Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
78/15.2T8VFC-A.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
EXCLUSÃO DA CLÁUSULA
CLAUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
NULIDADE DO CONTRATO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/29/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I – A prova da comunicação das cláusulas contratuais cabe ao predisponente delas e não se basta com o facto de os executados aderentes terem tido o contrato em seu poder.
II - Não constitui abuso de direito a conduta do aderente do contrato que, decorridos vários anos após a celebração do contrato, pretende a exclusão de cláusulas contratuais por falta do cumprimento dos deveres de comunicação e de informação, “sendo completamente natural e nada contraditório, que o cidadão assine o contrato, confiando que não vai encontrar percalços na sua execução, e reaja apenas quando esses percalços, normalmente imprevisíveis na data da celebração do contrato, surgem.”

III. Para além de que, para se provar o abuso de direito, outros factos teriam que estar dados como provados e, para o poder invocar, a predisponente das cláusulas não poderia ter dado causa à situação que está na origem da exclusão das CC’G’.

IV. A regra do n.º 3 do art. 1 do regime das CC’G’, sobre o ónus da prova, aplica-se não só às cláusulas contratuais gerais mas também às específicas, ou seja, na dúvida se as cláusulas não foram previamente negociadas individualmente (art. 1/1) ou se não o aderente não pôde influenciar o respectivo conteúdo (art. 1/2), é como se elas não tivessem sido negociadas individualmente e o aderente não tivesse podido influenciar o seu conteúdo.

V. No caso dos autos, a exclusão de todas as cláusulas contratuais não implica a nulidade do contrato (art. 9 do regime das CC’G’), porque é possível entender que existiu um acordo entre o Banco e os executados, para que o Banco entregasse em benefício dos executados, a título devolutivo, uma quantia determinada, ou seja, pode-se considerar subsistente um contrato de mútuo civil.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:

            Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

            O Banco - SA, requereu uma execução contra E e mulher, ME,, com base num requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória.

            O executado veio opor-se à execução, mediante embargos de executado, a que foi dado seguimento com base na inconstitucionalidade do art. 857 do CPC (o tribunal invocou o acórdão do Tribunal Constitucional 264/2015, o executado tinha invocado os acs. 714/2014 e 828/2014); excepcionou a ineptidão do requerimento de injunção e a nulidade do contrato celebrado com o Banco, por inobservância, por parte deste, dos deveres de comunicação e informação previstos nos artigos 5 e 6 do Decreto-Lei 446/85, de 25/10, e a usura dos juros pedidos; e impugnou o direito do Banco ao montante peticionado, por não serem devidos os juros remuneratórios.

            O Banco contestou, impugnando quer os factos alegados como base das excepções quer os efeitos de direito que o executado quer retirar deles; alegou ter cumprido os deveres legais de comunicação e informação; e excepcionou o abuso de direito por parte do executado ao excepcionar a nulidade do contrato;

            Realizado o julgamento, os embargos foram julgados improcedentes, mantendo-se a execução.

            O executado recorre desta sentença – para que seja revogada e substituída por outra que julgue procedente a excepção de nulidade do contrato e em consequência extinga a execução, ou para que seja anulada por contradição insanável entre a fundamentação e a decisão [sic] -, terminando as alegações do recurso com as seguintes conclusões (em síntese deste acórdão):

         1. A decisão recorrida é nula porque os seus fundamentos estão em oposição com ela (sendo inclusivamente uma decisão surpresa atendendo ao teor das declarações das testemunhas): art. 615/1-c do CPC, já que tendo entendido que o Banco não cumpriu os deveres de comunicação e de informação dos arts. 6 e 8 do DL 446/85 se impunha que considerasse o contrato nulo.

         2. O executado juntou, com os embargos, o contrato de mútuo, a ficha de informação normalizada e as condições gerais e especificas do mútuo, como documentos 6 e 7.

         3. Alegou e provou que a assinatura de tais documentos não foi simultânea, que nunca esteve na presença do mutuante ou seu funcionário e que não lhe foram explicadas as cláusulas do contrato, tão pouco o que concerne aos seus elementos essenciais.

         4. A ficha de informação normalizada, o contrato de mútuo e condições gerais do mútuo foram assinados a 16/07/2009 pelos executados.

         5. Contudo, o contrato de mútuo e condições específicas foi redigido a 17/07/2009, ou seja, um dia depois da assinatura do contrato, o que é manifestamente impossível!

         6. Ainda, as condições gerais do contrato, assinadas a 16/07/09, foram redigidas a 15/07/09, tudo conforme documentos 6 e 7.

         7. O executado alegou e demonstrou que o Banco, para além de não o ter informado convenientemente das cláusulas e condições do contrato firmado entre ambos, ainda o enganou pois o executado assina os documentos todos a 16/07/2009, mas estes ora são redigidos a 15/07/09 ou a 17/07/2009.

         8. O Banco não conseguiu explicar tal situação, de onde o tribunal a quo tenha dado como provado que “não foram comunicadas e esclarecidas aos executados as condições a que estavam a aderir, nomeadamente taxas de juros praticadas, comissões e cláusula penal inserta no documento assinado” e tenha dito que não se provou o cumprimento desses deveres de comunicação e informação.

         9. Diga-se que nenhuma parte do contrato foi efectivamente discutida, informada ou negociada, retirando-se do testemunho do vendedor (chamado à lide pelo tribunal a quo) que apenas foi dito ao executado qual o preço da viatura e montante pecuniário da mensalidade a pagar.

         10. Quanto a estes factos o tribunal a quo formulou a sua convicção dando por provados os factos sob 14 e 24.

         11. Dos factos provados resulta igualmente a condição de analfabetismo dos executados à data dos factos e inclusivamente após a citação.

         12. A sentença recorrida vai exactamente no sentido contrário da jurisprudência dominante, pois que, sendo dados por provados os mesmos factos - para além de falecer a necessária comunicação das CCG aos executados, também as assinaturas não foram apostas em simultâneo, em que a assinatura do exequente corresponde a uma digitalização da assinatura, impressa no contrato de mútuo -, o ac. do STJ [de 30/10/2007] processo n.º 07A3048, confirmou o ac. do TRL, no qual se decidiu pela absolvição dos réus.

         13. Naquele ac. do STJ diz-se que: “Nos contratos de crédito ao consumo em que intervêm, além do comprador, o financiador e o vendedor, não sendo simultâneas as assinaturas das três partes contratualmente envolvidas, sai afrontada a defesa do consumidor e o seu direito a ser informado, se o financiador, usando de CCG comete a terceiro (a entidade vendedora do bem) o dever de informação, como que numa delegação de competência que viola um seu dever pessoal, mais a mais, sendo o consumidor analfabeto (…)”. “Importa considerar que qualquer contrato só se considera perfeito se a proposta for aceite e, concedendo que no caso dos autos porque três são os intervenientes no contrato, as assinaturas não [sejam simultâneas parece-nos que trai a defesa do consumidor cometer a terceiro] o dever de informação; no caso teria sido a entidade vendedora do veículo cuja aquisição foi financiada pela recorrente quem procedeu à informação como que numa informal delegação de competência deferida pela ora recorrente […].

         14. No mesmo sentido, vai o ac. do TRL de 15/03/2012, proc. 1693/2002.L1-6: ”Não tendo a contratante proponente provado que foi cumprido o dever legal de comunicação e informação, devem ser excluídas do contrato todas essas cláusulas nos termos do artigo 8 do DL 446/85 e deverá o contrato ser declarado nulo ao abrigo do art. 9/2 do DL 446/85, por se verificar uma indeterminação insuprível dos elementos essenciais do contrato.

         15. A acolher a sentença recorrida, fica assente que o Banco infringiu a lei no que toca à protecção do executado enquanto consumidor, porém sem qualquer cominação.

         16. A razão pela qual o Banco não cumpriu com a lei no que toca à fase pré-contratual, é precisamente para levar o executado a vincular-se a um contrato que não conhece, controlando a sua decisão deste modo no sentido de aderir ao que lhe é proposto, sem reservas, negociação ou explicações.

         17. O Banco não reúne presencialmente com o executado, não lhe explica ou faz entender os contornos do contrato que apresenta, leva-o a assinar toda a documentação e depois de assinado o contrato e devidamente vinculado, é que se predispõe a esclarecer eventuais dúvidas. Que dúvidas poderia ter o executado, se nada lhe foi dado a conhecer? Este procedimento devia ser efectuado antes de celebrado o contrato e não depois.

         18. O Banco agiu em abuso de direito ao vir exigir o cumprimento de obrigações às quais tinha obrigação legal de explicar e informar em detalhe para que o executado aderente tomasse uma decisão fundamentada, pois que lhe pede o pagamento uma quantia exorbitante a título de juros remuneratórios, abusivamente fixados sem que o executado conhecesse a sua taxa ou sequer tivesse oportunidade de a negociar. O mesmo se dirá quanto à cláusula penal por incumprimento contratual.

