Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
969/09.0TYLSB.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: INQUÉRITO JUDICIAL
DIREITO À INFORMAÇÃO
SOCIEDADES ANÓNIMAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: O direito do sócio requerer inquérito judicial releva, quer quando não lhe são fornecidas informações, por escrito, e respeitantes a assuntos sociais, quer quando lhe é recusado o direito de informação na modalidade de direito de consulta de determinados livros e documentos em poder da sociedade.
Estando o direito à informação do sócio sujeito a alguns limites, maxime no âmbito das sociedades anónimas, cabe aos sócios requerente de inquérito judicial alegar e provar factos que evidenciem lhes foi negada concreta informação, à qual tinham direito e, à sociedade, alegar e provar - através de factos concretos e que se traduzem em factos impeditivos do direito do requerente - que a recusa não pode/deve ser qualificada como ilícita.
No âmbito do processo de inquérito judicial à sociedade, e haja ou não resposta dos requeridos, o juiz decide se há motivos para proceder ao inquérito e, na afirmativa, pode enveredar por determinar logo que a informação pretendida pelo requerente seja prestada, sendo que, porque de jurisdição voluntária, e nas providencias a tomar, deve o juiz adoptar a solução que julgue a mais conveniente e oportuna.

(Sumário elaborado pelo relator - cfr. nº 7, do artº 663º, do CPC):
Decisão Texto Parcial:Acordam os Juízes na 6ª Secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa.

                                                          
1.Relatório:


A ( Sociedade de Capital de Risco, S.A.)  , e  B, intentaram acção especial nos termos do disposto no art. 1479º,nº1, do pretérito Código de Processo Civil ( anterior ao aprovado em 2013), contra:
C ;
D ;
E, e
F ( Sociedade de Serviços Médicos, S.A. ), com sede em …..
Peticionam os AA :
Que seja realizado um inquérito judicial à sociedade Requerida F para averiguação dos pontos que indicam no artigo 33.° do requerimento inicial.
1.1. Para tanto, alegaram ambos os autores, em síntese que :
-  São accionistas da sociedade Requerida, sendo titulares de uma percentagem do capital social superior a 10%, beneficiando portanto do direito colectivo à informação ;
- Daí que, no âmbito do referido direito, dirigiram ao Conselho de Administração da sociedade Requerida, do qual são membros os três Requeridos/pessoas singulares, dois pedidos de informação por escrito sobre assunto social, concretamente sobre as obras de remodelação efectuadas na Clínica Europa, propriedade da sociedade Requerida, obras que acabaram por custar aquando concluídas quase mais 230%  do que tinham sido orçamentadas;
- Com os esclarecimentos pretendidos, visam os Requerentes apurar, nos termos do disposto no artigo 72º do CSC, da eventual responsabilidade dos membros da Administração da Sociedade no desvio orçamental verificado de 230%, até porque consideram os Requerentes que, com o desvio mencionado, foi colocada em causa a viabilidade económico - financeira da Sociedade.
- Sucede que, os referidos pedidos foram recusados pela Administração da sociedade requerida, com fundamentos inatendíveis e injustificados, maxime com o argumento - que não é verdadeiro - de que a Sociedade requerida havia já prestado todos os esclarecimentos pretendidos pelos requerentes ;
- No essencial, no entender dos requerentes, interessa averiguar e obter informação sobre os seguintes aspectos referentes às obras de remodelação:
1.Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos;
2.Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais;
3.Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen;
4.Contrato de empreitada que deverá incluir planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários, garantias de qualidade dos trabalhos;
5.Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra;
6.Contrato com as equipas projectistas;
7.Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a empresa construtora Hagen;
8.Relatórios da fiscalização;
9.Contrato de empréstimo destinado ao financiamento das obras;
10.Actas do conselho de administração referentes à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias.

1.2.Após citação dos RR, vieram todos apresentar contestação, em articulado conjunto, deduzindo no essencial impugnação motivada, maxime alegando que esclareceram já os AA das efectivas razões que levaram à alteração do valor da obra, o que fizeram no âmbito de uma Assembleia Geral, tendo então prestado uma informação completa, verdadeira e elucidativa.
Consequentemente, terminam os RR por impetrar a total improcedência da acção e, concomitantemente, requerem que sejam os AA sancionados como litigantes de má fé.

1.3.Após resposta dos AA ao incidente de litigância de má fé, procedeu-se à produção de prova ( inquirição das testemunhas arroladas ) ,  e  , concluída a mesma ( em 6/2/2017 ) , veio em 31/03/2017 a ser proferida decisão que pôs termo à acção, sendo o respectivo excerto decisório o seguinte :
“(…)
IX.DECISÃO
Face ao exposto:
1.- Julgo a presente acção improcedente e, em consequência:
a.- Não determino a realização de inquérito judicial à sociedade F., absolvendo-se os Requeridos do pedido.
b.- Condeno os Requerentes A e B no pagamento das custas do processo, ao abrigo do disposto no artigo 1052.°, n.° 1. do Código de Processo Civil.
2.- Julgo totalmente improcedente o pedido de condenação dos Requerentes como litigantes de má fé e, em consequência :
a.- Dele absolvo os Requerentes A e B
b.- Condeno os Requeridos C , D,  E, e F no pagamento das custas do incidente, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal, nos termos do disposto nos artigos 527.°, n.°s 1 e 2. do Código de Processo Civil e 7.°. n.°s 4 e 8. e Tabela II anexa, do Regulamento das Custas Processuais.
Registe e notifique.
Lisboa, 31/03/2017

1.4.Notificados da sentença identificada em 1.3., e da mesma discordando, vieram então os requerentes A e B, interpor recurso de apelação, que admitido foi e com efeito meramente devolutivo, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
A. Por sentença de fls... o douto tribunal a quo julgou a acção improcedente e, em consequência, não determinou a realização de inquérito judicial à sociedade Recorrida F, absolvendo os Recorridos do pedido;
B. Decidiu o douto tribunal a quo "(...) que os Requerentes os formulam ao abrigo do estatuído no artigo 291° do Código das Sociedades Comerciais (...) [cabendo] apreciar se são pedidas informações sobre factos ou se são pedidos documentos, tendo presente tudo o que supra se deixou dito (...). ";
C. E concluiu a Meritíssima Juiz a quo que "(...) estamos perante um pedido de documentos e não perante um pedido de informações efectuado ao abrigo do estatuído no artigo 291.° do Código das Sociedades Comerciais (...) não se enquadrando os documentos pedidos nos documentos que os Requerentes teriam direito de consultar e sendo, como é, taxativo o elenco legal, não pode deixar de concluir-se que não têm direito à sua consulta e muito menos a cópia dos mesmos, porquanto nada tendo sido alegado ou sequer apurado no sentido da aplicabilidade do disposto no n.°4 do artigo 288. ° ainda que fosse admissível a sua consulta, nunca a mesma poderia ocorrer fora da sede social. Destarte, não estando os Requeridos obrigados a fornecer tais documentos, por os Requerentes não terem direito à sua consulta e/ou cópia, podem recusar-se a fazê-lo, sem que isso configure uma recusa de informação susceptível de fundar o inquérito judicial à sociedade (...) ";
D. No entanto, com o devido respeito, mal andou o tribunal a quo na sua decisão, permitindo que aos Recorrentes fosse preterido o seu direito à informação, na qualidade de accionistas da sociedade Recorrida, nos termos do artigo 21.°, n.° 1, al. c), do CSC, sendo este um direito irrenunciável e inderrogável;
E. E, antes de mais, relembre-se que o direito à informação do titular da participação social terá sempre a natureza de direito subjectivo, de que é credor o sócio ou o accionista, consubstanciando-se na faculdade de obter informações sobre a vida da sociedade nos termos da lei e dos estatutos sociais, e de que é devedor a própria sociedade;
F. Uma vez que estamos perante uma zona de autonomia privada por excelência, sempre se dirá que "a liberdade e o discernimento exigem informação. O agir negocial pressupõe que a pessoa que age o faça informadamente. Por isto, a informação é imprescindível no exercício societário." ( Pedro Pais de Vasconcelos, A Participação Social nas Sociedades Comerciais, 2.a edição, Almedina, página 204 );
G. Pelo que, atenta a sua imprescindibilidade como condição prévia do exercício de direitos sociais, quiçá para uma eventual responsabilização dos administradores em efectividade de funções por actos praticados durante o exercício do seu mandato, ou até para um correto exercício do direito de voto pelo titular do capital social, afigura-se premente que a informação solicitada pelos accionistas, nos presentes autos ao abrigo do previsto no artigo 291.°, do CSC, lhes seja facultada, de forma verdadeira, completa e elucidativa;
H. Os Recorrentes, fazendo uso do meio legal previsto no artigo 291.°, do CSC, efectuaram dois pedidos de informação à sociedade Recorrida, o primeiro a 17 de Abril de 2009 e o segundo a 29 de maio de 2009, os quais lhes foram peremptoriamente negados pela sociedade Recorrida, vendo assim um dos seus direitos sociais, advenientes do seu status de accionistas de fruto do seu investimento, ser lesado e afectado, de forma irreversível;

I. Perante m desvio orçamental de 230% (duzentos e trinta
porcento) nas obras de remodelação da sociedade Recorrida, face ao orçamento aprovado, não pode deixar de ser lícito o pedido de informação por parte dos accionistas que pretendem compreender o seu conteúdo e apurar a responsabilização dos administradores em efectividade de funções, e solicitando em especial :
1-Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos;
2-Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais;
3-Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen;
4-Contrato de empreitada que deverá incluir, planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários;
5-Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra;
6-Contrato com as equipas projectistas;
7-Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a empresa construtora Hagen;
8-Relatórios da fiscalização;
9-Contrato de empréstimo destinado ao financiamento das obras;
10-Actas do conselho de administração que sustentam as deliberações tomadas relativamente à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias.

J. No caso em apreço, ficou claro que os Recorrentes cumprem todos os requisitos formais para se fazerem valer deste mecanismo jurídico de defesa do status socii : são titulares de 40.949 (quarenta mil novecentas e quarenta e nove acções), com o valor nominal de € 5,00 (cinco euros) cada uma, perfazendo um total de 17,8% (dezassete vírgula oito porcento) do capital social da sociedade Recorrida, e solicitaram por escrito, ao conselho de administração da sociedade Recorrida - o órgão competente e capaz para o efeito - que lhes fossem prestadas, também por escrito, informações sobre "assuntos sociais", mencionando que o pedido se destinava a apurar eventuais responsabilidades dos seus membros;
K. Sendo que, este órgão social apenas se pode desobrigar de o fazer se, pelo conteúdo do pedido ou por outras circunstâncias, seja patente não ser esse o fim visado pelo pedido de informação (artigo 291.°, n.° 2, do CSC) e ainda quando for de recear que o accionista a utiliza para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta ou de algum accionista, quando a divulgação seja susceptível de prejudicar relevantemente a sociedade ou os accionistas ou quando ocasione violação de segredo imposto por lei (artigo 291.°, n.° 4, do CSC).
L. Da factualidade assente nos autos, é claro que nenhum destes objectivos seria de atingir: os Recorrentes, e tal como plasmado no segundo pedido de informação, apenas pretendem, efectiva e exclusivamente, "apurar a responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no desvio orçamental de quase 230% (duzentos e trinta por cento) nas obras de remodelação da Clínica";
M. É evidente que não se tratam de documentos taxativamente elencados no artigo 288.°, do CSC, mas de documentação de suporte e onde se consubstanciam factos já praticados pela administração da sociedade Recorrida, concernentes com a sua remodelação e com as opções e medidas tomadas pela sua administração, que originaram um desvio orçamental de 230% (duzentos e trinta por cento), face ao inicialmente aprovado;
N. E não se diga que o primeiro pedido de informações de 17 de Abril de 2009 foi satisfeito com a realização da assembleia geral de 30 de Abril de 2009, pois nenhuma correlação existirá entre ambos, sendo de total independência um e outro acontecimento, uma vez que a sociedade Recorrida sempre estaria vinculada a fornecer os elementos informativos solicitados pelos Recorrentes, em que altura fosse, sendo o direito à informação previsto no artigo 291.°, do CSC, entendido como um direito permanente! ;
O. Também não se diga que a renovação do pedido de informações de 29 de maio de 2009 não seria atendível perante a circunstância do primeiro não ter sido satisfeito, uma vez que este direito do accionista é ilimitado quantitativamente, não podendo a sua conduta suscitar qualquer questão de abuso de direito;
P. Por outro lado, também não se pode aceitar que, tendo os pedidos sido efectuados com base no artigo 291.°, do CSC, se entenda que "assuntos sociais" digam apenas e somente respeito a factos;
Q. Neste sentido, "A adopção, por parte do legislador, de um critério única e simplesmente inspirado em actos já praticados e outros cuja prática seja de esperar conduz-nos a que, faltando uma descriminação acerca da natureza desses actos, possamos entender que os sócios poderão solicitar informações a respeito de actos jurídicos, materiais, acções, omissões e mesmo actos dos sócios ou terceiros, na medida em que apresentem uma conexão com a vida e gestão da sociedade, de modo a justificarem a pertinência da informação." ( Diogo Drago, O Poder De Informação Dos Sócios Nas Sociedades Comerciais, Almedina, página 127, sublinhado nosso);
R. Em suma, poder-se-á "definir informação como a possibilidade de acesso a quaisquer dados, de facto ou de direito, relacionados com o andamento dos negócios sociais ou a gestão da sociedade, obtidos de modo direito ou indirecto, independentemente dos meios ou instrumentos utilizados para o seu conhecimento, assim como o conteúdo ou substrato que deriva daquela possibilidade de acesso." (Ana Gabriela Ferreira Rocha, O Direito A Informação Do Sócio Gerente Nas Sociedade Por Quotas, Revista de Direito das Sociedades, Ano II, 2011,4, página 1033, sublinhado nosso);
S. "O accionista requerente limita-se a exercer um direito que a lei das sociedades comerciais lhe faculta para a defesa dos seus interesses em consonância com o valor da sua participação social, sendo que a informação solicitada se enquadra nos "assuntos sociais" mencionados no n.º 1 do art.º 291.° do CSC. " (Tribunal da Relação do Porto, no acórdão proferido em 17-12-2001, no processo 0151616, relator Caimoto Jácome, disponível em www.dgsi.pt );
T. Logo, dúvidas não existem que os "assuntos sociais " são assuntos relacionados com a vida da sociedade ou com a sua gestão, sendo que os pedidos de informações efectuados nestes se consubstanciam, e que apenas através da disponibilização da documentação de suporte solicitada pelos Recorrentes era, e é, possível aferir os factos concretamente susceptíveis de responsabilização dos administradores da sociedade Recorrida;
U. Pelo que, a sua não-disponibilização consiste numa privação de um direito reconhecido nos termos da lei ao accionista, nessa sua precisa qualidade, derrogando a sua posição de accionista minoritário;
V. Donde se alcança que, mal andou o douto tribunal a quo quando, na sua fundamentação de direito, decidiu que "estamos perante um pedido de documentos e não perante um pedido de informações efectuado ao abrigo do estatuído no artigo 291.°, do Código das Sociedades", uma vez que, sendo taxativo o elenco do artigo 288.°, do CSC, e nele não se enquadrando os documentos solicitados, "é lícita a recusa de informação e insusceptível de fundar o inquérito judicial à sociedade ";
W. Entendem os Recorrentes que outro deveria ter sido o sentido a dar à expressão legal "assuntos sociais", prevista no artigo 291.°, n.° 1, do CSC, e com influência directa na apreciação da fundamentação de direito dos presentes autos, devendo ser entendida como a informação respeitante a actos jurídicos, materiais, acções ou omissões, em correlação directa com a vida societária e com a gestão levada a cabo pelo seu órgão de administração, na medida em que apenas este órgão é capaz de a fornecer, abrangendo factos concretos, pedidos de documentação ou qualquer esclarecimento adicional não previsto taxativamente noutro preceito legal;
X. Mesmo que assim não se entendesse, " No seio deste tipo de processos - de jurisdição voluntária - o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo ser proferido um juízo e oportunidade ou conveniência face aos interesses em causa." ( Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão proferido em 06-12-2005, no processo 2271/05, relator Sousa Pinto, disponível em www.dgsi.pt"), pelo que, mesmo que o douto tribunal a quo entendesse que os Recorrentes formularam erradamente os seus pedidos de informação, na medida em que englobaram documentos na expressão "assuntos sociais", imperativo era que outra tivesse sido a sua decisão face aos interesses em causa;
Y. Entendem os Recorrentes que este é um direito social e essencial na vida societária, sem o qual toda a autonomia privada que lhe está subjacente fica comprometida, e, mais do que isso, é a alavanca que permite às minorias controlarem o poder de actuação quase ilimitado das maiorias;
Z. Pelo que, não conseguem os Recorrentes alcançar como lhes foi negado, pelo douto tribunal a quo, o pedido de inquérito judicial à sociedade Recorrida, sendo este o instrumento jurídico legalmente previsto para o efeito, nos termos do artigo 292.°, do CSC, e do artigo 1048.° e seguintes, do CPC;
AA. Assim sendo, ao decidir em contrário ao supra exposto, a sentença ora recorrida violou o artigo 37.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa, o artigo 21.°, n.° 1, al. c), o artigo 291.°, e o artigo 292.°, todos do CSC;
BB. E, nesta conformidade, deverá ser revogada a decisão proferida pelo tribunal a quo e substituída por outra que determine a realização de inquérito judicial à sociedade Recorrida F, com a consequente condenação dos Recorridos no pedido ;
Termos em que, Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, revogando a sentença proferida pelo Tribunal a quo e substituindo-a por outra que determine a realização de inquérito judicial à sociedade Recorrida " F, com a consequente condenação dos Recorridos no pedido, farão a tão necessária e costumada JUSTIÇA!

1.5. Os apelados [C, D, E, e F] ,tendo apresentado contra-alegações, vieram defender que ao recurso interposto pelos AA deve ser negado provimento, devendo em consequência a sentença recorrida ser confirmada integralmente, para tanto concluindo nos seguintes termos :
1.-Entendem os recorridos que a instância recorrida fez uma correta aplicação do direito aos factos que vieram a resultar provados, motivo, pelo qual, não padece a decisão impugnada de qualquer vício formal ou substancial.
2.-Com efeito, ao contrário do alegado pelos recorrentes, o pedido formulado nas cartas datadas de 17/04/2009 e 29/05/2009, e nas quais estribam o seu direito à informação escrita, tem por objecto um pedido de documentos, e não, ao invés, um pedido de informação.
3.-Isto é, recorrendo ao instituto do artigo 291.° do CSC, o qual tem por objecto o direito a obter informação escrita, peticionaram os recorrentes um verdadeiro pedido de documentos de forma "encapotada".
4.-Com efeito, quando naquelas missivas se diz, " requer ... nos termos do art. o 2910 do CSC, lhes sejam prestadas informações ... , por escrito, sobre as obras realizadas em 2008 e os respectivos custos, nomeadamente ... ", passando de seguida a aludir a uma série de documentos,
5.-não formulando, porém, qualquer questão sobre esses documentos, salvo melhor opinião, tal é a "prova provada" que os recorrentes não pretendiam qualquer informação por escrita, mas sim documentos, sendo que tal pedido não constitui o objecto do artigo 291.° do CSC.
6.-Acresce que, e não obstante o pedido formulado pelos recorrentes não ter respaldo legal no artigo 291.° do CSC, também não o terá por via da sujeição à disciplina do artigo 288. ° CSC.
7.-Por um lado, e compulsado os documentos discriminados no artigo 33.° do requerimento inicial dos recorrentes, daí se vislumbra que nenhum deles encontra a sua previsão nas alíneas do n.º 1 do artigo 288.° do CSC,
8.-as quais, refira-se, têm caracter taxativo.
9.-Por outro lado, sem conceder, por mera hipótese, a ser admissível a consulta dos documentos peticionados pelos recorrentes, tal nunca poderia ocorrer fora da sede social, como pretendem.
10.-Nem, por maioria de razão, ser-lhes remetida cópias desses documentos.
11.-No entanto, e não obstante a limitação legal imposta à consulta de documentos sociais, refira-se que os documentos solicitados pelos recorrentes sempre estiveram disponíveis para consulta na sede social da recorrida F,
12.-não tendo os recorrentes aí se deslocado para tal desiderato, pese embora tenham disso sido informados.
13.-Acresce, ainda que, sem conceder, a considerar-se que os recorrentes apenas peticionaram informações, e não a entrega de documentos, sempre se dirá que o direito que assiste por via do artigo 291.0 do CSC não foi cabalmente exercido.
14.-Com efeito, compulsado os doc. 3 e 4 do requerimento inicial, e onde os recorrentes respaldam o seu direito à informação, salvo melhor opinião, daí não se vislumbra que pontos, perante a panóplia de documentos a que aludem, desejam ver em concreto esclarecidas.
15.-Note-se que, o pedido de informação formulado ao abrigo do artigo 291.0 do CSC deve recair sobre factos objectivos, e não sobre um qualquer objecto indeterminado.
16.-De todo o modo, sabem os recorridos, conforme se alcança do doc. 6 junto ao requerimento inicial, ponto 11 dos factos assentes, que por carta datada de 17/06/2009, portanto por escrito, prestaram informação aos recorrentes sobre o único facto que é perceptível no pedido formulado: obras realizadas em 2008 e o seu custo.
Nestes termos, e nos mais de direito, deverá a presente Apelação ser julgada improcedente, por não provada, e , em consequência, ser confirmada a decisão proferida pelo tribunal recorrido, com todos os efeitos legais.
                                                          
1.6. Thema decidendum
Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, a questão a apreciar e a decidir  é apenas a seguinte  :
A)-Aferir se, em face da factualidade assente, não existiam razões juridicamente atendíveis para que a acção tivesse sido julgada - como o foi - improcedente no tocante ao pedido de realização de um inquérito judicial à sociedade Requerida , antes se impunha a total procedência da mesma , e isto porque verificados todos os pressupostos legais para o seu deferimento.
                                                          
2. Motivação de Facto.
Após a instrução da causa, fixou o tribunal a quo a seguinte factualidade :
A)- PROVADA.
2.1.– F pessoa colectiva n.° 000000000, tem sede em Rua de …….    .
2.2. Tem por objecto social a prestação de serviços médicos, paramédicos, ambulatórios e de internamento.
2.3. Tem o capital social de € 1.150.000,00, repartido por 230000 acções ao portador, com o valor nominal de € 5,00.
2.4. A é titular de 25.999 acções da sociedade Requerida.
2.5. B é titular de 14.950 acções da sociedade Requerida.
2.6. Da acta n.° 36 da Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 10 de Abril de 2008, junta a fls. 126, 127 e 133 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, consta, além do mais, que:
"(…) Seguiu-se depois a intervenção do Dr. …., Presidente do Conselho da Administração, o qual abordou o tema do investimento a realizar na Clínica, para enfrentar os desafios da concorrência crescente na zona geográfica de influência da Clínica, inevitável, disse ele, e condição de sobrevivência da Empresa. Neste contexto afirmou que no âmbito das orientações já anunciadas na assembleia anual de 2007, a Administração deu sequência ao processo de remodelação da Clínica, encontrando-se já em fase final de aprovação camarária o projecto de obras a realizar, na sua exposição, o Dr. ….. deu detalhadas informações sobre o projecto, destacando os seguintes aspectos:
Natureza e extensão das obras: alteração da recepção, criação de novos gabinetes; melhoria da pediatria; demolição do laboratório e transferência para o interior, consequente alargamento do espaço de parqueamento automóvel; mudança para outro espaço do equipamento da TAC; instalação de um novo elevador central, construção de novos quartos, passando de 8 para 13; consequente ampliação do número de camas, de 10 para 20; criação de nova zona técnica de armazenamento; instalação do novo equipamento de ar condicionado; arranjo do telhado, que apresenta infiltrações. (...)
Componente financeira: o custo do investimento encontra-se em negociação, estimando-se um dispêndio da ordem dos 2.000.000 euros; o investimento será feito através do recurso a crédito bancário.
Outros aspectos. A obra foi adjudicada, por negociação directa, à empresa HAGEN, por ser uma empresa reputada a nível nacional e assegurar a execução da obra em ritmo intensivo, de modo a permitir a reabertura da Clínica em 8 de Setembro de 2008; será elaborado um contrato com a empresa HAGEN de modo a acautelar inteiramente os interesses da Clínica, será contratada uma entidade independente para fiscalizar o execução da obra.
(...)".
2.7. - Por carta datada de 17 de Abril de 2009, junta a fls. 116 e 117 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, os Requerentes solicitaram ao Presidente do Conselho de Administração da sociedade Requerida a prestação por escrito de informações, nos seguintes termos:
"(…) Considerando que o investimento na remodelação da Clínica, que se previa na ordem dos €2.000.000,00 (dois milhões de euros), conforme informação prestada em reunião da Assembleia Geral realizada em 10 de Abril de 2008, veio a atingir o valor de €4.600.000,00 (quatro milhões e seiscentos mil euros) e com o exclusivo objectivo  de apurar a eventual responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no aumento extraordinário destes custos, a A e B, titulares, no seu conjunto, de 40.949 acções representativas de 17,8% do capital social da F., vêm, nos termos do art° 291° do Código das Sociedades Comerciais, requerer que lhe seja prestada informação precisa e completa por escrito, sobre as obras realizadas em 2008 e os respectivos custos, nomeadamente:
1.- Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos,
2.- Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais,
3.- Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen,
4.- Contrato de empreitada que deverá incluir, planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários, garantias de qualidade dos trabalhos,
5.- Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra,
6.- Contrato com as equipas projectistas,
7.- Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a empresa construtora Hagen,
8.- Relatórios da fiscalização,
9.- Contrato de empréstimo destinado ao financiamento da obras,
10.- Actas do conselho de administração que sustentam as deliberações tomadas relativamente à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias.
Mais sublinhamos que os elementos solicitados se destinam exclusivamente ao cumprimento das mencionadas determinações legais.
(...)".
2.8. Da acta n.° 37 da Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 30 de Abril de 2009, junta a fls. 179 a 191 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, consta, além do mais, que:
"(...) Tomou a palavra o Presidente do Conselho de Administração, Dr. ….., que começou por salientar a sua satisfação e o seu orgulho pela forma como decorreu todo o processo de conceptualização e realização das obras de ampliação e melhoramento da Clínica, as quais dignificam e enobrecem a Instituição a que se orgulha de pertencer e de servir. Afirmou que com as obras realizadas e acabadas de visitar pelos senhores accionistas, a Clínica está em condições de competir com as restantes unidades privadas de saúde e de prestar serviços de saúde de elevada qualidade, o que só poderá augurar um futuro muito promissor para a prossecução dos objectivos sociais e, obviamente, a melhor garantia de rentabilidade dos investimentos dos accionistas.
A obra permitiu, desde logo, a integração dos dois edifícios com uma melhor eficácia e uma melhor funcionalidade. Um novo elevador central, ligando internamente os dois edifícios entre si, veio colmatar uma deficiência estrutural há muito diagnosticada. No exterior, essa integração materializou-se com o recurso ao vidro espelhado criando uma harmonia arquitectónica de muito belo efeito.
Criou-se uma nova recepção central com uma sala de espera ampla e panorâmica, bem como novos gabinetes de consulta e uma área de pediatria, adequadamente decorada.
Criou-se uma nova área de imagiologia com uma recepção própria, permitindo uma melhor funcionalidade na circulação de doentes. Criou-se, também uma nova sala para a TAC.
O Laboratório foi provido de novas instalações, com uma sala de espera própria e duas salas de colheitas.
O Bloco Operatório ficou com a 3a sala de operações redimensionada, com o ar condicionado independente para as 3 salas e para a sala de recobro.
O Internamento passou de 8 para 13 quartos e de 10 para 20 camas, sendo um quarto destinado e decorado para a Pediatria
Toda a área Administrativa ficou no 2º andar da vivenda. No fosso do telhado criou-se uma área ampla: onde se encontra a actual sala de reuniões e onde se realiza a presente Assembleia Geral. O espaço em causa permitirá no futuro um adequado e rentável aproveitamento. No topo do edifício ficará instalada uma cafetaria.
A Área técnica foi totalmente remodelada. Todos os equipamentos enterrados: AVAC (chillon)/Gerador/PT/UTAS/Gases medicinais.
Instalaram-se painéis solares no topo do edifício novo numa óptica de rentabilização energética.
Criou-se uma área nova na cave com cerca de 600 m2, bem como uma área nova de armazém da Farmácia com cerca de 100 m2.
Aumentou-se o estacionamento para 100 lugares. Procedeu-se ao rearranjo exterior com árvores, floreiras, canteiros e apôs-se a marca Clínica Europa na entrada e na parte virada para a marginal.
A obra, segundo salientou o Dr. …., cumpre cabalmente os objectivos traçados pelo Conselho de Administração, tendo, neste momento, a Clínica …. todas as características necessárias para desenvolver a sua actividade no local onde está inserida e no mercado que serve, bem como para competir com a concorrência existente.
Continuou, dizendo que, a realização da obra era de carácter urgente e quiçá inadiável. Primeiro, pela necessidade de agir face à concorrência na zona e no sector, tal como já havia sido discutido na Assembleia do ano transacto. Depois, porque só poderia realizar-se no verão - altura em que a procura é menor - e as condições atmosféricas são previsivelmente mais favoráveis. Acrescentou o Presidente do Conselho de Administração que, para o efeito, a Clínica deveria estar encerrada pelo menos 4 meses. Assim, aproximando-se o Verão, o período para adjudicação da obra, final de Abril, era manifestamente muito curto. Pretendia-se iniciar as obras no dia 1 Junho de 2008, pelo que havia necessidade de desalojar e transferir para um outro local os serviços administrativos e os serviços susceptíveis de serem realizados em condições precárias, sem por nunca em risco a prática clínica e o acto médico correlativo.
Acrescia a todo o já exposto o facto de o Projecto de Arquitectura estar incompleto e revelar algumas falhas, particularmente nos projectos de especialidades, como mais tarde se veio a constatar.
A adjudicação à Empresa Hagen foi directa, por uma questão de urgência, mas também por se tratar de uma empresa idónea e competente, como foi dito pelos presentes na Assembleia Geral do ano passado, pela relação de confiança entre os dois presidentes dos respectivos Conselhos de Administração, pela proposta de orçamento e condições de pagamento excepcionais.
A proposta de orçamento, datada de 16 de Maio de 2008, foi de €2.830.000, sem IVA, como acontece nas empreitadas de construção civil, considerando o normal regime de IVA aplicado à generalidade dos casos, o que não acontece com a Clínica em que o IVA não é dedutível, pelo menos na sua totalidade, ultrapassou a expectável previsão situada entre os €2.000.000,00 e os €2.500.000,0, e que se estimara na anterior Assembleia Geral, com base numa previsão ainda superficial. Convém salientar que a experiência de alguns accionistas, como é o caso do sr. Eng.° …., veio a revelar-se correcta, uma vez que afirmaram antes que os valores estimados eram baixos e que a previsão inicial deveria ser revista. De qualquer modo a obra iniciou-se no dia 18 de Junho de 2009 atendendo ao atraso na emissão da licença de construção pela C. M. de Cascais.
A obra decorreu com um entendimento excepcional entre todos os intervenientes. Este facto aliado à não obrigação legal de contratação de uma empresa de fiscalização e à preocupação de reduzir ao mínimo os custos incorridos, determinou que o Conselho de Administração decidisse proceder à fiscalização directa da obra. Neste âmbito, decorreram 50 reuniões de obra onde estiveram sempre presentes elementos da Hagen, dois elementos do Conselho de administração da Clínica …., um seu chefe de serviços com experiência na actividade de construção civil e com o apoio da fiscalização feito pelo arquitecto e seu gabinete de arquitectura.
Apesar dos vários contratempos que a seguir expandiu, a actividade cirúrgica da Clínica foi retomada no dia 1 de Outubro de 2008 (3 meses e 12 dias depois do início) terminando em 9 de Dezembro de 2008.
No que concerne aos custos da obra começou por afirmar que o contrato inicial da obra foi de €2,830.000€+ IVA= €3.400.000,00. Todavia, no decorrer da obra verificaram-se alguns factos, a maioria não programáveis e insusceptíveis de serem previstos e que justificaram plenamente, segundo o Conselho de Administração, um incremento, conforme se explica:
Demolição e Reconstrução da Vivenda (edifício mais antigo) que revelou não ter estrutura suficiente para suportar as obras programadas - teve um incremento de €256.000 - +9,3% .
Alteração do local de implantação dos chillers/AVAC (ar condicionado) - €243.000 -+8,8%
Trabalhos impossíveis de determinar na proposta inicial (ramal EDP, climatização quartos antigos, etc.) €156.000 - + 5,7%
Reparação total do Telhado - €146.000 - +5,3%
Variação entre o projecto de arquitectura inicial e a execução (aumento de área do corpo central)- €95.000€- +3,4%
Opções do C.A.: (reclames e substituição nas grades das varandas) - €22.000 (0,8%) (obrigação legislativa Laboratório gases medicinais) - €13.000,00 (0,4%)
O total dos valores incrementados foi de €930.000€+Iva = €1.114.000, pelo que o custo final da obra foi de €4.412.000,00 (€3.684.000+lva), valor que consta no imobilizado da empresa. A este acrescem, ainda, €180.000,00 (projecto de arquitectura +licença de construção rede de gases medicinais e €38.000,00 (móveis, estores, decoração) o que perfaz o custo total de €4.630.000,00.
O Presidente do Conselho de Administração interrompeu a sua exposição para apresentar por escrito o seguinte Requerimento:
"O Conselho de Administração da F. requer que sejam ratificados por esta Assembleia os actos e opções tomados por si, em relação a todos os aspectos da obra realizada durante o ano de 2008 e que acabaram de ser expostos e que já constam do relatório de gestão que neste ponto da ordem de trabalhos se discute. Carcavelos, 30 de Abril de 2009".
O Presidente da Mesa recebeu o Requerimento e submeteu à votação, tendo merecido a aprovação de uma maioria de 72,69% do capital social da F …... Votaram contra 19,98% do capital social. Não houve abstenções.
Seguidamente pediu a palavra o Dr. …., Administrador-Delegado (...)
No que concerne ao financiamento das obras informou que o Montepio Geral aprovou um empréstimo de €3.000.000,00 à taxa Euribor a 3 meses com um spread de 0,9%> em Setembro de 2008 com uma cláusula de reembolso antecipado sem qualquer penalização. Mais informou que está aprovado, mas ainda não assinado, um aumento desta linha de crédito para os €4.500.000,00, com a mesma taxa mas com um spread de 2%.
No que tange a pagamentos à Hagen informou que já foram pagos €2.790.000,00 (com IVA), através da utilização parcial do primeiro financiamento no valor de €2.750.000,00.
Terminada a exposição, pediu a palavra o accionista Eng.° …. Começou por dar os parabéns pela visita à Clínica e declarou ser um dos subscritores da carta mencionada e também assinada pela accionista A e referenciada logo no início dos trabalhos. Manifestou dúvidas sobre a adjudicação à Hagen e ao valor de empreitada de €2.000.000,00, ambos os factos constantes da acta da última Assembleia Geral. Pediu esclarecimentos ao Conselho de Administração sobre as decisões tomadas no decurso da obra:
a)- porque foi escolhida uma equipa de arquitectura sendo que se trata de uma obra técnica, como por exemplo a colocação dos chellers ?
b)- Mencionou-se um valor de fiscalização da obra de 5% sendo que normalmente esse custo não é superiora 3%. Porquê?
c)- As deslocalizações referidas foram suportadas por orçamentos prévios e suportadas nas dotações orçamentais de acordo com o "business plann"?
Por fim quis salientar que nada tem quanto à empresa Hagen, mas questionou da razão de não ter sido tomada a decisão de fazer acompanhar a obra por algum accionista.
Seguidamente pediu a palavra o Dr. …., representante da accionista Drive que começou por salientar o desvio enorme entre os €2.000.000,00 referidos na acta da última Assembleia Geral e o custo final de €4.600.000,00 e de questionar a Assembleia se este desvio não deveria ter sido previamente apresentado aos accionistas e colocada à sua decisão, pois, segundo afirmou, poderá estar em causa a viabilidade do negócio e a rentabilidade dos investimentos. O Dr. …., em nome do Conselho de Administração, pediu a palavra para dar os esclarecimentos. Começou por dizer que o contrato de empreitada com a Hagen foi assinado posteriormente à adjudicação pelas razões já referidas pelo Dr. …. com particular incidência nas deficiências decorrentes do projecto de arquitectura que só no terreno foram possíveis de serem detectadas. Quis deixar claro que a estimativa referida na Assembleia Geral do ano passado, como todos os accionistas bem se recordariam apresentava uma variação entre os €2.000.000,00 e os €2.500.000,00 sem IVA, tal como acontece normalmente nas empreitadas, dado o regime de IVA aplicável. Acontece que a Clínica não pode deduzir o IVA pelo que ao valor do contrato acresce o IVA. Assim, o valor de contrato foi de €2.830.000,00, mais €330.000,00 do que o valor inicialmente estimado e já referido. A esse valor acresce o respectivo IVA, pelo que o valor contratualizado foi de efectivamente de €3.400.000,00. Entre este valore o valor final de custo das obras há de facto um incremento de cerca de €1.200.000,00, devidamente justificado e já explicado com a máxima minúcia.
Quanto ao valor de fiscalização referiu que este se situa entre os 3 e os 5% e que tem muitas dúvidas que se a fiscalização tivesse sido realizada por uma outra entidade e com outro construtor não seria muito mais onerosa. Acrescentou que o projecto foi acima de tudo um projecto de arquitectura, ao contrário do afirmado pelo accionista, Eng.° …. Houve vários colaboradores e técnicos ligados à saúde que a Hagen escolheu com o conhecimento da Administração. O caso referido da deslocação dos "chellers" foi totalmente inesperado por se desconhecer o estado da estrutura, dado tratar-se de uma construção antiga. Situação que obrigou inclusive à realização de trabalhos a mais e ao inevitável incremento dos custos da obra. Além do mais o barulho produzido pelas referidas máquinas poderia afectar o conforto dos doentes.
Quis acrescentar ainda em resposta ao accionista, Eng.° … que muitos accionistas acompanharam o decurso das obras e deram os seus pareceres, os quais não deixaram de ser ponderados devidamente. Lamentou que o Eng. …. nunca o tenha feito e tenha, ao invés, numa atitude hostil, procurado obter informações noutros locais, nomeadamente da Hagen e não junto do Conselho de Administração.
Em resposta à A afirmou que o Conselho de Administração sabe fazer contas e o histórico dos últimos anos é isso mesmo que revela. Este Conselho de Administração soube gerir e apresentar muito mais cedo do que seria expectável resultados positivos e dividendos para os senhores accionistas.
Afirmou, ainda, que seria mais fácil nada fazer. Porém gerir é antecipar e prever. Deixar a F como estava, isso sim era hipotecar o futuro. Salientou que toda a obra foi financiada no mercado sem problema, sem o recurso ao dinheiro dos accionistas, e isso não será certamente pela incompetência do Conselho de Administração. Terminou com uma nota: alguém acredita que se não tivéssemos credibilizado esta instituição, se nós próprios enquanto administradores não merecêssemos o respeito e a confiança do mercado e dos bancos, alguém nos financiaria em €4.500.000,00?
O Eng.° … quis retorquir dizendo que não foi pedir esclarecimentos a terceiros senão à empreiteira Hagen e apenas para aferir o grau de satisfação e o estado dos pagamentos. Terminou dizendo que pensava que o IVA era dedutível, razão pela qual nas empreitadas o valor do IVA normalmente não é mencionado.
O Dr. … afirmou uma vez mais que o IVA é um custo na actividade da Clínica e que os accionistas em causa não tinham tido isso em linha de conta quando falaram no desvio entre os valores estimados e os custos finais.
Seguidamente pediu a palavra o Dr. … para dizer que a acta da última Assembleia Geral estava incorrecta e não registava com rigor o teor da sua intervenção à data, como disso são testemunhas todos os accionistas que nela participaram do princípio ao fim. Extrair da sua redacção, sem levar em conta também a questão do IVA, pondo tudo no mesmo saco é manifesta má-fé e revela uma atitude de quem assim procede, não só hostil, desproporcionada, como merecedora da maior censura. Aditou dizendo que " Quem não se sente não é filho de boa gente" e considera hostil e talvez mesmo injuriosa a posição da Drive e do Eng.° … .
Continuou, segundo disse, fazendo um pouco de história.
“(...)"

2.9. A sociedade Requerida respondeu à carta dos Requerentes referida em 7. por missiva datada de 04 de Maio de 2009, junta a fls. 121 e 122 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, da qual consta que:
"(…) Acusamos a recepção da v/ carta datada de 17 de Abril de 2009 e recepcionada nesta Clínica em 20 de Abril de 2009, a qual mereceu a nossa melhor atenção.
Gostaríamos de informar que a F., nos termos do Art.° 291°, n.°2 in fine do C.S.C., não prestará a informação por escrito, como solicitado, por entender que do comportamento de V.Exas facilmente se conclui que o fim visado não é o declarado, como bem ficou demonstrado na Assembleia Geral de dia 30 de Abril de 2009.
A Administração da F prestou todos os esclarecimentos relativos aos factos que servem de suporte ao peticionado na referida Assembleia Geral, em que V.Exas estiveram presentes e bastas vezes intervieram, inquirindo o Conselho de Administração e pedindo todos os esclarecimentos que entenderam, os quais prontamente foram prestados de forma clara, detalhada e precisa, como é apanágio dos membros deste órgão e é regra de relacionamento com todos os senhores accionistas.
Só assim se justifica que uma maioria de 72,69% do capital social tenha ratificado os actos praticados por esta administração na concepção e realização da obra, aprovado o Relatório de Gestão e Contas do exercício de 2008 e conferido um voto de confiança a este Conselho de Administração.
Este Conselho de Administração está seriamente convicto que os senhores accionistas subscritores deste pedido de informação escrita pretendem, refugiando-se na letra da lei, legitimarem comportamentos hostis, contrários aos interesses sociais e com claro prejuízo para esta sociedade, como é do conhecimento geral da maioria dos accionistas.
Todavia, como é do vosso conhecimento, o Conselho de Administração da Clínica sempre esteve, e está, disponível para prestar toda a informação e todos os esclarecimentos que os senhores accionistas requeiram, mesmo fora das Assembleias e a disponibilizar a consulta à documentação que solicitem. O mesmo acontece relativamente a V.Exas, desde que tal se mostre razoável e justificado e não ponha em causa os superiores interesses sociais.
(…)"
2.10.  Por carta datada de 29 de Maio de 2009, junta a fls. 118 a 120 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, dirigida ao Presidente do Conselho de Administração da sociedade Requerida, os Requerentes renovaram o pedido de informação, nos seguintes termos:
 "(...) Atenta a resposta enviada no passado dia 4 de Maio de 2009 pela Administração da F ao nosso primeiro pedido de informação, recusando a prestação das informações solicitadas, vimos pela presente tecer as seguintes considerações e, a final, renovar o nosso pedido.
Antes porém de entrarmos no cerne da nossa missiva, não queremos, desde já, deixar de lamentar que V. Exas., ao procederem à mencionada recusa, o tenham efectuado em contraponto com o divulgado na Assembleia Geral de 30 de Abril de 2009, em que informaram todos os accionistas presentes, incluindo os subscritores, que iriam dar resposta e entregar todos os elementos solicitados por estes últimos.
Retomando o tema que em aberto deixámos no primeiro parágrafo, seguem as nossas considerações quanto à resposta recebida de V. Exas.,
I A recusa comunicada pela carta de 4 de Maio de 2009 foi manifestamente ilícita porquanto jamais a Administração da Clínica Europa apresenta quaisquer factos justificativos para a conclusão que toma de que o pedido de informação efectuado não tem por fim apurar as responsabilidades dos membros do Conselho de Administração;
II Factos justificativos que, aliás, nem poderia apresentar, atento o facto de que, efectivamente e exclusivamente, o fim dos ora subscritores é apurar a responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no desvio orçamental de quase 230% (duzentos e trinta por cento) nas obras de remodelação da Clínica;
III Efectivamente, e conforme é do conhecimento de V. Exas., em Assembleia Geral realizada em 10 de Abril de 2008 o Conselho de Administração da F declarou que o investimento nas obras de remodelação seria de € 2.000.000,00 (dois milhões de euros);
IV Nas contas referentes ao exercício de 2008 vieram os ora subscritores a verificar que os custos totais das obras de remodelação foram de € 4.600.000,00 (quatro milhões e seiscentos mil euros). Um desvio orçamental, repita-se, de 230% (duzentos e trinta por cento) ;
V Atento o exposto, é normal e sensato, que os ora accionistas queiram obter informações sobre as obras de remodelação efectuadas para então apurar da responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no desvio orçamental verificado;
VI Na realidade, e ao contrário do que V. Exas. Referem na carta de 4 de Maio, os ora subscritores não defendem interesses contrários aos interesses sociais da F, antes pelo contrário, é no interesse da F que efectuam este pedido de informação, por considerarem que com o desvio orçamental verificado foi colocada em causa a viabilidade económico financeira da Sociedade e a sua continuidade;
VII Os interesses dos ora subscritores não são outros senão os interesses da Sociedade de quem são accionistas. Pretendem, assim, ver esclarecidas as circunstâncias que rodearam a execução das obras de remodelação e os gastos suportados pela Sociedade, para então apurar se as decisões tomadas pelo Conselho de Administração o foram de acordo com os deveres impostos pelo Artigo 64° do Código das Sociedades Comerciais;
VIII Atento o exposto, vem a A, titular de 25.999 acções representativas de 11,3% do capital social da F, conjuntamente com o também accionista B, titular de 14.950 acções representativas de 6,5%, requerer, novamente, que, nos termos do art. 291° do CSC, lhes sejam prestadas informações precisas e completas, por escrito, sobre as obras realizadas em 2008 e os respectivos custos, nomeadamente:
1.-Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos,
2.- Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais,
3.- Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen,
4.- Contrato de empreitada que deverá incluir, planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários, garantias de qualidade dos trabalhos,
5.- Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra,
6.- Contrato com as equipas projectistas,
7.- Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a w empresa construtora Hagen,
8.- Relatórios da fiscalização,
9.- Contrato de empréstimo destinado ao financiamento da obras,
10.- Actas do conselho de administração referentes à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias. Informações e elementos estes que jamais foram prestados e disponibilizados, respectivamente, na Assembleia Geral realizada em 30 de Abril de 2009. (...).
2.11. À carta referida em 10. respondeu a sociedade Requerida por missiva datada de 17 de Junho de 2009, junta a fls. 123 a 125 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, da qual consta que:
"(...) Acusamos a recepção da v/ carta datada de 29 de Maio de 2009 e w recepcionada nesta Clínica em 4 de Junho de 2009, a qual mereceu a nossa melhor atenção.
Gostaríamos de informar, tal como já foi expresso na nossa carta de 4 de Maio de 2009, que a F, nos termos do Art.° 291°, n.°2 , in fine do C.S.C., não prestará a informação por escrito, como solicitado, por entender que do comportamento de V.Exas facilmente se conclui que o fim visado não é o declarado, como bem ficou demonstrado na Assembleia Geral de dia 30 de Abril de 2009.
Como já foi dito anteriormente e agora se reafirma, a Administração da F. prestou todos os esclarecimentos relativos aos factos que servem de suporte ao peticionado na referida Assembleia Geral, em que V.Exas estiveram presentes e bastas vezes intervieram, inquirindo o Conselho de Administração e pedindo todos os esclarecimentos que entenderam, os quais prontamente foram prestados de forma clara, detalhada e precisa, como é apanágio dos membros deste órgão e é regra de relacionamento com todos os senhores accionistas.
Só assim se justifica que uma maioria de 72,69% do capital social tenha ratificado os actos praticados por esta administração na concepção e realização da obra, aprovado o Relatório de Gestão e Contas do exercício de 2008 e conferido um voto de confiança a este Conselho de Administração.
Este Conselho de Administração está seriamente convicto que os senhores accionistas subscritores deste pedido de informação escrita pretendem, refugiando-se na letra da lei, legitimarem comportamentos hostis, contrários aos interesses sociais e com claro prejuízo para esta sociedade, como é do conhecimento geral da maioria dos accionistas.
Não é verdade que tenha havido um desvio de 230% na realização das obras. Tal afirmação, depois de todas as explicações apresentadas na Assembleia Geral revela má-fé e uma clara intenção de prejudicar seriamente a sociedade.
Com efeito, a base de que partem: €2.000.000,00, não inclui IVA, ao contrário do valor final apresentado - €4.600.000,00, já com IVA, e era apenas o valor mínimo estimado. Como foi lembrado na última Assembleia Geral, o valor estimado à data, ainda antes da adjudicação da obra, situava-se entre os referidos €2.000.000,00 e os €2.500.000,00 - valores sem IVA.
O facto de apenas constar, da acta em causa, o valor mínimo e sem IVA não é da responsabilidade da Administração e tratou-se como foi explicado de uma incorrecção. Todos os accionistas assim o entenderam, com a excepção de V. Exas., cuja hostilidade transparece em cada acto.
Mais, foi clara e detalhadamente explicado o custo entre o valor adjudicado e o valor final e as vantagens e benefícios decorrentes para a Clínica, no que concerne à funcionalidade, eficácia e criação de novos espaços.
As obras em causa eram e são condição de competitividade da sociedade num sector tão fortemente sujeito à concorrência. Ignorar isso, só mesmo por motivações estranhas à sociedade e contrárias ao seu bom e sustentado desenvolvimento.
Apesar de tudo, como já foi dito e é do vosso conhecimento, o Conselho de Administração da Clínica sempre esteve, e está, disponível para prestar toda a informação e todos os esclarecimentos que os senhores accionistas requeiram, mesmo fora das Assembleias Gerais, e a disponibilizar a consulta à documentação que solicitem. O mesmo acontece relativamente a V.Exas, desde que tal se mostre razoável e justificado e não ponha em causa os superiores interesses sociais. (...)".

B. NÃO PROVADA.
Com relevo para a decisão da causa, não se provou que:
2.12.– Os Requerentes sabem que obtiveram a satisfação do que solicitaram nas cartas referidas em 2.7., na Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 30 de Abril de 2009.
2.13. A sociedade Requerente instaurou contra a sociedade Requerida e seus Administradores três processos judiciais.
                                                          
3. Motivação de direito.
3.1. Se, em face da factualidade assente, forçoso era que o tribunal a quo tivesse julgado a acção como procedente , determinando em consequência a realização de inquérito judicial à sociedade Requerida .
Em face da factualidade assente, considerou o tribunal a quo que demonstrava/revelava a mesma que não dispunham in casu os requerentes de fundamento legal para exigirem dos requeridos a realização de um inquérito judicial à sociedade Requerida e com o desiderato de se averiguarem e serem esclarecidos todos os pontos que indicam no artigo 33.° do requerimento inicial.
Para tanto, recorda-se, baseou-se a primeira instância, e no essencial, em dois pressupostos :
O primeiro :  o de que os Requerentes, em rigor, não pretendem obter informações sobre  factos, antes visam obter e/ou ter acesso a documentos,  logo, e em rigor, não se verifica a previsão do artigo 291.°, do Código das Sociedades Comerciais ;
O segundo : o de que, visando os requerentes terem acesso a documentos, a verdade é que os concretamente pretendidos não integram a previsão dos artºs 288º e 291º, ambos do CSC,  e  , consequentemente, obrigados não estão os Requeridos a fornecê-los, não podendo portanto a referida recusa - de informação - sustentar o inquérito judicial à sociedade pelos AA requerido .
Dissentindo do entendimento sufragado na sentença apelada pela Exmª Juiz a quo, já para os apelantes é manifesto que visam no essencial obter da sociedade requerida diversas informações sobre "assuntos sociais", e tendo em vista  apurar da responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no desvio orçamental de quase 230%  nas obras de remodelação da Clínica, e , consequentemente, o direito que através da presente acção pretendem exercer, não apenas encontra total e adequado enquadramento no artigo 291.°, n.ºs 1 e 2, do CSC) , como, ademais, não se verificando a previsão do nº 2, parte final e nº 4, ambos do referido artº  291º, mal andou a primeira instância em negar aos Recorrentes o exercício de um direito social e que é , consabidamente , essencial na vida societária.
Quid Juris ?
Ora, emerge da factualidade assente que a requerida sociedade anónima, F., tem o capital social de € 1.150.000,00, repartido por 230.000 acções ao portador, com o valor nominal de € 5,00, sendo a requerente A  titular de 25.999 acções da sociedade  e , o requerente,  B , titular de 14.950 acções .
Por sua vez, rezam os artºs  21º, nº1, alínea c), 288º,nº1, alínea a) e 291º ,nº1, todos do Código das Sociedades Comerciais , e estando os dois últimos integrados no respectivo titulo IV, o qual tem por objecto especificamente as Sociedades anónimas - que são as cujo capital é dividido em acções e cada sócio limita a sua responsabilidade ao valor das acções que subscreveu, cfr. artº 271º - que, respectivamente  :
- Todo o sócio tem direito, “ A obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato” ;
Qualquer accionista que possua acções correspondentes a, pelo menos, 1% do capital social pode consultar, desde que alegue motivo justificado, na sede da sociedade: a) Os relatórios de gestão e os documentos de prestação de contas previstos na lei, relativos aos três últimos exercícios, incluindo os pareceres do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão ou da comissão para as matérias financeiras, bem como os relatórios do revisor oficial de contas sujeitos a publicidade, nos termos da lei ;
- Os accionistas cujas acções atinjam 10% do capital social podem solicitar, por escrito, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo que lhes sejam prestadas, também por escrito, informações sobre assuntos sociais.
No tocante ao direito à informação previsto no nº1, art.º 291º,do CSC , sob a epígrafe “Direito colectivo à informação”,  e indicado supra em último, e tal como nos elucidam os respectivos nºs 2, 3 e 4 , seguintes , certo é que :
“2 - O conselho de administração ou o conselho de administração executivo não pode recusar as informações se no pedido for mencionado que se destinam a apurar responsabilidade de membros daquele órgão, do conselho fiscal ou do conselho geral e de supervisão, a não ser que, pelo seu conteúdo ou outras circunstâncias, seja patente não ser esse o fim visado pelo pedido de informação.
3 - Podem ser pedidas informações sobre factos já praticados ou, quando deles possa resultar a responsabilidade referida no n.º 2 deste artigo, de actos cuja prática seja esperada.
4 - Fora do caso mencionado no n.º 2, a informação pedida nos termos gerais só pode ser recusada:
a)-Quando for de recear que o accionista a utilize para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta ou de algum accionista;
b)- Quando a divulgação, embora sem os fins referidos na alínea anterior, seja susceptível de prejudicar relevantemente a sociedade ou os accionistas;
c)- Quando ocasione violação de segredo imposto por lei.

O direito potestativo à informação a que se reportam os normativos legais acabados de transcrever, parcialmente, configurando como é consabido um  princípio básico e fundamental em que assenta o Código das Sociedades Comerciais, é de resto considerado como um  « elemento estrutural do status do sócio» (1), qual direito instrumental, instituído na perspectiva da sua essencialidade para garantir o exercício de outros direitos sociais, nomeadamente o direito aos lucros, de voto, de impugnação de deliberações sociais, de acção de responsabilidade contra os administradores, etc.). (2)
De direito se trata por isso que “é tido como um direito geralmente qualificado como um direito extrapatrimonial do sócio para o exercício de outros direitos, patrimoniais ou extrapatrimoniais, a exercer junto do órgão habilitado a prestá-las, que é o órgão de gestão da sociedade, como sejam «... esclarecimentos, dados, elementos, notícias, descrições sobre factos, actuais e futuros, que integrem a vida e a gestão da sociedade ...». (3)
E, de direito -  direito à informação - se trata também que, além do mais, tem a natureza de um vero direito subjectivo[ e inderrogávelirrenunciável , estando à sociedade vedado poder eliminá-lo, e não podendo outrossim o sócio - cfr. artº 988º, do CC -  ao mesmo renunciar (4) ] do sócio, o qual lhe é conferido, no seu exclusivo interesse, e que este poderá exercer ou não exercer, consoante entenda necessário ou conveniente,  maxime para através dele ( sendo o sócio o credor ) poder o sócio “ conhecer, a posteriori, o destino que foi dado ao seu investimento no capital social por aqueles a quem incumbe a gestão da sociedade”. (5)
Já o direito à informação a se,e segundo ANA GABRIELA FERREIRA ROCHA (6) , pode/deve ser definido como sendo “ a possibilidade de acesso a quaisquer dados, de facto ou de direito, relacionados com o andamento dos negócios sociais ou a gestão da sociedade, obtidos de modo directo ou indirecto, independentemente dos meios ou instrumentos utilizados para o seu conhecimento, assim como o conteúdo ou substrato que deriva daquela possibilidade de acesso “,  e  ,  no que objecto preciso do mesmo concerne, mostra-se ele dividido em 4 subespécies, a saber : , um direito à informação stricto sensu, através do qual permitido é ao sócio, a todo o tempo, solicitar a elucidação de questões sobre a vida da sociedade ; um direito de consulta de livros e documentos em poder da sociedade  ; um direito de inspecção pelo sócio de bens pertencentes à sociedade , e , por último, um direito de requerer inquérito judicial  à sociedade (7).
Porém, dispondo o artºs  21º, nº1, alínea c), do CSC, como vimos supra, que todo o sócio tem direito, “ A obter informações sobre a vida da sociedade,  nos termos da lei  e do contrato”, importa não olvidar que, no âmbito do direito à informação,  o respectivo conteúdo não é  semelhante para a generalidade das sociedades comerciais  [ quer adoptem o tipo de sociedade em nome colectivo, de sociedade por quotas, de sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedade em comandita por acções - cfr. artº 1º do CSC ],  antes varia ele consoante o tipo societário adoptado [ no dizer de Diogo Drago (8), os vários tipos de sociedade reflectem formas distintas  de participação de um sócio , o que naturalmente condiciona  o âmbito de poderes  e deveres que se encontram, sob este pretexto ao dispor  desse sócio “ ] .
É assim que, sendo o conteúdo do referido direito delimitado consoante o tipo societário adoptado ou o contrato, v.g. nas sociedades em nome colectivo e  devido à responsabilidade ilimitada dos sócios, é ele pleno e ilimitado ( cfr. artigo 181º, do CSC ), podendo qualquer sócio solicitar a consulta, na sede social , da respectiva escrituração, livros e documentos.
Outrossim no tocante às sociedades por quotas ( cfr. artº 214º,nº1,do CSC) , o exercício pelo sócio do direito à informação assume a abrangência do conferido ao aos sócios das sociedades em nome colectivo, sem prejuízo porém do contrato de sociedade poder regulamentá-lo estabelecendo v.g. alguns limites desde que não se impeça o seu exercício efectivo ou limite injustificadamente o seu âmbito - cfr. artigo 214º, nº2  - , e sem prejuízo de a consulta poder ser recusada  quando seja  de recear que o sócio a utilize para fins estranhos à sociedade e com prejuízo desta e, bem assim, quando a prestação ocasionar violação de segredo imposto por lei no interesse de terceiros - cfr. artigo 215º, do CSC.
Já nas sociedades anónimas, diversamente , o direito à informação não é pleno [ em razão da dispersão do capital social existente neste tipo societário, e ao consequente maior afastamento existente entre o accionista e os negócios da sociedade, bem como pela necessidade de acautelar, neste tipo de sociedade em que o anonimato dos sócios pode atingir um sentido integral, a privacidade dos negócios sociais (9) ], variando [ como vimos supra ] consoante a percentagem de capital detido,  e , assim , apenas aos accionistas que possuam pelo menos 1% de capital e desde que aleguem motivo justificado , é assegurado um direito mínimo à informação ( cfr. artigo 288º) , e compreendendo ele  apenas a consulta pessoal de certos elementos/documentos expressamente enunciados nas diversas alíneas do nº1, do artigo 288º - no essencial, o mínimo de informação, nas sociedades anónimas, traduz-se assim no direito de consulta.
Por sua vez, já aos accionistas cujas acções atinjam os 10% do capital social, é conferido também o direito de solicitarem, por escrito, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo, que lhes sejam prestadas, por escrito, informações sobre assuntos sociais - cfr. artigo 291º,nº1, do CSC - , sendo que, as informações prestadas ficarão à disposição dos outros accionistas na sede da sociedade - cfr. artigo 291º,nº7, do CSC.
O direito referido - a informações sobre assuntos sociais-, explica Diogo Drago (10), justifica-se em razão da “ cautela de interesses do sócio relativamente  à preservação da sua posição na sociedade e que justificam, entre outras, uma preocupação fiscalizadora sobre o desenvolvimento do projecto em que ele se encontra envolvido “.
Em suma, o direito à informação na “modalidade “ de consulta de livros e documentos em poder da sociedade, mostra-se nas sociedades anónimas  limitado a um certo tipo e/ou qualidade de documentos, estando ao dispor apenas de accionistas com determinada percentagem de capital , e exigindo-se também que disponha  o accionista de motivo justificado para a pretendida consulta. (11)
No seguimento das considerações - com enfoque no direito positivo que nos rege - acabadas de aduzir  e tendo por objecto o direito à informação do sócio de Soc. Comercial, diz-nos por fim o artº 292º, do mesmo diploma legal, sob a epígrafe de “ inquérito judicial, e no seu nº1, que : o accionista a quem tenha sido recusada informação  pedida ao abrigo dos artigos 288.º e  291.º ou que tenha recebido informação presumivelmente falsa, incompleta ou não elucidativa  pode requerer ao tribunal inquérito à sociedade “,  socorrendo-se então o interessado do processo de jurisdição voluntária regulado nos art.ºs 1048º, e segs.  do Código de Processo Civil, e o qual comporta no essencial duas fases, a saber :
Uma primeira, que se destina à apreciação pelo juiz dos fundamentos invocados pelo requerente e, haja ou não resposta dos requeridos, decide se há motivos para proceder ao inquérito solicitado ( cfr. art.ºs 1048º e 1049º, nº 1);
Uma segunda, e que, caso seja de deferir a requerida realização do inquérito à sociedade, fixa então o juiz os pontos que a diligência deve abranger, nomeando-se perito ou peritos que deverão realizar a investigação -  aplicando-se o disposto quanto à prova pericial - e, depois de concluído o inquérito com a elaboração do respectivo relatório conclusivo, termina o Juiz por fixar a matéria de facto e por decidir sobre a pertinência da aplicação das providências requeridas ( cfr. art. 1049º, nºs 2 e 3, 1051º,nºs 1 e 2, ambos do CPC ),  sendo que, neste conspecto, e porque - recorda-se - de processo de jurisdição voluntária se trata , não está o Juiz sujeito a critérios de legalidade estrita, antes deve adoptar a decisão julgada mais conveniente e oportuna- cfr. artº 987º,do CPC .
Em face de tudo o acabado de aduzir, temos assim que , a segunda fase do processo de jurisdição voluntária regulado nos art.ºs 1048º [ com a epígrafe de “ Do inquérito judicial à sociedade” ] , apenas tem lugar se, verificado ser o requerente titular do direito à informação pretendida ( ser ele sócio ), é outrossim  a factualidade provada reveladora de ter existido uma efectiva recusa na prestação de informação pedida [ com indicação clara de qual o esclarecimento e/ou informação pretendida (12), mas não sendo já necessário indicar a ratio do pedido de informação à sociedade  (13) ] ou ser a informação entretanto prestada falsa, incompleta ou não elucidativa - tudo factos cujo ónus de alegação e prova recai forçosamente sobre o requerente do inquérito judicial, nos termos do disposto artº 342º,nº1, do Código Civil.
Já será porém sobre os requeridos [ a sociedade, e também os titulares dos respectivos órgãos sociais a quem sejam apontadas “irregularidades no exercício das suas funções “ , cfr. art. 1048.º, n.º 2, do CPC ] que , por sua vez , incide o ónus de alegação e prova de factualidade susceptível de revelar/demonstrar que a recusa na prestação da informação pelo sócio requerida foi legítima, ou seja, não se traduziu de todo na prática de acto ilícito por omissão - cfr. do artº 342º, nº2, do Código Civil. (14)
Em suma, enquanto ao sócio e requente da realização do inquérito cabe alegar e provar factos que justifiquem o seu direito à informação pretendida, e ,  bem assim, que apesar de solicitada à sociedade, foi-lhe negado o acesso à mesma, já à sociedade demandada caberá alegar e provar que a recusa em prestá-la encontra total cobertura legal, devendo portanto ser considerada legítima à luz v.g. do disposto no art. 291º ,nº2, in fine [ quando, informando o sócio requerente que o pedido tem por desiderato  apurar responsabilidades de membros do conselho de administração, do conselho fiscal ou do conselho geral e de supervisão, for patente não ser esse o fim visado pelo pedido
de informação em apreço ], e nº 4, alíneas a) a c), do CSC. (15)
Aqui chegados, e apetrechados de todos os considerandos de direito acabados de enunciar, e descendo de imediato à factualidade assente, é desde logo  inquestionável que o direito à informação dos apelantes, na modalidade de direito de consulta de livros  e documentos em poder da sociedade demandada [ ou de Direito mínimo à informação nas Sociedades Anónimas - artº 288º, do CSC ] , não lhes estava vedado,  pois que , de  accionistas se trata que possuem  acções correspondentes a, pelo menos, 1% do capital social da sociedade requerida .
Não obstante, todos os documentos a cujo acesso e/ou entrega pretendem os apelantes prima facie aceder ( e que são todos os identificados no item 1.1 in fine do presente Ac. ), e como bem salienta o tribunal a quo, estão longe de integrar a previsão do nº 1, do artº 288º, do CSC,  logo, ao não serem os mesmos disponibilizados aos requerentes, tal não configura de todo uma recusa ilícita de informação solicitada por accionista , não conferindo a mesma qualquer direito aos apelantes de requererem a realização de um  inquérito judicial  à sociedade.
Nesta parte, em suma, nenhuma censura merece, portanto, a sentença recorrida, mostrando-se de resto o entendimento sufragado [ no sentido de que direitos plasmados nos artigos 288.° a 291.°, do CSC, são limitativos ou taxativos ( ressalvadas as estipulações lícitas do contrato da sociedade), quer no sentido que a lei confere esses quatro direitos à informação e só esses, quer no sentido de que cada um deles só pode ser exercido nos precisos moldes previstos pela lei ] devidamente amparado em doutrina especializada e idónea.
Incidindo de seguida a nossa atenção sobre a possibilidade de, ainda assim, demonstrar a factualidade provada que viram os apelantes cerceado - pelos apelados - o seu um direito à informação stricto sensu[ aquele que é conferido ao accionista de , a todo o tempo, solicitarem a elucidação de questões sobre assuntos sociais, que é o mesmo que dizer, sobre assuntos respeitantes à vida da sociedade (16) , ou  relacionados com a gestão da sociedade (17) ] , é manifesto que, em face da  factualidade provada, mostra-se assente que os requerentes/apelantes dirigiram à sociedade requerida, da qual são accionistas, diversos pedidos - por escrito - de prestação de informação/esclarecimento , sendo o primeiro por carta datada de 17 de Abril de 2009, junta a fls. 116 e 117 , e , o segundo, por carta datada de 29 de Maio de 2009, junta a fls. 118 a 120 [ cfr. factualidade inserta nos itens , ambos da motivação de facto ].
Em ambos os referidos pedidos de informação, solicitam os accionistas/ora apelantes que, uma vez que havia sido estimado pela sociedade que a obra de remodelação da Clínica implicava a realização de um investimento cujo custo obrigaria ao dispêndio da ordem dos 2.000.000 euros, mas , no final,  e segundo informação prestada em reunião da Assembleia Geral realizada em 10 de Abril de 2008, acabaram as referidas obras de remodelação da Clínica por atingir um custo de €4.600.000,00 , importava conhecer com precisão quais as obras efectivamente realizadas em 2008 e quais os respectivos custos,  tudo com o objectivo de se apurar da eventual responsabilidade dos membros do Conselho de Administração no aumento extraordinário dos apontados custos.
Ou seja, no essencial, pretendem os accionistas apelantes serem informados das razões concretas que justificam/explicam a pretensa derrapagem dos custos das obras entretanto realizadas no âmbito da  remodelação da Clínica, informação esta que, convenhamos, incide sobre assunto relacionado com a gestão da sociedade , e , ademais, mostra-se o objecto da indagação/informação almejada suficientemente concretizado/balizado/discriminado ,  não podendo de todo os apelados  invocar o desconhecimento [ porque v.g. vaga, confusa ou indeterminada (18) ] da realidade e  matéria que devem esclarecer para assim não satisfazerem o solicitado .
Não obstante o acabado de destacar, a verdade é que, revela-nos outrossim a factualidade assente [ nos itens 2.9 e 2.11, ambos da motivação de facto ] que , ambos os pedidos de informação formulados pelos apelantes em 17 de Abril de 2009  e  em 29 de Maio de 2009, foram pela sociedade requerida rejeitados, tendo na primeira comunicação/resposta  [ datada de 04 de Maio de 2009 ] e também na segunda [ datada de 17 de Junho de 2009 ] , informado/justificado a requerida  que não prestava qualquer informação ao abrigo do Art.° 291°, n.°2 , in fine do C.S.C. - que o mesmo é dizer ,por ser  patente não ter o pedido de informação solicitado por objectivo apurar a responsabilidade de membros do conselho de administração - , pois que, para todos os efeitos, haviam sido os accionistas requerentes já totalmente esclarecidos/informados das razões que justificaram o custo total e efectivo das obras realizadas, o que sucedeu  aquando da realização da Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 30 de Abril de 2009.
Dito isso, temos para nós que evidencia a factualidade assente , com segurança,  que lograram os apelantes/accionistas provar os factos constitutivos do direito que através da presente acção pretendem fazer valer, ou seja, que lhes assiste o direito de solicitarem à requerida sociedade o acesso, por escrito, às informações/explicações reclamadas, porque respeitantes a assuntos sociais, isto por um lado e, por outro, que tal direito foi-lhes pelos apelados e expressis verbis negado ( desde logo por escrito) .
Prima facie, portanto, porque provada a preterição do direito dos accionistas apelantes à informação, inevitável seria concluir pela verificação de motivo/fundamento para a realização judicial do inquérito à sociedade ( cfr. art.º 1409º,nº1, do CPC), maxime porque, ademais, é a factualidade assente em absoluto insuficiente para poder integrar a previsão de uma qualquer alínea do nº 4, do artº 291º, do CSC.
Resta, em última instância, aferir da possibilidade de os apelados, terem logrado provar factualidade pertinente capaz de integrar o tatbestand do artº 291º,nº2, in fine, do CSC, ou seja, susceptível de conferir à recusa de prestação da informação solicitada um carácter de não ilicitude [ porque ancorada em fundamento legal ], qual facto impeditivo do direito dos requerentes/accionistas.
Ora Bem.
Dispõe o nº2, referido, que não podem ser recusadas as informações solicitadas por escrito quando o sócio impetrante avisa que visam as mesmas apurar responsabilidade/s de membros de certos órgãos , a não ser que, pelo seu conteúdo ou outras circunstâncias, seja patente não ser esse o fim visado pelo pedido de informação em causa.
O preenchimento do tatbestand da II parte do nº 2, ora em equação, como é manifesto , não prescinde da prova de factualidade concreta , ónus que incumbe à Sociedade, através do respectivo conselho de administração ou do conselho de administração executivo, ou seja, carece ele de ser sustentado em factos objectivos .
E, tais factos objectivos, além do mais, hão-de forçosamente revelar, de forma patente, ou seja, ostensiva e manifesta, que a informação solicitada pelo sócio não visa de todo apurar quaisquer responsabilidades de membros de  órgãos da sociedade.
Ou seja, para justificar uma recusa de prestação de informações ao abrigo do nº 2, do artº 291º, do CSC, não é licito à sociedade ancorar-se em meras convicções subjectivas e não suportadas em elementos concretos e visíveis, quer no próprio conteúdo do pedido de informação , quer em elementos exteriores mas concretos.
Ora, analisando o teor dos requerimentos dirigidos à sociedade, e identificados em 2.7. e 2.10, não se descortina como possa o conteúdo dos mesmos concluir, com evidência, que que a informação solicitada pelos sócios não tem de todo por desiderato apurar quaisquer responsabilidades de membros de  órgãos da sociedade.
fora de ambos os requerimentos, e em termos de factualidade e/ou circunstâncias susceptíveis de permitir concluir pela verificação da previsão do nº 2, in fine, do artº 291º, do CSC, apenas se descobre o teor da acta n.° 37 da Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 30 de Abril de 2009, junta a fls. 179 a 191 dos autos, e cujo conteúdo dá nota de que, no âmbito da referida Assembleia Geral, terá sido efectuada uma exposição pelo Presidente do Conselho de Administração da Requerida/Sociedade e tenho por objecto  as obras realizadas de ampliação e melhoramento da Clínica, quais as efectuadas e os seus custos.
Será que tal factualidade, pode e deve consubstanciar uma “circunstância” , nos termos e para efeitos do nº 2, in fine, do artº 291º, do CSC ?
Em nosso entender, não cremos que in casu se justifique uma resposta positiva à pergunta aludida.

Senão ,vejamos.
Desde logo, importa não olvidar que, o 1º pedido de informação é de 17 de Abril de 2009 , ou seja, é anterior à data da Assembleia Geral da sociedade Requerida realizada em 30 de Abril de 2009.
Depois, recorda-se que os sócios  cujas acções atinjam 10% do capital social podem solicitar, por escrito, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo, que lhes sejam prestadas, também por escrito, informações sobre assuntos sociais.

Ou seja, e como resulta expressis verbis do CSC, a prestação de informações em sede de assembleia geral não é o meio idóneo e legal de satisfazer um pedido de informação solicitado ao abrigo do artigo 291°,nº1, do Código das Sociedades Comerciais.

E, em coerência, se não é a prestação de informações em assembleia Geral o meio adequado para satisfazer um pedido de informação solicitado por sócio ao abrigo do artigo 291°,nº1, do Código das Sociedades Comerciais, então não pode ele também consubstanciar uma circunstância que torne patente não ser o fim indicado pelos accionistas no pedido de informação o verdadeiro fundamento do mesmo.

De resto, como decorre do disposto no artº 290º, do CSC, o direito à informação em assembleia geral consiste no direito atribuído ao accionista com vista a obter informações verdadeiras, completas e elucidativas que lhe permitam formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação, devendo portanto existir uma relação entre a informação solicitada e os assuntos sujeito a deliberação.

Acresce que, como bem nota Diogo Drago (19) , pode acontecer que uma informação já prestada a sócio no âmbito de uma assembleia, seja novamente objecto de uma nova solicitação, desta feita por escrito e posteriormente a essa assembleia, em razão de uma questão de controlo e de fiscalização de determinado aspecto,  o que tudo não “obriga” necessariamente a qualificar tal solicitação como consubstanciando o exercício ilegítimo ou abusivo do poder de informação. (20)

Seja como for, o certo é que, não é a factualidade assente minimamente elucidativa a ponto de se justificar a conclusão de que, a pretensão dos AA, ainda que ancorada indubitavelmente em normativo legal de Direito Substantivo, pode e deve ser qualificada como traduzindo o exercício abusivo do direito à informação, porque exercido em termos clamorosamente ofensivos dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito ( cfr. artº 334º, do CC ).
Dito de uma outra forma, não nos revela o conjunto dos factos alegados e provados que, o direito social e fundamental à informação que assiste aos AA, pretenda pelos mesmos ser exercido de uma forma tal que ofenda clamorosamente o sentimento jurídico dominante.

E, assim sendo, a procedência da apelação afigura-se-nos inevitável.
Porém, considerando que :
A o direito de requerer inquérito judicial, por denegação do direito à informação, atento o seu tão acentuado carácter intrusivo na vida da sociedade visada, é ou mostra-se susceptível de ser tão grave e perturbador, que não deve ser utilizado em situações de impasse ou desconfiança, atendendo a que a sua utilização tende, não raras vezes, a agravar estas situações, colocando os tribunais como “polícias das sociedades”, tendo, nessa medida, um efeito mais negativo que positivo” ; (21)
B O accionista a quem tenha sido recusada informação pedida ao abrigo dos artigos 288.º e 291.º , pode requerer ao tribunal inquérito à sociedade , caso em que, “ O juiz pode determinar que a informação pedida seja prestada ….”. - cfr. artº 292º, nº 2, do CSC;
C Haja ou não resposta dos requeridos, o juiz decide se há motivos para proceder ao inquérito, podendo determinar logo que a informação pretendida pelo requerente seja prestada, ou fixa prazo para apresentação das contas da sociedade - cfr. artº 1049, nº 1, do CSC;
D Ou seja, do nº 1, do artº 1049º, do CCC, decorre de forma expressa que o juiz , ainda que considere que existem motivos para a realização do inquérito, pode determinar tão só que seja prestada a informação pretendida ;
E Ao contrário do que sucede nos processos de jurisdição contenciosa, na jurisdição voluntária « não existe um conflito de interesses a dirimir, mas apenas um interesse fundamental, que o juiz procura regular da forma mais conveniente e oportuna » ; (22)
F Concluindo o Juiz que existem motivos para proceder ao inquérito judicial, pode ele ordenar, imediatamente, a prestação das informações pretendidas pelo requerente ou determinar a efectiva realização do inquérito, para o que designará o perito ou peritos; (23)
G É que, como é entendimento de António Menezes Cordeiro ,“ o inquérito judicial surge como um procedimento complicado e pesado, a usar, somente quando necessário, sendo um esquema destinado a enfrentar problemas bem mais graves do que a não prestação de informação ou a informação inexacta “ ; (24)
Tudo visto e ponderado, e tendo em atenção o disposto no arº 987º, do CPC, no seguimento da procedência da apelação, e impondo-se a revogação da decisão recorrida, justifica-se ainda assim a determina-se a notificação dos apelados para, em prazo, fornecerem por escrito as informações pretendidas pelos apelantes e identificadas nos seus requerimentos identificados em 2.7. e 2.10, maxime informações precisas e completas, por escrito, sobre as obras realizadas em 2008 e os respectivos custos.
                                                                                                        
5. Decisão.

Em face de tudo o supra exposto,
acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em , concedendo parcial provimento ao recurso de apelação apresentado pelos apelantes :
5.1.- Revogar a decisão recorrida;
5.2.- Determinar que os RR/apelados, no prazo de 30 dias, prestem aos AA/apelantes as informações pretendidas e plasmadas nos seus requerimentos identificados em 2.7. e 2.10, maxime informações precisas e completas, por escritosobre as obras realizadas em 2008 e os respectivos custos .
                                                          
Custas pelos apelantes e apelados, e na proporção, respectivamente, de 1/5  e  4/5 .



LISBOA, 14/9/2017


                                     

António Manuel Fernandes dos Santos(O Relator)                          Francisca da Mata mendes(1ª Adjunta)          
Eduardo Petersen Silva(2º Adjunto)



                                                       
(1)Cfr. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, in Código das Sociedades Comerciais anotado, Almedina, Coimbra, 2.ª ed., 2011, pág. 144.
(2)Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 25-11-2013, Proc. nº 287/12.6TBAMR.G1, por nós também subscrito na qualidade de 1º Adjunto, e in www.dgsi.pt
(3)Cfr. Prof. Raul Ventura, in Sociedades por Quotas, I, 2ª edição, pág. 282 e Carlos Maria Pinheiro Torres, in O Direito à Informação nas Sociedades Comercias, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 122, ambos citados no acórdão da Relação de Guimarães de 25-11-2013, e indicado na nota que antecede.
(4)Carlos Maria Pinheiro Torres, ibidem ,págs. 294-295.
(5)Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21-9-2006, Proc. nº 6067/2006-6, e in www.dgsi.pt.
(6)In O direito à informação do sócio gerente nas sociedades por quotas, in Revista de Direito das Sociedades, Ano II, 2011, 4, pág. 1033.
(7)J. P. REMÉDIO MARQUES, in Código das Sociedades Comerciais, Comentado, Vol. III ( arts. 175.º a 245.º),
(8)Cfr. Carlos Maria Pinheiro Torres, ibidem pág. 186.
(9)In O Poder De Informação dos Sócios Nas Sociedades Comerciais, Almedina, 2009, pág. 118
(10)Ibidem, pág. 123.
(11)Recorda-se que, nas sociedades anónimas, o direito dos accionistas à informação mostra-se subdivido em: direito mínimo à informação - artigo 288.º do CSC; direito colectivo à informação - artigo 291.º do CSC;  informações preparatórias da assembleia geral - artigo 289.º CSC e informações em assembleia geral - artigo 290.º do CSC
(12)Não sendo de considerar como válidos quaisquer pedidos de informação vagos, confusos ou indeterminados, no entendimento de ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Direito das Sociedades, Vol. I, cit., pág. 732
(13)Cfr. ainda , e de entre vários outros, o acima citado Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 25-11-2013.
(14)Cfr. Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 17-12-2001, Proc. nº 0151616, e in www.dgsi.pt.
(15)Cfr. v.g. ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades comerciais, valores mobiliários, instrumentos financeiros e mercados, Vol. I, 7.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013, pág. 144
(16)Cfr. Prof. Raúl Ventura, in Novos Estudos sobre Sociedades Anónimas e em nome Colectivo, Comentário CSC, Almedina, 1994, pág. 151.
(17)Cfr. Prof. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, in Código das Sociedades Comerciais, Anotado, Almedina, pág. 674.
(18)Cfr.Prof. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, in Direito das Sociedade, volume I, [ das sociedades em geral ] 2ª edição, 2007, página 679.
(19)Ibidem , pág. 219.
(20)Vide, neste conspecto, o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 17-12-2001, Proc. nº 0151616, e in www.dgsi.pt,no qual se concluiu que “ O facto de na assembleia geral da requerida, terem sido prestadas ao accionista X informações sobre assuntos da sociedade, designadamente sobre parte da matéria informativa discriminada no requerimento inicial, não obsta a que o referido sócio possa solicitar, posteriormente, à requerida a informação escrita relativamente aos mesmos assuntos sociais.”.
(21)Cfr. Diogo Lemos e Cunha, Inquérito judicial enquanto meio de tutela do direito à informação nas sociedades por quotas, in Separata da Revista da Ordem dos Advogados, A. 75, n.º 1 e 2 ( jan.-jun. 2015).
(22)Cfr. JORGE AUGUSTO PAIS DE AMARAL, in Direito Processual Civil, Almedina, Coimbra, 2001, pág. 50.
(23)Cfr. Diogo Lemos e Cunha, ibidem.
(24)In Direito das Sociedades I, Parte Geral, 3ª Edição, Almedina, 2011. págs. 734 e 736 .



LISBOA, 12/10/2017



António Manuel Fernandes dos Santos(Relator)                              
Eduardo Petersen Silva(1º Adjunto)                                            
Cristina Isabel Ferreira Neves ( 2ª Adjunta)
Decisão Texto Integral: