o direito ao contraditório, o direito de audição e defesa do arguido, direito de igualdade de armas e o direito a um processo equitativo, salientando-se  que as garantias constitucionalmente consagradas são mais mitigadas em sede de procedimento contraordenacional, não estando constitucionalmente consagrada a garantia de um duplo grau de recurso sobre toda e qualquer decisão proferida no recurso de impugnação judicial de decisão administrativa, que assume especificidades que não se compadecem com uma aplicação acrítica e automática das disposições do processo penal.
Deste modo, não se conhece destes segmentos recursivos.
*
2ª- Vícios da matéria de facto da sentença recorrida (art. 410º nº 2 do CPP):

O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. os artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2 e 410º, n.º 2, als. a), b) e c) do Código de Processo Penal).
Estando em causa o recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75º n.º 1 do DL n.º 433/82, de 27/10 (RGCO) estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal de 2ª instância apenas conhece de matéria de direito.
Apesar de este Tribunal da Relação não poder reapreciar a matéria de facto julgada pelo Tribunal recorrido, pode tomar conhecimento das nulidades previstas no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, segundo o qual “mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
 a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
 c) erro notório na apreciação da prova.
Acontece que, tal como se extrai do referido preceito legal, aqueles vícios tem de resultar do texto da decisão recorrida e não de elementos processuais a ela estranhos, ainda que produzidos no âmbito da discussão judicial do caso, designadamente depoimentos testemunhais ou documentos particulares, pelo que, a insuficiência da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação, ou contradição entre a fundamentação e a decisão e, o erro notório na apreciação da prova, devem resultar de per si do texto da decisão recorrida e ser analisados em função do aí consignado, conjugado com as regras de experiência comum.
“Por isso, fica excluída da previsão do preceito toda a tarefa de apreciação e/ou valoração da prova produzida, em audiência ou fora dela, nomeadamente a valoração de depoimentos, mesmo que objecto de gravação, documentos ou outro tipo de provas, tarefa reservada para o conhecimento do recurso em matéria de facto” , objecto de recurso que em matéria contraordenacional está excluído do Tribunal de 2ª instância, conforme decorre do referido art. 75º nº 1 do RGCO.

2.1 Erro notório na apreciação da prova:
Segundo Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, há erro notório na apreciação da prova “quando um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das leges artis.
(…) Assim, não poderá incluir-se no erro notório na apreciação da prova a sindicância que os recorrentes possam pretender efectuar à forma como o tribunal recorrido valorou a matéria de facto produzida perante si em audiência, valoração que aquele tribunal é livre de fazer, de harmonia com o preceituado no art. 127º”.
 “Esse vício é caracterizado por uma incompatibilidade evidente e manifesta entre o facto e a realidade, de tal forma que para o tribunal resulte, sem margem para dúvidas, que a prova foi mal apreciada, devendo esse erro resultar do texto da decisão e não da apreciação da prova recolhida.”
“(…) O mesmo verifica-se quando, partindo do texto da decisão recorrida, a matéria de facto considerada provada e não provada pelo tribunal a quo, atenta, de forma notória, evidente ou manifesta, contra as regras da experiência comum, avaliadas de acordo com o padrão do homem médio. É um vício intrínseco da sentença, isto é, que há-de resultar do texto da decisão recorrida, de tal forma que, lendo-o, logo o cidadão comum se dê conta que os fundamentos são contraditórios entre si, ou com a decisão tomada.”
A esse propósito, sob as Conclusões 69 a 91 o recorrente sustenta que a sentença recorrida incorreu em erro notório da apreciação da prova quanto a dois aspectos:
2.1.1- no que diz respeito à consideração do depoimento da testemunha III;
2.2.2- no que diz repeito à reestruturação da R..., S.A.
Vejamos.
2.1.1- No que diz respeito ao depoimento da testemunha III diz o recorrente que o tribunal a quo para dar como provado que o recorrente teria ordenado pessoal e directamente a ocultação do passivo da EI..., S.A nos exercícios de 2008 a 2012 assentou exclusivamente nos depoimentos contraditórios e incongruentes prestados pela única testemunha directa- III- concluindo que ficou incorrectamente provada a matéria de facto dada como provada nos pontos 113 a 118, 491 a 494 da decisão recorrida, porque o tribunal ao assentar aquelas imputações ao recorrente apenas numa testemunha que apresentou nove versões diferentes sobre aqueles factos relativos às contas da EI..., S.A, manifestamente incongruentes entre si, incorreu num erro notório na apreciação da prova.
Do alegado pelo recorrente resulta evidente que se insurge contra a relevância que o tribunal a quo deu àquele depoimento testemunhal, descredibilizando-o com recurso a elementos processuais estranhos ao processo (outras versões apresentadas fora deste processo), pretendendo com isso que o tribunal de recurso reaprecie a valoração da prova produzida perante o tribunal a quo, o que este Tribunal de recurso  está impedido de fazer, por imperativo legal, não conhecendo de matéria de facto, apenas e só de direito ( art. 75º do RGCO).
Só assim não será se do texto da sentença recorrida resultar de per si, ou conjugado com as regras de experiência comum, que há um erro grosseiro, gritante, na valoração daquele meio de prova, visível aos olhos de qualquer cidadão médio.
O recorrente omite que o tribunal teve o cuidado de esclarecer de forma exaustiva e detalhada na sentença recorrida, as razões que o levaram a dar credibilidade ao depoimento testemunhal de III e, escamoteou que os factos a que faz alusão não se basearam, como diz, em exclusivo naquele depoimento testemunhal, mas na articulação de inúmeros outros depoimentos e vasta prova documental, como se pode ler designadamente a fls. 422 a 433 da sentença, tendo tido o tribunal o cuidado de escalpelizar as alegadas nove versões diferentes dos factos alegadamente prestadas pela referida testemunha (que o recorrente insiste em invocar),em extenssíssimas considerações vertidas a fls. 433 a 468 da sentença, de forma ponderada, racional, e bem fundamentada.
O tribunal a quo valorou o depoimento daquela testemunha de forma lógica e devidamente fundamentada à luz das regras da experiência, como se vê da motivação à matéria de facto vertida designadamente a fls. 422 a 468 da sentença e, conclui de forma lapidar que “o depoimento de III mostra consistência com outros elementos de prova que já vêm sendo identificados nesta sede, de índole documental e testemunhal, que confirmam a manipulação intencional das demonstrações financeiras da EI..., S.A nos anos de 2008 a 2012 e também com critérios de experiência comum. O seu depoimento acerca dos moldes como foram sendo realizadas as demonstrações financeiras da EI..., S.A, o procedimento que era adoptado, para além de corroborado por CCC (nas partes em que este intervinha), mostra-se detalhado e coerente, e não nos merecendo descrédito, pelo que não pode deixar de ser relevado pelo tribunal.
Para além disso, apesar das inúmeras testemunhas que foram inquiridas nestes autos e para além dos inúmeros documentos que foram juntos também nestes autos, o acervo probatório que serviu para formar a convicção do tribunal não foi sequer posto em causa por quaisquer meios de prova que acompanhassem o aventado pelo Recorrente, não sendo o depoimento de III infirmado por nenhum meio de prova produzido, antes tendo sido viabilizado por aqueles outros meios de prova, pois com eles se mostra consistente e coerente.”
O facto de o  recorrente não concordar com a valoração dada pelo tribunal a quo a um determinado depoimento testemunhal não consubstancia erro notório na apreciação da prova, nem o mesmo ocorreria se aqueles factos tivessem sido dados como provados apenas com recurso a um depoimento testemunhal (que não foram, tendo sido articulados com outros depoimentos e prova documental), uma vez que para prova da referida matéria de facto a lei não exije formalidade especial, dependendo do juizo crítico que é feito pelo juiz perante quem a prova foi produzida.
Esse juízo, contrariamente ao sustentado pelo recorrente, não resulta do texto da sentença recorrida ter sido “ilógico e arbitrário”, estando exaustivamente expressas as razões pelas quais o tribunal a quo assim decidiu, por que razões valorou aquele depoimento da testemunha III, os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, não ressaltando do texto da sentença qualquer erro patente que invalide a decisão proferida quanto àqueles factos, ou a credibilidade dada àquela prova, estando-se no ãmbito do princípio da livre apreciação da prova, insindicável por este tribunal de recurso ( art. 127º do CPP).
Alegou, ainda, o recorrente que na fundamentação dos factos aqui em causa a sentença recorrida violou o princípio in dubio pro reo, uma vez que valorou a prova em manifesto prejuízo do recorrente, aludindo a pag. 418, 419, 421, 424 a 428 da sentença.
“No que respeita à invocada violação do princípio in dubio pro reo, deverá este ser entendido no sentido de que na decisão de factos incertos, a dúvida favorece o arguido, ou seja, o julgador deverá recorrer a tal princípio sempre que se encontre perante uma dúvida insanável, que continue a existir após a produção da prova de forma insuperável, devendo a mesma ser também notoriamente razoável, atendendo às regras da experiência.
Assim, a violação do princípio in dubio pro reo, que dizendo respeito à matéria de facto é um princípio fundamental em matéria de apreciação e valoração da prova, só pode ser sindicado (…) dentro dos seus limites de cognição, devendo, por isso, resultar do texto da decisão recorrida em termos análogos aos dos vícios do artigo 410.º, n.º 2, do CPP, e só se verifica quando seguindo o processo decisório evidenciado através da motivação da convicção se chegar à conclusão de que o tribunal, tendo ficado num estado de dúvida, decidiu contra o arguido; ou quando a conclusão retirada pelo tribunal em matéria de prova se materialize numa decisão contra o arguido que não seja suportada de forma suficiente, de modo a não deixar dúvidas irremovíveis quanto ao seu sentido, pela prova em que assenta a convicção.” 
Ter sido valorada a prova em sentido contrário ao pretendido pelo recorrente não equivale a ter o tribunal, na dúvida sobre aqueles factos, decidido contra o arguido, significa apenas que a prova foi valorada pelo tribunal em sentido diferente do que o recorrente entendia que devia ter sido.
Caso contrário, qualquer arguido podia afirmar que a prova produzida em desfavor da sua pretensão violava o princípio in dubio pro reo.
Aquela alegação apenas traduz, mais uma vez, uma discordância quanto à valoração da prova efectuada pelo tribunal a quo, estando-se no âmbito do princípio da imediação da prova, gozando o julgador de ampla liberdade de apreciação das provas, desde que na ponderação a efectuar e a verter na motivação, se paute por regras lógicas e racionais, máximas da experiência comum, de modo que os destinatários a percebam, ainda que eventualmente dela discordem.
Só existiria erro notório na apreciação da prova se do texto da sentença resultasse de forma notória, evidente, que o tribunal ficara na dúvida quanto à prova daqueles factos e resolvera essa dúvida contra o aqui recorrente.
Porém, lida e relida a motivação vertida na sentença recorrida, designadamente as páginas apontadas pelo recorrente, não se evidencia qualquer dúvida do tribunal a quo expressa no texto da sentença que tenha sido resolvida em prejuízo do recorrente, pelo contrário, dela se extrai que o tribunal não teve dúvidas em dar aqueles factos como provados, com base na prova que ponderou e verteu na motivação de facto, tendo-se limitado a  teorizar eventuais dúvidas que pudessem surgir da leitura da fundamentação apresentada para dar aqueles factos como provados, numa formulação argumentativa que em nada conflitua com a convição demonstrada e sustentada naqueles meios de prova, apresentada sem hesitações que revelem a violação do princípio in dubio pro reo.
Depois de uma argumentação detalhada sobre a valoração que fez da prova perante si produzida e sua ponderação à luz das regras de experiência, o tribunal a quo concluiu que “Ora, assim, não nos subsistem quaisquer dúvidas, conjugando todos os elementos acima referidos, que apesar da conivência do comissaire aux comptes e de CCC, que confiavam na solidez do grupo e na perspicácia de AA para reverter a situação, ao que não terá sido indiferente o seu já descrito histórico de sucesso após a reprivatização do sector bancário em Portugal, que foi AA, nos moldes identificados por III, quem mandou manipular as demonstrações financeiras da EI..., S.A.”( pag.431 da sentença).

2.1.2- A propósito do alegado erro notório na apreciação da prova relativo à reestruturação da R..., S.A, o recorrente argumenta, mais uma vez, que o tribunal ao dar como provado o facto vertido no ponto 516 da sentença recorrida valorou a prova em violação do princípio in dubio pro reo como consta da página 625 da sentença.
Mais uma vez o recorrente não tem razão, atendendo à motivação do referido facto 516, que não se limitou ao excerto descontextualizado invocado pelo recorrente (página 625), pelo que convidamos o recorrente a ler atentamente as páginas seguintes até página 635 e encontrará uma motivação firme, segura e sem sombra de dúvida sobre a sua actuação, alicerçada em prova que em nada se pode apelidar de “incipiente” .
Do texto da sentença resulta a forma ponderada, lógica e racional como foram valorados todos os meios de prova de que o tribunal a quo se socorreu para dar como provado o referido facto, não existindo qualquer evidência de que essa valoração esteja desfasada das regras da experiência comum, nem que o tribunal a quo tenha ficado com dúvidas quanto áquele facto e as tenha resolvido em prejuízo do recorrente, destinando-se aquele trecho da motivação a afastar os argumentos defendidos pelos recorrentes nas respectivas defesas, que se destinavam precisamente a plantar dúvidas ao julgador e que este arredou de forma firme na fundamentação dessa matéria de facto que considerou provada.
Deste modo, improcede este segmento recursivo.

2.2. Contradição insanável da fundamentação da sentença recorrida:
O recorrente a propósito deste vício da sentença, alegou as seguintes situações, sob as Conclusões 92 a 109:
i)- contradição entre os factos provados 642 e 654;
ii)-contradição entre os factos vertidos no facto provado 643;
iii)-contradição entre os factos 182 e 186;
iv)-contradição da fundamentação nas páginas 784 e 785 da sentença;
Tenhamos, mais uma vez, presente que este tribunal de recurso não conhece de facto, apenas de direito, a não ser que ocorra o vício da matéria de facto apontado pelo recorrente e previsto no art. 410º nº 1 al. b) do CPP, vício esse a detectar atendo-nos apenas ao teor do texto da sentença recorrida e, se necessário, às regras da experiência comum.
A contradição tanto pode emergir entre factos contraditoriamente provados entre si, como entre estes e os não provados, como entre a fundamentação ( em sentido amplo, abrangendo a fundamentação de facto e também a de direito) e a decisão.
O Ac STJ de 11/1/2017 é elucidativo quanto a este vício, dele se podendo ler:“O vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão a que alude a al. b) do nº 2 do art. 410º do CPP, verifica-se quando no texto da decisão, e sobre a mesma questão, constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluem mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perpectiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respectivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito.
Há contradição insanável da fundamentação quando, através de um raciocínio lógico, se conclua pela existência de oposição insanável entre os factos provados, entre estes e os não provados, ou até entre a fundamentação probatória da matéria de facto, ou seja, quando se dá como provado e não provado determinado facto, quando ao mesmo tempo se afirma ou nega a mesma coisa, quando simultaneamente se dão como assentes factos contraditórios e ainda quando se estabelece confronto insuperável e contraditório entre a fundamentação probatória da matéria de facto.
Só é de considerar relevante, para os fins do preceituado nesta alínea b) do nº 2, a contradição que se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser integrada com recurso à decisão, ou seja, quando a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão.”
Também Simas Santos e Leal Henriques defendem que “há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face á colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluirem-se mutuamente.”
No caso sub judice as contradições invocadas pelo recorrente  a que se fez alusão nos pontos i) e iii) dizem respeito a contradição entre factos.
Vejamos.
Constam da sentença recorrida os factos 642 e 654, com a seguinte redação:
“642. Na comercialização do papel comercial quer da R..., S.A, quer da EI..., S.A, o B... limitou-se sempre a prestar aos seus clientes a informação que constava vertida nas respectivas Notas Informativas;
654. Em Setembro de 2013, o DRG do B... concluiu os trabalhos que tinha iniciado em meados do ano para atribuição do rating à EI..., S.A, tendo sido utilizada a ferramenta “SPV Rating Tool”, estimando-se a atribuição de um rating entre “bb-” e “b+”, tendo a possibilidade de incumprimento da EI..., S.A sido estimada entre 1,10% a 1,96%;”
Salvo o devido respeito, não vemos onde está a contradição, uma coisa é dar como provado que o B... se limitou a prestar aos seus clientes a informação que constava vertida nas respectivas Notas Informativas aquando da comercialização do papel comercial quer da R..., S.A, quer da EI..., S.A, outra diferente é o B... ter avaliado a qualidade da informação prestada sobre a EI..., S.A que constava nessas Notas Informativas, não se vê como possa ser considerado incompatível ou antagónico o B... ter atribuído um determinado rating à EI..., S.A e ter prestado aos seus clientes quando comercializou o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A apenas a informação que constava das Notas Informativas, não consubstanciando factos inconciliáveis.
Relativamente à alegada contradição da matéria do facto provado 643, vejamos o seu teor:
“643.   Após a operação de reestruturação, a R..., S.A deixou de ter créditos sobre a EI..., S.A (553 milhões de euros) e sobre a E... Limited (368 milhões de euros), que estas sociedades do G... não estavam em condições de pagar, e passou a ser dona de participações sociais sobre a E..., S.A, que era a sociedade controladora de vários Bancos, entre os quais o B..., ou seja dona de participações sociais com valor e com alguma liquidez, pois a E..., S.A e o B... estavam cotados em bolsa, sendo assumida como uma operação com certos benefícios para a R..., S.A, à data.”
Alega o recorrente que, ou se diz que os créditos já não existiam e a EI..., S.A e a E... Limited nada deviam à R..., S.A, ou que os créditos existiam mas a EI..., S.A e a E... Limited não estavam em condições de pagar os creditos que a R..., S.A detinha sobre as mesmas.
O que o tribunal afirma é que a R..., S.A tinha aqueles créditos sobre a EI..., S.A e a E... Limited, que estas sociedades não tinham condições para pagar e que após a reestruturação deixou de ter aqueles créditos, não se detectando a apontada contradição ou inconciliabilidade entre os referidos factos.
Relativamente aos factos 182 e 186, deles consta o seguinte:
“182.Na sequência das discussões havidas tanto em sede do Comité ALCO do B..., como em sede de Conselho de Administração da Epi..., S.A, foi decidido pelo B... que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a colocar directamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B....
186.Depois de decidido, pelo B..., que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a Directora Coordenadora do DFME, UU, convocou uma reunião com JJJ, na qualidade de representante do G....”
Também não há contradição insanável entre os factos 182 e 186, pelo contrário, em ambos os factos se afirma que foi decidido pelo B... que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a colocar directamente junto dos clientes do B....
Diz o recorrente que as entidades emitentes do papel comercial foram a EI..., S.A e a R..., S.A e que o B... interveio apenas como intermediário financeiro, pelo que, pela própria natureza da qualidade de cada entidade o B... nunca poderia ter decidido que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial porque tal decisão é uma decisão da própria entidade emitente.
Essa alegação evidencia que o recorrente discorda de ter sido dado como provado aquele facto, porém, essa discordância nada tem a ver com o vício da contradição insanável da fundamentação da sentença recorrida, constando da sentença, da articulação dos demais factos dados como provados e da motivação como um todo, que o tribunal a quo entendeu que, independentemente de a quem competia a emissão do papel comercial (às emitentes), aquela decisão foi tomada pelo B... e depois executada formalmente pelas emitentes, redundando a pretensão do recorrente numa impugnação da matéria de facto que não cabe nos poderes deste tribunal de recurso.
Isso mesmo é devidamente explicitado pelo tribunal a quo na fundamentação desse facto, a páginas 474 a 480 da sentença, que depois de escalpelizar a prova produzida a esse respeito, assim concluiu:” a prova documental conjugada com a prova testemunhal referida supra permite concluir que a decisão de a EI..., S.A e de a R..., S.A emitirem papel comercial a colocar junto dos clientes do B... foi tomada pelo B... através do Comité ALCO”.
Quanto à fundamentação da matéria de facto provada constante das páginas 784 e 785 da sentença sustenta o recorrente que a sentença tanto reconhece que a operação de reestruturação do G... ainda não estava concluída, existindo uma margem de incerteza, como depois conclui que a mesma deveria ter sido divulgada, o que é, em si mesmo, incompatível.
Mais uma vez o recorrente não tem razão, porquanto o tribunal diz claramente que apesar da operação estar dependente de terceiros, devia ter sido comunicada aos clientes do B... pois que, no que dependesse do B... a decisão estava já tomada e teria efeitos retroactivos, sendo relevante que essa possibilidade fosse dada a conhecer, não se extraindo dessa fundamentação qualquer contradição insanável.
Logo na página 786 da sentença se pode ver claramente que aquelas duas asserções não são incompatíveis, tendo  por certo que, tal como se lê da sentença “a partir do momento em que foi tomada uma decisão, em termos de gestão, por parte de um órgão com poderes de facto para decidir uma operação com a dimensão da que estava em causa, ou seja o Conselho Superior do G..., que se assumia, como referido, como o órgão com poder decisório sobre as questões estratégicas para o grupo, sendo-lhe reconhecido esse poder de decisão, a partir desse momento, diziamos, independentemente da formalização dos negócios que estivesse pendente ou da obtenção de autorizações de entidades terceiras, o B... tinha, em princípio, o dever de informar os investidores sobre a operação.”, pelo que, concorde o recorrente ou não com o afirmado, os factos não são manifestamente contraditórios.
Improcede, totalmente, este segmento recursivo.

3ª- Nulidade da sentença recorrida por alteração não substancial de factos não comunicada ao recorrente e por imputação de factos com recurso a juizos conclusivos e valorativos.

Esta questão está colocada pelo recorrente sob as Conclusões 110 a 125 relativamente a vários pontos da matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo.
O recorrente insurge-se quanto ao facto de o tribunal ter dado como provado um facto novo, que não constava da Decisão da CMVM, a propósito das condições pessoais do recorrente sob o facto provado 767, por duas ordens de razões:
-constitui uma alteração não substancial à matéria de facto fixada pela CMVM na sua decisão condenatória, o qual não deriva de qualquer facto alegado pelo recorrente no recurso de impugnação judicial e, serviu para fundamentar o agravamento do grau de culpa para efeitos da determinação da medida concreta da coima a aplicar-lhe ( páginas 891, 892 e 896 da sentença), não lhe tendo sido comunicado esse aditamento, nem concedido prazo para se pronunciar ou preparar a sua defesa, violando o art. 358º nº 1 do CPP, o que implica a nulidade da sentença;
-configura matéria conclusiva, vaga, genérica e valorativa.
Conclui que, ao dar como provada aquela matéria de facto a sentença violou o disposto no art. 58º nº 1 al.b) do RGCO e arts. 283º nº 3 al. b) e 374º nº 2 do CPP e, pede que a sentença seja declarada nula, embora curiosamente invoque para sustentar esta nulidade jurisprudência do STJ que se pronunciou no sentido de se “ter como não escrito” ( o que significaria eliminá-lo do elenco dos factos provados, nunca declarar nula a sentença!).
A violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei, porque nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto é meramente irregular ( art. 118º do CPP).
O art. 358º do CPP dispõe quanto à alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, no sentido de que se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa, ressalvando-se o caso de a alteração ter derivado de factos alegados pela defesa.
Segundo o art. 1º al. f) do CPP a alteração substancial dos factos é aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, pelo que, a contrario sensu, a alteração não substancial será toda a modificação dos factos constantes da acusação ou da instrução que não tenha como efeito a imputação de crime diverso, nem a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.
Só é nula a sentença, segundo o art. 379º nº 1 al. b) do CPP, que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, fora dos casos e das condições previstas no art. 358º do CPP, isto é, sem que o tribunal comunique a alteração e conceda ao arguido prazo, se ele o requerer, para preparação da defesa.
Como resulta dos autos, o facto provado 767 está enquadrado com os factos 757 a 777, constituindo no seu conjunto o texto extraído  de um documento junto aos autos, do conhecimento do recorrente e devidamente contraditado, que serviu de prova a todos aqueles factos (ver página 709 da sentença) sendo esse facto visto isoladamente perfeitamente inócuo porquanto está interligado com os demais e coincide em parte com o facto provado 776.
Apesar de ter sido ponderado na determinação concreta da coima, foi articulado com os outros factos atrás mencionados,  não tendo sido utilizado para imputar ao arguido um crime diverso, nem para alterar os limites máximos das sanções aplicáveis (a moldura da sanção abstratamente aplicável manteve-se a mesma) pelo que, não se mostra violado o art. 358º, nem a sentença, por esse motivo, padece de nulidade ( art. 379º nº 1 al. b) do CPP), quando muito poderia ser dado como não escrito, o que não se determina porquanto isso não teria qualquer interferência relevante no conteúdo e sentido decisório da sentença recorrida.
Quanto à objecção de constituir matéria conclusiva e valorativa, está vedado a este Tribunal reapreciar matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo.
Improcede, também, este segmento recursivo.

4ª- Inadmissibilidade da alteração não substancial dos factos na sentença recorrida face à decisão da CMVM.

Sustenta o recorrente, sob as Conclusões 126 a 150,  que a alteração e aditamento de factos promovida pelo tribunal a quo antes da prolação da sentença e, que passaram a constar do elenco dos factos provados da sentença recorrida, é manifestamente ilegal, debruçando-se sobre os seguintes factos:
- factos provados 347 e 350: não é possível porque visa colmatar uma nulidade por falta de imputação de factos concretos de que enferma o facto provado 362 da decisão administrativa;
-factos provados 356ª e 356B: factualidade totalmente nova face à factualidade provada na decisão da CMVM, não integrando o objecto dos presentes autos;
-facto provado 370: visa colmatar lacunas da decisão administrativa, contém matéria vaga e genérica, contém matéria jurídica e sempre configuraria uma alteração substancial dos factos vedada pelo art. 359º do CPP;
-factos provados 516 a 519: contêm imputações subjectivas, a nível da culpa, que não constam da decisão administrativa, que excedem o âmbito dos factos provados 565, 566 e 568 da decisão administrativa e constituem alteração substancial dos factos;
-facto provado 633: contém uma impossibilidade fáctica;
-factos provados 641 e 642: são falsos.
Desde já se repete que, nenhum dos factos aditados pelo tribunal a quo, depois de devidamente comunicada a alteração não substancial dos factos em apreço, teve como efeito a imputação de crime diverso, nem a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis às mesmas infrações pelas quais o recorrente foi condenado em sede de decisão administrativa e cuja condenação foi confirmada na sentença recorrida, logo, não se verifica qualquer alteração substancial de factos.
Por outro lado, é consabido que, em sede de recurso de impugnação judicial de decisão administrativa, no âmbito de um procedimento contraordenacional, o tribunal não está limitado estritamente aos factos vertidos como tal na decisão administrativa, podendo aditar factos que dela constassem ainda que não no elenco dos factos e, podendo também aditar novos factos que resultem da instrução do procedimento contraordenacional, designadamente concretizadores ou complementares, sem vinculação ao texto da decisão impugnada, apenas com o limite de não poder alterar substancialmente os factos constantes dessa decisão  e, desde que os tenha comunicado ao arguido, concedendo-lhe prazo para sobre eles se defender, o que ocorreu no caso sub judice.
Se os factos são falsos, contêm uma impossibilidade fáctica, matéria vaga, genérica ou jurídica não consubstancia qualquer nulidade por alteração dos factos, mas mera discordância com a matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo, que não pode ser sindicada pelo tribunal de recurso.
Deste modo, não se concluindo por qualquer alteração substancial dos factos, tendo a alteração não substancial dos factos sido comunicada e contraditada pelo recorrente, não se verifica a apontada nulidade da sentença, nem se mostram violados os princípios constitucionalmente consagrados nos arts. 2º, 20º nº 1 e 4 e 32º nº 10 da CRP.
Improcede este segmento recursivo.

5ª- Violação do princípio Ne Bis In Idem: Processo 58/... do Banco de Portugal( Processo 182/16....)

O Recorrente AA arguiu a questão da violação do princípio Ne Bis In Idem previsto no art. 29º nº 5 da CRP, nas Conclusões 151 a 177, alegando já ter sido julgado e condenado, por sentença transitada em julgado, no Processo nº 182/16.0YUSTR.L1, por infrações contraordenacionais pela violação das regras de conflito de interesses quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., tendo sido novamente condenado nestes autos pela prática das mesmas contraordenações, ainda que por força da aplicação do art. 309º do CdVM, por alegadamente ter feito prevalecer os interesses do B..., Epi..., S.A e os seus próprios interesses individuais sobre os interesses dos clientes do B... que investiram em papel comercial, existindo igualdade de agente, igualdade dos factos legalmente relevantes e identidade do bem jurídico tutelado, considerando irrelevante a diferente qualificação jurídica e o diferente regime sancionatório.
Mais alegou que essa violação também ocorre relativamente à contraordenação relativa à violação da qualidade de informação na colocação de papel comercial da EI..., S.A, porquanto naquele Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1 (58/...)lhe foram imputados factos que determinaram a sua responsabilização contraordenacional pela colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., com base na utilização e divulgação de contas deste emitente, com o seu passivo subavaliado, o que motivou a condenação do aqui recorrente pela prática de contraordenação de gestão ruinosa.
A garantia prevista no nº 5 do art. 29º da CRP, comporta duas dimensões:
“a) como direito subjetivo fundamental garante ao cidadão o direito a não ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo facto, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a possibilidade de se defender contra atos estaduais violadores desse direito (direito de defesa negativo);
b) como princípio constitucional objetivo (dimensão objetiva do direito fundamental), obriga fundamentalmente o legislador à conformação do direito processual e à definição do caso julgado material de modo a impedir a existência de uma pluralidade de julgamentos pelo mesmo facto.
Para a tarefa de «densificação semântica» do princípio, é particularmente importante a clarificação do sentido da expressão «prática do mesmo crime». A Constituição proíbe rigorosamente o duplo julgamento e não a dupla penalização, mas parece óbvio que a proibição do duplo julgamento pretende evitar a aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do «mesmo crime». O conceito jurídico-constitucional de «mesmo crime» tem de obter-se recorrendo aos conceitos jurídico-processuais e jurídico-materiais desenvolvidos pela doutrina do direito e processo penais. O problema é particularmente difícil em casos de comparticipação, de concurso de crimes e de crime continuado.”
Apercebemo-nos, pois, da dificuldade prática que emana da aplicação do princípio do ne bis in idem, designadamente no caso sob análise, dada a similitude jurídica das condutas punidas pelo RGICSF e as punidas pelo CdVM, até na nomenclatura utilizada, e da necessária dissecação a efectuar entre as contraordenações objecto das duas condenações, quer quanto aos elementos de imputação objectiva, quer subjectiva, quer em termos de concurso e, autoria/comparticipação.
Impõe-se desde logo apurar, em cada um dos dois processos contraordenacionais, o que se entende ser o facto juridicamente relevante, que integra os elementos objectivos e subjectivos do tipo de contraordenação em causa, para se aferir se estamos ou não perante o «mesmo crime», leia-se, a mesma contraordenação.
Na vertente do caso julgado, Germano Marques da Silva, dá um contributo relevante para esta questão, referindo que “o caso julgado é um instituto que visa a protecção das decisões jurisdicionais, sem o que essas decisões não seriam vinculativas já que poderiam ser repetidamente modificadas.
(…) o efeito negativo do caso julgado consiste em impedir qualquer novo julgamento da mesma questão. É o princípio conhecido pelo brocardo non bis in idem, consagrado como garantia fundamental pelo art. 29º nº 5 da Constituição da República Portuguesa: ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime.
O elemento de natureza objectiva da proibição do non bis in idem é dado pela identidade entre o pedido e a causa de pedir do feito já julgado e daquele por que se pretende instaurar o novo processo.
(…)“A identidade da causa de pedir  refere-se aos factos já julgados e aos que se pretendem julgar no novo processo, devendo buscar-se aqueles no fundamento de facto da sentença. A identidade da causa de pedir não deve considerar-se em abstracto, como jus persecuendi, mas antes em concreto pela identidade da razão de pedir; e o pedido, na estrutura actual do processo penal, não é senão o reconhecimento pela lei da existência do crime objecto da acusação, da declaração da responsabilidade do arguido e a aplicação da sanção.” 
Ora, a identidade do facto, é a que mais dificuldades suscita na aplicação do princípio do ne bis in idem, desde logo porque quer a Doutrina, quer a Jurisprudência não é unívoca quanto ao conteúdo desse requisito, afigurando-se-nos que a jurisprudência emanada do TJUE assenta numa identidade fáctica naturalística, prescindindo da sua valoração jurídica e da distinção quanto aos bens jurídicos tutelados pelas normas jurídicas convocadas, contrariamente ao sentido perfilhado pelo Tribunal Constitucional.
Germano Marques da Silva, a esse propósito refere que(…)“A doutrina tradicional dominante era no sentido de que bastava a identidade parcial dos factos, sendo também indiferente a qualificação jurídica que lhes fosse dada. Não nos parece correcta essa construção.
O processo penal com estrutura acusatória limita o objecto processo ao facto descrito na acusação. Entendemos que a delimitação do facto se há-de fazer necessariamente em função do bem jurídico protegido, pois que só o facto, enquanto alegadamente delitivo (facto qualificado) interessa ao processo e tem virtualidade para que o processo se abra e prossiga.
Numa primeira aproximação, por mesmo crime deve considerar-se a mesma factualidade jurídica e o seu aspecto substancial, os elementos essenciais do tipo legal pelos quais o arguido foi julgado.
 Por isso que, como já referimos, nos casos de concurso ideal, se o arguido foi já julgado por um dos crimes em concurso isso não impede que seja novamente julgado pelos outros; os crimes são diversos.
Mas, pelo contrário, nos casos de mero concurso aparente de crimes- entre o julgado e o que se pretende julgar-quando os dois ou mais crimes em concurso não podem ser cumulados, julgado um, impedido está o julgamento pelo outro.
Em conclusão: «crime» deve considerar-se como o mesmo quando exista uma parte comum entre o facto histórico julgado e o facto histórico a julgar e que ambos os factos tenham como objecto o mesmo bem jurídico ou formar, como acção que se integra na outra, um todo do ponto de vista jurídico.” 
Estas considerações, apesar de pensadas para as infrações penais, são perfeitamente transponíveis para a hipótese de cumulação de procedimentos contraordenacionais e infrações dessa natureza, como é entendimento generalizado e já sedimentado na jurisprudência e doutrina.
Neste recurso não se discute a identidade do agente, nem o duplo julgamento/dupla punição do aqui recorrente AA, uma vez que foi arguido nos dois processos e nos dois foi julgado e condenado.
Senão vejamos.
No âmbito do procedimento contraordenacional nº n.º 58/... instaurado pelo Banco de Portugal contra o aqui Recorrente AA, entre outros, foi proferida decisão administrativa, que o condenou nos seguintes termos:
a) pela infração consubstanciada na violação do disposto nos artigos 19.º e 20.º, ambos do Aviso n.º 5/2008 (não implementação de sistemas de informação e comunicação adequados) punível nos termos da alínea m) do artigo 210.º do RGICSF;
b) pela infração consubstanciada na violação do disposto nos artigos 10.º, 11.º, n.os 1 a 3, 13.º, n.os 1 e 2, 15, n.º 2, alínea c), e 18.º, n.os 1 e 2, todos do Aviso n.º 5/2008 (não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à atividade de colocação de produtos emitidos por terceiros), punível nos termos da alínea m) do artigo 210.º do RGICSF;
c) pela infração consubstanciada na prática de atos dolosos de gestão ruinosa, praticados em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, punível nos termos da alínea l) do artigo 211.º do RGICSF;
d) pela infração consubstanciada na prestação de falsas informações ao Banco de Portugal, punível nos termos da alínea r) do artigo 211.º do RGICSF;
e) pela infração consubstanciada na violação das regras sobre conflitos de interesses previstas no artigo 86.º do RGICSF, punível nos termos da alínea i) do artigo 211.º do RGICSF.
AA interpôs recurso de impugnação judicial, que correu termos sob o Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1, no qual veio a ser proferida sentença pela 1ª Instância, confirmada em sede de recurso para o Tribunal da Relação, que o condenou nos seguintes termos:
a) pela prática, a título de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de informação e comunicação adequados no B..., prevista nos art. °s 19° e 20° do Aviso 5/2008, de 1 de julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.° 210°, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de quatrocentos mil euros (€400.000,00);
b) pela prática, a titulo de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente no B... quanto à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, prevista nos art.'s 10°, 11°, n. °s 1 a 3, 130, n.°3 1 e 2, 15, n.°2, alínea c) e 18°, n. °s 1 e 2 do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.° 210°, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na colina de quatrocentos mil atros (€400.000,00);
c) pela prática, a título de dolo necessário, no que concerne à prática da contra-ordenação de actos dolosos de gestão ruinosa em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.° 211, alínea 1) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de um milhão e novecentos mil euros (€1.900.000,00);
d)pela prática, a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação de prestação de falsas informações ao Banco de Portugal que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.° 211, alínea r) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de um milhão de euros (€1.000.000,00);
e) pela prática, a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação consubstanciada na violação das normas de conflitos de interesses prevista no art.° 86° do Regime Geral das instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.° 211, alínea i) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de setecentos mil euros (6 700.000,00);
Nos presentes autos, em sede de sentença recorrida, o referido arguido/recorrente foi assim sentenciado:
a) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros);
b) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros);
c) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros);
d) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil euros);
e) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros);
f) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 330.000,00 (trezentos e trinta mil euros);
g) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 330.000,00 (trezentos e trinta mil euros);
h) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 580.000,00 (quinhentos e oitenta mil euros).
A controvérsia foca-se na alegada identidade de factos e na identidade de bens jurídicos existentes entre os dois procedimentos contraordenacionais no âmbito dos quais foi o aqui recorrente condenado.
Conforme se pode extrair das alegações do recorrente o mesmo centra a problemática da violação do princípio do ne bis in idem na verificação de uma identidade de condutas e/ou identidade de factos que determinaram a sua condenação no Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1(procedimento contraordenacional nº 58/...) e processo sub judice, alegando que “o que releva é a conduta do agente, ou seja, o facto praticado e já não a sua qualificação ou valoração jurídica” e, é aqui que radica, no essencial, o ponto de discórdia entre o seu entendimento e o perfilhado na sentença recorrida.
Efectivamente, a esse propósito, foi tomada, em síntese, a seguinte posição na sentença recorrida:
“O princípio ne bis in idem é um princípio clássico que tem idêntico conteúdo em vários dispositivos legais, incluindo comunitários.
 (…) para que se esteja perante a repetição da mesma causa é necessário que haja identidade de pessoa e identidade do facto, proibindo-se que um mesmo e concreto facto (objecto decidendum ou acontecimento histórico) possa erguer um segundo processo penal / contra-ordenacional.
A identidade do facto importa quando simultaneamente constituir identidade de ilícito, ou seja, o que releva é não o facto pelo facto, mas sim o facto com um conteúdo ou uma consequência normativa.
(…)Com efeito, ao contrário do que entendemos ser a posição dos Recorrentes, um comportamento naturalisticamente analisado poderá subsumir-se em vários ilícitos típicos, sem que tal implique, automaticamente, a violação do princípio ne bis in idem. Reforçamos, para apurar se existe a violação de tal princípio, importa aferir se, apesar de naturalisticamente una, a conduta comporta a violação de uma multiplicidade de sentidos sociais autónomos vertidos nos vários ilícitos-típicos cometidos, comportando, numa perspectiva teleológica, diversas valorações jurídicas.
(…)Tanto o Recorrente AA, como o Recorrente BB exerciam funções de administração numa entidade que era simultaneamente uma instituição de crédito (sujeita à supervisão do Banco de Portugal) e um intermediário financeiro e emitente de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado (sujeita à supervisão da CMVM). Estavam ambos, por isso, sujeitos às normas destinadas a cada um dos dois sectores distintos em causa, sendo que, tal como refere a decisão administrativa, tal constitui “a consequência necessária do privilégio de acesso às mesmas”.
Seguindo os critérios de natureza estritamente normativa adoptados pelo Tribunal Constitucional, importa concluir que entre as normas que estão na génese da punição do Banco de Portugal e as normas que suportam a decisão da CMVM não existe uma relação de consunção, que implique a violação do princípio ne bis in idem, não se tratando dos mesmos ilícitos.
Na verdade, se o critério a adoptar, que é seguido pelo Tribunal Constitucional, coloca em segundo plano a acção proibida em si mesma, na sua vertente naturalística, ressaltando antes a valoração jurídica da conduta, temos de concluir que os sectores de actividade financeira em causa (bancário e financeiro strito senso) e por inerência as normas de dever que ambos observam, tutelam bens jurídicos distintos, pressupondo desvalores igualmente distintos, apresentando cada um dos factos uma diversa relevância jurídica, em consonância com a perspectiva normativa, assumindo desvalores autónomos.”
O Tribunal a quo optou claramente pela aferição do pressuposto relativo à identidade do facto de acordo com a valoração normativa do ilícito, afastando-se da mera aferição naturalística, embora a ela também faça alusão, entendimento que acompanhamos.
A discordância do recorrente centra-se essencialmente na identidade de factos, considerando irrelevante para aferir da violação ou não do referido princípio a diferente qualificação jurídica das infrações cometidas, o diferente regime sancionatório ou a diferença de bens jurídicos protegidos.
O Recorrente vai ao ponto de afirmar que “uma coisa é o facto praticado pelo agente; outra, muito diferente, mas irrelevante para a aplicação do princípio ne bis in idem, é a valoração jurídica ( i.e., consequência) desse facto, o que não obsta á aplicação do princípio ne bis in idem”.
Não podíamos estar mais em desacordo, porquanto não consentimos que o princípio faça apelo apenas a um conceito puro e naturalístico de facto, mas ao conceito normativo de facto- facto enquanto desvalor jurídico, violador de um determinado bem jurídico- havendo que perscrutar o bem jurídico tutelado por cada uma das normas punitivas em aplicação (idem factum illicitum)
Verificar-se-á um idem factum illicitum se houver identidade do bem jurídico tutelado pelas normas sancionadoras concorrentes ou do desvalor pressuposto por cada uma delas.
A lei pode conferir distintas valorações jurídicas à mesma conduta, materialmente entendida (estando-se perante um concurso efectivo de infrações) e, nesses casos, segundo o Tribunal Constitucional, não se suscita a inconstitucionalidade por violação do principio ne bis in idem (Ac. TC nº 356/2006, Ac TC nº 265/2016 e o recente Ac TC nº 298/2021).
Neste último aresto pode ler-se:
“Tomando o facto - «o mesmo facto» -, não de um ponto de vista naturalístico, que coloca a tónica sobre a ação proibida, mas de um ponto de vista normativo, que atende à valoração jurídica da conduta, o Tribunal entendeu verificar-se um idem factum illicitum quando os tipos em confronto tutelam o mesmo «bem jurídico» ou pressupõem o mesmo tipo de «desvalor» (Acórdão n.º 244/1999); inversamente, entendeu que esse “idem factum illicitum” não verifica quando uma «mesma conduta (…) no sentido naturalístico» «corresponde a uma realização de factos com diversa relevância jurídica» e, na «perspetiva do grau de desvalor», o legislador sustentadamente entenda que existe «um acréscimo de desvalor» pela realização do tipo contraordenacional relativamente àquele que subjaz à realização do tipo criminal, optando, com base nesse «acréscimo de desvalor», por uma solução de «concurso efetivo» entre crime e contraordenação em detrimento de «outras opções segundo uma lógica de concurso ideal», tendo em conta que a «Constituição não impõe uma única solução jurídica nesta matéria» (Acórdão n.º 356/2006).
Este último entendimento foi aplicado ainda no Acórdão n.º 265/2016, onde se concluiu que, «se um mesmo objeto material comporta teleologicamente diferentes valorações jurídicas», a existência de uma situação de «concurso efetivo e ideal de infrações de natureza distinta» - penal e contraordenacional - «não se afigura constitucionalmente inadmissível», já que a «lei confere distintas valorações jurídicas à mesma conduta, materialmente entendida».”
Ainda que a conduta do arguido seja a mesma, ou tenha ocorrido no mesmo contexto, isso não impede que haja um acréscimo de desvalor tutelado por dois regimes sancionatórios distintos.
Segundo o recorrente há identidade dos factos legalmente relevantes até porque uma parte substancial dos factos que serviram de base á decisão no ... repetem-se nos presentes autos.
Quanto à repetição de factos, naturalisticamente falando, parece-nos inquestionável que se verifica, até porque o enquadramento espacio-temporal é o mesmo, o contexto que despoletou a imputação das infrações que dizem respeito à actuação em conflito de interesses relativamente à colocação do papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., num e noutro processo contraordenacional, é o mesmo, podendo encontrar-se vários factos dados como provados num e noutro processo que isso espelham, no entanto, apesar de tudo, os factos juridicamente relevantes não são totalmente coincidentes e, são diferentes as valorações jurídicas.
Efectivamente, no que diz respeito à violação das regras sobre conflitos de interesses, no Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1, foi dado como provado que, em 04.09.2013 AA integrava o Conselho de Administração do B..., sendo vice-presidente deste órgão ( facto 1077); que na mesma data era acionista indirecto da EI..., S.A( facto 1078); nessa data foi discutida e aprovada com a participação de AA a comercialização do DCP da EI..., S.A pelo B...( facto 1082); AA sabia que a sua participação e decisão no processo de comercialização do DCP da EI..., S.A a 04.09.2013 era uma matéria em que o próprio era interessado (dada a sua qualidade de administrador do B... e simultaneamente de acionista indirecto da EI..., S.A)/facto 1084);AA conhecia o quadro normativo em vigor, designadamente que devia abster-se de apreciar e decidir operações em que fosse directa ou indirectamente interessado ou sociedades que directa ou indirectamente dominasse e, ainda assim, quis participar na decisão de colocação de DCP da EI..., S.A através do B... tomada em ALCO realizado em 04.09.2013 ( facto 1085).
Enquanto que a violação do art. 86º do RGICSF esgota-se no facto objectivo de o recorrente AA ter participado e tomado decisões, (designadamente as relativas à emissão de papel comercial pela EI..., S.A e sua comercialização a clientes do B...), enquanto administrador do B... e da EI..., S.A, operações em que também era directamente interessado- privilegiando os seus próprios interesses e os da EI..., S.A, em detrimento da própria instituição bancária B...- revelando um conflito de interesses com esta.
Já a violação do art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM traduz um conflito de interesses mais específico e centrado na actividade do B... enquanto intermediário financeiro e, embora os factos de base sejam aqueles acima mencionados (vertidos nos factos 480 a 512 deste processo)- o mesmo contexto - a eles acrescem todos os vertidos nos factos 395 a 405 e 480 a 515, que revelam um conflito de interesses com os clientes do B..., a quem o referido papel comercial foi disponibilizado, sem que o intermediário financeiro se organizasse por forma a identificar e a evitar o risco de ocorrência desses conflitos de interesses, sem ser assegurado aos clientes do B... um tratamento transparente e equitativo, e sem ter sido dado prevalência aos interesses dos clientes do B..., tanto em relação aos interesses do próprio recorrente AA, quer aos interesses das sociedades do grupo.
A identidade naturalística de factos é demasiado redutora para permitir, por si só, concluir por qualquer violação do princípio in bis in idem, devendo exigir-se, tal como entendimento acima transcrito do Prof. Germano Marques da Silva e consagrado de forma muito consistente e aprofundada pelo Tribunal Constitucional, que esse circunstancialismo fáctico idêntico assuma também o mesmo desvalor jurídico, apelando-se a um conceito normativo de idem, afastando-se a violação daquele princípio quando haja um desvalor plúrimo, um concurso real de contraordenações, ainda que os factos sejam substancialmente os mesmos.
Não obstante, sabemos não ser essa a orientação da jurisprudência firmada no TEDH, que assenta primordialmente no conceito naturalístico de idem, impedindo o julgamento e sancionamento dos mesmos factos ou factos substancialmente idênticos.
 Tal como nos dá conta a decisão proferida em 10.02.2009 (no caso Sergey Zolotukhin c. Russia, P. nº 1493903) na qual o TEDH veio afirmar que o art. 4º do Protocolo nº 7 à CEDH proíbe que uma segunda infracção seja punida com fundamento em actos idênticos, ou substancialmente iguais, aos que serviram de fundamento à primeira, qualquer que seja a sua qualificação jurídica (opção clara pelo idem factum e negação do idem crimen), descrevendo a identidade dos factos como um conjunto de circunstâncias fácticas concretas que envolvem o mesmo infractor e estão indissociavelmente ligadas no tempo e no espaço.
Aquela decisão abordou “a problemática da aplicação do princípio do ne bis in idem segundo o critério da prevalência da identidade dos factos (idem factum) materiais ou da identidade da infração (idem legal/mesma qualificação jurídica segundo o direito interno do Estado) e sua diferente natureza procedimental (administrativa/penal) concluindo que, a diferenciação de natureza e qualificação não obsta a essa identidade e viola assim a regra do art. 4º nº 1 do Pt7 à CEDH”.
A aplicação do princípio do ne bis in idem pelo TEDH exige a verificação de quatro condições:
1) a identidade da pessoa julgada ou punida;
2) a identidade dos factos em juízo;
3) a duplicação dos processos sancionatórios;
 4) o carácter definitivo de uma das decisões.
O art. 50º da Carta proíbe a aplicação, por factos idênticos, de várias sanções de natureza penal (ou contraordenacional) no termo de diferentes procedimentos instaurados para estes afins.
Também o TJUE tem sustentado de forma reiterada e consistente que o critério relevante para apreciar a existência de uma mesma infração é o da identidade dos factos materiais, entendidos no sentido da existência de um conjunto de circunstâncias concretas indissociavelmente ligadas entre si, que levaram à absolvição ou à condenação definitiva da pessoa em causa, independentemente da qualificação jurídica desses factos ou do bem jurídico protegido (entre outros, caso Straaten C-150/05 decisão de 28.09.2006; caso Kretzinger C-288/05 decisão de 18.07.2007; caso Kraaijenbrink C-367/05 decisão de 18.07.2007).
De igual modo no Acórdão do TJUE C-537/16 de 20.03.2018(caso Garlsson Real Estate SA e Commissione Nazionale per le Societá e la Borsa( Consob), o Tribunal apreciou a questão da natureza penal de sanção administrativa pecuniária (por manipulação de mercado)- afirmando a natureza penal daquela sanção, atenta a sua finalidade repressiva e o nível de severidade elevado, face ao montante da sanção- e adoptou como critério relevante para apreciar a existência de uma mesma infracção, o da identidade dos factos materiais, entendidos enquanto conjunto de circunstâncias concretas indissociavelmente ligadas entre si que levaram à absolvição ou à condenação definitiva da pessoa em causa, tendo também considerado irrelevante para efeitos da verificação da existência de uma mesma infração, a qualificação jurídica, no direito nacional, dos factos e o interesse jurídico protegido.
Porém, se atentarmos no aresto acima mencionado, deixou-se à instância nacional, a possibilidade de apreciar se o grau de identidade e de conexão entre todas as circunstâncias factuais a comparar é tal que seja possível declarar, á luz do critério acima mencionado, tratar-se dos «mesmos factos».
Mas mais, numa demonstração de que para a aferição da violação do princípio ne bis in idem não é apenas determinante a existência da identidade dos factos, o próprio TJUE, designadamente no Acórdão acima mencionado, justificou já algumas restrições àquele princípio com base no art. 52º/1 da Carta, quando resultantes de regulamentação nacional, que corresponda a um objectivo de interesse geral (naquele caso a salvaguarda da integridade dos mercados financeiros da União), sopesando, pois, o bem jurídico tutelado.
Tal como o voltou a fazer no Acórdão C-524/15 de 20.03.2018 (Luca Menci), em que analisou o interesse geral em apreço no caso – luta contra as infracções em matéria de IVA – concluindo que se poderá justificar o cúmulo de procedimentos e sanções (penal e administrativa de natureza penal), que têm finalidades complementares (admitindo, mais uma vez, uma restrição ao princípio ne bis in idem), declarando que pode justificar-se um cúmulo de procedimentos e de sanções de natureza penal quando estes visem, para a realização do referido objectivo, finalidades complementares que tenham por objecto, se for caso disso, aspectos diferentes da mesma conduta ilícita em causa, o que cabe ao órgão jurisdicional verificar.
O artigo 50º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia foi “interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual podem ser instaurados processos penais contra uma pessoa, por não pagamento do imposto sobre o valor acrescentado devido nos prazos legais, apesar de já lhe ter sido aplicada, pelos mesmos factos, uma sanção administrativa definitiva de natureza penal na aceção do referido artigo 50º, na condição de esta regulamentação
– visar um objetivo de interesse geral que seja suscetível de justificar esse cúmulo de procedimentos e de sanções, a saber, a luta contra as infrações em matéria de imposto sobre o valor acrescentado, devendo esses procedimentos e essas sanções ter finalidades complementares,
– conter regras que assegurem uma coordenação que limite ao estritamente necessário o encargo adicional que para as pessoas em causa resulta de um cúmulo de procedimentos, e
– prever regras que permitam assegurar que a severidade do conjunto de sanções aplicadas corresponde à gravidade da infração em causa.”
É neste contexto que se poderá chamar à colação  o art. 420º do CdVM que, consagra o concurso de infrações, prevendo expressamente que se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, o arguido é responsabilizado por ambas as infrações, instaurando-se processos distintos a decidir pelas autoridades competentes ( aplicável de igual modo em caso de concurso de contraordenações) e, que consagra a regra de que quando o mesmo facto der origem a uma pluralidade de infrações e de processos da competência de entidades diferentes, as sanções já cumpridas ou executadas em algum desses processos podem ser tidas em conta na decisão de processos ulteriores para efeitos de determinação das respectivas sanções, incluindo o desconto da sanção já cumprida e executada, se a natureza das sanções aplicadas for idêntica.
Relativamente ao requisito da identidade do bem jurídico também não acompanhamos a discordância dos recorrentes, porquanto se nos afigura que, embora o objectivo último do RGICSF e do CdVM seja a proteção da estabilidade do sistema financeiro, ou o princípio da confiança no mercado financeiro (nas instituições financeiras), os dois diplomas legais consagram a proteção de bens jurídicos complementares, não idênticos, que embora persigam aquele fim último, tutelam bens jurídicos específicos, com destinatários dos deveres de conduta diferenciados (embora possam coexistir em determinados casos).
Haverá, sim, uma situação de convergência de normas sancionadoras de natureza diversa, consagradas em regimes jurídicos diferentes, que consagram a tutela de bens jurídicos complementares, mas não exactamente coincidentes.
E, porque assim é, o legislador nacional teve o cuidado de prever a hipótese de um mesmo facto (ou factos substancialmente idênticos) poderem constituir simultaneamente crime e contraordenação, sendo nesse caso responsabilizado por ambas as infrações, instaurando-se processos distintos a decidir pelas autoridades competentes e, dando origem a uma pluralidade de infrações e de processos da competência de entidades diferentes (diferentes procedimentos contraordenacionais, como é o caso, da competência de autoridades administrativas diferentes- BP e CMVM), as sanções já cumpridas ou executadas em algum desses processos poderem ser tidas em conta na decisão de processos ulteriores para efeitos de determinação das respectivas sanções, incluindo o desconto da sanção já cumprida e executada, se a natureza das sanções for a mesma ( art. 420º do CdVM).
Este normativo mais não é do que concretização da restrição do princípio do ne bis in idem admitida expressamente pelo TJUE nos acórdãos acima mencionados, admitindo-se que o mesmo facto (ou factos substancialmente idênticos) possa dar origem a dois procedimentos contraordenacionais, que o mesmo arguido seja punido em simultâneo por duas infrações, em face da relevância dos interesses juridicamente protegidos por mais do que um regime sancionatório- a proteção da integridade dos mercados financeiros da União.
Essa possibilidade foi admitida como válida também pelo Tribunal Constitucional, como se pode ler do Ac TC nº 298/2021, o qual aflorou mesmo o caso previsto no referido art. 420º do CdVM, não se concluindo por qualquer inconstitucionalidade decorrente da punição do concurso de infrações por aplicação do referido preceito legal.
Com maior acuidade se poderia colocar a violação do princípio ne bis in idem relativamente às infrações pelas quais os recorrentes tinham já sido condenados no Proc nº 58/... respeitantes ao conflito de interesses na colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., dada a aparente identidade dos factos ou identidade dos bens jurídicos.
Porém, como acima deixamos exposto, nem há identidade dos factos relevantes, nem há identidade dos bens jurídicos tutelados, como veremos.
 Focando-nos na questão da identidade dos bens jurídicos, secunda-se a bem fundamentada argumentação sufragada na sentença recorrida, citando-se o seguinte segmento:
(…)Como bem atenta a CMVM, em sede de alegações escritas, as condutas dos Recorrentes AA e BB que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação consistem em contributos causais daqueles Arguidos, em síntese, (i) para que o B... não se organizasse de modo a identificar uma situação de conflito de interesses e bem assim que não evitasse ou reduzisse ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, (ii) para que o B..., face ao conflito de interesses existente, não agisse de forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo, (iii) para que o B... não actuasse no exclusivo interesse dos seus clientes, bem como (iv) para a prestação de informação sem qualidade, pelo B..., aos investidores.
Estão em causa factos que não são objecto do processo de contra-ordenação do Banco de Portugal, desde logo porque não são objecto de tutela contra-ordenacional no âmbito do sector bancário, sendo que a distinção dos factos em apreço é confirmada, aliás, pela diversidade dos interesses jurídicos afectados pelas condutas que estão em causa num e noutro processo.
O artigo 309.º, n.ºs 1 a 3 do CdVM consagra deveres de conduta do intermediário financeiro em matéria de gestão do conflito de interesses que visam a transparência e a integridade do mercado, tentando evitar problemas sistémicos que podem advir de uma falta de confiança nos intermediários.
Por seu turno e ao contrário, o artigo 86.º do RGICSF prevê que “os membros do órgão de administração, diretores, e outros empregados, os consultores e os mandatários das instituições de crédito não podem intervir na apreciação e decisão de operações em que sejam direta ou indiretamente interessados os próprios, seus cônjuges, ou pessoas com quem vivam em união de facto, parentes ou afins em 1.º grau, ou sociedades ou outros entes coletivos que uns ou outros direta ou indiretamente dominem”.
Trata-se de uma norma que pretende evitar conflitos de interesses, mas que visa proteger, em primeira instância, a própria instituição de crédito face aos interesses dos membros do órgão de administração, directores, e outros empregados, consultores e mandatários. Está em causa uma norma evidentemente de cariz prudencial.
Por sua vez, o artigo 7.º do CdVM tutela a qualidade da informação divulgada no mercado de valores mobiliários. Já o artigo 211.º, alínea l), do RGICSF (na redacção vigente à data da prática dos factos), relativo à gestão ruinosa, visa a protecção da solvabilidade das instituições bancárias e da estabilidade do sistema financeiro.
Como muito bem defende a CMVM, em alegações escritas, “existem, por isso, não apenas factos diversos como interesses jurídicos diversos que podem ser autonomamente violados: desde logo, as normas em causa nos presentes autos, são normas que visam orientar a conduta do intermediário financeiro no exercício da sua atividade e na relação com os seus clientes (tendo um cariz comportamental), ao passo que as normas em causa no processo do Banco de Portugal visam assegurar a solvabilidade e solidez financeira da instituição (tendo um cariz prudencial). Não é por acaso que são infrações consagradas em ramos do Direito diversos, em normas diversas, aplicadas por entidades diversas, protegendo diversos sectores da vida e da regulação e consequentemente diversas redes de valores e de bens jurídicos.”
“Os interesses jurídicos protegidos pelo dever de informação, previsto no artigo 7.º do CdVM, e pelo ilícito gestão ruinosa, consagrada no 211.º, alínea l), do RGICSF (na redação vigente à data da prática dos factos), são bem distintos.
“Do mesmo modo, os interesses jurídicos protegidos pelo regime do conflito de interesses previsto no artigo 309.º, n.os 1 a 3 do CdVM e pelo regime previsto no artigo 86.º do RGICSF, são distintos. O artigo 309.º, nº 1 a 3 do CdVM estipula deveres ao intermediário financeiros que têm por objetivo evitar o conflito de interesses, ou no caso de este existir, deveres de gestão e de atuação, protegendo os próprios clientes do intermediário financeiro. Já o artigo 86.º do RGICSF proíbe a intervenção dos membros do órgão de administração, diretores, e outros empregados, os consultores e os mandatários das instituições de crédito na apreciação e decisão de operações em que sejam direta ou indiretamente interessados os próprios, seus cônjuges, ou pessoas com quem vivam em união de facto, parentes ou afins em 1.º grau, ou sociedades ou outros entes coletivos que uns ou outros direta ou indiretamente dominem, protegendo a própria instituição de crédito.
(…)Em suma, importa epilogar no sentido de que o princípio ne bis in idem não se mostra violado no vertente processo, dada a autonomia normativa existente entre os regimes sancionatórios suscitados e a diferença dos interesses jurídicos tutelados pelos mesmos regimes sancionatórios. Por outro lado, os factos (numa visão normativa) que são julgados nestes autos não são os mesmos, já que o seu sancionamento realiza e protege interesses jurídicos distintos. Por seu turno, o n.º 5 do artigo 29.º da CRP não proíbe a dupla valoração de factos, ou seja, a derivação de efeitos e consequências jurídicas distintas em diversas ordens do sistema jurídico, quando os mesmos apresentem um desvalor autónomo e distinto.
Na verdade, entre os três processos existe uma relação material e temporal suficientemente estreita, onde as finalidades de um completam o do outro, numa relação de complementaridade entre os diversos aspectos da conduta lesiva para a sociedade, atenta a dualidade prática e jurídica dos três processos em evidência.
Reforçamos que estamos perante três processos, dois de contra-ordenação da competência de entidades distintas com competências sectoriais autónomas e outro de natureza estritamente criminal, nenhum acabando por esgotar nem a matéria de facto nem as infracções referentes à emissão de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A nos períodos em causa nos autos. “
Relativamente às infrações respeitantes á gestão ruinosa e à violação dos deveres de informação é por demais evidente a inexistência de violação daquele princípio, não existindo igual desvalor jurídico na violação da infração ao art. 86º do RGICSF e na do art. 309º do CdVM, sendo igualmente distintos os bens jurídicos tutelados, não havendo consunção entre as infrações em causa.
Contrariamente ao defendido pelo recorrente AA, a contraordenação de gestão ruinosa, punida pelo art. 211º l) do RGCIFS, não abrange o desvalor jurídico subjacente à contraordenação relativa à violação do art. 7º do CdVM, sendo evidente que pode haver actos de gestão ruinosa dos administradores sobre uma instituição financeira, susceptíveis de pôr em risco a liquidez e solvabilidade da instituição, de molde a afectar a confiança e estabilidade do sistema financeiro, sem que simultaneamente haja violação de deveres de informação enquanto intermediário financeiro. Havendo simultaneidade de violação daquelas normas contraordenacionais- normas de conduta- não há concurso aparente ou consunção, persistindo desvalores jurídicos diferenciados.
O tipo legal das infrações pelas quais os aqui recorrentes foram condenados no Proc. Nº 58/..., punidas pelos arts. 86º e 211º do RGICSF não esgotam o desvalor jurídico do comportamento dos recorrentes, existindo um desvalor acrescido e suficientemente autónomo punido pelos arts. 309º e 7º do CdVM.
Improcede, pois, este segmento recursivo.
*
6ª- Nulidade da decisão final por imputação genérica de factos e consequente nulidade da sentença recorrida.

Sustenta o recorrente, sob as Conclusões 178 a 193, que a decisão recorrida é nula por falta de concretização dos factos imputados ao recorrente em violação do disposto no art. 58º nº 1 al. b) do RGCO e no art. 414º-A nº 2 do CdVM.
Alega para o efeito que, a decisão condenatória deve indicar elementos de facto e as circunstâncias de modo, tempo e lugar dos factos imputados, sob pena de ser impossível exercer o contraditório de forma efectiva sobre imputações genéricas, violando o direito de defesa consagrado no art. 32º nº 10 do RGCO, o que acontece com os factos genéricos e conclusivos vertidos nos factos provados 114, 117, 119, 120, 127, 128 a 131, 137, 544 a 549, 553 a 555, 557, 558, 562, 563 e 565 da decisão da CMVM e que correspondem aos factos provados 101, 104, 106, 107, 114 a 118, 124, 490 a 495, 499 a 501, 503, 504, 508 e 509, 511 da sentença.
Desde já se salienta que este tribunal de recurso não conhece de vícios da decisão administrativa, porquanto objecto de recurso é a decisão judicial proferida pelo tribunal de 1ª instância, de modo que, a apontada nulidade ter-se-á de aferir de acordo com o que consta do texto da sentença recorrida, não sendo aplicável nem o art. 58º do RGCO, nem o art. 414º-A nº 2 do CdVM que se referem apenas à acusação/decisão administrativa.
Não obstante, afigura-se-nos que a sentença recorrida não padece de falta de concretização dos factos imputados ao aqui recorrente, nem a existir a mesma consubstanciaria qualquer nulidade insanável, porquanto o arguido percebeu perfeitamente os factos que lhe foram imputados e pelos quais foi condenado, conforme se pode ver da profusa defesa apresentada, estando os factos integradores das infrações que lhe foram imputados perfeitamente concretizados, assim como o circunstancialismo espacio-temporal dos factos relevantes relativos aos elementos objectivos das referidas infrações, podendo ser menos exigente a redação dos factos complementares e que contextualizam a prática das infrações, pelo que, conclui-se que o recorrente não viu coartada a possibilidade de defesa e exercício do contraditório relativamente a quaisquer dos factos essenciais à sua condenação.
No que toca aos mencionados factos provados 101, 104, 106, 107, 114 a 118, 124, 490 a 495, 499 a 501, 503, 504, 508 e 509, 511 da sentença, parte deles são descritivos de um modus operandi, circunstanciais e, naqueles que relatam reuniões e decisões está descrito o contexto, o autor das decisões e os assuntos envolvidos, não sendo imperativo que estejam exaustivamente concretizados em termos de tempo e modo para que o recorrente os apreenda e possa deles defender-se, como efectivamente o fez.
De todo o modo, esta alegação, embora sob a qualificação de nulidade mais não é do que uma tentativa de reanálise da referida matéria de facto, o que está vedado a este Tribunal.
Deste modo, improcede este segmento recursivo.

7ª- Nulidade do processo por utilização de prova proibida e nula produzida no ....

Sob as Conclusões 194 a 236 o recorrente sustentou que a acusação, a decisão final e a sentença recorrida são nulas por a CMVM ter utilizado prova proibida e nula que foi produzida no processo de contraordenação nº 58/... promovido pelo Banco de Portugal, por a prova obtida pela CMVM ter sido completamente condicionada e dependente da prova produzida naquele processo, tendo o aludido processo sido “transportado ou integrado” com todos os seus elementos e vícios em 6 de Agosto de 2015 numa fase muito incipiente e quando ainda nenhuma prova havia sido carreada para os presentes autos, nem havia sido realizada qualquer diligência probatória.
Relativamente à alegada prova proibida e nula contida no ... o recorrente refere-se à seguinte prova:
- registo fonográfico das reuniões do chamado “Conselho Superior do G...” cujas gravações inicialmente o recorrente desconhecia e que em qualquer caso nunca consentiu na sua utilização/divulgação- consubstancia o crime de gravações ilícitas p.p no art. 199º do CP;
-inquirição das testemunhas III e JJJ que mantiveram a qualidade de testemunhas apesar de terem reconhecido que cometeram ilícitos penais e contraordenacionais, o que imporia a sua constituição como arguido, não tendo sido constituídos arguidos em contrapartida de imputarem factos ilícitos ao recorrente, tendo sido utilizados como delatores premiados- violação do art. 58º nº 1 al. a) e d) do RGCO, art. 103º nº 4, art. 126º nº 1 e 2 al. a) do CPP.
Concluiu que, a junção do ... aos presentes autos, incluindo aquela prova nula, fez com que toda a prova produzida nos presentes autos daí por diante seja igualmente nula, por força da doutrina ou teoria dos frutos da árvore envenenada, atingindo essa nulidade a acusação deduzida pela CMVM, a decisão final e a sentença recorrida ( efeito à distância).
Como é evidente, apenas a nulidade da sentença recorrida poderá ser objecto de apreciação neste recurso, circunstanciada à alegada nulidade por utilização de prova proibida obtida no ..., nos termos do art. 126º do CPP.
Como se pode ver do Acórdão proferido no Proc. Nº 182/16.0YUSTR.L1 ( Recurso de Impugnação Judicial intentado pelo aqui recorrente contra a decisão administrativa condenatória emanad do BP no procedimento contraordenacional nº 58/...) nenhum daqueles meios de prova foi ali declarado prova proibida ou nula, sendo que relativamente aos referidos depoimentos testemunhais de III e JJJ o Tribunal da Relação que apreciou tal recurso decidiu de forma expressa e peremptória a questão que agora volta a ser aqui arguida, tendo ficado ali decidido que não ficara provada qualquer factualidade que evidenciasse terem sido tais testemunhas utilizadas pelo BP como delatores premiados, nem factualidade que demonstrasse que aquelas testemunhas tivessem tido qualquer participação nos factos que configuravam a prática da contraordenação de gestão ruinosa em causa naqueles autos, pois que da matéria de facto considerada provada a decisão de colocação da dívida da EI..., S.A aos balcões do B... não foi decidida e/ou executada com qualquer comparticipação de III ou JJJ e daí que eles não pudessem ser acusados daquela contraordenação p. e p. no art. 211º al. l) do RGICSF.
Curiosamente o recorrente alude na conclusão 210 que a testemunha III reconheceu que “cometeu ilícitos penais e contraordenacionais (desde logo com relevância à luz do RGICSF)”, porém não atribui à referida testemunha o cometimento da contraordenação sancionada pelo BP aos demais arguidos, entre eles o aqui recorrente.
O mesmo se passa quanto à testemunha JJJ,  relativamente à qual o recorrente é ainda mais lacunar, falando apenas de a sua inquirição “auto-imputar a prática de alegados factos ilícitos com relevância contraordenacional“.
Resulta evidente do ...( Proc. 182/16....) que nele as referidas testemunhas não poderiam ser arguidas porquanto nenhuns factos ficaram demonstrados que pudessem consubstanciar a prática pelas referidas testemunhas dos ilícitos contraordenacionais sancionados pelo BP em apreciação naqueles autos, não tendo participado nos factos relativos à colocação da dívida emitida pela EI..., S.A aos clientes do B..., não preenchendo a sua conduta a contraordenação de gestão ruinosa ali sancionada. 
Se factos de natureza criminal praticaram e confessaram não era o BP competente para a investigação e instauração de processo crime, sendo certo que, entretanto por matéria conexa com a provada naqueles autos vieram a ser constituidos arguidos pela autoridade judiciária com competência para o efeito.
Quanto à valoração do registo fonográfico das reuniões do Conselho Superior do G..., também não está demonstrado nos autos que essa gravações não fossem do conhecimento do aqui recorrente, ou que nunca tivesse consentido na sua utilização/divulgação.
De todo o modo, ainda que constituísse prova nula, o que não se concede, não foi assim declarada no processo onde foi obtida, nem se pode concluir, como o fez o recorrente, que a mesma afecta a matéria dos factos provados 369, 372, 373, 379, 380, 484 e 512 da sentença recorrida.
Vejamos.
Aqueles factos foram fundamentados pelo tribunal a quo na articulação de diferentes meios de prova, documental e testemunhal, não com base na audição dos referidos registos fonográficos, como se dá conta no seguinte excerto:
“No que tange à primeira parte do tema da reestruturação do G... (factos n.ºs 369 a 372), especialmente no que tange ao facto dessa reestruturação ter sido ou não decidida em sede do Conselho Superior do G..., na reunião de 07.01.2014, em termos probatórios, não existe grande controvérsia sobre o assunto, apesar do dissídio que parte dos Recorrentes insistem em pretender observar na prova.
Na verdade e em primeiro lugar, tal como avançou a decisão administrativa, encontra-se nos autos um documento que serviu de apoio à reunião de do Conselho de Administração da R..., S.A que teve lugar no dia 25 de Fevereiro de 2014 e onde se ratificou a proposta de reestruturação do G..., a qual se traduziu na aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A.
A R..., S.A era uma das peças centrais da reestruturação, na medida em que, como foi unissonamente referido por todas as testemunhas nos autos que sobre o assunto depuseram, iria passar a ser, após a reestruturação, a holding principal de acesso ao mercado que agregava o ramo financeiro e o ramo não financeiro do grupo – vide, a título de exemplo, depoimentos de UU, VV, NN, PP, TTTTT, LLLLL, JJJ e III.
De facto, a fls. 8817-8855 dos autos pode analisar-se o documento denominado “II. Pontos de informação e discussão (1)/ Evolução financeira da R..., S.A 2009-2013/ Orçamento R..., S.A para 2014/ Programa de Reestruturação do G... e implicações para a R..., S.A”.
A testemunha LLLLL – que, à data da prática dos factos constantes dos presentes autos, era Presidente da Comissão Executiva da R..., S.A – atestou precisamente que o dito documento fora elaborado pela Comissão Executiva da R..., S.A para servir de apoio à reunião do Conselho de Administração da R..., S.A, nos moldes acima mencionados.
 Ora, do referido documento de fls. 8817-8855, resulta que o seu conteúdo tem como fonte a “Apresentação do Programa [de Reestruturação do G...] ao Conselho Superior pela equipa financeira do B... (7 janeiro 2014)” (vide nota de rodapé das fls. 8826-8830) e que o plano de reestruturação do G... foi precisamente “aprovado pelo Conselho Superior a 7.jan.2014” (vide cabeçalho das fls. 8826-8830).
A fls. 8826-8830 deste documento consta ainda, designadamente, os objectivos da reestruturação, os contratos a celebrar, o impacto financeiro no balanço consolidado da R..., S.A, bem como a proposta de “aprovação da reestruturação organizativa de acordo com proposta anterior”.
Veja-se que, num documento interno do grupo, que se destinava precisamente ao Conselho de Administração de uma das empresas principalmente envolvidas na reestruturação, nenhum óbice ou pejo existiu em referir-se à expressão “aprovado pelo Conselho Superior”, o que logo evidencia que, independentemente dos efeitos jurídicos que essa aprovação pode acarretar, o certo é que era um órgão (para-societário), onde eram tomadas decisões e isso era assumido pelo grupo de forma transparente e cristalina.
Sobre estas asserções também não existiu grande controvérsia em termos de prova testemunhal, fluindo todos os depoimentos prestados nos autos no sentido exposto.
A título de exemplo e apontando os depoimentos que, por força das funções exercidas, considerámos mais expressivos, importa identificar:
TTTTT, Assessora do Conselho de Administração do B... que participou na elaboração do “Plano Complementar” ao “Programa de Reestruturação do G...”, afirmou ter estado presente precisamente na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014, porque foi apresentado o Plano Complementar que ia ser enviado ao Banco de Portugal, relativamente ao qual, como já verificámos, a testemunha integrou o respectivo grupo de trabalho.
Sem prejuízo da testemunha ter referido que apesar desta reunião, o plano teve de ser “aprovado nas várias entidades relevantes – os boards das respetivas sociedades” e insistir na natureza não definitiva do que lá foi decidido, o certo é que tal não infirma a deliberação que foi tomada em sede da reunião de 07.01.2014, independentemente de, obviamente, em termos formais, ter de existir deliberações das entidades envolvidas. Veja-se que a testemunha fez questão de começar a frase com a expressão “em última instância (quem decidiu a operação foram…)”, o que evidencia bem o carácter meramente formal da decisão das entidades do G... envolvidas.
As declarações prestadas por QQQ nos autos no sentido do Conselho Superior não ter qualquer poder jurídico, de falar, de decidir sobre certos aspectos, não inflete a nossa convicção, na medida em que, obviamente que sendo um órgão constituído à margem de uma estrutura formal societária, juridicamente não tinha poder para vincular as entidades envolvidas, mas o certo é que, na prática as vinculava.
Disso nos dá precisamente conta a testemunha LLLLL, Presidente da Comissão Executiva da R..., S.A à data da prática dos factos, que elucidou que a referida reestruturação apenas foi ratificada pelo Conselho de Administração da R..., S.A, a 25 de Fevereiro de 2014, ainda que com efeitos reportados a 31 de Dezembro de 2013, já quando a mesma estava operacionalizada definitivamente – veja-se que a reestruturação foi comunicada no portal da CMVM em 23.01.2014 (Comunicado de fls. 9.102 e 9.103 do Volume 21). Ou seja, daqui decorre que existiu uma decisão tomada por um órgão, ainda que para-societário, que foi imediatamente executada até à sua integral operacionalização, não sendo sequer esperado pelo G... que os “boards das respetivas sociedades” envolvidas, nas palavras de TTTTT, ratificassem o decidido.
Esta actuação evidencia bem o peso que uma decisão tomada ao nível do Conselho Superior do G... tinha em sede do grupo.
O facto de ter existido uma verdadeira decisão tomada em sede do Conselho Superior do G... está bem evidenciada no depoimento isento, objectivo e esclarecedor e com conhecimento directo acerca da implementação do plano de reestruturação, da referida testemunha TTTTT, no sentido de que logo após a passagem pelo Conselho Superior do G..., o que lá havia sido aprovado, passou imediatamente à sua fase de execução – vide TTTTT,
Ou seja, para se avançar com a execução foi necessário precisamente passar pelo escrutínio daquele órgão, tendo o mesmo de “dar luz verde” para que se avançasse, como imediatamente avançou.
Ora mal se percebia o motivo pelo qual um projecto tivesse de passar pelo crivo de um órgão constitudo à margem de uma estrutura societária para poder avançar se nenhum poder decisório esse órgão tivesse. Obviamente que formalmente não existiu uma decisão no sentido dessa decisão poder vincular juridicamente as entidades envolvidas, mas que esse órgão deliberou que se avançasse com o plano de reestruturação do G... não temos qualquer tipo de resquício de dúvida. E que as entidades envolvidas reconheciam esse poder àquele órgão, também não temos qualquer dúvida.
Por isso, independentemente da prova testemunhal complementar que os Recorrentes pretendessem realizar a propósito, sobre os efeitos jurídicos daquilo que se deliberou em sede do Conselho Superior do G..., essa prova seria totalmente inócua. Saber se o aprovado se pode apelidar juridicamente de decisão ou não, é totalmente inócuo para esta matéria de facto. Naturalisticamente foi tomada uma decisão/deliberação, sim, de avançar com a reestruturação.
Aliás, o poder que era assumido em sede de Conselho Superior do G... é bem ilustrado pela transcrição da reunião de 07.01.2014, de fls. 15909, onde é bem evidente que a pretensa mera exposição sobre o que era o plano de reestruturação se tornou numa conversa acerca de concretizações e não de meras possibilidades. Os participantes falam das entidades envolvidas no projecto, com uma certeza sobre a implementação dos processos que lhes estavam destinados, que não nos deixa quaisquer dúvidas acerca da natureza do órgão. Até porque se nada lá se decidisse, mal se percebia o motivo de levar a este tipo de “fórum” matérias com a importância como as que foram discutidas no dia 07.01.2014, com efeitos sobre distintas sociedades pertencentes ao G.... Julgamos que AA (e os demais) que na sua impugnação judicial se lamentou de uma agenda bastante preenchida e de um trabalho que pouco tempo lhe deixava, não teria qualquer tipo de interesse em perder esse escasso tempo em reuniões infrutíferas e inúteis, como os Recorrentes insistem em defender.
Na verdade, também a testemunha LLLLL não teve qualquer hesitação em afirmar ser o Conselho Superior do G... o órgão da Família Es... que decidia os negócios do G....
Também a testemunha NN, à data dos factos, administrador executivo com o pelouro financeiro da R..., S.A, identificou o mesmo órgão para-societário como o órgão no qual se tomavam decisões sobre o G..., confirmando ter sido nessa sede onde se aprovou o plano de reestruturação do G... a 7 de Janeiro de 2014.
Nas suas palavras elucidativas, “o Conselho Superior do G... não era o órgão formal da EI..., S.A, que era o nosso acionista, mas na prática era o fórum de decisão. O processo, na génese, não foi nosso, foi do acionista, cabendo-nos o papel de operacionalização e de ratificação.”
A par da testemunha LLLLL, também NN confirmou, desta feita, que ao Conselho de Administração da R..., S.A coube apenas operacionalizar o plano de reestruturação em causa, sendo que esta apenas foi ratificada pelo mesmo em 25 de Fevereiro de 2014, data em que parte do plano já estava implementado.
Também a testemunha JJJ, que assumia, simultaneamente, as funções de senior manager da EI..., S.A, secretário do Conselho Superior do G... e membro da equipa que preparou a proposta de reestruturação do G..., quando questionado sobre quem decidiu a realização das operações de aquisição, pela R..., S.A, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e de concentração nesta última das acções da E..., S.A de que o denominado G... era titular, respondeu: “os membros do Conselho Superior do G...”.
Por seu turno, também nesta sede foi contundente o depoimento da testemunha PP, colaborador do G..., que participou na elaboração do “Programa de Reestruturação do G...” na parte contabilística desta operação e que demonstrou amplo conhecimento sobre o funcionamento do G... e a forma como eram tomadas decisões nessa sede. Com efeito, quando questionado sobre quem decidiu a realização das operações de aquisição, pela R..., S.A, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e de concentração nesta última das acções da E..., S.A de que o denominado G... era titular, respondeu não saber em concreto, “mas do que conheço do funcionamento do G... – dos anos em que trabalhei lá – julgo que terá sido o Conselho Superior e, em especial, o Dr. AA, que era quem tinha a visão mais geral do G...”.
Ora, este depoimento consolida a nossa convicção sobre o papel do Conselho Superior do G... em sede do grupo, alinhando-se esta forma de tomada de decisão acerca das questões relacionadas com o G..., amplamente descrito pelas testemunhas, com o facto de efectivamente, uma alteração com a dimensão e importância que consistia para o grupo, ser decidido por aquele órgão, a quem era amplamente reconhecido poder para determinar que as sociedades integradas no grupo agissem de acordo com as decisões que tomava. Tanto assim era que, repetimos, o plano de reestruturação avançou, independentemente da ratificação formal pela R..., S.A acima aludida, que apenas se deu no cerca de um mês depois da reestruturação estar operacionalizada / executada / concluída.
Para além disso, tal como revelou o Recorrente CC, o Conselho Superior do G... tinha uma regulamentação interna em vigor à data dos factos, aprovada a 23 de Maio de 2011, aprovada pelo próprio Conselho, em sede da qual foi estabelecido que cabia a este órgão o seguinte, designadamente: a missão de zelar, de forma permanente, pela preservação e realização dos interesses do G... e das actividades das sociedades que o compõem, incumbindo-lhe, designadamente, o acompanhamento e avaliação da actividade e da administração das sociedades participadas e a apreciação, análise, debate e decisão sobre assuntos de natureza estratégica, decidindo, nomeadamente, sobre a aquisição, alienação ou oneração de participações sociais das sociedades que compõem o G..., bem como dos activos detidos por tais sociedades quando estes pelo seu valor intrínseco assumam natureza estratégica no conjunto das actividades desenvolvidas pelo G...; diminuição, por qualquer forma, do peso relativo das partes sociais detidas pelo G... em sociedades suas participadas; alteração da titularidade do capital social das sociedades directa ou indirectamente dominadas pela Ec..., S.A.; e alteração relevante aos contratos de sociedade das participadas da Ec..., S.A..
Ou seja, apesar do que especialmente o Recorrente AA advoga, o certo é que foi o próprio Conselho Superior do G... se auto-intitulou como órgão com poder decisório dentro do denominado “G...”, o que era acatado pelas entidades que nele se incluíam, como verificámos da prova testemunhal e documental analisada.
Para além disso, apesar de insistentemente pretender refutar evidências, foi o próprio Recorrente AA que na sua impugnação escreveu que a nomeação de WW para fazer parte da task force da EI..., S.A após a descoberta da situação do passivo teve de ser aprovada pelo Conselho Superior do G..., o que bem denota o peso que o ógão tinha no grupo, em termos decisórios.
A epilogar, é impossível não referir a carta que o próprio Conselho Superior do G... enviou ao Banco de Portugal em 03.12.2013, constante de fls. 9630, onde se assume como órgão com capacidade para fazer propostas de resolução de problemas que ocorriam na EI..., S.A, junto daquele regulador, se assume com poder “para realizar o plano de acção que propomos” e como órgão que representava todo o denominado “G...”, propondo-se a reuniões mensais com o Banco de Portugal nessa qualidade.
Avançando.
Os contratos relativos à referida operação de reestruturação foram celebrados a 22 de Janeiro de 2014, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013 e a operação divulgada no site da CMVM, conforme referido, a 23 de Janeiro de 2014 (vide fls. 7507-7525, 8909-8913v e 9202-9203).
Quanto aos demais factos integrados neste sub-grupo, como sendo a composição do Conselho Superior do G... e a sua natureza para-societária (primeira parte do facto n.º 370 e facto n.º 371) e quem secretariava as reuniões do referido órgão (facto n.º 372), trata-se de matéria relativamente à qual não existiu controvérsia por parte dos Recorrentes, sendo certo que a mesma foi concludentemente afirmada, nas partes em que depuseram e de que tinham conhecimento, pelas testemunhas já acima referidas e ainda pela testemunha CC.
Quanto aos Recorrentes que participaram na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014 foi matéria unissonamente atestada por todas as testemunhas que tinham conhecimento directo sobre o facto em causa, onde se destaca, atenta a sua razão de ciência, as testemunhas TTTTT e JJJ.
Por referência aos factos n.ºs 373 a 377 e 379, como não poderia deixar de ser, atento o seu papel central nos factos em questão, foi preponderante o depoimento de TTTTT, que os atestou, não existindo nos autos outros meios de prova com semelhante proximidade aos factos capazes de inverter o testemunho credível, por isento e coerente, que pela testemunha foi prestado. Para além disso, o seu depoimento foi ainda corroborado por outros meios de prova que o tribunal considerou igualmente credíveis, como sendo, as testemunhas UU, PP, NN e LLLLL  e pelo teor do documento de fls. 8108-8115v, maxime 81110v, de onde se extrai precisamente a transformação pretendida da R..., S.A na holding das participações sociais do G... na área financeira e não financeira, de acordo com o esquema, conforme provado no facto n.º 374.
Quanto ao facto provado n.º 378 (em algumas das reuniões de preparação da proposta participaram, para além dos referidos RR, JJJ, NN e PP, os arguidos AA, BB, DD e EE, bem como UU, LLLLL, VV e colaboradores do BEl...), o tribunal considerou, de forma compaginada, os seguintes depoimentos/declarações, que depuseram sobre a factualidade em questão, tendo conhecimento directo sobre a mesma:
- depoimento da testemunha UU, Directora Coordenadora do DFME, que confirmou a sua presença em várias reuniões nas quais se discutiu a reestruturação do G..., apesar de não integrar o grupo de trabalho a propósito daquela reestruturação do G..., limitando-se a sua intervenção como representante da Direcção Financeira do B..., com a experiência inerente a operações de mercado.
Tendo afirmado a sua participação nas referidas reuniões, a testemunha UU referiu ainda que, nas mesmas, estiveram também presentes os Recorrentes AA, BB, EE e DD, bem como II, LLLLL, NN, JJJ, VV, RR, e elementos do BEl...;
- Tal como afirma a decisão administrativa, a afirmação de UU quanto à participação daqueles intervenientes nas referidas reuniões onde se discutia o plano de reestruturação do G... é congruente com as funções desempenhadas por cada um deles nas entidades em causa e bem assim com as matérias em discussão.”
Diz o recorrente que todas as provas que tiverem sido alcançadas por via do registo áudio em causa são igualmente prova afectada pela nulidade e proibição de valoração inicial, porém,  mesmo que a audição daquele registo audio consubstanciasse prova proibida, não se afigura que aqueles depoimentos testemunhais e prova documental  só tenham sido obtidos pela CMVM por via daquela audição.
Como bem se decidiu, de forma pertinente e adequada, na sentença recorrida, “ainda que a prova produzida no âmbito do processo contra-ordenacional instaurado pelo Banco de Portugal fosse nula, o certo é que a existência de prova nula não tem o efeito automático de determinar a nulidade de toda a prova produzida nestes autos (autónomos, reforçamos).
De acordo com o acórdão da Relação de Lisboa de 03.07.2012, processo n.º 14538/10.4TFLSB.L1-5, in www.dgsi.pt, “a doutrina dos “frutos da árvore venenosa”, não tem o sentido de um forçoso e inevitável “efeito dominó” que arraste, forçosamente, em cascata, todas as provas que, em quaisquer circunstâncias, apareçam em momento posterior à prova proibida e com ela possam, de alguma forma, ser relacionadas, antes abrindo um amplo espaço à ponderação das situações concretas, não conduzindo necessariamente à invalidação de todas as provas posteriores à prova ilegal”.
Também o Tribunal Constitucional se pronunciou sobre a questão da valoração de prova indirecta, aceitando o efeito à distância da prova proibida sujeito a limitações, no âmbito do acórdão n.º 198/04, nos seguintes moldes:
A “(…) possibilidade de projecção de efeitos assume particular importância no caso das proibições de prova. Com efeito, quando retrospectivamente se diz, encarando globalmente certo processo-crime, que determinada prova não é valida, retirando-se como consequência que a mesma, embora tenha existido, deve ser tratada como se não existisse (não tivesse existido), há que determinar complementarmente - é esse, como veremos, o sentido do artigo 122.º do CPP - se essa inexistência abrange ou não actos processuais (factos ou provas) posteriores que apresentem alguma conexão com o que foi considerado inexistente. Saber qual o tipo de ligação que deve conduzir à projecção da supressão do acto anterior no acto posterior traduz aquilo que doutrinariamente se qualifica como «efeito à distância», indagando este «da comunicabilidade ou não da proibição de valoração aos meios secundários de prova tornados possíveis à custa de meios ou métodos proibidos de prova» (Manuel da Costa Andrade, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, Coimbra, 1992, p. 61). (…) Pode, assim, afirmar-se com segurança que o sentido de uma norma prescrevendo que a invalidade do acto nulo se estende aos que deste dependerem ou que ele possa afectar (artigo 122º, n.º 1, do CPP) é, desde logo, o de abrir caminho à ponderação que — como adiante se verá — subjaz à chamada doutrina dos «frutos proibidos». Isto, cotejado com a apontada amplitude das garantias de defesa contidas no artigo 32º da CRP, leva a que este Tribunal considere que, efectivamente, certas situações de «efeito à distância» não deixam de constituir uma das dimensões garantísticas do processo criminal, permitindo verificar se o nexo naturalístico que, caso a caso, se considere existir entre a prova inválida e a prova posterior é, também ele, um nexo de antijuridicidade que fundamente o «efeito à distância», ou se, pelo contrário, existe na prova subsequente um tal grau de autonomia relativamente à primeira, que a destaque substancialmente daquela. Outro sentido não tem, aliás, a doutrina dos «frutos da árvore venenosa», desde a sua formulação no direito norte-americano, que não seja aquele que exige a ponderação do caso concreto, determinando a existência ou não, desse nexo de antijuridicidade entre a prova proibida e a prova subsequente que exige para esta última o mesmo tratamento jurídico conferido àquela”.
De igual forma, o acórdão do STJ de 12.03.2009, processo n.º 09P0395, in www.dgsi.pt, defende a existência de limitações no que toca aos efeitos à distância da prova proibida, pugnando o seguinte entendimento:
O “(…) efeito à distância da prova proibida nunca poderá alcançar uma abrangência que congregue no seu efeito anulatório provas que só por uma mera relação colateral, e não relevante, se encontram ligadas à prova proibida ou que sempre se produziriam, ou seria previsível a sua produção, independentemente da existência da mesma prova proibida.
“Nada obsta a que as provas mediatas possam ser valoradas quando provenham de um processo de conhecimento independente e efectivo, uma vez que não há nestas situações qualquer relação de causalidade entre o comportamento ilícito inicial e a prova mediatamente obtida. Pode afirmar-se que o efeito metastizante da violação das regras de proibição de prova apenas tem razão de ser em relação à prova que se situa numa relação de conexão de ilicitude.
“Não está abrangida pela conexão de ilicitude a prova produzida quando os órgãos de investigação criminal dispõem de um meio alternativo de prova, ou seja, de um processo de conhecimento independente e efectivo, nem nas situações em que a “mancha” do processo é apagada pelas próprias autoridades judiciárias ou através da actuação livre do arguido ou de um terceiro. O mesmo se dirá em relação à prova produzida através de uma prova ilícita pela sua proibição quando for imperativa a conclusão de que o mesmo resultado probatório seria sempre atingido por outro meio de obtenção de prova licitamente conformado”.
Nestes termos, existem três limitações ao efeito à distância da prova proibida:
a) a prova independente ou a descoberta inevitável (inevitable source).
De acordo com a mesma, existe uma limitação ao efeito à distância, sempre que se puder concluir pela ocorrência de determinado facto, mediante provas obtidas licitamente, ainda que o conhecimento desse facto advenha de prova ilícita, desde que aquelas provas licitamente obtidas sejam independentes, isto é, não tenham uma conexão causal com a prova ilícita directa ou derivada. Se pela prova lícita se obtém inevitavelmente o conhecimento do facto está excluída a eficácia reflexa da prova proibida.
b) o resultado, apesar da prova proibida, seria sempre e inevitavelmente alcançado.
Em conformidade com esta limitação, o funcionamento da doutrina da “árvore envenenada” é obstaculizado quando se demonstra que uma outra actividade investigatória, apesar de não levada a cabo por força da descoberta do facto através da prova proibida, seguramente iria ocorrer na concreta situação, o que determinaria, inexoravelmente, o mesmo resultado.
c) a “mácula dissipada” (purged taint limitation).
Esta terceira limitação da doutrina da “árvore envenenada” consiste numa prova que deriva de uma outra prova proibida poder ser aceite quando os meios de alcançar aquela representam uma forte autonomia relativamente a esta, de tal modo que existe uma evidente atenuação da ilegalidade pregressa.
Nesta conformidade, ainda que se pudesse concluir que a prova consistente nas gravações das reuniões do Conselho Superior do G... e nos depoimentos das testemunhas III e JJJ obtidas em sede do processo contra-ordenacional instaurado pelo Banco de Portugal era prova nula, o certo é que tal não arrastaria, automaticamente, a nulidade de toda a prova produzida nestes autos.
A CMVM, com base nas notícias veiculadas pela Imprensa sobre a questão do Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A por referência aos períodos que estão em causa nos autos (a existência dessas notícias é um facto notório) poderia desencadear averiguações, sendo certo que facilmente teria acesso às gravações do Conselho Superior do G... através das prerrogativas conferidas por lei, nomeadamente as elencadas no artigo 385.º do CdVM.
Bem como facilmente teria conhecimento de que as duas testemunhas que o Recorrente coloca em causa, III e JJJ, tinham conhecimento directo dos factos, não precisando do processo contra-ordenacional instaurado pelo Banco de Portugal para, desde logo, poder concluir que o primeiro, III era o “comissaire aux comptes” da EI..., S.A e JJJ era o sénior manager, responsável pela gestão da tesouraria da EI..., S.A e de todo o G....
São funções que são identificadas em vários documentos, sendo certo que a CMVM facilmente teria acesso a esses documentos, quer mediante a sua apreensão quer pela obtenção de esclarecimentos e informações junto de quaisquer pessoas relacionadas funcionalmente com as entidades envolvidas.
Tendo em vista os factos que se discutem nos autos e as funções exercidas pelas duas testemunhas em apreço, a CMVM, independentemente do Banco de Portugal as ter interrogado, facilmente concluiria, no âmbito das suas averiguações, pela essencialidade para a descoberta da verdade material questionar aquelas duas pessoas que estavam no centro da contenda e inquiri-las, de forma autónoma e independente, nestes autos, como a CMVM acabou inclusivamente por fazer.
O que se poderá discutir nestes autos é, ainda assim, a própria validade da prova consistente nas gravações do Conselho Superior do G... que foram incorporadas nestes autos, não numa perspectiva de cópia provinda de outro processo, mas como prova autónoma e independente, caso se considere que é possível, nestes autos, discutir essa validade, apesar do trânsito em julgado da sentença proferida no âmbito do processo n.º 182/16.....
No que tange às referidas gravações, o Recorrente considera que as mesmas constituem a prática do crime de gravações ilícitas, previsto e punido pelo artigo 199.º do Código Penal, pelo que o CD junto aos autos a fls. 708 do processo n.º 58/..., e integrado a fls. 1.561 dos presentes autos, constitui prova nula e inadmissível, que não pode ser valorada, tudo ao abrigo dos artigos 125.º e 167.º do Código de Processo Penal ex vi artigos 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM. Por isso, o Recorrente defende que, nos termos do disposto nos artigos 125.º e 167.º do CPP (aplicáveis ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM) e artigo 199.º do Código Penal, as gravações do Conselho Superior do G..., de fls. 708 do processo n.º 58/..., integrado a fls. 1.561 dos presentes autos, devem ser declaradas nulas, com a consequente anulação da Acusação e demais actos subsequentes, em particular, a Decisão Recorrida.
Ora, ainda que vingasse a tese do Recorrente no sentido de que as gravações em causa consistem em prova proibida, o certo é que os factos que se extraem das mesmas e que foram considerados no âmbito da decisão administrativa, facilmente seriam obtidos, como acabaram por ser, através de outros meios de prova totalmente independentes.
Em primeiro lugar, resulta dos autos que, apesar das gravações, na sequência das reuniões do Conselho Superior do G..., eram realizadas actas – vide, a título meramente exemplificativo, o depoimento de JJJ, que era o próprio secretário que realizava as actas dessas reuniões. A CMVM, através das prerrogativas conferidas por lei, nomeadamente as elencadas no artigo 385.º do CdVM, poderia ter sempre obtido tais actas, de onde consta o discutido e decidido em sede de tais reuniões.
Para além disso, à data da prática dos factos em causa no presente processo de contra-ordenação, o Conselho Superior do G... era composto pelas seguintes pessoas:
(i) XXXX (Presidente);
(ii) YYYY;
(iii) AA;
(iv) BB;
(v) CC;
(vi) QQQ;
(vii) HHH;
(viii) PPP;
(ix) AAAAA.
Acresce que as reuniões do Conselho Superior do G... eram secretariadas por JJJ.
Assim sendo, também o que fora discutido e o que fora decidido em sede das reuniões em causa sempre poderia ter sido objecto de ampla prova testemunhal, como aliás o foi.
Ora, existindo, como existiu, meios alternativos de prova, ou seja, um processo de conhecimento dos factos totalmente independente e efectivo, a eventual nulidade que é suscitada pelo Recorrente nunca teria o condão de determinar a nulidade da demais prova produzida e muito menos a nulidade da própria acusação e da própria decisão administrativa.
Com efeito, a eventual nulidade de prova não tem o condão de determinar a nulidade de actos processuais autónomos, dependentes de uma vontade livre, apenas determinando a inadmissibilidade do seu uso, mas prosseguindo os autos, especialmente nesta fase em que já decorreu o julgamento, sendo proferida decisão com base na prova que puder ser usada.
Com efeito, “as exigências legais para determinar o efeito à distância das provas proibidas (artigo 122.º, n.º 1 do CPP), os limites a esse efeito reconhecidos pela lei, pela doutrina e pelo Tribunal Constitucional e o dever legal de aproveitamento de actos processuais (artigo 122.º, n.º 3 do CPP),  impõem que se aproveite a prova autónoma e não dependente da prova proibida” – vide Jorge de Figueiredo Dias, Manuel da Costa Andrade e Frederico de Lacerda da Costa Pinto, in “Supervisão, Direito ao Silêncio e Legalidade da Prova”, Almedina, pág. 125.”
Concorda-se inteiramente com o decidido pelo tribunal a quo, porquanto afigura-se-nos que a documentação que serviu de prova às reuniões do chamado “Conselho Superior do G...” e as testemunhas acima identificadas ( prova cuja nulidade o recorrente pretendia fazer extender a estes autos) são meios de prova a que a CMVM com grande probabilidade obteria, no decurso de uma actividade investigatória independente e autónoma da do BP, até pelas funções exercidas por aquelas testemunhas numa das sociedades emitente do papel comercial objecto de investigação promovida pela CMVM, o que tornaria o conhecimento dos factos aqui sancionados uma descoberta inevitável, assim se afastando o efeito à distância de qualquer eventual nulidade da prova produzida no ....
Deste modo, considera-se que a sentença recorrida não se fundamentou em prova proibida ou nula, não padecendo da apontada nulidade decorrente do art. 126º do CPP, improcedendo, também, este segmento recursivo.

8ª- Violação do principio da igualdade e métodos proibidos de prova.

Sob as Conclusões 237 a 254 alegou o recorrente que a acusação, a decisão final e a sentença da 1ª instância são nulas porque violam o princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP dado que, perante os mesmos meios de prova a CMVM decidiu ( e a 1ª instância ratificou-o) de forma absolutamente arbitrária, imputar a alegada prática de uma contraordenação, mantendo os demais supostos intervenientes como testemunhas, em violação do disposto no art. 126º nº 2 al. d) e e) do CPP, referindo-se ao facto de III, JJJ e CCC não terem sido constituídos arguidos nos presentes autos, tendo a CMVM preterido esse acto obrigatório que contamina as suas inquirições de nulidade, assim como toda a prova produzida.
Mais alegou que aqueles mantiveram a qualidade de testemunha em contrapartida de prestarem depoimento, tendo sido utilizados como delatores premiados, o que é inadmissível à luz do art. 126º nº 1 e 2 al. d) e e) do CPP.
Relativamente ao facto de não terem sido constituídos arguidos, repete-se o raciocínio já vertido no Prco. Nº 182/16.0YUSTR.L1, porquanto, não existindo factualidade provada bastante para imputar àquelas testemunhas as contraordenações objecto destes autos- pois que nenhuma comparticipação causal relevante tiveram nos factos que integram as contraordenações imputadas ao recorrente relativas ao conflito de interesses, e violação dos deveres relativos à qualidade da informação dos intermediários financeiros- não poderiam nestes autos ser constituídos arguidos, não tendo sido preterido qualquer acto obrigatório que determine a nulidade da prova.
Pelos motivos acima expostos, também não existe qualquer identidade entre a situação das referidas testemunhas e a situação do recorrente( designadamente identidade de factos provados que impusessem que todos fossem constituídos arguidos) não tendo havido violação do princípio da igualdade.
Quanto ao facto de tais testemunhas terem sido utilizados como delatores premiados, constituindo método proibido de prova, o recorrente limita-se a levantar suspeitas, que não encontram qualquer arrimo na factualidade dada como provada.
Se os mesmos praticaram crime, a constituição de arguidos em processo crime não compete à CMVM, sendo certo que entretanto o foram pela autoridade judiciária competente no processo crime em curso.
Deste modo, nenhum princípio constitucional foi violado, designadamente a apontada violação do princípio da igualdade previsto no art. 13º da CRP, ou dos princípios  previstos nos arts 1º, 2º, 32º nº 10 da CRP, da Dignidade da Pessoa Humana e Estado de Direito ou garantias de defesa.
Pelas razões acima expostas, improcede este segmento recursivo.

9ª- Vícios relativos ao depoimento da testemunha CCC e nulidade da acusação, da decisão final e da sentença recorrida.

Sob as Conclusões 255 a 282 veio o recorrente arguir a nulidade, ou subsidiariamente, a irregularidade da acusação, decisão final e sentença recorrida, nos termos dos arts. 118º nº 1 e 120º nº 2 al. d) do CPP ex vi do art. 41º nº 1 do RGCO e 407º do CdVM, bem como por violação do disposto no art. 32º nº 10 da CRP.
Refere o art. 118º nº 1 do CPP que a violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei e, segundo o nº 2 nos casos em que a lei não cominar a nulidade o acto ilegal é irregular.
Alega o recorrente que a testemunha CCC foi inquirida por determinação da CMVM na fase administrativa do processo contraordenacional não constando dos autos quaisquer pedidos de cooperação internacional remetidos pela CMVM para a FINMA o que consubstancia uma nulidade prevista no art. 120º nº 2 al. d) do CPP, porque a falta da documentação do pedido de cooperação internacional consubtancia a insuficiência do inquérito/instrução pela falta da prática de um acto legalmente obrigatório.
Segundo o art. 120º nº 2 al. d) do CPP constituem nulidades dependentes de arguição a insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
Aquela nulidade tem de ser arguida nos prazos referidos no nº 3 do referido preceito legal.
Acontece que, não constar dos autos o pedido de cooperação internacional é uma coisa, e a alegada falta da prática desse acto é outra bem diferente, não estando demonstrado nos autos a falta daquela formalidade.
Independentemente disso, a falta de junção do pedido de cooperação internacional relativo a inquirição de uma testemunha não consubstancia insuficiência do inquérito, nem a sua falta está cominada na lei com nulidade.
A esse propósito concordamos com a decisão proferida pelo tribunal a quo, de acordo com a qual, “a inquirição de testemunhas no processo de contra-ordenação em apreço é regulada pelo artigo 409.º do CdVM e, subsidiariamente, pelas disposições do RGCO e do CPP.
À data da realização da diligência, sob escrutínio, o artigo 409.º do CdVM não preceituava expressamente sobre a inquirição de testemunhas residentes fora do território nacional ( ), tendo a CMVM recorrido a um mecanismo de cooperação internacional para efeitos de inquirição da testemunha CCC – vide ofício da FINMA de 6 de Abril de 2016, junto aos autos a fls. 4487 e ss. –, ou seja, o IOSCO Multilateral Memorandum of Understanding Concerning Consultation and Cooperation and the Exchange of Information (IOSCO MMoU) , que regula a assistência mútua e troca de informações entre autoridades de supervisão dos mercados de instrumentos financeiros, incluindo para efeitos sancionatórios, nos termos do ponto 6 (a), primeira parte, do IOSCO MMoU.
Tal como refere a decisão administrativa, o IOSCO MMoU não prevê qualquer norma que determine a obrigatoriedade dos pedidos de auxílio mútuo constarem dos processos da Parte Requerente, o que desde já permite concluir pela ausência de preterição de qualquer acto legalmente obrigatório por parte da CMVM, ao invés do alegado pelo Recorrente.
O citado instrumento de cooperação apenas estabelece a forma do pedido – que deve ser realizado por escrito (ponto 8 (a) do IOSCO MMoU) – visando permitir à Parte requerida determinar a autenticidade do pedido.
Assim, decorre do instrumento de cooperação internacional que as próprias formalidades do pedido não se destinam, teleologicamente, à tutela dos direitos dos Arguidos, ou seja, sequer a permitir-lhes sindicar se a prova foi obtida com observância dos requisitos legais.
Como bem defende a CMVM, em sede de decisão administrativa, na verdade, a conclusão sobre a legalidade da obtenção da prova não é sequer susceptível de ser alcançada através da observação do pedido de auxílio – como de resto a prova testemunhal não se sindica pela observação do ofício de notificação expedido à testemunha –, mas antes pelo auto de inquirição que descreve os termos da realização da diligência e conteúdo dos depoimentos prestados.
O ofício da FINMA de 6 de Abril de 2016, junto a fls. 4487 e ss., consente ao Recorrente AA averiguar o meio de obtenção de prova e os meios de prova obtidos, no quadro da inquirição da testemunha CCC.
Tal ofício e o correspondente auto de inquirição indicam, de forma cristalina e sem que a sua correcção e genuinidade tenha sido questionada por qualquer sujeito processual, incluído o aqui Recorrente AA, a forma como decorreu a inquirição da testemunha CCC.
Tais peças referem que a prova foi produzida em conformidade com o IOSCO MMoU, na sequência de um pedido de assistência da CMVM dirigido à sua congénere FINMA,  que CCC foi ouvido na qualidade de testemunha, que a diligência foi dirigida pelos colaboradores da FINMA, estando também presentes colaboradores da CMVM e que a informação e documentos recolhidos no âmbito da inquirição da testemunha apenas podem ser utilizados ou transmitidos a outras autoridades, tribunais ou organismos para os fins previstos no pedido de assistência.
Para além disso, decorre ainda das mesmas peças que a testemunha CCC se fez acompanhar por advogado, que lhe foram feitas as advertências legais, são indicadas as concretas questões que lhe foram dirigidas, o teor das respectivas respostas e são identificados os documentos apresentados pela testemunha, explicando-se o contexto em que essa apresentação e posterior entrega ocorreu.
Assim sendo, para além da diligência de prova se mostrar válida, não se vislumbrando belisque dos direitos de defesa do Recorrente AA, reforçamos, não existe na lei a exigência de obrigatoriedade de fazer conter nos autos os pedidos de auxilio de cooperação internacional, pelo que não tem aplicação o disposto na al. d) do n.º 2 do artigo 120.º do CPP, na medida em que não deixaram de ser praticados actos legalmente obrigatórios. Nessa medida, falece a arguida nulidade pugnada pelo Recorrente citado.
(…)Tendo em vista o exposto, logo se conclui que não constando da lei expressamente a cominação da nulidade no caso de falta de pedido formal de cooperação internacional (que o Recorrente admite que existiu, só discute a sua ausência material nos autos) o vício, a existir (que consideramos não existir), constituiria uma mera irregularidade, nos termos do artigo 123.º do CPP, a qual deve ser arguida perante a própria autoridade administrativa, nos três dias seguintes à notificação de qualquer termo do processo – neste sentido, vide Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª Ed., Universidade Católica Editora, pág. 269.
A irregularidade é um vício que é sanável, porque não se mostra elencado no artigo 119.º, do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, que respeita às nulidades insanáveis.
Assim sendo, se irregularidade existisse, a mesma já estaria sempre sanada, por dois motivos.
Primeiro, não resulta dos autos, nem das alegações do próprio, que o Recorrente tenha arguido a irregularidade perante a CMVM no aludido prazo de 3 dias.
Segundo, nem todas as ilegalidades cometidas no processo são irregularidades, apenas sendo relevantes aquelas que possam afectar o valor do acto praticado, de acordo com o princípio da relevância material da irregularidade – vide, neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, à Luz da Constituição Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2.ª Edição actualizada, Universidade Católica Editora, pág. 312.
Ora, a mera omissão de documentação do pedido de cooperação internacional, caso se entendesse que deve constar dos autos, consubstanciaria, com o devido respeito, uma ilegalidade inócua e juridicamente irrelevante, dado que, conforme já referido, o ofício da FINMA permite ao Recorrente conhecer cabalmente os termos e o teor da diligência efectuada.
Para além disso, mesmo que se entendesse que fora cometida uma irregularidade, o que não se entende, a mesma nunca teria o condão de determinar os efeitos pretendidos pelo Recorrente, como sendo a nulidade da prova ou a nulidade da acusação e da decisão administrativas.
Com efeito, como anteriormente já explicámos, a propósito de outra temática, existe um comando legal de aproveitamento de actos processuais (artigo 122.º, n.º 3 do CPP), pelo que a prova que fora produzida ao abrigo do pedido que, embora realizado, não se mostra fisicamente materializado nos autos, configura um acto totalmente autónomo deste pedido, ainda por mais que todas as formalidades que foram cumpridas no âmbito da produção da prova em si mesma, como acto destacável do próprio pedido, podem ser escrutinadas através do oficio e do auto de inquirição junto nos autos.
Como bem evidencia a decisão administrativa, facilmente se deduz que o pedido dirigido à FINMA consiste numa formalidade que não apresenta qualquer relação com a produção da prova testemunhal propriamente dita (repare-se que um qualquer vício que afecte a notificação dirigida a uma testemunha não afecta a validade da prova testemunhal posteriormente produzida, na medida em que a mesma tenha respeitado os respectivos requisitos legais).
Por outro lado, ainda que existisse algum tipo de invalidade no âmbito desta prova produzida, o que não existe, pelos motivos que já explicitámos, também tal invalidade não poderia contaminar todo o acto autónomo da acusação e da decisão administrativa, apenas acarretando (o que não acarreta porque, reforçamos, a prova produzida não padece do vício que é imputado pelo Recorrente) a inadmissibilidade de valorar o próprio depoimento de CCC como meio de prova.”
Deste modo, não ficou demonstrada a apontada nulidade ou irregularidade quanto ao depoimento da testemunha CCC, não tendo existido qualquer omissão de acto legalmente obrigatório que consubstancie insuficiência de inquérito/instrução.
Consequentemente, não ficou demonstrada qualquer violação do direito de defesa do arguido à luz do art. 414º-A nº 1 do CdVM e 32º nº 10 da CRP, face á ausência de omissão de acto legalmente obrigatório que tenha impedido o recorrente de sindicar a forma como a prova foi obtida, improcedendo totalmente este segmento recursivo.

10ª- Violação do direito de defesa e nulidade por falta de produção de prova:
i)indeferimento da inquirição da testemunha CCC;
ii) indeferimento da inquirição das testemunhas EEE e FFF através de meios de cooperação internacional;
iii) indeferimento da inquirição da testemunha NNN;
iv)indeferimento da acareação entre as testemunhas LLL e OOO.

Nesta questão, suscitada nas Conclusões 283 a 318 e, 341 a 416, estão agrupadas as decisões de indeferimento pela CMVM de algumas diligências probatórias, como o indeferimento de inquirição de testemunhas e de acareação entre algumas delas, a não tradução do depoimento da testemunha CCC, a não expedição de cartas rogatórias ou inquirição por videoconferência-  decisões proferidas pela autoridade administrativa CMVM na fase administrativa do presente procedimento.
Dessas decisões tomadas pela autoridade administrativa no decurso do processo o recorrente arguiu a nulidade para o tribunal a quo, em sede de recurso de impugnação judicial, alegando a violação insanável do direito de defesa, em violação do art. 50º do RGCO e art. 32º nº 10 da CRP, tendo o tribunal a quo decidido pelo indeferimento.
Novamente inconformado, vem o recorrente reiterar o pedido de nulidade daquelas decisões proferidas pela CMVM, de todos os actos subsequentes, incluindo da decisão final administrativa e da sentença recorrida.
Acontece que, não é admissível recurso para o Tribunal da Relação de qualquer uma das decisões judiciais previstas no art. 55º nº 1 e 3 do RGCO, porquanto, embora as decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas no decurso do processo sejam susceptíveis de impugnação judicial por parte do arguido, competente para o decidir é o tribunal de 1ª Instância que decidirá em última instância.
 Quanto à renovação do pedido da inquirição das testemunhas CCC, EEE e FFF perante o tribunal a quo e ao indeferimento proferido por esse tribunal, também já acima ficou decidido não ser admissível recurso ( 1ª questão, ponto 1.2).
Como vimos, em processo contra-ordenacional não é constitucionalmente imposta a consagração da possibilidade de recurso de todas as decisões judiciais proferidas no decurso da impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória (Acórdão TC nº 659/2006 de 28/11/2006), sendo que, o facto de só haver um grau de recurso das decisões administrativas proferidas no decurso do processo também não viola os princípios constitucionalmente consagrados nos arts. 2º, 20º nº 4 e 32º nº 10 da CRP.
Pelas razões acima expostas não se conhece deste segmento recursivo.

11ª- Proibição de valoração de prova testemunhal por violação do direito fundamental ao contraditório ( direito de defesa).

Sob as Conclusões 319 a 340 veio o recorrente alegar que a decisão final da CMVM é manifestamente ilegal porque atenta contra o seu direito de defesa previsto no art. 414º-A do CdVM, art. 50º do RGCO e art. 32º nº 10 da CRP e art. 356º nº 6 do CPP, uma vez que as testemunhas UU, III e JJJ foram inquiridos pela CMVM na fase pré-acusatória, sem a presença ou contraditório dos Il. Mandatários do recorrente e, apesar de terem sido arrolados na fase pós-acusação o recorrente viu-se impedido de exercer o respectivo direito de defesa porque, por um lado a testemunha JJJ faleceu antes de ter tido possibilidade de depor e, por outro lado as testemunhas III e UU recusaram-se a responder às questões que lhe foram formuladas com fundamento na sua constituição como arguidos no processo crime nº 324/14...., concluindo que tais depoimentos não podiam ter sido valorados pela CMVM para efeitos da decisão final, como o foram.
Sustenta que se viu impedido de contraditar aqueles depoimentos, não tendo podido realizar o contra-interrogatório, o qual integra o direito a um processo equitativo assegurado pelo art. 6º nº 2 al. d) da CEDH e, que ao abrigo do art. 356º nº 6 do CPP os depoimentos das testemunhas UU e III não podem ser valorados, assim como não o pode ser o depoimento da testemunha JJJ à luz do nº 4 do art. 356º do CPP.
Conclui que, aqueles artigos 50º do RGCO ex vi do art. 407º do CdVM e art. 356º nº 4 e 6 do CPP interpretados no sentido de que o depoimento de testemunha prestado na fase pré-acusatória de processo contraordenacional pode ser valorado, para efeitos de decisão final, ainda que a testemunha se recuse e/ou fique impossibilitada de responder a questões na fase pós-acusatória, ou que o indeferimento do contrainterrogatório de uma testemunha ouvida na fase pré-acusatória não viola o direito de contraditório do arguido é inconstitucional por violação do direito de defesa consagrado no art. 32º nº 10 da CRP.
E, ao terem valorado os referidos depoimentos testemunhais a decisão da CMVM e a sentença recorrida padecem de nulidade por violação do direito de defesa do recorrente, consagrado nos referidos preceitos legais.
Vejamos.
O art. 50º do RGCO consagra o direito de audição e defesa do arguido, dispondo que não é permitida a aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória sem antes se ter assegurado ao arguido a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre, tendo sido assegurado esse direito ao aqui recorrente que apresentou a sua defesa em sede pós-acusação, pronuciando-se sobre as contraordenações que lhe eram imputadas e sobre as sanções em que incorria, tendo tido a possibilidade de requerer a produção de meios de prova nessa fase administrativa e na fase judicial depois de interpor recurso de impugnação judicial da decisão administrativa condenatória.
Por seu turno o art. 414º-A do CdVM dispõe que antes de aplicar uma coima ou sanção acessória é assegurada ao arguido a possibilidade de, em prazo fixado pela CMVM entre 10 e 30 dias úteis, apresentar defesa escrita e oferecer meios de prova, o que manifestamente foi facultado ao aqui recorrente.
Segundo o art. 356º nº 4 e 6 do CPP, só é permitida a reprodução ou leitura de declarações prestadas perante a autoridade judiciária se os declarantes não tiverem podido comparecer por falecimento (…); sendo proibida, em qualquer caso, a leitura de depoimento prestado em inquérito ou instrução por testemunha que, em audiência, se tenha validamente recusado a depor.
Convém, no entanto, salientar, que de acordo com o disposto no art. 416º nº4 e  5 do CdVM o tribunal pode decidir sem audiência de julgamento se não houver oposição do arguido, do MP ou da CMVM ( caso em que atenderá à prova produzida na fase administrativa, designadamente depoimentos testemunhais reduzidos a escrito) e, se houver lugar a audiência de julgamento, decide com base na prova realizada na audiência, bem como na prova produzida na fase administrativa do processo de contraordenação, não estando prevista a necessidade de observância de qualquer formalidade legal para poder valorar determinado depoimento testemunhal que não tenha sido produzido em sede de audiência de julgamento, desde que seja concedida ao arguido a possibilidade de contraditar as provas produzidas perante ele ou que tenham sido produzidas na fase pré-acusatória, afigurando-se-nos que, face ás especificidades do processo contra-ordenacional o direito de defesa do arguido fica assegurado desde que se possa pronunciar sobre o conteúdo e valor probatório dos depoimentos testemunhais já produzidos, apresentando defesa escrita e meios de prova que os possam contraditar ou abalar.
Já vimos que o Tribunal Constitucional tem sufragado este entendimento de que as garantias de defesa em sede de processo contraordenacional não exigem o cumprimento estrito e rigoroso de todos os preceitos legais consagrados no CPP, para além do previsto no art. 50º do RGCO, o qual está materializado também no art. 414º-A nº 1 do CdVM.
É certo que o recorrente não teve a oportunidade de contra-interrogar aquelas três testemunhas, uma porque entretanto faleceu e as outras duas porque se recusaram legitimamente a depôr (por terem sido constituídas arguidas por factos  sobre os quais haviam prestado anteriormente depoimento), no entanto pode apresentar defesa escrita, contraditar aqueles depoimentos, apresentar testemunhas para os contrariar e/ou abalar o seu valor probatório, estando suficientemente assegurado o âmago do direito de defesa e contraditório de acordo com as especificidades do processo contraordenacional.
Secundamos, pois, o que a esse propósito a extensa e pertinente argumentação do tribunal a quo:
“Ressalvado que seja o núcleo essencial do direito de defesa a que alude o n.º 10 do artigo 32.º da CRP, nos termos do qual não é permitida a prolação de decisão sem ter sido dada ao arguido a oportunidade de “discutir, contestar e valorar” (vide parecer nº 18/81 da Comissão Constitucional, in Pareceres da Comissão Constitucional, 16ºvol., pág. 154), existe uma flexibilidade subjacente ao exercício do contraditório e do direito de defesa, tal como é sustentado pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 1185/96 (in Diário, II Série, de 12 de Fevereiro de 1997).
Ora, salvo melhor entendimento, estando em causa inquirições de três testemunhas, que cumpriram as formalidades legais, apesar dos respectivos depoimentos não terem sido gravados, mas apenas reduzidos a auto, o que não é legalmente vedado – vide n.º 1 do artigo 99.º do CPP, ex vi do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM – e que se têm mantido nos autos desde data anterior à prolação da acusação até esta fase judicial, consideramos, data vénia, que o direito de defesa, mormente na sua vertente de direito ao contraditório, não exige, em termos absolutos, o interrogatório directo em cross-examination.
Contendo o processo os autos de inquirição das testemunhas, tal possibilita que o Recorrente tenha a hipótese de questionar os depoimentos prestados, em termos de dispor e poder usar de todos os instrumentos processuais necessários e adequados para defender a sua posição e contrariar a acusação, nomeadamente, apresentando a sua versão, atacando a eficácia persuasiva dos depoimentos e apresentando provas que os contrariem, contribuído, assim, para os alicerces da decisão.
Com efeito, estão em causa duas situações que, apesar dos esforços envidados pela CMVM, no sentido de permitir um contra-interrogatório ao Recorrente quanto às três testemunhas, o certo é que a materialização da sua impossibilidade em nada foi causada por conduta da CMVM.
Quanto à testemunha JJJ, o seu contra-interrogatório passou a ser objectivamente impossível, em face do seu falecimento.
Quanto a UU e III os mesmos recusaram prestar depoimento, de forma legítima, tendo em vista a sua constituição como arguidos no processo-crime n.º 324/14...., invocando o direito à sua não auto-incriminação (n.º 2 do artigo 132.º do CPP, ex vi do n.º 1 do artigo 41.º do RGCO, ex vi do artigo 407.º do CdVM).
Tal impede um cross examination, ou o exercício de um direito ao confronto por parte do Recorrente. Contudo, em caso similar o próprio TEDH, no caso Asch v. Austria, decisão de 26.04.1991, §29 ( ), entendeu que bastava o acusado ter a oportunidade de discutir ou contestar as declarações anteriores, bastando-se com aquilo a que se denomina por “contraditório sobre o elemento de prova”, dispensando o “contraditório na formação do elemento de prova”. Apesar de não desconhecermos que o entendimento em causa acaba por não ser o dominante no seio daquele Colendo Tribunal, o certo é que o entendimento foi adoptado em sede de processo penal.
Ora, é sabida a diferença entre o direito penal e o direito contra-ordenacional. Desde logo, como se afirma no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 231/79, de 24 de Julho, que introduziu o ilícito de mera ordenação social na ordem jurídica portuguesa, “hoje é pacífica a ideia de que entre os dois ramos de direito medeia uma autêntica diferença: não se trata apenas de uma diferença de quantidade ou puramente formal, mas de uma diferença de natureza. A contra-ordenação “é um aliud que se diferencia qualitativamente do crime na medida em que o respectivo ilícito e as reacções que lhe cabem não são directamente fundamentáveis num plano ético-jurídico, não estando, portanto, sujeitas aos princípios e corolários do direito criminal” (…). Está em causa um ordenamento sancionatório distinto do direito criminal. Não é, por isso, admissível qualquer forma de prisão preventiva ou sancionatória, nem sequer a pena de multa ou qualquer outra que pressuponha a expiação da censura ético pessoal que aqui não intervém. A sanção normal do direito de ordenação social é a coima, sanção de natureza administrativa, aplicada por autoridade administrativa, com o sentido dissuasor de uma advertência social, pode, consequentemente, admitir-se a sua aplicação às pessoas colectivas e adoptar-se um processo extremamente simplificado e aberto aos corolários do princípio da oportunidade”.
Conforme refere Figueiredo Dias, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra, 2001, pág. 151 e O movimento de descriminalização e o ilícito de mera ordenação social, Centro de Estudos Judiciários, Jornadas de Direito Criminal, pág. 33, quanto à própria culpa, embora o artigo 1.º do RGCO caracterize a contra-ordenação como “o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima”, não pode falar-se numa culpa em sentido jurídico-penal, baseada numa censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, mas apenas de uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor, que serve como especial advertência ou reprimenda relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas.
Por seu turno, o próprio Tribunal Constitucional tem vindo a defender, de forma muito consistente, as diferenças de regimes, o que implica que, embora o direito de defesa dos arguidos, em sede de direito contra-ordenacional, mereça evidentemente tutela, o certo é que essa tutela apresenta uma maior plasticidade, em face do direito penal.
Também tem salientado o mesmo Colendo Tribunal que, em face da menor ressonância ética do direito contra-ordenacional, não é o n.º 10 do artigo 32.º da CRP (que garante os direitos de audiência e defesa em processos de contra-ordenação e demais processos sancionatórios), que permite estender ao ilícito contra-ordenacional a generalidade do regime pensado para o direito penal. Essa disposição releva apenas no plano adjectivo e significa apenas ser inconstitucional a aplicação de qualquer tipo de sanção contra-ordenacional ou administrativa sem que o arguido seja previamente ouvido e possa defender-se das imputações que lhe são feitas (vide acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 160/2004 e 161/2004).
Ora, tendo o TEDH, no caso Asch v. Austria, decisão de 26.04.1991, §29, entendido que bastava o acusado ter a oportunidade de discutir ou contestar as declarações anteriores, bastando-se com um “contraditório sobre o elemento de prova” e que tal não violava o n.º 3 do artigo 6.º do CEDH, em sede do processo criminal, onde as garantias de defesa dos Arguidos se impõem de forma mais musculada, estamos certos de que, em sede do direito contra-ordenacional e à luz do que tem sido a jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, não viola o direito de defesa do Recorrente, o facto da CMVM ter valorado provas pessoais que aquele não pôde contra-interrogar, ora por falecimento da testemunha, ora por recusa legitima a depor.
Na verdade, tal como já dissecado, nestes autos ao Recorrente foi dada possibilidade de apresentar a sua versão dos factos, analisar os depoimentos em causa, apresentar provas que pudessem abalar a sua fidedignidade e contestá-los, como contestou, tendo laborado activamente para a produção da decisão que lhe diz respeito.
Consideramos, para além disso, que o paradigma do direito contra-ordenacional acima já elucidado, apesar de carácter sancionatório, implica uma maior liberdade concedida ao legislador para poder conformar a forma como é assegurado o direito que decorre do n.º 10 do artigo 32.º do CRP.
(…)Ao contrário, no processo contra-ordenacional, o legislador ordinário não diferenciou as provas pessoais das outras provas (documentais ou periciais, por exemplo), aproximando todas as provas, sem excepção, do regime previsto no âmbito do processo penal para as provas documentais ou periciais.
Nessa medida, importa referir que em sede do processo contra-ordenacional não vigora de forma perfeita nem o princípio da oralidade, nem da imediação.
Com efeito e como decorre do n.º 5 do artigo 416.º do CdVM, havendo lugar a audiência de julgamento, o tribunal decide com base na prova realizada na audiência, bem como na prova produzida na fase administrativa do processo de contra-ordenação.
A par do disposto no n.º 2 do artigo 72.º do RGCO, aquele artigo expõe a particularidade do processo sancionatório de cariz contra-ordenacional, no que tange à produção de prova, sendo clara a opção do legislador em afastar expressamente o regime contido no artigo 355.º do CPP.
Nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, pág. 148, “no processo contra-ordenacional não vigora o princípio da imediação, na sua versão rígida, pois na fase administrativa a autoridade administrativa pode decidir sem ter contacto directo com a prova testemunhal ou por declarações e na fase judicial o tribunal pode valorar declarações do arguido e depoimentos das testemunhas prestados diante da autoridade administrativa e até sem assistência do defensor”.
Assim sendo, toda a prova produzida na fase administrativa deve ser considerada, em sede da fase judicial do processo contra-ordenacional, não tendo de ser analisada ou reproduzida em sede de audiência de discussão e julgamento perante o tribunal, para que possa ser valorada para a criação da convicção do julgador.
Assim sendo e perante o que fica dito, se no processo penal, as provas pessoais colhidas em fase de inquérito são meros actos de investigação, cuja validade é limitada, exigindo-se para poderem valer, a sua repetição em julgamento, num pleno e musculado direito de defesa e de exercício de contraditório, em modalidade cross examination, no processo contra-ordenacional foi adoptada uma solução distinta.
Todas as provas foram agregadas no mesmo regime e a par do que ocorre com a prova documental ou pericial produzida na fase de inquérito do processo penal, que apresenta um carácter tendencialmente definitivo e irrepetível, também a prova oral (onde se discute com maior afinco a necessidade de um direito ao confronto, ou contra inquirição)  se satisfaz com um contraditório posterior, ou seja, basta que o Arguido tenha a oportunidade de discutir ou contestar a prova oral anterior, num “contraditório sobre o elemento de prova” e não sobre a “produção do próprio elemento de prova”.
Quer isto dizer que o legislador ordinário em sede de direito contra-ordenacional não veda ao decisor, quer seja o decisor da fase administrativa, quer seja o decisor da fase judicial, de valorar a prova pessoal que foi produzida no processo, quer tenha existido um contra-interrogatório do arguido, quer esse contra-interrogatório não tenha sido possível, mormente, por força de ausência (em sentido lato, abrangendo as situações de falecimento, recusa legítima a depor, desconhecimento de paradeiro) da prova pessoal anteriormente produzida, como sucede in casu.
Consideramos contundente intensificar que, enquanto no processo penal, as provas orais, onde se discute a necessidade de existir um direito ao confronto, têm de ser, por princípio (salvo as excepções contempladas na lei), repetidas em julgamento para poderem valer e assim, quanto a elas, poder ser cumprido esse direito ao confronto, no processo contra-ordenacional não é assim.
O legislador adoptou uma solução evidentemente diversa, neste ramo de direito onde a tutela do direito de defesa permite uma maior elasticidade e está sujeito a princípios de simplificação e celeridade, ao adoptar, como princípio, ao invés, a dispensa do direito ao confronto, na medida em que na fase de julgamento está dispensada a reprodução da prova oral que fora produzida na fase administrativa, estando esse direito ao confronto sujeito a critérios de necessidade para a boa decisão da causa (a analisar pela entidade administrativa, em sede da fase administrativa e a avaliar pelo tribunal, na fase judicial).
Reforçamos, o direito de defesa, basta-se, neste ramo de direito, com a possibilidade do arguido se pronunciar acerca do meio de prova produzido, poder apresentar provas que o contradigam ou abalem ou mesmo requerer a sua repetição, mas, neste caso, a repetição está sujeita à avaliação sobre a sua relevância para a decisão da causa, pela entidade administrativa ou tribunal.
Não podemos também deixar aqui de referir que o Tribunal Constitucional, no acórdão n.º 372/00 (embora com um voto de vencido), admitiu precisamente, no próprio processo penal, na fase instrutória, que o direito ao contraditório é cumprido com a oportunidade a posteriori do arguido se pronunciar sobre depoimentos produzidos anteriormente, na sua ausência e, assim, sendo preservado o seu núcleo essencial.
Considerou expressamente que basta que o arguido possa ter acesso aos depoimentos que tinham sido reduzidos a escrito e possa, antes de ser tomada uma decisão instrutória, contraditar o teor das declarações anteriormente prestadas pelas testemunhas, podendo inclusivamente requerer a produção de prova indiciária suplementar (incluindo, se necessário, uma nova inquirição das testemunhas) que considere pertinente. Aqui, claramente afastada a necessidade de um cross examination, sendo que a sua ausência não viola os direitos de defesa do Arguido.
Claro está que a questão fulcral que nos parece estar em causa, não passa, por isso, pela violação de um direito de defesa do Recorrente, mas antes pela valoração que foi feita da prova pela CMVM, valoração essa que deverá ser reapreciada por este tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 127.º do CPP. Na verdade, compete, nesta fase do processo, ao tribunal ponderar, de acordo com a sua livre convicção, se depoimentos que foram prestados em sede da fase administrativa do processo, sem que o Recorrente os pudesse sujeitar a um contra-interrogatório, devem merecer a credibilidade que foi depositada pela CMVM nos mesmos.
Para além disso, não podemos deixar de chamar à colação que mesmo não sendo o entendimento maioritário em sede do TEDH o que foi adoptado no referido acórdão do caso Asch v. Austria, decisão de 26.04.1991, §29, o certo é que, paulatinamente o mesmo Colendo Tribunal tem vindo a reconhecer que a utilização para condenação de depoimentos de testemunhas em que a defesa não interveio, em princípio, não viola de forma automática o n.º 3 do artigo 6.º do CEDH.
Por exemplo, no caso Unterpertinger c. Áustria, de 24.11.1986, §§28-33, o TEDH entendeu que esse tipo de depoimentos poderia ser admitido, desde que não surgissem como as bases exclusivas ou predominantes para a condenação (regra do “sole or decisive rule”).
Porém, mais recentemente, verificou-se uma alteração substancial de paradigma, surgindo uma nova interpretação acerca do cross examination, em sede do TEDH, passando este a admitir a utilização de depoimentos não submetidos ao escrutínio do acusado, ainda que exclusivos ou decisivos para a condenação. Trata-se do conhecido caso Al- Khawaja e Tahery v. Reino Unido, de 15.12.2011 [decisão da Grand Chamber do TEDH (Tribunal Pleno) que revogou a primeira decisão proferida pelo TEDH].
Neste caso, o TEDH entendeu que se existirem, no caso concreto, circunstâncias que compensem o prejuízo imposto ao direito de defesa (“counterbalancing factors”), tal não implica a violação deste direito. Tratam-se de métodos de aferição da credibilidade do depoimento de uma testemunha por meio diverso do confronto directo, que implicam que, observando o processo como um todo, o mesmo ainda possa ser identificado como um processo justo e equitativo (o já acima referido fair trial) – vide, de igual forma, o caso Schatschaschwili c. Alemanha, de 1.12.2015, §125, o caso Salikhov v. Russia, de .03.05.2012, §§ 118 e ss.; o caso TEDH Asadbeyli e outros v. Azerbajão, de 11.122012, § 134; o caso Yevgeniy Ivanov v. Rússia, de 25.04.2013, §§ 45 e ss.; o caso T Şandru v. Romênia, de 15.10.2013, §§ 62 e ss..
Assim, de acordo com o mesmo tribunal, mesmo no processo penal, não existe uma obrigação dos Estados Membros a adoptar um modelo adversarial, seja na produção da prova oral, seja na exclusão das provas quando não submetidas ao confronto – vide Gustavo Badaró, in “A utilização da hearsay witness na Corte Penal Internacional: estudo sobre sua admissibilidade e valoração”, Revista electrónica Zeitschrift für Internationale Strafrechtsdogmatik, in www.zis-online.com, ZIS n.° 4, 2014, pág. 181.
Ora, ainda desta perspectiva, novamente importa aqui referir que implicará ao tribunal, em sede da motivação de facto, analisar se os três depoimentos não sujeitos a um contra-interrogatório, merecem credibilidade, por força da sua corroboração, por exemplo, por outros meios de prova.
Para além disso, o depoimento das três testemunhas em causa não foram os únicos meios de prova que concorreram para a condenação do Recorrente.
Acresce que em sede da fase administrativa dos autos, a CMVM admitiu a junção de 63 documentos (fls. 12471-15666) e a inquirição de 28 testemunhas (fls. 12458-12461), requeridas pelo Recorrente (fls. 16127-16184). Este tribunal admitiu a audição de testemunhas arroladas pelo mesmo Recorrente (algumas das quais prescindidas pelo mesmo) e admitiu os documentos juntos nos autos por si. O Recorrente teve oportunidade de se pronunciar várias vezes acerca do teor dos depoimentos produzidos, na medida em que teve (ou podia ter) acesso aos mesmos, apresentando as provas que entendeu para os contraditar (embora sujeito a um princípio de relevância da prova, que acima já dissecámos), apresentou a sua versão dos factos, colaborando activamente para a elaboração da decisão que lhe dizia respeito, não sendo tratado como um objecto da decisão administrativa, mas antes como um sujeito do processo, que se mostra justo e equitativo.
Do que se vem de expor, logo se logra compreender que o segundo e terceiro argumentos do Recorrente AA, no sentido de ter sido violado o n.º 6 do artigo 356.º do CPP (aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407º do CdVM) e o n.º 4 do artigo 356.º do CPP (ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO e 407.º do CVM) são totalmente improcedentes.
(…)Estamos certos que um dos artigos que bule, de forma flagrante, com o RGCO e toda a natureza e teleologia que lhe é inerente é precisamente o artigo 356.º do CPP, o qual não tem, por isso, aplicação nos processos contra-ordenacionais.
O artigo 355.º do CPP reflecte os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório em audiência. O artigo 356.º do CPP apresenta carácter excepcional, apenas justificado por circunstâncias estritamente previstas na lei, já que o momento decisivo e primordial para a produção da prova, no processo penal, é a audiência de julgamento.
Ora, ao contrário, no processo contra-ordenacional não vigora, de forma plena, o princípio da imediação, da oralidade e do contraditório em audiência. A norma excepcional do artigo 356.º do CPP não admite, por isso, aplicação subsidiária ao direito contra-ordenacional, porque neste ramo de direito, como já verificámos, o momento decisivo e primordial para a produção da prova não é a audiência de julgamento.
Neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, pág. 291 e 292, refere que do princípio da imediação na sua forma mitigada “decorrem duas consequências práticas muito relevantes. Por um lado, o depoimento da testemunha ausente na audiência pode ser lido sem as restrições do artigo 356.º do CPP. Por outro lado, a testemunha presente na audiência de julgamento pode ser confrontada com o seu depoimento prestado diante da autoridade administrativa e o tribunal pode valorar a versão que entender mais próxima da verdade”.
O mesmo autor ainda esclarece que “a leitura dos depoimentos prévios das testemunhas não bule com a versão mitigada do princípio da imediação consagrada no artigo 6.º da CEDH, porque o arguido teve oportunidade de se pronunciar sobre os mesmos depoimentos, ou na audição realizada durante o processo administrativo ou na própria impugnação judicial, como teve também em ambos os momentos processuais ocasião para requerer o que entendesse por conveniente para contraditar os ditos depoimentos.”
Reforçamos. No processo contra-ordenacional não vigora, na sua forma plena, o princípio da oralidade e da imediação. As provas produzidas na fase administrativa são valoradas pelo tribunal na fase judicial do processo, independentemente de serem lidas e analisadas ou não em sede de julgamento.”
Deste modo, não tendo sido violado o direito de defesa do recorrente (direito ao contraditório) o tribunal a quo não estava impedido de valorar aqueles depoimentos testemunhais e de neles fundamentar a decisão recorrida, não padecendo esta da apontada nulidade.
Improcede este segmento recursivo.

12ª-Falta da imputação de factos concretos no alegado conflito de interesses relativo ao papel comercial da R..., S.A.

Sob as Conclusões 417 a 426 veio o recorrente alegar que para tentar estender a imputação de uma alegada contra-ordenação quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A ao ora Recorrente, a Sentença Recorrida sustentou a imputação da suposta violação de conflito de interesses no facto de a R..., S.A ser uma sociedade dominada pela EI..., S.A, da qual o ora Recorrente era administrador, à data em que foi aprovada a colocação de papel comercial da R..., S.A, em Clientes do B... (cfr. factos provados 413, 417, 515, alíneas v. e vi. e 519, da Sentença Recorrida), mas que tal é manifestamente, insuficiente para lhe imputar a violação de regras de conflitos de interesses, pois o facto de a EI..., S.A dominar a R..., S.A não implica, necessária e automaticamente, que um administrador da EI..., S.A esteja em conflito em todas e quaisquer operações que a R..., S.A intervenha com outra sociedade (neste caso, o B...), que tenham em comum administradores da EI..., S.A.
E, não sendo o ora Recorrente administrador da R..., S.A, não participou na decisão daquela de emitir papel comercial, sendo certo que também não participou na decisão de colocação de papel comercial foi ratificada em reunião da Comissão Executiva do B..., de 2 de Outubro de 2013 (cfr. fls. 78-f a 83-v do Livro de Actas da Comissão Executiva do B... n.º 81 que consta de fls. 4.870-v a fls. 4.876 da Pasta 11).
Sustenta que, como sucedia com a Acusação e a Decisão da CMVM, a Sentença não imputa ao ora Recorrente qualquer facto concreto que lhe permita imputar as contra-ordenações aqui em causa por alegado conflito de interesses na colocação de papel comercial a R..., S.A, não resultando dos factos provados 413, 417, 515, alíneas v. e vi. e 519, da Sentença Recorrida qualquer imputação de factos próprios ao ora Recorrente, que permita sustentar uma qualquer intervenção do ora Recorrente na colocação de papel comercial, pela R..., S.A.
Conclui que, a sentença Recorrida tinha de concretizar e circunstanciar a actuação e a culpa concreta do ora Recorrente, fundamentando em que medida a conduta do ora Recorrente contribuiu causalmente, para o facto típico, o que não resulta da Sentença, pelo que deve ser absolvido.
Vejamos.
O recorrente sustenta que os factos provados 413, 417, 515, alíneas v. e vi. e 519, da Sentença Recorrida são manifestamente insuficientes para lhe imputar a violação de regras de conflitos de interesses quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A, pois o facto de a EI..., S.A dominar a R..., S.A não implica, necessária e automaticamente, que um administrador da EI..., S.A esteja em conflito em todas e quaisquer operações que a R..., S.A intervenha com outra sociedade (neste caso, o B...), que tenham em comum administradores da EI..., S.A e,  não sendo o ora Recorrente administrador da R..., S.A, não participou na decisão daquela de emitir papel comercial, sendo certo que também não participou na decisão de colocação de papel comercial foi ratificada em reunião da Comissão Executiva do B..., de 2 de Outubro de 2013 (cfr. fls. 78-f a 83-v do Livro de Actas da Comissão Executiva do B... n.º 81 que consta de fls. 4.870-v a fls. 4.876 da Pasta 11).
Contudo, o recorrente não pode desconhecer que não foram apenas aqueles factos que determinaram a sua condenação nas contraordenações por violação de conflitos de interesses na colocação do papel comercial da R..., S.A, que todos os factos provados sob os pontos 480 a 490, 511 a 515, 517 e 519 contrariam a sua versão dos factos por si sustentada, matéria de facto essa estabilizada e que contêm de forma cabal os elementos de facto que integram quer o elemento objectivo, quer subjectivo, das referidas contraordenações pelas quais foi condenado.
Isso mesmo resulta com clarividência da sentença recorrida, conforme se extrai do seguinte segmento decisório:
“O Recorrente participou na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014, onde foi decidido avançar com a reestruturação do G..., o que tinha implicações para a emitente R..., S.A, a vários níveis, decorrentes da aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31.12.2013.
Apesar dessa aquisição ter representado um aumento do activo total da R..., S.A, o certo é que as transacções levadas a cabo pela R..., S.A, tendentes à aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, implicaram, igualmente, uma diminuição do activo corrente e um aumento do passivo total.
Em consequência da aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a liquidez de curto prazo da R..., S.A, passou a ser negativa.
Em consequência da aquisição da referida participação de 49,26% do capital social da E..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, a solvabilidade da R..., S.A, foi negativamente afectada, tendo o rácio de solvabilidade sofrido uma redução de 23%, passando de 52%, em 31 de Dezembro de 2012, para 29%.
Nestes termos, ao participar e tomar lugar no processo decisório dessa operação, num órgão para-societário com poderes de facto para decidir sobre as estratégias a engendrar por referência a todas as sociedades que constituam o denominado “G...”, o Recorrente potenciou um conflito de interesses, nos moldes dissecados a propósito da conduta do intermediário financeiro (B...), que aqui se dão por reproduzidos.
Na verdade, não podemos esquecer que para além de ter assento no Conselho Superior do G..., o Recorrente era administrador e membro da comissão executiva do B... que era o intermediário financeiro.
Assim, ao ter participado na decisão tomada pelo Conselho Superior do G... em 07.01.2014, o Recorrente promoveu a alteração do produto financeiro que estava em plena comercialização pelo B..., à medida e conveniência dos interesses do G... e das entidades envolvidas que gravitavam à sua volta, sem que essa alteração do produto fosse devidamente transmitida aos clientes.
O nível de informação detida pelo intermediário financeiro, por força da conduta do Recorrente, sobre o papel comercial da R..., S.A era abisbalmente superior ao nível de informação disponibilizada aos clientes, potenciando o conflito de interesses.
Aliás, a alteração, apesar de formalmente terminada em 22.01.2014 ou em 25.02.2014 (a primeira data, tendo em conta a celebração dos contratos, a segunda tendo em conta a ratificação pelo Conselho de Administração da R..., S.A), tinha efeitos retroactivos a 31.12.2013.
Com efeito, ao saber da colocação e comercialização do papel comercial em curso e ao ter participado na decisão que lhe subjazera, a conduta de fazer retroagir efeitos de uma operação, com as consequências que estão em causa, a 31.12.2013, sem que os clientes do B... fossem informados acerca dessa possibilidade (veja-se que a decisão administrativa apenas aponta a conduta em causa a partir de 09.01.2014) e depois de formalizada a operação em 22.01.2014 (sem prejuízo de apenas em 25.02.2014 ter ocorrido a ratificação pelo Conselho de Administração da R..., S.A), sem também informar os clientes do B... dessas alterações, a conduta do Recorrente contribuiu de forma causal:
- para que o B... não se organizasse para identificar os conflitos de interesses que estavam em causa;
- não assumisse uma postura de lealdade perante os seus clientes, informando-os de forma clara, transparente e, muito importante, em tempo útil sobre os conflitos de interesses instalados decorrentes da reestruturação do G... e os respectivos motivos; e
- colocasse os interesses dos clientes em segundo plano (prosseguiu os interesses de todo o G... e demais envolvidos na reestruturação e continuação ainda assim da comercialização do papel comercial da R..., S.A, em detrimento dos interesses dos clientes em adquirir um produto financeiro, pelo menos, com as características anunciadas).
Por força da sua conduta activa, o B... não logrou cumprir os normativos a que aludem os n.ºs 1 a 3 do artigo 309.º do CdVM, nos termos que acima já ficaram dissecados.
Ora, do que daqui decorre é que, relativamente também à situação da R..., S.A, o Recorrente, sob o prisma do conceito extensivo de autoria do artigo 16.º do RGCO, é comparticipante, tendo uma participação activa no cometimento dos ilícitos típicos.
Na verdade, in casu, para além do Recorrente ser destinatário do dever, criou ele próprio um risco proibido de violação do dever, sendo “comparticipante todo aquele que cause o facto descrito, o que inclui a lesão do dever” – vide Frederido da Costa Pinto, “O Ilicito de MeraOrdenação Social”, pág.236.
Quanto ao elemento subjectivo, as contra-ordenações em causa tanto podem ser cometidas a título de dolo, como a título de negligência, como decorre do disposto no n.º 1 do artigo 402.º do CdVM.
Ora, um dos princípios basilares do direito contra-ordenacional é o princípio da culpa, sendo indispensável que o facto possa ser imputado a título de dolo ou negligência. O dolo consiste, de forma sumária, no propósito de praticar o facto descrito na lei contra-ordenacional. Já a negligência consiste na falta do cuidado devido, que tem como consequência a realização do facto proibido por lei.
 Na verdade, a culpa jurídico-contra-ordenacional é distinta da culpa jurídico-penal; esta baseada numa censura ética, dirigida à pessoa de agente e à sua atitude interna. Aquela associada à imputação do facto à responsabilidade social do seu autor.
(…)Quanto à situação da R..., S.A, ficou provado que sabia que o B... comercializou, entre 9 de janeiro e 24 de fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A.
Também se mostra provado que, ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, AA previu como possível que o B..., na tomada de decisão de continuação da comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade.
(…)Finalmente, também se mostra provado que ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, AA também previu como possível que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A e AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade.”
A actuação ilícita do recorrente está suficientemente concretizada e provada nos factos acima elencados, estando descrito em que medida a conduta do recorrente contribuiu causalmente para o facto típico, assim como a sua “culpa” no sentido que a mesma assume num ilícito de natureza contraordenacional, que se traduz na imputação do facto à responsabilidade social do respectivo agente, não se fundando na censura ética do agente (como acontece no ilícito criminal).
Improcede, também, este segmento recursivo.

13ª- Prescrição da responsabilidade contraordenacional.

O Recorrente AA suscitou a questão da prescrição, sob as Conclusões 427 a 446, alegando que a sentença de 1.ª Instância improcede ao entender que a legislação pandémica atinente à suspensão dos prazos prescricionais é aplicável ao presente caso e ao entender que opera aqui a causa de suspensão prevista no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c), do RGCO.
Sustentou que, as regras excepcionais previstas no artigo 7.º, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020 (na sua redacção original) – entretanto revogado pela Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, com entrada em vigor em 3 de Junho –, e no artigo 6.º-B, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março de 2020, na redacção dada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro – entretanto revogado pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de Abril, com entrada em vigor em 6 de Abril – não são aplicáveis, retroactivamente, a processos contra-ordenacionais pendentes no início da vigência desta Lei, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados, desde logo, antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020 e 22 de Janeiro de 2021, respectivamente, sob pena de violação das garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP e os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.
Alegou para o efeito que, por um lado, a al. e) do n.º 6 do artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, na redacção da Lei n.º 16/2020, não contém qualquer remissão nem para o n.º 4, nem para o n.º 5 desta norma e, por outro lado, a al. e) do n.º 7 do artigo 6.º-E da Lei n.º 1-A/2020, na redacção da Lei n.º 13-B/2021, não contém qualquer remissão nem para o n.º 4, nem para o n.º 5 desta norma.
Aqueles preceitos, interpretados e aplicados no sentido de que a suspensão da prescrição é aplicável aos processos contra-ordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquelas leis, em que estejam em causa ou discussão alegados factos ilícitos imputados ao arguido praticados antes de 9, 13 ou 19 de Março de 2020 e 22 de Janeiro de 2021, respectivamente, violam as garantias do direito de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.os 1 e 10, da CRP, os princípios da confiança e segurança jurídicas ínsitos ao Estado-de-Direito consagrado no artigo 2.º da CRP e, ainda, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 3, da CRP
Mais alegou que a causa de suspensão de prazos prescricionais que se encontra descrita no artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c) e n.º 2, do RGCO também não é aplicável aos presentes autos porque o despacho de aceitação das impugnações judiciais destes autos foi notificado ao Recorrente em 25 de Outubro de 2021 e nessa data já se encontravam esgotados os prazos prescricionais que lhe são aplicáveis (e que por isso não podiam ser suspensos).
Relativamente à alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro (artigo 309.º do CMV), decorre da matéria de facto provada que a colocação e comercialização do papel comercial da EI..., S.A decorreu entre Setembro e 4 Dezembro de 2013 e, que a colocação e comercialização do papel comercial da R..., S.A decorreu entre 7 de Outubro de 2013 e 24 de Fevereiro de 2014, pelo que, tendo por referência a data da prática dos factos imputados ao ora Recorrente, a prescrição das três supostas contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A ocorreu em 4 de Junho de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 4 de Dezembro de 2013), e a prescrição das três supostas contra-ordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A ocorreu em 24 de Agosto de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 24 de Fevereiro de 2014).
Relativamente à alegada falta de qualidade de informação (artigo 7.º do CMV), decorre da matéria de facto provada que a colocação e comercialização do papel comercial da EI..., S.A decorreu entre Setembro e Dezembro de 2013 e que a colocação e comercialização do papel comercial da R..., S.A decorreu entre 7 de Outubro de 2013 e 24 de Fevereiro de 2014, pelo que, tendo por referência a data da prática dos factos imputados ao ora Recorrente, a prescrição da suposta contra-ordenação pela violação do dever de qualidade da informação, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A ocorreu em 4 de Junho de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 4 de Dezembro de 2013) e, a prescrição da suposta contra-ordenação pela violação do dever de qualidade da informação, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A ocorreu em 24 de Agosto de 2021 (sete anos e meio volvidos desde 24 de Fevereiro de 2014).
Vejamos se ocorreu a prescrição do procedimento contraordenacional.
O Recorrente foi condenado, por decisão judicial proferida pelo TCRS, datada de 15/2/2022, nos seguintes termos:
1- pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
2- pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
 3- pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
4- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
5- pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
6- pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
7- pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM;
8- pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM.
Estabelecia o art. 418º nº 1 do CdVM (na redação em vigor à data da prática dos factos) que o procedimento por aquele tipo de contraordenações extingue-se por efeito da prescrição no prazo de cinco anos.
A prescrição corre a partir da data da prática dos factos (art.º 27º RGCO) e suspende-se ou interrompe-se, nas condições referidas nos artigos 27º-A e 28º do RGCO.
Independentemente disso, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade - art.º 28º nº 3 do RGCO.
Desta norma resulta, em conjugação com o disposto no art.º 27º-A n.º2 do RGCO quanto ao prazo da suspensão (6 meses), que no caso de o prazo de prescrição ser de cinco anos, o prazo máximo de prescrição será de sete anos e seis meses, a que poderá acrescer 6 meses por causa suspensiva ocorrida designadamente nos termos do art. 27º-A nº 1 al. c) e nº 2 do RGCO, no máximo de oito anos.
Segundo o disposto no art. 27º do RGCO o início de contagem do prazo de prescrição é o do momento da prática da contraordenação, sendo que o art. 5º do RGCO esclarece que o facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido.
Assim não será se estivermos perante contraordenações permanentes, caso em que os prazos se contam desde o dia em que cessa a respectiva consumação, uma vez que o agente cria uma situação antijurídica cuja manutenção depende da sua vontade , como sustentou o tribunal a quo e cujo entendimento se sufraga, sendo que nenhum dos Recorrentes se insurge contra a qualificação das infrações como permanentes.
A discordância do aqui Recorrente, quanto à decisão de indeferimento de prescrição proferida pelo tribunal a quo, centra-se essencialmente quanto à inaplicabilidade quer da suspensão de 6 meses prevista no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO, quer das causas de suspensão decorrentes das Leis temporárias nº 1-A/2020 e nº 4-B/2021, quer da nova redação do art. 418º nº 2 do CdVM.
Quanto ao início do prazo de contagem da prescrição a decisão recorrida perfilhou o seguinte entendimento:
“ Nestes termos, no caso da colocação do papel comercial da EI..., S.A, relativamente à contra-ordenação por violação do dever de divulgação de informação com qualidade (artigo 7.º do CdVM), nos termos em que foi imputada aos Recorrentes, é uma infração permanente, já que resulta da violação do dito dever, que se mostra materializado em diversas condutas, desde Setembro a Dezembro de 2013, através das quais o bem jurídico protegido pela norma violada foi sendo estreitado de forma sucessiva, por vontade dos agentes.
Assim, as infracções consumaram-se no dia 11 de Dezembro de 2013, data até à qual foi comercializado, pelo B... (facto que não é colocado em causa pelos Recorrentes), o papel comercial, com a prestação da informação com base apenas no que constava nas Notas Informativas.
No caso da colocação do papel comercial da R..., S.A, relativamente ao dever de divulgação de informação com qualidade (artigo 7.º do CdVM), as infracções, igualmente permanentes, consumaram-se no dia 24 de Fevereiro de 2014, data até à qual foi comercializado, pelo B..., o papel comercial (facto que não é refutado pelos Recorrentes), com a prestação de informação apenas com base no que constava nas Notas Informativas.
Já quanto às contra-ordenações que têm que ver com o conflito de interesses, a saber:
- dever do intermediário financeiro organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos de interesses actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da ocorrência de conflitos de interesses (artigo 309.º, n.º 1, do CdVM);
- dever de, em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo (artigo 309.º, n.º 2, do CdVM); e
- dever do intermediário financeiro dar prevalência aos interesses do(s) cliente(s) em relação aos seus próprios interesses (artigo 309.º, n.º 3, do CdVM),nos moldes como foram imputadas aos Recorrentes, as infracções são igualmente duradouras (ou permanentes) e não instantâneas.
Assim sendo, no que diz respeito ao dever do intermediário financeiro organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da ocorrência de conflitos de interesses (artigo 309.º, n.º 1, do CdVM), a infracção por referência ao papel comercial da EI..., S.A consumou-se no dia em que foi determinado no seio do B... a cessação da comercialização do papel comercial pela Comissão Executiva, no dia 04.12.2013. Foi neste dia que o B... se organizou e logrou identificar e agir em conformidade para identificar e cessar o risco de conflito de interesses, apesar de ter continuado a violar os n.ºs 2 e 3 do artigo 309.º do CdVM.
Também e ainda por referência à colocação do papel comercial da EI..., S.A, as demais infracções (n.ºs 2 e 3 do artigo 309.º do CdVM) consumaram-se no dia 11 de Dezembro de 2013, data até à qual foram comercializadas, pelo B..., as emissões de papel comercial, com violação dos deveres decorrentes daquelas normas de conflito de interesses (a de tratamento de clientes – n.º 2; e a de gestão de conflitos – n.º 3).
No caso da colocação do papel comercial da R..., S.A, as três infracções consumaram-se no dia 24 de Fevereiro de 2014, data até à qual foram comercializadas, pelo B..., as emissões de papel comercial, conforme decorre da decisão administrativa e se mostra provado infra, com violação das três regras de conflitos de interesses.
Apesar do Banco de Portugal ter determinado a suspensão da comercialização desse papel comercial, em data anterior, certo é que ainda assim o B... não se logrou organizar, mantendo a comercialização até àquele dia.
Por outro lado, ao contrário do que parece ser o entendimento do Haitong, o facto do BEl... (agora Haitong) não ter sido o intermediário financeiro responsável pela colocação do papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A e, consequentemente, pela prestação de informação aos investidores (clientes do B...) que o adquiriram, em nada contende com o cálculo da data de prescrição do procedimento contra-ordenacional, na medida em que resulta da decisão administrativa que a mesma considera que aquele Banco Recorrente (e também o Recorrente AA) deram um contributo causal para a prestação de informação sem qualidade por parte do B... aos seus clientes, sendo aplicado o conceito extensivo de autoria que resulta do n.º 1 do artigo 16.º do RGCO.
Nestes termos, a contagem dos prazos de prescrição do presente procedimento contra-ordenacional iniciou-se nos aludidos prazos e não, como pretende o Arguido Haitong, em 15 de Outubro de 2013 (data da última Nota Informativa do papel comercial da EI..., S.A em causa nos presentes autos) e 16 de Janeiro de 2014 (data da última Nota Informativa do papel comercial da R..., S.A em casa nos presentes autos). Veja-se que, as Notas Informativas apenas foram um veículo de transmissão de informação, sendo que, após a última emissão, continuou a ser comercializado papel comercial sem que a informação prestada fosse de qualidade. Como melhor se explicará infra, o tipo objectivo que foi imputado à Haitong nada tem que ver com a redacção ou necessidade de actualização de Notas Informativas, mas antes com a violação de um dever de prestar informação de qualidade por parte do intermediário financeiro, independentemente do veículo de transmissão dessa informação.
(…) a contagem do prazo de prescrição inicia-se com a consumação do facto ilícito e não com a prática do(s) contributo(s) causal(ais) de cada um dos agentes para a realização do mesmo.
Tal extrai-se do próprio n.º 1 do artigo 119.º do Código Penal que determina que “o prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se tiver consumado”, esclarecendo ainda o n.º 3 do mesmo artigo 119.º do Código Penal que “no caso de cumplicidade atende-se sempre, para efeitos deste artigo, ao facto do autor”.
Relativamente ao início de contagem do prazo de prescrição secundamos o raciocínio perfilhado pelo tribunal a quo, face á qualificação das infrações cometidas pelo aqui Recorrente como contraordenações permanentes, pelas razões acima melhor expostas e que aqui se reproduziram por uma questão de simplificação.
Por recurso, subsidiariamente, ao disposto no art. 119º nº 2 al. a) do CP ( ex vi art. 407º CdVM e art. 32º do RGCO), articulado com o teor dos factos dados como provados, designadamente nos pontos 230, 238, 246, 253, 267, 275, 305, 306, 359 a 362, os prazos de prescrição ter-se-ão iniciado em 04.12.2013, 11.12.2013 e 24.02.2014, pelo que, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 25.10.2021, em circunstâncias normais já se mostraria esgotado o prazo máximo de prescrição de sete anos e meio.
Porém, assim não aconteceu, porquanto se entende que àqueles prazos de prescrição deverão somar-se os dois períodos de suspensão da prescrição consagrados pelas Lei nº 1-A/2020 e nº 4-B/2021, regime decorrente das medidas excepcionais adoptadas na situação de pandemia por Covid 19 que assolou o país.
Senão vejamos.
A Lei 1-A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, no artigo 7.º, nºs 3 e 4, determinou a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos, desde 9 de Março de 2020.
Uma vez que a Lei 16/2020, de 29 de Maio, revogou o artigo 7.º da Lei 1-A/2020, alterada pela Lei 4-A/2020, pondo termo à suspensão dos aludidos prazos de prescrição e caducidade (cf. artigo 8.º da Lei 16/2020), a partir do dia 3 de junho de 2020 os prazos de prescrição e caducidade que haviam ficado suspensos por força da Lei 1-A/2020 retomaram a respetiva contagem.
Segundo o artigo 6.º da Lei 16/2020, os prazos de prescrição e caducidade que “deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas por tal lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão”.
Assim sendo, no caso em apreço, ao aludido prazo de prescrição de sete anos e meio, acresce o prazo em que foi determinada a mencionada nova causa de suspensão decorrente da situação de emergência nacional e de calamidade determinada pela pandemia causada pelo Covid19, que por força da Lei nº 1-A/2020 é de 86 dias (entre 9/3/2020 e 2/6/2020) e que abrangeu o procedimento dos autos uma vez que o prazo de prescrição nessa altura ainda não se esgotara.
Posteriormente, pela Lei nº 4-B/2021 de 1/2 foi aditado o art. 6º-B nº 3 e 4 da Lei nº 1-A/2020, voltando a suspender os prazos de prescrição com efeitos reportados a 22/1/2021 até 5/4/2021 (Lei nº 13-B/2021 de 5/4), no total de 74 dias, e que abrangeu o procedimento dos autos uma vez que o prazo de prescrição nessa altura também ainda não se esgotara.
Tendo ficado expressamente previsto no referido art. 6º-B nº 4 que, “prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, aos quais acresce o período de tempo em que vigorar a suspensão”.
A aplicabilidade destes prazos de suspensão tem sido reiteradamente aceite por este Tribunal da Relação-Secção PICRS , no seguimento dos consistentes entendimentos nesse sentido do Tribunal Constitucional, que enjeita qualquer das inconstitucionalidades invocadas pelos Recorrentes, designadamente a alegada violação dos arts. 2º e 29º nº 1 e 4 da CRP, como deu conta o tribunal a quo, nos seguintes termos:
“Os Recorrentes Haitong e AA defendem que não têm aplicação, no vertente caso, as suspensões do prazo de prescrição, em decorrência da pandemia por covid-19, tendo em conta a data da prática das infracções imputadas e a data da entrada em vigor das citadas leis, sob pena de violação do princípio da proibição da aplicação retroactiva da lei menos favorável aos Arguidos.
Sucede, porém, que o próprio Tribunal Constitucional, chamado que foi para verificar a conformidade das normas em apreço quando interpretadas no sentido de poderem ser aplicadas a infracções cometidas antes da entrada em vigor dos diplomas em causa, já se pronunciou pela conformidade constitucional das mesmas normas.
Na verdade, no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 500/2021 foi decidido o seguinte:
“Não julga inconstitucional o artigo 7.º, n.os 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência.”
Já o acórdão do mesmo Colendo Tribunal, com o n.º 660/2021 decidiu o seguinte:
“Não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido “de que a causa de suspensão dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista se aplica aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontram já em curso”.
De acordo com aquele primeiro acórdão:
“A medida constante dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 — já o notámos — insere-se no âmbito de legislação temporária e de emergência, aprovada pela Assembleia da República para dar resposta à crise sanitária originada pela pandemia associada ao coronavírus SARS-CoV-2 e à doença COVID-19.
“No cumprimento do seu dever de proteção da vida e da integridade física dos cidadãos (artigos 24.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, da Constituição, respetivamente), o Estado adotou um conjunto de medidas destinadas a conter o risco de contágio e de disseminação da doença, baseado na implementação de um novo modelo de interação social, caracterizado pelo distanciamento físico e pela diminuição dos contactos presenciais.
“No âmbito da administração da justiça — vimo-lo também —, o cumprimento desse dever de proteção conduziu à excecional contração da atividade dos tribunais, concretizada através da sujeição dos atos e diligências processuais ao regime das férias judiciais referido no n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, e, após as alterações introduzidas pela Lei n.º 4-A/2020, à regra da suspensão, pura e simples, de todos os prazos processuais previstos para aquele efeito. Para os processos urgentes, começou por estabelecer-se um regime especial de suspensão dos prazos para a prática de atos, ainda que com exceções (artigo 7.º, n.º 5, da Lei n.º 1-A/2020), que a Lei n.º 4-A/2020 acabou por modificar, impondo a sua normal tramitação desde que fosse possível assegurar a prática de atos ou a realização de diligências com observância das regras de distanciamento físico.
“Por força desta paralisação da atividade judiciária, que se estendeu à justiça penal, os atos processuais interruptivos e suspensivos da prescrição deixaram de poder praticar-se no âmbito dos procedimentos em curso, pelo menos nas condições em que antes o podiam ser. Relativamente aos procedimentos criminais, assim sucedeu com a dedução da acusação, a prolação da decisão instrutória e a apresentação do requerimento para aplicação de sanção em processo sumaríssimo (artigos 120.º, n.º 1, alínea b), e 121.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal), a declaração de contumácia (artigos 120.º, n.º 1, alínea c), e 121.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal) e a constituição de arguido (121.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal). Já no âmbito dos procedimentos contraordenacionais, o mesmo se verificou, pelo menos, com a prolação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima (artigo 27.º-A, n.º 1, alínea c), e 28.º do RGCO), a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomadas ou qualquer notificação (artigo 28.º, n.º 1, alínea a), do RGCO), a realização de quaisquer diligências de prova (artigo 28.º, n.º 1, alínea b), do RGCO) e a prolação da decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima (artigo 28.º, n.º 1, alínea d), do RGCO).
“É este particular e especialíssimo contexto que está subjacente à fixação, por lei parlamentar, de uma causa de suspensão da prescrição que não somente é transitória, como se destinou a vigorar apenas e só durante o período em que se mantivesse — se manteve — o condicionamento à atividade dos tribunais determinado pela situação excecional de emergência sanitária e pelo concomitante imperativo de proteção da vida e da saúde dos operadores e utentes do sistema judiciário: suspendeu-se o decurso do prazo de prescrição porque se suspenderam os prazos previstos para a prática dos atos suscetíveis de obstar à sua verificação; suspenderam-se os prazos previstos para a prática desses (e de outros) atos processuais porque se suspendeu a atividade normal dos tribunais de modo a prevenir e conter o risco de infeção dos intervenientes no sistema de administração da justiça, incluindo dos próprios arguidos.
“Como bem notou o Tribunal recorrido, encontramo-nos, pois, diante de um «mecanismo normativo […] instrumental», destinado a fazer face a uma «situação de rutura e anormalidade», em estreita e indissociável relação com o já designado «“lockdown” da justiça penal» (Gian Luigi Gatta, “Lockdown da justiça penal, suspensão da prescrição do crime e princípio da irretroatividade: um curto-circuito”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 30, n.º 2, maio-agosto de 2020, p. 297 e ss.) originado pela crise sanitária, que afetou em intensa medida — ou mesmo eliminou — a possibilidade de serem praticados os atos processuais suscetíveis de interromper e de suspender a prescrição.
“Não é demais sublinhar que se trata de uma suspensão, e não de uma interrupção, do prazo prescricional: o tempo de prescrição já decorrido desde a data da consumação do ilícito típico não é inutilizado; apenas o seu decurso é paralisado pelo tempo correspondente à paralisação do normal processamento dos termos ulteriores dos processos em curso.
“Neste contexto, é evidente que a causa de suspensão da prescrição estabelecida no n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 apenas se encontraria apta a cumprir aquela função se pudesse aplicar-se aos procedimentos pendentes por factos anteriores ao início da sua vigência. Como refere Gian Luigi Gatta a propósito de norma congénere aprovada em Itália (artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020), «[t]rata-se de uma disposição temporária pensada precisamente para os processos em curso e, como tal, para ter eficácia retroativa. Suspende-se uma atividade em curso por força da impossibilidade do seu prosseguimento, determinando-se um prazo para o seu reatamento, congelando-se o intervalo de tempo entretanto volvido. A suspensão é forçada: não é imputável a ninguém e não há razão para que beneficie quem quer que seja» (loc. cit., p. 303).
“Esta última afirmação é especialmente relevante: conforme se verá em seguida, ela sintetiza, na verdade, as duas razões que explicam a impossibilidade de reconduzir a causa de suspensão prevista no artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 1-A/2020, à ratio da proibição da retroatividade in pejus, consagrada no artigo 29. º, n.ºs 1, 3 e 4, da Constituição.
“ Dizer-se que a suspensão «não é imputável a ninguém» é o mesmo que dizer-se que a suspensão não é imputável ao Estado.
“Tendo em conta os fundamentos inerentes ao princípio da legalidade penal, tal constatação, para além de correta, é particularmente esclarecedora.
“A suspensão do decurso do prazo de prescrição dos procedimentos sancionatórios pendentes durante o período em que vigoraram as medidas de emergência adotadas na Lei n.º 1-A/2020 não se destinou a permitir que o Estado corrigisse ou reparasse os efeitos da sua inércia pretérita no âmbito do exercício do poder punitivo de que é titular. Destinou-se apenas e tão só a responder aos efeitos de uma superveniente e não evitável paralisação do sistema de administração da justiça penal, imposta pela necessidade de controlar e conter a disseminação de um vírus potencialmente letal. Tratando-se de uma causa de suspensão e não de interrupção do prazo de prescrição, cuja vigência não excedeu o lapso temporal durante o qual se verificou a afetação ou condicionamento da atividade dos tribunais, nem conduziu — reticus, não tinha sequer a virtualidade de conduzir — à reabertura dos prazos prescricionais já integralmente decorridos, a sua aplicação aos procedimentos pendentes não exprime qualquer excesso, arbítrio ou abuso por parte do Estado contra o qual faça sentido invocar as garantias inerentes à proibição da retroatividade in pejus: ao determinar a aplicação a procedimentos pendentes da suspensão da prescrição em razão da pandemia então em curso, a solução adotada limita-se, na verdade, a assegurar «a produção do efeito útil da norma de emergência» (idem, p. 313), não ingressando no âmbito da esfera defensiva que é assegurada pelo princípio da legalidade.
“Não é diferente a conclusão a que se chega se encararmos a proibição da retroatividade in pejus a partir da proteção da confiança, como fez o Tribunal recorrido.
“Se tal proibição visa garantir ao destinatário uma previsibilidade razoável das consequências com que se deparará ao violar o preceito penal, é relativamente evidente, quando se trate de estender o respetivo âmbito de incidência para além dos limites traçados pela letra dos n.ºs 1, 3 e 4, do artigo 29.º, que a sua invocação deixará de ter fundamento se o evento em causa se situar no mais elevado grau daquilo que não é por natureza antecipável, como sucede com a paralisação do sistema de administração da justiça penal ditada pelo súbito e inesperado surgimento de uma pandemia à escala global.
“Contra o que acaba de dizer-se, pode argumentar-se, é certo, que a antecipação em lei contemporânea da prática dos factos da causa de suspensão da prescrição que veio a constar do conjunto de medidas de emergência aprovadas pelo Parlamento teria sido, em rigor, possível. Bastaria que o legislador português tivesse integrado no elenco das causas de suspensão da prescrição previstas no artigo 120.º, n.º 1, do Código Penal, uma disposição idêntica à que consta do artigo 159.º do Código Penal italiano, que prevê a suspensão do decurso do prazo de prescrição do procedimento criminal nos «casos em que a suspensão do procedimento ou do processo penal é imposta por uma disposição especial da lei».
“Do ponto de vista da invocabilidade das garantias inerentes à proibição da retroatividade, a diferença entre o ordenamento jurídico português e o Direito italiano não é, porém, determinante: apesar de ter conhecimento de que o decurso do prazo de prescrição se suspenderá se e quando vier a ser determinada em lei posterior a suspensão do processo ou do procedimento, o agente que deva ser punido segundo o direito italiano não sabe, no momento em que decide praticar o ilícito-típico, se essa suspensão virá efetivamente a ocorrer, nem sobre durante quanto tempo vigorará na hipótese de vir a ser determinada, nem sobre as caraterísticas do facto ou do acontecimento que venham a ditar essa eventual opção.
“Perante a causa de suspensão que veio a constar do artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020, a posição do agente italiano não é, por isso, muito diferente daquela em que se encontra o agente português em face da causa de suspensão da prescrição constante do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020: tal como este não podia saber, no momento em que praticou o facto criminoso, que a suspensão da prescrição do procedimento instaurado viria a ser imposta pela Assembleia da República em consequência do lockdown da justiça penal originado pelo súbito avanço da pandemia, também aquele não podia ter conhecimento, quando tomou a decisão de praticar o crime, de que a suspensão do processo — e, com ela, a suspensão do prazo de prescrição — viria a ser determinada em norma posterior, editada no mesmo exato contexto.
“É por isso que, apesar de o Tribunal Constitucional italiano ter atribuído relevância à existência de uma norma de intermediação como a constante do proémio do artigo 159.º do respetivo Código Penal para concluir pela compatibilidade da norma constante do artigo 83.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 18, de 17 de março de 2020, com a proibição da retroatividade (Acórdão n.º 278 de 2020), não existe entre uma e outra solução qualquer diferença que possa ser considerada decisiva ou determinante do ponto vista da proteção da confiança: em ambos os casos, a causa da suspensão do prazo de prescrição é integralmente determinada em lei ulterior ao momento da prática do ilícito-típico, sem que possa dizer-se, tendo em conta o carácter totalmente imprevisível dos acontecimentos que a determinaram, que a sua aplicação aos procedimentos pendentes frustre aquela exigência de previsibilidade das consequências da violação da norma penal a que responde a proibição da retroatividade in pejus.
No mesmo sentido, vide também o recentíssimo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 798/2021.”
Assim sendo, ao referido prazo de prescrição das contraordenações em causa nestes autos, acresceram o/os período(s) de tempo em que vigorou a suspensão, por força dos referidos regimes de suspensão da Lei nº 1-A/2020 (com as apontadas alterações), num total de 160 dias.
Deste modo, quando foi proferido o despacho de recebimento dos recursos de impugnação judicial em 25.10.2021 ainda não se completara o prazo de prescrição de nenhuma das infrações em causa e, nesse momento iniciou-se novo período de suspensão do prazo de prescrição de 6 meses, previsto no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO.
 Para além desse acréscimo do prazo de suspensão de prescrição, entendemos também ser de aplicar a nova causa de suspensão do prazo de prescrição prevista no actual art. 418º nº 2 do CdVM introduzido pela Lei n.º 28/2017, de 30/05.
Senão vejamos.
O aqui Recorrente foi condenado, por decisão proferida pela CMVM, pela prática das referidas contraordenações previstas e punidas pelos arts. 389º nº 1 al. a) e 397º, n.º 2, alínea b) do CdVM.
Inconformado com a referida decisão proferida pela CMVM, o aqui recorrente dela interpôs Recurso de Impugnação Judicial, tendo sido proferido despacho de recebimento desse recurso pelo TCRS em 25.10.2021.
Foi precisamente a partir da notificação daquele despacho- despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima- que se iniciou o prazo de suspensão da prescrição do procedimento relativo às referidas contraordenações consagradas no CdVM, prevista no art. 27º-A nº 1 al. c) do RGCO.
Nessa mesma data já se encontrava em vigor a nova redação do art. 418º do CdVM, introduzida pela Lei n.º 28/2017, de 30/05- que revê o regime sancionatório do direito dos valores mobiliários [transpõe a Diretiva 2014/57/UE, do Parlamento e do Conselho, de 16 de abril de 2014, a Diretiva de Execução (UE) 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, e parcialmente a Diretiva 2013/50/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, e adapta o direito português ao Regulamento (UE) n.º 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, procedendo à alteração ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, e ao Decreto-Lei n.º 357-C/2007, de 31 de outubro], a qual introduziu significativas alterações ao CdVM, nomeadamente no regime da prescrição, passando o art. 418º a ter o seguinte teor:
“1 - O procedimento contraordenacional prescreve:
a) No prazo de oito anos, nas contraordenações muito graves; e
b) No prazo de cinco anos, nas contraordenações graves e menos graves.
2 - Sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação.
3 - A suspensão prevista no número anterior cessa em relação às infrações imputadas em que seja proferida, em sede de recurso, uma decisão de absolvição.
4 - No caso das infrações sucessivas ou simultâneas referidas no artigo 402.º-A, o prazo de prescrição do procedimento por contraordenação conta-se a partir da data de execução do último ato praticado.
5 - O prazo de prescrição das sanções é de cinco anos a contar do dia em que se torna definitiva ou transita em julgado a decisão que determinou a sua aplicação.”
Os ilícitos contraordenacionais previstos no CdVM e, pelos quais os aqui Recorrentes foram condenados, continuaram a ser punidos nos termos dessa legislação, apenas se impuseram algumas alterações em função da necessidade de transposição das mencionadas Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho.
Parte dos argumentos utilizados para a admissão da aplicação da nova causa de suspensão do prazo de prescrição introduzida pela Lei nº 1-A/2020, são transponíveis para a decisão de admissão desta nova causa de suspensão do prazo de prescrição estabelecida na nova redação do art. 418º nº 2 do CdVM com plena aplicabilidade aos procedimentos contraordenacionais em curso, apesar da prática dos factos ser anterior à entrada em vigor  daquela Lei nº28/2017, de 30/05.
Como vimos, o art. 27º-A nº 1 do RGCO admite outras causas de suspensão do prazo de prescrição para além das hipóteses ali previstas (não contendo enunciado taxativo), nos casos especialmente previstos na lei, admitindo outras causas de suspensão que só sejam consagradas por lei posterior, como é o caso.
Na génese da Lei nº28/2017, de 30/05, está a Proposta de Lei nº 53/XIII de 12.1.2017, com vista à alteração do CdVM, em cuja Exposição de Motivos se pode ler que, “O Programa do XXI Governo Constitucional estabelece o objetivo de assegurar uma regulação eficaz, particularmente sobre o setor financeiro. Casos recentes ocorridos no sistema financeiro português, alguns relacionados com a prática de ilícitos, além de evidenciarem falhas na supervisão e regulação financeiras, provocaram sérios prejuízos diretos e indiretos para a economia nacional, para as finanças públicas e, sobretudo, para os portugueses. Na maioria daqueles casos, a ausência ou demora na obtenção de uma sanção efetiva dos responsáveis afetou a credibilidade e reputação das entidades encarregues da regulação e supervisão do setor financeiro, assim como a confiança no sistema judicial e na realização da justiça.
O reforço da eficácia dos poderes de supervisão, de fiscalização e de sanção de infrações, tendo em vista a proteção dos direitos e interesses dos consumidores de produtos e serviços financeiros, aconselha o estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão.
A adaptação do direito português ao Regulamento (UE) n.º 596/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativo ao abuso de mercado (regulamento abuso de mercado), e a transposição da Diretiva n.º 2014/57/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa às sanções penais aplicáveis ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado (abuso de mercado), e da Diretiva de Execução (UE) n.º 2015/2392, da Comissão, de 17 de dezembro de 2015, relativa à comunicação de infrações, constituem o momento oportuno para proceder a uma revisão do regime sancionatório dos valores mobiliários – que vigora há cerca de 25 anos, desde o Código dos Mercados de Valores Mobiliários de 1991 –, num esforço de melhoria de soluções processuais e substantivas já consagradas e na previsão de novos regimes.”
O alargamento dos prazos de prescrição do procedimento contraordenacional e a introdução da causa de suspensão mostra-se assim justificada:
(…) consagra-se uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação judicial, total ou parcial, da decisão administrativa, à semelhança do modelo já acolhido no Código Penal. O novo regime fundamenta-se no facto de, nestes casos, o prolongamento da tramitação processual não se dever a qualquer inércia do Estado no exercício do poder sancionatório. Também por isso, a suspensão cessa em função da prolação de uma decisão subsequente de absolvição.”
Foi propósito expresso do legislador consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de prescrição, assente na confirmação da condenação administrativa por tribunal de 1ª Instância, , em moldes já previstos no CP, uma vez que, se terá considerado ser de dar prevalência aos poderes punitivos do Estado, na medida em que os direitos de defesa dos arguidos nessa fase estavam já adequadamente protegidos face à análise judicial efectuada em sede de impugnação judicial da decisão administrativa, justificando-se que, perante aquela confirmação por decisão judicial condenatória a prescrição em curso se suspendesse até que a decisão judicial transitasse, só voltando o prazo de prescrição a correr caso seja proferida sentença de absolvição no recurso da 2ª Instância( igual suspensão já vigorava no art. 120º nº 1 al. e) do CP).
“É preciso não esquecer que, em virtude da permanente alteração das dinâmicas sociais e económicas, quantas vezes de forma imprevisível, o legislador se vê frequentemente confrontado com a necessidade de interferir nos efeitos futuros de situações jurídicas constituídas no passado- o que faz, em nome da prossecução de interesses públicos de grande relevância e ao abrigo da normal revisibilidade das soluções legais e da liberdade de conformação que lhe cabe, enquanto poder democraticamente legitimado. Proibir em absoluto a modificação de efeitos vindouros de todas e quaisquer situações jurídicas já existentes no momento da emanação da lei (restritiva) nova constituiria uma solução demasiado rígida, susceptível de tolher a liberdade de movimentos de que o legislador precisa para adptar a ordem jurídica às constantes mutações da realidade.” (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Vol. I, p. 285/286).
Ora, afigura-se-nos que, atentos os interesses públicos subjacentes às alterações introduzidas no CdVM, de garantir a execução efetiva da política europeia destinada a assegurar a integridade dos mercados financeiros, (estabelecida no Regulamento (UE) nº 596/2014) e nomeadamente as finalidades que conduziram à nova redação do art. 418º do CdVM- estabelecimento de um regime sancionatório substantivamente mais robusto e proporcional às consequências das infrações cometidas e processualmente mais ágil e eficaz na obtenção de uma decisão- impõe-se aplicar a suspensão do prazo de prescrição aí prevista aos processos contraordenacionais pendentes na autoridade administrativa e que deram entrada em tribunal após a sua publicação, como é o caso dos autos.
Ao período de suspensão da prescrição do procedimento por contraordenação previsto no art. 27º-A nº 2 al. c) do RGCO ex vi do art. 407º do CdVM, que  se iniciou a partir da notificação do despacho que procedeu ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima até à decisão final do recurso- que no regime geral das contraordenações (RGCO) não podia ultrapassar seis meses- no caso das contraordenações previstas no CdVM (regime especial) acresce a suspensão do prazo de prescrição caso haja confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância da decisão administrativa de condenação.
Não estamos perante um caso de violação do princípio da retroactividade da lei mais desfavorável, como exaustivamente foi tratado nos mencionados Ac TC nº 500/2021, nº 660/2021 e nº 798/2021, mais não seja porque não se está a aplicar retroativamente a lei, mas a aplicar-se para futuro a processo contraordenacional ainda pendente, embora os factos tenham sido cometidos no passado.
Tal como entende Frederico de Lacerda da Costa Pinto, ( embora o faça no contexto da aplicação das Leis Covid, mas cujos argumentos são transversais) “o regime adoptado incide sobre a suspensão do prazo de prescrição em curso e a sua contagem futura, constitui um caso de retroconexão ( criação de um regime para o presente e o futuro a partir de um facto pressuposto anterior) e não está abrangido pela proibição de retroatividade da lei penal nem pelo princípio da aplicação da lei penal mais favorável ao arguido em caso de sucessão de leis penais no tempo- regimes estes que se reportam ao facto, à sua imputação e à pena, mas não ao regime processual de suspensão da prescrição.”
Essa aplicação imediata aos processos pendentes não ofende de forma arbitrária, inesperada ou desproporcional expectativas do arguido- não violando os princípios da segurança, confiança e proporcionalidade- porquanto o legislador, em matéria contraordenacional tem mais amplos poderes de conformação da legislação em função de relevantes interesses de ordem pública que estão subjacentes à punição daquele tipo de ilícios contraordenacionais, como acima deixamos exarado, tendo sido o legislador a entender por bem consagrar uma nova causa de suspensão do prazo de suspensão da prescrição na fase judicial do processo contraordenacional desse tipo de ilícitos, entendendo que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional suspende-se em caso de confirmação, total ou parcial, pelo tribunal de primeira instância ou pelo tribunal de recurso da decisão administrativa de condenação, suspensão essa que acresce às demais previstas na lei, pois que se aplica sem prejuízo de outras causas de suspensão ou de interrupção da prescrição.
O princípio da confiança também não impõe, como exemplarmente se pode ler dos já mencionados Acórdãos do Tribunal Constitucional, a exacta cognoscibilidade de todas as causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional no momento em que o arguido comete o ilícito.
Cumpre também referir que “ a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal, que dá origem a um sistema punitivo próprio, com espécies de sanção, com procedimentos punitivos e agentes sancionadores distintos, obsta a que se proceda a uma transposição automática e imponderada para o direito de mera ordenação social dos princípios constitucionais que regem a legislação penal. Tais ilícitos não se distinguem apenas pelo diferente tipo de cominação- uma coima ou uma pena-mas sobretudo por um critério material que atende à diferença de bens jurídicos protegidos e à diferente ressonância ética dos ilícitos.
A submissão do direito das contraordenações às garantias essenciais do direito penal, isto é, as garantias relativas á segurança, certeza, confiança e previsibilidade dos cidadãos, não significa que as normas e princípios constitucionais em matéria penal tenham que ser aplicados ao domínio contraordenacional com a mesma intensidade e com as mesmas exigências.
(…) No domínio contraordenacional, cabe ainda na margem de conformação do legislador a configuração em concreto da dimensão processual do instituto da prescrição do procedimento e, deste modo, a determinação do tempo necessário para o adequado desenvolvimento do mesmo procedimento com vista à prossecução das referidas finalidades.”( Ac TC nº 297/2016).
Neste conspecto, tem sido entendimento sufragado, de forma reiterada e consistente, pelo Tribunal Constitucional, designadamente nos referidos Acórdãos, que a nova lei que consagre uma nova causa de suspensão da prescrição (como acontece, como vimos, quanto à aplicação da nova causa de suspensão do prazo da prescrição promovida pela lei nº 1-A/2020) é imediatamente aplicável aos processos de contraordenação pendentes, ainda que a data da prática do facto ilícito seja anterior, a isso não obstando os princípios constitucionais cuja violação foi apontada pelos recorrentes.
Senão vejamos.
No Acórdão do TC nº 500/2021( já atrás citado) ficou decidido, “não julgar inconstitucional o artigo 7º nº 3 e 4 da lei nº 1-A/2020 de 19 de março, interpretado no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência.
Dele se extraem, com especial relevo para o caso em apreço, os seguintes enxertos:
“Em suma: para além de absolutamente congruente com o mais amplo critério seguido na jurisprudência do TEDH e do TJUE, a norma extraída dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, interpretados no sentido de que a causa de suspensão do prazo de prescrição do procedimento aí prevista é aplicável aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respetiva vigência, não se encontra abrangida, nem pela letra, nem pela ratio da proibição da retroatividade in pejus a que a Constituição, no seu artigo 29.º, n.ºs 1, 3 e 4, sujeita a aplicação das leis que definem as ações e omissões puníveis e fixam as penas correspondentes. 
(…) A circunstância de a interpretação sindicada se cingir aos procedimentos contraordenacionais pendentes por factos anteriores ao início da vigência da Lei n.º 1-A/2020 apenas serve para tornar mais evidente a conclusão que acima se alcançou. Com efeito, apesar de o direito das contraordenações, enquanto direito sancionatório público, ser influenciado ou “matizado” pelos princípios constitucionais do direito penal, a autonomia material do ilícito de mera ordenação social em relação ao ilícito penal obsta a que tais princípios possam ser transpostos deste para aquele de forma automática ou imponderada ou que possam aí valer com a mesma exata extensão ou com o mesmo grau de intensidade  (cf. Acórdão n.º 76/2016; no mesmo sentido, a propósito da liberdade de conformação do legislador na modelação do instituto da prescrição, v.  Acórdão n.º 297/2016). No que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto.
Resta concluir, assim, que, ao proibir que qualquer cidadão seja «sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão» ou sofra pena que não esteja expressamente cominada «em lei anterior» ou mais grave do que a prevista «no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos», o artigo 29.º da Constituição, respetivamente nos seus n.ºs 1, 3 e 4, não se opõe à aplicação de uma causa de suspensão da prescrição com a função e o recorte daquela que foi prevista no artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2000, a procedimentos contraordenacionais pendentes por factos praticados antes do início da respetiva vigência.”
Também no Acórdão do TC nº 660/2021(atrás citado) com relevo para o caso concreto, dele pode ler-se o seguinte:
“(…)é reconhecido na jurisprudência constitucional que inexiste suporte explícito na Lei Fundamental que consagre a regra da imprescritibilidade do procedimento criminal e que são valores como a certeza e a paz jurídica, ínsitos ao princípio do Estado de direito democrático, que reclamam que o instituto da prescrição, em sede criminal, seja ponderado e perspetivado como valor constitucional (cfr. Acórdãos 483/2002 e 629/2005).
Igualmente nesta senda, tem sido afirmado que o princípio da proibição da imprescritibilidade das penas ou das sanções equiparáveis não ancora um direito subjetivo do arguido à prescrição (cfr. Acórdãos n.º 483/2002 e 366/2018), sendo lícito ao legislador estabelecer causas de suspensão e de interrupção da prescrição, ou prever limites máximos temporais a causas de suspensão, desde que isso não implique, em concreto, a ineficácia do instituto de que o arguido possa vir a beneficiar.
Como tem sido evidenciado pela jurisprudência constitucional acima elencada, para além de não existir um direito subjetivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela Assembleia da República, o que se verifica neste caso (cfr. Acórdão n.º 449/2002).
Assim, consideramos que a aplicação imediata desta causa de suspensão a processos em curso não colide com as garantias asseguradas pelo princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal, quando, como é o caso, no momento da sua entrada em vigor, o prazo de prescrição já se tinha iniciado e, apesar de se encontrar em curso, não se havia ainda extinto – aliás, encontra-se fora do respetivo âmbito de proteção (v., de novo, o Acórdão n.º 500/2021).
Quer isto dizer que, na linha de pensamento de GIAN LUIGI GATTA, quando o prazo de prescrição não tenha ainda atingido o seu fim, ao determinar o prolongamento – como no caso da suspensão motivada pela pandemia –, a lei superveniente não torna punível um facto não punível: ela limita-se a conceder ao Estado, por qualquer motivo, neste caso por força de uma emergência sanitária, mais tempo para apurar os factos e a responsabilidade criminal. O direito de defesa não resulta, de modo algum, comprometido e o Estado não abusa do poder punitivo, nem frustra aquela exigência de previsibilidade das consequências da violação da norma penal: como mostra a própria disciplina da prescrição do crime (…) o momento em que se cumpre a prescrição é, na verdade, variável e em boa medida imprevisível antes da prática do facto, quando o agente nem sequer sabe se alguma vez será alvo de um procedimento criminal (cfr. “Lockdown da justiça penal, suspensão da prescrição do crime e princípio da irretroatividade: um curto-circuito”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Separata, Ano 30, n.º 20, maio-agosto 2020, Gestlegal, pág. 312 e 313).
(…) A construção perfilhada pelo TJUE, nos dois arestos da Saga Taricco, posiciona-se na mesma linha jurisprudencial do TEDH, no sentido de a proibição da retroatividade em matéria de prescrição poder ter por referência o terminus do prazo de prescrição, previsto na lei em vigor à data da prática dos factos, uma vez que o artigo 7.º da CEDH não impede a aplicação imediata aos procedimentos em curso das leis que estendem prazos de prescrição, quando os factos imputados ainda não tenham prescrito e quando essa extensão não seja arbitrária (cfr. Acórdão de 22 de junho de 2000, proferido no Caso Coëme and Others v. Belgium; Acórdão de 8 de dezembro de 2009, proferido no Caso Cesare Preveti v. l’Italie; ponto 22 do Acórdão n.º 500/2021; e Gatta, Gian Luigi, Ob. Cit. pág. 316).
Muito embora a apreciação da conformidade constitucional da aplicação da causa de suspensão da prescrição prevista nos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 aos procedimentos em curso se tenha feito por referência à sua natureza criminal, os argumentos que sustentam o presente juízo de não inconstitucionalidade são replicáveis para os procedimentos de natureza contraordenacional. Com efeito, e não obstante a jurisprudência do Tribunal se encontrar estabilizada no sentido de os princípios constitucionais com relevo em matéria penal não serem transponíveis, com a mesma extensão e intensidade, para o domínio contraordenacional (cfr. entre outros Acórdãos n.ºs 344/93, 278/99, 160/04, 537/2011, 85/2012, 76/2016, 297/2016 e 175/2021), é para nós claro, na senda do decidido no Acórdão n.º 500/2021, que, “no que diz respeito à proibição constitucional da retroatividade in pejus, isso significa que ela se estenderá ao direito contraordenacional somente enquanto manifestação nuclear da função de garantia do princípio da legalidade, exigida pela ideia de Estado de Direito e oponível ao arbítrio ex post facto”.
Assim, pelos fundamentos e considerações jurídicas acima expendidas, concluímos que a interpretação extraída do artigo 7.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido de ser aplicável a causa de suspensão da prescrição do procedimento aí prevista aos procedimentos contraordenacionais pendentes aquando da entrada em vigor daquele diploma, não viola o princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal in malam partem, consagrado no artigo 29.º, n.ºs 1 e 4, da CRP.”
Já mesmo anteriormente, no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 449/2002, havia ficado decidido que, para além de não existir um direito subjectivo à prescrição do procedimento criminal, é também legítimo que o legislador contemple causas de suspensão em diplomas especiais, desde que sejam suficientemente precisas e emitidas pela AR.
Deste modo, considerando o Tribunal Constitucional conforme à Constituição da República Portuguesa a aplicação da lei nova, que cria uma nova causa de suspensão da prescrição, aos processos a correr termos por factos cometidos antes do início da respectiva vigência, aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, se encontravam já em curso, não vemos qualquer obstáculo à aplicação da actual redação do art. 418º nº 2 do CdVM aos presentes autos.
Estar-se-á a aplicar aos processos pendentes de natureza contraordenacional outra causa de suspensão do prazo da prescrição, a um prazo que ainda está a decorrer, que não se havia esgotado à luz da lei anterior, não se tratando de uma causa de interrupção, pois que não se inutiliza o tempo decorrido até à sua entrada em vigor.
Assim sendo, na senda do que tem vindo a ser doutamente decidido pelo Tribunal Constitucional, não se vislumbram obstáculos constitucionais à aplicação imediata da causa de suspensão do prazo de prescrição  prevista no nº 2 do art. 418º do CdVM ao procedimento contraordenacional em curso relativamente às contraordenações pelas quais foram condenados os aqui recorrentes e que são objecto destes autos.
Salienta-se que argumentos semelhantes, especificamente no que se refere à aplicação de lei nova aos processos pendentes, quando procedem ao alargamento ou introdução de novas causas de suspensão da prescrição,  foram já sustentados por este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, designadamente no Acórdão proferido no Proc. Nº249/17.7YUSTR.L3 e 127/19.5YUSTR.L1, embora a propósito de ilícitos contraordenacionais de natureza distinta e sujeitos a regimes também eles distintos, mas cuja razão de ser tem aqui plena similitude.
Deve, pois, considerar-se adequada e conforme aos princípios constitucionais a aplicação, ao caso sub judice, do prazo de suspensão da prescrição estabelecido no actual art. 418º nº 2 do CdVM, e consequentemente declara-se não verificada a prescrição, uma vez que quando a sentença recorrida foi proferida pelo tribunal de 1ª Instância em 15/2/2022 ainda não se havia esgotado o prazo de prescrição, tendo o tribunal a quo confirmado a decisão administrativa de condenação quanto aos aqui recorrentes.
Assim decidindo, conclui-se que o prazo de prescrição do presente procedimento contraordenacional está suspenso desde 15/2/2022 e só retomará se vier a ser proferida decisão de absolvição em sede do presente recurso (art. 418º nº 3 do CdVM).
Improcede, pois, este segmento recursivo.
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14ª- A violação das regras de conflito de interesses consubstancia a prática de uma única contraordenação por cada pretensa violação das regras prevista no art. 309º do CdVM.
Sob as Conclusões 447 a 458 o recorrente requer a revogação da sentença recorrida sustentando que caso se considere que praticou as infrações previstas no art. 309º do CdVM, de violações das regras de conflitos de interesses no que respeita à colocação, pelo B..., do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, apenas poderá ser-lhe imputada a prática de uma única contraordenação.
Para o efeito entende o recorrente que, a sentença Recorrida imputa ao ora Recorrente a prática de três contraordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e outras três contraordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A, porém essas infrações não têm autonomia entre si, pelo que tão-pouco poderão configurar mais do que uma contra-ordenação por cada uma das normas alegadamente violadas.
Segundo o Recorrente a sua actuação consubstanciadora das aludidas contra- ordenações é a mesma: a aprovação do papel comercial (o próprio facto provado n.º 489 da Sentença Recorrida abarca a aprovação do papel comercial emitido por ambas as emitentes), por outro lado, o bem jurídico em causa nestas supostas contraordenações consiste na protecção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado, estando em causa uma única actuação que permite a imputação ao ora Recorrente, de uma única contra-ordenação, por cada uma das normas pretensamente violadas.
Para o caso de assim não se entender, considera que nas contra-ordenações imputadas apenas está em causa a alegada mesma decisão de colocação, pelo B..., do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A junto de clientes, alegadamente adoptada na reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013 e, por conseguinte, está em causa uma única contra-ordenação, ainda que possa ser configurada como uma contra-ordenação continuada, o que releva para fixar a medida da sanção, mas nunca para efeitos de imputar diferentes contra-ordenações.
A sentença recorrida pronunciou-se sobre esta temática sustentando que “os ilícitos respeitantes ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e os respeitantes ao papel comercial emitido pela R..., S.A não são os mesmos e foram praticados em momentos diferentes, o que implicou uma renovação do respectivo processo de motivação, apesar de terem preenchido o mesmo tipo de ilícito.
Na verdade, podemos surpreender diferentes resoluções contra-ordenacionais subjacentes às duas situações sob escrutínio, podendo ser afirmadas tantas infracções quantos os juízos concretos de censura que foram formulados aos agentes.
Para além disso, em termos de bens jurídicos violados, eles são igualmente distintos, na medida em que, de um lado, temos a pretecção dos investidores da EI..., S.A e, de outro lado, temos a protecção dos investidores da R..., S.A, em termos de prevenção e gestão de conflitos de interesses.
Do que fica dito, podemos concluir que estamos perante bens jurídicos distintos, tutelados por normas distintas, o que desde logo implica, com todo o respeito por entendimento diverso, que não se possa afirmar que o conteúdo do ilícito desvendado na conduta global do B... e do Recorrente se pode determinar totalmente apenas por uma das normas contra-ordenacionais aplicáveis.
 Esta diferença de bens jurídicos em apreço permite concluir pela existência de um concurso de contra-ordenações, afastando as relações de especialidade ou de subsidiariedade entre normas mas também de consumpção.
Neste momento, tendo em vista que os tipos de ilícitos contra-ordenacionais em causa tutelam bens jurídicos distintos e sancionam condutas distintas, não coincidindo, por isso, na sua descrição objectiva e subjectiva, exclui-se qualquer tipo de relação de especialidade ou de subsidiariedade.
Quanto à relação de consumpção, importa referir que a decisão de proceder à emissão, colocação e comercialização de papel comercial da EI..., S.A, embora seja tomada na mesma altura, é autonoma em relação à decisão de emissão, colocação e comercialização de papel comercial da R..., S.A, na medida em que estão em causa decisões respeitantes a entidades distintas, com reflexos sobre universos de investidores igualmente distintos.
Nestes termos, não se logra identificar um elemento de relação entre as duas contra-ordenações, que, numa apreciação global dos factos, possibilite a conclusão de que com a punição da violação das regras sobre conflitos de interesses por referência à EI..., S.A, se realiza também a punição da violação das regras sobre conflitos de interesses por referência à R..., S.A, ou vice-versa, antes de denotando sentidos de ilicitude diferentes, concluindo-se pela realização dos dois tipos de contra-ordenação em simultâneo.
Apenas a aplicabilidade à situação de facto em concreto das diferentes normas em causa representativas de diversos tipos de infracção logra encontrar uma reacção punitiva devida pela violação dos concretos e distintos bens jurídicos tutelados, não sendo a punição por apenas um deles suficiente para assegurar a salvaguarda de todos os interesses emergentes, sendo amplamente justificada a aplicação das normas em simultâneo, por protegerem bens jurídicos distintos; não existe entre as normas uma relação de tutela de “maior dimensão” e de “menor dimensão” de bens jurídicos. Existem antes bens jurídicos tutelados diversos.”
Como veremos, na questão que será tratada a seguir a esta (15ª questão) sobre o concurso aparente de contraordenações, o recorrente volta a este tema, pelo que será melhor abordado nessa altura, porquanto se sufraga o entendimento perfilhado na sentença recorrida de que há um concurso real e efectivo de contraordenações, pois que para além da pluralidade de tipos violados, -o recorrente cometeu mais do que uma infração ( mais propriamente 6 infrações p.p. pelo art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM) através de condutas diferentes ( pluralidade de acções) tendo havido pluralidade de resoluções em cada uma das colocações de papel comercial- a da EI..., S.A e a da R..., S.A-com pluralidade de violações das regras de conflito de interesses.
Quanto à questão da contraordenação continuada, a admitir-se a sua aplicação no regime das infrações contraordenacionais,  necessário seria que se verificassem os requisitos estabelecidos no art. 30º nº 2 do CP ex vi do art. 32º do RGCO.
A Doutrina e a Jurisprudência não tem posição unívoca quanto à questão da admissibilidade ou não, em sede de direito contraordenacional, da figura da infracção continuada.
A favor, pronunciaram-se já António Beça Pereira (Regime Geral de Contra-ordenações e Coimas, 12º edição, 2020, Coimbra Almedina, pág. 79, citando o Prof. Figueiredo Dias relativamente ao crime continuado - Direito Penal 2, pág, 366 e 385) e Sima Santos e Lopes de Sousa (Contraordenações anotações ao Regime Geral, 2001, Vislis Editores, pág. 169 e 175).
Segundo estes últimos autores, “há contra-ordenação continuada quando, através de várias acções, se repete o preenchimento do mesmo tipo legal ou de tipos que protegem o mesmo bem jurídico, usando-se de um procedimento que se reveste de uma certa uniformidade e aproveita um condicionalismo exterior que propicia a repetição, fazendo assim diminuir consideravelmente a culpa do agente.
Com efeito, sucede, por vezes, que certas actividades que preenchem o mesmo tipo legal de infração (ou mesmo diversos tipos legais, mas que fundamentalmente protegem o mesmo bem jurídico), e às quais presidiu uma pluralidade de resoluções ( que portanto atiraria a situação para o campo da pluralidade de infrações) devem ser aglutinadas numa só infração, na medida em que revelam uma considerável diminuição da culpa do agente.”
Considerando duvidosa a aplicação da figura da infração continuada no direito contraordenacional, conhece-se a posição de Augusto Silva Dias, o qual sustenta que a «infracção continuada foi pensada no contexto de factos lesivos de bens jurídicos pessoais e as contraordenações consistem na afectação de interesses funcionais ou organizatórios, destituídos por definição de referente pessoal: por isso o requisito do art. 30º/2 do CP «…que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico…» não se verifica». Por outro, considera que «a  neutralidade axiológica e o carácter admonitório da culpa própria das contraordenações são dificilmente compatíveis com a sensível diminuição progressiva da culpa» (Direito das Contraordenações, 2020, Almedina, pág. 145 e seguintes).
Maria João Antunes aponta “como requisitos da contra-ordenação continuada os seguintes: a existência de várias violações de um tipo contra-ordenacional ou de tipos contra-ordenacionais que, no essencial, protejam o mesmo interesse jurídico, através de condutas idênticas ou homogéneas; que as diversas infrações ocorram no quadro de uma mesma situação exterior, que, por objectivamente facilitar ou precipitar a prática do ilícito, diminui de forma sensível a culpa do agente; que entre as diversas infrações não tenha decorrido um intervalor de tempo tão longo que desfaça a unidade de motivação que há-se subjazer a todas elas. Por razões óbvias, e ao invés do que sucede na órbita do crime continuado, omite-se a referência à natureza não pessoal dos bens jurídicos. Isto porque, devido à índole do direito de mera ordenação social, que apenas contempla interesses de carácter funcional ou organizatório, a figura da contra-ordenação continuada nunca poderá incidir sobre valores pessoais, cuja sede exclusiva se situa na esfera do direito criminal.”
Não obstante a posição que se assuma perante tal querela doutrinal,  afigura-se-nos que, no caso dos autos, tal como se mencionou na sentença recorrida, não estão reunidos os pressupostos para que se conclua pela verificação de uma infracção continuada, porquanto, apesar de se ter apurado uma  pluralidade e homogeneidade de condutas, estando em causa essencialmente a proteção do mesmo interesse jurídico- proteção dos investidores em matéria de conflito de interesses-, não ficou demonstrado, desde logo, que tais condutas se enquadrem numa mesma situação exógena que leve à diminuição da culpa do recorrente, não tendo o recorrente feito qualquer menção à verificação deste requisito no caso em apreço.
A este propósito, de forma assertiva, ficou decidido na sentença recorrida que, “Nesta conformidade importa apurar se existiu, no vertente caso, uma “disposição exterior das coisas para o facto”, que de “maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente” (vide Eduardo Correia, in “Direito Criminal”, II, Almedina, Coimbra, 1971, pág. 208- e ss) (circunstâncias exógenas da conduta) ou, se, pelo contrário, estamos perante meras circunstâncias endógenas a favorecer a pluralidade de ilícitos.
Em suma, a construção da figura do crime continuado assenta essencialmente no menor grau de culpa do agente alicerçado no momento exógeno das condutas, na disposição exterior para o facto (e não na tendência, interna, do agente para o ilícito).
Ora, salvo o devido respeito, o Recorrente não logra demonstrar em que medida é que existe um factor que diminua a sua culpa e a do B..., de modo a fazer arrastá-los para a conduta desviante, em molde de tornar sucessivamente mais difícil e menos exigível contrariar o recurso ao expediente que contraria as normas violadas.
Na verdade, os deveres profissionais quer do B..., quer do Recorrente, enquanto intermediário Financeiro e administrador de um intermediário financeiro, respectivamente e a sua experiência no ramo, fazem esperar que a contra motivação daí decorrente seja suficiente para não se deixar tentar pela prática de ilícitos desta natureza que têm que ver com bens jurídicos relevantes, nos moldes já acima dissecados, independentemente de uma qualquer outra circunstância que possa ter ocorrido, momente qualquer tipo de instabilidade financeira do grupo.
O conjunto dos factos revela, antes, que foi na sua própria personalidade e estrutura interna que o B... e o Recorrente encontraram a determinação necessária para iniciar e persistir no não cumprimento dos deveres, o que de todo não revela uma diminuição da culpa, bem pelo contrário, acentua a sua culpa, mais grave à medida que viola mais e mais um dever, deveres esses que, não pudemos deixar de sublinhar, são inerentes à actividade desenvolvida. Ao contrário, consideramos que existe antes uma culpa não diminuída, tendo em vista que, em circunstância alguma, devem ser violados os normativos em causa, já que eles acabam por ser capitais para um exercício da actividade em causa.
Com todo o respeito, parece-nos totalmente indefensável esgrimir que existe uma culpa diminuída. Existe, sim, uma culpa aumentada, jamais diminuída, o que afasta a possibilidade de aplicação da figura da contraordenação continuada.
Como afirma Eduardo Correia, in “Unidade e Pluralidade de Infracções”, Teses, Almedina, 1983, pág. 251. (indicado no acórdão da Relação de Évora de 11-07-2013, processo .º 82/12.2YQSTR.E1, in www.dgsi.pt), “sempre que se prove que a reiteração, menos que a tal disposição das coisas, é devida a uma certa tendência da personalidade do criminoso, não poderá falar-se em atenuação da culpa e fica, portanto, excluída a possibilidade de existir um crime continuado”.
Não se verifica, pois, que o B... e o Recorrente tivessem agido no “quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminuísse consideravelmente a sua culpa”.
Por sua vez, não menos despiciendo importa aludir ao que refere a CMVM, no sentido de também não se verificar o pressuposto da execução tendencialmente homogénea dos factos.
Tal como acima já verificámos, a conduta que integra a factualidade típica não se realiza no mesmo momento, no que respeita à violação do disposto no artigo 309.º, n.º 1, no artigo 309.º, n.º 2 e no artigo 309.º, n.º 3.
Por outro lado, também não existe coincidência temporal entre as condutas violadoras dos três tipos contraordenacionais previstos no artigo 309.º do CdVM no que respeita, por um lado, à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e, por outro lado, à emissão de papel comercial emitido pela R..., S.A.
De facto, ao passo que os factos que constituem a prática do tipo de ilícito previsto no n.º 1 do artigo 309.º do CdVM, no que respeita à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A, ocorreram entre 4 de setembro de 2013 (data da realização da reunião do Comité ALCO do B..., em que foi decidida a colocação, pelo B..., de papel comercial a emitir pela EI..., S.A) e 11 de dezembro de 2013 (data da última subscrição de papel comercial emitido pela EI..., S.A colocado pelo B...), os factos que constituem a prática do tipo de ilícito previsto no artigo 309.º, n.º 2 e no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, no que respeita à colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A, ocorreram entre 9 de setembro de 2013 (data do início da colocação, pelo B..., de papel comercial emitido pela EI..., S.A) e 11 de dezembro de 2013 (data da última subscrição de papel comercial emitido pela EI..., S.A colocado pelo B...).
Já no que respeita aos factos que constituem a prática do tipo de ilícito previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, no que respeita à colocação de papel comercial emitido pela R..., S.A, ocorreram entre 4 de setembro de 2013 (data da realização da reunião do Comité ALCO do B..., em que foi decidida a colocação, pelo B..., de papel comercial a emitir pela R..., S.A) e 27 de fevereiro de 2014 (data da última subscrição de papel comercial emitido pela R..., S.A colocado pelo B...).
E os factos que constituem a prática dos tipos de ilícito previstos no artigo 309.º, n.º 2 e no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM, no que respeita à colocação de papel comercial emitido pela R..., S.A, ocorreram entre 9 de janeiro de 2014 (data da primeira colocação, pelo B..., de papel comercial emitido pela R..., S.A) e 27 de fevereiro de 2014 (data da última subscrição de papel comercial emitido pela R..., S.A colocado pelo B...).
Em suma, não se verificam todos os requisitos cumulativos de que o n.º 2 do artigo 30.º do CP, ex vi do artigo 32.º do RGCO faz depender a continuação criminosa, nada havendo a censurar à decisão administrativa por não ter decidido nesse sentido.”
Os factos apurados não permitem concluir pela verificação de uma mesma situação exterior que facilitasse a repetição da actividade ilícita, tornando menos exigível ao agente o cumprimento da norma jurídica violada.
Deste modo, a falta daquele requisito, afasta desde logo a possibilidade de qualificar as condutas praticadas pelo recorrente respeitantes ao conflito de interesses na colocação do papel comercial da EI..., S.A e da colocação do papel comercial da R..., S.A como uma única infracção continuada.
Como acima ficou demonstrado também nunca se poderia falar numa única contraordenação por cada violação das regras previstas no art. 309º do CdVM sendo perfeitamente autónomas as decisões de colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, e plúrimas as actuações do recorrente, designadamente em momentos temporais distintos e com actuações não interiramente coincidentes.
Assim sendo, improcede este segmento recursivo.

15ª- Concurso aparente de contraordenações:

i) relação de consumpção entre as 6 contraordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro ( art. 309º do CdVM);
ii) relação de subsidiariedade entre o nº 1 do art. 309º do CdVM e os nºs 2 e 3 do art. 309º do CdVM;
iii) relação de consumpção entre as 4 contraordenações imputadas e consubstanciadas na alegada violação das regras sobre conflito de interesses do intermediário financeiro previstas nos nºs 2 e 3 do art. 309º do CdVM;
iv) concurso aparente entre as contraordenações consubstanciadas na alegada violação das regras sobre o conflito de interesses relativamente á colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
v) concurso aparente entre as contraordenações consubstanciadas na alegada violação do art. 309º nº 3 do CdVM e o art. 7º nº 1 do CdVM.

Sob as Conclusões 459 a 502 o recorrente sustenta que a sentença recorrida andou mal ao entender que existiria um concurso efectivo entre seis contraordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses do intermediário financeiro, previstas respectivamente nos nºs 1, 2 e 3 do CdVM no que respeita à colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, p.p. no art. 397º nº 2 al. b) do CdVM, assim como errou ao imputar-lhe a prática de duas contraordenações pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, como previsto no art. 7º do CdVM e p.p no art. 397 nº 2 al. b) do CdVM, porquanto as contraordenações encontram-se numa relação de concurso aparente.
Mais uma vez, antecipamos que o recorrente não tem razão.
Para uma clarificação das relações de concurso entre crimes, transponíveis para as contraordenações, entendemos profícua a seguinte citação doutrinal:
“O art. 30º nº 1 do Código penal estabelece a propósito as seguintes regras, que são subsidiariamente aplicáveis em matéria de contra-ordenações ( art. 32º do RGCO):
-unidade de infração:
-unidade de tipos preenchidos com a conduta;
- concurso de infrações:
-pluralidade de tipos preenchidos com a conduta;~
-unidade de tipos preenchidos, nas pluralidade de vezes em que tal aconteceu.
Verificando-se pluralidade de infrações, costuma distinguir-se entre:
-concurso legal, aparente ou impuro a conduta do agente apenas formalmente preenche vários tipos de infração, mas, por via de interpretação, conclui-se que o conteúdo dessa conduta é exclusiva e totalmente abrangido ou absorvido por um só dos tipos violados, pelo que os outros tipos devem recuar, não sendo aplicados. Trata-se sobretudo de concurso ou convergência de normas jurídicas, em que a aplicação de umas exclui a aplicação de outras, tratando-se, pois, de um problema de determinação da norma aplicável.
Relações que podem estabelecer-se entre os diversos tipos de infracção:
- especialidade, um dos tipos aplicáveis (tipo especial) incorpora os elementos essenciais de um outro tipo também aplicável abstratamente ( tipo fundamental), acrescendo elementos suplementares ou especiais referente ao facto ou ao próprio agente. Por força do princípio lex speciallis derogat legi generali só se deve aplicar o tipo especializado.
- consumpção, o preenchimento de um tipo legal (mais grave) inclui o preenchimento de outro tipo legal (menos grave) devendo a maior ou menor gravidade ser encontrada na especificidade do caso concreto. Por força dos princípios ne bis in idem e lex consumens derogat lex consumate só se aplica o tipo mais grave. Pode, no entanto, acontecer o caso inverso e o crime mais grave acompanhar um crime menos grave consumpção impura aplicando-se, então, a norma mais leve;
-subsidiariedade, em que certas normas só se aplicam subsidiariamente, ou seja, quando o facto não é punido por uma outra norma mais grave. Com efeito, casos há em que a lei expressamente condiciona a aplicação de um preceito á não aplicação de outra norma mais grave e noutros ter-se-á de ver onde se dá tal relação, como acontece, v.g, com os actos acessórios puníveis e as infrações cujo preenchimento visam;
(…)
-concurso efectivo, verdadeiro ou puro, em que entre dos tipos legais prenchidos pela conduta do agente se não dá uma exclusão por via de qualquer das regras, como acontece com o concurso ideal, mas antes as dibversas normas aplicáveis aparecem como concorrentes na aplicação concreta. Há, pois, concurso efectivo quando se comete mais do que uma infração, quer através da mesma conduta, quer através de condutas diferentes.
No concurso efectivo é costume ainda distinguir-se entre:
-concurso ideal quando mediante uma só acção se violam diferentes tipos ( concurso ideal heterogéneo) ou se viola várias vezes o mesmo tipo ( concurso ideal homogéneo);
-concurso real quando à pluralidade de infrações praticadas corresponde uma pluralidade de acções.
Dado o critério adoptado de distinção entre a unidade e a pluralidade de infrações (o número de tipos legais efectivamente preenchidos ou o número de vezes que o mesmo tipo foi preenchido) o Código penal equiparou o concurso ideal ao concurso real.
Embora a lei não o refira expressamente, torna-se necessário, para se concluir pela existência de concurso efectivo, além da pluralidade de tipos violados, o recurso ao critério da pluralidade de resoluções no sentido de nexos finais e de uma pluralidade de violações do próprio dever de cuidado conexionado com um resultado típico concreto.”
Também se chama à colação o acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 8/2019 (in Diário da 3939 República n.º 246/2019, Série I de 2019-12-23) segundo o qual, “ocorre consumpção «quando o conteúdo de um ilícito típico inclui, em regra, o conteúdo de outro facto, de tal modo que a condenação apenas pelo ilícito mais grave exprime já de forma bastante o desvalor de todo o comportamento materialmente considerado» (…), visto na sua globalidade (lex consumens derogat legi consumptae). Sendo que nestes casos se tomam em consideração os factos nas suas conexões típicas, entre si, e «se assume que o legislador teria levado implicitamente em conta esta circunstância, ao editar as molduras penais respectivas»”.
Vejamos se as contraordenações pelas quais o recorrente foi condenado, se encontram nalgumas das relações de concurso aparente suscitadas pelo recorrente ( relação de consumpção; relação de subsidiariedade).
Já vimos que o recorrente foi condenado por 6 contraordenações pela violação das regras sobre o conflito de interesses- 3 pela colocação pelo B... do papel comercial emitido pela EI..., S.A e 3 pela colocação pelo B... do papel comercial emitido pela R..., S.A.
Diz o recorrente que a conduta imputada ao recorrente é a expressão de uma única resolução típica, que se consubstanciou num único facto típico, que se reconduz à decisão da colocação de papel comercial tomada pelo intermediário financeiro B... e, que as normas violadas visam salvaguardar o mesmo bem jurídico (a proteção dos investidores e a tutela da confiança destes no regular funcionamento do mercado).
Já vimos que assim não é, as mesmas normas foram violadas várias vezes, em ocasiões temporais perfeitamente distintas, com a colocação de produtos de empresas distintas, com objectivos concretos distintos e mediante várias resoluções, tantas quantas as violações cometidas, sendo extremamente redutora a posição assumida pelo recorrente, dando a entender que, uma vez tomada a decisão pelo B... de colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A, tudo o mais não seria punido (designadamente futuras colocações de papel comercial de outras empresas emitentes, como foi o caso da R..., S.A).
Pela posição assumida pelo recorrente, uma vez praticado um facto típico previsto numa determinada norma jurídica, caso voltasse a decidir violar os deveres previstos na mesma norma só seria punido por uma contraordenação, o que consubstanciaria a atribuição de um irrazoável benefício ao infractor.
Mais refere o recorrente que, existe uma relação de consumpção entre os nºs 1, 2 e 3 do art. 309º do CdVM porquanto as circunstâncias previstas no nº 2 e 3 do art. 309º apenas ocorrerão caso se verifique uma situação de conflito de interesses, o que importa necessariamente na violação do nº 1 do eferido preceito legal, concluindo que existe um desvalor jurídico pela violação do nº 1 do art. 309º do CdVM que já se encontra abrangido pelo desvalor da violação dos nºs 2 e 3 do referido preceito legal, pelo que, ao preencher um tipo legal mais grave ( nº 3 do art. 309º do CdVM) este consome ou inclui o preenchimento de outro tipo legal menos grave ( nºs 1 e 2 do art. 309º do CdVM).
Ao ter sido condenado por 6 contraordenações, pelo mesmo facto, quando apenas lhe podia ser imputada a prática de 1 contraordenação pela violação do nº 3 do art. 309º do CdVM foi violado o princípio ne bis in idem previsto no art. 29º nº 5 da CRP.
Alegou ainda o recorrente que, a não existir relação de consumpção, existe uma relação de subsidiariedade entre o nº 1 do art. 309º do CdVM e os nºs 2 e 3 desse mesmo preceito legal, porquanto as infrações pela violação do nº 1 e 2 do art. 309º do CdVM correspondem a contraordenações de perigo concreto, ou no limite abstrato-concreto e a infração pela violação do nº 3 corresponde a uma contraordenação de perigo concreto.
E, que ainda que assim não se entenda, sempre existirá uma relação de consumpção entre o nº 2 do art. 309º do CdVM e o nº 3 desse mesmo preceito legal, porque quando está em causa um conflito de interesses dito pessoal a violação do nº 3 pressupõe e incluirá a violação do nº 2.
Analisemos o art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM:
1 - O intermediário financeiro deve organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência.
2 - Em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro deve agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo.
3 - O intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses do cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais ou dos de agente vinculado e dos colaboradores de ambos.
Resulta evidente da análise do referido preceito legal que, embora os nº 2 e 3 do art. 309º pressuponham a pré-existência de um conflito de interesses, isto é a falência do objectivo previsto no nº 1 (cujo risco de conflito visava evitar ou reduzir ao mínimo), nenhum deles esgota o desvalor jurídico do outro, nem se encontram numa posição de hierarquia de desvalores, sendo perfeitamente autónomos, porquanto, constatada a violação do nº 1 pelo intermediário financeiro (violação do dever de se organizar por forma a evitar situações de conflitos de interesses) ele deve assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo e deve dar prevalência aos interesses dos clientes em detrimento dos seus próprios interesses, não se esgotando o desvalor jurídico neste último, porquanto ainda que dê prevalência aos interesses dos clientes numa situação de conflitos pode ou não ter violado os demais e vice-versa.
O intermediário pode até ter uma organização preparada para identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de forma a, por regra, evitar ou reduzir ao mínimo o risco de conflitos de interesses ( Compliance) e, ainda assim ocorrer uma situação de conflito de interesses entre ele e os clientes, ou entre clientes e, pode numa situação declarada de conflito de interesses dar prevalência aos interesses do cliente, mas violar o nº 2 do art. 309º não o informando disso mesmo ou fazendo-o de forma não transparente ou equitativa, ou, vice-versa, pode informá-lo sobre o conflito de forma transparente, mas dar prevalência aos seus próprios interesses e, em qualquer dos casos, se violar os deveres autónomamente consagrados em cada um dos nºs 1, 2 e 3 do art. 309º do CdVM incorre na violação de uma contraordenação por cada um dos deveres violados, por cada uma das resoluções ilícitas assumidas, ainda que todas digam respeito a matéria de violação de conflito de interesses.
Isso mesmo se evidencia do facto do art. 309º do CdVM corresponder à transposição do art. 23º da DMIF II, segundo o qual:
1. Os Estados-Membros exigem às empresas de investimento que tomem todas as medidads adequadas para identificar e para evitar ou gerir quaisquer conflitos de interesses entre elas próprias, incluindo os seus dirigentes, empregados e agentes vinculados ou quaisquer pessoas com elas direta ou indiretamente ligadas através de controlo, e os seus clientes, ou entre os próprios clientes, suscetíveis de surgir no quadro da prestação de quaisquer serviços de investimento e auxiliares, ou de combinações desses serviços, incluindo os causados pela aceitação de incentivos de terceiros ou pela própria remuneração da empresa de investimento e demais estruturas de incentivos.
2. Caso as medidas a nível organizativo ou administrativo, adotadas pela empresa de investimento nos termos do art. 16º nº 3, para evitar que os conflitos de interesses prejudiquem os interesses dos seus clientes, não sejam suficientes para garantir, com um grau de certeza razoável, que serão evitados os riscos de os interesses dos clientes serem prejudicados, a empresa de investimento deve informar claramente o cliente, antes de efectuar uma operação em seu nome, da natureza genérica e/ou das fontes destes conflitos de interesses e das medidas adotadas para mitigar esses riscos.
3. A informação referida no nº 2 tem de :
a) ser efectuada num suporte duradouro;e
b) ser suficientemente detalhada, tendo em conta a natureza do cliente, para permitir que este tome uma decisão informada relativamente ao serviço no âmbito do qual surge o conflito de interesses.
(…)
No caso em apreço não existe qualquer situação de concurso aparente, nem por consumpção, nem por subsidiariedade, porquanto a conduta do recorrente preencheu vários tipos de infração, não sendo absorvida por um só dos deveres previstos especificamente em cada um dos nºs 1, 2 e 3 do art.309º do CdVM concretamente violados, devendo ser todos aplicados e, fê-lo quer relativamente à colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, quer tempos mais tarde, relativamente ao papel comercial emitido pela R..., S.A, existindo plúrimas resoluções típicas.
A aplicação de cada um daqueles números do art. 309º do CdVM, no caso concreto, não ficou excluida, pelo contrário, são todos aplicáveis.
Atendendo aos factos provados todos aqueles deveres foram violados (ver factos 395 a 405 relativamente ao papel comercial da EI..., S.A; factos 406 a 417 relativamente ao papel comercial da R..., S.A) e, nem o preenchimento de nº 3 se afigura mais grave nem inclui o preenchimento dos demais, não existindo qualquer violação do princípio ne bis in idem porquanto as condutas punidas são independentes e não prenchem apenas o nº 3 do art. 309º do CdVM.
Tal como entendeu a sentença recorrida, que acompanhamos, “Na verdade, são amplamente diversos os interesses que se visam tutelar através dos tipos de contra-ordenação ínsitos nas infracções referentes à violação das regras sobre conflitos de interesses, apostos nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo em análise.
Por intermédio do n.º 1 do artigo 309.º do CdVM pretende-se que o intermediário financeiro adopte uma conduta preventiva na identificação de possíveis conflitos de interesses, para poder actuar de modo a evitar ou reduzir a sua ocorrência ao máximo. Está em causa um momento prévio ao próprio surgimento do conflito de interesses.
Por sua vez, perante o surgimento de um conflito de interesses em concreto, a lei determina a adopção de dois conmportamentos ao intermediário financeiro, que são totalmente distintos:
- um, o dever de ter uma atitude totamente transparente, clara, equitativa e justa para com o cliente, mormente alucidando-o acerca do conflito gerado e medidas adoptadas para mitigar o riscos decorrentes do conflito. Trata-se da atitude directa que deve ter no trato com o cliente.
Está em causa o dever a que alude o n.º 2 do artigo 14.º da DMIF I, que estabelece o seguinte “se as medidas de organização adoptadas pelo GFIA para identificar, prevenir, gerir e acompanhar os conflitos de interesses não forem suficientes para assegurar, com um grau de certeza razoável, que os riscos de os interesses dos investidores serem prejudicados foram afastados, o GFIA deve informar claramente os investidores, antes de efectuar qualquer operação em seu nome, da natureza genérica e das fontes desses conflitos de interesses e pôr em prática políticas e procedimentos adequados nesse contexto.”
- outro, fazer prevalecer o interesse do cliente em face dos demais que estejam em conflito. Este dever é diverso, pois não tem que ver com o trato directo com o cliente. Tem que ver com a própria gestão que o intermediário faz do conflito de interesses com que se depara.
O intermediário financeiro pode informar sobre a fonte de conflitos de interesses, mas ainda assim sobrepor outros interesses aos interesses do cliente. Na verdade, no vertente caso, ainda que o B... tivesse informado sobre as fontes dos conflitos de interesses subjacentes, perante o conflito com que se deparou adoptou uma postura de gestão de conflitos errada, pois no momento da colocação do papel comercial da EI..., S.A e do papel comercial da R..., S.A, fez prevalecer todos os interesses que estavam em cima da mesa, à excepção dos interesses dos clientes, ainda sabendo da situação económica e finaneira dos emitentes.
Porque assim é, estamos perante tipos de contra-ordenação distintos, que tutelam interesses igualmente distintos, sem que entre eles interceda qualquer tipo de relação de especialidade, subsidiariedade ou consumpção, pelo que improcedem as afirmações dos Recorrentes de que estamos perante uma relação de concurso aparente. Inexiste, in casu, salvo melhor entendimento, qualquer tipo de hierarquia de normas, em que a punição por via de uma esgota totalmente a punição por via da outra.
Aliás, existe uma evidente dispensabilidade daquelas que seriam as alegadas contra-ordenações instrumentais para o cometimento daquela que seria a alegada contra-ordenação fim, pelo que as três contra-ordenações conservam a sua autonomia, devendo ser punidas no âmbito do concurso real de infracções.”
Relativamente ao alegado concurso aparente entre as duas contraordenações consubstanciadas na violação do art. 7º do CdVM, uma pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da EI..., S.A e outra pela violação do dever de qualidade da informação relativamente ao papel comercial da R..., S.A valem as mesmas considerações, sendo certo que, não existiu apenas uma resolução típica como sustenta o recorrente, nem a violação do art. 309º nº 3 do CdVM ( conflito de interesses) consome a norma do art. 7º do CdVM ( deveres de informação), nem aquela é mais grave do que esta.
Uma coisa é a violação do dever de dar prevalência aos interesses dos clientes numa situação de conflito de interesses ( art. 309º nº 3 do CdVM), outra muito diferente e autónoma é a violação da qualidade da informação a que o intermediário está obrigado por força do art. 7º do CDVM que se refere à informação respeitante a instrumentos financeiros admitidos à negociação, a qual deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita.
O intermediário financeiro pode violar estes deveres de informação e nunca existir uma situação de conflito de interesses e o inverso também é verdadeiro, pode existir conflito de interesses e os deveres de informação term sido cumpridos de forma adequada.
Caso coincidam na mesma conduta a violação dos dois deveres, nem por isso se pode dizer que haja uma só resolução ou que a violação dos deveres de informação consuma ou inclua o dever de dar prevalência aos interesses dos   clientes em situação de conflito de interesses, sendo certo que no caso em apreço resulta do factualismo dado como provado a violação de ambos os deveres, de forma perfeitamente autónoma, com motivações e resoluções distintas tomadas pelo recorrente.
Deste modo, tal como decidido pelo tribunal a quo, conclui-se pela existência de concurso efectivo, dada a pluralidade de tipos violados preenchidos com a conduta do recorrente , a pluralidade de resoluções e a pluralidade de violações do próprio dever de cuidado consagrados em cada uma das contraordenações pelas quais foi condenado.
Improcede, de todo, este segmento recursivo.

16ª-Relevância do facto impeditivo do resultado não incluído no tipo contraordenacional.

Sob as Conclusões 503 a 512 o recorrente sustenta que, contrariamente ao decidido na sentença recorrida as contraordenações que lhe foram imputadas configuram contraordenações de perigo concreto, pressupondo-se a verificação do perigo real resultante da violação da qualidade da informação e das regras de conflito de interesses, não se bastando com a suposição do perigo abstracto, ou no limite serão contraordenações de perigo abstracto-concreto , com excepção da hipótese do nº 3 do art. 309º do CdVM que será sempre uma contraordenação de perigo concreto.
Sustenta que, embora os tipos das contra-ordenações em causa não exijam a imputação de um efectivo “resultado” negativo na esfera dos Clientes, em última análise, este é o “resultado não incluído no tipo” que se pretende evitar ao consagrar, por antecipação, as contra- ordenações de violação da qualidade de informação (artigo 7.º do CVM) e das regras de conflitos de interesses (artigo 309.º do CVM), a conduta do agente destinada a evitar o “resultado” não previsto no tipo tem relevância jurídica.
Segundo o recorrente, a sua conduta visou, efectivamente, obstar à verificação do “resultado” não previsto nos tipos contra-ordenacionais; tanto que, durante o período em que o ora Recorrente permaneceu enquanto CEO do B..., os Clientes não institucionais ou não qualificados deste banco que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A foram sendo, sempre, reembolsados, sendo que o incumprimento relevante do reembolso destes instrumentos financeiros apenas ocorreu após a cessação de funções do ora Recorrente, enquanto CEO do B..., tendo-se esforçado, seriamente, para evitar ou obstar à concretização do resultado não contido nos tipos contra-ordenacionais, circunstâncias que relevam, desde logo, porque resulta de uma interpretação extensiva do artigo 14.º e 15.º do RGCO (ex vi artigo 407.º do CVM) que a conduta do agente destinada a evitar o resultado não contido no tipo releva, para efeitos de afastar as exigências de punibilidade.
Conclui que, a sua conduta destinada a evitar o “resultado” não previsto, i.e., a salvaguardar os interesses dos Clientes e a garantir o reembolso do investimento dos clientes não institucionais do B... em papel comercial deveria ter sido devidamente relevada pela CMVM, pelo que a Sentença Recorrida deve ser revogada e o ora Recorrente deve ser absolvido da prática das contra-ordenações que lhe foram imputadas nos presentes autos.
As contraordenações pelas quais o recorrente foi condenado são contraordenações de mera actividade, sendo sancionada a conduta independentemente dos efeitos danosos que ela possa provocar nos bens jurídicos que se visam salvaguardar,  nas quais o preenchimento do tipo se esgota na realização da conduta proibida, independentemente de qualquer resultado exterior.
Consubstanciam contraordenações de mera actividade e de perigo abstracto, “pois o perigo não é elemento do tipo legal, mas simplesmente motivo da proibição. O comportamento é tipificado em nome da perigosidade da atividade para o bem jurídico, sem que seja necessária a sua comprovação no caso concreto. Por outras palavras: o agente é punido independentemente de ter criado um perigo efetivo para o bem jurídico (…) uma vez que a violação das referidas contraordenações de conflito de interesses e de violação de edeveres de informação com qualidade, tipificadas no CdVM destinam-se a proteger a segurança dos mercados de valores mobiliários. “O perigo é presumido pelo legislador, ficando dispensada qualquer averiguação sobre a perigosidade do facto no caso concreto(…) bastando a prova da ação típica, pois é esta que em si mesma é considerada perigosa sendo desnecessária a prova da produção de dano efetivo na esfera jurídica de terceiros.”
UUUUU refere que, “No âmbito do mercado de valores mobiliários uma tal antecipação da intervenção sancionatória de natureza contraordenacional justifica-se plenamente. A tutela dos valores em causa não se deve fazer por referência aos danos provocados ou às lesões de interesses efetivamente verificadas. Por um lado, porque neste tipo de mercado é muitas vezes difícil a identificação dos danos, na maior parte de natureza difusa; por outro lado, quando identificados os danos sobre o mercado eles são, em regra, já irreparáveis e incontroláveis; finalmente, porque com as práticas ilícitas se geram normalmente efeitos económicos em cadeia que transcendem o simples espaço de circulação dos valores em causa; por último, mas não menos importante, para um mercado tão rápido e sensível como este qualquer perigo é já um momento de danosidade efetiva, que nele permanece alimentando a desconfiança dos investidores. É pois compreensível, por exemplo, que o CdVM sancione a simples violação de deveres de informação ou a inexatidão desta”. 
Deste modo, sancionando-se o simples perigo de violação dos bens juridicamente tutelados pelas referidas contraordenações, irrelevante se torna a verificação de qualquer dano e, consequentemente a conduta do arguido no sentido de evitar um resultado por ele potenciado.
A propósito desta questão, teceram-se as seguintes considerações na sentença recorrida, com as quais se concorda:
“Ora, as infracções que in casu são imputados ao Recorrente são, a par da maioria dos tipos contraordenacionais que assentam em normas de dever, segundo o critério da conduta, ilícitos formais ou de mera actividade, na medida em que o tipo contra-ordenacional se preenche através da mera execução de um determinado comportamento (por acção ou omissão).
Na verdade, nenhum dos tipos contra-ordenacionais em causa prevê a produção de um evento como consequência objectivamente imputável à conduta do agente (como um resultado de dano ou de perigo), bastando-se com a mera acção proibida:
- a violação do artigo 7.º do CdVM , conjugado com a al. d) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 312.º do CdVM, ocorre quando o agente presta informação que não seja completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita;
- a violação do n.º 1 do artigo 309.º do CdVM ocorre quando o agente não se organiza de forma a identificar o risco de ocorrência de conflitos de interesses ou quando não actua de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo a sua ocorrência;
- a violação do n.º 2 do artigo 309.º do CdVM ocorre quando o agente, face ao conflito de interesses existente, não age por forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo; e
- por fim, a violação do n.º 2 do artigo 309.º do CdVM ocorre quando o agente não dá prevalência aos interesses do cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais ou dos de agente vinculado e dos colaboradores de ambos.
Assim, as contra-ordenações em causa ficam realizadas com a concorrência do próprio comportamento típico, ou seja, o tipo não exige que à conduta acresça um efeito sobre o objecto da acção e desta distinto espácio-temporalmente.
Para além disso, em função do bem jurídico protegido pela norma, as contra-ordenações configuram contra-ordenações de perigo.
Nas palavras de Paulo Pinto Albuquerque (in Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direito do Homem, Universidade Católica Editora, 2011, pág 30), em função desse bem jurídico protegido pela norma, “as contra-ordenações podem ser de dano ou perigo. (…) A contra-ordenação de dano é aquela em que se verifica uma lesão do bem jurídico protegido pela norma. A contra-ordenação de perigo é aquela em que o bem jurídico protegido pela norma é apenas colocado em perigo.”
E são contra-ordenações de perigo abstracto.
Com efeito, nos ilícitos de perigo concreto, como o perigo faz parte do tipo, este só é preenchido quando o bem jurídico tenha efectivamente sido posto em perigo.
Nos ilícitos de perigo abstracto, como é o caso, o legislador não contempla o perigo como fazendo parte de um dos elementos do tipo porque presume, presunção essa fundada na observação empírica, que determinados comportamentos, como os que estão em causa nos autos, são perigosos em si mesmos, isto é, na maioria dos casos em que essa conduta teve lugar, a mesma evidenciou ser perigosa do ponto de vista dos bens jurídicos tutelados.
Já por seu turno, nos ilícitos de perigo abstracto-concreto, ou ilícito de aptidão ou de perigo hipotético, o tipo “(…) não se limita a descrever uma conduta genericamente perigosa, de acordo com dados estatísticos ou regras de experiência da vida quotidiana, como sucede nos crimes de perigo abstracto, nem exige a comprovação de uma situação concreta de perigo para um ou vários bens jurídicos, desligada mas objectivamente imputável á acção, como acontece nos crimes de perigo concreto” (vide Augusto Silva Dias, in “Entre «Comes E Bebes»: Debate De Algumas Questões Polémicas No Âmbito Da Protecção Jurídico-Penal Do Consumidor in RPCC A. 8/4º pág. 520).
Assim, a efectiva lesão do bem jurídico protegido não faz parte do tipo (não sendo um ilícito de dano), nem a efectiva colocação em perigo do bem jurídico protegido (não sendo um ilícito de perigo concreto), mas o legislador exige ao intérprete e aplicador do direito que comprove, no caso concreto, a aptidão da acção para atingir aqueles determinados bens jurídicos.
“Produz-se desta forma uma combinação na acção de elementos abstractos e concretos de perigo, concentrados na acção, de tal sorte que o perigo nem está abstractamente contido na “ratio legis” [como nos crimes de perigo abstracto], nem surge tipicamente exposto como evento [como sucede nos crimes de perigo concreto], mas apresenta-se como uma qualidade intrínseca à acção.” – vide Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral I, Coimbra Editora-2004 pág. 293.
Nesta conformidade e com todo o respeito, as contra-ordenações que estão em causa nos autos e que são imputadas ao Recorrente AA são contra-ordenações de perigo abstracto, já que o perigo não é contemplado como fazendo parte de um dos elementos do tipo, presumindo antes o legislador que os comportamentos descritos nas normas tipificadoras são perigosos em si mesmos, isto é, na maioria dos casos em que essas condutas tiveram lugar, as mesmas evidenciaram ser perigosas do ponto de vista dos bens jurídicos tutelados.
Não são contra-ordenações de perigo concreto, porque, reforçamos, o perigo faz parte do tipo e nem de perigo abstracto-concreto porque o legislador não comete ao aplicador da norma a necessidade de apurar a aptidão da acção para afectar determinados bens jurídicos.
Nestes termos e aplicando a doutrina que acima já fizemos referência, temos de concluir que não estando em causa contra-ordenações de resultado, nem contra-ordenações de perigo concreto ou de perigo abstracto-concreto, mas antes contra-ordenações de perigo abstracto, uma vez consumadas, não podem deixar de ser puníveis, vista a perigosidade geral que logo nas respectivas acções se contem e que não é apagada ou anulada pela desistência.
Ainda que assim não fosse, sempre importa acrescentar que independentemente da conduta do Recorrente, a consequência da acção não incluída no tipo contra-ordenacional acabou por se verificar efectivamente.
Como bem sustenta a CMVM, na decisão administrativa, “na verdade, por um lado, os clientes do B... já haviam tomado decisões de investimento fundadas em informação que não era verdadeira, completa, actual e lícita; por outro lado, como é público e notório, a transparência e a integridade do mercado já haviam sido efectivamente afectadas, em matéria de conflitos de interesse, gerando desconfiança pública face ao mercado de valores mobiliários e à transparência da informação que nele é veiculada quanto ao adequado tratamento das situações de conflito de interesses.
“E não só o resultado não compreendido no tipo efectivamente já havia ocorrido, como as condutadas invocadas pelos Arguidos não eram idóneas a fundar uma situação de desistência relevante.
“Por um lado, o reembolso dos instrumentos financeiros comercializados (invocado pelo Arguido AA) é irrelevante para os tipos contra-ordenacionais imputados aos Arguidos e, ainda que assim não fosse, tal conduta constitui o mero cumprimento das obrigações que impendem sobre os emitentes dos instrumentos financeiros, sendo a tais entidades imputável. Repare-se que entre o momento em que os clientes subscreveram papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A na sequência de decisões de investimento tomadas com base em informação sem qualidade correram efetivamente o risco (desconhecido) de não ver o seu investimento reembolsado. (…)
Nesta senda, durante o ano de 2013, a colocação de instrumentos financeiros emitidos por entidades do Grupo G... junto dos clientes do B... já era objecto de acompanhamento por parte das autoridades de supervisão, estando a situação quer de informação sem qualidade aposta nas Notas Informativas, quer as de violação de regras de conflitos de deveres expostas a nu, não existindo, ao contrário do advogado pelo Recorrente, um abandono da conduta por impulso próprio, mas antes um acreditar necessário por parte do Recorrente, perante a situação exposta a nu, de não poder mais alcançar a finalidade das suas acções.”
Concorda-se inteiramente com a decisão proferida, sendo, ainda, de salientar que não encontra arrimo nos factos provados a alegação feita pelo recorrente de que a sua conduta visou obstar à verificação do “resultado” não previsto nos tipos contraordenacionais, sendo certo que o facto de os investidores terem sido reembolsados enquanto foi CEO do B... mais não é do que o resultado do cumprimento normal da obrigação das emitentes do papel comercial, não havendo qualquer resquício de factos que demonstrem qualquer actuação pessoal do recorrente  no sentido  de impedir ou evitar o perigo de conflito de interesses ou de falta de informação por parte do intermediário financeiro, pelo contrário, a sua actuação foi propulsionadora e determinante no sentido da violação desses deveres, pondo em perigo os bens jurídicos que as contraordenações pelas quais foi condenado visam tutelar.
Improcede, também, este segmento recursivo.

17ª-Inconstitucionalidade da medida da coima prevista nas normas contraordenacionais invocadas:
17.1. Inconstitucionalidade da moldura abstrata da coima aplicável: violação do princípio da proporcionalidade;
17.2.  inconstitucionalidade da moldura abstrata da coima aplicável pela sua indeterminação: violação do princípio da legalidade contraordenacional;

17. 1. Sob as Conclusões 513 a 531 o recorrente requer que seja declarada a inconstitucionalidade dos artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, por violação do princípio da proporcionalidade previsto no art. 18º nº 2 da CRP, com a consequente revogação da sentença recorrida.
Alegou para o efeito que, a sentença Recorrida condenou-o pela prática de oito contra-ordenações, cada uma das quais punidas com coimas de € 25.000,00 a € 5.000.000,00 (artigo 388.º, n.º 1 – al. a) do CVM), o que, por força da aplicação das regras de cúmulo jurídico, previstas no artigo 19.º do RGCO, ex vi artigo 407.º do CVM, conduz a uma coima máxima que, em abstracto, ascende ao valor exorbitante de 10 milhões de euros, para além de eventuais sanções acessórias, sendo manifesta a desproporcionalidade da moldura abstracta da coima em causa, pela prática de “meros” ilícitos contra-ordenacionais, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.
Argumenta para o efeito que, o valor desta coima única, aplicável em cúmulo jurídico, corresponde a mais de 22 vezes o limite máximo da multa única aplicável, em cúmulo jurídico, no âmbito do direito penal, onde o limite máximo da multa é de 450 mil euros (interpretação conjugada dos artigos 47.º, n.º 2, e 77.º, n.º 2, do Código Penal),  pelo que o valor máximo abstractamente aplicável por cada uma das oito contra-ordenações imputadas ao ora Recorrente, ultrapassa – em muito – o limite máximo da multa aplicável a uma pessoa singular, pela prática de um único crime, já que, da conjugação dos n.os 1 e 2 do artigo 47.º do Código Penal resulta que o limite máximo da pena de multa supletiva aplicável a uma pessoa singular, pela prática de um crime, corresponde a € 180.000,00, o que corresponde apenas a 3,6% do valor da coima abstracta mais elevada que poderá ser aplicada ao ora Recorrente (i.e. € 5 milhões).
Mais refere que a violação do princípio da proporcionalidade não resulta do mero facto de os tipos de ilícito contra-ordenacionais previstos no CVM preverem uma sanção pecuniária mais elevada do que um qualquer tipo de ilícito criminal,  mas trata-se de, por um lado, os artigos 388.º, n.º 1 – al. a), 389.º, n.º 2 – al. a), e 397.º, n.º 2 – al. b) do CVM e, ainda, o artigo 19.º do RGCO ex vi artigo 407.º do CVM, interpretados e aplicados no sentido de que uma pessoa singular poder ser punida com uma coima, em cúmulo jurídico, de 10 milhões de euros, levará a que a coima aplicável ao ora Recorrente possa superar o limite máximo da pena de multa aplicável, em caso de concurso de crimes e, por outro lado, a coima abstractamente aplicável ao ora Recorrente (em resultado da interpretação normativa dos aludidos artigos do CVM e do RGCO) é desproporcional face à natureza de “censura formal” dos ilícitos de mera ordenação social, sobretudo porque se assume com uma discrepância gritante face aos limites máximos da pena de multa aplicáveis a certos tipos de crime, que implicam uma censura material e ético-jurídica mais grave.
Por último, considera que a violação do princípio da proporcionalidade é tão mais evidente se considerarmos que o ora Recorrente é uma pessoa singular e não uma pessoa colectiva, o que releva, porque uma única pessoa singular não tem de per se a possibilidade de gerar rendimentos e lucros como, em princípio, uma pessoa colectiva e, ao contrário do que sucede com a responsabilidade penal das pessoas singulares, a panóplia de crimes pelos quais as pessoas colectivas são puníveis é restrita aos casos, expressamente, previstos na lei, o que poderá justificar a aplicação de coimas relevantes a estas, em casos excepcionais.
Vejamos.
Todas as contraordenações pelas quais o recorrente foi condenado são qualificadas pelo legislador como contraordenações muito graves, sendo puníveis com coima, cuja moldura abstrata varia entre o limite mínimo de € 25.000,00 e o limite máximo de € 5.000.000,00 (art. 388.º nº 1 al. a) do CdVM, conjugada com art. 389.º nº 1 al. a) e art. 397.º nº 2 al. b) do CdVM), não variando em função de o arguido ser pessoa singular ou pessoa colectiva.
Está posta em causa a conformidade dos referidos preceitos legais do CdVM, articulados com o art. 19º do RGCO, com o princípio da proporcionalidade constitucionalmente consagrado no art. 18º nº 2 da CRP.
Segundo o referido preceito constitucional, a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
“(…) analisa-se tal princípio em três vectores ou subprincípios relativamente autónomos: adequação; necessidade; e proprocionalidade em sentido estrito. Em qualquer dos casos, em se tratando de leis restritivas, o que está em causa é a relação que se estabelece entre os meios usados pelo legislador, no regime jurídico gizado, e os fins que ele mesmo se propõe alcançar.
(…)o que se prescreve na proporcionalidade stricto sensu é uma exigência de racionalidade e de justa medida, no sentido de que o órgão competente proceda a uma correcta avaliação da providência adotada em termos qualitativos e quantitativos e, bem assim, para que esta não fique aquém ou além do que importa para se obter o resultado devido- nem mais, nem menos.
(…) Em termos gerais, a jurisprudência do Tribunal Constitucional é reveladora de uma tendência de autocontenção, que, apesar de não limitar formalmente a sua função a um controlo de evidência ou a um controlo de defensabilidade não deixa de sublinhar enfaticamente a ampla margem de avaliação e de conformação que cabe ao legislador.
Por isso o controlo do respeito pelo princípio da proporcionalidade é feito sempre pela negativa e a inconstitucionalidade só é declarada em caso de “erro manifesto”, quando as soluções legais são claramente inadequadas, desnecessárias, irrazoáveis, excessivas ou desproporcionadas.”
Isso mesmo se extrai da ampla jurisprudência do Colendo Tribunal Constitucional, como se deu adequada nota na sentença recorrida e, de que se faz menção na Decisão Sumária do TC nº 8/2020 ( proc. Nº 646/19) onde se cuidava de saber se é inconstitucional uma norma nos termos da qual à prática de determinado(s) ilícito(s) de mera ordenação social pode corresponder coima de valor superior ao da multa correspondente à prática de determinado(s) ilícito(s) de direito penal:
“A esse respeito, é essencial começar por observar que esse problema de constitucionalidade não incide sobre uma eventual desproporcionalidade entre as sanções contraordenacionais em causa nos presentes autos por referência à gravidade (maior ou menor) dos ilícitos contraordenacionais respetivos, mas sobre a sua eventual desproporcionalidade por referência aos máximos da sanção penal de multa possíveis de aplicar no ordenamento jurídico português – seja a crimes específicos, seja a um concurso de crimes. Assim especificada a dimensão normativa relevante, aquela questão não pode senão considerar-se manifestamente improcedente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, considerada a abundante jurisprudência prolatada pelo Tribunal Constitucional sobre estas matérias, de que bastará aqui destacar, a título de exemplo, o Acórdão n.º 591/2015, onde – com suporte, já, em abundante jurisprudência constitucional anterior – se consignou o seguinte:
«(...)
[O] Tribunal Constitucional tem salientado, em diversas ocasiões, que o legislador dispõe de uma ampla margem de decisão quanto à fixação legal dos montantes das coimas a aplicar, pelas razões explicitadas no Acórdão n.º 574/95 […]:
“Quanto ao princípio da proporcionalidade das sanções, tem, antes de mais, que advertir-se que o Tribunal só deve censurar as soluções legislativas que cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou manifesta e claramente excessivas, pois tal o proíbe o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. Se o Tribunal fosse além disso, estaria a julgar a bondade da própria solução legislativa, invadindo indevidamente a esfera do legislador que, aí, há de gozar de uma razoável liberdade de conformação [cf., identicamente, os acórdãos n.ºs 13/95 (Diário da República, II série, de 9 de fevereiro de 1995) e 83/95 (Diário da República, II série, de 16 de junho de 1995)], até porque a necessidade que, no tocante às penas criminais é – no dizer de FIGUEIREDO DIAS (Direito Penal II, 1988, policopiado, página 271) – ‘uma conditio iuris sine qua non de legitimação da pena nos quadros de um Estado de Direito democrático e social’, aqui, não faz exigências tão fortes.
De facto, no ilícito de mera ordenação social, as sanções não têm a mesma carga de desvalor ético que as penas criminais – para além de que, para a punição, assumem particular relevo razões de pura utilidade e estratégia social.”
 No mesmo sentido pronunciaram-se, mais recentemente, os Acórdãos n.ºs 62/2011, 67/2011, 132/2011, 360/2011 e 110/2012 (…). A título de exemplo, pode ler-se no Acórdão n.º 360/2011 que:
“(…) o legislador ordinário, na área do direito de mera ordenação social, goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, devendo o Tribunal Constitucional apenas emitir um juízo de censura, relativamente às soluções legislativas que cominem sanções que sejam manifesta e claramente desadequadas à gravidade dos comportamentos sancionados. Se o Tribunal fosse além disso, estaria a julgar a bondade da própria solução legislativa, invadindo indevidamente a esfera do legislador que, neste campo, há de gozar de uma confortável liberdade de conformação, ainda que ressalvando que tal liberdade de definição de limites cessa em casos de manifesta e flagrante desproporcionalidade.”
(...)
Em suma, decorre de todas as considerações precedentes que o legislador ordinário, na área do direito de mera ordenação social, goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, devendo o Tribunal Constitucional emitir juízos de censura somente nos casos em que as soluções legislativas cominem sanções que sejam manifesta e claramente desproporcionais relativamente à gravidade dos comportamentos sancionados.»
De facto, perante a consistente jurisprudência de que acima se deu mero exemplo, nunca seria possível cogitar a inconstitucionalidade do limite máximo de uma coima em razão da mera circunstância de ele exceder o máximo de multa permitido para casos de responsabilidade penal – o (único) enunciado normativo que, neste ponto, o recorrente traz à consideração deste Tribunal no seu recurso. Se essa conclusão decorreria já com naturalidade das linhas fundamentais daquela jurisprudência, ela sai ainda reforçada pela apreciação já feita pelo Tribunal Constitucional sobre vários aspetos do específico quadro sancionatório previsto no RGICSF no Acórdão n.o 41/2004 e no Acórdão n.º 422/2016.
A falta de fundamento destas questões torna-se ainda mais manifesta quando se considera a circunstância de se estar aqui perante um domínio sancionatório que integra «ilícitos especialmente graves relacionados com a atividade de instituições de crédito e atividade financeira em que apenas pode estar em causa o perigo para os bens jurídicos ou já danos especialmente graves para a atividade financeira e para pessoas singulares», que o potencial «prejuízo para o equilíbrio financeiro» destas instituições é muito elevado e tem como inerência igualmente elevados riscos sistémicos e que, por conseguinte, existem «várias e importantes razões» para se concluir que se «justificam limites bastante elevados para as coimas nesta área» (Acórdão n.º 41/2004). Assim, não só não se afigura arbitrária (o que seria necessário para que se julgasse violado o princípio da proporcionalidade ínsito no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição), como se afigura até absolutamente plausível a opção do legislador de lançar aí mão de elevadas coimas, sanções estas que – convém recordar, apesar de ser evidente –, ao contrário da pena de multa, são insuscetíveis de conversão em prisão subsidiária e em relação às quais, também por isto, aquela liberdade legislativa é significativamente mais ampla.”
Estas considerações tem plena aplicabilidade em sede do CdVM, regime contraordenacional onde se impõe com acuidade sanções suficientemente dissuasoras para agentes económicos com elevada capacidade económico-financeira que só perante a ameaça de sanções com limites máximos abstratos elevados ponderarão retrair-se na violação dos ilícitos contraordenacionais que visam prevenir e evitar ao máximo a instabilidade dos mercados financeiros e proteger a confiança e as poupanças dos investidores, acautelando os riscos sistémicos que, afectando a economia, se repercutirão sobre todos os operadores económicos e consumidores em geral.
Quanto maior for o limite máximo da moldura abstrata da coima maior será a eficácia na proteção dos bens jurídicos tutelados pela contraordenação em causa, sendo certo como é, que a coima terá sempre uma finalidade repressiva e de prevenção geral relativamente a quem opere no mercado de valores mobiliários ou mercado financeiro, onde se movem valores de relevo, relativos à transparência do mercado de valores mobiliários, também eles constitucionalmente protegidos.
Os arts. 81º al. f) e 101º da CRP prevêm o funcionamento eficiente dos mercados e a repressão de práticas lesivas do interesse geral, estando em causa não só a tutela dos mercados mas também direitos patrimoniais dos aforradores, investidores e clientes das instituições financeiras, cujo fim último é a salvaguarda do património.
Como perfilha Paulo Pinto de Albuquerque, a “coima não tem um fim retributivo da culpa ética do agente, pois não visa o castigo de uma personalidade deformada reflectida no facto ilícito, nem tem um fim de prevenção especial positiva, pois não visa a ressocialização de uma personalidade deformada do agente, tem antes um fim de prevenção especila negativa, isto é, visa evitar que o agente repita a conduta infractora, bem como um fim de prevenção geral negativa, ou seja, visa evitar que os demais agentes tomem o comportamento infractor como modelo de conduta.” 
Resultou também evidente, desde cedo, que o Tribunal Constitucional não equipara tout court o ilícito contraordenacional ao ilícito penal no que à exigência da observância dos princípios constitucionais diz respeito, como de forma lapidar se pode ler dos Acórdãos TC nº85/2012, nº110/2012, nº201/2014, nº297/2016 e nº 47/2019, entre muitos outros.
Neste último aresto fez-se constar o seguinte:
“No domínio do direito de mera ordenação social, a determinação e a conformação da moldura abstrata da coima cabe ao legislador, por obediência ao princípio da legalidade na previsão da sanção. Por extensão do princípio nulla poena sine lege, consagrado no n.º 3 do artigo 29.º, ou por decorrência direta do n.º 2 do artigo 18.º da CRP, o legislador está vinculado a estatuir a moldura sancionatória aplicável a cada tipo legal contraordenacional e a indicar os critérios ou fatores que presidem à determinação concreta da sanção (Acórdãos n.ºs 574/95, 635/11, 466/12, 85/12 e 201/14).
Porém, como o Tribunal Constitucional tem várias vezes salientado, reconhece-se ao legislador ordinário uma ampla margem de decisão quanto à fixação legal dos valores mínimos e máximos das coimas, desde que não se revelem manifestamente desproporcionais (Acórdãos n.ºs 574/95, 547/01, 62/11, 67/11, 132/11, 360/11, 85/12, 110/12, 78/13, 313/13, 97/14).
Nesse sentido, se pronunciou o Acórdão n.º 360/11:
«(…) o legislador ordinário, na área do direito de mera ordenação social, goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, devendo o Tribunal Constitucional apenas emitir um juízo de censura, relativamente às soluções legislativas que cominem sanções que sejam manifesta e claramente desadequadas à gravidade dos comportamentos sancionados. Se o Tribunal fosse além disso, estaria a julgar a bondade da própria solução legislativa, invadindo indevidamente a esfera do legislador que, neste campo, há de gozar de uma confortável liberdade de conformação, ainda que ressalvando que tal liberdade de definição de limites cessa em casos de manifesta e flagrante desproporcionalidade».
A ampla liberdade de conformação que neste domínio é reconhecida ao legislador tem justificação na diferente natureza do ilícito, que dá origem a um sistema punitivo próprio, com espécies de sanções, procedimentos punitivos e agentes sancionadores distintos do ilícito penal. Tais ilícitos não se distinguem apenas pelo diferente tipo de cominação – uma coima ou uma pena – mas também por um critério material que atende à diferença de bens jurídicos protegidos e à diferente ressonância ética dos ilícitos.
E por isso, se o direito das contraordenações não deixa de ser um direito sancionatório de caráter punitivo, a verdade é que a sua sanção típica “se diferencia, na sua essência e nas suas finalidades, da pena criminal, mesmo da pena de multa criminal (…) A coima não se liga, ao contrário da pena criminal, à personalidade do agente e à sua atitude interna (consequência da diferente natureza e da diferente função da culpa na responsabilidade pela contraordenação), antes serve como mera admoestação, como especial advertência ou reprimenda relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas; e o que esta circunstância representa em termos de medida concreta da sanção é da mais evidente importância. Deste ponto de vista se pode afirmar que as finalidades da coima são em larga medida estranhas a sentidos positivos de prevenção especial ou de (re)socialização” (Figueiredo Dias, “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 150-151, da ed. de 2001, da Coimbra Editora).
A liberdade de conformação da moldura sancionatória tem, porém, por critério e limite o princípio da proporcionalidade. Na medida em que as coimas são medidas que afetam negativamente direitos patrimoniais, a sua cominação não pode deixar de obedecer às exigências do princípio da proporcionalidade ínsito no artigo 2.º (ou consagrado no artigo 18.º, n.º 2) da CRP. Para além da adequação e exigibilidade da sanção contraordenacional, assume particular relevância a proporcionalidade em sentido estrito (ou princípio da justa medida) no estabelecimento da moldura sancionatória, pois as sanções mais graves devem ser aplicáveis às contraordenações mais graves, e as menos graves às contraordenações mais leves. De modo que são merecedoras de censura opções legislativas que cominem sanções desadequadas ou manifestamente desproporcionadas à natureza dos bens a tutelar e à gravidade da infração que se destina a sancionar ou cujo montante se revele inadmissível ou manifestamente excessivo.”
Em função das considerações acima explanadas, estamos em crer que o limite máximo da moldura abstrata da coima única em causa nestes autos (operado o cúmulo jurídico) não é arbitrário, mas assenta na gravidade das infrações.
Salienta-se que, o legislador poderia ter enveredado pela consagração do cúmulo material das coimas, como o fez noutros regimes contraordenacionais, e nesse caso o recorrente teria sido condenado num valor bastante mais superior.
Os referidos preceitos do CdVM, conjugado com o cúmulo jurídico das coimas, permite a obtenção de valores da coima única que não se revelam inadmissíveis, manifestamente excessivos ou desproporcionados em face da natureza dos bens tutelados, eles próprios com consagração constitucional ( arts. 81º al. f) e 101º da CRP), pelo que, gozando o legislador de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis no direito contraordenacional, pelas conforme razões expostas, não se mostra violado o princípio da proporcionalidade nos termos propugnados pelo recorrente.

17.2. Sob as Conclusões 532 a 536 o recorrente requer que seja declarada a inconstitucionalidade do artigo 388.º, n.º 1 al. a) do CdVM, por violação do princípio da legalidade da sanção, previsto e punido pelos arts. 29º nº 1 e 3 e 30º da CRP, com a consequente revogação da sentença recorrida.
Argumenta para o efeito que, o artigo 388.º, n.º1 al. a) do CdVM, ao estabelecer a respectiva moldura infraccional entre € 25.000 e € 5.000.000, para as contra-ordenações qualificadas como muito graves, por um lado, não permite aos destinatários prever a sanção que lhes poderá ser aplicada e, por outro lado, atribui à CMVM um poder excessivo na determinação da coima, verificando-se uma excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo da coima aplicável nos presentes autos, prevista no artigo 388.º, n.º 1 al. a) do CVM.
Segundo o art. 29º nº 1 e 3 da CRP ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior e, não podem ser aplicadas penas ou medidas de segurança que não estejam expressamente cominadas em lei anterior.
Por seu turno o art. 30º da CRP dispõe que, não pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida.
“(…) sanção de duração indefinida seria aquela em que o limite máximo não fosse definido pela lei, mas ficasse dependente de uma decisão administrativa ou judicial.”
Desde logo não se nos afigura que seja o caso do art. 388º nº 1 al. a) do CdVM que prevê o limite máximo da coima, coima cuja moldura abstrata tem também um limite mínimo legalmente estabelecido, moldura abstrata essa previamente fixada em lei anterior à prática das infrações pelo aqui recorrente.
Quanto à excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo da coima aplicável nos presentes autos, prevista no artigo 388.º, n.º 1 al. a) do CdVM, desde logo o recorrente não pode desconhecer que a coima aplicável será determinada, necessariamente dentro daqueles limites, de acordo com os parâmetros fixados no art. 405º do CdVM, em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou colectiva do agente.
A esse propósito a sentença recorrida é pródiga na fundamentação da negação da propugnada inconstitucionalidade, com abundante citação de acórdãos do Tribunal Constitucional a propósito desta matéria, transversal a vários regimes contraordenacionais e com plena aplicabilidade ao caso em apreço.
Não obstante, reforça-se o sentido decisório de conformidade constitucional do art. 388º nº 1 al. a) do CdVM invocando-se para o efeito o Ac TC nº 85/2012 que versou precisamente sobre a alegada indeterminabilidade dessa norma.
Neste aresto se pode ler que, “aquele preceito constitucional (refere-se ao art. 29º nº 1 e 3 da CRP) consagra o princípio da tipicidade ou a exigência de clareza e determinação das normas penais incriminadoras, uma vez que a exigência da determinabilidade é uma das dimensões irredutíveis do princípio da legalidade (“nullum crimen, nulla poena sine lege coerta”), fundamental para a garantia da liberdade e segurança dos cidadãos.
Mas é um erro pretender estender tais exigências ao domínio contraordenacional.
Importa efetivamente relembrar que o Tribunal Constitucional tem constantemente sublinhado “a diferente natureza do ilícito, da censura e das sanções” entre o ilícito contraordenacional e o ilícito penal, o que justifica que os princípios que orientam o direito penal não sejam automaticamente aplicáveis ao direito de mera ordenação social. É o que resulta, por exemplo, do Acórdão n.º 344/93 (publicado in Diário da República, IIª Série, de 11-08-1993), do Acórdão n.º 278/99 (disponível no site do Tribunal Constitucional) e do Acórdão n.º 160/04, que sublinhou a “diferença dos princípios jurídico-constitucionais que regem a legislação penal, por um lado, e aqueles a que se submetem as contraordenações”. Diferença, esta, que cobra expressão, designadamente, na natureza administrativa (e não jurisdicional) da entidade que aplica as sanções contraordenacionais”. A mais recente jurisprudência do Tribunal Constitucional, precisamente a propósito da aplicação de contraordenações pela CMVM, reafirmou essa orientação, conforme resulta, por exemplo, do Acórdão n.º 537/2011 (disponível no site do Tribunal). É assim bem certo que a exigência de determinabilidade do tipo predominante no direito criminal não opera no domínio contraordenacional.
(…) a alínea a) do n.º 1 do artigo 388.º do CdVM, que estabelece a moldura sancionatória das contraordenações qualificadas como muito graves, fixada entre 25000 e 2500000 Euros. Não se pode considerar que os limites máximo e mínimo da moldura sancionatória tenham sido fixados de forma a violar o princípio da determinabilidade da norma. De facto, o CdVM especifica no artigo 405.º os critérios que deverão presidir à determinação da medida da coima, nomeadamente a ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, os benefícios obtidos, as exigências de prevenção, a natureza singular ou coletiva do agente. A determinação da coima em concreto resulta da ponderação, dentro da margem fornecida pelos limites mínimo e máximo estabelecidos pelo n.º 1 do artigo 388.º do CdVM, das circunstâncias que estão expressamente mencionadas na lei. É, assim, perfeitamente possível aos destinatários saber quais são as condutas proibidas, como ainda antecipar, com segurança, a sanção aplicável ao correspondente comportamento ilícito.
E é nisto que consiste a necessária determinabilidade dos tipos contraordenacionais. Importa relembrar, com efeito, que da jurisprudência do Tribunal resulta que o estabelecimento de limites alargados das sanções, no domínio contraordenacional, não consubstancia em si uma violação de princípios constitucionais, devendo avaliar-se se a lei estabelece outros mecanismos que concorrem para a segurança jurídica.
No Acórdão n.º 574/95 (disponível no site do Tribunal Constitucional), o Tribunal considerou que o n.º 5 do artigo 670.º do CdVM então em vigor –  que previa uma moldura sancionatória de 500.000$00 a 300.000.000$00 – não era inconstitucional, já que “a distância entre o limite mínimo e o limite máximo da coima” não seria “de molde a que esta deixe de cumprir a sua função de garantia contra o exercício abusivo (persecutório e arbitrário) ou incontrolável do ius puniendi do Estado”, já que o legislador teria fixado sem margem para dúvidas os limites “dentro dos quais se há de mover aquele que tiver de aplicar a coima”. Acrescentou-se ainda que  “uma certa extensão da moldura sancionatória é de algum modo – pode mesmo dizer-se – o tributo que o princípio da legalidade das sanções tem de pagar ao princípio da culpa, que deriva da essencial dignidade da pessoa humana e se extrai dos artigos 1º e 25º, nº 1 da Constituição”.
É certo que no Acórdão n.º 547/01, o Tribunal reviu alguns destes argumentos, chegando a uma solução diferente no que toca ao n.º 4 do artigo 670.º do CdVM, que fixava uma coima de 500.000$00 a 300.000.000$00. Mas mesmo dentro deste prisma, o aresto não deixou de reconhecer que:
“(…) as características particulares do mercado de valores mobiliários não impediram o legislador de 1999 de alterar o sistema sancionatório das contraordenações com ele relacionadas, através do novo Código dos Valores Mobiliários.
Com efeito, por um lado, as contraordenações muito graves passam a ser puníveis com coimas de 25.000 a 2.500.000 euros [al. a) do nº 1 do artigo 388º], o que, apesar de representar ainda uma grande amplitude, atenua a distância substancial até aí existente entre um limite mínimo leve e um limite máximo particularmente severo.
Por outro lado, o artigo 405º do mesmo Código estabelece, de modo inovador, uma série de critérios e circunstâncias tendentes a permitir adequar a determinação concreta da sanção ao grau de ilicitude e da culpa do agente.
Deste modo, independentemente do juízo que possa merecer o novo regime, confirma-se que o legislador tem diversos meios de que se pode servir para evitar violar o princípio da determinação da sanção, decorrente do princípio da legalidade”.
Pode, por isso, concluir-se que o regime resultante da fixação dos limites máximo e mínimo que compõem a atual moldura sancionatória para as contraordenações muito graves da CdVM, em conjugação com a previsão expressa dos critérios e circunstâncias que devem pautar a determinação concreta da sanção, é suficiente para respeitar as exigências de determinabilidade sancionatória decorrente da Constituição.”
Deste modo se conclui pela manifesta improcedência das inconstitucionalidades invocadas pelo recorrente, como perpassa dos referidos Acórdãos do Tribunal Constitucional, improcedendo este segmento recursivo.

18ª- Cúmulo jurídico: a errada determinação da medida concreta da coima:
18.1. erro da sentença recorrida quanto á apreciação da imputação ao ora recorrente de uma actuação a título de dolo eventual quanto á colocação do papel comercial da R..., S.A;
18.2. insuficiência da matéria de facto provada e o erro da sentença recorrida quanto aos benefícios obtidos pelo ora recorrente;
18.3. insuficiência da matéria de facto provada: a falta de ponderação dos actos do ora recorrente destinados a reparar os danos ou obviar aos perigos causados pelas infrações;
18.4. erro da sentença quanto a existência de antecedentes contraordenacionais;
18.5. erro na ponderação da situação econíomica do ora recorrente na determinação da coima aplicável;
18.6. erro na ponderação da situação pessoal do ora recorrente na determinação da coima aplicável.

A propósito da fixação das coimas parcelares e coima única e factores atendíveis para o cúmulo jurídico relativamente a este recorrente, a sentença recorrida formulou o seguinte raciocínio:
“No que se relaciona com a ilicitude concreta dos factos, consideramos que a mesma se situa em nível elevado, sendo superior no caso da EI..., S.A e menor (embora de forma pouco expressiva) no caso da R..., S.A.
No que tange à situação da EI..., S.A, não podemos descorar que o Recorrente apesar de ter participado na tomada de decisão do B... de emissão, colocação e comercialização do papel comercial daquela entidade, o certo é que participou nos factos que deram origem à situação de prestação de informação sem qualidade, na medida em que o próprio determinou a adulteração dos relatos financeiros da EI..., S.A, por referência aos anos de 2008 a 2012, com ocultação do passivo, com vista a determinar uma melhor imagem da sociedade que administrava para o mercado e ainda promoveu o aumento inusitado do passivo durante os primeiros nove meses de 2013.
Quanto ao conflito de interesses, também foi o mesmo Recorrente que, com a sua conduta potenciou e criou uma situação de conflito de interesses no quadro da emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e, depois, orientou a decisão do intermediário financeiro no sentido de dar prevalência aos interesses da EI..., S.A e da R..., S.A, aos seus próprios interesses, aos interesses da Epi..., S.A, bem como e aos interesses de alguns membros do seu conselho de administração (entre os quais se incluía o Arguido AA), face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial (maxime, em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A), pois apesar de estar presente na tomada de decisão do B... respectiva, não partilhou a informação relevante que tinha conhecimento.
No fundo, o Recorrente foi o promotor de toda a situação verificada, sendo o seu epicentro, propagando ondas sísmicas com abalos nas vertentes analisadas.
Quanto à situação da R..., S.A, integrava o Recorrente o Conselho Superior do G..., que decidiu nos moldes dados como provados, pertencendo a um órgão parassocial que se arrogava de poderes decisórios em relação às entidades relacionadas com a situação em concreto. Para além de tal ter determinado a prestação de informação sem qualidade aos investidores, também potenciou e criou um risco de conflito de interesses como já analisado.
Não é igualmente despiciendo referir que o Recorrente AA era administrador do B... sendo que era o mesmo reconhecido entre os seus pares como uma pessoa confiável competente e de princípios, como ficou provado e o próprio frisou na sua impugnação judicial.
No fundo, o B... também beneficiava dessa imagem positiva que era detida pelo Recorrente aqui e além-fronteiras.
Tal implica que os produtos financeiros adquiridos fossem considerados com a qualidade que lhes era anunciada pelo intermediário financeiro, sem grande sentido crítico por parte dos investidores, atenta a sólida relação de fidúcia estabelecida pelo B... e pelo Recorrente AA com o mercado financeiro, até porque estavam em causa informações que os investidores não poderiam avaliar da sua veracidade, excepto quando, em 23.01.2014, no que tange à R..., S.A, foi publicada na página da CMVM a reestruturação do G..., com implicações para a natureza, situação económica e estrutura da emitente.
Contudo, ainda assim, apesar de, a partir desse momento, a ilicitude poder ser considerada menor, esse decréscimo de ilicitude é apenas mitigado, pois que, como já anteriormente analisámos, não era exigível aos investidores encetarem, eles próprios, a tão falada em audiência de discussão e julgamento, “due diligence” acerca da veracidade do que era anunciado.
Importa ainda aludir ao facto que a ilicitude concreta dos factos é tanto mais grave quando o intermediário financeiro deu prevalência aos interesses do próprio comparticipante AA.
Por sua vez, também aumenta a ilicitude dos factos, o elevadíssimo número de investidores que estão em causa e que constam identificados nos anexos da decisão administrativa e o período de tempo em que foram prestadas informações sem qualidade aos clientes, o que implica uma potenciação de afectação dos interesses dos investidores que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A e comercializado pelo B... e o regular funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e inerente perda de confiança nos mesmos.
Veja-se que quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial da EI..., S.A, a mesma decorreu entre Setembro e Dezembro de 2013 e quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial emitido pela R..., S.A, esta decorreu entre 9 de janeiro de 2014 e de 24 de fevereiro de 2014.
 Portanto, durante cerca de 3 meses em relação à EI..., S.A e durante cerca de dois meses em relação à R..., S.A.
Quanto ao grau de culpa, o mesmo é muito elevado, na medida em que se molda a título de dolo directo, por referência à EI..., S.A e a título de dolo eventual, por respeito à situação da R..., S.A.
Para além disso, essa culpa é igualmente aumentada por via do facto do Recorrente AA possuir, à data dos factos, elevada experiência profissional e conhecimento das actividades bancária e de intermediação financeira, em geral, e do B... em particular, bem conhecendo os especiais deveres relativos à actividade de intermediação financeira que sobre si recaíam, assim como os efeitos das suas condutas para os clientes e para o mercado em geral, o que aumenta as exigências de pautar a sua conduta pelos trilhos do direito. O respeito que granjeou entre os seus pares e no mercado em geral deveria ter sido um motivo suficientemente dissuasor para não cometer os ilícitos que estão em causa, em detrimento de um mercado que orgulhosamente afirma que ajudou a construir. Contudo, com as suas condutas, apenas demostrou que o castelo da confiança e da reputação inatacável que grita aos quatro ventos neste processo era de cartas e desmoronou, desmoronando com ele a confiança no próprio mercado e sistema financeiro.
Veja-se que o Arguido AA era, à data dos factos em causa nos presentes autos, (i) desde setembro de 1991, administrador e presidente da Comissão Executiva do B..., sendo responsável, entre outros pelouros, pela presidência do Comité ALCO (ii) administrador da EI..., S.A, sendo responsável pela gestão da tesouraria dessa entidade e de todo o grupo G...  (iii) administrador da Es... (iv) membro do Conselho Superior do G..., sendo quem, materialmente, assumia a responsabilidade pela condução das atividades do G....
Em termos de benefícios obtidos com os factos, correspondem aos interesses que o Recorrente AA, assumindo as funções em órgãos sociais em várias entidades do G..., tinha, de captar para a EI..., S.A e para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G....
O Recorrente, quanto à situação da EI..., S.A promoveu a ocultação de passivo nas demonstrações financeiras daquela sociedade, o que tende a dificultar a descoberta da infracção.
Desconhece-se a existência de actos destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
É certo que o Recorrente informou a parte dos seus pares, em 02.12.2013, a situação da EI..., S.A e participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 04.12.2013, que deliberou a suspensão da comercialização do papel comercial da EI..., S.A. Contudo, salvo melhor opinião, tais factos não têm grande relevo para a presente análise, na medida em que o regulador Banco de Portugal, por força do ETRICC2, estava a acompanhar a situação financeira da EI..., S.A, o que despoletou o apuramento dos factos atinentes. Não estão em causa, por isso, verdadeiros actos de arrependimento por parte do Recorrente. Aliás, arrependimento algum se vislumbra até hoje da sua parte, que insistiu em negar os factos, nos presentes autos.
No que concerne às exigências de prevenção, consideramos, com Taipa de Carvalho, que "não cabem nas finalidades das sanções contra-ordenacionais as ideias de retribuição", pese embora se possa dizer que "as funções principais destas sanções são de dissuasão geral (prevenção geral negativa) e de dissuasão individual (prevenção especial negativa): dissuasão de todos os destinatários das respectivas normas; dissuasão do infractor condenado em relação à reincidência. Logo: funções prevenção negativa". Todavia, este Autor vê ainda a possibilidade das sanções contra-ordenacionais terem igualmente finalidades de prevenção positiva no sentido de promoveram a "consciencialização social comunitária" e "consciencialização social do próprio infractor" para a importância comunitária e/ou individual dos "valores ou bens jurídicos tutelados pelo direito de ordenação social" (vide Direito Penal, Parte Geral, Questões fundamentais. Teoria geral do crime, 3.ª ed., ...: UCP, 2016, pág. 142, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2018, in Diário da República n.º 219/2018, Série I de 2018-11-14).
Assim, tendo em vista por um lado os bens jurídicos tutelados pelas normas violadas e o facto do Recorrente ter antecedentes contra-ordenacionais, consideramos as exigências de prevenção são muito elevadas. Por um lado, aumenta as necessidades de prevenção a necessidade premente de dissuasão geral, já que estão em causa infracções que contendem com o correcto funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e com os bens e interesses jurídicos em causa (a qualidade da informação, a prevenção e regular gestão de conflitos de interesses, os interesses e o património dos investidores).
Por outro lado, o Recorrente AA tem antecedentes conta-ordenacionais, por violação de normas em que está em causa o regulador Banco de Portugal, mas que afectam igualmente o mercado financeiro.
Na verdade, o Recorrente AA foi condenado, no âmbito do processo n.º 182/16...., mediante sentença proferida por este tribunal transitada em 06/11/2020:
a) a título de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de informação e comunicação adequados no B..., prevista nos art.ºs 19º e 20º do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de quatrocentos mil euros (€400.000,00);
b) a título de dolo directo, no que concerne à omissão de implementação de sistemas de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente no B... quanto à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros, prevista nos art.ºs 10º, 11º, n.ºs 1 a 3, 13º, n.ºs 1 e 2, 15, n.º2, alínea c) e 18º, n.ºs 1 e 2 do Aviso 5/2008, de 1 de Julho, o que constitui a contra-ordenação sancionada pelo art.º 210º, alínea m) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima de quatrocentos mil euros (€400.000,00);
c) a título de dolo necessário, no que concerne à prática da contra-ordenação de actos dolosos de gestão ruinosa em detrimento de depositantes, investidores e demais credores, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea l) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de um milhão e novecentos mil euros (€1.900.000,00);
d) a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação de prestação de falsas informações ao Banco de Portugal que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea r) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de um milhão de euros (€1.000.000,00);
e) a título de dolo directo, no que concerne à prática da contra-ordenação consubstanciada na violação das normas de conflitos de interesses prevista no art.º 86º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que constitui uma infracção especialmente grave, punida pelo art.º 211, alínea i) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, a coima de setecentos mil euros (€ 700.000,00);
f) Em cúmulo jurídico das coimas parcelares, de harmonia com o disposto no art.º 19º do Regime Geral das Contra-Ordenações, aprovado pelo DL 433/82 de 27.10, aplicável ex vi art.º 232º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na coima única de três milhões e setecentos mil euros (€3.700.000,00); e
g) nas sanções acessórias de: i. publicação pelo Banco de Portugal da punição definitiva a expensas do infractor, num dos jornais nacionais generalistas de maior tiragem; ii. inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento ou instituições de moeda electrónica, por um período de oito anos (8) anos.
Embora esteja em causa normas diversas, tal releva alguma tendência para o não cumprimento das normas que são impostas à sua actividade.
A seu favor o facto de ter um diagnóstico clínico compatível com a doença de ..., que o impedirá de exercer as funções que exercia à data dos factos em questão, a acrescer à sanção acessória acima mencionada de inibição do exercício de cargos sociais e de funções de administração, direcção, gerência ou chefia em quaisquer instituições de crédito, sociedades financeiras, instituições de pagamento ou instituições de moeda electrónica, por um período de oito anos (8) anos, o que acaba por mitigar as exigências de prevenção especial.
Importa ter ainda em conta a natureza de pessoa singular do Recorrente em causa.
No que diz respeito à situação económica do Recorrente AA, mostra-se provado que todo o seu património está arrestado à ordem do processo-crime n.º 324/14.... e tem cauções no valor total de EUR 3 milhões prestadas nos processos-crime n.º 324/14.... e n.º 207/11...., em virtude das quais passou a auferir uma reforma e um complemento de reforma mensal líquido no total actualmente de cerca de € 1.900,00.
As contas bancárias do Recorrente na ..., detidas conjuntamente com a sua mulher, foram inicialmente arrestadas pelas autoridades ... e, posteriormente, também passaram a estar arrestadas pelo Tribunal Central de Instrução Criminal no NUIPC 324/14...., num montante de cerca de ... 9.000.000, equivalentes a cerca de EUR 8.540.316,90.
Para além disso, importa referir a sua conduta anterior que se mostra provada, que demonstra que o Recorrente AA foi um homem com reconhecidas competências técnicas, que logrou alcançar prestígio para si e para o grupo do B... não apenas ao nível nacional como internacional. Contudo, conforme já referimos, se essas capacidades podem ser enaltecidas, as mesmas também têm um efeito inverso. Na verdade, a responsabilidade de ter granjeado a confiança do mercado impunha-lhe um especial e acrescido dever de probidade, de respeito pelo mercado e de honrar a confiança que lhe foi depositada por este mercado.
A CMVM condenou o Recorrente AA nas seguintes coimas:
- Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
i. coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever (do intermediário financeiro) de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM;
ii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM;
iii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM;
iv. coima de € 750.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM;
b) Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A:
i. coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de atuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM;
ii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM;
iii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM;
iv.coima de € 600.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM.
Ora, tendo em vista a extensão da moldura das coimas em causa, fixadas pelo legislador, de € 25.000,00 a € 5.000.000,00, nos termos acima indicados e todos os factores acima ponderados, relativamente aos quais consideramos que deverá existir uma distinção entre a situação respeitante à EI..., S.A e a respeitante à R..., S.A, na medida em que a situação da EI..., S.A configura ser de gravidade superior à da R..., S.A, conforme já tinhamos referido e em que a culpa do Recorrente também se mostra mais intensa e ainda sob ponderação dos princípios da necessidade, proibição de excesso ou proporcionalidade das sanções – vide artigo 18º, n.º 2 da CRP –, decidimos adequado e proporcional à defesa do ordenamento jurídico, não ultrapassando a medida da culpa do Recorrente, fixar a medida das coimas, nos seguintes montantes:
- Quanto à colocação de papel comercial da EI..., S.A:
Manter as coimas fixadas pela CMVM a este respeito, ou seja:
i. coima de € 300.000,00, pela violação, a título doloso, do dever (do intermediário financeiro) de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM, mantendo, assim, a coima fixada;
ii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM;
iii. coima de € 350.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM;
iv. coima de € 750.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM;
b) Quanto à colocação de papel comercial da R..., S.A, fixar as seguintes coimas:
i. coima de € 280.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de atuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM;
ii. coima de € 330.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM;
iii. coima de € 330.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM;
iv.coima de € 580.000,00, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM.
- Do cúmulo jurídico das coimas:
Estando em causa o cometimento de 8 contra-ordenações, importa apelar às regras do cúmulo jurídico, nos termos do artigo 19.º do RGCO, considerando a moldura do concurso balizada entre os € 750.000,00 (coima mais elevada concretamente aplicada) e os € 2.970.000,00 (soma das coimas concretamente aplicadas).
“A coima única é fixada em função da apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adscritiva do agente (…). Em regra, a coima única deve aproximar-se dos limites máximos da soma das coimas concretamente aplicadas, devendo ser ponderadas, a favor do agente quaisquer circunstâncias atenuantes ainda não avaliadas aquando da determinação do valor concreto de cada coima.” – vide Comentário ao Regime Geral das Contra-Ordenações à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, Paulo Pinto de Albuquerque, pág. 89 (sublinhado nosso)
Ora, da pluralidade de ilícitos em causa resulta que estes foram cometidos em várias situações distintas, começando na decisão de emissão, colocação e comercialização do papel comercial de 04.09.2013, estendendo-se, quanto à EI..., S.A, até 04.12.2013 e, por referência à R..., S.A, sendo decidida a reestruturação do G... em 07.01.2014 e prosseguindo até 24 de Fevereiro de 2014. Por isso, não se está perante um caso de mera pluriocasionalidade.
Importa referir que mesmo depois de ter determinado a ocultação do passivo da EI..., S.A de 2008 a 2012 e de ter procedido a um aumento inusitado do passivo dessa sociedade em 2013, manchando a credibilidade do mercado em que se inseria, o Recorrente ainda assim participou na decisão do Conselho Superior do G..., tomando como possível novamente macular aquela mesma credibilidade, o que é altamente censurável.
A CMVM fixou uma coima única de € 2.000.000,00.
Consideramos que atento tudo o que foi exposto, não merece qualquer censura a decisão da CMVM, tendo na ponderação da medida concreta da coima única doseado devidamente todos os factores relevantes.
Nestes termos, decido manter a coima única conjunta no valor de € 2.000.000,00.”

18.1. Sob as Conclusões 537 a 544 o recorrente considera que, apesar do tribunal a quo ter alterado a decisão da CMVM no que diz respeito à colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, convolando a conduta a título de dolo directo para dolo eventual, não retirou qualquer efeito jurídico ou consequência prática desta alteração, pois que embora as penas parcelares tenham sido ligeiramente reduzidas a sentença recorrida manteve o valor da coima única, requerendo que seja reformulado o cúmulo jurídico das coimas e reduzida a medida concreta da coima única que lhe foi aplicada.
O recorrente não diz qual é a coima única que considera adequada, limitando-se a insurgir quanto ao facto de o tribunal não a ter reduzido apesar de ter reduzido as penas parcelares quando convolou o dolo directo em dolo eventual.
Salienta-se que de acordo com o art. 416º nº 9 do CdVM não é aplicável a proibição de reformatio in pejus, não estando o tribunal a quo, assim como este Tribunal de recurso limitado ao valor da coima única fixada em sede de decisão administrativa.
Sendo assim, o juiz, dentro dos limites previstos para o cúmulo jurídico estabelecidos no art. 19º do RGCO e, verificados os critérios estabelecidos no art. 405º do CdVM, tem amplos poderes de determinação de cada uma das coimas parcelares e da coima única a fixar ao recorrente, pelo que, ainda que o tribunal quo tivesse reduzido ligeiramente as coimas parcelares quanto às contraordenações relacionadas com a colocação do papel comercial da R..., S.A podia manter, como manteve, o valor da coima única, porquanto em nada foram modificados os limites previstos no referido art. 19º do RGCO e mantinham-se os elementos e circunstâncias valoradas para a sua quantificação, sendo certo que, ainda que assim não fosse, já foi decidido por Ac TC 373/2015 que a coima pode ser agravada sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória.
Ora, atendendo á fundamentação da sentença recorrida não vemos porque divergir do juízo feito quanto ao valor da coima única fixada, mesmo que nalgumas contraordenações o recorrente tenha sido condenado a título de dolo eventual em vez de dolo directo, porquanto, para além do elevado grau de desvio do recorrente aos deveres sociais impostos pelo CdVM, afigura-se essencial na determinação da sanção, em face dos valores e bens jurídicos tutelados, ponderar a elevadíssima necessidade de prevenção geral negativa, conforme é do conhecimento público e notório, face ao elevado número de cometimento de ilícitos contraordenacionais que afectam o mercado de valores mobiliários e sistema financeiro, cuja proteção reveste dignidade e constitucional, urgindo sancioná-los de forma dissuasora de ilícitos futuros, evitando que os demais agentes tomem este comportamento infractor como modelo de conduta.
Em suma, em total concordância com o decidido pelo tribunal a quo, afigura-se-nos que a coima única fixada é adequada e manifestamente proporcional à natureza dos bens tutelados e à gravidade das infrações cometidas, não havendo motivos para que seja reduzida em função da alteração do dolo de directo para dolo eventual (que ocorreu apenas em parte das contraordenações pelas quais o recorrente foi condenado).
             
18.2. Sob as Conclusões 545 a 552 o recorrente sustenta que o tribunal a quo errou ao considerar como elemento relevante na determinação da medida da coima concretamente aplicável que tivesse obtido qualquer benefício com os factos (cfr. parágrafos 22629 e seguintes da página 892 da Sentença), porque da mera leitura da Sentença Recorrida não constam quaisquer factos provados concretos que permitam concluir que o ora Recorrente tenha obtido qualquer benefício da prática das contraordenações imputadas na decisão e, porque não resulta dos factos provados na Sentença uma qualquer quantificação do benefício supostamente auferido pelo ora Recorrente.
Em seu entender a mera titularidade de órgãos sociais de uma sociedade não permite, por si só, retirar qualquer benefício para o agente e, os “interesses” que o agente alegadamente tenha – enquanto titular de órgãos sociais de várias entidades do G... – de captar para a EI..., S.A e para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G..., não se traduzem num benefício obtido pelo agente.
Concluiu que, em rigor, está em causa uma insuficiência da matéria de facto, que resulta da mera leitura da própria Sentença Recorrida, configurando um vício da sentença recorrida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, peticionando que a sentença seja revogada e seja ordenada a baixa do processo para correcção do vício.
O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ocorre quando os factos provados forem insuficientes para fundamentar a decisão proferida, ou quando, o tribunal recorrido, podendo fazê-lo, deixou de investigar toda a matéria relevante, daí resultando que essa matéria de facto considerada provada não permite, por ser insuficiente, a subsunção jurídica encontrada pelo tribunal para resolver em termos de direito o litígio judicial.
Esse vício traduzir-se-ia numa«(…) lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher.
Porventura melhor dizendo, só se poderá falar em tal vício quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a solução de direito e quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto com interesse para a decisão final.»( )
Afigura-se-nos que a sentença não padece do apontado vício, tendo-se limitado o tribunal a inferir de factos provados nos autos- ver factos 413 e 480 a 515- (que o recorrente é accionista e administrador de várias sociedades do G...) que obteve um benefício económico com o cometimento dos ilícitos pelos quais foi condenado, correspondente à captação dos recursos financeiros dos clientes do B... para empresas das quais era acionista, daí resultando mais não seja um incremento patrimonial indirecto, que não precisa de  ser quantificado para o efeito (o benefício económico inclui o aumento da clientela, como refere Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao RGCO, p. 85; no mesmo sentido Augusto Silva Dias, Direito das Contra-Ordenações, p. 170)

18.3. Sob as Conclusões 554 a 561 o recorrente voltou a arguir o vício da sentença por insuficiência da matéria de facto provada, alegando que no recurso de impugnação judicial havia alegado factos que demonstram que a sua conduta visou obviar aos supostos perigos causados pela infracção, em concreto, obstar ao não reembolso aos Clientes do B... do investimento feito em papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, pois que, durante o período em que permaneceu enquanto CEO do B... (até 13 de Julho de 2014), os Clientes não institucionais ou não qualificados do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A foram sendo, sempre, reembolsados.
Como referido no recurso de impugnação judicial, em particular, nos artigos 2461 a 2469, entre 30 de Junho de 2014 e 31 de Dezembro de 2013 verificou-se uma redução de € 1.355 milhões no papel comercial emitido por estas duas entidades colocado nos Clientes não institucionais do B..., ou seja, houve uma redução de 70% do papel comercial da EI..., S.A e R..., S.A colocado em Clientes institucionais do B..., que foi reembolsado durante esse período.
Conclui que o reembolso da dívida titulada emitida pela EI..., S.A e pela R..., S.A que foi sendo realizado durante o ano de 2014 (até à medida de resolução do B...) demonstra a preocupação do B... e dos seus administradores com a protecção e salvaguarda dos principais interesses dos clientes do B....
E, uma vez que a matéria de facto referida supra, invocada no recurso de impugnação judicial foi ignorada pela Sentença Recorrida, na qual se considerou que se desconhecia a existência de actos do ora Recorrente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção, é forçoso concluir que se verifica uma insuficiência da matéria de facto para a decisão, prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, ex vi artigos 41.º, n.º 1 e 74.º, n.º 4, do RGCO, que requer seja declarada.
Como já decidido a propósito da questão 16ª, as contraordenações pelas quais o recorrente foi condenado são contraordenações de mera actividade, de perigo, que prescindem do resultado, sendo que o reembolso dos clientes até á saída do recorrente do B... não teve origem em acto pessoal seu, nem isso seria relevante, porquanto, contrariamente ao por si alegado, para além de não ter obviado aos perigos decorrentes das infrações cometidas, foi o impulsionador desses perigos e, conforme ficou provado no facto 513, o recorrente para além de ter praticado os factos descritos nos autos, não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas.
Deste modo, os factos alegados pelo recorrente não teriam relevância para o efeito pretendido, razão pela qual, a omissão dos mesmos na sentença recorrida não consubstancia nenhuma insuficiência da matéria de facto provada.

18.4. Sob as Conclusões 562 a 570 o recorrente invocou o erro da sentença quanto à existência de antecedentes contraordenacionais, alegando que nos parágrafos 22657 e seguintes da página 893 e parágrafos 22664 e seguintes da página 894 da Sentença Recorrida, é destacado que o ora Recorrente tem antecedentes contraordenacionais, por violação de normas em que está em causa o regulador Banco de Portugal, mas que afectam igualmente o mercado financeiro, uma vez que foi condenado, no âmbito do processo n.º 182/16...., mediante sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, transitada em julgado em 6 de Novembro de 2020, mas a sua condenação no âmbito do processo n.º 182/16...., por sentença transitada em julgado, não pode relevar enquanto antecedente contraordenacional, por que os factos relevantes naquele processo não são anteriores aos factos destes autos e,  as infracções que ali lhe foram imputadas terão sido alegadamente praticadas ao tempo da alegada prática das infracções aqui arguidas.
A lógica de graduar a coima do agente tendo em conta os seus antecedentes contra-ordenacionais tem subjacente as necessidades de prevenção especial, relacionadas com a dissuasão do agente condenado em relação à reincidência, no entanto, não está aqui em causa uma actuação posterior ilícita do ora Recorrente, uma vez que os factos em causa na decisão condenatória do processo n.º 182/16.... não são anteriores aos da Sentença Recorrida.
Conclui que, a relevância dada à condenação do ora Recorrente no âmbito do processo n.º 182/16.... afigura-se totalmente contraditória e incongruente com a posição adoptada pelo Tribunal de 1.ª instância quanto à inexistência de violação do princípio ne bis in idem na Sentença Recorrida.
É inegável que o recorrente foi condenado por sentença transitada em julgado no processo contraordenacional nº 182/16.0YUSTR.L1 e foi isso que o tribunal valorou e bem, porquanto na determinação da sanção é ainda tomada em conta a conduta anterior do agente e os seus antecedentes- não tendo sido considerado reincidente-, não tendo essa valoração qualquer incompatibilidade com a decisão de indeferimento do ne bis in idem, pelo contrário, porque os factos não eram os mesmos e por eles o recorrente foi definitivamente condenado, sendo porém infrações que também afectam os mercados financeiros devendo ser valoradas enquanto tal.

18.5. Sob as Conclusões 571 a 575 o recorrente arguiu o erro na ponderação da sua situação económica na determinação da coima aplicável, alegando que o tribunal deu como provados os factos 757 a 779 relativos á sua situação e condição económica mas não retirou qualquer efeito ou consequência prática com reflexo na medida da coima aplicada, tendo confirmado na integra a coima aplicada pela CMVM, quando devia ter concluído que a medida da coima única aplicada pela CMVM não era proporcional, nem adequada à sua condição, por não dispor de património ou meios financeiros próprios relevantes e, como tal deveria ter sido reduzida tal coima única que lhe foi aplicada, pelo que, não o tendo sido violou o disposto no art. 405º nº 4 do CdVM.
Não tem qualquer razão o recorrente, o tribunal valorou a sua condição económica, como acima se reproduziu, contudo essa valoração não implica necessariamente uma redução da coima única aplicada, a qual, como vimos, é fixada atendendo a diversos critérios, pelo que, sopesando o elevado grau de ilicitude concreta dos factos e as exigências de prevenção, não se mostra a coima desproporcionada ou inadequada à sua condição económica, sendo que, apesar de, eventualmente ainda ter grande parte do património arrestado, esse património existe, é elevado e pertence-lhe.

18.6. Sob as Conclusões 576 a 582 o recorrente alegou o erro na ponderação da sua situação pessoal na determinação da coima aplicável, alegando para o efeito que na Sentença Recorrida, apesar do Tribunal de 1.ª instância ter dado como provado que actualmente tem um diagnóstico clínico compatível com a doença de ... (facto provado 780), tendo reconhecido que tal facto mitigaria as exigências de prevenção especial (cfr. página 895 da Sentença Recorrida), sem que a coima aplicada tivesse sido objecto de redução, quando as necessidades de prevenção – gerais e especiais – são tanto menores quando se verifica que o arguido não tem a capacidade de compreender a totalidade da sanção.
Conclui que, na determinação da medida concreta da coima a aplicar ao ora Recorrente, a Sentença Recorrida deveria ter ponderado correctamente que, tanto a doença mental cognitiva que lhe foi diagnosticada como a idade avançada do Recorrente – 78 anos – concorrem para mitigar as exigências de prevenção geral e especial e, em consequência, as necessidades da sanção, desde logo, porque a capacidade cognitiva do ora Recorrente para compreender o alcance da coima que lhe é aplicada está arredada e afectada ou, pelo menos, diminuída.
Discordamos do recorrente quando refere que “as necessidades de prevenção gerais e especiais são tanto menores quando se verifica que o arguido não tem capacidade de compreender a totalidade da sanção”, por um lado porque as exigências de prevenção geral não se dirigem à sua pessoa, mas aos outros operadores nos mercados financeiros que devem ser dissuadidos de enveredar por condutas  do género das praticadas pelo recorrente, que fazem perigar de forma muito séria a estabilidade do sistema financeiro, potenciando riscos sistémicos.
E, por outro lado, porque não está demonstrado nos autos que o recorrente esteja efectivamente incapacitado de compreender o real alcance das condenações que lhe foram impostas, apenas que   tem um diagnóstico clínico compatível com a doença de ..., não sendo o factor idade necessariamente sinónimo de uma menor percepção da realidade, da dimensão da sua conduta e das sanções que lhe foram impostas.

Pelo exposto, improcedem totalmente os argumentos recursivos apresentados pelo recorrente, mantendo-se a sentença recorrida na parte que lhe diz respeito.
*
III- Recurso de BB

1ª- Da dupla violação do princípio Ne Bis In Idem.
O Recorrente BB, tal como o recorrente AA o fez, arguiu a questão da violação do princípio Ne Bis In Idem, previsto no art. 29º nº 5 da CRP, alegando, nas Conclusões 4 a 25, que a sua intervenção na operação de emissão e colocação, pelo B..., de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A não só foram já sancionados pelo Banco de Portugal no processo de contraordenação n.º 58/..., como foram objecto de acusação criminal no processo n.º 324/14...., actualmente em fase de instrução junto do Tribunal Central de Instrução Criminal, respeitando a Decisão proferida pela CMVM, econfirmada pela Sentença, essencialmente, (i) à comercialização de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A em alegado prejuízo dos interesses dos clientes do B..., e (ii) à disponibilização de informação sobre as entidades emitentes alegadamente não correspondente com a realidade, sendo que os factos referentes ao papel comercial emitido pela EI..., S.A são em tudo coincidentes com os constantes da decisão proferida pelo Banco de Portugal no referido processo de contra-ordenação, o qual teve por objecto a desconformidade dos registos contabilísticos da EI..., S.A, a ausência de sistemas e procedimentos de gestão de risco, e, ainda, os alegados conflitos de interesses na comercialização de papel comercial da EI..., S.A e, que a alegada falta de qualidade da informação constante das Notas Informativas da EI..., S.A é resultado directo da falsificação das respectivas contas eda obnubilaçãoda sua situação económica, facto esse já sancionado no processo movido pelo Banco de Portugal.
Mais alegou que os factos relativos ao papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, surgem igual e integralmente vertidos na acusação deduzida no referido processo-crime: (i) a falsificação das demonstrações financeiras da EI..., S.A e a colocação de papel comercial pela mesma emitido nessas circunstâncias, maxime o teor das respectivas Notas Informativas; (ii) a operação de reestruturação do G..., o respectivo alegado impacto na situação da R..., S.A, e a continuação da colocação de papel comercial pela mesma emitido após a concretização da referida operação, não reflectida nas respectivas Notas Informativas; e (iii) a emissão e comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, aprovada na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, em alegado conflito de interesses e consequente prejuízo dos interesses dos clientes do B..., sendo irrelevante a circunstância de as infracções imputadas, as sanções aplicadas, e as entidades competentes serem diversas [ou, de resto, a distinção/autonomia entre os sistemas sancionatórios, sectores de actividade e/ou os interesses jurídicos em causa porquanto o conceito relevante para o efeito corresponde a um conceito histórico-naturalístico, em função do concreto acervo factual, espácio e temporalmente delimitado, e não da lei aplicável, da autoridade competente, dos tipos legais, ou do bem jurídico tutelado.
Sustentou ainda que, à luz do disposto no artigo 79.º, n.º 1, do RGCO, o Banco de Portugal esgotou o ius puniendi relativamente aos factos referentes à EI..., S.A, precludindo, assim, a possibilidade de a CMVM exercer o seu próprio poder punitivo sobre os mesmos e, que, sendo os factos em causa susceptíveis de constituir, simultaneamente, a prática de crimes, é aplicável o postulado no artigo 20.º do RGCO, e não o (especialmente) disposto no artigo 420.º, n.º 1, do CdVM  o qual, sob pena de inconstitucionalidade por violação do artigo 29.º, n.º 5, da CRP, deve ser interpretado restritivamente no sentido de excluir os casos de concurso aparente, e, por isso, o presente caso.
Concluiu que, verificando-se, alegadamente, concurso entre crime e contra-ordenação, deve, nos termos conjugados dos artigos 20.º e 38.º, n.os1 e 2, ambos do RGCO, aplicável ex vi artigo 407.º do CdVM, ser determinada a remessa dos presentes autos ao Tribunal Central de Instrução Criminal.
Tendo a Decisão proferida pela CMVM, e confirmada pelo Tribunal a quo, incidido sobre factos susceptíveis de constituir, simultaneamente, crime pelos quais foi, aliás, já deduzida acusação criminal, e pela autoridade competente para o efeito , invocou a nulidade insanável, por violação das regras de competência [cfr. artigo 119.º, alínea e), do CPP [aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO)].
Suscitou, ainda, a inconstitucionalidade material da interpretação normativa resultante da conjugação dos artigos 20.º e 38.º, n.os 1 e 2, do RGCO, e 401.º, 408.º, n.º 1, e 420.º, n.º 1, todos do CdVM, no sentido de que a autoridade administrativa pode apreciar, investigar, instruir processos, acusar e condenar por factos susceptíveis de constituir, simultaneamente, crime, e objecto de acusação em processo criminal, por violação do princípio ne bis in idem, consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da CRP, bem como da interpretação normativa resultante da conjugação dos artigos 79.º, n.º 1, do RGCO, 401.º, e 408.º, n.º 1, ambos do CdVM, no sentido de que a autoridade administrativa pode apreciar, investigar, instruir processos, acusar e condenar por factos já objecto de decisão final definitiva por outra autoridade administrativa.
Atendendo à especificidade desta questão, embora a mesma já tenha sido decidida aquando da apreciação do recurso do recorrente AA, vamos reproduzir no geral o aí decidido, estando embora cientes que, fazendo-o, poderemos tornar-nos muito repetitivos, mas afigura-se preferível em termos expositivos.
A garantia prevista no nº 5 do art. 29º da CRP, comporta duas dimensões:
“a) como direito subjetivo fundamental garante ao cidadão o direito a não ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo facto, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a possibilidade de se defender contra atos estaduais violadores desse direito (direito de defesa negativo);
b) como princípio constitucional objetivo (dimensão objetiva do direito fundamental), obriga fundamentalmente o legislador à conformação do direito processual e à definição do caso julgado material de modo a impedir a existência de uma pluralidade de julgamentos pelo mesmo facto.
Para a tarefa de «densificação semântica» do princípio, é particularmente importante a clarificação do sentido da expressão «prática do mesmo crime». A Constituição proíbe rigorosamente o duplo julgamento e não a dupla penalização, mas parece óbvio que a proibição do duplo julgamento pretende evitar a aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do «mesmo crime». O conceito jurídico-constitucional de «mesmo crime» tem de obter-se recorrendo aos conceitos jurídico-processuais e jurídico-materiais desenvolvidos pela doutrina do direito e processo penais. O problema é particularmente difícil em casos de comparticipação, de concurso de crimes e de crime continuado.”
Apercebemo-nos, pois, da dificuldade prática que emana da aplicação do princípio do ne bis in idem, designadamente no caso sob análise, dada a aparente similitude das condutas punidas pelo RGICSF e pelo CdVM e, da necessária dissecação a efectuar entre as contraordenações objecto das duas condenações, quer quanto aos elementos de imputação objectiva, quer em termos de concurso.
Impõe-se desde logo apurar, em cada um dos dois processos contraordenacionais, o que se entende ser o facto juridicamente relevante, que integra os elementos objectivos do tipo das contraordenações em causa, para se aferir se estamos ou não perante o «mesmo crime» e/ou a mesma contraordenação.
Na vertente do caso julgado, Germano Marques da Silva, dá um contributo relevante para esta questão, referindo que “o caso julgado é um instituto que visa a protecção das decisões jurisdicionais, sem o que essas decisões não seriam vinculativas já que poderiam ser repetidamente modificadas.
(…) o efeito negativo do caso julgado consiste em impedir qualquer novo julgamento da mesma questão. É o princípio conhecido pelo brocardo non bis in idem, consagrado como garantia fundamental pelo art. 29º nº 5 da Constituição da República Portuguesa: ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime.
O elemento de natureza objectiva da proibição do non bis in idem é dado pela identidade entre o pedido e a causa de pedir do feito já julgado e daquele por que se pretende instaurar o novo processo.
(…)“A identidade da causa de pedir  refere-se aos factos já julgados e aos que se pretendem julgar no novo processo, devendo buscar-se aqueles no fundamento de facto da sentença. A identidade da causa de pedir não deve considerar-se em abstracto, como jus persecuendi, mas antes em concreto pela identidade da razão de pedir; e o pedido, na estrutura actual do processo penal, não é senão o reconhecimento pela lei da existência do crime objecto da acusação, da declaração da responsabilidade do arguido e a aplicação da sanção.” 
Ora, a identidade do facto, é a que mais dificuldades suscita na aplicação do princípio do ne bis in idem, desde logo porque quer a Doutrina, quer a Jurisprudência não é unívoca quanto ao conteúdo daquele requisito, afigurando-se-nos que a jurisprudência emanada do TJUE assenta numa identidade fáctica naturalística, prescindindo da sua valoração jurídica e da distinção quanto aos bens jurídicos tutelados pelas normas jurídicas convocadas, da qual se afasta a jurisprudência praticamente unânime do Tribunal Constitucional.
Germano Marques da Silva, a esse propósito refere que(…)“A doutrina tradicional dominante era no sentido de que bastava a identidade parcial dos factos, sendo também indiferente a qualificação jurídica que lhes fosse dada. Não nos parece correcta essa construção.
O processo penal com estrutura acusatória limita o objecto processo ao facto descrito na acusação. Entendemos que a delimitação do facto se há-de fazer necessariamente em função do bem jurídico protegido, pois que só o facto, enquanto alegadamente delitivo (facto qualificado) interessa ao processo e tem virtualidade para que o processo se abra e prossiga.
Numa primeira aproximação, por mesmo crime deve considerar-se a mesma factualidade jurídica e o seu aspecto substancial, os elementos essenciais do tipo legal pelos quais o arguido foi julgado.
 Por isso que, como já referimos, nos casos de concurso ideal, se o arguido foi já julgado por um dos crimes em concurso isso não impede que seja novamente julgado pelos outros; os crimes são diversos.
Mas, pelo contrário, nos casos de mero concurso aparente de crimes- entre o julgado e o que se pretende julgar- quando os dois ou mais crimes em concurso não podem ser cumulados, julgado um, impedido está o julgamento pelo outro.
Em conclusão: « crime» deve considerar-se como o mesmo quando exista uma parte comum entre o facto histórico julgado e o facto histórico a julgar e que ambos os factos tenham como objecto o mesmo bem jurídico ou formar, como acção que se integra na outra, um todo do ponto de vista jurídico.”  
Estas considerações, apesar de pensadas para as infrações penais, são perfeitamente transponíveis para a hipótese de cumulação de procedimentos contraordenacionais e infrações dessa natureza, como é entendimento generalizado e já sedimentado na jurisprudência e doutrina.
Neste recurso não se discute a identidade do agente, nem o duplo julgamento/dupla punição, uma vez que o aqui recorrente foi arguido nos dois processos e nos dois foi julgado e condenado.
Senão vejamos.
No âmbito do procedimento contraordenacional nº n.º 58/... instaurado pelo Banco de Portugal contra o aqui Recorrente BB, entre outros, foi proferida decisão administrativa, que o condenou nos seguintes termos:
a) pela infração consubstanciada na violação do disposto nos arts. 10º, 11º nºs 1 a 3, 13º nºs 1 e 2, 15º nº 2 al. c) e 18º nº 1 e 2 todos do Aviso nº 5/2008 ( não implementação de um sistema de gestão de riscos sólido, eficaz e consistente, no que concerne à actividade de colocação de produtos emitidos por terceiros) punível nos termos da alínea m) do artigo 210º do RGICSF;
b) pela infração consubstanciada na violação das regras sobre conflitos de interesses previstas no art. 86º do RGICSF, punível nos termos da alínea i) do art. 211º do RGICSF.
Nos presentes autos, em sede de sentença recorrida, o referido arguido/recorrente foi assim sentenciado:
a) Absolvido da prática dolosa da violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
b) Absolvido da prática dolosa da violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
c) Absolvido da prática dolosa da violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
d) Absolvido da prática dolosa da violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM
e) Condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 50.000,00 (cinquenta mil euros);
f) Condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
g) Condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
h) Condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 100.000,00 (cem mil euros);
i) Condenado, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros);
j) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
k) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
l) Condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros);
A controvérsia objecto deste recurso foca-se na alegada identidade de factos e na identidade de bens jurídicos existente entre os dois procedimentos contraordenacionais no âmbito dos quais foi o aqui recorrente condenado.
Conforme se pode extrair das alegações do recorrente o mesmo centra a problemática da violação do princípio do ne bis in idem na verificação de uma identidade de condutas e/ou identidade de factos que determinaram a sua condenação no procedimento contraordenacional nº 58/... e processo sub judice, alegando que “ os factos referentes ao papel comercial emtido pela EI..., S.A são em tudo coincidentes com os constantes da decisão proferida pelo Banco de Portugal, o qual teve por objecto a desconformidade dos registos contabilísticos da EI..., S.A, a ausência de sistemas e procedimentos de gestão de risco e ainda os alegados conflitos de interesses na comercialização de papel comercial da EI..., S.A, sendo que a alegada falta de qualidade da informação constante das Notas Informativas da EI..., S.A é resultado directo da falsificação das respectivas contas e da obnubilação da sua situação económica, facto esse já sancionado no processo movido pelo BP” sendo irrelevantes os interesses jurídicos em causa porquanto relevante é o conceito histórico-naturalístico em função do concreto acervo factual espácio e temporalmente delimitado e, é aqui que radica, no essencial, o ponto de discórdia entre o seu entendimento e o perfilhado na sentença recorrida.
Efectivamente, a esse propósito, foi tomada, em síntese, a seguinte posição na sentença recorrida:
“O princípio ne bis in idem é um princípio clássico que tem idêntico conteúdo em vários dispositivos legais, incluindo comunitários.
 (…) para que se esteja perante a repetição da mesma causa é necessário que haja identidade de pessoa e identidade do facto, proibindo-se que um mesmo e concreto facto (objecto decidendum ou acontecimento histórico) possa erguer um segundo processo penal / contra-ordenacional.
A identidade do facto importa quando simultaneamente constituir identidade de ilícito, ou seja, o que releva é não o facto pelo facto, mas sim o facto com um conteúdo ou uma consequência normativa.
(…)Com efeito, ao contrário do que entendemos ser a posição dos Recorrentes, um comportamento naturalisticamente analisado poderá subsumir-se em vários ilícitos típicos, sem que tal implique, automaticamente, a violação do princípio ne bis in idem. Reforçamos, para apurar se existe a violação de tal princípio, importa aferir se, apesar de naturalisticamente una, a conduta comporta a violação de uma multiplicidade de sentidos sociais autónomos vertidos nos vários ilícitos-típicos cometidos, comportando, numa perspectiva teleológica, diversas valorações jurídicas.
(…)Tanto o Recorrente AA, como o Recorrente BB exerciam funções de administração numa entidade que era simultaneamente uma instituição de crédito (sujeita à supervisão do Banco de Portugal) e um intermediário financeiro e emitente de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado (sujeita à supervisão da CMVM). Estavam ambos, por isso, sujeitos às normas destinadas a cada um dos dois sectores distintos em causa, sendo que, tal como refere a decisão administrativa, tal constitui “a consequência necessária do privilégio de acesso às mesmas”.
Seguindo os critérios de natureza estritamente normativa adoptados pelo Tribunal Constitucional, importa concluir que entre as normas que estão na génese da punição do Banco de Portugal e as normas que suportam a decisão da CMVM não existe uma relação de consunção, que implique a violação do princípio ne bis in idem, não se tratando dos mesmos ilícitos.
Na verdade, se o critério a adoptar, que é seguido pelo Tribunal Constitucional, coloca em segundo plano a acção proibida em si mesma, na sua vertente naturalística, ressaltando antes a valoração jurídica da conduta, temos de concluir que os sectores de actividade financeira em causa (bancário e financeiro strito senso) e por inerência as normas de dever que ambos observam, tutelam bens jurídicos distintos, pressupondo desvalores igualmente distintos, apresentando cada um dos factos uma diversa relevância jurídica, em consonância com a perspectiva normativa, assumindo desvalores autónomos.”
O Tribunal a quo optou claramente pela aferição do pressuposto relativo à identidade do facto de acordo com a valoração normativa do ilícito, afastando-se da mera aferição naturalística, embora a ela também faça alusão, entendimento que acompanhamos.
A discordância do recorrente centra-se essencialmente na identidade de factos, considerando irrelevante para aferir da violação ou não do referido princípio a diferente qualificação jurídica das infrações cometidas, o diferente regime sancionatório ou a diferença de bens jurídicos protegidos.
Não podíamos estar mais em desacordo, porquanto não consentimos que o princípio faça apelo apenas a um conceito puro e naturalístico de facto, mas ao conceito normativo de facto- facto enquanto desvalor jurídico, violador de um determinado bem jurídico- havendo que perscrutar o bem jurídico tutelado por cada uma das normas punitivas em aplicação (idem factum illicitum)
Verificar-se-á um idem factum illicitum se houver identidade do bem jurídico tutelado pelas normas sancionadoras concorrentes ou do desvalor pressuposto por cada uma delas.
A lei pode conferir distintas valorações jurídicas à mesma conduta, materialmente entendida (estando-se perante um concurso efectivo de infrações) e, nesses casos, segundo o Tribunal Constitucional, não se suscita a inconstitucionalidade por violação do principio ne bis in idem (Ac. TC nº 356/2006, Ac TC nº 265/2016 e o recente Ac TC nº 298/2021).
Neste último aresto pode ler-se:
“Tomando o facto - «o mesmo facto» -, não de um ponto de vista naturalístico, que coloca a tónica sobre a ação proibida, mas de um ponto de vista normativo, que atende à valoração jurídica da conduta, o Tribunal entendeu verificar-se um idem factum illicitum quando os tipos em confronto tutelam o mesmo «bem jurídico» ou pressupõem o mesmo tipo de «desvalor» (Acórdão n.º 244/1999); inversamente, entendeu que esse “idem factum illicitum” não verifica quando uma «mesma conduta (…) no sentido naturalístico» «corresponde a uma realização de factos com diversa relevância jurídica» e, na «perspetiva do grau de desvalor», o legislador sustentadamente entenda que existe «um acréscimo de desvalor» pela realização do tipo contraordenacional relativamente àquele que subjaz à realização do tipo criminal, optando, com base nesse «acréscimo de desvalor», por uma solução de «concurso efetivo» entre crime e contraordenação em detrimento de «outras opções segundo uma lógica de concurso ideal», tendo em conta que a «Constituição não impõe uma única solução jurídica nesta matéria» (Acórdão n.º 356/2006).
Este último entendimento foi aplicado ainda no Acórdão n.º 265/2016, onde se concluiu que, «se um mesmo objeto material comporta teleologicamente diferentes valorações jurídicas», a existência de uma situação de «concurso efetivo e ideal de infrações de natureza distinta» - penal e contraordenacional - «não se afigura constitucionalmente inadmissível», já que a «lei confere distintas valorações jurídicas à mesma conduta, materialmente entendida».”
Ainda que a conduta do arguido seja a mesma, que tenha ocorrido no mesmo contexto histórico, isso não impede que não haja um acréscimo de desvalor tutelado por dois regimes sancionatórios distintos.
Segundo o recorrente há identidade dos factos legalmente relevantes até porque uma parte substancial dos factos que serviram de base á decisão no ... repetem-se nos presentes autos.
Quanto à repetição de factos, naturalisticamente falando, parece-nos inquestionável que se verifica, até porque o enquadramento espacio-temporal é o mesmo, o contexto que despoletou a imputação das infrações que dizem respeito à actuação em conflito de interesses relativamente à colocação do papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., num e noutro processo contraordenacional, é o mesmo, podendo encontrar-se vários factos dados como provados num e noutro processo que isso espelham, no entanto, apesar de tudo, os factos juridicamente relevantes não são totalmente coincidentes e, são diferentes as valorações jurídicas.
Efectivamente, no que diz respeito à violação das regras sobre conflitos de interesses, no Proc. Nº 58/... foi dado como provado as funções que o aqui recorrente exercia nas sociedades do grupo B..., e a participação que teve e decisões que tomou a propósito da colocação de papel comercial da EI..., S.A nos clientes do B..., conforme factos 1077, 1079, 1080, 1082 a 1085, tendo aí sido condenado pela violação do art. 86º do RGICSF, sendo que, no mesmo contexto, actuou como se deu como provado nos factos 395 a 405 e 520 a 543-D dos presentes autos, que consubstancia a violação do art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM, sendo distintos os conflitos de interesses tutelados pelas normas contraordenacionais do RGICSF e do CdVM.
Enquanto que a violação do art. 86º do RGICSF esgota-se no facto objectivo de o recorrente ter participado e tomado decisões, (designadamente as relativas à emissão de papel comercial pela EI..., S.A e sua comercialização a clientes do B...), enquanto administrador do B... e da EI..., S.A, operações em que também era directamente interessado- privilegiando os seus próprios interesses e os da EI..., S.A, em detrimento da própria instituição bancária B...- revelando um conflito de interesses com esta.
Já a violação do art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM traduz um conflito de interesses mais específico e centrado na actividade do B... enquanto intermediário financeiro e, embora os factos de base sejam aqueles acima mencionados (vertidos nos factos 520 a 539 deste processo)- o mesmo contexto - a eles acrescem todos os vertidos nos factos 395 a 405 e 539 a 543-D, que revelam um conflito de interesses com os clientes do B..., a quem o referido papel comercial foi disponibilizado, sem que o intermediário financeiro se organizasse por forma a identificar e a evitar o risco de ocorrência desses conflitos de interesses, sem ser assegurado aos clientes do B... um tratamento transparente e equitativo, e sem ter sido dado prevalência aos interesses dos clientes do B..., perante os interesses do próprio recorrente e os interesses das sociedades do grupo de que era administrador ou acionista.
Não obstante, a identidade naturalística de factos é demasiado redutora para permitir, por si só, concluir por qualquer violação do princípio in bis in idem, devendo exigir-se, tal como entendimento acima transcrito do Prof. Germano Marques da Silva e consagrado de forma muito consistente e aprofundada pelo Tribunal Constitucional, que esse circunstancialismo fáctico idêntico assuma também o mesmo desvalor jurídico, apelando-se a um conceito normativo de idem, afastando-se a violação daquele princípio quando haja um desvalor plúrimo, um concurso real de contraordenações, ainda que os factos sejam substancialmente os mesmos.
Não obstante, bem sabemos, não ser essa a orientação da jurisprudência firmada no TEDH, que assenta primordialmente no conceito naturalístico de idem, impedindo o julgamento e sancionamento dos mesmos factos ou factos substancialmente idênticos.
 Tal como nos dá conta a decisão proferida em 10.02.2009 (no caso Sergey Zolotukhin c. Russia, P. nº 1493903) na qual o TEDH veio afirmar que o art. 4º do Protocolo nº 7 à CEDH proíbe que uma segunda infracção seja punida com fundamento em actos idênticos, ou substancialmente iguais, aos que serviram de fundamento à primeira, qualquer que seja a sua qualificação jurídica (opção clara pelo idem factum e negação do idem crimen), descrevendo a identidade dos factos como um conjunto de circunstâncias fácticas concretas que envolvem o mesmo infractor e estão indissociavelmente ligadas no tempo e no espaço.
Aquela decisão abordou “a problemática da aplicação do princípio do ne bis in idem segundo o critério da prevalência da identidade dos factos (idem factum) materiais ou da identidade da infração (idem legal/mesma qualificação jurídica segundo o direito interno do Estado) e sua diferente natureza procedimental (administrativa/penal) concluindo que, a diferenciação de natureza e qualificação não obsta a essa identidade e viola assim a regra do art. 4º nº 1 do Pt7 à CEDH”.
A aplicação do princípio do ne bis in idem pelo TEDH exige a verificação de quatro condições:
1) a identidade da pessoa julgada ou punida;
2) a identidade dos factos em juízo;
3) a duplicação dos processos sancionatórios;
 4) o carácter definitivo de uma das decisões.
O art. 50º da Carta proíbe a aplicação, por factos idênticos, de várias sanções de natureza penal (ou contraordenacional) no termo de diferentes procedimentos instaurados para estes afins.
Também o TJUE tem sustentado de forma reiterada e consistente que o critério relevante para apreciar a existência de uma mesma infração é o da identidade dos factos materiais, entendidos no sentido da existência de um conjunto de circunstâncias concretas indissociavelmente ligadas entre si, que levaram à absolvição ou à condenação definitiva da pessoa em causa, independentemente da qualificação jurídica desses factos ou do bem jurídico protegido (entre outros, caso Straaten C-150/05 decisão de 28.09.2006; caso Kretzinger C-288/05 decisão de 18.07.2007; caso Kraaijenbrink C-367/05 decisão de 18.07.2007).
De igual modo no Acórdão do TJUE C-537/16 de 20.03.2018(caso Garlsson Real Estate SA e Commissione Nazionale per le Societá e la Borsa( Consob), o Tribunal apreciou a questão da natureza penal de sanção administrativa pecuniária (por manipulação de mercado)- afirmando a natureza penal daquela sanção, atenta a sua finalidade repressiva e o nível de severidade elevado, face ao montante da sanção- e adoptou como critério relevante para apreciar a existência de uma mesma infracção, o da identidade dos factos materiais, entendidos enquanto conjunto de circunstâncias concretas indissociavelmente ligadas entre si que levaram à absolvição ou à condenação definitiva da pessoa em causa, tendo também considerado irrelevante para efeitos da verificação da existência de uma mesma infração, a qualificação jurídica, no direito nacional, dos factos e o interesse jurídico protegido.
Porém, se atentarmos no aresto acima mencionado, deixou-se à instância nacional, a possibilidade de apreciar se o grau de identidade e de conexão entre todas as circunstâncias factuais a comparar é tal que seja possível declarar, á luz do critério acima mencionado, tratar-se dos «mesmos factos».
Mas mais, numa demonstração de que para a aferição da violação do princípio ne bis in idem não é apenas determinante a existência da identidade dos factos, o próprio TJUE, designadamente no Acórdão acima mencionado, justificou já algumas restrições àquele princípio com base no art. 52º/1 da Carta, quando resultantes de regulamentação nacional, que corresponda a um objectivo de interesse geral (naquele caso a salvaguarda da integridade dos mercados financeiros da União), sopesando, pois, o bem jurídico tutelado.
Tal como o voltou a fazer no Acórdão C-524/15 de 20.03.2018 (Luca Menci), em que analisou o interesse geral em apreço no caso – luta contra as infracções em matéria de IVA – concluindo que se poderá justificar o cúmulo de procedimentos e sanções (penal e administrativa de natureza penal), que têm finalidades complementares (admitindo, mais uma vez, uma restrição ao princípio ne bis in idem), declarando que pode justificar-se um cúmulo de procedimentos e de sanções de natureza penal quando estes visem, para a realização do referido objectivo, finalidades complementares que tenham por objecto, se for caso disso, aspectos diferentes da mesma conduta ilícita em causa, o que cabe ao órgão jurisdicional verificar.
O artigo 50º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia foi “interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual podem ser instaurados processos penais contra uma pessoa, por não pagamento do imposto sobre o valor acrescentado devido nos prazos legais, apesar de já lhe ter sido aplicada, pelos mesmos factos, uma sanção administrativa definitiva de natureza penal na aceção do referido artigo 50º, na condição de esta regulamentação
– visar um objetivo de interesse geral que seja suscetível de justificar esse cúmulo de procedimentos e de sanções, a saber, a luta contra as infrações em matéria de imposto sobre o valor acrescentado, devendo esses procedimentos e essas sanções ter finalidades complementares,
– conter regras que assegurem uma coordenação que limite ao estritamente necessário o encargo adicional que para as pessoas em causa resulta de um cúmulo de procedimentos, e
– prever regras que permitam assegurar que a severidade do conjunto de sanções aplicadas corresponde à gravidade da infração em causa.”
É neste contexto que se poderá chamar à colação  o art. 420º do CdVM que, consagra o concurso de infrações, prevendo expressamente que se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, o arguido é responsabilizado por ambas as infrações, instaurando-se processos distintos a decidir pelas autoridades competentes ( aplicável de igual modo em caso de concurso de contraordenações) e, que consagra a regra de que quando o mesmo facto der origem a uma pluralidade de infrações e de processos da competência de entidades diferentes, as sanções já cumpridas ou executadas em algum desses processos podem ser tidas em conta na decisão de processos ulteriores para efeitos de determinação das respectivas sanções, incluindo o desconto da sanção já cumprida e executada, se a natureza das sanções aplicadas for idêntica.
Relativamente ao requisito da identidade do bem jurídico também não acompanhamos a discordância do recorrente, porquanto se nos afigura que, embora o objectivo último do RGICSF e do CdVM seja a proteção da estabilidade do sistema financeiro, ou o princípio da confiança no mercado financeiro (nas instituições financeiras), os dois diplomas legais consagram a proteção de bens jurídicos complementares, não idênticos, que embora persigam aquele fim último, tutelam bens jurídicos específicos, com destinatários dos deveres de conduta diferenciados (embora possam coexistir em determinados casos).
Haverá, sim, uma situação de convergência de normas sancionadoras de natureza diversa, consagradas em regimes jurídicos diferentes, que consagram a tutela de bens jurídicos complementares, mas não exactamente coincidentes.
E, porque assim é, o legislador nacional teve o cuidado de prever a hipótese de um mesmo facto (ou factos substancialmente idênticos) poderem constituir simultaneamente crime e contraordenação, sendo nesse caso responsabilizado por ambas as infrações, instaurando-se processos distintos a decidir pelas autoridades competentes e, dando origem a uma pluralidade de infrações e de processos da competência de entidades diferentes (diferentes procedimentos contraordenacionais, como é o caso, da competência de autoridades administrativas diferentes- BP e CMVM), as sanções já cumpridas ou executadas em algum desses processos poderem ser tidas em conta na decisão de processos ulteriores para efeitos de determinação das respectivas sanções, incluindo o desconto da sanção já cumprida e executada, se a natureza das sanções for a mesma ( art. 420º do CdVM).
Este normativo mais não é do que concretização da restrição do princípio do ne bis in idem admitida expressamente pelo TJUE nos acórdãos acima mencionados, admitindo-se que o mesmo facto (ou factos substancialmente idênticos) possa dar origem a dois procedimentos contraordenacionais, que o mesmo arguido seja punido em simultâneo por duas infrações, em face da relevância dos interesses juridicamente protegidos por mais do que um regime sancionatório- a proteção da integridade dos mercados financeiros da União.
Essa possibilidade foi admitida como válida também pelo Tribunal Constitucional, como se pode ler do Ac TC nº 298/2021, o qual aflorou mesmo o caso previsto no referido art. 420º do CdVM, não se concluindo por qualquer inconstitucionalidade decorrente da punição do concurso de infrações por aplicação do referido preceito legal.
Com maior acuidade se poderia colocar a violação do princípio ne bis in idem relativamente às infrações pelas quais o recorrente tinha já sido condenado no Proc nº 58/... respeitantes ao conflito de interesses na colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., dada a aparente identidade dos factos ou identidade dos bens jurídicos.
Porém, como acima deixamos exposto, nem há identidade dos factos relevantes, nem há identidade dos bens jurídicos tutelados, como veremos.
 Focando-nos na questão da identidade dos bens jurídicos, secunda-se a bem fundamentada argumentação sufragada na sentença recorrida, citando-se o seguinte segmento:
(…)Como bem atenta a CMVM, em sede de alegações escritas, as condutas dos Recorrentes AA e BB que constituem o objecto do presente processo de contra-ordenação consistem em contributos causais daqueles Arguidos, em síntese, (i) para que o B... não se organizasse de modo a identificar uma situação de conflito de interesses e bem assim que não evitasse ou reduzisse ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, (ii) para que o B..., face ao conflito de interesses existente, não agisse de forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo, (iii) para que o B... não actuasse no exclusivo interesse dos seus clientes, bem como (iv) para a prestação de informação sem qualidade, pelo B..., aos investidores.
Estão em causa factos que não são objecto do processo de contra-ordenação do Banco de Portugal, desde logo porque não são objecto de tutela contra-ordenacional no âmbito do sector bancário, sendo que a distinção dos factos em apreço é confirmada, aliás, pela diversidade dos interesses jurídicos afectados pelas condutas que estão em causa num e noutro processo.
O artigo 309.º, n.ºs 1 a 3 do CdVM consagra deveres de conduta do intermediário financeiro em matéria de gestão do conflito de interesses que visam a transparência e a integridade do mercado, tentando evitar problemas sistémicos que podem advir de uma falta de confiança nos intermediários.
Por seu turno e ao contrário, o artigo 86.º do RGICSF prevê que “os membros do órgão de administração, diretores, e outros empregados, os consultores e os mandatários das instituições de crédito não podem intervir na apreciação e decisão de operações em que sejam direta ou indiretamente interessados os próprios, seus cônjuges, ou pessoas com quem vivam em união de facto, parentes ou afins em 1.º grau, ou sociedades ou outros entes coletivos que uns ou outros direta ou indiretamente dominem”.
Trata-se de uma norma que pretende evitar conflitos de interesses, mas que visa proteger, em primeira instância, a própria instituição de crédito face aos interesses dos membros do órgão de administração, directores, e outros empregados, consultores e mandatários. Está em causa uma norma evidentemente de cariz prudencial.
Por sua vez, o artigo 7.º do CdVM tutela a qualidade da informação divulgada no mercado de valores mobiliários. Já o artigo 211.º, alínea l), do RGICSF (na redacção vigente à data da prática dos factos), relativo à gestão ruinosa, visa a protecção da solvabilidade das instituições bancárias e da estabilidade do sistema financeiro.
Como muito bem defende a CMVM, em alegações escritas, “existem, por isso, não apenas factos diversos como interesses jurídicos diversos que podem ser autonomamente violados: desde logo, as normas em causa nos presentes autos, são normas que visam orientar a conduta do intermediário financeiro no exercício da sua atividade e na relação com os seus clientes (tendo um cariz comportamental), ao passo que as normas em causa no processo do Banco de Portugal visam assegurar a solvabilidade e solidez financeira da instituição (tendo um cariz prudencial). Não é por acaso que são infrações consagradas em ramos do Direito diversos, em normas diversas, aplicadas por entidades diversas, protegendo diversos sectores da vida e da regulação e consequentemente diversas redes de valores e de bens jurídicos.”
“Os interesses jurídicos protegidos pelo dever de informação, previsto no artigo 7.º do CdVM, e pelo ilícito gestão ruinosa, consagrada no 211.º, alínea l), do RGICSF (na redação vigente à data da prática dos factos), são bem distintos.
“Do mesmo modo, os interesses jurídicos protegidos pelo regime do conflito de interesses previsto no artigo 309.º, n.os 1 a 3 do CdVM e pelo regime previsto no artigo 86.º do RGICSF, são distintos. O artigo 309.º, nº 1 a 3 do CdVM estipula deveres ao intermediário financeiros que têm por objetivo evitar o conflito de interesses, ou no caso de este existir, deveres de gestão e de atuação, protegendo os próprios clientes do intermediário financeiro. Já o artigo 86.º do RGICSF proíbe a intervenção dos membros do órgão de administração, diretores, e outros empregados, os consultores e os mandatários das instituições de crédito na apreciação e decisão de operações em que sejam direta ou indiretamente interessados os próprios, seus cônjuges, ou pessoas com quem vivam em união de facto, parentes ou afins em 1.º grau, ou sociedades ou outros entes coletivos que uns ou outros direta ou indiretamente dominem, protegendo a própria instituição de crédito.
(…)Em suma, importa epilogar no sentido de que o princípio ne bis in idem não se mostra violado no vertente processo, dada a autonomia normativa existente entre os regimes sancionatórios suscitados e a diferença dos interesses jurídicos tutelados pelos mesmos regimes sancionatórios. Por outro lado, os factos (numa visão normativa) que são julgados nestes autos não são os mesmos, já que o seu sancionamento realiza e protege interesses jurídicos distintos. Por seu turno, o n.º 5 do artigo 29.º da CRP não proíbe a dupla valoração de factos, ou seja, a derivação de efeitos e consequências jurídicas distintas em diversas ordens do sistema jurídico, quando os mesmos apresentem um desvalor autónomo e distinto.
Na verdade, entre os três processos existe uma relação material e temporal suficientemente estreita, onde as finalidades de um completam o do outro, numa relação de complementaridade entre os diversos aspectos da conduta lesiva para a sociedade, atenta a dualidade prática e jurídica dos três processos em evidência.
Reforçamos que estamos perante três processos, dois de contra-ordenação da competência de entidades distintas com competências sectoriais autónomas e outro de natureza estritamente criminal, nenhum acabando por esgotar nem a matéria de facto nem as infracções referentes à emissão de Papel Comercial da EI..., S.A e da R..., S.A nos períodos em causa nos autos. “
Relativamente às infrações respeitantes à violação dos deveres de informação é por demais evidente a inexistência de violação daquele princípio, não existindo igual desvalor jurídico na violação da infração do conflito de interesses prevista no art. 86º do RGICSF e na do art. 309º do CdVM, sendo igualmente distintos os bens jurídicos tutelados, não havendo consunção entre as infrações em causa.
Pode haver conflito de interesses na tomada de decisões de administradores da instituição financeira, susceptíveis de pôr em risco a liquidez e solvabilidade da própria instituição, de molde a afectar a confiança e estabilidade do sistema financeiro, sem que simultaneamente haja violação de deveres de informação enquanto intermediário financeiro.
A decisão de colocação de papel comercial da EI..., S.A em clientes do B..., tomada pelos administradores em situação de conflito de interesses, é independente da violação dos deveres de informação, pois que, aquela não implica a inobservância de uma organização por forma a identificar e a evitar o risco de ocorrência desses conflitos de interesses, sem ser assegurado aos clientes do B... um tratamento transparente e equitativo, e sem ser dado prevalência aos interesses dos clientes do B..., perante os interesses do próprio recorrente e os interesses das sociedades do grupo de que era administrador ou acionista.
Na actuação do recorrente, ainda que dentro do contexto comum da colocação do papel comercial da EI..., S.A em clientes do B...- existe simultaneidade de violação daquelas normas contraordenacionais- normas de conduta- não se estando perante um concurso aparente ou consumção, persistindo desvalores jurídicos diferenciados.
O tipo legal das infrações pelas quais o aqui recorrente foi condenado no Proc. Nº 58/..., punidas pelo art. 86º do RGICSF não esgotam o desvalor jurídico do comportamento do recorrente, existindo um desvalor acrescido e suficientemente autónomo punido pelos arts. 309º e 7º do CdVM.
Salienta-se, também, que as contraordenações pelas quais o aqui recorrente foi condenado, por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, não foram objecto de julgamento e condenação no procedimento nº 58/....
Quanto ao processo crime nº 324/14...., estando na fase da instrução, não existindo qualquer condenação, e desconhecendo-se por que crimes irá o aqui recorrente a julgamento ou qual o desfecho do mesmo, não se colocará, nos presentes autos, a violação do ne bis in idem, que exige o carácter definitivo de uma das decisões.
Também não é aplicável o art. 79º do RGCO porquanto, como vimos, não há identidade do facto juridicamente relevante já julgado no procedimento contraordenacional nº 58/... e o facto em julgamento nos presentes autos.
De todo o modo, conforme já acima se fez alusão, o art. 420º do CdVM prevê a possibilidade de punição cumulativa pelo crime e pela contraordenação, se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, a decidir por cada uma das autoridades competentes, regime especial que afasta a regra geral prevista no art. 20º do RCGO, até porque não se está perante caso de concurso aparente ou consunção como sustenta o recorrente.
A aplicação do referido preceito legal arreda igualmente a aplicação da regra geral prevista no art. 38º do RGCO, inexistindo a nulidade por incompetência da CMVM suscitada pelo recorrente, bem como qualquer fundamento legal para a remessa dos autos ao Tribunal Central de Instrução Criminal, o qual já tramita o processo crime acima identificado, para o qual tem exclusiva competência, devendo as contraordenações aqui em causa permanecer na esfera de competência deste Tribunal por a competência para a decisão administrativa sob recurso estar legalmente atribuída à CMVM ( art. 408º do CdVM).
Conclui-se, pois, que não existe violação do princípio ne bis in idem, nem incompetência da CMVM para sancionar as contraordenações imputadas ao aqui recorrente, pelo que, nenhuma das interpretações decorrentes dos preceitos legais acima aludidos padece de inconstitucionalidade material por alegada violação do art. 29º nº 5 da CRP.
 Improcede este segmento recursivo.
*
2ª- Do princípio da confiança.
Sob as Conclusões 26 a 51 o Recorrente sustenta que não lhe pode ser imputada a prática de qualquer contraordenação relativa à emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, seja por alegado conflito de interesses na respectiva tomada de decisão e concretização, seja por alegada falta de qualidade da informação para tanto divulgada, alegando em suma que, sempre actuou ao abrigo da repartição de funções estabelecida, tendo em conta a formação, habilitações e experiência de cada membro do Conselho de Administração do B... e da confiança recíproca de e nos seus colegas, de que estes cumpririam com diligência as funções que lhes competiam.
Para tanto, esclareceu que, não lhe cabia, nem nunca coube, a gestão de assuntos financeiros, de contabilidade, tesouraria, estratégia de investimento, política de crédito/financiamento, jurídicos, de compliance, risco, marketing, informação ao mercado, auditoria ou inspecção e afins  nem no B..., nem na EI..., S.A, nem na R..., S.A, porquanto tais matérias estavam acometidas a outras pessoas, nomeadamente aos Arguidos AA, FF, EE e DD e, que quaisquer informações e propostas (maxime deliberativas), incluindo no que respeita aos temas abordados na Sentença (designadamente relativas à emissão e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A), quando eram apresentadas em reunião do Conselho de Administração ou da Comissão Executiva do B... (ou, de resto, do Conselho Superior do G...), vinham preparadas e visadas pelos respectivos departamentos, não procedendo o Recorrente ao controlo e sindicância das opções e decisões tomadas nessa sede, das quais tinha conhecimento quando abordadas nas referidas reuniões, e, nesse âmbito, nos precisos e exactos moldes em que eram apresentadas.
Mais alegou que, confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do G... fossem apresentadas ou tomadas pelo Arguido AA, bem como no modelo de repartição de tarefas instituído, cingindo a sua actuação no dia-a-dia do G... às funções supra descritas, sendo o Arguido AA, líder incontestado do B... (e do G...) há mais de 20 (vinte) anos, o principal responsável pela sua gestão estratégica, financeira e de risco, sendo pessoa a quem todos reconheciam grande competência e capacidade de liderança, com o qual o Recorrente tinha relação pessoal e profissional de grande proximidade.
Conclui que, não tinha, sob a sua responsabilidade, funções relativas à colocação de dívida e/ou à gestão da oferta comercial do Banco, tendo confiado que o processo de comercialização do Papel Comercial não contendia com os interesses dos subscritores, e, bem assim, que as Notas Informativas continham informação com qualidade, tendo actuado ao abrigo do princípio da confiança aqui com plena aplicabilidade, porquanto qualquer imputação subjectiva ao Recorrente só poderá, quando muito, ter lugar a título de negligência (isto porque este princípio quando não exclui, por completo, qualquer imputação objectiva, obsta, pelo menos, a uma imputação dolosa).
E, que em sociedades comerciais tão complexas quanto o B... ou no contexto de um Grupo como o G..., não era possível que cada administrador soubesse, em detalhe e/ou a todo o momento, o que ocorre nas áreas da responsabilidade dos demais administradores, podendo legitimamente esperar que os outros cumprissem as suas funções de modo diligente, respeitando os seus próprios deveres de cuidado.
O aqui recorrente foi condenado, na sentença recorrida, nos seguintes termos:
- a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 50.000,00 (cinquenta mil euros);
- a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
- a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
- a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 100.000,00 (cem mil euros);
-a título doloso, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros);
- a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
- a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
- a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros);
- Operado o cúmulo jurídico das coimas supra referidas, foi condenado na coima única conjunta de € 500.000,00 (quinhentos mil euros);
- Suspensa parcialmente a execução da coima única conjunta cominada de € 500.000,00 (quinhentos mil euros), no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) pelo período de 2 (dois) anos;
- Condenado na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 2 (dois) anos, contabilizados desde o trânsito em julgdo da decisão.
A propósito da participação do recorrente nos factos pelos quais foi condenado, ficou provado o seguinte:
- O Recorrente BB foi Administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva entre Abril de 1992 e 13 de Julho de 2014 ( facto provado 520);
- Na qualidade de membro da Comissão Executiva do B... tinha, para além de outros, os pelouros dos ... e de ... (facto provado 521);
- Foi eleito Administrador do BEl... na assembleia geral de 21 de Março de 2013 para o quadriénio 2013-2016 (facto provado 522);
- O Recorrente BB era, à data da prática dos factos, administrador da EI..., S.A (facto provado 523);
- Era, à data da prática dos factos, membro do Conselho Superior do denominado “G...”(facto provado 524);
- Era, à data da prática dos factos, administrador da Es... (facto provado 525);
- O Recorrente BB participou na reunião do Comité ALCO do B... realizada no início do Verão de 2013 em que foi avançada a possibilidade de ser oferecida aos clientes do B... a oportunidade de subscreverem o papel comercial de sociedades do denominado “G...”, de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B... (facto provado 526);
- Participou nas reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A em que se discutiu a possibilidade de a EI..., S.A emitir papel comercial a colocar junto de clientes do B... de forma a reembolsar o papel comercial colocado até Setembro de 2013 no fundo Elz... (facto provado 527);
- Participou na reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, que aprovou o início da comercialização do papel comercial junto dos clientes do B... (facto provado 528);
- Participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 2 de Outubro de 2013, na qual foi ratificada a acta da reunião do Comité ALCO de 4 de Setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião (facto provado 529);
- Participou nas reuniões do Comité ALCO subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B... (facto provado 530);
- BB participou nas reuniões do Comité Private subsequentes a 4 de Setembro de 2013, nas quais foi prestada informação sobre os montantes de papel comercial da EI..., S.A colocados em clientes do B... (facto provado 531);
- O Recorrente BB, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, aprovou as contas individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012 (facto provado 532);
- O Recorrente BB, na qualidade de Administrador do B... com os pelouros dos ... e de ..., acompanhou o processo de comercialização do papel comercial da EI..., S.A junto dos clientes de tais Departamentos do B... (facto provado 533);
- Participou na reunião da Comissão Executiva do B..., realizada a 4 de Dezembro de 2013, que deliberou a suspensão da colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A (facto provado 534);
- Participou em algumas das reuniões de preparação da proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações (facto provado 535);
- Participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A (facto provado 536);
- Não adoptou, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas (com excepção da sua participação na reunião da Comissão Executiva do B..., de 4 de Dezembro de 2013)(facto provado 537);
- O Recorrente BB agiu consciente e voluntariamente na prática dos factos descritos (facto provado 538);
- Com efeito, o Recorrente BB (facto provado 539):
i. Conhecia os factos supra descritos, porquanto se trata de factos próprios, em que participou;
ii. Sabia que o B... comercializou, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, disponibilizando aos seus clientes as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A;
iii. Sabia que o B... comercializou, entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A, disponibilizando aos seus clientes Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A;
iv. Sabia que era administrador da EI..., S.A e participou na decisão do B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
v. Sabia que a EI..., S.A era a acionista única da R..., S.A;
vi. Sabia que o B... tinha interesse em colocar junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
vii. Sabia que a Epi..., S.A, enquanto sociedade gestora do fundo Elz..., tinha interesse que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
viii. Sabia que a EI..., S.A e a R..., S.A tinham interesse em que o B... colocasse junto dos seus clientes o papel comercial por elas emitido;
ix. Sabia que os clientes do B... que subscreveram o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A tinham interesse em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A e da R..., S.A;
x. Quis participar na decisão de o B... colocar papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A;
xi. Quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas;
- Ao participar na tomada de decisão emanada do Conselho Superior do G..., de 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente BB previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade (facto provado 540);
- Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B..., na tomada de decisão de continuação da comercialização de papel comercial a emitir pela R..., S.A, não se organizasse de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e da R..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os interesses dos administradores do B... AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade (facto provado 541);
- Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B... não assegurasse aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade (facto provado 542);
- Ao praticar os factos que se deram como provados por referência à R..., S.A e deles tendo conhecimento, previu como possível que o B..., na colocação do papel comercial emitido pela R..., S.A, desse prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses da Epi..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de alguns membros do conselho de administração do B... (o Recorrente CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os Recorrentes AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade (facto provado 543);
- O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B... estar a colocar papel comercial da EI..., S.A junto dos seus clientes, prestando aos seus clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013 informação que não revelava a situação patrimonial, económica e financeira da EI..., S.A à data da emissão do papel comercial, nos exactos termos em que esta foi prestada, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação (facto provado 543.A);
- O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir pela EI..., S.A e pela R..., S.A, não se ter organizado de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A e os interesses dos demais clientes do B... e (d) os seus próprios interesses e dos administradores do B... AA, CC, PPP, QQQ e HHH, e os interesses dos clientes do B..., não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação (facto provado 543.B);
- O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B... não estar a assegurar aos seus clientes, na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, um diálogo e um trato transparente e recto, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação (facto provado 543.C);
- O Recorrente BB ao não ter conhecimento sobre o facto do B..., na colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, ter dado prevalência aos seus próprios interesses, bem como os interesses do B..., da Epi..., S.A, da EI..., S.A, da R..., S.A e aos interesses de outros membros do conselho de administração do B... (o arguido CC, igualmente administrador da EI..., S.A e da R..., S.A, e os arguidos AA, BB, PPP, QQQ e HHH, igualmente administradores da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A) face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial, não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação (facto provado 543.D).
Acontece que, com relevância para a decisão da causa, outros factos foram dados como provados, que melhor circunstanciam a prática dos factos subjacentes ás infrações em causa, tais como:
- O Recorrente era, à data da prática dos factos, membro do Conselho de Administração da Epi..., S.A ( facto provado 18);
- O Conselho Superior do G... decidiu, em 7 de Janeiro de 2014, estando presentes, designadamente, os Recorrentes AA, BB, CC e DD, a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A (facto provado 369);
- O Conselho Superior do G... era constituído por representantes dos cinco acionistas de controlo do G..., sendo um órgão para-societário, onde eram tomadas decisões sobre os negócios estratégicos para o grupo pelos seus principais accionistas, que se assumia como um centro decisório desse grupo, sendo-lhe reconhecido poder para, de facto, determinar que as sociedades integradas no grupo agissem de acordo com as decisões que tomava (facto provado 370);
- Os Recorrentes AA, BB e CC e também QQQ e HHH, administradores do B... e da EI..., S.A, tinham interesse em captar para a EI..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G... (facto provado 401);
- Os Recorrentes AA e BB e também QQQ e HHH, administradores do B... e da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A, tinham interesse em captar para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da R..., S.A e de todo o denominado “G...”(facto provado  413);
- Com efeito, o B... decidiu, através dos Recorrentes AA, BB, CC, administradores comuns ao B... e à EI..., S.A, que a EI..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...( facto provado 622);
- Com efeito, o B... decidiu, através (i) do Recorrente CC (administrador do B... e da R..., S.A) e (ii) dos Recorrentes AA e BB (administradores do B... e da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) que a R..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B... (facto provado 635);
- O B...  sabia que AA, BB, CC, PPP, QQQ e HHH eram administradores da EI..., S.A (facto provado 639);
- O B... quis decidir, através de AA, BB e CC, administradores comuns ao B... e à EI..., S.A, que a EI..., S.A deveria proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B... (facto provado 639);
- As valências e funções mais desempenhadas, na prática, pelo Recorrente BB dentro do B... tinham que ver, principalmente, com a angariação e manutenção de clientes (private) e, em certa medida, também, com a representação externa do Banco, actuando quase como um “relações públicas” daquele (facto provado 782);
- Entre os seus pares era e é visto como uma pessoa que confia e é de confiança, que exerceu as suas funções com sentido de responsabilidade e rectidão, procurando respeitar os interesses dos clientes, investidores, colaboradores e demais stakeholders e honrando o nome da sua família, mas não sendo considerado um profissional tecnicamente muito dotado (facto provado 783);
- O Recorrente confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do denominado “G...” fossem apresentadas ou tomadas por AA e confiava no modelo de repartição de tarefas instituído, cingindo a sua actuação no dia a dia do denominado “G...” às funções descritas no primeiro ponto deste grupo de factos( facto provado786).
Relativamente à prática das infrações respeitantes à comercialização do papel comercial da EI..., S.A o recorrente foi condenado a título de negligência e, relativamente às infrações respeitantes à comercialização do papel comercial da R..., S.A o recorrente foi condenado a título de dolo eventual.
No caso da comercialização do papel comercial da R..., S.A não ficou provado que o Recorrente se tenha limitado a omitir um dever objectivo de cuidado que era capaz de representar no circunstancialismo concreto (negligência), traduzindo-se antes a sua conduta num conhecimento da proibição e conformação com a possível realização do facto ilícito (dolo eventual).
Esta distinção quanto ao elemento subjectivo do tipo de ilícito tem relevância para efeitos da aferição da aplicabilidade do princípio da confiança invocado pelo recorrente, porquanto o mesmo não se coaduna com uma actuação a título de dolo, como de resto foi dito na sentença recorrida, uma vez que confiar que os outros cumprirão os seus próprios deveres de cuidado é incompatível com a conformação com a possibilidade da realização do facto ilícito como consequência da conduta, caracterizadora do dolo eventual.
Não obstante, sempre se dirá que o princípio da confiança, tal como se fez menção na sentença recorrida e que aqui se secunda, perante os factos dados como provados, não viabiliza a pretendida desresponsabilização do aqui recorrente, mesmo relativamente às infrações que lhe foram imputadas e pelas quais foi condenado a título de negligência.
Pelo contrário, entra em colisão com a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, não estando invocado pelo recorrente qualquer vício da sentença que pudesse implicar alguma modificação factual e, o Tribunal não vislumbra do texto da sentença qualquer evidência da ocorrência de qualquer um dos vícios mencionados no art. 410º nº 2 do CPP de que cumpra conhecer oficiosamente.
Vejamos o que se diz, assertivamente, sobre esta questão, na sentença recorrida:
“Este princípio, de acordo com a esmagadora maioria da doutrina e jurisprudência, traduz-se na possibilidade dos agentes confiarem na actuação correcta, cuidadosa e conforme o dever de cuidado dos restantes nas diversas relações sociais em que participam.
De acordo com o princípio da confiança, não se responde de forma geral pela falta de cuidado alheio, sendo legitimo “confiar que os outros com funções e responsabilidades específicas no aspecto ou tarefa concreta geradora de risco - cumprirão os seus deveres de cuidado, isto é, o princípio da confiança exclui a imputação objectiva do resultado produzido por quem actuou ao abrigo daquela confiança, apenas respondendo quando existam circunstâncias particulares que devam levar a uma perda da confiança no cumprimento do dever alheio” [vide Bernardo Feijoo Sánchez, in Autoria e participação em organizações empresariais complexas”, Direito Penal Económico e Financeiro. Coimbra Editora, pág.148].
Este princípio comporta excepções. Na verdade, o mesmo não tem aplicação quando os sujeitos tenham razões fundadas e concretas que permitam julgar, ou que devam fazer julgar, que os outros irão actuar de forma incauta.
Assim, o princípio da confiança cessa, como refere Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral. Coimbra Editora, 2004. pág. 649:
“- se os erros forem previsíveis ou vierem a ser efectivamente cometidos, eles devem ser impedidos ou corrigidos pelos colegas e, nomeadamente, pelo chefe da equipa;
“- face ao conhecimento ou à previsão de erros notórios de outros membros da equipa, que exigem correcção, bem assim, perante membros da equipa que se encontrem ainda em fase de aprendizagem ou de treino — relativamente aos quais, por isso, se não pode falar de uma negligência (anterior) na assunção ou aceitação — e sobre os quais deve justamente exercer-se, por parte dos restantes membros da equipa ou de algum ou alguns deles, uma particular atividade de fiscalização, de controlo e supervisão”.
A razão de ser deste princípio tem sido analisado pela doutrina, existindo autores, como Jakobs e Roxin, que defendem que o princípio assenta no princípio do risco permitido, ou como Figueiredo Dias e Stratenwerth, que consideram que assenta no princípio da auto-responsabilidade ou como Faria Costa que entende o princípio como expressão de uma "actualização" da relação de cuidado-de-perigo.
Na senda de Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2007, pág. 262, na qualidade de seres responsáveis, devemos poder contar que os outros também o são e desta forma confiar na sua actuação cuidadosa e correcta, pois, em princípio, ninguém responde pela “falta de cuidado alheio”.
Como já verificámos, umas das áreas mais significativas de intervenção do princípio da confiança é nas áreas onde existe uma reforçada divisão de trabalho, no seio de equipas constituídas, como sucede nas grandes empresas. Essa divisão de trabalho poderá assumir uma característica de horizontalidade ou de verticalidade, em função da posição de paridade que assume cada membro na estrutura organizacional.
Sendo uma divisão horizontal, cada um dos agentes deve ocupar-se das suas tarefas e competências.
Já na divisão vertical, existe uma relação de supra e infra ordenação, ou seja, existe uma hierarquia, em que o superior hierárquico assume uma posição inerente de liderança e de gestão da equipa.
Neste tipo de divisão de tarefas, a aplicação do princípio da confiança apresenta-se de aplicação mais limitada, na medida em que o superior hierárquico tem o dever de dar ordens e de controlar o seu cumprimento.
Com efeito, impende sobre os superiores hierárquicos deveres de vigilância, supervisão e controlo, cuja intensidade poderá variar de acordo com vários critérios que casuisticamente sejam apurados, devendo os motivos de desconfiança ser sólidos e objectivos.
Adrede, consideramos que se os superiores hierárquicos estivessem de estar a vigiar permanentemente a actuação dos subordinados, provavelmente ocorreriam menos situações de violação de deveres de forma negligente, mas também se realizariam muito menos tarefas e ocorreria uma indesejada paralisação da estrutura organizacional onde se inserissem os membros da hierarquia, correndo-se o risco de se esvaziar de conteúdo a distribuição de tarefas, impondo um dever de vigilância permanente da actividade dos quadros e colaboradores.
Como refere Raquel Lourenço Vieito, na sua Dissertação de Mestrado Forense Sob a Orientação do Senhor Professor Germano Marques da Silva, “A (IR)RESPONSABILIDADE PENAL DOS GESTORES PELA PARTICIPAÇÃO EM ÓRGÃOS COLEGIAIS”, UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA – FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA, Maio de 2016 ( ), “neste sentido, cremos que o princípio da confiança assume especial relevância nesta sede pois permite explicar a delimitação da responsabilidade individual de cada gestor quanto ao seu próprio âmbito de competência e constitui, por conseguinte, um limite à imputação da responsabilidade dos gestores por negligência devido à estrutura empresarial e à divisão de tarefas e, consequentemente, de competências, que, para além de comum é essencial para o normal funcionamento societário e relacionamento da equipa de trabalho. Este princípio encontra-se em estreita conexão com a delimitação da organização e responsabilidade de cada um dos gestores, pois depende do papel que cada gestor desempenha no seio do órgão de administração. (…) Ainda que se assuma que todos os gestores desempenham a mesma função é frequente que a decisão de cada um seja influenciada pela informação proporcionada por outro membro especialista no assunto. Seria insustentável que, aquando a adoção de uma determinada deliberação, cada membro tivesse que constatar da veracidade das informações fornecidas pelos membros competentes nessa matéria para poder decidir o seu voto. Enquanto limite objetivo à imputação da responsabilidade por negligência, esta “autorização a confiar” (…) em que os outros cumprirão os seus deveres de cuidado, implica que seja responsável o administrador que proporcionou a informação e que está encarregue do âmbito sobre o qual se adotou a decisão ilícita.
“ANA CÉPEDA, PAREDES CASTAÑON e RODRÍGUEZ MONTAÑEZ (…) vão mais longe ao defenderem que o gestor verá a sua responsabilidade excluída quando o dano surja fora do seu âmbito de controlo e vigilância, não recaindo sobre este o dever de impedir a produção do resultado ilícito. Segundo esta construção doutrinária, os gestores não assumem uma posição de garante específica sobre o âmbito de responsabilidade de outros membros, independentemente, portanto, do conhecimento prévio da autenticidade das informações prestadas.
“Esta conceção conduz a soluções inadmissíveis e contrárias aos deveres que vinculam os gestores. Se, por um lado, não se pode estender os deveres de cuidado exigidos ao gestor à suspeita da credibilidade das informações prestadas pelos restantes membros da sua equipa, uma vez que é legitimo que cada gestor possa confiar que os outros atuem diligentemente, não se pode descorar, sem mais, as situações em que existam indícios concretos que o façam pensar o contrário (…) ou ainda quando o gestor tenha conhecimento prévio que as informações prestadas por quem de competência são falsas e/ou visam precisamente que se adote uma decisão ilícita.(…) Neste caso, cremos que será responsável, atendendo precisamente aos deveres de vigilância e controlo supra tratados (…), o gestor que, embora tenha efetivo conhecimento do que se visa com a deliberação, nada faça para acautelar a produção do evento ilícito.
“Todavia, cremos que a afirmação do princípio da confiança não é per se suficiente para se excluir a responsabilidade penal: Esta questão terá de ser resolvida com base na figura do erro. Nos termos do número 1 do artigo 17.º do Código Penal “Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável”.
Aquele que votou a favor de uma decisão ilícita sem ter previamente conhecimento acerca da sua ilicitude e/ou por ter confiado nas informações prestadas nas condições referidas, não poderá ser responsável pelas consequências que daí resultem se, naturalmente, o fato de se encontrar em estado de erro não lhe for censurável. Por conseguinte, acompanhando os ensinamentos de MEINI MENDÉZ (…), um determinado sujeito encontrar-se-á em estado de erro censurável ou não em função das possibilidades que tenha tido ex ante para se precaver, sendo que, o princípio da confiança poderá auxiliar o reforço desse mesmo estado.”
Nos casos em que é invocado o princípio da confiança, importa assim apurar se os agentes confiavam no cumprimento dos deveres adstritos a outros agentes na estrutura organizacional e, em caso positivo, até onde lhes era permitido ou legitimo confiar.
Ora, de tudo quanto se expôs, temos forçosamente de concluir que o princípio da confiança apenas se poderá aplicar nas situações de negligência, porque existindo uma actuação dolosa do agente, valem as regras de imputação da conduta a esse agente.
Ora, tendo em vista os factos provados relativamente aos Recorrentes que invocaram o princípio da confiança (…) BB (…), verificamos que as condutas do Recorrente (…) BB (…) quanto à situação da R..., S.A também foi igualmente cometida a titulo de dolo (eventual), pelo que se mostra afastada a aplicação do princípio em causa.
Quanto à situação da EI..., S.A, por referência ao Recorrente BB (…) a mesma foi cometida a título de omissão, por negligência, tendo ficado provado que ambos confiavam nas decisões que fossem tomadas por AA.
Sucede, porém, que, como já analisámos supra, o n.º 4 do artigo 401.º do CdVM pune condutas omissivas, dispensando sequer o conhecimento da prática da infracção, apelando aos deveres de garante que impendem sobre as pessoas que ocupam cargos dentro de uma organização empresarial que têm o dever de zelar pela legalidade da actuação do ente colectivo.
Neste sentido, como verificámos, os Recorrentes BB (…) não cuidaram de cumprir com o dever de garante, podendo fazê-lo, actuando sem os cuidados que eram exigidos e de que eram capazes, pelo que consideramos que apesar da confiança que depositaram no administrador da EI..., S.A, AA, certo é que com ele estavam numa relação paritária, em termos hierárquicos. Existindo essa relação paralela em termos de administração da EI..., S.A, o princípio da confiança não demite os Recorrentes de actuaram como administradores diligentes e acompanharem a gestão que é feita da sociedade em causa e de que também eram administradores. No fundo, sendo as tarefas dos três administrar a EI..., S.A, a demissão fáctica de administrar diligentemente por parte dos Recorrentes, como os próprios assumem, sem que tenham renunciado a tal cargo, não pode ser justificada com o princípio da confiança, para efeito de apagar a responsabilidade contra-ordenacional, nos moldes já analisámos supra.”
Efectivamente, afigura-se-nos que não pode um Administrador Executivo do B..., Administrador da EI..., S.A, Administrador do BEl..., membro do Conselho Superior do G..., Administrador da Es..., Administrador da Epi..., S.A (só para falar nas sociedades do G... directamente envolvidas nos factos subjacentes às infrações que lhe foram imputadas) afastar a sua responsabilidade alegando de forma cândida que, sempre actuou ao abrigo da repartição de funções estabelecida, tendo em conta a formação, habilitações e experiência de cada membro do Conselho de Administração do B... e da confiança recíproca de e nos seus colegas, de que estes cumpririam com diligência as funções que lhes competiam, quando não consta da matéria provada que as decisões em que participou não fizessem também parte das suas funções ou estivessem nas competências específicas e atribuídas em exclusivo a qualquer um dos outros Administradores executivos do B..., sendo o Conselho Executivo um orgão colegial, estando todos os Administradores em posição paritária e não estando apurada a estanque divisão de funções entre cada um deles.
Por alguma razão a Diretiva 2013/36/EU, transposta para o nosso ordenamento interno pelo DL nº 157/2014 de 24/10 alterou o RGICSF quanto à composição e funcionamento do órgão de administração das instituições de crédito, por forma a que cumpra efectivamente os seus papéis de liderança e fiscalização, sendo que o “caso B...” colocou em destaque o problema do governo daquelas instituições, evidenciando que os conselhos de administração não exerceram o devido controlo e vigilância sobre a sociedade, como nos dá conta José Ferreira Gomes, em Estudos Dispersos, Vol 3, Direito Mobiliário e Bancário.
“Independentemente da complexidade que possa assumir a estrutura organizatória da sociedade, o conselho é sempre o primeiro responsável pela sua actividade empresarial, devendo promover o interesse social não só na sua intervenção direta, mas também através do controlo exercido sobre a actuação dos diferentes níveis dessa estrutura.  Nessa medida, o facto de a prática de um ato ter sido confiada a um dos administradores ou a um qualquer colaborador da sociedade não isenta os demais administradores do cumprimento dos seus deveres para com a sociedade. Nas palavras de FERRI
« a lei não quer administradores inertes que se limitam a estar presentes nas reuniões do conselho, indifirentes aos interesses da sociedade e sem consciência da responsabilidade que assumiram ao aceitar o seu cargo»
(…)O conselho de administração é, portanto, o primeiro fiscalizador da atividade da empresa.”
De todo o modo, só pode invocar o princípio da confiança, quem, ele próprio, actua com diligência nas funções que lhe estão atribuídas, não bastando exigir isso dos outros.
Ora, o aqui recorrente acumulou inúmeros cargos de topo em instituições financeiras e de investimento do mesmo grupo, aí tomou decisões que interferiam inevitavelmente com poupanças e recursos de terceiros que confiavam, esses sim, na competência, diligência e lealdade de gestores competentes, na necessária formação e sentido de cuidado com os interesses dos outros, que não se regulassem por interesses próprios ou das sociedades que representavam em detrimento dos clientes, o que não aconteceu, não tendo o recorrente actuado com o cuidado que lhe era exigível.
“Segundo tal princípio, pois, quem se comporta no tráfico de acordo com a norma de cuidado deve poder confiar que o mesmo sucederá com os outros” , não fazendo sentido que, quem não se comporta com o cuidado devido, possa arredar a sua responsabilidade alegando pura e simplesmente que confiava que os outros o fizessem.
Isso mesmo se pode ler na obra de Sónia Fidalgo, Princípio da Confiança e Crimes Negligentes, que claramente refere que “ (…) a jurisprudência e a doutrina têm considerado que um limite de validade do princípio da confiança radica, desde logo, na ideia de que só pode confiar o sujeito que se comporta de acordo com a norma de cuidado- quem se comporta em violação do cuidado não pode invocar o princípio da confiança.
(…) somente o sujeito que actua de acordo com o direito pode confiar em igual lealdade por parte dos outros intervenientes.
Desde logo, subjacente a tal entendimento está a ideia de que a expectativa da actuação dos outros de acordo com o cuidado que lhes é exigível não permite a cada um actuar contra o dever de cuidado que sobre si impende.
(…) o princípio da confiança delimita o dever de cuidado, mas não dispensa cada um do seu cumprimento.
(…) aquele que se comporta de modo contrário ao dever não pode pretender excluir a sua responsabilidade invocando a confiança em que outros, através de um cuidado acrescido, compensarão os perigos por ele criados.”
Ao recorrente não cabia apenas e só, como sustenta, “a angariação e manutenção de clientes e a representação externa do Banco, actuando quase como um relações públicas  daquele”, para isso não seria necessário, seguramente, ser Administrador Executivo do B..., ou sequer administrador de qualquer uma daquelas sociedades do grupo, designadamente do ramo financeiro, porém, mesmo que, na prática, fossem essas as valências e funções mais desempenhadas pelo recorrente (facto provado 782), não podia ignorar que não eram essas apenas e só as funções que por lei lhe estão acometidas, pelo que, delas se demitindo, incorreu ele próprio numa falta de zelo e cuidado merecedora de censura social.
Convém, inclusive, realçar que as operações levadas a cabo pelo B... com a comercialização do papel comercial quer da EI..., S.A, quer da R..., S.A visavam precisamente manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B... ( assunto que cabia precisamente nas funções que o recorrente, na prática, mais realizaria), estando provado que, o Recorrente BB, entre outros administradores do B... e da EI..., S.A, accionista única da R..., S.A, tinha interesse em captar para a R..., S.A e para a EI..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da R..., S.A e da EI..., S.A e de todo o denominado “G...”(factos provados 401 e  413) e, que o B... decidiu, através do Recorrente BB, entre outros administradores comuns ao B... e à EI..., S.A, que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a permitir o reembolso do papel comercial colocado no fundo Elz..., mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B...( factos provados 622 e 635).
Essa interferência de interesses próprios e das sociedades que administrava, com os clientes do B..., era evidente, não podia ser ignorada pelo recorrente, e no entanto o recorrente participou em todas aquelas decisões que criavam o risco premente de conflitos de interesses, omitindo o dever funcional de controlo de actos ilícitos do intermediário financeiro.
Alegou o recorrente que confiava nas linhas estratégicas e decisões que no seio do G... fossem apresentadas ou tomadas pelo Arguido AA, bem como no modelo de repartição de tarefas instituído (facto provado 786), porém, para além de não ter ficado provado qualquer repartição de tarefas, uma coisa é confiar nas estratégias e decisões tomadas pelo arguido AA, outra é não actuar com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar as infrações cometidas (no caso da comercialização do papel comercial da EI..., S.A) ou, prever como posssível uma infração mas ainda assim conformar-se com essa possibilidade (no caso da comercialização do papel comercial da R..., S.A), como se provou ter acontecido.
 Convém ainda salientar que a responsabilidade imputada ao recorrente deriva do art. 401º nº 4 do CdVM segundo o qual os titulares do orgão de administração das pessoas colectivas e entidades equiparadas, bem como os responsáveis pela direcção ou fiscalização de áreas de atividade em que seja praticada uma contraordenação, incorrem na sanção prevista para o autor, especialmente atenuada, quando, conhecendo ou devendo conhecer a prática da infração, não adotem as medidas adequadas para lhe pôr termo imediatamente, estando provado no facto 539 que o recorrente quis não adoptar, durante o período de tempo em que o B... procedeu à comercialização de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A, qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas condições referidas.
Deste modo, mesmo admitindo-se que o recorrente confiasse nas linhas estratégicas e decisões que no seio do G... fossem apresentadas ou tomadas pelo Arguido AA, como se provou, todos os demais factos apurados relativos à sua participação nas referidas decisões e factos praticados pelo B... afastam, no caso concreto, a aplicabilidade do princípio da confiança.
Improcede este segmento recursivo.

3ª- Da alegada violação das regras sobre conflito de interesses.
Sob as Conclusões 52 a 85 o Recorrente sustenta que não pode ser imputada a violação, em simultâneo, dos números 2 e 3 do art. 309º do CdVM, uma vez que os deveres de gestão dos conflitos de interesses neles previstos são um único dever, não tendo o dever de dar prevalência aos interesses do cliente autonomia face ao dever de tratamento transparente e equitativo, porquanto, considerá-los deveres autónomos seria admitir a possibilidade de um intermediário financeiro não dar prevalência ao interesse do cliente, e, ainda assim, estar a tratá-lo equitativamente o que é um evidente contra-senso, pois que a violação do referido número 3 implica, sempre e necessariamente, a violação do referido número 2 e, que ao informar do alegado conflito de interesses (como pugna o Tribunal a quo), sempre o intermediário financeiro já estará a dar prevalência aos interesses dos investidores,  estando-se perante uma única norma tipificadora, e, por isso, uma alegada violação de um só dever, uma única possível infracção.
Sustenta ainda que, a interpretação normativa do artigo 309.º, n.os 2 e 3, do CdVM como normas contra-ordenacionais autónomas isto é, no sentido de que podem consubstanciar duas infracções dissociáveis e cumulativamente imputáveis ao agente é materialmente inconstitucional, por violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 29.º, n.os 1 e 3, da CRP.
Mais alegou que, a Decisão erra, também, ao imputar ao Recorrente duas violações do número 1 do artigo 309.º do CdVM, uma por referência ao papel comercial da EI..., S.A e outra por referência ao Papel Comercial da R..., S.A, porquanto o dever de estabelecer uma organização idónea à identificação, prevenção e redução dos riscos associados à ocorrência de potenciais situações de conflitos de interesses constitui um dever genérico e, a alegada ausência de semelhante organização corresponde a uma única omissão, resultante de uma única alegada conduta ou resolução (omissiva), à luz do respectivo comportamento global espácio e temporalmente determinado, consubstanciando, por isso, uma única alegada violação do correspondente dever (i.e., uma única infracção), sendo que o ilícito contra-ordenacional em causa consuma-se com a falta de implementação, pelo intermediário financeiro, de um sistema de organização apto a diminuir o risco de ocorrência de conflitos de interesses, sistema esse que existia no B....
Conclui que as duas alegadas situações de conflito de interesses objecto do presente processo a emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A  sempre resultariam de um unico alegado defeito organizativo, uma única alegada omissão, uma única resolução, uma mesma decisão/deliberação, e num mesmo fórum, a reunião do Comité ALCO do B... de 4 de Setembro de 2013, independentemente dos bens jurídicos tutelados, ainda que coincidentes.
Em consequência pede que seja absolvido das 2 (duas) contra-ordenações relativas à alegada violação do número 3 do artigo 309.º do CdVM, e, ainda, de 1 (uma) contra-ordenação relativa à alegada violação do número 1 do artigo 309.º do CdVM.
Sem prescindir, sustenta que não lhe pode ser imputada qualquer violação das regras sobre conflitos de interesses, porquanto a ratio subjacente às disposições legais referentes aos conflitos de interesses é a garantia de que não existirá, em determinadas circunstâncias, uma sobreposição dos interesses dos intervenientes decisores com os da instituição financeira e/ou dos seus clientes, sobreposição essa que é aferida não pelas aparências, mas pela substância e, que as meras posições societárias e/ou funções exercidas do/pelo Recorrente não bastam para que se verifique conflito de interesses, quando, no caso concreto, e em termos objectivos, inexistem razões para que o tipo contra-ordenacional esteja preenchido, porquanto não obstante ser administrador do B... (e das demais sociedades referidas a este propósito na Sentença), o Recorrente não tinha qualquer interesse pessoal, mormente concorrente, na colocação, pelo B..., junto dos seus clientes, de dívida da EI..., S.A ou da R..., S.A.
Por último, sustenta que, o Tribunal a quo, à semelhança do que já havia feito a CMVM, confunde e mistura o alegado conflito de interesses com a alegada falta de qualidade da informação, fazendo o primeiro basear-se na segunda, ou seja, sustentando haver conflito de interesses pela circunstância de a informação veiculada aos investidores relativamente às entidades emitentes não ter, alegadamente, qualidade , com o que, de um lado, descaracteriza, por completo, o conflito de interesses, e, do outro, promove uma dupla valoração do(s) mesmo(s) factos, que é proibida.
E, que o B... estava, efectivamente, organizado (e, no caso concreto, organizou-se) por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência, desde logo ao nível da divisão de pelouros e responsabilidades entre o Departamento de Compliance, o Departamento de Risco Global, e o Departamento de Auditoria e Inspecção, a par do Sistema de Controlo Interno e respectiva Unidade de Gestão, sendo que os procedimentos internos concluíram pela inexistência de qualquer conflito de interesses (inexistindo, por isso, também, quaisquer deveres de gestão do mesmo a cumprir).
Alegou ainda que, não lhe pode ser imputada a violação, por nenhuma vez, do disposto no artigo 309.º do CdVM, nem mesmo por força do disposto no artigo 16.º, n.º 1, do RGCO, ou, de resto, no artigo 401.º, n.º 4, do CdVM, valendo no Direito de Mera Ordenação Social um conceito restritivo de autor, considerando o seu carácter sancionatório e sujeição aos princípios da legalidade e tipicidade das infracções e, ainda que assim não fosse, qualquer conceito extensivo de autoria sempre não prescindiria da ideia de titularidade do dever, sobretudo num cenário de estrutura orgânica e divisão de funções e delegação de poderes, pelo que, concretamente no que respeita ao Papel Comercial da R..., S.A, o Recorrente não era o titular ou o destinatário do dever, não tinha o domínio dos factos, não estava na sua disponibilidade realizar ou não as infracções imputadas, nem, tão-pouco, era autor ou titular da informação em causa,  não tendo dado qualquer contributo causal no sentido de acção ou omissão sem a qual não se teria verificado o resultado, muito menos relevante.
Conclui que,  no que especialmente concerne ao Papel Comercial da EI..., S.A, sobre o Recorrente não recaía qualquer dever de evitar o alegado resultado típico, dever esse que não emerge da sua mera pertença aos órgãos sociais das entidades em causa, maxime por referência ao disposto no artigo 305.º-D do CdVM, ou, de resto, no artigo 401.º, n.º 4, do mesmo código, sob pena de se cair numa responsabilização objectiva e acrítica, independentemente da divisão de pelouros, das qualidades e competências de cada administrador, e, bem assim, das circunstâncias específicas da sua individual actuação, sendo que não estava em qualquer posição privilegiada para evitar a situação em causa, porquanto, desde logo, não acompanhava a contabilidade da sociedade, mais confiando em quem efectivamente o fazia, do que e de quem nunca teve quaisquer razões para duvidar, sobre ele não recaindo qualquer dever de garante quanto ao conteúdo e qualidade da informação vertida nas Notas Informativas, maxime da EI..., S.A.
Nesta questão o recorrente mistura uma série de outras questões que se prendem, embora não o diga explicitamente, com o conceito de autoria, comparticipação, relação de concurso entre contraordenações, voltando também a fazer alusão ao principio da confiança, sendo que quanto a esta última alusão se reproduzem as considerações tecidas a propósito da questão decidida anteriormente sob pena de fastidiosa repetição.
Analisemos o art. 309º nº 1, 2 e 3 do CdVM:
1 - O intermediário financeiro deve organizar-se por forma a identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da sua ocorrência.
2 - Em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro deve agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo.
3 - O intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses do cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais ou dos de agente vinculado e dos colaboradores de ambos.
Tal como já referimos a propósito desta questão também suscitada pelo recorrente AA, resulta evidente da análise do referido preceito legal que, embora os nº 2 e 3 do art. 309º pressuponham a pré-existência de um conflito de interesses, isto é a falência do objectivo previsto no nº 1 (cujo risco de conflito visava evitar ou reduzir ao mínimo), nenhum deles esgota o desvalor jurídico do outro, nem se encontram numa posição de hierarquia de desvalores, sendo perfeitamente autónomos, porquanto, constatada a violação do nº 1 pelo intermediário financeiro (violação do dever de se organizar por forma a evitar situações de conflitos de interesses) ele deve assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo (conflito entre clientes) e, deve dar prevalência aos interesses dos clientes em detrimento dos seus próprios interesses, não se esgotando o desvalor jurídico neste último, porquanto ainda que dê prevalência aos interesses dos clientes numa situação de conflito (com a instituição ou titulares dos seus órgãos) pode ou não ter violado os demais e vice-versa.
O intermediário pode até ter uma organização preparada para identificar possíveis conflitos de interesses e actuar de forma a, por regra, evitar ou reduzir ao mínimo o risco de conflitos de interesses ( Compliance) e, ainda assim ocorrer uma situação de conflito de interesses entre ele e os clientes, ou entre cliente entre si e, pode numa situação declarada de conflito de interesses dar prevalência aos interesses do cliente, mas violar o nº 2 do art. 309º não o informando disso mesmo ou dando-lhe um tratamento não equitativo, ou, vice-versa, pode informar sobre um conflito de interesses entre clientes, de forma transparente, mas dar prevalência aos seus próprios interesses e, em qualquer desses casos, se violar os deveres autónomamente consagrados em cada um dos nºs 1, 2 e 3 do art. 309º do CdVM incorre na violação de uma contraordenação por cada um dos deveres violados, por cada uma das resoluções ilícitas assumidas, ainda que todas digam respeito a matéria de violação de conflito de interesses.
Isso mesmo se evidencia do facto do art. 309º do CdVM corresponder à transposição do art. 23º da DMIF II, segundo o qual:
1. Os Estados-Membros exigem às empresas de investimento que tomem todas as medidas adequadas para identificar e para evitar ou gerir quaisquer conflitos de interesses entre elas próprias, incluindo os seus dirigentes, empregados e agentes vinculados ou quaisquer pessoas com elas direta ou indiretamente ligadas através de controlo, e os seus clientes, ou entre os próprios clientes, suscetíveis de surgir no quadro da prestação de quaisquer serviços de investimento e auxiliares, ou de combinações desses serviços, incluindo os causados pela aceitação de incentivos de terceiros ou pela própria remuneração da empresa de investimento e demais estruturas de incentivos.
2. Caso as medidas a nível organizativo ou administrativo, adotadas pela empresa de investimento nos termos do art. 16º nº 3, para evitar que os conflitos de interesses prejudiquem os interesses dos seus clientes, não sejam suficientes para garantir, com um grau de certeza razoável, que serão evitados os riscos de os interesses dos clientes serem prejudicados, a empresa de investimento deve informar claramente o cliente, antes de efectuar uma operação em seu nome, da natureza genérica e/ou das fontes destes conflitos de interesses e das medidas adotadas para mitigar esses riscos.
3. A informação referida no nº 2 tem de :
a) ser efectuada num suporte duradouro;e
b) ser suficientemente detalhada, tendo em conta a natureza do cliente, para permitir que este tome uma decisão informada relativamente ao serviço no âmbito do qual surge o conflito de interesses.
(…)
No caso em apreço não existe qualquer situação de concurso aparente entre as contraordenações previstas no art. 309º do CdVM, podendo uma só conduta preencher vários tipos de infração autonomamente previstos nos nº 1, 2 e 3, não sendo absorvida por um só dos deveres previstos especificamente em cada um desses números e, nesse caso, devem ser todos aplicados, como ocorreu no caso sub judice, mesmo no que toca à colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A, e ao papel comercial emitido pela R..., S.A, existindo plúrimas resoluções típicas e estando autonomizadas as condutas- veja-se a título exemplificativo os factos provados 630 e 631, que demonstarm que o B... não assegurou aos seus clientes um diálogo e um trato transperante e recto e, na colocação do papel comercial deu prevalência aos seus próprios interesses em detrimento dos interesses dos clientes subscritores do papel comercial.
Repare-se que, mesmo relativamente ao incumprimento do nº 1 do art. 309º do CdVM os factos provados 621 e 634 autonomizam a incapacidade do B... para se organizar de forma a evitar as situações de conflito de interesses sem que isso implique uma ausência de sistema de deteção de riscos dentro da organização do B..., sinal de que, mesmo que existisse esse sistema, como ficou demonstardo nos factos provados 656 a 745, esse sistema, pelo menos naquelas duas situações falhou.
A interpretação normativa do artigo 309.º, n.os 2 e 3, do CdVM como normas contra-ordenacionais autónomas isto é, no sentido de que podem consubstanciar duas infracções cumulativamente imputáveis ao agente não enferma de qualquer desconformidade inconstitucional, mormente a apontada violação do princípio da legalidade, consagrado no artigo 29.º, n.os 1 e 3, da CRP, estando perfeitamente tipificadas naquele preceito legal, de forma autónoma, cada uma das infrações de conflito de interesses pelas quais o recorrente foi condenado.
A aplicação de cada um daqueles números do art. 309º do CdVM, no caso concreto, não ficou excluida, pelo contrário, são todos aplicáveis, assim como o é a infração por falta de qualidade da informação, perfeitamente autonomizada da norma relativa ao conflito de interesses.
Tal como entendeu a sentença recorrida, que acompanhamos, “Na verdade, são amplamente diversos os interesses que se visam tutelar através dos tipos de contra-ordenação ínsitos nas infracções referentes à violação das regras sobre conflitos de interesses, apostos nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo em análise.
Por intermédio do n.º 1 do artigo 309.º do CdVM pretende-se que o intermediário financeiro adopte uma conduta preventiva na identificação de possíveis conflitos de interesses, para poder actuar de modo a evitar ou reduzir a sua ocorrência ao máximo. Está em causa um momento prévio ao próprio surgimento do conflito de interesses.
Por sua vez, perante o surgimento de um conflito de interesses em concreto, a lei determina a adopção de dois conmportamentos ao intermediário financeiro, que são totalmente distintos:
- um, o dever de ter uma atitude totamente transparente, clara, equitativa e justa para com o cliente, mormente alucidando-o acerca do conflito gerado e medidas adoptadas para mitigar o riscos decorrentes do conflito. Trata-se da atitude directa que deve ter no trato com o cliente.
Está em causa o dever a que alude o n.º 2 do artigo 14.º da DMIF I, que estabelece o seguinte “se as medidas de organização adoptadas pelo GFIA para identificar, prevenir, gerir e acompanhar os conflitos de interesses não forem suficientes para assegurar, com um grau de certeza razoável, que os riscos de os interesses dos investidores serem prejudicados foram afastados, o GFIA deve informar claramente os investidores, antes de efectuar qualquer operação em seu nome, da natureza genérica e das fontes desses conflitos de interesses e pôr em prática políticas e procedimentos adequados nesse contexto.”
- outro, fazer prevalecer o interesse do cliente em face dos demais que estejam em conflito. Este dever é diverso, pois não tem que ver com o trato directo com o cliente. Tem que ver com a própria gestão que o intermediário faz do conflito de interesses com que se depara.
O intermediário financeiro pode informar sobre a fonte de conflitos de interesses, mas ainda assim sobrepor outros interesses aos interesses do cliente. Na verdade, no vertente caso, ainda que o B... tivesse informado sobre as fontes dos conflitos de interesses subjacentes, perante o conflito com que se deparou adoptou uma postura de gestão de conflitos errada, pois no momento da colocação do papel comercial da EI..., S.A e do papel comercial da R..., S.A, fez prevalecer todos os interesses que estavam em cima da mesa, à excepção dos interesses dos clientes, ainda sabendo da situação económica e finaneira dos emitentes.
Porque assim é, estamos perante tipos de contra-ordenação distintos, que tutelam interesses igualmente distintos, sem que entre eles interceda qualquer tipo de relação de especialidade, subsidiariedade ou consumpção, pelo que improcedem as afirmações dos Recorrentes de que estamos perante uma relação de concurso aparente. Inexiste, in casu, salvo melhor entendimento, qualquer tipo de hierarquia de normas, em que a punição por via de uma esgota totalmente a punição por via da outra.
Aliás, existe uma evidente dispensabilidade daquelas que seriam as alegadas contra-ordenações instrumentais para o cometimento daquela que seria a alegada contra-ordenação fim, pelo que as três contra-ordenações conservam a sua autonomia, devendo ser punidas no âmbito do concurso real de infracções.”
A violação do art. 309º do CdVM ( conflito de interesses) não consome a norma do art. 7º do CdVM ( deveres de informação), nem a primeira se baseia na segunda, não tendo sido feita qualquer confusão entre as referidas infrações na sentença recorrida, nem tendo sido sustentado, como alega erroneamente o recorrente, haver conflito de interesses pela circunstância de a informação veiculada aos investidores relativamente às entidades emitentes não ter qualidade, estando perfeitamente autonomizada a prática dos dois tipos de contraordenação.
 Uma coisa é a violação dos dispositivos atinentes ao conflito de interesses (art. 309º nº 3 do CdVM), outra muito diferente e autónoma é a violação da qualidade da informação a que o intermediário financeiro está obrigado por força do art. 7º do CDVM que se refere à informação respeitante a instrumentos financeiros admitidos à negociação, a qual deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita.
O intermediário financeiro pode violar estes deveres de informação e nunca existir uma situação de conflito de interesses e, o inverso também é verdadeiro, pode existir conflito de interesses e os deveres de informação term sido cumpridos de forma adequada.
Caso coincidam na mesma conduta a violação dos dois deveres, nem por isso se pode dizer que haja uma só resolução ou que a violação dos deveres de informação consuma ou inclua o dever de evitar situações de conflito de interesses ou de dar prevalência aos interesses dos clientes em situação de conflito de interesses, ou que haja qualquer confusão entre aqueles dois deveres, sendo certo que no caso em apreço resulta do factualismo dado como provado a violação de ambos os deveres, de forma perfeitamente autónoma, com motivações e resoluções distintas tomadas pelo aqui recorrente.
Quanto à questão do conceito restritivo de autoria, estamos em desacordo com o recorrente, porquanto é praticamente unânime e sedimentado na jurisprudência e na Doutrina, o entendimento de que, em matéria de contraordenações, prevalece o conceito extensivo de autoria.
O art. 16º do RGCO consagra um conceito extensivo de autor, bastando para a imputação da contraordenação a verificação de um contributo causal ou co-causal da conduta do agente para o facto, afastando-se a teoria do domínio do facto e, consagra o regime da comunicação da ilicitude, bastando que a qualidade ou relação especial se verifique em qualquer um dos agentes que contribuíram para o resultado ou tentativa para que todos sejam punidos pela moldura da contraordenação específica.
O contributo pode ter a forma de uma acção ou de uma omissão que promova o facto de terceiro ou lese um dever de agir (neste sentido Paulo Pinto de Albuquerque, Figueiredo Dias, Gonçalves da Costa, Costa Pinto e Almeida Costa citados pelo primeiro autor).
O mesmo ocorre nas contraordenacões específicas de valores mobiliários, conforme art. 419º do CdVM.
Por força daquele conceito extensivo de autoria o dever de cumprimento das normas relativas a conflitos de interesses previstas no art. 309º do CdVM, impendiam quer sobre o B..., na qualidade de intermediário financeiro que se encontrava a colocar papel comercial junto dos seus clientes, quer sobre o Recorrente, enquanto membro do Conselho de Administração do intermediário financeiro (cfr. artigos 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, do CdVM).
Contrariamente ao sustentado pelo recorrente, ainda que o B... tivesse um sistema implementado para evitar conflitos de interesse, isso não exclui a responsabilidade dos titulares dos órgãos decisórios já que esse sistema foi inoperante para o efeito, porquanto ficou demonstrado que o B... na tomada de decisão de comercialização de papel comercial a emitir quer pela EI..., S.A, quer pela R..., S.A, não se organizou de forma a identificar o risco de conflito de interesses entre (a) os interesses do B... e os interesses dos seus clientes; (b) os interesses da Epi..., S.A (enquanto sociedade gestora do fundo Elz...) e os interesses dos clientes do B...; (c) os interesses da EI..., S.A ( e da R..., S.A) e os interesses dos demais interesses do B... e (d) os interesses dos administradores do B..., entre eles o aqui recorrente BB(…) e os interesses dos clientes do B... – factos provados 621 e 634.
O artigo 401.º do CdVM estabelece, quanto à responsabilidade pela prática das contraordenações previstas no CdVM, a responsabilidade das pessoas coletivas, em conjunto ou separadamente das pessoas singulares (nº 5), consoante o seu envolvimento na prática dos factos, sendo que a responsabilidade das pessoas colectivas não exclui a responsabilidade individual dos respectivos agentes.
Frederico Costa Pinto refere que, “Mantém-se no CdVM de 1999 o modelo da imputação autónoma da responsabilidade por ilícitos de mera ordenação social a entes colectivos e entes singulares ( art. 401º nº 1) e a regra da imputação funcional dos factos de pessoas singulares às pessoas colectivas, nos termos do art. 401º nº 2. Ou seja, os factos que constituem contra-ordenação podem ser imputados alternativa ou cumulativamente a pessoas singulares e a pessoas colectivas. Estes regimes pressupõem as regras gerais de atribuição e individualização da responsabilidade, nomeadamente no plano da imputação subjectiva ( art. 402º nº 1 em conjugação com o art. 8º do RGCords) e nunca excluem a responsabilidade dos agentes individuais( art. 401º nº 4).
Novo é o regime do art. 401º nº 3 que acolhe uma infração omissiva pura, necessária para evitar alguns problemas suscitados pelo regime da comparticipação entre sujeitos individuais integrados na estrutura organizativa de entes colectivos. Trata-se de uma infração autónoma ( dolosa ou negligente, como decorre do art. 402º nº 1) que se traduz na violação do dever funcional de impedir práticas ilícitas que tenham lugar dentro de pessoas colectivas, nomeadamente de intermediários financeiros. Ao criar a possibilidade de certos titulares de órgãos de administração, direcção ou fiscalização dos entes colectivos, bem como responsáveis por áreas de actividade, responderem autonomamente pela omissão de controlo dos actos ilícitos, procura-se evitar que se criem dentro das pessoas colectivas zonas francas de responsabilidade aproveitáveis por alguns agentes. Deste modo, visa-se também refoçar os mecanismos de controlo e organização interna de entidades que têm a seu cargo a captação de poupanças do público investidor.”
Nenhum gestor diligente devia assumir tantas funções de gestão no seio do B... e sociedades do ramo financeiro do grupo, como o fez o recorrente, mantendo-se alheado e indiferente às decisões que tomava (designadamente no seio do Conselho Superior do G...) e que tinha obrigação de saber, teriam consequências para os investidores, eles próprios clientes do B..., que confiavam na instituição e nos administradores que a deviam administrar de forma cuidadosa, empenhada, não que se demitissem dessas funções inerentes aos cargos assumidos, pois que, enquanto titular de órgãos de administração tinha responsabilidades de direcção, fiscalização e de impedir práticas ilícitas.
As demais objecções suscitadas pelo recorrente não encontram arrimo na factualidade apurada nos autos, pelo contrário, em face dos factos dados como provados sob os pontos 520 a 543-D (especificamente quanto ao aqui recorrente) articulados com os factos dados como provados sob os pontos 395 a 434 e, 603 a 639 (relativamente ao B... do qual era administrador executivo), conclui-se que o recorrente praticou os ilícitos contraordenacionais pelos quais foi condenado, estando demonstrados os elementos objectivo e subjectivo, nenhum fundamento legal ou factual existindo para a pretendida absolvição.
Improcede este segmento recursivo.

4ª- Do alegado incumprimento do dever de qualidade da informação.
Sob as Conclusões 86 a 111 o Recorrente sustenta que não era responsável pela elaboração ou disponibilização do papel comercial, nem detinha, em qualquer das entidades emitentes (nem no B...), os pelouros relativos às matérias em causa, não só não participou no processo de elaboração das Notas Informativas, ou, de resto, determinou o respectivo conteúdo, como, tanto quanto era do seu conhecimento, a informação nelas vertida era não mais do que actual, completa, verdadeira, e, de resto, lícita, não lhe incumbindo a respectiva confirmação, pelo que jamais poderia ter adoptado qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização nas alegadas (mas por ele desconhecidas) condições, muito menos isoladamente.
Alegou que sempre fez fé no que constava das demonstrações financeiras da EI..., S.A, tendo sempre confiado nas pessoas responsáveis pela preparação e acompanhamento da contabilidade da sociedade, desconhecendo quaisquer instruções, alterações, irregularidades, ocultações ou omissões, razão pela qual não objectou, ao longo dos anos, à aprovação das mesmas, quando, depois de preparadas, apresentadas pelos administradores responsáveis e, no que concerne à R..., S.A, na qual não exercia quaisquer funções, não tinha conhecimento ou acesso, muito menos em detalhe, à respectiva informação financeira, nem, de resto, intervenção em quaisquer decisões de gestão (incluindo as relativas à emissão do papel comercial ou à concretização da operação de reestruturação do G...).
Mais entende que a inclusão da informação relativa à operação de aquisição, pela R..., S.A, das participações sociais da E..., S.A não era sequer exigível, ou, de resto, necessária à tomada de uma decisão de investimento esclarecida, sendo que,  na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014 foi apenas apresentada uma proposta/versão inicial do plano de reestruturação do G..., discutida em termos gerais e estratégicos, tendo ficado acordado que esse plano deveria ser debatido ao nível das sociedades nele envolvidas, operação que só foi concretizada em 22 de Janeiro de 2014 (ou seja, em data posterior a todas as Notas Informativas da R..., S.A, pelo que a informação nelas contida era actual e completa), configurando a versão inicial uma mera proposta, pelo que qualquer divulgação a 7 de Janeiro de 2014 seria informação sem qualidade, concluindo que, não só nenhuma deliberação do Conselho Superior do G... assumia, a 7 de Janeiro de 2014, estabilidade e definitividade que obrigasse à sua divulgação, como a informação em causa não era susceptível de ter repercussões na decisão dos investidores.
Por último referiu que a obrigação de elaboração das Notas Informativas recaía sobre as entidades emitentes, as quais, no limite, corresponderiam aos agentes da alegada infracção, e não o B..., não sendo, por isso, tal imputável ao Recorrente na qualidade de administrador daquele.
Começando por esta última asserção é lamentável que o recorrente atribua a responsabilidade pela falta de informação com qualidade relativa à situação económica e financeira da EI..., S.A na elaboração das Notas Informativas à própria emitente, e arrede a sua responsabilidade na qualidade de administrador do B... quando não ignora que acumulava o cargo de Administrador daquela mesma emitente!
Relativamente a este tipo de dever violado valem no geral as considerações gerais tecidas na questão anterior quanto ao tipo de comparticipação imputada ao recorrente na prática deste tipo de infração, atendendo ao conceito extensivo de autoria e ao cargo exercido no B..., na EI..., S.A e no Conselho do G....
Por força daquele conceito extensivo de autoria o dever de prestação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM impendia quer sobre o B..., na qualidade de intermediário financeiro que se encontrava a colocar papel comercial junto dos seus clientes, quer sobre o Recorrente, enquanto membro do Conselho de Administração do intermediário financeiro (cfr. artigos 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, do CdVM).
Com efeito, o dever de prestação de informação com qualidade, consagrado no artigo 7.º do CdVM, impõe um conjunto de requisitos de qualidade da informação que têm de ser observados por todos os agentes ou entidades que prestam serviços no mercado de valores mobiliários.
Conforme também já fizemos menção no recurso apresentado pelo recorrente Haitong Bank, SA e que aqui consideramos reproduzido face à identidade de questões, a responsabilidade das emitentes pela informação vertida nas Notas Informativas do papel Comercial não é a que está em causa nestes autos, nem exclui a responsabilidade de todos os agentes que se movem no mercado de valores mobiliários, entre os quais os intermediários fibanceiros, como era o caso do B..., do qual o recorrente era Administrador, pela violação dos deveres de informação emanados do CdVM.
“A transparência informativa é, neste sentido, o pilar básico sobre o qual assentam as decisões dos investidores, razão pela qual a proteção destes passa necessariamente pela consagração de medidas tendentes à prestação obrigatória de informação. Os interesses dos investidores são, assim, fortemente tutelados pela atribuição de verdadeiros deveres jurídicos de informação.
As regras consagradas no Cód. VM e em diversos regulamentos da CMVM respeitantes aos deveres de informação são numerosas mas o seu grau de desenvolvimento varia consoante o sujeito passivo desse dever.
È nos deveres de informação dos intermediários financeiros que o legislador parece ter depositado o maior encargo informativo.”
Embora, outras entidades actuantes no mercado de valores mobiliários também estejam sujeitas a deveres de informação, como é o caso das emitentes, entidades gestoras de mercado…
Sobre a violação dos deveres de informação que recaem sobre os intermediários financeiros, claramente decorre da matéria de facto apurada, que o recorrente comparticipou, ao lado do B..., na violação daqueles deveres, tendo sido prestado informação, pelo intermediário financeiro do qual o recorrente era administrador executivo, sem a qualidade necessária, na qual foram omitidos elementos sobre a situação das emitentes relevante para uma decisão informada e ponderada por parte dos investidores, tanto no que se refere ao papel comercial da EI..., S.A (da qual era administrador), como no que se refere ao papel comercial da R..., S.A.
No que diz respeito à confiança depositada, essa questão já foi acima tratada, tendo-se concluído que não exclui a responsabilidade do recorrente pela prática das referidas contraordenações.
Tudo o mais alegado pelo recorrente a propósito da pretendida absolvição da prática das infrações de violação do dever de informação está em manifesta oposição com a matéria de facto dada como provada sob os factos 395 a 434, 520 a 543-D e 603 a 639, a qual demonstra que o B... violou os referidos deveres de informação intermediário financeiro, ao lado de quem responde pelas infrações contraordenacionais cometidas, por força dos referidos arts. 16º do RGCO e arts. 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, 401º nº 5 e 419º do CdVM- por ser titular do órgão de administração do B... e por força do conceito extensivo de autoria- dando-se aqui também por reproduzidas as asserções a esse propósito efectuadas aquando do conhecimento da mesma questão colocada neste recurso pelo recorrente AA.
Improcede este segmento recursivo.

5ª- Das sanções:
5.1 Admoestação;
5.2 Redução da coima/atenuação especial;
5.3 Suspensão da execução da coima;
5.4 Revogação da sanção acessória de inibição do exercíco de funções.

Sob as Conclusões 112 a 142 o Recorrente sustenta que, mesmo que se pudesse imputar-lhe a prática das contraordenações pelas quais foi condenado, sempre se justificaria a aplicação da sanção de mera admoestação, ou no limite, de uma coima correspondente ao mínimo legal aplicável, em todo o caso totalmente suspensa na sua execução, sendo inadequada e desnecessária a aplicação da sanção acessória de inibição do exercício de funções cumulativamente aplicada, atendendo ao seu estado de saúde, a par da reduzida ilicitude concreta dos factos, a sua culpa diminuta, a inexistência de benefícios obtidos, reduzidas exigências de prevenção, da boa conduta adoptada e da sua idade avançada.

5.1 Admoestação.
O art. 51º do RGCO (ex vi art. 35º do DL 10/2004) prevê a aplicação de admoestação aos ilícitos contraordenacionais quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique (nº 1).
A aplicação da admoestação depende da verificação dos requisitos previstos no art. 51º do RGCO:
- reduzida gravidade da infração;
- culpa reduzida do agente.
A propósito da possibilidade de aplicação de admoestação a este recorrente consta da sentença recorrida que, “Quanto à possibilidade de aplicação de uma mera admoestação ao Recorrente BB, como pugnado nas doutas alegações orais proferidas pelo seu Ilustre Mandatário, nos termos do n.º 1 do artigo 51.º do RGCO, consideramos, data vénia, que tal sanção se mostra inaplicável no vertente caso, porquanto a gravidade abstracta das contra-ordenações não se situa em nível baixo, mas antes muito elevado.
Tal implica que a própria lei identifica as contra-ordenações em apreço como contra-ordenações de ilicitude não baixa, o que afasta a possibilidade de se poder concluir pela existência de contra-ordenações de “reduzida gravidade”.
Conforme tem sido entendimento generalizado quer na jurisprudência, quer na doutrina, a admoestação apenas se pode aplicar a contra-ordenações ligeiras, sendo certo que a gravidade da infracção também é determinada pela gravidade da ilicitude pressuposta pelo legislador.
No caso do legislador classificar expressamente a infracção como grave, tal significa que o legislador considerou a conduta, em abstracto, portadora de uma ilicitude considerável. Também quando são determinadas molduras de coimas com limites mínimos e/ou máximos substancialmente elevados, tal apenas pode significar que o legislador entendeu as condutas sancionadas como encerrando em si uma gravidade que não é, desde logo e em abstracto, diminuta.
Quando assim é, o julgador não pode modificar a lei, conferindo uma menor gravidade àquela ilicitude, o que impede que se possa optar por uma mera admoestação – vide fundamentação do acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 6/2018, publicado in Diário da República n.º 219/2018, Série I de 2018-11-14.”
Perfilhamos o entendimento de que a admoestação constitui uma medida alternativa para os casos de pouca relevância do direito contraordenacional, ou seja, para contraordenações qualificadas como leves ou simples, em que houve actuação negligente e naquelas em que não haja lugar a sanções acessórias (neste sentido, vide Simas Santos e Lopes de Sousa, 2002, pág. 316 e Ac RL de 9/1/2018, P. nº 90/17.7YUSTR.L1-5, disponível em www.gdsi.pt).
“No caso de concurso de contra-ordenações, todas elas devem ser leves ou simples e, no seu conjunto, não devem consubstanciar um ilícito nem uma culpa significativos” , o que manifestamente não ocorre no caso sub judice.
Relativamente à gravidade das infrações imputadas ao Recorrente, desde logo o legislador qualificou-as como contraordenações muito graves nos arts.  389º nº 1 al. a) e art. 397º nº 2 al. b) do CdVM, pelo que, afigura-se-nos que perante a natureza dos interesses extremamente relevantes de natureza pública atinentes ao mercado financeiro não se pode sustentar que seja reduzida a gravidade dos ilícitos contraordenacionais em causa.
Relativamente ao grau de culpa, afigura-nos desadequado que tendo sido o Recorrente condenado a título doloso relativamente a quatro das oito contraordenações se possa sustentar que a sua culpa foi diminuta ou reduzida.
Em suma, no caso dos autos, a factualidade provada não permite qualificar as infrações cometidas (que a lei classifica como contraordenações muito graves) de reduzida gravidade, nem considerar a culpa do recorrente diminuta.
Deste modo, secundamos o entendimento perfilhado na sentença recorrida de que é de afastar a aplicação de mera admoestação, perante a gravidade das infrações e a culpa do Recorrente, a qual não se reputaria adequada à responsabilização contraordenacional do recorrente, não estando verificado o circunstancialismo previsto no art. 51º do RGCO.
Improcede este segmento recursivo.

5.2 Redução da coima/atenuação especial.
A esse propósito relembra-se o então decidido pelo tribunal a quo, com o qual concordamos e nos escusamos de repetir:
“- Da moldura das coimas, por referência à situação da EI..., S.A:
Concluiu-se que, por referência à situação da EI..., S.A, o Recorrente BB deveria ser condenado nos termos no n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, que dita que deverá ser condenado na coima cominada ao autor, especialmente atenuada.
A comissão por omissão, situa-se num plano qualitativamente diferente da comissão por acção, pois o nexo de ligação psicológica entre o agente e o facto é menos envolvente, ou seja, é menos intenso, justificando-se a atenuação especial.
Como se sabe, o autor poderá ser condenado a título de dolo ou negligência.
O facto de estarem em causa contra-ordenações por omissão impura ou imprópria não significa que esteja afastada a moldura da negligência. Na verdade, a par do que sucede no artigo 10.º do Código Penal, as condutas omissivas previstas no citado n.º 4 do artigo 401.º do CdVM podem ser praticadas dolosa ou negligentemente – vide, neste sentido Frederico de Lacerda da Costa Pinto, in O Novo Regime dos Crimes e Contra-Ordenações no Código dos Valores Mobiliários, Almedina, pág. 24.
Nestes termos, estando em causa uma conduta por omissão, praticada de forma negligente, aplica-se a moldura da negligência, especialmente atenuada.
  Assim sendo, importa apurar a nova moldura das coimas.
Consideramos que, atenta a redacção do preceito legal, que impõe ao aplicador a referida atenuação especial da coima, já que refere expressa e impositivamente que as pessoas lá identificadas “incorrem na sanção prevista para o autor, especialmente atenuada”, os pressupostos da atenuação especial previstos no artigo 72.º do CP não são aplicáveis.
Analisado o CdVM, verificamos que do mesmo não se extrai a moldura da coima no caso de comportamentos negligentes, pelo que, por remissão do disposto no artigo 407.º do mesmo diploma, importa aplicar o n.º 4 do artigo 17.º do RGCO, que determina que “(…) se a lei, relativamente ao montante máximo, não distinguir o comportamento doloso do negligente, este só pode ser sancionado até metade daquele montante.”
Nestes termos, a moldura da coima para comportamentos negligentes situa-se entre € 25.000,00 e € 2.500.000,00. ( )
Desta feita, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 18.º do RGCO (moldura da atenuação especial), “os limites máximo e mínimo da coima são reduzidos para metade”, o que implica uma moldura da coima que varia entre € 12.500,00 e € 1.250.000,00.
*
- Da moldura da coima, por referência à situação da R..., S.A, tendo em vista a requerida atenuação especial da coima pelo Recorrente BB:
O Recorrente BB veio requerer a atenuação especial da coima que lhe fosse eventualmente aplicada. Tendo em vista o que acima se deixou decidido, importa aflorar se também quanto à situação da R..., S.A se mostra adequado proceder a tal atenuação.
O Recorrente, de forma sintetizada, justifica o seu pedido com o facto de já terem decorridos mais de sete anos sobre a prática dos factos, sendo colaborou com todas as instituições que investigaram a situação, sempre apresentando quer anterior, quer posteriormente aos factos uma boa conduta.
Os pressupostos da atenuação especial previstos no CP (artigo 72.º) são aplicáveis ao RGCO (neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do RGCO à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica, pág. 86), os quais consubstanciam a existência de circunstâncias anteriores ou posteriores à prática do ilícito, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da sanção.
Para esse efeito, decorre do n.º 2 do artigo 72.º do CP, que são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.
A propósito desta matéria, Figueiredo Dias (in “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, 1993, pág. 306) refere o seguinte:
“A diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto resultante da actuação da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo. Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue –, quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excepcionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os casos “normais”, lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios”.
Trata-se, assim, de uma válvula de segurança, só aplicável a situações que, pela sua excepcionalidade, não se encaixam nos limites da moldura da coima aplicável ao caso, ou seja, a situações em que se mostra quebrada a relação/equivalência entre o facto cometido e a coima para o mesmo estabelecida, consabido que entre a contra-ordenação e a coima deverá existir uma equivalência.
Há que ver, então, se se justifica, no caso concreto, a atenuação especial da coima.
Salvo o devido respeito por melhor opinião, não se vislumbra absolutamente facto nenhum que autorize a operatividade deste instituto ao vertente caso.
O Recorrente desenvolvia uma actividade altamente regulada, devido aos interesses sociais e económicos que estão em causa com a prática de tal actividade, os quais têm assento constitucional.
O Recorrente participou na decisão tomada em 07.01.2014, pelo Conselho Superior do G..., cerca de apenas um mês depois da dramática situação ocorrida com o papel comercial da EI..., S.A, cuja comercialização teve de ser imediatamente suspensa, após o conhecimento do escândalo da omissão de passivo nas contas da EI..., S.A que já se encontravam fechadas e do aumento inusitado de passivo no ano de 2013.
A essa data o Recorrente já tinha necessariamente conhecimento da situação e do desmerecimento prestado aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da EI..., S.A.
O plano de reestruturação que foi aprovado naquela sede previa uma alteração radical em sede da sociedade R..., S.A que estava a emitir papel comercial e previa também que essa alteração radical fosse efectuada com efeitos retroactivos a 31.12.2013.
Como já se disse, a circunstância de serem previstos efeitos retractivos, aliada a uma decisão tomada por um órgão para-societário que necessitava de ser formalizada por entidades pertencentes ao denominado “G...” e outras entidades terceiras, o que demoraria sempre tempo, como demorou, implicava que todos os que subscrevessem papel comercial desde 09.01.2014 (data que é indicada pela decisão administrativa) até à data da formalização do negócio fossem sempre adquirir um produto diverso do necessariamente anunciado (dados os referidos efeitos retroactivos).
Essa situação ninguém que participou naquela reunião quis acautelar, de forma a respeitar os interesses dos clientes. É que independentemente da bondade do plano de reestruturação, os clientes têm o direito de escolher, de forma devidamente informada, os produtos em que querem investir, não tendo de ser surpreendidos com uma alteração das regras do jogo (independentemente das mesmas poderem ou não ser mais benéficas para si, já que o intermediário financeiro deve adoptar uma conduta objectiva para com o seu cliente), para a qual não contribuíram.
Com isso o Recorrente, apesar de ter tomado como possível, se conformou. Mesmo depois da formalização do negócio a 22.01.2014, sem que sequer existisse ainda uma ratificação formal do mesmo por parte da principal afectada pelo plano de reestruturação, que apenas ocorreu em 25.02.2014, também continuou a não ser assegurado qualquer respeito pelos clientes e com isso o Recorrente novamente se conformando.
Toda esta situação é altamente censurável.
Na verdade, apesar do evidente decurso do tempo, mais de sete anos, como afirma o Recorrente (relativamente ao qual não podemos deixar aqui de lançar um olhar novamente crítico para a CMVM por isso), não menos certo que esse tempo não foi ainda suficiente para desvanecer as necessidades de prevenção geral elevadas que no presente caso se sentem, atenta a gravidade da situação.
Não só pelos valores que foram investidos pelos clientes do B..., nem pelo número elevado de clientes em causa, como por todo o circunstancialismo que envolve a situação. Na verdade, os clientes do B... foram atraiçoados duas vezes. Uma na situação da EI..., S.A e, um mês depois, na situação da R..., S.A.
No fundo, o que aqui se evidencia de forma contundente é que os interesses do denominado “G...” e de quem girava à sua volta, perante a hecatombe da EI..., S.A, uma situação que abala a credibilidade de qualquer instituição financeira e a pode arrastar para o precipício (as instituições financeiras vivem da sua imagem e credibilidade granjeadas junto do cliente alvo), sempre foram colocados acima dos interesses dos clientes que foram total e novamente desrespeitados nesta situação da R..., S.A, mas desta vez não apenas por intervenção de AA, como por aqueles que participaram na decisão de 07.01.2014, não lhes sendo permita a tomada de uma decisão livre, fundamentada, conscienciosa, desconhecendo os interesses em conflito envolvidos, numa autêntica desregra em termos de prevenção e gestão de conflito de interesses.
A boa conduta anterior e posterior aos factos, incluindo a prestação de desculpas institucionais públicas aos clientes do B... por parte do Recorrente, com todo o respeito, não têm o condão de transformar a imagem global do facto numa situação de gravidade diminuída, fazendo com que se que possa razoavelmente supor que o legislador não pensou em hipóteses como as que estão em causa nestes autos quando determinou os limites normais da moldura cabida aos tipos de facto respectivos.
Acresce ainda que normas como as que foram violadas são normas que tutelam bens jurídicos com raiz constitucional, como já verificámos, mas também que são a espinha dorsal de todo o jus mobiliário. Sem confiança e sem uma actuação virada para os interesses dos clientes todo o sistema financeiro desmorece.
Desta forma, consideramos que os factores que são chamados nesta vertente à colação pelo Recorrente serão factores a convocar apenas no juízo de determinação concreta da sanção, mas não depõem no sentido de um invulgar quadro fáctico que imponham um sentimento de gritante desproporcionalidade da coima, ao ponto de se concluir que o legislador, quando pensou na moldura abstracta, não previu uma situação como a dos autos. Julgamos que a realidade factual apurada pouco ou nada acrescenta às situações pensadas pelo legislador.
Porque assim é, decide-se não atenuar especialmente as coimas por referência às contra-ordenações por respeito à situação da R..., S.A.
*
- Da determinação concreta das coimas:
No que se relaciona com a ilicitude concreta dos factos, consideramos que a mesma se situa em nível elevado, sendo superior no caso da EI..., S.A e menor (embora de forma pouco expressiva) no caso da R..., S.A.
No que tange à situação da EI..., S.A e à prestação de informação sem qualidade, não podemos descorar que está em causa a ocultação de informação sobre o passivo de uma sociedade que emitia papel comercial, o que aumenta o descrédito no mercado financeiro por parte dos investidores, abalando-o.
Quanto ao conflito de interesses, a potenciação e criação de uma situação de conflito de interesses no quadro da emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e, depois, a orientação a decisão do intermediário financeiro no sentido de dar prevalência aos interesses da EI..., S.A e da R..., S.A, aos seus próprios interesses, aos interesses da Epi..., S.A, bem como e aos interesses de alguns membros do seu conselho de administração (entre os quais se incluía o Arguido BB), face aos interesses dos clientes subscritores do papel comercial (maxime, em tomar uma decisão de investimento esclarecida, conhecendo os riscos decorrentes da real situação da EI..., S.A), promove igualmente uma elevada desconfiança no mercado.
Quanto à situação da R..., S.A, integrava o Recorrente o Conselho Superior do G..., que decidiu nos moldes dados como provados, pertencendo a um órgão parassocial que se arrogava de poderes decisórios em relação às entidades relacionadas com a situação em concreto. Para além de tal ter determinado a prestação de informação sem qualidade aos investidores, também potenciou e criou um risco de conflito de interesses como já analisado.
Não é igualmente despiciendo referir que o B..., onde o Recorrente era administrador, era reconhecido como uma instituição confiável e por isso credível.
Tal implica que os produtos financeiros adquiridos fossem considerados com a qualidade que lhes era anunciada pelo intermediário financeiro, sem grande sentido crítico por parte dos investidores, atenta a sólida relação de fidúcia estabelecida pelo B... com o mercado financeiro, até porque estavam em causa informações que os investidores não poderiam avaliar a sua veracidade, excepto quando, em 23.01.2014, no que tange à R..., S.A, foi publicada na página da CMVM a reestruturação do G..., com implicações para a natureza, situação económica e estrutura da emitente.
Contudo, ainda assim, apesar de, a partir desse momento, a ilicitude poder ser considerada menor, esse decréscimo de ilicitude é apenas mitigado, pois que, como já anteriormente analisámos, não era exigível aos investidores encetarem, eles próprios, a tão falada em audiência de discussão e julgamento, “due diligence” acerca da veracidade do que era anunciado.
Importa ainda aludir ao facto que a ilicitude concreta dos factos é tanto mais grave quando o intermediário financeiro deu prevalência aos interesses do próprio comparticipante BB.
Também não pode ser descurada a participação do Reocorrente nos factos:
i) na qualidade de Administrador da EI..., S.A, aprovou as contas individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012.;
ii) na qualidade de Administrador do B... com os pelouros dos ... e de ..., acompanhou o processo de comercialização do papel comercial da EI..., S.A junto dos clientes de tais Departamentos do B...;
iii) participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A.
iv) participou activamente no processo decisório que levou à decisão de emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A e respetiva colocação junto dos clientes do B..., de forma a assegurar à EI..., S.A e à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial emitido por estas que estava colocado, até setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B..., e consequentemente a que o B... violasse as regras sobre os conflitos de interesses em causa e prestasse informação sem qualidade aos investidores.
Por sua vez, também aumenta a ilicitude dos factos, o elevadíssimo número de investidores que estão em causa e que constam identificados nos anexos da decisão administrativa e o período de tempo em que foram prestadas informações sem qualidade aos clientes, o que implica uma potenciação de afectação dos interesses dos investidores que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A e comercializado pelo B... e o regular funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e inerente perda de confiança nos mesmos.
Veja-se que quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial da EI..., S.A, a mesma decorreu entre Setembro e Dezembro de 2013 e quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial emitido pela R..., S.A, esta decorreu entre 9 de janeiro de 2014 e de 24 de fevereiro de 2014. Portanto, durante cerca de 3 meses em relação à EI..., S.A e durante cerca de dois meses em relação à R..., S.A.
Quanto ao grau de culpa, na situação da EI..., S.A o mesmo é mediano. Na verdade, importa referir que, apesar do Recorrente não conhecer a prática das contra-ordenações, certo é que se mostra provado que o mesmo não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação.
Quanto à situação da R..., S.A, o grau de culpa é elevado, pois molda-se a título de dolo eventual.
Para além do que fica dito, a culpa do Recorrente é aumentada por via do facto do Recorrente possuir, à data dos factos, elevada experiência profissional e conhecimento das áreas bancária e de intermediação financeira, em geral, e do B... em particular, bem conhecendo os especiais deveres relativos à actividade de intermediação financeira que sobre si recaíam, assim como os efeitos para os clientes e para o mercado em geral das suas condutas, o que aumenta as exigências de pautar a sua conduta pelos trilhos do direito.
Com efeito, o Recorrente BB era, à data dos factos, desde abril de 1992, administrador e presidente da Comissão Executiva do B..., sendo responsável, entre outros, pelos pelouros dos ... e de ...; administrador da EI..., S.A, administrador da Es...; e membro do Conselho Superior do G....
Baixa, embora de forma mitigada, a culpa o facto de ter confiado nas estratégias perfilhadas pelo Recorrente AA, que era um reputado profissional na área, o que não afasta a sua responsabilidade.
Em termos de benefícios obtidos com os factos, correspondem aos interesses que o Recorrente, assumindo as funções em órgãos sociais em várias entidades do G..., tinha, de captar para a EI..., S.A e para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G....
Desconhece-se a realização de actos pelo Recorrente com vista à ocultação das infracções em causa, o que o beneficia.
Por outro lado, beneficia o Recorrente o facto de, perante os factos que vieram a público, ter prestado um pedido de desculpas formal ao mercado, o que implica a conclusão de que o Recorrente se terá consciencializado devidamente sobre a gravidade das condutas que estão em causa, tentando, dessa forma, reparar moralmente os danos causados pelas infracções.
Também participou na reunião da Comissão Executiva do B... de 04.12.2013, que deliberou a suspensão da comercialização do papel comercial da EI..., S.A. Contudo, salvo melhor opinião, este facto não tem grande relevo para a presente análise, na medida em que o regulador Banco de Portugal, por força do ETRICC2, estava a acompanhar a situação financeira da EI..., S.A, o que despoletou o apuramento dos factos atinentes.
No que concerne às exigências de prevenção, consideramos, com Taipa de Carvalho, que "não cabem nas finalidades das sanções contra-ordenacionais as ideias de retribuição", pese embora se possa dizer que "as funções principais destas sanções são de dissuasão geral (prevenção geral negativa) e de dissuasão individual (prevenção especial negativa): dissuasão de todos os destinatários das respectivas normas; dissuasão do infractor condenado em relação à reincidência. Logo: funções prevenção negativa". Todavia, este Autor vê ainda a possibilidade das sanções contra-ordenacionais terem igualmente finalidades de prevenção positiva no sentido de promoveram a "consciencialização social comunitária" e "consciencialização social do próprio infractor" para a importância comunitária e/ou individual dos "valores ou bens jurídicos tutelados pelo direito de ordenação social" (vide Direito Penal, Parte Geral, Questões fundamentais. Teoria geral do crime, 3.ª ed., ...: UCP, 2016, pág. 142, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2018, in Diário da República n.º 219/2018, Série I de 2018-11-14).
Assim, tendo em vista por um lado os bens jurídicos tutelados pelas normas violadas e o facto do Recorrente não ter antecedentes contra-ordenacionais, consideramos as exigências de prevenção são medianas. Por um lado, aumenta as necessidades de prevenção a necessidade premente de dissuasão geral, já que estão em causa infracções que contendem com o correcto funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e com os bens e interesses jurídicos em causa (a qualidade da informação, a prevenção e regular gestão de conflitos de interesses, os interesses e o património dos investidores). Assim as necessidades de prevenção geral são muito elevadas.
Contudo, em sentido inverso, consideramos que as exigências de prevenção especial são relativamente baixas no vertente caso.
Com efeito, o Recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais averbados, sendo certo que demonstrou, pelo pedido de desculpas público que apresentou, logo em 2014, ter-se consciencializado acerca do desvalor das condutas em causa nestes autos.
Para além disso, o Recorrente BB não exerce actualmente quaisquer funções no sector bancário, há sensivelmente 7 anos, sendo certo que sofreu um Acidente Vascular Cerebral que o deixou física e psiquicamente debilitado, sem capacidade de locomoção, com períodos de desorientação no tempo e no espaço, estando, previsivelmente em definitivo, física e psiquicamente incapacitado para o exercício de funções semelhantes às que estão em causa nos autos.
Importa ter ainda em conta a natureza de pessoa singular do Recorrente em causa.
No que diz respeito à situação económica do Recorrente BB, mostra-se provado que, por referência ao ano de 2020, apresentou rendimentos a título de trabalho dependente e/ou pensões, no valor de € 463.117,76 e rendimentos a título de rendas com imóveis no valor de € 8.306,40.
- Do cúmulo jurídico das coimas:
Estando em causa o cometimento de 8 contra-ordenações, importa apelar às regras do cúmulo jurídico, nos termos do artigo 19.º do RGCO, considerando a moldura do concurso balizada entre os € 450.000,00 (coima mais elevada concretamente aplicada) e os € 1.420.000,00 (soma das coimas concretamente aplicadas).
“A coima única é fixada em função da apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adscritiva do agente (…). Em regra, a coima única deve aproximar-se dos limites máximos da soma das coimas concretamente aplicadas, devendo ser ponderadas, a favor do agente quaisquer circunstâncias atenuantes ainda não avaliadas aquando da determinação do valor concreto de cada coima.” – vide Comentário ao Regime Geral das Contra-Ordenações à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, Paulo Pinto de Albuquerque, pág. 89 (sublinhado nosso)
Ora, da pluralidade de ilícitos em causa resulta que estes foram cometidos em situações distintas, começando na decisão de emissão, colocação e comercialização do papel comercial de 04.09.2013, estendendo-se, quanto à EI..., S.A, até 04.12.2013 e, por referência à R..., S.A, sendo decidida a reestruturação do G... em 07.01.2014 e prosseguindo até 24 de Fevereiro de 2014. Por isso, não se está perante um caso de mera pluriocasionalidade.
A CMVM fixou uma coima única de € 750.000,00.
Consideramos que, atento tudo o que foi exposto, a globalidade do circunstancialismo em causa permite que a coima única não se situe próxima do limite máximo da soma das coimas concretamente aplicadas, antes se afigurando proporcional e adequado fixar a coima única no valor de € 500.000,00.
Afigura-se-nos que a decisão recorrida fez uma devida ponderação da gravidade das infrações cometidas pelo Recorrente e das necessidades de prevenção geral e especial, sendo as primeiras muito elevadas, em face dos riscos sistémicos no sistema financeiro que este tipo de infrações têm provocado, mormente no panorama nacional, sendo que as circunstâncias atenuantes alegadas pelo Recorrente já foram adequadamente ponderadas na sentença recorrida, tendo a coima única sido reduzida pelo tribunal a quo para limites muito próximos do mínimo, mostrando-se as coimas parcelares e a coima única aplicada justa e adequada, proporcional à sua culpa e à ilicitude dos factos, não havendo razões ponderosas para a sua redução.
Quanto à coima única fixada ao recorrente, a apreciação conjunta dos factos provados leva a concluir pela elevada gravidade das condutas adoptadas pelo Recorrente, reveladoras de uma pronunciada irresponsabilidade social, exigindo a aplicação de uma coima única de pendor marcadamente intimidatório, sendo certo que são particularmente significativas as necessidades de prevenção geral.
Apreciando em termos sumários as principais objecções levantadas pelo recorrente, diremos, ainda, que: a culpa não é diminuta; a “confiança” nas estratégias delineadas pelo arguido AA foram levadas em consideração; a sua situação não é comparável à do arguido Haitong, mesmo no que respeita ao valor das coimas parcelares porquanto o recorrente era titular do órgão decisor do intermediário financeiro, o qual tinha em primeira linha a obrigação de divulgar informação com qualidade e, detinha no B... um nível elevado de responsabilidade e por isso um especial dever de não cometer a infração ( art. 405º nº 3 do CdVM); as infrações não foram pontuais, quando muito concentradas num curto espaço de tempo mas isso nada releva para o grau de culpa e ilicitude evidenciadas; caso tivesse existido demonstração  de actos de ocultação seguramente que as coimas teriam sido agravadas não sendo a sua ausência motivo de redução das coimas fixadas; a ausência de antecedentes foi tomada em consideração na sentença; é incompreensível que o recorrente insista que sobre ele não recaía qualquer dever de não cometer as infrações face á matéria de facto apurada; a ausência de benefícios económicos foi devidamente arredada e a sua situação económica foi ponderada na sentença com os elementos que constam da factualidade apurada (não encontrando arrimo nessa factualidade os elementos mencionados pelo recorrente), tendo sido devidamente ponderadas as exigências de prevenção quer especial quer geral, assim como tomadas em consideração o seu estado de saúde, o afastamento da actividade bancária, o tempo entretanto decorrido bem, como o pedido de desculpas público, como consta da sentença recorrida em parte acima reproduzida para clareza da exposição.
Quanto à desnecessidade das coimas aplicadas atendendo ao estado de saúde debilitado em que se encontra, ou à falta de capacidade de alcançar a gravidade da sanção ou de reorientar a sua conduta para o cumprimento do Direito, é argumento que se tem dificuldade em assimilar porquanto se desconhece qual o fundamento legal para excluir a aplicação de coima a quem foi responsável pela prática de oito ilícitos, perfeitamente consciente e orientado na altura em que os cometeu, apenas e só porque no momento da sua aplicação poderá ter alguma dificuldade na percepção da gravidade dos ilícitos cometidos, não podendo ignorar o recorrente que a coima ( não pena penal) fixada na medida adequada e proporcional à culpa do agente, para além de um objectivo preventivo individual, tem também uma função dissuasora e intimidatória em termos de prevenção geral negativa.
De todo o modo, o CdVM não prevê o regime da dispensa de pena- contrariamente ao regime especial do RGICSF em cujo artigo 22º se previu a dispensa da pena mediante a verificação de pressupostos idênticos aos constantes do nº 1 do artigo 74º do Código Penal- afigurando-se-nos que esse regime não é aplicável a contraordenações a não ser que o regime especial assim o preveja, conforme perfilhado também por Paulo Pinto de Albuquerque (no mesmo sentido Ac RC de 15/5/2013, Proc. Nº 661/12.8TBCBR.C1, disponível em www.dgsi.pt).
Aquele mesmo Autor refere que, “A coima não tem um fim retributivo da culpa ética do agente, pois não visa o castigo de uma personalidade deformada refletida no facto ilícito, nem tem um fim de prevenção especial positiva, pois não visa a ressocialização de uma personalidade deformada do agente.
A coima tem um fim de prevenção especial negativa, isto é, visa evitar que o agente repita a conduta infractora, bem como um fim de prevenção geral negativa, ou seja, visa evitar que os demais agentes tomem o comportamento infractor como modelo de conduta.”
Nestes termos, tendo em conta todo o circunstancialismo assinalado e que foi devidamente valorado pelo Tribunal a quo, resulta evidente que as coimas, parcelares e única, fixadas pela 1ª Instância se mostram justas, proporcionais e adequadas, foi ponderada a atenuação especial nas contraordenações cometidas por negligência, nenhum reparo merecendo a sentença recorrida.
Improcede, também, este segmento recursivo.

5.3 Suspensão da execução da coima.
O art. 415º do CdVM prevê a suspensão, total ou parcial, da execução da coima a determinar pela CMVM, suspensão essa também aplicada na sentença recorrida quanto a este recorrente, de forma parcial, no montante de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) pelo período de 2 (dois) anos, tendo, pois, sido deferida a suspensão de metade da coima única aplicada, embora o recorrente pretenda a suspensão total, invocando para o efeito que a simples censura do facto e a ameação da sanção realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
No entanto, contrariamente ao recorrente, não se nos afigura que sejam meramente residuais as exigências de prevenção, pelo contrário, atendendo a essas necessidades elevadas e prementes de prevenção geral seria absolutamente inadequada a suspensão total da execução da coima.
Não vislumbramos razões plausíveis que justifiquem a alteração da decisão recorrida, que determinou a suspensão em metade do pagamento da coima, a qual se mostra proporcional e adequada ao caso, afigurando-se-nos que a comunidade num caso desta gravidade poderia encarar a suspensão total como um sinal de impunidade, concluindo-se, pois, que a pretendida suspensão do pagamento da coima na sua totalidade não seria susceptível de acautelar as exigências de prevenção geral.

5.4 Revogação da sanção acessória de inibição do exercíco de funções.
Sustentou o recorrente que a sanção acessória de inibição do exercício de funções que lhe foi aplicada é profundamente inadequada e desnecessária, face ás reduzidas exigências de prevenção, atendendo ao seu estado de saúde, á reduzida ilicitude concreta dos factos, á diminuta culpa, inexistência de benefícios obtidos, boa conduta adoptada e idade avançada.
A aplicação da referida sanção acessória ficou assim justificada na sentença recorrida:
- Da sanção acessória:
Nos termos do artigo 404.º do CdVM, na redacção vigente à data da prática dos factos:
“1 - Cumulativamente com as coimas, podem ser aplicadas aos responsáveis por qualquer contra-ordenação, além das previstas no regime geral dos ilícitos de mera ordenação social, as seguintes sanções acessórias:
“a) Apreensão e perda do objecto da infracção, incluindo o produto do benefício obtido pelo infractor através da prática da contra-ordenação;
“b) Interdição temporária do exercício pelo infractor da profissão ou da actividade a que a contra-ordenação respeita;
“c) Inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de alguma ou de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros;
“d) Publicação pela CMVM, a expensas do infractor e em locais idóneos para o cumprimento das finalidades de prevenção geral do sistema jurídico e da protecção dos mercados de valores mobiliários ou de outros instrumentos financeiros, da sanção aplicada pela prática da contra-ordenação;
“e) Revogação da autorização ou cancelamento do registo necessários para o exercício de actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros.
“2 - As sanções referidas nas alíneas b) e c) do número anterior não podem ter duração superior a cinco anos, contados da decisão condenatória definitiva.
“3 - A publicação referida na alínea d) do n.º 1 pode ser feita na íntegra ou por extracto, conforme for decido pela CMVM.”
A CMVM, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 404.º do CdVM, decidiu ainda pela aplicação da sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as atividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, por 4 anos.
Está em causa a prática de oito contra-ordenações, todas elas qualificadas abstractamente pela lei como muito graves.
Por referência à R..., S.A, o Recorrente actuou sob a forma de dolo (eventual). Qaunto à situação da EI..., S.A, actuou de forma negligente, desconhecendo a prática das infracções.
Contudo, demonstrou uma verdadeira atitude de arrependimento pelos factos cometidos, ao prestar desculpas públicas, logo em 2014, pelas situações ocorridas.
As sanções acessórias são determinadas em função dos mesmos critérios que são respeitados na determinação da medida concreta das coimas, nos termos do artigo 405.º do CdVM. Deve assim ter-se em conta a ilicitude concreta dos factos, a culpa do agente, os benefícios obtidos, as exigências de prevenção, a situação económica e a conduta anterior do agente.
Importa, assim, neste momento, analisar se é de manter ou não a sanção acessória aplicada, valendo aqui as considerações acima expendidas sobre a possibilidade teórica de aplicação da sanção em apreço.
Ora, apesar do Recorrente estar incapacitado de prestar funções semelhantes às que prestava aquando da ocorrência dos factos em questão e de ter prestado desculpas institucionais, o que baixa em muito as exigências de prevenção especial, o certo é que, em sentido inverso e com um peso inquestionável importa reflectir sobre as exigências de prevenção geral. Essas exigências mostram-se muito elevadas, pelo que a sanção acessória aplicada pela CMVM se mostra adequada a fazer face a essas exigências, como efeito dissuasor da prática de actos como os que estão em causa.
Por outro lado, a gravidade das situações que se analisaram é muito elevada, com evidente mácula para a credibilidade do mercado financeiro, que se quer coeso e sólido, sendo certo que, por referência à situação da R..., S.A, o Recorrente actuou a título de dolo eventual.
Em suma, face ao tipo de contra-ordenações que estão em causa, que protegem directamente bens jurídicos relevantes, com assento constitucional, como a protecção do sistema financeiro como um todo e a protecção dos consumidores, na qualidade de investidores, a sanção acessória de inibição sobrevém como especialmente adequada, particularmente se percepcionada como sanção que acessoriamente promove a protecção de condições indispensáveis ao viver comunitário, viver esse que pode ser violentamente estremecido com a prática das contra-ordenações em apreço.
Assim, perante a própria natureza das infracções em causa, a sanção acessória de inibição aparece como verdadeiramente adequada e necessária.
Nestes termos, tendo em atenção tudo o que já se explicitou acerca da gravidade das infracções, da culpa do Recorrente, do número de infracções cometidas e das necessidades de prevenção, mormente geral, mostra-se totalmente adequado e proporcional a sanção acessória aplicada pela CMVM, como sendo inibição do exercício de funções de administração, direção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as atividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, fixando-se, contudo, pelo período máximo de 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da presente sentença.”
Concordamos inteiramente com a decisão tomada pelo tribunal a quo, salientando que os elementos argumentativos apresentados pelo recorrente foram devidamente ponderados, realçando-se, no entanto que, a gravidade das infrações cometidas e a culpa do agente, enquanto pressupostos gerais da aplicação de sanções acessórias, também mencionados no art. 21º do RGCO, desaconselham no caso concreto a revogação da sanção acessória aplicada, justificando-se a razoabilidade e proporcionalidade da referida sanção pelo facto de o recorrente ter cometido oito contraordenações qualificadas como muito graves, quatro delas a título de dolo eventual, sendo concretamente elevada a ilicitude e a culpa demonstrada pelo recorrente, a que acresce a elevadíssima exigência de prevenção geral negativa como já anteriormente afirmamos.
Improcede este segmento recursivo

Pelo exposto, improcedem totalmente os argumentos recursivos apresentados pelo recorrente, mantendo-se a sentença recorrida na parte que lhe diz respeito.
*
IV- Recurso de CC

1ª- Suspensão da execução da coima.
O Recorrente limitou o objecto do seu recurso à pretensão de suspensão da execução da coima única que lhe foi aplicada pelo tribunal a quo, tendo sustentado sob as Conclusões 4ª a 15ª que a mera ameaça da punição realiza os propósitos que o direito contraordenacional almeja prosseguir, devendo a sentença recorrida ser revogada na parte em que lhe negou a possibilidade de suspensão da coima e que seja substituída por outra que lhe conceda tal suspensão, por prazo que se tenha como compatível com as finalidades prosseguidas pelo ilícito de mera ordenação social.
Para o efeito, o Recorrente lançou mão dos seguintes argumentos:
1- em termos da gravidade objectiva e subjectiva da conduta sentenciada, se a decisão recorrida abrange, em cúmulo jurídico, coimas aplicáveis a várias infracções contraordenacionais, as mesmas relevam de dois núcleos essenciais de condutas homogéneas, atinentes, respectivamenete, às emissões EI..., S.A e R..., S.A, valoradas na dupla vertente da qualidade de informação e da salvaguarda do conflito de interesses;
2- trata-se de condutas de perfil omissivo nisso incluindo a que é imputada a título de dolo eventual;
3- releva também a circunstância de a actuação do ora recorrente se ter desenvolvido no quadro de uma relação de confiança relativamente a AA, que a própria decisão em causa considera que «baixa, embora de forma mitigada a culpa» e, de a sentença recorrida ter dado como provado que o ora recorrente não actuava no âmbito do “ramo financeiro” do G..., sim do ramo “não financeiro”, estando aquele a cargo de AA;
4- em termos de valoração da conduta global do ora recorrente, face à decisão administrativa proferida pela CMVM, na sentença recorrida verificaram-se quatro situações em que foi decretada a absolvição;
5- está factualmente adquirido na sentença que, ante o crash do G... e a necessidade de se proceder à sua reestruturação – a qual passou por uma nova arquitectura societária em que a R..., S.A assumiria a função de holding de topo do grupo, substituindo-se à EI..., S.A – o ora recorrente chamou a si a manutenção do cargo de Presidente do Conselho de Administração daquela, no que porfiou ante a debandada dos demais membros da administração, atitude do maior relevo porquanto demonstra vontade de garantir a continuidade do G... e, por essa forma, os interesses daqueles que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial em causa;
6- há que relevar a conduta do recorrente que acorreu ao aumento de capital da Ec..., S.A. [Ec..., S.A.] com o valor de três milhões de euros, dando de garantia o imóvel de sua residência ao Montepio, o qual viria a perder, ficando, assim, privado do local da sua própria habitação, tudo isto no quadro da reestruturação do G... e com o propósito de acorrer com meios financeiros líquidos necessários à sua sobrevivência e, como se disse, por essa forma, salvaguarda os interesses dos que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial;
7- o ora recorrente presentemente (i) não aufere rendimentos e (ii) tem o quinhão hereditário emergente da morte de um tio e de sua mãe, arrestado à ordem de um processo-crime no qual é arguido, estando assim privado de meios financeiros que lhe permitam o pagamento da coima;
8- o ora recorrente não tem antecedentes contraordenacionais;
9- em termos de critério de prevenção especial importa ter em consideração que o ora recorrente não desempenha qualquer função do tipo daquelas que teve a cargo, não só pelo que decorre da sanção acessória, como também em virtude de estar na prática e por razões reputacionais, a que este processo não é alheio, impossibilitado de levar a cargo qualquer actividade na área da administração de empresas, nomeadamente das que tenham actuação no mercado de capitais;
10- em termos de prevenção geral, vista a impossibilidade de o ora recorrente ter meios financeiros que lhe permitam pagar a coima em causa, por razões que a própria sentença recorrida aceitou, é alternativa ao perdurar de uma decisão punitiva inconsequente na sua eficácia, uma suspensão da sua execução que funcione como solene advertência e prevenção disuasória condutas futuras com a natureza da que está em causa.
Vejamos.
O Recorrente foi condenado pela prática de 8 contraordenações, quatro delas a título negligente e as outras quatro a título de dolo eventual, nos seguintes termos:
- condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 50.000,00 (cinquenta mil euros);
- condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de, em situação de conflito de interesses, agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista a punida nos termos do artigo 397.º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
- condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 60.000,00 (sessenta mil euros);
- condenado, a título negligente, nos termos do n.º 4 do artigo 401.º do CdVM, pela violação do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 100.000,00 (cem mil euros);
- condenado, pela violação, a título doloso, do dever de actuar de modo evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de um conflito de interesses, previsto no artigo 309.º, n.º 1, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 200.000,00 (duzentos mil euros);
- condenado, pela violação, a título doloso, do dever de, em situação de conflito de interesses,  agir de forma a assegurar aos clientes um tratamento transparente e equitativo, previsto no artigo 309.º, n.º 2, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
- condenado, pela violação, a título doloso, do dever de dar prevalência aos interesses dos seus clientes, previsto no artigo 309.º, n.º 3, do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a pática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 397º, n.º 2, alínea b), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros);
- condenado, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros);
- operado o cúmulo jurídico das coimas supra referidas, foi condenado na coima única conjunta de € 500.000,00 (quinhentos mil euros);
- mais foi condenado, na sanção acessória de inibição do exercício de funções de administração, direcção, chefia ou fiscalização e, em geral, de representação de quaisquer intermediários financeiros no âmbito de todas as actividades de intermediação em valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros (artigo 404.º, n.º 1, al. c), do CdVM), pelo período de 3 (três) anos, contabilizados desde o trânsito em julgado da decisão.
O art. 415º do CdVM prevê a suspensão, total ou parcial, da execução da coima a determinar pela CMVM, suspensão essa também aplicada na sentença recorrida quanto a outros dois Recorrentes, de forma parcial.
Independentemente da controvérsia sobre a admissibilidade ou não da suspensão da execução da coima em processo contraordenacional, face à omissão de tal regime no RGCO (contrariamente à suspensão da execução da pena prevista no art. 50º do CP), o regime especial das contraordenações do CdVM prevê a sua aplicação pela autoridade administrativa, pelo que, por maioria de razão deve a mesma poder ser aplicada pelo tribunal em sede de recurso judicial de impugnação, como o foi pelo tribunal a quo, relativamente a dois co-Recorrentes (Haitong Bank, SA e BB).
No caso em apreço, apesar de ter sido requerida pelo aqui Recorrente a suspensão da execução da coima em sede de recurso de impugnação judicial, foi-lhe negada tal possibilidade, constando da sentença recorrida, a esse propósito, o seguinte: (…) Apesar da ausência de antecedentes contra-ordenacionais, o certo é que não se pode olvidar o número de contra-ordenações cometidas, a gravidade das mesmas e de forma relevante, o facto de nunca ter o Recorrente exprimido qualquer tipo de arrependimento quanto às situações que estão em causa, nem mesmo em sede de audiência de discussão e julgamento, o que revela que ainda não interiorizou devidamente a ilicitude das suas condutas, pelo que julgo não estarem cumpridos os requisitos para a suspensão das sanções, inexistindo circunstâncias, quer anteriores, quer posteriores, que nos permitam concluir que a simples censura do facto e a ameaça da sanção realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. “
Como podemos ler do Ac RC de 11/3/2015, a propósito da suspensão da execução da pena, que se transpor, com as devidas adaptações à coima“(…) o que a lei visa com o instituto em termos de finalidade político-criminal “é o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer «correcção», «melhora» ou – ainda menos — «metanóia» das concepções da vida e o mundo (…) ou como porventura será preferível dizer, decisivo é aqui o «conteúdo mínimo» da ideia de socialização, traduzida na «prevenção da reincidência” (Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, § 519), sendo certo que, como se escreve no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Novembro de 1999, processo n.º 823/99 “não são considerações de culpa que interferem na decisão sobre a execução da pena, mas apenas razões ligadas às finalidades preventivas da punição, sejam as de prevenção geral positiva ou de integração, sejam as de prevenção especial de socialização, estas acentuadamente tidas em conta no instituto da suspensão, desde que satisfeitas as exigências de prevenção geral, ligadas à necessidade de correspondência às expectativas da comunidade na manutenção da validade das normas violadas”.
Podemos dizer que a suspensão da pena assenta na formulação de um juízo de prognose favorável quanto ao futuro comportamento do arguido, ou seja, na formulação de um juízo de que ele não praticará novos crimes.
Temos assim que na ponderação da personalidade do agente, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias do mesmo, o tribunal terá que ter em mente que a suspensão da execução da pena de prisão apenas poderá ser aplicada se sustentar e viabilizar os desígnios de prevenção especial — apoiando e promovendo a reinserção social do condenado — e geral — na perspectiva em que a comunidade não encare a suspensão, como um sinal de impunidade.”
As questões relacionadas com o grau de ilicitude e culpa foram essenciais para a determinação da sanção aplicável, conforme art. 405º do CdVM, devendo, quanto à questão da ponderação da suspensão da execução da coima e sua eventual medida, dar-se mais ênfase às condições pessoais do arguido e às exigências de prevenção especial e geral, por forma a alcançar, na medida do possível, um juízo de prognose positivo quanto à possibilidade de a simples censura do facto e a ameaça da sanção realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
 Deste modo, analisando os argumentos apresentados pelo Recorrente diremos que o grau de ilicitude e de culpa, o perfil omissivo da conduta, a pluriocasionalidade, a ponderação do grau de confiança depositado pelo recorrente no arguido AA, foram já tomados em consideração pelo tribunal a quo para a determinação das coimas parcelares e coima única, cujo valor foi reduzido de forma acentuada face aos valores da condenação proferida pela autoridade administrativa, devendo ser salientado que o recorrente não foi propriamente absolvido da prática de qualquer uma das contraordenações pelos quais havia sido sancionado, pois que o tribunal apenas o absolveu da prática dolosa das 4 contraordenações respeitantes à comercialização do papel comercial emitido pela EI..., S.A entre Setembro e Dezembro de 2013, para, simultaneamente, o condenar pelas mesmas 4 contraordenações  a título negligente-  as infrações cometidas mantiveram-se as mesmas, apenas passaram de dolosas para negligentes.
Relativamente aos aspectos tomados em consideração pelo tribunal a quo para a medida da coima,veja-se o que a esse propósito ficou consignado na sentença recorrida:
“Importa ainda aludir ao facto que a ilicitude concreta dos factos é tanto mais grave quando o intermediário financeiro deu prevalência aos interesses do próprio comparticipante CC.
Também não pode ser descurada a participação do Recorrente nos factos:
a) Assinou na qualidade de Administrador da EI..., S.A, as notificações da EI..., S.A ao BEl... para todas as emissões de papel comercial ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl...;
b) na qualidade de Administrador da EI..., S.A, assinou os rapports de gestion respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
c) na qualidade de Administrador da EI..., S.A, aprovou as contas individuais da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012;
d) participou na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de janeiro de 2014, que decidiu a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
e) participou activamente no processo decisório que levou à decisão de emissão de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A e respetiva colocação junto dos clientes do B..., de forma a assegurar à EI..., S.A e à R..., S.A os fundos necessários para proceder ao reembolso do papel comercial emitido por estas que estava colocado, até setembro de 2013, no fundo Elz..., bem como a manter os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... junto do grupo B..., e consequentemente a que o B... violasse as normas de conflitos de interesses em causa e prestasse informação sem qualidade aos investidores.
Por sua vez, também aumenta a ilicitude dos factos, o elevadíssimo número de investidores que estão em causa e que constam identificados nos anexos da decisão administrativa e o período de tempo em que foram prestadas informações sem qualidade aos clientes, o que implica uma potenciação de afectação dos interesses dos investidores que subscreveram o papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A e comercializado pelo B... e o regular funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e inerente perda de confiança nos mesmos.
Veja-se que quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial da EI..., S.A, a mesma decorreu entre Setembro e Dezembro de 2013 e quanto à prestação de informação sem qualidade sobre o papel comercial emitido pela R..., S.A, esta decorreu entre 9 de janeiro de 2014 e de 24 de fevereiro de 2014. Portanto, durante cerca de 3 meses em relação à EI..., S.A e durante cerca de dois meses em relação à R..., S.A.
Quanto ao grau de culpa, na situação da EI..., S.A o mesmo é mediano. Na verdade, importa referir que, apesar do Recorrente não conhecer a prática das contra-ordenações, certo é que se mostra provado que o mesmo não actuou com o cuidado que, objectivamente, lhe era imposto e devido, e de que era capaz, em ordem a evitar essa situação.
Quanto à situação da R..., S.A, o grau de culpa é elevado, pois molda-se a título de dolo eventual.
Para além do que fica dito, a culpa do Recorrente é aumentada por via do facto do Recorrente possuir, à data dos factos, elevada experiência profissional e conhecimento das áreas bancária e de intermediação financeira, em geral, e do B... em particular, bem conhecendo os especiais deveres relativos à atividade de intermediação financeira que sobre si recaíam, assim como os efeitos para os clientes e para o mercado em geral das suas condutas, o que aumenta as exigências de pautar a sua conduta pelos trilhos do direito.
Com efeito, o Recorrente CC era, à data dos factos, desde Março de 1994, administrador do B...; administrador da EI..., S.A, Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A; administrador da Es...; e membro do Conselho Superior do G....
Baixa, embora de forma mitigada, a culpa o facto de ter confiado sempre nas estratégias perfilhadas pelo Recorrente AA, que era um reputado profissional na área, apesar de tal não lhe anular a responsabilidade.
Em termos de benefícios obtidos com os factos, correspondem aos interesses que o Recorrente, assumindo as funções em órgãos sociais em várias entidades do G..., tinha, de captar para a EI..., S.A e para a R..., S.A os recursos dos clientes do B..., de forma a assegurar o financiamento da EI..., S.A e de todo o G....
Desconhece-se a realização de actos pelo Recorrente com vista à ocultação das infracções em causa, o que o beneficia.
(…)Ora, da pluralidade de ilícitos em causa resulta que estes foram cometidos em situações distintas, começando na decisão de emissão, colocação e comercialização do papel comercial de 04.09.2013, estendendo-se, quanto à EI..., S.A, até 04.12.2013 e, por referência à R..., S.A, sendo decidida a reestruturação do G... em 07.01.2014 e prosseguindo até 24 de Fevereiro de 2014. Por isso, não se está perante um caso de mera pluriocasionalidade.”
Deste modo, afigura-se-nos que para se aferir da oportunidade da suspensão da execução da coima deverá ser dada preponderância ao comportamento anterior e posterior do recorrente, às suas condições pessoais e, primordialmente às exigências de prevenção especial e de prevenção geral, tendo a esse propósito ficado consignado na sentença recorrida o seguinte:
“Desconhece-se a existência de actos destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
No que concerne às exigências de prevenção, consideramos, com Taipa de Carvalho, que "não cabem nas finalidades das sanções contra-ordenacionais as ideias de retribuição", pese embora se possa dizer que "as funções principais destas sanções são de dissuasão geral (prevenção geral negativa) e de dissuasão individual (prevenção especial negativa): dissuasão de todos os destinatários das respectivas normas; dissuasão do infractor condenado em relação à reincidência. Logo: funções prevenção negativa". Todavia, este Autor vê ainda a possibilidade das sanções contra-ordenacionais terem igualmente finalidades de prevenção positiva no sentido de promoveram a "consciencialização social comunitária" e "consciencialização social do próprio infractor" para a importância comunitária e/ou individual dos "valores ou bens jurídicos tutelados pelo direito de ordenação social" (vide Direito Penal, Parte Geral, Questões fundamentais. Teoria geral do crime, 3.ª ed., Lisboa: UCP, 2016, pág. 142, citado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2018, in Diário da República n.º 219/2018, Série I de 2018-11-14).
Assim, tendo em vista por um lado os bens jurídicos tutelados pelas normas violadas e o facto do Recorrente não ter antecedentes contra-ordenacionais, consideramos que as exigências de prevenção são acima do médio. Por um lado, aumenta as necessidades de prevenção a necessidade premente de dissuasão geral, já que estão em causa infracções que contendem com o correcto funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros e com os bens e interesses jurídicos em causa (a qualidade da informação, a prevenção e regular gestão de conflitos de interesses, os interesses e o património dos investidores). Assim as necessidades de prevenção geral são muito elevadas.
Por sua vez, consideramos que as exigências de prevenção especial são medianas no vertente caso.
Com efeito, o Recorrente não tem antecedentes contra-ordenacionais averbados, apesar de, contudo, nunca ter demonstrado arrependido relativamente aos factos em questão, nem mesmo em sede de audiência de discussão e julgamento, quando prestou declarações, refutando a sua responsabilidade, o que nos suscita a dúvida sobre a sua verdadeira consciencialização acerca do desvalor das condutas em causa nestes autos.”
Como vimos, a ausência de antecedentes contraordenacionais já foi devidamente tomada em consideração de forma positiva pelo tribunal a quo, quer na medida da coima, quer na análise da suspensão da execução da coima.
O recorrente argumenta ainda que chamou a si a manutenção do cargo de Presidente do Conselho de Administração da R..., S.A, no que porfiou ante a debandada dos demais membros da administração, demonstrando vontade de garantir a continuidade do G... e, por essa forma, os interesses daqueles que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial em causa, tendo, ainda, acorrido ao aumento de capital da Ec..., S.A. [Ec..., S.A.] com o valor de três milhões de euros, dando de garantia o imóvel de sua residência ao Montepio, o qual viria a perder, ficando, assim, privado do local da sua própria habitação, tudo isto no quadro da reestruturação do G... e com o propósito de acorrer com meios financeiros líquidos necessários à sua sobrevivência e, como se disse, por essa forma, salvaguardar os interesses dos que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial.
Apesar de alguns daqueles argumentos estarem em parte demonstrados no facto provado 791, não podemos esquecer que o recorrente ao praticar os factos ilícitos relatados nos autos, mormente os que contendem com conflitos de interesses na comercialização de papel comercial da R..., S.A, previu como possível que fosse dada prevalência aos seus próprios interesses, sendo administrador do B..., da EI..., S.A e da R..., S.A, relativamente aos dos clientes do B... e com isso se conformou, não podendo dizer-se desinteressada a atitude de salvaguardar e dar continuidade ao G... face ao interesse próprio na sua manutenção.
De todo o modo, nada consta nos factos provados quanto ao alegado propósito de ter actuado daquela forma para salvaguardar os interesses dos que tivessem sido lesados pelas emissões de papel comercial.
Quanto à valoração feita pelo tribunal a quo relativamente ao grau das exigências de prevenção especial e geral em apreço no caso concreto, com a mesma concordamos inteiramente, tendo sido sopesado, e bem, o facto do Recorrente não ter demonstrado, mormente até ao julgamento, qualquer tipo de arrependimento relativamente à prática das contraordenações, revelando não ter interiorizado devidamente a ilicitude das suas condutas, persistindo num comportamento de negação da autoria das mesmas.
Relativamente ao argumento apresentado pelo Recorrente de que não tem meios financeiros que lhe permitam o pagamento da coima, por não auferir rendimentos e, ter o quinhão hereditário emergente da morte de um tio e de sua mãe, arrestado à ordem de um processo-crime no qual é arguido, diremos que, o que ficou provado é que na data da sentença o recorrente não exercia actividade profissional, nem auferia rendimentos e, que em virtude de determinação proferida em processo crime no qual é arguido encontra-se arrestado o quinhão hereditário existente por morte de sua mãe e de um seu tio ( factos provados 790 e 792), não estando provado que esteja impossibilitado de trabalhar, que não tenha rendimentos, nem que que não tenha meios financeiros que lhe permitam o pagamento da coima, sendo certo que, mesmo o quinhão arrestado não deixa de ter valor e de fazer parte do seu património, desconhecendo-se o destino que terá em função do desfecho do processo-crime.
Não obstante, sopesando o passado isento de antecedentes contraordenacionais e, o tempo entretanto decorrido entre a prática das referidas contraordenações e o presente ( mais de 8 anos) sem termos conhecimento de novas infrações, o contexto em que as mesmas foram cometidas que dificilmente se repetirá e, mesmo o facto de neste recurso o recorrente apenas questionar a possibilidade de suspensão da execução da coima, assumindo de alguma maneira assentimento à sanção que lhe foi fixada (bastante reduzida face à inicialmente determinada pela CMVM), bem como, ponderando a decisão tomada quanto ao co-recorrente BB a quem foi suspensa a execução de metade da referida coima, existindo similitude quer das contraordenações, quer do montante da coima única em que foi condenado, afigura-se-nos justo, adequado e equitativo, deferir, embora em termos também parciais, o pedido de suspensão da execução da coima formulado pelo aqui recorrente.
Porém, tal como fizemos menção aquando do conhecimento do recurso interposto por aquele recorrente BB, afigurando-se-nos elevadas e prementes as exigências de prevenção geral, que impõem coimas dissuasoras de comportamentos violadores dos interesses públicos no regular funcionamento dos mercados financeiros pelos demais agentes, seria absolutamente inadequada a suspensão total da execução da coima, que num caso desta gravidade poderia levar a comunidade a encarar a suspensão total como um sinal de impunidade, concluindo-se, pois, que a suspensão do pagamento da coima na sua totalidade não seria susceptível de acautelar as mencionadas exigências de prevenção geral.
Sem prejuízo da importância que o respeito pelas normas violadas representa para a confiança no regular funcionamento dos mercados financeiros, ponderadas as circunstâncias do caso concreto, considera-se que a aplicação efectiva parcial da coima aplicada revelar-se-á suficiente para responder às necessidades preventivas especiais e gerais, num juízo de prognose favorável quanto ao seu comportamento futuro, concedendo-se ao recorrente a oportunidade de conformação da conduta futura com as exigências legais de atuação nos mercados financeiros, no sentido de orientar a sua conduta para o cumprimento das normas legais aplicáveis á actividade que eventualmente venha a desenvolver nessa área ou noutra qualquer.
Relativamente ao co-recorrente BB, para a decisão da suspensão da execução da coima em metade do seu valor tomada pelo tribunal a quo, pesou o facto de ter, logo em 2014, pedido desculpas públicas institucionais aos clientes do B..., não escamoteando a gravidade e reconhecimento das implicações graves da actuação do B... para os investidores,  no entanto, condicionar a suspensão ao aqui recorrente mediante um pedido de desculpas, como parece ser a posição assumida pelo Ministério Público, seria neste momento inconsequente e traduzir-se-ia num mero cumprimento de um formalismo, quando a sua mais valia relativamente ao recorrente BB decorreu da espontaneidade e ocasião temporal contemporânea aos acontecimentos, a qual não é mais possível.
Deste modo, ponderando todos os factores em causa, entendemos que a execução imediata de €350.000,00 (trezentos e cinquenta mil euros) da coima única aplicada ao Recorrente, e a suspensão da execução do remanescente de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros) pelo período de três anos, será suficiente e adequado para que o Arguido fique ciente da censura do facto e para que a ameaça do remanescente da sanção realizem de forma adequada as finalidades da punição das contraordenações pelas quais foi sancionado e prevenção de eventuais infrações futuras deste recorrente e para retração comportamental dos demais agentes dos mercados financeiros em matérias de idêntica natureza.
Deste modo, procede, em parte, o recurso interposto pelo aqui recorrente, suspendendo-se parcialmente a coima única aplicada ao recorrente, pelo montante de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pelo período de 3 (três) anos.
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V- Recurso de DD

1ª- Vícios processuais:
1.1- Nulidade da sentença por insuficiente fundamentação e carácter subsidiário da baixa do processo.
Sob a Conclusão 3ª o Recorrente sustenta que a sentença recorrida padece de nulidade por insuficiente fundamentação, nos termos concatenados nos artigos 374º n.º 2 do CPP e 379º n.º 1 alínea a) do CPP, por o Tribunal a quo ter omitido a fundamentação quanto aos factos provados 632, 633 e 642 (no que concerne à comercialização do papel comercial da R..., S.A), não permitindo reconstituir o processo lógico-racional por si seguido nem alcançar a perceção das razões pelas quais decidiu dessa maneira.
O art. 379º nº 1 al. a) do CPP comina com nulidade a sentença que não contiver as menções referidas no nº 2 e no nº 3 al. b) do art. 374º do CPP.
Segundo o art. 374º nº1 e 2 do CPP a sentença começa com um relatório que contém as indicações mencionadas no nº 1 e, ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto posssível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
No caso em apreço está invocada a falta de fundamentação relativamente a três factos dados como provados: factos 632, 633 e 642.
Os factos em análise são os seguintes:
- O B..., através dos seus departamentos comerciais, divulgou junto dos clientes que subscreveram, entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de Janeiro de 2014 e 16 de Janeiro de 2014, as quais continham a informação que se deu como provada supra ( facto provado 632);
- O B... não informou os clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 que a R..., S.A iria adquirir ou que tinha adquirido ( ), com efeitos a 31 de dezembro de 2013, uma participação qualificada de 49,26% da E..., S.A (facto provado 633);
- Na comercialização do papel comercial quer da R..., S.A, quer da EI..., S.A, o B... limitou-se sempre a prestar aos seus clientes a informação que constava vertida nas respectivas Notas Informativas (facto provado 642).
A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o disposto no art. 97º nº 5 do CPP, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
Porém, como é entendimento pacífico da Jurisprudência e Doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. a) do n.º 1 do citado art. 379º do CPP.
A mera fundamentação deficiente, incompleta, não convincente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz a sua nulidade. 
A propósito da relevância da fundamentação do acto decisório, refere Alberto dos Reis, que “As partes precisam de ser elucidadas a respeito dos motivos da decisão. Sobretudo a parte vencida tem o direito de saber por que razão lhe foi desfavorável a sentença; e tem mesmo necessidade de o saber, quando a sentença admita recurso, para poder impugnar o fundamento ou fundamentos perante o tribunal superior. Este carece também de conhecer as razões determinantes da decisão, para as poder apreciar no julgamento do recurso.
Não basta, pois, que o juiz decida a questão posta; é indispensável que produza as razões que apoiam o seu veredicto. A sentença, como peça jurídica, vale o que valerem os seus fundamentos. “ 
Também a propósito da fundamentação da decisão, ensina Anselmo de Castro, que a fundamentação “está ligada ao princípio da livre convicção do juiz, entendido tal princípio não como uma pura convicção íntima e imotivada, mas antes como uma convicção motivada, lógica e racional. Livre convicção não significa desrespeito de toda a lógica, de todo o motivo discursivo.
De outra forma, a livre convicção era susceptível de redundar em puro arbítrio, pois o juiz, sabendo-se desligado da obrigação de motivar as suas decisões, seria naturalmente conduzido a deixar de auto-controlar-se. “
E prossegue, ainda, este último Ilustre Professor “Há ainda que ter em conta os destinatários da sentença que, aliás, não são só as partes, mas a própria sociedade. Para que umas e outras entendam as decisões judiciais, e não as sintam como um acto autoritário, importa que as sentenças e as decisões se articulem de forma lógica. Uma decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos. E, embora a força obrigatória da sentença ou despacho esteja na decisão, sempre a força se deve apoiar na justiça. Ora os fundamentos destinam-se precisamente a formar a convicção de que a decisão é conforme à justiça. “ 
Dito isto, e tendo, pois, por assente a exigência de fundamentação da sentença ou de qualquer outro acto decisório (que não seja de mero expediente), não é, todavia, qualquer eventual vício ao nível da fundamentação que conduz à nulidade da sentença.
Desde logo, como salientam quer Alberto dos Reis, quer A. Varela, não basta para que exista falta de fundamentação de facto e/ou de direito que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta ou não convincente; é preciso que haja falta absoluta ou total de fundamentação, seja de facto, seja de direito. 
Assim sendo, para que haja falta de fundamentação, enquanto causa de nulidade da sentença, é necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão, ou, ainda, quanto aos fundamentos de direito, que o juiz não explicite as razões jurídicas que servem de apoio à solução por si adoptada. 
Estes ensinamentos, apesar de expressos relativamente a sentenças de natureza cível, às quais se aplica o disposto no art. 615º nº 1 al. b) do CPC, são transponíveis para as sentenças de natureza crime/contraordenacional, face à similitude dos fundamentos consagrados no art. 379º nº 1 al. a) do CPP ex vi do art. 374º nº 2 do CPP.
Perante o antes exposto, em face da decisão recorrida, afigura-se-nos inegável que no caso em apreço não ocorre falta de fundamentação, uma vez que na sentença recorrida foram devidamente discriminados os factos que o Juiz a quo julgou provados e não provados, bem como foram devidamente especificados os fundamentos jurídicos subjacentes à sua decisão.
A discordância do Recorrente quanto à decisão recorrida, que apelida de nulidade por insuficiente fundamentação, assente no alegado desconhecimento de qual a convicção do tribunal a quo na tomada de decisão final quanto aos factos dados como provados sob os nºs 632, 633 e 642, para além de não constituir falta absoluta de fundamentação geradora de nulidade, também não tem razão de ser, porquanto o tribunal a quo motivou a sua convicção relativamente aos factos dados como provados e não provados, especificando os meios probatórios que a isso conduziram, fazendo uma análise global e crítica da prova produzida, ainda que possa não o ter feito de forma muito pormenorizada e expressa relativamente a cada um dos factos e, designadamente quanto àqueles factos em concreto, uma vez que os agrupou e consignou a motivação, umas vezes pelo número do facto, outras pelos títulos e subtítulos dos factos agrupados, sendo que, em todo o caso, consta uma exposição tanto quanto posssível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto que fundamentam a decisão, tal como impõe a lei, devendo analisar-se a motivação de facto no seu todo, que no caso em apreço foi muito extensa e exaustiva, uma vez que vários factos reportam-se à mesma matéria e mereceram uma fundamentação unitária, não impondo a lei uma resposta detalhada a cada um dos factos dados como provados, desde que se depreenda com relativa facilidade os argumentos e a convição do tribunal que o conduziram àquela decisão de facto.
E foi isso mesmo o que se passou com os factos provados 632, 633 e 642, isto é, tais factos constam de um elenco mais alargado que engloba os factos provados 603 a 639, sob o título “Outros factos com relevo para a boa decisão da causa: -Da actuação do B... enquanto intermediário financeiro”, sendo que a motivação referente a esse conjunto de factos consta expressamente da sentença recorrida precisamente sob o mesmo nome, da qual se pode extrair com clareza que os factos 632, 633 e 642 foram devidamente fundamentados nas provas aí mencionadas e com a devida análise crítica da prova.
A esse propósito, salientamos o seguinte trecho:
“Quanto à actuação do B..., importa esclarecer que, apesar do mesmo não ser Recorrente nos autos, o certo é que a sua actuação, na qualidade de intermediário financeiro, tem implicações para a responsabilidade contra-ordenacional de cada Arguido, conforme será demonstrado em sede da motivação de direito.
Apesar de considerarmos que a esmagadora maioria dos factos que, nesta secção, se encontram vertidos, já se mostram devidamente motivados, tendo o tribunal vertido os motivos em que assentou a sua convicção, também consideramos que importa aflorar certos pormenores que enfatizam a convicção do tribunal.
Em primeiro lugar, importa referir que as testemunhas VVVVV, TT e WWWWW atestaram que, de facto, o B..., através dos seus departamentos comerciais, disponibilizou junto dos clientes que subscreveram, entre Setembro e Dezembro de 2013, papel comercial emitido pela EI..., S.A, as Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A, as quais continham informação nos moldes já apurados, cingindo-se a informação prestada aos clientes àquela que constava dessas Notas Informativas (vide facto provado n.º 642)
Por seu turno, também se considerou provado que para além do teor omisso das Notas Informativas, o B... não prestou aos seus clientes que subscreveram papel comercial da EI..., S.A, aquando da comercialização, informação sobre os montantes totais da dívida titulada, do passivo e do capital próprio da EI..., S.A respeitantes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, nem quanto ao aumento do passivo da EI..., S.A nos primeiros nove meses do ano de 2013, na medida em que, como já acima analisámos, até aos trabalhos respeitantes ao ETRICC2 estavam em causa informações desconhecidas dos que colaboravam no B..., com excepção do Recorrente AA, pelo que, de acordo com máximas de experiência comum, logo se conclui que os comerciais do B..., ao desconhecerem a informação relevante em causa, não poderiam tê-la prestado aos clientes.
Para além disso, tratam-se de factos que foram ainda confirmados pelas mesmas testemunhas VVVVV, TT e WWWWW, os quais esclareceram o procedimento seguido pelos comerciais do B... na comercialização do papel comercial, resultando de tais elementos probatórios que, no que respeita à informação prestada sobre o emitente, a mesma se limitava à divulgação da nota informativa em vigor à data da subscrição e fichas técnicas. Como já verificámos, as Notas Informativas (bem como as fichas técnicas) eram omissas quanto à questão dos problemas do passivo da EI..., S.A.
Também foi considerado provado que o B... decidiu, através dos Recorrentes AA, BB, (administradores comuns do B... e da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) e CC (administrador comum do B..., da EI..., S.A e da R..., S.A), que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a comercializar e colocar diretamente junto dos clientes do B..., de forma a substituir o papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A colocado no fundo Elz... até Agosto de 2013 e permitir o seu reembolso, mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B....
Voltamos, nesta sede, a repisar na prova que foi produzida e que atesta o provado e que, em síntese, decorre do documento relativo à apresentação “ALCO – Evolução dos Recursos de Clientes” (a fls. 2280-2298, 5525-5543 e 7174-7192) e da respetiva Ata da Reunião do Comité ALCO de 4 de setembro 2013 (a fls. 2290-2303, CD de fls. 4537, a fls. 5477-5481, CD de fls. 6959, 7169-7173, 17863-17872), da Ata da Reunião da Comissão Executiva do B... de 02.10.2013 (fls. 2304-2304v e documento “Livro 81”, p. 78 e s., integrado no CD de Fls 4537\Oficio ...16\Ponto 1\Atas CE), da Ata Reunião do Conselho de Administração da EI..., S.A de 28.10.2013 (fls. 3737-3738), dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o BEl... e o B... (fls. 3658-3672, documento “...49 - Contrato de Colocação Papel Comercial EI..., S.A (AC Dr.ª XXXXX)”, integrado no CD de Fls 1674, fls. 1889-1952 e 3673-3685), das notificações da EI..., S.A ao BEl... para todas as emissões de papel comercial ao abrigo dos Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl... (CD de fls. 2317, fls. 2366, 2340, 2403, 2449, 2475, 2513, 2551, 2559, 2581, 2590, 2614, 2642, 2670, 2733, 2762, 2788, 2809, 2840, 2864, 2897, 2923, 2946, 2967, 3003, 3054, 3075, 3106, 3138, 3184, 3209, 3238, 3272, 3308, 3336, 3370, 3397, 3433, 3457, 3477, 3502, 3532, 3562, 3581, 3622 e 3657), do Relatório de Governo da Sociedade do B... de 2013 (a fls. 190-243), do Relatório Anual de Governo da Sociedade do B... de 2014 (a fls. 2100-2140), do Relatório Anual da EI..., S.A de 2012 (a fls. 2100-2140), do Relatório Anual da R..., S.A de 2012 (a fls. 7781-7827), no Relatório Anual da R..., S.A de 2013 (a fls. 7912-7972), prova esta documental conjugada com os depoimentos prestados pelas testemunhas UU, YY, TT, LLLLL, NN, HHHHH e III.
A conjugação destes meios de prova, todos eles coerentes entre si, no que toca a este grupo de factos, permite concluir, nos moldes que se deram como provados.
Na verdade, da prova resulta que, na decorrência de discussões havidas no Comité ALCO do B... e no Conselho de Administração da Epi..., S.A, onde se discutiu o impacto da publicação do NRJOIC no fundo Elz..., foi decidido pelo B..., através do seu Comité ALCO, que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a comercializar e colocar directamente junto dos clientes do B..., de forma a substituir e permitir o reembolso do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A colocado no fundo Elz... até Agosto de 2013, mantendo os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... no universo do grupo B....
Os Recorrentes AA, BB (administradores comuns do B... e da EI..., S.A, acionista única da R..., S.A) e CC (administrador comum do B..., da EI..., S.A e da R..., S.A), na qualidade de administradores do B..., participaram activamente neste processo decisório, pelo que contribuíram para a decisão de que a EI..., S.A e a R..., S.A deveriam proceder à emissão de papel comercial, a comercializar e colocar directamente junto dos clientes do B....
Com efeito, tal como já acima mencionado, a comercialização e colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A foi aprovada em sede de Comité ALCO do B..., a quem competia aprovar a oferta de produtos de recursos e os respetivos preços a praticar, sendo certo, que naquele Comité participaram os Recorrentes AA e BB – vide Relatório de Governo Societário do B... de 2013 (a fls. 190-243, maxime 201 e a fls. 550-603, maxime 561), Relatório de Governo Societário do B... de 2014 (a fls. 520-549, maxime 525v), na norma interna do B... “NG – 00003/2011 – Sistemática da Coordenação das Reuniões e Comités do G...” (correspondente ao documento “2011.01.26 NG 0003_2011”, p. 8, integrado no CD de Fls 4537\Oficio 14072016\Ponto 3 e a fls. 5756-5762, maxime 5759v e 5761v e 6006v-6013, maxime 6010v e 6012v) e convocatórias para as reuniões do Comité ALCO (constantes de CD de Fls 4537\Oficio 14072016\Ponto 2).
O impacto da aprovação do NRJOIC no fundo Elz... foi discutido, nas reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A e nas reuniões do Comité ALCO do B... a partir do início do Verão de 2013, ainda antes da publicação daquele diploma legal,. Nas primeiras participaram nomeadamente o Recorrente AA (Presidente da Comissão Executiva do B..., Administrador da EI..., S.A e Presidente do Conselho de Administração da Epi..., S.A – sociedade que detinha a Epi..., S.A, sociedade gestora do fundo Elz...) e o Recorrente BB (Administrador Executivo do B..., Administrador da EI..., S.A e membro do Conselho de Administração da Epi..., S.A), sendo que a transferência da colocação do papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A do fundo Elz... para os clientes do B..., permitiu que os recursos dos clientes que detinham unidades de participação do fundo Elz... se mantivessem no universo do grupo B..., como asseverado pelas já identificadas testemunhas.
Na sequência das reuniões do Conselho de Administração da Epi..., S.A e das discussões havidas no Comité ALCO a partir do início do Verão de 2013 sobre o impacto do NRJOIC no fundo Elz..., a colocação de papel comercial emitido pela EI..., S.A e pela R..., S.A nos clientes do B..., foi aprovada na reunião do Comité ALCO de 4 de setembro de 2013 – vide apresentação “ALCO – Evolução dos Recursos de Clientes”, a fls. 2280-2298, maxime 2288-2289v, 5525-5543, maxime 5533-5534, 7174-7192, maxime 7182v-7183v, à respetiva Ata da Reunião do Comité ALCO de 4 de setembro 2013, a fls. 2290-2303, maxime 2301v, CD de fls. 4537, a fls. 5477-5481, maxime 5479v, CD de fls. 6959, 7169-7173, maxime 7171v, 17863-17872, maxime 17868, de onde consta a oferta de papel comercial a ser comercializada pelo B... durante o mês de Setembro de 2013, assim como do Relatório de Auditoria do DAI do B... à colocação de papel comercial G... junto de clientes B... através da sua rede comercial de 25.06.2014, constante dos autos a fls. 7364-7476, maxime 7380.
Naquela reunião estivera, presentes, nomeadamente, os Recorrentes AA e BB – vide Ata da Reunião do Comité ALCO de 4 de setembro 2013, junta a fls. 17863-17872, maxime 17868.
Por sua vez, a acta da reunião do Comité ALCO de 4 de setembro de 2013, que integrava os suportes, em formato powerpoint, das apresentações realizadas pelos participantes na referida reunião, foi ratificada pela Comissão Executiva do B..., realizada em 2 de outubro de 2013, na qual esteve presente designadamente o Recorrente BB – vide Ata da Reunião da Comissão Executiva do B... de 02.10.2013, a fls. 2304-2304v e documento “Livro 81”, p. 78 e s., integrado no CD de Fls 4537\Oficio ...16\Ponto 1\Atas CE dos autos.
Por seu turno, o Recorrente CC, igualmente administrador do B..., assinou, na qualidade de Administrador da EI..., S.A, os Contratos de Organização e Colocação de Papel Comercial celebrados entre a EI..., S.A, o B... e o BEl..., bem como as notificações da EI..., S.A ao BEl... para todas as emissões de papel comercial ao abrigo dos referidos contratos, conforme consta dos referidos contratos a fls. 3658-3672, maxime 3666v, bem como das referidas notificações a fls. 2317 (CD), 2366, 2340, 2403, 2449, 2475, 2513, 2551, 2559, 2581, 2590, 2614, 2642, 2670, 2733, 2762, 2788, 2809, 2840, 2864, 2897, 2923, 2946, 2967, 3003, 3054, 3075, 3106, 3138, 3184, 3209, 3238, 3272, 3308, 3336, 3370, 3397, 3433, 3457, 3477, 3502, 3532, 3562, 3581, 3622 e 3657.
À data da decisão tomada pelo B... no sentido de a EI..., S.A e de a R..., S.A emitirem papel comercial a comercializar e colocar nos clientes do B..., os Recorrentes AA e BB, eram administradores comuns do B... e da EI..., S.A (acionista única da R..., S.A) e CC era administrador comum do B..., da EI..., S.A e da R..., S.A (vide Relatórios Anuais de Governo da Sociedade do B... de 2013 e de 2014, juntos a fls. 190-243, maxime 196v e 197 e 520-549, maxime 525v e 526, o Relatório Anual da EI..., S.A de 2012, junto a fls. 2100-2140, maxime 2124 e o Relatório Anual da R..., S.A de 2013, junto a fls. 7912-7972, maxime 7917).
A R..., S.A tinha como acionista única a EI..., S.A (vide Relatório Anual da R..., S.A de 2012, a fls. 7781-7827, maxime 7784v) e não dispunha de autonomia de tesouraria quer ao nível da definição das suas fontes de financiamento, quer ao nível da aplicação dos seus excedentes de tesouraria, sendo a gestão da sua tesouraria tratada ao nível da EI..., S.A, pela equipa chefiada por JJJ, tal como decorreu dos depoimentos uníssonos nessa sede prestados por LLLLL, NN e HHHHH.
Dos igualmente inissonos depoimentos das testemunhas NN, LLLLL, HHHHH e III decorre também que os administradores executivos da R..., S.A, LLLLL e NN e o presidente e o vice-presidente do conselho de administração da R..., S.A, respetivamente CC, que representava no Conselho de Administração da R..., S.A, a acionista única EI..., S.A, e HHHHH tinham reuniões quinzenais, nas quais o CFO da R..., S.A, NN, apresentava a posição de tesouraria da R..., S.A.
Neste conspecto, dos depoimentos das citadas testemunhas decorre também que a EI..., S.A, para além de deter a totalidade do capital da R..., S.A, também geria, de facto, a tesouraria desta sociedade, fazendo-se representar, formalmente, pelo Recorrente CC (administrador da EI..., S.A) no Conselho de Administração da R..., S.A. Com efeito, era JJJ e a sua equipa quem geria a tesouraria da EI..., S.A, sendo que o Recorrente CC participava em reuniões quinzenais com o CFO da R..., S.A, NN, nas quais este apresentava a posição de tesouraria da R..., S.A, pelo que, sob o ponto de vista financeiro, acaba por ser a EI..., S.A, num prisma de tesouraria centralizada, quem geria efetivamente a R..., S.A.
Tendo em vista tudo o que vem dito, tal permite concluir que os Recorrentes AA e BB, administradores do B... e da EI..., S.A (que era acionista única da R..., S.A) e CC decidiram, na qualidade de administradores do B..., que a EI..., S.A e a R..., S.A que deveriam emitir papel comercial a colocar pelo B... junto dos seus clientes.
Apesar dos Recorrentes defenderem que não decidiram a colocação de papel comercial pela EI..., S.A e R..., S.A, na medida em que tal se tratou de um processo com a intervenção de vários departamentos e pessoas que nem sequer a eles reportavam, o certo é que independentemente da participação de diferentes departamentos ou unidades orgânicas e de diferentes pessoas no processo de emissão e colocação de papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, os Recorrentes em apreço participaram no respetivo processo decisório, participando quer em sede da reunião onde se decidiu a colocação e comercialização do papel comercial (os Recorrentes AA e BB), quer depois na formalização de contratos necessários para levar a efeito a decisão tomada (o Recorrente CC).
Por outro lado, também as testemunhas VVVVV, TT e WWWWW atestaram de forma coerente entre si, em moldes semelhantes aos já referidos a propósito da situação da EI..., S.A, que o B..., através dos seus departamentos comerciais, divulgou junto dos clientes que subscreveram, entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de janeiro de 2014 e 16 de janeiro de 2014, as quais continham informação nos termos dados como provados. Na verdade, de acordo com as testemunhas e conforma já elucidado acima, a informação prestada aos clientes que subscreviam papel comercial emitido pela R..., S.A consistia exclusivamente na que constava das Notas Informativas e das fichas técnicas, as quais eram divulgadas aquando da comercialização.
Ora, da mera análise das Notas Informativas em causa (a de 06.01.2014 e a de 16.01.2014) (Nota Informativa de 06.01.2014 consta do documento pdf “Notas Informativas” integrado no CD de fls. 6959\PCRFI_CMVM_Ponto 2\Ponto 2.i, vide ainda fls. 140-151v; 6081;; 7081-7827; 8953-8964v; fls. 7129-7154; fls. 7129-7154), compaginada com a Nota Informativa que depois nem sequer foi disponibilizada aos clientes, datada de 14.02.2014, resulta uma total ausência de informação sobre o os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível do “Risco Cambial”, do “Risco de Preço”, do “Risco de Taxa de Juro”, do “Risco de Crédito”, do “Risco Operacional” e do “Risco de Liquidez” (os quais constam da Nota Informativa de 14 de fevereiro de 2014), sendo certo que essa aquisição foi decidida pelo Conselho Superior do G..., em 7 de janeiro de 2014, no contexto da reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações. Se as informações disponibilizadas as clientes se cingiam àquelas que constavam das Notas Informativas e Fichas Técnicas, logo facilmente se concluiu que nenhuma informação acerca da emitente do papel comercial (a R..., S.A) foi prestada aos clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela mesma para além daquela que constava das Notas Informativas.
Decorreu ainda do depoimento de KK que o B... reviu as Notas Informativas elaboradas pelo BEl....”
Essa fundamentação contém os elementos suficientes para que o recorrente apreenda os meios de prova em que o tribunal se baseou para dar aqueles factos 632, 633 e 642 como provados- também quanto à comercialização do papel comercial da R..., S.A- e a análise crítica efectuada pelo tribunal a quo a esse propósito.
Mas mais, aqueles factos, tal como o tribunal acima consignou, já haviam sido exaustivamente motivados anteriormente, pois que estavam relacionados nomeadamente com os factos 452 a 464 dados como provados, salientando-se que os factos 457 e 458 dados como provados referem a mesma matéria de facto, deles constando expressamente que “Das notas informativas disponibilizadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A, entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, não constam, devendo constar, os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível da descrição da actividade da Emitente, nem ao nível da descrição dos sectores de actividade em que a R..., S.A investia (facto 457);
Em suma, as notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 contêm informação que:
a. não contém a referência à participação qualificada detida pela R..., S.A na E..., S.A, nem ao sector de actividade dos “Sectores Financeiros”, em que esta participada da R..., S.A actuava;
b. não descreve todas as actividades da R..., S.A nem todos os sectores de actividade (omitindo o sector de actividade dos “Serviços Financeiros) em que a mesma investia à data da emissão do papel comercial, nem à data da comercialização do papel comercial junto dos clientes do B...; e
c. não contém a descrição de todas as actividades da emitente e todos os sectores de actividade em que a mesma investia (facto 458);
Das notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial emitido pela R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não consta uma advertência de que existem alterações significativas e materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49,26% do capital social da E..., S.A (facto 463);
Em suma, as notas informativas divulgadas aos clientes do B... que subscreveram papel comercial da R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 contêm informação que:
a. não contém uma advertência de que existem alterações materiais às demonstrações financeiras delas constantes, decorrentes da aquisição da participação de 49, 26% do capital social da E..., S.A;
b. não reflecte a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A e, consequentemente a real situação financeira e patrimonial da sociedade à data da emissão do papel comercial, nem à data da sua comercialização junto dos clientes do B... (facto 464).”
A motivação dessa matéria de facto já constava na Subsecção II- A informação respeitante ao papel comercial da R..., S.A prestada pelo B... aos clientes que o adquiriram entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 ( factos provados 447 a 451), bem como sob o títulos a) Da informação respeitante aos riscos relacionados com a Emitente e a respectiva actividade ( factos provados 452 a 454); “b) Da informação sobre a Emitente e a sua actividade (factos 455 a 458) e c) Da informação sobre as Demonstrações Financeiras Consolidadas e Individuais da Emitente ( factos 459 a 464) e, já anteriormente o tribunal a quo havia feito constar da motivação da matéria de facto as razões que determinaram que considerasse ter ficado provado que na comercialização do papel comercial quer da R..., S.A, quer da EI..., S.A, o B... limitou-se a prestar aos seus clientes a informação vertidas nas respectivas Notas Informativas, manifestamente desfasada da realidade economico-financeira das emitentes e da qual não constavam os impactos da aquisição pela R..., S.A da participação da E..., S.A com efeitos retroativos a 31/12/2013, aludindo que, “Aliás, foi produzida prova credível em como as informações que eram prestadas se cingiam às informações que constavam das Notas Informativas e fichas técnicas, como infra se demonstrará”, demonstração que consta da articulação da motivação exarada na sentença recorrida lida de forma completa e não truncada, como o fez o recorrente.
Da própria argumentação do Recorrente em sede do recurso interposto, resulta que o que está em causa não é uma falta (absoluta) de fundamentação de facto da sentença, mas uma alegada insuficiência quanto aos argumentos que estiveram na base da decisão de serem considerados provados os referidos factos 632, 633 e 642.
Não obstante, em face do acima dito, não se compreende a invocação pelo recorrente da insuficiente fundamentação daqueles factos, a não ser que tenha feito uma leitura apressada e pouco séria da sentença recorrida, a qual contém, manifestamente, quer os fundamentos de facto, quer as razões jurídicas (fundamentos de direito) pelos quais o Tribunal a quo julgou o litígio, que alicerçam e justificam o sentido decisório a que chegou, de condenação do recorrente.
De todo o modo, a nulidade da sentença por falta absoluta de fundamentação de facto e/ou de direito não se confunde com o erro de julgamento, isto é, com o erro na apreciação ou subsunção jurídica do quadro factual tomado em consideração pelo julgador ou com uma insuficiente motivação da fundamentação dos meios de prova que determinaram a convicção do juiz relativamente a determinados factos e, mesmo esta, como vimos, manifestamente não ocorre.
Em conclusão, a sentença recorrida não enferma de qualquer falta de fundamentação de facto para efeitos do preceituado no art. 379º nº 1 al. a) do CPP, improcedendo o recurso nesta parte.

2ª- Vícios do art. 410º nº 2 do CPP:
O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. os artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2 e 410º, n.º 2, als. a), b) e c) do Código de Processo Penal).
Estando em causa o recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75º n.º 1 do DL n.º 433/82, de 27/10 (RGCO) estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal de 2ª instância apenas conhece de matéria de direito.
Apesar de este Tribunal da Relação não poder reapreciar a matéria de facto julgada pelo Tribunal recorrido, pode tomar conhecimento das nulidades previstas no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, segundo o qual “mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
 a) a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
 c) erro notório na apreciação da prova.
“A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no art. 410º nº 2 do CPP, no qual se convencionou chamar de «revista alargada»; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o art. 412º nº 3, 4 e 6 do mesmo diploma; No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do nº 2 do referido artigo 410º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras de experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como por exemplo quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento(…).”
Uma vez que, no âmbito deste recurso de sentença que conheceu de impugnação judicial de uma decisão administrativa proferida em processo de contraordenação, o disposto no artigo 75º n.º 1 do DL n.º 433/82, de 27/10 (RGCO) estabelece que, em regra, e salvo se o contrário resultar do diploma, este Tribunal de 2ª instância apenas conhece de matéria de direito, a eventual sindicância da matéria de facto terá de resultar da procedência de algum dos referidos vícios previstos no art. 410º nº 2 do CPP e como tal resultar do texto da sentença recorrida.
Tal como se extrai do referido preceito legal, aqueles vícios tem de resultar do texto da decisão recorrida e não de elementos processuais a ela estranhos, ainda que produzidos no âmbito da discussão judicial do caso, designadamente depoimentos testemunhais ou documentos particulares, pelo que, a insuficiência da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação, ou contradição entre a fundamentação e a decisão e, o erro notório na apreciação da prova, devem resultar de per si do texto da decisão recorrida e ser analisados em função do aí consignado, conjugado com as regras de experiência comum.
“Por isso, fica excluída da previsão do preceito toda a tarefa de apreciação e ou valoração da prova produzida, em audiência ou fora dela, nomeadamente a valoração de depoimentos, mesmo que objecto de gravação, documentos ou outro tipo de provas, tarefa reservada para o conhecimento do recurso em matéria de facto” , objecto de recurso que em matéria contraordenacional está excluído do Tribunal de 2ª instância, conforme decorre do referido art. 75º nº 1 do RGCO.
 
2.1- Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Sob a Conclusão 4ª o Recorrente sustenta que a sentença recorrida padece ainda de quatro insuficiências para a decisão da matéria de facto provada, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, por o Tribunal a quo não ter apurado factos relevantes para a decisão da causa¸ nomeadamente factos subjetivos relativamente ao Recorrente correspondentes à factualidade objetiva que o Tribunal a quo aditou e deu como provada e bem assim factos sobre a atual situação económica do Recorrente, essenciais para a correta determinação da sanção aplicável.
Acontece que o recorrente não fez constar das conclusões de recurso, como devia, quais as concretas insuficiências para a decisão da matéria de facto, aludindo, apenas, de forma genérica, ao não apuramento de factos subjectivos relativamente ao recorrente e a factos sobre a sua actual situação económica.
A alegação feita pelo recorrente na aludida Conclusão 4ª é manifestamente insuficiente para que o tribunal possa aferir se havia factos relevantes para a decisão da causa e, quais, deviam ter sido apurados e não o foram por o tribunal não os ter investigado.
Constitui entendimento pacífico e sedimentado na jurisprudência e doutrina que, conforme estabelecido no art. 412º do CPP, o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, conclusões essas que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar (Germano Marques da Silva, Curso de Processo penal, Vol. III, p. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo penal, p. 103; Ac STJ de 5/12/2007, Proc. 3178/07 e Ac RL de 23/2/2022, Procd. Nº 3802/20.8T9LSB.L1-3, entre outros, www.dgsi.pt).
O recorrente limitou-se a referir,  apenas nas alegações propriamente ditas, que teria sido necessário para a sua condenação, o apuramento do elemento intelectual, referindo-se aos factos provados 370, 633, 641 e 642, no sentido de que teria de ter ficado provado que o recorrente sabia daqueles factos, não constando da factualidade provada (nem da não provada) esse conhecimento, o qual não se pode presumir.
Não obstante, sempre se dirá que, o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada só ocorre quando os factos provados forem insuficientes para fundamentar a decisão proferida, ou quando, o tribunal recorrido, podendo fazê-lo, deixou de investigar toda a matéria relevante, daí resultando que essa matéria de facto considerada provada não permite, por ser insuficiente, a subsunção jurídica encontrada pelo tribunal para resolver em termos de direito o litígio judicial.
Esse vício traduzir-se-ia numa«(…) lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher.
Porventura melhor dizendo, só se poderá falar em tal vício quando a matéria de facto provada é insuficiente para fundamentar a solução de direito e quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto com interesse para a decisão final.»
Ora, da sentença recorrida constam os elementos de facto quanto ao elemento subjectivo do tipo de ilícito pelo qual o recorrente foi condenado, conforme se comprova dos factos 581 a 583, sendo estes suficientes para a sua condenação a título de dolo eventual, como o foi, contendo a matéria de facto dada como provada quer o elemento intelectual, quer o elemento volitivo do dolo, sendo perfeitamente despiciendo que constasse expressamente da matéria de facto o conhecimento pelo recorrente dos factos mencionados nos pontos 370, 633, 641 e 642 dos factos provados.
Senão, vejamos.
O recorrente foi condenado pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no art. 7º do CdVM ( por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), que constitui a prática da contraordenação prevista e punida nos termos do art. 389º nº 1 al. a) do CdVM e do art. 388º nº 1 al. a) do CdVM na coima de €300.000,00.
Ficou provado que o recorrente conhecia os factos descritos nos autos quanto à comercialização do papel comercial da R..., S.A e seus objectivos, coordenou, na qualidade de Administrador executivo do B..., com o pelouro do ... e do ... o processo de aprovação interna dessa comercialização, aprovou a documentação de suporte a essa comercialização (factos provados 562 a 572), solicitou a uma equipa de trabalho que analisasse os impactos e as necessidades de financiamento da operação de concentração, pela R..., S.A, da participação do denominado G... na E..., S.A, participou em reuniões de preparação da proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, apresentou essa proposta de reestruturação na reunião do Conselho Superior do G... de 7/1/2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a qual viu ser aprovada, agiu consciente e voluntariamente na prática desses factos, tratando-se de factos próprios em que participou e, não salvaguardou a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, tendo o recorrente previsto a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade.
Na sentença recorrida ficou exarado, em termos de motivação desta matéria de facto que, “Por seu turno, em termos de tipo subjectivo, mostra-se provado que ao levar ao Conselho Superior do G..., em 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, a qual viu ser aprovada naquela sede, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente DD previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade.
Trata-se de uma conduta a título de dolo eventual (n.º 3 do artigo 14.º do Código Penal) e esse título deverá ser condenado o Recorrente DD.”
“Na estrutura do dolo podemos destacar dois elementos essenciais:
- um elemento intelectual ou cognoscitivo traduzido no conhecimento material dos elementos e circunstâncias do tipo legal da infração em causa, bem como do seu sentido e significação (…).
O elemento intelectual do dolo resume-se, por um lado, à representação ou previsão pelo agente do facto ilícito com todos os seus elementos integrantes e, por outro, á consciência de que esse facto é censurável(…);
- um elemento emocional ou volitivo ou seja uma especial direcção da vontade, qual seja a de realização do facto ilícito previsto pelo agente, e que pode dar lugar a diferentes tipos de dolo como sejam:
(…)
- o dolo eventual em que o agente, ao actuar, se conforma com a possível realização do facto ilícito como consequência da conduta. Isto é, o agente não quer directamente o resultado da acção, mas assume o risco de produzi-lo (“dê o que der não deixarei de actuar” art. 14º nº 3 do Código penal).”
Também relativamente aos factos respeitantes às suas condições pessoais e económicas, o tribunal apurou os factos 796 e 797, constando neste último que o recorrente, no ano de 2020, não teve rendimentos, o que é muito diferente da alegação feita pelo recorrente de que o tribunal não apurou nada quanto à sua situação económica, sendo certo que, não consta dos autos que o recorrente tenha alegado e demonstrado qualquer outro facto sobre a sua situação económica que relevasse para a determinação da coima que lhe foi fixada e que incumbisse ao tribunal averiguar.
A insuficiência mencionada no art. 410º al. a) do CPP não diz respeito à insuficiência dos meios de prova produzidos para a matéria de facto dada como provada, mas apenas e só à insuficiência da matéria de facto dada como provada para a decisão da causa a que o tribunal chegou, insuficiência essa que não se evidencia do texto da sentença recorrida.
Em suma, as conclusões de recurso acerca desta matéria não consubstanciam qualquer vício de insuficiência da matéria de facto para a decisão da causa, não relevando qualquer eventual insuficiência da prova, erro na apreciação e valoração da prova produzida, insindicável neste recurso meramente de direito, face ao âmbito do princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127º do CPP, constando do texto da sentença recorrida toda a matéria de facto necessária à decisão de condenação do recorrente que foi proferida.
Improcede, assim, este segmento recursivo.

2.2- Contradição insanável da fundamentação.
Sob a Conclusão 5ª o Recorrente sustenta que a sentença recorrida padece também do vício de contradição insanável da fundamentação, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, por o Tribunal a quo ter assumido posições antagónicas e racionalmente inconciliáveis na fundamentação da decisão, com referência aos factos provados 369, 370 e 633, por um lado, e ao facto provado 749, por outro.
Vejamos o que dizem tais factos:
369. No contexto da referida reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, o Conselho Superior do G... decidiu, em 7 de Janeiro de 2014, estando presentes, designadamente, os Recorrentes AA, BB, CC e DD, a aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A;
370. O Conselho Superior do G... era constituído por representantes dos cinco acionistas de controlo do G..., sendo um órgão para-societário, onde eram tomadas decisões sobre os negócios estratégicos para o grupo pelos seus principais accionistas, que se assumia como um centro decisório desse grupo, sendo-lhe reconhecido poder para, de facto, determinar que as sociedades integradas no grupo agissem de acordo com as decisões que tomava;
633. O B... não informou os clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela R..., S.A entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 que a R..., S.A iria adquirir ou que tinha adquirido ( ), com efeitos a 31 de dezembro de 2013, uma participação qualificada de 49,26% da E..., S.A;
749. A alienação pela EI..., S.A das acções da E..., S.A estava dependente do consentimento da Cde..., em virtude da existência de um penhor financeiro e da anuência do Banco de Portugal.
A contradição tanto pode emergir entre factos contraditoriamente provados entre si, como entre estes e os não provados, como entre a fundamentação e a decisão.
Tenhamos, mais uma vez, presente que este tribunal de recurso não conhece de facto, apenas de direito, a não ser que ocorra o vício da matéria de facto apontado pelo recorrente e previsto no art. 410º nº 1 al. b) do CPP, vício esse a detectar atendo-nos apenas ao teor do texto da sentença recorrida e, se necessário, com recurso às regras da experiência comum.
A propósito deste vício da sentença já tecemos as devidas considerações gerais, a propósito do recurso interposto pelo co-recorrente AA, que aqui voltamos a reproduzir.
A contradição tanto pode emergir entre factos contraditoriamente provados entre si, como entre estes e os não provados, como entre a fundamentação ( em sentido amplo, abrangendo a fundamentação de facto e também a de direito) e a decisão.
O Ac STJ de 11/1/2017 é elucidativo quanto a este vício, dele se podendo ler:“O vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão a que alude a al. b) do nº 2 do art. 410º do CPP, verifica-se quando no texto da decisão, e sobre a mesma questão, constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluem mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perpectiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respectivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito.
Há contradição insanável da fundamentação quando, através de um raciocínio lógico, se conclua pela existência de oposição insanável entre os factos provados, entre estes e os não provados, ou até entre a fundamentação probatória da matéria de facto, ou seja, quando se dá como provado e não provado determinado facto, quando ao mesmo tempo se afirma ou nega a mesma coisa, quando simultaneamente se dão como assentes factos contraditórios e ainda quando se estabelece confronto insuperável e contraditório entre a fundamentação probatória da matéria de facto.
Só é de considerar relevante, para os fins do preceituado nesta alínea b) do nº 2, a contradição que se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser integrada com recurso à decisão, ou seja, quando a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão.”
Também Simas Santos e Leal Henriques defendem que “há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluirem-se mutuamente.”
No caso sub judice as contradições invocadas pelo recorrente dizem respeito a uma alegada contradição na fundamentação do tribunal a quo relativamente aos factos dados como provados, alegando o recorrente nas suas alegações (não nas conclusões) que a contradição reporta-se a um facto essencial porque determinante para se poder concluir a partir de que momento poderia ser exigível ao B... que informasse os seus clientes que pretendiam adquirir papel comercial da R..., S.A que esta iria adquirir ou que tinha adquirido com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, uma participação qualificada de 49,26% da E..., S.A.
Vejamos qual foi a fundamentação dada na sentença recorrida a propósito de tal matéria:
“No que tange à primeira parte do tema da reestruturação do G... (factos n.ºs 369 a 372), especialmente no que tange ao facto dessa reestruturação ter sido ou não decidida em sede do Conselho Superior do G..., na reunião de 07.01.2014, em termos probatórios, não existe grande controvérsia sobre o assunto, apesar do dissídio que parte dos Recorrentes insistem em pretender observar na prova.
Na verdade e em primeiro lugar, tal como avançou a decisão administrativa, encontra-se nos autos um documento que serviu de apoio à reunião de do Conselho de Administração da R..., S.A que teve lugar no dia 25 de Fevereiro de 2014 e onde se ratificou a proposta de reestruturação do G..., a qual se traduziu na aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e a subsequente aquisição, pela Esa... SGPS S.A, na mesma data, da participação social detida pela EI..., S.A na E..., S.A.
A R..., S.A era uma das peças centrais da reestruturação, na medida em que, como foi unissonamente referido por todas as testemunhas nos autos que sobre o assunto depuseram, iria passar a ser, após a reestruturação, a holding principal de acesso ao mercado que agregava o ramo financeiro e o ramo não financeiro do grupo – vide, a título de exemplo, depoimentos de UU, VV, NN, PP, TTTTT, LLLLL, JJJ e III.
De facto, a fls. 8817-8855 dos autos pode analisar-se o documento denominado “II. Pontos de informação e discussão (1)/ Evolução financeira da R..., S.A 2009-2013/ Orçamento R..., S.A para 2014/ Programa de Reestruturação do G... e implicações para a R..., S.A”.
A testemunha LLLLL – que, à data da prática dos factos constantes dos presentes autos, era Presidente da Comissão Executiva da R..., S.A – atestou precisamente que o dito documento fora elaborado pela Comissão Executiva da R..., S.A para servir de apoio à reunião do Conselho de Administração da R..., S.A, nos moldes acima mencionados.
 Ora, do referido documento de fls. 8817-8855, resulta que o seu conteúdo tem como fonte a “Apresentação do Programa [de Reestruturação do G...] ao Conselho Superior pela equipa financeira do B... (7 janeiro 2014)” (vide nota de rodapé das fls. 8826-8830) e que o plano de reestruturação do G... foi precisamente “aprovado pelo Conselho Superior a 7.jan.2014” (vide cabeçalho das fls. 8826-8830).
A fls. 8826-8830 deste documento consta ainda, designadamente, os objectivos da reestruturação, os contratos a celebrar, o impacto financeiro no balanço consolidado da R..., S.A, bem como a proposta de “aprovação da reestruturação organizativa de acordo com proposta anterior”.
Veja-se que, num documento interno do grupo, que se destinava precisamente ao Conselho de Administração de uma das empresas principalmente envolvidas na reestruturação, nenhum óbice ou pejo existiu em referir-se à expressão “aprovado pelo Conselho Superior”, o que logo evidencia que, independentemente dos efeitos jurídicos que essa aprovação pode acarretar, o certo é que era um órgão (para-societário), onde eram tomadas decisões e isso era assumido pelo grupo de forma transparente e cristalina.
Sobre estas asserções também não existiu grande controvérsia em termos de prova testemunhal, fluindo todos os depoimentos prestados nos autos no sentido exposto.
A título de exemplo e apontando os depoimentos que, por força das funções exercidas, considerámos mais expressivos, importa identificar:
TTTTT, Assessora do Conselho de Administração do B... que participou na elaboração do “Plano Complementar” ao “Programa de Reestruturação do G...”, afirmou ter estado presente precisamente na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014, porque foi apresentado o Plano Complementar que ia ser enviado ao Banco de Portugal, relativamente ao qual, como já verificámos, a testemunha integrou o respectivo grupo de trabalho.
Sem prejuízo da testemunha ter referido que apesar desta reunião, o plano teve de ser “aprovado nas várias entidades relevantes – os boards das respetivas sociedades” e insistir na natureza não definitiva do que lá foi decidido, o certo é que tal não infirma a deliberação que foi tomada em sede da reunião de 07.01.2014, independentemente de, obviamente, em termos formais, ter de existir deliberações das entidades envolvidas. Veja-se que a testemunha fez questão de começar a frase com a expressão “em última instância (quem decidiu a operação foram…)”, o que evidencia bem o carácter meramente formal da decisão das entidades do G... envolvidas.
As declarações prestadas por QQQ nos autos no sentido do Conselho Superior não ter qualquer poder jurídico, de falar, de decidir sobre certos aspectos, não inflete a nossa convicção, na medida em que, obviamente que sendo um órgão constituído à margem de uma estrutura formal societária, juridicamente não tinha poder para vincular as entidades envolvidas, mas o certo é que, na prática as vinculava.
Disso nos dá precisamente conta a testemunha LLLLL, Presidente da Comissão Executiva da R..., S.A à data da prática dos factos, que elucidou que a referida reestruturação apenas foi ratificada pelo Conselho de Administração da R..., S.A, a 25 de Fevereiro de 2014, ainda que com efeitos reportados a 31 de Dezembro de 2013, já quando a mesma estava operacionalizada definitivamente – veja-se que a reestruturação foi comunicada no portal da CMVM em 23.01.2014 (Comunicado de fls. 9.102 e 9.103 do Volume 21). Ou seja, daqui decorre que existiu uma decisão tomada por um órgão, ainda que para-societário, que foi imediatamente executada até à sua integral operacionalização, não sendo sequer esperado pelo G... que os “boards das respetivas sociedades” envolvidas, nas palavras de TTTTT, ratificassem o decidido.
Esta actuação evidencia bem o peso que uma decisão tomada ao nível do Conselho Superior do G... tinha em sede do grupo.
O facto de ter existido uma verdadeira decisão tomada em sede do Conselho Superior do G... está bem evidenciada no depoimento isento, objectivo e esclarecedor e com conhecimento directo acerca da implementação do plano de reestruturação, da referida testemunha TTTTT, no sentido de que logo após a passagem pelo Conselho Superior do G..., o que lá havia sido aprovado, passou imediatamente à sua fase de execução – vide TTTTT,
Ou seja, para se avançar com a execução foi necessário precisamente passar pelo escrutínio daquele órgão, tendo o mesmo de “dar luz verde” para que se avançasse, como imediatamente avançou.
Ora mal se percebia o motivo pelo qual um projecto tivesse de passar pelo crivo de um órgão constitudo à margem de uma estrutura societária para poder avançar se nenhum poder decisório esse órgão tivesse. Obviamente que formalmente não existiu uma decisão no sentido dessa decisão poder vincular juridicamente as entidades envolvidas, mas que esse órgão deliberou que se avançasse com o plano de reestruturação do G... não temos qualquer tipo de resquício de dúvida. E que as entidades envolvidas reconheciam esse poder àquele órgão, também não temos qualquer dúvida.
Por isso, independentemente da prova testemunhal complementar que os Recorrentes pretendessem realizar a propósito, sobre os efeitos jurídicos daquilo que se deliberou em sede do Conselho Superior do G..., essa prova seria totalmente inócua. Saber se o aprovado se pode apelidar juridicamente de decisão ou não, é totalmente inócuo para esta matéria de facto. Naturalisticamente foi tomada uma decisão/deliberação, sim, de avançar com a reestruturação.
Aliás, o poder que era assumido em sede de Conselho Superior do G... é bem ilustrado pela transcrição da reunião de 07.01.2014, de fls. 15909, onde é bem evidente que a pretensa mera exposição sobre o que era o plano de reestruturação se tornou numa conversa acerca de concretizações e não de meras possibilidades. Os participantes falam das entidades envolvidas no projecto, com uma certeza sobre a implementação dos processos que lhes estavam destinados, que não nos deixa quaisquer dúvidas acerca da natureza do órgão. Até porque se nada lá se decidisse, mal se percebia o motivo de levar a este tipo de “fórum” matérias com a importância como as que foram discutidas no dia 07.01.2014, com efeitos sobre distintas sociedades pertencentes ao G.... Julgamos que AA (e os demais) que na sua impugnação judicial se lamentou de uma agenda bastante preenchida e de um trabalho que pouco tempo lhe deixava, não teria qualquer tipo de interesse em perder esse escasso tempo em reuniões infrutíferas e inúteis, como os Recorrentes insistem em defender.
Na verdade, também a testemunha LLLLL não teve qualquer hesitação em afirmar ser o Conselho Superior do G... o órgão da Família Es... que decidia os negócios do G....
Também a testemunha NN, à data dos factos, administrador executivo com o pelouro ... da R..., S.A, identificou o mesmo órgão para-societário como o órgão no qual se tomavam decisões sobre o G..., confirmando ter sido nessa sede onde se aprovou o plano de reestruturação do G... a 7 de Janeiro de 2014.
Nas suas palavras elucidativas, “o Conselho Superior do G... não era o órgão formal da EI..., S.A, que era o nosso acionista, mas na prática era o fórum de decisão. O processo, na génese, não foi nosso, foi do acionista, cabendo-nos o papel de operacionalização e de ratificação.”
A par da testemunha LLLLL, também NN confirmou, desta feita, que ao Conselho de Administração da R..., S.A coube apenas operacionalizar o plano de reestruturação em causa, sendo que esta apenas foi ratificada pelo mesmo em 25 de Fevereiro de 2014, data em que parte do plano já estava implementado.
Também a testemunha JJJ, que assumia, simultaneamente, as funções de senior manager da EI..., S.A, secretário do Conselho Superior do G... e membro da equipa que preparou a proposta de reestruturação do G..., quando questionado sobre quem decidiu a realização das operações de aquisição, pela R..., S.A, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e de concentração nesta última das acções da E..., S.A de que o denominado G... era titular, respondeu: “os membros do Conselho Superior do G...”.
Por seu turno, também nesta sede foi contundente o depoimento da testemunha PP, colaborador do G..., que participou na elaboração do “Programa de Reestruturação do G...” na parte contabilística desta operação e que demonstrou amplo conhecimento sobre o funcionamento do G... e a forma como eram tomadas decisões nessa sede. Com efeito, quando questionado sobre quem decidiu a realização das operações de aquisição, pela R..., S.A, da totalidade do capital social da Esa... SGPS S.A e de concentração nesta última das acções da E..., S.A de que o denominado G... era titular, respondeu não saber em concreto, “mas do que conheço do funcionamento do G... – dos anos em que trabalhei lá – julgo que terá sido o Conselho Superior e, em especial, o Dr. AA, que era quem tinha a visão mais geral do G...”.
Ora, este depoimento consolida a nossa convicção sobre o papel do Conselho Superior do G... em sede do grupo, alinhando-se esta forma de tomada de decisão acerca das questões relacionadas com o G..., amplamente descrito pelas testemunhas, com o facto de efectivamente, uma alteração com a dimensão e importância que consistia para o grupo, ser decidido por aquele órgão, a quem era amplamente reconhecido poder para determinar que as sociedades integradas no grupo agissem de acordo com as decisões que tomava. Tanto assim era que, repetimos, o plano de reestruturação avançou, independentemente da ratificação formal pela R..., S.A acima aludida, que apenas se deu no cerca de um mês depois da reestruturação estar operacionalizada / executada / concluída.
Para além disso, tal como revelou o Recorrente CC, o Conselho Superior do G... tinha uma regulamentação interna em vigor à data dos factos, aprovada a 23 de Maio de 2011, aprovada pelo próprio Conselho, em sede da qual foi estabelecido que cabia a este órgão o seguinte, designadamente: a missão de zelar, de forma permanente, pela preservação e realização dos interesses do G... e das actividades das sociedades que o compõem, incumbindo-lhe, designadamente, o acompanhamento e avaliação da actividade e da administração das sociedades participadas e a apreciação, análise, debate e decisão sobre assuntos de natureza estratégica, decidindo, nomeadamente, sobre a aquisição, alienação ou oneração de participações sociais das sociedades que compõem o G..., bem como dos activos detidos por tais sociedades quando estes pelo seu valor intrínseco assumam natureza estratégica no conjunto das actividades desenvolvidas pelo G...; diminuição, por qualquer forma, do peso relativo das partes sociais detidas pelo G... em sociedades suas participadas; alteração da titularidade do capital social das sociedades directa ou indirectamente dominadas pela Ec..., S.A.; e alteração relevante aos contratos de sociedade das participadas da Ec..., S.A..
Ou seja, apesar do que especialmente o Recorrente AA advoga, o certo é que foi o próprio Conselho Superior do G... se auto-intitulou como órgão com poder decisório dentro do denominado “G...”, o que era acatado pelas entidades que nele se incluíam, como verificámos da prova testemunhal e documental analisada.
Para além disso, apesar de insistentemente pretender refutar evidências, foi o próprio Recorrente AA que na sua impugnação escreveu que a nomeação de WW para fazer parte da task force da EI..., S.A após a descoberta da situação do passivo teve de ser aprovada pelo Conselho Superior do G..., o que bem denota o peso que o ógão tinha no grupo, em termos decisórios.
A epilogar, é impossível não referir a carta que o próprio Conselho Superior do G... enviou ao Banco de Portugal em 03.12.2013, constante de fls. 9630, onde se assume como órgão com capacidade para fazer propostas de resolução de problemas que ocorriam na EI..., S.A, junto daquele regulador, se assume com poder “para realizar o plano de acção que propomos” e como órgão que representava todo o denominado “G...”, propondo-se a reuniões mensais com o Banco de Portugal nessa qualidade.
Avançando.
Os contratos relativos à referida operação de reestruturação foram celebrados a 22 de Janeiro de 2014, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013 e a operação divulgada no site da CMVM, conforme referido, a 23 de Janeiro de 2014 (vide fls. 7507-7525, 8909-8913v e 9202-9203).
(…)
Relativamente ao facto 633, pode ler-se, nomeadamente o seguinte:
“Por outro lado, também as testemunhas VVVVV, TT e WWWWW atestaram de forma coerente entre si, em moldes semelhantes aos já referidos a propósito da situação da EI..., S.A, que o B..., através dos seus departamentos comerciais, divulgou junto dos clientes que subscreveram, entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014, papel comercial emitido pela R..., S.A as Notas Informativas do papel comercial da R..., S.A de 6 de janeiro de 2014 e 16 de janeiro de 2014, as quais continham informação nos termos dados como provados. Na verdade, de acordo com as testemunhas e conforma já elucidado acima, a informação prestada aos clientes que subscreviam papel comercial emitido pela R..., S.A consistia exclusivamente na que constava das Notas Informativas e das fichas técnicas, as quais eram divulgadas aquando da comercialização.
Ora, da mera análise das Notas Informativas em causa (a de 06.01.2014 e a de 16.01.2014) (Nota Informativa de 06.01.2014 consta do documento pdf “Notas Informativas” integrado no CD de fls. 6959\PCRFI_CMVM_Ponto 2\Ponto 2.i, vide ainda fls. 140-151v; 6081;; 7081-7827; 8953-8964v; fls. 7129-7154; fls. 7129-7154), compaginada com a Nota Informativa que depois nem sequer foi disponibilizada aos clientes, datada de 14.02.2014, resulta uma total ausência de informação sobre o os impactos da aquisição, pela R..., S.A, com efeitos a 31 de Dezembro de 2013, da participação de 49,26% da E..., S.A ao nível do “Risco Cambial”, do “Risco de Preço”, do “Risco de Taxa de Juro”, do “Risco de Crédito”, do “Risco Operacional” e do “Risco de Liquidez” (os quais constam da Nota Informativa de 14 de fevereiro de 2014), sendo certo que essa aquisição foi decidida pelo Conselho Superior do G..., em 7 de janeiro de 2014, no contexto da reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações. Se as informações disponibilizadas as clientes se cingiam àquelas que constavam das Notas Informativas e Fichas Técnicas, logo facilmente se concluiu que nenhuma informação acerca da emitente do papel comercial (a R..., S.A) foi prestada aos clientes que subscreveram o papel comercial emitido pela mesma para além daquela que constava das Notas Informativas.”
E, relativamente ao facto 749, consta o seguinte:
“O facto da alienação pela EI..., S.A das acções da E..., S.A estar dependente do consentimento da Cde... (n.º 749) decorre para além do teor dos depoimentos das testemunhas TTTTT, JJJ, NN, LLLLL, PP, também do teor dos emails fls. 8.617 do Volume 20, documentos de fls. 8.616 do Volume 20, fls. 8616 do Volume 20, Considerando (E) do Contrato de Compra e Venda das Acções da E..., S.A de 31 de Dezembro de 2013 de fls. 7515 a 7518 verso do Volume 17 e contrato de mútuo de fls. 8.599 a 8.615 do Volume 20.”
Esses segmentos da fundamentação dos referidos factos não deve ser lida de forma espartilhada, mas deve ser harmonizada com toda a fundamentação vertida na sentença recorrida, uma vez que aqueles factos não podem nem devem ser apreciados de forma isolada mas enquadrados na globalidade da matéria de facto apurada quanto à reestruturação do G..., suas implicações na situação económica da emitente R..., S.A e omissão de divulgação dessas alterações (com efeitos retroactivos) aos clientes que investiram em papel comercial da R..., S.A.
E, dessa articulação conclui-se que o tribunal a quo, apesar de ter dado como provado que a alienação pela EI..., S.A das acções da E..., S.A dependia formalmente de entidades terceiras, mesmo assim fez recair sobre o B... a obrigação de dar a conhecer aos seus clientes a decisão que o Conselho Superior do G... tomara quanto àquela reestruturação ( a qual teria implicações graves na situação económica da emitente R..., S.A) apartir do momento em que essa decisão foi tomada e se iniciou a sua execução.
Da sentença recorrida extrai-se claramente que aquelas asserções não são incompatíveis, tendo  por certo que, tal como se lê da sentença “a partir do momento em que foi tomada uma decisão, em termos de gestão, por parte de um órgão com poderes de facto para decidir uma operação com a dimensão da que estava em causa, ou seja o Conselho Superior do G..., que se assumia, como referido, como o órgão com poder decisório sobre as questões estratégicas para o grupo, sendo-lhe reconhecido esse poder de decisão, a partir desse momento, diziamos, independentemente da formalização dos negócios que estivesse pendente ou da obtenção de autorizações de entidades terceiras, o B... tinha, em princípio, o dever de informar os investidores sobre a operação.”
(…)
“Na verdade, tal como anteriormente referido, os Recorrentes insistem em considerar que o que foi discutido na reunião do Conselho Superior do G... a 07.01.2014 não foi uma decisão, foi apenas o delinear de um projecto.
Já explicámos porque entendemos que o que foi lá tratado se reconduziu a uma efectiva decisão, mas não podemos deixar aqui de referir que, de facto, essa decisão não apresentava um carácter formal, já que uma decisão que é tomada num órgão para-societário não vincula formalmente as sociedades envolvidas.
Mas a vida real supera a vida plasmada em normas e este é um caso paradigmático em que um órgão sem poderes formais tinha poderes de facto para decidir as linhas estratégicas a seguir por todas as entidades que integrassem o denominado “G...”, como já analisámos e esse poder não era apenas por si auto-intitulado, como era por todos reconhecido de facto.
Independentemente de ter de existir actos formais que legalizassem o que era decidido, o certo era que sendo decidido por aquele órgão parassocial, as decisões eram acatadas e seriam formalizadas pelos envolvidos nas mesmas, como efectivamente o foram, muito antes até de uma ratificação do negócio pelo Conselho de Administração da R..., S.A que apenas veio a acontecer em 25.02.2014. Deste poder de vinculação de facto nos deram conta a abundante prova que já acima identificámos.
Por isso se explica que a testemunha TTTTT tenha insistido no facto da decisão de 07.01.2014 não ser uma decisão definitiva. Não era de facto definitiva, pois carecia da formalização a que aludiram as testemunhas já citadas NN e PP.
NN é bastante elucidativo, quando refere que na implementação da reestruturação, onde se inclui a contratualização dos contratos subjacentes, nem sabe sequer quem interveio, mas sabe que os contratos apareceram feitos.
Sabe agora que a execução da operação foi levada a cabo pela equipa da E... Limited, que era uma sociedade com funções similares à Es..., como decorre do documento onde consta fls. 8824.
Nas palavras ainda de NN, o projecto de reestruturação aprovado pelo Conselho Superior do G... tinha uma “primeira perna” que era a concentração de participações da E..., S.A, que era o que viabilizava o projecto, situação que estava depende nomeadamente da aprovação do Banco de Portugal e da autorização da Cde... porque existia um penhor financeiro, o que foi confirmado por TTTTT.
 Também por esta última testemunha foi explicado que os efeitos do negócio pensado, seriam para reportar a 31.12.2013, tendo a testemunha III explicado que tal se devia à auditoria que seria realizada à R..., S.A que tinha um crédito sobre a EI..., S.A, que esta não lograria pagar, servindo os efeitos retroactivos para que a R..., S.A não fosse questionada acerca dessa dívida incobrável – lembre-se que nesta data os problemas da EI..., S.A já tinham sido trazidos a nu.
Mas se realmente era necessário proceder à formalização dos negócios pelas entidades do G... envolvidas e por outras entidades terceiras, como a Cde... e o Banco de Portugal, tal significava, de acordo com critérios de normalidade, que desde dia 07.01.2014 até à data em que fossem formalizados os negócios previstos no plano de reestruturação sempre havia de decorrer algum tempo, como os próprios Recorrentes defendem. Tal aliás veio a suceder, na medida em que apenas em 22 de Janeiro foi formalizado o negócio e em 23 de Janeiro foi comunicado no site da CMVM (vide Comunicado de fls. 9.102 e 9.103 do Volume 21), tal como provado.
Vide também o teor dos emails trocados a propósito, junto de fls. 8.616 a 8.622 da Pasta 20, do Considerando (E) do Contrato de Compra e Venda das Acções da E..., S.A de 31 de Dezembro de 2013 de fls. 7515 a 7518 verso do Volume 17 (vide contrato de mútuo de fls. 8.599 a 8.615 do Volume 20).
Sucede, porém, que de forma que se considera de uma desfaçatez gritante, esse plano de reestruturação previa os ditos efeitos retroactivos, reportados a 31.12.2013. Isto significa algo muitíssimo simples: é que os Recorrentes admitem como regular comercializar papel comercial desde, pelo menos, 09.01.2014 (esta é a data que é indicada na decisão administrativa como data de referência e é essa a data que vamos respeitar) até 22.01.2014 (data da formalização dos negócios, sem prejuízo de apenas em 25.02.2014 ter ocorrido a ratificação pelo Conselho de Administração da R..., S.A), anunciando características de um produto que, por vontade e determinação de parte dos administradores do próprio colocador / intermediário financeiro (com assento no Conselho Superior do G... ou mediante uma participação activa no mesmo, como sucedeu com DD) alteram à medida dos interesses do G..., quando o produto já tinha sido adquirido pelos investidores.”
Aqueles factos entre si não são contraditórios, nem a fundamentação dos mesmos entra em contradição, tendo o tribunal dito claramente que apesar da operação estar dependente de terceiros, a decisão informal que a desencadeou e cuja execução se iniciou de imediato, devia ter sido comunicada aos clientes do B... pois que, no que dependesse do B... a decisão estava já tomada e teria efeitos retroactivos, sendo relevante que essa possibilidade fosse dada a conhecer aos investidores, não se extraindo, pois, dessa fundamentação contradição insanável nos seus termos.
Deste modo, concorde o recorrente ou não com o que foi dado como provado pelo tribunal e a convicção que deixou exposta na sua fundamentação, os factos não são manifestamente contraditórios e, muito menos o é a fundamentação, não se evidenciando o alegado vício da sentença.
Improcede, assim, este segmento recursivo.

2.3- Erro notório na apreciação da prova.
Sob a Conclusão 6ª o Recorrente sustenta que a sentença recorrida padece de erro notório na apreciação da prova, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, quanto à decisão de considerar provados os factos 369, 370, 579 e 583.
Das conclusões de recurso não consta, como devia (mais uma vez, tal como acima afloramos na questão da insuficiência da matéria de facto para a decisão), qual foi o erro notório na apreciação da prova que o tribunal a quo cometeu, apenas se podendo extrair que o recorrente se insurge quanto ao facto de o tribunal ter dado aqueles factos como provados.
Contudo, por recurso às alegações apresentadas quanto a este vício da sentença, desde logo se conclui que não estamos perante um erro na apreciação da prova mas de uma manifesta discordância quanto à convicção formada pelo tribunal, porquanto é o próprio recorrente que alega que se “constata uma absoluta incompatibilidade entre determinados factos dados como provados e concretos meios de prova a que o tribunal a quo deu credibilidade”.
Entende o recorrente que os factos provados 369, 370, 579, 583 mostram-se contraditados pela transcrição da gravação da reunião do Conselho Superior do G... de 7.1.2014 constante de fls. 15784 a 15921, bem como das suas declarações e do depoimento da testemunha RR.
A este Tribunal da Relação não cabe sindicar a forma como o tribunal a quo apreciou ou valorou a prova documental ou a prova testemunhal perante aquele produzida, uma vez que não lhe cabe reapreciar a prova produzida, nem sequer pode aferir se a prova produzida era suficiente para dar como provada tal matéria de facto, face ao âmbito do princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127º do CPP, a não ser que conste do texto da sentença qualquer contradição com as regras de experiência comum, evidenciando-se uma convicção desajustada ao parâmetros da normalidade e razoabilidade.
No entanto, salienta-se que a transcrição da gravação daquela reunião que o recorrente aponta como meio de prova inequívoco do erro notório na apreciação da prova e o depoimento da testemunha RR, entre muitos outros meios de prova documentais e testemunhais, foram apreciados devidamente pelo tribunal, que a eles expressamente aludiu e inclusivamente utilizou na fundamentação daqueles factos, só não os valorou da mesma forma que o recorrente o fez, mas essa divergência de convicção não consubstancia, de todo, o apontado vício da decisão.
“Esse vício é caracterizado por uma incompatibilidade evidente e manifesta entre o facto e a realidade, de tal forma que para o tribunal resulte, sem margem para dúvidas, que a prova foi mal apreciada, devendo esse erro resultar do texto da decisão e não da apreciação da prova recolhida.”
“(…) O mesmo verifica-se quando, partindo do texto da decisão recorrida, a matéria de facto considerada provada e não provada pelo tribunal a quo, atenta, de forma notória, evidente ou manifesta, contra as regras da experiência comum, avaliadas de acordo com o padrão do homem médio. É um vício intrínseco da sentença, isto é, que há-de resultar do texto da decisão recorrida, de tal forma que, lendo-o, logo o cidadão comum se dê conta que os fundamentos são contraditórios entre si, ou com a decisão tomada.”
No mesmo sentido, Ac STJ de 19/11/2008, segundo o qual, “Os vícios do art. 410º nº 2 do CPP não podem ser confundidos com a divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e a convicção que o tribunal firme sobre os factos, no respeito pelo princípio da livre apreciação da prova inscrito no art. 127º do CPP.
Neste aspecto, o que releva, necessariamente, é a convicção que o tribunal forme perante as provas produzidas em audiência, sendo irrelevante, no âmbito da ponderação exigida pela função do controlo ínsita na identificação dos vícios do art. 410º nº 2 do CPP, a convicção pessoalmente formada pelo recorrente e que ele próprio alcançou sobre os factos.”
Os factos mencionados pelo recorrente estão devidamente fundamentados na sentença recorrida, baseados em meios de prova válidos, apreciados de forma coerente e consistente, a motivação não se afigura arbitrária e, não são factos sujeitos a prova vinculada, pelo que, deve imperar a livre apreciação da prova pelo tribunal a quo, não constando do texto da decisão erro crasso, evidente, desfasado das regras da experiência comum que importe corrigir.
Alegou ainda o recorrente que decorre da fundamentação do facto provado 583 que a convicção do tribunal a quo foi alcançada através de um raciocínio in dubio contra reo.
Quanto a este ponto em concreto diremos que o recorrente labora em manifesto erro porquanto o tribunal a quo fixou a matéria de facto em sentido favorável ao recorrente (in dubio pro reo), tendo convolado uma actuação que tinha sido condenada pela CMVM a título de dolo directo, para dolo eventual, pois que na dúvida sobre se o recorrente quis efectivamente que a informação não fosse transmitida aos investidores, o tribunal optou por não o condenar por dolo directo, sem, contudo,  evidenciar qualquer dúvida de que o recorrente previu a possibilidade de a informação veiculada não revelar a situação real da R..., S.A e com essa possibilidade se conformou.
Isso mesmo se extrai da fundamentação da decisão de facto, nomeadamente do seguinte segmento:
“No vertente caso, o Recorrente participou, sugerindo uma determinada tomada de decisão, num órgão para-societário que decidiu, de facto, sobre negócios em que figurava como parte a R..., S.A, sabendo do inicio da sua execução, sem que existisse uma decisão formal do órgão competente dentro da estrutura organizativa da mesma R..., S.A, sabendo que se tratava de alterações com significado para a própria R..., S.A e por inerência a todos os clientes do B... que subscrevessem papel comercial dessa sociedade, sabendo igualmente que estava em curso essa comercialização.
Sendo o Recorrente DD administrador quer da entidade colocadora, o B..., quer da entidade que elaborava as Notas Informativas (se bem que com as informações provindas da emitente), o BEl..., agora Haitong, sobre o mesmo recai deveres de diligência, mormente deveres de cuidar que as sociedades de que era administrador prossigam a sua actividade mediante o traço da legalidade.
Está em causa o já acima aludido dever de diligência que implica, tal como defende Carneiro da Frada, in “O dever de legalidade: um novo (e não escrito) dever fundamental dos administradores, DSR, 8 (2012), pág. 65 e ss, um dever de legalidade.
Neste conspecto, devem os administradores adoptar condutas conformes com a lei e adoptar condutas de modo a que a sociedade de que são administradores também prima pelo cumprimento da lei. Se um administrador tem conhecimento de determinado facto relevante no cumprimento de determinado dever da sociedade, independentemente do modo como obteve esse conhecimento, tem o dever de promover dentro da sociedade todos os procedimentos necessários para cumprir a legalidade, já que nas suas funções está intrínseco o dever de rumar a actividade da sociedade no sentido da legalidade, porque a isso impõe o dever de diligência.
Assim sendo, quando foi tomada uma decisão de reestruturação do G..., com implicações inevitáveis, relevantes e complexas na estrutura, na natureza e situação económica e financeira da R..., S.A, cuja execução se iniciou de forma imediata, decisão essa que o Recorrente sabia necessariamente necessariamente que era uma decisão apartada de uma decisão formal por parte da sociedade R..., S.A, ou seja, sem existência de um acto decisório emanado do órgão social formalmente competente para o efeito, não poderia o Recorrente deixar de ter como possível que a sociedade R..., S.A, na qualidade de emitente, pudesse não comunicar ao BEl... (que elaborava as Notas Informativas) as informações relevantes aos investidores do papel comercial que vinha sendo e continuava a ser emitido.
Também não poderia deixar de ter como possível que, perante essa possibilidade, existia outra possibilidade inevitável; um risco intenso de que, ao nada ter assegurado no sentido do B..., enquanto intermediário financeiro, adoptar uma conduta que se coadunasse com o conhecimento que tinha sobre a existência da dita reestruturação (veja-se que no Conselho Superior do G... tinham assento administradores do B... e nele participou também o Recorrente DD, também administrador do B...), que essa informação relevante acabasse por não ser transmitida por quem, dentro da instituição B..., tinha o dever de informar os ditos investidores.
Veja-se que o Recorrente também sabia e participou na própria decisão tida pelo próprio colocador (intermediário financeiro B...) de emissão de papel comercial da R..., S.A, sabendo que era o próprio colocador que estava em plena comercialização daquele papel comercial respeitante àquela emitente R..., S.A. No fundo, os próprios administradores do B... que participaram na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014 ajustaram as características de um produto financeiro à medida dos interesses do G..., sabendo que o B... o estava a comercializar, sem que tivessem em conta os interesses dos clientes em saber as novas características do produto gizadas à medida daqueles interesses do G....
Aliás, mais crítica ainda se torna a situação, quando se pensa que para proceder à alteração do produto financeiro que estava em plena comercialização, foi consituida uma equipa, como já analisámos, que pertencia ao próprio B..., colocador/intermediário financeiro, onde estava precisamente incluindo DD.
(…)
Os efeitos do plano de reestruturação sobre a R..., S.A foram conhecidos por todos os que participaram na reunião do Conselho Superior do G... de 07.01.2014, tal como foi assertivamente confirmado pela própria testemunha TTTTT (vide também o teor do documento respeitante à apresentação ao Conselho de Adinistração da R..., S.A da reestruturação, mormente fls. 8824). Aliás, no que tange ao Recorrente DD o mesmo participou activamente na sua elaboração, apresentando-o, pelo que não poderia deixar de saber sobre esses efeitos.
Ora, DD que contribuiu para a decisão tomada pelo Conselho Superior do G... não é certamente uma pessoa néscia, mas antes uma pessoa que assumia cargos de referência numa instituição bancária de referência. Independentemente das suas maiores ou menores habilidades de gestão, existem patamares mínimos de competência exigíveis a quem ocupa cargos de topo numa instituição financeira, até porque se aceita ocupar esses cargos está tacitamente a aceitar que tem as competências necessárias para os assumir.
Obviamente que DD ao saber, como não poderia deixar de saber porque foi ele quem ajudou a delinear tal situação, sobre a previsão dos efeitos retroactivos relativamente a determinado negócio com reflexos expressivos na sociedade emitente não poderia deixar de ter, pelo menos, como possível que a informação a veicular aos investidores que comprassem papel comercial desde a data de 01.01.2014 (rectius, desde 09.01.2014 para respeitarmos a decisão administrativa) até à formalização dos negócios seria necessariamente sem qualidade – tal como aquela que fosse transmitida posteriormente, pelo motivos já dissecado.
No fundo e em suma, ao saber de uma decisão desta magnitude, para a qual acabou por contribuir, num órgão com poder decisório, de facto, em relação ao grupo onde se inseria o B..., o BEl... e a R..., S.A, estando em curso a emissão e comercialização de papel comercial desta última, o Recorrente não podia deixar de tomar em linha de conta as implicações que essa decisão iria ter, mormente a possibilidade da informação sobre uma decisão assim tomada e imediatamente executada, não chegar a ser devidamente tratada pelo B..., enquanto intermediário financeiro, com deveres de lealdade para com os seus clientes, no que tange a veiculação de informação com qualidade.
Por sua vez, temos de concluir que perante todas aquelas possibilidades que foram antevistas necessariamente, o Recorrente DD com elas se conformou.
Com efeito, a conformação exige concordância, condescendência, resignação e, portanto, uma adesão da vontade. E adesão da vontade (elemento volitivo) a um resultado previsto como possível (elemento cognoscitivo).
No vertente caso, como vimos, os riscos respeitantes à ocorrência do resultado das acções praticadas eram inevitavelmente elevados (prática pelo ilícito em causa). Com efeito, de acordo com o próprio significado social das acções em causa, existe um inevitável e sério risco que não pode deixar de ser tomado em conta por um administrador experiente, como o Recorrente.
Assim sendo, consideramos que a conduta do Recorrente ultrapassa a mera irresponsabilidade ou indiferença perante o resultado da sua acção, mas antes consiste numa acção animada pela liberdade de escolha do mesmo, no sentido em que o agente, perante o óbvio, acabou por concordar, em condescender, em se resignar face ao resultado das suas acções. Perante um inevitável e sério risco de produção do resultado, o agente acabou por se conformar com a produção do resultado típico.
Perante tudo o que ficou exposto, não podemos aceitar sequer que o agente tenha confiado poder evitar o resultado típico, como forma de se poder sustentar existir negligência consciente. Das regras de experiência comum decorre que há mais de que uma sobrevaloração da sua capacidade pelo agente de direcção final e de uma minivaloração das regras de cuidado, que possa ter desembocado numa confiança em poder evitar o resultado. Não se logra sustentar, salvo melhor opinião, como pôde o agente ter criado a confiança de, perante as acções que estão em causa pudesse evitar o resultado, ou seja, a não violação das regras em causa.
Existe sim, uma decisão, ainda que sob a forma de resignação, pela lesão dos bens jurídicos implícitos.”
A matéria de facto está estabilizada, o Tribunal ad quem não conhece de matéria de facto, só de matéria de direito, sendo que não se verificam evidências no texto da sentença recorrida de qualquer erro notório na apreciação da prova quanto aos pontos invocados pelo Recorrente.
Em suma, não consta do texto da sentença recorrida quanto à apreciação da prova produzida, qualquer contradição com as regras de experiência comum, com os parâmetros da normalidade e razoabilidade, estando a decisão daquela matéria de facto devidamente motivada e explicada, não se afigurando arbitrária a convicção do tribunal a quo.
Improcede, nesta parte, o recurso.
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3ª- Vícios substantivos:

3.1- RJPC- As ofertas particulares de papel comercial apenas faziam impender o dever de informação sobre as entidades emitentes.
Sob as Conclusões 9ª a 12ª o Recorrente sustenta que, na versão do RJPC vigente à data da prática dos factos em causa, as ofertas particulares de papel comercial apenas faziam impender o dever de informação sobre as sociedades emitentes e não sobre os intermediários financeiros por opção deliberada do legislador, sendo que, em face do específico instrumento financeiro comercializado através de ofertas particulares, o dever de informação imposto pelo artigo 17º do RJPC sobrepõe-se ao dever geral de prestação de informação por parte dos intermediários financeiros consagrado nos artigos 7º e ou 312º do CdVM, por evidente relação de especialidade normativa, pelo que, não impendia sobre o intermediário financeiro B... o dever de informação consagrado nos artigos 7º e ou 312º do CdVM por opção do legislador que ao aplicador apenas cumpre respeitar.
Conclui que, não impendendo o dever em causa sobre o B..., à data da ocorrência dos factos em causa (conclusão que juridicamente se impõe, não obstante a condenação deste por decisão não impugnada e, como tal, transitada em julgado), daí decorre naturalmente a absolvição do Recorrente.
Na sentença recorrida o aqui recorrente foi condenado, pela violação, a título doloso, do dever de divulgação de informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM (por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014), o que constitui a prática da contra-ordenação prevista e punida nos termos do artigo 389.º, n.º 1, alínea a), do CdVM e do artigo 388.º, n.º 1, alínea a), do CdVM, na coima de € 300.000,00 (trezentos mil euros).
Conforme já anteriormente decidido, quer em sede de recurso do recorrente AA, quer dos recorrentes Haitong Bank, SA e BB, e cujas considerações aqui se dão expressamente por reproduzidas, apesar do Regime Jurídico do papel Comercial fazer impender sobre as emitentes a obrigação de deveres de informação e, no caso em apreço o papel comercial da R..., S.A ter sido comrecializada mediante oferta particular, sem obrigatória intervenção de intermediário financeiro na sua comercialização, o que é ponto assente e está devidamente provado, é que houve intervenção do B... na sua comercialização na qualidade de intermediário financeiro e, sobre este recai o dever de informação estabelecido no art. 7º, 312º e 389º do CdVM porquanto assim actuou, não excluindo aquele regime jurídico específico do papel comercial os deveres de informação consagrados no CdVM.
Tal como já se fez menção aquando da decisão daqueles recursos, e aqui se relembra para total esclarecimento da questão em apreciação, nos arts. 304º e 312º do CdVM  concretizam-se os princípios e deveres a que se encontra vinculada a actividade de intermediação financeira, designadamente quanto aos deveres de informação.
Segundo o art. 304º  nºs 1, 2 e 5 do CdVM, “os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado.
Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração e às pessoas que dirigem efectivamente a actividade do intermediário financeiro ou do agente vinculado e aos colaboradores do intermediário financeiro, do agente vinculado ou de entidades subcontratadas, envolvidos no exercício ou fiscalização de actividades de intermediação financeira ou de funções operacionais que sejam essenciais à prestação de serviços de forma contínua e em condições de qualidade e eficiência.”
Especificamente quanto aos deveres de informação a investidores, os mesmos surgem elencados no art. 312º ss do CdVM, estabelecendo-se uma obrigação de o intermediário financeiro prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada.
Sendo assim, da conjugação dos referidos preceitos legais resulta que o dever de divulgar informação com qualidade, previsto no artigo 7.º do CdVM, aplica-se a qualquer pessoa ou entidade que divulgue aquele tipo de informação, respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes, isto é,  impõe-se a todos os sujeitos envolvidos na prestação daqueles serviços, com o amplo leque consagrado no art. 304º nº 5 do CdVM.
Através da imposição da DMIF II o âmbito subjectivo do dever de informação foi ampliado, sendo que “a lei fez abranger por tais deveres também outros sujeitos integrados na órbita do intermediário financeiro”, como dispõe o art. 304º nº 5 do CdVM.
Por último, o art. 7º do CdVM deve ser articulado com os arts. 389º e 388º do CdVM que consagram, respectivamente, a qualificação como contraordenação da violação do dever de informação e a sanção correspondente à prática desse ilícito de mera ordenação social de natureza especial.
Segundo o art. 389º nº 1 al. a) do CdVM constitui contraordenação muito grave a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação, que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita ( especificando quem é o destinatário do dever, qual o dever violado e qual a forma que pode assumir essa violação).
Da articulação dos referidos preceitos legais- art. 7º, 304º, 312º, 388º e 389º do CdVM- resulta o tipo de ilícito de natureza contraordenacional por violação do dever de informação com qualidade, pelo qual o recorrente foi condenado.
Assim sendo, toda e qualquer pessoa ou entidade que comunica ou divulga informação sem qualidade, nomeadamente sobre instrumentos financeiros, atividades de intermediação financeira e emitentes, comete a infração que resulta da conjugação do artigo 7.º com a alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do CdVM, estando abrangido o B... nesse grupo de entidades pelas funções que desempenhou na organização e colocação do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A, tendo actuado no mercado de valores mobiliários.
Ainda que as emitentes do papel comercial possam ser responsabilizadas pelas informações inverídicas apostas nas Notas Informativas do papel comercial, isso não invalida que quem tenha agido como intermediário financeiro no mercado de valores mobiliários, no âmbito da organização e na colocação daquele papel comercial (B...) ao violar o dever de informação (sabendo da falta de completude e verdade das referidas informações) fique isento da respectiva responsabilidade, sendo autónomas tais responsabilidades.
Não se ignorou na sentença recorrida que existe um regime especial para o papel comercial, estabelecido no DL nº 69/2004 de 25/3, que regula a disciplina aplicável aos valores mobiliários de natureza monetária designados por papel comercial, que consagra os requisitos de emissão e reembolso de papel comercial,  regime esse que prevê a existência de uma Nota Informativa, impondo a elaboração dessa nota e determinados deveres de informação- no art. 17º- às entidades emitentes ( deveres actualmente mais desenvolvidos no art. 20º-A), no entanto, aquele regime especial nem atribui responsabilidade exclusiva às emitentes na divulgação da informação contida nessas Notas Informativas, nem exclui a possibilidade da informação nelas contida ser divulgada por outrem, designadamente por intermediário financeiro, como foi o caso.
Ora, se o intermediário financeiro presta informação aos investidores sobre um determinado instrumento financeiro e respetivo emitente, deve prestá-la de forma verdadeira, completa, clara, objetiva e lícita, independentemente do conteúdo das Notas Informativas, ou da responsabilidade pela sua elaboração estar atribuída às emitentes por qualquer diploma especial.
O disposto no artigo 17.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25/3, não desonera o intermediário financeiro do cumprimento dos requisitos de qualidade do dever de informação exigidos pelo artigo 7.º do CdVM junto dos investidores, porquanto as referidas informações sobre valores mobiliários e emitentes devem ser prestadas, seja de que forma for, pelos intermediários financeiros e qualquer que seja o regime jurídico especial que consagre cada um dos tipos de valores mobiliários, sob pena de, no limite, ficar esvaziado de conteúdo aquele dever de informação consagrado no CdVM.
Nem sequer se pode dizer que o legislador optou por só fazer impender esse dever de informação sobre as emitentes do papel comercial, se comercializado através de ofertas particulares, porquanto o legislador sabia que, caso fosse comercializado por intermediário financeiro estava assegurado o dever de informação imposto pelo CdVM.
Só assim se compreende que, porventura por impulso da crise gerada pelo “caso B...”, o legislador tenha alterado o RJPC por forma a tornar expresso aquilo que já era uma evidência, que também o intermediário financeiro garante a divulgação de informação ao mercado, por parte da entidade emitente, com observância do disposto no art. 7º do CdVM (art. 15º nº 6 introduzido pelo DL nº 29/2014 de 25/2).
Salienta-se que, contrariando a posição sustentada pelo recorrente, ficou provado nos factos 656 a 660,  que o B..., à data da prática dos factos, tinha a actividade relativa a produtos financeiros suportados em valores mobiliários regulada internamente pela NP 0161/2006 e, que este normativo abrangia a colocação de papel comercial, consagrando expressamente a salvaguarda da qualidade de informação relativa ao papel comercial da R..., S.A e o cumprimento dos deveres de informação perante os clientes, podendo ler-se do parágrafo 3 da NP 0161/2006( sob a epígrafe “Deveres de Informação”) em vigor à data dos factos, o seguinte:
“Deveres de informação:
o Genericamente, o Gestor deverá preocupar-se em fornecer informação de qualidade aos Clientes:
- Dar informações completas, verdadeiras, atuais, claras, objetivas, lícitas, concisas e em linguagem facilmente compreensível para o investidor médio;
- Não dar ênfase a quaisquer benefícios potenciais sem dar igualmente uma indicação correcta e clara de quaisquer riscos relevantes” (fls. 1.958).
A partir do momento em que se deu como provado que o B... divulgou informação sem qualidade, que, embora incluída nas Notas Informativas do papel comercial da EI..., S.A e da R..., S.A elaborada com base nas informações prestadas pelas emitentes, sabia não ser verdadeira, que não mencionavam factores de risco importantes para uma decisão de investimento ponderada e esclarecida, sabendo que estava obrigado a prestar tal informação com qualidade nos termos previstos no artigo 7.º do CdVM, violou o dever de informação, incorrendo na prática da contraordenação prevista no art. 389º do CdVM, tendo o aqui recorrente incorrido na prática da mesma infração enquanto administrador executivo do B... e à luz do conceito extensivo de autoria.
Deste modo, improcede este segmento recursivo.

3.2- A intervenção do recorrente na reunião do Conselho Superior de 7/1/2014 não implicou um contributo causal relevante para a prática do ilícito contraordenacional.
Sob as Conclusões 14ª e 15ª o Recorrente sustenta que a sua intervenção na reunião do Conselho Superior de 7.01.2014 não implicou um contributo causal revelante para a prática do ilícito contraordenacional praticado pelo intermediário financeiro B..., respeitante à prestação de informação sem qualidade aos seus Clientes por referência à comercialização do papel comercial emitido pela R..., S.A entre 9 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2014, pelo que se impõe a sua absolvição.
Mais alegou que, a interpretação das disposições conjugadas dos artigos 16º n.º 1 do RGCO e 389º n.º 1 alínea a) do CdVM no sentido de poder ser punido como (com)participante no ilícito contraordenacional mesmo quem não tenha dado um contributo causal relevante para a sua realização, é inconstitucional por violar o artigo 29º da CRP.
Na sentença recorrida consta a seguinte fundamentação:
“O Recorrente, apesar de não ter assento no Conselho Superior do G..., não tendo poder de voto em sede desse órgão, o certo é que participou na reunião daquele Conselho Superior do G... de 07.01.2014. Na verdade, foi o Recorrente, reforçamos administrador e membro da comissão executiva do intermediário financeiro B..., que apresentou, juntamente com RR, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, com reflexos importantes para a emitente R..., S.A, a qual viu ser discutida e aprovada.
Esse plano de reestruturação, que o próprio gizou juntamente com a equipa que constituiu, previa que, formalizados que fossem os passos necessários à sua implementação efectiva, os efeitos do plano sobre a R..., S.A seriam reportados retroactivamente a 31.12.2013.
Assim sendo, era inevitável que todos os clientes do B... que subscrevessem papel comercial da R..., S.A entre 09.01.2014 (data de referência da decisão administrativa) e a data da efectivação do negócio que determinaria os efeitos na estrutura, natureza e situação económica da R..., S.A passassem a investir num produto com características totalmente diversas das que haviam adquirido e que lhes haviam sido anunciadas, atentos os referidos efeitos retroactivos.
Por sua vez, também os investidores que adquiriram papel comercial da R..., S.A após a data da formalização do negócio, investiram num produto com características totalmente distintas das anunciadas.
Ora, esta decisão cujo projecto inicial teve origem dentro do próprio B..., que era o intermediário financeiro e tinha efeitos sob o próprio emitente, a R..., S.A, foi tomada em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial daquele emitente, emissão essa que teve por por base uma decisão do B..., em que o Recorrente interveio também.
Assim, não só o Recorrente interveio na decisão sobre a emissão, colocação e comercialização de papel comercial da R..., S.A, como também interveio no projecto que desembocou na decisão, que viu ser aprovada, que implicou alterações significativas e relevantes na própria emitente R..., S.A, em pleno curso de um programa de papel comercial, cujos trâmites não foram alterados, incluindo as próprias informações que vinham sendo prestadas pelo B..., que passaram a estar incompletas, desactualizadas, enfim, sem qualidade.
Apesar de não ter assento no Conselho Superior do G..., o certo é que o Recorrente participou nele, sendo administrador e membro da comissão executiva do intermediário financeiro B..., conhecendo os termos do plano de reestruturação com relexos numa emitente de papel comercial com um programa de emissão em curso, por ele gizados.
Sob este prisma, não temos qualquer dúvida de que a actuação do Recorrente DD, nos moldes em que ficou provada, implicou um contributo causal relevante e activo para a prática do ilícito em causa, sendo comparticipante no mesmo, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 16.º do RGCO.
Por seu turno, em termos de tipo subjectivo, mostra-se provado que ao levar ao Conselho Superior do G..., em 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, a qual viu ser aprovada naquela sede, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente DD previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade.
Trata-se de uma conduta a título de dolo eventual (n.º 3 do artigo 14.º do Código Penal) e esse título deverá ser condenado o Recorrente DD.”
A propósito do contributo causal relevante para a prática do ilícito pelo qual o recorrente foi condenado convirá desde já realçar que, o recorrente não foi condenado por ter participado na reunião do Conselho Superior do G... onde foi aprovada a reestruturação do G..., nem o seu contributo se cinge a isso, porquanto apesar de ter levado ao Conselho Superior do G..., em 7/1/2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a proposta de restruturação do G... e simplificação da sua estrututa de participações, não salvaguardou a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro (do qual era Administrador executivo), informar os seus clientes sobre o aí decidido- aqui está o contributo relevante para a violação do dever de informação com qualidade do intermediário financeiro- tendo previsto a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, ainda assim conformou-se com essa possibilidade e não adoptou qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização naquelas condições.
O art. 16º do RGCO consagra um conceito extensivo de autor, bastando para a imputação da contraordenação a verificação de um contributo causal ou co-causal da conduta do agente para o facto, afastando-se a teoria do domínio do facto e, consagra o regime da comunicação da ilicitude, bastando que a qualidade ou relação especial se verifique em qualquer um dos agentes que contribuíram para o resultado ou tentativa para que todos sejam punidos pela moldura da contraordenação específica.
O contributo pode ter a forma de uma acção ou de uma omissão que promova o facto de terceiro ou lese um dever de agir (neste sentido Paulo Pinto de Albuquerque, Figueiredo Dias, Gonçalves da Costa, Costa Pinto e Almeida Costa citados pelo primeiro autor).
O mesmo ocorre nas contraordenacões específicas de valores mobiliários, conforme art. 419º do CdVM.
Por força daquele conceito extensivo de autoria o dever de cumprimento das normas relativas a deveres de informação com qualidade impendiam quer sobre o B..., na qualidade de intermediário financeiro que se encontrava a colocar papel comercial junto dos seus clientes, quer sobre o Recorrente, enquanto membro do Conselho de Administração do intermediário financeiro (cfr. artigos 304.º, n.º 5, e artigo 305.º-D, n.º 1, do CdVM).
O artigo 401.º do CdVM estabelece, quanto à responsabilidade pela prática das contraordenações previstas no CdVM, a responsabilidade das pessoas coletivas, em conjunto ou separadamente das pessoas singulares (nº 5), consoante o seu envolvimento na prática dos factos, sendo que a responsabilidade das pessoas colectivas não exclui a responsabilidade individual dos respectivos agentes.
Frederico Costa Pinto refere que, “Mantém-se no CdVM de 1999 o modelo da imputação autónoma da responsabilidade por ilícitos de mera ordenação social a entes colectivos e entes singulares ( art. 401º nº 1) e a regra da imputação funcional dos factos de pessoas singulares às pessoas colectivas, nos termos do art. 401º nº 2. Ou seja, os factos que constituem contra-ordenação podem ser imputados alternativa ou cumulativamente a pessoas singulares e a pessoas colectivas. Estes regimes pressupõem as regras gerais de atribuição e individualização da responsabilidade, nomeadamente no plano da imputação subjectiva ( art. 402º nº 1 em conjugação com o art. 8º do RGCords) e nunca excluem a responsabilidade dos agentes individuais( art. 401º nº 4).
Novo é o regime do art. 401º nº 3 que acolhe uma infração omissiva pura, necessária para evitar alguns problemas suscitados pelo regime da comparticipação entre sujeitos individuais integrados na estrutura organizativa de entes colectivos. Trata-se de uma infração autónoma ( dolosa ou negligente, como decorre do art. 402º nº 1) que se traduz na violação do dever funcional de impedir práticas ilícitas que tenham lugar dentro de pessoas colectivas, nomeadamente de intermediários financeiros. Ao criar a possibilidade de certos titulares de órgãos de administração, direcção ou fiscalização dos entes colectivos, bem como responsáveis por áreas de actividade, responderem autonomamente pela omissão de controlo dos actos ilícitos, procura-se evitar que se criem dentro das pessoas colectivas zonas francas de responsabilidade aproveitáveis por alguns agentes. Deste modo, visa-se também refoçar os mecanismos de controlo e organização interna de entidades que têm a seu cargo a captação de poupanças do público investidor.”
Deste modo, à luz deste enquadramento legal, está devidamente provado o contributo causal relevante do aqui recorrente para a violação do dever de informação com qualidade do intermediário financeiro, do qual era administrador executivo, tendo plena aplicabilidade o conceito extensivo de autoria.
“(…) Sendo a estrutura do ilícito típico contraordenacional baseda na violação de um dever, autor será em regra a pessoa singular ou colectiva que surge como destinatária do dever e pratica a acção ou omissão que se traduz na respectiva violação.”
Deste modo, tendo este recorrente sido condenado pela comparticipação relevante para a violação do dever de informação com qualidade do intermediário financeiro, nenhuma desconformidade inconstitucional existe na conjugação dos arts. 16º do RGCO e art. 389º nº 1 al. a)do CdVM; mormente a apontada violação do art. 29º da CRP.
Improcede, também, esta parte do recurso.

3.3- A factualidade provada não sustenta a integração normativa do preenchimento do elemento subjectivo do tipo contraordenacional.
Sob as Conclusões 16ª e 17ª o Recorrente sustenta que, a factualidade julgada provada não sustenta a integração normativa do preenchimento do elemento subjetivo do tipo contraordenacional pelo qual o Recorrente foi condenado, pois teria de resultar dos factos julgados provados que DD, no momento em que “(…)apresentou, juntamente com RR, na reunião do Conselho Superior do G... de 7 de Janeiro de 2014, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, discutida e aprovada nessa reunião”, teria representado mentalmente que tal apresentação constituiria um contributo causal relevante para a eventual prestação, por parte do B..., de informação sem qualidade aos subscritores do papel comercial da R..., S.A e se teria conformado com essa possibilidade.
Conclui que, os factos julgados provados não permitem sustentar que o Recorrente– cuja última intervenção nesta matéria foi a aludida apresentação em 7 de janeiro de 2014 – previra como possível, na sequência dessa apresentação, que a informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelasse a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial e se conformara que a mesma fosse nesses termos prestada aos Clientes do B....
Estas alegações do recorrente são feitas ao arrepio da matéria de facto dada como provada, porquanto foi precisamente isso que ficou provado no facto 583- Ao levar ao Conselho Superior do G..., em 07.01.2014, em pleno curso de um programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, a proposta de reestruturação do G... e simplificação da sua estrutura de participações, a qual viu ser aprovada naquela sede, não salvaguardando a necessidade do B..., enquanto intermediário financeiro, informar os seus clientes sobre o aí decidido, o Recorrente DD previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos, 9 de Janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A à data da emissão do papel comercial, mas ainda assim conformou-se com essa possibilidade- ficou plenamente demonstrado que o recorrente actuou com culpa, a título de dolo eventual, como acima já ficou exaustivamente esclarecido.
Improcede este segmento recursivo.

3.4- Erro sobre a factualidade típica que determina a exclusão do dolo.
 Sob as Conclusões 18ª e 19ª o Recorrente sustenta que, a factualidade julgada provada apenas permite sustentar que haveria–quando muito–uma divergência entre a realidade e o que o recorrente representou mentalmente quanto à factualidade típica em causa nos autos, o que nos reconduziria a erro sobre a factualidade típica, previsto no artigo 8º n.º 2 do RGCO, que determina a exclusão do dolo, ficando contudo ressalvada a punibilidade por negligência nos termos gerais, porém, não foram apurados factos demonstrativos da existência de uma apreciação negligente por parte do recorrente e a negligência não se presume.
Segundo o art. 8º nº 2 do RGCO o erro sobre elementos do tipo, sobre a proibição ou sobre um estado de coisas que, a existir, afastaria a ilicitude do facto ou a culpa do agente exclui o dolo.
“No direito de mera ordenação social foi acolhido o critério dualista de tratamento do erro sobre as proibições, com origem no direito penal, pois que temos por um lado uma modalidade de erro sobre as proibições que exclui o dolo (art. 8º nº 2 do RGCO) e por outro um erro sobre a ilicitude que apenas poderá excluir a culpa, se for não censurável, e atenuar a sanção quando o mesmo for censurável”.
Segundo o art. 1º do RGCO constitui contra-ordenação todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima, só sendo punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência ( art. 8º nº 1 do RGCO).
O dolo contraordenacional reside no conhecimento intelectual dos elementos do tipo e no desrespeito pelas proibições ou obrigações legais tuteladas pelas normas contraordenacionais, sendo que, como vimos, em caso de dolo eventual bastará que o agente actue em desvio de um dever-ser social, conformando-se com a possível realização do facto ilícito como consequência da sua conduta.
“O conteúdo volitivo do dolo eventual deve ser detectado na passividade do agente de não querer desencadear os mecanismos volitivos que levassem a evitar, quer a acção principal intencionalmente querida, quer os resultados adjacentes que aquela acção provavelmente desencadearia”.
Ora no caso do recorrente estão, como vimos acima, devidamente provados os elementos intelectual e volitivo do dolo,  a título de dolo eventual, não estando, por seu turno provada qualquer matéria de facto (nem a ela o recorrente faz qualquer menção) passível de consubstanciar erro sobre os elementos do tipo, falta ou errada representação dos elementos do tipo.
Sendo o recorrente destinatário do dever de prestar informação com qualidade, enquanto titular do órgão de administração do intermediário financeiro, com pelouro nas áreas da comercialização de instrumentos financeiros, sabia que os actos em que participou demandavam uma alteração da informação prestada aos investidores do papel comercial da R..., S.A e, no entanto, não salvaguardou a necessidade de o B... informar os seus clientes das alterações sofridas pela emitente em pleno curso do programa de emissão de papel comercial da R..., S.A, quando previu a possibilidade da informação veiculada pelo B... aos seus clientes entre, pelo menos 9 de janeiro de 2014 e 24 de Fevereiro de 2014 não revelar a situação patrimonial, económica e financeira da R..., S.A, mas ainda assim se conformou com essa possibilidade.
Deste modo, tendo o recorrente previsto a falta de informação com qualidade como consequência possível da conduta do B... e persistindo na sua actuação por se conformar com tal resultado, o qual lhe lhe foi indiferente, agiu com dolo eventual.
Em suma, é inegável a demonstração fáctica da actuação do recorrente com dolo eventual, não encontrando a arguição do erro sobre os elementos do tipo o mínimo arrimo na matéria fáctica apurada nos autos.
Improcede, nesta parte, o recurso.

3.5- Falta de consciência da ilicitude por erro não censurável.
 Sob a Conclusão 20ª o Recorrente sustentou que, sempre se imporia a sua absolvição à luz do disposto no artigo 9º n.º 1 do RGCO, por quanto este, conhecedor da «Advertência aos Investidores» constante das Notas Informativas e não sendo jurista, estaria convicto da veracidade do que nela expressamente se afirma quanto à exclusão da responsabilidade do B... pela qualidade da informação constante dessas mesmas Notas Informativas e/ou pela obrigação de atualização dessa mesma informação, o que sempre configuraria – pelo menos – uma situação de falta de consciência da ilicitude, por erro não censurável.
Qanto ao erro sobre a ilicitude, estabelece o art. 9º do RGCO que se o agente actua na convicção de que o comportamento não é contrário ao direito será desculpado pelo que fez, se o erro não lhe for censurável
Segundo aquele preceito legal, age sem culpa quem actua sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
Devemos ter presente que a culpa no âmbito contraordenacional não se equipara à censura ético-penal, consistindo num “desvio do agente relativamente ao papel social que constitui o padrão do sector de actividade em que aquele opera- o que se censura na culpa é o incumprimento do dever em distonia com a hipotética actuação do papel no caso concreto.
O papel funciona, pois, como padrão de culpa, como mediador normativo através do qual a culpa é aferida e atribuída.
Esta característica não só aproxima a culpa da ilicitude, no que tange ao critério de imputação, como torna a culpa contraordenacional menos individualizada ou mais objectivada do que a culpa penal.
Os elementos que servem de base à censura são, como na responsabilidade penal, a imputabilidade, a consciência da ilicitude e a exigibilidade de um comportamento conforme ao dever.”
Mais uma vez o recorrente sustenta um erro, desta vez, sobre a ilicitude, que não tem qualquer suporte factual, porquanto nada se apurou que permita sustentar a exclusão da culpa plenamente provada nos autos.
“A censurabilidade da culpa do agente mede-se pela sua responsabilidade social pela evitação da conduta infractora e não pela atitude interna, ao invés do que sucede no âmbito do direito penal.
(…) Assim, o agente não beneficia de qualquer atenuação da coima se ele tiver a responsabilidade social (por exemplo, profissional ou deontológica) de conhecer os bens jurídicos protegidos pelo direito contraordenacional e as regras que os protegem.”
Assim é no caso em apreço, porquanto o aqui recorrente foi administrador do B... e membro da sua Comissão Executiva durante cerca de 10 anos, tinha acesso à informação relevante sobre os deveres de um intermediário financeiro adstrita ás funções que desempenhava, para mais quando tinha, além de outros, os pelouros do DFME e do DGP, recaindo sobre ele a obrigação de orientar a actividade do B... de acordo com os ditames legais que regulam a referida actividade, era garante do estrito cumprimento dos deveres de informação, entre outros, regulados no CdVM, sabia qual era o conteúdo das Notas Informativas do papel comercial que se dispôs colocar no mercado e comercializar, sabia que no curso dessa comercialização a emitente R..., S.A sofreu alterações significativas que interferiram com a futura possibilidade de reembolso do papel comercial aos investidores, admitiu que essa informação não fosse prestada pelo B... aos seus clientes e mesmo assim não adoptou qualquer medida adequada a pôr termo à comercialização naquelas condições, agindo de forma voluntária e consciente, prevendo que a informação veiculada não respeitasse os requisitos exigidos pelo art. 7º do CdVM e, com isso se conformou.
O recorrente não se pode refugiar nas referidas “Advertências aos Investidores” vertidas nas Notas Informativas pois que a sua responsabilidade enquanto intermediário financeiro não deriva do conteúdo dessas notas, mas de imposições legais imperativas consagradas no CdVM e, essas normas não são afastadas por vontade da emitente do papel comercial, pelo contrário, coexistem deveres de informação sobre todos os que agem no mercado de valores mobiliários, como claramente decorre do art. 389º nº 1 al. a) do CdVM que estipula que constitui contraordenação muito grave a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação, que não seja completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita, assim como se evidencia do actual art. 15º nº 6 do RJPC que impõe essa obrigação cumulativamente á emitente e ao intermediário financeiro- este de forma expressa ao abrigo do art. 7º do CdVM.
Sendo o recorrente um profissional com larga experiência na área de actuação dos intermediários financeiros, não pode invocar falta de conhecimento daqueles deveres, das normas que regulam aquele sector de actividade para excluir a sua culpa, sendo certo que, mesmo que existisse erro (que não consta de qualquer facto dado como provado) o mesmo nunca seria não censurável.
Salienta-se, mais uma vez, que o B... tinha inclusivamente uma normativa que impunha deveres de informação ao intermediário financeiro, mesmo no caso de comercialização de papel comercial, como ficou provado nos factos 656 a 660- NP 0161/2006 o que contraria, frontalmente, o erro arguido pelo recorrente.
Improcede, também nesta parte, o recurso.
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Pelo exposto, improcede totalmente o recurso quanto a este Recorrente, mantendo-se a sentença recorrida no que lhe diz respeito.
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IV. DECISÃO
Em face do exposto, deliberam os Juizes deste Tribunal da Relação:
i. julgar totalmente improcedentes os recursos interpostos pelos recorrentes Haitong Bank SA., AA, BB e DD, mantendo a decisão recorrida;
ii. conceder parcial provimento ao recurso interposto por CC,, suspendendo-se parcialmente a coima única aplicada ao recorrente, pelo montante de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), pelo período de 3 (três) anos, no mais confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos Recorrentes, com excepção do Recorrente CC cujo decaimento não foi total, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC’s para cada um dos Recorrentes (art.°s 513°, n.° 1, do CPP e 8°, n.° 9, do RCP e Tabela III anexa).
Notifique.

Lisboa, 13/7/2022
Maria da Luz Teles Meneses de Seabra
Carlos M G de Melo Marinho
Ana Pessoa