Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
130/11.3TTLSB.L1-4
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: EMPRESAS DE SERVIÇOS DE LIMPEZA
PERDA DO LOCAL DE TRABALHO
PRESSUPOSTOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/02/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I – Por força do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável, havendo sucessão de empresas na prestação de serviço de limpeza em relação a um determinado local, os trabalhadores que aí prestavam a sua actividade laboral passam a ficar vinculados, sem perda de quaisquer garantias, à nova empresa encarregada de prestar esse serviço, desde que se verifiquem três requisitos: a) a perda do local de trabalho, por parte da empresa a que o trabalhador se encontrava vinculado; b) a afectação do trabalhador a esse local de trabalho; c) a transmissão desse mesmo local de trabalho para uma outra empresa prestadora de serviços.
II – Acresce, porém, um requisito de ordem formal, traduzido na obrigação da empregadora que perde o local de trabalho de fornecer, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção do pedido, à empresa que obteve a nova empreitada, diversos elementos referentes aos trabalhadores que transitam para os seus quadros, sendo certo que a expressão inicial «sem prejuízo da aplicação dos números anteriores» tem em vista que, verificando-se as excepções previstas nos n.ºs 4 e 5, fica dispensada a obrigação de resposta ao pedido da nova adjudicatária.
         (Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório

1.1. AA, contribuinte n.º (…), residente na R. (…), Lote (…),(…),(…), Lisboa, intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB, S.A., NIPC (…), com sede na Av. (…), n.º (…),(…) andar, (…) Lisboa, e CC, Lda., NIPC (…), com sede na R. (…), n.º (…),(…) Lisboa, pedindo:
- a declaração de qual das RR. é entidade patronal da A. e a condenação da mesma a readmitir a A. ao serviço e a pagar-lhe os salários desde Agosto de 2010, subsídio de Natal e metade do subsídio de férias referente ao ano de 2010, acrescidos de juros desde a citação;
- a condenação das RR. a pagarem à A. a quantia de 4.750,00 € a título de danos morais, acrescida de juros de mora desde a citação;
- caso não seja possível a reintegração da A., ser a entidade patronal condenada a pagar-lhe indemnização por antiguidade, no montante de 9.517,50 €, acrescida de juros de mora desde a citação.
Fundamentou a sua pretensão, em síntese, nos seguintes factos:
(…)
Realizada a audiência de partes, não se obteve a conciliação das mesmas (fls. 55/56).
A R. CC, Lda. contestou, por excepção, invocando a sua ilegitimidade, por não existir vínculo laboral entre esta e a A., e por impugnação motivada, declinando qualquer responsabilidade porquanto só obteve as informações necessárias ao cumprimento da Cláusula 17.ª do CCT 30 dias após as ter solicitado e 16 dias após o início do contrato de prestação de serviços que celebrou com a Livraria Almedina, motivo pelo qual colocou outro trabalhador naquele posto de trabalho (fls. 58 e ss.).
A R. BB, S.A. contestou, por impugnação motivada, alegando que executava a empreitada de prestação de serviços de limpeza na Livraria Almedina em regime de subcontratação (DD 2), tendo afectado a A., sua trabalhadora, àquele serviço há mais de um ano, pelo que tendo sido adjudicada à 2.ª R. a empreitada de limpeza, o posto de trabalho da A. deve manter-se ao serviço desta última (fls. 84 e ss.).
A R. BB (fls. 109 e ss.) e a A. (fls. 115 e ss.) responderam à contestação da R. CC, pronunciando-se pela improcedência da excepção invocada.
A pedido da A., foi admitida a intervenção principal provocada de DD (fls. 122), a qual, citada, não contestou.
Foi proferido despacho saneador que conheceu dos pressupostos processuais, julgando improcedente a excepção de ilegitimidade processual invocada, e dispensou a selecção da matéria de facto assente e controvertida (fls. 128 e ss.).
Realizou-se a audiência de julgamento, finda a qual se procedeu à fixação da matéria de facto provada e não provada, que não foi objecto de reclamação (fls. 221 e ss.).
Seguidamente, pela Mma. Juíza a quo foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo (fls. 228 e ss.):
«Em face de tudo o exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:
1. Declaro ilícito o despedimento da autora, AA, pela Ré CC, Lda, e condeno esta a reintegrar a A. com observância da sua categoria e antiguidade;
2. Condeno a Ré CC, Lda., a pagar à autora, as retribuições, férias, subsídio de férias e de Natal, vencidos desde 12 de Dezembro de 2010 até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescidas dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, descontadas das importâncias que a autora tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do subsídio de desemprego;
3. Condeno a ré Centúria Gold – Serviços de Limpeza, Lda., a pagar à autora a quantia de € 1.500, 00, a título de indemnização por danos morais, acrescida dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data do trânsito em julgado da presente decisão até efectivo e integral pagamento;
4. Absolvo a Ré CC, Lda., do demais peticionado;
5. Absolvo a Ré BB, S.A. e a chamada, DD, do pedido contra elas formulado.
Custas a cargo da autora e da Ré CC, Lda, na proporção do respectivo decaimento que se fixa, respectivamente, em 5% e 95% (art.º 446, nº 2º do CPC).»
1.2. A R. CC, Lda., inconformada, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões (fls. 258 e ss.):
(…)
1.3. A A. apresentou resposta ao recurso da 2.ª R., formulando as seguintes conclusões (fls. 306 e ss.):
(…)
1.4. Também a R. BB, S.A. apresentou resposta ao recurso da 2.ª R., formulando as seguintes conclusões (fls. 337 e ss.):
(…)
1.5. O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo (fls. 351).
1.6. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, em parecer, no sentido de não ser concedido provimento à apelação (fls. 369 e ss.).
Colhidos os vistos (fls. 376), cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são:
- impugnação da decisão da matéria de facto;
- se o contrato de trabalho da A. se transmitiu para a 2.ª R. por efeito da perda do local de trabalho pela 1.ª R..

3. Fundamentação de facto

Os factos provados a ter em conta são os seguintes:
1. A A. foi admitida ao serviço da R. BB, S.A., em 09/04/1984, como empregada de limpeza.
2. A A. executava as suas funções nos clientes da 1.ª R., de segunda-feira a sexta-feira, entre as 6 e as 9 horas.
3. A A., nos meses de Janeiro a Julho de 2010, auferiu as remunerações constantes dos documentos de fls. 18 a 20 e 24 a 28 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
4. A A., no dia 16/08/2010, iniciou o seu período de férias de acordo com a marcação previamente acordada com a 1.ª R., que decorreu até 31/08/2010.
5. (alterado conforme decisão infra)
Até 31 de Julho de 2010, e desde 13/07/2009, a A. encontrava-se a exercer as funções de empregada de limpeza, por conta da 1.ª R., na Livraria Almedina Av. D. João II, lote 11605, fracção B.
6. Por acordo escrito datado de 4 de Agosto de 2010, cuja cópia se encontra a fls. 196 a 199 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, a sociedade EE S.A., detentora do estabelecimento Livraria Almedina Oriente, adjudicou à R. CC, Lda. os serviços de limpeza daquele estabelecimento, com efeitos a partir de 16 de Agosto de 2010.
7. Quando regressou de férias a A., em 1 de Setembro de 2010, apresentou-se ao serviço na Livraria Almeida Oriente, tendo sido impedida de prestar serviço pela 2.ª R..
8. Entre os dias 1 e 9 de Novembro de 2010, a A. apresentou-se ao serviço na Livraria Almeida Oriente, tendo sido sempre impedida de prestar serviço pela 2.ª R..
9. No dia 9 de Novembro de 2010, a A. entregou ao responsável pela livraria as respectivas chaves, por solicitação daquele.
