Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
29433/15.6T8LSB.L1-2
Relator: ARLINDO CRUA
Descritores: ACÇÃO DE DESPEJO
NULIDADE DE SENTENÇA
EXCESSO DE PRONÚNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDÊNCIA PARCIAL
Sumário: - Através da alegação, por parte da Autora, de uma concreta causa de pedir e de um específico pedido, tradutores do objecto do processo, estabeleceu-se ou firmou-se o enunciado balizamento cognitivo a que o Tribunal a quo estava vinculado, não podendo este, consequentemente, conhecer acerca de causas de pedir não invocadas, nem ultrapassar os limites do pedido ou pedidos deduzidos (nomeadamente, no que concerne á sua qualidade), em violação do princípio do dispositivo;

- pelo que, fixado o objecto do processo, incumbia ao julgador a quo respeitá-lo na decisão proferida, limitando o seu campo de conhecimento á concreta causa de pedir invocada (contrato de arrendamento alegadamente incumprido pelo arrendatário, no que concerne á obrigação do pagamento das rendas, determinando causa da sua resolução), e ao objecto fixado no petitório deduzido (resolução contratual, com consequente devolução do arrendado e pagamento das rendas, vencidas e vincendas, devidas);

- apesar da nítida definição das balizas de conhecimento legalmente permitidas, a decisão sob apelo configurou e apreciou a pretensão accional deduzida como se estivéssemos perante uma acção de reivindicação ou de índole reivindicativa, no âmbito de um contencioso petitório, alicerçado, substantivamente, nos artigos 1305º e 1311º, ambos do Cód. Civil;

- e não, como deveria, tendo por base a concreta causa de pedir invocada, consubstanciada na relação obrigacional de arrendamento e de pretensa violação de uma das obrigações contratuais, alegadamente fundante e justificativa de resolução contratual;

- pelo que, além de conhecer de causa de pedir não invocada, a sentença apelada condenou, ainda, em objecto diverso do pedido, o que configura preenchimento das causas de nulidade inscritas no 2º segmento, da alín. d) – excesso de pronúncia – e 2º segmento da alín. e) – pronúncia em objecto diverso do pedido -, determinante da parcial nulidade da sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do petitório accional, julga parcialmente procedente a acção;

- da articulação ou concatenação do prescrito nos artigos 639.º e 640.º, do Cód. de Processo Civil, resulta que o ónus principal a cargo do recorrente exige, pelo menos:
§ a indicação nas conclusões recursórias, com precisão, dos concretos pontos de facto da sentença que são objecto de impugnação, ou seja, cuja modificação é pretendida pelo recorrente, sem o que não é possível ao tribunal de recurso sindicar eventuais erros no julgamento da matéria de facto ;
§ a indicação expressa, na motivação ou corpo alegacional, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, ou seja, relativamente a cada questão de facto impugnada.

- compulsadas as conclusões recursórias apresentadas pelo Réu/Reconvinte/Apelante, constata-se não constarem das mesmas qualquer indicação, por mínima que seja, dos concretos pontos de facto da sentença apelada que são objecto de impugnação, isto é, dos pontos factuais que o Recorrente pretende ver modificados e, por outro lado, analisado o corpo alegacional ou motivação, não se vislumbra, minimamente, que do mesmo conste, relativamente a cada segmento da impugnação ou questão factual impugnada, qual o resultado pretendido, ou seja, qual o facto que deveria passar a constar como provado ou não provado;

- Pelo que, na constatação de tais omissões, e sendo certo que estas não permitem o apelo a despacho de aperfeiçoamento, impõe-se, nos termos das alíneas a) e c), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, a total rejeição da apelação interposta, relativamente à impugnação da matéria de facto.
Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
               
I - RELATÓRIO
1CONFRARIA de ..., Instituição Particular de Solidariedade Social, com sede na Rua ..., ..., Carnide, Lisboa, intentou a presente acção declarativa de despejo, sob a forma de processo comum, contra:
- FG..., residente na Rua ..., ...,, Lisboa,
deduzindo petitório nos seguintes termos:
I. Ser decretada a resolução do contrato de arrendamento;
II. Ser o Réu condenado a despejar imediatamente o locado e a entregá-lo à Autora livre e devoluto, nas mesmas condições em que o recebeu;
III. Ser o Réu condenado a pagar as rendas vencidas e vincendas até à entrega do locado;
IV. Ser o Réu condenado a pagar à Autora a título de indemnização, o valor da renda mensal em vigor, na data da resolução do contrato, por cada mês que decorra entre o trânsito em julgado da sentença e a data em que o locado seja entregue, nos termos do disposto no artigo 1045.º do Código Civil;
V. Ser o Réu condenado a pagar à Autora os juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento de cada uma das rendas, até ao efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte:
§ A Autora é proprietária do prédio urbano sito na Rua ..., ..., Lisboa, Freguesia de Carnide, Concelho de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo …;
§ Em data que não consegue precisar, deu de arrendamento a JG..., pai do Réu, para fins habitacionais, uma dependência daquele prédio urbano, não tendo sido tal contrato reduzido a escrito;
§ Por morte da primitivo Arrendatário, JG..., o arrendamento transmitiu-se para a ora Réu, seu filho;
§ A renda mensal actualmente em vigor é de € 100,00 (cem euros);
§ o Réu não procede ao pagamento das rendas a que contratualmente está obrigado desde Janeiro de 2015;
§ o que não fez nos 8 (oito) dias seguintes a contar do início da constituição em mora relativamente a cada uma das indicadas rendas, nem posteriormente;
§ ascendendo as rendas vencidas e não pagas a € 1.000,00 (mil euros), ou seja, 10 (dez) meses a multiplicar por € 100,00;
§ A Autora interpelou diversas vezes extrajudicialmente o Réu, para esta proceder ao pagamento das rendas em dívida;
§ Contudo, apesar de instado para o fazer, o Réu não efectuou qualquer pagamento, nem tão-pouco entregou o locado;
§ tendo já decorrido mais de 2 (dois) meses sobre a data de início da mora na realização do primeiro pagamento, tornou-se inexigível aos Autores a manutenção do contrato de arrendamento;
§ Assistindo-lhes, assim, o direito à resolução, nos termos do disposto n.º 3 do artigo 1083.º do Código Civil;
§ é inexorável concluir que se encontram preenchidos os pressupostos de facto e de direito que conferem à Autora o direito a pedir a resolução do contrato de arrendamento em causa nos presentes Autos.
2 – Devidamente citado, veio o Réu contestar/reconvir, alegando, em súmula, o seguinte:
· O R. sabe que o A. se intitula dono da propriedade identificada no art.º 1º da p. i., desconhecendo contudo a existência de quaisquer títulos que possam confirmar a alegação feita, desconhecendo por isso se os factos que aí se alegam são ou não verdadeiros, que por não lhes serem pessoais, os deixam impugnados, nos termos e para efeitos do disposto no art.º 574 n.3 do CPC.;
· a A. nunca deu de arrendamento o imóvel descrito no articulado 1 da p.i., para fins habitacionais, por escrito ou verbalmente, ao JG..., pai do R. nem tal tinha qualquer cabimento, uma vez que o imóvel em causa foi construído e pago a expensas do JG... em 1946, agindo sempre o mesmo como seu proprietário;
· No referido imóvel, nasceu o R. e os seus 6 irmãos, tendo até hoje o R. sempre o habitado como se tivesse herdado o mesmo de seu pai;
· Todos os melhoramentos e manutenção da mesma foram sempre feitos a expensas do pai do R. ao seu tempo, o JG..., e hoje em dia desde que faleceu o mesmo, são feitas pelo filho que nunca deixou de lá viver;
· A verdade é que, em 1946, foi dado ao JG... uma parcela de terreno para ai edificar a sua casa, o respectivo imóvel referenciado nestes autos, que hoje corresponde ao nº 35 da Rua ..., Carnide, como forma de pagamento pelos serviços prestados que se estenderam muito além da sua função como encarregado Geral da Confraria, e ora A.;
· A A. que á data 1946 tinha a denominação de ASILO DAS VELHINHAS DE PALHAVÃ, detinha em Ruínas, o que hoje é a Confraria aqui designada por A. foi todo reconstruído pelo pai do R. e outros já falecidos;
· Ora, como não TINHA MEIOS FINANCEIROS PARA RETRIBUIR O TRABALHO PRESTADO E ERA ESCASSO O PAGAMENTO DE salários, aquela data, a direcção, representada pela irmã IS..., deu o terreno onde hoje se encontra a construído o referido imóvel em causa, ASSIM COMO UMA ÁREA DE TERRENO CONTIGUA PARA QUE O ENTÃO, JG..., PAI FALECIDO, TAMBÉM PUDESSE AÍ PLANTAR ALGUM DO SUSTENTO PARA OS SEUS;
· Sendo que, só por lapso, e pela boa fé praticada, e descuido, o pai do R. o JG... não procedeu ao registo da sua propriedade;
· Pelo que nunca existiu qualquer contrato de arrendamento, verbal ou escrito, como nunca houve qualquer transmissão de arrendamento porque este nunca existiu;
· Aliás, o A. sempre actuou perante o R. e o pai do R. o JG... como se de um legitimo proprietário se tratasse;
· Face a tudo o alegado, e não tendo nunca existido nenhum contrato de arrendamento escrito, ou verbal, quer na pessoa do pai do R. o José Gomes quer na pessoa do R., não tem a A. qualquer direito á sua pretensão de resolução de contrato de arrendamento por o mesmo nunca ter existido;
· A conduta da Autora é contrária aos ditames de boa fé, tanto mais que sabem que para além do decurso de mais de duas dezenas de anos no caso concreto cerca de 50 anos, sobre os factos, os mesmos foram consentidos e autorizados por quem era proprietário do prédio;
· Sendo assim ilegítimo o exercício dos direitos pretendidos pela A., tanto quanto decorre do artigo 334.º do código Civil;
· Reconvencionalmente, por mera cautela de patrocínio o R. invoca além do mais, o instituto da Acessão;
· A Autora alega que o R. é seu arrendatário, quando na verdade o imóvel existente uma “moradia de família” com terreno de logradouro, foi construída em 1946, pelo pai do R. do qual o mesmo herdou, tendo sempre lá nascido e vivido até hoje;
· Tal construção foi edificada de boa fé, com pleno conhecimento e consentimento do A., sendo certo que desde o início da construção até hoje já lá vão mais de 50 anos;
· De qualquer forma o R. e seu falecido pai JG..., estavam e sempre estiveram de boa é, porque estavam ao tempo da construção autorizados e avalizados pela A.;
· Tal edificação esta construída e incorporada no solo de forma definitiva, e tais obras como já foi dito foram executadas a expensas exclusivas do pai do R. e posteriormente toda a manutenção e substituição por materiais mais modernos foi sempre a expensas exclusivas do R.:
· O valor da construção é muito superior ao valor da parcela de terreno que ela ocupa, estando avaliado o imóvel á volta, no valor de mercado imobiliário de compra e venda, por cerca de 300.000.00 Euros para mais do que para menos;
· o terreno sobre o qual está edificado o imóvel tem 170 m2 x 120,60 = 2.050,20 euros, valor que a Confraria teria que receber.
Conclui, nos seguintes termos:
“Termos em que deve a presente acção ser julgada improcedente por não provada, e, consequentemente serem o R. absolvido dos pedidos contra si formulados.
Se assim não se entender, o que por hipótese académica se concebe:
I- Deve a Reconvenção ser julgada procedente por provada e consequentemente,
a) Ser reconhecido judicialmente que o prédio, construído pelo pai do R. e ora do R., foi constituído por usucapião.
b) Ser reconhecido que a parcela de terreno que se venha a apurar ser propriedade do A. e sobre a qual se encontra construído o imóvel, adveio à propriedade destes por Acessão Industrial Imobiliária e em consequência seja ao R. reconhecido o direito de haver para si a propriedade de tal parcela de terreno, mediante o pagamento de justa indemnização, no valor de 2.050,20, Euros conforme alegado em reconvenção articulado 8º.
c) Declarar-se que o valor da parcela de terreno que venha a apurar-se ser propriedade do A. parcialmente ocupado pelo R. é de 102,60 Euros o metro quadrado, sendo o valor da indemnização calculado nesses termos, conforme articulado em 8º.
Independentemente da procedência ou não improcedência dos pedidos acima formulados serem os A. condenados a:
a)Reconhecerem o direito de propriedade do R. ao prédio identificado no artigo 1º da p.i. correspondente Rua ... …, Carnide, Lisboa, identificado na p.i .como nº 45.
b)Absterem se de praticar quaisquer actos lesivos que afectem o exercício do direito de propriedade do R.”.
3 – Conforme fls. 59 a 67, veio a Autora/Reconvinda apresentar réplica, na qual:
· pugnou pela inadmissibilidade legal da reconvenção;
· impugnou os factos aduzidos reconvencionalmente, requerendo que a mesma seja julgada improcedente;
· reiterou a existência de um contrato de arrendamento com o pai do Réu;
· suscitou a existência de abuso de direito por parte do Réu, na modalidade de venire contra factum proprium;
· invocou a litigância de má fé por parte do Réu.
Concluiu, nos seguintes termos:
a. não deve ser admitida a Reconvenção deduzida pelo Réu por legalmente inadmissível; ou,
b. deve a Reconvenção ser considerada improcedente por não provada, procedendo, consequentemente, a Réplica apresentada;
c. deverá a excepção de abuso de direito ser julgada procedente, por provada e, em consequência, deverá o Réu ser condenado em multa e indemnização a ser paga à Autora em valor que deve ser prudentemente arbitrada por esse Tribunal;
d. ser o Réu condenado como litigantes de má-fé no pagamento de uma multa, e de uma indemnização a pagar à Autora a calcular nos termos do n.º 1 do artigo 543.º do Código de Processo Civil”.
4 – Por despacho de 16/09/2016, o Sr. Juiz a quo – cf., fls. 120 -, convidou a Autora a apresentar, querendo, nova petição inicial, na qual procedesse á devida identificação do objecto despejando, o que a mesma veio fazer, conforme fls. 125 a 131.
Consequentemente, veio o Réu, conforme fls. 140 a 176, apresentar contestação/reconvenção, em resposta à petição inicial aperfeiçoada.
E, a fls. 181 a 192, veio a Autora/Reconvinda apresentar nova réplica, à qual respondeu o Réu/Reconvinte, conforme requerimento de fls. 206 a 214.
5 – Procedeu-se à realização de audiência prévia, conforme actas de fls. 232 e 233 e 261 a 263, no âmbito da qual:
§ realizou-se inspecção judicial ao local – cf., auto de fls. 243;
§ admitiu-se a reconvenção deduzida;
§ fixou-se o objecto do litígio e os temas da prova;
§ apreciaram-se os requerimentos probatórios;
§ designou-se data para a realização da audiência final.
6 – Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, conforma actas de fls. 283 a 289, 291 e 292, com observância do formalismo legal.
7 - Posteriormente, em 25/10/2017, foi proferida sentença – cf., fls. 293 a 301 -, traduzindo-se a Decisão nos seguintes termos:
Em face do exposto julga-se a acção parcialmente procedente e a reconvenção improcedente e, em consequência:
- julga-se reconhecido o direito de propriedade da Autora sobre a construção com 6 divisões, incluindo cozinha e casa de banho, com entrada por uma porta metálica sem número, situada cerca de 15 metros à direita de um portão com o nº 35 de polícia, da Rua ..., Carnide, Lisboa, e que constitui uma dependência do prédio urbano sito na Rua ..., nº …, freguesia de Carnide, Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº …/…, da referida freguesia, e condena-se o Réu a restitui-la à A. livre de pessoas e bens,
- absolve-se o Réu do demais peticionado pela Autora;
- julga-se improcedente o pedido reconvencional dele se absolvendo a Autora..
Custas por A. e R. na proporção de 1/3 para a primeira e 2/3 para o segundo.
Registe. Notifique”.
8 – Inconformado com o decidido, o Réu interpôs recurso de apelação, em 24/11/2017, por referência à sentença prolatada – cf., fls. 302 a 310.
Apresentou, em conformidade, o Recorrente as seguintes CONCLUSÕES:
a) O imóvel objecto dos autos não consta quer da Certidão de Registo Predial, quer da caderneta predial do prédio urbano que é propriedade da Autora;
b) Por isso o Tribunal a quo determinou inspecção ao local, para ser concretizado o objecto dos autos, pois que a própria Autora convidada para o fazer não o conseguia descrever;
c) A construção do imóvel em discussão foi efectuada pelo pai do R, a qual se iniciou em 1946;
d) Sob terreno que lhe foi dado pelos então responsáveis do “Asilo das Velhinhas de Carnide” que veio a denominar-se Confraria ....
e) Independente de quem era o proprietário do terreno, ou dos poderes de disposição que tal veneranda pessoa possuía.
f) Nas fotografias juntas aos autos na sequência da Inspecção ao Local, é possível verificar a diferença de materiais utilizados no imóvel em causa, nomeadamente o telhado;
g) O pai do Recorrente tomou posse do terreno e da construção como seu dono e legítimo proprietário, nele residiu com sua família ininterruptamente desde 1946 até à sua morte em Dezembro de 2004;
h) Ali recebia os amigos, fazia obras à medida que a família aumentava e cultivava o terreno.
i) O Recorrente continuou a residir na casa de família até à presente data.
j) Ao contrário do que foi entendido pelo Tribunal a quo a posse do pai do Recorrente e deste não foi precária e subjacente ao contrato de trabalho;
k) Apesar de nos recibos de vencimento da generalidade dos empregados da Autora constar um item com a designação de “alojamento e alimentação”
l) É manifesto que lá era englobado custos de alimentação e alojamento, ou só de alimentação ou só de alojamento.
m) No caso do pai do Recorrente e do Recorrente o valor descontado nas suas retribuições correspondeu exclusivamente a alimentação e não a qualquer outra coisa.
n) Pelo que a sentença proferida deverá ser substituída por outra que valorize o depoimento das testemunhas e em consequência reconheça o direito de propriedade do Recorrente na qualidade de herdeiro de seu pai, JG....
o) E assim não for entendido, o que só por mera hipótese se concede, que seja a questão da propriedade do imóvel discutida noutra instância, devendo a sentença proferida consubstanciar-se tão só ao pedido de despejo formulado pela A, no sentido da improcedência deste por falta de qualquer arrendamento”.
9 – A Apelada/Recorrida Autora apresentou, em 27/12/2017, contra-alegações, nas quais formulou as seguintes CONCLUSÕES:
A – Sendo o objecto do recurso delimitado pelas Conclusões que o Recorrente apresentou a final da sua peça, resulta evidente que aquele se limita a pôr em crise o julgamento sobre a matéria de facto feito em 1ª Instância.
B – Deste modo, a pretensão do Recorrente limita-se a que este Venerando Tribunal da Relação valorize o depoimento das testemunhas por ele arroladas, alterando-se, por essa via, o elenco dos factos Provados e o elenco dos factos não provados.
C – Sucede que, nesta sua pretensão, o Recorrente não respeitou o ónus que o artigo 640º do CPC lhe impõe, ou seja,
D – O Recorrente não especificou:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes da gravação realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
E – Acresce, contudo, que não assiste qualquer razão ao Recorrente. Na verdade
F – Nenhum dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelo Recorrente e que este se encarregou de transcrever para as suas Alegações de recurso foi hábil a ilidir a presunção que resulta do registo predial a favor da Recorrida.
G – Nenhuma daquelas testemunhas foi clara e idónea, ainda que minimamente, sobre a existência de um contrato de doacção a favor do pai do Recorrente.
H – Com efeito, a ciência que vieram transmitir ao Tribunal baseou-se, sempre e sem nenhuma excepção, no que ouviram o Pai do Recorrente dizer.
I – Nenhuma das testemunhas arroladas pelo Recorrente veio a Tribunal dizer, de forma clara e indúbia, que sabia que a parcela de terreno havia sido doada ao Pai daquele pela Confraria....
J – Daí que o Tribunal “a quo” tenha decidido não julgar idónea a prova testemunhal produzida sobre os factos que foram julgados como não provados.
K - Por sua vez, o Recorrente também não logrou demonstrar (na verdade nem sequer alegou) como se operou a transmissão do invocado direito de propriedade para a sua esfera patrimonial, sendo certo que não foi herdeiro universal de seu Pai, pois a este sobreviveram, pelo menos, mais dois filhos que depuseram no julgamento como testemunhas.
L – Ao invés, as testemunhas arroladas pela Recorrida relataram, entre outros factos, ao Tribunal, que trabalharam nas obras de reparação e de beneficiação da casa, que transportaram parte dos materiais de construção usados nessas obras, encomendados e pagos pela Recorrida.
M – E que sempre ouviram o Pai do Recorrente dizer-lhes (às próprias testemunhas) que quando deixasse de trabalhar a Casa era da Confraria (testemunha AP... a 0:02:45.3).
N - Deste modo, outra não podia ter sido a decisão do Tribunal de 1ª Instância”.
Conclui, no sentido de ser confirmada a sentença apelada.
10 – O recurso foi admitido por despacho datado de 09/01/2018 – cf., fls. 349 -, como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo (após rectificação operada por despacho de fls. 352).
11 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
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II ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação do recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede determina o conhecimento das seguintes questões:

1. DA NULIDADE de SENTENÇA POR EXCESSO de PRONÚNCIA e CONDENAÇÃO em OBJECTO DIVERSO DO PEDIDO, nos quadros do artº. 615º, nº. 1, alín. d) e e), do Cód. de Processo Civil =» conclusão o);
2. DA EVENTUAL PERTINÊNCIA DA MODIFICABILIDADE DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO, nos quadros do artº. 662º, do Cód. de Processo Civil, o que implica, prima facie, a REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADAconclusões a) a n).

Aprioristicamente, conhecer-se-á acerca do aduzido pela Apelada/Autora/Reconvinda nas contra-alegações, no sentido do recurso do Recorrente/Réu/Reconvinte não ter observado o ónus imposto pelo artigo 640º, nº. 1, do Cód. de Processo Civil.
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III - FUNDAMENTAÇÃO

A –
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença recorrida/apelada, foi considerado como PROVADO o seguinte: (procede-se à correcção dos lapsos de redacção):


Encontra-se inscrita junto da C.R.P. pela Ap.1 de …. a aquisição a favor da Autora, por compra a Jean Gabriel Ponymayon do prédio urbano aí descrito sob o nº … da freguesia de Carnide, sito em Carnide, Rua ... números … a …, composto de edifício com 2 pavimentos de construção antiga da qual fazia parte uma antiga igreja, terras de semeadura com 3 poços, uma nora, árvores e fruto, uma faixa de terreno com 12 oliveiras e 4 casas abarracadas com os números 33 a 41 e respectivos anexos.

No prédio urbano acima referido existe uma construção com 6 divisões, incluindo cozinha e casa de banho que se encontra encostada a outra dependência do mesmo prédio e que constitui um pavilhão, construção essa que tem entrada por uma porta metálica sem número situada a cerca de 15 metros à direita do portão com o número … da Rua ..., Carnide, Lisboa.

A construção referida no número anterior consiste na denominada como residência do motorista na caderneta predial junto a fls. 6 e 7, e não tem número de polícia.

A referida construção não possui contadores de água e electricidade.

Os consumos de água e electricidade são suportados pela Autora.

JG..., pai do Réu, trabalhou para a Autora desde 1948 até 21/12/2014, data em que faleceu, exercendo inicialmente funções de motorista, e posteriormente de encarregado.

Desde essa data e até à sua morte o referido JG... habitou a construção referida no número 2º, sendo descontada pela entidade patronal no valor do respectivo salário mensal uma verba destinada a alojamento e géneros e posteriormente a alojamento e a alimentação.

O referido JG... faleceu no estado de viúvo deixando além do Réu outros filhos.

O Réu voltou a habitar na construção referida no número 2º com o seu pai antes do falecimento deste.
10º
O Réu celebrou em 31/12/2005 contrato de trabalho com a A., o qual se encontra materializado no documento de fls. 47 a 52.
11º
No vencimento do Réu era descontada pela entidade patronal no valor do respectivo salário mensal uma verba destinada a alojamento e a alimentação, o que sucedeu pelo menos até Agosto de 2013.


Na mesma sentença, foi CONSIDERADA NÃO PROVADA, a seguinte factualidade (procede-se à correcção dos lapsos de redacção, inexistindo facto 11º não provado):


O imóvel descrito no número 1º é composto por várias dependências, nomeadamente residência do capelão, residência do motorista, carpintaria, refeitório, para operários, vacaria, casa do hortelão, dormitório de empregados, lagar, garagem e edifício anexo.

Todas estas dependências que no conjunto somam 1500 metros quadrados de área bruta, acham-se implantadas, com maior ou menor antiguidade na área total de terreno que tem 16 500 metros quadrados.

O acesso físico a cada uma destas dependências faz-se exclusivamente pelas portas do terreno atravessando o logradouro do edifício principal.

Em data que a Autora não consegue precisar esta deu de arrendamento ao pai do Réu para fins habitacionais a construção descrita no número 2º, sendo a renda mensal a pagar através de desconto no vencimento e a partir de 2014 por transferência bancária.

Actualmente a renda é de 100,00 euros por mês.

As rendas vencidas e não pagas totalizavam à data da propositura da acção 1 000,00 euros.

O Réu sempre habitou a construção descrita no número 2º como se a tivesse herdado do seu pai.

Todos os melhoramentos e manutenção da mesma foram feitos a expensas do pai do Réu e depois da morte deste são feitas pelo Réu que nunca deixou de lá viver.

Em 1946 foi dada ao pai do Réu uma parcela de terreno para ele aí edificar a sua casa, o prédio cuja entrega é pedida nestes autos, como forma de pagamento pelos serviços prestados que a Autora não tinha meios financeiros para retribuir, que se estenderam muito além da sua função como encarregado geral da Autora, referindo-se à reconstrução pelo pai do Réu e por outros já falecidos do então denominado Asilo das Velhinhas de Carnide, que se encontrava em ruínas.
10º
A construção descrita no número 2º foi realizada em 1946, com o consentimento e a autorização da irmã IS... que em 1946 exercia a direcção da Autora.
12º
O Réu herdou a construção descrita no número 2º com terreno de logradouro do seu pai.
13º
O terreno no qual está edificada a construção descrita no número 2º tem 170 metros quadrados.
14º
A construção descrita no número 2º tem o valor de mercado de cerca de 300 000,00 euros.
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B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

I) da NULIDADE da SENTENÇA, por preenchimento das causas enunciadas na 2ª parte, da alínea d),e 2ª parte da alínea e), do nº. 1, do artº. 615º, do Cód. de Processo Civil (excesso de pronúncia e condenação em objecto diverso do pedido) conclusão o)

Sob a alínea o) das Conclusões recursórias apresentadas, aduz o Apelante Réu que ainda que não se entenda pela modificação da matéria de facto impugnada, “que seja a questão da propriedade do imóvel discutida noutra instância, devendo a sentença proferida consubstanciar-se tão só ao pedido de despejo formulado pela Autora, no sentido de improcedência deste por falta de qualquer arrendamento”.
Em consonância, e no corpo alegacional, já havia o Apelante aduzido que se o Tribunal a quo entendesse “que não tinha sido efectuada prova bastante para declarar a propriedade do pai do R. e consequentemente deste, deveria ter-se abstido de reconhecer a propriedade a qualquer uma das partes e pronunciar-se tão só quanto ao pedido da A. de despejo que obviamente teria que improceder dada a inexistência de qualquer arrendamento”.
Ora, ao pugnar pela limitação de conhecimento da sentença apelada ao pedido de despejo formulado pela Autora, e abstenção de reconhecimento do direito de propriedade das partes, ainda que de forma implícita, o Apelante acaba por invocar a nulidade da sentença proferida, aludindo ao conhecimento de questão que o Tribunal não deveria ter conhecido e á condenação em objecto divergente do constante do petitório.

Vejamos.
 
Enunciando as causas de nulidade da sentença, prescrevem as alíneas d) e e), do nº. 1, do artº. 615º, ser “nula a sentença quando:
d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”.
Por sua vez, o nº. 2, do artº. 608º, prevendo acerca das questões a resolver e sua ordem, referencia que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Por sua vez, estipulando acerca dos limites da condenação, referencia o nº. 1, do artº. 609º, igualmente do Cód. de Processo Civil, que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”.

No regime jurídico das nulidades dos actos decisórios releva “a divergência entre o que é objectivamente praticado ou declarado pelo juiz, e o que a lei determina ou o que resultou demonstrado da produção de prova”. Estamos no campo do error in procedendo, que se traduz “na violação de uma disposição reguladora da forma (em sentido amplo) do ato processual: o ato executado é formalmente diferente do legalmente previsto. Aqui não se discute se a questão foi bem julgada, refletindo a decisão este julgamento acertado – por exemplo, é irrelevante que a sentença (à qual falte a fundamentação) reconheça a cada parte o que lhe pertence (suum cuique tribuere)[2] [3].
Assim, nas situações ou manifestações mais graves, o error in procedendo fere o acto de nulidade, estando-se perante vícios do acto processual formais, pois os “vícios substanciais, como por ex., os cometidos na apreciação da matéria de fundo, ou na tramitação do processo, são objecto de recurso, não se inserindo na previsão normativa das nulidades[4].
A diferenciação ocorre, assim, por referência ao error in judicando, que “é um vício de julgamento do thema decidendum (seja este de direito, processual ou material ou de facto). O juiz falha na escolha da norma pertinente ou na sua interpretação, não aplicando apropriadamente o direito – dito de outro modo, não subsume correctamente os factos fundamento da decisão à realidade normativa vigente (questão de direito) -; ou falha na afirmação ou na negação dos factos ocorridos (positivos ou negativos), tal como a realidade histórica resultou demonstrada da prova produzida, havendo uma divergência entre esta demonstração e o conteúdo da decisão de facto (questão de facto). Não está aqui em causa a regularidade formal do ato decisório, isto é, se este satisfaz ou não as disposições da lei processual que regulam a forma dos atos. A questão não foi bem julgada, embora a decisão – isto é, o ato processual decisório – possa ter sido formalmente bem elaborada.
A decisão (ato decisório) que exteriorize um error in judicando não é, com este fundamento, inválida. O meio adequado à sua impugnação é o recurso, sendo o objecto deste o julgamento em que assenta a pronúncia. Confirmando-se o julgamento, a decisão é mantida; no caso oposto, é, por consequência, cassada, ou revogada e substituída – dependendo do sistema de recursos vigente[5].

As nulidades de sentença – cf., artigos 615º e 666º -, integrando, juntamente com as nulidades de processo – artigos 186º a 202º -, “o género das nulidades judiciais ou adjectivas”, distinguem-se, entre si, “porquanto, às primeiras, subjazem desvios ao formalismo processual prescrito na lei, quer por se praticar um ato proibido, quer por se omitir uma ato prescrito na lei, quer por se realizar um acto imposto ou permitido por lei mas sem o formalismo requerido, enquanto que as segundas se traduzem na violação da lei processual por parte do juiz (ou do tribunal) prolator de alguma decisão”.
Como vício de limite, a nulidade de sentença enunciada na transcrita alínea d) divide-se em dois segmentos, sendo o segundo atinente ao excesso de pronúncia.
Neste, em correspondência com o citado 2º segmento, do nº. 2 do artº. 608º, “encontra-se vedado ao juiz conhecer de causas de pedir não invocadas ou de excepções que não sejam do seu conhecimento oficioso[6].
No excesso de pronúncia, e a nulidade daí resultante de excesso de pronúncia de facto, nas palavras de Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro [7], “não é de conhecimento oficioso, só podendo o tribunal que proferiu a decisão anular (parcialmente) a sentença com esse fundamento, sobre requerimento da parte (art. 196º).
Embora este vício seja impressivo, por representar uma ostensiva violação do matricial princípio dispositivo, é por esta mesma razão que não se justifica o seu conhecimento oficioso. Se o vencido renuncia a invocar a inadmissibilidade da pronúncia sobre o facto essencial – o que está na sua disponibilidade (art. 264º) -, sujeita-se á sua consideração pelo tribunal ad quem na base factual do julgamento de direito”.

Na pronúncia ultra petitum enunciada na transcrita alínea e), do nº. 1, do artº. 615º, ocorre violação do “princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância”, ao não serem observados “os limites impostos pelo art. 609-1, condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido[8].
Não pode, deste modo, o juiz, “ultrapassar na sentença os limites do pedido (ou dos pedidos deduzidos), em violação do princípio dispositivo. É que lhe impõe o nº. 1 do artº. 609º; a condenação em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido, ex-vi da al. e) do nº. 1 do artº 615º”.
Assim, não pode o juiz, “sob pena de nulidade, condenar ultra-petitum, ou seja, em quantidade superior ou em objecto (qualidade) diversos dos constantes do pedido”, sendo exemplo de condenação em objecto diverso o caso do “autor pedir a restituição da coisa comodatada e a sentença condenar o réu a entregar-lhe uma outra coisa em substituição daquela ou a prestar um outro facto que não o da entrega da coisa”. Bem como o exemplo de que “tendo o autor pedido o reconhecimento do seu direito de propriedade por ter adquirido, por compra, certo prédio, não pode o juiz, na sentença, reconhecer esse direito com fundamento em que o ter adquirido por sucessão, ainda que os factos em que se baseie tenham sido alegados, a outro título, no processo[9].
Ora, este “balizamento cognitivo (…) é operado pelo objeto do processo (pedido e causa de pedir) tal como definido (a título principal) pelo autor na petição inicial”.
O mesmo autor, sustentado no entendimento de Miguel Mesquita [10], advoga, no que á presente causa de nulidade concerne, o que apelida de “flexibilização do princípio do pedido”, tendo por base a necessidade de ponderação “do princípio da efectividade (eficiência/eficácia)”, bem como tendo “sempre presente o princípio da proporcionalidade, nas suas vertentes da justa medida e da proibição do excesso”.
Tal adopção determina que “seja de reconhecer ao juiz a faculdade de «sugerir (ex-officio) uma modificação do pedido» e em que, por tal, «o princípio do pedido deva ser suavizado ou mitigado» quando o autor requeira unicamente certa providência que os factos alegados e provados demonstrem revestir-se de um carácter demasiado drástico ou oneroso”.
Ora, um dos campos de intervenção do julgador situa-se ao nível dos “poderes/deveres do juiz com vista ao aperfeiçoamento dos articulados (artº 591º, nº. 1, al. c)) ou mesmo os seus poderes instrutórios dimanados do princípio do inquisitório (artº 411º)”.
Todavia, conclui-se, “«qualquer desvio, na sentença, relativamente ao pedido exigirá sempre o prévio respeito pelos princípios da cooperação, do contraditório e do dispositivo e da igualdade das partes»”, devendo sempre o tribunal “«trabalhar com base nos factos alegados, não abrindo a porta a novos factos sob pena de violação do princípio do dispositivo»[11] [12].
Deste modo, “o juiz não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pela partes; na decisão que proferir sobre essas questões, não pode ultrapassar, nem em quantidade, nem em qualidade, os limites constantes do pedido formulado pelas partes”.
Pelo que “não pode condenar em objecto diverso do que se pediu, isto é, não pode modificar a qualidade do pedido. Se o autor pediu que o réu fosse condenado a pagar determinada quantia, não pode o juiz condená-lo a entregar coisa certa; se o autor pediu a entrega de coisa certa, não pode a sentença condenar o réu a prestar um facto; se o pedido respeita á entrega duma casa, não pode o juiz condenar o réu a entregar um prédio rústico, ou a entregar casa diferente daquela que o autor pediu; se o autor pediu a prestação de determinado facto (a construção dum muro, por hipótese), não pode a sentença condenar na prestação doutro facto (na abertura duma mina, por exemplo)[13].

Ora, no caso sub júdice, a Autora CONFRARIA de ..., no que concerne á pretensão accional, configura o objecto da acção através da invocação duma relação obrigacional contratualizada com o pai do Réu – contrato de arrendamento -, na qual este teria sucedido, alegando incumprimento do ora inquilino na legal obrigação do pagamento das rendas, o que configura causa de resolução de tal vínculo contratual.
E, através da alegação de tal núcleo factual, com contornos jurídicos, tradutor duma concreta causa de pedir – cf., o nº. 4, do artº. 581º, do Cód. de Processo Civil -, formulou o competente pedido, ou seja, o efeito jurídico pretendido – cf., o nº. 3, do mesmo artº. 581º -, que, in casu, traduziu-se no pedido:
§ de resolução do contrato de arrendamento;
§ de condenação do Réu a despejar imediatamente o locado, entregando-o á Autora, livre e devoluto, nas mesmas condições em que o recebeu;
§ de pagamento das rendas vencidas e vincendas até à entrega do locado;
§ de pagamento, a título de indemnização, do valor da renda mensal em vigor, na data da resolução do contrato, por cada mês que decorra entre o trânsito em julgado da sentença e a data em que o local seja entregue;
§ de pagamento de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento de cada uma das rendas, até ao efectivo e integral pagamento.
Deste modo, através da alegação, por parte da Autora, de uma concreta causa de pedir e de um específico pedido, tradutores do objecto do processo, estabeleceu-se ou firmou-se o enunciado balizamento cognitivo a que o Tribunal a quo estava vinculado. Não podendo este, consequentemente, conhecer acerca de causas de pedir não invocadas, nem ultrapassar os limites do pedido ou pedidos deduzidos (nomeadamente, no que concerne á sua qualidade), em violação do princípio do dispositivo.
E, tal cristalização do objecto processual perdurou durante a ulterior tramitação, pois, apesar da existência de articulados aperfeiçoados, resultantes de convite do julgador, não ocorreu qualquer alteração superveniente do objecto do processo (nomeadamente a sua ampliação), nos quadros dos artigos 264º e 265º, ambos do Cód. de Processo Civil.
Deste modo, fixado o objecto do processo, incumbia ao julgador a quo respeitá-lo na decisão proferida, limitando o seu campo de conhecimento á concreta causa de pedir invocada (contrato de arrendamento alegadamente incumprido pelo arrendatário, no que concerne á obrigação do pagamento das rendas, determinando causa da sua resolução), e ao objecto fixado no petitório deduzido (resolução contratual, com consequente devolução do arrendado e pagamento das rendas, vencidas e vincendas, devidas).
Ora, apesar da nítida definição das balizas de conhecimento legalmente permitidas, a sentença apelada não as observou.
Efectivamente, a decisão sob apelo configurou e apreciou a pretensão accional deduzida como se estivéssemos perante uma acção de reivindicação ou de índole reivindicativa, no âmbito de um contencioso petitório, alicerçado, substantivamente, nos artigos 1305º e 1311º, ambos do Cód. Civil. E não, como deveria, tendo por base a concreta causa de pedir invocada, consubstanciada na relação obrigacional de arrendamento e de pretensa violação de uma das obrigações contratuais, alegadamente fundante e justificativa de resolução contratual.
Deste modo, naquela decisão, apesar de reconhecer-se que, “ao contrário do sustentado pela A., os factos apurados não permitem concluir pela existência de contrato de arrendamento entre ela e o pai do R., com a transmissão da posição de arrendatário para o R., mas na cedência para habitação da construção cuja entrega é reclamada no âmbito do contrato de trabalho celebrado inicialmente com o primeiro e posteriormente com o R. ..”, acabou por concluir-se que “dado que a A. beneficia da presunção de titularidade do direito de propriedade sobre o imóvel cuja entrega reclama por força do registo a seu favor, sendo certo que o R. não demonstrou a existência de título que legitimasse a ocupação dessa construção impõe-se a condenação do Réu na respectiva restituição (artigos 1305º e 1311º do Cód. Civil)”.
Ora, em nenhum momento a Autora enformou a causa de pedir invocada com contornos reivindicativos, sendo que a alusão á qualidade de proprietária do imóvel teve apenas por base a sua legitimação para a proposta acção de despejo.
Efectivamente, no âmbito do pedido accional, e é este apenas que ora releva, nunca esteve em causa, como questão controvertida suscitada pela Autora, a propriedade do imóvel cujo despejo foi requerido.
Pelo que, entendemos, relativamente à acção instaurada pela Autora contra o Réu, estava o Tribunal a quo impedido de conhecer daquela causa de pedir, de natureza real, não invocada, ocupando-se de questão não suscitada por aquela parte activa, assim incorrendo em excesso de pronúncia, o que configura efectiva causa de nulidade, nessa parte, da sentença recorrida.
E, nem se diga que o pedido reconvencional deduzido pelo Réu/Reconvinte altera o juízo explanado, em virtude da causa de pedir nesta sede invocada ter efectiva natureza real, traduzida na aludida aquisição prescritiva do imóvel, pedido de reconhecimento do direito de propriedade e de abstenção da Autora na prática de actos lesivos que afectem aquele afirmado direito de propriedade.
Efectivamente, a reconvenção configura-se como uma verdadeira contra-acção, em que o petitório reconvencional deduzido teve por base o facto jurídico que fundou a defesa apresentada, ou seja, a alegação de que o imóvel em causa era pertença do pai do Réu/Reconvinte, por alegadamente o ter adquirido por usucapião, tendo sido construído em terreno doado verbalmente (ou, numa outra versão, aparentemente contraditório, pretendendo a sua aquisição mediante acessão industrial imobiliária).
Todavia, a pretensão reconvencional é absolutamente distinta da pretensão accional, não se confunde com esta e estabelece um diferenciado balizamento cognitivo.

Por outro lado, para além do vício supra exposto, a sentença apelada, no âmbito do dispositivo, julga a acção parcialmente procedente e, consequentemente, julga “reconhecido o direito de propriedade da Autora sobre a construção com 6 divisões, incluindo cozinha e casa de banho, com entrada por uma porta metálica sem número, situada cerca de 15 metros à direita de um portão com o nº 35 de polícia, da Rua ..., Carnide, Lisboa, e que constitui uma dependência do prédio urbano sito na Rua ..., nº 45, freguesia de Carnide, Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº .../..., da referida freguesia”, condenando, ainda, “o Réu a restitui-la à A. livre de pessoas e bens”.
Ora, conforme resulta do supra exposto, em nenhum momento a Autora deduziu pedido de reconhecimento do seu direito de propriedade (e muito menos nos termos declarados), nem deduziu pedido de condenação do Réu na restituição daquele mesmo imóvel, nos termos igualmente declarados.
Com efeito, o que a Autora peticionou foi a entrega do imóvel, livre e devoluto, como consequência ou efeito da resolução contratual e despejo consequente, e não uma condenação de restituição de natureza ou índole reivindicativa, fundada numa presunção de propriedade assente na presunção registral.
Poder-se-ia, ainda, argumentar que o reconhecimento do direito de propriedade da Autora sob a construção configura-se como um pedido implícito, tal como normalmente acontece na acção reivindicativa, onde o autor ao peticionar a entrega da coisa, tem normalmente por implícito, o que o julgador considera, o pedido de reconhecimento do correspondente direito de propriedade.
Todavia, ainda que assim fosse, o que não resulta claro na presente acção de índole ou natureza obrigacional, tal apenas justificaria o 1º segmento do dispositivo, ou seja, a singela declaração de reconhecimento do direito de propriedade, e não já o segmento de condenação do Réu na restituição, fundando-se este, como se fundava, nos efeitos consequentes à resolução de um contrato de arrendamento, cuja existência a Autora não logrou provar.
O que significa que, para além de conhecer de causa de pedir não invocada, a sentença apelada condenou, ainda, em objecto diverso do pedido, o que configura, igualmente, causa de nulidade da sentença, nos quadros da 2ª parte, da transcrita alínea e), do nº. 1, do artº. 615º, do Cód. de Processo Civil.

Por todo o exposto, por preenchimento das causas de nulidade inscritas no 2º segmento, da alín. d) – excesso de pronúncia – e 2º segmento da alín. e) – pronúncia em objecto diverso do pedido -, julga-se parcialmente nula a sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do petitório accional, julga parcialmente procedente a acção.

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Prevendo acerca da regra da substituição ao tribunal recorrido, prescrevem os nºs. 1 e 2 do artº. 665º, do Cód. de Processo Civil, que “ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação.
2 – Se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários”.
O presente normativo abarca as, já supra apreciadas, denominadas “nulidades de sentença que se manifestam essencialmente através da falta de especificação dos fundamentos de facto ou de direito, verificação de oposição entre os fundamentos de facto ou de direito e a decisão, omissão de pronúncia ou condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido (art. 615º, nº. 1)”.
Decorre do mesmo que “ainda que a Relação confirme a arguição de alguma das referidas nulidades da sentença, não se limita a reenviar o processo para o tribunal a quo. Ao invés, deve prosseguir com a apreciação das demais questões que tenham sido suscitadas, conhecendo do mérito da apelação, nos termos do art. 665º, nº. 2.
Deste modo, a anulação da decisão (v.g. por contradição de fundamentos ou por omissão de pronúncia) não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objecto do recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nesta eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo[14].
Pelo que, pela adopção desta solução legal – regra da substituição da Relação ao tribunal recorrido -, determinar-se-á, na situação exposta no transcrito nº. 2, “e, por vezes, também na do seu nº. 1 (é, por ex., o caso da nulidade fundada em omissão de pronúncia) a supressão de um grau de jurisdição e, consequentemente, a instituição de uma instância única[15].

Pelo que, na adopção de tal regra, deverá o presente Tribunal conhecer do objecto ou mérito da apelação, só assim não o fazendo caso não dispusesse dos elementos necessários ao efeito.
O que se passa a cumprir infra.
Todavia, e aprioristicamente, urge consignar o seguinte: decide-se pela não observância da audição enunciada no nº. 3 do artº. 665º, pois, no caso concreto, perante a declaração de nulidade parcial da sentença, na parte respeitante à acção, cumpre agora conhecer apenas acerca do petitório efectivamente deduzido, ou seja, acerca da pretensão concretamente deduzida pela Autora.
O que é situação já bastamente apreciada nos autos, injustificando nova audição das partes, que apenas se configuraria com contornos dilatórios.

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 Na redacção vigente á data do imputado incumprimento [16], dispunham os nºs. 1 a 4, do artº. 1083º, do Cód. Civil, prevendo acerca do fundamento da resolução, que:
1 - Qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base em incumprimento pela outra parte.
2 - É fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente quanto à resolução pelo senhorio:
a) A violação de regras de higiene, de sossego, de boa vizinhança ou de normas constantes do regulamento do condomínio;
b) A utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública;
c) O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização para o prédio;
d) O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º;
e) A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente e onerosa ou gratuita, do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio.
3 - É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a dois meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do disposto nos n.os 3 a 5 do artigo seguinte.
4 - É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato, não sendo aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte”.
Dispõem os nºs. 2 e 3, do artº. 1084º, do mesmo diploma, acerca do modo de operar a resolução, que:
2 - A resolução pelo senhorio quando fundada em causa prevista nos n.os 3 e 4 do artigo anterior bem como a resolução pelo arrendatário operam por comunicação à contraparte onde fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida.
3 - A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês”.

Refere Albertina Pedroso [17], que no tocante à possibilidade de resolução do contrato pelo senhorio, o n.º 2 do artigo 1083.º do CC logo vem proclamar a necessidade de um incumprimento específico, uma espécie de incumprimento qualificado, na terminologia da lei, o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento.
(…) Desta sorte, a gravidade do incumprimento fundador do direito à resolução do contrato há-de aferir-se quer pela própria natureza da infracção — actuação/omissão substancialmente grave — quer pelas consequências ou efeitos que provoca — e que tornam tal incumprimento grave — quer ainda pela reiteração da conduta violadora das obrigações assumidas — que, por essa via, também é qualificável como grave —, tudo de tal forma que não seja razoavelmente exigível à outra parte a manutenção do arrendamento.
(…) A principal questão que tem sido objecto de divergência na interpretação deste elenco exemplificativo previsto no n.º 2 do artigo 1083.º do CC é a de saber se os casos seleccionados pelo legislador como hipóteses de incumprimento pelo arrendatário preenchem ou não, por si só, a cláusula geral ínsita na 1.ª parte do artigo.
Como é sabido, o preceito em referência adoptou a denominada “técnica dos exemplos-padrão”, a qual tem sido usada noutros diplomas relativamente aos quais tem sido defendido que as circunstâncias exemplificativas não são de funcionamento automático carecendo de ser enquadradas na cláusula geral.
Este é o entendimento que preconizamos porque efectivamente não consideramos que tendo o legislador optado por esta enunciação exemplificativa na sequência da exigência de um incumprimento grave, por si ou pelas suas consequências, e que por tal motivo torne inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento, a simples alegação e prova de qualquer uma das situações enunciadas possa configurar o imediato preenchimento das aludidas cláusulas gerais
Basta pensar que, se assim fosse, que razão teria o legislador para não avançar para a possibilidade de resolução extrajudicial nestes casos?
Tal opção do legislador, que impõe quanto aos fundamentos enquadrados neste n.º 2 do artigo 1083.º o recurso à acção judicial, só pode ter como justificação válida precisamente a indispensabilidade do preenchimento do conceito geral de justa causa, fazendo impender sobre o senhorio, autor na acção de despejo, o ónus da alegação e da prova (cfr. artigo 342.º, n.º 1, do CC) da factualidade subsumível, não apenas nas diferentes alíneas do n.º 2, mas também, na cláusula geral constante da 1.ª parte do n.º 2.
Na verdade, a simples alegação e prova de factos subsumíveis em qualquer uma das situações enunciadas, pode não bastar para o imediato e indispensável preenchimento da cláusula geral do n.º 1 do preceito, até porque as causas resolutivas previstas nas diversas alíneas configuram níveis de gravidade de grau muito diferente entre si, sendo que algumas das situações “eleitas” pelo legislador têm, quando objectivamente consideradas, um grau de gravidade menor do que outros fundamentos não elencados, por exemplo, as obras não autorizadas.
O que acontece quanto ao enquadramento do fundamento de resolução neste número do artigo 1083.º — precisamente mercê da consagração no mesmo de exemplos de tipo muito distinto —, é que o ónus que recai sobre a parte será mais facilmente cumprido nalguns dos casos previstos na lei do que noutros”.
Ora, no caso concreto, resulta claramente da matéria de facto fixada, não ter a Autora logrado provar, ónus que lhe incumbia – cf., o nº. 1, do artº. 342º, do Cód. Civil -, a existência do próprio contrato de arrendamento, no qual funda os pedidos de resolução e consequente despejo, condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas, condenação, a título de indemnização, do valor da renda mensal, desde a data do trânsito em julgado da sentença e a data em que o locada seja entregue e juros moratórios, vencidos e vincendos, desde a data de vencimento de cada uma das rendas até efectivo e integral pagamento.
Efectivamente, nenhuma da factualidade tradutora do alegado arrendamento mereceu prova positiva, tal como resulta dos factos não provados sob os nºs. 4º a 6º, ou seja, não se provou que “em data que a Autora não consegue precisar esta deu de arrendamento ao pai do Réu para fins habitacionais a construção descrita no número 2º, sendo a renda mensal a pagar através de desconto no vencimento e a partir de 2014 por transferência bancária”, que “actualmente a renda é de 100,00 euros por mês” e que “as rendas vencidas e não pagas totalizavam à data da propositura da acção 1 000,00 euros”.
Na realidade, conforme se refere expressamente na sentença apelada, “ao contrário do sustentado pela A., os factos apurados não permitem concluir pela existência de contrato de arrendamento entre ela e o pai do R, com a transmissão da posição de arrendatário para o R., mas na cedência para habitação da construção cuja entrega é reclamada no âmbito do contrato de trabalho celebrado inicialmente com o primeiro e posteriormente com o R.”.
Donde, refere a mesma decisão sob recurso, “a utilização do imóvel objecto dos autos, que se manteve inalterável desde que o pai do R. habitou essa casa, reveste características típicas da detenção por cedência do respectivo gozo pelo seu proprietário no âmbito de relação de trabalho subordinado”.
Pelo que, à míngua probatória da factualidade nuclear que sustenta a totalidade do petitório deduzido, a decisão só pode ser a de total improcedência da acção, o que se decide e determina.


II) Da REAPRECIAÇÃO da PROVA GRAVADA decorrente da impugnação da matéria de facto

QUESTÃO PRÉVIA:

- Do INCUMPRIMENTO do ÓNUS IMPOSTO PELO ARTº. 640º, nº. 1, do CÓD. de PROCESSO CIVIL
               
Nas contra-alegações apresentadas à apelação interposta pelo Recorrente Réu/Reconvinte, alega a Autora/Reconvinda que aquele não respeitou o ónus imposto pelo artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, ainda que sem indicar eventuais consequências para tal incumprimento.

Decidindo:

Prevendo acerca da modificabilidade da decisão de facto, consagra o artigo 662º do Cód. de Processo Civil os poderes vinculados da Relação, estatuindo que:
“ 1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”.

Para que tal conhecimento se consuma, deve previamente o recorrente/apelante, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus a seu cargo, plasmado no artigo 640º do mesmo diploma, o qual dispõe que:
“1 -Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
Presentemente, o sistema vigente nas situações em que o recurso de apelação envolve a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, implica que “relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos”.
E, ainda que “em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões”.
Acrescentando, ainda, dever ainda o Recorrente deixar “expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente” (sublinhado nosso).
Pelo que deve ocorrer rejeição, total ou parcial, do recurso respeitante à impugnação da matéria de facto, sempre que se verifique “falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº. 1, al. a))”, servindo igualmente esta especificação “para delimitar o objecto do recurso”.
Bem como deve ainda ocorrer igual rejeição, total ou parcial, na “falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”.
Assim, ainda que se reconheça dever interpretar-se tais exigências legais à luz de um necessário critério de rigor, como consequência ou decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, se “em lugar de uma sincopada e por vezes estéril localização temporal dos segmentos dos depoimentos gravados, o recorrente optar por transcrever esses trechos, ilustrando de forma mais completa e inteligível os motivos das pretendidas modificações da decisão da matéria de facto, deve considerar-se razoavelmente cumprido o ónus de alegação neste campo. A indicação exacta das passagens das gravações não passa necessariamente pela sua localização temporal, sendo a exigência legal compatível com a transcrição das partes relevantes dos depoimentos[18].
Acrescenta, todavia, o mesmo Ilustre Conselheiro, importar que “não se exponenciem os requisitos formais a um ponto que seja violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador”. E, citando douto aresto do STJ de que foi Relator [19] aduz ser “necessário que a verificação do cumprimento do ónus de alegação regulado no art. 640º seja compaginado com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, atribuindo maior relevo aos aspectos de ordem material”, aludindo, ao nível do Supremo Tribunal de Justiça, a uma “tendência consolidada no sentido de não se exponenciarem os efeitos cominatórios previstos no art. 640º”.
 Lavrou, então, o mesmo Relator em tal aresto sumário, no sentido de dever “considerar-se satisfeito o ónus de alegação previsto no art. 640º, se o recorrente, além de indicar o segmento da decisão da matéria de facto impugnado, enunciar a decisão alternativa sustentada em depoimento testemunhal que identificou e localizou”, sendo que “na verificação do cumprimento do ónus de alegação previsto no art. 640º, os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade” (sublinhado nosso).
O mesmo Acórdão referencia jurisprudência do STJ, no pugnado sentido, donde se realça, por atinente ao caso sub júdice, a seguinte:
- datado de 09/07/2015, onde se refere que “tendo o apelante, nas suas alegações de recurso, identificado os pontos de facto que considerava mal julgados, por referência aos pontos da base instrutória, indicado o depoimento das testemunhas que entendeu mal valorados, fornecido a indicação da sessão na qual foram prestados e o início e o termo dos mesmos, apresentado a sua transcrição e referido qual o resultado probatório que deveria ter tido lugar, relativamente a cada quesito e meio de prova, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar” (sublinhado nosso);
- de 19/02/2015, no qual se referencia que “enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já o mesmo se não se afigura que a especificação dos meios de prova ou a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações” (sublinhado nosso).
Acrescenta, ainda, o Ilustre Autor ser frequentemente constatável “que uma leitura concertada das alegações, e não apenas das respectivas conclusões, permite afirmar o preenchimento dos requisitos mínimos a que deve obedecer uma peça processual para a qual não está legalmente prevista uma estrutura rígida quer na parte da motivação, quer no segmento conclusivo”, pelo que os aspectos “fundamentais a assegurar neste campo são os relacionados com a definição clara do objecto da impugnação (que se satisfaz seguramente com a clara enunciação dos pontos de facto em causa), com a seriedade da impugnação (sustentada em meios de prova que são indicados ou em meios de prova oralmente produzidos que são explicitados) e com a assunção clara do resultado pretendido[20].
Deve ter-se ainda em consideração, realçando-se, o sumariado no douto aresto do STJ de 29/10/2015 [21], no qual se refere que “face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta actualmente do nº1 do art. 640º do CPC; e um ónus secundário – tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas – indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes (e que consta actualmente do art. 640º, nº2, al. a) do CPC).
2. Este ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando – apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação é complementada com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso (sublinhado nosso).
Referencie-se, igualmente, o sumariado em aresto do mesmo Alto Tribunal de 19/02/2015 [22], no sentido de que “a especificação dos concretos meios probatórios convocados e a indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova, sem prejuízo do seu poder inquisitório sobre toda a prova produzida que se afigure relevante para tal reapreciação, como decorre do preceituado no n.º 1 do artigo 662.º do CPC”.
Assim, “é em vista dessa função que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do CPC”, pelo que “nessa conformidade, enquanto que a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória”.
Pelo que “tendo o recorrente, nas conclusões recursórias, especificado os concretos pontos de facto que impugna, com referência às respostas dadas aos artigos da base instrutória, indicando também aí a decisão que, no seu entender, deve sobre eles ser proferida, enquanto que só no corpo das alegações especifica os meios de prova convocados e indica as passagens das gravações dos depoimentos em foco, têm-se por preenchidos os requisitos formais do ónus de impugnação exigidos pelo art.º 640.º, n.º 1 e 2, alínea a), do CPC” (sublinhado nosso).
Por fim, referencie-se, ainda, o sumariado no douto aresto do STJ de 01-10-2015 [23], no sentido de que:
“I - No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe.
II - Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso.
III - Não existe fundamento legal para rejeitar o recurso de apelação, na parte da impugnação da decisão da matéria de facto, numa situação em que, tendo sido identificados nas conclusões os pontos de facto impugnados, assim como as respostas alternativas propostas pelo recorrente, não foram, contudo, enunciados os fundamentos da impugnação nem indicados os meios probatórios que sustentam uma decisão diferente da que foi proferida pela 1.ª instância, requisitos estes que foram devidamente expostos na motivação.
IV - Com efeito, o ónus a cargo do recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não exige que as especificações referidas no seu nº 1, constem todas das conclusões do recurso, mostrando-se cumprido desde que nas conclusões sejam identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação.
Do exposto, resulta, assim, ser legítimo concluir-se, da articulação ou concatenação do prescrito nos artigos 639.º e 640.º, do Cód. de Processo Civil, que o ónus principal a cargo do recorrente exige, pelo menos:
§ a indicação nas conclusões recursórias, com precisão, dos concretos pontos de facto da sentença que são objecto de impugnação, ou seja, cuja modificação é pretendida pelo recorrente, sem o que não é possível ao tribunal de recurso sindicar eventuais erros no julgamento da matéria de facto;
§ a indicação expressa, na motivação ou corpo alegacional, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, ou seja, relativamente a cada questão de facto impugnada.

Ora, compulsadas as conclusões recursórias apresentadas pelo Réu/Reconvinte/Apelante, constata-se não constarem das mesmas qualquer indicação, por mínima que seja, dos concretos pontos de facto da sentença apelada que são objecto de impugnação, isto é, dos pontos factuais que o Recorrente pretende ver modificados.
Por outro lado, analisado o corpo alegacional ou motivação, não se vislumbra, minimamente, que do mesmo conste, relativamente a cada segmento da impugnação ou questão factual impugnada, qual o resultado pretendido, ou seja, qual o facto que deveria passar a constar como provado ou não provado.
Pelo que, na constatação de tais omissões, e sendo certo que estas não permitem o apelo a despacho de aperfeiçoamento [24], impõe-se, nos termos das alíneas a) e c), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, a total rejeição da apelação interposta, relativamente à impugnação da matéria de facto.

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Donde, em guisa conclusiva, decide-se o seguinte:
I) nos termos das alíneas a) e c), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, relativamente à impugnação da matéria de facto, pela total rejeição da apelação interposta;
II) na parcial procedência do recurso apresentado pelo Apelante/Recorrente/Réu /Reconvinte FG...:
§ por preenchimento das causas de nulidade inscritas no 2º segmento, da alín. d) – excesso de pronúncia – e 2º segmento da alín. e) – pronúncia em objecto diverso do pedido-, julga-se parcialmente nula a sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do petitório accional, julga parcialmente procedente a acção;
§ por aplicação da regra da substituição, decide-se pela total improcedência da acção;
III) determinando, consequentemente, alteração do DISPOSITIVO, que passará a ter a seguinte redacção:
Em face do exposto, julga-se a acção e a reconvenção totalmente improcedentes e, em consequência:
- absolve-se o Réu dos pedidos deduzidos pela Autora;
- absolve-se a Reconvinda/Autora dos pedidos formulados pelo Reconvinte/Réu”.

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Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, a tributação opera-se nos seguintes termos:
Quanto à acção:
- custas da acção e reconvenção, respectivamente, a cargo da Autora e Reconvinte, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que este goza;
Quanto ao recurso:
- custas a cargo do Recorrente/Apelante e Recorrida/Apelada, em idêntica proporção, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que aquele goza.
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IV. DECISÃO

Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa o seguinte:
I) nos termos das alíneas a) e c), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, relativamente à impugnação da matéria de facto, pela total rejeição da apelação interposta;
II) na parcial procedência do recurso apresentado pelo Apelante/Recorrente/Réu/Reconvinte FG..., em que figura como Apelada/Recorrida/Autora/Reconvinda CONFRARIA de ...:
§ por preenchimento das causas de nulidade inscritas no 2º segmento, da alín. d) – excesso de pronúncia – e 2º segmento da alín. e) – pronúncia em objecto diverso do pedido-, julgar parcialmente nula a sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do petitório accional, julga parcialmente procedente a acção;
§ por aplicação da regra da substituição, decide-se pela total improcedência da acção;
III) determinando, consequentemente, alteração do DISPOSITIVO, que passará a ter a seguinte redacção:
Em face do exposto, julga-se a acção e a reconvenção totalmente improcedentes e, em consequência:
- absolve-se o Réu dos pedidos deduzidos pela Autora;
- absolve-se a Reconvinda/Autora dos pedidos formulados pelo Reconvinte/Réu”.

Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, a tributação opera-se nos seguintes termos:
Quanto à acção:
- custas da acção e reconvenção, respectivamente, a cargo da Autora e Reconvinte, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que este goza;
Quanto ao recurso:
- custas a cargo do Recorrente/Apelante e Recorrida/Apelada, em idêntica proporção, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que aquele goza.

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Lisboa, 04 de Abril de 2019

Arlindo Crua - Relator

António Moreira – 1º Adjunto
 
Lúcia Sousa – 2ª Adjunta
(Presidente)

[1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
[2] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2014, 2ª Edição, Almedina, pág. 599.
[3] Traduzem estas nulidades da sentença a “violação da lei processual por parte do juiz (ou do tribunal) prolator de alguma decisão”, pertencendo ao género das nulidades judiciais ou adjectivas – cf., Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, pág. 368.
[4] Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, 1982, pág. 102.
[5] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, ob. cit, pág. 600 e 601.
[6] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372.
[7] Ob. cit., pág. 606.
[8] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 737.
[9] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372.
[10] RLJ, Ano 143º, Novembro-Dezembro de 2013, nº. 3983, pág. 129 a 151.
[11] Ferreira de Almeida, ob. cit., pág. 372 a 375.
[12] Acerca da disponibilidade da tutela jurisdicional a operar pelo princípio do dispositivo, através das modificações objectivas da instância, por alteração do pedido e da causa de pedir, nos termos dos artigos 264º e 265º, ambos do Cód. de processo Civil, cf., José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., Vol. 1º, 4ª Edição, pág. 40.
[13] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, pág. 67 e 68.
[14] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, 4ª Edição, Almedina, pág. 322.
[15] Ferreira de Almeida, Ob. Cit., pág. 485.
[16] Redacção da Lei nº. 31/2012, de 14/08.
[17] A Resolução do Contrato de Arrendamento no Novo e Novíssimo Regime do Arrendamento Urbano, artigo publicado na revista “JULGAR”, n.º 19, Janeiro de 2013, págs. 45-47.
[18] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 155, 156, 158 e 159.
[19] Acórdão datado de 28/04/2016, disponível in www.dgsi.pt .
[20] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 164 e 165.
[21] Relator: Lopes do Rego, Processo nº. 233/09.4TBVNG.G1.S1, in www.dgsi.pt .
[22] Relator: Tomé Gomes, Processo nº. 299/05.6TBMGD.P2.S1, in www.dgsi.pt .
[23] Processo n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1, in www.dgsi.pt .
[24] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 157.