Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
824/11.3TYLSB.L1-2
Relator: MAGDA GERALDES
Descritores: MARCAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/18/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Sumário: A lei proíbe a utilização de palavras que façam parte de denominações de origem de prestígio de modo a evitar que as mesmas se tornem genéricas, de modo a evitar a sua diluição, fá-lo no pressuposto de que essa utilização, em concreto, pode de algum modo ser associada à denominação de origem protegida, não sendo proibida a utilização na composição de uma marca de uma palavra, apenas e só porque essa palavra faz parte da composição de uma denominação de origem.
A ratio da proibição é que a utilização das palavras que fazem parte da denominação de origem possa prejudicar a eficácia distintiva ou o prestígio da denominação de origem, para que tal uso seja proibido. O que se pretende aqui evitar é o risco da diluição ou banalização do sinal prestigiado, e não tanto o risco de confusão do consumidor
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa, 2ª Secção Cível



Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, identificada nos autos, interpôs recurso de apelação da sentença que julgou improcedente o recurso por si interposto do despacho do Director da Direcção de Marcas e Patentes do INPI, datado de 28.03.2011 que deferiu o pedido de registo da marca nacional n.º 474.831, “VERDES MATAS”, requerido por A, também identificado nos autos.

Em sede de alegações de recurso formulou as seguintes conclusões:

“1. O objecto da apelação é a sentença proferida nos autos em 13.03.2015, que julga improcedente o recurso interposto pela ora Recorrente do despacho do Director da Direcção de Marcas e Patentes do INPI, de 28.03.2011, que concedeu o registo de marca nacional n.º 474.831,“VERDES MATAS”, destinada a assinalar bebidas alcoólicas, com excepção das cervejas, da classe 33.ª.
2. Impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, por não concretizar os registos de denominação de origem e de marca “VINHO VERDE” que foram alegados e provados pela Recorrente na Petição Inicial.
3. Com efeito, da matéria de facto deverão constar, em concreto, os registos, da titularidade da Recorrente, que foram expressamente invocados no artigo 28.º da P.I. e provados pelos documentos n.ºs 4 e 5 juntos a esse articulado, e que não foram impugnados pelo Recorrido – e foram confirmados pelo INPI durante o processo administrativo.
4. Na sentença recorrida omite-se que a Recorrente é titular do registo da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”.
5. Razões por que, ao abrigo do disposto no art.º 640.º do C.P.C., impugna-se a decisão sobre a matéria de facto, no que se refere à referida omissão dos direitos da Recorrente, requerendo-se a este Venerando Tribunal da Relação que se digne acrescentar à decisão sobre a matéria de facto dada como provada (a seguir ao facto provado 4.1.2.), os factos provados seguintes:
«A Recorrente é titular dos registos da Denominação de Origem n.º 3, “VINHO VERDE” e da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”, os quais lhe foram concedidos em 24/05/1971, para assinalar vinhos comuns provenientes da respectiva região demarcada (classe 33.ª)».
6. A decisão recorrida fez uma errada aplicação do disposto nos art.ºs 312.º, 238.º, n.º 6, al. a), 242.º, n.º 1 – ou, neste caso, supletivamente, dos art.ºs 241.º, n.º 1 ou 239.º, n.º 1, al. a) – e no art.º 239.º, n.º 1, al. e), todos do C.P.I.
7. No âmbito da legislação nacional deve ser tido em consideração que, em 28/03/2011, data em que o INPI proferiu o despacho de concessão do registo da marca nacional n.º 474.831, “VERDES MATAS”, a Portaria n.º 668/2010, de 11 de Agosto, reconhecia como denominação de origem (D.O.) a designação «Vinho Verde».
8. A esse diploma foi aditado pela Portaria n.º 949/2010, de 22 de Setembro (o designado “Regulamento de Produção e Comércio da D.O. Vinho Verde”) o art.º 1.º-A, que define o âmbito de protecção da D.O. Vinho Verde, determinando que «(…) são proibidas as marcas compostas por palavras ou partes de palavras que sejam susceptíveis de, no espírito das pessoas a que se destinam, ser confundidas com a totalidade ou parte da DO ‘vinho verde’ (…)».
9. O enfoque desse preceito refere-se à proibição de utilização, na composição de marcas, da palavra “verde” (ou parte desta), por não ser de crer que o legislador pretendesse proibir a utilização da palavra “vinho”.
10. A marca registanda é nominativa, por ser constituída, exclusivamente, pela expressão “VERDES MATAS”, e destina-se a assinalar bebidas alcoólicas, com excepção das cervejas.
11. A marca “VERDES MATAS” contem e reproduz a palavra “VERDE” e esta é, inquestionavelmente, a parte distintiva da D.O. “VINHO VERDE”.
12. A concessão de registos de marcas com o vocábulo “VERDE” – seja por força dos direitos de propriedade e de exclusivo da Recorrente sobre a marca e D.O. n.º 3 “VINHO VERDE”, seja por efeito directo da lei –, é ilegal.
13. O que resulta da redacção do art.º 1.º-A da Portaria n.º 668/2010, é que esta norma tem por finalidade impedir o registo e uso de marcas confundíveis com a D.O. “VINHO VERDE”, mas também que essa expressão ou pare dela se torne genérica, isto é, evitar a diluição da sua capacidade distintiva.
14. Tanto assim que o art.º 1.º-A da Portaria n.º 668/2010, estipula a proibição de « (…) marcas compostas por palavras ou partes de palavras que sejam susceptíveis de, no espírito das pessoas a que se destinam, ser confundidas com a totalidade ou parte da DO ‘Vinho Verde’» «(…) com a finalidade de «evitar que as mesmas se tornem genéricas em conformidade com o regime de protecção e controlo das denominações de origem».
15. Resulta do exposto que, para além dos direitos de exclusivo sobre a utilização do vocábulo “VERDE”, no âmbito de especialidade dos produtos vitivinícolas, adquiridos pela Recorrente pelo registo da D.O. “VINHO VERDE”, haverá ainda que tomar em consideração os direitos de exclusivo que lhe são reconhecidos directamente pela legislação nacional.
16. Por outro lado, haverá que observar a legislação comunitária aplicável à denominação de origem protegida “VINHO VERDE”, em especial, o Regulamento (CE) n.º 491/2009 do Conselho de 2009/6/17, que determina no seu art.º 118.-L, n.º 1 que «Sempre
que uma denominação de origem ou uma indicação geográfica seja protegida ao abrigo do presente regulamento, é recusado o registo de uma marca que corresponda a uma das situações referidas no n.º 2 do artigo 118.º-M e diga respeito a um produto de uma das categorias constantes do anexo XI-B, caso o pedido de registo da marca seja apresentado após a data de apresentação à Comissão do pedido de protecção da denominação de origem ou da indicação geográfica e a denominação de origem ou a indicação geográfica seja subsequentemente protegida. As marcas registadas em violação do disposto no primeiro parágrafo são consideradas inválidas».
17. Ora, a zona vitivinícola dos “Vinhos Verdes” está contemplada no Anexo XI-B para que remete a citada norma.
18. O pedido de registo da marca “VERDES MATAS” corresponde a mais do que uma das situações referidas no art.º 118.º-M, n.º 2, als. a), b) e d) do Regulamento (CE) n.º 491/2009.
19. Não obstante o Tribunal a quo não ter conhecido dessa legislação comunitária – quando esta foi expressamente invocada na P.I. –, é manifesta a aplicabilidade ao caso em apreço do disposto no n.º 1 do art.º 118.-L do Regulamento (CE) n.º 491/2009.
20. Mas há outras consequências a retirar do facto de a Recorrente ser titular dos registos da Denominação de Origem n.º 3, “VINHO VERDE” e da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”, os quais lhe foram concedidos em 24.05.1971, para assinalar vinhos comuns provenientes da respectiva região demarcada (classe 33.ª) – vd. pedido de
alteração da decisão sobre matéria de facto.
21. Dúvidas não se colocam de que a Denominação de Origem “VINHO VERDE” goza de um excepcional prestígio nacional e internacional, e de que “VINHO VERDE” é uma marca de prestígio em Portugal e, mesmo, na Comunidade, na acepção do n.º 1, do art.º 242.º do C.P.I.
22. Ora, a marca “VERDES MATAS” contem o elemento característico e distintivo “VERDE” da marca de prestígio “VINHO VERDE”, e da denominação de origem prestigiada “VINHO VERDE”.
23. Não se colocando nenhuma dúvida de que a marca da Recorrente goza de prioridade e assinala produtos idênticos ou afins aos produtos a que se destina a marca em apreço, deve concluir-se que esta imita a marca de prestígio “VINHO VERDE”, da Recorrente.
24. Como tal, a sentença recorrida violou o disposto no art.º 242.º, n.º 1 do C.P.I. – ou, subsidiariamente, violou o disposto, sucessivamente, nos art.ºs 241.º, n.º 1 ou no art.º 239.º, n.º 1, al. a) do C.P.I.
25. E, por a marca registanda infringir os direitos privativos de propriedade industrial da Recorrente sobre a Denominação de Origem n.º 3, “VINHO VERDE”, a decisão recorrida também viola o disposto no art.º 239.º, n.º 1, al. c) do C.P.I.
26. O uso da marca “VERDES MATAS” possibilitaria ao Recorrido (residente no concelho de Lamego, que não integra a região demarcada dos vinhos verdes), mesmo independentemente das suas intenções, fazer concorrência desleal, mediante a utilização de uma marca enganosa, sobre a proveniência geográfica dos produtos a que se destina, pois poderia assinalar com tal marca qualquer tipo de bebidas alcoólicas (designadamente provenientes do concelho de Lamego), mesmo que não provenientes da área territorial da Região Demarcada dos Vinhos Verdes, nem possuidoras das suas características e qualidades, legalmente definidas.
27. Por ter confirmado a concessão do registo em tais circunstâncias, a decisão recorrida também violou o disposto nos art.ºs 239.º, n.º 1, al. e) e 238.º, n.º 6, al. a) do C.P.I.
28. A Recorrente, na P.I., requereu a isenção de custas processuais, ao abrigo do disposto nos art.ºs 2.º e 4.º, n.º 1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais, por ser uma Pessoa Colectiva de Direito Privado e Utilidade Pública, estatuto que lhe foi reconhecido pelo Decreto-Lei n.º 104/87, de 6/3.
29. A sentença recorrida condenou a Recorrente no pagamento das custas processuais, enfermando de nulidades, por omissão de pronúncia (art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC), posto que não se pronunciou sobre o referido requerimento, nem especificou os fundamentos, de facto e de direito, dessa decisão (art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC).
30. Por ter incorrido nas referidas nulidades, que aqui se arguem, e ter violado o disposto nos art.ºs 2.º e 4.º, n.º 1, al. f) do R.C.P., deve ser declarada a nulidade da decisão sobre custas, e, concedida a concessão do benefício de isenção de custas, nos termos legais.
Nestes termos, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V. Ex.ª, deve a presente apelação ser julgada procedente, decidindo-se revogar a sentença recorrida, e, em consequência, substituí-la pela recusa do registo da marca nacional n.º 474.831, “VERDES MATAS”, e pelo reconhecimento da isenção de custas à Recorrente, como é de
JUSTIÇA!”

Não foram apresentadas contra-alegações nos autos.

Questões a apreciar: impugnação da matéria de facto; mérito da sentença recorrida.

FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS

A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos:
“4.1.1. O Recorrido requereu ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (I.N.P.I.), em 16/11/2010, o registo da marca a nacional n.º 474.831, "VERDES MATAS", destinada a assinalar "alcoólicas (bebidas -) [com excepção das cervejas] " na classe 33.
4.1.2. Este pedido de registo foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 228/2010, de 25/11/2010.
4.1.3. A Recorrente reclamou contra esse pedido de registo, para defesa dos seus direitos privativos de propriedade industrial sobre o sinal distintivo "VINHO VERDE".
4.1.4. 0 I.N.P.I. procedeu então ao estudo do pedido de registo, tendo sido emitido parecer pelo Departamento de Oposição e Contencioso, da Direcção de Marcas e Patentes, de 28/03/2011, pelo qual foi proposto superiormente a concessão do registo.
4.1.5. O Exmo. Senhor Director da Direcção de Marcas e Patentes do I.N.P.I. exarou sobre esse parecer o despacho «Concordo e defiro em 2011.03.28», a que se reporta o aviso
publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 70/2011 de 11/04.”

O DIREITO

Da impugnação da matéria de facto.

Alega a recorrente que na sentença recorrida se omite que a mesma é titular do registo da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”, não concretizando a matéria de facto os registos de denominação de origem e de marca “VINHO VERDE” que foram alegados e provados pela recorrente na petição inicial.
A recorrente invocou, expressamente, tais registos no artº 28.º da sua petição inicial estando os mesmos provados pelos docs. n.ºs 4 e 5 juntos a esse articulado, não tendo os mesmos sido impugnados pelo recorrido.
Porque os factos atinentes à titularidade da recorrente dos registos da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”, e de Denominação de Origem n.º 3, “VINHO VERDE denominação de origem e de marca “VINHO VERDE”, foram alegados na petição inicial como fundamentos de facto da pretensão formulada em juízo pela ora recorrente, sendo os mesmos relevantes para a decisão da causa, mostrando-se provados documentalmente haverá que aditar tais factos à matéria de facto dada como prova.
Assim, procedendo a impugnação da matéria de facto, acrescenta-se à mesma a seguinte factualidade:
- 4.1.6. A recorrente é titular dos registos da Denominação de Origem n.º 3, “VINHO VERDE” e da marca nacional n.º 140.300, “VINHO VERDE”, os quais lhe foram concedidos em 24/05/1971, para assinalar vinhos comuns provenientes da respectiva região demarcada (classe 33.ª) – cfr. docs. n.ºs 4 e 5 juntos com a petição inicial.

O DIREITO

A sentença recorrida julgou improcedente o recurso interposto pela COMISSÃO DE VITICULTURA DA REGIÃO DOS VINHOS VERDES do despacho datado 28.03.2011, do Director da Direcção de Marcas e Patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, despacho que concedeu o registo da marca nacional n.º 474831 “VERDES MATAS” ao ora recorrido, A.
Para tanto, adianta-se na sentença recorrida, designadamente, a seguinte fundamentação:
“(…) Cumpre, pois, apreciar e decidir se a marca registada “VERDES MATAS” afronta alguma das disposições normativas de modo a não poder ser autorizado o registo e o uso daquela marca em concreto. A tese da Recorrente, para sustentar a recusa do registo da marca “VERDES MATAS” é o facto desta marca ser composta por parte de palavras que são susceptíveis de, no espírito das pessoas a que se destinam, ser confundidas com a totalidade ou parte da denominação protegida “VINHO VERDE”. Não se aceita a tese da Recorrente.
Em rigor, não é reproduzida na marca nenhuma das palavras que compõem a denominação de origem. Mas entende-se a alegação como referindo-se às palavras VERDES versus VERDE.
No entanto, na marca a palavra “verdes” adjectiva o substantivo “matas” e na denominação de origem algo muito diverso, o substantivo “vinho”. Assim, não se vê como pode o consumidor, mesmo distraído e desatento, quando confrontado com a marca “VERDES MATAS”, mesmo numa embalagem de vinho, associar esse vinho marcado à denominação de origem, pode inclusivamente tratar-se de um vinho maduro, rosé, ou outro qualquer.
Como se sustentou na decisão sob recurso e se sufraga “…o sinal - VERDES MATAS, que se pretende registar, cumpre a sua função distintiva, uma vez que o vocábulo "VERDES" presente nesta marca registanda, surge associado ao vocábulo "MATAS", favorecendo em termos conceptuais um afastamento da denominação de origem nº 3 VINHO VERDE, atendendo a que surge como elemento caracterizador das "MATAS”, adjectiva este local, não induzindo o consumidor a pensar estar diante de produtos que obedecem a determinadas características especificadas pela Denominação de Origem supra mencionada”.
Por outro lado, sustenta a Recorrente que “…são proibidas as marca compostas por palavras ou partes de palavras que sejam susceptíveis de, no espírito das pessoas a que se destinam, ser confundidas com a totalidade ou parte da DO 'Vinho Verde' e das denominações das respectivas sub-regiões, de forma a evitar que as mesmas se tornem genéricas em conformidade com o regime de protecção e controlo das denominações de origem», sendo que a ratio dessa norma não é, somente, impedir o registo e uso de marcas
confundíveis com a D.O. "VINHO VERDE", mas também impedir a diluição da capacidade
distintiva desta. Como supra já se referiu na composição da marca sob recurso não é utilizada nenhuma das palavras que compõem a denominação de origem. E da utilização da palavra verde mas no plural, verdes, e relacionada com a palavra “matas” completamente distinta de “vinho” não se vê como pode causar diluição da capacidade distintiva da denominação de origem “VINHO VERDE”. Quando a lei proíbe a utilização de palavras que façam parte de denominações de origem de prestígio de modo a evitar que as mesmas se tornem genéricas, de modo a evitar a sua diluição, fá-lo no pressuposto de que essa utilização, em concreto, pode de algum modo ser associada à denominação de origem protegida, não sendo proibida a utilização na composição de uma marca de uma palavra, apenas e só porque essa palavra faz parte da composição de uma denominação de origem. A ratio da proibição é que a utilização das palavras que fazem parte da denominação de origem possa prejudicar a eficácia distintiva ou o prestígio da denominação de origem, para que tal uso seja proibido. O que se pretende aqui evitar é o risco da diluição ou banalização do sinal prestigiado, e não tanto o risco de confusão do consumidor. Se, por exemplo, a denominação de origem fosse apenas constituída pela palavra “VERDE” e a marca fosse “VERDE MATAS”, na qual se reproduzia na íntegra a, exemplificada, denominação de origem “VERDE”, ainda que se pudesse afirmar que apresentava capacidade distintiva suficiente para evitar induzir o consumidor em erro ou confusão e que não existia por parte do Recorrido, intenção de aproveitamento, sempre o uso daquela marca, “VERDE MATAS”, contribuiria para a banalização e diluição da exemplificada denominação de origem, “VERDE”, desvirtuando ou diminuindo a sua notoriedade, capacidade distintiva e valor publicitário e, tendo em conta os direitos que o registo confere ao seu titular, previstos no art.º 312.º do CPI a palavra “VERDE”, não poderia figurar na marca, pois, no nosso exemplo, era a reprodução da prestigiada denominação de origem “VERDE”. Mas o caso em discussão nos presentes autos é totalmente diferente, a denominação de origem protegida é “VINHO VERDE”, o consumidor, não irá associar a marca “VERDES MATAS” à denominação de origem “VINHO VERDE”, atendendo a que a visão de conjunto dos sinais é absolutamente distinta. A utilização da palavra VERDES na marca não invoca na mente do consumidor médio a denominação de origem “VINHO VERDE”, donde, também a concessão do registo, não desencadeará a ocorrência de situações de concorrência desleal. Os princípios da anterioridade do registo, da novidade e da exclusividade que protege a denominação de origem “VINHO VERDEda Recorrente não se mostram ofendidos pela marca cujo registo foi admitido. (…)”.

A sentença recorrida procedeu a uma análise criteriosa dos elementos fácticos carreados para os autos e a uma correcta interpretação e aplicação das normas legais referidas, que aqui não merecem reparo, não sendo patente a alegada semelhança entre a denominação de origem protegida “VINHO VERDE” e a marca “VERDES MATAS”, não se verificando identidade fonética entre ambas que permitam concluir por uma imitação de uma marca protegida, sendo que, tal como se refere na sentença recorrida, «da utilização da palavra verde mas no plural, verdes, e relacionada com a palavra “matas” completamente distinta de “vinho” não se vê como pode causar diluição da capacidade distintiva da denominação de origem “VINHO VERDE”». Ao que acresce o facto relevante de na composição da marca sob recurso não ser utilizada nenhuma das palavras que compõem a denominação de origem.
Decorre dos elementos fácticos dos autos não existir qualquer semelhança entre as marcas em confronto, que possa induzir, facilmente, o consumidor em erro ou confusão acerca das qualidades, características e proveniência geográfica dos vinhos verdes enquanto produtos que obedecem a determinadas características especificadas pela denominação de origem protegida, ou das respectivas sub-regiões, ou seja, pela Denominação de Origem nº 3 - “VINHO VERDE”, ou que compreendam um risco de associação com a marca anterior da recorrente, ou ainda que a marca registanda permita que as marcas de que a recorrente é titular se tornem genéricas, havendo um risco de associação da marca registanda com as marcas anteriores da recorrente.
Esta conclusão decorre da formulação de um juízo de apreciação global das marcas em apreço, que aqui também se efectua, para se acompanhar o efectuado pelo tribunal recorrido.

Assim, não se mostram violadas as disposições legais contidas nos artºs 238º, nº6: “(…) 6 - É ainda recusado o registo de uma marca que contenha, entre outros elementos, a Bandeira Nacional nos casos em que seja susceptível de: a) Induzir o público em erro sobre a proveniência geográfica dos produtos ou serviços a que se destina;”, 239º, nº1- a), ou seja, “a) A reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada;”, no artº 241º, nº1:1 - É recusado o registo de marca que, no todo ou em parte essencial, constitua reprodução, imitação ou tradução de outra notoriamente conhecida em Portugal, se for aplicada a produtos ou serviços idênticos ou afins e com ela possa confundir-se ou se, dessa aplicação, for possível estabelecer uma associação com o titular da marca notória.”, no artº 242º, nº 1, quando dispõe que “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, o pedido de registo será igualmente recusado se a marca, ainda que destinada a produtos ou serviços sem identidade ou afinidade, constituir tradução, ou for igual ou semelhante, a uma marca anterior que goze de prestígio em Portugal ou na Comunidade Europeia, se for comunitária, e sempre que o uso da marca posterior procure tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da marca, ou possa prejudicá-los.”, todos do CPI.
Também o disposto no artº 312º do CPI, que identifica os direitos conferidos pelo registo, não se mostra violado pela sentença recorrida, se atentarmos no seu conteúdo:
“1 - O registo das denominações de origem ou das indicações geográficas confere o direito de impedir:
a) A utilização, por terceiros, na designação ou na apresentação de um produto, de qualquer meio que indique, ou sugira, que o produto em questão é originário de uma região geográfica diferente do verdadeiro lugar de origem;
b) A utilização que constitua um acto de concorrência desleal, no sentido do artigo 10-bis da Convenção de Paris tal como resulta da Revisão de Estocolmo, de 14 de Julho de 1967;
c) O uso por quem, para tal, não esteja autorizado pelo titular do registo.
2 - As palavras constitutivas de uma denominação de origem ou de uma indicação geográfica legalmente definida, protegida e fiscalizada não podem figurar, de forma alguma, em designações, etiquetas, rótulos, publicidade ou quaisquer documentos relativos a produtos não provenientes das respectivas regiões delimitadas.
3 - Esta proibição subsiste ainda quando a verdadeira origem dos produtos seja mencionada, ou as palavras pertencentes àquelas denominações ou indicações venham acompanhadas de correctivos, tais como «género», «tipo», «qualidade» ou outros similares, e é extensiva ao emprego de qualquer expressão, apresentação ou combinação gráfica susceptíveis de induzir o consumidor em erro ou confusão.
4 - É igualmente proibido o uso de denominação de origem ou de indicação geográfica com prestígio em Portugal, ou na Comunidade Europeia, para produtos sem identidade ou afinidade sempre que o uso das mesmas procure, sem justo motivo, tirar partido indevido do carácter distintivo ou do prestígio da denominação de origem ou da indicação geográfica anteriormente registada, ou possa prejudicá-las.
5 - O disposto nos números anteriores não obsta a que o vendedor aponha o seu nome, endereço ou marca sobre os produtos provenientes de uma região ou país diferente daquele onde os mesmos produtos são vendidos, não podendo, neste caso, suprimir a marca do produtor ou fabricante.”
Quanto à invocada concorrência desleal não contêm os autos quaisquer elementos de facto que permitam concluir pela sua verificação.
De acordo com o disposto no artº 239º, nº1- e) do CPI, “1 -Constitui ainda fundamento de recusa do registo de marca: (…) e) O reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal ou de que esta é possível independentemente da sua intenção.Tais fundamentos não se mostram provados no caso dos autos.
Alega a recorrente que se mostra violado o disposto no artº118.º-M, n.º 2, als. a), b) e d) do Regulamento (CE) n.º 491/2009, de 17.006.2009, em virtude de o pedido de registo da marca “VERDES MATAS” corresponder a mais do que uma das situações referidas em tal normativo comunitário.
O artº 118º -M, nº2, do citado Regulamento do CE refere
“ (…)
2. As denominações de origem protegidas e as indicações geográficas protegidas e os vinhos que utilizam esses nomes protegidos em conformidade com o caderno de especificações são protegidos contra:
a) Qualquer utilização comercial directa ou indirecta de um nome protegido:
i) por produtos comparáveis não conformes com o caderno de especificações do nome protegido; ou
ii) na medida em que tal utilização explore a reputação de uma denominação de origem ou de uma indicação geográfica;
b) Qualquer usurpação, imitação ou evocação, ainda que a verdadeira origem do produto ou serviço seja indicada ou que o nome protegido seja traduzido ou acompanhado por termos como «género», «tipo», «método», «estilo», «imitação», «sabor», «como» ou similares;
c) Qualquer outra indicação falsa ou falaciosa quanto às proveniência, origem, natureza ou qualidades essenciais do produto, que conste do acondicionamento ou da embalagem, da publicidade ou dos documentos relativos ao produto vitivinícola em causa, bem como o acondicionamento
em recipientes susceptíveis de criar uma opinião errada sobre a origem do produto;
d) Qualquer outra prática susceptível de induzir o consumidor em erro quanto à verdadeira origem do produto.”
Atentos os fundamentos supra adiantados, assim como os constantes da sentença recorrida, que conduziram à não verificação da violação dos preceitos legais do CPI transcritos, nos presentes autos não verifica a violação do disposto no artº118.º-M, n.º 2, als. a), b) e d) do Regulamento (CE) n.º 491/2009, de 17.006.2009, em qualquer uma das situações nele contempladas.

Tal como o decidido na sentença recorrida, o recurso apresentado pela ora recorrente merecia ser julgado improcedente, com a consequente manutenção do despacho recorrido que concedeu o registo à marca nacional n.º 474.831, “VERDES MATAS”.

Da condenação em custas.

Alega a recorrente que a sentença recorrida condenou a recorrente no pagamento das custas processuais, enfermando de nulidades, “por omissão de pronúncia (art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC), posto que não se pronunciou sobre o referido requerimento, nem especificou os fundamentos, de facto e de direito, dessa decisão (art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC).”
As nulidades invocadas pela recorrente, a procederem, determinariam a nulidade da respectiva decisão de condenação em custas. Todavia a recorrente limita-se a pedir a revogação da decisão recorrida e não a declaração da sua nulidade, repetindo perante este tribunal o pedido de reconhecimento de tal isenção.
A recorrente invocou a sua isenção de custas ao abrigo do disposto nos artºs 2º e 4º, nº 1, al. f) do Regulamento das Custas Processuais, por ser uma Pessoa Colectiva de Direito Privado e Utilidade Pública, estatuto que lhe foi reconhecido pelo Decreto-Lei n.º 104/87, de 6/3.
A sentença recorrida condenou a recorrente em custas face à improcedência do recurso contencioso que apresentou do despacho datado de 28.03.201, proferido pelo Director da Direcção de Marcas e Patentes do INPI, que deferiu o pedido de registo da marca nacional n.º 474.831, “VERDES MATAS”.
Tendo a sentença recorrida decidido pela condenação em custas por parte da recorrente, não ocorre qualquer omissão de pronúncia, havendo que entender-se que o tribunal a quo com tal decisão entendeu não ocorrer a isenção invocada.

Relativamente ao pedido de reconhecimento de tal isenção, o artº 4º, nº1 – f) do RCP (Regulamento das Custas Processuais, aprovado pela Lei n.º 72/2014, de 02/09) estabelece que: “1 - Estão isentos de custas: (…) f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;”.

O DL nº 104/87, de 06.03, no seu artº 2º estipula o seguinte:
“Comissão vitivinícola regional
1 - O Governo, para os efeitos do disposto no artigo 5.º da Lei 8/85, de 4 de Junho, reconhece a constituição e a actividade da vigente Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, abreviadamente designada por CVRVV, considerando-a como associação regional, pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública.”

Os estatutos da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes “aprovados em reunião do Conselho Geral de 04/04/2007, foram objecto de escritura pública realizada no Cartório Notarial M. Rosário Costa Gomes, no Porto, no dia 04/05/2007, tendo sido o respectivo anúncio (extracto) n.º2852/2007 publicado no DR 96, II Série, de 18/05/2007.”
Em tais estatutos está consagrado o seguinte:
Artigo 1.º Denominação, objecto e duração
A Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, que também usa a sigla CVRVV, é um organismo interprofissional que tem por objecto a representação dos interesses das profissões envolvidas na produção e comércio da Denominação de Origem (DO) "Vinho Verde" e da Indicação Geográfica (IG) "Minho" e a defesa do património colectivo que as mesmas constituem, revestindo, nessa qualidade, a forma jurídica de uma associação regional, pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública, e durará por tempo indeterminado.”
E no “Artigo 3.º Atribuições e competências
“1. São atribuições da CVRVV a promoção e defesa da DO "Vinho Verde" e da IG "Minho", seu controlo, certificação e utilização, competindo-lhe designadamente: (…)”.
– cfr. http://www.vinhoverde.pt:8081/pt/instituicao/estatutos.asp.

Os estatutos da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes não prevêem, no seu texto, qualquer isenção de custas ou de taxa de justiça.
Assim, a isenção de custas cujo reconhecimento é pretendido só poderá decorrer da interpretação que se faça do disposto no artº 4º, nº 1, al.f) do Regulamento das Custas Processuais, que dispõe que estão isentas de custas “ (…) f) As pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável;”.
O artº 4º, nº1, al.f), do RCP faz “depender a isenção subjectiva em matéria de custas no tocante às pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos da verificação de dois pressupostos de legitimidade processual:
1. Quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições”, ou,
2. Para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos da legislação que lhe seja aplicável”. (cfr. Acórdão do STA de 14.03.2013, in proc. 01166/12 – Pleno da Secção do CA, in www.dgsi.pt)

Ora, tendo a recorrente a natureza jurídica de pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública, sendo certo que face ao constante do artº 1º dos seus estatutos, é um “organismo interprofissional que tem por objecto a representação dos interesses das profissões envolvidas na produção e comércio da Denominação de Origem (DO) "Vinho Verde" e da Indicação Geográfica (IG) "Minho" e a defesa do património colectivo que as mesmas constituem”, e que “São atribuições da CVRVV a promoção e defesa da DO "Vinho Verde" e da IG "Minho", seu controlo, certificação e utilização”, a mesma intervêm nos presentes autos exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições e na defesa dos interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto, e de acordo com o qual a recorente prossegue fins não lucrativos, inserindo-se nesses fins o presente recurso.

Assim sendo, goza a recorrente da isenção do pagamento de custas processuais prevista no artº 4º, nº1 – f) do RCP, não podendo manter-se a decisão recorrida nesta parte.

Procedendo as conclusões das alegações de recurso quanto à impugnação da matéria de facto, assim como quanto à isenção de custas por parte da recorrente, improcedem todas as demais quanto ao mérito da sentença recorrida, onde aliás, o recorrente se limitou a manter a defesa por si apresentada ao longo de todo o processo, sem invocação de qualquer fundamento que, pela sua novidade ou pertinência, impusesse maior estudo ou mais aturada indagação do que os evidenciados pelo tribunal recorrido.

DECISÃO

Atentos os fundamentos invocados, acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do TRL, em:
a) – conceder provimento ao recurso de apelação quanto à impugnação da matéria de facto;
b) – conceder parcial provimento ao recurso de apelação, confirmado a sentença recorrida quanto ao mérito e revogando a decisão de condenação em custas;
b) – sem custas.


LISBOA, 18.02.2016


Magda Geraldes………………………..………..

Farinha Alves…………………………………….

Tibério Silva……………………………………..