Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
14917/21.5T8LSB.L1-8
Relator: MARIA DO CÉU SILVA
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM
GARANTIA BANCÁRIA AUTÓNOMA
LEGISLAÇÃO SARS COVID 19
ACCIONAMENTO
PROIBIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/18/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1Ter o tribunal recorrido considerado válida a resolução efetuada pela senhoria em nada contribuiu para a decisão de não decretamento da providência cautelar, constituindo uma consideração dispensável, sem qualquer significado decisivo no conhecimento do mérito da causa.

2Atenta a natureza autónoma da garantia, no procedimento cautelar destinado a impedir o garante de entregar a quantia pecuniária ao beneficiário ou este de a receber, a prova da fraude ou do abuso tem de ser líquida e inequívoca.

3 O art. 12º-A da L 4-C/2020, de 6 de abril, aditado pela L 45/2020, de 20 de agosto, abrange as garantias bancárias autónomas, pois onde a lei não distingue não pode o intérprete distinguir.


Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: c)- Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa


No presente procedimento cautelar comum que G…, Lda move contra Z…, B… e  C…, a requerente interpôs recurso da decisão que julgou improcedente a providência cautelar e absolveu as requeridas de todos os pedidos contra si formulados, pedidos esses que são os seguintes:
«II.Que seja suspensa a validade das garantias bancárias seguintes, emitidas por pedido da Requerente, com cláusula de pagamento à primeira solicitação, por ser ilegal a sua execução pela Requerida Z…:
a)-Garantia bancária n.º 0...-...4-00000.. (2.............2), no valor de 139.500,00 €, emitida pelo Banco Popular Portugal, em cujo negócio bancário sucedeu o Requerido B…;
b)-Garantia bancária n.º 2..../.0...../.9..., no valor de 195.000,00 €, emitida pela Requerida C…..
III.Que seja declarado que não há lugar ao vencimento de rendas durante o período em que nas lojas …-A  e …-B, que são da Requerida Z…, por imposição da lei não foi possível exercer o comércio de artigos, respetivamente, da insígnia “R…” e da insígnia “P…”.
IV.Que seja decretada a modificação do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª. ..., ..…-A, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020, nas seguintes cláusulas que passam a ter a seguinte redação:
a)-Cláusula 3.1.-O arrendamento é celebrado pelo prazo de 10 anos, tendo o seu início na data da celebração do contrato.
b)-Cláusula 3.2.-A duração e denúncia do contrato é feita nos termos das disposições supletivas da lei.
c)-Cláusula 3.3.- A oposição à renovação do contrato é feita nos termos das disposições supletivas da lei.
d)-Exclusão das cláusulas 4.7, 4.8, 4.9 e 4.10., passando a matéria relativa à garantia do cumprimento das obrigações da Requerente a ser regulada pelas disposições supletivas da lei.
e)-Que o valor das rendas mensais, relativamente ao período entre 18-03-2020 e 31-12-2020, que não seja incluído no pedido III, seja considerado de valor nulo, seguindo juízos de equidade, em paralelismo com as disposições do artigo 168.º-A, n.º 5 da Lei n.º 2/2020, de 31 de março, mantendo-se o Requerido como responsável pelo pagamento das despesas e encargos comuns, nos termos contratuais.
f)-Que o valor das rendas mensais, relativamente ao período entre 01-01-2021 e 31-12-2021, que não seja incluído no pedido III, seja fixado no valor de 16.250,00 €, seguindo juízos de equidade, em paralelismo com as disposições do artigo 8.º-D da Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril.
V.Que seja declarada válida e eficaz a resolução do contrato, baseada na alteração anormal das circunstâncias, sem que haja lugar ao pagamento de rendas vincendas, do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª..., ..... , …-B, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020.
Subsidiariamente ao pedido formulado em V,
VI.Que seja decretada a modificação do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª..., ....., …-B, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020, nas seguintes cláusulas que passam a ter a seguinte redação:
a)-Cláusula 2.1.- O Imóvel arrendado destina-se exclusivamente a ser utilizado pela Arrendatária como loja destinada ao comércio através de estabelecimento aberto ao público.
b)-Cláusula 3.1.- O arrendamento é celebrado pelo prazo de 10 anos, tendo o seu início na data da celebração do contrato.
c)-Cláusula 3.2.- A duração e denúncia do contrato é feita nos termos das disposições supletivas da lei.
d)-Cláusula 3.3.- A oposição à renovação do contrato é feita nos termos das disposições supletivas da lei.
e)-Exclusão das cláusulas 4.7, 4.8, 4.9 e 4.10., passando a matéria relativa à garantia do cumprimento das obrigações da Requerente a ser regulada pelas disposições supletivas da lei.
f)-Que o valor das rendas mensais, relativamente ao período entre 18-03-2020 e 31-12-2020, que não seja incluído no pedido III, seja considerado de valor nulo, seguindo juízos de equidade, em paralelismo com as disposições do artigo 168.º-A, n.º 5 da Lei n.º 2/2020, de 31 de março, mantendo-se o Requerido como responsável pelo pagamento das despesas e encargos comuns, nos termos contratuais.
g)-Que o valor das rendas mensais, relativamente ao período entre 01-01-2021 e 31-12-2021, que não seja incluído no pedido III, seja fixado no valor de 11.575,00 €, seguindo juízos de equidade, em paralelismo com as disposições do artigo 8.º-D da Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril.
VII.Que face à modificação dos arrendamentos, no que diz respeito ao regime da garantia do cumprimento de cada um dos contratos, como medida cautelar e relativamente às garantias bancárias identificadas no pedido, em II, deve a Requerida Z ser constituída na obrigação de depósito nestes autos dos títulos das garantias bancárias identificadas, para entrega, à Requerente ou à Requerida Z…, conforme venha a ser decidido na decisão final deste pleito.»
Na alegação de recurso, a recorrente pediu a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que decrete a providência, tendo formulado as seguintes conclusões:
«1.ª-No julgamento da matéria de facto o Tribunal a quo debruçou-se sobre a solução jurídica de determinadas questões e resolveu-as, nessa sede, como se de factos se tratassem, de acordo com a interpretação da norma que o Tribunal fez, em desrespeito pela norma do artigo 607.º, n.º 3 e n.º 4 do CPC.
2.ª-A afirmação que consta de 107 da decisão sobre a matéria de facto resulta da aplicação das normas jurídicas que disciplinaram o estado de emergência que o Tribunal a quo menciona nos antecedentes pontos 41, 42, 46 e 48.
3.ª-A matéria que o Tribunal a quo considerou provada em 108 da decisão sobre a matéria de facto resulta da sua interpretação da situação jurídica, determinando afinal qual é o regime jurídico aplicável à situação de facto subjacente e, por isso, não observa a disciplina de elaboração da sentença, fixada nas normas do artigo 607.º, n.º 3 e n.º 4 do CPC, e deve ser eliminado do julgamento da matéria de facto.
4.ª-A matéria que o Tribunal a quo assentou em 109, 110, 111, 112, 113 e 114 da decisão sobre a matéria de facto, resulta da aplicação do direito que faz, consignando respostas que são conclusões jurídicas, não observando as normas do artigo 607.º, n.º 3 e n.º 4 do CPC, e essa matéria deve ser eliminada do julgamento da matéria de facto.
5.ª-A formulação adotada pelo Tribunal a quo em 116., da decisão sobre a matéria de facto, da forma que é feita, para além de afirmar contexto que não é factual, contém conclusões tiradas com base em regras jurídicas e não cabe por isso no julgamento da matéria de facto, nos termos das normas do artigo 607.º, n.º 3 e n.º 4 do CPC devendo esses termos ser dela excluídos.
6.ª-O facto assente em 116 deve ser expresso através da seguinte afirmação:
116.(revisto) - Por cartas datadas de 07.07.2021 e enviadas pela Requerida nesse mesmo dia, esta comunicou à Requerente a resolução dos dois Contratos de Arrendamento em análise na presente providência, com fundamento na falta de pagamento das rendas que declarou vencidas e reclamou o seu pagamento.
7.ª-A interpretação das regras do artigo 607.º, n.º 3 e n.º 4. à luz do princípio da igualdade das partes consignado no artigo 4.º do CPC, leva a concluir que não pode ser incluído na matéria de facto assente um facto declarativo sem que seja apreciada a inclusão, ou não inclusão, da declaração que pretenda constituir facto impeditivo, modificativo ou extintivo daquele primeiro facto, consoante essa declaração seja julgada provada ou não provada.
8.ª-Devem aditar-se à discriminação dos factos provados os factos enumerados seguintes, por terem sido alegados pela Requerente como factos impeditivos do efeito jurídico de outros factos alegados pela Requerida, que foram considerados na seleção de factos provados:
117(aditado) - As comunicações da Requerida Z com a pretensão de resolver os contratos de arrendamento relativos à Loja …-A e à Loja …-B foram recebidas pela Requerente em 08-07-2021, i.e., 14 dias depois da citação da Requerida Z
118(aditado) - A Requerente comunicou à Requerida Z por carta de 13-07-2021, recebida em 14-07-2021, que relativamente à loja sita na Avª..., ....., n.º …-A, a Requerente declarou no Requerimento Inicial a modificação do contrato, com efeito desde 18-03-2020, nas cláusulas que disciplinam a renda, a denúncia, a oposição à renovação e as garantias especiais do cumprimento e que sem que essa disciplina seja judicialmente fixada, não é possível estabelecer a disciplina contratual aplicável.
119(aditado) - A Requerente comunicou à Requerida Z por carta de 13-07-2021, recebida em 14-07-202, relativamente à loja sita na Avª..., ....., n.º …-B, que a Requerente declarou no Requerimento Inicial a resolução do contrato, com efeito desde 18-03-2020 e que sem que essa resolução seja judicialmente apreciada, não é possível estabelecer a efetiva existência do contrato para além daquela data e, se inexistir por ter sido resolvido, não poderá obviamente sê-lo de novo.
9.ªNa audiência de julgamento depuseram sobre matérias de natureza contabilística e financeira três testemunhas arroladas pela Requerente, entre elas o seu Contabilista Certificado.
10.ªNa fundamentação da matéria de facto a Sentença afirma que não obstante a prova testemunhal ter confirmado solidamente as quebras de faturação, custos e proveitos e as percentagens dos clientes duty free e não duty free, o depoimento de testemunhas é por si inidóneo para confirmar esses factos e que era indispensável a junção aos autos dos documentos contabilísticos que espelhem tais factos, que no seu entendimento, são o único meio de prova desses factos.
11.ªNenhuma norma exige a contabilidade escrita, para além das demonstrações financeiras anuais, como impõe o artigo 65.º. do Código das Sociedades Comerciais, compostas pelo balanço, demonstração dos resultados por naturezas, demonstração das alterações no capital próprio, demonstração dos fluxos de caixa pelo método direto e anexo definidas no artigo 11.º do Sistema de Normalização Contabilística, que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 158/2009 de 13 de julho e cujos modelos foram fixados na Portaria 986/2009 de 7 de setembro.
12.ªO tratamento contabilístico dos factos que devam ser sujeitos ao seu registo, é feito, em regime de exclusividade, e sob responsabilidade pela regularidade técnica, pelos contabilistas certificados inscritos na respetiva Ordem e a informação do Contabilista Certificado da empresa, prestada com base na contabilidade, não depende do seu suporte físico, mas da chancela desse profissional a quem o Estado conferiu competência para a planificação, organização e a coordenação da execução da contabilidade, pelo que o seu depoimento perante o Tribunal, como testemunha, deve ser especialmente qualificado, nos termos do artigo 10.º, n.º 1 do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pela Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro.
13.ªNão havendo norma que impusesse a prova por documento, não era ónus da Requerente, que alegou os factos, apresentar informações contabilísticas sob a forma de documento, tanto mais que esse documento de informação sempre seria organizado pelo Contabilista Certificado, que depôs na audiência de julgamento, como impõe a regra do artigo 516.º-1 do CPC.
14.ªA decisão sobre a matéria de facto, na parte em que considera que a prova testemunhal é insuficiente para prova de factos de natureza contabilística, relativas a dois estabelecimentos da Requerente, designadamente quebras de faturação, custos e proveitos e as percentagens dos clientes duty free e não duty free, e que considera indispensável a junção aos autos dos documentos contabilísticos que espelhem tais factos, que no seu entendimento, são o único meio de prova desses factos, viola o princípio da liberdade de prova previsto no artigo 392.º do Código Civil e a regra da livre apreciação da prova prevista no artigo 607.º-5 do CPC, visto que lhe fica subtraído o conhecimento da prova que imperativamente seja feita por documento, nos termos de outra norma, também no artigo 607.º-5 do CPC.
15.ªComo não há norma jurídica que imponha que esses dados contabilísticos sejam provados por documento, não era ónus da Requerida juntar elementos contabilísticos suportados em documento, quando esta optou pela produção de prova testemunhal pelo seu Contabilista Certificado e ao afirmar esse ónus, o Tribunal a quo impôs à Requerente uma diligência que era sua e violou a norma que impõe que determine, por sua iniciativa ou a requerimento das partes, as diligências necessárias ao apuramento da verdade, constante do artigo 411.º do CPC.
16.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 39.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, gravado, registado de 00:09:24 a 00:09:36, de 00:10:03 a 00:10:13, de 00:10:35 a 00:11:20 e de 00:11:47 a 0:12:30; o testemunho do Contabilista Certificado D…, também gravado, registado de 00:10:23 a 00:11:28; o depoimento gravado de C… registado de 00:13:30 a 00:13:51, de 00:15:10 a 00:16:15”, de 00:18:20 a 00:18:30 e a 00:18:40; e o depoimento gravado de S… de 00:07:40 a 00:08:05.
17.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 39.º do seu Requerimento inicial.
18.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 40.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, gravado, registado a 00:13:05” a 00:13:55” e a 00:13:57” a 00:14:42”; e o depoimento gravado de C… registado de 00:22:47” a 00:24:15”, de 00:25:35” a 00:26:35” e de 00:26:36” a 00:27:45”.
19.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 40.º do seu Requerimento inicial.
20.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 65.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho do Contabilista Certificado da Requerente D…, gravado de 00:08:06 a 00:08:36.
21.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 65.º do seu Requerimento inicial, adequada pela prova produzida:
O estabelecimento comercial situado na loja …-A, explorado pela Requerente, teve quebras de faturação na ordem dos 75 % no ano de 2020, quando comparado com o período homólogo de 2019.
22.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 66.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho do Contabilista Certificado da Requerente D…, registado a 00:10:15” a 00:10:19.
23.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 66.º do seu Requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada pela prova produzida:
O estabelecimento aberto ao público situado na loja …-B, explorado pela Requerente, teve quebras de faturação na ordem dos 90% no ano de 2020, quando comparado com o período homólogo de 2019.
24.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 67.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, diretor financeiro da Requerente, registado em gravação de 00:31:49” a 00:32:15”, de 00:31:49” a 00:32:15”, de 00:28:04” a 00:28:20” e de 00:30:27” a 00:30:46”; e do depoimento do Contabilista Certificado da Requerente D…, registado a 00:10:23” a 00:11:28”.
25.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 67.º do seu Requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada por essa prova:
Os dados de atividade da Requerente na loja …-A e na loja …-B, nos anos de 2019 e de 2020, foram os seguintes:
Vendas - loja …-A - (2019) 1.034.963,00 € - (2020) 267.955,00/ loja …-B (2019) 107.545,00 € - (2020) 11.756,00 €
Número de operações de venda - loja …-A - (2019) 1994 - (2020) 487/ loja …-B (2019) 118 - (2020) 308
Percentagem do valor das vendas em duty free - loja …-A - (2019) 61% - (2020) 49%
26.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 69º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, diretor financeiro da Requerente, registado em gravação de 00:33:58” a 00:34:30” e de 00:36:00” a 00:36:35”; e do depoimento de C…, registado a 00:38:00 a 00:38:40.
27.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 69.º do seu Requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada pela prova produzida:
O custo fixo mensal de funcionamento da loja R… é de 41.000,00 € e o da loja da P… de 35.000,00 €, compreendendo rendas, pessoal, e custos acessórios como água, luz, limpeza, taxa de publicidade e música e prevê-se que tenha um resultado negativo.
28.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 70.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, diretor financeiro da Requerente, registado em gravação de 00:33:58 a 00:34:30, e de 00:35:22 a 00:35:28; e do depoimento de C…, registado a 00:38:00 a 00:38:40.
29.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 70.º do seu Requerimento inicial.
30.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 175º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho de P…, diretor financeiro da Requerente, registado em gravação de 00:56:10” a 00:58:54 e o depoimento de C…, registado de 00:50:50 a 00:51:49.
31.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 175.º do seu Requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada pela prova produzida:
O pagamento das garantias bancárias pela Requerida C e pelo Requerido B provocará danos irreversíveis à Requerente, designadamente diretamente a sua insolvência e reflexamente o encerramento das suas lojas.
32.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 183.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o depoimento do Contabilista Certificado da Requerente D…, registado de 00:10:47 a 00:11:15.
33.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 183.º do seu Requerimento inicial
34.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 194.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o depoimento do Contabilista Certificado da Requerente D…, registado de 00:10:47 a 00:11:15.
35.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 194.º do seu Requerimento inicial.
36.ª A matéria de facto alegada pela Requerida em 220.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a posição que sobre ela tomou a Requerida C e a prova documental constante do documento n.º 31, junto com o requerimento inicial.
37.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 220.º do seu requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada pela prova produzida:
A execução da garantia bancária prestada pela C originaria o vencimento antecipado de diversas outras obrigações, em virtude da existência de cláusulas de cross default noutros contratos de financiamento desse banco à Requerente.
38.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 226.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova testemunhal produzida, designadamente o depoimento de C…, registado de 00:51:13 a 00:51:21 e do diretor financeiro da Requerente, P…, registado de 00:58:12 a 00:58:18.
39.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 226.º do seu Requerimento inicial.
40.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 227.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou admitida por acordo, como impunha a posição que sobre ela tomou a Requerida C…, para quem esse facto é pessoal e dessa forma violou as normas que constam dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do seu julgamento os factos admitidos por acordo.
41.ªAs normas dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do julgamento os factos admitidos por acordo, impõem que se considere admitida por acordo a matéria alegada pela Requerente em 227.º do seu requerimento inicial.
42.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 228.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou admitida por acordo, como impunha a posição que sobre ela tomou o Requerido B…, para quem esse facto é pessoal e dessa forma violou as normas que constam dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do seu julgamento os factos admitidos por acordo.
43.ªAs normas dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do julgamento os factos admitidos por acordo, impõem que se considere admitida por acordo a matéria alegada pela Requerente em 228.º do seu requerimento inicial.
44.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 229.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou admitida por acordo, como impunha a posição que sobre ela tomaram a Requerida C e o Requerido B…, para quem esse facto é pessoal e dessa forma violou as normas que constam dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do seu julgamento os factos admitidos por acordo.
45.–As normas dos artigos 574.º-2 e 607.º-5 do CPC, na parte em que retira da liberdade do julgamento os factos admitidos por acordo, impõem que se considere admitida por acordo a matéria alegada pela Requerente em 229.º do seu requerimento inicial, na parte em que o facto lhes é pessoal, nos seguintes termos:
Foi admitido por acordo que a execução de qualquer um dos valores de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros), correspondentes às garantias bancárias emitidas, pelos Requeridos B… e C… provocará, de imediato, a inibição da Requerente recorrer ao financiamento bancário nesses bancos.
46.ªA matéria de facto alegada pela Requerida em 236.º do seu Requerimento Inicial foi incorretamente julgada pelo Tribunal a quo que não a considerou provada, como impunha a prova documental constante dos documentos n.ºs 42, 43, 45, juntos com o requerimento inicial e com a prova testemunhal produzida, designadamente o testemunho do Contabilista Certificado da Requerente D…, registado em gravação de 00:14:00 a 00:14:15 e o depoimento de C…, registado de 00:52:12” a 00:52:20.
47.ªA prova produzida impõe que se considere provada a matéria alegada pela Requerente em 236.º do seu requerimento inicial, com a seguinte redação, adequada pela prova produzida e limitada à parte factual:
A Requerente pagou em 2020 o IRC relativo ao ano de 2019 no montante de 22.990,07 € e foi liquidado IVA no ano de 2020 no valor de 426.762 €.
48.ªO facto alegado no artigo 238.º do Requerimento Inicial foi admitido por acordo, por não ter sido impugnado pelas Requeridas e a sua não inclusão na decisão sobre a matéria de facto provada, discriminando-o como facto admitido por acordo, viola a norma do artigo 574.º, n.º 2 do CPC e desrespeita as regras que disciplinam a elaboração da sentença, designadamente o artigo 607.º-4 e da norma que retira tal facto à sua livre apreciação, constante do artigo 607.º-5, ambos do CPC.
49.ªDeve por isso corrigir-se a decisão da matéria de facto e consignar-se que:
Foi admitido por acordo que uma vez pago o valor das garantias bancárias à Z esta só o restituirá ao Requerido B… e à Requerida C… depois de longo contencioso nos tribunais.
50.ªO Tribunal a quo considerou que o pedido de reconhecimento de não haver lugar ao vencimento de rendas não podia proceder porque entendeu que o pedido não se enquadrava como uma lesão atual e iminente, que estava fora do escopo cautelar.
51.ªOs factos provados expressam bem a iminência de um dano, que é o pagamento das rendas pela força das garantias e a subsequente cobrança coerciva pelos prestadores dessas garantias e o fundado receio que este ocorra, demonstrado pela exigência de pagamento aos bancos e a ponderação de satisfação do pagamento que estes ponderavam fazer.
52.ªHá probabilidade séria da existência de direito da Requerente pois não são devidas quaisquer rendas durante o período em que na Loja …-A não foi possível exercer o comércio de artigos da insígnia “R…” e em que na Loja …-B não foi possível exercer o comércio de artigos da insígnia “P…” pois na relação de arrendamento a renda é a contraprestação típica devida pelo arrendatário pela cedência do gozo temporário do imóvel (1022.º do C.C.) e é obrigação do locador assegurar ao arrendatário o gozo do imóvel para os fins a que se destina (1031.º-b do C.C.), cabendo-lhe também assegurar a sua aptidão para o fim em vista (1070.º-1 do C.C.).
53.ªNa impossibilidade do exercício do comércio nas lojas arrendadas que é objetiva e parcial, deve ser reduzida a contraprestação, neste caso a renda, nos termos da norma do artigo 793.º do C.C. e também nos termos do artigo 795.º-1 do C.C.
54.ªAo não decretar a providência pedida no seu pedido III o Tribunal a quo violou as regras dos artigos 362.º-1 do CPC e recusou a aplicação do direito adequado a resolver a questão, designadamente as normas dos artigos 1022.º, 1031.º-b, 1070.º-1, 793.º e 795.º-1 do C.C..
55.ªO Tribunal a quo considerou que o pedido de modificação do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª...., ....., …-A, em Lisboa, não podia proceder porque considerou que a pandemia da doença SARS COVID 19 e as medidas legislativas tomadas não tiveram repercussão nas cláusulas contratuais de que Requerente pretende alteração, e que a vigência, de tais cláusulas não acarreta uma situação de lesão de direito iminente e atual da Requerente que careça de tutela cautelar.
56.ªA interpretação do direito do Tribunal a quo viola o dispositivo do artigo 437.º-1 do C.C., pois este dispositivo não exige um nexo entre o evento que produz a alteração, que foi a Pandemia e os seus efeitos, e as concretas cláusulas do contrato que se pretende modificar.
57.ªA Requerente e a Requerida Z celebraram contrato de arrendamento por 10 anos, com início em 30-09-2015, com a renda mensal de 32.500,00 €, com cláusulas específicas, que vão para além do quadro legal supletivo, em matéria de denúncia, que não pode ser declarada antes do termo do contrato e de garantia do cumprimento das obrigações, que é feita através de caução em dinheiro de 55.000,00 € e de garantia bancária on first demand no valor de 195.000,00 €.
58.ªA partir da declaração do estado de emergência a exploração da loja passou a ser deficitária, tendo a sua faturação na Loja …-A, comparando os anos de 2019 e de 2020, tido quebra de faturação na ordem dos 75% no ano de 2020 e o número de operações de venda, no mesmo período, reduziu-se de 1994 para 487, em resultado do encerramento da loja, dos constrangimentos ao seu funcionamento e da ausência dos seus clientes típicos, que são estrangeiros de classes favorecidas com origem na Ásia e na América do Norte, que deixaram de viajar pelas limitações trazidas pela pandemia.
59.ªÉ notório e está provado, que a Pandemia impõe condicionalismos à atividade da Requerente na Loja …-A que vão para lá de qualquer prognóstico que pudesse ser feito em 2015, i.e., a Pandemia impôs novo quadro económico e legal que não podendo ser previsto, tem natureza anormal.
60.ªNos termos das normas do artigo 437.º-1 do C.C. a Requerente pode legitimamente peticionar a modificação do contrato de arrendamento, segundo juízos de equidade.
61.ªNão parece à Requerente que no ambiente económico presente, nas concretas condições de exploração da Loja …-A e na imprevisibilidade quanto ao futuro em geral e quanto ao negócio da Requerida em particular, seja conforme com os princípios da boa-fé, que devem reger a alteração anormal das circunstâncias, a imposição de manter o contrato, para além da viabilidade económica do estabelecimento, através de cláusula que impede a sua denúncia pela Requerente, cuja extinção se pede.
62.ªO valor da renda foi determinado pelo equilíbrio que o mercado exprimiu em 2015, no contexto do ambiente económico que então se vivia e, no ambiente económico presente, e nas concretas condições de exploração da Loja …-A, não é conforme com os princípios da boa-fé, que regem a alteração anormal das circunstâncias, a manutenção de renda em valor que compromete a viabilidade económica do estabelecimento.
63.ªA estipulação feita pela Requerente e pela Requerida Z…, de garantia adicional de bom cumprimento, através de garantia bancária on first demand, era comum em 2015 e era entendida como meio de conforto do seu beneficiário mas no ambiente económico presente, a concessão ao senhorio de privilégio de pagamento do seu crédito com preferência relativamente aos credores prioritários típicos, através da execução da garantia não é conforme com os princípios da boa-fé, que devem reger a alteração anormal das circunstâncias.
64.ªO reequilíbrio do contrato é ditado por juízo de equidade que cabe ao Tribunal, nos termos da norma do artigo 437.º-1 do C.C., mas a Requerente crê que a reposição do regime supletivo da denúncia e da garantia das obrigações e a adoção de solução para a renda, análoga àquela que a Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril prevê no seu artigo 8.º-D, n.º 1, correspondem à melhor solução para o caso concreto.
65.ªA Requerente tem a sua capacidade financeira seriamente afetada e a exploração da loja …-A é marcadamente deficitária e não tem perspetivas de retoma ou recuperação nos anos de 2021 e de 2022 e como a Requerida Z… mostrou-se indisponível para renegociar o arrendamento e solicitou a execução das garantias bancárias prestada a seu favor, a Requerida C… irá executá-la por esse valor, colocando a Requerente em risco de insolvência.
66.ªA modificação do contrato a título provisório é providência adequada para assegurar a efetividade do direito que a Requerente tem a essa modificação, quando esta for, a final, apreciada pelos tribunais.
67.ªAo entender que a providência cautelar de modificação do contrato da Loja …-A não deveria proceder, o Tribunal a quo cometeu erro de subsunção dos factos ao direito, designadamente às normas do artigo 437.º-1 do C.C. e do artigo 362.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, que violou.
68.ªO Tribunal a quo considerou que o pedido de resolução do contrato, baseada na alteração anormal das circunstâncias, sem que haja lugar ao pagamento de rendas vincendas, do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª..., ....., …-B, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020 não deveria proceder porque já em 2019, o negócio em torno da marca P…, que era explorada na loja não estava a ser rentável sendo de concluir que não foi a Pandemia que gerou a insustentabilidade financeira da empresa, pelo que não lhe seria lícito declarar essa resolução.
69.ªO Tribunal a quo, não indica que normas está a aplicar para decidir como decidiu e nessa medida violou a norma do artigo 607.º-3 do CPC.
70.ªEstá assente que a Requerente e a Requerida celebraram contrato de arrendamento por 10 anos, com início em 30-12-2015, com a renda mensal de 23.250,00 € que não pode ser denunciado do seu termo e no qual a Requerida goza de garantia especial do cumprimento das obrigações, constituída por garantia bancária on first demand no valor de 139.500,00 €, destinada exclusivamente ao comércio de produtos da marca “P…”.
71.ªA partir da declaração do estado de emergência a exploração da loja foi deficitária, tendo a sua faturação sido reduzida na ordem dos 90% no ano de 2020, em resultado do encerramento da loja, dos constrangimentos ao seu funcionamento e da ausência dos seus clientes típicos, não havendo procura no atual estado de Pandemia para a exploração da marca “P…” na Loja …-B.
72.ªÉ notório que determinado ambiente económico faz parte das circunstâncias em que as empresas comerciais, que visam o lucro, assentam a sua decisão de contratar e é também notório e está provado, que a Pandemia impõe condicionalismos à atividade da Requerente na Loja …-B que vão para lá de qualquer prognóstico que pudesse ser feito em 2015, i.e., a Pandemia impôs novo quadro económico e legal que não podendo ser previsto, tem natureza anormal, pelo que, nos termos das normas do artigo 437.º-1 do C.C. a Requerente pode legitimamente peticionar a resolução do contrato de arrendamento.
73.ªNo ambiente económico presente, nas concretas condições de exploração da Loja …-B e na imprevisibilidade quanto ao futuro em geral e quanto ao negócio da Requerente em particular, não é conforme com os princípios da boa-fé, a imposição de manter o contrato, para além da viabilidade económica do estabelecimento.
74.ªA Requerente tem a sua capacidade financeira seriamente afetada, a exploração da loja …-B é marcadamente deficitária e a Requerida Z… mostrou-se indisponível para renegociar o arrendamento ou para aceitar a entrega das chaves da loja e solicitou a execução das garantias bancárias prestada a seu favor, e a Requerente teme que o Requerido B… venha a satisfazer o pagamento solicitado pela Requerida Z…
75.ªA Requerente não tem meios disponíveis para efetuar o pagamento do valor de 334.500,00 €, e, se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o seu valor ao Requerido B… este irá executá-la por esse valor, originando o vencimento antecipado de outras obrigações.
76.ª A resolução do contrato a título provisório é providência adequada para assegurar a efetividade do direito que a Requerente tem, quando esta for, a final, apreciada pelos tribunais, pois até lá, inexistindo débito de rendas, impedir-se-á o acionamento de garantias.
77.ªAo entender que a providência cautelar de modificação do contrato da Loja …-A o Tribunal a quo cometeu erro de subsunção dos factos ao direito, designadamente às normas do artigo 437.º-1 do C.C. e do artigo 362.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
78.ªO Tribunal a quo considerou que o pedido da Requerente de modificação do contrato de arrendamento para a loja …-B não deveria proceder porque a pandemia da doença SARS COVID 19 e as medidas legislativas tomadas não têm repercussão nas cláusulas contratuais de que a Requerente, pretende alteração, nem que a vigência, de tais cláusulas, acarrete uma situação de lesão do seu direito iminente e atual que careça de tutela cautelar.
79.ªOs elementos de facto e no direito invocados a propósito do pedido de resolução do contrato são aqui inteiramente aplicáveis e face a eles há que concluir que a modificação do contrato a título provisório é providência adequada para assegurar a efetividade do direito que a Requerente tem a essa modificação, quando esta for, a final, apreciada pelos tribunais.
80.ªAo entender que a providência cautelar de modificação do contrato da Loja …-B não deveria proceder, o Tribunal a quo cometeu erro de subsunção dos factos ao direito, designadamente às normas do artigo 437.º-1 do C.C. e do artigo 362.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
81.ªO Tribunal a quo não apreciou o pedido para depósito, a título provisório, das garantias bancárias.
82.ªAs garantias bancárias emitidas pelos Requeridos C… e B… têm escopo nos contratos de arrendamento nos autos e só devem vigorar enquanto estes existirem. A partir do momento em que as cláusulas que as suportam virem a sua eficácia suspensa, deixarão de poder ser exercidas, até que a providência cautelar caduque ou que a decisão final transite em julgado.
83.ªO depósito, até ao transito da decisão do processo, das garantias bancárias prestadas constitui a providência adequada a efetivar o direito da Requerente, nos termos da norma do artigo 362.º, n.º 1 e n.º 2.
84.ªNa Sentença o Tribunal a quo pronunciou-se sobre a validade de declaração de resolução proferida pela Requerida Z exorbitando os poderes jurisdicionais que lhe estão atribuídos.
85.ªA pronúncia do Tribunal a quo sobre a existência e valor de dívidas de rendas da Requerente à Requerida Z e sobre a validade da resolução declarada por esta viola as normas dos artigos 368.º-1 e 608.º-2 do CPC e fere-a de nulidade, nos termos da norma do artigo 615.º-1-d) do CPC.
86.ªDe todo o modo apreciação do Tribunal a quo, nesta matéria, viola as normas de direito material subjacentes à sua decisão, designadamente o artigo 9.º-1 da Lei 4- C/2020 de 6 abril e o artigo 1083.º-3 do C.C.
87.ªO Tribunal a quo considerou que o pedido da Requerente de suspensão da validade das garantias bancárias improcedia por inexistência de lesão iminente grave e dificilmente reparável ao direito invocado.
88.ªO pedido formulado pela Requerente é a expressão comum da tutela que pretende: a Requerente pretende que seja decretado a título provisório, como é próprio das providências cautelares e por isso pede a suspensão que, para tutela do seu direito, que as garantias sejam declaradas sem validade para o seu fim.
89.ªO direito a que as garantias que a Requerente fez prestar não sejam acionadas, ou executadas, é-lhe conferido pela norma do artigo 12.º-A da Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril e ao não reconhecer este direito à Requerente o Tribunal a quo violou este dispositivo.
90.ªA ameaça do dano é ilustrada pelos sucessivos pedidos da Requerida Z de execução das garantias aos bancos prestadores que, se as pagarem exigirão o seu reembolso à Requerente que, não dispondo de meios será alvo de execuções através das livranças que subscreveu.
91.ªA existência de fundado receio que o cenário que traçou se venha a efetivar, é expressa nas insistências que os Requeridos C… e B… para que preste esclarecimentos sobre a sua situação contratual, não obstante a clareza da letra da lei.
92.ªAo não suspender a validade das garantias bancárias o Tribunal a quo violou as normas do artigo 362.º-1 e 2 do CPC e do artigo 12.º-A da Lei n.º 4-C de 6 de abril.»
A requerida Z respondeu à alegação do recorrente.
São as seguintes as questões a decidir:
- da nulidade da decisão recorrida;
- da impugnação da decisão sobre a matéria de facto; e
- da verificação dos requisitos do decretamento da providência cautelar.

***

Na decisão recorrida, foram dados como provados os seguintes factos:
«1-A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica ao exercício da indústria, representação, importação, exportação e comercialização por grosso e/ ou a retalho de diversos artigos de viagem, malas, pastas, carteiras, cintos, acessórios, objetos de luxo e demais artigos em pele, couro, materiais naturais e não naturais, importação e exportação e comercialização por grosso e/ ou a retalho de confeções, camisaria, lãs, sapataria, luvaria, perfumaria e outros artigos afins e, de um maneira geral de todos os artigos relacionados com o vestuário de homem, senhora e criança e de artigos de desporto e moda desportiva e comercialização a retalho de bebidas alcoólicas (certidão permanente com o código de acesso …).
2-A Requerida Z é uma pessoa coletiva que exerce atividade no ramo segurador em Portugal.
3-O Requerido B… é uma pessoa coletiva que exerce atividade enquanto instituição de crédito (banco) em Portugal.
4-O Requerido B… integrou o Banco… através de operação de fusão na modalidade de transferência global do património com data de 27 de dezembro de 2017 (Insc.29 | AP. 24/20171227 constante da certidão permanente com o código de acesso …).
5- A Requerida C… é uma pessoa colectiva que exerce atividade enquanto instituição de crédito (banco) em Portugal.
6- Em 30 de dezembro de 2015, a “M…” celebrou com a “A…”, que era dona e senhora do imóvel, acordo para o gozo temporário, por escrito que denominaram de “contrato de arrendamento não habitacional”, da fração autónoma com a letra “A”, do prédio urbano sito na Avª..., ..... n.º…-A, - Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º … e na respetiva matriz sob o n.º …, que por facilidade se refere nesta peça como “Loja …-A” nos termos que constam do documento n.º 1…
7- Em 15 de janeiro de 2016, a “M…” celebrou com a “A…”, que era dona e senhora do imóvel, um aditamento ao acordo para o gozo temporário da Loja …-A, por escrito que denominaram “Primeiro Aditamento ao Contrato de Arrendamento para Fim Não Habitacional celebrado em 2015.12.30” (doc. 2).
8-Através do aditamento ao “contrato de arrendamento” da Loja …-A, as partes aceitaram que em caso de acionamento de garantia bancária pela senhoria, a inquilina deveria reforçar a garantia bancária ou emitir uma nova garantia bancária até aos montantes previstos no “contrato de arrendamento” no prazo de 60 dias e que a falta de reforço da garantia ou a emissão de uma nova constitui uma violação das obrigações contratuais, com base na qual a senhoria poderá determinar a cessação do acordo para o gozo temporário (doc. 2).
9-Em 30 de dezembro de 2015, a Requerente celebrou com a “A…”, que era dona e senhora do imóvel, acordo para o gozo temporário, por escrito que denominaram de “contrato de arrendamento não habitacional”, da fração autónoma com a letra “B”, do prédio urbano sito na Avª..., ..... n.º …- B, Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º … e na respetiva matriz sob o n.º …, que por facilidade se refere nesta peça como “Loja …-B” documento n.º 3…
10-Em 15 de janeiro de 2016, a Requerente celebrou com a “A…”, que era dona e senhora do imóvel, um aditamento ao acordo para o gozo temporário da Loja …-B, por escrito que denominaram “Primeiro Aditamento ao Contrato de Arrendamento para Fim Não Habitacional celebrado em 2015.12.30” (doc. 4).
11-Através do aditamento ao “contrato de arrendamento” da Loja …-B, as partes aceitaram que em caso de accionamento de garantia bancária pela senhoria, a inquilina deveria reforçar a garantia bancária ou emitir uma nova garantia bancária até aos montantes previstos no “contrato de arrendamento” no prazo de 60 dias e que a falta de reforço da garantia ou a emissão de uma nova constitui uma violação das obrigações contratuais, com base na qual a senhoria poderá determinar a cessação do acordo para o gozo temporário (doc. 4).
12-Em 28 de janeiro de 2016, a “A…” transmitiu a sua posição de dona e senhoria da Loja …-A e da Loja …-B à Requerida Z…, que em consequência assumiu a posição de senhoria nos “contrato de arrendamento” (docs. 5 e 6).
13-Por operação registada em 20 de dezembro de 2018, a “M…” foi incorporada na Requerente através de operação de fusão por transferência global do património, pelo que a posição de inquilina no “contrato de arrendamento” da Loja …-A passou a ser da Requerente (Insc.13 | AP. 104/20181220 constante da certidão permanente com o código de acesso …).
14-Atualmente a Requerida Z ocupa a posição de senhoria nos “contratos de arrendamento” da Loja …-A e da Loja …-B e a Requerente ocupa a posição de inquilina (docs. 1,3, 5 e 6).
15-No “contrato de arrendamento” foi aceite entre a Requerente e a Requerida Z que o gozo temporário da Loja …-A se destinava à utilização como loja destinada exclusivamente a estabelecimento de monomarca sob a insígnia “R…” e foi também aceite a renda mensal de 32.500,00 € (trinta e dois mil e quinhentos euros), com prazo de pagamento no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que diga respeito (doc. 1).
16-No “contrato de arrendamento” foi também aceite entre a Requerente e a Requerida Z o gozo temporário da Loja …-A pelo prazo de 10 (dez) anos, tendo ainda sido combinado o carácter obrigatório do cumprimento integral do prazo (doc. 1).
17-Em satisfação do que combinaram, a Requerente pagou à senhoria a quem sucedeu a Requerida Z…, a quantia de 55.000,00 € (cinquenta e cinco mil euros) correspondente ao valor de duas rendas mensais de 27.500,00 € (vinte e sete mil e quinhentos euros) cada, respeitantes à Loja …-A e aos primeiro e último mês do “contrato de arrendamento” (docs. 1 e 7).
18-No “contrato de arrendamento” da Loja …-A foi também aceite que “são sempre devidas integralmente as rendas correspondentes a cada um dos períodos obrigatórios de vigência do contrato, ou seja, integralmente as dos primeiros 10 (anos) de vigência ou as dos subsequentes 5 (cinco) em caso de renovação.” (cláusula 3.1. do doc. 1)
19-No “contrato de arrendamento” da Loja …-A foi ainda acordado entre a Requerente e a Requerida Z que a inquilina entregaria garantia bancária à senhoria, a favor desta, para “garantia do cumprimento de todas as obrigações para si emergentes do presente contrato” (cláusula 4.7. do doc. 1).
20-A “M…”, a quem sucedeu a Requerente, pediu à Requerida C… a emissão de garantia bancária a favor da Requerida Z…, que a Requerida C… prestou em 27 de janeiro de 2016 com o n.º 2.../.0...../.9..., no montante de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e que foi entregue pela “M…” à Requerida Z…, destinada a garantir o pontual e integral cumprimento de todas as obrigações emergentes do “contrato de arrendamento” da loja …-A (doc. 9).
21-Para emissão pelo Requerida C da garantia bancária e como sua contragarantia, a Requerente subscreveu livrança em branco, com pacto de preenchimento para que este banco a preenchesse pelo valor que tivesse que satisfazer em seu cumprimento, com a prerrogativa de fixar a data de pagamento, para efetuar a sua execução da dívida.
22-No “contrato de arrendamento” da Loja …-B foi aceite entre a Requerente e a Requerida Z que o gozo temporário se destinava à utilização como loja destinada exclusivamente a estabelecimento de monomarca sob a insígnia “P…” e foi também aceite a renda mensal de 23.250,00 € (vinte e três mil, duzentos e cinquenta euros), com prazo de pagamento no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que diga respeito (doc. 3).
23-No “contrato de arrendamento” foi também aceite entre a Requerente e a Requerida Z… o gozo temporário da Loja …-B pelo prazo de 10 (dez) anos, tendo ainda sido aceite o caráter obrigatório do cumprimento integral do prazo (doc. 3).
24-Foi também aceite entre a Requerente e a Requerida Z que no momento da “assinatura do contrato-promessa de arrendamento celebrado entre as partes e que antecedeu o presente contrato definitivo de arrendamento”, a inquilina deveria pagar à senhoria a quantia de 38.000,00 € (trinta e oito mil euros) correspondente ao valor de duas rendas mensais de 19.000,00 € (dezanove mil euros) cada, respeitantes aos primeiro e último mês do “contrato de arrendamento” (doc. 3).
25-Em satisfação do que combinaram para a Loja …-B, a Requerente pagou à Requerida Z a quantia de 38.000,00 € (trinta e oito mil euros) correspondente ao valor de duas rendas mensais de 19.000,00 € (dezanove mil euros) cada, respeitantes aos primeiro mês que foi dezembro de 2015 e último mês do “contrato de arrendamento” (docs. 3 e 8).
26-No “contrato de arrendamento” da Loja …-B foi também aceite que “são sempre devidas integralmente as rendas correspondentes a cada um dos períodos obrigatórios de vigência do contrato, ou seja, integralmente as dos primeiros 10 (anos) de vigência ou as dos subsequentes 5 (cinco) em caso de renovação.”(cláusula 3.1. do doc. 3)
27-No “contrato de arrendamento” da Loja …-B foi ainda aceite entre a Requerente e a Requerida Z… que a inquilina entregaria garantia bancária à senhoria, a favor desta, para “garantia do cumprimento de todas as obrigações para si emergentes do presente contrato” (cláusula 4.7. do doc. 3).
28-Em 22 de janeiro de 2016, a Requerente pediu ao Banco…, mais tarde integrado no Requerido B…, a emissão de garantia bancária a favor da Requerida Z…, que o Requerido B… prestou em 22 de janeiro de 2016 com o n.º 0...-...4-00000.. (2...............2), no montante de 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) e que foi entregue pela Requerente à Requerida Z… destinada a garantir o pontual e integral cumprimento de todas as obrigações emergentes do “contrato de arrendamento” da loja …-B (doc. 10).
29-Para emissão pelo Banco…, mais tarde integrado no Requerido B…, da garantia bancária e como sua contragarantia, a Requerente subscreveu livrança em branco, com pacto de preenchimento para que este banco a preenchesse pelo valor que tivesse que satisfazer em seu cumprimento, com a prerrogativa de fixar a data de pagamento, para efetuar a sua execução da dívida (doc. 10).
30-Entre a data de celebração de cada “contrato de arrendamento” e 18 de março de 2020, a Requerente desenvolveu a sua atividade comercial nas lojas da Requerida Z e satisfez-lhe as rendas convencionadas.
31-A partir da declaração de estado de emergência de 18 de março de 2020 e da respectiva regulamentação (Decreto n.º 2-A/2020), que estabeleceu uma ordem de encerramento de todo o comércio não essencial, que iniciou a sua vigência em 22 de março de 2020, deixou de ser possível, durante alguns períodos, exercer o comércio de venda dos produtos com loja aberta e on line para fora de Portugal, da marca “R…” na loja …-A.
32-A partir da declaração de estado de emergência de 18 de março de 2020 e da respetiva regulamentação (Decreto n.º 2-A/2020), que estabeleceu uma ordem de encerramento de todo o comércio não essencial, que iniciou a sua vigência em 22 de março de 2020, deixou de ser possível, durante alguns períodos temporais, de exercer o comércio de venda dos produtos, com loja aberta e também on line, da marca “P…” na loja …-B.
33-As lojas …-A e …-B localizam-se em Lisboa, na Avª..., ....., no edifício “…”, que é um empreendimento imobiliário de luxo (doc. 11).
34-As lojas …-A e …-B estão inseridas no complexo de lojas de comércio de marcas de luxo, com acesso directo à via pública, que se estende ao longo de toda a Avª. ... ......
35-A Avª...., ...... reúne o comércio das marcas de maior prestígio internacional e faz parte do roteiro dos viajantes de negócios e turistas que apreciam ou procuram artigos de moda, de ourivesaria, e de uso pessoal de prestígio (doc. 12).
36-A R… é uma marca do grupo L… e através dela são comercializadas malas de viagem e acessórios (doc. 13).
37-A P… é uma marca que vende produtos de moda e desporto, óculos, malas e bagagem, relógios, dispositivos eletrónicos e acessórios. (doc. 14).
38-Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde declarou o estado de pandemia em face do impacto causado pelo surto de Covid-19 à escala global.
39-Em 18 de março de 2020, o Presidente da República Portuguesa decretou o estado de emergência face à situação excepcional de saúde pública e à proliferação de casos registados de contágio de COVID-19, através do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020.
40-O Despacho n.º 3427-A/2020, de 18 de março, interditou o tráfego aéreo com destino e a partir de Portugal de todos os voos de e para países que não integram a União Europeia, com algumas exceções, com efeitos a partir de 18 de março de 2020, o que foi, posterior e sucessivamente, prorrogado.
41-A declaração do estado de emergência decretada pelo Presidente da República veio a ser executada pelo Governo através do Decreto n.º 2-A/2020, de 20 de março, que estabeleceu medidas extraordinárias e de carácter urgente, de restrição de direitos e liberdades dos cidadãos.
42-O Decreto n.º 2-A/2020, de 20 de março, determinou a suspensão das atividades de comércio a retalho consideradas não essenciais, nas quais se incluiu a atividade nas lojas da Requerida Z... - na loja nº...-A e na loja ...-B.
43-A partir de 22 de março de 2020 e até maio de 2020, na loja .....-A e na loja .....-B que são do Requerido, e cujo gozo foi cedido à Requerente para o comércio exclusivo de produtos da marca “R…” e de produtos da marca “P…”, deixou de ser possível exercer aquelas atividades por determinação legal e as lojas foram encerradas ao público.
44-Desde 22 de março de 2020 que o comércio em geral e o comércio de produtos de marcas de luxo em particular não mais voltou a seguir os padrões de procura que o caracterizavam até então, em consequência da Pandemia Covid-19 e das medidas impostas pelo Estado para combate à doença.
45-A suspensão da atividade de comércio a retalho foi levantada com restrições ao seu normal funcionamento, nomeadamente em termos de lotação máxima de clientes no interior das lojas, de exigentes e necessárias medidas de higienização e de horários de funcionamento reduzidos.
46-Em 8 de novembro de 2020, o Decreto n.º 8/2020 regulamentou o estado de emergência decretado pelo Presidente da República e impôs a proibição de circulação no concelho de Lisboa, onde se localiza a loja …-A e a loja …-B entre as 23:00h e as 05:00h nos dias de semana e entre as 13:00h e as 05:00h nos dias de fim-de-semana.
47-A partir de 15 de janeiro de 2021, na loja …-A e na loja …-B que são da Requerida Z…, e cujo gozo foi cedido à Requerente para o comércio exclusivo de produtos das marcas “R…” e produtos da marca “P…”, deixou novamente de ser possível exercer aquelas atividades por determinação legal e as lojas foram encerradas ao público.
48-O Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro, determinou novamente a suspensão nas lojas do Requerido, cujo gozo está cedido à Requerente, do comércio de atividades de comércio a retalho consideradas não essenciais, onde se incluiu a atividade desenvolvida pela Requerente nos imóveis arrendados, a partir do dia 15 de janeiro de 2021.
49- A suspensão da atividade de comércio a retalho foi levantada em abril de 2021 e novamente com a determinação de inúmeras restrições ao seu funcionamento, quanto à lotação máxima de clientes no interior das lojas, de exigentes e necessárias medidas de higienização e de horários de funcionamento reduzidos.
50-Desde o mês de março de 2020 que na loja …-A e na loja …-B que são do Requerido, e cujo gozo foi cedido à Requerente para o comércio exclusivo de produtos da marca “R…” e de produtos da marca “P…”, respetivamente, deixou de ser possível exercer aquelas atividades durante, pelo menos 6 meses, designadamente nos meses de março, abril, maio e junho de 2020 e nos meses de janeiro, fevereiro, março e de 2021.
51-No ano de 2020, o número de dormidas na Área Metropolitana de Lisboa de cidadãos provenientes do estrangeiro diminuiu 77,3%, em comparação com o ano de 2019 (doc. 15 – página 9).
52-Os fluxos nos aeroportos da Área Metropolitana de Lisboa diminuíram 70,6% no ano de 2020, em comparação com o ano de 2019 (doc. 15 – página 9).
53-Os fluxos nos portos marítimos da Área Metropolitana de Lisboa diminuíram 91,2% no ano de 2020, em comparação com o ano de 2019 (doc. 15 – página 9).
54-O número de passageiros movimentados nos aeroportos portugueses no 1.º trimestre de 2021 teve uma diminuição de 84,4%, em comparação com o 1.º trimestre de 2020 (doc. 16).
55-O número de passageiros movimentados no aeroporto de Lisboa no 1.º trimestre de 2021 teve uma diminuição de 86,3%, em comparação com o 1.º trimestre de 2020 (doc. 16).
56-O Produto Interno Bruto (PIB) de Portugal teve uma redução de 7,6% no ano de 2020 face ao ano de 2019, o que representa a maior queda do PIB português desde que existem registos estatísticos (doc. 17).
57-No 1.º trimestre de 2021, o PIB português teve uma contração de 5,4% face ao 1.º trimestre de 2020 (doc. 18).
58-Não há procura no atual estado de Pandemia para a exploração da marca “P…” na Loja …-B.
59-A requerente não tem perspetivas retoma ou recuperação do volume de clientes do turismo e de vendas daí derivadas nos anos de 2021 e de 2022.
60-Desde 12 de março de 2020, a Requerente desenvolveu contactos com a Requerida Z de modo a ajustar os contratos de arrendamento à nova realidade causada pela Pandemia Covid-19.
61-Entre 12 de março de 2020 e 4 de maio de 2021, a Requerente apresentou propostas para a celebração de um acordo de alteração dos contratos relativos à loja …-A e à loja …-B, nos seguintes aspetos:
a)-Cessação do “contrato de arrendamento” relativamente à loja …-A e à loja …-B;
b)-Ajustamento da renda da loja …-A e da loja …-B;
c)-Alteração do sistema de denúncia pela inquilina nos “contratos de arrendamento”.
62-A Requerente apresentou propostas para alteração das regras dos “contratos de arrendamento” à Requerida Z… em 12 de março de 2020, 14 de abril de 2020, 16 de junho de 2020, 29 de setembro de 2020, 3 de novembro de 2020, 14 de janeiro de 2021 e 4 de maio de 2021 - docs. 20, 21, 22, 23-A e 23-B, 24, 25-A e 25-B e 26).
63-A Requerida Z não aceitou nenhuma das propostas apresentadas pela Requerente, por entender que as alterações propostas não equilibravam a repartição dos efeitos da Pandemia Covid 19 pela Arrendatária e Senhorio.
64-Em 14 de janeiro de 2021, a Requerente propôs a entrega das chaves da loja …-A e a Requerida Z não aceitou (doc. 25-A).
65-Em 12 de março de 2020, 14 de abril de 2020, 14 de janeiro de 2021 e 28 de janeiro de 2021, a Requerente propôs a entrega das chaves da loja …-B e a Requerida Z… não aceitou (doc. 20, 21, 25-B e 27).
66- Em 14 de abril de 2020, 16 de junho de 2020 e 29 de setembro de 2020, a Requerente propôs ajustar as rendas convencionadas de acordo com o movimento do negócio e a Requerida Z… não aceitou (doc. 21, 22 e 23-A e 23-B).
67-Em 14 de janeiro de 2021, a Requerente propôs a cessação antecipada do “contrato de arrendamento” relativo à loja …-A no final do ano de 2021 e a cessação imediata do “contrato de arrendamento” relativo à loja …-B e a Requerida Z… não aceitou (doc. 25-A e doc. 25-B).
68-Em comunicação com data de 4 de janeiro de 2021 a Requerida Z…, na qualidade de beneficiária da garantia bancária n.º 2.../.0...../.9... que foi prestada a pedido da “M…”, solicitou à Requerida C… o pagamento do montante de 156.783,85 € (cento e cinquenta e seis mil, setecentos e oitenta e três euros e oitenta e cinco cêntimos) (doc. 28).
69-Em 11 de janeiro de 2021, a Requerida C… comunicou à Requerente a solicitação de pagamento pela Requerida Z… da garantia bancária n.º 2.../.0...../.9..., (doc. 29).
70-Em 12 de janeiro de 2021, a Requerida C… informou a Requerente que o processo relativo à garantia bancária havia sido enviado para a área jurídica se pronunciar (doc. 30).
71-Em 27 de janeiro de 2021, a Requerida C… comunicou à Requerente que iria enviar carta à Requerida Z a informar o seguinte: “Face ao objeto da garantia bancária em causa cumpre-nos, no entanto, invocar o impedimento legal respeitante ao respetivo acionamento, decorrente do Artigo 12.º-A da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril, razão pela qual a C… abster-se-á de efetuar o pagamento solicitado.” (doc. 31).
72-Em 14 de janeiro de 2021, a Requerida Z…, beneficiária da garantia bancária n.º 2.............2, solicitou ao Requerido B… o pagamento do montante de 114.721,28 € (cento e catorze mil setecentos e vinte e um euros e vinte e oito cêntimos) (doc. 32).
73-Em 14 de janeiro de 2021, o Requerido B… comunicou à Requerente a solicitação de pagamento pela Z… da garantia bancária n.º 2.............2 (doc. 33).
74-Em 15 de janeiro de 2021, o Requerido B… informou a Requerente que iria alertar a Requerida Z…, beneficiária da garantia, para o disposto no artigo 12.º- A da Lei n.º 4-C/2020 (doc. 34).
75-Em 15 de janeiro de 2021, o Requerido B… informou a Requerente que no seu entendimento, tratando-se de uma Garantia Bancária on first demand, o Banco estava obrigado a honrá-la, não podendo opor à Requerida Z… quaisquer meios de defesa (doc. 34).
76-Em 29 de janeiro de 2021, o Requerido B… transmitiu à Requerente, que o Banco não está obrigado a comunicar previamente à G… qualquer pagamento que faça da Garantia, e está apenas obrigado a efetuar o pagamento e a cumprir com os prazos previstos para o efeito (doc. 35).
77-Em 8 de junho de 2021 a Requerida Z…, na qualidade de beneficiária da garantia bancária n.º 2.../.0...../.9... que foi prestada a pedido da Requerente, solicitou à Requerida C… o pagamento do montante de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) (doc. 36).
78-Em 11 de junho de 2021, a Requerida C… comunicou à Requerente a solicitação de pagamento pela Requerida Z… da garantia bancária n.º 2.../.0...../.9... e solicitou à Requerente que prestasse os comentários entendidos como relevantes, o que esta fez no próprio dia (doc. 37).
79-Em 15 de junho de 2021, a Requerida C… questionou a Requerente para que prestasse as seguintes informações: “(i) se diligenciaram junto da Z… no sentido de o pagamento das rendas em causa ser deferido ao abrigo da Lei n.º 4-C/2020 de 6 de abril; (ii) se, mesmo fora do âmbito desse diploma, tentaram renegociar com a Z… as condições do contrato, quando e em que termos; (iii) qual o resultado das diligências referidas em (i) e (ii); iv) se o contrato de arrendamento se encontra resolvido, por iniciativa de quem e desde quando.” (doc. 38).
80-A Requerente respondeu à Requerida C… no dia 16 de junho de 2021 e afirmou expressamente que seria totalmente ilegal que a Requerida C… procedesse ao pagamento do montante solicitado pela Requerida Z…, atendendo à vigência de norma legal que proíbe a execução de garantias bancárias (doc. 39).
81-Em 16 de junho de 2021, o Requerido B… informou a Requerente da solicitação de pagamento pela Requerida Z… da garantia bancária n.º 2.............2 no montante de 143.369,34 € (cento e quarenta e três mil, trezentos e sessenta e nove euros e trinta e quatro cêntimos) (doc. 40).
82-Na mesma comunicação, o Requerido B… transmitiu o seu entendimento de que o banco teria obrigatoriamente de realizar o pagamento, dado o tipo de garantia e a redação do seu termo (doc. 40).
83-A Requerente respondeu ao Requerido B… em 16 de junho de 2021 e afirmou expressamente que seria totalmente ilegal que o Requerido B… procedesse ao pagamento do montante solicitado pela Requerida Z…, atendendo à vigência de norma legal que proíbe a execução de garantias bancárias (doc. 41).
84-A Requerente teme que a Requerida C… e o Requerido B… venham a satisfazer o pagamento solicitado pela Requerida Z…
85-Em 2019, a Requerente apresentou um resultado líquido tributável negativo de 284.319,28 e um prejuízo para efeitos fiscais de 288.690,19 € (doc. 42).
86-A Requerente pagou o IRC relativo ao ano de 2019, pelo valor de € 22.990,07 (doc. 43).
87-Os capitais próprios estão reduzidos em 31-12-2019, em resultado dos seguintes dados (doc. 44):
Capital social - 2 200 000,00 € - 100,00%
Total dos capitais próprios - 460 879,17 € - 20,95%
88-A autonomia financeira era, no final de 2019, de 5,01% e a solvabilidade geral era de 5,28% em resultado dos seguintes valores pelo que revelavam grande dependência do crédito (doc. 44):
Capital próprio - 460 879,17 €
Ativo - 9 196 019,60 €
Capital alheio - 8 735 140,43 €
89-No final de 2019 a liquidez geral era de 72,46%, a liquidez reduzida era de 26,53% e a liquidez imediata era de 1,91% o que conduz à dificuldade de conseguir responder a imprevistos sem recurso a crédito e aumento do endividamento, em resultado dos seguintes valores (doc. 44):
Ativo circulante - 3 901 893,70 €
Inventários - 2 473 278,40 €
Meios Financeiros - 102 982,91 €
Passivo circulante - 5 384 573,29 €
90-Os efeitos provocados pela Pandemia Covid-19 verificaram-se em Portugal a partir do mês de março de 2020 e, em particular, após a declaração do Estado de Emergência de 18 de março de 2020.
91-As medidas impostas no âmbito da contenção e combate à transmissão do vírus incluíram as seguintes, entre muitas outras:
Limitações à liberdade de circulação (tanto dentro do território nacional como de entrada e saída do país);
Encerramento das atividades comerciais consideradas não essenciais;
Encerramento de fronteiras terrestres, aéreas e marítimas;
Adoção generalizada do regime do teletrabalho, quando possível para as funções em causa.
92-Todas estas medidas repercutiram-se em Portugal e em todo o mundo.
93-O sector do turismo viveu e vive uma crise de enorme dimensão, em face da diminuição muito substancial no número de turistas que visitam o país, em consequência das restrições à liberdade de circulação e demais efeitos causados pela Pandemia.
94-A Pandemia provocada pela doença Covid-19 originou uma quebra substancial no número de turistas que visitaram a cidade de Lisboa, em geral, e a Avª. ... ....., zona premium da cidade, em particular.
95-A Avª.... ..... é uma das principais artérias da cidade em termos turísticos e onde se localizam lojas de muitas das mais reputadas marcas a nível nacional e internacional.
96-Os principais clientes das lojas exploradas pela Requerente eram turistas estrangeiros, naturais dos países Asiáticos e da América do Norte e Sul de classes económicas favorecidas.
97-Estes turistas viram-se impedidos de visitar Portugal em virtude das medidas restritivas de encerramento de fronteiras e de limitações à liberdade de circulação.
98-A Pandemia Covid-19 foi um evento imprevisível, anormal, cujos efeitos se continuam a repercutir em diversas esferas da atividade económica e na vertente social da vida em sociedade.
99-As medidas de combate à Pandemia COVID 19 tornaram indisponíveis os produtos comercializados na Avª. ... ..... em geral e nas lojas da Requerente em particular por falta de cadeia de fornecimento devido às imposições legais que variam de país para país.
100-A evolução das taxas de variação do turismo e viajantes na Área Metropolitana de Lisboa está expressa nos seguintes números:
Os fluxos nos aeroportos da Área Metropolitana de Lisboa diminuíram 70,6% no ano de 2020, em comparação com o ano de 2019.
Os fluxos nos portos marítimos da Área Metropolitana de Lisboa diminuíram 91,2% no ano de 2020, em comparação com o ano de 2019.
O número de passageiros movimentados no Aeroporto de Lisboa, no 1.º trimestre de 2021, teve uma redução de 86,3 %, em comparação com o 1.º trimestre de 2020.
101-Atualmente não há turismo nem viajantes turistas asiáticos e americanos.
103-Face ao facto 101, houve uma diminuição de clientes estrangeiros nas lojas ...-A e ...-B.
104-A suspensão da atividade comercial desenvolvida nos imóveis arrendados (loja …-A e loja …-B) e as várias restrições ao seu funcionamento levaram a que se tenham verificado diminuição de vendas que afecta todo o comercio não essencial.
105-A Requerida Z… solicitou a execução das garantias bancárias prestadas a seu favor, a pedido da Requerente, aos seguintes bancos que as prestaram:
a)-Em 11 de janeiro de 2021, a garantia bancária com a referência n.º 2.../.0...../.9... à Requerida C…, pelo valor de 156.783,85 € (cento e cinquenta e seis mil, setecentos e oitenta e três euros e oitenta e cinco cêntimos).
b)-Em 14 de janeiro de 2021, a garantia bancária com a referência n.º 2.............2 ao Requerido B…, pelo valor de 114.721,28 € (cento e catorze mil, setecentos e vinte e um euros e vinte e oito cêntimos).
c)-Em 8 de junho de 2021, pediu de novo, o pagamento da garantia acima identificada (referência n.º 2.../.0...../.9...) à Requerida C…, pelo valor de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros).
d)-Em 9 de junho de 2021, pediu de novo, o pagamento da garantia acima identificada (referência n.º 2.............2) ao Requerido B…, pelo valor de 143.369,34 € (cento e quarenta e três mil, trezentos e sessenta e nove euros e trinta e quatro cêntimos).
106-A Requerente não procedeu a qualquer pagamento de rendas, mesmo parcial, desde abril de 2020 até à presente data.
107-As lojas em discussão nos presentes autos apenas estiveram encerradas nos períodos seguintes: a) O período de 17.03.2020 a 14.06.2020; e b) O período de 15.01.2021 a 18.04.2021.
108-Na sequência de uma ausência de entendimento entre Requerente e Requerida, acabou por vigorar o regime de diferimento de rendas, tal como previsto no artigo 8.º da Lei n.º 4-C/2020.
109-A requerente deve relativamente à loja …-A a título de rendas vencidas e não pagas, o montante de € 383.754,05, o qual se decompõe da seguinte forma:
outubro de 2020 - € 32.665,75
novembro de 2020 - € 32.665,75
dezembro de 2020 - € 32.665,75
janeiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
fevereiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
março de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
abril de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
maio de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
junho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
julho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
110-Em concreto, e conforme resulta da tabela inserida no número anterior, desse montante, € 57.165,08 correspondem ao valor das rendas de abril e setembro de 2020 e cuja regularização está coberta pelo regime da moratória previsto no artigo 8.º da Lei n.º 4-C/2020, e € 326.588,97 corresponde ao montante das rendas devidas desde outubro de 2020 a julho de 2021.
111-O valor total sujeito ao regime da moratória ascende a € 195.994,50.
112-Na presente data, e a respeito da Loja …-B, a Requerente deve à Requerida, e a título de rendas vencidas e não pagas, o montante de € 273.827,61, o qual se decompõe da seguinte forma:
outubro de 2020 - € 23.902,06
novembro de 2020 - € 23.902,06
dezembro de 2020 - € 23.902,06
janeiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
fevereiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
março de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
abril de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
maio de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
junho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
julho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
113-Em concreto, e conforme resulta da tabela inserida no número anterior, desse montante, € 34.857,20 correspondem ao valor das rendas de abril e setembro de 2020 e cuja regularização está coberta pelo regime da moratória previsto no artigo 8.º da Lei n.º 4-C/2020, e € 238.970,41 corresponde ao montante das rendas devidas desde outubro de 2020 a julho de 2021.
114-O valor total sujeito ao regime da moratória ascende a € 143.412,36.
115-A Requerida interpelou-a consecutivamente para que retomasse o pagamento das rendas contratuais nos dois contratos, conforme cartas de interpelação no dia 30.04.2021 e voltou a reenviá-las no dia 11.06.2021.
116-Neste contexto, por cartas datadas de 07.07.2021 e enviadas pela Requerida nesse mesmo dia esta comunicou à Requerente a resolução dos dois Contratos de Arrendamento em análise na presente providência, com fundamento na falta de pagamento das rendas já vencidas e reclamou o valor total em dívida acima identificado.»

***

Na decisão recorrida, foram dados como não provados os seguintes factos (a sequência dos factos não provados por letras foi introduzida por este tribunal para facilitar a posterior apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto):
A-“a estratificação do comércio das lojas da Requerida em 2019, relativamente ao volume anual de vendas, é a seguinte:
Volume de vendas - 1.034.963,00 € (loja …-A) - 107.545,00 € (loja …-B)
Valor médio por compra - 519,00 € (loja …-A) - 77,00 € (loja…-B)
Percentagem do valor das vendas em duty free - 61% (loja …-A) - 49% (loja …-B)
Percentagem de clientes que não eram residentes em Portugal, em vendas sem duty free - 31% (loja ...-A) - 36% (loja …-B)”.
B-“a demonstração de resultados sintetizada das lojas da requerente em 2019 teve a seguinte configuração:
Volume de vendas (1) - 1.034.963,00 € (loja …-A) - 107.545,00 € (loja …-B)
Custos totais (2=a+b+c+d) - 976.319,00 € (loja …-A) - 369.185,00 € (loja …-B)
Custos das mercadorias (a) - 486.870,00 € (loja …-A) - 53.664,00 € (loja …-B)
Custos com pessoal (b) - 64.138,00 € (loja …-A) - 22.209,00 € (loja …-B)
Rendas de Instalações (c) - 390.000,00 € (loja …-A) - 285.369,00 € (loja …-B)
Outros custos das vendas (d) - 35.311,00 € (loja …-A) - 7.943,00 € (loja …-B)
Resultado Operacional (1-2) - 58.644,00 € (loja …-A) - 261.640,00 € (loja …-B)”.
C-“o estabelecimento aberto ao público situado na loja …-B, explorado pela Requerente, teve quebras de faturação de 89,07% no ano de 2020, quando comparado com o período homólogo de 2019.”
D-“os dados de atividade da Requerente na loja …-A e na loja …-B, nos anos de 2019 e de 2020, foram os seguintes:
Vendas - loja …-A - (2019) 1.034.963,00 € - (2020) 267.955,00/ loja …-B (2019) 107.545,00 € - (2020) 11.756,00 €
Número de operações de venda - loja …-A - (2019) 1994 - (2020) 487/ loja …-B (2019) 118 - (2020) 308
Percentagem do valor das vendas em duty free - loja …-A - (2019) 61% - (2020) 49%/ loja …-B (2019) 49% - (2020) 49%
Percentagem de clientes que não eram residentes em Portugal em vendas sem duty free - loja …-A - (2019) 31% - (2020) 36%/ loja …-B (2019) 36% - (2020) 36%”.
E-“o orçamento mensal de exploração da loja R… para os meses seguintes ao atual é o seguinte:
Vendas (base: média vendas mensais em sete meses de 2020 - maio a outubro de 2020) - 44.659,17 €
Custos das vendas (duodécimos dos custos 2019) - mercadorias (pro-rata sobre faturação 2019-2020) 21.008,68 € - Pessoal (duodécimo dos custos 2019) 5.344,83 €
Outros custos das vendas (idem) - 2.942,58 €
Resultado operacional negativo - -17.136,93 €”.
F-“não é economicamente viável a exploração da Loja …-A no atual estado de Pandemia pois só os custos diretos conduzem a resultado negativo de 17.136,93 €.”
G-“os contratos de arrendamento não são equilibrados no momento que se vive relativamente aos seguintes direitos e obrigações que foram regulados pelas partes:
a)-Obrigação da Requerente manter por 10 anos o arrendamento inicial e por 5 anos a sua renovação (cláusula 3.1, 3.2 e 3.3 do doc. 1 e do doc. 3);
b)-Garantia do cumprimento da Requerente através de garantia bancária on first demand (cláusula 4.7 do doc. 1 e do doc.3).
H- “o pagamento das garantias bancárias pela Requerida C… e pelo Requerido B… provocará danos irreversíveis à Requerente, designadamente diretamente a sua insolvência e reflexamente o encerramento das suas lojas, o despedimento dos seus 70 trabalhadores, prejuízos aos seus fornecedores pela incapacidade da Requerente de satisfazer integralmente os créditos daqueles e prejuízos ao Estado pela incapacidade de satisfazer as suas obrigações diferidas de reembolso de IVA por anulação de créditos de fornecedores e contribuições patronais calculadas sobre as últimas retribuições dos seus trabalhadores.”
I-“a faturação anual da Requerente na Loja …-A, onde comercializa artigos da insígnia “R…” foi de 1.034.963,00 € em 2019 e de 267.955,00 € em 2020, o que significa uma redução de 74,11%.”
J-“a faturação anual da Requerente na Loja …-B, onde comercializa artigos da insígnia “P…” foi de 107.545,00 € em 2019 e de 11.756,00 € em 2020, o que significa uma redução de 89,07%.”
K-“a execução da garantia bancária originaria o vencimento antecipado de diversas outras obrigações, em virtude da existência de cláusulas de cross default noutros contratos de financiamento em que a Requerente é parte.”
L-“a Requerente paga pontualmente as suas contribuições e impostos, que no ano de 2020 ascenderam ao total de 470.425,00 € (426.762,00 € a título de IVA - e 7.663,00 € a título de IRC) e teme deixar de continuar a honrar as suas obrigações perante o Estado, se sobrevier a sua insolvência.”
M-“a inibição de recorrer ao financiamento bancário ou ao crédito dos seus fornecedores impedirá a Requerente de desenvolver a sua atividade comercial.”
N-“o impedimento de exercício da sua atividade comercial provocará a insolvência da Requerente.”
O-“uma vez pago o valor das garantias bancárias à Z esta só o restituirá ao Requerido B… e à Requerida C… depois de longo contencioso nos tribunais.”
P-“o acionamento das garantias bancárias pela Requerida Z e respetivo pagamento do valor das garantias por parte da Requerida C… e/ ou por parte do Requerido B… na pendência desta providência tornará ineficaz a providência.”
Q-“o estabelecimento comercial situado na loja …-A, explorado pela Requerente, teve quebras de faturação na ordem dos 74,11% no ano de 2020, quando comparado com o período homólogo de 2019.”
R-“a Requerente não tem meios disponíveis para efetuar o pagamento do valor de 334.500,00 € (trezentos e trinta e quatro mil e quinhentos euros), correspondente às garantias bancárias.”
S-“se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) à Requerida C… esta poderá executá-la por esse valor.”
T-“se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) ao Requerido B…, este poderá executá-la por esse valor.”
U-“a execução de qualquer um dos valores de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) pelos Requeridos B… e C… pode provocar a inibição da Requerente recorrer ao financiamento bancário.”
V-“a execução de qualquer um dos valores de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) pelos Requeridos Be C provocará, de imediato, a inibição da Requerente recorrer ao crédito dos seus fornecedores.”
W-“a apresentação pela Requerida Z de sucessivos pedidos de pagamento de garantias bancárias faz a Requerente temer que, no conhecimento desta providência esta consiga receber o valor das garantias bancárias.”

***

A recorrente arguiu a nulidade da decisão recorrida com fundamento no disposto no art. 615º nº 1 al. d) do C.P.C., nos termos do qual “é nula a sentença quando o juiz… conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
A causa de nulidade da sentença prevista no art. 615º nº 1 al. d) do C.P.C. está diretamente relacionada com o art. 608º nº 2 do C.P.C., segundo o qual “o juiz… não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”

Na fundamentação da decisão recorrida, pode ler-se:
“Assim sendo, a resolução, de ambos os contratos, por parte da Requerida Z…, por falta de pagamento de rendas é válida, por ter sido efectuada à luz do artigo 4 da lei 4-C/2020 de 6 de Abril, na redacção dada pela lei 75º-A/2020 de 30 de Dezembro, ou seja, na situação do arrendatário não ter pago as rendas vencidas (diferidas relativas aos meses de Abril a Junho de 2020), no prazo de 12 meses contados do termo desse período, em prestações inferiores a um duodécimo do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês, produzindo-se os efeitos da resolução, desde as datas da recepção das referidas cartas.”
No artigo 51º da oposição, a requerida Z afirmou que “a resolução dos contratos operada pela requerida é lícita”.
A questão da validade da resolução foi, pois, suscitada por uma das partes.
É certo que tal questão foi suscitada pela requerida Z inserida na questão da inutilidade superveniente da lide, questão esta que o tribunal recorrido acabou por não apreciar.
Ter o tribunal recorrido considerado válida a resolução efetuada pela senhoria em nada contribuiu para a decisão de não decretamento da providência cautelar, constituindo uma consideração dispensável, sem qualquer significado decisivo no conhecimento do mérito da causa.
Ao contrário do afirmado pela recorrente na sua alegação, o tribunal recorrido não conheceu a questão da validade da resolução “a título definitivo”, sendo certo que, conforme resulta do art. 364º nº 4 do C.P.C., “nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final proferida no procedimento cautelar, têm qualquer influência no julgamento da ação principal”.
Assim, improcede a arguição da nulidade da decisão.

***

A recorrente defendeu a eliminação da matéria de direito que, no seu entender, consta dos pontos 107 a 114 e 116 da matéria de facto provada.
O ponto 107 da matéria de facto provada é do seguinte teor:
“As lojas em discussão nos presentes autos apenas estiveram encerradas nos períodos seguintes: a) O período de 17.03.2020 a 14.06.2020; e b) O período de 15.01.2021 a 18.04.2021”.
Se os períodos de encerramento coincidem com os períodos em que as lojas deveriam, por determinação da lei, estar fechadas, então a lei foi respeitada.
A palavra “apenas” tem o seguinte sentido: não houve mais dias de encerramento para além daqueles que foram impostos por lei.
Importa, pois, concluir que o ponto acima transcrito contém apenas matéria de facto.
Do ponto 108 da matéria de facto provada consta o seguinte:
“Na sequência de uma ausência de entendimento entre Requerente e Requerida, acabou por vigorar o regime de diferimento de rendas, tal como previsto no artigo 8.º da Lei n.º 4-C/2020.”
A ausência de entendimento resulta dos pontos 60 a 67 da matéria de facto provada.
Definir o regime aplicável na ausência de entendimento é matéria de direito.
Assim, é de eliminar o ponto 108 da matéria de facto provada.
A redação dos pontos 109 e 112 da matéria de facto provada deve ser alterada por forma a eliminar as palavras “deve” e “vencidas”, porque estas traduzem conceitos jurídicos.
Nos pontos 109 e 112 da matéria de facto provada, estão especificadas as rendas não pagas, sendo em sede de fundamentação de direito que importa apurar se cada uma delas está sujeita ou não ao regime da moratória.
É, pois, de eliminar os pontos 110, 111, 113 e 114 da matéria de facto provada.
O ponto 116 da matéria de facto provada é do seguinte teor:
“Neste contexto, por cartas datadas de 07.07.2021 e enviadas pela Requerida nesse mesmo dia esta comunicou à Requerente a resolução dos dois Contratos de Arrendamento em análise na presente providência, com fundamento na falta de pagamento das rendas já vencidas e reclamou o valor total em dívida acima identificado.”
Do referido ponto resulta que a falta de pagamento das rendas já vencidas foi o fundamento invocado na comunicação de resolução e que o valor “acima identificado” foi o valor reclamado como estando em dívida.
 Importa, pois, concluir que tal ponto contém apenas matéria de facto.
A recorrente defendeu o aditamento à matéria de facto de factos por si alegados na audiência final aquando da resposta à questão da inutilidade superveniente da lide, a saber:
- “As comunicações da Requerida Z com a pretensão de resolver os contratos de arrendamento relativos à Loja …-A e à Loja …-B foram recebidas pela Requerente em 08-07-2021, i.e., 14 dias depois da citação da Requerida Z
- “A Requerente comunicou à Requerida Z por carta de 13-07-2021, recebida em 14-07-2021, que relativamente à loja sita na Avª. ... ....., n.º …-A, a Requerente declarou no Requerimento Inicial a modificação do contrato, com efeito desde 18-03-2020, nas cláusulas que disciplinam a renda, a denúncia, a oposição à renovação e as garantias especiais do cumprimento e que sem que essa disciplina seja judicialmente fixada, não é possível estabelecer a disciplina contratual aplicável.”
- “A Requerente comunicou à Requerida Z por carta de 13-07-2021, recebida em 14-07-202, relativamente à loja sita na Avª... - ....., n.º …-B, que a Requerente declarou no Requerimento Inicial a resolução do contrato, com efeito desde 18-03-2020 e que sem que essa resolução seja judicialmente apreciada, não é possível estabelecer a efetiva existência do contrato para além daquela data e, se inexistir por ter sido resolvido, não poderá obviamente sê-lo de novo”.
Terem as cartas de resolução sido recebidas no dia 8 de julho de 2021 é facto admitido por acordo.
Conforme resulta do art. 224º nº 1 do C.C., “a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida”.
Daí que se justifique a inclusão na matéria de facto provada da data da receção das cartas.
Ter a requerente respondido às cartas de resolução não constitui facto relevante, sendo de salientar que a posição defendida pela requerente nas respostas apresentadas constitui matéria de direito.
Nas conclusões recursivas, a recorrente especificou como incorretamente julgada a matéria alegada nos artigos 39º, 40º, 65º, 66º, 67º, 69º, 70º, 175º, 183º, 194º, 220º, 226º, 227º, 228º, 229º, 236º e 238º do requerimento inicial, matéria que o tribunal recorrido deu como não provada (cf. alíneas A, B, C, D, E, F, H, I, J, K, L, O, Q, R, S, T e U da matéria de facto não provada).
Na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, o tribunal recorrido escreveu o seguinte:
 “A factualidade dada como não provada resultou da ausência de prova suficiente e credível quanto à mesma, que conduziu a resposta negativa quanto aos factos em questão. Cumpre referir que não obstante o tribunal ter logrado ficar convencido da quebra da facturação, em termos gerais, nos termos dados como indiciariamente provados, facto este que é do conhecimento da generalidade das pessoas, como a principal consequência no comércio não essencial, o certo é que tal circunstância não é suficiente e adequada para considerar como provado, ainda que indiciariamente, os valores da facturação em concreto, os custos de manutenção das lojas abertas (à excepção da renda), uma vez que não juntou a requerente, como lhe competia tal ónus, a documentação contabilística adequada para prova de tais factos, prova documental que tem existência física, por fazer da contabilidade organizada da Requerente tal como frisaram as testemunhas P…, director financeiro da Requerente; D…, contabilista e Técnico Oficial de Contas da requerente.

Assim, não obstante as referidas testemunhas e bem assim as testemunhas C…, sócio e director comercial da Requerente e S…, coordenadora de retalho aereo portuário e mercado doméstico da requerente e que, anteriormente, desde 2018 até Fevereiro de 2021, foi coordenadora das lojas da Avª..., ....., em causa nos autos, tenham vindo confirmar, de forma unânime, as percentagens de quebra da facturação, custos e proveitos, e as percentagens dos clientes duty free e não duty free, não se nos afigura ser suficiente e adequado, para dar tais factos como indiciariamente provados, desde logo porque tal quebra, os custos e proveitos e tipo de cliente, terão que estar sempre espelhados em documentos contabilísticos da empresa que tem contabilidade organizada. Sem estarem nos autos esses documentos contabilísticos que espelhem tais factos, entende o tribunal que os depoimentos daquelas testemunhas, por si só, não podem ser suficientes e adequados para dar tal prova como indiciariamente assente, porque, por um lado, não há forma de confirmar tais factos com os documentos contabilísticos que os atestem e, por outro lado, sem esses documentos contabilísticos a Requerida (que aos mesmos não tem acesso) não pode contraditar os números apresentados, de forma a exercer o princípio do contraditório na sua plenitude.

Por outro lado, também não logrou provar as consequências que sofreria pelo acionamento das garantias, uma vez que não juntou prova documental relativamente aos financiamentos contratados que poderiam ser afectados com tal accionamento e bem assim não juntou qualquer prova documental relativamente ao número de trabalhadores que existe, prova documental que existe por fazer parte da sua contabilidade.

Por fim, cumpre sublinhar que o tribunal, ainda que numa fase procedimental indiciária, não se pode basear a sua convicção apenas em prova testemunhal, relativamente a factos relacionados com facturação, custos, proveitos, trabalhadores e financiamentos quando relativamente aos mesmos há prova documental contabilística que ateste a factualidade.”

No presente procedimento cautelar, estão em causa duas garantias bancárias autónomas.
Na garantia autónoma, o garante assegura ao beneficiário determinado resultado, assumindo uma obrigação própria. Não se trata de garantir o cumprimento da obrigação do devedor, mas assegurar o interesse económico do credor beneficiário da garantia. O garante terá de proporcionar ao beneficiário determinado resultado (recebimento de determinada quantia em dinheiro), desde que este diga que não o obteve da outra parte, não podendo o garante opor ao beneficiário as exceções de que se pode prevalecer o garantido (Galvão Teles, Garantia Bancária Autónoma, pág. 22; Pedro Romano Martinez, Garantias de Cumprimento, pág. 49).
“No processo genético de emissão de uma garantia bancária autónoma existe, em primeiro lugar, um contrato-base, entre o mandante da garantia e o beneficiário, a que se segue um contrato, qualificável como de mandato, mediante o qual o mandante incumbe o banco de prestar garantia ao beneficiário, e, por último, o contrato de garantia, celebrado entre o banco e o beneficiário, em que o banco se obriga a pagar a soma convencionada logo que o beneficiário o informe de que a obrigação garantida se venceu e não foi paga e solicite o pagamento, sem possibilidade de invocar a prévia excussão dos bens do beneficiário ou a invalidade ou impossibilidade da obrigação por este contraída” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 21 de novembro de 2002, processo 02B3453).
“Não obstante a natureza autónoma da garantia on first demand, e a sua actuação ou execução automática, a possibilidade da sua exigência pelo beneficiário não pode ter-se como ilimitada: há, com efeito, no direito português, que estabelecer alguns limites à exigência da garantia, sempre que o imponham as regras da boa fé (art. 762º, nº 2, do C.Civil) ou o abuso do direito (art. 334º do mesmo diploma), como por exemplo nos casos extremos de manobras tendentes a enganar o garante ou de procedimento abusivo do beneficiário, designadamente exigindo a garantia em caso de cumprimento pontual da obrigação do devedor” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 14 de outubro de 2004, processo 04B2883).
Por a automaticidade da garantia não poder se absoluta, a doutrina e a jurisprudência têm admitido que o mandante requeira procedimento cautelar destinado a impedir o garante de entregar a quantia pecuniária ao beneficiário ou este de a receber.
“…, no âmbito da tutela cautelar, o juízo necessário para o decretamento da medida inibitória não deve quedar-se pela mera verosimilhança.
Tendo em atenção a especial natureza (autónoma) da garantia, a prolação de uma providência cautelar, para além de estar condicionada à verificação daqueles requisitos rigorosos, deve ser precedida da apresentação de prova pronta, líquida, irrefutável, bem longe dos elementos de prova que, pela sua natureza intrínseca (v.g. testemunhas) ou pelo seu conteúdo (v.g. documentos) não revelem ou não sejam susceptíveis de revelar a ocorrência de alguma daquelas situações excepcionais” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 23 de fevereiro de 2010, processo 5714/09.7TVLSB.L1-7).
“… estando em causa uma garantia autónoma e à primeira solicitação, é no âmbito do processo cautelar que há-de ser devidamente considerada a sua autonomia relativamente ao contrato subjacente, de forma a evitar que, através de uma decisão baseada em prova de primeira aparência e respeitante a esse contrato, se altere a natureza da garantia prestada” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 21 de abril de 2010, processo 458/09.2YFLSB).
A recorrente quer que seja apreciada a alteração anormal das circunstâncias com base na prova testemunhal.
No acórdão do STJ proferido a 14 de julho de 2021, no processo 19222/20.1T8LSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt, pode ler-se:
“Cremos ser correcto distinguir, como se distinguiu, o momento da análise e decisão, mesmo no juízo de aparência que nas providências cautelares é possível realizar, quanto à existência de alteração anormal das circunstâncias, daquele outro, posterior e no qual, aceite e decidida essa alteração e a admissibilidade da resolução esta se apresente como oponível ao garante em termos de o acionamento da garantia ser considerado abusivo.
Com esta explicação concluímos que, no acórdão recorrido, não se configurou como admissível outra prova que não a líquida e inequívoca para demonstrar a existência de fraude manifesta e abuso de direito ou má-fé patente por parte do credor, prova essa que como se refere no acórdão fundamento só poderia ser documental. O que se referiu e decidiu (no acórdão recorrido), diferentemente, foi que se impunha em primeiro lugar na providência cautelar averiguar a existência de alteração anormal das circunstâncias, nos termos do art. 437 do CC, para decidir se a resolução extrajudicial era válida e só depois, perante esse juízo de validade e legalidade, concluir que, nessa conformidade, essa resolução é oponível ao garante como evidência da má fé por parte do credor. Isto é, a prova inequívoca, que o acórdão recorrido não desmentiu nem desautorizou como necessária, situou-a na existência válida de resolução extrajudicial.”
Diferente é a situação no presente procedimento cautelar, uma vez que a recorrente não comunicou à requerida Z a resolução do contrato.
Assim, por não ter sido produzida prova líquida e inequívoca, bem andou o tribunal recorrido em dar como não provados os factos vertidos nas alíneas A, B, C, D, E, F, I, J e Q da matéria de facto não provada.
Relativamente ao receio de lesão grave e dificilmente reparável, basta um juízo de mera probabilidade ou verosimilhança.
Quanto aos factos vertidos na alínea H da matéria de facto provada, a recorrente pretende que, com base nos depoimentos das testemunhas P… e C…, seja dado como provado que “o pagamento das garantias bancárias pela Requerida C… e pelo Requerido B… provocará danos irreversíveis à Requerente, designadamente diretamente a sua insolvência e reflexamente o encerramento das suas lojas”.
Se as requeridas C… e B… pagarem à requerida Z…, a recorrente terá de reembolsar aquelas instituições bancárias quando interpelada para o efeito.
De acordo com as declarações da testemunha C…, a recorrente não tem condições para pagar às requeridas Ce B tal como não tem para pagar à requerida Z
É possível, pois, estar a recorrente em situação de insolvência, com ou sem pagamento das garantias bancárias pelas requeridas Ce B
No que toca ao facto vertido na alínea K da matéria de facto provada, a recorrente pretende que, com base no documento nº 31 junto com o requerimento inicial, seja dado como provado que “a execução da garantia bancária prestada pela C… originaria o vencimento antecipado de diversas outras obrigações, em virtude da existência de cláusulas de cross default noutros contratos de financiamento desse banco à requerente.”
Importa salientar que não é a execução da garantia bancária, mas sim o não reembolso pela recorrente quando interpelada para o efeito, que pode levar ao vencimento antecipado de outras obrigações.
Atento o documento mencionado pela recorrente, no qual funcionária da C reconhece a existência de cláusulas de cross default, importa dar como sumariamente provado que existem cláusulas de cross default nos contratos de financiamento entre a C e a requerente.
Relativamente ao facto vertido na alínea L da matéria de facto provada, a recorrente pretende que, com base nos documentos nºs 42, 43 e 45 juntos com o requerimento inicial, seja dado como provado que “a Requerente pagou em 2020 o IRC relativo ao ano de 2019 no montante de 22.990,07 € e foi liquidado IVA no ano de 2020 no valor de 426.762 €”.
O pagamento do IRC no montante de € 22.990,07 consta já do ponto 86 da matéria de facto provada.
Quanto ao IVA, o documento nº 45 junto com o requerimento inicial refere IVA liquidado e este é o IVA que foi cobrado ao cliente final. Não resulta, pois, do documento que a requerente tenha entregue o IVA ao Estado.
Da alínea O da matéria de facto provada consta que “uma vez pago o valor das garantias bancárias à Z esta só o restituirá ao Requerido B… e à Requerida C depois de longo contencioso nos tribunais”.
O “contencioso nos tribunais” oporá a requerida Z à requerente e aquela só terá de restituir se ficar vencida, não tendo as requeridas Be C de aguardar pelo fim daquele contencioso para exigir da requerente o reembolso. 
Da alínea R da matéria de facto não provada consta que “a Requerente não tem meios disponíveis para efetuar o pagamento do valor de 334.500,00 € (trezentos e trinta e quatro mil e quinhentos euros), correspondente às garantias bancárias.”
Importa dar como sumariamente provado tal facto, atento o atrás referido quanto ao depoimento da testemunha C…, conjugado com os pontos 88 e 89 da matéria de facto provada.
Das alíneas S, T e U da matéria de facto não provada consta, respetivamente, que “se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) à Requerida C… esta poderá executá-la por esse valor”; “se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) ao Requerido B, este poderá executá-la por esse valor”; e “a execução de qualquer um dos valores de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) pelos Requeridos Be C pode provocar a inibição da Requerente recorrer ao financiamento bancário”.
A recorrente pretende que se dê como provados tais factos por serem factos admitidos por acordo.
Reconhecendo a requerente que a requerida Z impugnou aqueles factos, não se pode considerar que foram admitidos por acordo.
A requerente, nos artigos 227º e 228º do requerimento inicial, usou a expressão “irá executá-la” em vez de “poderá executá-la” e, no artigo 229º daquele mesmo articulado, usou a expressão “provocará, de imediato” em vez de “pode provocar”.
Importa, pois, alterar a redação das alíneas S, T e U da matéria de facto não provada em conformidade com o alegado.
Assim, julgo parcialmente procedente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, passando a matéria de facto provada a ter a seguinte redação:

108-(eliminado)
109-A requerente não pagou relativamente à loja …-A, a título de rendas, o montante de € 383.754,05, o qual se decompõe da seguinte forma:
outubro de 2020 - € 32.665,75
novembro de 2020 - € 32.665,75
dezembro de 2020 - € 32.665,75
janeiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
fevereiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
março de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
abril de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
maio de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
junho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44
julho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 32.665,75 + € 8.166,44.
110- (eliminado)
111-(eliminado)
112-A respeito da Loja …-B, a Requerente não pagou à Requerida, a título de rendas, o montante de € 273.827,61, o qual se decompõe da seguinte forma:
outubro de 2020 - € 23.902,06
novembro de 2020 - € 23.902,06
dezembro de 2020 - € 23.902,06
janeiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
fevereiro de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
março de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
abril de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
maio de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
junho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60
julho de 2021, acrescido de 1/24 das rendas correspondentes aos meses de abril a setembro de 2020 - € 23.902,06 + € 4.979,60.
113- (eliminado)
114- (eliminado)

117-As cartas referidas no ponto 116 foram recebidas pela requerente a 8 de julho de 2021.
118-Existem cláusulas de cross default nos contratos de financiamento entre a C… e a requerente.
119-A Requerente não tem meios disponíveis para efetuar o pagamento do valor de 334.500,00 €, correspondente às garantias bancárias.
A matéria de facto não provada passa a ter a seguinte redação:

K-(eliminado)

R-(eliminado)
S-“se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) à Requerida C esta irá executá-la por esse valor”.
T-“se as garantias bancárias forem satisfeitas à Requerida Z e a Requerente não reembolsar o valor de 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) ao Requerido B…, este irá executá-la por esse valor”.
U-“a execução de qualquer um dos valores de 195.000,00 € (cento e noventa e cinco mil euros) e 139.500,00 € (cento e trinta e nove mil e quinhentos euros) pelos Requeridos Be C provocará, de imediato, a inibição da Requerente recorrer ao financiamento bancário.”

***

O art. 362º nº 1 do C.P.C. dispõe o seguinte: “sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado”.
Resulta do disposto no art. 362º nº 2 do C.P.C. que “o interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor”.
Nos termos do art. 368º nº 1 do C.P.C., “a providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão”.
No presente procedimento cautelar, a requerente pediu “que seja declarado que não há lugar ao vencimento de rendas durante o período em que nas lojas …-A e …-B, …, por imposição da lei não foi possível exercer o comércio de artigos”; “que seja decretada a modificação do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z…, para a loja na Avª. ... ....., …-A, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020”; “que seja declarada válida e eficaz a resolução do contrato, baseada na alteração anormal das circunstâncias, sem que haja lugar ao pagamento de rendas vincendas, do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z, para a loja na Avª. ... ....., …-B, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020”; e, subsidiariamente, “que seja decretada a modificação do contrato de arrendamento celebrado entre a Requerente e a Requerida Z, para a loja na Avª. ..., ....., …-B, em Lisboa, com efeitos reportados a 18-03-2020”.
São pedidos próprios de uma ação principal e não providências cautelares.
Dos pedidos deduzidos pela requerente, apenas são providências cautelares a requerida suspensão da validade das garantias bancárias e o requerido depósito nestes autos dos títulos das garantias bancárias.
Para fundamentar tais providências, a requerente invoca o direito à modificação e o direito à resolução do contrato com base na alteração anormal das circunstâncias.
Não tendo a requerente optado pela resolução extrajudicial, estão em causa direitos emergentes de decisão a proferir em ação constitutiva.
Conforme atrás já referido, na garantia bancária autónoma, o garante não pode opor ao beneficiário as exceções de que se pode prevalecer o garantido, mas a automaticidade da garantia bancária não é absoluta: a fraude ou abuso manifesto obstam ao acionamento da garantia autónoma.
O acionamento das garantias bancárias pela requerida Z é abusivo por ser contrário ao disposto no art. 12º-A da L 4-C/2020, de 6 de abril, aditado pela L 45/2020, de 20 de agosto, segundo o qual, “no decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, o senhorio não pode executar garantias bancárias pelo incumprimento no pagamento de rendas não habitacionais”, sendo de salientar que tal disposição abrange as garantias bancárias autónomas, pois onde a lei não distingue não pode o intérprete distinguir.
Consta da matéria de facto provada que a Requerente teme que as requeridas Ce B venham a satisfazer o pagamento solicitado pela requerida Z
Se as requeridas C… e  B pagarem à requerida Z…, a requerente terá de reembolsar aquelas, mas resulta da matéria de facto provada que a requerente não tem meios disponíveis para efetuar o pagamento do valor correspondente às garantias bancárias.
Não pagando a requerente à requerida C quando interpelada para o efeito, esta, por força das cláusulas de cross default a que alude o ponto 118 da matéria de facto provada, poderá exigir de imediato as prestações referentes aos contratos de financiamento celebrados com a requerente.
Mostra-se, pois, fundado o receio de lesão grave e dificilmente reparável.
Decorre do art. 376º nº 3 do C.P.C. que “o tribunal não está adstrito à providência concretamente requerida”.

***

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso, revogando a decisão recorrida e ordenando que, no decurso da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a requerida Z se abstenha de acionar as garantias bancárias referidas nos pontos 20 e 28 da matéria de facto provada e que as requeridas Ce B se abstenham de pagar à requerida Z no âmbito daquelas garantias. 
Custas do procedimento cautelar e da apelação pela recorrente e pela requerida Z…, na proporção de 1/3 e 2/3, respetivamente.



Lisboa, 18 de novembro de 2021



Maria do Céu Silva
Teresa Sandiães
Octávio Diogo