Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
105/2007-5
Relator: FILIPA MACEDO
Descritores: SEGREDO DE JUSTIÇA
ADVOGADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/05/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I - A violação do segredo de justiça é um crime contra a realização da justiça, pretendendo o legislador com a observância de tal segredo garantir o êxito das investigações em processo penal pendente e evitar expôr os simples suspeitos, cuja inocência se presume até à condenação com trânsito.
II - Não comete o crime de violação de segredo de justiça uma pessoa que, em virtude da consulta dos autos criminais, divulga factos, que estejam a ser apurados em processo ainda em fase secreta, se deles tiver tido conhecimento por meios lícitos, como o são a audição não proibida do próprio arguido, dos declarantes ou das testemunhas desse processo, pessoas estas que, por natureza, não estão obrigadas a esse segredo de justiça.
III – Também não viola o segredo de Justiça o advogado que entrega a outro advogado - representante da Ordem dos Advogados - cópia de uma queixa crime, com ou sem carimbo de "recebido" do Ministério Público.
Decisão Texto Integral: ACORDAM, EM AUDIÊNCIA, OS JUÍZES DA 5ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO:
1. – No processo nº 252/00.6TATVD do 3º Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, foi julgado e condenado o arguido – (A), que recorreu, onde, por Sentença de 6/10/06, foi decidido o seguinte:

( … )
I – Julgar a acusação procedente e condenar (A) pela comissão, como autor material:
de um crime de violação do segredo de justiça, previsto e punido pelo art.º 371.º, n.º1 do Código Penal, com referência ao art.º 86.º, n.º1 do CPP, na pena de admoestação (art.º 60.º do Código Penal).
( … )


2. - Desta decisão, recorreu o arguido, tendo apresentado motivações, das quais extraiu as seguintes “conclusões” depois de mandadas aperfeiçoar, (que se transcrevem):

( … )

1- O MM° Juiz a quo deu como não provados os factos aduzidos tis 417 in fine e 418- processos identificados e de CONHECIMENTL OFICIOSO: constata-se NULIDADE que influi na Decisão,

2- O arguido não incorreu em violação do segredo Justiça porquanto:

- NÃO DEU A CONHECER AO MUNDO AS QUEIXAS EFECTUADAS ! - - NÃO DEU ENTREVISTAS A ÓRGÃOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL !
- É UM ADVOGADO DESCONHECIDO E DESCONHECIDOS DO PÚBLICO SÃO AS QUEIXAS EFECTUADAS....

3- O arguido apenas deu a conhecer - segundo os factos provados - o teor das queixas ao DR, (C)- LEGITIMO DELEGADO da ORDEM dos ADVOGADOS.... OBRIGADO AO SIGILO Ill

4- A comunicação ao Sr. Dr. (C) - delegado da Ordem dos Advogados -- foi legitima e este procurou que os clientes do queixoso cumprissem a Decisão Judicial, pagando os danos fixados no P°. 104/99 do Douto 2° Juizo T. VEdras - devia à sua constituinte e filhos.

5-Tal como a comunicação efectuada pelo Ministério Público à Ordem dos Advogados - Lisboa - sobre a queixa crime instaurada pelo Dr. (M), contra o arguido foi legitima, nos termos do art.° 95 do Estatuto da Ordem dos Advogados, também a comunicação do arguido ao Dr. (C) foi legitima - art.° 81 -1-b) do mesmo E.O.A., pois "o advogado é obrigado a segredo profissional no que respeita a factos que, por virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados, qualquer colega, obrigado quanto aos mesmos factos.... lhe tenha comunicado" - art.° 81 - 1 b) do D.L. 84/84 de 16/3.

6- Quanto ao requisito in art.° 371° do C.P.: "quem ilegitimamente der conhecimento" existe normalidade no acto, pois o Dr. (C) e o arguido estavam obrigados ao segredo profissional e segredo do justiça, ambos respeitaram a sua essência, ao que acresce o facto de aquele, à data, ser Delegado da Ordem à qual o arguido pertence.

7- O arguido actuou de boa-fé, como advogado interessado em pugnar pelo interesse dos seus clientes PELO QUE DEVERIA SER ABSOLVIDO !

8- O DR (C) E O ASSISTENTE NÃO INDICARAM A
DATA EM QUE AS QUEIXAS LHES FORAM COMUNICADAS- cfr. cassette
LADO A- rotações 0001 a 0781 e LADO B- 0001 a 273…pelo que inexiste prova da DATA em que as queixas foram alegadamente exibidas, se com carimbo do Ministério Público ou não, o que, índublo pro reo conduz à absolvição do arguido.

9- O art° 371 do Cód. Penal é inconstitucional: viola os arts. 13 e 32-1 da Lei Fundamental e art. 6° da Convenção Europeia dos Direitos Homem quando entendido, como ín casu, que viola o segredo de Justiça o advogado que entrega a outro advogado- legitimo representante da Ordem dos Advogados- cópia da queixa crime - com ou sem carimbo de "recebido" do Ministério Público tal como seria inconstitucional a mesma hermenêutica quando o Ministério Público envia à Ordem dos Advogados peças de processos em sigilo de Investigação subscritas por advogado, que, quiçá, tivessem incorrido em ilicito disciplinar ou Criminal.
10- Verifica-se o vicio do art. 410-2-a) do CPP.



- Art° 412- 2- a) CPP: art°s 371 Cód. Penal e 81- 1 b) do D.L. 84/84 de 16/3

- art. 412- 2- b)- CPP: no modesto entendimento do arguido o Douto Tribunal a quo interpretou o art° 371 Cód. Penal no sentida de que mera exibição de uma queixa crime efectuada por um advogado que entrega cópia a um Membro da Ordem dos Advogados constitui requisito para a subsunção a esse norma e deve ser admoestado.

Porém, o advogado que se queixa de outro advogado e comunica tal acto à Delegação dos Advogados não infringe norma alguma, face ao disposto no art. 81- 1 - B) do D.L. 84/84 de 16 Março ( ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS) com as alterações posterioresArt. 412- 2-c) CPP: deve ser aplicada in casu a norma constante do Estatuto da Ordem dos Advogados e o arguido absolvido.

Art. 412- 3 CPP:

O segmento constante da cassette LADO A- rotações 0001 a 0781 e LADO 8- 0001 a 273..., demonstra que inexiste prova da DATA em que as queixas foram alegadamente exibidas, se com carimbo do Ministério Público ou não, o que, in dubio pro reo conduz à absolvição do arguido pois o DR (C) E O ASSISTENTE NÃO INDICARAM A DATA EM QUE AS QUEIXAS LHES FORAM COMUNICADAS..
( … )


3. - O M.ºP.º da 1ª instância respondeu às alegações do arguido, sendo as suas conclusões no sentido de dever ser confirmada a Sentença recorrida.
4. – Neste Tribunal, a Digna P.G.A. apôs o seu “visto”.
5. – Colhidos os vistos legais, realizou-se a audiência.
6. – O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, é o seguinte:
- o arguido alega:

- que a decisão violou os art.ºs 371º do Código Penal, o art.º6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e os artigos 13.°, 32.°, n.° 1 e 205.° da Constituição da República Portuguesa;

- que na decisão não se deram como provados factos identificados a fls. 417 e 418, de conhecimento oficioso, acarretando nulidade que influiu na decisão;
- que o arguido apenas deu a conhecer os factos em crise ao legítimo representante da Ordem dos Advogados, que por sua vez apenas procurou consenso entre os causídicos.
- Invoca a inconstitucionalidade do art. 371.° do Código Penal, por violação dos artigos 13.°, 32.° n.° 1 e 205.° da Constituição da República Portuguesa.


7. – A decisão recorrida é do seguinte teor: ( … )
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:

1 – Em data que não se logrou apurar, mas que se situa nos meses de Outubro/Dezembro de 2000, o arguido (A) entregou, em Torres Vedras, área desta comarca, a (C), então Delegado da Ordem dos Advogados, cópias de duas queixas crime: uma apresentada por (E) e seus filhos contra o aqui queixoso; outra apresentada por (FF), também contra (M), Advogado, e outros, tendo, em ambos os casos, os queixosos passado procuração a favor do ora arguido.
2 – Tais queixas foram registadas e autuadas como inquérito, nesta Procuradoria da República, nos dias 13/09/2000 e 16/10/2000, respectivamente.
3 - Sendo que a primeira deu origem ao inquérito n.º 160/00.0 TATVD e a segunda ao inquérito 191/00.0 TATVD.
4 – Este arquivado em 16/07/2001, decisão que foi mantida por despacho proferido em sede de reclamação hierárquica, com data de 12/10/2001.
5 – Aquele ainda a correr seus termos na 3.ª Delegação desta Procuradoria da República.
6 – Da primeira queixa acima referida (registada em 13/09/2000) consta que: “(…) o arguido (V) foi julgado e condenado na pena de 12 anos de prisão e a pagar 28.236.422$00 à queixosa e filhos menores, cfr. proc. 104/99-OGCTVD do 2° Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras" (por crime de homicídio, na pessoa de (J), marido da queixosa) "(...) sucede que, o arguido (V) em conluio com a arguida (L)e o arguido Dr. (M), idealizaram e concretizaram um plano com vista a dissipar o património do arguido (V), com vista a não pagar à queixosa e filhos a indemnização em que viesse a ser, como, o foi, condenado a pagar 28.236.422$00. Assim, em 15 de Novembro de 1999, nove meses após ter cometido o homicídio, o arguido (V) "divorciou-se" da arguida (L)(...).
Em 6 de Abril de 2000, o arguido (M), no Estabelecimento Prisional de Caldas da Rainha, redigiu pelo seu próprio punho uma procuração com "poderes especiais" e pela qual o arguido (V) lhe conferia poderes para proceder à partilha dos bens com a esposa e arguida(L), proceder à composição de quinhões, dando ou recebendo tornas (...).
Munido de tal procuração, o arguido (M) instruiu a 4.ª arguida, conferindo-lhe certidões de Registo Predial onde constavam registados os dois arrestos para que preparasse uma "escritura de partilhas".
(...) Assim, em 6 de Abril de 2000 a arguida, munida de tais documentos e na presença do arguido (M) a arguida (L)elaborou e redigiu o Doc. 1 pelo qual:
- O arguido (V) "partilhava" os bens imóveis com a arguida (L)através da procuração conferida ao arguido (M).
- À arguida (L)foram adjudicados os imóveis designados em (...) - ao arguido (V) as verbas (...)
- a arguida (L)ter pago de tornas a quantia de 3.333.139$00 ao arguido (V) que declara ter recebido tal quantia;
- a arguida notária declara que o acto pode ser ineficaz relativamente aos arrestos Doc. 1.
Sucede que a declaração/confissão do pagamento de tornas é falsa pois que:
- a arguida (L)não pagou "tornas" nem dispunha de 3.333.139$00.
- O arguido (V) não recebeu “tornas”, nem entraram os 3.333.139$00 no EPR.