         19. Quanto a esta matéria, decidiu o já referido ac. do TRL 1693/2002.L1-6 que: “A arguição da nulidade do contrato com este fundamento não constitui abuso de direito” […]

         20. No mesmo sentido, vai o já referido ac. do STJ 07A3048: “Quanto à ponderação de abuso do direito por parte do consumidor que invoca vícios do contrato, após o início da sua execução, o tribunal deve actuar com particular prudência, já que, na relação de financiamento à aquisição de bens de consumo, é patente a desigualdade de meios entre o fornecedor dos bens ou serviços e o consumidor, sendo de equacionar se, ao actuar como actuou, a entidade financiadora da aquisição, prevalecendo-se de superioridade negocial em relação a quem recorreu ao crédito, não infringiu ela mesmo, em termos censuráveis, os deveres cooperação, de lealdade, e informação, em suma os princípios da boa fé”.

         21. Não deve a pretensão do executado de ver declarada a nulidade do contrato de mútuo ser indeferida, por abuso de direito, se a Banco violou os deveres de cooperação, lealdade e informação, usando de má-fé contratual.

         22. A clamorosa violação dos limites da boa fé, bons costumes ou fim do direito deve ser avaliada caso a caso, consoante as circunstâncias, sendo que, no caso do contratante que adere às cláusulas contratuais gerais, a violação dos limites da boa fé terá ser muito grave para se concluir pelo abuso do direito, face à especial protecção que a lei lhe concede e sob pena de esta protecção ser neutralizada (cfr neste sentido ac. do STJ de 28/04/2009, proc. 2/09.1YFLSB).

         23. Ora, não se provou nos autos uma acção do executado que fosse contrária aos limites impostos pela boa fé e, naturalmente, o entendimento perfilhado na decisão recorrida falece em demonstrá-lo.

         24. Neste sentido, vai o ac. do TRP de 04/10/2011, proc. 1341/08.4TJVNF.P1: “Na verdade, o facto de já ter decorrido um período de tempo durante o qual o contrato foi cumprido não significa necessariamente que o sujeito criou no proponente uma expectativa de que não irá impugnar a validade do contrato e de que prescindiu de se defender invocando a protecção que a lei lhe atribui, acontecendo que, frequentemente, só depois de decorrido algum tempo, quando ocorre uma situação de incumprimento, é que o contratante aderente se apercebe do sentido de algumas cláusulas.”

            O Banco contra-alegou, dizendo que: (também em síntese deste acórdão)

         1. Contrariamente ao que o executado pretende e, também, ao que o tribunal a quo entendeu, o Banco não só cumpriu efectivamente com os referidos deveres de comunicação e informação, como tal resulta até inequívoco da matéria de facto provada nos autos: pontos de facto 3, 4, 14, 15, 16, 22, 23, 24, 26.

         2. Como se pode pretender, face a estes factos, que não foram comunicadas aos executados as cláusulas do contrato dos autos? É evidente que o foram!

         3. Teria o exequente que enviar alguém expressamente ao pé dos executados para lhes ler (soletrando de preferência…) todo o texto do contrato dos autos? É evidente que não, até porque o contrato dos autos é um contrato celebrado entre ausentes e nunca os executados tal solicitaram, bem como nunca suscitaram ao exequente o esclarecimento de qualquer eventual dúvida ou questão relativamente ao dito contrato!

         4. Afinal o que é que do contrato dos autos não foi comunicado aos executados? É evidente que tudo lhes foi devidamente comunicado e que do teor do contrato os executados tomaram pleno conhecimento, tendo assinado e/ou rubricado todas as suas páginas!

         5. Neste sentido, Almeida e Costa e Meneses Cordeiro, em Clausulas Contratuais Gerais, Almedina, 1986, pág. 25, que: “O dever de comunicação é uma obrigação de meios: não se trata de fazer com que o aderente conheça efectivamente as cláusulas, mas apenas desenvolver, para tanto, uma actividade razoável. Nessa linha, o n.º 2, esclarece que o dever de comunicação não varia, no modo da sua realização e na sua antecedência, consoante a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas. Como bitola, refere-se a lei à possibilidade do conhecimento completo e efectivo das cláusulas por quem use de comum diligência. Encontra-se aqui uma afloração do critério geral de apreciação das condutas em abstracto e não em concreto.”

         6. É que, contrariamente ao que o executado pretende, o Banco não tem obrigatoriamente que ler e explicar aos seus clientes todas as clausulas dos contratos que com eles celebra (excepto evidentemente se estes não souberem ler ou lhe suscitarem duvidas acerca do conteúdo do contrato), o que o Banco tem que fazer (e faz, e fez) é assegurar que as condições contratuais acordadas constam dos contratos antes de estes serem assinados, precisamente para permitir que quem use de “comum diligência” possa ler e analisar o contrato, e estar à disposição dos seus clientes para lhes prestar quaisquer esclarecimentos que estes lhe solicitem sobre os contratos que celebra.

         7. E se porventura o executado não tivesse lido - como leu - o contrato dos autos antes de o assinar, foi porque não o quis fazer.

         8. As cláusulas do contrato dos autos, porque perfeitamente claras e explícitas, não justificam qualquer aclaração em especial (a não ser, evidentemente, que sobre elas tivesse sido pedido qualquer esclarecimento, o que não sucedeu), como, sendo o contrato dos autos um contrato celebrado entre ausentes (como ressalta do processo de elaboração antes descrito) sempre se teria que atender “às circunstâncias” que no n.º 1 do referido art. 6 do DL 445/85, se ressalvam.

         9. Neste sentido, os acs. do TRP de 15/12/2010, proc. 266/09.0TBLSD.P1, e do STJ de 13/09/2016, proc. 1262/14.1T8VCT-B.G1.S1.

         10. Mais acresce ainda que, como aliás está expressamente provado nos autos, foi prestada aos executados a informação pré-contratual legalmente exigida (cfr. doc. n.º 2 junto com a petição inicial), o que por si só é garante do cumprimento dos referidos deveres de comunicação e informação, nos termos aliás do n.º 5 do art. 6 do DL 133/2009, de 02/07.

         11. Há ainda que ter em consideração que, como também está expressamente provado nos autos, o executado já anteriormente tinha celebrado com o Banco outro contrato de mútuo (semelhante ao dos autos) com vista ao financiamento da aquisição de um veículo automóvel, pelo que a celebração de contratos de mútuo como o dos autos não era novidade para o executado.

         12. Mesmo que porventura se viesse a entender o contrário, o certo é que sempre a invocação pelos executados de tal suposta violação consubstanciaria um manifesto e evidente abuso de direito.

         13. Neste sentido, Vaz Serra, em Abuso do direito (em matéria de responsabilidade civil), estudo publicado em Boletim do Ministério da Justiça, 85, Abril 1959, págs. 330 e 331 e RLJ ano 94, pág. 203 e ano 103, pág. 34 e 35 e 447; ac. do STJ de 10/02/2000, publicado em Colectânea de Jurisprudência STJ, Tomo I, pág. 78; e, embora relativamente à questão de entrega de exemplar do contrato, os acs. do TRL de 2/06/2005, proc. 4336/2005-8; do TRE de 17/11/2010, proc. 27/08.4BBJA.E1, do TRE de 08/09/2011, proc. 3358/09.2TBFAR; do TRL de 09/05/2006, proc. 12155/2005-7, e do TRP 22/02/2005, proc. 046038.

         14. A invocação pelos executados, apenas depois de judicialmente demandados para os termos da execução por incumprimento do contrato, da pretensa invalidade do contrato de mútuo dos autos que confessadamente e há muito celebraram com o Banco, por suposta violação do referidos deveres de comunicação e informação – que foram cumpridos, como se explicitou -, nos termos, pelos “motivos”, no momento (ou seja, cerca de 6 anos e meio depois de terem celebrado com o recorrido o contrato de mutuo dos autos nas precisas condições que dele constam; depois do ora recorrido lhes ter emprestado, a pedido deles, a quantia mutuada para a compra de um veiculo automóvel que os executados há muito para si adquiriram, usufruíram e utilizaram; e depois ainda dos executados terem pago 30 das 48 prestações mensais acordadas em tal contrato) e com a finalidade com que são feitas tais invocações (o tentar fugir às suas responsabilidades), e tudo isto sem que nunca antes tenham invocado qualquer pretenso desconhecimento do contrato que celebraram, nem qualquer suposta violação dos referidos deveres – apesar dos vários contactos com eles havidos -, configura não só um manifesto venire contra factum proprium, como constitui a invocação de excepção contra a boa fé, e uma manifesta e irrefutável quebra da confiança objectiva em que o Banco de boa fé, e em função da conduta do executado sempre investiu e confiou.

         15. Por outro lado, importa ainda referir que contrariamente ao que o executado pretende, o eventual não cumprimento dos referidos deveres de comunicação e informação não gera a nulidade do contrato, mas a exclusão das cláusulas gerais, nos termos do disposto no art. 9 do DL 446/85.

         16. Ora, da analise do contrato de mútuo dos auto, designadamente das respectivas condições especificas do mesmo expressamente acordadas, ressalta à saciedade que tais condições especificas contêm todos os elementos essenciais de um contrato de mútuo, como sejam, por exemplo, a identificação das partes e respectivas assinaturas, a quantia mutuada, o bem objecto do financiamento, a taxa de juro e a TAEG, o numero e a periodicidade da prestações acordadas, o montante de cada prestação, as datas de vencimento de cada prestação, o valor total das prestações etc…, pelo que mesmo que porventura tivessem sido violado os referidos deveres (e não o foram), e mesmo que não houvesse (como há) um claro abuso de direito na invocação do Banco, o certo é que tal não acarretaria a nulidade do referido contratos mas sim, quando muito, a exclusão das condições gerais do mesmo.

