Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
30/13.2TTLRS.L1-4
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
COMPENSAÇÃO
ACEITAÇÃO
ARTICULADO SUPERVENIENTE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I – A aceitação do despedimento por força do recebimento da compensação extingue o direito do trabalhador de impugnar o despedimento e, processualmente, constitui uma excepção peremptória, importando a absolvição do pedido, a qual, de acordo com a regra geral, não é de conhecimento oficioso mas antes dependente da invocação expressa por parte do interessado (arts. 576.º, n.º 3 e 579.º do Código de Processo Civil de 2013).

II – Não é de admitir articulado superveniente apresentado depois de findos os debates em sede de audiência de julgamento e em que a empregadora invoca a excepção peremptória da aceitação do despedimento por efeito do recebimento da compensação pelo trabalhador, cerca de um ano depois de a ter pago, e para mais sem oferecer prova da alegada superveniência do conhecimento da sua não devolução pelo mesmo, facto que, aliás, interessava só ao trabalhador e não àquela.

         (Elaborado pela Relatora)

Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório

1.1. Em 8 de Janeiro de 2013, AA intentou acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra BB, S.A., na qual se opõe ao despedimento promovido pela empregadora na sequência de procedimento para despedimento por extinção do posto de trabalho, com efeitos a partir de 28 de Fevereiro de 2013, requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo, com as legais consequências.

Procedeu-se à realização da audiência de partes, na qual não foi possível obter a conciliação das mesmas (fls. 47/48).

A empregadora apresentou articulado de motivação do despedimento e juntou o procedimento de despedimento, em 20 de Fevereiro de 2013 (fls. 51 e ss.), alegando, em síntese, que se dedica, entre outras, à comercialização, concepção, projecto, montagem e manutenção de instalações e respectivos equipamentos, nomeadamente, em “health clubs”, hipermercados, hotéis e centros comerciais.

Mais alega que o sector onde a Ré opera sofreu uma diminuição de actividade durante o ano de 2012, entre os 30% e os 40%, com a consequente abrupta diminuição do volume de negócios.

Com base na referida conjuntura, a Ré procedeu à extinção do posto de trabalho do Autor, atendendo a que se tratava do trabalhador mais recentemente contratado, o que auferia o vencimento mais elevado, em comparação com os colegas com a mesma categoria profissional, não dispondo a Ré de outro posto de trabalho compatível com as funções desempenhadas pelo Autor.

Termina, pedindo que se reconheça a regularidade e licitude do despedimento do Autor.

O trabalhador contestou a licitude do despedimento (fls. 89 e ss.), por não se verificarem os pressupostos para a extinção do seu posto de trabalho.

Conclui pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe as quantias referentes às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial, a reintegrar o Autor e a pagar-lhe a quantia de € 5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos, bem como, ainda, a pagar-lhe a quantia em dívida relativa a isenção de horário de trabalho, desde 1-01-1999 até ao termo do contrato de trabalho.

O empregador respondeu à contestação em 2 de Abril de 2013 (fls. 104 e ss.), em que impugnou o pedido reconvencional, concluindo como no articulado inicial.

Foi proferido despacho saneador (fls. 444/445), onde, além do mais, foi admitido o pedido reconvencional, após o que se realizou a audiência de julgamento.

Findas as alegações orais dos senhores advogados das partes, o tribunal designou data para a leitura da decisão sobre a matéria de facto, a qual, por impossibilidade daquele, não se realizou na data designada, isto é, 3 de Fevereiro de 2014 (fls. 479).

Em 5 de Fevereiro de 2014, a Ré veio apresentar articulado (fls. 475 e ss.), dizendo que em 26-02-2013 transferiu para a conta bancária do Autor a quantia de € 47.275,99, que inclui € 44.515,67 a título de indemnização pelo despedimento por extinção do posto de trabalho, quantia que o Autor não devolveu à Ré até à presente data, presumindo-se, pois, que aceitou o despedimento.

Mais alega a Ré que detectou que o Autor não procedeu àquela restituição apenas agora, ao emitir as declarações de rendimentos dos trabalhadores e ex-trabalhadores referentes ao ano de 2013.

Juntou cópia do recibo de vencimento do Autor relativo a Fevereiro de 2013 e declaração emitida pelo Banco BPI comprovando que foi transferida para a conta bancária daquele, em 26-02-2013, o valor de € 47.275,99.

O tribunal determinou a notificação do Autor para, no prazo de cinco dias, se pronunciar sobre o requerimento apresentado pela Ré.

O Autor veio responder (fls. 487 e ss.), alegando que tal requerimento é extemporâneo, pois a factualidade correspondente deveria ter sido alegada no articulado motivador do despedimento e não o foi, ou em última análise em sede de audiência de discussão e julgamento, fase que identifica como a do encerramento da discussão sobre a matéria de facto.

Mais alega que o A. mantém o interesse no prosseguimento da acção, devendo o tribunal proceder à leitura da decisão sobre a matéria de facto, uma vez que, ao impugnar o despedimento judicialmente, o Autor ilidiu a presunção legal de que aceitava o despedimento.

Seguidamente, pela Mma. Juíza a quo foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo (fls. 499 e ss.):

«Por tudo quanto se deixa exposto julgo a presente acção totalmente improcedente, e, em consequência:

a) Não declaro a ilicitude do despedimento do A.

b) Absolvo a Ré do demais peticionado.

Custas a cargo do Autor (art.º 446º do Código de Processo Civil, ex vi art.º 1º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho), sem prejuízo de eventual apoio judiciário, de que possa beneficiar.»

1.2. O Autor, inconformado, veio interpor recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões (fls. 511 e ss.):

(…)

1.3. A Ré apresentou resposta ao recurso do trabalhador, pugnando pela sua improcedência (fls. 550 e ss.).

1.4. O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo (fls. 578).

1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, em parecer, no sentido de não ser concedido provimento ao recurso do Autor (fls. 588).

Colhidos os vistos (fls. 592), cumpre decidir.

2.         Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são, por ordem de precedência lógica:

- admissibilidade de apresentação do articulado superveniente e dos documentos destinados a provar os factos aí alegados (conclusões G- a ZZ-);

- nulidade da sentença por excesso e omissão de pronúncia (conclusões A- a F- e GGG- a NNN-);

- licitude ou ilicitude do despedimento (conclusões AAA- a FFF-).

3. Apreciação do recurso

3.1. Apreciemos, então, se é admissível a apresentação do articulado superveniente e dos documentos destinados a provar os factos aí alegados (fls. 475 e ss.).

Conforme resulta do Relatório supra, a presente acção foi intentada pelo trabalhador em 8 de Janeiro de 2013, com vista à impugnação de despedimento por extinção do posto de trabalho que lhe foi comunicado para produzir efeitos em 28 de Fevereiro de 2013.

A empregadora apresentou articulado de motivação do despedimento em 20 de Fevereiro de 2013 e respondeu à contestação do trabalhador em 2 de Abril de 2013.

Realizada a audiência de julgamento, após as alegações orais dos senhores advogados das partes, o tribunal designou data para a leitura da decisão sobre a matéria de facto, a qual, por impossibilidade daquele, não se realizou na data designada, isto é, 3 de Fevereiro de 2014.

Em 5 de Fevereiro de 2014, a Ré veio apresentar articulado (fls. 475 e ss.), dizendo que em 26-02-2013 transferiu para a conta bancária do Autor a quantia de € 47.275,99, que inclui € 44.515,67 a título de indemnização pelo despedimento por extinção do posto de trabalho, quantia que o Autor não devolveu à Ré até à presente data, presumindo-se, pois, que aceitou o despedimento.

Mais alega a Ré que apenas agora detectou que o Autor não procedeu àquela restituição, ao emitir as declarações de rendimentos dos trabalhadores e ex-trabalhadores referentes ao ano de 2013.

Juntou cópia do recibo de vencimento do Autor relativo a Fevereiro de 2013 e declaração emitida pelo Banco BPI comprovando que foi transferida para a conta bancária daquele, em 26-02-2013, o valor de € 47.275,99.

Tendo em conta a cronologia desta tramitação, há que ter em conta que é aplicável o Código de Processo do Trabalho de 1999, na redacção conferida pelo DL n.º 295/2009, de 13 de Outubro, e, por força do seu art. 1.º, o Código de Processo Civil de 1961 e, após 1 de Setembro de 2013, o Código de Processo Civil de 2013, nos termos dos arts. 5.º e 8.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que o aprovou. 

Por outro lado, o procedimento de despedimento do Autor desenvolveu-se no âmbito de vigência do Código do Trabalho de 2009, na redacção conferida pela Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho.

Ora, estabelecia o n.º 2, al. d) do art. 371.º deste diploma que a decisão de despedimento é proferida por escrito, dela constando, nomeadamente, montante, forma, momento e lugar do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, acrescentando o n.º 4 que o pagamento da compensação, dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho deve ser efectuado até ao termo do prazo de aviso prévio.

Por seu turno, dispunha o art. 372.º, sob a epígrafe «Direitos de trabalhador em caso de despedimento por extinção de posto de trabalho», que ao trabalhador despedido por extinção do posto de trabalho se aplicava, além do mais, o art. 366.º, o qual, por seu turno, estabelecia, com o título «Compensação por despedimento colectivo»:

1 - Em caso de despedimento colectivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 20 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

2 - A compensação prevista no número anterior é determinada do seguinte modo:

a) O valor da retribuição base mensal e diuturnidades do trabalhador a considerar para efeitos de cálculo da compensação não pode ser superior a 20 vezes a retribuição mínima mensal garantida;

b) O montante global da compensação não pode ser superior a 12 vezes a retribuição base mensal e diuturnidades do trabalhador ou, quando seja aplicável o limite previsto na alínea anterior, a 240 vezes a retribuição mínima mensal garantida;

c) O valor diário de retribuição base e diuturnidades é o resultante da divisão por 30 da retribuição base mensal e diuturnidades;

d) Em caso de fracção de ano, o montante da compensação é calculado proporcionalmente.

3 - A compensação é paga pelo empregador, com excepção da parte que caiba ao fundo de compensação do trabalho ou a mecanismo equivalente, nos termos de legislação específica.

4 - No caso de o fundo de compensação do trabalho ou o mecanismo equivalente não pagar a totalidade da compensação a que esteja obrigado, o empregador responde pelo respectivo pagamento e fica sub-rogado nos direitos do trabalhador em relação àquele em montante equivalente.

5 - Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo.

6 - A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação pecuniária recebida à disposição do empregador e do fundo de compensação do trabalho ou mecanismo equivalente.

7 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto nos n.ºs 1, 2, 3 e 4.

Não obstante, há ainda que ter em atenção que a mencionada Lei n.º 23/2012, de 25/06, estabeleceu no n.º 1 do seu art. 6.º, intitulado «Compensação em caso de cessação de contrato de trabalho», que, em caso de cessação de contrato de trabalho celebrado antes de 1 de Novembro de 2011, a compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho, na redacção conferida por aquela, é calculada do seguinte modo:

a) Em relação ao período de duração do contrato até 31 de Outubro de 2012, o montante da compensação corresponde a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade;

b) Em relação ao período de duração do contrato a partir da data referida na alínea anterior, o montante da compensação corresponde ao previsto no artigo 366.º do Código do Trabalho;

c) O montante total da compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.

Como refere António Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, Almedina, 2012, p. 513), “[a] lei relaciona com a realização desta atribuição patrimonial dois efeitos manifestamente atípicos.

Em primeiro lugar, e como já se observou, o pagamento da compensação (ou melhor, como se verá, a sua oferta) até ao termo do prazo de aviso prévio é condição de licitude do despedimento, solução surpreendente mas inequivocamente consagrada no art. 384,º/d) (com nova redacção dada pela L. 23/2012).

Depois, o recebimento da compensação pelo trabalhador gera a presunção de aceitação do despedimento. A presunção é ilidível de uma única forma: mediante a devolução da compensação. Deste modo, e dentro dos prazos legalmente estabelecidos para a impugnação do despedimento (arts. 387.º e 388.º CT), enquanto o trabalhador mantiver em seu poder o montante recebido, o empregador estará garantido contra essa impugnação. Tal é o teor do art. 366.º/5 e 6 (na redacção da L. 23/2012), para o qual, como temos visto, remete o art. 372.º.”

Isto é, a aceitação do despedimento por força do recebimento da compensação extingue o direito do trabalhador de impugnar o despedimento e, processualmente, a sua invocação constitui uma excepção peremptória, importando a absolvição do pedido (art. 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil de 2013). Não obstante, de acordo com a regra geral, trata-se duma excepção peremptória que não é de conhecimento oficioso mas antes dependente da invocação expressa por parte do interessado (art. 579.º do mesmo diploma legal).

Por seu turno, estabelece o art. 98.º-L do Código de Processo do Trabalho, respeitante à tramitação da acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento:

(…)

4 - Se o trabalhador se tiver defendido por excepção, pode o empregador responder à respectiva matéria no prazo de 10 dias; havendo reconvenção, o prazo para resposta é alargado para 15 dias.

5 - É correspondentemente aplicável o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 60.º e no n.º 6 do artigo 274.º do Código de Processo Civil.

6 - As partes devem apresentar ou requerer a produção de prova nos respectivos articulados ou no prazo destes.

Ora, nos termos do citado n.º 3 do art. 60.º, só são admitidos articulados supervenientes nos termos do artigo 506.º do Código de Processo Civil ou para os efeitos do artigo 28.º.

Não relevando para o caso o mencionado art. 28.º, importa sim ter em conta o art. 588.º do Código de Processo Civil de 2013, correspondente ao art. 506.º do Código de Processo Civil de 1961, sobre os articulados supervenientes, o qual dispõe:

Termos em que são admitidos

1 - Os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitem, até ao encerramento da discussão.

2 - Dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência.

3 - O novo articulado em que se aleguem factos supervenientes é oferecido:

a) Na audiência prévia, quando os factos hajam ocorrido ou sido conhecidos até ao respectivo encerramento;

b) Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da audiência final, quando não se tenha realizado a audiência prévia;

c) Na audiência final, se os factos ocorreram ou a parte deles teve conhecimento em data posterior às referidas nas alíneas anteriores.

4 - O juiz profere despacho liminar sobre a admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou ordenando a notificação da parte contrária para responder em 10 dias, observando-se, quanto à resposta, o disposto no artigo anterior.

5 - As provas são oferecidas com o articulado e com a resposta.

6 - Os factos articulados que interessem à decisão da causa constituem tema da prova nos termos do disposto no artigo 596.º.

Ou seja, como ensina José Lebre de Freitas (A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, Coimbra Editora, 2013, pp. 146-147), “[p]odem, depois do último articulado da parte, ocorrer novos factos – ou elementos de facto – constitutivos da situação jurídica do autor (ou do facto objeto da ação de simples apreciação) ou factos modificativos ou extintivos dessa situação (superveniência objetiva). Pode também ocorrer que só depois do seu último articulado o autor tenha conhecimento de outros factos – ou elementos de facto – constitutivos, ou o réu conhecimento de factos impeditivos, modificativos ou extintivos, embora uns e outros tivessem ocorrido anteriormente (superveniência subjetiva). Em ambos os tipos de situação, pode ter lugar articulado superveniente, em que a parte a quem o facto é favorável o alegará (art. 588, n.ºs 1 e 2), juntamente, se for caso dela, com a superveniência subjetiva.

Relativamente ao réu, não joga a preclusão do art. 573-1 para estas exceções supervenientes (art. 573-2).”

Retornando ao caso dos autos, verifica-se que a empregadora só invocou a excepção peremptória da aceitação do despedimento por efeito do recebimento da compensação pelo trabalhador no articulado de 5 de Fevereiro de 2014, sendo certo que, tendo aquele recebimento ocorrido em 26 de Fevereiro de 2013, não o podia ter invocado no articulado de motivação do despedimento apresentado em 20 de Fevereiro de 2013 mas já podia tê-lo feito na resposta à contestação do trabalhador que apresentou em 2 de Abril de 2013, ou, em última análise, no momento referido na al. b) do n.º 3 do art. 588.º do Código de Processo Civil de 2013.

É certo que, não obstante a inverosimilhança, por se tratar de facto pessoal, e ocorrido há pouco menos de um ano, a Ré alegou também que detectou que o Autor não procedeu à restituição da compensação apenas à data da apresentação do articulado, ao emitir as declarações de rendimentos dos trabalhadores e ex-trabalhadores referentes ao ano de 2013, com vista – segundo nos parece – a que se considerasse haver superveniência decorrente de a parte só ter conhecimento do facto (anterior) depois de findarem os prazos para apresentação dos articulados normais.

Todavia, a Ré não ofereceu quaisquer provas desse alegado conhecimento superveniente, nos termos dos n.ºs 2 e 5 do art. 588.º do Código de Processo Civil de 2013; e, por outro lado, o facto constitutivo da excepção peremptória referente à aceitação do despedimento é o recebimento da compensação respectiva por parte do trabalhador, no caso por efeito da transferência ordenada pela própria Apelada em 26-02-2013, sendo esse facto que lhe cabia alegar e demonstrar, no momento processual devido, e não a sua devolução ou não devolução, que só ao trabalhador interessava com vista à ilisão da presunção legal.

Acresce ainda que "[o] termo dos debates, encerrando a discussão da matéria de facto em 1.ª instância, constitui um importante momento preclusivo, após o qual deixa de ser possível, além da alegação de factos nos termos do art. 264-3, apresentar articulado superveniente (arts. 506-1 e 663-1), ampliar o pedido em desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo (art. 273-2), apresentar documentos (art. 523-2) ou coisas (art. 518-1), sem prejuízo da apresentação de documento em eventual recurso (arts. 524-1, 712-1-c, 727), propor prova relativa à genuinidade do documento particular (art. 545-2) e, de modo geral, produzir qualquer outro meio de prova, ainda que, fora o caso da iniciativa oficiosa do art. 653-1, a produção da prova já não possa ter lugar, salvo os casos indicados na lei (arts. 650-3, 507-1, 380-3, 545-1 e 549-1), desde que os debates se iniciam, o mesmo sucedendo com a dedução do incidente de liquidação (...)" (José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, Coimbra Editora, 2008, pp. 624-625).

Ora, no caso em apreço, o articulado da Recorrida foi apresentado já depois de findos os debates, momento equivalente ao do encerramento da discussão, conforme resulta também do disposto no art. 72.º, n.ºs 4 e 5 do Código do Processo do Trabalho, nos termos do qual após tal momento se impõe que o tribunal do trabalho profira a decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória e eventualmente outra relevante para a boa decisão da causa que tenha sido articulada e tenha resultado daquela discussão, pelo que, também por tal motivo aquele articulado foi intempestivo à luz do preceituado no art. 588.º, n.º 1 do Código de Processo Civil de 2013.  

Em face do exposto, não deveria ter sido admitido o articulado da empregadora, bem como os documentos anexos destinados a provar os factos aí alegados, por manifesta extemporaneidade nos termos do art. 588.º, n.ºs 1, 2 e 3, al. b) do Código de Processo Civil de 2013, pelo que procede o recurso do Autor nesta parte, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões.

4. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação procedente e em revogar a sentença recorrida, determinando-se o desentranhamento e restituição ao empregador do articulado e documentos de fls. 475 a 477 e o prosseguimento da acção com a designação de nova data para prolação da decisão sobre a matéria de facto prevista no art. 72.º do Código de Processo do Trabalho e ulteriores termos processuais.

Custas do incidente de desentranhamento e do recurso pela Apelada.   

Lisboa, 3 de Dezembro de 2014

Alda Martins

Paula Santos

Ferreira Marques (com dispensa de visto)

Decisão Texto Integral: