Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
310/13.7TVLSB.L1-2
Relator: ARLINDO CRUA
Descritores: UNIÃO DE FACTO
CESSAÇÃO
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
DIREITO DE REGRESSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/09/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I – O direito de regresso no âmbito das obrigações solidárias (solidariedade entre devedores), tem por conteúdo ou substracto, em relação a cada um dos condevedores, a respectiva parte na responsabilidade do crédito, sendo normalmente iguais as suas quotas, e só excepcionalmente diferenciadas ;
II - caso se conclua ter sido o Autor a satisfazer o crédito perante a entidade credora, para além da parte que lhe competia, terá direito de regresso perante a Ré condevedora, na parte concernente à responsabilidade desta, nos quadros do artº. 524º, do Cód. Civil, ou seja, na decorrência do enunciado vínculo legal de reembolso, a Ré, enquanto devedora solidária, estará obrigada a custear a parte que lhe competir na dívida ;
III - No que se refere á quota-parte de responsabilidade no crédito de cada um dos mutuários solidários, não permitindo a factualidade apurada afastar a presunção inscrita no artº. 516º, do Cód. Civil, decorre presunção de igualdade de comparticipação na dívida ;
IV - O nosso ordenamento jurídico não regula ou prevê qualquer regime de bens aplicável à união de facto, o que determina um adensar da problemática, a nível patrimonial, quanto esta tem o seu epílogo, no que concerne aos efeitos patrimoniais da sua dissolução ;
V - na resolução de tal problemática, e à míngua de um regime específico e regulado, a jurisprudência tem vindo a ser chamada no sentido de encontrar soluções e alternativas de resolução, recorrendo, fundamentalmente a mecanismos de direito comum, entre os quais o regime das sociedades de facto (num período inicial) e o regime do enriquecimento sem causa ;
VI - um dos requisitos do instituto do enriquecimento sem causa traduz-se na falta ou ausência de causa justificativa da deslocação patrimonial verificada, seja porque nunca a tenha tido ou porque, tendo-a inicialmente, esta se tenha extinguido ou perdido ;
VII – provando-se ter ocorrido deslocação patrimonial, determinando enriquecimento da Ré, pelo facto do imóvel adquirido apenas ter integrado o património pessoal daquela, e consequente empobrecimento do Autor, traduzindo-se a causa do enriquecimento a vivência em união de facto, pois, tal como se provou, destinou-se tal imóvel à habitação dos conviventes e respectivos filhos (da Ré e um deles comum), sendo a habitação permanente do casal, e tendo sido mesmo intenção das partes que tal imóvel ficasse a integrar o património do agregado familiar, o que só não sucedeu pelo facto do Autor ainda figurar como casado e no intuito de proteger o património familiar do risco inerente à sua actividade empresarial, cessada tal união de facto, aquela causa justificativa deixou de existir, ou seja, ocorreu posterior e subsequente desaparecimento da causa legitimadora do enriquecimento ocorrido ;
VIII - O que determinará que, constatada aquela deslocação patrimonial mediante a prestação efectuada pelo Autor convivente, a qual tinha como causa a união de facto e permanência desta, com consequente permanência dos conviventes na fracção adquirida, cessando este fim, a obrigação daí resultante fica sem causa, ou seja, a deslocação patrimonial fica carente de causa justificativa, por supressão posterior desta ;
IX – isto é, resulta claro que a união de facto encerrou e constituiu a causa jurídica da contribuição monetária realizada pelo convivente Autor, através da assumpção do pagamento das prestações debitórias, para a aquisição do identificado imóvel ;
X - pelo que, nos termos expostos, com a dissolução da união de facto, importa concluir pela extinção da causa jurídica daquela contribuição por prestação, ou seja, a causa justificadora daquela deslocação patrimonial não mais subsiste, tendo supervenientemente desaparecido (condictio ob causam finitam), ocorrendo assim enriquecimento em virtude de causa que deixou de existir ;
XI - determinando que o ordenamento jurídico acautele e legitime a necessária reposição do equilíbrio patrimonial, preenchidos que se mostram todos os requisitos ou pressupostos do enriquecimento sem causa
XII – as despesas inerentes e necessárias à convivência típica de um envolvimento familiar, sendo livre e espontaneamente realizadas entre os membros da união de facto, não são exigíveis em termos da sua repetição, sendo-lhes antes aplicável o regime das obrigações naturais ;
XIII - com feito, tais despesas, tendo uma causa justificativa, que é a própria subsistência do relacionamento análogo aos dos cônjuges, querido por ambos os conviventes, não podem ser reclamadas com base no enriquecimento sem causa, pois, além do mais, e independentemente da maior premência ou necessidade da sua verificação, sempre volátil consoante a concreta disponibilidade económica do concreto agregado familiar, consubstanciam ainda como que o cumprimento do dever ético de prestar assistência ao agregado familiar, ainda que informalmente constituído, traduzindo efectivo cumprimento de uma obrigação natural ;
XIV - a conduta do Autor ao vir reclamar, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, o pagamento das quantias relativamente às quais empobreceu, com consequente enriquecimento da Ré, em consequência da cessação da causa que legitimava tal deslocação patrimonial, não é reveladora de qualquer comportamento contraditório, susceptível de traduzir abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium ;
XV - o facto do Autor ter continuado a assumir o pagamento das prestações relativas ao mútuo bancário concedido à Ré para a aquisição do imóvel, mesmo após a data da cessação da contribuição desta, explica-se pela perduração da relação de união de facto que vivenciava, tendo aquele imóvel constituído, durante algum tempo, a residência dos unidos e respectivos filhos da Ré e filho comum ;
XVI – bem como pelo facto do Autor figurar em tal mútuo na posição de fiador e principal pagador, justificativo que tivesse prolongado tal pagamento, inclusive até data posterior á própria cessação da união de facto, pois, eventual incumprimento na satisfação do mesmo não deixaria de ter repercussões na sua posição patrimonial, bem como, lateralmente, no seu crédito junto da instituição bancária mutuante (e, reflexamente, junto das demais).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:
               
I – RELATÓRIO
1 – JS…, residente na Avenida …, …, …º-A, em Lisboa, intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra MT…, residente na Rua …, nº. …, …º, Lisboa, deduzindo o seguinte petitório:
- a título principal:
a condenação da Ré a pagar-lhe:
1. A quantia de € 208.366,04 a título de direito de regresso pelo pagamento de todas as prestações de amortização do empréstimo para aquisição de apartamento pertencente à Ré e para as obras de beneficiação do mesmo, bem como no pagamento, ao último, de todas as quantias que este venha futuramente a pagar relativas à amortização do aludido empréstimo, enquanto fiador e principal pagador;
2. A quantia de € 13.013,12 a título de direito de regresso pelo pagamento de metade de todas as prestações de amortização do empréstimo para aquisição da garagem identificada nos autos, pagas até à data pelo Autor e que cabiam à Ré pagar enquanto codevedora solidária, bem como no pagamento de metade de todas as quantias que aquele venha futuramente a suportar relativas à amortização do mesmo empréstimo enquanto codevedor;
3. A quantia total de € 44.752,00, paga integralmente pelo Autor, relativa a seguros obrigatórios indexados aos empréstimos supra referidos.
- subsidiariamente:
a condenação da Ré a pagar-lhe, a título de indemnização por enriquecimento sem causa:
1. A quantia de € 204.082,72 correspondente ao empobrecimento do Autor e correspectivo enriquecimento da Ré pela aquisição do direito de propriedade do apartamento identificado supra;
2. A quantia de € 13.013,12 em que se saldou o empobrecimento do Autor e correspondente enriquecimento da Ré pela aquisição de ½ do direito de propriedade da garagem identificada supra;
3. A quantia total de € 44.752,00, paga integralmente pelo Autor, relativa ao empobrecimento que este sofreu com o pagamento dos seguros obrigatórios indexados aos empréstimos supra referidos.
Em qualquer das situações, tais quantias deverão ser acrescidas dos respectivos juros legais, a contar da citação da Ré para a presente acção e até integral e efectivo pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese, o seguinte:
- por escritura pública de 10.10.96, a Ré comprou a fracção autónoma designada pela letra «C», que corresponde ao … andar do prédio urbano sito na Rua …, número … e …-A, em Lisboa, contraindo, para o efeito, mútuo bancário no valor de €142.157,40 (€124.699,47, para aquisição da dita fracção e €17.457,93 para realização de obras na mesma) concedido por dezassete anos a contar de 15.10.96 ;
- até à presente data, todas as prestações de amortização da dívida, capital e juros, foram sempre pagas pelo Autor com dinheiro seu ;
- por escritura pública de 10.07.08, a Ré e o Autor adquiriram a fracção autónoma designada pela letra «U», que corresponde à garagem em estacionamento coberto correspondente ao prédio urbano sito na Rua …, número …, em Lisboa, pelo preço de € 37.500,00 ;
- contraindo, para o efeito, mútuo bancário no valor de € 75.000,00 ;
- até à presente data, todas as prestações de amortização da dívida, capital e juros, foram sempre pagas pelo Autor com dinheiro seu ;
- cinquenta por cento da quantia mutuada em 2008 pelo Banco Comercial Português (ou seja, € 37.500,00) foi aplicada na aquisição da garagem, tendo sido o remanescente (os restantes € 37.500,00) utilizado para reforço do orçamento familiar, nomeadamente para pagamento de despesas extraordinárias como foram férias de Inverno na neve e de verão no Algarve ;
- enquanto viveu com o Autor em união de facto, a Ré nunca obteve qualquer rendimento regular pelo que foi sempre o Autor quem suportou todas as despesas com os empréstimos supra referidos ;
- bem como com a quase totalidade dos encargos decorrentes da convivência em união de facto, com o filho de ambos, bem como com os três filhos de dois casamentos anteriores da Ré ;
- o dinheiro que provisionava a conta bancária com o NIB … no Banco Millennium BCP, de onde eram debitadas as aludidas prestações, provinha de rendimentos a si pertencentes ;
- pois, apesar de a conta ser solidária entre o Autor e a Ré, nunca esta a movimentou a crédito.
Conclui, conforme supra referido, preconizando que lhe assistem, respectivamente, os direitos de sub-rogação e de regresso e que, com a cessação da união de facto, deixou de existir qualquer causa que justifique o facto de a Ré ter ficado proprietária dos referidos imóveis (apartamento e garagem) sem que tenha suportado qualquer encargo.
2 – Regularmente citada, a Ré veio apresentar contestação, alegando, em súmula, o seguinte:
- além da mencionada conta do BCP, da qual o A. era o 1.º titular, e a R. a 2.ª titular, existia e existe ainda uma outra conta no Banco BBVA, com o n.º …/…, na qual figurava como 1.ª titular a R. e 2.º titular o A. ;
- tal conta era utilizada para pagamento das despesas familiares e outras durante todo o período em que A. e R. viveram em união de facto ;
- a qual era apenas movimentada pela R., sendo a única a creditar dinheiro na mesma para pagamento dos encargos familiares, designadamente, despesas com férias familiares ;
- sempre exerceu actividade profissional no ramo imobiliário, auferindo rendimentos fixos e rendimentos que oscilavam, sempre elevados, provenientes de negócios avultados (à excepção de um curto período em que esteve doente) ;
- assim contribuindo para o sustento do agregado familiar e pagando sozinha todas as despesas relativas aos seus filhos fruto de casamentos anteriores, nomeadamente Colégios, Faculdade e outras despesas destes ;
- fruto do rendimento do seu trabalho, entre muitos outros valores de que não tem comprovativos de depósito, a R. depositou na conta solidária do Millennium BCP da qual foram debitadas as prestações dos empréstimos, diversos valores ao longo dos anos, de montante global não inferior a € 337.508,33 ;
- relativamente à garagem, sustenta que apenas foi pago ao vendedor o valor de € 36.375,00, correspondendo a diferença de € 1.125,00 à comissão da R. no negócio, a qual foi por si creditada na conta solidária do BCP ;
- deve, assim, ser absolvida do pedido, pois o Autor não teve qualquer intervenção no pagamento dos aludidos mútuos, porquanto a R. depositou, na conta solidária da qual eram debitadas as prestações, montante global mais do que suficiente para o seu pagamento.
3 – Notificado da contestação, o Autor apresentou réplica, na qual, em súmula, referenciou o seguinte:
- nega que a Ré tenha procedido aos depósitos e transferências que discrimina, conferindo a tais movimentos um diferenciado e específico enquadramento justificativo ;
- nomeadamente, sustenta que, na sua maioria, parte desses movimentos se destinaram a reembolsar o Autor de valores que o mesmo adiantara, designadamente, a título de empréstimo a filhos da Ré ;
- sendo que a demais parte terá ocorrido antes da celebração do primeiro mútuo, pelo que não relevam para efeitos do que é aqui pedido.
Conclui, no sentido da improcedência das excepções invocadas pela Ré, concluindo-se conforme peticionado no articulado inicial.
4 – Conforme fls. 860 a 862, foi:
- dispensada a realização da audiência prévia ;
- proferido saneador stricto sensu ;
- fixado o valor da causa ;
- delimitado o objecto do litígio ;
- designada data para a realização da audiência de julgamento.
5 – Tal audiência veio a realizar-se, em 6 sessões de julgamento, conforme actas de fls. 994 a 999, 1393, 1394, 1439 a 1444, 1867 a 1870, 1946 e 1947, com observância do legal formalismo.
6 – Conforme fls. 1894 a 1919, veio o Autor proceder à liquidação do pedido, entendida na sentença proferida como ampliação deste, manifestado a pretensão de “liquidar o seu pedido com efeitos à data mais próxima”, mantendo a parcela atinente a seguros pagos e incrementando as demais, respectivamente, para €214.031,25 (relativa ao primeiro mútuo) e €22.208,95 (relativa ao segundo mútuo), contabilizando, desta feita, os juros vencidos no montante total de € 34.981,60, concluindo, assim, pelo pedido global de € 315.973,80.
Para tanto, alegou que, no decurso da acção – nesta data já com três anos e meio de pendência -, se venceram ulteriores prestações dos mútuos em questão nos autos.
A Autora respondeu a tal pretensão a fls. 1927 e 1928, aduzindo a natureza precoce da liquidação do pedido efectuada, mantendo a posição no tocante ao pagamento de seguros e impugnando o apurado valor dos juros civis.
7 – Posteriormente, foi proferida sentença – cf., fls. 1962 a 2122 -, traduzindo-se a Decisão nos seguintes termos:
“Pelo exposto, julgando-se totalmente improcedente a acção, absolve-se a Ré, MT…, dos pedidos (principal e subsidiário) formulados pelo Autor, JS….
*
Custas pelo Autor.
*
Registe e notifique”.
8 - Inconformado com o decidido, o Autor interpôs recurso de apelação, por referência à sentença prolatada.
Apresentou, em conformidade, o Recorrente as seguintes CONCLUSÕES (que ora se transcrevem, na íntegra):
“A. O Autor veio a juízo reclamar da Ré o reembolso de todos os custos que suportou com a amortização de um empréstimo bancário (amortizações de capital e juros e seguros conexos com o mesmo), relativo a um contrato de mútuo celebrado entre a Ré e o agora Millennium bcp, a 10.10.96, na pendência da união de facto, para financiamento de um apartamento adquirido pela Ré na Rua …, número … e …-A, …º andar, em Lisboa, na qualidade de fiador e a título de direito de regresso, ou subsidiariamente, a título de enriquecimento sem causa, bem como,
B. o reembolso dos custos que suportou como codevedor com a amortização de um empréstimo bancário (amortizações de capital e juros e seguros conexos com o mesmo), relativo a um contrato de mútuo celebrado entre a Ré e o Autor, por um lado, e o agora Millenniumbcp, por outro, a 10 de Julho de 2008, igualmente na pendência da união de facto, para financiamento da aquisição uma garagem e despesas do agregado familiar, sita na Rua …, número …, em Lisboa, a título de direito de regresso, ou subsidiariamente, a título de enriquecimento sem causa;
C. Posteriormente, e tendo em conta que o Autor continuou a amortizar os dois mútuos bancários na pendência da acção, veio o mesmo, por requerimento de 07 de Setembro de 2017, apresentar uma liquidação adicional das prestações peticionadas, reportadas à data de 06 de Abril de 2016, no montante global de € 315.973,80, sem prejuízo de liquidação posterior relativamente às prestações vincendas, o que foi aceite na sentença recorrida;
D. Produzida a prova, improcedeu o tribunal recorrido a acção com fundamento, em síntese, de que a Ré pagou ao Autor quantias muito superiores às suportados pelo Autor com as amortizações dos empréstimos através da conta deste no BCP (adiante conta BCP), além de que o Autor nem sequer logrou provar que o dinheiro desta conta era seu uma vez que a referida conta passou a ser solidária com a Ré aquando do primeiro mútuo;
E. Fundamentou, ainda, o tribunal recorrido a improcedência da acção, com base no facto do Autor não ter agido como fiador ou co-devedor no pagamento dos encargos decorrentes dos mútuos, pelo que não havia lugar a direito de regresso;
F. Por último, fundamentou ainda o tribunal recorrido a sua decisão pelo facto de in casu não ser aplicável o enriquecimento sem causa, por abuso de direito do autor, comportamento contraditório e por não haver cessação da causa justificativa, pese embora considerar provada a cessação da união de facto em Setembro de 2010;
G. O Autor não se conforma com a referida decisão, entre outras razões, por erro no julgamento da matéria de facto, não sendo como tal verdadeira a conclusão do tribunal de que a Ré creditou a conta do Autor em quantia superior ao valor suportados com os custos de amortização dos empréstimos. Pelo contrário, o Autor entende que do saldo final resulta que foi ele quem creditou a conta da Ré no BVVA;
H. O Autor considera que face à prova produzida o tribunal não poderia ter considerado provado o facto que consta no ponto 9.2 dos factos julgados provados, i.e., que “A última prestação do mútuo datado de 10.07.08 foi debitada em 06.04.16, tendo, até essa data, sido pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros.”
I. Ora, conforme resulta do teor do contrato de mútuo celebrado a 10.07.08 o mesmo só terminará em Maio de 2014!!!;
J. Em vez disso, deveria o tribunal ter julgado provado que “Relativamente ao mútuo datado de 10.07.08 e com terminus a 30 de Maio de 2024, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros por referência à data de 06.04.16;
K. Considera, ainda, o Autor que face à prova produzida o tribunal também não poderia ter considerado provado o facto que consta no ponto 27 dos factos julgados provados, i.e., que, entre outros ali mencionados, a Ré depositou na conta solidária do BCP o valor de €279.939,89 e de €24.939,89;
L. Efectivamente, o facto que consta no referido ponto 27 dos factos julgados deverá ficara com a seguinte redacção:
A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a) €1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;
b) €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;
c) €25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;
d) €9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95”;
M. Face aos factos alegados e à prova produzida deveria o tribunal recorrido ter dado como provado que “O Autor após ter sido depositado o empréstimo bancário para habitação na conta BCP pagou à Ré a quantia correspondente a 37.500,00, por conta do reembolso dos adiantamentos realizados pela mesma relativamente ao pagamento antecipado do preço de aquisição do imóvel da Rua …” devendo este facto ser acrescentado à matéria provada, com o nº 27.3 (para seguir a numeração adoptada):
N. Entende, ainda, o Autor, novamente salvo o devido respeito por posição contrária, que foi deficientemente julgado o facto 36 dos factos julgados provados e que estipula que “Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de €52.100,00, entre 2003 e 2007.”
O. É que o valor dado como provado não corresponde ao somatório dos valores alegados e provados documentalmente. Efectivamente, se somarmos os valores debitados na conta BCP correspondentes a créditos na conta do BBVA, o seu valor atinge os €65.475,00, muito acima, portanto, do valor de €52.100,00 dados como provados pelo tribunal;
P. Face ao acima exposto, considera o Autor que o ponto 36 dos factos provados deverá ser alterado ficando com a seguinte redacção: “Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de €65.475,00, entre 2003 e 2007.”
Q. Não pode igualmente o Autor, ora Recorrente, conformar-se com o julgamento do tribunal recorrido no que concerne ao ponto 55 dos factos provados que refere que “Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua … ascendeu a €207.789,00 sendo que A. e Ré suportaram renda de valor global para igual período de €265.236,00.”
R. É que, em lado algum resulta – muito pelo contrário - que a Ré também suportou o pagamento das rendas em igual período no montante de €265.236,00 mas apenas que o pagamento daquelas rendas foi debitado da conta BCP do Autor;
S. Pelo que, deverá a redacção do ponto 55 dos factos provados ser alterado/aditada nos seguintes termos: “Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP ascendeu a €207.789,00 e as rendas suportadas para igual período debitadas na mesma conta ascendeu a €265.236,00” ;
T. A alteração justifica-se não só porque não é verdade nem ficou provado que a Ré suportou o pagamento das rendas (e tal constava da redacção do facto provado pelo tribunal)
U. como, além disso, será de concluir que a diferença entre as rendas pagas e recebidas, no montante €57.477,00 foi suportado pelo Autor através da Conta BCP;
V. Entende, ainda, o Recorrente que o tribunal julgou erradamente não provados alguns pontos da matéria alegada pelo o Autor;
W. Efectivamente, considerou-se não provado na douta sentença sub judice o facto de que “Foi sempre o Autor quem procedeu ao pagamento das prestações a que se reportam os pontos 5 e 8 dos Factos Provados, com dinheiro seu.” (nº 1 dos factos não provados);
X. Entende o ora Recorrente que este facto foi mal julgado e o mesmo deveria constar necessariamente dos factos provados
Y. Apurando-se o saldo entre a movimentação a crédito na conta BCP efectuada pela Ré e os débitos na mesma conta creditados na conta BBVA, provados em tribunal, resulta um resultado negativo de €42.276,43 na conta BCP e um resultado positivo na conta BBVA da Ré. Isto é, na conta BCP, saiu (pelo menos) mais €42.276,43 para conta da Ré do que aquilo que, directa ou indirectamente, entrou;
Z. Pelo que, se assim foi, então necessariamente se terá de concluir que todos os pagamentos/amortizações dos empréstimos que saíram da conta BCP só podem ter sido suportados pelo Autor,
AA. Razão porque deverá o facto constante no ponto 1 dos factos julgados não provados, com a redacção, “Foi sempre o Autor quem procedeu ao pagamento das prestações a que se reportam os pontos 5 e 8 dos Factos Provados, com dinheiro seu.” ser acrescentado aos factos provados;
BB. Não considerou igualmente provado o tribunal recorrido o facto alegado pelo Autor, correspondente ao por si alegado em 57º e 58º da p.i., (com base no por si também alegado em 46º a 56º do mesmo articulado) de que “O montante de € 105.562,50 supra mencionado é dinheiro do Autor.” (ponto 16 dos factos não provados). Ora, entende o Recorrente que também aqui o tribunal recorrido não tem a menor razão e fez um mau julgamento da prova;
CC. Efectivamente, face à prova que consta na matéria de facto provada e às declarações de parte proferidas pelo Autor em sede de declarações de parte, consubstanciadas em documentação junta; deverá passar a constar dos factos provados o facto com a seguinte redacção: “O montante de € 105.562,50 supra mencionado é dinheiro do Autor.” ;
DD. Entendeu o tribunal recorrido não ser de aplicar o direito de regresso invocado pelo Autor porquanto “a Ré excepciona o pagamento e prova efectivamente que realizou pagamentos tal como lhe competia na repartição do ónus probatório”, (…) “tendo ainda em conta que um dos depósitos ascende ao dobro do que viria a ser pedido ao Banco”;
EE. Só que, como acima se referiu a propósito do julgamento da matéria de facto, resulta evidente que a conclusão tirada pelo tribunal parte de premissas erradas. Então, necessariamente, ter-se-á de concluir, ao contrário do referido na sentença recorrida, que o Autor logrou um pressuposto do direito de regresso por si invocado;
FF. Refere-se ainda na mesma sentença a propósito da aplicação do direito de regresso que se questiona o elemento volitivo do fiador durante a união, pelo que também por esta razão será de afastar o mesmo;
GG. Importa, antes de mais, sublinhar que o direito de regresso invocado pelo Autor não se cingiu apenas à sua qualidade de fiador no empréstimo de 10/10/96. Estendeu-se, igualmente, à qualidade de codevedor no empréstimo de 10.07.08;
HH. Por outro lado, o elemento volitivo, quanto à actuação do Autor como fiador ou como codevedor, sempre estaria provado, desde logo porque os pagamentos diziam respeito a amortizações de mútuos para aquisições de imóveis para a Ré, mas, sobretudo, porque, o Autor procedeu aos referidos pagamentos, quer durante a pendência da união de facto, quer já após a mesma ter cessado, quer mesmo – e mais importante – quer depois de já ter reclamado judicialmente o reembolso dos mesmos à Ré;
II. E continua, actualmente, a actuar, no caso do empréstimo de 10.07.08 (garagem) (cfr. dos. 1 ora junto);
JJ. Pelo que, o tal elemento volitivo que se refere na sentença resultou por demais provado nos presentes autos;
KK. Assim sendo, e ficando provado todos os demais pressupostos de que depende o direito de regresso, deveria a douta sentença recorrida ter condenado a Ré a pagar ao Autor todas as prestações vencidas relativas aos empréstimos em apreço, bem como nas que se vencerem até integral pagamento e comprovadamente suportadas pelo mesmo,
LL. Assim não o tendo feito, violou o mui douto tribunal recorrido, o disposto no artº 524º nº 1 e artº 644º do Código Civil;
MM. Enquadra, ainda, o tribunal recorrido a resolução do presente litígio do ponto de vista do enriquecimento sem causa, no seguimento do alegado subsidiariamente pelo Autor;
NN. E pese reconhecer que tal regime tem sido adoptado maioritariamente, quer pela mais recente jurisprudência quer pela doutrina, como solução a adoptar nos casos de cessão das uniões de facto, contudo, acaba por afastar a aplicação da mesma, por razões que no entender do Autor não são se aplicam ao presente caso;
OO. Conforme se refere na douta sentença quem invoca o enriquecimento sem causa, terá de provar a existência real de um enriquecimento, o empobrecimento do lesado e a inexistência de causa justificativa, o que neste caso não terá sucedido segunda mesma;
PP. Considera-se, ainda, que mesmo que fossem provados aqueles dois pressupostos, e pese embora se reconhecer que na jurisprudência se entende que com a cessação da união de facto cessa a causa justificativa, contudo, in casu, não seria de aplicar este regime por o Autor ao reclamar da Ré os custos com os encargos dos empréstimos actuou em manifesto abuso de direito;
QQ. Além disso, questiona-se na decisão recorrida o motivo pelo qual o Autor continuou a partir de 2005 -data em que no entender do tribunal foi feito o último depósito “por conta” da Ré na conta BCP- sensivelmente a meio do plano prestacional, a assegurar as prestações. Se essa causa foi o valor recebido da Ré se a expectativa da manutenção da união de facto. Neste último caso ter-se-ia de concluir que a causa não tinha cessado e como tal não estariam preenchidos os requisitos do enriquecimento sem causa;
RR. É estranho, contudo, que na decisão recorrida não se coloque a possibilidade mais evidente de que o Autor continuou a assegurar os pagamentos das prestações, mesmo após a cessação da união de facto, pela simples razão que era fiador num empréstimo e codevedor no outro;
SS. Pelo que se, mais não fosse, se o Autor reclama à Ré o reembolso dos encargos suportados pela amortização dos mútuos e continua a pagar os mesmos, certamente que não é porque os não queira receber ou o faça na expectativa da manutenção da união?!!
TT. É pela simples razão que se não tivesse amortizado aqueles empréstimos e continuasse a amortizar os mesmos arriscava-se – como continua a arriscar-se se não pagar - a ser executado pelo banco e a ver penhorados todos os seus bens!!!
UU. Quanto às despesas que o Autor continuou a suportar com a Ré e com o filho do Autor, invocarem-se as mesmas, como argumento contra o Autor, é, além de incompreensível, completamente desumano;
VV. Ao decidir como decidiu, violou igualmente, o muito douto tribunal recorrido o disposto no artº 473º do Código Civil”.
Conclui, no sentido de provimento do recurso, com consequente revogação da sentença e decisão que julgue a acção procedente.
9 – A Apelada/Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes CONCLUSÕES (que ora integralmente se transcrevem):
“1. Das conclusões do recorrente parece resultar uma tentativa de impugnar matéria de facto, sem no entanto, cumprir os formalismos constantes do artº 640º do CPC, nomadamente sem no entanto indicar os concretos meios de prova que impunham decisão diversa. O Recorrente limita-se, de forma inconsistente, a referir que determinados pontos da matéria de facto devem ser alterados, sem no entanto indicar os concretos meios de prova que impunham decisão diversa.
2. Assim e em face do exposto deve este douto Tribunal da Relação rejeitar liminarmente a impugnação da matéria de facto, nos termos do disposto no art 640º/1 do CPC, com as legais consequências.
3. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que os factos provados e não provados foram decididos de forma correctíssima pelo douto tribunal recorrido, que promoveu uma cabal fundamentação da prova produzida quer documental quer testemunhal, conforme aliás já referimos.
4. Saliente-se ainda, que conforme foi sustentado pela douta sentença recorrida a este respeito, o seguinte: ” Chama-se igualmente a atenção para algumas respostas [aos factos articulados levados aos Temas da Prova restritivas e para outras tantas explicativas. Com efeito, é pacífico na jurisprudência que “Na decisão da matéria de facto podem ocorrer várias situações, contando-se entre elas a de respostas aos quesitos com conteúdo restritivo ouexplicativo.Com uma resposta restritiva considera-se provada apenas parte da matéria quesitada.Com uma resposta explicativa concretiza-se um facto com utilidade para a decisão da causa, mantendo-se a mesma dentro da pergunta formulada, mas explicitando o seu conteúdo, sem que, no entanto, a mesma amplie a factualidade articulada pelas partes, caso em que não poderá ser considerada por se incorrer em excesso de pronúncia (…) O tribunal pode dar respostas explicativas a quesitos desde que, ao fazê-lo, não amplie indevidamente o conteúdo da pergunta, nem, de forma indirecta, o tema da prova” (v., por todos, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 05.05.09, disponível em www.dgsi.pt). No âmbito das respostas explicativas, introduziram-se alguns elementos – devidamente assinalados -,constantes de documentos não impugnados. Acerca da consideração de factos emergentes de documentos juntos e não impugnados, v., com interesse, o Acórdão do Tribunal da Relação de 02.07.13, disponível em www.dgsi.pt).”
5. Aplicando os princípios expostos ao caso em apreço, desde logo se diga, que não existe qualquer fundamento para alterar a matéria de facto desde logo no que se refere aos alegados montantes depositados no BCP constantes do ponto 27, com a alteração referida na alínea L das conclusões. Desde logo porque nem sequer demonstra em que meios de prova assenta a referida alteração da prova e porque os documentos são claros a suportar o facto provado tal como consta do artigo 27.
6. Alega ainda o Recorrente que deveria ser acrescentado o ponto 27.3 à matéria de facto relativa ao deposito do empréstimo bancário de 37.500,00 seria por conta do reembolso dos adiantamentos realizados pela mesma relativa ao pagamento antecipado do preço da Rua …. No entanto nenhum meio de prova indica a suportar esta alteração da matéria de facto, o que se percebe, pois não há.
7. Com efeito, da prova produzida em julgamento não resultou minimamente provado esse facto.
8. Alega o A que também foi deficientemente julgado o art 36 dos factos provados, entendendo que o valor do somatório é de 65.475,00 e não de 52.100.
9. Também aqui o A não demonstra quais os meios de prova que justificam este valor, e além disso é manifesto que o somatório dos extractos juntos conforme documentos 8 a 10, 12 a 15 e 17 da PI, resulta claro que o somatório dos valores entre 2003 e 2007 atinge o valor de €52.100,00.
10. Nessa mesma linha decidiu e bem o douto tribunal a quo:
“A matéria contemplada nos artigos 86º a 93º da Réplica, ressalvados os respectivos segmentos conclusivos, está assente, não foi levada aos temas da prova e é pacífica no quadro das versões das partes. Resultam, de resto, do mapa comparativo de rendas que o Autor faz e que tem respaldo nos extractos juntos, nas contas que também a Ré faz no requerimento de Junho de 2014 bem como no documento 8 da Réplica.”
11. O recorrente entende que deve ser aditado aos factos provados o ponto 1 dos factos não provados, embora não concretize e muito menos fundamente.
12. Acresce que não se percebem as conclusões Y e Z das conclusões, uma vez que o Recorrente conclui que “ todos os pagamento e amortizações dos empréstimos que saíram do BCP só podem ser suportados pelo A, o que já se referiu não é verdade, pois também a conta BCP teve vários créditos da Recorrida, e além disso, em momento algum o Recorrrente demonstra o que alega, o que se compreende por não corresponder a verdade.
13. Não se resultando minimamente provado o referido facto.
14. O Recorrente alega que o facto alegado nos artigos 57º e 58º da Pi, relativo ao montante de €105.562,50 do ponto 16 dos factos não provados, devia ser considerado provado ser dinheiro do Autor. Sobre esta questão foi feita prova cabal de que o referido montante não pertence ao Recorrente.
15. Entrando na análise da questão jurídica, sempre se dirá que a sentença recorrida não merece o menor reparo, estando muito bem fundamentada, sendo aliás difícil de encontrar uma sentença tão bem fundamentada, como esta, sendo nessa medida, intocável.
16. Ao contrário do sustentado pelo Recorrente o Tribunal a quo analisou de forma critica a existência ou não de direito de regresso e de sub rogação no caso judice, concluindo, e bem, pela sua inexistência.
17. A este propósito resultou da douta sentença recorrida o seguinte” A propósito da relevância, a este nível, do depósito efectuado por DM…, cumpre tecer alguns considerandos acerca da relação do mesmo com o contributo da Ré. Este valor foi, de facto, conseguido em virtude de um serviço conseguido pela última. Não fosse esse serviço e as partes nada teriam recebido. Ou seja, constitui um contributo obtido com o esforço do trabalho da Ré. Esforço que
tem um valor patrimonial - o indicado – e que a jurisprudência (v. Aresto atrás citado) tem considerado que deve ser tido em conta a par das contribuições em numerário. Não se mostraria, de resto, razoável sustentar-se que, como, à data, na perspectiva vertida na Réplica, a Ré teria concordado em “dar” ao Autor metade do valor por si conseguido graças ao trabalho que prestou (o que se retira de não ter então contestado os depósitos –um em cada conta – feitos por DM…), tal valor não pudesse ser contabilizado para os efeitos aqui pretendidos (pagamento da obrigação que constitui aqui causa de pedir e/ou contribuição para os encargos comuns na vigência da união de facto). Trata-se, pois, de um valor algo significativo, mesmo no contexto de rendimentos elevados das partes, posto que em causa está o ano de 2005. Oito anos e meio, sensivelmente, depois do início da execução do primeiro mútuo.”
18. Seguindo esta linha, e concordando em absoluto com o entendimento sufragado pela douta sentença recorrida, não estão reunidos os pressupostos do direito de regresso, conforme resulta da douta sentença recorrida, sendo que esmagadora da jurisprudência reconduz essa situação ao instituto do enriquecimento sem causa.
19. A respeito do enriquecimento sem causa, e em relação ao pedido subsidiário do Recorrente, importa desde já referir que a união de facto se inicia em 1991 terminou em Outubro de 2010, conforme resultou da matéria de facto provada.
20. Conforme referido pelas partes, nos seus depoimentos, o A nunca em nenhum momento solicitou directa ou indirectamente solicitou a R o pedido de reembolso de despesas e em nenhum momento o A promoveu a declaração judicial de dissolução da união de facto.
21. Ora a referida declaração judicial tem que ser judicialmente declarada quando se pretendam fazer valer direitos que dependam dela, como é o caso (v. art 8º/1b), nº 2 e 3 da Lei 7/2001, de 11 de Maio, que rege as medidas de protecção das Uniões de Facto.
22. Acresce que conforme decorre do número 3 da referida disposição legal, que a declaração judicial de dissolução da união de facto deve ser proferida na acção mediante a qual o interessado pretende exercer direitos dependentes da dissolução.
23. Ora não foi isso que fez o A, ora Recorrente pelo que nos termos da presente disposição legal, não pode tribunal conhecer do mérito da causa, em face de não estar preenchido o pressuposto prévio de que depende a acção.
24. Em face do exposto, deve a presente acção ser julgada improcedente, em face de não estar preenchido o pressuposto prévio de que depende a acção, pelo que também por essa razão deverá o recurso ser julgado totalmente improcedente.
25. A douta sentença recorrida analisou exaustivamente a questão, tendo decidido e fundamentado de forma correctíssima a presente questão. Com efeito, foi decidido pela douta sentença o seguinte:
“Em qualquer dos casos, como se depreende da parte final do sumário citado em último lugar, tem sido questão central a de saber que valores (despesas, encargos, contribuições) contam para os cálculos, mais ou menos rigorosos, a fazer. É nesta sede que, aprofundando a análise, alguns investigadores inserem a articulação desta problemática com as ”obrigações naturais” e com o “abuso de Direito”(…) Ora, é certo que, agindo deste modo, o A. não cumpria, neste particular, uma obrigação natural, porquanto, do ponto de vista dos Bancos mutuantes e tendo o A. renunciado ao benefício da excussão prévia no mútuo em que figurou como fiador (ponto 3 dos factos provados), tal obrigação sempre lhe poderia vir a ser judicialmente exigível. No entanto, importa analisar se, face a esse comportamento espontâneo nos dois anos que se seguiram à separação, o que nesta acção se vem pedir não constituirá abuso de direito na
Modalidade de venire contra factum proprium. Numa palavra, se não constituirá um comportamento contraditório. Afigura-se-nos evidente que se trata de um comportamento contraditório. Para explicar a mudança de postura, o Autor alega que a Ré usava demasiado o cartão de crédito, que não conseguia encerrar a conta e que não queria falhar com um Banco do qual era cliente antigo. Ora, a verdade é que o Autor continuou a provisionar o cartão de crédito porque quis e nunca interpelou a Ré para pagar, como vimos. Falecem, portanto, os argumentos avançados para explicar o carácter contraditório do seu comportamento.
26. Na mesma linha, foi decidido por douto Acórdão de 27.01.2011, o seguinte:
“A união de facto não se mostra, por si só, apta para gerar direitos patrimoniais relativamente a bens adquiridos na constância de tal união.
II Invocando e uma situação de enriquecimento sem causa, haverá que apurar qual a proporção aproximada da participação de cada uma das partes nas despesas destinadas à satisfação do agregado familiar, numa união de facto que se prolongou por quase 23 anos e da qual nasceram duas filhas.
III Pedindo a Autora com base em tal enriquecimento sem causa a restituição de metade das quantias que pagou dos empréstimos contraídos para aquisição de dois imóveis, registados em seu nome e no do Réu e destinados à satisfação das necessidades do agregado familiar, terá igualmente de provar qual o grau de comparticipação não só no pagamento da totalidade do preço de tais prédios como nas demais despesas do agregado familiar ao longo da união de facto, pois só assim se poderá aferir da existência de efectivo enriquecimento de um à custa do empobrecimento do outro”.
27. Em face do exposto, é manifesto que por um lado a comparticipação da Recorrida foi superior à do Recorrente para a vida em comum, e por outro lado, em momento algum o Recorrente exigiu ou interpelou a Recorrida para reembolsar qualquer quantia, pelo que é manifesta a improcedência do presente recurso na esteira da jurisprudência maioritária, não merecendo a douta decisão recorrida o menor reparo”.
Conclui, no sentido da total improcedência da apelação, com as legais consequências.
10 – O recurso foi admitido por despacho de fls. 2217, como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
11 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir.
**
II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO
Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil, estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que:
1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas ;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”.
Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação do recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Pelo que, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede determina o conhecimento das seguintes questões:
1. DA EVENTUAL PERTINÊNCIA DA MODIFICABILIDADE DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO, nos quadros do artº. 662º, do Cód. de Processo Civil, por referência:
1.1 - ao facto provado 9.2
pretendendo-se que o mesmo passe a figurar com a seguinte redacção:
“relativamente ao mútuo datado de 10/07/2008 e com terminus a 30 de Maio de 2014, foi pago o montante global de € 44.417,89, a título de capital e juros, por referência à data de 06/04/2016” - Conclusões H) a J) ;
1.2 – ao facto provado 27, alíneas a) e f)
pretendendo-se que o mesmo passe a figurar com idêntica redacção, com supressão das alíneas a) e f) - Conclusões K) e L) e Conclusão contra-alegacional 5 ;
1.3  - ao aditamento à matéria de facto provada, de um novo facto, a figurar com o nº. 27.3, com a seguinte redacção:
“o Autor, após ter sido depositado o empréstimo bancário na conta BCP, pagou à Ré a quantia correspondente a 37.500,00 €, por conta do reembolso dos adiantamentos realizados pela mesma relativamente ao pagamento antecipado do preço de aquisição do imóvel na Rua …” - Conclusão M) e Conclusões contra-alegacionais 6 e 7 ;
1.4  - ao facto provado 36
pretendendo-se que o mesmo passe a figurar com a seguinte redacção:
“através de cheques passados à Ré, que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 65.475,00 entre 2003 e 2007” - Conclusões N) a P) e Conclusões contra-alegacionais 8 e 9 ;    
1.5 - ao facto provado 55
pretendendo-se que o mesmo passe a figurar com a seguinte redacção:
“até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP, ascendeu a € 207.789,00 e as rendas suportadas para igual período, debitadas na mesma conta, ascendeu a € 265.236,00”Conclusões Q) a U) e Conclusão contra-alegacional 10 ;
1.6 – ao facto não provado 1
Pretensão que o mesmo passe a figurar como provado - Conclusões V) a AA) e Conclusões contra-alegacionais 11 a 13 ;   
1.7 - ao facto não provado 16
Pretensão que o mesmo passe a figurar como provado - Conclusões BB) e CC) e Conclusão contra-alegacional 14.
o que implica a REAPRECIAÇÃO DA PROVA produzida ;
2. Seguidamente, quer se conclua pela requerida modificação (total ou parcial) da matéria de facto fixada, quer esta seja improcedente, aferir acerca da SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS, o que implica apreciação do ENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CAUSA.
Nomeadamente a aferição das seguintes matérias:
2.1 - o preenchimento dos pressupostos do direito de regresso ;
- A não prova, por parte da Ré, da excepção de pagamento ;
- O elemento volitivo do fiador durante a união - Conclusões DD) a LL) e Conclusões contra-alegacionais 16 a 18 ;
2.2 – o preenchimento dos pressupostos do enriquecimento sem causa ;
- Da cessação de “causa justificativa” ;
- Da inexistência de abuso de direito (a alegada inexistência de “comportamento contraditório”) - Conclusões MM) a VV) e Conclusões contra-alegacionais  18 e 25 a 27.
Tendo em consideração o teor das contra-alegações, e como questões prévias, urge ainda apreciar acerca:
- Do alegado incumprimento do estatuído na alínea b), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil - Conclusões contra-alegacionais  1 e 2 ;
- Da alegada necessidade de declaração judicial de dissolução de união de facto como pressuposto prévio da acção - Conclusões contra-alegacionais  19 a 24.
*
QUESTÃO PRÉVIA: do alegado incumprimento do disposto no artº. 640º, nºs. 1, alín. b), do Processo Civil, conducente à rejeição do recurso interposto
Alega a Recorrida que nas conclusões apresentadas pelo Recorrente, pretendendo este impugnar a matéria de facto, não cumpre os formalismos inscritos no artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, ao não indicar os concretos meios de prova que impunham decisão diversa, limitando-se, de forma inconsistente, que determinados pontos da matéria de facto devem ser alterados.
Pelo que, nos termos do nº. 1, daquele normativo, deve ser liminarmente rejeitada a impugnação da matéria de facto – cf., Conclusões contra-alegacionais 1 e 2.
Decidindo:
Prevendo acerca do ónus a cargo do recorrente na impugnação da matéria de facto, a alínea b), do nº. 1, do artº. 640º, do Cód. de Processo Civil, enuncia, entre outras, e sob pena de rejeição, a obrigatoriedade de especificação dos “concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”.
Estando em causa na apelação a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, deve o Recorrente “indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões”, devendo, ainda, “especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos”.
Pelo que, o recurso deve ser rejeitado, total ou parcialmente, no que concerne á impugnação da decisão sobre a matéria de facto, quando ocorrer “falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.)”, não sendo, todavia, exigível, conforme prevalecente entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça, que tais “elementos constem das conclusões, bastando que ressaltem da motivação” [2].
Ponto fulcral é que tais exigências ou requisitos formais não sejam exponenciados ou exacerbados, “a um ponto que seja violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador”.
Donde, resultar “infundada a rejeição do recurso da matéria de facto com fundamento na falta de indicação, nas conclusões, dos meios probatórios ou dos segmentos da gravação em que o recorrente se funda. O cumprimento desses ónus no segmento da motivação parece suficiente para que a impugnação da decisão da matéria de facto ultrapasse a fase liminar, passando para a apreciação do respectivo mérito”.
Pelo que, o que resulta essencial é garantir que o cumprimento do ónus de alegação inscrito no referenciado normativo “seja compaginado com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, atribuindo maior relevo aos aspectos de ordem material”, sendo clara a tendência consolidada ao nível do Supremo Tribunal de Justiça de “não se exponenciarem os efeitos cominatórios previstos no art. 640º” [3]
Ora, compulsado o teor das alegações recursórias, nomeadamente no que se reporta ao corpo alegacional ou motivacional, resulta claramente ter o Recorrente observado o ónus que lhe incumbia.
Com efeito, e por referência aos vários pontos de impugnação factual, enunciou e identificou, de forma tendencialmente clara e bastante, quais os meios probatórios sustentadores da sua pretensão, os quais, no presente caso, possuem fundamentalmente natureza documental, para além de referência, igualmente especificada, ao teor das suas declarações de parte.
Donde decorre, com clareza e nitidez, ter o Apelante, na impugnação da decisão sobre a matéria de facto, observado e cumprido os legais ditâmes, assim improcedendo o pedido de liminar rejeição do recurso de apelação, no segmento referente àquela impugnação.
*
QUESTÃO PRÉVIA: da alegada necessidade de declaração judicial de dissolução de união de facto como pressuposto prévio da acção
Em sede contra-alegacional, refere a Apelada que em nenhum momento o A promoveu a declaração judicial de dissolução da união de facto, sendo que esta tem que ser declarada quando se pretendam fazer valer direitos que dependam dela, como é o caso (v. art 8º/1b), nº 2 e 3 da Lei 7/2001, de 11 de Maio, que rege as medidas de protecção das Uniões de Facto.
Acrescenta que tal declaração judicial de dissolução da união de facto deve ser proferida na acção mediante a qual o interessado pretende exercer direitos dependentes da dissolução – cf., o nº. 3, do mesmo normativo.
Pelo que, não o tendo feito o Autor, está vedado ao Tribunal conhecer acerca do mérito da causa, em face de não estar preenchido o pressuposto prévio de que depende a acção.
Determinando, consequentemente, que a presente acção seja julgada improcedente, em face de não estar preenchido o pressuposto prévio de que depende a acção, o que determinará igual juízo de improcedência relativamente ao presente recurso.
Apreciando:
Prevendo acerca da dissolução da união de facto, prescreve o artº. 8º, nº. 1, alín, b), da Lei nº. 07/2001, de 11/05 (adopta medidas de protecção das uniões de facto), dissolver-se a união de facto “por vontade de um dos seus membros”.
Acrescentam os nºs. 2 e 3, do mesmo normativo, que:
“2 - A dissolução prevista na alínea b) do número anterior apenas tem de ser judicialmente declarada quando se pretendam fazer valer direitos que dependam dela.
3 - A declaração judicial de dissolução da união de facto deve ser proferida na acção mediante a qual o interessado pretende exercer direitos dependentes da dissolução da união de facto, ou em acção que siga o regime processual das acções de estado”.
Referencia-se no douto aresto desta Relação de 31/10/2017 [4], resultar do estabelecido no transcrito normativo, nomeadamente nos seus nºs. 2 e 3, que “caso se pretendam fazer valer direitos dependentes da dissolução da união de facto, esta terá de ser judicialmente declarada, ainda que não seja necessário instaurar processo autónomo para obtê-la, antes devendo essa declaração constar da acção em que os direitos reclamados são exercidos – cfr. neste sentido PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA, in “Curso de Direito de Família”, 4.ª ed., 2008, pág. 83, e FRANÇA PITÃO, in “União de Facto e Economia Comum”, 3.ª ed., pág. 280”.
Acrescenta, ainda, no exemplo ali tratado de atribuição da utilização da casa de morada de família, ser indispensável tal declaração, ainda que a mesma “não tenha de ser formulada explicitamente pelo interessado, como se admite (v. o ac. da RL de 5.3.2009, in dgsi), por nos movermos no domínio da jurisdição voluntária” (sublinhado nosso).
Acrescenta-se no douto Acórdão desta Relação de 12/09/2013 [5] ser manifesta a legal consagração da “possibilidade de declaração judicial da dissolução da união de facto em sede de apreciação de pretensões judicialmente exercidas que dessa dissolução dependam: como pressuposto da declaração desses direitos, o tribunal declara a dissolução da união de facto”.
Assim, aduz-se, no nosso sistema legal “a união de facto não é encarada, pese embora a amplitude de direitos que dela decorrem, como uma sub-espécie do casamento marcada pela informalidade de constituição; o legislador manteve um sistema em que os cidadãos podem optar por uma vivência marital com as características jurídicas do casamento ou por uma vivência marital de facto alheada dessas consequências jurídicas.
Não obsta a tal conclusão a verificação da amplitude dos direitos reconhecidos em caso de dissolução da união de facto. O reconhecimento de tais direitos não decorre da assimilação do regime da união de facto ao do casamento, antes ocorre no respeito pela diferença querida pelos cidadãos, que podem escolher ser membros de união de facto ou cônjuges, sem que essa liberdade seja coarctada pelo legislador mediante a assimilação dos regimes.
A intervenção do Estado na união de facto, que se constitui e dissolve pela simples vontade dos membros, é residual e destina-se apenas à correcção de situações de desprotecção ou de injustiça que sem essa intervenção poderiam verificar-se.
Por isso que a vontade que a constitui pode dissolvê-la sem qualquer intervenção judicial.
Contexto em que se percebe a finalidade da declaração judicial: quando o Estado reconhece direitos com base na dissolução de uma situação de facto meramente consensual tem de formalizar a sua dissolução para suporte daquelas pretensões que deixam de assentar no consenso”.
Desta forma, conclui, “o pedido de dissolução de união de facto carece de autonomia, assumindo tão somente a natureza de pressuposto de pretensões decorrentes daquela vivência” (sublinhado nosso).
Resulta do legal enquadramento que a dissolução da união de facto resulta da mera vontade de um dos seus membros, não se traduzindo a declaração judicial de dissolução em acto extintivo da união de facto, mas antes “num mero acto declarativo que se limita a constatar ou a declarar uma realidade já verificada”.
Pelo que, “se um dos ex – companheiros da união de facto dissolvida pretender exercer direitos que dela dependam, como é o caso do direito à atribuição da casa de morada de família, impõe-se ao outro. Tal declaração é um pressuposto do direito reclamado com a diferença, no que respeita à atribuição da casa de morada de tribunal, constatada a união de facto e a sua dissolução, que assim o declare.
Tal declaração constitui um pressuposto do reconhecimento do direito à casa de morada de família e residência comum, impondo-se que seja proferida apenas quando se trate de fazer valer os direitos que a lei confere aos ex – companheiros de uma união de facto já dissolvida”.
Todavia, realça-se, a lei impõe “que o tribunal profira tal declaração mas não impõe que o interessado deduza tal pedido como se estivéssemos face a uma cumulação real de pedidos”.
Deste modo, reitera-se, “a referida declaração de dissolução da união de facto não dispõe de autonomia só se impondo que seja proferida quando se trate de fazer valer os direitos que a lei confere aos companheiros de uma união de facto já dissolvida.
O pedido que importa deduzir é naturalmente aquele que corresponde ao direito que o ex-companheiro julgue assistir-lhe, direito que, no caso vertente, é o direito ao arrendamento da casa de morada de família.
A declaração judicial da dissolução da união de facto constitui um pressuposto do reconhecimento do direito à casa de morada de família e residência comum: a lei impõe que o tribunal profira tal declaração, mas não impõe que o interessado deduza tal pedido como se estivéssemos face a uma cumulação real de pedidos”.
Desta forma, conclui, a declaração de dissolução da união de facto “não tem autonomia em relação ao pedido que o companheiro da união de facto já dissolvida haja deduzido; por isso, estando nós face a uma cumulação aparente, o Tribunal não desrespeita o princípio do pedido quando conhece do pedido que foi deduzido (o de atribuição da casa de morada de família) declarando o pressuposto de que o pedido depende, ou seja, declarando judicialmente dissolvida a união de facto, mesmo que não tivesse sido pedida” (sublinhado nosso) [6].
Por fim, referencie-se, ainda, o juízo defendido no douto Acórdão, igualmente desta Relação, de 03/07/2008 [7], relativamente a situação em que, tendo sido formulado pedido de atribuição de casa de morada de família, não se cumulou pedido de declaração da dissolução da união de facto.
Começando-se por defender não se duvidar, face ao legalmente prescrito, “de que se um dos ex-companheiros da união de facto dissolvida pretender exercer direitos que dela dependam, como é o caso do direito à atribuição da casa de morada de família, impõe-se ao Tribunal, constatada a união de facto e a sua dissolução, que assim o declare”, realça-se, contudo, que esta declaração de dissolução não “dispõe de autonomia só se impondo que seja proferida quando se trate de fazer valer os direitos que a lei confere aos companheiros de uma união de facto já dissolvida”.
Assim, perfilhando idêntico entendimento ao supra exposto, aduz-se que “a lei impõe que o tribunal profira tal declaração, mas não impõe que o interessado deduza tal pedido como se estivéssemos face a uma cumulação real de pedidos.
Na verdade, este caso deve ser tratado como os demais casos de cumulação aparente de pedidos. Assim, por exemplo, considerou-se que tal cumulação se verifica quando o A. pede lhe seja reconhecida a qualidade de arrendatário de determinado prédio e a condenação do réu ( senhorio) a realizar certas obras no arrendado (Ac. da Relação de Coimbra de 10-12-1992- Cardoso Albuquerque - B.M.J. 422-438) ou quando na acção de reivindicação se pede a entrega da coisa reconhecida que seja a propriedade da coisa (Ac. do S.T.J. de 21-1-2003, agravo nº 4172/02 - Silva Salazar - Ac. da Relação de Coimbra de 4-1-1983 - Ataíde das Neves - C.J.,1, pág. 18; ver também Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, 1- Princípios Fundamentais.2- fase Inicial do Processo Declarativo ,Almedina, 1997, pág. 120 e Temas Judiciários, I Volume, pág. 211/212)”.
Conclui-se, então, que, estando-se perante uma cumulação aparente, e não possuindo a declaração de dissolução da união de facto autonomia, nos termos já expostos, “o Tribunal não desrespeita o princípio do pedido quando conhece do pedido que foi deduzido (o de atribuição da casa de morada de família) declarando o pressuposto de que o pedido depende, ou seja, declarando judicialmente dissolvida a união de facto.
Mas sempre se deveria considerar, aceitando-se que o pedido de dissolução da união de facto possa ser deduzido autonomamente, implícito esse pedido no pedido de atribuição do direito ao arrendamento da casa de morada de família por se dever entender que quem reclama o arrendamento da casa que foi a casa de morada de família, pretende obviamente o reconhecimento de que houve uma vivência da união de facto naquela habitação que se extinguiu. Importa, claro está, que os factos integrativos da dissolução e da anterior vivência na casa de morada de família em união de facto tenham sido alegados” (sublinhado nosso).
Aplicando tais princípios e entendimento ao caso sub júdice, constata-se o seguinte:
- nos presentes autos o pedido principal formulado pelo Autor funda-se em alegada sub-rogação ou direito de regresso decorrente do facto de ter figurado como fiador (num dos empréstimos) e co-devedor (no demais), contraídos para aquisição de imóveis adquiridos em nome da Ré ;
- ou seja, no empréstimo contraído para aquisição da fracção habitacional, o Autor figurou como fiador e principal pagador, figurando a Ré como mutuária, afirmando aquele na presente acção o seu direito de sub-rogação no crédito do anterior credor ;
- enquanto que no empréstimo para a aquisição da garagem, sendo Autor e Ré devedores solidários, invoca o seu direito de regresso relativamente à Ré condevedora, correspondente a metade da quantia liquidada ;
- decorre do exposto que através do petitório accional principal o Autor não pretende exercer ou valer direitos dependentes da dissolução da união de facto, ou seja, os invocados direitos de regresso ou su-rogação não estão condicionados ou sob dependência de um qualquer juízo de dissolução da união de facto mantida ;
- pois, tais invocados direitos podem, claramente, ser objecto de judicial reivindicação, sem que tal implique um qualquer prévio juízo de judicial declaração de dissolução da união de facto entre Autor e Ré – cf., o Acórdão desta Relação e Secção de 13/09/2018 (Relator: Pedro Martins, Processo nº. 358/17.2T8SNT-2 – in www.dgsi.pt -, no qual intervieram como Adjuntos o ora Relator e 1º Adjunto), no qual se defendeu que “o direito de o devedor solidário (pelas dívidas decorrentes dos empréstimos para aquisição do imóvel em causa) pedir do seu co-devedor aquilo que pagou a mais ao credor, ou seja, por ter pago aquilo que o seu co-devedor também devia ter pagado e não pagou”, não está dependente da ruptura da união de facto, podendo perfeitamente conviver com situação de manutenção desta ;    
- decorrendo, assim, claramente, ser in casu inexigível tal declaração judicial de dissolução da união de facto, pois os direitos pretendidos fazer valer a título principal não dependem daquela dissolução ;
- pois, apenas se impõe o proferir de tal declaração quanto esteja em causa a pretensão de fazer valer direitos que a lei confere ou atribui aos companheiros de uma união de facto já dissolvida ;
- todavia, ainda que assim não se considerasse, e se entendesse estar o tribunal legalmente vinculado a proferir tal declaração, tal não implica ou impõe, necessariamente,  que o Autor tivesse que ter deduzido tal pedido, como se estivéssemos perante situação de cumulação real de pedidos ;
- ou seja, ainda que não tivesse sido formulado o pedido de declaração judicial de dissolução da união de facto, pode o Tribunal conhecer acerca do petitório deduzido (principal e subsidiário), declarando o pressuposto de que este depende, isto é, declarando judicialmente dissolvida a união de facto, desde que exista base factual demonstrativa de tal dissolução ;
- pelo que, mesmo nesta situação, inexistindo declaração expressa por parte do Tribunal recorrido, sempre tal omissão poderia ser colmatada por esta Relação, no âmbito da oficiosidade, pois estamos apenas perante uma mera declaração certificativa de um pressuposto de pretensões decorrentes daquela vivência em união de facto e sua dissolução ;
- improcedendo, consequentemente, o reclamado juízo de ausência de preenchimento do pressuposto prévio de que depende a presente acção, conducente a um necessário juízo de improcedência desta ;
- o que impõe, nesta vertente, total improcedência da pretensão contra-alegacional apresentada.
**
III - FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Na sentença recorrida, foi considerado como PROVADO o seguinte (consta a rectificação de alguns lapsos de redacção ; estão devidamente identificados, com * os factos impugnados ou pretendidos aditar ; nos casos em que ocorreu alteração da matéria de facto, consta em nota de rodapé o facto correspondente na sua redacção original):
1. Autor e Ré viveram como marido e mulher desde data não anterior a 1992 nem posterior a Março de 1994 e até Setembro de 2010.
2. Por escritura pública outorgada no …º Cartório Notarial de Lisboa a ….10.96, foi celebrado contrato de compra e venda da fracção autónoma designada pela letra «C» que corresponde ao … andar do prédio urbano situado na Rua …, números … e …-A, em Lisboa, descrito na 4ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº … da freguesia da Lapa e inscrito na correspondente matriz predial urbana sob o artigo …, pelo qual a Ré adquiriu tal imóvel (adiante designado por apartamento da Rua …) a MA…, pelo preço de vinte e cinco milhões de escudos (€124.699,47).
3. Pelo mesmo instrumento notarial, foi celebrado um contrato de mútuo em que intervieram o Banco de Investimento Imobiliário, SA. [do grupo Millennium BCP] na qualidade de mutuante, a Ré, na qualidade de mutuária e o Autor na qualidade de fiador e principal pagador, em virtude do qual foi emprestado à Ré, com a obrigação de restituição, o montante de vinte e oito milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a €142.157,40), sendo vinte e cinco milhões de escudos (correspondentes a €124.699,47) destinados ao pagamento da aquisição da fracção acima referida e os restantes três milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a € 17.457.93) destinados ao pagamento de obras de beneficiação na mesma fracção.
4. Nos termos do disposto na cláusula quarta do documento complementar anexo à escritura, estipulou-se que o empréstimo seria concedido por dezassete anos a contar de 15 de Outubro de 1996 e seria amortizado em duzentas e quatro prestações mensais, de capital e juros, tendo a primeira vencimento no dia 15 de Novembro de 1996.
5. O pagamento das prestações de amortização da dívida, capital e juros atinentes a tal empréstimo foi sempre efectuado por débito directo da conta titulada pelo Autor no Banco Millennium BCP, com o número …, a qual passou a ser conjuntamente titulada por A. e Ré a partir de 27.05.1996.
6. Por escritura pública celebrada no Cartório Notarial a cargo do Notário RM…, a 10.07.08 a Ré adquiriu a fracção autónoma designada pela letra «U» que corresponde à garagem em estacionamento coberto correspondente ao prédio urbano sito na Rua …, número …, em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº … da freguesia de Santos-O-Velho e inscrito na correspondente matriz predial urbana sob o artigo …, o que fez pelo preço de € 36.375,00.
7. - Pelo mesmo instrumento notarial, o Banco Comercial Português, SA, na qualidade de mutuante, emprestou à Ré e ao Autor, na qualidade de mutuários, com obrigação de restituir, o montante de setenta e cinco mil euros (€75.000,00).
8. Nos termos do disposto na cláusula segunda do documento complementar anexo à referida escritura, o empréstimo foi concedido pelo prazo de cento e noventa meses a contar do dia 30 de Julho de 2008 e seria amortizado em cento e noventa prestações mensais, de capital e juros, a primeira com vencimento a 30 de Agosto de 2008 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
9. Em cumprimento destes mesmos mútuos datados de 10.10.96 e 10.07.08, respectivamente, foram pagas por débito directo da conta identificada em 5 no Banco Millennium BCP as seguintes importâncias:
a) Mútuo de 10.10.96: Em 1996 e 1997, o montante de € 20.297,84
b) Mútuo de 10.10.96: Em 1988 o montante de € 14.983,97..............
c) Mútuo de 10.10.96: Em 1999, o montante de € 13.515,79.............
d) Mútuo de 10.10.96: Em 2000, o montante de € 13.702,41.............
e) Mútuo de 10.10.96: Em 2001, o montante de € 14.077,17.............
f) Mútuo de 10.10.96: Em 2002, o montante de € 13.274,12..............
g) Mútuo de 10.10.96: Em 2003, o montante de € 12.737,07.............
h) Mútuo de 10.10.96: Em 2004, o montante de € 12.483,36.............
i) Mútuo de 10.10.96: Em 2005, o montante de € 11.288,43..............
j) Mútuo de 10.10.96: Em 2006, o montante de € 11.389,27..............
k) Mútuo de 10.10.96: Em 2007, o montante de € 11.710,66.............
l) Mútuo de 10.10.96: Em 2008, o montante de € 11.823,65..............
m) Mútuo de 10.07.08: Em 2008, o montante de €.............................
n) Mútuo de 10.10.96: Em 2009, o montante de € 11.305,68.............
o) Mútuo de 10.07.08: Em 2009, o montante de € 11.305,68.............
p) Mútuo de 10.10.96: Em 2010, o montante de € 11.157,78.............
q) Mútuo de 10.07.08: Em 2010, o montante de € 11.305,68.............
r) Mútuo de 10.10.96: Em 2011, o montante de € 11.182,70..............
s) Mútuo de 10.07.08: Em 2011, o montante de € 11.305,68.............
t) Mútuo de 10.10.96: Em 2012, o montante de € 11.176,47..............
u) Mútuo de 10.07.08: Em 2012, o montante de € 11.305,68.............
v) Mútuo de 10.10.96: Em 2013, o montante de € 1.859,66...............
w) Mútuo de 10.07.08: Em 2013, o montante de € 11.305,68.............
9.1. A última prestação do mútuo datado de 10.10.96 foi debitada em 16.09.13, tendo, até essa data, sido pago o montante global de €214,031,2 a título de capital e juros.
9.2. Relativamente ao mútuo datado de 10.07.08, com terminus a 30 de Maio de 2024, por referência à data de 06.04.16, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros [8] *.
10. Da quantia mutuada pelo Banco Comercial Português, foi aplicado na aquisição da garagem mencionada no ponto 6 deste elenco o valor de €36.375,00, tendo sido o remanescente integrado a conta [do BCP] identificada no ponto 5 deste elenco.
11. Na conta bancária com o NIB … no Banco Millennium BCP, de onde eram debitadas as prestações referentes aos apontados encargos, o Autor recebia o seu vencimento e outros rendimentos.
12. A Ré apenas passou a ser cotitular da conta solidária do Millennium BCP a partir de Maio de 1996, sendo, no entanto, que, a débito, apenas a movimentava com o uso de cartão de crédito associado e que, a crédito, apenas a movimentou nos termos infra descritos nos pontos 27 a 28 deste elenco.
13. A decisão de adquirir um apartamento foi tomada pelo Autor e pela Ré na pendência da vida em comum, como se fossem casados, e o mesmo serviria, como serviu, de habitação dos dois, do filho de ambos e dos três filhos da Ré.
14. Pese embora a intenção das partes de que o imóvel ficasse a integrar o património do agregado familiar, pelo facto de o Autor querer proteger o património familiar do risco inerente à sua actividade empresarial, foi decidido que o apartamento da Rua … seria adquirido em nome da Ré.
**
15. Antes de conhecer o A., a R. residia num apartamento na Rua …, em Lisboa.
16. Em Março de 1994, a Ré celebrou um contrato de arrendamento que tinha por objecto o apartamento da Rua … (que viria a adquirir em 10.10.1996 nos termos apontados em 2.), pela renda de trezentos e trinta mil escudos por mês mas com um compromisso de obras no valor de seis milhões de escudos, mais ficando acordado que, até à conclusão das obras por esse valor, seriam abatidos mensalmente cem mil escudos do valor da renda.
17. Apesar de se encontrar separado, o A. era ainda casado, tendo vindo a divorciar-se em 13.11.00, facto pelo qual a fracção identificada em 2. foi adquirida apenas em nome da Ré, figurando o Autor na qualidade de fiador do mútuo mencionado em 3., já que o Banco exigia tal garantia.
18. Tal fracção foi habitação permanente do Autor e da Ré.
19. A. e Ré passaram ainda a ser titulares em conjunto da conta nº …/…, do BBVA- Bilbao Vizcaya Argentaria, até aí apenas titulada pela Ré.
20. Não obstante ser solidária, tal conta do BBVA apenas era movimentada a débito pela Ré, tendo-a o A. movimentado a crédito apenas nos termos infra descritos no ponto 36 deste elenco.
21. A Ré exercia actividade quando conheceu o Autor e fê-lo durante o período em que viveram juntos.
22. O A. conheceu a R. quando esta integrava a Task Force do BCI e fora mandatada para a compra de espaços comerciais que viriam a ser utilizados como balcões bancários, altura em que auferia mensalmente, em ordenado e comissões, cerca de um milhão de escudos.
23. O A. era o engenheiro nomeado pela empresa Engexpor, encarregue da fiscalização e direcção das obras nos espaços comerciais.
24. Quando o BCI deixou de pagar as remunerações, a R. processou o BCI com ganho de causa, tendo recebido vinte e um milhões de escudos a título de indemnização, quantia que depositou na aludida conta do BBVA.
25. Entre 1993 e Setembro de 1994, a Ré trabalhou como mediadora na sociedade Cofirep- Sociedade de Mediação Imobiliária Lda., com o NIPC 502 120 142, tendo, em 16 de Setembro de 1994 adquirido 50% do capital social da empresa e, mais tarde, em 1997, adquirido o restante capital social.
26. Como gerente da Cofirep, a R. auferia rendimento mensal bruto de €1.500,00, o que apenas se alterou em Março de 2002, quando a Ré foi acometida de doença oncológica e submetida a tratamento.
27. A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a) €1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;  
b) €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;  
c) €25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;  
d) €9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95 [9] *.
27.1. Foram transferidos por DM… para a conta do BCP €105.562,50 em 31.10.05, data em que quantia idêntica foi igualmente transferida pelo mesmo para a conta do BBVA.
27.2. A R. pagou ao anterior proprietário da fracção da R. … o montante de € 7.481,96 através da sua conta pessoal do BBVA.
27.3. o Autor, após disponibilização do montante do mútuo referenciado nos factos 3 e 4, emitiu e entregou à Ré um cheque sacado sobre a conta identificada em 5, datado de 14/10/1996, no valor de 7.500.000$00 (contravalor de 37.409,84 €), que esta depositou na conta do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, identificada em 19 * [10].
27.4. a quantia referenciada em 27.1, transferida para a conta do BCP identificada em 5, era pertença do Autor [11].
28. Foram ainda depositados na mesma conta do BCP os seguintes valores resultantes do arrendamento da fracção da R. …, a saber:
- € 31.500,00 – referentes a rendas pagas pelo arrendatário no valor mensal de € 2244,60 (à data 450.000$00), entre Abril de 2001 e Fevereiro de 2003;
- € 17.500,00 – referentes a rendas pagas pelo arrendatário no valor mensal de € 1.750,00, entre Agosto de 2004 e Julho de 2005;
- € 63.800,00 – referentes a rendas pagas pelo arrendatário no valor mensal de € 2.000,00 de renda de casa e € 200,00 de renda da garagem, entre Agosto de 2005 e Dezembro de 2007;
- € 47.000,00 – referentes a rendas pagas pelo arrendatário no valor mensal de € 2.350,00, entre Dezembro de 2007 e Julho de 2009.
29. Através da conta do BBVA, entre 1992 e 2010, a Ré pagou despesas do agregado familiar com mobiliário, decoração, empregados, arrendamentos de casas de férias e outros encargos correntes, no valor global de €295,901,25, dos quais, €71.782,93 se destinaram a pagar, entre 1994-2000 e 2007-2010, encargos mensais com empregadas domésticas – item que implicou um custo médio mensal não inferior a €500,00-; consumos de electricidade- item que implicou um custo médio mensal não inferior a €100,00 -; colégio do filho comum(nascido em 1995) - item que implicou um custo médio mensal não inferior a €400,00 -; alimentação - item que implicou um custo médio mensal não inferior a €500,00 -; e renda de casa - item que implicou um custo médio mensal não inferior a €600,00.
30. O empréstimo no valor de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), fora concedido a pensar na compra de duas garagens, cada uma no valor de € 37.500,00.
31. O Autor suportava as rendas de casa da filha fruto de casamento anterior.
32. A aquisição do automóvel BMW 650 i foi adquirido pelo Autor em 2008 com recurso a leasing contraído junto do BPI, cujo vencimento ocorreu em 14.04.11.
33. Em 1993, a Ré vendeu um apartamento do Autor e abdicou da sua comissão de €1.646,00.
34. O Autor nunca foi chamado ao pagamento do empréstimo para aquisição da fracção identificada em 2., a título de fiador, posto que a conta da qual as prestações eram debitadas teve sempre cobertura.
**
35. O Autor pagou as despesas com o casamento da filha da Ré, MTe…, através da emissão de um chegue no montante de € 3.750.00 registado com o n.º 6305 e descontado no extracto do mesmo documento na data 10.12 - depositado pela Ré na sua conta do BBVA no mesmo dia –; e de um outro o cheque registado com o n.º … no montante de € 10.000.00 descontado no mesmo extracto na data de 10.28 referente ao primeiro reembolso que o Autor fez à sociedade (Engexpor) que adiantou o pagamento do jantar.
36. Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA de transferências para a mesma conta e pelo creditar nesta da totalidade do reembolso do IRS concretizado em 2007, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 70.008,44, entre 2003 e 2010 (entre 2003 e 2007, tal valor fixou-se em 52.358,44 €) [12]*.
37. DM… era, por herança pela morte do seu pai, o senhorio da casa que o agregado familiar arrendou na Rua …, quando pela primeira vez, Autor e Ré, decidiram sair da fracção da Rua … para uma casa maior e com estacionamento para os carros, no início de 2001.
38. Em 2005, o senhorio (DM…) informou o Autor e a Ré que tinha decidido mudar todos os seus negócios para Espanha e tinha por isso decidido também a vender alguns activos que tinha em Portugal e consultou o Autor e a Ré sobre o seu interesse em comprar a casa por um preço que, necessariamente indexado à renda que recebia, era naturalmente abaixo do provável valor de mercado da casa.
39. No âmbito dessas negociações ficou acordado que a Ré trataria, porque era a sua actividade, de promover a venda da casa no mercado e que o valor obtido, naquilo que excedesse o valor que o senhorio tinha proposto à Ré e ao Autor para lhe comprarem a casa, fosse dividido em duas partes iguais, 50% para o senhorio e 50% para os inquilinos, nas pessoas do Autor e da Ré.
40. A casa foi vendida por mais € 422.250,00 do que inicialmente proposto ao Autor e Ré.
41. Assim, € 211.125,00 foram para o senhorio, que no próprio dia em que recebeu o dinheiro da venda perguntou ao Autor como queria fazer com os € 211.125.00.
42. O Autor informou o ex senhorio que deveria depositar esse valor, dividido em duas partes iguais, nas contas do Autor (BCP) e da Ré (BBVA).
43. O montante de € 12.500 proveniente do filho da Ré (M…) resultou do reembolso que o mesmo tinha que fazer ao Autor no âmbito de um adiantamento daquela quantia feita àquele pelo último.
44. Relativamente a um veículo Smart, o valor de € 6.900,00 depositado em 17.09.07 na conta do BCP em 17.09.07, resulta de uma decisão tomada pelo Autor e pela Ré quando a última recebeu da seguradora a indemnização por perda total do veículo (acidentado) da sua filha Ma….
45. Nessa data – 17.09.07 -, a Ré tinha a sua conta do BBVA com um saldo na ordem de cerca de duzentos euros, incrementado logo a seguir com o valor da totalidade de reembolso de IRS - € 5.533,44, resultante da declaração conjunta apresentada.
46. Por essa razão, a Ré pediu ao Autor que a ajudasse a completar o dinheiro necessário para comprar um novo carro para uso da filha M….
47. Duas possibilidades se puseram relativamente ao destino a dar ao dinheiro do seguro (indemnização):
1) entregava-se os € 6.900,00 ao stand e pagava-se o restante em modalidade a acordar, ou
2) a Ré entregava esse dinheiro ao Autor e este celebrava um contrato de leasing no valor global do carro novo.
48. Feitas as contas, o Autor optou pela segunda hipótese e depositaram-se os € 6.900,00 na conta do BCP mas, em contrapartida, foi pago um leasing no total de €10.200,00.
49. Assim, o Autor suportou, na aquisição de um novo Smart de Matricula …-EB-…, para a filha da Ré (Ma…) mais €3.300,00 além do dinheiro recebido da Seguradora, a título de indemnização.
50. Relativamente aos montantes de €10.500,00 e de €24.704,66 a que se reporta o , os mesmos resultaram da venda de carrinhas Audi que eram os carros familiares que o Autor pagou directamente ou através das empresas de grupo de que era sócio.
51. O que sucedia era que, no final dos planos de financiamento (leasing), os automóveis eram registados em nome da Ré.
52. Os depósitos de €1.500.00 e €6.000.00 da filha da Ré (Mt…) constituíram o pagamento de uma divida de €7.500.00 que a mesma – Mt… – e o seu marido, NT…, tinham para com o Autor.
53. Aqueles pediram ao Autor o dinheiro numa altura de aflição da empresa que geriam com o compromisso de o pagarem no espaço de um ou dois meses sendo, no entanto, que MTe… e o marido demoram praticamente um ano a devolver o dinheiro ao Autor.
54. O Autor e a Ré concordaram, em determinada altura, mudar de casa porque a família, com os três filhos da R. a ficarem adultos e o filho comum ainda criança mas a crescer, começou a ter outras exigências de espaço e porque queriam ter um ou dois lugares para os 4 carros que já existiam na família.
55. Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP (identificada em 5), ascendeu a o valor de €207.789,00 e as rendas suportadas em idêntico período, debitadas na mesma conta, ascendeu ao montante de €265.236,00 [13] *.
56. A partir de Janeiro de 2012, o Autor parou de provisionar a conta referida no art.º 17º da petição inicial, sendo que a conta bancária não tem – actualmente – praticamente nenhum movimento além das prestações da fracção da Rua …, da garagem e do Seguro de Saúde da Ré e do filho de ambos, tendo o A. aberto uma nova conta bancária, no mesmo banco, de onde, ainda hoje, providencia esses suprimentos.
57. No mês de Julho de 2007, no que respeita a manutenção de casa de férias, o A. suportou o vencimento da empregada doméstica PM… - €261,00; do jardineiro - €325,00; no mês de Setembro de 2007, suportou o de PM… - €216,00 -,e do caseiro, JD… - €592,00; em Outubro Novembro e Dezembro 2007, novamente o do caseiro – respectivamente, €374,00; €722,00; €640,00; e para o jardineiro €500,00.
58. Relativamente à moradia de férias de Montemor, o Autor suportou os seguintes valores: em 04.11.03, €4.936,00; 05.05.04, €4.904,55; em 11.08 €4.489,18; 11.10 €444,21; e em 24.02 €358,79.
59. Nos meses de Maio a Outubro de 2007, entre outros, o Autor suportou despesas de alimentação mensais oscilantes entre cerca de €400,00 e €1.000,00, através do cartão de crédito associado à conta do BCP.
60. Quando o agregado familiar voltou a viver na Rua …, em 2009, ficou acertado que aquela garagem ficaria para a Ré utilizar e que para o Autor, que tinha um carro de grandes dimensões, se procuraria uma solução com o recurso a um arrendamento vindo, nesta sequência, a ser arrendada uma garagem na Rua …, que o Autor usou e pagou enquanto habitou na fracção da Rua …, e que chegou igualmente a servir para o filho da R. guardar a sua motorizada.
61. A Engexpor é uma sociedade da qual o Autor era sócio na altura, juntamente com outras três pessoas.
62. Todos os adiantamentos que a Engexpor fazia aos seus sócios eram objecto de acerto de contas no final de cada ano, obrigando os sócios que tivessem beneficiado desses adiantamentos às respectivas devoluções, caso às mesmas houvesse lugar.
63. As viagens de avião (para 6 pessoas) rumo ao Funchal, no fim de ano de 2009, foram adiantadas pela empresa Engexpor, tendo o Autor suportado, durante a estadia, a festa do Fim do Ano no Hotel 4 Views Baia, bem como os extras Hotel Royal Savoy, com os valores de €900,00 e de €229,86, bem como outros encargos, de valor global não inferior a €300,00.
64. Em Julho de 2009, a Ré deu uma contribuição para arrendar, na Quinta do Lago, a casa de férias no Algarve nesse ano, tendo, contudo, o Autor suportado €9.415,00.
65. O Autor suportou igualmente as despesas com as férias na neve para grupos que chegaram a ser de nove pessoas, entre 2006 e 2009, nos valores de € 7.417,85; € 4.021,46 e € 2.902,85.
66. O Autor suportou os custos de obras feitas no apartamento da Rua … em 2009, no valor global de cerca de €63.000,00.
67. O Autor pagou médicos e despesas de saúde bem como o colégio do filho de ambos, mais provisionando a conta do BCP, pelo menos, até 2012 – salvo nos meses em que a Ré o fez, até 2010, pedindo apenas algumas das correspondentes facturas à R.
68. O Autor suportou ainda um seguro de saúde para a Ré e para o filho de ambos através da conta solidária que ainda se mantém no BCP e que foi provisionando à medida dos compromissos que se mantiveram indexadas a essa conta (empréstimo da fracção, empréstimo da garagem, seguros dos empréstimos e seguros de saúde da R. e do filho comum).
69. O Autor suportou despesas de electricidade, gás, água e telefone salvo nos meses em que a Ré o fez.
70. A partir da altura em que a Ré passou a ter um cartão de crédito da conta solidária do BCP, as compras de supermercado começaram a ser pagas pela Ré também por essa via.
71. O que a R. continuou a fazer até cerca de dois anos após a separação.
72. Em 2010, o Autor foi confrontado com facturas por liquidar emitidas à Ré, que esta não pagou e que vieram a ser pagas pelo primeiro.
-----------------
Na mesma sentença, foram considerados NÃO PROVADOS os seguintes factos (consta a rectificação de alguns lapsos de redacção ; estão devidamente identificados, com * os factos impugnados ; nos casos em que ocorreu alteração da matéria de facto, consta em nota de rodapé o facto correspondente na sua redacção original):
1. Foi sempre o Autor quem procedeu ao pagamento das prestações a que se reportam os pontos 5 e 8 dos Factos Provados, com dinheiro seu *.
2. A garagem a que se reporta o ponto 6 dos Factos Provados foi adquirida pelo Autor e pela Ré.
3. O remanescente do empréstimo contraído em 2008 foi utilizado para reforço do orçamento familiar, nomeadamente, para pagamento de despesas extraordinárias como foram férias de Inverno da neve e férias de Verão no Algarve.
4. Apesar dos filhos da Ré serem maiores e não serem filhos do Autor, foi sempre o último que, só por si, as suportou para a família toda.
5. Enquanto viveu com o Autor, a Ré nunca obteve qualquer rendimento regular pelo que foi sempre o Autor quem suportou todas as despesas com os empréstimos supra referidos, bem como com a quase totalidade dos encargos decorrentes da convivência em união de facto, com o filho de ambos bem como com os três filhos de dois casamentos anteriores da Ré.
6. Apesar de a conta do BCP ser solidária, nunca a R. a movimentou a crédito, ou seja, nunca depositou ou transferiu para a mesma conta qualquer montante.
**
7. Não obstante ser solidária, a conta do BBVA apenas era movimentada pela R., sendo a única a creditar dinheiro na mesma, para pagamento dos encargos familiares.
8. A R. suportava sozinha todas as despesas relativas aos seus filhos, nomeadamente Colégios, Faculdade e outras despesas destes.
9. Quando recebeu a aludida indemnização do BCI, a R. transferiu para a conta solidária do BCP dois milhões e quinhentos mil escudos.
10.Por conta da Ré, foram depositados na c.c. do BCP os seguintes valores:
- € 12.500,00 em 10.01.2008 de conta bancária do filho da R., MM…;
- € 6.900,00 em 17.09.2007 pela seguradora Ocidental referente a indemnização por perda total do carro, propriedade da Ré, de marca Smart com a matricula …-…-RH;
- € 10.500,00 em 26 de Setembro de 2003, relativos à venda de um carro Audi A4, propriedade da Ré a DA…;
- € 1.500,00 em 22.12.2003 de conta bancária da filha da R., MMa…;
- € 6.000,00 em 22.12.2003 de conta bancária da filha da R., MMa…;
- € 24.704,66 (4.952.840$00) em 25.02.2000, referente à venda de um carro de marca Audi, propriedade da Ré, a RM….
11. Era a R. quem pagava, através da sua conta no BBVA, supra identificada, todas as despesas com mobiliário, decoração, empregada, arrendamentos das casas de férias em Azeitão e Montemor.
12. A garagem identificada no ponto 8 dos Factos Provados era utilizada essencialmente pelo A., para estacionamento do seu carro, sendo que a R. praticamente não a utiliza pois, atentos os seus problemas de saúde, nomeadamente respiratórios, tem muita dificuldade em subir a pé a rua que vai desde a garagem até à sua habitação.
13. A diferença de € 1.125,00 entre o valor da garagem pago e o montante peticionado ao Banco corresponde à comissão da R. no negócio e que a mesma deixou creditada na conta solidária do BCP.
14. A. e Ré faziam acerto de contas muitas vezes, directamente, até à separação de ambos, em Outubro de 2010.
15. Quando foi viver com a R., o A. apenas levou consigo a sua roupa e um elevado acumular de dívidas que foi a R., com a sua actividade, que ajudou a liquidar.
*
16. Eliminado [14] *.
17. Nunca o Autor utilizou a garagem adquirida pela Ré nem teve chave nem qualquer meio de acesso à mesma.
**
B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
I) Da REAPRECIAÇÃO da PROVA GRAVADA decorrente da impugnação da matéria de facto
Prevendo acerca da modificabilidade da decisão de facto, consagra o artigo 662º do Cód. de Processo Civil os poderes vinculados da Relação, estatuindo que:
“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados”.
Para que tal conhecimento se consuma, deve previamente o recorrente/apelante, que impugne a decisão relativa à matéria de facto, cumprir o ónus a seu cargo, plasmado no artigo 640º do mesmo diploma, o qual dispõe que:
“1 -Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
No caso sub judice, o Recorrente/Apelante deu cumprimento ao preceituado no supra referido artigo 640º do Cód. de Processo Civil, inclusive no que concerne à parte referente á prova constante de registo ou gravação (fundamentalmente no que concerne à prova por declarações de parte do Autor), pelo que o presente Tribunal pode proceder à sua reapreciação, uma vez que dispõe dos elementos de prova que serviram de base à decisão sobre o(s) facto(s) em causa.
Não se desconhece que “para negar a admissibilidade da modificação da decisão da matéria de facto, designadamente quando esta seja sustentada em meios de prova gravados, não pode servir de justificação o mero facto de existirem elementos não verbalizados (gestos, hesitações, posturas no depoimento, etc.) insusceptíveis de serem recolhidos pela gravação áudio ou vídeo. Também não encontra justificação a invocação, como factor impeditivo da reapreciação da prova oralmente produzida e da eventual modificação da decisão da matéria de facto, da necessidade de respeitar o princípio da livre apreciação pelo qual o tribunal de 1ª instância se guiou ou sequer as dificuldades de reapreciação de provas gravadas em face da falta de imediação”.
Pelo que, poderá e deverá a Relação “modificar a decisão da matéria de facto se e quando puder extrair dos meios de prova, com ponderação de todas as circunstâncias e sem ocultar também a livre apreciação da prova, um resultado diferente que seja racionalmente sustentado” [15].
Reconhece-se que o registo dos depoimentos, seja áudio ou vídeo, “nem sempre consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal a quo. Como a experiência o demonstra frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, sendo que a mera gravação dos depoimentos não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que porventura influenciaram o juiz da 1ª instância.
Na verdade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador”.
Efectivamente, e esta é uma fragilidade que urge assumir e reconhecer, “o sistema não garante de forma tão perfeita quanto a que é possível na 1ª instância a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e de onde é legítimo aos tribunais retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”.
Todavia, tais dificuldades não devem justificar, por si só, a recusa da actividade judicativa conducente à reapreciação dos meios de prova, ainda que tais circunstâncias ou fragilidades devam ser necessariamente “ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados[16] (sublinhado nosso).
Vejamos.
- facto provado 9.2
Redacção consignada:
A última prestação do mútuo datado de 10.07.08 foi debitada em 06.04.16, tendo, até essa data, sido pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros” ;
Redacção proposta:
“Relativamente ao mútuo datado de 10.07.08 e com terminus a 30 de Maio de 2024, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros por referência à data de 06.04.16”.               
Alega o Apelante que a prova produzida não poderia conduzir à redacção consignada, pois, conforme resulta do contrato de mútuo referenciado, o mesmo só terminará em Maio de 2024, tendo sido celebrado pelo prazo de 190 meses, computados desde Julho de 2008.
O que foi, acrescenta, igualmente referenciado na liquidação adicional efectuada, por requerimento de 08/09/2017, e resulta, ainda, do documento ora junto com as alegações, traduzido no detalhe de tal mútuo – cf., artigos 60 a 70 do corpo alegacional e Conclusões H) a J).
Em sede de resposta, a Apelada nada aduziu relativamente a tal pretensão.
Decidindo:
Parece inquestionável a razão do Apelante.
Efectivamente, conforme resulta do contrato de mútuo com hipoteca outorgado em 10/07/2008, e respectivo documento complementar (cf., fls. 491 a 500), aquele foi celebrado pelo prazo de 190 meses, a contar do dia 30 de Julho de 2008, sendo “amortizado em cento e noventa prestações mensais, de capital e juros, a primeira com vencimento no mesmo dia do mês seguinte e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.
Ora, 190 meses corresponde a 15 anos e 10 meses, pelo que, tendo-se iniciado a sua amortização em Agosto de 2008, o mesmo nunca poderia ter terminado em 2016, antes se prolongando até ao ano de 2024.
O que é reforçado pelo teor do documento junto em sede alegacional (cf., fls. 2170), do qual consta, claramente, que o terminus de tal crédito hipotecário ocorre em 30/05/2024.
Donde, sem ulteriores delongas, no deferimento da impugnação apresentada, o facto provado 9.2, passa a ter a seguinte redacção:
 “Relativamente ao mútuo datado de 10.07.08, com terminus a 30 de Maio de 2024, por referência à data de 06.04.16, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros”.
- facto provado 27, alíneas a) e f)
Redacção consignada:
A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a)-€279.939,89 (cinquenta e seis milhões de escudos) em 11.01.94 ;
b)€1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;
c)- €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;
d)-€25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;
e)-€9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95; e
f)- €24.939,89 (cinquenta milhões de escudos) em 11.01.94” ;
Redacção proposta:
Idêntica redacção, com supressão das alíneas a) e f).
Referencia o Recorrente não se vislumbrar “como foi provado o depósito da quantia de €279.939,89 referida na alínea a) deste facto provado”, pois “em lado algum da contestação a Ré faz alusão a este depósito, nem o mesmo vem referido em qualquer articulado junto aos autos”.
Acrescenta que a Ré “apenas faz alusão ao mesmo num requerimento que juntou a 23/06/2014, alegadamente como prova de créditos feitos pela Ré na conta BCP (alínea iii) daquele requerimento”, o qual “foi apresentado sete dias antes da data marcada para a audiência de julgamento (sessão marcada para 01/07/2014) e como tal intempestivo”.
Refere, ainda, que “por despacho de 27/06/14 a Meritíssima Juíza adiou aquela sessão de julgamento e determinou que o Autor se pronunciasse sobre o requerimento apresentado”, sendo que por “requerimento de 10/07/2014 veio o Autor solicitar mais tempo para se poder pronunciar com mais pormenor e esclarecimento sobre os inúmeros documentos apresentados, todos eles supostamente com mais de 10 anos, não deixando contudo de impugnar nos seus pontos 10 e 11, não só todos os documentos apresentados como “todas as causas e origens descritas pela R. dos movimentos financeiros neles expressos, bem como as conclusões que a R. retira dos mesmos””.
Acresce que “nenhuma das testemunhas ouvidas em tribunal, nem tão-pouco a Ré nas suas declarações de parte, mencionou este crédito e, por maioria de razão, justificou o mesmo”.
Por outro lado, “observado o documento de duas folhas que a Ré juntou no referido requerimento para justificar o crédito na conta BCP (doc. 3 do referido requerimento) constata-se que a primeira folha é um extracto bancário da referida conta, onde consta um movimento a crédito (em escudos), sem que na descrição do mesmo resulte qualquer menção à Ré, além de que o movimento está datado de 09/02/1994 e, como tal, numa data em que não ficou provado sequer que o Autor e a Ré viviam já em união de facto (cfr. nº 1 dos factos julgados provados).
Por outro lado, a segunda folha é um “canhoto” da conta do Autor onde se constata um lançamento com o nome “T…” de 200.000$00 a débito dessa conta (basta seguir as alterações ao saldo para assim se concluir) e o um lançamento feito abaixo, entre o lançamento “T…” o lançamento “Zé N. ???”, no montante de 56.000.000$00, cuja descrição ou justificação não vem mencionada”.
Refere, assim, que apesar do “crédito não ter sido alegado na Contestação (facto que sempre seria de considerar estranhíssimo face ao elevado montante do mesmo), do mesmo ter sido impugnado pelo Autor, de ninguém ser ter pronunciado sobre aquele crédito e/ou justificado o mesmo e dos documentos apresentado nada provarem”, ainda assim o tribunal atribui à Ré o crédito na conta do BCP.
Assinale-se, ainda, o “lapso da sentença no que respeita à data que atribui a este crédito – 11/01/94 – (arrastado talvez pelo erro da Ré no seu requerimento), quando resulta do extracto bancário que o movimento é de 09/02/94)”.
Tal situação ocorre, “mutatis mutandis quanto ao suposto movimento a crédito na conta do BCP pela Ré referido na alínea f), no montante de € 24.939,89 (que na sentença, certamente por lapso, se descreve como cinquenta milhões de escudos???)”, o qual, tal como o antecedente, “não vem alegado em lado algum da Contestação”, a “Ré apenas faz alusão ao mesmo num requerimento que juntou a 23/06/2014, alegadamente como prova de créditos feitos pela Ré na conta BCP (alínea ii) daquele requerimento)”, tendo-o o Autor impugnado “nos pontos 10 e 11 do seu requerimento de 10/07/2014”.
Acrescenta que, tal “como o anterior, nenhuma das testemunhas ouvidas em tribunal, nem tão-pouco a Ré nas suas declarações de parte, mencionou este crédito e, por maioria de razão, justificou o mesmo”, a que acresce que observado “o documento de duas folhas que a Ré juntou no referido requerimento para justificar o crédito na conta BCP (doc. 2 do referido requerimento) constata-se que a primeira é um “canhoto” da conta BCP, com um lançamento a crédito manuscrito pelo Autor de €24.939,89 (em escudos: 5.000.000$00) com a descrição “Casa Venda Sinal” o qual, como facilmente se percebe, não faz qualquer menção à Ré. A segunda folha é um talão de depósito na conta BCP, naquele montante, com um movimento a crédito com origem numa conta do Barclays, sem, igualmente qualquer menção à Ré (veja-se que a conta da Ré referida nos autos nem sequer é deste banco mas sim do BBVA”.
Tal como o antecedente, “pese embora também este crédito não ter sido alegado na Contestação (facto que sempre seria de considerar estranhíssimo face ao elevado montante do mesmo), do mesmo ter sido impugnado pelo Autor, de ninguém ser ter pronunciado sobre aquele crédito e/ou justificado o mesmo e dos documentos apresentado nada provarem, ainda assim o tribunal atribui à Ré o crédito na conta do BCP”.
Por fim, enuncia não poder deixar ainda de referir que “tanto o suposto primeiro crédito datado de 09.02.94, como o segundo, 11.01.94”, referem-se a datas em que nem sequer se provou que Autor e Ré viviam já em união de facto, pelo que a resposta ao facto nº. 27 deve ser alterada, ficando com a seguinte redacção:
 “A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a) €1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;
b) €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;
c) €25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;
d) €9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95” - cf., artigos 73 a 96 do corpo alegacional e Conclusões K) e L).
Na resposta apresentada, invoca a Recorrida inexistir fundamento para a requerida alteração da matéria de facto, pois, desde logo, porque nem sequer o Apelante “demonstra em que meios de prova assenta a referida alteração da prova e porque os documentos são claros a suportar o facto provado tal como consta do artigo 27”.
Seguidamente, após citar a fundamentação aduzida pelo Tribunal a quo, conclui que nem o Recorrente alega nem existe qualquer meio probatório que contrarie o ponto 27, pelo que deve o mesmo manter-se - cf., artigos 16 a 18 do corpo alegacional e Conclusão 5.
Na sentença apelada a fundamentação/motivação da resposta dada ao presente ponto factual foi efectuada em conjunto com a fundamentação/motivação exposta relativamente aos factos 27.1 e 27.2.
Com relevo para o ponto ora questionado, fez-se constar o seguinte:
Reportam-se aos art.s 33º e 38º da Contestação e relaciona-se com a proveniência dos depósitos ali mencionados. Embora não tenha sido expressamente levado aos temas da prova, a sua pertinência, neste âmbito, decorre da inserção do artigo 5º da P.I. nos Temas da Prova, de harmonia com as regras do ónus probatório. Não restam, pois, dúvidas de que este constituiu um dos aspectos críticos da prova produzida ora a apreciar.
Os depósitos elencados defluem sem esforço do cruzamento dos extractos do BCP com os talões de depósitos e contas correntes relativos às indicadas datas (documentos 1 a 9 e 17 juntos com o Requerimento de Junho de 2014, a fls 1095 e seguintes, volume VI). De resto, a verdade é que o Autor os admite na Réplica (alega desconhecer mas tratam-se de factos de que deveria ter conhecimento pessoal; v. art. 574º, nº3, do C.P.C.), contrariando expressamente, sobretudo, a respectiva relevância para o que ora se discute em virtude de remontarem a data anterior ao primeiro mútuo em questão.
(…)
Tratando-se de matéria de excepção (posto que o A. demonstrou que movimentava a conta do BCP a crédito sozinho, por regra, e que desta conta, onde recebia rendimentos, eram pagas as prestações), o ónus probatório recaiu sobre a Ré”.
Decidindo:
As alíneas ora questionadas, relativamente ao facto 27, reportam-se a alegados, e julgados provados, depósitos efectuados pela Ré na conta solidária do BCP, nos valores, respectivamente, de 279.939,89 € (correspondente a cinquenta e seis milhões de escudos) e de 24.939,89 € (correspondente a cinco milhões de escudos, e não cinquenta milhões, conforme consta, por lapso, no facto provado).
Efectivamente, conforme bem refere o Recorrente, tais alegados depósitos não foram invocados pela Ré em sede de contestação, nomeadamente nos referenciados artigos 33º e 38º deste articulado, mencionados na fundamentação aposta na sentença apelada. Nem consta a referência àqueles em qualquer outro ponto da mesma peça processual.
Pelo que, e desde logo, a sua aduzida admissibilidade pelo Autor na réplica, por invocação do nº. 3, do artº. 574º, do Cód. de Processo Civil, invocada na mesma motivação, nunca os poderia abranger.
Com efeito, tais aludidos depósitos constam do requerimento apresentado pela Ré em 23/06/2014, tendo sido efectivamente impugnados pelo Autor nos termos expostos, no requerimento apresentado em 10/07/2014.
Ora, atenta a relevância dos valores em equação, tem que corroborar-se a aduzida estranheza da omissão da sua invocação em sede de contestação, quando, concomitantemente, foram alegados outros valores depositados de muito menor relevância, de forma expressa e detalhada.
Analisado o teor da prova enformadora de tais depósitos, nos termos feitos constar na motivação da sentença recorrida, não podemos deixar de reconhecer pertinência na impugnação apresentada.
Efectivamente, no que concerne ao alegado depósito no valor de 56.000.000$00 (279.939,89 €), referenciado sob o ponto iii) daquele requerimento, datado de 09/02/1994 (e não de 11/01/1994, conforme ali consta), a prova documental que alegadamente o consubstancia traduz-se no doc. nº. 3, constante de fls. 1099 e 1100.
A primeira folha traduz-se no extracto combinado de tal conta bancária (nº. 2 de 1994), do qual consta tal depósito a crédito, tendo por data de movimento o dia 09/02/1994 e como data de valor o dia 10/02/1994.
A segunda folha traduz-se à anotação da conta corrente de tal conta (o aludido canhoto da conta do Autor), constando entrelinhado entre a anotação da emissão de dois cheques (nºs. … e …), a referência a “+ 56.000.000$00”, sem menção da proveniência de tal quantia ou valor. Do cheque nº. … consta a referência a “T…”, que será a ora Ré, e ao valor de 200.000$00 que, conforme cálculos que efectuámos na decorrência dos valores anotados, reporta-se a cheque emitido à ordem da mesma. Cheque que, conforme consta da primeira folha, foi debitado na mesma conta em 17/02/1994. Relativamente ao cheque nº. …, consta a referência “Z…”, seguido de uma outra palavra não descortinável, tendo sido o mesmo objecto de débito na mesma conta em 17/02/1994.
Outrossim, no que se reporta ao alegado depósito de 5.000.000$00, datado de 11/01/1994, a situação possui alguma semelhança argumentativa.
Efectivamente, tal depósito, identificado no ponto ii) do requerimento apresentado, é alegadamente consubstanciado no teor do documento nº. 2 junto.
Este documento, constante de fls. 1096 a 1098 (melhor visualizado através da plataforma Citius), contém na primeira folha o extracto combinado de tal conta bancária (nº. 1 de 1994), do qual consta tal depósito a crédito, tendo por data de movimento o dia 11/01/1994 e como data de valor o dia 12/01/1994, aí se fazendo menção apenas a “depósito valores”.  
A segunda folha é constituída pela aludida conta corrente da mesma conta bancária (o mencionado canhoto da conta do Autor), aí constando anotado tal valor, sob a menção “casa venda sinal”, sem qualquer outra menção, nomeadamente à ora Ré.
Por fim, a terceira folha, constituída por cópia do talão de depósito daquele valor, nessa mesma conta do BCP, não permite fazer qualquer correspondência à Ré, nomeadamente que tal valor tivesse origem na conta bancária desta titulada no BBV, antes sendo feita referência a distinta instituição bancária. Nomeadamente, tal talão de depósito, assinado pelo Autor como titular da conta, datado de 11/01/1994, reporta-se ao depósito de um cheque sacado sobre o Barclays, por referência à conta nº. …, sem qualquer coincidência com a conta bancária do BBVA, movimentada pela Ré. 
Na fundamentação/motivação apresentada, e por referência aos factos ora em equação, nenhuma outra prova é invocada, pois a demais prova documental aí consignada nenhuma atinência possui com aqueles. Exemplificativamente, o aludido documento 17, constante de fls. 1166 e segs., traduzido em movimentos da conta corrente da conta bancária do BBV (Banco Bilbao Vizcaya), movimentada pela Ré, e objecto de anotação por esta, inicia a referência a tais movimentos em 21/02/1994, ou seja, em data posterior aos movimentos de depósito ora em equação.
Deste modo, cremos que tal factualidade dada como provada não assenta em meios probatórios suficientemente consistentes ou fundados, atenta a equivocidade destes e fundamentalmente a ausência de qualquer clara ou inquestionável vinculação dos mesmos à Ré, ou seja, que tais valores depositados na conta bancária do BCP tivessem por origem quantias por aquela disponibilizadas.
Ademais, tais documentos, já juntos numa fase processual tardia, foram devidamente impugnados pelo Autor, sem que sobre os mesmos exista notícia de ter sido efectivada qualquer actividade probatória ulterior, cuja menção as partes, nomeadamente a Apelada, omite totalmente, limitando-se a aludir a uma alegada clareza dos documentos invocados na fundamentação (que já concluímos não existir) e à inexistência de meios probatórios que contrariem tal ponto factual.
Todavia, tal alegação da Apelada parece padecer de um nítido erro de raciocínio, pois não está em equação a aferição acerca da existência de meios probatórios capazes de questionar ou contrariar o facto julgado provado, mas antes ajuizar se este tem fundamento ou substracto probatório, tendo em atenção que o ónus da sua prova positiva onerava a Ré.
Por outro lado, no que concerne ao aludido valor de 56.000.000$00, caso o mesmo proviesse de depósito efectuado pela Ré (o que já vimos não possuir sustento probatório), ficaria ainda por entender o motivo pelo qual, em data muito próxima, o Autor emitiu um cheque, alegadamente entregue à mesma e descontado em 17/02/1994, pois o mais natural seria, logicamente, uma eventual compensação de valores, e não a prática de uma duplicidade de actos.  
Para além do exposto, não podemos, ainda, deixar de reiterar a impressividade decorrente da omissão de tais depósitos em sede de contestação. Efectivamente, estando-se perante valores assaz relevantes, sendo inclusive um deles (de muito longe) o de maior valor dos alegadamente depositados, não é entendível ou razoável a sua omissão quando, em sede contestação – cf., artigos 33º a 38º -, a Ré procede à elencagem dos depósitos alegadamente efectuados, ao longo dos anos, na conta solidária do BCP.
Por todo o exposto, a impugnação apresentada não pode deixar de proceder, determinando a alteração do ponto de facto 27, suprimindo-se as aludidas alíneas a) e f), passando o mesmo a figurar com a seguinte redacção:
A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a) €1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;  
b) €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;  
c) €25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;  
d) €9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95”.
- do aditamento de um novo facto provado, a figurar sob o nº. 27.3
Redacção proposta:
“O Autor, após ter sido depositado o empréstimo bancário na conta BCP, pagou à Ré a quantia correspondente a 37.500,00 €, por conta do reembolso dos adiantamentos realizados pela mesma relativamente ao pagamento antecipado do preço de aquisição do imóvel na Rua …”.
Prosseguindo o excurso de impugnação da matéria de facto, aduz ainda o Recorrente que, conforme facto 27.2, foi dado como provado que “a R. pagou ao anterior proprietário da fracção da R. … o montante de €7.481,96 através da sua conta pessoal do BBVA”, correspondendo tal ao alegado pela Ré no artº 38º da contestação.
Acrescenta que tal facto foi impugnado no artº. 98º da réplica, onde afirmou ser falso “e por isso impugna-se que a Ré tenha suportado o montante referido no artº 38º da Contestação. O Autor creditou valores muito superiores àquela quantia, na conta da Ré, (BBVA) cfr. doc 2 da petição inicial e doc. 10 ora junto”, acrescentando não ter impugnado “expressamente o pagamento realizado pela Ré ao anterior proprietário do apartamento da Rua … (razão pelo que não se questiona o julgamento do tribunal relativo a este facto), mas impugna o efeito/conclusão que do mesmo pagamento se poderia retirar (e o tribunal retirou) de que a Ré suportou parte do preço do daquele apartamento”.
Efectivamente, aduz, tal impugnação teve por base o doc. 10 junto com a réplica, traduzido em “cópia de um cheque sacado sob a conta BCP, por si titulada conforme se constata do mesmo, no montante de 7.500.000$00 (correspondente a € 37.500,00), com data de 19/10/1996, à ordem da Ré”, o qual não foi impugnado pela Ré, nem o questionou nas declarações de parte prestadas.
Seguidamente, transcreve a parte das suas declarações de parte em que se aludiu ao mesmo, com o seguinte teor:
“(sessão de 04/03/2016 – declarações de parte do Autor – Início: 15:03:01 horas):
Adv. Quando chegaram à altura da escritura a casa já estava paga. Estava paga por quem? (00:33:21)
Autor: Quer dizer, veja bem a T… passou estes cheques, se estes cheques são da T… 7 mil, a casa custou 25 mil, imagine quem pagou o resto.
… um dos primeiros cheques que eu passei quando o dinheiro foi depositado na conta foi um cheque à T… de 37.500 euros em que lhe disse toma lá o cheque de 37500 euros que paga os abonos que você fez para pagar a casa.
Esse cheque lamentavelmente não vem na contestação. (00:33,21)
Autor: Vem só aquilo que entregou, não vem aquilo que recebeu. (00:33:45)
Adv: Gostava de confrontar a testemunha com o doc. 10 da Réplica (00:34:10)
Autor: Deixe-me só acabar Sr. Dr. Para não o cansar. Se estes 3 valores são depósitos da T… e eu mais uma vez admito que sim. Tenham sido depósitos na minha conta para se avançar dinheiro ao Sr. (…) que nos vendeu a casa, se isso se confirmar até há aqui uma certa lógica nisto tudo. É que o que cheque de 37.500 euros, arredondado para cima, pq eu quando pagava contas à T… arredondava sempre para cima... são 37.500 euros, é exactamente o total...
Adv: Mas que cheque é esse?
Autor: … eu sei que esse cheque se meteu na réplica
Adv.: a testemunha pode então ser confrontada com o doc 10?

Adv: Então veja lá a data desse cheque. (00:35:55)
Autor: a data é Outubro de 1996
Adv.: este cheque, o que é precisamente este cheque? (00:36:42)
Autor: este cheque é a devolução do dinheiro adiantado para a casa arredondado para cima

Adv.: Ó Sr. Eng quando ao bocado se referiu… Agosto de 95, o dinheiro terá sido parte da contribuição para o sinal da casa da Sr. D. T… mas disse que o dinheiro que foi pago por ela, depois o senhor, logo que recebeu pagou-lhe através daquele cheque? (00:41:20);
Autor: Há aqui uma coincidência que não é despicienda, coincidência a tomar em conta que estes 3 montantes que são depósitos feitos pela T…… eu no dia a seguir a receber do banco passei- lhe um cheque exactamente neste montante arredondado para cima;
Juíza: Mas por quê? se viviam… viviam em economia comum;
Autor: Porque a casa era suposto que era eu que a pagava, porque tinha condições para pagar a casa e ela não, … e de tal maneira assumi isso que o dinheiro que ela pôs agarrei no cheque e devolvi-lhe no dia seguinte a ter... e ela aceitou. Podia não ter aceite.

Juíza: Já agora porque é que fizeram o empréstimo, a casa já estava paga? (00:44:03)
Autor: O Srª Drª, porque eu fiquei empenhado… eu não tinha na altura dinheiro para comprar a casa. Tinha algum mas não tinha todo. Tinha feito as obras, tinha pago as obras. Eu para pagar esta casa tive de pagar a amigos meus a juros e na altura os juros não eram tão baixo como isso. Esteve aqui uma testemunha hoje de manhã que na altura me emprestou 7.500 contos para eu pagar a casa... e quem diz este, diz outros amigos meus que me emprestaram... a irmão da T… emprestou-me dinheiro a juros que paguei religiosamente. Não tinha o dinheiro todo para pagar a casa”.
Desta forma, acrescenta, explicitou e justificou a entrega de tal cheque, afirmando que “visava reembolsar a Ré dos adiantamentos feitos por a mesma por conta do pagamento do preço do apartamento da Rua …, reembolso realizado logo que o Autor recebeu o empréstimo do banco”, sendo o cheque de 14/10/1996, ou seja, “apenas quatro dias após a celebração do contrato de mútuo bancário em 10/10/1996, tempo necessário para o dinheiro do empréstimo entrar na conta BCP e o Autor poder pagar à Ré”.
Reafirmando que tal não foi questionado pela Ré por nenhum meio de prova produzido, “tal como julgou provado que a Ré pagou ao anterior da fracção da Rua … o montante de €7.481,96 através da sua conta pessoal do BBVA”, deverá ser dado como “provado (foi alegado e havia elementos probatórios inequívocos neste sentido) que o Autor após ter sido depositado o empréstimo bancário para habitação na conta BCP pagou à Ré a quantia correspondente a 37.500,00, por conta do reembolso dos adiantamentos realizados pela mesma relativamente ao pagamento antecipado do preço de aquisição do imóvel da Rua …” - cf., artigos 97 a 112 do corpo alegacional e Conclusão M).
Na resposta apresentada, referencia a Apelada que o impugnante nenhum meio de prova indica a suportar a pretendida alteração da matéria de facto, o que considera ser perceptível, atenta a inexistência, acrescentando não ter resultado minimamente provado tal facto em julgamento - cf., artigo 19 do corpo alegacional e Conclusões 6 e 7.
Na motivação feita constar na sentença apelada, referenciou-se (entre outros) ser o artº. 98º da réplica conclusivo – cf., fls. 2030 -, ainda que o referenciado cheque emitido pelo ora Autor a favor da ora Ré conste no esquema da documentação junta e examinada (Anexo I, a fls. 2054).
Decidindo:
No artigo 38º da contestação, alega a Ré que, para além dos montantes anteriormente enunciados, pagou, ainda, o montante de € 7.481,96, da sua conta pessoal do BBVA, ao anterior proprietário da casa adquirida.
No artigo 98º da réplica, o Autor alega ser falso que a Ré tenha suportado tal montante, referenciando ter creditado “valores muito superiores àquela quantia, na conta da Ré (BBVA)”. Faz ainda, referência ao documento nº. 2 junto com a petição inicial e ao documento nº. 10 junto com a mesma réplica.
Analisado o teor deste último documento, constata-se ser cópia de um cheque emitido pelo ora Autor, a favor da ora Ré, datado de 14/10/1996, sacado sobre a conta do BCP, no montante de 7.500.000$00 – cf., fls. 790 a 793. 
Aquela alegação da Ré subjaz ao facto provado 27.2, do qual consta que “a Ré pagou ao anterior proprietário da fracção da Ré da Lapa o montante de € 7.481,96 através de cheque da sua conta pessoal do BBVA, datado de 08.08.1996”.
Ora, ao referenciar, em sede de réplica, e em resposta àquela alegação, ter creditado, na mesma conta pessoal da Ré, domiciliada no BBVA, “valores muito superiores àquela quantia”, fazendo remissão para o documento nº. 10 junto, afigura-se-nos não podermos simplesmente concluir estarmos perante matéria factual conclusiva.
Por outro lado, atenta a data da emissão de tal cheque, constata-se ser de apenas 4 dias após a outorga do mútuo bancário celebrado aquando da outorga da escritura pública de compra e venda da fracção autónoma designada pela letra “C”, datada de 10/10/1996, obtendo-se através daquele a quantia de 142.157,40 € - cf., facto 3.
Decorre, assim, ser totalmente pertinente, atento o âmbito da controvérsia em equação, aditar-se á factualidade provada aquela entrega do cheque. Ainda que sem consignação da segunda parte do facto proposto, por tal não ter sido alegado nos termos ora reclamados, ou seja, como reembolso de adiantamentos realizados pela Ré, relativamente ao pagamento antecipado de pagamento de aquisição do imóvel, pela circunstância de, tratando-se da aquisição de um imóvel apenas em nome da Ré, não se poder concretamente aludir-se, com pertinência, a reembolso de montantes pela mesma disponibilizados, como, por fim, tal segmento factual configurar-se com natureza conclusiva, sendo antes eventual ilação a retirar do contexto das entregas efectuadas e datas destas.
Por fim, dir-se-á, ainda, que atentos os fundamentos probatórios invocados, não se compreende a alusão da Apelada, efectuada na resposta apresentada, de que o impugnante nenhum meio de prova indicou capaz de suportar a pretendida alteração da matéria de facto, quando os meios invocados foram especificamente e detalhadamente invocados, nomeadamente a aludida prova documental e teor das declarações de parte transcritas (na audição destas constatou-se estarem sintonizadas, no essencial, mas nem sempre com total correspondência, com o teor da transcrição consignada nos autos).
Donde, no parcial deferimento da impugnação apresentada, decide-se aditar á matéria factual um novo facto provado, a figurar sob o nº. 27.3, com a seguinte redacção:
“o Autor, após disponibilização do montante do mútuo referenciado nos factos 3 e 4, emitiu e entregou à Ré um cheque sacado sobre a conta identificada em 5, datado de 14/10/1996, no valor de 7.500.000$00 (contravalor de 37.409,84 €), que esta depositou na conta do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, identificada em 19”.
- facto provado 36
Redacção consignada:
Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 52.100,00, entre 2003 e 2007” ;
Redacção proposta:
“Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 65.475,00, entre 2003 e 2007”.
 Entende, ainda, o Autor Recorrente ter sido deficientemente julgado o facto provado 36, que corresponder ao por si alegado nos artigos 38º e 39º da réplica.
Acrescenta que para prova de tal factualidade “fundou-se em diversos extractos bancários da conta BCP com movimentos a débitos (docs. 8, 9, 10, 11, 13, 14, 15 e 17 da petição inicial) os quais cruzou com movimentos correspondentes, em valor e data, a créditos na conta BBVA (da Ré) resultantes de extractos bancários desta conta que juntou como doc. 4 na Réplica”.
Referencia que tais movimentos resultam claros dos documentos juntos, que não foram impugnados, tendo sido considerados pelo Tribunal, que para os mesmos remeteu na fundamentação consignada.
Todavia, ressalva, o valor “dado como provado é que não corresponde ao somatório dos mesmos”, pois, “se somarmos os valores debitados na conta BCP correspondentes a créditos na conta do BBVA, o seu valor atinge os €65.475,00, muito acima, portanto, do valor de €52.100,00 dados como provados pelo tribunal”.
Donde, conclui, deve ser alterada a redacção de tal ponto factual, de forma a consignar tal valor rectificado - cf., artigos 113 a 118 do corpo alegacional e Conclusões N) a P).
Em sede contra-alegacional, referencia a Apelada que o impugnante não demonstra quais os meios de prova que justificam tal valor, sendo claro dos extractos juntos, conforme documentos 8 a 10, 12 a 15 e 17, da petição inicial, que o somatório dos valores entre 2003 e 2007 atinge o provado valor de 52.100,00 €.
Cita a fundamentação constante da sentença recorrida, à qual anui, considerando não dever ser alterada a matéria factual questionada - cf., artigos 20 a 22 do corpo alegacional e Conclusões 8 e 9.
Relativamente ao facto em equação, consta na fundamentação/motivação da sentença apelada o seguinte:
Reporta-se ao artigo 39º da Réplica. Acrescentámos apenas o total das mencionadas quantias, efectuando um mero cálculo aritmético, pois que o valor global deverá ser cruzado com outros de modo a identificar os contributos significativos de ambas as partes para o que ora releva e de forma a poder identificar, em sede própria, eventuais “deslocações patrimoniais”.
Cotejados os extractos de ambas as contas juntos aos autos, designadamente, nos documentos 8º a 10, 12 a 15 e 17 da P.I. é possível confirmar a coincidência de valores e datas ali reportados, pelo que se mostra lógica a versão do Autor. Daqui resulta, pois, que o Autor entregou desta forma, por cheque e transferência, ao longo dos anos de 2003 a 2007 o valor global de €52.100,00. Tudo em sintonia com a evolução do saldo da conta do BBVA, com o período de doença da Ré e com a época áurea do sector imobiliário.
Do cuidado cruzamento feito, confirma-se, pois, como detalha o Autor, que:
a) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial com o n.º 1.30 (Janeiro) (cfr. doc. 8 junto à petição inicial);
b) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 2.18 (Fevereiro) (cfr. doc. 8 junto à petição inicial;)
c) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 8.07 (Agosto) (cfr. doc. 8 junto à petição inicial);
d) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 9.04 (Setembro) (cfr. doc. 8 junto à petição inicial);
e) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 12.30 (Dezembro) (cfr. doc. 8 junto à petição inicial)
f) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 7.15 (Julho) (cfr. doc. 9 junto à petição inicial);
g) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 2.10 (Fevereiro) (cfr. doc. 10 junto à petição inicial);
h) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 4.22 (Abril) ( cfr. doc. 10 junto à petição inicial);
i) A transferência bancária (movimento 8.16 - Agosto) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 9 junto à petição inicial);
j) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 9.12 (Setembro) (cfr. doc. 10 junto à petição inicial);
k) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 10.12 (Outubro) (cfr. doc. 10 junto à petição inicial);
l) A transferência bancária (movimento 9.06 - Setembro) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 11 junto à petição inicial);
m) A transferência bancária (movimento 1.29 - Janeiro) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 12 junto à petição inicial);
n) As transferências bancárias (movimentos 5.21, 7.13 e 7.20, correspondentes, a primeira a Maio e as restantes a Julho) provenientes da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 12 junto à petição inicial);
o) O movimento a crédito na conta bancária da Ré junto do BBVA, resultante da totalidade de reembolso de IRS, no montante de € 5.533,44;
p) O depósito do cheque com o n.º … corresponde ao movimento de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com o n.º 2.18 (Fevereiro) (cfr. doc. 13 junto à petição inicial);
q) O depósito dos cheques com os n.º …, … e …, correspondentes aos movimentos de saída da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial, com os n.º 2.26 (Fevereiro), 3.06 (Março) e 4.18 (Abril) (cfr. doc. 13 junto à petição inicial);
r) A transferência bancária (movimento 7.17 - Julho) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 13 junto à petição inicial);
s) As transferências bancárias (movimentos 8.27 e 9.11, correspondentes, a primeira a Agosto e a segunda a Setembro) provenientes da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 13 junto à petição inicial);
t) A transferência bancária (movimento 1.20 - Janeiro) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 14 junto à petição inicial);
u) As transferências bancárias (movimentos 5.18 e 6.02, correspondentes, a primeira a Maio e a segunda a Junho) provenientes da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 14 junto à petição inicial);
v) As transferências bancárias (movimentos 10.13, 10.14 e 11.02, correspondentes, as primeiras a Outubro e a última a Novembro) provenientes da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 14 junto à petição inicial);
w) A transferência bancária (movimento 1.05 - Janeiro) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 15 junto à petição inicial);
x) A transferência bancária (movimento 5.10 - Maio) proveniente da conta bancária referida no art.º 17º da petição inicial (cfr. doc. 15 junto à petição inicial)” – cf., fls. 2023 a 2025.
Decidindo:
Conforme aposto na motivação, o presente facto reporta-se ao artigo 39º da réplica, que se reporta a movimentos/transferências efectuados pelo Autor para a conta BBVA, fundamentalmente provenientes da conta Millenium BCP.
Tais movimentos encontram-se detalhados nas várias alíneas componentes daquele artº. 39º, assim se concretizando o aduzido no artº. 38º do mesmo articulado.
Ora, consta do facto em controvérsia que o Autor terá provisionado o saldo da aludida conta do BBVA no montante global de 52.100,00 €, considerando o Autor impugnante que o valor correcto a considerar deverá ser o de 65.475,00 €.
Ora, escalpelizados os movimentos bancários aduzidos pelo Autor no citado artº. 39º da réplica, e que foram decalcados na fundamentação da matéria de facto fixada, nos termos transcritos, constata-se que nem o valor feito constar no facto 36 nem o ora reclamado se mostram correctos.
Efectivamente, tendo-se procedido a uma análise detalhada de cada um dos movimentos, quer por referência aos extractos do BCP Millenium, quer por referência aos extractos/movimentos do BBVA – cf., doc. nº. 4, junto com a réplica -, constata-se desde logo o seguinte:
- os movimentos bancários referenciados – depósitos de cheques emitidos pelo Autor e transferências por este efectuadas -, e especificamente indicados na fundamentação aduzida, não se reportam apenas ao período entre 2003 a 2007 ;
- efectivamente, integrantes de tal período são apenas os movimentos identificados nas alíneas a) a o) supra identificadas ;
- reportando-se os demais movimentos, identificados nas alíneas p) a X), aos anos de 2008 a 2010 ;
- aqueles movimentos entre 2003 a 2007 traduzem-se no valor global de 52.358,44 €, nestes estando incluído o enunciado na alínea o), datado de 13/09/2007, traduzido no movimento a crédito resultante do reembolso da totalidade do IRS ;
- por sua vez, a totalidade dos movimentos alegados pelo Autor e feitos constar na motivação pelo Tribunal a quo, computam-se no valor total de 70.008,44 €, por referência às várias alíneas, valores e folhas dos autos que os documentam (em parêntesis, os extractos do BBVA):
a) – 2.000,00 € =» fls. 200 vº (750) ;
b) – 3.500,00 € =» fls. 198 vº (751) ;
c) – 6.000,00 € =» fls. 186 (752) ;
d) – 6.000,00 € =» fls. 184 (753) ;
e) – 1.500,00 € =» fls. 177 vº (754) ;
f) – 5.000,00 € =» fls. 218 vº (755) ;
g) – 2.500,00 € =» fls. 265 (756) ;
h) – 4.000,00 € =» fls. 259 vº (755) ;
i) – 1.750,00 € =» fls. 247 vº (756 – numeração duplicada) ;
j) – 750,00 € =» fls. 244 (757) ;
k) – 3.750,00 € =» fls. 241 vº (758) ;
l) – 3.000,00 € =» fls. 280 vº (759) ;
m) – 5.175,00 € =» fls. 339 vº (760) ;
n) – 1.900,00 € (500,00 + 400,00 + 1.000,00) =» fls. 327 vº e 321 vº (761) ;
o) – 5.533,44 € =» (762) ;
p) – 5.000,00 € =» fls. 372 vº (763) ;
q) – 5.500,00 € (1.500,00 + 1.000,00 + 3.000,00) =» fls. 372 vº, 369 e 366 vº (764) ;
r) – 400,00 € =» fls. 357 vº (765) ;
s) – 1.500,00 € (1.000,00 + 500,00) =» fls. 354 vº e 351 vº (766) ;
t) – 1.000,00 € =» fls. 409 vº (767) ;
u) – 1.500,00 € (750,00 + 750,00) =» fls. 399 vº e 396 (768) ;
v) - 1.400,00 € (500,00 + 400,00 + 500,00) =» fls. 381 vº e 384 vº (769) ;
w) – 750,00 € =» fls. 444 vº (770) ;
x) – 600,00 € =» fls. 432 vº (771) ;
- ora, o âmbito alegacional aduzido pelo Autor não se limitou ou restringiu ao período decorrente entre 2003 a 2007, nem tal limitação foi pretendida efectuar pelo Tribunal a quo, pois fundou a resposta conferida em movimentos bancários ocorridos igualmente nos anos de 2008 a 2010 ;
- pelo que, estando em equação o campo factual balizado no artigo 39º da réplica, a que se reporta o questionado facto 36, a redacção a conferir a este deverá abranger toda a temporalidade ali aduzida ;
- por outro lado, constando igualmente do alegado provisionamento da conta um movimento a crédito resultante do reembolso total do IRS, deverá esta situação ficar devidamente salvaguardada na redacção a conferir ;
- concluindo-se, então, pela necessária alteração da redacção do facto 36, nos seguintes termos:
“Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA de transferências para a mesma conta e pelo creditar nesta da totalidade do reembolso do IRS concretizado em 2007, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 70.008,44, entre 2003 e 2010 (entre 2003 e 2007, tal valor fixou-se em 52.358,44 €)”.
- facto provado 55
Redacção consignada:
Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento do imóvel identificado no ponto 2 deste elenco ascendeu a €207.789,00 sendo que A. e Ré suportaram renda de valor global para igual período de €265.236,00” ;
Redacção proposta:
“Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP, ascendeu a €207.789,00 e as rendas suportadas para igual período, debitadas na mesma conta, ascendeu a €265.236,00”.
Relativamente ao presente ponto factual, alega o Apelante que a discussão deste facto resulta “da Ré ter alegado que na conta BCP foi depositado o montante de €207.789,00 resultante do arrendamento do apartamento da Rua … durante o período em que Autor e Ré não habitaram a mesma”, pretendendo assim demonstrar “que o Autor beneficiou daquela elevada quantia em resultante do arrendamento do apartamento da Rua … e, como tal, (supõe-se e só assim faz sentido aquela alegação) que o mesmo não poderia dizer que o empréstimo tinha sido pago com dinheiro seu da conta BCP”.
Respondendo a tal alegação, veio o Autor, na réplica, mencionar que a Ré apenas refere o valor das rendas depositadas, mas já olvida “os montantes que saíram daquela conta, para pagamento das rendas nas casas onde o agregado familiar residia, com saldo manifestamente negativo, suportado pelo Autor, em quase €60.000,00”.
Acrescentou que para “explicação e prova de que o Autor suportou o montante de €60.000,00 correspondente à diferença das rendas que pagou pelos apartamentos que o Autor e a Ré tomaram de arrendamento enquanto viveram fora do apartamento da Rua … e as rendas obtidas pelo arrendamento deste último apartamento, foi junto pelo mesmo na Réplica um documento (doc. 8) que faz o cruzamento e a comparação entre todos os débitos na conta BCP resultantes dos pagamentos de rendas e os créditos na mesma conta resultantes dos recebimentos das rendas, com referência aos diversos extractos bancários juntos pelo Autor como docs. 6 a 8 da p.i.”.
Deste forma, “para além da existência de prova documental inequívoca e bastante sobre os referidos movimentos a débito e a crédito relativos às rendas em apreço, da Ré não ter questionado tal facto, o Autor ter explicado pormenorizadamente nas suas declarações de parte os mesmos, o próprio tribunal aceitou os mesmos como correctos, porquanto os valores que o tribunal considerou provados como rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua … - €207.789,00 – e rendas suportadas em igual período - €265.236,00 – corresponde exactamente ao que resulta, e vem referido no final, do doc. 8 junto pelo Autor na Réplica”.
Pelo que, desta forma, “não poderia o tribunal ter considerado como provado que a Ré (também) suportou o pagamento das rendas pelos apartamentos tomados de arrendamento”, justificando-se tal alteração pois “a diferença entre as rendas pagas e recebidas, no montante €57.477,00 foi suportado pelo Autor, sabendo-se de antemão que a Ré não movimentou esta conta para além do referido nos pontos 27 e 28 dos factos provados “.
Por outro lado, “não pode o tribunal julgar provado que na conta BCP foram depositados €207.789,00 resultantes do arrendamento da fracção da Rua … (ponto 28 dos factos provados), tirando daí ilações quanto ao benefício do Autor com aqueles depósitos e ignorar que da mesma conta saiu o montante de €265.236,00 para pagamento de rendas a terceiros”, assim ignorando “que a diferença substancial de €57.477,00 foi suportada pelo Autor” - cf., artigos 119 a 132 do corpo alegacional e Conclusões Q) a U).
Na resposta apresentada, referencia a Apelada que mais uma vez o Recorrente “não se estriba em nenhum elemento de prova” que suporte tal entendimento, “sendo aliás um facto que resultou assente e alegado pelo A.”, citando o entendimento feito constar pelo Tribunal a quo na motivação - cf., artigos 23 e 24 do corpo alegacional e Conclusão 10.
Na motivação/fundamentação da sentença apelada, relativamente ao presente ponto factual, consta o seguinte:
A matéria contemplada nos artigos 86º a 93º da Réplica, ressalvados os respectivos segmentos conclusivos, está assente, não foi levada aos temas da prova e é pacífica no quadro das versões das partes. Resultam, de resto, do mapa comparativo de rendas que o Autor faz e que tem respaldo nos extractos juntos, nas contas que também a Ré faz no requerimento de Junho de 2014 bem como no documento 8 da Réplica.
Os artigos 91º a 94 da Réplica constituem conclusões ou considerandos de Direito”.
Decidindo:
Está em equação o apuramento dos valores das rendas percepcionadas, no que concerne ao imóvel identificado no facto 2, durante o período em que o mesmo esteve arrendado, em contraposição com os valores despendidos nos arrendamentos efectuados por Autor e Ré, durante o mesmo período, em virtude de terem decidido encontrar um espaço mais condizente com as necessidades de espaço da família.
Inexiste litígio ou controvérsia quanto aos valores depositados na conta BCP, fruto das rendas pagas pelo arrendamento da fracção da Lapa, identificada em 2, registada em nome da Ré – cf., facto 28.
E, também não existe litígio quanto aos valores despendidos nos arrendamentos dos espaços ocupados pela família em idêntico período.
A questão que se coloca tem fundamentalmente a ver com a redacção conferida ao presente ponto factual, na assunção das despesas com tais arrendamentos, consignando-se que aquele valor global foi suportado por Autor e Ré.
Todavia, e independentemente de quem suportou ou não tal valor, e da eventual (ir)relevância deste facto, urge fundamentalmente considerar em que conta bancária foram feitos tais depósitos e, posteriormente, mediante a análise dos movimentos a débito e crédito de tal conta, concluir-se pela eventual assumpção de tais encargos, resultantes da diferença entre os valores recebidos pelo arrendamento da casa da Lapa e despendidos, no mesmo período, nos arrendamentos efectuados de outros espaços pertença de terceiros.
Donde, na consideração do doc. nº. 8 junto com a réplica – cf., fls. 780 a 785 -, em articulação com os documentos nºs. 6 a 14 juntos com a petição inicial – cf., fls. 131 a 411 -, considerados igualmente pelo Tribunal recorrido, defere-se a requerida alteração do ponto 55 da matéria de facto provada, o qual passa a ter a seguinte redacção:
“Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP (identificada em 5), ascendeu a o valor de €207.789,00 e as rendas suportadas em idêntico período, debitadas na mesma conta, ascendeu ao montante de €265.236,00”.
- facto não provado 1
Redacção consignada:
Foi sempre o Autor quem procedeu ao pagamento das prestações a que se reportam os pontos 5 e 8 dos Factos Provados, com dinheiro seu” ;
Redacção proposta:
Pretende o Autor impugnante que tal facto passe a figurar como provado.
Alega o Impugnante que tendo em atenção vária matéria de facto considerada provada, quer na sentença apelada, quer fruto da impugnação apresentada – exemplificativamente, os factos 5, 9. 11, 12, 27, 27.2, 28, 36 e facto pretendido aditar -, o presente facto encontra-se mal julgado.
Com efeito, acrescenta, “apurando-se o saldo entre a movimentação a crédito na conta BCP efectuada pela Ré e os débitos na mesma conta creditados na conta BBVA, provados em tribunal, resulta um resultado negativo de €42.276,43 na conta BCP e um resultado positivo na conta BBVA da Ré. Isto é, na conta BCP, saiu (pelo menos) mais €42.276,43 para conta da Ré do que aquilo que, directa ou indirectamente, entrou”.
Donde, “se assim foi, então necessariamente se terá de concluir que todos os pagamentos/amortizações dos empréstimos que saíram da conta BCP só podem ter sido suportados pelo Autor”, determinando que o presente facto passe a figurar como provado - cf., artigos 133 a 146 do corpo alegacional e Conclusões V) a AA).
Em sede contra-alegacional, a Recorrida nega que tal facto resulte minimamente provado, acrescentando não se entenderem as conclusões Y) e Z), sendo que em nenhum momento o Recorrente demonstra o que alega - cf., artigo 25 do corpo alegacional e Conclusões 11 a 13.
Justificando a não prova desta factualidade, consignou-se na sentença apelada, a propósito igualmente do facto provado 5, o seguinte:
Facto Provado 5. – 5. O pagamento das prestações de amortização da dívida, capital e juros atinentes a tal empréstimo foi sempre efectuado por débito directo da conta titulada pelo Autor no Banco Millennium BCP, com o número …, a qual passou a ser conjuntamente titulada por A. e Ré a partir de 27.05.1996.
Corresponde aos segmentos provados retirados das alegações constantes dos artigo 5º e 17º da P.I., tendo, pois, este último integrado o Tema da Prova. A vertente não provada do artigo 5º da P.I. (repetido no artigo 31º da P.I., que integrou igualmente o Tema da Prova), encontra-se no ponto 1. dos Factos Não Provados: 1.Foi sempre o Autor quem procedeu ao pagamento das prestações a que se reportam os pontos 5 e 8 dos Factos Provados, com dinheiro seu.
.
Com efeito, no artigo 27º da Réplica, é o próprio Autor que admite que a conta do BCP da qual eram debitadas directamente as apontadas prestações chegou a ser movimentada a crédito também pela Ré, embora assinale que tais movimentos foram pontuais e anteriores ao primeiro mútuo. Por outro lado, dos depoimentos prestados por Autor e Ré, resulta pacífico o que atestava já o documento nº2, junto com a P.I. que demonstra que a conta em questão era então já (antes do primeiro mútuo) solidária, titulada pelas partes (atente-se na referência “cs”). Ora, sendo o dinheiro fungível, dado que ambas as partes provisionaram a conta, está afastada a alegação de que o Autor suportou todas as prestações e com dinheiro seu. Mais à frente, porém, seguindo a ordem das alegações dos articulados, veremos em maior detalhe este aspecto que é, efectivamente, estruturante da causa de pedir da presente acção. Ou seja, veremos o que entrou a crédito na conta do BCP, analisando o anexo II da Fundamentação de Facto”.
Decidindo:
O juízo contido no ponto 1 da factualidade não provada tem natureza manifestamente conclusiva, pois determinar se foi sempre o Autor, com dinheiro seu, a proceder ao pagamento das prestações referentes aos mútuos bancários contraídos, é algo que se retirará, ou não, da demais factualidade provada, nomeadamente da análise da conta bancária onde as prestações daqueles mútuos eram debitadas e da proveniência dos réditos que alimentavam aquela.
Ora, como bem se refere na sentença recorrida, resultando, inclusive por reconhecimento do Autor, que a conta bancária onde tais débitos eram amortizados (conta do BCP Millenium) chegou a ser movimentada a crédito pela ora Ré, independentemente da data em que tais movimentos ocorreram, tal consignação, ainda que não se considerasse a sua natureza conclusiva, sempre se revelaria inviável e desacertada, sem uma ponderação dos movimentos de crédito daquela conta, apenas operacionável mediante a análise dos fluxos entre as contas bancárias utilizadas pelos conviventes.
Donde, independentemente da sua natureza, a factualidade feita constar no ponto 1 não provado, deverá manter-se qua tale, indeferindo-se a pretensão de que a mesma passe a figurar como provada
- facto não provado 16
Redacção consignada:
O montante de € 105.562,50 supra mencionado é dinheiro do Autor” ;
Redacção proposta:
Pretende o Autor impugnante que tal facto passe a figurar como provado.
Enuncia o Autor impugnante resultar dos factos provados 37 a 42, que corresponde ao por si alegado nos artigos 46º a 54º da réplica, ser evidente “que o dinheiro recebido com a venda do imóvel de DM… visava compensar Autor e Ré pelo facto de prescindirem do arrendamento do imóvel e aceitarem que o mesmo fosse vendido”.
Efectivamente, o senhorio “DM… ia mudar-se para Espanha e decidiu vender o apartamento ao Autor e à Ré (ponto 48 dos factos provados)”, sendo que o “preço base de venda da casa que serviu de critério ao valor pago pelo Senhorio ao Autor e à Ré (face à não aceitação da proposta de compra do imóvel por estes), resulta de uma proposta de venda do apartamento ao Autor e Ré cujo valor era naturalmente abaixo do valor de mercado”.
Ora, “Autor e Ré eram arrendatários do referido apartamento e podiam impedir o negócio de venda pretendido pelo Senhorio”, pelo que acordaram “que naquilo que excedesse o valor que o senhorio tinha proposto à Ré e ao Autor para lhe comprarem a casa, fosse dividido em duas partes iguais, 50% para o senhorio e 50% para os inquilinos, nas pessoas do Autor e da Ré (ponto 39 dos factos provados)”.
Desta forma, tudo leva a crer que “o valor que o Senhorio pagou ao Autor e à Ré mais não foi que uma compensação por estes terem aceite abdicar do apartamento e rescindir o contrato de arrendamento”.
Acrescenta corresponder à verdade ter sido a Ré a levar “a cabo a venda do imóvel, mas, face ao acima referido, isto não tem o condão de afastar a natureza de indemnização/compensação ao dinheiro pago pelo Senhorio”, pois considerar-se “que os €211.125,00 pagos pelo Senhorio (€105.562,50 na conta BCP e igual montante na conta BBVA) seriam uma comissão da Ré pela venda do imóvel era, em primeiro lugar, considerar “normal” uma comissão neste elevado montante”, quando o normal é, antes, “que a Ré neste caso tivesse abdicado de qualquer comissão face ao elevado montante da indemnização recebida”. Para além de que tal entendimento ignoraria “o acordo entre todos, expresso no ponto 39 dos factos provados, de que o dinheiro seria para o Autor e para a Ré. (Se era para o Autor e para a Ré, não poderia ser uma comissão da Ré)”.
Acresce, ainda, que “as declarações prestadas pelo Autor, em sede de declarações de parte, sempre levariam a considerar metade do dinheiro pago pelo Senhorio como dinheiro seu”, transcrevendo tais declarações nos seguintes termos:
Autor: Julgo que a T… prescindiu da comissão de venda exactamente porque este negócio envolvia esta especie de indemnização (00:48:41)

Autor: Foi combinado também isso, vamos pôr a casa no mercado. A T… vende-te a casa e a mais-valia do remanescente que a T… conseguir fazer na casa, metade fica para ti…foi um acordo de cavalheiros, metade é teu.
Advogado: Ó Sr. Engº este dinheiro, dinheiro que foi depositado, 200 mil euros, este valor, foi uma indemnização que o senhor teve por sair da casa sendo inquilino ou foi comissão da venda?
Autor: Entenda assim, que isto foi um negócio… foi um negócio de cavalheiros. Porque ele quando vendeu a casa eu disse-lhe se tu não conseguires vender a casa por dinheiro decente acima deste dá-me um mínimo, que eu já não sei o que fixei, para eu mudar. Dás-me um mínimo para eu mudar. A casa não te compro. Está fora de questão. Dás um mínimo para eu me mudar. Quando a T… vai para o mercado e vende a casa por mais 400 mil euros, é evidente que os 400 mil euros era o valor da casa.
Adv.: Este dinheiro foi uma compensação para sair da casa?
Autor: Foi uma compensação para sair da casa e por ter permitido vender a casa pelo valor justo.
Decorre, assim, que “também estas declarações do Autor, coerentes, esclarecedores e informadas deveriam necessariamente ter levado o tribunal a dar como provado que o dinheiro depositado na conta BCP por DM… era dinheiro do Autor”, o que não foi sequer infirmado pelas declarações da Ré.
Por fim, questiona a interpretação e considerações feitas pelo Tribunal a quo acerca da fixação do presente facto, nomeadamente a que sustenta o afastamento da natureza indemnizatória do montante pago - cf., artigos 147 a 172 do corpo alegacional e Conclusões BB) e CC).
Na resposta apresentada, a Apelada refere, apenas, ter sido feita prova cabal de que tal dinheiro não pertence ao Recorrente, transcrevendo o juízo argumentativo utilizado pelo Tribunal na sua fundamentação - cf., artigos 26 e 27 do corpo alegacional e Conclusão 14.
A justificação da resposta negativa conferida ao presente ponto mereceu, por parte do Tribunal Recorrido, longa análise e justificação, o que foi apreciado aquando da análise do conteúdo do artº. 33º da contestação (já supra citado), tendo por base a definição da identidade dos valores depositados pela Ré na conta solidária do Millenium BCP.
Discorreu-se, então, o seguinte (repetem-se os dois primeiros § já supra transcritos):
“Reportam-se aos art.s 33º e 38º da Contestação e relaciona-se com a proveniência dos depósitos ali mencionados. Embora não tenha sido expressamente levado aos temas da prova, a sua pertinência, neste âmbito, decorre da inserção do artigo 5º da P.I. nos Temas da Prova, de harmonia com as regras do ónus probatório. Não restam, pois, dúvidas de que este constituiu um dos aspectos críticos da prova produzida ora a apreciar.
Os depósitos elencados defluem sem esforço do cruzamento dos extractos do BCP com os talões de depósitos e contas correntes relativos às indicadas datas (documentos 1 a 9 e 17 juntos com o Requerimento de Junho de 2014, a fls 1095 e seguintes, volume VI). De resto, a verdade é que o Autor os admite na Réplica (alega desconhecer mas tratam-se de factos de que deveria ter conhecimento pessoal; v. art. 574º, nº3, do C.P.C.), contrariando expressamente, sobretudo, a respectiva relevância para o que ora se discute em virtude de remontarem a data anterior ao primeiro mútuo em questão.
Diversamente do que sucede com os montantes directamente depositados pela Ré na conta do BCP, a razão de ser da transferência do valor de €105.562,50 (ponto 27.1 deste elenco) para a mesma conta [do BCP] em 31.10.05 foi controvertida. Sem embargo, na verdade, A. e R. neste particular, relatam essencialmente os mesmos factos, extraindo apenas diferentes conclusões quanto ao propósito do vendedor e ao que terá eventualmente sido expressamente combinado entre as partes (cfr. artigos 47º e seguintes da Réplica, repetidos, no essencial, nos depoimentos de parte, com as ressalvas a seguir escalpelizadas, a propósito da versão da Réplica, de harmonia com a repartição do ónus probatório).
Assim, a apreciação da última alínea do ponto do art. 33º da Contestação implicou apreciar em simultâneo a matéria vertida nos artigos 46º a 58º da Réplica.
Com efeito, no âmbito dos respectivos depoimentos, A. e Ré. explicaram que, por essa altura, pretenderam sair do imóvel que tomaram de arrendamento a DM… já que este pretendia vendê-lo mas as partes não queriam adquiri-lo e que o mesmo, necessitando de verbas com urgência, lhes propôs, dada a actividade profissional e know how da Ré, que encontrassem comprador para o imóvel sendo que lhes entregaria metade do valor a mais que conseguissem para além de determinado preço (tecto) que indicou. Como a Ré tivesse conseguido adquirente para o imóvel disposto a pagar preço que ultrapassou em mais de quatrocentos mil euros o tecto apontado por DM…, este entregou-lhes metade dessa margem, conforme combinado.
Por conseguinte, quer a proposta de DM… quer a circunstância de ter sido a Ré, que trabalhava no meio, a angariar comprador e a conseguir um “bom negócio” são aspectos comuns às versões de cada uma das partes. Entende, contudo, também, o Autor que DM…, seguindo as suas instruções, depositou metade daquele valor na conta de cada um, pois que o combinado teria sido isso mesmo, sugerindo, desta forma que cada uma das partes teria direito a metade do dito valor e, sobretudo, que tal repartição resultaria de acordo firmado entre si e a Ré. É justamente apenas neste último ponto que, com relevo, as versões divergem. Efectivamente, a Ré considerou que o depósito de metade do valor na conta de cada um visou corresponder às indicações que lhe foram dadas (a DM…) mas que, sem dúvida, todo o valor correspondeu, em rigor, à comissão que lhe era devida pelo trabalho prestado e de acordo com o inicialmente combinado com DM… quanto ao critério seguido para contabilizar o valor dessa comissão. Cumpre, portanto, explanar com algum pormenor o raciocínio fundador da nossa convicção neste jaez.
Registe-se que não foi produzida qualquer outra prova neste domínio para além dos extractos bancários e dos depoimentos de parte. Restou, por isso, analisar cada um desses depoimentos à luz das regras da lógica e da experiência.
Tratando-se de matéria de excepção (posto que o A. demonstrou que movimentava a conta do BCP a crédito sozinho, por regra, e que desta conta, onde recebia rendimentos, eram pagas as prestações), o ónus probatório recaiu sobre a Ré.
Ora, independentemente, do que DM… possa ter cogitado sobre a gestão – individual ou conjunta - que o casal fazia da sua economia, a verdade é que o valor em questão foi, de facto, conseguido em virtude de um serviço conseguido pela Ré e nisto estão os presentes litigantes de acordo. Não fosse esse serviço e as partes nada teriam recebido. A respeito deste episódio, mais disse o A. que DM… lhe telefonou a perguntar como deveria fazer com o dinheiro. Neste contexto, acrescentou o Autor estas palavras “julgo que a T… prescindiu da comissão de venda”. Ora, por um lado, tal afirmação revela que a memória do A. neste domínio não estava já tão clara. Por outro, aparenta ser um non sense. Pois, por que razão iria a Ré diligenciar por um tal negócio, próprio da actividade profissional que desenvolvia, sem pedir uma comissão?! Caso tivesse sido perspectivado atribuir uma indemnização aos inquilinos pela resolução antecipada do arrendamento – enquadramento que nenhuma das partes mencionou e que apenas se equaciona para exposição do raciocínio seguido -, certamente que os valores teriam sido outros. A este respeito, a R. explicou que, em geral, estabelecia-se uma percentagem de três a cinco por cento para a comissão de venda. Todavia, em negócios avultados, sucedia estabelecer-se a comissão através de outros critérios, como, por exemplo, o utilizado no negócio com DM….
Entre 2003 e 2005 (documentos de fls 740 e seguintes do IV volume, extractos do BBVA de 2003 em diante), o A. tinha entregue cheques à Ré, que esta depositou na sua conta pessoal do BBVA, cerca de trinta mil euros. Valor que nada tem que ver com o que ora se discute de mais de cem mil euros, pelo que não se mostra lógico perspectivar o valor de cerca €105.000 como um qualquer reembolso ao Autor por valores que o mesmo tenha facultado directamente à R.
Ora, já vimos, a Ré, a débito, não movimentava a conta do BCP (para além do uso do cartão de crédito) e o saldo desta era então de perto de €26.000,00 (extractos do BCP juntos a fls 585 e seguintes).
Nesta confluência, mostrando-se mais lógica e razoável a conclusão da Ré, a mesma logrou contrariar o sustentado pelo Autor neste particular, pelo que se julgou provado o facto vertido, a final, no artigo 33º da Contestação, incompatível com a alegação de que tal valor era dinheiro do Autor (V. elenco dos factos não provados). Não está em causa a maior credibilidade de uma parte ou de outra mas e no que toca a este facto em particular, a lógica e razoabilidade da conclusão a extrair quanto à razão de ser do dito depósito e à perspectiva das partes quando acordaram no depósito de metade do valor a haver em cada uma das contas”.
Decidindo:
Liminarmente, afigura-se-nos, sem pejo, consignar que o entendimento sufragado pelo Tribunal a quo não se nos afigura como o mais pertinente, lógico e adequado. O que procuraremos esclarecer e fundamentar.
A dissensão existente encontra-se perfeitamente exposta na efectuada transcrição da fundamentação, sendo que o negócio que permitiu os réditos em equação encontra-se plenamente provado, conforme factos 37 a 42.
Ora, decorre com alguma clareza destes factos, atento o teor e âmbito do acordado, que metade da quantia que viesse a ser obtida, no excedente ao preço de aquisição que o proprietário e senhorio havia proposto aos arrendatários, seria para o Autor e para a Ré. Ou seja, no denominado negócio de cavalheiros, atenta a decisão do senhorio de mudar os seus negócios para Espanha e decidido vender alguns dos activos que possuía em Portugal, estando a casa arrendada e não pretendendo os inquilinos/arrendatários (os ora Autor e Ré) adquiri-la, lograram alcançar aquilo que apenas pode ser considerado como uma forma de compensação pela antecipada cessação do contrato de arrendamento. Compensação ou indemnização que se traduziria na obtenção de um ganho equivalente a metade do valor obtido que excedesse o preço de venda que havia pedido aos arrendatários (necessariamente mais baixo, por que indexado à renda convencionada), a favor destes.
Ora, para lograr tal desiderato, entende-se perfeitamente que, desempenhando a Ré funções no ramo da mediação imobiliária, tenha sido acordado que a mesma promoveria a venda da casa no mercado, pois, certamente, quando maior o valor que obtivesse, maior seria a quantia que receberia, juntamente com o ora Autor, enquanto arrendatários.
Desta forma, é neste contexto que surge lógico e entendível que atendendo a estes específicos contornos do negócio, em que os arrendatários já iriam obter um provento pecuniário pela venda da casa de que eram arrendatários, a Ré tenha prescindido da comissão devida pela mediação imobiliária no negócio. Efectivamente, se já ia lucrar, juntamente com o Autor, enquanto arrendatários e unidos de facto, pela venda de um imóvel (o que, por si só, já é situação invulgar), não faria sentido que a acrescer ao lucro acordado, o vendedor senhorio ainda tivesse que arcar com um valor de comissão, ou que a totalidade desse valor recebido pudesse ser vista e considerado como comissão da Ré. Não é, e os factos desmentem totalmente que o seja.
Assim, não se entende o entendimento plasmado na motivação apresentada, questionando acerca da razão pela qual a Ré diligenciaria por tal negócio, próprio da sua actividade profissional, sem pedir uma comissão.
A resposta é simples e, afirmamo-lo nós agora, perfeitamente lógica e coerente. Se já iria obter proventos acordados com o vendedor nos termos expostos, que razão teria para lhe aditar o valor de uma comissão, certamente natural e entendível nas situações em que esse fosse apenas o seu ganho pelo trabalho de mediação desenvolvido, mas não já na particular situação acordada.
Como não se entende a exposta estranheza pelos valores em equação caso estivéssemos perante uma alegada indemnização aos inquilinos pela resolução antecipada do arrendamento, pois estranho seria que o valor despendido pelo vendedor – 211.125,00 € - consubstanciasse uma qualquer comissão de venda. Efectivamente, ainda que se desconheça o valor da alienação, não se olvide que, ainda que calculando uma comissão de 5%, o valor da venda teria que ser de aproximadamente 4.000.000,00 € (quatro milhões de euros) e para uma comissão de 3%, teria de ser de aproximadamente 7.000.000,00 € (sete milhões de euros) !
Por outro lado, acresce, ainda, um outro facto nada despiciendo, traduzido na forma como valor a receber pelos conviventes arrendatários foi depositado, dividido em dois montantes iguais, cada um depositado nas contas do Autor e Ré – cf., facto 42.
Ora, se tal valor fosse apenas atribuível à Ré, ou seja, se tal fosse o teor do acordado, qual o motivo de tal divisão logo aquando do depósito da quantia por parte do senhorio ? Pois, o normal seria que a totalidade fosse transferida para a conta do BBVA e, posteriormente, caso assim o entendesse a Ré, transferir parte para a conta do BCP, independentemente da intencionalidade subjacente.
Pelo exposto, resulta claro e evidente que o entendimento a sufragar só pode ser o de entender-se tal quantia de 105.562,50 €, transferida por DM… para a conta do BCP, referenciada no facto provado 27.1, como de efectiva pertença do Autor. O que, para além do enquadramento supra exposto, tem ainda acolhimento na prova documental referenciada, para além do próprio teor das declarações do Autor, verdadeiramente elucidativo e concludente neste ponto (reiteramos que, na audição destas, constatou-se estarem sintonizadas, no essencial, mas nem sempre com total correspondência, com o teor da transcrição consignada nos autos).
Determinando, consequentemente, o seguinte:
Ø A eliminação do facto não provado 16 ;
Ø O aditamento à factualidade provada de um novo ponto, que figurará identificado como 27.4, com a seguinte redacção:
“a quantia referenciada em 27.1, transferida para a conta do BCP identificada em 5, era pertença do Autor”.
Em resumo conclusivo, as alterações introduzidas na matéria de facto ponderável, fruto do conhecimento da impugnação apresentada, traduzem-se nas seguintes alterações:
- Alteração da redacção do facto provado 9.2, que passa a ter a seguinte redacção:
 “Relativamente ao mútuo datado de 10.07.08, com terminus a 30 de Maio de 2024, por referência à data de 06.04.16, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros”.
- alteração da redacção do ponto de facto 27, suprimindo-se as alíneas a) e f), passando o mesmo a figurar com a seguinte redacção:
A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a) €1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;  
b) €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;  
c) €25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;  
d) €9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95”.
- aditamento á matéria factual um novo facto provado, a figurar sob o nº. 27.3, com a seguinte redacção:
“o Autor, após disponibilização do montante do mútuo referenciado nos factos 3 e 4, emitiu e entregou à Autora um cheque sacado sobre a conta identificada em 5, datado de 14/10/1996, no valor de 7.500.000$00 (contravalor de 37.409,84 €), que esta depositou na conta do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, identificada em 19”.
- alteração da redacção do facto 36, nos seguintes termos:
“Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA de transferências para a mesma conta e pelo creditar nesta da totalidade do reembolso do IRS concretizado em 2007, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 70.008,44, entre 2003 e 2010 (entre 2003 e 2007, tal valor fixou-se em 52.358,44 €)”.
- alteração da redacção do ponto 55 da matéria de facto provada, o qual passa a ter a seguinte redacção:
“Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento (a terceiros) do apartamento da Rua …, creditadas na conta BCP (identificada em 5), ascendeu a o valor de €207.789,00 e as rendas suportadas em idêntico período, debitadas na mesma conta, ascendeu ao montante de €265.236,00”.
- A eliminação do facto não provado 16 ;
- O aditamento à factualidade provada de um novo ponto, que figurará identificado como 27.4, com a seguinte redacção:
“a quantia referenciada em 27.1, transferida para a conta do BCP identificada em 5, era pertença do Autor”.
II) DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA EXPOSTA NA DECISÃO RECORRIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS
Delimitemos os contornos do litígio.
No articulado inicial, o Autor alegou que na pendência na vivência da união de facto com a Ré, esta adquiriu, em Outubro de 1996, uma fracção autónoma, designada pela letra “C”, correspondente ao …º andar do prédio urbano sito na Rua …, nº. … e …-A, em Lisboa, com recurso a mútuo bancário.
Acrescentou o demandante que o pagamento das prestações de tal mútuo foram sempre por si suportadas, com dinheiro seu, figurando em tal mútuo bancário como fiador e principal pagador, sendo que, até à data da instauração da acção (19/02/2013), já havia pago a quantia de 208.366,04 €.
Referenciou que, igualmente durante a pendência da vivência em comum, em Julho de 2008, juntamente com a Ré, adquiriram uma fracção autónoma designada pela letra “U”, que corresponde a uma garagem em estacionamento coberto, no prédio urbano sito na Rua …, nº. …, em Lisboa.
Para tal, contraíram um outro mútuo bancário, junto do BCP, S.A., no montante de 75.000,00 €, cujas prestações também foram por si sempre suportadas, com dinheiro seu, sendo que, até à data da instauração da acção, já havia pago a quantia de 26.026,40 €.
Da quantia mutuada, metade destinou-se à aquisição da garagem, tendo sido o remanescente utilizado para reforço do orçamento familiar, nomeadamente para o pagamento das despesas extraordinárias como férias de Inverno na neve e de verão no Algarve.
Mencionou, ainda, que o dinheiro que provisionava a conta bancária do Millenium BCP, na qual eram debitadas as prestações de ambos os encargos, provinha de rendimentos seus, pois, apesar da conta ser solidária entre Autor e Ré, esta nunca a movimentou a crédito.
Fazendo o cômputo dos montantes despendidos, a que acresce o valor de 44.752,00 € relativos a pagamento de seguros obrigatórios indexados aos empréstimos, já despendeu o montante total de 279.144,44 €.
Invoca, assim, a sub-rogação relativamente aos montantes despendidos com a  amortização do mútuo relativamente ao qual é fiador, enquanto que à metade da quantia liquidada com a amortização do mútuo para a aquisição da garagem, invoca o direito de regresso.
Acrescenta que com a cessação da união de facto deixou de existir qualquer causa que justifique o facto da Ré ter ficado proprietária do imóvel sem que tenha suportado qualquer encargo, aludindo, ainda, ao direito de regresso relativamente ao valor despendido para a aquisição da fracção “C” e a metade paga relativamente à aquisição da garagem (fracção “U”). No que concerne à outra metade do empréstimo utilizado para as despesas familiares, invoca o instituto do enriquecimento sem causa.
Consequentemente, no que concerne ao petitório formulado, deduz, a título principal, pedido de condenação da Ré no pagamento dos valores indicados, fundado no direito de regresso, e, a título subsidiário, pedido de condenação fundado no enriquecimento sem causa.
Contestando a pretensão accional, alegou a Ré não corresponder à verdade que o Autor tenha pago as prestações dos empréstimos com dinheiro seu, pois a conta do Millenium BCP era movimentada tanto pelo Autor como por si que, tal como o Autor, também a creditava.
Assim, depositou em tal conta, onde forma debitadas as prestações dos empréstimos, vários valores (entre outros de que não possui comprovativo), nomeadamente:
- 145.403,67 € de rendimentos do seu trabalho ;
- 62.104,00 €, por sua conta ;
- 159.800,00 €, de arrendamentos da fracção habitacional,
num total de 337.508,33 €, a que acresce ter pago, ainda, o montante de 7.481,96 € da sua conta pessoal do BBVA ao anterior proprietária da casa adquirida.
Efectivamente, existia uma outra conta bancária solidária, sedeada no BBVA, utilizada para pagamento das despesas familiares e outras, durante o período em que viveu em união de facto com o Autor, a qual era apenas movimentada por si, sendo a única a creditar dinheiro na mesma, fruto da actividade profissional que sempre desenvolveu durante o período de vivência em união de facto. Ressalvou, igualmente, ter efectuado pagamentos com recurso à conta da sociedade de que era e é sócia-gerente (COFIREP).
Acrescentou que a garagem foi adquirida apenas em seu nome, servindo de apoio à habitação a si pertencente, ainda que fosse essencialmente utilizada pelo Autor, para estacionamento do seu veículo.
Nega dever qualquer quantia ao Autor decorrente da aquisição da sua habitação, afirmando tê-la pago com dinheiro seu, pois depositou na conta solidária do BCP, na qual eram debitadas as prestações, montante mais do que suficiente ao pagamento do empréstimo do banco, sendo que o Autor nunca foi chamado ao pagamento daquele mútuo bancário para a aquisição de tal fracção, a título de fiador.
Relativamente ao empréstimo pessoal, considera que são ambos devedores solidários do mesmo, mas que sempre contribuiu para o pagamento das prestações, quer mediante depósitos directos na conta, quer mediante acerto de contas com o Autor.
Acrescenta que os valores depositados na conta solidária são de ambos, em igual medida, pelo que, sendo ambos devedores solidários de tal mútuo, sendo titulares solidários da conta bancária donde as prestações são descontadas e contribuindo ambos com valores creditados na conta, nada há que entregar, de parte a parte, relativamente ao mesmo, invocando o prescrito no artº. 516º, do Cód. Civil.
Nega, assim, e por fim, a existência de qualquer direito de regresso ou enriquecimento sem justa causa que tutele a pretensão do Autor. 
Em resposta, na réplica apresentada, o Autor começou por referenciar ter efectuado para a conta no BBVA inúmeros movimentos/transferências, que encontram correspondência num movimento de saída nos extractos bancários da conta do BCP Millenium.
No que concerne aos alegados valores depositados pela Ré na conta do Millenium BCP, na qual eram debitadas as prestações de amos os mútuos bancários, aduziu o seguinte:
- a verba de 105.562,50 €, depositada por DM…, era dinheiro a si pertencente, e não dinheiro da Ré, que recebeu quantia igual na sua conta BBVA, proveniente de um negócio de venda do imóvel do qual eram arrendatários ;L
- a quantia de 12.500,00 €, proveniente do filho da Ré (M…), resultou de um reembolso ao Autor, por parte daquele, relativamente a um adiantamento que lhe havia efectuado ;
- o montante de 6.900,00 €, proveniente da seguradora como indemnização pela perda total do veículo acidentado da filha da Ré (Ma…), teve como contrapartida o facto do Autor ter assumido o pagamento do leasing do carro novo da mesma filha, no montante total de 10.200,00 €, tendo o Autor vindo a suportar a quantia excedente de 3.300,00 € relativamente àquele valor depositado ;
- os valores de 10.500,00 € e 24.704,66 €, resultaram da venda de carrinhas Audi, que eram carros familiares que o Autor pagou, directamente ou através das empresas de grupo de que era sócio.
No final dos planos de financiamento (leasing), os automóveis eram registados em nome da Ré, sendo que tal dinheiro não lhe pertencia ;
- as quantias de 1.500,00 € e 6.000,00 €, de depósitos da filha da Ré (Mt…), trata-se do pagamento de uma dívida que tal filha e marido (NT…) tinham para com o Autor, no total de 7.500,00 € ;
- os alegados depósitos das rendas da casa da Lapa tinham como contrapartida a saída de valores para pagamento das rendas nas casas onde o agregado familiar residia, com saldo manifestamente negativo para o Autor em quase 60.000,00 €.
Acrescentou, ainda, que os reclamados valores dos seguros estão indexados aos empréstimos contraídos para a aquisição da fracção e da garagem (crédito imobiliário multiriscos e crédito habitação vida).
Por fim, referenciou que mesmo após a separação ocorrida, em Outubro de 2011, a Ré continua a não depositar qualquer quantia na conta onde são debitadas as prestações do empréstimo da fracção onde reside, sendo o Autor quem continua a provisionar tal conta, para pagamentos dos empréstimos destinados à aquisição da fracção e garagem, dos seguros dos empréstimos e do seguro de saúde da Ré e filho comum.
Na sentença apelada ajuizou-se, basicamente, nos seguintes termos:
Enunciou-se que a primeira questão consiste em aferir se da factualidade apurada extraem-se os pressupostos que condicionam o exercício do direito de regresso que assiste ao obrigado solidário.
Equacionou-se se estaríamos perante uma situação de direito de regresso ou de sub-rogação, enunciando-se, na análise dos interesses passivos, que ao fiador e ao codevedor que pretendam exercer o direito de regresso incumbirá a prova:
a) Da sua qualidade ;
b) Do pagamento que reclamam ter efectuado.
Incumbindo, por sua vez, à contraparte a prova das excepções, nomeadamente:
a. A efectivação de prestações idênticas – pagamento ;
b. A existência de convenção, expressa ou tácita (mas concludente), do afastamento da solidariedade nas relações passivas.
In casu, a Ré excepciona o pagamento, alegando que efectuou prestações de montante superior ao que foi pago aos mutuantes, para a conta da qual eram debitadas as prestações bancárias referentes aos mútuos.
Ora, provou-se que a Ré efectuou, entre 1994 e 1996, depósitos na conta do Millenium BCP que, em conjunto, ascenderam a 344.720,95 €, e que em 2005, por conta de um serviço prestado a um terceiro, este efectuou um depósito, na mesma conta, no valor de 105.562,50 €, num total de 450.282,95 €. Ou seja, a Ré excepciona o pagamento e prova, efectivamente, ter feito pagamentos.
Por sua vez, o Autor não logrou associar tais depósitos (pagamentos) a outras obrigações que a Ré tivesse para consigo, limitando-se a assinalar que são anteriores ao mútuo, assim concluindo que não relevam para estes efeitos.
Todavia, acrescenta, a fracção habitacional adquirida foi sendo preparada para obras e paga anteriormente a ter sido contraído o mútuo bancário, coincidindo os depósitos da Ré com essa altura, pelo que mostra-se razoável concluir não só pela identidade (ou, pelo menos, compatibilidade) das prestações, como pela similitude da causa das mesmas.
Aduz-se na mesma sentença que, ainda que assim não se entendesse, resulta não ter o Autor demonstrado que efectuou o pagamento com numerário seu, atenta a fungibilidade do dinheiro e os significativos depósitos com que a Ré reforçou a conta na qual foram debitadas as prestações em apreço.
Determinando, assim, a falência na verificação de um dos dois pressupostos estruturantes do exercício do direito de regresso.
Adrede, acrescenta-se que, tendo sido disponibilizado ao Autor moramente suficiente para a liquidação dos mútuos em equação, e optando este por não o fazer, mas antes disponibilizando de tal liquidez, considera-se que, de modo tácito, foi afastada entre as partes a relação devedor/garante, pois a distribuição de utilidades provenientes dessa relação já se encontrava equitativa. Efectivamente, considera-se que entre 1994 e 1996 e em 2005, a Ré depositou na conta movimentada a débito apenas pelo Autor, na qual eram depositadas as prestações bancárias – conta do Millenium BCP -, montante global que ultrapassa o valor do pedido e, por conseguinte, do total das prestações que o Autor garantiu.
Ora, idêntico raciocínio é válido para os codevedores principais, no que tange ao mútuo contraído em 2008 e ao invocado direito de sub-rogação, que antes deverá ser enquadrado e considerado em sede do direito de regresso.
Donde se conclui pelo total não preenchimento dos pressupostos constitutivos dos direitos de regresso invocados, conducente a juízo de total improcedência do pedido principal.
Relativamente ao petitório subsidiário, a sentença (ora recorrida) começou por referenciar os princípios da liberdade contratual e da autonomia privada vigentes no âmbito da união de facto, evidenciando a relevância, mesmo na apreciação dos pressupostos do enriquecimento sem causa, da necessidade de interpretar a vontade negocial, ou seja, dilucidar o que os membros quiseram, isto é, olhando para os seus assumidos comportamentos existe a necessidade de aferir acerca do elemento volitivo que determinou a contracção de determinada obrigação e a boa-fé negocial.
Seguidamente, após enunciar os pressupostos do enriquecimento sem causa, bem como as distintas situações abrangidas pelo conceito/requisito de ausência de causa justificativa – casos em que nunca existiu causa justificativa para a deslocação patrimonial ; casos em que, embora existindo inicialmente, tal causa deixou de existir ; casos em que a deslocação patrimonial teve em vista um determinado efeito que não se verificou -, considerou as dificuldades na aferição do preenchimento deste.
Considerou-se, então, a cessação da união de facto como causa justificativa para estes efeitos, nomeadamente por referência ao preenchimento da 2ª parte, do nº. 2, do artº. 473º, do Cód. Civil, no segmento “o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir”, funcionando a figura da obrigação natural como factor corrector ou de moderação.
Seguidamente, analisou-se a questão de saber quais os valores (despesas, encargos, contribuições) a contabilizar para os cálculos a efectuar, o que se articulou com as figuras das obrigações naturais e do abuso de direito.
E, concluiu-se no sentido de que as prestações contributivas oriundas da comunhão de vida resultante da união de facto enquadram-se no cumprimento de deveres morais de entreajuda e partilha de recursos. Ou seja, o que é prestado a título de cooperação e assistência para a economia comum da união de facto é insusceptível de repetição, nos termos do artº. 403º, do Cód. Civil, tratando-se do cumprimento de um dever de ordem moral e social. 
Na prossecução do juízo exposto, considerou-se acerca da necessidade de aferir o que, no âmbito da vivência em união de facto, fica fora das obrigações naturais, ou seja, do dever moral e de justiça, entendendo-se que, em princípio, tal ocorre com as despesas significativas que não se prendam com a subsistência do agregado.
Ressalvou-se, contudo, que algumas contribuições, apesar de serem judicialmente exigíveis, por não estarem a coberto do regime das obrigações naturais, não são, todavia, repetíveis, por tal reivindicação traduzir abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
Procurou-se, então, aferir acerca do motivo/causa pelo qual, após 2005, data do último depósito “por conta” da Ré na conta do Millenium BCP, sensivelmente a meio do plano prestacional, o Autor continuou a assegurar o pagamento das prestações. Equacionou-se que tal causa poderá ter sido:
a. A união de facto (a expectativa da manutenção da união) ;
b. O valor global recebido da Ré, que ultrapassou o valor peticionado ao Banco.
Assim, na ponderação da primeira situação, aferiu-se se, no contexto das partes, a cessação da união de facto deveria ser entendida como extinção da causa justificativa para estes efeitos.
Considerou-se, então, que o Autor, após a cessação da união de facto, continuou a suportar a referidas prestações de amortização dos mútuos bancários, bem como outras despesas da Ré e do filho comum, durante cerca de dois anos, sem lograr demonstrar (ou sequer alegar) que a teria avisado que iria cessar a assumpção de tal encargo e sem que lhe tivesse pedido contas.
Ora, perante tal comportamento, equacionou-se se o mesmo não determinava que o peticionado nesta acção devesse ser considerado abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, atenta a existência de um comportamento contraditório, concluindo-se em sentido afirmativo, na consideração da confiança que o comportamento do Autor transmitiu à Ré, em termos desta confiar no cumprimento integral das prestações por banda do Autor. Ou seja, com tal comportamento, o Autor revelou que não encarou a ruptura da união de facto como a cessação da causa que justificava o seu contributo para aquele agregado.
Por outro lado, de forma a aquilatar acerca do equilíbrio da redistribuição das utilidades percebidas um do outro, com vista a analisar as deslocações patrimoniais, enunciou-se o seguinte:
- o valor global peticionado, adicionado ao que o Autor despendeu em obras na habitação em 2009 (63.000,00 €) e às despesas correntes familiares e de férias entre 2003 e 2007 (52.100,00 €), perfaz 430.173,80 € ;
- tal quantia fica aquém do montante de 450.282,95 €, que a Ré depositou directamente e através do serviço prestado a DM… (não se contabilizando as rendas pagas pelos inquilinos da Ré na Rua …) ;
- as demais despesas invocadas pelo Autor inserem-se no âmbito do sustento do agregado ou em extras de que beneficiou, pelo que, sendo obrigações naturais, são irrepetíveis, não entrando nesta equação ;
- não ocorreu, assim,  um enriquecimento e consequentemente empobrecimento destes conviventes, pois ambos contribuíram de forma igualitária ou, pelo menos, não clamorosamente desproporcionada, para encargos familiares mantidos durante a vida em comum, usufruindo, de forma idêntica, daqueles fluxos patrimoniais.
De retorno ao supra aduzido, consignou, então, que o Autor comportou-se como se, no seu animus, o agregado em que se encontrava o seu filho fosse (continuasse a ser) família que o mesmo devesse proteger e ajudar, ou seja, comportou-se como se a causa da sua contribuição se mantivesse, ou como se tivesse para si que, em tempo, a Ré lhe tivesse depositado na conta valores suficientes para pagar antecipadamente os empréstimos bancários.
Criando, assim, com tal comportamento, uma situação objectiva de confiança num determinado comportamento e ponto de vista, nos quais a Ré terá, compreensivelmente, confiado. Pelo que, o comportamento contraditório ora revelado traduz os elementos constitutivos de uma situação de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
O que, caso se considerassem preenchidos os requisitos do enriquecimento sem causa (o que não se reconhece) sempre extinguiria o direito decorrente da aplicação daquele instituto. Ou seja, ainda que existisse um enriquecimento da Ré, suportado pelo empobrecimento do Autor, o que este não demonstrou, existiria uma causa para aquela conferida vantagem, consubstanciada na intenção do Autor de, conscientemente, e num espírito de generosidade, beneficiar o património da Ré, de modo a, eventualmente, preservar o agregado familiar do filho comum, não sendo conferida tutela jurídica ao seu posterior arrependimento.
Determinando, consequentemente, igual juízo de total improcedência relativamente ao pedido subsidiário, fundado no enriquecimento sem causa.
No que concerne ao pedido principal, em que está fundamentalmente em equação o direito de regresso invocado pelo Autor, veio este, na presente sede recursória, invocar, em resumo, o seguinte:
- A sentença apelada entendeu “não ser de aplicar o direito de regresso invocado pelo Autor porquanto “a Ré excepciona o pagamento e prova efectivamente que realizou pagamentos tal como lhe competia na repartição do ónus probatório”, (…) “tendo ainda em conta que um dos depósitos ascende ao dobro do que viria a ser pedido ao Banco” ;
- Todavia, tal como resulta da impugnação à matéria de facto apresentada, tal conclusão partiu de premissas erradas, devendo antes concluir-se, contrariamente ao ali exposto, “que o Autor logrou um pressuposto do direito de regresso por si invocado” ;
- Na mesma sentença questionou-se, ainda, acerca do “elemento volitivo do fiador durante a união, pelo que também por esta razão será de afastar o mesmo”, importando, todavia, “sublinhar que o direito de regresso invocado pelo Autor não se cingiu apenas à sua qualidade de fiador no empréstimo de 10/10/96. Estendeu-se, igualmente, à qualidade de codevedor no empréstimo de 10.07.08” ;
- Acresce que tal elemento volitivo quanto à actuação do Autor “como fiador ou como codevedor, sempre estaria provado, desde logo porque os pagamentos diziam respeito a amortizações de mútuos para aquisições de imóveis para a Ré, mas, sobretudo, porque, o Autor procedeu aos referidos pagamentos, quer durante a pendência da união de facto, quer já após a mesma ter cessado, quer mesmo – e mais importante – quer depois de já ter reclamado judicialmente o reembolso dos mesmos à Ré”, continuando ainda a fazê-lo no presente, no que se reporta ao empréstimo de 10/07/2008 ;
- Resultando, assim, tal elemento volitivo pode demais provado nos presentes autos ;
- Pelo que, provados que foram os pressupostos de que depende o direito de regresso, deveria a sentença recorrida ter “condenado a Ré a pagar ao Autor todas as prestações vencidas relativas aos empréstimos em apreço, bem como nas que se vencerem até integral pagamento e comprovadamente suportadas pelo mesmo”, pois, ao não o fazer, violou o disposto nos artigos 524º, nº. 1 e 644º, ambos do Cód. Civil – cf., Conclusões DD) a LL).
Na resposta apresentada, a Apelada defende o teor do decidido na sentença recorrida, transcrevendo-a parcialmente e aduzindo que bem concluiu no sentido de não estarem reunidos os pressupostos do direito de regresso ou da sub-rogação, reconduzindo a maioria da jurisprudência tal situação ao instituto do enriquecimento sem causa – cf., Conclusões contra-alegacionais 16 a 18.
Vejamos.
- Do DIREITO de REGRESSO e seus pressupostos
Estipulando acerca do direito de regresso no âmbito das obrigações solidárias (solidariedade entre devedores), prescreve o artº. 524º, do Cód. Civil que “o devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competir tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a estes compete”.
Anteriormente – artº. 516º, do mesmo diploma -, regulando acerca da participação nas dívidas e nos créditos, refere-se que “nas relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito”.
Refere Rodrigues Bastos [17] estabelecer o presente normativo, entre os devedores solidários, “um vínculo legal de reembolso, por virtude do qual cada devedor solidário está obrigado a custear a parte que lhe competir na dívida”, fundando-se “no vínculo de solidariedade que une os condevedores mas não pode efectivar-se enquanto um dos devedores não tenha satisfeito o direito do credor, não bastando, para esse efeito, que o credor reclame dele a prestação por inteiro”.
A obrigação é, desta forma, “solidária nas relações entre os devedores e o credor, mas não nas relações internas entre estes ; pagando a totalidade, o devedor só tem direito de regresso pela parte que pertença a cada um dos devedores”.
Desta forma, o direito de regresso “tem por conteúdo, em relação a cada um dos condevedores, a parte da sua responsabilidade no crédito”, sendo normalmente iguais as suas quotas, e só excepcionalmente diferenciadas.
Todavia, para que aquele direito nasça, é necessário, conforme legal imposição, “que o devedor satisfaça o direito do credor, não bastando que tenha sido interpelado para cumprir ou que haja mesmo constituído qualquer garantia especial a favor do credor” [18].
Desta forma, o devedor solidário que satisfaça o direito do credor tem direito de regresso relativamente a cada um dos condevedores pela quota respectiva, podendo estes, todavia, aquando do exercício do direito de regresso, invocar “os meios de defesa que lhes seria lícito opor ao credor”. Podem, assim, os condevedores “afastar o direito de regresso com fundamento, não só nos meios pessoais de defesa (…), como nos meios comuns, ainda que o devedor que cumpriu os não tenha oposto, sem culpa sua, ao credor (…)”.
Por outro lado, o próprio devedor interpelado, pode “ainda opor os meios pessoais de defesa, que tenha contra o próprio titular do direito de regresso (como seja a compensação da sua obrigação com o crédito que tenha contra ele)” [19].   
Relativamente à natureza jurídica da solidariedade e justificação do direito de regresso, referencia o mesmo Autor [20] que este é “um verdadeiro direito de compensação concedido ex vi legis ao condevedor que satisfaz o direito do credor”, cujas raízes provêm “do momento constitutivo da obrigação solidária”.
Efectivamente, ”embora cada um dos devedores, em face do credor, para tutela especial dos interesses deste, fique obrigado ao cumprimento de toda a prestação, também é certo que cada um deles, em regra, se obriga a concorrer com a sua quota parte para a totalidade da prestação devida. Nesse traço fundamental reside a distinção entre a obrigação solidária (plural) e a obrigação singular que, com o mesmo objecto, recaísse sobre um dos devedores”.
Todavia, apesar daquele momento constitutivo da obrigação solidária, o direito de regresso “só nasce no preciso momento em que o condevedor satisfaz o direito do credor para além da sua quota”.
O direito de regresso surge, deste modo, como “um direito novo, que se constitui na esfera do devedor solidário por efeito da satisfação, por cumprimento ou por outra causa, do direito do credor além da parte que internamente lhe competia. Este direito vincula os outros devedores solidários, que vêem constituir-se na sua esfera a correspondente obrigação de regresso” [21].