10. Em virtude do referido em 9, a A. passou a apresentar-se, no dia 10/11/2010 e até 16/11/2010, na sede da 1.ª R..
11. Na sequência de uma queda, a A. esteve de baixa médica entre 17/11/2010 e 02/01/2011.
12. Após o período de baixa médica, a A. dirigiu-se às sedes das 1.ª e 2.ª RR. com vista à resolução da sua situação.
13. A A. enviou à 1.ª R. a carta cuja cópia se encontra a fls. 34 e 35, datada de 24/09/2010, cujo teor se dá por reproduzido, tendo esta respondido através da carta cuja cópia se encontra a fls. 36 e 37 dos autos, datada de 13 de Outubro de 2010, cujo teor se dá por reproduzido.
14. A A. enviou igualmente uma carta à 2.ª R., que respondeu através da carta cuja cópia se encontra a fls. 39 e 40 dos autos, datada de 27/09/2010, cujo teor se dá por reproduzido.
15. A 2.ª R. enviou à DD, em 02/08/2010, o fax cuja cópia se encontra a fls. 70 e 71 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
16. Em 06/08/2010, a 2.ª R. recebeu da DD, Lda. o mail cuja cópia se encontra a fls. 72 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, indicando que os elementos relativos à colaboradora deveriam ser solicitados à BB, S.A., empresa que operacionalizava a prestação de serviço.
17. Em 10/08/2010, a 2.ª R. enviou à 1.ª R. o fax cuja cópia se encontra a fls. 73 e 74, cujo teor se dá por reproduzido, solicitando o envio, no prazo de 5 dias úteis, dos dados relativos à trabalhadora.
18. A 1ª R. apenas respondeu à comunicação referida em 17 no dia 02/09/2010, através da comunicação cuja cópia se encontra a fls. 75 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, através da qual foi remetida o documento de fls. 77 e 78 dos autos, cujo teor se dá igualmente por reproduzido.
19. A 2.ª R. colocou outro trabalhador a efectuar o serviço de limpeza na Livraria Almedina.
20. A 1.ª R. executava os serviços de limpeza na Livraria Almedina ao abrigo do acordo celebrado com a DD, cuja cópia se encontra a fls. 204 a 206 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, que havia sido contratada pela empresa exploradora da Livraria.
21. O acordo referido em 20, celebrado entre a 1.ª R. e a chamada, cessou em 31 de Julho de 2010.
23. A 2.ª R., quando celebrou o acordo referido em 6, tinha conhecimento da existência de uma trabalhadora que efectuava a limpeza da livraria.
24. A 2.ª R. enviou à chamada, em 10/08/2010, o fax cuja cópia se encontra a fls. 95 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
25. O facto de as RR. não aceitarem a A. como trabalhadora desde 1 de Setembro de 2010 deixou a A. nervosa.

4. Fundamentação de direito

4.1. Coloca-se em primeiro lugar a questão da alteração da decisão da matéria de facto.
(…)
Deste modo, procede-se à alteração nos seguintes termos:
5. Até 31 de Julho de 2010, e desde 13/07/2009, a A. encontrava-se a exercer as funções de empregada de limpeza, por conta da 1.ª R., na Livraria Almedina – Av. D. João II, lote 11605, fracção B.
(…)
4.2. Importa, então, apreciar se o contrato de trabalho da A. se transmitiu para a 2.ª R. por efeito da perda do local de trabalho pela 1.ª R..
Conforme reconhece a Recorrente, a questão coloca-se com fundamento na cláusula 15.ª do CCT celebrado entre a APFS e a FETESE, publicado no BTE n.º 15, de 22 de Abril de 2008, objecto de Regulamento de Extensão por via da Portaria n.º 1519/2008, publicada no DR, I Série, de 24/12/2008, a qual, sob a epígrafe «Perda de um local ou cliente», tem o seguinte teor:
1 — A perda de um local de trabalho por parte da empregadora não integra o conceito de caducidade nem de justa causa de despedimento.
2 — Em caso de perda de um local de trabalho, o empregador que tiver obtido a nova empreitada obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço.
3 — No caso previsto no número anterior, o trabalhador mantém ao serviço da nova empresa todos os seus direitos, regalias e antiguidade, transmitindo-se para a nova empresa as obrigações que impendiam sobre a anterior directamente decorrentes da prestação de trabalho tal como se não tivesse havido qualquer mudança de empregador, salvo créditos que, nos termos deste CCT e das leis em geral, já deveriam ter sido pagos.
4 — Para os efeitos do disposto no n.º 2 da presente cláusula, não se consideram trabalhadores a prestar normalmente serviço no local de trabalho:
a) Todos aqueles que prestam serviço no local de trabalho há 120 ou menos dias;
b) Todos aqueles cuja remuneração e ou categoria profissional foram alteradas dentro de 120 ou menos dias, desde que tal não tenha resultado directamente da aplicação do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Os 120 dias mencionados neste número são os imediatamente anteriores à data do início da nova empreitada.
5 — Quando justificadamente o trabalhador se recusar a ingressar nos quadros da nova empresa, a empregadora obriga-se a assegurar-lhe novo posto de trabalho.
6 — Sem prejuízo da aplicação dos números anteriores, a empregadora que perder o local de trabalho é obrigada a fornecer, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção do pedido, à empresa que obteve a nova empreitada e ao sindicato representativo dos respectivos trabalhadores os seguintes elementos referentes aos trabalhadores que transitam para os seus quadros:
a) Nome e morada dos trabalhadores;
b) Categoria profissional;
c) Horário de trabalho;
d) Situação sindical de cada trabalhador:
e) Data da admissão na empresa e, se possível, no sector;
f) Início da actividade no local de trabalho;
g) Situação contratual: a prazo ou permanente;
h) Se a prazo, cópia de contrato;
i) Mapa de férias do local de trabalho;
j) Extracto de remuneração dos últimos 120 dias, caso sejam concedidos a algum trabalhador acréscimos de remuneração por trabalho aos domingos, trabalho nocturno ou quaisquer prémios ou regalias com carácter regular e permanente;
k) Situação perante a medicina no trabalho, com indicação do último exame;
l) Qualquer outra obrigação cujo cumprimento decorra da lei.
7 — No caso dos trabalhadores na situação de baixa que transitaram para outra empresa, nos termos desta cláusula, cujo contrato de trabalho tenha cessado por reforma coincidente com o termo de suspensão, compete à empresa adquirente da empreitada o pagamento dos créditos daí resultantes.
8 — O disposto na presente cláusula aplica-se, com as necessárias adaptações, às reduções de empreitadas.
Conforme se diz no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Março de 2005, “[a] cláusula impõe, por força dos seus n.ºs 1, 2 e 3, a transmissão da posição contratual dos trabalhadores para o novo prestador de serviços, sempre que ocorra uma mudança de titularidade da empreitada relativamente a um certo local de trabalho. Ou seja, havendo sucessão de empresas na prestação de serviço de limpeza em relação a um determinado local, os trabalhadores que aí prestavam a sua actividade laboral passam a ficar vinculados, sem perda de quaisquer garantias, à nova empresa encarregada de prestar esse serviço.
Como se salienta no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 249/90 de 12 de Julho de 1990 (confirmado em plenário pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 431/91 publicado no DR II série, de 24 de Abril de 1992), a cláusula visa garantir a estabilidade do emprego aos trabalhadores e, concomitantemente, contribuir para a viabilidade económica das empresas.
A transmissão da posição contratual depende, porém, de três factores: (a) a perda do local de trabalho, por parte da empresa a que o trabalhador se encontrava vinculado; (b) a afectação do trabalhador a esse local de trabalho; (c) a transmissão desse mesmo local de trabalho para uma outra empresa prestadora de serviços. É o que se depreende com toda a evidência do n.º 2 da cláusula 17ª onde se refere: "Em caso de perda de um local de trabalho (1º requisito), a entidade patronal que tiver obtido a nova empreitada (3º requisito) obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço (2º requisito)."
No entanto, para além destes requisitos materiais, o n.º 6 estabelece ainda como requisito de ordem formal a obrigação do empregador de fornecer, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção do pedido, à empresa que obteve a nova empreitada e ao sindicato representativo dos respectivos trabalhadores, diversos elementos referentes aos trabalhadores que transitam para a nova empresa.
Ora, no entendimento da sentença recorrida, a que as Apeladas aderem, há transmissão automática dos contratos independentemente de qualquer comunicação da empresa que perde o local de trabalho, invocando-se em abono dessa tese a expressão «sem prejuízo da aplicação dos números anteriores» constante da parte inicial do n.º 6, que é interpretada no sentido de «sem prejuízo do facto de a nova empresa ter de assumir nos seus quadros todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviços».
Corolário deste entendimento será, necessariamente, que a nova empresa tem de assumir todos os contratos, mesmo que a substituída nada lhe comunique, o que significa que os custos decorrentes do incumprimento desta regra recaem sobre aquela, e limitando-se a infractora a ter de suportar a multa prevista na cláusula 53.ª.
Ora, esta interpretação assenta no pressuposto errado de que a norma só tutela a estabilidade do trabalhador, quando na verdade visa também tutelar a livre concorrência entre as empresas, e conduz a resultados certamente inadmissíveis: se a substituída pudesse apresentar os elementos relativos aos trabalhadores se e quando entendesse, sem outra sanção que não uma multa de € 25 a € 150 por cada trabalhador ou de € 750 a € 7.500 no caso de uma pluralidade, dificilmente se poderia pensar que quem estabeleceu o IRCT soube escolher as mais acertadas soluções, a que alude o art. 9.º, n.º 3 do Código Civil, sendo manifesta a inadequação daquela sanção para prevenir atitudes de mau perder (como seria se a vencedora do concurso fosse confrontada com um enorme quadro de pessoal várias semanas depois de iniciar a actividade).
Neste sentido, veja-se o Acórdão desta Relação de Lisboa de 9 de Outubro de 2013, proferido na Apelação n.º 1441/09.3TTLSB.L1, em que foi relator o Desembargador Sérgio Almeida, segundo cremos não publicado.
Por outro lado, nos termos do n.º 4 da cláusula em referência, ficam excluídos da transmissão os trabalhadores que prestam serviço no local de trabalho há 120 ou menos dias e aqueles cuja remuneração e ou categoria profissional foram alteradas dentro de 120 ou menos dias, desde que tal não tenha resultado directamente da aplicação do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Acresce que, de acordo com o n.º 5, quando justificadamente o trabalhador se recusar a ingressar nos quadros da nova empresa, a empregadora obriga-se a assegurar-lhe novo posto de trabalho.
Resulta, pois, da cláusula em apreço, que a posição e inerentes obrigações do empregador não cessam automaticamente quando perde um local onde presta serviços de limpeza, pois há trabalhadores que não estão abrangidos pela transmissão e os demais podem pretender opor-se legitimamente a ela.
A letra do n.º 6, aliás, ao dispor que a empregadora que perder o local de trabalho é obrigada a fornecer, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção do pedido, à empresa que obteve a nova empreitada, diversos elementos referentes aos trabalhadores que transitam para os seus quadros, inculca esse sentido, sendo certo que a expressão inicial «sem prejuízo da aplicação dos números anteriores» tem em vista que, verificando-se as excepções previstas nos n.ºs 4 e 5, fica dispensada a obrigação de resposta ao pedido da nova adjudicatária.
Ou seja, o regime em causa nesta cláusula, a que voluntariamente se submeteram as empresas de prestação de serviços de limpeza, garantindo aos respectivos trabalhadores a manutenção do posto e local de trabalho mesmo em casos em que nenhuma transmissão de estabelecimento se verifica e, por isso, caem fora do âmbito de aplicação do art. 285.º do Código do Trabalho, só se compreende e justifica como resposta a vicissitudes problemáticas decorrentes do normal funcionamento das regras do mercado específico que a todas afecta, numa lógica de leal e sã concorrência.
Conforme resulta, desde logo, do seu n.º 1, a norma pretende acautelar situações que, de outro modo, por configurarem uma alteração imprevisível, aleatória e objectiva das condições de exercício da actividade do empregador, poderiam eventualmente fundamentar a invocação por este de caducidade dos contratos de trabalho ou de justa causa (objectiva, por motivos económicos) de despedimento.
Só nesse estrito sentido, de resposta limitada aos normais efeitos do mercado, se entende a estatuição de que, mesmo quando se opere a transmissão, fiquem excluídos os trabalhadores que prestam serviço no local de trabalho em causa há 120 ou menos dias e aqueles cuja remuneração e ou categoria profissional foram alteradas dentro de 120 ou menos dias, desde que tal não tenha resultado directamente da aplicação do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Com efeito, não se vislumbra outra razão de ser para tais excepções que não seja a de prevenir que o empregador aumente os encargos ou desvantagens com pessoal em determinado local de trabalho tendo em vista a eventualidade da sua transferência para outrem, quando se aproxima o termo do prazo da empreitada. 
Deste modo, não é sustentável que o empregador não observe devidamente o estipulado no n.º 6, sem outras consequências para além do pagamento duma multa simbólica, sob pena de se inviabilizar o escrutínio das situações a que alude o mencionado n.º 4. 
Ora, no caso em apreço, provou-se que, por acordo datado de 4 de Agosto de 2010, a proprietária da Livraria Almedina Oriente adjudicou à R. CC os serviços de limpeza daquele estabelecimento, com efeitos a partir de 16 de Agosto de 2010.
Nessa data, a 2.ª R. tinha conhecimento da existência de uma trabalhadora que efectuava a limpeza da livraria e enviara já à DD, em 02/08/2010, fax a solicitar os respectivos elementos, tendo em 6/08/2010 recebido da mesma mail a indicar que os mesmos deveriam ser solicitados à BB. Em 10/08/2010, a 2.ª R. enviou à 1.ª R. fax a solicitar o envio, no prazo de 5 dias úteis, dos dados relativos à trabalhadora, tendo a 1.ª R. respondido apenas no dia 2/09/2010.
Assim, em face do que se disse, deve a BB acarretar com as consequências do incumprimento no momento devido da obrigação de informação que impendia sobre ela como condição da efectiva transmissão do contrato da A. para a CC.
E, por conseguinte, tendo recusado continuar a dar trabalho à A., como se alcança dos pontos 10. a 13. e 25., responde pelas consequências jurídicas decorrentes do despedimento, nos termos já apreciados e decididos na sentença recorrida. 

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar o recurso procedente e, em consequência:
1. Declara-se ilícito o despedimento da A., AA, e condena-se a R. BB, S.A. a reintegrá-la com observância da sua categoria e antiguidade;
2. Condena-se a R. BB, S.A. a pagar à A. as retribuições, férias, subsídios de férias e de Natal, vencidos desde 12 de Dezembro de 2010 até ao trânsito em julgado da decisão, acrescidos dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, descontados das importâncias que a A. tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do subsídio de desemprego;
3. Condena-se a R. BB, S.A. a pagar à A. a quantia de € 1.500,00, a título de indemnização por danos morais, acrescida dos juros de mora computados à taxa legal de 4% desde a data do trânsito em julgado da decisão até efectivo e integral pagamento;
4. Absolve-se a R. BB, S.A. do demais peticionado;
5. Absolvem-se a R. CC, Lda. e a chamada DD do pedido contra elas formulado.
Custas pelas Recorridas.

Lisboa, 2 de Julho 2014
 
Alda Martins
Paula Santos
Seara Paixão)



Decisão Texto Integral: