Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
891/09.0TBLNH.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
LITISCONCÓRCIO ACTIVO
COLIGAÇÃO ACTIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/24/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. A taxa de justiça é uma tributação aplicável no âmbito judicial como contrapartida pela prestação de serviços de justiça e é fixada em função do valor e complexidade do processo, sendo devido o pagamento da taxa de justiça pelo impulso processual de cada parte.
2. A parte processual é a pessoa ou cada uma das pessoas que pede a composição do litígio, ou contra quem ela é pedida. Os sujeitos processuais são, ao invés, as pessoas que podem integrar uma parte ou uma pluralidade de partes
3. O artigo 447º, nºs 4 e 5 do CPC, bem como os artigos 6º, nº 1 e 13º, nº 6 do RCP tratam diferentemente as situações de litisconsórcio e de coligação, quer quanto à responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça, quer quanto à respectiva base de cálculo.
4. Estando em causa uma situação litisconsorcial activa que pressupõe uma única relação material controvertida, não faz sentido a imposição do pagamento de uma taxa de justiça por cada um dos sujeitos processuais que compõem a parte activa da relação processual.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES DA 2ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

I.    RELATÓRIO


                        “A” e mulher “B”, residentes em ..., ..., …, …, intentaram contra:
1. “C”, viúva, residente em…, …, …, ….,
2. “D”, casado, residente na Praça…, nº …, ….,…,
3. “E”, casado, residente na Rua…, …, …, em …,
acção declarativa, sob a forma de processo comum sumário, formulando os seguintes pedidos:
a) Serem os réus condenados a reconhecerem que a serventia situada entre o prédio do acervo da herança dos réus e o prédio propriedade dos autores limitada a norte e a sul pelas paredes e muros desses prédios, com cerca de cinco metros de largura e cerca de vinte e cinco metros de comprimento, constituída por destinação de pai de família, em data anterior a 1980, sendo então proprietários dos identificados prédios “F”, já falecido, pai dos 2º e 3º réus, e ora 1ª réus, cônjuge supérstite, “C”;
b) Serem os réus condenados a reconhecer que a referida serventia foi também constituída por usucapião;
c) Serem os réus condenados a não praticarem qualquer acto que diminua ou impeça a passagem dos autores, ou seus convidados, a pé ou com veículos, por esta serventia, para a garagem e logradouro no tardoz do prédio de que são proprietários, através do portão que lhes dá acesso, e a removerem os veículos que se encontram depositados na serventia, impedindo essa passagem.
d) Requerem, ainda, que os réus sejam condenados a sanção compulsória de 20,00€/dia por cada dia que decorra, após o trânsito em julgado da sentença que os condenar, sem removerem os veículos depositados na serventia de acordo com o ora pedido pelos autores.

         Atribuíram os autos à acção o valor de € 15.500,00 e procederam à autoliquidação da taxa de justiça, pelo valor de € 229,50.

         Citados, os réus apresentaram contestação, impugnando os factos alegados pelos autores e procederam, de igual modo, a autoliquidação da taxa de justiça, pelo mesmo valor.

                        O Exmo. Juiz do Tribunal a quo proferiu, em 08.11.2010, o seguinte despacho:

Compulsados os autos, verifica-se que os AA apenas juntaram “uma taxa de justiça” pese embora ocorra uma situação de litisconsórcio.
No tocante às custas judiciais, dispõe o art. 474.º A, n.º 4, do Código de
Processo Civil, nos casos de litisconsórcio (passivo ou activo, necessário ou facultativo, de “marido e mulher” ou outro, uma vez mais por funcionamento do princípio ubi lex non distinguit nec nos distiguere debemos) o litisconsorte que figurar em 1.º lugar, terá de proceder ao pagamento da totalidade da taxa de justiça, salvaguardando-se o direito de regresso para com os demais litisconsortes.
E essa “totalidade da taxa de justiça” é uma taxa de justiça por cada litisconsorte e não uma taxa de justiça a dividir pelo número de litisconsortes, por várias razões.
Em primeiro lugar, nos termos do art. 447.º, n.º 2, do Código de Processo
Civil, a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente (e não parte ou conjunto de sujeitos processuais), pelo que sendo mais do que um interveniente a impulsionar o processo, independentemente de se tratar de litisconsórcio ou de coligação, cada um terá de pagar uma taxa de justiça.
Em segundo lugar, se atentarmos no art. 13.º, n.º 6, al. b), do Regulamento das Custas Processuais, o interveniente que faça seus os articulados da parte a que se associe paga taxa de justiça nos termos a Tabela I-B, daí resultando que o interveniente que apresente articulados próprios terá de pagar pela Tabela I-A. Ora, como sabemos, a “intervenção” é uma das formas de sanar a preterição de litisconsórcio necessário, pelo que se o litisconsorte que intervier mais tarde terá de pagar taxa de justiça “autónoma” (e aqui não se trata do incidente ex se, mas da sua intervenção processual após o incidente ter sido julgado procedente), é óbvio que se intervier ab initio, por igualdade de razão, também terá de pagar, ou seja, a sua “cabeça” terá de ser considerada para efeito do montante da taxa de justiça a pagar pelo 1.º litisconsorte. E nem se diga que tal norma se destina ao pagamento das custas “a final” porque, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, as partes terão de, com a sua primeira intervenção processual (petição inicial, contestação), proceder ao pagamento integral da taxa de justiça relativa àquele processo.
De notar que nem é outro o entendimento perfilhado por Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, p. 56.
Assim, não tendo sido liquidada no montante legalmente exigido, ao abrigo do disposto nos artigos 467.º, n.º 3, e 150.º A, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil, determino o desentranhamento da petição inicial.
Custas da acção pelos AA, nos termos dos artigos 446.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
           
                                    Inconformados com o assim decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, relativamente à decisão prolatada.

                        São as seguintes as CONCLUSÕES dos recorrentes:

i) Os autores pagaram a taxa de justiça pela totalidade nos termos previstos na tabela I-A do Regulamento das Custas Processuais para o valor da causa.

ii) São marido e mulher, casados no regime da comunhão de adquiridos, visando a acção um direito real relativo a um bem comum, conforme se mostra pela certidão predial referente ao prédio de que são proprietários junta à petição inicial como documento n.º 1, pelo que se trata de litisconsórcio necessário nos termos do artigo 28.º do CPC.

iii) O artigo 447.º-A do CPC estabelece que “Havendo litisconsórcio, o litisconsorte que figurar como parte primeira na petição inicial, reconvenção ou requerimento deve proceder ao pagamento da totalidade da taxa de justiça, salvaguardando-se o direito de regresso sobre os litisconsortes.”.


iv) Assim, paga que foi a totalidade da taxa de justiça inicial de acordo com o valor do processo, e representando marido e mulher, que constituem uma sociedade conjugal, uma única parte, incidindo o resultado da acção, dado o regime de bens, num único património, e junto que foi o documento comprovativo desse pagamento, encontra-se satisfeita a obrigação prevista no artigo 467.º do CPC.

v) Seria violar as supra citadas normas constitucionais exigir duplo pagamento da taxa de justiça, quando marido e mulher, pagando do mesmo património e defendendo um interesse comum, vêm pedir ao Tribunal que lhes reconheça um direito que entendem assistir-lhes em comum, como fez notar a Senhora Desembargadora Fátima Galante no Acórdão de 20/05/2010 no processo n.º 491/05.3TCFUN-A.L1-6 deste Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, deve existir uma “correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais designadamente da taxa de justiça, de acordo com o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 2.º CRP, e do direito de acesso à justiça acolhido no artigo 20.º CRP.”.

vi) Quer o artigo 447.º-A, n.º 4, do CPC, ao falar em totalidade distinguindo claramente o litisconsórcio da coligação prevista no n.º 5 da mesma disposição legal, quer o n.º 2 do artigo 447.º, ao fazer depender a taxa de justiça do valor e complexidade da causa (princípio da correspectividade) quer o disposto na al. b) do n.º 6 do artigo 13.º do Regulamento das Custas Processuais, que apenas se deve reportar às partes que se associem e cuja intervenção seja requerida por terem interesse igual ao autor ou ao réu – e não quando o interesse é único e o mesmo – contra o que mui doutamente expressa a fundamentação da douta decisão recorrida, apontam no sentido de, no caso vertente, ser apenas devida uma taxa de justiça de acordo com o valor da acção.

vii) Mas mesmo que a interpretação devesse conduzir à obrigatoriedade de pagamento da totalidade da taxa de justiça por cada um dos


litisconsortes, o que só por dever de patrocínio se admite, não se justificaria fosse ordenado o desentranhamento da petição inicial e o pagamento das custas da acção, com as legais consequências, quando os réus, e diga-se com muita dificuldade e custos, já tinham sido citados e contestado, sem que aos autores não fosse dada a possibilidade de regularizarem a instância no prazo que lhes fosse fixado.

viii) Assim decidiu este Venerando Tribunal da Relação em Acórdão no processo n.º 459/09.OTTFAR-L1-4 de 29/09/2010 (in www.dgsi.pt).

ix) Dispondo o n.º 6 do artigo 467.º do CPC no caso de indeferimento do pedido de apoio judiciário que o desentranhamento da petição só pode ocorrer antes de efectuada a citação do réu, por maioria de razão o mesmo se aplicaria ao caso vertente. Aliás, também o artigo 685.º-D do CPC estabelece regime semelhante nos recursos, não se vislumbrando razão que o afaste no caso vertente, com a instância já longa.

x) Por último, sempre deveria importar o disposto nos artigos 265.º, n.ºs 1 e 2, e 266.º, do CPC, onde resulta o dever/poder do M.º Juiz do processo para, usando os seus poderes de direcção, conceder, ao verificar uma irregularidade, prazo para regularizar a instância.

xi) Dir-se-á, por fim, que uma decisão tão drástica em termos de inutilização de todo um trabalho e custos dispendidos, violará, por certo, o disposto nos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa.

xii) A douta decisão recorrida violou, por incorrecta interpretação, o disposto no n.º 4 do artigo 447.º-A do CPC e o n.º 1 do artigo 6.º do RCP, normas que deveriam ser interpretadas no sentido de ser devida uma única taxa de justiça em caso de litisconsórcio, sendo a totalidade paga de acordo com a coluna A da tabela I do Anexo ao RCP, sendo certo que, tratando-se de marido e mulher casados segundo o regime da comunhão de adquiridos ou de comunhão de bens e tratando-se de bem comum não é aplicável a parte final do n.º 4 do artigo 447.º-A citado. Subsidiariamente, e se não fosse esta a interpretação correcta, o que só por cautela se admite, a douta decisão recorrida, ao não permitir a regularização da instância, viola, por omissão, o disposto nos artigos 265.º, n.º 2, e 266.º do CPC, que abonam em sentido contrário.

                  Pedem, por isso, os apelantes, que seja revogada a decisão recorrida e ordenado o prosseguimento dos autos, dando-se por devidamente satisfeita a taxa de justiça paga pelos autores, ou, se assim se não entender e, por mera cautela, pedem, subsidiariamente, seja fixado prazo para suprir a falta.

                  Os réus não apresentaram contra alegações.

                      Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

***


II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO


                  Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 684º, nº 3 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação dos recorrentes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal
ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

                        Em face ao teor das conclusões a única questão controvertida consiste em saber:

Þ QUAL A TAXA DE JUSTIÇA DEVIDA EM CASO DE PLURALIDADE ACTIVA



por forma a apurar se a parte activa da relação processual composta por duas pessoas (marido e mulher) deverá ser responsável pelo pagamento de uma ou duas taxas de justiça.

***


III . FUNDAMENTAÇÃO


A - DOS TERMOS DA APELAÇÃO



                        Com relevância para a decisão a proferir, importa ter em consideração a alegação factual referida no relatório deste acórdão, cujo teor aqui se dá por reproduzido.


***

B - O DIREITO

                        Estando em causa a questão de saber qual a taxa de justiça que a parte tem de pagar, numa situação de litisconsórcio activo, importa desde já enunciar as normas legais aplicáveis.

                        Como é sabido, o Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro  aprovou o Regulamento das Custas Processuais e procedeu à revogação do Código das Custas Judiciais e a alterações, designadamente, ao Código de Processo Civil, ao Código de Processo Penal, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário.

                        Este novo regime das custas processuais assenta, por um lado, na transferência das regras de cariz substantivo (regras gerais sobre a responsabilidade pelas custas, i.e., conceito de custas, princípios gerais sobre a matéria, titularidade da responsabilidade por custas) para o Código de Processo Civil e para o Código de Processo Penal, os quais serão aplicáveis subsidiariamente a outros tipos de processos; e, por outro lado, na concentração de todas as regras sobre custas num só diploma - Regulamento das Custas Processuais – o qual contém as regras fundamentais sobre a matéria, designadamente, a quantificação da taxa de justiça, o modo de pagamento das custas ou o processamento da correspectiva conta.

                        Ora, decorre do artigo 447º do CPC que
1 - As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.
2 - A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.
           (…)

                        E, dispõe o artigo 447º do CPC, no que aqui interessa, que:
1 - A taxa de justiça é paga apenas pela parte que demande na qualidade de autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou requerido, recorrente e recorrido, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais.
(…)
4 - Havendo litisconsórcio, o litisconsorte que figurar como parte primeira na petição inicial, reconvenção ou requerimento deve proceder ao pagamento da totalidade da taxa de justiça, salvaguardando-se o direito de regresso sobre os litisconsortes.
5 - Nos casos de coligação, cada autor, reconvinte, exequente ou requerente é responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça, sendo o valor desta o fixado nos termos do Regulamento das Custas Processuais.

                        Em relação às regras relativas ao litisconsórcio e à coligação, resulta ainda do artigo 446º  do CPC que:



1 - Tendo ficado vencidos, na totalidade, vários autores ou vários réus litisconsortes, estes respondem pelas custas em partes iguais.
2 - Nos casos de transacção de algum dos litisconsortes, aqueles que transigirem beneficiarão de uma redução de 50 % no valor das custas.
3 - Quando o vencimento de algum dos consortes for somente parcial, a responsabilidade por custas toma tal circunstância em consideração, nos termos fixados no Regulamento das Custas Processuais.
4 - Quando haja coligação de autores ou réus, a responsabilidade por custas é determinada individualmente nos termos gerais fixados no n.º 2 do artigo anterior.

                        Por seu turno, o Regulamento das Custas Processuais, no seu artigo 6º, estatui que:
1 – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.
(…)
3 – Nos processos em que o recurso aos meios electrónicos não seja obrigatório, a taxa de justiça é reduzida a 75% do seu valor quando a parte entregue a primeira ou única peça processual através dos meios electrónicos disponíveis.

                        Prevê-se no artigo 13º, nº 2 do Regulamento das Custas Processuais que “A taxa de justiça é paga integralmente e de uma só vez por cada parte ou sujeito processual, salvo disposição em contrário resultante da legislação relativa ao apoio judiciário”.

                        E, prescreve o nº 6 do citado normativo que “ A taxa de justiça é fixada nos termos da Tabela I-B para: a) As partes coligadas; b) O interveniente que faça seus os articulados da parte a que se associe (…).


                        Com o novo Regulamento das Custas Processuais, o pagamento da taxa de justiça passa a ser devida num só momento, ou quando a parte assim o entenda, em duas prestações até um prazo de 90 dias.

                        De acordo com as novas tabelas, o valor da taxa de justiça não é fixado com base numa mera correspondência face ao valor da acção, não sendo este apenas o elemento decisivo na ponderação da complexidade do processo e na geração de custos para o sistema judicial.

                        Estabeleceu-se, com efeito, no Regulamento das Custas Processuais um sistema misto que assenta no valor da acção, até um certo limite máximo, e na possibilidade de correcção da taxa de justiça quando se trate de processos especialmente complexos, independentemente do valor económico atribuído à causa.

                        Assim, e como se determina no artigo 447.º n.º 1 do Código de Processo Civil, a taxa de justiça é uma tributação aplicável no âmbito judicial como contrapartida pela prestação de serviços de justiça e é fixada em função do valor e complexidade do processo, sendo devido o pagamento da taxa de justiça pelo impulso processual de cada parte.

                        Tal significa que, quando alguém der início a um processo, será, em regra, responsável pelo pagamento de uma taxa de justiça, vigorando o princípio da tipicidade tributária em matéria de custas processuais (artigo 9.º n.º 7 do RCP). É que, para que seja devido o pagamento da taxa de justiça é necessária uma actividade processual, devendo para a mesma estar previsto, no RCP, o pagamento de uma taxa.

                        O valor da taxa de justiça é fixado, como antes ficou dito, em função do tipo, valor e complexidade do processo (artigo 447.º n.º 1 do Código de Processo Civil e artigo 6.º n.º 1 do RCP). A regra geral, prevista no artigo 6.º do RCP, é a de que a taxa de justiça é fixada nos termos da tabela I, anexa ao regulamento. Existem, contudo, regras especiais consoante o tipo ou forma de processo e ainda regras especiais para a prática de actos avulsos (ver Tabelas II, III e IV).

                        As partes vencedoras estão obrigadas a pagar taxa de justiça, nos termos do disposto no artigo 447.º-A n.º 2 do CPC, uma vez que este pagamento não corresponde à obtenção de um vencimento na acção, mas à prestação de um serviço. Contudo, as partes vencedoras têm direito à devolução dos valores pagos a título da taxa de justiça no âmbito do regime das custas de parte.

                        Na Tabela I elencam-se os diversos valores da acção e as correspondentes taxas de justiça, consoante se trate da Tabela I-A, I-B ou I-C, aí se referindo que a taxa de justiça será aplicável a cada parte ou conjunto de sujeitos processuais.

                        Ora, verifica-se que a lei faz referência, simultaneamente, à parte e aos sujeitos processuais, visto que tais conceitos não se equivalem.

                        A parte processual é a pessoa ou cada uma das pessoas que pede a composição do litígio, ou contra quem ela é pedida. Os sujeitos processuais são, ao invés, as pessoas que podem integrar uma parte ou uma pluralidade de partes.

                        Inexiste, é certo, no actual Regulamento das Custas Processuais um preceito idêntico ao nº 3 do artigo 13º do C.C.J. que, em caso de pluralidade activa ou passiva de sujeitos processuais, expressamente identificava cada conjunto composto por mais de um autor, requerente ou recorrente ou mais de um réu, requerido ou recorrido, como uma única parte para efeitos de cálculo da taxa de justiça.

                        Todavia, a lei não regula de forma uniforme as figuras do litisconsórcio e da coligação.



                        E, como é sabido, o litisconsórcio distingue-se da coligação pela relação material controvertida. No primeiro caso é uma só, ao passo que na coligação, são duas ou mais, e reporta-se, necessariamente, a pretensões objectivamente diferentes - EURICO LOPES CARDOSO, Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, 3ª edc. 105 e SALVADOR DA COSTA, Os incidentes da Instância”, 3.º ed.,  78.

                        Dificulta a Lei a distinção entre litisconsórcio e coligação porquanto, nos artigos 27º e 30º do CPC, caracteriza esta, a partir da pluralidade de pedidos, e aquele, pela unidade de relação jurídica.

                        No entanto, a doutrina tem entendido que o litisconsórcio e a coligação se distinguem porque nesta, há pedidos diferentes dirigidos por cada um dos autores discriminadamente contra uma pluralidade de partes; e naquele, unidade de pedido dirigido contra mais de uma parte, ou pluralidade de pedidos não discriminadamente dirigidos ou dirigidos discriminadamente se idênticos no seu conteúdo e fundamentos – v. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, vol. II, 256 e ss.

                        A coligação pressupõe, pois, uma pluralidade de partes principais e uma pluralidade de pedidos que são formulados diferentemente por cada um dos autores ou contra cada um dos réus – v. a este propósito MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, 87-88.

                        Sucede que o artigo 447º, nºs 4 e 5 do CPC, bem como os artigos 6º, nº 1 e 13º, nº 6 do RCP tratam diferentemente as situações de litisconsórcio e de coligação, quer quanto à responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça, quer quanto à respectiva base de cálculo.

                        Como acima se mencionou, o artigo 447º, nº 4 do CPC, ao tratar do litisconsórcio estatui que será o litisconsorte que, designadamente,  figurar  como  primeiro  autor  na  petição  inicial,  que deverá proceder ao pagamento da totalidade da taxa de justiça, sem prejuízo do direito de regresso sobre os demais.

                        Já no caso da coligação, expressamente decorre do nº 5 do citado artigo 447º que, designadamente, cada um dos autores será responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça.

                         Daí se considerar que não será exigível, numa situação de litisconsórcio inicial, o pagamento de tantas taxas de justiça quantos os autores, aplicando-se a Tabela I-A. E, tratando-se de partes coligadas, cada um dos autores haja de pagar a sua taxa de justiça, mas fixada nos termos da Tabela 1-B, que é metade da Tabela I-A (v. artigo 13º, nº 6 do RCP.

                        Entende-se que no caso aqui em apreciação - litisconsórcio activo - porque está em causa uma única relação material controvertida, não faz sentido a imposição do pagamento de uma taxa de justiça por cada um dos sujeitos processuais que compõem a parte activa da relação processual, como se decidiu na 1ª instância.

                        Discorda-se, consequentemente, da posição sufragada na decisão recorrida, razão pela qual se julga procedente o recurso de apelação.

                        E, uma vez que os autores procederam ao pagamento da devida taxa de justiça, revoga-se a decisão recorrida, devendo a acção prosseguir os seus ulteriores termos.

                        Sem custas.

***


IV. DECISÃO


                        Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida, determinando-se a prossecução dos ulteriores termos do processo.

                        Sem custas.

Lisboa, 24 de Março de 2011

Ondina Carmo Alves - Relatora
Ana Paula Boularot
Lúcia Sousa ( Em substituição de Maria da Luz  Borrero Figueiredo, ausente por doença nos termos do artigo 711º, nº 2 do CPC e com dispensa de vistos)