         17. Acresce, ainda, que mesmo que inexistissem, ou fossem excluídas, as condições gerais do contrato de mútuo dos autos, o certo é que a única parte, relativamente ao pedido formulado nos autos, em que o Banco decairia respeitava apenas a 2% do acréscimo de 4 pontos percentuais relativamente às taxas de juros acordadas em ambos os contratos a título de cláusula penal (que corresponde aliás ao expressamente permitido no n.º 2 do artigo 7 do DL 344/78, de 17/11, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 83/86, de 06/05, pelo que tal acréscimo de 4% não é nem nunca poderá ser considerado como excessivo ou desproporcional)

         18. Mesmo sem condições gerais o Banco sempre poderia peticionar a título de juros moratórios um acréscimo de 2% à taxa contratual acordada (em vez do acréscimo de 4% da cláusula penal), nos termos e de harmonia com o disposto no art. 7/1 DL 344/78, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 83/86.

                                                                 *

            Questões que importa decidir: se as cláusulas deviam ter sido excluídas do contrato, com a eventual consequência da nulidade do mesmo, sem se impedir o exercício desse direito com base no abuso do mesmo (desconsidera-se a questão da nulidade da sentença, que aflora nas conclusões do recurso, visto que a questão é antes, de forma clara, de um possível erro de julgamento).

                                                      *

            Factos provados (já com a acrescento da 2ª parte – a partir do ponto - do ponto 16, decidido neste acórdão):

         1. Serve de base à execução requerimento de injunção, apresentado a 26/11/2012, ao qual foi aposta fórmula executória a 01/02/2013.

         2. Nesse requerimento de injunção, é dito:

         “O Banco no exercício da sua actividade comercial e através do contrato supra referido concedeu aos executados crédito directo, com destino à aquisição de um veículo automóvel x com a matrícula xx-xx-LT, tendo assim emprestado 8825€, com juros à taxa nominal de 21,75% ao ano, devendo a importância do empréstimo, ser pago, nos termos acordados, em 48 prestações, mensais e sucessivas, com vencimento, a primeira, em 10/08/2009 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes mediante transferências bancárias a efectuar, aquando do vencimento de cada uma das referidas prestações, para a conta bancária, sediada em Lisboa, logo indicada pelo Banco.

         Foi expressamente acordado que a falta de pagamento de três ou mais prestações sucessivas na data dos respectivos vencimentos implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações e implicava um acréscimo de 4% á taxa de juros acordada, ou seja, uma taxa de juro de 25,75%.

         Os executados, das prestações referidas, não pagaram a 30.ª prestação e seguintes, tendo contudo pago a 31.ª, que se venceu em 10/02/2012 - num total de 18 – vencida a primeira em 10/01/2012, vencendo-se então todas do montante cada uma de 283,23€, tendo contudo entregue 41,30€, ficando assim em divida 5056,84€.

         O total das prestações em débito pelos executados ao Banco, ascende a 5056,84€.

         Os juros vencidos até ao presente – 24/11/2012 - ascendem já a 1141,60€.

         O imposto de selo, sobre os juros referidos, ascende já a 45,66€.

         Os executados devem, assim, ao Banco 5056,84€, bem como, nos termos referidos, 1141,60€ de juros vencidos até ao presente – 24/11/2012 - mais 45,66€ de imposto de selo sobre os juros vencidos, mais os juros que à referida taxa de 25,75%, se vencerem, sobre o dito montante de 5056,84€ desde 25/11/2012 até integral e efectivo pagamento e, ainda, o imposto de selo sobre os juros vincendos.

         Incumprimento do contrato (xxxxxx) no valor de 5056,84€ + juros entre 10/01/2012 e 24/11/2012 (1141,60€ (320 dias a 25,75%))

         Capital Inicial: 5056,84€

         Total de Juro: 1141,60€

         Capital acumulado: 6198,44€”

         3. O Banco e os executados, estes na qualidade de 1º e 2º mutuário, subscreveram escrito intitulado “contrato de mútuo n.º xxxxxx”, com a data de 17/07/2009 e no qual estão apostas, no fundo, assinaturas com os dizeres “E”, “ME” e, por baixo de cada uma das assinaturas, “Recebi e assinei original a 16/07/2009”.

         4. Mostram-se igualmente apostas assinaturas com os dizeres “E”, “ME” no canto superior direito de cada uma das páginas e no fundo da última página das “Condições Gerais”, anexas ao documento referido no ponto anterior.

         5. No mesmo, os mutuários indicam como sua morada “Rua X”.

         6. Nas “Condições Específicas” desse documento diz-se, para além do mais:

         - Que o “objecto do financiamento” é “Viatura X, matrícula xx-xx-LT e “outras despesas”.

         - Montante total do financiamento: 8825€;

         - Data de vencimento da 1ª prestação: 10/06/2009 e data de vencimento da última prestação 10/07/2013;

         - Número de prestações – 48, com periodicidade mensal;

         - Montante de cada prestação: 283,23€ (ao montante indicado acresce 1,50€ por cada cobrança)”.

         - Taxa anual nominal de juros fixa ao longo da vida do contrato: 21,750%.

         - TAEG: 23,387%

         7. Os executados não receberam o capital directamente, uma vez que este foi depositado directamente na conta do vendedor do veículo e mediador do crédito, V-Lda.

         8. Nas condições específicas do documento referido em 3, previa-se “o 1º mutuário autoriza que, para pagamento das prestações acima indicados, bem como de quaisquer outras verbas decorrentes deste contrato, designadamente juros de mora e despesas de cobrança, a sua conta, da CGD com o NIB xxxxxxxxxxxxxxx seja debitada, por contrapartida de uma conta de que o Banco seja titular. (…)”

         9. Foram efectuados os seguintes débitos na conta Banco com o n.º referido no ponto anterior e a sua favor:
         - 2009-08-17, no montante de €284,73;
         - 2009-09-11, no montante de €284,73;
         - 2009-10-12, no montante de €284,73;
         - 2009-11-10, no montante de €307,29;
         - 2009-12-10, no montante de €307,29;
         - 2010-01-11, no montante de €307,29;
         - 2010-02-10, no montante de €307,29;
         - 2010-03-10, no montante de €307,29;
         - 2010-04-20, no montante de €329,49;

         - 2010-05-31, no montante de €331,70; (…)

         10. A 23/3/2012, foi debitado na mesma conta, a favor do Banco, o valor de 349,44€.

         11. O executado frequentou, no ano lectivo de 1968/1969, na Escola Básica e Secundária de X, o 1º ano de escolaridade, com aproveitamento.

         12. A executada frequentou, no ano lectivo de 1980/1981, na Escola Básica e Secundária de X, o 2º ano de escolaridade, com aproveitamento.

         13. Os executados foram formandos no Curso de Aquisição de Competências Básicas – B1, da Escola Profissional de X, ministrado entre 09/04/2015 e 03/08/2015, das 08h30 às 12h30.

         14. Nunca os executados estiveram na presença de pessoa ao serviço do Banco nem assinaram documentos em simultâneo com a mesma.

         15. O vendedor do veículo era simultaneamente mediador de crédito, autorizado pela exequente.

         16. Foi entregue aos executados uma ficha de informação normalizada. Dessa ficha consta que a data da mesma é 15/07/2009, ela está assinada pelos executados e ao lado das assinaturas, com o mesmo tipo de letra, consta o seguinte: recebi e assinei original a 16/07/2009.

         17. Na cláusula 8ª das Condições Gerais associadas ao documento referido em 3 prevê-se:

         “a) O(s) mutuário(s) ficará(ão) constituídos em mora no caso de não efectuar(em), aquando do respectivo vencimento, o pagamento de qualquer prestação.

         b) Em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas, o Banco poderá considerar vencidas todas as restantes prestações, incluindo nelas os juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas Condições Específicas, desde que por escrito em carta simples dirigida ao mutuário para a morada constante do contrato lhe conceda um prazo suplementar de quinze dias de calendário para proceder ao pagamento das prestações em atraso acrescidas da indemnização devida pela mora, com expressa advertência de que tal falta de pagamento neste novo prazo suplementar implica o dito vencimento por perda de benefício do prazo.

         c) Em caso de mora incidirá sobre o montante em débito e durante o tempo da mora, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual, acrescida de 4 pontos percentuais.

         d) Ao montante referido na alínea anterior, antes do envio da comunicação escrita mencionada na anterior alínea b), para fazer face a despesas decorrentes do incumprimento, nomeadamente diligências para a respectiva gestão, acresce uma comissão mensal de gestão por cada prestação em mora cujo valor será de 17,50€ no primeiro mês e de 10€ por cada mês adicional em que a prestação se mantenha em mora. Esta comissão mensal de gestão será actualizada anualmente a uma taxa que não ultrapassará a taxa de juro legal.

         e) Sem prejuízo do referido na anterior alínea b), o Banco poderá exigir o pagamento de quaisquer prestações em mora acrescidas da indemnização referida na anterior alínea c) e d) desde a data do vencimento da prestação ou prestações em causa.

         18. Na cláusula 18ª, al. b) e c) das mesmas Condições Gerais diz-se o seguinte:

         “a) Por efeito deste contrato e durante a sua vigência o(s) mutuário(s) caso tenha(m) subscrito conforme condições específicas, desde que à data da sua celebração não exceda(m) os 70 anos, goze(m) de boa saúde e não esteja(m) sob controlo médico regular devido a doença ou acidente, beneficie(m) de uma apólice de um seguro de vida ou de um seguro de acidentes pessoais, subscrita pelo Banco, pela qual, o capital vincendo em dívida à data dessa ocorrência, ficará(ão) integralmente saldados, nas situações emergentes de (…)”

         19. Em data não concretamente apurada, o embargado aderiu ao seguro referido no ponto anterior, pelo que o valor da prestação mensal total devida, a partir da 4ª prestação e até à 29ª, inclusive, passou a ser de pelo menos 305,79€.

         20. O montante referido em 10 foi imputado ao pagamento da 31ª prestação e prémio de seguro respectivo, vencidos em 10/02/2012 e ainda a juros e encargos inerentes à mora.

         21. O executado é titular de carta de condução de veículos automóveis das categorias B e B1 desde 04/05/2004.

         22. Em Abril de 2005, o executado subscreveu um outro escrito, intitulado “contrato de mútuo n.º yyyyy”, no qual o Banco lhe concedeu financiamento da aquisição de um veículo automóvel w, matrícula xx-xx-JS, veículo este fornecido também pela firma V-Lda.

         23. Os executados assinaram e devolveram ao Banco o exemplar do contrato referido em 3 e da respectiva informação pré-contratual e guardaram para si os exemplares de tais documentos que lhes foram destinados.

         24. As condições específicas e gerais do contrato em causa encontravam-se já integralmente impressas quando os executados assinaram e rubricaram todas as folhas que o compõem e não foram pré-negociadas.

         25. O Banco enviou aos executados cartas datadas de 20/09/2012, remetidas para a morada do ponto 5, nas quais se diz o seguinte: “Apesar de todas as diligências e insistentes contactos já ocorridos, continua V. Exa sem pagar as importâncias em dívida do contrato em referência. Encontram-se ao presente em débito 3 ou mais prestações sucessivas, ou seja, as:
         - Prestação n.º 30, vencida em 10-01-2012;
         - Prestação n.º 32, vencida em 10-03-2012;
         - Prestação n.º 33, vencida em 10-04-2012;
         - Prestação n.º 34, vencida em 10-05-2012;
         - Prestação n.º 35, vencida em 10-06-2012;
         - Prestação n.º 36, vencida em 10-07-2012;
         - Prestação n.º 37, vencida em 10-08-2012;

         - Prestação n.º 38, vencida em 10-09-2012;

         Assim, nos termos e de harmonia com o disposto nas Cláusulas das Condições Gerais do referido contrato comunicamos a V. Exa que lhe concedemos um prazo suplementar de 20 dias de calendário a contar da data da presente carta, para proceder ao pagamento do montante das ditas prestações, acrescido dos respectivos juros, da comissão de gestão em função de cada prestação em mora, tudo no total de 3117,33€.

         Caso até ao termo do limite do referido prazo não seja efectuado o pagamento da referida importância consideramos, nos termos expressamente acordados, vencidas todas as demais prestações por perda do benefício do prazo contratual (…)”.

         Mais se apurou que:

         26. Em momento algum os executados comunicaram ao Banco ou ao mediador dificuldades em ler ou escrever ou referiram não compreender o teor do documento referido em 3.

         Como facto não provado, entre outros, consta:

         28. Foram comunicadas e esclarecidas aos executados as condições a que estavam a aderir, nomeadamente as taxas de juro praticadas, comissões e cláusula penal inserta no documento assinado.


I

            Os fundamentos da sentença recorrida: (em síntese deste acórdão)

         Banco e executados celebraram contrato de crédito ao consumo, sob a forma de mútuo bancário, legalmente definido no art. 4 do DL 133/2009, de 02/06, e substantivamente regulado pelas disposições dos arts. 1142 e seguintes do Código Civil, pelas disposições do referido DL e pelos arts. 362 e 394 a 396 do Código Comercial (sem esquecer o artigo único do DL 32765, de 29/04/1943).

         O Banco não cumpriu os deveres de comunicação e de informação previsto nos arts. 5 e 6 do DL 446/85, como decorre de não ter ficado provado o que consta do facto sob 28. A consequência para o desrespeito destas normas é, nos termos do art. 8, als. a) e b) do mesmo diploma, que as mesmas se considerem excluídas dos contratos singulares (e não a nulidade do contrato).

         Porém, o tribunal não pode deixar de analisar a conduta dos executados à luz do instituto do abuso de direito (art. 334 do CC). Neste caso, apesar da reduzida escolaridade dos executados (factos 11 a 13), certo é que os mesmos não são inexperientes neste tipo de contrato. Resulta da factualidade provada que já em 2005, o embargante celebrou contrato semelhante, também com o Banco, para aquisição de um veículo Não consta, nem tal foi alegado pelos executados, que tenha havido qualquer problema relativamente a este primeiro contrato, em tudo semelhante ao que agora cabe analisar. Se voltaram a recorrer a crédito em moldes semelhantes, é sinal que compreendiam o que estava em jogo e as obrigações que assumiam junto do embargado por via do mesmo. Acresce que em momento algum os executados comunicaram, quer ao mediador quer ao Banco, qualquer dificuldade em ler, escrever ou em compreender os termos do contrato que haviam subscrito. Apenas o vêm fazer decorridos quase 7 anos desde a data da celebração do contrato, depois de pagas 31 das 48 prestações acordadas, em cujo cálculo influía a taxa de juro que agora dizem desconhecer e quando se vêem impossibilitados de cumprir com as obrigações assumidas e visados num processo executivo. Perante isto, não podemos deixar de concluir que o executado age em manifesto abuso de direito, mais concretamente na modalidade de venire contra factum proprium (ac. do TRC de 25/01/2011, proc. 307/09.1TBSRT.C1).

         Quanto ao vencimento dos juros remuneratórios, constitui jurisprudência uniformizada, a partir do AUJ 7/2009 do STJ, de 25/03/2009, que “no contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artigo 781 CC não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados.”

         Mas perfilhamos o entendimento, propugnado igualmente pelo TRL de 04/07/2013 e pelo TRG de 14/11/2013 (aliás, estribando-se num segmento da fundamentação do AUJ), segundo o qual nada impede que as partes, ao abrigo da liberdade contratual, afastem este regime, como no caso afastaram, convencionando expressamente que em caso de vencimento imediato das demais prestações, estas continuem a vencer os juros remuneratórios previstos, já que não estamos perante norma imperativa (o art. 781 do CC). Pelo que são devidos os juros pedidos.

         Quanto aos juros usurários, questão posta ao abrigo do art. 28 do DL 133/2009, por força do art. 37 deste DL, o mesmo só entrou em vigor no dia 01/10/2009, data posterior à celebração do contrato aqui em causa (17/07/2009), ressalvando o n.º 7 daquele artigo os efeitos decorrentes de contratos já celebrados ou em vigor. Será portanto inaplicável a este contrato a sua disciplina. E anteriormente, o seu antecessor, DL 359/91, de 21/09, não contém qualquer norma expressa sobre a taxa máxima de juros, remuneratórios ou moratórios. Antes de 2009, entendia-se ser intenção legislativa a liberalização das taxas de juros estipuladas pelas instituições bancárias. Com efeito, o Banco de Portugal, através do aviso n.º 3/93 de 20 de Maio, estabeleceu no seu n.º 2 que “são livremente estabelecidas pelas instituições de crédito e sociedades financeiras as taxas de juro das suas operações, salvo nos casos em que sejam fixadas por diploma legal.” Daqui, a vasta maioria da doutrina e da jurisprudência [que cita, referindo também contra a posição de Carlos Gabriel da Silva Loureiro, juros usuários no crédito ao consumo, Revista de estudos politécnicos, 2007] extrai (no período pré-DL 133/2009, claro está) a inexistência de limites máximos às taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras e a inaplicabilidade do regime legal dos artigos 102 do CCom, 599-A e 1146 do CC sempre que o mutuário seja uma instituição de crédito. Pelo que também aqui não devem ter provimento os argumentos invocados pelo executado.

                                                                 II

            Do incumprimento do dever de comunicação das cláusulas contratuais gerais

            O executado, nas primeiras nove conclusões do recurso, parece estar a pôr em causa parte da decisão da matéria de facto, ao menos enquanto nalgumas delas invoca factos que não estão dados como provados e faz referência a prova que serviria para fundamentar uma decisão contrária de provados.

            A argumentação é dúbia, para além do mais porque, embora só refira 2 documentos, que dizem respeito, um a uma ficha de informação normalizada e outro ao contrato, com as condições específicas e gerais, o executado fala destas como se não fossem o contrato, e diz que as condições gerais foram redigidas a 15/07/2009 enquanto o contrato foi redigido a 17/07/2009.

            Se se descontar esta ‘confusão’ e se se tiverem em conta os documentos 6 e 7 e os factos provados sob 3, 4 e 16, as únicas coisas que não constam dos factos dados como provados é que a ficha de informação normalizada foi redigida a 15/07/2009 e que os executados também a assinaram a 16/07/2009.

            Não se vê qual o interesse que o executado pode ter no eventual acrescento destes factos, que poderá antes beneficiar a parte contrária. Mas, por isso mesmo, e em benefício da discussão, entende-se que a questão deve ser tida em conta.

            Do documento n.º 6 consta, no espaço 3: data da FIN: 15/09/2009. E ao lado da assinatura dos executados constam os dizeres: recebi e assinei original a 16/07/2009. Quer o documento quer as assinaturas dos executados e os dizeres que constam ao lado delas não foram impugnados, antes aceites e utilizados por ambas partes nos seus articulados, pelo que se considera que estes dados devem ser acrescentados ao ponto 16 dos factos provados, tanto mais que os mesmos dizeres constam como provados no ponto 3.

            Já a invocação do depoimento de uma testemunha, feita na conclusão 9 do recurso, não se refere a qualquer facto que tenha sido dado como provado e que o executado diga que quer que fique não provado, nem o executado diz que quer que tal facto fique provado, pelo que não pode funcionar como impugnação da decisão da matéria de facto. De resto, logo a seguir o executado diz o que consta da conclusão 10, o que aponta no mesmo sentido.

                                                       *

            O Banco nas suas conclusões de recurso, diz que comunicou aos executados as cláusulas do contrato. Não diz estar a impugnar a decisão da matéria de facto, não faz qualquer referência ao ponto de facto dado como não provado sob 28, nem diz pretender alargar o âmbito do recurso, fazendo uso da prerrogativa do art. 636/2 do CPC, como o teria de fazer para alertar devidamente o executado, de forma a dar a este condições de exercício do direito previsto no art. 638/8 do CPC.

            O Banco não está, assim, a impugnar a decisão da matéria de facto, designadamente o ponto 28 dos factos dados como não provados, mas apenas a dizer que dos factos provados que indica se pode tirar a conclusão de que a comunicação e informação das cláusulas foram feitas.

            Assim, não se trata de pôr em causa a decisão de dar como não provado o facto sob ponto 28, mas apenas de pretender que, juridicamente, os factos provados podem ser interpretados como correspondendo ao cumprimento dos deveres de comunicação e de informação, apesar de, de facto, o Banco não ter comunicado ou informado as cláusulas aos executados. E, nesta medida, mas apenas nesta medida, a argumentação do Banco será considerada.

            Caso contrário, o Banco estaria, sem impugnar a decisão da matéria de facto nos termos devidos, a pretender que fossem dados como provados factos que a sentença expressamente deu como não provados, conduzindo a um resultado processual inadmissível, como o disse, por último, o ac. do STJ de 06/04/2017, 374/13.3TBSTS.P1.S1: Constitui violação de princípios fundamentais da disciplina processual que, sem que tenha havido impugnação da decisão relativa à matéria de facto, a Relação, fazendo uso de presunções judiciais, tenha partido de factos provados para dar como provados factos essenciais que a sentença deu como não provados.

                                                      *

            Posto isto,

            A sentença considerou expressamente que o Banco não cumpriu com os deveres que lhe são impostos pelos arts. 6 e 8 do DL 446/85 e que sempre resultariam do disposto também nos arts. 232 e 236 do CC (neste sentido, Carlos Ferreira de Almeida, Contratos I, 2015, 5ª edição, Almedina, págs. 176/177).

            O Banco põe isto em causa invocando alguns pontos de facto dados como provados.

            O ponto 3 dá conta de que o contrato foi celebrado, com data de 17/07/2009 e que os executados o assinaram e disseram ter recebido o original do contrato/documento no dia 16/07/2009. Ora, para além de a data do contrato ser posta em causa pelo facto de ele estar a ser assinado no dia 16/07/2009, disto não decorre qualquer comunicação das cláusulas do contrato. Os executados não dizem ter recebido o original ou as cláusulas antes do momento em que o assinaram.

            O art. 5/1 do DL 446/85, na redacção em vigor, o que diz é que “as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. 2. A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.” Ou seja, as cláusulas têm que ser comunicadas antes da assinatura.

            O ponto 4 não acrescenta nada ao ponto 3, para além da confusão de se esquecer que as condições gerais não estão anexas, são, sim, parte do contrato.

            O ponto 14 diz que os executados nunca estiveram na presença de pessoa ao serviço do Banco nem assinaram documentos em simultâneo com a mesma. Daqui não pode decorrer qualquer comunicação das cláusulas.

            O Banco aproveita o facto para falar aqui em contratos entre ausentes, como se esta circunstância servisse para afastar (ou atenuar?) os deveres de comunicação das cláusulas. Mas sem qualquer razão. O tema dos ausentes e dos presentes esteve em cima da mesa, há uns anos atrás, quando se discutia a questão da falta da entrega do documento/contrato como causa de nulidade. Nunca se pretendeu que, se o contrato não fosse celebrado entre presentes, o predisponente das cláusulas estivesse desobrigado dos deveres de comunicação. O ac. do STJ de 2007, citado pelos executados, é claro nesse sentido. Se o Banco utiliza mediadores no cumprimento da obrigação da comunicação, a eventual falha destes no cumprimento dela corre por conta do Banco e não por conta dos executados (art. 800 do CC). Dai, por outro lado, o disposto no art. 9 do DL 133/2009 (: “1 - Os artigos 6, 7 e 8 não são aplicáveis aos fornecedores ou aos prestadores de serviços que intervenham como intermediários de crédito, desde que a título acessório. 2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o credor deve assegurar que o consumidor recebe e conhece as informações pré-contratuais mencionadas, designadamente através dos fornecedores ou dos prestadores de serviços a que se refere o número anterior. 3 - Compete ao credor fazer prova do cumprimento do disposto neste artigo.”) 

            O ponto 15 fala do vendedor do veículo. Não decorre dele qualquer comunicação das cláusulas.

            O ponto 16 diz que foi entregue aos executados uma ficha de informação normalizada. Como o ponto não dizia quando é que tal tinha acontecido, o mesmo era completamente irrelevante para a questão. No entanto, por força do recurso dos executados, foram acrescentados ao ponto 16 mais alguns factos. Mesmo assim, destes não decorre que a FIN tenha sido entregue antes da assinatura do contrato.

            Pode-se, no entanto, fazer a seguinte construção: a FIN é de 15/07/2009. O contrato foi celebrado a 17/07/2009, logo, os executados teriam tido a FIN desde 15/07/2009 e por isso teriam podido conhecer as cláusulas. Mas nada disto é certo. Pois que, o que se sabe é apenas que os executados disseram ter recebido a FIN na mesma data em que dizem ter assinado e recebido o contrato. Quando o que o Banco devia ter provado é que ela foi entregue com a antecedência necessária (daí que, em anotação ao art. 6 do DL 133/2009, que trata desta ficha de informação normalizada, Fernando de Gravato de Morais diga que o período de antecedência quanto à prestação da informação ao consumidor deve ser razoável em relação ao (possível) momento da conclusão do contrato de crédito, não podendo ser dada a informação e, sucessivamente, ocorrer a celebração do contrato, ressalvados pontuais casos.” - Crédito aos consumidores, Almedina, 2009, págs. 46 e 47).

            O ponto 22 diz respeito a um outro contrato anterior semelhante a este. A sua invocação pelo Banco é uma evidente petição de princípio: primeiro teria que provar que os executados tiveram conhecimento das cláusulas do anterior contrato, o que de modo algum resulta do ponto 22. É perfeitamente normal que, por exemplo, se o cumprimento do anterior contrato tiver corrido bem – o que deve ter ocorrido, visto que foi celebrado novo – os executados nunca tenham tido que averiguar o que é que ele dizia. Mas note-se que o ponto 22 nem sequer diz que os executados tivessem o anterior contrato em poder deles para o poderem consultar. 

            O ponto 23 diz respeito o que os executados fizeram depois de assinar o contrato. Dele não pode resultar, por isso, que eles tivessem conhecimento do contrato antes de o assinarem.

            O ponto 24 diz que já estava tudo impresso antes dos executados terem assinado o contrato. Como é que daqui poderia decorrer a comunicação antecipada das cláusulas?

            O ponto 26 diz que os executados não comunicaram ao Banco ou ao mediador dificuldades em ler ou escrever ou referiram não compreender o teor do contrato. Como é que isto pode implicar que o Banco lhes tenha comunicado as cláusulas?

            É assim manifesto que dos factos provados não decorre, seja como for, que o Banco tenha comunicado as cláusulas do contrato aos executados.

            Os acórdãos invocados pelo Banco são, por isso, inúteis na defesa da tese do mesmo. É que mesmo que o contrato tivesse sido entregue antes da assinatura do mesmo pelos executados – e nem disso há prova – está perfeitamente assente que tal, só por si, não seria suficiente para prova da comunicação imposta pelo art. 5 do regime das CC’G’ – veja-se apenas por exemplo um dos acórdãos citados pelo próprio Banco, qual seja, o do STJ de 13/09/2016, proc. 1262/14.1T8VCT-B.G1.S1:

         I - É aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais ao clausulado inserido no corpo contratual individualizado cujo conteúdo, previamente elaborado, o destinatário não pode influenciar.

         II - O cumprimento das prestações impostas pelos arts. 5 e 6 da LCCG – cuja prova onera o predisponente – convoca deveres pré-contratuais de comunicação das cláusulas (a inserir no negócio) e de informação (prestação de todos os esclarecimentos que possibilitem ao aderente conhecer o significado e as implicações dessas cláusulas), enquanto meios que radicam no princípio da autonomia privada, cujo exercício efectivo pressupõe que se encontre bem formada a vontade do aderente ao contrato e, para tanto, que este tenha um antecipado e cabal conhecimento das cláusulas a que se vai vincular, sob pena de não ser autêntica a sua aceitação.

         III - Por isso, esse cumprimento deve ser assumido na fase de negociação e feito com antecedência necessária ao conhecimento completo e efectivo do aderente, tendo em conta as circunstâncias (objectivas e subjectivas) presentes na negociação e na conclusão do contrato – a importância deste, a extensão e a complexidade (maior ou menor) das cláusulas e o nível de instrução ou conhecimento daquele –, para que o mesmo, usando da diligência própria do cidadão médio ou comum, as possa analisar e, assim, aceder ao seu conhecimento completo e efectivo, para além de poder pedir algum esclarecimento ou sugerir qualquer alteração.

         IV - É certo que as exigências especiais da promoção do efectivo conhecimento das cláusulas contratuais gerais e da sua precedente comunicação, que oneram o predisponente, têm como contrapartida, também por imposição do princípio da boa-fé, o aludido dever de diligência média por banda do aderente e destinatário da informação – com intensidade e grau dependentes da importância do contrato, da extensão e da complexidade (maior ou menor) das cláusulas e do nível de instrução ou conhecimento daquele –, de quem se espera um comportamento leal e correcto, nomeadamente pedindo esclarecimentos, depois de materializado que seja o seu efectivo conhecimento e informação sobre o conteúdo de tais cláusulas.

         V - Porém, essa constatação, em caso algum, poderá levar a admitir que o predisponente fique eximido dos deveres que o oneram, ou a conceber como legítimas uma sua completa passividade na promoção do efectivo conhecimento das cláusulas contratuais gerais e, sobretudo, uma ausência de comunicação destas ao aderente com a antecedência necessária ao conhecimento completo e efectivo, até para que o mesmo possa exercitar aquele seu dever de diligência, nos apontados termos. Uma tal concepção conduziria à inversão não consentida da hierarquia legalmente estatuída entre os deveres do predisponente e do aderente.

         VI - No caso em apreço, apenas no circunstancialismo da subscrição ou outorga do contrato foram dadas a conhecer à aderente a cláusula contratual geral em discussão, quando, por tudo o exposto, a mesma não teria, para o efeito, de desenvolver mais do que uma diligência comum e era à proponente que caberia propiciar-lhe o antecipado e efectivo conhecimento daquela cláusula.

            E, por tudo isto, este acórdão considerou que:

         VII - Por outro lado, o dever de atempada comunicação, face à sua identificada ratio, também não fica preenchido com as declarações constantes na escritura de que, no dia da sua celebração, esta foi lida aos outorgantes e feita a explicação do seu conteúdo, questão cuja pertinência mais se realça atentando na significativa complexidade do clausulado alusivo à «renúncia ao benefício da excussão prévia» e à sua elevada repercussão (importância) para a embargante, para quem, sendo uma funcionária administrativa, aquela é uma expressão de alcance jurídico dificilmente inteligível.

            Ou seja, nem a leitura (aliás, não é bem a leitura que se impõe, o que no caso, por falta de interesse não se desenvolve) do contrato antes da assinatura, só por si, sem mais, seria suficiente para permitir a conclusão da comunicação das cláusulas, para mais quando, como no caso dos autos, os executados apenas tinham o 1º e o 2º ano de escolaridade à data do contrato e as condições gerais ocupam duas páginas de texto denso e compactado, cada uma delas com 70 linhas de escrita com margens muito curtas, que dariam muitas mais linhas normais do que as 140 linhas da soma das duas.

            Posto isto, o que importa é que, no caso, foram dadas como não provadas as afirmações feita pelo Banco de que tinha comunicado as cláusulas aos executados e esclarecidas as condições a que estavam a aderir.

            Ora, como o ónus da prova destas afirmações de facto cabiam ao Banco – art. 5/3 do regime das CC’G’ do DL 446/85: O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais -, é a eles que a circunstância de não se terem provado tem de desfavorecer, considerando-se excluídas do contrato as cláusulas não comunicadas (art. 8-a do DL 446/85).

                                                      III


Do suposto abuso de direito

            A sentença recorrida entende, no entanto, que o executado não pode invocar esta consequência, porque agiu com abuso de direito.

            Quer a decisão recorrida, quer as alegações das partes, fazem referência a inúmeros acórdãos a favor desta solução e contra ela.

            O ac. do STJ acabado de citar, de 13/09/2016, proc.  1262/14.1T8VCT-B.G1.S1, e que tinha sido invocado pelo próprio Banco, é particularmente significativo na defesa da tese contrária à do Banco (como já o era a propósito do anterior problema):

         VIII - O factum proprium apto a violar a boa-fé ou a confiança da recorrente e a constituir o aqui invocado exercício abusivo do direito pela embargante pressuporia, enquanto facto voluntário, a ciência e a vontade dessa violação. Ora, no caso, a exequente não provou ter propiciado à embargante o efectivo conhecimento da discutida cláusula, pelo que, no contexto, assim configurado, do incumprimento dos deveres de comunicação e de informação que sobre ela impendiam, não podem ser avocados os (inverificados) pressupostos cognitivos da liberdade de contratar por parte da embargante, que integrariam, simultaneamente, o elemento subjectivo da putativa violação da confiança.

         IX - Por consequência, não podendo ser subjectivamente imputado à embargante o alegado comportamento anterior, ou a referida conduta voluntária, fica arredada a invocada violação da expectativa ou confiança supostamente gerada na recorrente.

            Ou seja, em relação à tese do Banco, e pressupondo toda a discussão que já consta do transcrito acima, para não a estar a repetir aqui, este acórdão sugere as seguintes falhas daquela tese: (i) esquece que foi o Banco que deu origem ao problema ao não ter cumprido o dever legal de comunicação das cláusulas contratuais que inseriu no contrato, (ii) bem como que não se prova qualquer conduta dos executados que fizesse crer ao Banco que nunca iriam levantar a questão (até porque não se prova que eles tivessem conhecimento da mesma) e que, por isso, (iii) nem sequer se pode dizer que o Banco tivesse algum razão para ter feito algum investimento – aliás, em quê? – que a invocação da exclusão viesse a afectar. 

            No mesmo sentido, veja-se o ac. do TRL de 13/10/2016, proc. 28382/15.2YIPRT.L1:

         V. Não constitui abuso de direito a conduta do aderente do contrato que, decorridos vários anos após a celebração do contrato, invoca a anulabilidade do mesmo por falta de um elemento imposto por lei ou a exclusão de cláusulas contratuais gerais por falta do cumprimento dos deveres de comunicação e de informação, “sendo completamente natural e nada contraditório, que o cidadão assine o contrato, confiando que não vai encontrar percalços na sua execução, e reaja apenas quando esses percalços, normalmente imprevisíveis na data da celebração do contrato, surgem.”

         VI. Para além de que, para se provar o abuso de direito, outros factos teriam que estar dados como provados e, para poder invocar o abuso de direito, a predisponente das cláusulas não poderia ter dado causa à anulabilidade ou à situação que está na origem da exclusão das CCG.

          Para mais desenvolvimentos, remete-se para os autores e acórdãos referidos nos acs. do STJ e do TRL acabados de citar e ainda para os vários outros invocados pelo executado, acrescentando-se apenas, por último, que Maria Raquel Guimarães, em As cláusulas contratuais gerais bancárias na jurisprudência recente dos tribunais superiores, II Congresso de Direito Bancário, 2017, págs. 208 a 211, segue neste mesmo sentido, dizendo que:

        “[…A] concepção subjectiva que esteve na base das considerações desenvolvidas pela Relação de Lisboa no referido acórdão [um dos vários no mesmo sentido – parenteses deste ac. do TRL] introduz um fac­tor de perturbação inadmissível na protecção conferida ao aderente pela lei das cláusulas contratuais gerais, deixando à sensibilidade do juiz - à "jurisprudência do sentimento", para usar uma expressão de Orlando de Carvalho'" - a procedência do exercício de um direito subjectivo reconhecido pela lei.

         […]

         […N]ão será o simples não exercício do direito durante um lapso de tempo considerável que desencadeará a hipótese do abuso de direito. Estando em causa direitos que poderão ser exercidos a todo o tempo ou mesmo durante um determinado prazo, o seu titular terá sempre a possibilidade de os exercer, a todo o tempo, ou até ao final do prazo, nos demais casos. A admissibilidade de uma suppressio não parece ser compatível com uma concepção de direito subjectivo enquanto “espaço aberto à autonomia de cada um", "mecanismo de intervenção jurisgénica” ou "instrumento da autodeterminação pessoal”. Não poderá ser o menor ou maior lapso de tempo decorrido entre a celebração do contrato e a invocação, pelo aderente, da não comunicação das cláusulas que deverá ditar a procedência ou improcedência do exercício do direito. E esta ideia foi muito claramente expressa pelo STJ em acórdão de 02/12/2013, [306/10.0TCGMR.G1.S1] ainda que no domínio paralelo dos contratos de seguro:

         Não constitui abuso do direito a situação do segurado que, decorridos seis anos após a celebração do contrato de seguro, invoca a exclusão de uma cláusula por falta do cumprimento dos deveres de comunicação e de informação, sendo completamente natural e nada contraditório, que o cidadão assine o contrato, confiando que não vai encontrar percalços na sua execução, e reaja apenas quando esses percalços, normalmente imprevisíveis na data da celebração do contrato, surgem.

         O direito será legitimamente exercido, independentemente do tempo vivido desde a conclusão do contrato, sempre que ainda esteja em causa a protecção dos interesses que o legislador quis acautelar com a consagra­ção do direito em causa: no caso, a não submissão do aderente a um con­teúdo contratual que desconhece.

         Questão diferente, e que extravasa o domínio específico das cláusulas contratuais gerais, será a de saber se a invocação de um abuso de direito poderá ter o alcance de travar a aplicação de regras que visam proteger, essencialmente, interesses públicos e que levam à exclusão de determina­das cláusulas dos clausulados contratuais. A Relação de Lisboa, em acór­dão de 05/05/2015 [2107/08.7TBVIS.L1], entendeu a este propósito que:

         "Estando em causa a nulidade do contrato fundada na violação do regime das cláusulas contratuais gerais, logo, de conhecimento oficioso, não pode convocar-se o instituto do abuso de direito.”

         A adopção desta posição de princípio levaria a que a avaliação dos requi­sitos do abuso de direito ficasse, desde logo, prejudicada, não cabendo aos tribunais a sua equação".

            Em suma, não há factos que permitam concluir pelo abuso de direito dos executados pretenderem a exclusão das cláusulas contratuais gerais.


IV

A exclusão das cláusulas contratuais


            No caso dos autos o Banco não provou a comunicação de qualquer cláusula, como lhe competia, e, por outro lado, todas as cláusulas, isto é, mesmo as específicas, foram incluídas no contrato sem qualquer negociação, tudo como consta dos pontos dos factos provados sob 24 e não provados sob 28.

            O regime do DL 446/85 aplica-se, segundo o seu n.º 1, às cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, bem como, segundo o seu n.º 2 às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode [ou melhor: pôde] influenciar.

            Isto aliás de acordo com a directiva 93/13/CEE, do Conselho de 05/04/1993, que no seu art. 3/1 se refere às cláusulas contratuais que não tenham sido objecto de negociação individual e no seu art. 3/2 considera que uma cláusula não foi objecto de negociação individual sempre que a mesma tenha sido redigida previamente e, consequentemente, o consumidor não tenha podido influir no seu conteúdo, em especial no âmbito de um contrato de adesão.

            Ou seja, na formulação de Menezes Leitão, Direito das obrigações, vol. I, 2010, 9ª ed., 2010, págs. 49/51, “[d]a directiva […] resulta assim que por imposição comunitária, nos contratos entre profissionais e consumidores, se dispensa o requisito da generalidade, ao contrário do que sucedia com a lei das cláusulas contratuais gerais […] em contratos que reúnem apenas as características da pré-elaboração e rigidez. […Aplica-se] genericamente a todos os contratos pré-formulados […].” O que, aliás, já resultaria da conjugação do art. 1/2 do regime das CC’G’ na redacção dada pelo DL 220/95, com o art. 9, n.ºs 2 e 3 da Lei da defesa do consumidor (neste sentido, também Almeno Sá, nas págs. 1 a 3 da Adenda à edição de 1999 do seu Cláusulas contratuais gerais, Almedina, e José Manuel de Araújo Barros, cláusulas contratuais gerais, Coimbra Editora, 2010, pág. 29).

            Ou seja, não estão só em causa as cláusulas contratuais gerais, mas as cláusulas contratuais individualizadas, desde que o aderente não as tenha podido influenciar, como é o caso, em que as cláusulas não foram negociadas nem comunicadas e os executados assinaram o contrato/documento com elas já totalmente impressas, no próprio dia em que elas lhe foram entregues.

            Ou seja, todas as cláusulas deste contrato, celebrado entre um profissional e um consumidor, foram redigidas previamente, sem que os executados tenham podido influir no seu conteúdo, pelo que a todas elas, e não só às gerais, mas também às específicas, se aplica o regime das CC’G’.

            E se houvesse alguma dúvida sobre a impossibilidade de negociação por parte dos executados, sempre ela deveria ser resolvida a favor destes, já que era ao Banco que incumbia a prova de que elas tinham podido ser negociadas (art. 1/3 do regime das CC’G’: “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”)

            É o que resulta do teor da directiva comunitária nos termos já referidos, da introdução no DL 446/85 do nº. 2 do art. 1 a seguir ao n.º 1, com a deslocação do anterior n.º 2 para o n.º 3, e do alcance genérico da expressão ‘cláusula contratual’ e não ‘cláusula contratual geral’.

            Neste preciso sentido, o ac. do TRP de 05/12/2006, proc. 0620332:

         I - As cláusulas contratuais gerais, típicas de contratos de adesão, estabelecidas normalmente para regular as relações estabelecidas entre grandes empresas e o consumidor, passaram com o DL 249/99 de 7/7, a ter se ser obrigatoriamente analisadas mesmo quando inseridas em contratos autónomos e individualizados, desde que solicitada a sua apreciação.

         II - Pretendendo o autor a não discussão de tal clausulado, incumbe-lhe a alegação e prova de que a existência do clausulado interessante fora objecto de concreta pré-negociação e que os réus a puderam influenciar.

            E o ac. do STJ de 19/10/2010, proc. 10552/06.6TBOER.S1, de que apenas foi publicado o sumário na base de dados do IGFEJ/STJ:

         II - As três características básicas das cláusulas contratuais gerais (CCG) são: a) a pré-elaboração; b) a rigidez ou inalterabilidade por via negocial; e, c) a generalidade. Só perante estas características se estará em presença da situação contemplada no art. 1.º, n.º 1, do DL n.º 446/85, de 25-10.

         III - A situação prevista no n.º 2, daquele art. 1.º, é diferente, pretendendo-se alargar a tutela regulada no diploma ao destinatário de tais cláusulas contratuais que, não sendo pré-formuladas para uma pluralidade de contratos ou para uma generalidade de pessoas (diferentemente do que acontece com as CCG) se destinam apenas a determinado negócio individualizado, sem que, todavia, tenham sido objecto de prévia negociação.

         IV - O regime do DL n.º 446/85 visa a protecção de todos quantos contratam com o utilizador de CCG, bem como com o utilizador de cláusulas individualizadas, pré-elaboradas sem negociação individual, ou seja, cujo conteúdo o destinatário não pode influenciar.

         V - O DL n.º 446/85 sempre se referiu a cláusulas e não a todo o contrato. Consequentemente, para que tenha lugar a aplicação da sua disciplina, não se torna necessário que todas as cláusulas de um contrato sejam CCG, ou, na hipótese do art. 1.º, n.º 2, que todas sejam pré-formuladas sem negociação. Bastará que uma ou um grupo de cláusulas, apresente as referidas características, para, elas próprias, estarem sujeitas a tal disciplina jurídica.

         […]

         VII - Considerando a regra de ónus da prova, vertida no art. 1.º, n.º 3, do DL n.º 446/85, a não se ter provado, em concreto, a impossibilidade de alterar o conteúdo das cláusulas por via de negociação, não se segue que tivesse ficado provada tal possibilidade em relação às cláusulas em questão, pertencendo esta prova positiva “sobre quem pretende prevalecer-se do seu conteúdo”.

            No mesmo preciso sentido, veja-se Jorge Morais Carvalho, Manual de direito do consumo, Almedina, 2016, 3ª edição, págs. 68/69 (embora refira também posições contrárias):

         “Em segundo lugar, coloca-se a seguinte questão: será que a inversão do ónus da prova apenas diz respeito à existência ou inexistência de negociação prévia ou será que também abrange a circunstância de o destinatário não ter podido influenciar o conteúdo da cláusula? Embora a letra da lei não seja clara quanto a este ponto, parece-nos, em especial tendo em conta a inserção sistem­ática da norma, que resulta do seu espírito que cabe a quem pré-elaborou as cláusulas a prova de que estas não cabem no âmbito do regime definido no DL 446/85, ou seja, a prova de que não se trata de cláusulas contratuais gerais (n.º 1) ou de cláusulas que o destinatário não pode influenciar (n.º 2). A lei portuguesa também vai mais longe do que a Directiva, que apenas invertia o ónus da prova em relação às cláusulas normalizadas (último parágrafo do art. 3.º-2), ou seja, às cláusulas contratuais gerais.

         Em suma, cabe ao predisponente provar que, tendo em conta as circunstâncias concretas do contrato celebrado, o destinatário poderia negociar os termos do contrato, influenciando o seu conteúdo.”

            E Carlos Ferreira de Almeida, Contratos I, 2015, 5ª ed., Almedina, págs. 187/188:

         III. Uma outra dúvida resulta de o novo preceito ter sido intercalado, como nº 2, entre o nº 1, que continua a conter o conceito de cláusulas contratuais gerais, e o nº 3 (antigo nº 2), que estabelece a presunção (simples) de inexistência de negociação prévia das cláusulas.

         Esta presunção foi introduzida pelo diploma de 1995 com o objectivo de trans­por a 3ª frase do artigo 3º, nº 2, da Directiva, que é do seguinte teor:

         "Se o profissional sustentar que uma cláusula normal-zada foi objecto de nego­ciação individual, caber-lhe-á o ónus da prova".

         Tanto na lei portuguesa (que antes da recente alteração não visava cláusulas individuais) como na Directiva comunitária (apesar do seu âmbito mais vasto), a presunção restringia-se pois a cláusulas contratuais gerais.

         Atendendo porém à localização do novo preceito, intencionalmente inserido antes da regra de presunção, e também à letra do (agora) nº 3 do artigo 1º (que se refere a "cláusula contratual" e não a "cláusulas contratuais gerais", como sucede em quase todos os restantes preceitos), a dúvida deverá ser resolvida no sentido de estender a presunção a quaisquer contratos.

         Também sob este aspecto a lei portuguesa é mais ampla do que a Directiva, dispensando os beneficiários do regime legal de provar e até de invocar o carácter geral das cláusulas em litígio.

            Com o mesmo resultado, José Manuel de Araújo Barros, obra citada, págs. 31/32, anotação 11. E Ana Filipa Morais Antunes, que diz que no mesmo sentido vai Carlos Ferreira de Almeida, Comentário à Lei das cláusulas contratuais gerais, Coimbra Editora, 2013, pág. 67

          É também este o regime castelhano que resulta do artículo 82 do Real Decreto Legislativo 1/2007, de 16 de noviembre, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios y otras leyes complementarias, relativo (o art. 82) ao concepto de cláusulas abusivas.

        1. Se considerarán cláusulas abusivas todas aquellas estipulaciones no negociadas individualmente […]

         2. […] El empresario que afirme que una determinada cláusula ha sido negociada individualmente, asumirá la carga de la prueba.

          Neste sentido, Marta Carballo Fidalgo, La protección del consumidor frente a las cláusulas no negociadas individualmente, Disciplina legal y tratamiento jurisprudencial de las cláusulas abusivas, Bosch, 2013, pág. 25, depois de dar conta do regime comunitário:

         Ambito objetivo: las cláusulas sujetas a control

         Ya desde una perspectiva objetiva, el ámbito de aplicación de la directiva viene dado esencialrnente por la noción de cláusula no negociada individual­mente (artícuLo 3.1), entendiendo por tal, en los términos del apartado 2 del precepto, la cláusula redactada previamente, sobre cuyo contenido no ha te­nido el consumidor influencia alguna, en particular en el caso de los contratos de adhesión. En el régimen de la directiva, corresponde al profesional que afirme que una cláusula tipo ha sido negociada individualmente la carga de la prueba (artículo 3.2.3).

            Continua, referindo-se ao regime castelhano, pág. 76:

         Los artículos 80 y 82 del TRLGDCU, al igual que las normas de que traen causa, circunscriben el ámbito de control a las cláusulas y estipulaciones “no negociadas individualmente”, noción cuyo sentido no es aclarado por la ley. En ausencia de definición propia, valen para la categoria española los rasgos conformadores de la noción comunitaria de la que es transposición. De este modo, y de acuerdo con el artículo 3.2 de la Directiva 93/13/CEE, las cláusulas sobre las que recae el test de equidad se caracterizan por una doble nota: la predisposición - que la directiva identifica con su redacción previa- y su irnposició al consumidor, entendida como imposibilidad de influir sobre su contenido [GONZÁLEZ PACANOWSKA (1999), p. 675; PAGADOR LÓPEZ (2011), PP 1396-1397].

              E conclui mais à frente (pág. 78):

         “[…] el sistema elegido arrastra la regla contenida en el artículo 82.2 deI TRLGDCU: en la medida en que la negociación individual constituye un hecho impeditivo de la aplicación de la normativa tuitiva, el empresario que afirme el carácter negociado de una cláusula assumirá la carga de la prueba. Puede observarse que, a diferencia de la directiva (artículo 3.2.3), eI texto español no limita eI juego de la presunción a las “cláusulas tipo” o condiciones generales, insertas en contratos calificables como de adhesión. De este modo, la presunción tiene en Espana un valor global y se extendie, al menos en apariencia, a las cláusulas predispuestas ad hoc, esto es, las reglas préformuladas en vista a la conclusión de un específico contrato […]”

            Assim, é a todas as cláusulas contratuais, e não só às gerais, que se aplicam as consequências do art. 8, ou seja, a sua exclusão do contrato.


V

Consequências da exclusão das cláusulas


            Por força do art. 9/1 do regime das CC’G’, nos casos previstos no artigo anterior os contratos singulares mantêm-se, vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração, dos negócios jurídicos.

            Tal só não acontecerá, segundo o n.º 2 do mesmo artigo, sendo então, por isso, os referidos contratos nulos, “quando, não obstante a utilização dos elementos indicados no número anterior, ocorra uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais ou um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé.”

            Ora, no caso dos autos, retirando-se embora todas as cláusulas contratuais do contrato, não há dúvida de que entre os executados e o Banco houve um encontro de declarações de vontade no sentido de ser entregue em benefício dos executados, pelo Banco, uma quantia monetária (8825€) a título devolutivo.

            Isto é suficiente para se concluir que ainda estamos perante um mútuo (art. 1142 do CC), mas um mútuo sem quaisquer especificidades, ou seja, um puro mútuo civil, que se regerá pelo regime supletivo geral, do Código Civil.

            E como daqui não resulta que fique algo por determinar ou a provocação de qualquer desequilíbrio das prestações, o contrato não é nulo em consequência da exclusão das cláusulas contratuais.

            Mutuo esse que, por outro lado, é válido formalmente dado que, sendo relativa ao valor de 8825€, foi celebrado por documento assinado pelos executados (art. 1143 do CC) e que se presume oneroso (art. 1145 do CC), sendo a taxa dos juros remuneratórios a fixada na Portaria 291/03, de 08/04 (art. 559 do CC), que é 4% ao ano.

            Nesta parte, não têm, por isso, razão os executados, não a tendo também o Banco, ao pretender excluir só as cláusulas gerais e não também as específicas.

                                                     VI

            Para saber, perante o que antecede, o que é que está em dívida na execução – se é que algo está em dívida -, há que ter em conta o seguinte:

            Dos factos provados resulta que as partes deram execução ao contrato do seguinte modo:

            O Banco entregou a quantia de 8825€.

            Os executados pagaram uma primeira prestação mensal de 284,73€ a 17/08/2009, pelo que se pode admitir que aquela quantia foi entregue a 17/07/209, dia a seguir à assinatura do contrato.

            O cálculo faz-se, por isso, assim:

Montante em dívida na data de:Juros vencidos até pagamento ocorrido em:Pagamento de: Valor que fica em dívida depois de pagos primeiro os juros e depois o capital
8825€ em 17/07/200917/08/2009 = 29,98€284,73€8570,25
8570,25€ em 17/08/200911/09/2009 = 23,48€284,73€8309€
8309€ em 11/09/200912/10/2009 = 28,23€284,73€8052,5€
8052,50€ em 12/10/200910/11/2009 =25,59€307,29€

            Neste ponto há que ter em conta que a diferença entre 307,29€ que foi o que a partir daqui e durante alguns meses, foi pago, e os anteriores 284,73€ que estavam a ser pagos, resulta de valores relativos a um outro contrato, passando a ser imprecisos, uns meses depois, os valores que foram pagos a qualquer título (ponto de facto 19).

            Ora, apenas os valores pagos em cumprimento deste contrato é que podem ser considerados, o que terá de ser apurado em liquidação.

            Por outro lado, sabe-se que em Janeiro de 2012 o executado deixou de pagar as prestações (ponto 25), pelo que, por força do art. 781 do CC, se venceram todas as restantes.

            Assim, pelo menos a partir de um mês depois da última prestação (feita em Dez2011) passou a ser devido todo o capital que ainda estivesse por restituir, vencendo-se sobre ele juros de mora, à mesma taxa legal de 4% ao ano, por força do art. 806 do CC, a que há que descontar o valor pago pelos executados segundo o ponto de facto 10 (a imputar primeiro nos juros de mora: art. 785 do CC).

            Para apurar estes elementos, que este tribunal de recurso não dispõe, o Banco terá de alegar, no tribunal recorrido, o que tiver por conveniente, em incidente de liquidação desta decisão, sujeito a contraditório dos executados.   

                                                      *

            Com o que antecede, ficam prejudicadas as eventuais questões do vencimento antecipado dos juros remuneratórios – pois que face ao determinado supra não ocorre (pois que não há a considerar qualquer cláusula nesse sentido) – e dos juros usurários.

                                                      *

            Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso do executado, revogando-se a decisão recorrida e em sua substituição profere--se agora esta outra que julga parcialmente procedentes os embargos e declara a exclusão de todas as cláusulas (específicas e gerais) do contrato celebrado entre o Banco e os executados, subsistindo, no entanto, o contrato de mútuo, agora puramente civil, sujeito ao regime geral supletivo do Código Civil, considerando-se em dívida de restituição do valor emprestado, que foi de 8825€, aquilo que se vier a apurar em liquidação desta decisão, nos termos determinados supra (parte VI), prosseguindo a execução apenas por esse valor.

            Custas quer do recurso quer dos embargos quer da execução pelo Banco e pelos executados na proporção do vencimento, a apurar na liquidação acabada de referir, sem prejuízo do apoio judiciário concedido aos executados.

            Lisboa, 29/06/2017

            Pedro Martins

            Lúcia Sousa

          Magda Geraldes