- O arguido (M) não recebeu tais "tornas".
- As contas bancárias dos arguidos (V) – (L)estão arrestadas desde Abril de 1999 e viviam apenas da “força do trabalho” do arguido (V), antes de preso.
- Os arguidos (V) e (L)pediram e obtiveram Apoio Judiciário nos autos de arresto/oposição/embargos de terceiro no Proc. 104/99 … do 2° Juízo de Torres Vedras com o argumento de serem pobres e nada mais terem de rendimentos para além da exploração dos prédios rústicos supra id.
A “escritura de partilhas” é falsa e teve apenas em vista fazer desaparecer o património do arguido (V) com vista ao não pagamento da indemnização que bem sabia estar condenado a pagar à queixosa e filhos menores desde 4-4-1999.
(. ..) não só não houve qualquer pagamento de tornas, como o único fito foi o de colocar-se o arguido (V) na situação de insolvência. Na verdade, as duas casas de habitação e o prédio rústico 5.000 m2 têm valor aproximado de 50.000.000$00 e foram “adjudicadas” à arguida(L).
Os 2 terrenos “adjudicados” ao arguido (V) têm o valor máximo de 1.5000.000$00 (…).
A intenção dos “outorgantes” (V), (L)e (M)l foi óbvia: fazer desaparecer dlo património do arguido (V) os bens que garantissem a indemnização de 28.236.422$00 – ou de 56.236.422$00 – conforme o arresto registado cerca de um ano antes de tal “escritura de partilhas” .
(…) o arguido (M) sabia e queria ao “compor” os quinhões, e ao outorgar em nome do seu representado (V) a escritura de “partilhas” que o arguido (V) se colocava numa situação de diminuição drástica do património, por ausência dos bens imóveis de maior valor que poderiam garantir, a final, o pagamento da indemnização de 28.236.422$00, e procedendo ele próprio ao registo na Conservatória de Registo Predial de Torres Vedras, cerca de dois meses antes do julgamento dos autos crime, no qual interveio como defensor do arguido (V)!
O arguido (M) sabia que havia requerido Apoio judiciário no Proc. 104/99 (…) e que inexistiam dinheiros ou pagamentos de “tornas” prestando declarações falsas perante a 43 arguida, querendo, como quis “descapitalizar” o património do arguido.
(...) não só não houve qualquer pagamento de tornas, como o único fito foi o de colocar-se o arguido (V) na situação de insolvência. Na verdade, as duas casas de habitação e o prédio rústico 5.000 m2 têm valor aproximado de 50.000.000$00 e foram "adjudicadas" à arguida(L).
O arguido (M) utilizou expediente manifestamente reprovável, sendo certo que era e é defensor no proc. crime 104/99 (…) como nos autos de arresto e que a escritura de “partilhas” era um acto reprovável, que colocava, como colocou, o seu constituinte na situação de insolvência dolosa, face à ausência de bens penhoráveis, capazes de satisfazer o pagamento dos 28.236.422$00.
Todos os arguidos quiseram com a conduta supra descrita, alterar a verdade, prestando declarações falsas de “pagamentos de tomas”; prejudicar a queixosa e filhos menores com vista ao não pagamento da indemnização; fazer desaparecer o património do arguido (V), e bem sabendo que as suas condutas eram manifestamente reprováveis e atentat6rias das decisões proferidas por um Órgão de Soberania, que logo após a prática do crime de homicídio por parte do lo arguido, ordenou arresto sobre bens deste, para garantir a final o pagamento da indemnização, o que não os coibiu, mesmo assim de outorgar uma “escritura de partilhas” que bem sabiam constituir acto ilícito e falso (...)”.
7 – Na segunda queixa mencionada (registada em 16/10/2000) consta:
Em Agosto de 1989 o participante foi detido no âmbito do proc. 49/89 do Tribunal Judicial da Lourinhã. Foi-lhe nomeado defensor oficioso o arguido (M).
(…) Ao longo dos anos de 1989, 1990 e 1991 o queixoso foi pagando várias quantias ao arguido (M) através das suas filhas X e Y e cujo quantitativo ascendeu a cerca de 300.000$00.
(…) Sucede que o arguido como advogado nomeado defensor oficioso pelo Tribunal não podia receber qualquer importância pois seria o tribunal a adiantar despesas e honorários pela defesa oficiosa, sendo certo que constou ao queixoso que o tribunal veio a pagar ao arguido cerca de 250.000$00 pela defesa oficiosa.
Um primo do queixoso de nome H veio a entregar ao arguido um caso relacionado com uma letra bancária no montante de um milhão de escudos tendo o arguido recebido procuração para tratar o caso, sendo certo que o arguido não só não acompanhou o caso como a casa do primo do ora queixoso foi vendida em hasta pública (…).
O queixoso é proprietário de duas mãos de bronze com cerca de um quilo de peso, cada uma e que possuía desde 1988.
Sucedeu que aquando da prisão do queixoso, o arguido (M) recebeu as referidas mãos de bronze que lhe foram entregues por (AS) (…) que as entregou ao arguido, por ser “advogado” do queixoso e a fim de o arguido as guardar e entregar ao queixoso, que à data se encontrava no E.P.R.
Porém o arguido nunca veio a entregar as mãos em bronze ao queixoso. Apossou-se das mesmas e, à revelia do queixoso, e apesar de este ter pedido ao arguido por diversas vezes que lhas entregasse, veio o arguido a ofertá-las a um tal Umbelino (…)”.
O queixoso nunca deveria ter pago qualquer quantia ao arguido, pois este não era advogado com procuração mas sim nomeado defensor oficioso.
E só entregou tal quantia – 300.000$00 – ao arguido porque este dizia que precisava do dinheiro para o processo da Lourinhã e para defender o queixoso”.
8 - Com a conduta acima descrita, o arguido, sem para tal estar autorizado ou legitimado, agiu com o propósito concretizado de dar conhecimento do teor das mencionadas queixas registadas, na Procuradoria da República, nos dias 13/09/2000 e 16/10/2000 e integradas nos processos n.ºs 160/00 e 191/00 em fase de inquérito, o que o arguido não desconhecia, bem sabendo, por isso, que as mesmas se encontravam cobertas por segredo de justiça.
9 - O arguido agiu sempre livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
10 – O Dr. (C) procurou um consenso e colocar termo ao litígio.
11 - O arguido divulgou o conteúdo das queixas crime ao representante da Ordem dos Advogados e permitiu que este as mostrasse ao assistente por se afigurar possível um consenso.
12 – O arguido é advogado nesta comarca e pessoa trabalhadora.
13 – O arguido não tem antecedentes criminais.

Não se provaram quaisquer outros factos que estejam em contradição com os assentes, designadamente:

- O arguido, por força do inconformismo perante morosidades processuais, é um advogado incómodo que tem efectuado protestos e pedidos de aceleração processual em diversos processos que há anos, aqui pendem, tais como:
- Inq. 225/99.0 TATVD – 1ª delegação – arguida (MS) – crime de lenocínio – destino: arquivado.
- Inq. 66/00.TATVD da 28 Delegação – arguido (AM) crime de poluição – destino: arquivado.
- Inq. 5/93 GCTVD – Proc Adm. 24/01 – 28 Delegação: (EF) – destino: desaparecido o inquérito e recusa sistemática do M. P., desde Janeiro de 2001, em passar cópia do Auto de apreensão e de bens apreendidos, em Janeiro de 1993, ao cliente.
- Inq. 217/99.9 TATVD – 3ª Delegação – queixoso C & N, Lda., pendente há mais de 3 anos… foi pedida aceleração processual.
- Inq. 194/01.8 GDTVD – queixosa (CS)… … ultrapassado o prazo para acusar, foi pedida a aceleração processual.
- Inq. 160/00.0 TATVD – 3.ª Delegação _ queixosa (AE) contra Dr. (M), Senhora Notária, e outros: pendente – tudo, como melhor consta da douta acusação – e… foi pedida a aceleração.
- O arguido Participou na defesa no caso (G), em 1992-1994.
- Participou no Julgamento do caso Dona Branca, em 1985.
- Representou (FL), no Tribunal de Sesimbra e no Supremo Tribunal de Justiça – Habeas Corpus – em Outubro de 2004.
- Há 3 anos representou um Deputado da Ucrânia – (Y S)” líder de uma “associação criminosa”, um processo com 30 arguidos, no âmbito das propaladas “máfias de Leste”, em recurso, no Tribunal Europeu.
- O Ministério Público que deduziu a Acusação tem, do arguido o conceito de persona non grata.
- “ O Ministério Público – Procurador Acusador e uma Colega – “pediram” ao 1° e 3° J. deste Douto Tribunal a “condenação” do arguido, por ter solicitado Acelerações de Inquéritos parados há 2 e 3 anos, sem Acusação….. valeu ao arguido o Sapiente Despacho do Sr Juiz. Machado Rodrigues – 1.º J. T.Vedras em 2003 – “…..julgar que o atraso nos Inquéritos se devia ao estado de desorganização dos Serviços do Ministério Público….”.
- O Inquérito 160/00.0 TATVD – a queixa está transcrita na acusação – em que o arguido é mandatário de (E), assistente no P.º Homicídio n.º 104/99, 2° Juízo deste Douto Tribunal,- ter demorado anos sem que os autores da escritura de “partilhas” – o queixoso, (M), Notária, (V) Lobo e ex-mulher (L), fossem “sancionados” pelo acto notarial.
- A queixosa (E)– com cinco filhos menores e cujo marido foi assassinado a sangue frio – lesada em mais de 40.000 contos – se ver compelida a instaurar Acção Pauliana – Proc. n.º 265/2000 -1° J.º deste Douto tribunal – e Acção de Simples Apreciação – proc. n.º 286/2000, neste Douto 2° Juízo, contestada pelos “obreiros” da escritura de “partilhas”.
- O arguido pretendia que os clientes do queixoso cumprissem com a Decisão Judicial, pagando os 40.000 contos que o homicida – representado pelo queixoso no Proc. n.º 104/99 deste Douto 2° juízo –onde foi condenado a 12 anos de prisão – devia e ainda deve, parcialmente, à sua constituinte e filhos.
- Os factos tecidos nas queixas crime são, rigorosamente, a verdade dos factos e a prova é que na Acção Pauliana - 1° Juízo de Torres Vedras – Proc. n.º265/00 - foram provados os fundamentos essenciais da má-fé e transmissão dos imóveis arrestados, através da referida “escritura de partilhas” outorgada pelo queixoso, Dr. (M): o Tribunal considerou que os Réus (L)e (V) Lobo sabiam que ao “partilharem os bens” tiveram consciência que dessa forma, os AA. (E)e filhos menores) não viriam a receber a indemnização... a Sentença foi de condenação daqueles “obreiros notariais”, em litigância de má fé, a pagarem € 1.500 e declarada a Ineficácia do Acto Notarial.
- Quanto ao caso das “mãos de bronze” do queixoso K: o caso foi arquivado face ao tempo decorrido, mas a verdade é que o queixoso K foi desapossado das mãos e lesado em 1000 contos.
- O arguido é pessoa séria, honrada, bem conceituado e estimada, por todos quantos a conhecem.


Indicação probatória quanto aos factos provados


O Tribunal, num juízo crítico da prova produzida, formou a sua convicção quanto aos factos dados como provados com base nos seguintes elementos:
Nas declarações do assistente Dr.(M), actual Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, que referiu ter encontrado casualmente (C), à data dos factos, advogado e representante da Ordem dos Advogados nesta comarca, que lhe terá informado ter-lhe o arguido entregue duas cópias de queixas, tendo aquele ido ao escritório do assistente e deu a conhecer as participações criminais, sendo as cópias juntas aos autos aquelas que o Dr.(C) lhe entregou, no depoimento de (C), actualmente Juiz de Direito, à data dos factos Delegado da Ordem dos Advogados em Torres Vedras, que referiu que Dr.(A) falou com ele por uma vez por estar aborrecido com o assistente, visando que o mesmo falasse com o assistente, posteriormente, o Dr.(A) entregou-lhe as cópias das queixas e o mesmo com autorização do arguido mostrou-as e deixou ficar cópias ao assistente.
Diga-se ainda que ficou claro que o objectivo da testemunha foi o apaziguamento e que o arguido deu autorização para que ele mostrasse as queixas ao assistente, pelo que, demos como provado que o arguido deu autorização ao representante da Ordem dos Advogados que mostrasse o teor das queixas ao assistente com vista ao consenso.
Importará finalmente referir que quer o Dr.(A), quer o Dr.(C) à data dos factos eram advogados, ora, o arguido ao ter apresentado as queixas carimbadas conforme constam dos autos ao Dr.(C) sabia que as mesmas estavam ao abrigo do segredo de justiça e que ao estar a entregá-las estava a dar conhecimento do teor das mesmas ao Dr.(C), pelo que, representou o facto de ir dar conhecimento do teor das queixas ao Dr.(C) e quis fazê-lo.
Teve-se em atenção os documentos de fls.6 a 10, 50 a 57, 59 a 102, 109 a 128 e CRC de fls.361.

Quanto aos factos não provados para além do que consta já anteriormente não foi feita prova suficiente para dar os mesmos por provados.
( … )


II – CUMPRE APRECIAR:
Por sentença de 6/10/06, foi o arguido condenado pela prática de factos, que integram a prática do crime de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo art. 371ºnº 1 do Código Penal, por referência ao art. 86.° n.° 1 do C.P.P., na pena de admoestação.

Inconformado, interpôs recurso dizendo, em síntese:

- A decisão violou os art.ºs 371º do Código Penal, o art.º6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e os artigos 13.°, 32.°, n.° 1 e 205.° da Constituição da República Portuguesa;

- Na decisão não se deram como provados factos identificados a fls. 417 e 418, de conhecimento oficioso, acarretando nulidade que influiu na decisão;

- O arguido apenas deu a conhecer os factos em crise ao legítimo representante da Ordem dos Advogados, que por sua vez apenas procurou consenso entre os causídicos;

- Invoca a inconstitucionalidade do art. 371.° do Código Penal, por violação dos artigos 13.°, 32.° n.° 1 e 205.° da Constituição da República Portuguesa.

Com efeito, atendendo à matéria probatória produzida em sede de audiência de julgamento, não há dúvidas, que o arguido deu conhecimento dos documentos, juntos aos autos, à testemunha (C).

Os factos vertidos em tais documentos encontravam-se abrangidos pelo segredo de justiça, sendo que a transmissão do seu conhecimento a (C) ocorreu no âmbito de relação profissional, que o legitimava.

Os factos são:

- o arguido, o assistente (M) e a testemunha (C) são advogados;

- este último, à data dos factos, também representante da Ordem dos Advogados;

- o arguido deu a conhecer a este último o teor de peça processual, que já havia dado origem a processo de inquérito;

- a qualidade de qualquer destes intervenientes tem a virtualidade de, por si, justificar os factos praticados, porquanto existiu, “in casu”, interesse legítimo na informação veículada, já que se pretendia conciliar as partes.

Na verdade, entende-se, que a comunicação ao Dr. (C) - delegado da Ordem dos Advogados, feita pelo arguido foi legítima e este procurou, que os clientes do aqui queixoso/ advogado - Dr. (M), cumprissem a decisão judicial, pagando os danos fixados no p°. nº 104/99 do 2° Juizo de T. Vedras, devidos à sua constituinte e filhos.

O mesmo aconteceu com a comunicação efectuada pelo Ministério Público à Ordem dos Advogados - Lisboa - sobre a queixa crime instaurada pelo Dr. (M), contra o arguido, (que foi legítima), nos termos do art.° 95 do Estatuto da Ordem dos Advogados, também a comunicação do arguido ao Dr. (C) foi legitima - art.° 81 -1-b) do mesmo E. da O.A., pois "o advogado é obrigado a segredo profissional no que respeita a factos que, por virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados, qualquer colega, obrigado quanto aos mesmos factos.... lhe tenha comunicado" - art.° 81 - 1 b) do D.L. 84/84 de 16/3.

Quanto ao elemento do tipo legal exigido pelo art.° 371° do C.P.:"quem ilegitimamente der conhecimento" existiu normalidade no acto, pois o Dr. (C) e o arguido estavam obrigados ao segredo profissional e segredo de justiça, ambos respeitariam a sua essência, ao que acresce o facto de aquele, à data, ser Delegado da Ordem, à qual o arguido pertence.

O arguido actuou como advogado interessado em defender os interesse dos seus clientes.

Para além disso, o dr (C) e o assistente não indicaram a data em que as queixas lhes foram comunicadas- cfr. Cassette lado A- rotações 0001 a 0781 e lado B- 0001 a 273…pelo que inexiste prova da data em que as queixas foram alegadamente exibidas, se com carimbo do Ministério Público ou não, o que, seguindo o princípio “in dubio pro reo”, só pode implicar a alteração dos “factos provados” sob os nºs 8 e 9, que passam a ter a seguinte redacção, o nº 8: “Com a conduta acima descrita, o arguido agiu com o propósito concretizado de dar conhecimento do teor das mencionadas queixas.”, sendo, que o restante teor deste nº se considera como “não provado”, assim como o nº 9, que passa a “facto não provado”.

Tais alterações implicam a absolvição do arguido.

Na verdade, não se pode entender, que viola o segredo de Justiça o advogado, que entrega a outro advogado- legitimo representante da Ordem dos Advogados- cópia da queixa crime - com ou sem carimbo de "recebido" do Ministério Público,tal como seria aberrante, o mesmo raciocínio, quando o Ministério Público envia à Ordem dos Advogados peças de processos em sigilo de investigação subscritas por advogado, que porventura, tivessem incorrido em ilicito disciplinar ou criminal.

O crime de violação do segredo de justiça é um crime contra a realização da justiça, pretendendo o legislador com a observância de tal segredo garantir o êxito das investigações em processo penal pendente e evitar expôr os simples suspeitos, cuja inocência se presume até à condenaqção em trânsito.

Não se pode dizer, que comete o crime de violação de segredo de justiça uma pessoa que, em virtude da consulta dos autos criminais, divulga factos, que estejam a ser apurados em processo ainda em fase secreta, se deles tiver tido conhecimento por meios lícitos, como o são a audição não proibida do próprio arguido, dos declarantes ou das testemunhas desse processo, pessoas estas que, por natureza, não estão obrigadas a esse segredo de justiça.

A factualidade ocorrida teria necessariamente outro tratamento se, ao invés de Advogados, fossem intervenientes dois conhecidos desavindos, em que um comunicasse a um terceiro, o teor das peças ora em análise, como efectivamente sucedeu.

Neste sentido, o Ac. da R.C., de 26/5/99:
( … )
… é pressuposto da incriminação por violação de segredo de justiça (art° 371°, do CP) que tenha sido a divulgação feita pelo concreto agente, que tornou público o que até aí era secreto, isto é, que só em virtude dessa divulgação, se tornou conhecido, no todo ou em parte, o teor de acto processual coberto pelo segredo.
( … )

III – DECISÃO:

Pelo exposto, acordam os Juízes da 5ª Secção do T.R.L., após audiência:

a) conceder provimento ao recurso do recorrente, alterando a decisão recorrida, como sobredito e absolvendo o arguido;

b) sem custas.

Lisboa, 5/6/07

Presidente da Secção: Dr. Pulido Garcia;

Relatora: Filipa de Frias Macedo;

1º Adjunto: Dr. Nuno Gomes da Silva;

2ºAdjunto: Dr. Santos Rita.