Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2216/08.2TCLRS.L1-7
Relator: LUÍS ESPÍRITO SANTO
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO
TRANSMISSÃO DO ARRENDAMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/28/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Resulta da conjugação dos artigos 26º e 28º do NRAU que, relativamente aos contratos de arrendamentos anteriores à vigência do Regime do Arrendamento Urbano (RAU), aprovado pelo Decreto-lei nº 321-B/90, de 15 de Outubro, será aplicável o regime de transmissão por morte no arrendamento para habitação previsto no artº 57º.
II - Entendeu o legislador, relativamente aos óbitos do arrendatário ocorridos no âmbito da vigência do NRAU respeitantes a contratos celebrados em momento anterior, estabelecer um regime especial de transmissibilidade do arrendamento, mais restritivo do que aquele que passa a vigorar nos contratos de arrendamento que se venham a constituir à sombra do citado diploma legal – NRAU - ( artº 1106º, do Código Civil, exclusivo para novos contratos ).
III - Tratou-se de uma opção legislativa, discutível como qualquer outra, mas que não encerra em si qualquer inconsistência lógica ou contradição insanável.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa
( 7ª Secção ).

I – RELATÓRIO.
Intentou A., divorciada, residente na… , a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, contra a ré Câmara Municipal de …, com sede nos Paços do Concelho- …
Alegou, essencialmente, que :
Manuel… celebrou, no ano de 1970, um contrato de arrendamento da fracção correspondente ao 2.º esquerdo, do n.º 3 do prédio sito…, em ….
A A., sua filha, viveu em economia comum com o seu progenitor desde 1986, à excepção do período que mediou entre 1997 e Agosto de 2003, partilhando as despesas, prestando assistência e cooperação mútua.
Os seus pais faleceram em 2006.
A A. é doente do foro psiquiátrico, com constantes períodos de baixa e internamento e embora trabalhe está numa situação precária, uma vez que não tem qualquer vínculo laboral.
É proprietária de uma habitação sem condições mínimas de segurança e habitabilidade, a qual se encontra à venda e cujas mensalidades não consegue suportar sozinha, tendo prestações em atraso.
 As suas filhas e netas da Autora residem desde há alguns meses na referida casa sendo a Autora quem as sustenta.
 Conclui pedindo que se declare o direito à transmissão do direito ao arrendamento, condenando-se a Ré a reconhecer essa qualidade a favor da Autora.
A ré citada, veio contestar deduzindo defesa por excepção e por impugnação.
Alega para o efeito e, em síntese que quando tomou conhecimento do óbito do seu pai a Ré notificou a Autora em 29 de Junho de 2007 para proceder à entrega do fogo, invocando a caducidade daquele contrato de arrendamento, a intransmissibilidade do mesmo e a consequente ausência de título da mesma para ocupar o fogo.
Notificada de tal acto a Autora deduziu impugnação graciosa, a qual foi objecto de despacho de indeferimento do qual a Autora foi notificada em 31 de Agosto de 2007, notificação devolvida à Ré com a menção de “não reclamada”.
Do exposto resulta que o tribunal está perante uma administrativa deduzida por um particular perante uma entidade administrativa que actuou no exercício da sua função administrativa de gestão de um bem público.
Recebeu o imóvel em causa nos autos por escritura pública celebrada em 30 de Janeiro de 2004 e ao abrigo do decreto-lei n.º 163/93, de 07 de Maio na redacção introduzida pelo Decreto-lei 271/2003, de 28 de Outubro.
Impugnou os factos referentes à filiação e vida em comum entre a Autora e o seu progenitor.
A autora veio apresentar réplica onde veio impugnar a excepção de incompetência material deduzida pela Ré e esclarecer que o contrato foi celebrado com o IGAPHE que transmitiu à Ré a propriedade, os direitos e obrigações sobre o imóvel em causa nos autos.
Na sequência do despacho de aperfeiçoamento proferido veio a Ré informar ter tomado conhecimento do óbito de M… em 29 de Março de 2007 que o contrato de arrendamento nunca foi celebrado por escrito, pelo então proprietário do imóvel IGHAPE sendo o valor da renda à data do óbito de 11.35€ e a Autora veio esclarecer a situação habitacional da casa sita em Lisboa e por si referida na petição inicial, sendo no entanto o verdadeiro proprietário J….
Foi proferido saneador-sentença que julgou a presente acção improcedente e, em consequência, absolveu a R. do pedido ( cfr. fls. 111 a 119 ).
Apresentou a A. recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 154 ).
Juntas as competentes alegações, a fls. 124 a 129, formulou a apelante as seguintes conclusões :
1ª – A A. fez prova de todos os requisitos exigidos pelo artº 1106º do Código Civil ( NRAU ) para efeitos de transmissibilidade do arrendamento, nomeadamente, o de residir em economia comum e há mais de um ano com o arrendatário.
2ª – A A. goza do direito à transmissibilidade do arrendamento de seu pai, quer ao abrigo do RAU, quer ao abrigo do NRAU já em vigor na data do óbito daquele.
3ª – O regime transitório constante do NRAU não deve ser aplicado porque da aplicação daquele resulta uma incongruência jurídica dos dois regimes em concurso.
4ª – Ao contrário do que vem expresso na sentença, o legislador, ao criar um Novo Regime do Arrendamento Urbano, quis, efectivamente, conceder tutela jurídica à situação da A., conforme dispõe o artº 1106º, nº 1, alínea b) do Código Civil.
5ª – A sentença violou o artº 1106º do Código Civil e, ou o artº 85º, nº 1, alínea b) do RAU, na medida em que preteriu a aplicação destas duas normas em favor do regime transitório do NRAU.
6ª – O regime transitório previsto no NRAU ( artigo 26º ) não deve ser aplicado, porque diz respeito aos arrendamentos celebrados na vigência do RAU, e o arrendamento sub judice é anterior a 1970.
7ª – A remissão feita no artº 28º do NRAU para as normas transitórias do artº 26º não deve ser extensível às matérias de transmissibilidade do arrendamento, de forma a evitar a aplicação de uma norma diversa do regime em vigor ( RAU ) e do novo regime, ora aprovado ( NRAU ).
8ª – Existe uma contradição insanável entre o regime transitório do NRAU e o regime de caducidade instituído pelo RAU e pelo NRAU, pelo que, se defende uma interpretação ab-rogatória das normas transitórias do NRAU.
9ª – O artº 57º, nº 1 do NRAU fica aquém das possibilidades do regime de transmissão que veio a ser aprovado pelo próprio RAU e àquele que vigorava à luz do RAU, evidenciando, desta forma, a falta de sentido das normas transitórias.
 Não houve resposta.

II – FACTOS PROVADOS.
Foi dado como provado em 1ª instância :
1- O pai da Autora, M……, faleceu a 9 de Novembro de 2006, viúvo de MC….
2- Manuel… acordou verbalmente com o IGHAPE, em data não concretamente apurada do ano de 1970, a cedência por este da fracção autónoma a que corresponde o .º andar esquerdo, do n.º .. do prédio sito na… em …, mediante o pagamento por aquele a este de uma contrapartida monetária mensal que, à data de 9 de Novembro de 2006, ascendia a €11,35.
3- Por escritura pública, cuja cópia consta dos autos de fls. 35 a 36 cujo teor dou por integralmente reproduzido, outorgada no dia 18 de Fevereiro de 2002, por C. em representação do primeiro outorgante Instituto de Gestão e Alienação do Património e por P., em representação do Segundo Outorgante declararam entre o mais, o seguinte: “o primeiro que ao abrigo do disposto no Decreto-lei n.º 163/93, de 07 de Maio, na sua redacção actual, introduzida pelo Decreto-lei 271/2003, de 28 de Outubro, o IGAPHE, transfere para o Município de …, a título gratuito e sem qualquer contrapartida, os direitos e obrigações sobre os edifícios ou suas fracções de que é proprietário, (….), e descritas no documento complementar em anexo, elaborado nos termos do artigo 64.º do Código do Notariado.
Pelo segundo outorgante foi dito que: “ O Município de …s, em cumprimento das deliberações tomadas pela câmara Municipal de …s na 17ª Reunião Ordinária realizada em 10 de Setembro de 2003 e na 2.ª Reunião realizada em 28 de Janeiro de 2004, aceita a presente transferência, nos termos e nas condições a seguir descritas:
UM- O Município, juntamente com a transferência dos bens acima referidos, aceita a partir da data da respectiva transmissão a responsabilidade pelos direitos e obrigações inerentes aos mesmos, nomeadamente: a)-Os contratos de arrendamento e de comodato, escritos ou verbais, celebrados pelo IGAPHE ou pelas entidades que os antecederam na titularidade daquele património. (…).
4- Do documento complementar mencionado em 3) cuja cópia consta dos autos a 37 a 62 e teor dou aqui por integralmente reproduzido o IGAPHE transferiu para o Município de …, o direito e as obrigações das fracções autónomas a seguir relacionadas, todas sitas nas freguesias de … e …s, concelho de … e destinadas a habitação, comércio e serviços/equipamento social: (…) XIX Do prédio urbano sito na Praceta …, n.º 3, em …s, freguesia e Concelho de …s, que confronta a norte com espaço público, a sul com Praceta …, a nascente com o n.º 2 da e a Poente com o n.º 4 da Praceta …, o qual está: Descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número dois mil novecentos e sete, da freguesia de ..., e aí registadas a favor do Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional pela inscrição G- 1, apresentação número 10 de 11 de Julho de 1992, e constituído sob o regime de propriedade horizontal pela inscrição F- 1, apresentação número 15 de 24 de Novembro de 1995, e inscrito na matriz predial Urbana, sob o artigo …, as seguintes fracções: (…) 5- fracção autónoma designada pela letra “E”, que corresponde ao segundo andar esquerdo, com o valor patrimonial de mil seiscentos e setenta e quatro euros e noventa e um cêntimos;(…)”.
5- Após o falecimento de M.…, a Autora permaneceu a habitar o imóvel referido em 2).
6- Após o óbito de seu pai, a autora comunicou tal facto à Ré, a qual do mesmo teve conhecimento em 29 de Março de 2007.
7- A autora continua no imóvel sem o restituir à ré, mesmo depois de receber a comunicação que consta de fls. 30, onde a ora autora era interpelada a entregar o locado no prazo de 30 dias, a contra da recepção da mesma.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.
São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar :
Aplicabilidade do regime transitório estabelecido no Novo Regime do Arrendamento Urbano ( NRAU ), aprovado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro ( artsº 26º, 28º e 57º ) à transmissibilidade dos contrato de arrendamentos celebrados antes da vigência do Regime do Arrendamento Urbano ( RAU ), aprovado pelo Decreto-lei nº 321-B/90, de 15 de Outubro. Ausência de fundamento para a pretendida interpretação correctiva ou ab-rogatória dos artº 26º a 28º do NRAU.
Passemos à sua análise :
O Novo Regime do Arrendamento Urbano ( NRAU ), aprovado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, só é aplicável aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor ( 28 de Junho de 2006 ), bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias ( respectivo artº 59º, nº 1 ).
 Resulta, por seu turno, da conjugação dos artigos 26º e 28º do NRAU que, relativamente aos contratos de arrendamentos anteriores à vigência do Regime do Arrendamento Urbano ( RAU ), aprovado pelo Decreto-lei nº 321-B/90, de 15 de Outubro, será aplicável o regime de transmissão por morte, no arrendamento para habitação, previsto no artº 57º.
Ora,
Este regime não permite a transmissibilidade do presente arrendamento ( constituído em 1970 ) em favor da A., filha do arrendatário, como ela própria reconhece, devido ao não preenchimento dos respectivos requisitos legais.
Confrontada com tal óbice, pretende a apelante que se proceda a uma interpretação ab-rogatória das normas dos artsº 26º a 28º, do NRAU.
Invoca neste sentido que :
O regime transitório constante do NRAU não deve ser aplicado porque da aplicação daquele resulta uma incongruência jurídica dos dois regimes em concurso.
Ao contrário do que vem expresso na sentença, o legislador, ao criar um Novo Regime do Arrendamento Urbano, quis, efectivamente, conceder tutela jurídica à situação da A., conforme dispõe o artº 1106º, nº 1, alínea b) do Código Civil.
 A sentença violou o artº 1106º do Código Civil e, ou o artº 85º, nº 1, alínea b) do RAU, na medida em que preteriu a aplicação destas duas normas em favor do regime transitório do NRAU.
 A remissão feita no artº 28º do NRAU para as normas transitórias do artº 26º não deve ser extensível às matérias de transmissibilidade do arrendamento, de forma a evitar a aplicação de uma norma diversa do regime em vigor ( RAU ) e do novo regime, ora aprovado ( NRAU ).
Existe uma contradição insanável entre o regime transitório do NRAU e o regime de caducidade instituído pelo RAU e pelo NRAU, pelo que, se defende uma interpretação ab-rogatória das normas transitórias do NRAU.
O artº 57º, nº 1 do NRAU fica aquém das possibilidades do regime de transmissão que veio a ser aprovado pelo próprio RAU e àquele que vigorava à luz do RAU, evidenciando, desta forma, a falta de sentido das normas transitórias.
Apreciando :
Nada justifica a dita interpretação ab-rogatória, nem mesmo a interpretação correctiva, do regime legal em referência.
Conforme refere Oliveira Ascensão in “ O Direito. Introdução e Teoria Geral “, pags. 425 a 426, a propósito da interpretação correctiva : “ Pode acontecer que, como resultado da interpretação, concluamos que a lei tem um sentido nocivo. A razão da lei será contrária aos interesses que se pretendem preponderantes. A fonte pode ser taxada de injusta ou inoportuna, representando um elemento negativo naquela comunidade. Como proceder então ? Admitem alguns que nesta hipóteses o intérprete poderia afastar a norma inadequada, considerando que o legislador certamente a não teria querido se tivesse previsto este resultado. Fala-se então em interpretação correctiva. ( … ) a interpretação correctiva é inadmissível na ordem jurídica portuguesa. ( … ) Por mais desejável que se apresente uma alteração do sistema normativo, essa alteração pertence às fontes de direito, não ao intérprete. Este capta o sentido da fonte como ele objectivamente se apresenta no momento actual, não lhe antepõe qualquer outro sentido. Razões ponderosas de segurança e defesa contra o arbítrio alicerçam esta conclusão. ( … ) A exclusão da interpretação correctiva teria em todo o caso de ser acompanhada por uma excepção, resultante já das nossas considerações anteriores : se o sentido da fonte se revelar contrário à ordem natural, esta deverá prevalecer, pois não há nenhuma segurança que mereça ser comprada com a negação dos princípios fundamentais da convivência social. “.
Já a propósito da interpretação ab-rogante, refere o mesmo autor, in obra citada, pags. 428 a 429 : “ Aí o intérprete não mata a regra, verifica que ela está morta – porque na realidade nenhum sentido alberga. Na conclusão do processo interpretativo, terá de concluir que há uma contradição insanável, donde não resulta nenhuma regra útil. A pretensa regra é um nado morto. A fonte terá pois que ser considerada ineficaz. ( … ) Estas situações são raríssimas. “[1].
Acontece que
Entendeu o legislador, relativamente aos óbitos do arrendatário ocorridos no âmbito da vigência do NRAU atinentes a contratos celebrados em momento anterior, estabelecer um regime especial de transmissibilidade do arrendamento, mais restritivo do que aquele que passa a vigorar nos contratos de arrendamento que se venham a constituir à sombra do citado diploma legal – NRAU - ( artº 1106º, do Código Civil, exclusivo para novos contratos ).
Tratou-se de uma opção legislativa, discutível como qualquer outra, mas que não encerra em si qualquer inconsistência lógica ou contradição insanável.
Bem pelo contrário, teve-se em conta que o regime vigente para futuro (artº 1106º, do Código Civil ) contará com pressupostos jurídicos diversos, globalmente considerados, diferentes dos que presidiram, no passado, à celebração - e regime jurídico -  dos arrendamentos ora existentes[2].
Ou seja,
Ocorrendo o facto jurídico determinante da caducidade do contrato de arrendamento - o óbito do arrendatário - durante a vigência do NRAU, previu-se que a protecção antes concedida aos candidatos a transmissários do direito ao arrendamento fosse fortemente restringida – quer se tratasse de contratos celebrados na vigência do RAU, quer constituídos em momento anterior.
Para futuro, assentando as condições legais para a celebração dos novos contratos de arrendamento em bases diversas, voltou a alargar-se a possibilidade de transmissibilidade do arrendamento.
Nada existe de ilógico ou contraditório neste regime, concorde-se ou não com ele.
Conforme certeiramente se refere no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29 de Maio de 2008 ( relator Ataíde das Neves ), publicado in www.dgsi.pt :
“ …a questão da transmissão só se coloca no momento da morte do pai da Ré, tendo a mesma até então uma mera expectativa e não qualquer direito constituído, sendo que naquele momento já se encontrava em vigor dispositivo legal mais restritivo em termos de transmissão do direito ao arrendamento, que obedeceu à nova política legislativa que optou por restringir a transmissão do vínculo locativo às situações de plena dependência económica do transmissário em relação ao transmitente, salvaguardando assim a sobrevivência daqueles que por motivo de ordem natural ( tenra idade ou deficiência ) e de formação profissional, valor actualmente tão caro às políticas sociais, sejam efectivamente dependentes do primitivo locatário falecido. “.
In casu, a A. acaba por ser pessoalmente afectada pela mudança legislativa que, contemplando especificamente esta matéria, a desfavorece na sua expectativa – outrora segura – da titularidade da transmissão do arrendamento que fora de seu pai[3].
É, assim, normal e natural a sua insatisfação/frustação ; a mesma, porém, não constitui, obviamente, motivo para a rejeição ou escusa da aplicação do normativo em referência.
A apelação improcede.

  IV - DECISÃO : 
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas da apelação pela apelante.

Lisboa, 28 de Fevereiro de 2012.

Luís Espírito Santo
Gouveia Barros
Conceição Saavedra
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[1] Sobre esta mesma matéria, escreve Baptista Machado, in “ Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador “, pag. 186 : “ Por vezes, embora raramente, será preciso ir mais além e sacrificar, em obediência ainda ao pensamento legislativo, parte duma fórmula normativa, ou até a totalidade da norma. Trata-se de fórmulas legislativas abortadas ou de verdadeiros lapsos. Quando a fórmula normativa é tão mal inspirada que nem sequer consegue aludir com uma clareza mínima às hipóteses que pretende abranger e, tomada à letra, abrange outras que decididamente não estão no espírito da lei, poderá falar-se de interpretação correctiva. O intérprete recorrerá a tal forma de interpretação, é claro, apenas quando só por essa via seja possível alcançar o fim visado pelo legislador.
A interpretação revogatória ou ab-rogante terá lugar apenas quando entre duas disposições legais existe uma contradição insanável. “.
[2] Saliente-se, desde logo, que relativamente aos novos arrendamentos para habitação não vigorará a regra da prorrogação forçada do vínculo contratual, que contemplou grande parte dos contratos realizados à luz do regime anterior. Ao invés, no âmbito do NRAU, o senhorio poderá opor-se à renovação do contrato no termo do prazo acordado ou, não tendo sido fixado prazo, denunciá-lo com uma antecedência de cinco anos, em conformidade com o disposto nos artsº 1096º, nº 2, 1097º, 1101º, alínea c), do Código Civil.
[3] Sobre esta temática veja-se o acórdão do Tribunal Constitucional nº 581/11, de 29 de Novembro de 2011 ( relatora Maria João Antunes ), onde se escreve : “ O recorrente pode depositar esperanças ou até expectativas de natureza política, de que nunca tendo o legislador limitado a transmissão do arrendamento para os descendentes que convivessem com o arrendatário no período anterior à sua morte, nomeadamente em função da idade ou do grau de incapacidade, essa orientação legislativa não viesse a ser tomada. Mas esses sentimentos ou convicções não têm relevância jurídica e não podem pesar na delimitação da área de liberdade de conformação do legislador. “