Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
177746/14.0YIPRT-A.L1-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: INJUNÇÃO
FÓRMULA EXECUTÓRIA
JUSTO IMPEDIMENTO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/22/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Após ter sido aposta fórmula executória no requerimento de injunção não pode ser admitida oposição à injunção, ainda que com invocação de justo impedimento da sua dedução no prazo legal.
II. No caso previsto em I o justo impedimento deverá ser declarado, com celeridade, perante o BNI, e apreciado pelo juiz de instrução em sede de oposição à execução (art.º 857.º n.º 2 do CPC).
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes, no Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


1.Em 19.11.2014 N, S.A. apresentou no Balcão Nacional de Injunções requerimento de injunção contra Maria, pedindo que a requerida fosse notificada para efetuar o pagamento da quantia total de € 7.810,16, emergente de transação comercial consubstanciada num contrato de prestação de serviços de bens e telecomunicações, celebrado em 23.5.2009.

2.Foi enviada à requerida notificação por carta registada com aviso de receção, que veio devolvida.

3.O Balcão Nacional de Injunções procedeu à averiguação, junto das bases de dados da Segurança Social e das Finanças, do domicílio da requerida, após o que procedeu à sua notificação por via postal simples, a qual foi depositada pelo distribuidor postal, no respetivo recetáculo postal, em 13.01.2015.

4.Em 09.02.2015 foi aposta fórmula executória no requerimento de injunção, pelo secretário de justiça.

5.Em 16.02.2015 a requerida apresentou oposição à injunção, aí referindo, como “questão prévia – da notificação”, o seguinte:

1.º-A requerida é uma empresária em nome individual e que detém, atualmente, quatro estabelecimentos comerciais de cabeleireiro, em Lisboa (Centro Comercial de O, Centro Comercial da B, Centro Comercial da P e Centro Comercial de O), os quais têm como firma A Cabeleireiros.
2.º-E foi, precisamente, em três desses estabelecimentos que a requerente prestou serviços à requerida.
3.º-A requerida detém o seu domicílio profissional na rua (…), em Moscavide, morada onde foi rececionada a notificação do presente procedimento de injunção.
Acontece, porém, que
4.º-O presente procedimento de injunção foi intentado em 9 de janeiro do corrente ano.
5.º-E a sua notificação foi rececionada nos serviços da requerida no dia 13 de janeiro do corrente ano, por uma funcionária a qual entregou ao Senhor Natalino (…), funcionário responsável pela documentação na empresa da requerida.
6.º-Contudo, a requerida não foi, nesse mesmo dia (13 de janeiro), informada da receção da notificação.
Isto porque,
7.º-A requerida encontrava-se em convalescença fruto de um acidente de viação sofrido no mês de novembro do pretérito ano, cfr. Doc. 1 que se junta e se dá por integralmente reproduzido.
8.º-O que impossibilitou da sua deslocação aos escritórios e diversos estabelecimentos comerciais que possui.
9.º-Tendo apenas tido conhecimento no dia 2 de fevereiro do corrente ano, quando retomou a sua atividade e quando teve uma reunião com o Sr. Natalino (…), cfr. Doc. 2 que se junta e se dá por integralmente reproduzido.
10.º-Assim, o prazo para a requerida contestar, apenas começou a contar apenas nesse dia 2 de fevereiro.
11.º-Pelo que a presente oposição terá de ser admitida por tempestiva.”

No final da oposição a requerida indicou, para prova da aludida questão prévia, duas testemunhas, “a apresentar”.

6.Em 18.02.2015 a Sr.ª secretária de justiça do BNI rejeitou a oposição, por a considerar extemporânea, encontrando-se o processo findo, com a fórmula executória aposta em 09.02.2015.
7.Em 05.3.2015 a requerida reclamou do despacho referido em 6, nos termos constantes a fls 34 a 37, em que, após afirmar que fora citada em 13.01.2015 e que em 16.02.2015 havia enviado oposição à injunção, alegou que a Sr.ª secretária não tinha competência funcional para apreciar o mérito jurídico das questões suscitadas e terminou pedindo que a oposição à injunção fosse aceite pelo BNI e remetida à distribuição, “para posterior análise e verificação do justo impedimento alegado, como questão prévia da oposição apresentada”.
8.Por despacho judicial datado de 19.3.2015 foi ordenada a remessa dos autos à distribuição, para apreciação.

9.Tendo os autos sido distribuídos ao Juiz 4 da Secção Cível, Instância Local de Loures, Comarca de Lisboa Norte, em 05.10.2015 foi proferido o seguinte despacho:
Fls. 18 e ss:: A Requerida apresenta reclamação sobre o acto de recusa de oposição à injunção.
Efectivamente, como informa a Sra. Secretária de Justiça, o prazo para a oposição havia expirado em 09/02/2015, tendo sido aposta fórmula executória no requerimento de injunção e tendo esse mesmo acto sido notificado àquela, em 12/02/2015, quando foi recebida, naquele balcão, uma oposição, via fax, em 16/02/2015.
Em primeira linha, é notório que a oposição apresentada é absolutamente extemporânea.
Verifica-se não existir qualquer irregularidade na citação efectuada por aquele Balcão que, como a própria citada admite, ocorreu mais de um mês antes do envio da oposição (sendo o prazo legal para a oposição de 15 dias, nos termos do artigo 1.° do Regime instituído pelo Decreto-Lei n.° 269/98, de 1 de Setembro).
Por outro lado, nesse requerimento de oposição, ao contrário do que agora pretende a Reclamante, não é invocada a existência de qualquer justo impedimento, qua tale, sendo apenas referido que a Requerida se encontrava em "convalescença", conforme documento que não se juntou, pelo que só posteriormente veio a ter conhecimento do acto de citação; mais, ainda que, sem identificação expressa daquele instituto processual, se houvesse de analisar o teor do articulado, sempre teria que se concluir que não foi alegado que a "convalescença" da Requerida a impedisse de compreender o teor da citação, correctamente realizada.
Nestes termos, nada haveria a apreciar judicialmente, mais do que em qualquer outra oposição que, dirigida aos autos, fosse extemporânea.
Assim, bem andou o BNI em apenas notificar a recusa da oposição. Nestes termos e pelo exposto, indefere-se o Requerido.
Custas a cargo da Reclamante.
Registe, notifique e devolva.”

10.A requerida apelou deste despacho, tendo apresentado alegações, em que formulou as seguintes conclusões:

1.Foi intentado a 09.01.2015, requerimento de injunção, contra a ora requerente, onde foi peticionado o pagamento da quantia de € 7.810,16, tendo pelo Balcão Nacional de Injunções sido a ora recorrente citada para que, querendo, contestasse o alegado.
2.A referida citação foi expedida para a morada rua (…), em Moscavide, a qual foi depositada na caixa postal.
3.Pelas partes não foi convencionado domicílio.
4.No prazo legal para, querendo, contestar, a requerida, ora recorrente, não esteve fisicamente, ou passou na morada onde foi depositada e recebida a citação, uma vez que tinha sofrido um acidente dois meses antes e esteve em casa, de convalescença, devido aos ferimentos sofridos e atenta a sua idade (70 anos).
5.A ora recorrente assim que regressou à sua empresa, e tomou conhecimento da correspondência, máxime a citação do Balcão Nacional de Injunções, a par de outros assuntos pendentes, a ora recorrente diligenciou no sentido de opor-se à injunção, tendo sido apresentada a oposição à injunção no dia 16.02.1015.
6.No dia 25.02.2015, a ora recorrente foi notificada do despacho, datado de 21.02.2015, de recusa, pela Secretária de Justiça do Balcão Nacional de Injunções, com fundamento na extemporaneidade na apresentação da oposição.
7.A ora recorrente reclamou do despacho a 06.2015.

8.A reclamação foi recebida, porque tempestiva, e foi apreciada pelo Tribunal a quo, o qual, por decisão final, datada de 21.09.2015 determinou a não admissão de oposição à injunção apresentada pela ora recorrente, e, em consequência, manteve a decisão proferida pelo Balcão Nacional de Injunções, fundamentando a sua decisão:
o prazo para oposição havia expirado em 09.02.2015, tendo sido aposta fórmula executória no requerimento de injunção e tendo esse mesmo ato sido notificado àquela, em 12.02.2015, quando foi recebida, naquele balcão, uma oposição, via fax, em 16.02.2015.
Em primeira linha, é notório que a oposição apresentada é absolutamente extemporânea.
Verifica-se não existir qualquer irregularidade na citação efetuada por aquele Balcão que, como a própria citada admite, ocorreu mais de um mês antes do envio da oposição (sendo o prazo legal para a oposição de 15 dias, nos termos do art.º 1.º do Regime instruído pelo D.L. 269/98 de 1 de setembro).
Por outro lado, nesse requerimento de oposição, ao contrário do que agora pretende a Reclamante, não é invocada a existência de qualquer justo impedimento, qua tale, sendo apenas referido que a Requerida se encontrava em “convalescença”, conforme documento que não se juntou um pelo que só posteriormente veio a ter conhecimento do ato de citação; mais, ainda que, sem identificação expressa daquele instituto processual, se houvesse de analisar o teor do articulado sempre teria que se concluir que não foi alegado que a “convalescença” da Requerida a impedisse de compreender o teor da citação, corretamente realizada”.

I–DA FALTA DE INVOCAÇÃO/ALEGAÇÃO PELA RECORRENTE DO JUSTO IMPEDIMENTO.

II-DO ERRO DE RACIOCÍONIO E FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO.
9.Salvo devido respeito, a decisão supra transcrita encontra-se inquinada na análise que faz da reclamação apresentada pela ora recorrente.
10.A ora recorrente na oposição à injunção alega como questão prévia, que não teve conhecimento imediato da notificação enviada pelo Balcão Nacional de Injunções, uma vez que não foi, por aqueles dias, à empresa - “O que impossibilitou da sua deslocação aos escritórios e diversos estabelecimentos comerciais que possui” (sublinhado nosso). Ou seja, a ora recorrente não teve conhecimento, em absoluto, da notificação enviada pelo Balcão Nacional de Injunção
11.O tribunal a quo fundamenta a sua decisão, a nosso ver erradamente, alegando que a ora recorrente não invocou a “existência de qualquer justo impedimento, qua tale. A ora recorrente alegou factos e requereu provas, a apresentar no momento próprio, do impedimento que motivou o exercício tardio no sue direito de defesa.
12.Outrossim, o tribunal a quo fundamenta, ainda, a sua decisão, que, caso “houvesse de analisar o teor do articulado sempre teria de concluir que não foi alegado que a “convalescença” da Requerida a impedisse de compreender o teor da citação, corretamente realizada”.
13.Ora, salvo devido respeito, uma vez mais a fundamentação do tribunal a quo padece de um erro, nomeadamente um erro de perceção de português. Isto porque não ter conhecimento da existência da citação, por desconhecer, face ao impedimento alegado, é diferente, de não perceber o conteúdo da citação, o que pressupõe, como prévio, que a ora recorrente tivesse tido conhecimento, ou melhor, tivesse recebido a citação.
A recorrente não alegou em parte alguma da oposição à injunção ou na reclamação que motivou a decisão em sindicância, que não compreendeu a citação. O que a ora recorrente alega, e pretende demonstrar, e não conseguiu, é que não teve conhecimento atempado para o exercício do seu direito de defesa, da citação enviada pelo Balcão Nacional de Injunções.

III–DO NÃO USO DA FACULDADE CONFERIDA PELO ART.º 6.º N.º 1 DO C.P.C.
14.Para prova dos factos alegados na oposição à injunção e depois vertidos e repetidos na reclamação decidida pelo tribunal a quo, a aqui recorrente pretendia a junção aos autos de um documento comprovativo da reunião onde teve conhecimento dos assuntos pendentes nas suas empresas, entre eles, a correspondência recebida e ainda não entregue, na qual estava a notificação do Balcão Nacional de Injunções, bem como a inquirição de duas testemunhas, as quais se encontravam identificadas na oposição à injunção e claramente identificadas em razão da matéria que se pretendia demonstrar.
15.Atenta a forma de processo e as regras do processo – Ação Especial de Cumprimento de Obrigações Pecuniárias, D.L. 269/98 de 1 de setembro -, esse documento terá que ser oferecido no início da audiência de julgamento e não antes, não existindo qualquer ónus para apresentação antecipada ou qualquer preclusão pela sua não apresentação apesar de referida nas peças processuais.
16.Caso assim não se entendesse, deveria o tribunal a quo o Tribunal ter feito uso da faculdade/poder que lhe é conferido no art.º 6.º n.º 1 do C.P.C. e notificar a parte para a junção do documento não junto, ainda que referido.
17.Não poderia o Tribunal a quo fundamentar a sua decisão, com base num documento não junto pela parte quando, não impendia sob a parte qualquer ónus de junção, nem a mesma foi notificada para, querendo, juntar tal documento. E, Ao não ter feito uso de tais poderes, e não ter permitido o exercício da produção de prova, o tribunal a quo decidiu erradamente.

IV–DA VIOLAÇÃO DO DIREITO Á PROVA.
18.Nos presentes autos, o tribunal a quo limitou-se a proferir uma decisão com base em alegações apresentadas pela aqui recorrente, sem permitir à mesma a produção de prova demonstrativa das suas alegações.
19.A consagração, no nº4 do artigo 20º, da Constituição da Republica Portuguesa, do direito a um processo equitativo, envolve a opção por um processo justo em cada uma das suas fases, constituindo o direito fundamental à prova (habitualmente deduzido do disposto no artigo 6º, nº3, al. d), da Convenção Europeia dos Direitos do Homem), uma das dimensões em que aquele se concretiza. O direito à prova emana da necessidade de se garantir ao cidadão a adequada participação no processo e de assegurar a capacidade de influenciar o conteúdo da decisão.
20.Ao ter decido a reclamação sem permitir a produção de prova pela ora requerente dos factos nela alegados, o tribunal a quo decidiu erradamente, violando o direito constitucional à prova, como corolário do direito à tutela judicial efetiva.

A apelante terminou pedindo que a “sentença” fosse revogada a substituída “por outra que determine:
a)Que caso se considere que a reclamação não está suficientemente instruída, o que apenas se admite como mero exercício académico, seja a ora recorrente convidada, no uso da faculdade prevista no art.º 6.º do C.P.C., para apresentar a prova que entenda suficiente para a demonstração dos factos por si alegados e, em consequência, seja a decisão reformulada.
b)Mais, deve ser revogada a decisão do tribunal a quo sobre a reclamação por indeferimento de apresentação de oposição apresentada pela ora recorrente e, permitir que a mesma produza prova que considere relevante para a demonstração dos factos alegados naquela peça processual.

A requerente contra-alegou, tendo rematado com as seguintes conclusões:
a)A Recorrente, como a própria assume, foi notificada de injunção e não deduziu oposição no prazo legal para o efeito.
b)Não provou o justo impedimento, de modo a ser admitida a praticar o ato fora de prazo.
c)Nem sequer invocou justo impedimento - sendo certo que a prova que fez foi, precisamente a de que o justo impedimento não existiu.
A apelada terminou pedindo que o recurso fosse julgado improcedente, por total ausência de fundamento, mantendo-se a decisão recorrida.

O recurso foi admitido, e bem, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO.
Suscita-se, neste recurso, a questão da admissibilidade da oposição à injunção, por alegado justo impedimento da sua apresentação no prazo legal de 15 dias.
O factualismo relevante é o que consta no Relatório supra.

O Direito.

Tendo em vista proporcionar ao credor uma forma célere e simplificada de obtenção de um título executivo, sem diminuir as garantias das partes provenientes do processo, o Dec.-Lei nº 404/93, de 10.12, instituiu a injunção, providência destinada a conferir força executiva ao requerimento de efetivação do cumprimento de obrigações pecuniárias decorrentes de contrato cujo valor não excedesse metade do valor da alçada do tribunal da 1ª instância. A forma do requerimento e a subsequente tramitação, no caso de oposição, eram decalcadas do regime do processo sumaríssimo então previsto no CPC.

O Dec.-Lei nº 269/98, de 01.9, revogou o Dec.-Lei nº 404/93 e alargou o regime da injunção às obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal da 1ª instância (art.º 1.º).

No âmbito da luta contra os atrasos de pagamento em transações comerciais, e transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva nº 2000/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29.6, o Dec.-Lei nº 32/2003, de 17.02, alargou a aplicação do regime da injunção às situações de atraso de pagamento em transações comerciais, para o efeito definidas como transações entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, que deem origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração. Tal faculdade era admitida independentemente do valor da dívida (art.º 7.º, n.º 1).

O Dec.-Lei nº 107/2005, de 01.7, alterando o art.º 1.º do Dec.-Lei n.º 269/98, alargou a aplicabilidade do regime da injunção às obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada da Relação.

Com a redação introduzida ao referido art.º 1.º pelo Dec.-Lei n.º 303/2007, de 24.8, tal limite foi reduzido para € 15 000,00.

O Dec.-Lei n.º 62/2013, de 10.5, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2011/7/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16.02, que estabelece medidas contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais, revogou o Dec.-Lei n.º 32/2003, mantendo o direito de o credor de pagamentos de transações comerciais recorrer, no caso de atraso dos pagamentos, à injunção, independentemente do valor da dívida (art.º 10.º n.º 1).

Nos termos do regime anexo ao Dec.-Lei n.º 269/98, com as alterações legais publicitadas, o devedor tem 15 dias para efetuar o pagamento do reclamado ou deduzir oposição à injunção, após ser notificado do respetivo requerimento (art.º 12.º, n.º 1).

Se, depois de notificado, o requerido não deduzir oposição, o secretário aporá no requerimento de injunção a seguinte fórmula: “Este documento tem força executiva” (n.º 1 do art.º 14.º).

No caso destes autos, tendo a requerida sido notificada em 13.01.2015, o prazo para eventual oposição à injunção terminaria em 28.01.2015. Decorrido esse prazo, sem que houvesse notícia de que a requerida pagara a quantia reclamada à requerente, nem tendo sido apresentada oposição à injunção, em 09.02.2015 a Sr.ª secretária judicial apôs no requerimento a fórmula executória. Assim, o requerente passou a dispor de um título executivo (artigos 7.º, 13.º n.º 1 alínea c), 14.º n.º 5), atingindo-se um dos objetivos possíveis do procedimento de injunção, que assim se concluiu.

Sucedeu, porém, que em 16.02.2015 a requerida apresentou oposição à injunção, alegando, como questão prévia, a existência de justo impedimento para a não apresentação da oposição dentro daquele prazo, o qual consistiria no facto de, por doença, ter permanecido afastada do local onde fora entregue a notificação, só tendo tomado conhecimento da mesma em 02.02.2015.

Como se viu supra, a Sr.ª secretária judicial do BNI não recebeu a oposição e tal decisão foi mantida por despacho judicial que apreciou a reclamação que desse despacho foi deduzida pela requerida.

Que dizer?

Cremos que a não admissão da oposição à injunção deve manter-se, mas com fundamentação diversa da do despacho recorrido.

É que, uma vez aposta a fórmula executória no requerimento de injunção, o procedimento de injunção concluiu-se. Assim, a haver justo impedimento que tenha obstado à apresentação de oposição à injunção no prazo legal, tal deve ser apenas declarado perante o BNI, conforme estipulado no art.º 857.º n.º 2 do CPC, que reza assim:
Verificando-se justo impedimento à dedução de oposição ao requerimento de injunção, tempestivamente declarado perante a secretaria de injunção, nos termos previstos no artigo 140.º, podem ainda ser alegados os fundamentos previstos no artigo 731.º; nesse caso, o juiz receberá os embargos, se julgar verificado o impedimento e tempestiva a sua declaração.”

Note-se que a declaração perante o BNI não se destina a que a existência do justo impedimento seja por este apreciada. Tem por fim apenas atestar que o requerido se encontra de boa-fé e evitar atuações dilatórias, cabendo depois ao juiz, em sede de oposição à execução, apreciar a verificação do impedimento e a tempestividade da declaração efetuada pelo requerido, admitindo-se, nesse caso, que os fundamentos da oposição à execução tenham o âmbito alargado concedido aos embargos de executado deduzidos contra execuções fundadas em títulos diversos das sentenças (cfr., neste sentido, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2012, volume II, Almedina, páginas 390 e 391; Marco Carvalho Gonçalves, “Lições de Processo Civil Executivo”, 2016, Almedina, páginas 213 a 215; Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, “A Ação Executiva Anotada e Comentada”, 2016, 2.ª edição, Almedina, páginas 562 e 563).

A admissibilidade de invocação de justo impedimento aproxima o regime jurídico da oposição à injunção nacional do da injunção de pagamento europeia, constante do Regulamento (CE) n.º 1896/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2006. Nos termos do art.º 20.º, n.º 1, do citado Regulamento, o requerido, ainda que na pendência da execução, poderá pedir a reapreciação da injunção de pagamento europeia ao próprio tribunal competente do Estado-Membro onde tiver corrido o respetivo procedimento se não tiver sido regularmente citado ou se “tiver sido impedido de contestar o crédito por motivo de força maior ou devido a circunstâncias excepcionais, sem que tal facto lhe possa ser imputável, desde que, em qualquer dos casos, actue com celeridade.”

No regime nacional da injunção, tendo sido aposta a fórmula executória no requerimento de injunção, será em sede de oposição à execução que o requerido poderá arguir o justo impedimento na dedução tempestiva de oposição à injunção e, também, os fundamentos de oposição que poderia ou quereria alegar contra a injunção no procedimento de injunção. Sendo certo que, de acordo com o juízo de inconstitucionalidade do n.º 1 do art.º 857.º do CPC, formulado pelo Tribunal Constitucional no acórdão n.º 264/2015, de 12.5, publicado no D.R., I série, n.º 110, de 08.6.2015, este n.º 2 do art.º 857.º do CPC perde parte do seu relevo, pois de acordo com aquela jurisprudência o requerido sempre poderá, em sede de oposição à execução, à semelhança das execuções fundadas em títulos diversos de sentenças, invocar fundamentos idênticos aos que poderiam ser alegados em sede de ação declarativa, ou seja, contra o requerimento de injunção no procedimento de injunção (art.º 731.º do CPC).

De todo o modo, in casu, caberá ao juiz de execução apreciar se a dedução da “questão prévia” contida na oposição à injunção apresentada pela requerida perante o BNI reúne os pressupostos de invocação de justo impedimento mencionados no n.º 2 do art.º 857.º do CPC e avaliar e aplicar o regime jurídico pertinente.

Conclui-se, assim, que a oposição à injunção não pode ser admitida, mas com fundamentação diversa da invocada pelo tribunal recorrido.

DECISÃO.

Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente, pelo que se mantém a decisão recorrida, ou seja, não se admite a oposição à injunção, embora com fundamentação diversa da decisão recorrida.
As custas da apelação são a cargo da apelante, que nela decaiu.



Lisboa, 22.9.2016


Jorge Leal
Ondina Carmo Alves
Pedro Martins