Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
54/16.8PEALM.L1-5
Relator: ARTUR VARGUES
Descritores: INDEMNIZAÇÃO
VÍTIMA ESPECIALMENTE VULNERÁVEL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSOS PENAIS
Decisão: NÃO PROVIDO O RECURSO DO ARGUIDO E PROVIDO O DO MºPº
Sumário: - Da leitura conjugada dos artigos 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, 67º-A, do CPP e 82º-A, do mesmo Código, resulta a imposição (excepto no casos em que a vítima expressamente se opuser) ao Tribunal de fixar, em relação a vítimas especialmente vulneráveis, reparação pelos danos sofridos, a suportar pelo agente do crime.
- Provado que a vítima tinha, à data dos factos, 73 anos de idade e usava uma “canadiana” para auxiliar a sua locomoção, pode concluir-se pela sua especial fragilidade em razão da idade e estado de saúde e, consequentemente de estarmos perante “vítima especialmente vulnerável”.
- No caso em apreço, não tendo sido por ela deduzido pedido de indemnização civil no processo penal, nem, tanto quanto se sabe, em separado e também não se opôs expressamente a que lhe fosse arbitrada quantia reparadora, haverá que fixar uma quantia a título de reparação dos prejuízos sofridos.
- Mas, não há que chamar à colação para a respectiva determinação as normas relativas à responsabilidade civil extracontratual, visto que a sua atribuição não é regulada pela lei civil, mas de acordo com o disposto nos artigos 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, 67º-A e 82º-A, do CPP, sendo que estes se não reportam a uma verdadeira indemnização, mas à reparação dos prejuízos – uma vez que a quantia é tida em conta em acção que venha a conhecer o pedido civil de indemnização, de acordo com o nº 3, do mesmo artigo - figuras jurídicas não exactamente coincidentes, pelo que somos levados a concluir que o que o legislador pretendeu foi a fixação de reparação, ainda que tenha utilizado de forma lata o termo “indemnização”, o que conduz a que seja calculada de acordo com a equidade.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I - RELATÓRIO

1. Nos presentes autos com o NUIPC 54/16.8PEALM, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Criminal de Almada – Juiz 1, em Processo Comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, foi o arguido J. condenado, por acórdão de 15/10/2018, nos seguintes termos:

Pela prática, em co-autoria (com o arguido, não recorrente, C. ) e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão;

Pela prática, em co-autoria (com o arguido, não recorrente, C. ) e na forma consumada, de um crime de burla informática, p. e p. pelo artigo 221º, do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão;

Após cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 1 ano e 1 mês de prisão.


2. O arguido J. não se conformou com o teor da decisão e dela interpôs recurso, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões (transcrição):

1o Foi o arguido, ora recorrente, condenado, em cúmulo jurídico, na pena de 1 (um) ano e 1 (um) mês de prisão efectiva, pela prática de um crime de furto simples, p.p. pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal e pela prática de um crime de burla informática, p.p. pelo artigo 221.º, n.º 1 do Código Penal.
2o Este venerando tribunal não pode ignorar que não existem provas concretas da culpabilidade do recorrente em relação aos factos referidos nas situações referidas nos pontos 3. e 27. do "Capítulo II- Fundamentação de facto, Factos provados" do douto acórdão.
3o O tribunal a quo baseou a sua sentença meramente em suposições decorrentes de, salvo o devido respeito, um entendimento arbitrário das intenções do ora recorrente, e não dos factos relatados por este c pela única testemunha ocular.
4o O douto acórdão deverá ser revogado na parte em que considera provada a participação do recorrente, pois a única testemunha ouvida cm audiência sobre os factos, MVV, situa-o a mais de 10 metros encostado a uma montra, de onde nem sequer tinha visibilidade para o interior do hall de entrada do prédio da ofendida, local onde o furto foi praticado.
5o Ora, neste recurso impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, sendo que, em função disso e do princípio da livre apreciação da prova, que se traduz numa valoração racional e critica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos que permite objectivar a apreciação dos factos, requisito necessário para uma motivação da decisão, tem de concluir-se, em nosso entender, que existem diversas contradições e consequentemente inúmeras dúvidas, pelas quais a decisão do tribunal "a quo" não se deixou tomar, mas devia.
6o Ate porque, da leitura do acórdão, do qual se recorre, nomeadamente nos factos dados como assentes e fundamentação que aqui se impugnou e a indicação das provas que ora se elencaram e expuseram e fundamentam este recurso, constata-se que o aludido princípio deve e pode ser chamado ao caso.
7o Deste modo, e até apenas pelas regras da experiência comum, haveria manifesto erro na apreciação da prova para que houvesse lugar à decisão de que agora se recorre - art. 410.º, n.º 2, alínea c) do Cód. Proc. Penal.
8o De facto, não existindo um ónus dc prova que recaia sobre os intervenientes processuais e devendo o tribunal investigar autonomamente a verdade, deverá este não desfavorecer o arguido sempre que não logre a prova do facto; isto porque o princípio in dúbio pro reo, uma das vertentes que o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP) contempla, impõe uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos: em tal situação, o tribunal tem de decidir a favor do arguido.
9o Pelo que a pena imposta ao arguido é excessiva e o mesmo deveria ter sido absolvido da prática em co-autoria do crime de furto, atento o princípio in dúbio pro reo.
10º Não tendo decidido a favor do arguido, o douto Tribunal violou o art. 32º nº 2 da Constituição da República Portuguesa e 127º do Código Processo Penal.
11o "Em processo penal, a justiça, perante a impossibilidade de uma certeza, encontrando-se na alternativa de aceitar, com base em uma probabilidade ou possibilidade, o risco de absolver um culpado e o risco de condenar um inocente, só pode tomar uma solução jurídica e moral: deve aceitar-se o risco de absolvição do culpado e nunca o da condenação de um inocente".
12º Para os efeitos do disposto no art. 412º nº 3 do Código dc Processo Penal indicam-se os pontos de facto incorretamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e cuja análise se reputa deve ser reapreciada pelo Tribunal de Recurso:
a) Os concretos pontos de facto incorretamente julgados são os factos dados como provados na sentença a pontos 3. e 27. na parte em que se referem ao ora recorrente J. .
b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida são o depoimento da testemunha MVV, constante da acta de audiência de discussão e julgamento de 17.09.2018, a Fls. 671 e 678 dos autos, gravação digital compilada no CD - sessão de 17.09.2018, entre as 11h11m34s e as 11h29m59s, bem como as declarações do arguido J.  , constante da acta de audiência de discussão e julgamento de 02.10.2018 a Fls. 693 e 693 vs. dos autos, gravação digital compilada no CD - sessão de 02.10.2018 entre as 12h18m38s e as 12h30m53s.
13º Para os efeitos do artigo 412, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal a decisão, ora impugnada, violou os artigos 127º e 410º nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal e, bem assim, o artigo 32º da Constituição da República Portuguesa ao fazer errada apreciação da prova e ao não aplicar, nem na globalidade, nem na apreciação e valoração concreta de cada um dos meios da prova a versão mais favorável ao arguido, pelo menos nas situações de contradição e dúvida.
14º Pelo exposto, tendo em consideração os vícios de que sofre a decisão recorrida, os meios de prova supra referidos, que foram devidamente impugnados, verifica-se o preenchimento dos requisitos do artigo 431º do Código de Processo Penal, pelo que deverá proceder-se à alteração da matéria de facto no sentido apontado supra e ser o arguido, aqui recorrente, absolvido do crime de furto simples em que foi condenado.
15º Deveria ainda, porque estão prenchidos os requisitos para tal, a pena pela prática do crime de burla informática ter sido suspensa na sua execução, por se tratar de uma pena de prisão não superior a cinco anos de prisão, nos termos do artº 50.º do Código Penal,
16º Ou, em alternativa, ser a pena executada em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, por se tratar de uma pena de prisão não superior a dois anos de prisão, com o expresso consentimento do condenado, nos termos do preceituado no art 43.º, nº 1, al. a) do Código Penal.
Tudo ponderado, nestes termos e nos mais de Direito, que V.as Excelências doutamente suprirão, deverá ser reparada a decisão proferida pelo tribunal de 1a instância e substituída por outra que absolva o arguido, ora recorrente, do crime de furto e, bem assim, ser revogada e substituída por pena suspensa ou em regime de permanência em habitação a pena de prisão por burla informática, em consonância com as pretensões expostas supra.

3. Também o Ministério Público interpôs recurso da decisão, apresentando as conclusões que se transcrevem:


Vem o presente Recurso interposto sobre a exclusão de reparação oficiosa deliberada pelo Colectivo, que aplicou e interpretou o regime da protecção das "vítimas especialmente vulneráveis" de forma redutora, em nossa opinião, contrariando a disciplina dos arts 67º-A, 1, b), e 82º-A, CPP, e 16º, 2, do Estatuto da Vítima/L130/15, 4.09, que habilitava e impunha tal arbitramento, atendendo à condição concreta da ofendida AL , pessoa particularmente indefesa, vítima das acções delituosas dos arguidos, que, sobre si, agiram conjuntamente, elegendo-a como alvo, vigiando-a, abordando-a e desapossando-a de bens e valores, sem que lhes pudesse oferecer, à luz das condicionantes físicas e etárias, captáveis à vista desarmada, qualquer oposição apta a cessar e fracassar o desiderato criminoso.

Com todo o respeito, e é muito, consabidamente, afigura-se-nos que o Tribunal "a quo" restringiu a possibilidade legal de concessão indemnizatória, oficiosamente, à verificação de uma tipologia taxativa (arts 67º-A, 3, CPP), quando, além dessa situação (automática), outras se inscrevem na letra da lei (arts 67º-A, 1, b), CPP, e 16º,2, Estatuto da Vítima), reunido que seja um "perfil" de vítima caracterizado pelo legislador (art 67º-1, b), CPP), que evidencie uma especial desprotecção do ofendido diante do agente infractor, impotente para se lhe opor, constituindo, esse aproveitamento, uma agravada ofensa aos direitos desse cidadão.

"In casu", acresce dizê-lo, nenhum dos arguidos expressou consubstanciadamente qualquer gesto que minimizasse a revolta e sofrimento da vítima, idosa e com notadas limitações físicas, capaz de lhe restituir, não só o património retirado, mas, porventura sobretudo, alguma tranquilidade e paz, intensamente perturbadas.

Pugnamos, pois, pela atribuição de um valor reparador, que se ajuste à dimensão dos danos, materiais e emocionais, capaz de esbater a repulsa social presumida pelo legislador (normas citadas), assim, concomitantemente, se afirmando a "mens legis", em toda a sua assertividade.

Vªs Exªs, porém, dirão JUSTIÇA a nosso ver repondo a validade das normas violadas, com o sentido que elas encerram.

4. O Magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo respondeu à motivação de recurso do arguido, concluindo pela sua improcedência, salvo quanto à aplicação do regime de permanência na habitação, em que opina no sentido da satisfação da pretensão.

5. Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto pelo arguido.

6. Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do CPP, não tendo sido apresentada resposta.

7. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1.   Âmbito do Recurso

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.

No caso em apreço, atendendo às conclusões das motivações de recurso, as questões que se suscitam são as seguintes:

Recurso interposto pelo arguido

Vício de erro notório na apreciação da prova.

Impugnação da matéria de facto/erro de julgamento/violação do princípio in dubio pro reo.

Dosimetria da pena aplicada/verificação dos pressupostos de aplicação das penas de substituição de suspensão da execução da pena ou regime de permanência na habitação.

Recurso interposto pelo Ministério Público

Verificação dos pressupostos da reparação oficiosa à vítima AL .

2. A Decisão Recorrida

O Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos (transcrição):

1. No dia 14 de Março de 2016, cerca das 13h30m, a ofendida AL , de 73 anos de idade, e que usava uma canadiana para auxílio à locomoção, estava a chegar à sua residência sita na Rua Borges ....
2. Ao chegar à porta de casa foi abordada pelo arguido C. , que se encontrava acompanhado do arguido J. , que se ofereceu para lhe carregar as compras até ao interior do imóvel, o que esta aceitou.
3. O arguido C.  entrou no hall do prédio, enquanto o outro arguido se manteve no exterior, vigiando o local.
4. Imediatamente a seguir e sem que nada o fizesse prever, o arguido C. , retirou de dentro do saco de compras da ofendida, que este trazia consigo, uma pochete, após o que, de imediato, se colocou em fuga, juntamente com o arguido J. .
5. No interior da "pochete" da ofendida encontravam-se o seu telemóvel e diversos cartões de identificação e bancários.
6. Durante os factos atrás descritos os arguidos lograram ainda apropriar-se de uma libra em ouro no valor de pelo menos 249€, que o arguido J. vendeu em Lisboa, no mesmo dia, pela quantia de 249€.
7. Os arguidos C.  e J.procederam ainda a seis levantamentos de 60€ cada através de um dos cartões e pin que se encontravam no interior da bolsa da ofendida, emitido pelo Novo Banco, no dia dos factos, pelas 14h43m, no ATM da Praça da Portela, da agência do Banco Millenium, a cerca de 800m do local dos factos.
8. Os arguidos C.  e J. tentaram ainda proceder a levantamentos com o cartão multibanco da ofendida no ATM colocado no Posto de Abastecimento de Combustíveis da GALP, sito na Avenida Duarte Pacheco.
9. No dia 17 de Abril de 2016, cerca das 13h30m, o arguido C.  dirigiu-se ao Centro Comercial Laranja, sito no Largo Francisco Sanches, no Laranjeiro, onde entrou no estabelecimento comercial de MJR , perguntando por uma carteira que se encontrava na montra.
10. No momento em que a ofendida se dirigiu à montra da loja, o arguido C.  pegou no computador portátil que se encontrava em cima de uma mesa, de valor pelo menos superir a €102,00, do qual se apropriou, após o que se colocou em fuga.
11. No dia 31 de Dezembro de 2016, entre as 00h30m e as 02h, o arguido C.  dirigiu-se à Rua Tomé de Sousa, em Almada, onde, através de uma janela, se introduziu no -- sito no n.º --.
12. Uma vez no interior da residência, o arguido C.  retirou um relógio e 90€ em dinheiro, bens pertencentes a JC  , sendo que o valor dos bens subtraídos ascende pelo menos a quantia superir a €102,00, bens de que se apropriou, após o que abandonou o local.
13. No dia 15 de Fevereiro de 2017, o arguido C. , dirigiu-se ao Parque de Estacionamento denominado "... Laranjeiro" sito na Rua D. …, no Laranjeiro, e introduziu-se no interior do gabinete de trabalho de uma funcionária, logrando abrir a grade metálica de protecção e forçando uma porta automática, do qual retirou quantia entre os €30,00 e os €40,00 que se encontrava dentro de um cofre, e um computador portátil de valor pelo menos superior a €102,00 após o que abandonou o local, apropriando-se destes bens.
14. No dia 21 de Março de 2017, pelas 19h, o arguido C.  dirigiu-se à lavandaria "AS", sita em Almada, onde entrou, sentando-se numa cadeira, depois de ter ido buscar umas revistas, por forma a observar o funcionamento da loja.
15. No dia seguinte, cerca das 19h17m, o mesmo arguido regressou a este estabelecimento comercial, no qual entrou, dirigiu-se à porta de acesso à zona privativa, cuja abertura conseguiu forçar, introduzindo-se no seu interior, onde forçou a abertura de um cofre moedeiro, do qual retirou quantia não inferior a €300,00, após o que abandonou o local apropriando-se de tal quantia.
16. No dia 2 de Abril de 2017, pelas 16h10m, o arguido C.  dirigiu-se à Lavandaria "AS", sita no Laranjeiro, onde entrou.
17. Uma vez aí, o arguido C. , munido de um formão, forçou a abertura da porta de acesso à zona técnica do estabelecimento, onde entrou, e de seguida, forçou a abertura da máquina de pagamento automático, da qual retirou a caixa de depósito de notas, que continha uma nota de 10€ e diversas moedas, no valor de pelo menos 112€, da qual se apropriou, após o que se colocou em fuga.
18. Em resultado do arrombamento do cofre e da porta o arguido causou ainda prejuízo no valor de pelo menos 140€.
19. No dia 10 de Abril de 2017, cerca das 20h15m, o arguido C.  dirigiu-se ao n.º.., da Rua Florbela Espanca, em Corroios.
20. Urna vez aí, cortou uma rede que vedava a residência da parte de trás, assim logrando introduzir-se no terreno, após o que partiu o vidro de um janela das traseiras, através da qual acedeu ao interior do imóvel, do qual retirou um aparelho de televisão de valor pelo menos superior a €102,00, que passou para o exterior através da colocação de um cobertor na janela.
21. Após o arguido abandonou o local, apropriando-se do referido bem, que fez seu.
22. No dia 21 de Abril de 2017, entre as 02h15m e as 02h45m, o arguido C.  acompanhado de pessoa não concretamente identificada, dirigiu-se à lavandaria "AS", local onde forçou a porta da entrada das traseiras, após o que, no interior do estabelecimento, tentou, sem sucesso, forçar a porta de acesso à sala onde se encontra a registadora e outros bens, de valor pelo menos superior a 102€, tendo para isso danificado a parede, não logrando os seus intentos na medida em que o alarme de segurança disparou, pelo que se colocou em fuga.
23. No dia 18 de Agosto de 2017, entre as 09h40m e as 14h45m, o arguido C.  dirigiu-se à Praça da Portela, em Almada, onde se encontrava estacionado o motociclo de marca Honda, matrícula 38, no valor de 2.000€, e através de uma ligação directa, conseguiu colocá-lo em funcionamento, abandonando o local, apropriando-se do mesmo.
24. O motociclo viria a ser recuperado mais tarde e entregue à sua legítima proprietária.
25. No dia 12 de Setembro de 2017, cerca das 14h05m, o arguido C.  dirigiu-se à Rua Borges ..., onde se introduziu na Imobiliária U..
26. Uma vez no interior do local, o arguido retirou um computador portátil e dois telemóveis de marca Samsung, um deles da funcionária da mediadora, tudo de valor pelo menos superior a €102,00, por cada objecto.
27. Agiu o arguido C.  nas circunstâncias de tempo modo e lugar atrás descritas, ora por si, ora em conjugação de esforços com o arguido J.em uma ocasião, mas sempre na execução de plano previamente delineado, livre e conscientemente, com intenção de, na situação descrita em 1 a 8 se apoderar dos bens que a ofendida tivesse consigo e a procederem a levantamentos em dinheiro através de cartão e pin da mesma, sabendo que para tal não estavam autorizados, nas restantes ocasiões, o arguido C.  dos bens que se encontrassem no interior de residências, estabelecimentos comerciais, espaços fechados e via pública, que fez seus, bem sabendo que não lhe pertenciam e que agia contra a vontade dos seus proprietários, e, o arguido C., introduzindo-se, ainda, noutras situações no interior de residências e estabelecimentos comerciais, forçando a abertura de portas, janelas e cofres, e por outros meios ilegítimos, sabendo ambos os arguidos que todas estas condutas são proibidas e punidas por lei penal.
28. Como consequência da conduta do arguido C.  , o motociclo de ARG ficou com a tranca de direcção partida e com danos nas carenagens, tendo esta despendido com a reparação do mesmo a quantia de €367,99.
29. Como consequência da conduta do arguido C.  , ARG teve que adquirir um novo "top case" para o seu motociclo, pelo qual despendeu a quantia de €70,00.
30. Como consequência da conduta do arguido C., ARG ficou privada do seu motociclo durante 42 dias, tendo despendido em títulos de transporte a quantia de €58,70.
31. Como consequência da conduta do arguido C. , ARG, viu-se privada do "top case" da sua motorizada, tendo despendido com a compra de um novo a quantia de €70,00.
32. Como consequência da conduta do arguido C. , MJR  ficou privada de todos os documentos, ficheiros e programas que tinha instalado no seu computador, adquirido pelo valor de €399,00.
33. Como consequência da conduta do arguido C. , MJR  ficou perturbada e com receio.
Antecedentes criminais:
34. Por acordão proferido pelo Tribunal de Almada (proc. 1837/99.7PBALM), devidamente transitado em julgado em 28/05/2001, datado de 11/05/2001, o arguido C.  foi condenado pela prática de um crime de furto de uso de de veículo e um crime de furto simples, ambos na forma tentada, praticados em 08/11/1999, na pena de 10 meses de prisão.
35. Por acordão proferido pelo Tribunal de Lisboa (proc. 545/99.3PBLSB), devidamente transitado em julgado em 18/01/2002, datado de 21/12/2001, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de roubo, praticado em 19/07/1999, na pena de 2 anos de prisão suspensa por 1 ano.
36. Por sentença proferida pelo Tribunal do Seixal (proc. 889/01.6PCALM), devidamente transitada em julgado em 13.05.2004, datada de 28.04.2004, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 25.06.2001, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €2,50.
37. Por sentença proferida pelo Tribunal do Seixal (proc. 1091/08.1PFSXL), devidamente transitada em julgado em 07.12.2017, datada de 02.10.2008, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de dano, praticado em 05.09.2008, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €6,00.
38. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 574/07.5PCALM), devidamente transitada em julgado em 24.05.2007, datada de 03.05.2007, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 03.05.2007, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €3,50.
39. Por sentença proferida pelo Tribunal do Seixal (proc. 623/08.0PFSXL), devidamente transitada em julgado em 07.06.2018, datada de 12.03.2012, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 02.06.2008, na pena de 3 meses de prisão suspensa por 1 ano.
40. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 343/07.2PTALM), devidamente transitada em julgado em 19.05.2010, datada de 18.12.2007, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução perigosa de veúculo rodoviário e um crime de condução sem habilitação legal, praticados em 27.11.2007, na pena única de 340 dias de multa à taxa diária de €5,00 e na pena acessória de proibição de conduzir por 6 meses.
41. Por sentença proferida pelo Tribunal de Portel (proc. 81/06.3GAPRL), devidamente transitada em julgado em 20.05.2010, datada de 25.09.2010, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 06.09.2006, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de €4,00.
42. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 2/11.1YESXL), devidamente transitada em julgado em 10.01.2013, datada de 26.10.2012, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 23.07.2011, na pena de 9 meses de prisão suspensa por 1 ano.
43. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 843/15.0PGALM), devidamente transitada em julgado em 09.02.2018, datada de 20.12.2016, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 15.07.2015, na pena de 16 meses de prisão suspensa por igual período de tempo.
44. Por sentença proferida pelo Tribunal do Seixal (proc. 1154/15.7PGALM), devidamente transitada em julgado em 24.04.2018, datada de 16.03.2018, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal e um crime de furto simples, praticados em 29.09.2015, na pena única de 7 meses de prisão suspensa por 1 ano.
45. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 1655/04.2TBALM), devidamente transitada em julgado em 10.05.2004, datada de 23.04.2004, o arguido J.foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 13.04.2004, na pena de 50 dias de multa à taxa diária de €4,00.
46. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 109/06.7PEALM), devidamente transitada em julgado em 01.09.2008, datada de 01.07.2008, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de furto, praticado em 01.10.2006, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,00.
47. Por acordão proferido pelo Tribunal do Seixal (proc. 42/03.4PESXL), devidamente transitado em julgado em 11/05/2009, datado de 02/04/2009, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado, praticado em 25/10/2003, na pena de 2 anos e 6 mesesde prisão suspensa por igual período de tempo.
48. Por acordão proferido pelo Tribunal de Lisboa (proc. 185/10.8PGLSB), devidamente transitado em julgado em 28/11/2012, datado de 25/10/2012, o mesmo arguido foi condenado pela prática dois crimes roubo na forma consumada e um crime de roubo na forma tentada, praticados em 29/04/2010, na pena de 2 anos e 1 mês de prisão suspensa na sua execução, com regime de prova, por igual período de tempo.
49. Por sentença proferida pelo Tribunal do Seixal (proc. 661/14.3PFSXL), devidamente transitada em julgado em 20.11.2015, datada de 06.01.2015, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticado em 21.08.2014, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de €5,00.
50. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 1897/13.0PGALM), devidamente transitada em julgado em 01.06.2017, datada de 10.07.2015, o mesmo arguido foi condenado pela prática de um crime de violência depois da subtracção, praticado em 10.12.2013, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução, com regime de prova, por igual período de tempo.
51. Por sentença proferida pelo Tribunal de Almada (proc. 623/07.7TAALM), devidamente transitada em julgado em 16.07.2008, datada de 14.05.2008, a arguida T. foi condenada pela prática de um crime de denúncia caluniosa, praticado em 30.11.2005, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de €5,00.

Condições socioeconómicas:
52. O arguido C.   nasceu no seio de uma família integrada a nível socioeconómico.
53. O mesmo arguido tem o 4.º ano de escolaridade, tendo abandonado a escola aos 15 anos de idade.
54. Após, iniciou a sua vida laboral, na actividade de montagem de tectos, como funcionário da empresa detida pelo seu progenitor.
55. Após o fecho da empresa do progenitor, o arguido emigrou tendo trabalhado no Dubai, Espanha e Holanda, onde permaneceu por curtos períodos de tempo.
56. O mesmo arguido iniciou consumo de heroína e cocaína com 17 anos de idade.
57. Tem um filho de um anterior relacionamento.
58. À data dos factos, o arguido vivia com os pais, encontrava-se desempregado, consumia estupefacientes e convivia com pessoas conotadas com comportamentos aditivos e criminais.
59. Actualmente, ambos os progenitores do arguido encontram-se a residir em bairro social, desempregados, auferem rendimento de inserção social no valor global de €312,00, exercendo esporadicamente , a progenitora a atividade de venda ambulante e o progenitor a actividade de mariscador, e por vezes, a actividade de servente na área da construção civil.
60. A irmã do arguido reside no mesmo bairro social, com o companheiro e as duas filhas, vivendo da actividade de venda ambulante.
61. No estabelecimento prisional, o arguido C.  apresenta vários processos disciplinares.
62. O mesmo arguido é acompanhado no programa de substituição de opiáceos por metadona.
63. O arguido J. nasceu e cresceu em meio socioeconómico desfavorável, sendo o mais velho de dois irmãos.
64. O mesmo arguido tem o 4.º ano de escolaridade.
65. Após, a conclusão da 4.ª classe, e em virtude do consumo de bebidas alcoólicas e violência do progenitor, o arguido, irmãos e mãe abandonaram a residência de família, deslocando-se para o Laranjeiro/Almada.
66. Nessa altura, o arguido J.  começou a realizar trabalhos em obras para comparticipar nas despesas de casa.
67. O arguido J.  começou os consumos de heroína aos 12 anos de idade.
68. Por volta dos 16/17 anos de idade, o arguido J.  deslocou-se para Lisboa, passando a viver como sem-abrigo, pernoitando, por vezes, numa associação.
69. Após regresso para junto da progenitora, iniciou tratamento à toxicodependência, na Comunidade Teraêutica da Equipa de Tratamento de Almada, tendo iniciado uma relação e voltado a trabalhar na construção civil.
70. O arguido J.  tem um filho com 14 anos de idade, de uma relacionamento anterior, que durou cerca de 6/7 anos.
71. Após o fim de tal relacionamento, o arguido J.  voltou para Lisboa, na condição de sem-abrigo e toxicodependente.
72. Após novo regresso para junto da progenitora, reiniciou, em 2014, tratamento à toxicodependência, na Comunidade Teraêutica da Equipa de Tratamento de Almada.
73. À data dos factos, o arguido J.  residia com a progenitora, não tendo actividade laborai regular, efectuando alguns trabalhos na apanha da amêijoa.
74. Desde Setembro de 2017, que o arguido J.  mantém tratamento à toxicodependência junto da Equipa de Tratamento de Almada, no âmbito de plano de reinserção social que lhe foi imposto no processo 1897/13 .0PGALM.
75. Actualmente, o arguido não tem actividade laboral regular.

Quanto aos factos não provados, considerou como tal (transcrição):

1. Aquando das circunstâncias referidas em 2), AL  declinou, agradecendo.
2. Aquando das circunstâncias referidas em 2), o arguido C.  insistiu, pedindo à ofendida que lhe trocasse 10€, tendo esta respondido que não tinha.
3. Aquando das circunstâncias referidas em 4), o arguido C. , usando a sua força física, puxou a "pochete" que a ofendida usava, arrancando-lha das mãos.
4. O telemóvel da ofendida referido em 5) tinha o valor de €22,00.
5. Que aquando dos factos descritos em 11), o arguido tenha forçado a abertura da janela.
6. Aquando da situação descrita em 12), no interior da residência se encontrassem os respectivos proprietários, bem como que o arguido C.  tenha retirado um anel em ouro, um cartão de cidadão do qual era titular o ofendido JC , dois cartões de identificação, sendo que o valor dos bens subtraídos ascendia a 720€.
7. Aquando da situação referida em 20), o arguido C. retirou todos os bens descritos a fls. 25, entre os quais peças em ouro, roupa, electrodomésticos, computador portátil, telemóvel e telefone, malas de viagem câmara fotográfica, em valor superior a 17.000€.
8. Aquando da situação referida em 22), a arguida TR tenha participado nos factos.
9. Aquando da situação referida em 22), a máquina registadora tivesse no seu interior valor superior a €102,00 em numerário.
10. O arguido C. dedicou-se de forma reiterada e exclusiva à prática de crimes contra o património, crimes de roubo e de furto, não lhe sendo conhecida qualquer actividade lícita através da qual provenha ao seu sustento, antes destinando-se o produto dos roubos e furtos ao sustento do arguido, praticando os factos descritos em dias muitos próximos, num período entre Março de 2016 e Setembro de 2017, quer em Almada, quer na área do Seixal.
11. Como consequência da conduta do arguido C., MJR  dependeu com a compra de um novo computador a quantia de €1.000,00.
Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão da causa, designadamente, de entre os alegados, todos os que estejam em contradição ou que tenham ficado prejudicados com a matéria de facto dada por assente e não assente.

Fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):

Em obediência ao disposto no artigo 374.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, cumpre indicar as provas que serviram para fundamentar a convicção do Tribunal.
Consigna-se que a convicção do Tribunal para a determinação da matéria de facto dada como provada e não provada resultou da conjugação e análise crítica da prova produzida em audiência de julgamento apreciada à luz das regras de experiência comum e segundo juízos de normalidade.
Assim, relativamente aos factos dados como provados e relativos ao episódio ocorrido em 14.03.2016, teve-se em conta as declarações dos arguidos C.  e J. , o depoimento da testemunha MVV, bem como os documentos e autos de reconhecimento juntos aos autos.
Assim, a testemunha MVV, referiu ter ouvido a ofendida AL  (senhora idosa e com canadianas) gritar, visualizando, imediatamente, os arguidos C.  e J.  em fuga, indivíduos que conhece bem por passarem em frente ao estabelecimento de café do qual é proprietário.
Mais teve em conta o Tribunal os seguintes elementos, constantes do inquérito n.º 54/16.8PEALM:
- extracto de saldos e movimentos, de fls. 22-23 dos autos, relativo aos seis levantamentos realizados por multibanco, através de cartão emitido pelo Novo Banco, no dia 14.03.2016, no valor de €60,00 cada.
- fotografias de fls. 46 a 54 dos autos, datadas de 14.03.2016, relativas à videovigilância do posto de combustíveis da Galp, sita na Avenida Duarte Pacheco, em Lisboa, onde se visualizam os arguidos C.  e J.  no interior do posto, e o arguido C.  a proceder a uma operação no ATM daquele posto.
- auto de reconhecimento de fls. 134 dos autos, realizado por MVV, onde este reconheceu o arguido C. .
- auto de reconhecimento de fls. 158 dos autos, realizado por AL , onde esta reconheceu o arguido C. .
- documento de fls. 196, de onde se retira que o arguido J.  vendeu uma libra de ouro, no dia 14.03.2016, numa ourivesaria sita em Lisboa, pela quantia de €249,00.
A par disto, diga-se que o arguido C. , após a produção da prova e em sede de audiência de julgamento, confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos, confirmando, na generalidade, a versão da acusação, excluindo, em suma, o exercício de violência sobre a vítima.
A mesma versão já tinha sido apresentada pelo arguido C.  em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido.
De outra banda, o arguido J.admitiu, também em sede de audiência de julgamento e após a produção de prova, a sua presença nas circunstâncias de tempo e lugar dos factos, bem como a fuga juntamente com o arguido C.  e a divisão do produto obtido com os factos entre os dois arguidos.
Negou, todavia, que soubesse das intenções do arguido C.  e que tivesse ficado de vigia.
Ora, relativamente à versão dos factos indicada pelo arguido C. , o Tribunal entendeu considera-la válida, em virtude da inexistência de prova em contrário, nomeadamente na ausência de audição da própria vítima (testemunha AL ) em sede de audiência de julgamento.
Já no tocante, à versão apresentada pelo arguido J.  de que não teve intervenção nos factos praticados pelo arguido C. , a sua versão não nos mereceu credibilidade, em face da demais prova produzida.
Na verdade, a testemunha MVV confirmou que viu o arguido J.  encostado à montra do seu estabelecimento, que fica a poucos metros da porta do prédio onde ocorreu o furto, bem como que o deixou de o ver, após, ter ouvido a vítima gritar. Por outro lado, o próprio arguido J.  confirma que se colocou em fuga com o arguido C. , bem como que dividiu o produto do furto com o mesmo, confirmando, inclusive, que vendeu a libra de ouro que se encontrava dentro da pochete usada por AL  — o que, de resto, é confirmado pelo documento de fls. 196, já supra referido.
Acresce que, as imagens de fls. 46 a 54 dos autos, datadas do dias dos factos, relativas à videovigilância do posto de combustíveis da Galp, mostram os dois arguidos C.  e J.  no interior do posto, e o arguido C.  a proceder a uma operação no ATM daquele posto.
Mais confirmou o arguido J.  os levantamentos efectuados, dinheiro que, o próprio arguido J.  confirmou ter despendido nos seus gastos e nos gastos do arguido C. .
Assim, do conjunto da prova produzida e tendo em conta as regras da experiência, o Tribunal não ficou com qualquer dúvida de que o arguido J.  praticou os factos conjuntamente com o arguido C. , sabendo que o mesmo iria furtar AL , colocando-se de vigia, fugindo com o mesmo e repartindo o produto do furto entre ambos.
Aliás, mal se compreenderia, face às mais elementares regras da lógica, que o arguido C. , à data toxicodependente, tivesse aceitado repartir o produto da subtracção com o arguido J. , se este não tivesse tido a intervenção de vigiar o local, participando nos factos dados como provados.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 17.04.2016, teve-se em conta, desde logo, o depoimento da testemunha MJR , a qual relatou que, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas na acusação, encontrava-se a trabalhar numa loja sita no Centro Comercial sito no Laranjeiro, quando lá entrou o arguido C.  (o qual reconheceu em sede de audiência de julgamento) a indagar sobre uma bolsa, e que, aproveitando o facto de a testemunha se virar para pegar na referida bolsa, agarrou o seu computador que se encontrava em cima de uma mesa a carregar, fugindo com o mesmo.
Mais relatou que o valor de aquisição do computador, o qual tinha 2 anos de utilização, e que o mesmo lhe fez muita falta por conter todos os seus ficheiros, dos quais não tinha qualquer cópia.
Mais se teve em conta, o depoimento da testemunha CT , o qual relatou que exerce funções de recepcionista no centro comercial do Laranjeiro e que, no dia dos factos, ouviu um grito de MJR  ("agarrem que é ladrão"), mas que não reconheceu o autor do furto, embora o tenha visto a fugir.
Mais se teve em conta o documento de fls. 6 (inquérito 491/16.8PGALM), relativo à factura de aquisição, em 06.02.2014, em nome de MJR , de um computador de marca ACER, no valor de €399,00.
Diga-se que, relativamente ao valor do bem furtado, o Tribunal, recorrendo às regras da experiência, tendo em conta a normal desvalorização de um computador, num período de dois anos, entendeu que o mesmo à altura dos factos não valia o valor de aquisição, mas sempre valor superior a €102,00, sendo do conhecimento geral que um computador, mesmo em segunda mão, não tem uma desvalorização em dois anos, superior a 50% do seu valor de aquisição.
A tudo já explanado, acresce que em, declarações após a produção de prova, o arguido C. , confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos descritos na acusação, mais confirmando que retirou um computador do interior do estabelecimento, no qual chegou a entrar, e que se encontrava em cima de uma prateleira.
No tocante aos factos ocorridos em 31.12.2016, o Tribunal teve em conta, desde logo, e relativamente aos autos de inquérito 1600/16.2PGALM:
»as fotografias de fls. 14, de onde se vê a janela por onde terá acedido o arguido, a qual não apresenta sinais de arrombamento, e o móvel de onde o arguido retirou os objectos e que se percebe que não é uma mesa, mas uma espécie de estante, que estaria não junto à janela, mas no interior da residência.
»relatório de inspecção judiciária de fls. 10 a 12 e exame pericial de fls. 16 a 21, onde se conclui que a os vestígios lofoscópicos recolhidos no vidro da janela (lado exterior), pertencem ao arguido C. .
Acresce que em, declarações após a produção de prova, o arguido C.  confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos descritos na acusação, mais confirmando que através da janela que dava para a sala da referida habitação, que se encontrava aberta, avistou objectos em cima de uma mesa, junto à janela, os quais retirou (relógio e dinheiro da carteira, admitindo ter retirado 90,00€).
Negou ter retirado mais objectos e se ter percebido que estavam pessoas dentro de casa.
Assim, quanto aos demais objectos descritos na acusação, não se tendo ouvido a vítima e inexistindo demais prova do furto dos mesmos, não foi dada como provada a sua subtracção.
No tocante ao valor do relógio, o Tribunal considerou, face às regras da experiência, que o mesmo, pelo menos teria o valor de €30.00, pois que, neste tipo de furtos, os bens furtados têm sempre um valor significativo, de molde a serem vendáveis e a realiza-se dinheiro com a venda.
Relativamente aos factos ocorridos em 15.02.2017,  teve-se, desde logo, em conta o depoimento das seguintes testemunhas:
RF , operadora de gestão de parques no Feijó, a qual relatou, em suma, que trabalha no parque de estacionamento denominado "... Laranjeiro", e que ficou sem o seu computador pessoal, o qual já não era novo, e foi adquirido por €1.000,00, bem como foi subtraído do parque quantia em dinheiro entre os €30,00 e os €40,00.
Quanto às circunstâncias do furto, referiu que o gradeamento não estava trancado e que a porta automática estava fechada e que foi forçada (embora, dada a sua natureza de porta automática, após funcionasse normalmente), e que, na altura dos factos, não estava lá ninguém e que o dinheiro estava num cofre , dentro de uma gaveta o qual estava aberto.
JT , também operadora de gestão de parques no Feijó, relatou que trabalha no parque de estacionamento denominado "... Laranjeiro", e que, aquando do furto, não estava ninguém no parque, o gradeamento estava fechado mas não trancado e a porta automática estava fechada mas foi forçada (embora não tenha ficado com danos, dado que é possível abri-la sem provocar danos, apenas com a força).
Mais concretizou que, do interior do gabinete, foram levados cerca de €40,00, (de dentro de um cofre aberto) e um computador que estava à vista dentro do gabinete.
A prova testemunhal supra elencada, foi ainda conjugada com os seguintes elementos que constam dos autos de inquérito 270/17.5PGALM (integrado nos autos de inquérito 559/17.3PGALM):
» fotografias de fls. 84 a 86, de onde se vê a localização do gabinete alvo do furto e imagens da porta de acesso ao mesmo, porta de vidro de fecho automático protegida por gradeamento metálico. Em ambas as fotografias não são visíveis sinais de arrombamento, os quais, se percebe que não existem face à natureza automática da porta que, segundo as regras da experiência, não tem fechadura, sendo, todavia, necessária a força física para a abrir.
A fls. 87, é, ainda, possível ver foto do cofre metálico descrito na acusação.
»relatório de inspecção judiciária de fls. 80 a 82 e exame pericial de fls. 89 a 94, onde se conclui que a os vestígios lofoscópicos recolhidos na face interior e exterior da porta de entrada do gabinete, pertencem ao arguido C. .
» auto de visionamento de fls. 116 a 129, onde se vê o arguido C.  a abrir o gradeamento metálico e a porta de vidro do gabinete, a introduzir-se lá dentro e a sair de lá com um computador nas mãos.
A tudo isto, acresce que em, declarações após a produção de prova, o arguido C.  confirmou a generalidade dos factos descritos na acusação, incluindo as circunstâncias de tempo, lugar, modo e os bens furtados.
Diga-se que, relativamente ao valor do computador furtado, o Tribunal, recorrendo às regras da experiência, e tendo em conta a normal desvalorização de um computador, com alguns anos e adquirido por cerca de €1.000,00 (como afirmado pela vítima), entendeu que o mesmo, à altura dos factos, não valia o valor de aquisição, mas sempre valor superior a €102,00, sendo do conhecimento geral que um computador, mesmo em segunda mão e com alguns anos, não tem uma desvalorização superior a 50% do seu valor de aquisição.
No tocante aos factos ocorridos no dia 21.03.2017 e 22.03.2017, teve-se em conta, desde logo, o depoimento da testemunha JC , proprietário do estabelecimento de lavandaria, o qual confirmou os factos descritos na acusação, afirmando a subtracção da quantia de pelo menos €300,00.
Mais valorou o Tribunal os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 20/17.6PEALM:
» fotografias de fls. 9 a 11, onde se vê o interior do estabelecimento comercial Lavandaria AS , e sinais de arrombamento da porta da sala das máquinas (no interior do estabelecimento), e sinas de arrombamento do receptáculo onde se encontrava o moedeiro.
» auto de visionamento de fls. 32 a 42, relativo ao dia 21.03.2017, onde se vê o arguido C.  a entrar no interior do estabelecimento comercial Lavandaria AS , a sentar-se numa cadeira, a folhear uma revista, e a dirigir-se a porta de acesso da área privada, mexendo na porta.
A tudo isto, acresce as declarações do arguido C. , após a produção de prova, o qual confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos, confirmando o que consta da acusação, com excepção do valor furtado, referindo apenas que teria retirado apenas €100,00 e não €350,00 — facto que não nos logrou convencer, atendendo ao depoimento da testemunha JC  que afirmou, peremptoriamente, que naquele dia em concreto a quantia subtraída não era inferior a €300,00.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 2.04.2017, teve-se em conta o depoimento da testemunha JC , proprietário do estabelecimento de lavandaria, o qual confirmou todos os factos descritos na acusação, afirmando que, aquando da subtracção, o receptáculo do dinheiro tinha uma nota de dez euros e quantia sempre superior a €112,00 em moedas, uma vez que, todos os dias (inclusive no dia destes factos), coloca €100,00 em moedas para trocos nas máquinas e que, do registo das máquinas da lavandaria, se recorda ter havido algumas lavagens e pelo menos duas secagens ao valor unitário de €2,00 cada.
Mais se valorou os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 559/17.3PGALM:
» fotografias de fls. 9 a 15, onde se vê o interior do estabelecimento comercial Lavandaria AS , sinais de arrombamento da porta de entrada da área técnica (no interior do estabelecimento), formão deixado no chão no interior de tal área, sinas de arrombamento do receptáculo onde se encontrava o moedeiro.
» auto de apreensão de fls. 18, relativo ao formão encontrado no interior estabelecimento comercial Lavandaria AS .
» auto de visionamento de fls. 36 a 51, onde se vê o arguido C.  a entrar no interior do estabelecimento comercial Lavandaria AS , a dirigir-se a porta de acesso da área técnica, a retirar o formão de dentro de uma mochila que consigo trazia, a abrir a porta, a introduzir-se no seu interior e a sair do mesmo com algo na mão.
» orçamentos de fls. 53 a 54.
Acresce as declarações do arguido C. , o qual, em sede de audiência de julgamento, confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos, relatando que a única porta fechada era a do moedeiro, que abriu com o formão — relato que, nesta parte, não nos mereceu credibilidade face ao conjunto da demais prova produzida e supra elencada.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 10.04.2017, teve-se em conta, desde logo, o depoimento da testemunha CH , tio do proprietário da casa, o qual relatou que, chamado ao local, visualizou um vidro de uma janela da parte de trás da residência partido e deu pela falta de um televisor que se encontrava no interior da residência.
Não demonstrou conhecimento directo sobre a eventual subtracção de outros objectos e respectivos valores.
Mais teve em conta o Tribunal os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 322/17.1PFSXL:
» fotografias de fls. 39 a 45, onde se vê fotos da moradia sita na Rua Florbela Espanca, muro que cerca a moradia por trás, rede de arame farpado cortada, janela traseira com o vidro partido e diversos cómodos da casa com as gavetas abertas.
» relatório de inspecção judiciária de fls. 35 a 37 e relatório de exame pericial de fls. 47 a 52, onde se conclui que os vestígios lofoscópicos recolhidos no fragmento de vidro da janela partida, pertencem ao arguido C. .
Acresce que o arguido C. , após a produção de prova, confirmou, na generalidade, as circunstâncias de tempo, lugar e modo descritas na acusação. Negando, com relevância, apenas a subtracção de outros bens para além do televisor.
Aqui, diga-se que o Tribunal, na ausência de demais prova sobre tal facto, para além da insuficiente relação de bens furtados junta em fase de inquérito, entendeu dar como provado apenas a subtracção de um televisor, tal como admitido pelo arguido.
Quanto ao valor de tal bem, o Tribunal atendeu às regras da experiência, e tendo em conta que, da fotografia de fls. 43, é visível, dado o encaixe na parede, que o televisor furtado era um televisor plano de dimensões grandes, o que acarreta que o seu valor normal de mercado, mesmo tendo em conta o eventual uso, é sempre superior a €102,00.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 21.04.2017, teve-se em conta o depoimento da testemunha JC , proprietário do estabelecimento de lavandaria, o qual confirmou todos os factos descritos na acusação, afirmando, no entanto, que, aquando da tentativa de subtracção, não havia dinheiro no estabelecimento, uma vez que nunca deixa lá dinheiro à noite, mas que lá existiam outros bens de valor seguramente superior a €102,00 e facilmente transportáveis, nomeadamente uma máquina registadora, diversas ferramentas e produtos de limpeza.
Mais teve em conta o Tribunal os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 646/17.8PGALM:
» fotografias de fls. 8 a 9, onde se vê sinais de arrombamento da porta de entrada do estabelecimento e da porta que dá acesso ao moedeiro no interior do estabelecimento.
» auto de visionamento de fls. 42 a 55, de 21.04.2017, onde se vê o arguido C.  e uma mulher do sexo feminino a entrarem no interior do estabelecimento comercial Lavandaria AS , a dirigirem-se a porta de acesso da área técnica, a tentarem arrombar a porta e a fugirem do local.
Acresce, as declarações do arguido C. , o qual, após a produção de prova, confirmou, na generalidade, as circunstâncias de tempo, lugar e modo dos factos descritos na acusação.
Em relação à arguida TR , uma vez que apenas existem as declarações do co-arguido C. , desacompanhadas de qualquer outro meio de prova que permita assegurar que é esta a pessoa que o acompanha, o Tribunal entendeu dar como não provada a participação de tal arguida nos factos de que vinha acusada.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 18.08.2017, o arguido C.  confirmou ter conduzido o motociclo, mas negou tê-lo furtado.
Em suma, tal arguido apresentou uma versão, segundo a qual, conduziu o veículo em causa, o qual lhe foi emprestado por um seu conhecido de nome D. . Mais, afirmou desconhecer a origem do veículo.
Todavia, diga-se que o Tribunal entendeu que a versão apresentada pelo arguido não se mostra verossímil, face à prova constante dos autos e as regras da experiência.
Assim, relevou Tribunal os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 1039/17.2PGALM:
» fotografias de fls. 14 a 16, do motociclo furtado, onde é visível buraco na carnagem, o que comprova que o veículo foi subtraído através de ligação directa e que, quando foi recuperado, apresentava sinais evidentes e perceptíveis para qualquer pessoa, de que tinha sido alvo de uma subtracção.
» relatório de inspecção judiciária de fls. 10 a 12 e relatório de exame pericial de fls. 18 a 22, onde se conclui que a os vestígios lofoscópicos recolhidos na viseira lado de dentro do capacete que acompanhava o veículo, pertencem ao arguido C. .
» auto de apreensão de fls. 282 (do proc. 54/16.9PEALM), datado de 18.08.2017, pelas 15h30m, relativo a um capacete, faca e motociclo de matrícula 38. De tais elementos, retira-se ainda que o motociclo em causa foi recuperado no próprio dias dos factos descritos na acusação e, apenas, algumas horas após os mesmos.
Assim, atendendo às mais elementares regras da experiência, mostra-se ilógica a versão do arguido de que não sabia a proveniência do veículo, sendo que, ao conduzir o mesmo, desde logo, teve que fazer uso da direcção directa feita através do buraco na carnagem do veículo.
Por outro lado, o facto de terem sido recolhidos vestígios do arguido C.  na viseira lado de dentro do capacete subtraído com o dito motociclo, aponta, claramente, para que foi o mesmo que o conduziu após a subtracção, tanto mais que este afirma que não usou o capacete quando alegadamente o conduziu por indicação do indivíduo de nome D. .
Acresce que, em momento algum, o arguido C.  faz uma identificação cabal que permitisse ao Tribunal ter com certa sequer a existência do tal indivíduo.
Assim, o Tribunal não ficou com quaisquer dúvidas de que o arguido C.  subtraiu o veículo em causa nas circunstâncias de tempo, lugar e modo descritas na acusação, e que, ademais, foram corroboradas pela testemunha ARG., proprietária do veículo, a qual confirmou ainda que o valor do veículo por si indicado (€2.000,00) teve em conta a normal desvalorização de mercado, face ao seu valor de aquisição originário (€2.800,00), o qual nos parece adequado tendo em conta as regras da experiência e os valores normais de mercado.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 12.09.2017, teve-se em conta, desde logo, o depoimento da testemunha AMS , a qual relatou que trabalha na Imobiliária U., e que, na altura em que voltava da cave do estabelecimento, deu pela falta de um computador portátil e dois telemóveis, tendo-se, nessa altura, deslocado à porta e visto o arguido C.  a sair e abandonar o local com um saco plástico azul nas mãos.
Mais teve em conta o Tribunal os seguintes elementos, que constam dos autos de inquérito 106/17.7PEALM:
» documento de fls. 10, cópia de factura de aquisição de dois telemóveis de marca Samsung Galaxy, no valor unitário de €154,39 cada um.
» auto de reconhecimento de fls. 24, efectuado pela testemunha AMS , no qual reconheceu o arguido como autor dos factos pelos quais apresentou denúncia.
Acresce as declarações do arguido C. , o qual, em sede de audiência de julgamento, confirmou as circunstâncias de tempo e lugar dos factos, mais confirmando ter de lá retirado dois telemóveis.
Quanto ao valor dos bens, o Tribunal atendeu às regras da experiência, e tendo em conta a normal desvalorização dos bens, sendo que só os telemóveis custaram cada um €154,39, pelo que, à altura dos factos, tais bens, como pouco mais de um ano de utilização, e um computador portátil (bem caro por natureza, mesmo que usado) valiam valor superior a €102,00, por cada um dos objectos, sendo do conhecimento geral que tais bens, mesmo em segunda mão e com alguns anos, não tem uma desvalorização superior a 50% do seu valor de aquisição.
O Tribunal refere, ainda, que, da imediação que fizemos da prova, o depoimento de todas as testemunhas nos mereceu credibilidade, uma vez que todas prestaram os respectivos depoimentos de forma clara e espontânea. Na verdade, todos os depoimentos não se mostraram destituídos nem de lógica, nem de verosimilhança, nem denotaram qualquer contradição insanável que permitisse a conclusão legítima, razoável e objectivável no espírito do julgador no sentido que os factos não podiam ter sucedido do modo como os mesmos os narraram, na verdade, afigurou-se-nos todos os relatos seguros, logrando, por isso, convencer o Tribunal.
Por sua vez, os factos provados atinentes ao elemento subjectivo resultam desde logo das presunções ligadas ao princípio da normalidade e das regras gerais de experiência.
Atento o exposto, ponderando a globalidade da matéria provada nos presentes autos, entendemos que existem factos materiais comuns e objectivos que permitem apreender com relativa clareza que os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
No tocante aos factos dados como provados e relativos ao pedido de indemnização civil formulado por ARG., o Tribunal teve em conta as declarações da própria e o orçamento e recibos de fls. 537 a 540 dos autos de inquérito 54/16.8PEALM.
No tocante aos factos dados como provados e relativos ao pedido de indemnização civil formulado por MJR , o Tribunal teve em conta as declarações da própria, regras da experiência, e o documento de fls. 6 (inquérito 491/16.8PGALM), relativo à factura de aquisição, em 06.02.2014, em nome de MJR , de um computador de marca ACER, no valor de €399,00.
No tocante aos antecedentes criminais dos arguidos, teve-se em conta o certificado de registo criminal dos mesmos junto aos autos.
Quanto às condições socio-económicas dos arguidos, baseou-se o tribunal nos relatórios sociais juntos aos autos e nas testemunhas abonatórias indicadas pelo arguido C.  e e inquiridas em sede de audiência de julgamento.
Relativamente aos factos dados como não provados temos que não foi feita prova dos mesmos.
Diga-se, a este respeito, que o facto dado como não provado no ponto 85), assim resultou, desde logo, porque a sua prova não se mostrou relevante para a decisão a proferir, atendendo à qualificação dos factos feita pelo Ministério Público na acusação.

Apreciemos.

Recurso interposto pelo arguido J.

Vício de erro notório na apreciação da prova

Conforme estabelecido no artigo 428º, nº 1, do CPP, os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito, de onde resulta que, em regra e quanto a estes Tribunais, a lei não restringe os respectivos poderes de cognição.

A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP, no que se denomina de “revista alargada”, cuja indagação tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento – neste sentido, por todos, Ac. do STJ de 05/06/2008, Proc. nº 06P3649 e Ac. do STJ de 14/05/2009, Proc. nº 1182/06.3PAALM.S1, in www.dgsi.pt. - ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se reporta o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma legal.

Sustenta o recorrente que a sentença recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova.

Como vimos, o apontado vício, a que se reporta o artigo 410º, nº 2, alínea c), do CPP, só releva se resultar do texto (e do contexto) da decisão recorrida apreciado na sua globalidade, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum. É um vício da decisão, não do julgamento, como frisa Maria João Antunes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Janeiro/Março de 1994, pág. 121.

Está presente quando um cidadão médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugado com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios.

E também se verifica este vício quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis.

Como bem se esclarece no Acórdão do STJ de 29/10/2015, Proc. nº 230/10.7JAAVR.P1.S1, consultável no referenciado sítio, o erro notório na apreciação da prova consiste em o tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto, quando a conclusão lógica seria a contrária já por ofender princípios ou leis formulados cientificamente, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum das pessoas, já por se ter violado ou postergado um princípio ou regra fundamental em matéria de prova.

Destarte, a discordância, face aos elementos de prova apreciados, entre aquilo que foi dado como provado e aquilo que o recorrente entende não ter resultado da prova produzida – ou que devia ter ficado provado – não se configura como erro notório na sua apreciação.

Ora, considera o recorrente que está presente o aludido vício porque a experiência “comum” exigiria, para não conferir credibilidade à versão do arguido e da única testemunha ocular, factos circunstanciais imprescindíveis, sozinhos ou cumulativamente, que permitissem constatar sem margem de dúvida a prática do crime por aquele.

Ao desvalorizar essas provas, designadamente no que se refere ao depoimento da testemunha MVV, dando como provados os factos referidos nos pontos 3. e 27., o Tribunal a quo errou notoriamente na apreciação da prova produzida e violou as normas do artº. 127º, do Cód. Proc. Penal.

Pois bem, no âmbito da impugnação da matéria de facto na modalidade de “revista alargada” e, concretamente, quanto ao vício de erro notório na apreciação da prova aqui em causa, apenas se pode ter em atenção para o detectar o texto da decisão recorrida e não também, em ordem a uma conclusão concordante ou discordante da obtida pela 1ª instância na valoração que fez da prova produzida, segmentos das declarações ou dos depoimentos prestados em audiência de julgamento que naquele se não mostrem espelhados, porquanto são elementos exteriores a esse texto.

Estamos aqui perante uma valoração pessoal do recorrente quanto a esses elementos de prova, valoração essa que não pode ser por este meio contraposta à conclusão a que chegou o tribunal a quo.

E de qualquer modo, ao contrário do sustentado pelo recorrente, o tribunal recorrido não desvalorizou o depoimento da testemunha MVV, antes o valorou até como decisivo para a formação da sua convicção no sentido que criticado está, como se alcança do seguinte trecho:

Já no tocante, à versão apresentada pelo arguido J.  de que não teve intervenção nos factos praticados pelo arguido C. , a sua versão não nos mereceu credibilidade, em face da demais prova produzida.

Na verdade, a testemunha MVV confirmou que viu o arguido J.  encostado à montra do seu estabelecimento, que fica a poucos metros da porta do prédio onde ocorreu o furto, bem como que o deixou de o ver, após, ter ouvido a vítima gritar. Por outro lado, o próprio arguido J.  confirma que se colocou em fuga com o arguido C. , bem como que dividiu o produto do furto com o mesmo, confirmando, inclusive, que vendeu a libra de ouro que se encontrava dentro da pochete usada por AL  — o que, de resto, é confirmado pelo documento de fls. 196, já supra referido.

Acresce que, as imagens de fls. 46 a 54 dos autos, datadas do dias dos factos, relativas à videovigilância do posto de combustíveis da Galp, mostram os dois arguidos C.  e J.  no interior do posto, e o arguido C.  a proceder a uma operação no ATM daquele posto.

Mais confirmou o arguido J.  os levantamentos efectuados, dinheiro que, o próprio arguido J.  confirmou ter despendido nos seus gastos e nos gastos do arguido C. .

Assim, do conjunto da prova produzida e tendo em conta as regras da experiência, o Tribunal não ficou com qualquer dúvida de que o arguido J.  praticou os factos conjuntamente com o arguido C. , sabendo que o mesmo iria furtar AL , colocando-se de vigia, fugindo com o mesmo e repartindo o produto do furto entre ambos.

Daí que, analisado o texto da peça processual sob censura, também não se mostra patente - manifesto, evidente - que os factos dados como provados com que o recorrente se mostra inconformado, face às regras da experiência comum e a lógica normal da vida, não se poderiam ter verificado, mormente por revelarem os elementos probatórios um sentido e a decisão recorrida quanto à matéria de facto ter concluído, de forma ilógica, arbitrária, incongruente, de todo insustentável, em sentido divergente e igualmente se não vislumbra que exista violação alguma daquelas regras ou desrespeito de regras sobre o valor de prova vinculada, ao dar como provada a factualidade em relação à qual o recorrente manifesta a sua discordância, não se podendo olvidar que não configura erro claro e patente um entendimento que possa traduzir-se numa leitura que se mostre possível, aceitável ou razoável da prova produzida.

Termos em que, não se verifica o assinalado vício, improcedendo, pois, o recurso neste segmento.

Impugnação da matéria de facto/erro de julgamento/violação do princípio in dubio pro reo

Critica o recorrente a matéria de facto dada como assente pela 1ª instância nos pontos 3 e 27, dos fundamentos de facto da decisão recorrida, chamando a terreiro, entre o mais, segmentos das suas declarações e do depoimento da testemunha MVV prestados em audiência de julgamento.

Quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto nesta modalidade, as conclusões do recurso, por força do estabelecido no artigo 412º, nº 3, do CPP, têm de descriminar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.

Segundo o nº 4 da mesma disposição legal, quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação, sendo que, neste caso, o tribunal procederá à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa - nº 6.

Para dar cumprimento a estas exigências legais tem o recorrente nas suas conclusões de especificar quais os pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados, quais as provas (específicas) que impõem decisão diversa da recorrida, bem como referir as concretas passagens/excertos das declarações/depoimentos que, no seu entender, obrigam à alteração da matéria de facto, transcrevendo-as (se na acta da audiência de julgamento não se faz referência ao início e termo de cada declaração ou depoimento gravados) ou mediante a indicação do segmento ou segmentos da gravação áudio que suportam o seu entendimento divergente, com indicação do início e termo desses segmentos (quando na acta da audiência de julgamento se faz essa referência, como no caso em apreço, o que não obsta a que, também nesta situação, o recorrente, querendo, proceda à transcrição dessas passagens).

Analisando a peça processual recursória, constata-se que cumpridas se mostram as exigências legais.

Assim se entendendo, importa analisar então a prova produzida com o objectivo de determinarmos se consente a convicção formada pelo tribunal recorrido, norteados pela ideia – força de que o tribunal de recurso não procura uma nova convicção, mas apurar se a convicção expressa pela 1ª instância tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e demais elementos probatórios podem exibir perante si (partindo das provas indicadas pelo recorrente que, na sua tese, impõem decisão diversa, mas não estando por estas limitado) sendo certo que apenas poderá censurar a decisão revidenda, alicerçada na livre convicção e assente na imediação e na oralidade, se for manifesto que a solução por que optou, de entre as várias possíveis e plausíveis, é ilógica e inadmissível face às regras da experiência comum - artigo 127º, do CPP.

E, “a censura quanto à forma de formação da convicção do tribunal não pode assentar de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade de formação da convicção”, pois “doutra forma seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão”.

Cumpre ter em atenção também que os diversos elementos de prova não devem ser analisados separadamente, antes ser apreciados em correlação uns com os outros, de forma a discernir aqueles que se confortam e aqueles que se contradizem, possibilitando ou a remoção das dúvidas ou a constatação de que o peso destas é tal que não permite uma convicção segura acerca do modo como os factos se passaram.

Analisemos então a factualidade que provada foi considerada, que o recorrente critica, sob a óptica da censura que lhe faz e se tem ou não suporte na prova produzida.

Conforme se extrai da decisão revidenda, o tribunal a quo para dar como provada tal factualidade, formou a sua convicção com alicerce no depoimento da testemunha MVV e declarações do arguido C. , que considerou credíveis, conjugados com o teor do extracto de saldos e movimentos, de fls. 22/23; fotografias de fls. 46/54; auto de reconhecimento de fls. 134; auto de reconhecimento de fls. 158 e documento de fls. 196.

Ponderou ainda as declarações negatórias do recorrente quanto à sua intervenção nos factos relativos à subtracção, que considerou não se mostrarem fiáveis.

Tendo-se procedido à audição do depoimento da testemunha MVV prestado em audiência de julgamento, na gravação disponibilizada pelo tribunal recorrido, resulta o seguinte:

No dia dos factos observou o arguido J. encostado à montra do seu estabelecimento de cafetaria, a olhar para o lado esquerdo.

Conhecia-o de passar com frequência junto ao seu café na companhia de outro indivíduo, sendo que este veio a ser identificado posteriormente como o arguido C. .

Pergunta: Eles andavam sempre juntos?

Resposta: Sim, andavam.

Pergunta: o seu café é virado para o prédio onde vive a senhora AL ?

Resposta: não, ao lado, esclarecendo posteriormente que a porta do prédio de AL  se situa à esquerda da porta do seu café.
Pergunta: Logo ao lado do seu café, é isso, na mesma rua?

Resposta: sim.

Pergunta: entre a porta do prédio da dona Adelaide e essa montra mais ou menos qual é o espaço?

Resposta: praí dez metros, talvez.

Reafirmou posteriormente que entre a porta do prédio onde habitava AL  e o seu estabelecimento existia uma loja que estava fechada, sendo a distância entre aquela e o café de dez metros, mais ou menos.

Foi então junto de A. que lhe disse que tinha sido assaltada na escada por um rapaz.

E, o arguido C.  referiu em audiência:
Que estava com o J. a caminho do “LIDL” para irmos buscar gambas para trocar por droga, nesse momento que estávamos a ir ao pé do café do senhor MVV, avistei a carteira dentro do saco das compras e disse para o J.  olha ali uma carteira pode ser que tenha dinheiro para a gente e que o J.  não retirou a carteira do saco, quem retirou a carteira fui eu. O J.  ficou à porta a ver se (frase não concluída).

Pergunta: a vigiar, é isso?

Resposta: Pronto, como o senhor MVV já explicou.

Por seu, turno, relatou J.em audiência de julgamento:

A gente íamos a passar para ir ao Minipreço, ao LIDL, íamos lá tirar umas gambas ou roubar uns queijos para tirarmos a ressaca e isto íamos a passar os dois e dissemos bom dia à senhora.

Ele seguiu o caminho para a frente e o C.  entrou para o prédio ajudando a senhora, mas nada combinado que íamos assaltar a senhora. Não ficou a fazer vigilância no exterior.

Depois parou junto ao café, ao lado da montra, à espera que o C.  viesse, para a gente ir ao Minipreço. Depois ouviu gritos, malandro, malandro, malandro e eu percebi, pronto alguma coisa se passou, devia ter-lhe tirado a carteira, ca gente já tinha visto a carteira no saco e eu agarrei em mim e fui-me embora.

Quanto à credibilidade das versões apresentadas pelo recorrente, testemunha MVV e arguido C. , como se salienta no Acórdão R. do Porto, de 21/04/2004, Processo nº 0314013 e Acs. R. de Coimbra de 18/02/2009, Proc. nº 1019/05.0OGCVIS.C1, de 10/11/2010, Proc. nº 2354/08.1PBCBR.C2, e de 09/01/2012, Proc. nº 102/10.5 TAANS.C1, todos consultáveis em www.dgsi.pt, a atribuição de credibilidade, ou não, a uma fonte de prova testemunhal ou por declarações, tem por base uma valoração do julgador fundada na imediação e na oralidade, que o tribunal de recurso, em rigor, só poderá criticar demonstrando que é inadmissível face às regras da experiência comum.

No caso sub judice, o tribunal recorrido explicita com clareza os fundamentos da valoração que fez e não se vislumbra esta inadmissibilidade, pelo que razão alguma existe para colocar em crise o juízo efectuado relativamente à não credibilidade das declarações do arguido/recorrente, por um lado e credibilidade do depoimento da testemunha MVV e declarações do arguido C. , por outro.

Mas, clama ainda ele, por existir violação do princípio in dubio pro reo.

Ora, a violação do princípio in dubio pro reo, princípio corolário do da presunção de inocência constitucionalmente tutelado, pressupõe “um estado de dúvida insanável no espírito do julgador”, só podendo concluir-se pela sua verificação quando do texto da decisão recorrida decorrer, por forma evidente, que o tribunal encontrando-se nesse estado, optou por decidir contra o arguido (fixando como provados factos dubitativos ao mesmo desfavoráveis ou assentando como não provados outros que lhe são favoráveis) ou, quando embora se não vislumbre que o tribunal tenha manifestado ou sentido dúvidas, da análise e apreciação objectiva da prova produzida, à luz das regras da experiência e das regras e princípios válidos em matéria de direito probatório, resulta que as deveria ter – cfr. Ac. do STJ de 27/05/09, Proc. nº 05P0145 e Ac. R. de Évora de 30/01/07, Proc. nº 2457/06-1, ambos em www.dgsi.pt.

Percorrendo a decisão revidenda, não resulta da mesma que o tribunal a quo tenha ficado num estado de dúvida – dúvida razoável, objectiva e motivável – e que, a partir desse estado, tenha procedido à fixação dos factos provados desfavoráveis ao recorrente e nem a essa conclusão (dubitativa) se chega da análise desse mesmo texto à luz das regras da experiência comum ou com recurso à prova gravada. Isto é, não se extrai que o tribunal recorrido, que não teve dúvidas, as devesse ter tido.

Não se encontrando o tribunal a quo nesse estado de dúvida e nada nos permitindo concluir que o devesse estar, não se manifesta violado este princípio.

Em síntese, da análise efectuada redunda que a prova produzida, que é legalmente permitida, suporta por forma suficiente, racional e coerente, a decisão do tribunal recorrido no que tange à factualidade sob impugnação sem margem para dúvidas razoáveis, inexistindo, por isso, fundamento para a impetrada alteração da matéria de facto, não podendo proceder a pretensão do recorrente de impor a sua convicção pessoal face à prova produzida em audiência em detrimento da do julgador, pois a decisão sobre esta está devidamente fundamentada e constitui solução plausível segundo as regras da experiência, tendo sido proferida em obediência à lei – artigo 127º, do CPP - que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção.

E, como decorre do que já ficou explicitado – concretamente da alínea b), do nº 3, do artigo 412º, do CPP, no segmento “as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida” - para que ocorra uma alteração da matéria de facto pelo tribunal ad quem não basta que o recorrente articule argumentos que permitam concluir pela possibilidade de uma outra convicção, exige-se que demonstre que a convicção obtida pelo tribunal a quo é uma impossibilidade lógica, uma impossibilidade probatória, se mostra violadora de regras da experiência comum ou se fez uma manifestamente errada utilização de presunções naturais. Ou seja, imperativamente tem de demonstrar que as provas que traz à colação apontam inequivocamente no sentido propugnado.

Tal não fez o recorrente.

Pelo exposto, carecendo de razão no que tange à alteração da matéria de facto, tem de se considerar esta definitivamente fixada nos termos mencionados.

Dosimetria da pena aplicada/verificação dos pressupostos de aplicação das penas de substituição de suspensão da execução da pena ou regime de permanência na habitação

Discorda também o recorrente da dosimetria da pena que lhe foi aplicada, no pressuposto de que deveria ter sido absolvido da prática do crime de furto.

Já vimos que a sua pretensão quanto à impugnação da matéria de facto no que tange aos factos relativos à subtracção dos bens pertencentes a AL  não merece acolhimento e, tendo em atenção os que provados se encontram, preenchidos se mostram os elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime de furto p. e p. pelo artigo 203º, nº 1, do Código Penal, por que foi condenado.

No entanto, ainda assim, analisemos.

O tribunal de 1ª instância entendeu optar pela pena de prisão, em detrimento da de multa em alternativa, ponderando que as finalidades de punição exigem a aplicação de penas de prisão, uma vez que os arguidos têm bastantes antecedentes criminais, inclusive, alguns relacionados com crimes contra o património.

Este entendimento não merece censura, atendendo ao estabelecido nos artigos 40º e 70º, do Código Penal.

Para a determinação da medida concreta da pena concernente a este crime, considerou:

O grau de ilicitude dos factos, que se nos afigura ser médio, tendo em conta toda a factualidade apurada;

O dolo dos arguidos, que reveste a forma de dolo directo, pois os arguidos em todas as situações agiram livre e conscientemente, representando os factos que preenchem os tipos de crime, agindo com a intenção de os realizar (artigo 14º, n.º 1, do Código Penal).

A existência de antecedentes criminais por parte dos arguidos, o que torna acentuadas as necessidades de prevenção especial, tanto mais, que o passado criminal dos arguidos é extenso.

As condições socioeconómicas dos arguidos, os quais contam com vasto passado de toxicodependência, com várias recaídas de consumo, sem percurso laboral estável e sem actividade laboral, actualmente, activa, bem como não denotam estrutura familiar capaz, por si só, de os afastar dos consumos e da vida criminosa.

A favor dos arguidos tem-se em conta a aceitação de parte dos factos, a qual embora tenha sido feita parcialmente e, apenas após a produção de prova, foi valorada pelo Tribunal nessa medida.

Mais se tem em conta que, actualmente, os arguidos (embora no âmbito da aplicação de penas e medidas de coacção) efectuam tratamento à toxicodependência.

Por seu turno, há que considerar, ainda, as exigências de prevenção geral que são elevadíssimas, tendo-se em consideração que os crimes de furto e burla informática causam grande alarme social, tendo como efeito na comunidade em geral uma sensação de desconforto e insegurança. Note-se, ademais, são dos crimes mais praticados no nosso país, tendo nos últimos tempos se acentuado, de tal forma que todos os dias há notícias de novos factos enquadráveis nestes tipos legais.

Conclui-se, assim, que as exigências de prevenção geral positiva são elevadas, havendo necessidade de reprimir de forma eficaz estas condutas e de consciencializar para o desvalor das mesmas.


Face ao que supra ficou transcrito, é patente que o acórdão revidendo levou em linha de conta e de forma correcta, os factores relevantes para a determinação concreta da pena, nos termos estabelecidos no artigo 71º, nºs 1 e 2, do Código Penal.

Pelo exposto, efectuado juízo de ponderação sobre a culpa, como medida superior da pena e considerando as exigências de prevenção e as demais circunstâncias previstas no artigo 71º, do Código Penal, não se mostra que a pena de 10 meses de prisão aplicada ao crime de furto e a de 6 meses de prisão para o crime de burla informática, extravasem a medida da respectiva culpa e também não ultrapassam os limites dentro dos quais a justiça relativa havia de ser encontrada, não se evidenciando como desadequadas, por excesso ou desproporcionadas.

E, quanto à pena única – de 1 ano e 1 mês de prisão - encontrada para o cúmulo jurídico desta pena do crime de furto com a do crime de burla informática, vista à luz do consagrado no artigo 77º, do Código Penal, afigura-se-nos não se justificar intervenção correctiva, pois se mostra adequada à consideração conjunta dos factos e da personalidade evidenciada pelo arguido.

Inconformado se encontra também quanto à não aplicação da pena de substituição de suspensão da execução da pena.

O tribunal recorrido sustentou a não aplicação da almejada pena nos seguintes termos (mondadas as referências normativa e doutrinária):

Ora, no caso concreto, temos que os arguidos contam com passado criminal longo, com a existência de outras condenações por crimes ligados ao património.

O arguido J.  conta, além do mais, com condenações por dois crimes de furto (um deles qualificado), três por crimes de roubo e um por violência depois da subtracção.

Por sua vez, o arguido C.  conta com várias condenações por condução sem habilitação legal, uma por condução perigosa de veículo rodoviário, uma por crime de furto de uso de veículo, urna por furto simples (estes dois últimos na forma tentada), uma por crime de roubo, uma por crime de dano e uma por crime de furto simples.

Assim, tais condenações denotam que os ambos os arguidos apresentam, calaramente, personalidades avessas ao dever-ser jurídico-penal.
Quanto às suas condições de vida, temos que, ambos os arguidos, contam, também, com vasto passado de toxicodependência, com várias recaídas de consumo, sem percurso laboral estável e sem actividade laboral, actualmente, activa, bem como não denotam estrutura familiar capaz, por si só, de os afastar dos consumos e da vida criminosa.

Acresce que a aceitação dos factos foi feita de forma parcial, o que indica que não interiorizam, ainda plenamente, o efeito das suas condutas na comunidade.

Mais se tem em conta que, actualmente, os arguidos efectuam tratamento à toxicodependência, mas apenas no âmbito da aplicação de penas e medidas de coacção.

Acresce que não podemos olvidar as fortes e elevadas razões de prevenção geral que reclamam punições fortemente dissuasores da prática destes tipos de crimes.

A realidade os furtos ligados à toxicodependência são, de tal forma um problema social grave, que são inúmeros os esforços e alertas comunitários que com frequência são efectuados.

Assim, as circunstâncias em que os crimes foram praticados pelos arguidos e, o seu enquadramento social e de personalidade, levam a um juízo de prognose manifestamente desfavorável à suspensão da execução da pena de prisão.

Note-se que, é de relevar, inclusive o facto de os arguidos já terem sido condenados em penas de prisão suspensas, suspensão que não surtiu qualquer efeito.

Analisemos então.

Nos termos do artigo 50º, nº 1, do Código Penal:

“1. O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
A aplicação da pena de substituição de suspensão da execução da pena, “medida de conteúdo pedagógico e reeducativo”, não constitui uma mera faculdade do juiz, configurando-se antes como um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.

São pressupostos da suspensão da execução da pena:

- Que ao arguido deva ser aplicada em concreto pena de prisão não superior a cinco anos;

- Que se revele ela adequada e suficiente para a prossecução das finalidades da punição (juízo de prognose), sendo que “a prognose, como pressuposto da suspensão da execução da pena, deve entender-se num sentido puramente preventivo especial, não tendo em conta critérios de prevenção geral (…)” e que “as considerações de prevenção geral só actuam como obstáculo à suspensão, sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.

Assim, deve atender-se essencialmente aos mesmos elementos que são tomados em consideração para a formulação de um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do delinquente – personalidade do agente, condições de vida, conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias deste” – Ac. do STJ de 29/11/2006, Proc. nº 06P3121, em www.dgsi.pt.

Como se salienta no Ac. do STJ de 06/02/2008, Proc. nº 08P101, consultável no mesmo sítio, “pressuposto material básico do instituto da suspensão da execução da pena é a expectativa, objectivamente fundada, de que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão bastarão para afastar o condenado da criminalidade. Refere Jescheck que a suspensão da pena pressupõe um prognóstico favorável, consubstanciado na esperança de que o condenado não voltará a delinquir, prognóstico que requer uma valoração global de todas as circunstâncias que possibilitem a formulação de uma conclusão sobre o comportamento futuro do condenado, aí se incluindo a personalidade (inteligência e carácter), a vida anterior (condenações anteriores), as circunstâncias do crime (motivos e fins), a conduta posterior ao crime (arrependimento, reparação do dano) e as circunstâncias pessoais (profissão, família, condição social), e que terá de ser feito tendo em vista exclusivamente considerações de prevenção especial, pondo de parte considerações de prevenção geral”.

Não obstante, conforme preceituado no artigo 50º, nº 1, do Código Penal (que manda atender às finalidades da punição, a saber, segundo o artigo 40º, nº 1, do CP, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade), “com aquele pressuposto material básico coexistem considerações de prevenção geral” pelo que “para aplicação desta pena de substituição é necessário, em primeiro lugar, que o julgador se convença, face à personalidade do condenado, suas condições de vida, comportamento global, natureza do crime e sua adequação a essa personalidade, de que o facto cometido não está de acordo com esta e foi simples acidente de percurso esporádico e de que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de comportamentos delituosos, sendo necessário, em segundo lugar, que a pena de suspensão de execução da prisão não coloque irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, ou seja, o sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade” – cfr. Ac. do STJ de 24/10/2007, Proc. nº 07P3317, consultável em www.dgsi.pt.

O recorrente sofreu as seguintes condenações anteriormente:

Por decisão transitada em julgado aos 10/05/2004, em pena de multa, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal.

Por decisão transitada em julgado aos 01/09/2008, em pena de multa, pela prática de crime de furto.

Por decisão transitada em julgado aos 11/05/2009, em pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática de um crime de furto qualificado.

Por decisão transitada em julgado aos 28/11/2012, em pena de 2 anos e 1 mês de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, pela prática de dois crimes de roubo na forma consumada e um crime de roubo na forma tentada.

Por decisão transitada em julgado aos 20/11/2015, em pena de multa, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal.

Por decisão transitada em julgado aos 01/06/2017, em pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, pela prática (em 10/12/2013) de um crime de violência depois da subtracção.

Pese embora a confissão (muito) parcial dos factos, não resulta que se tenha verificado autocrítica consistente e, por conseguinte, interiorização do desvalor da conduta delituosa.

Como é patente, foram já anteriormente aplicadas penas não detentivas sem qualquer eficácia, pois não surtiram o efeito preventivo especial almejado.

Tendo em consideração a factualidade em causa e a personalidade do recorrente nos factos reflectida (que não se coibiu de subtrair bens de uma cidadão de 73 anos de idade e que se locomovia com o suporte de uma “canadiana”, para obter proventos destinados à satisfação da sua adição de produtos estupefacientes) bem como as circunstâncias inerentes às condições pessoais que provadas se encontram (em que avultam a problemática aditiva de longos anos, pois iniciou os consumos de heroína aos 12 anos de idade e tem actualmente 42 anos, não ultrapassada e a ausência de hábitos regulares de trabalho) é efectivamente de entender que a mera ameaça da pena de prisão se mostra insuficiente para o afastar da prática de novas infracções criminais, não sendo possível, por isso, efectuar um juízo de prognose de que, de futuro, se pautará por uma forma de vida afastada da criminalidade.

Acresce que, tal pena de substituição de suspensão da execução da pena, julgamos, frustraria até as expectativas da comunidade em ver salvaguardadas, com a decisão, a segurança jurídica que espera das instituições aplicadoras do direito e das regras jurídicas em sociedade, pois as circunstâncias de ter praticado o crime dos autos depois de ter sofrido já diversas condenações colocam irremediavelmente em causa o mencionado sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade.

Não merece crítica, pois, o entendimento da 1ª instância de não aplicar esta pena de substituição.

A título subsidiário, pugna ainda o recorrente pela aplicação do regime de permanência na habitação com vigilância electrónica, sendo certo que infere-se claramente de toda a fundamentação incidente sobre a não suspensão da execução da pena que o tribunal a quo o afastou por considerar ser de cumprir a pena efectivamente e em meio institucional.

De acordo com o estabelecido no artigo 43º, do Código Penal, na versão dada pela Lei nº 94/2017, de 23/08 (que entrou em vigor em 22/11/2017):

“1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:
a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos;

b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;

c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º

2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas (…)”.

A versão do Código Penal vigente à data da prática dos factos consagrava no seu artigo 44º:

“1 - Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição:

a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano;

b) O remanescente não superior a um ano da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em regime de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação.

2 - O limite máximo previsto no número anterior pode ser elevado para dois anos quando se verifiquem, à data da condenação, circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente:

a) Gravidez;

b) Idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos;

c) Doença ou deficiência graves;

d) Existência de menor a seu cargo;

e) Existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado (…)”.

Tendo em atenção as normas em vigor à data da prática da infracção (concretamente o pressuposto formal de a pena de prisão aplicada não ser superior a 1 ano de prisão) e os factos que provados se encontram (não subsumíveis ao previsto em qualquer das alíneas do nº 2) não era susceptível de ser aplicável ao caso o regime de permanência na habitação.

Mas assim não é quando consideramos a versão actual e de acordo com o estabelecido no artigo 2º, nº 4, do Código Penal, quando as disposições penais vigentes no momento da prática do facto punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicado o regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente.

Pois bem, atendendo às elevadas necessidades de prevenção especial que no caso se fazem sentir, decorrentes das condenações sofridas pelo arguido e das penas aplicadas em tais condenações, as quais, como referido supra, se revelaram insuficientes para o ressocializar, aliadas à já muito longa problemática de toxicodependência e ausência de hábitos regulares de trabalho, entendemos que o cumprimento da pena de prisão aplicada ao arguido em regime de permanência na habitação nos termos do artigo 43º, do Código Penal, não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão, que são a defesa da sociedade e prevenção da prática de crimes, devendo orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, no dizer do artigo 42º, do mesmo Código.

Em face do exposto, não se mostra adequada a opção pela aplicação do regime de permanência na habitação ao arguido/recorrente.

Recurso interposto pelo Ministério Público

Sustenta o recorrente/Ministério Público que deveria o tribunal a quo ter atribuído reparação pelos prejuízos sofridos à vítima AL , atento o estabelecido no artigo 16º, nº 2, do Estatuto da Vítima e artigos 67º-A, nº 1, alínea b) e 82º-A, do CPP.

A propósito, diz-se na decisão sob censura:

Os arguidos foram notificados nos termos e para os efeitos previstos no artigo 82.º- A, n.ºs 1 e 2 do CPP.

Todavia, considerando os crimes efectivamente praticados pelos arguidos, não estamos perante a prática de delito que a lei processual qualifica de criminalidade de violenta (cfr.art.1º alínea j) do CPP), nos termos do art.67-A nº 3 "ex vi" nº1 alínea b) do mesmo diploma.

Face ao exposto, fica prejudicada a atribuição de indemnização às vítimas, nomeadamente à vítima AL , nos termos do art. 16º nº 2 do Estatuto da Vítima, e nos termos do art. 82º-A nºs 1 e 2 do Cód. Proc.Penal.


Estabelece-se no artigo 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, que “à vítima é reconhecido, no âmbito do processo penal, o direito a obter uma decisão relativa a indemnização por parte do agente do crime, dentro de um prazo razoável” – nº 1; sendo que “há sempre lugar à aplicação do disposto no artigo 82º-A do Código de Processo Penal em relação a vítimas especialmente vulneráveis, excepto nos casos em que a vítima a tal expressamente se opuser.”

E, de acordo com o artigo 67º-A, do CPP, na parte a ter em conta:

“1 - Considera-se:

a) 'Vítima':

i) A pessoa singular que sofreu um dano, nomeadamente um atentado à sua integridade física ou psíquica, um dano emocional ou moral, ou um dano patrimonial, directamente causado por acção ou omissão, no âmbito da prática de um crime;
(…)
b) 'Vítima especialmente vulnerável', a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua idade, do seu estado de saúde ou de deficiência, bem como do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social;
(…)
3 - As vítimas de criminalidade violenta e de criminalidade especialmente violenta são sempre consideradas vítimas especialmente vulneráveis para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1 (…)”.
Já o artigo 82º-A, do mesmo Código, consagra:

“1 - Não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil no processo penal ou em separado, nos termos dos artigos 72º e 77º, o tribunal, em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de protecção da vítima o imponham.

2 - No caso previsto no número anterior, é assegurado o respeito pelo contraditório.

3 - A quantia arbitrada a título de reparação é tida em conta em acção que venha a conhecer de pedido civil de indemnização.”

Da leitura conjugada dos artigos transcritos resulta a imposição (excepto no casos em que a vítima expressamente se opuser) ao Tribunal de fixar, em relação a vítimas especialmente vulneráveis, reparação pelos danos sofridos, a suportar pelo agente do crime.

Provado está que AL  à data dos factos tinha 73 anos de idade e usava uma “canadiana” para auxiliar a sua locomoção, de onde se pode concluir pela sua especial fragilidade em razão da idade e estado de saúde e, consequentemente de estarmos perante “vítima especialmente vulnerável”.

No caso em apreço, não foi por ela deduzido pedido de indemnização civil no processo penal, nem, tanto quanto se sabe, em separado e também não se opôs expressamente a que lhe fosse arbitrada quantia reparadora

Assim sendo, haverá que fixar uma quantia a título de reparação dos prejuízos sofridos.

Mas, não há que chamar à colação para a respectiva determinação as normas relativas à responsabilidade civil extracontratual, visto que a sua atribuição não é regulada pela lei civil, mas de acordo com o disposto nos artigos 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, 67º-A e 82º-A, do CPP, sendo que estes se não reportam a uma verdadeira indemnização, mas à reparação dos prejuízos – uma vez que a quantia é tida em conta em acção que venha a conhecer o pedido civil de indemnização, de acordo com o nº 3, do mesmo artigo - figuras jurídicas não exactamente coincidentes, pelo que somos levados a concluir que, também neste caso, o que o legislador pretendeu foi a fixação de reparação, ainda que tenha utilizado de forma lata o termo “indemnização”, o que conduz a que seja calculada de acordo com a equidade – cfr. Ac. do STJ de 06/10/2011, Proc. nº 88/09.9PESNT.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.

Assim sendo, tudo ponderado, julga-se adequada a reparação no montante de 700,00 euros, a pagar solidariamente pelos arguidos C.  e J.(atento o estabelecido nos artigos 490º e 497º, do Código Civil, dada a sua actuação na forma de co-autoria e condenação criminal em conformidade) à vítima AL , a que acrescem juros de mora contados desde a data da presente decisão até integral pagamento.

Termos em que, merece provimento o recurso interposto pelo Ministério Público.

III – DISPOSITIVO

Nestes termos, acordam os Juízes da 5ª Secção desta Relação em:

A) Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido J.e confirmar a decisão recorrida;

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC.

B) Conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, condenam os arguidos J. e C. , solidariamente, no pagamento da quantia de €700,00 (setecentos euros) a AL, a título de reparação pelos prejuízos sofridos, nos termos do estabelecido nos artigos 16º, do Estatuto da Vítima, aprovado pela Lei nº 130/2015, de 04/09, 67º-A e 82º-A, do CPP, a que acrescem juros de mora contados desde a data da presente decisão até integral pagamento.

Sem tributação.

Lisboa, 26 de Fevereiro de 2019

(Consigna-se que o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94º, nº 2, do CPP)

Artur Vargues
Jorge Gonçalves