- Do DIREITO de SUB-ROGAÇÃO e seus pressupostos nas relações entre devedor e fiador
Prevendo acerca da sub-rogação nas relações entre o devedor e o fiador, prescreve o artº. 644º, do Cód. Civil, que “o fiador que cumprir a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida em que estes foram por ele satisfeitos”.
A sub-rogação, enquanto instituto reportada à transmissão de créditos e dívidas, encontra-se previsto nos artigos 589º a 594º, do mesmo diploma, estatuindo o artº. 589º, a propósito da sub-rogação pelo credor, que “o credor que recebe a prestação de terceiro pode sub-rogá-lo nos seus direitos, desde que o faça expressamente até ao momento do cumprimento da obrigação”.
Por sua vez, equacionando as situações de sub-rogação legal, aduz o artº. 592º, do mesmo diploma, que:
“1. Fora dos casos previstos nos artigos anteriores ou noutras disposições da lei, o terceiro que cumpre a obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver directamente interessado na satisfação do crédito.
2. Ao cumprimento é equiparada a dação em cumprimento, a consignação em depósito, a compensação ou outra causa de satisfação do crédito compatível com a sub-rogação”.
Através da sub-rogação equacionada no transcrito artº. 644º, “o fiador que pagou substitui-se ao credor, nos direitos que este tinha contra o devedor”, sendo que esta sub-rogação legal já seria reconhecida nos quadros do nº. 1, do artº. 592º, igualmente transcrito.
Assim, “o pagamento do débito garantido por parte do fiador opera uma modificação objectiva na relação jurídica a que se referia a garantia, na qual muda, não o conteúdo, mas a pessoa do credor, porque o fiador sucede na relação principal assumindo a posição do credor satisfeito, assim se tornando credor do devedor garantido, nas mesmas condições e nos limites em que era o credor principal” [22].
Ou seja, por outras palavras, o “crédito transfere-se para ele, com todas as garantias e acessórios (cfr. arts. 582º, aplicável por força do art. 594º e 593º)”, pelo que o direito do fiador “não é, portanto, um direito próprio de regresso, como resultava do artigo 883º do Código de 1867. Não é um direito novo, mas o direito do credor que se transmitiu por sub-rogação, em consequência do cumprimento”.
Pelo que, “ a redução da posição do fiador que cumpre a obrigação a uma simples sub-rogação legal, além de outros efeitos, elimina todas as dificuldades que os autores têm encontrado para fundamentar (através do mandato, da gestão de negócios, etc.) o direito de regresso que pretendiam atribuir-lhe. O fiador fica investido na posição do credor originário, não só porque realizou o resultado prático do cumprimento, mas também porque tinha um interesse (jurídico) legítimo no cumprimento efectuado” [23].
Ora, tal diferenciação “entre a concessão dum direito novo de regresso e a transmissão do crédito anterior (apesar da satisfação dada ao direito do credor) exprime-se num duplo aspecto, do maior interesse teórico e prático”, constituindo um deles o reconhecimento de que “para o fiador transfere-se, não apenas o direito à prestação principal, mas todos os atributos ou qualidades do direito encabeçado no credor” [24].
Por outro lado, “tratando-se de um fenómeno de transmissão de direito e não do surgimento na esfera jurídica do fiador de um novo direito, designadamente de um direito de regresso contra o devedor, o devedor pode opor ao fiador os mesmos meios de defesa de que dispunha face ao credor” [25].
Procedendo à diferenciação entre as duas figuras jurídicas – sub-rogação e direito de regresso -, referencia Antunes Varela [26] que a primeira “é uma forma de transmissão do crédito, enquanto o segundo constitui um crédito novo, que nem sempre tem o mesmo objecto do direito extinto”.
A confusão entre ambos os institutos é frequente, mesmo em sede dos textos legais, ocorrendo ambos os fenómenos “em resultado do cumprimento de uma obrigação”, sendo que “em vários sistemas jurídicos, nem existe a distinção”.
Todavia, entre nós, “o direito de regresso é um direito novo, que surge no contexto das obrigações solidárias sempre que um devedor satisfaz o direito do credor além da parte que internamente lhe compete, e não o resultado de uma transmissão, ainda que de fonte legal, de um direito de crédito primitivamente constituído noutra esfera jurídica – a do credor originário” [27].
Exposto o presente enquadramento jurídico, analisemos acerca da reclamada aplicabilidade do instituto do direito de regresso (ou da sub-rogação, caso este se revele com maior acuidade jurídica), tendo fundamentalmente em análise os dois mútuos referenciados nos autos, com base nos quais o Autor fundamenta a demanda.
Não se olvidando que é esta a causa de pedir que subjaz ao petitório principal deduzido, tendo por base os contratos de mútuo bancário outorgados, finalidade destes e vinculação nos mesmos assumida pelo ora Autor.
Provou-se que Autor e Ré viveram em união de facto (como marido e mulher) até Setembro de 2010, tendo-se iniciado tal vivência em comum desde data não anterior a 1992, nem posterior a Março de 1994, o que perfaz período necessariamente superior a 16 anos – facto 1.
O petitório principal accionado pelo Autor convivente tem por base dois contratos de mútuo bancário outorgados durante tal vivência em união de facto, pelo, atenta a sua necessária destrinça e diferenciação, serão tratados em separado.
Relativamente ao mútuo datado de 10/10/1996:
Provou-se que na pendência da vida em comum, como se casados fossem, Autor e Ré decidiram adquirir um apartamento, de forma a servir, como serviu, de habitação dos dois, do filho de ambos e dos três filhos da Ré. E que, pese embora a intenção das partes de que o imóvel ficasse a integrar o património do agregado familiar, pelo facto de o Autor querer proteger o património familiar do risco inerente à sua actividade empresarial, foi decidido que o apartamento da Rua … seria adquirido em nome da Ré – cf., factos 13 e 14.
 Na prossecução do decidido, provou-se que mediante escritura pública de compra e venda outorgada em 10/10/1996, a Ré adquiriu a fracção autónoma designada pela letra «C» que corresponde ao … andar do prédio urbano situado na Rua …, números … e …-A, em Lisboa, pelo preço de vinte e cinco milhões de escudos (€ 124.699,47).
Pela mesma escritura, foi celebrado um contrato de mútuo em que intervieram o Banco de Investimento Imobiliário, SA. [do grupo Millennium BCP] na qualidade de mutuante, a Ré, na qualidade de mutuária e o Autor na qualidade de fiador e principal pagador, em virtude do qual foi emprestado à Ré, com a obrigação de restituição, o montante de vinte e oito milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a €142.157,40), sendo vinte e cinco milhões de escudos (correspondentes a €124.699,47) destinados ao pagamento da aquisição da fracção acima referida e os restantes três milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a € 17.457.93) destinados ao pagamento de obras de beneficiação na mesma fracção.
Tal empréstimo foi concedido pelo prazo de dezassete anos a contar de 15 de Outubro de 1996 e seria amortizado em duzentas e quatro prestações mensais, de capital e juros, tendo a primeira vencimento no dia 15 de Novembro de 1996, sendo que o pagamento das prestações de amortização da dívida, capital e juros atinentes a tal empréstimo foi sempre efectuado por débito directo da conta titulada pelo Autor no Banco Millennium BCP, com o número …, a qual passou a ser conjuntamente titulada por A. e Ré a partir de 27.05.1996 – cf., factos 2 a 5.
A última prestação de tal mútuo foi debitada em 16/09/2013, tendo, até essa data, sido pago o montante global de 214.031,20 €, a título de capital e juros – cf., factos 9 e 9.1.
Provou-se, por fim, nunca ter sido o Autor chamado ao pagamento de tal empréstimo, a título de fiador, em virtude da conta na qual as prestações eram debitadas sempre ter tido cobertura – cf., facto 34.
Constata-se do exposto que, independentemente dos fluxos financeiros que permitiram, ao longo do período de vigência do mútuo, a sua liquidação atempada, com aferição de quem provisionou a conta bancária onde as prestações mensais eram debitadas (conta do Millenium BCP, identificada em 5), a eventual assumpção do encargo por parte do convivente masculino, ora Autor, nunca foi assumida, em termos técnicos e objectivos, a título de fiador. Ou seja, não ocorreu qualquer situação de incumprimento documentada que tenha despoletado o chamamento pessoal do Autor fiador, perante o banco credor, enquanto garante da satisfação do direito de crédito.
Reconhecer-se-á, certamente, que à eventual e alegada assumpção de responsabilidade no pagamento por parte do Autor não foi certamente alheia a sua qualidade de garante na satisfação do mútuo contraído.
Todavia, o que se constata e decorre é que a afirmada responsabilidade, e consequente pagamento das prestações devidas perante a entidade credora, não decorreu por accionamento do Autor enquanto fiador, na decorrência de uma situação de incumprimento da mutuária, de forma a concluir-se que o Autor cumpriu a obrigação na qualidade de fiador, assim ficando sub-rogado nos direitos do credor, nos quadros do analisado artº. 644º, do Cód. Civil.
Donde decorre que, independentemente da idoneidade do instituto ou mecanismo jurídico equacionável – sub-rogação ou direito de regresso -, constata-se que o eventual ressarcir da posição patrimonial do Autor não encontra tutela jurídica naqueles quadros normativos, antes devendo ser indagada e ponderada noutra sede.
O que nos conduzirá, relativamente à problemática ressarcitória/compensatória, decorrente do presente mútuo, para os quadros do pedido subsidiário, onde se tratará acerca dos efeitos patrimoniais da dissolução da união de facto, com eventual e putativo recurso, nessa sede, ao mecanismo jurídico do enriquecimento sem causa.
Relativamente ao mútuo datado de 10/07/2008:
Ainda durante a pendência da mesma vivência em união de facto, provou-se que, por escritura pública datada de 10/07/2008, a Ré adquiriu a fracção autónoma designada pela letra «U» que corresponde à garagem em estacionamento coberto correspondente ao prédio urbano sito na Rua …, número …, em Lisboa, pelo preço de € 36.375,00.
E que, pelo mesmo instrumento notarial, o Banco Comercial Português, SA, na qualidade de mutuante, emprestou à Ré e ao Autor, na qualidade de mutuários, com obrigação de restituir, o montante de setenta e cinco mil euros (€75.000,00), tendo tal empréstimo sido concedido pelo prazo de cento e noventa meses a contar do dia 30 de Julho de 2008 e seria amortizado em cento e noventa prestações mensais, de capital e juros, a primeira com vencimento a 30 de Agosto de 2008 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes – cf., factos 6 a 8.
Provou-se, ainda, que o presente mútuo apenas terá o seu terminus em 30/05/2024, e que, em 06/04/2016, havia sido pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros, tendo as prestações deste mútuo sido igualmente debitadas na conta bancária identificada em 5 – cf., factos 9 e 9.2.
Por fim, ainda se provou que tal empréstimo, no valor de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), fora concedido a pensar na compra de duas garagens, cada uma no valor de € 37.500,00, mas foi aplicado apenas na aquisição de uma garagem, pelo indicado valor de 36.375,00 €, tendo o remanescente sido integrado na conta bancária do BCP identificada no facto 5 – cf., factos 10 e 30 -, não se provando que tal remanescente tenha sido utilizado para reforço do orçamento familiar, nomeadamente, para pagamento de despesas extraordinárias como foram férias de Inverno da neve e férias de Verão no Algarve – cf., facto 3 não provado.
Ora, relativamente ao presente mútuo, Autor e Ré figuram como mutuários perante a entidade bancária mutuante, sendo solidária a sua responsabilidade.
Pelo que, caso se conclua ter sido o Autor a satisfazer o crédito perante a entidade credora, para além da parte que lhe competia, terá direito de regresso perante a Ré condevedora, na parte concernente à responsabilidade desta, nos quadros do artº. 524º, do Cód. Civil. Ou seja, na decorrência do enunciado vínculo legal de reembolso, a Ré, enquanto devedora solidária, estará obrigada a custear a parte que lhe competir na dívida.
No que se refere á quota-parte de responsabilidade no crédito de cada um dos mutuários solidários, a factualidade apurada não permite afastar a presunção inscrita no transcrito artº. 516º, do Cód. Civil, da qual decorre uma presunção de igualdade de comparticipação na dívida. Efectivamente, a factualidade apurada, atenta até a diferenciada aplicação que mereceu a quantia disponibilizada pela mutuária, pois sensivelmente metade foi aplicada na aquisição de uma garagem, em nome da Ré e que apenas ingressou no património desta, enquanto a demais metade ingressou na conta bancária que, ainda que solidária, era fundamentalmente movimentada pelo Autor, não permite formular qualquer juízo de diferenciação na participação da dívida, nem resulta da mesma factualidade que só um deles devesse suportar o encargo decorrente da mesma dívida mutuária. 
Ora, sabe-se que:
- até 06/04/2016, relativamente ao mútuo em equação, foi pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros, tendo as prestações deste mútuo sido debitadas na conta bancária identificada em 5 – facto 9.2 ;
- era nesta conta que o Autor recebia o seu vencimento e outros rendimentos – facto 11 ;
- a  Ré apenas passou a ser cotitular desta conta solidária do Millennium BCP a partir de 27 de Maio de 1996, sendo, no entanto, que, a débito, apenas a movimentava com o uso de cartão de crédito associado e que, a crédito, apenas a movimentou nos termos infra descritos nos pontos 27 a 28 – facto 12 ;
- os movimentos de crédito para tal conta enunciados no facto 27, ocorreram entre 1993 e 1995, ou seja, mais de 13 anos antes da contracção do mútuo ora em equação, no valor global de 39.841,17 € - facto 27 ;
- e, apesar disso, logo após a disponibilização da quantia referente ao mútuo contraído em 10/10/1996, o Autor emitiu e entregou à Ré um cheque sacado sobre a conta identificada em 5, datado de 14/10/1996, no valor de 7.500.000$00 (contravalor de 37.409,84 €), que esta depositou na conta do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, identificada em 19 -  facto 27.3 ;
- a quantia referenciada em 27.1, transferida em 31/10/2005, é irrelevante para a ponderação em apreciação, atenta a prova da sua pertença ao Autor – facto 27.4 ;
- por sua vez, os valores depositados na mesma conta do BCP, entre 2001 e 2009, provenientes dos arrendamentos da fracção (e garagem) da Ré, identificadas em 2 e 6, no montante total de 207.789,00 €, tiveram como correspondente que, em idêntico período, tenha sido suportado o pagamento de rendas, debitadas na mesma conta, no montante de €265.236,00 - factos 28 e 55 -, ou seja, em montante ainda superior ao depositado.
Ora, na ponderação de tal factualidade resulta claro ter o Autor logrado provar que, na qualidade de devedor (condevedor) relativamente ao identificado mútuo, de solidária responsabilidade, liquidou e pagou, até 06/04/2016, o indicado montante global de €44.417,89, a título de capital e juros.
Pelo que, estando-se perante igualitária quota de responsabilidade, a Ré, condevedora, será, prima facie, responsável pela liquidação de metade do valor pago, ou seja, da quantia, até àquela data liquidada, de 22.208,95 €.
E, só assim não será caso tenha logrado provar, como excepção, ter efectuado pagamentos de igual montante, ou seja, a efectivação de prestações idênticas, ou então que existisse convenção (acordo), expressa ou tácita (mas necessariamente concludente e evidenciadora), de que só o Autor deveria suportar o encargo de tal dívida, isto é, que nas relações passivas internas ocorria afastamento da regra da solidariedade.
Com efeito, exercido o direito de regresso, por parte do condevedor que tenha satisfeito o direito do credor, é legalmente admissível que o devedor accionado oponha os meios de defesa que tenha contra o titular daquele direito de regresso, entre os quais figura a alegação de que satisfez, junto deste, o pagamento das prestações, na quota-parte da responsabilidade que lhe incumbe.
Ora, não evidencia a factualidade provada ter ocorrido tal pagamento, ou seja, que a Ré tenha efectuado prestações direccionadas ao pagamento da sua quota parte de responsabilidade no mútuo contraído.
E, por outro lado, da mesma factualidade nada conduz a considerar-se que tenha existido um qualquer acordo entre os devedores mutuários (Autor e Ré), no âmbito das relações internas, no sentido de ser apenas aquele o responsável pelo pagamento do encargo da dívida.
Acresce que podia questionar-se se tal acordo, podendo ser expresso ou tácito, nos termos supra referenciados, não era susceptível de depreender-se do facto de, mesmo após a cessação da união de facto, o Autor continuar a proceder ao pagamento de tal mútuo – cf., factos 68 e 71.
Todavia, não cremos que tal determine ou evidencie situação concludentemente reveladora de que, no âmbito das relações internas entre os devedores, apenas o Autor seria responsável pelo suportar do encargo da dívida, pois, desde logo, atenta a obrigação que o Autor assumiu perante o banco credor, na qualidade de (con)devedor, o seu eventual entrar em incumprimento trar-lhe-ia custos acrescidos, potencial afectação do seu património e um claro questionar da sua idoneidade e reputação, enquanto cliente cumpridor e de imaculado registo, junto da entidade bancária credora.
Por fim, conforme melhor se evidenciará infra, tal factualidade também não traduz ou revela que, ocorrendo a contracção de tal mútuo na vigência da vivência em comum dos unidos ou conviventes, decorra da ponderação da distribuição de utilidades entre estes, ou da aferição do contributo e cada um deles para os encargos comuns daquele vivência, uma situação tradutora ou reveladora de que a Ré compensou ou provisionou o património do condevedor Autor de um activo suficiente e destinado à assumpção da sua responsabilidade no solver do mútuo solidário contraído.
Donde decorre, cremos, juízo de procedência do invocado direito de regresso do Autor perante a Ré condevedora solidária, sendo esta responsável pelo pagamento, a título de direito de regresso, das seguintes quantias, referentes ao mútuo identificado nos factos provados 7 e 8 (datado de 10/07/2008):
- O montante de 22.208,95 € (vinte e dois mil duzentos e oito euros e noventa e cinco cêntimos), correspondente a metade do valor pago, a título de capital e juros, através de prestações de amortização, até 06/04/2016 ;
-  A quantia que, na proporção de metade, tenha sido ou venha a ser paga, exclusivamente pelo Autor, enquanto condevedor, a idêntico título de amortização (capital e juros), computada desde aquela data e até à sua total liquidação (30/05/2024) ;
- Juros moratórios, vencidos e vincendos, sobre tais quantias já pagas, desde a citação e até integral pagamento.  
O Autor peticiona, ainda, o pagamento da quantia total de 44.752,00 €, por si integralmente paga, relativa a seguros obrigatórios indexados aos mútuos supra identificados – cf., o artº. 21º da petição inicial e alínea c) do petitório accional principal.
Na contestação apresentada, a Ré não questiona propriamente a existência de tal despesa, apenas referenciando que aquele não especifica que seguros são, nem junta quaisquer documentos. Acrescenta, ainda, não ter tirado qualquer usufruto dos mesmos, nem deles beneficiar, pelo que nada deve ao Autor a tal título – cf., artigos 61º a 64º da contestação.
Em sede de réplica, o Autor refere que se a Ré tivesse a mínima noção dos custos subsidiários do empréstimo da fracção, deveria saber-se tratar-se do seguro com pagamento de prémio mensal, com a definição Crédito Imobiliários Multiriscos e seguro Crédito Habitação Vida, com pagamento de prémio anual, no mês de Outubro, os quais estão indexados aos empréstimos contraídos para a aquisição da fracção e da garagem.
Acrescenta que o seguro cobre o risco de incumprimento dos devedores, em caso de morte ou lesão grave de onde resulte a incapacidade – cf., artigos 195º a 198º.
Conforme facto 68, provou-se ter o Autor suportado, ainda, um seguro de saúde para a Ré e para o filho de ambos através da conta solidária que ainda se mantém no BCP e que foi provisionando à medida dos compromissos que se mantiveram indexadas a essa conta (empréstimo da fracção, empréstimo da garagem, seguros dos empréstimos e seguros de saúde da R. e do filho comum).
Ou seja, inquestionado que está o pagamento de tais seguros, desconhece-se, todavia, qual a natureza dos mesmos, montantes efectivamente liquidados e a sua referência a um ou a outro dos mútuos em consideração.
O que determina, por recurso ao quadro legal inscrito no nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, a condenação da Ré, na quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente a metade das quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo identificado nos factos 7 e 8.
Não sendo a falta de liquidez da presente vertente do crédito, fundado no direito de regresso, imputável à Ré devedora, não são devidos juros moratórios sobre a mesma, atento o prescrito no 1º segmento do nº. 3, do artº. 805º, do Cód. Civil.
- Do ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA e seus pressupostos
Nos termos supra expostos, avancemos, então, para a apreciação do pedido subsidiário, tendo por pressuposto a aferição dos efeitos patrimoniais associados á dissolução da união de facto, e sua apreciação fundada no instituto do enriquecimento sem causa.
Referencia o Apelante que a decisão apelada, apesar de reconhecer que o instituto do enriquecimento sem causa tem sido adoptado maioritariamente pela doutrina e jurisprudência nos casos de cessação de uniões de facto, afasta-se da sua aplicabilidade, por razões que entende não serem aplicáveis à situação sub júdice.
Aquela decisão, após enunciar os requisitos do enriquecimento, considera que ainda que fossem provados tais pressupostos, e pese embora se reconhecer que na jurisprudência se entende que com a cessação da união de facto cessa a causa justificativa, contudo, in casu, não seria de aplicar este regime por o Autor ao reclamar da Ré os custos com os encargos dos empréstimos ter actuado em manifesto abuso de direito.
Por outro lado, na mesma sentença apelada, questiona-se o motivo “pelo qual o Autor continuou a partir de 2005 -data em que no entender do tribunal foi feito o último depósito “por conta” da Ré na conta BCP- sensivelmente a meio do plano prestacional, a assegurar as prestações. Se essa causa foi o valor recebido da Ré se a expectativa da manutenção da união de facto. Neste último caso ter-se-ia de concluir que a causa não tinha cessado e como tal não estariam preenchidos os requisitos do enriquecimento sem causa.
Todavia, acrescenta ser estranho que na mesma decisão não se coloque a possibilidade mais evidente de que o Autor continuou a assegurar os pagamentos das prestações, mesmo após a cessação da união de facto, pela simples razão que era fiador num empréstimo e codevedor no outro.
Pelo que, acrescenta, se mais não fosse, se o Autor reclama à Ré o reembolso dos encargos suportados pela amortização dos mútuos e continua a pagar os mesmos, certamente que não é porque os não queira receber ou o faça na expectativa da manutenção da união?!!, mas antes pela simples razão que se não tivesse amortizado aqueles empréstimos arriscava-se – como continua a arriscar-se se não pagar - a ser executado pelo banco e a ver penhorados todos os seus bens!!!.
Por outro lado, aduz, no que concerne às despesas que o Autor continuou a suportar com a Ré e com o filho do Autor, invocarem-se as mesmas, como argumento contra o Autor, é, além de incompreensível, completamente desumano, considerando ter a decisão recorrida violado o disposto no artº. 473º, do Cód. Civil – cf., conclusões MM) a VV).
Nas contra-alegações apresentadas, defende a Apelada a bondade do decidido, transcreve partes da sentença apelada e considera ser manifesto que por um lado a comparticipação da Recorrida foi superior à do Recorrente para a vida em comum, e por outro lado, em momento algum o Recorrente exigiu ou interpelou a Recorrida para reembolsar qualquer quantia, pelo que é manifesta a improcedência do presente recurso na esteira da jurisprudência maioritária, não merecendo a douta decisão recorrida o menor reparo – Conclusões 18 e 25 a 27.
Analisemos.
Sem definir propriamente o que é união de facto, o nº. 2, do artº. 1º, da Lei nº. 7/2001 [28] enuncia que “a união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”.
Tal definição sintoniza com o prescrito no artigo 2020.º do Código Civil que estabelece que “1. Aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges (...)”.
Através da legal remissão constata-se, desde logo, que a procura da legal definição se efectua por referência ao casamento, estando-se, porém, perante duas realidades bem diferenciadas.
Assim, “a maior diferença entre a união de facto e o casamento é que este último se desenvolve dentro de um quadro legal predefinido, resultante do vínculo formal que é o matrimónio, enquanto que na união de facto não existe qualquer quadro legal que enforma a relação entre os membros”.
Não podendo ser definida pelo seu período de duração, que apenas terá relevância na atribuição de efeitos jurídicos, podemos defini-la como uma “relação entre duas pessoas desenvolvida em comunhão de mesa, leito e habitação, sem o vínculo formal do casamento, mas em condições análogas às dos cônjuges, formando-se “logo que os sujeitos vivam em coabitação, não sendo necessária uma cerimónia ou qualquer outra forma especial” [29].
Tal figura goza de plena tutela constitucional, conforme decorre do artº. 36º, nº. 1, da Constituição da República Portuguesa, através do qual “reconhecem-se e garantem-se (…) os direitos relativos à família, ao casamento e à filiação” [30], acrescentando que a “Constituição não admite todavia a redução do conceito de família à união conjugal baseada no casamento, isto é, à família «matrimonializada»”.
Desta forma, aquele normativo constitucional “atribui dois direitos, o direito de constituir Família e o direito de contrair casamento. O legislador constituinte nesta norma separa a ideia de constituição da família da ideia de casamento. A constituição da família não está dependente de se contrair matrimónio, deixa o legislador a janela aberta para se poderem inserir outras realidades familiares na consagração do art.º 36 nº1. Família adotiva, família natural, famílias monoparentais, comunidades familiares com filhos nascidos fora do casamento, famílias formadas por irmãos e irmãs, famílias constituídas por união de facto. Uma realidade − (constituir família) − não está dependente da outra − (contrair casamento) −, podendo constituir uma família sem contrair casamento (…)” [31].
Conferindo-se relevância constitucional a todos os modos de constituição de família, aduzem Gomes Canotilho e Vital Moreira [32]que “a clara delimitação do nº1 entre o direito a constituir família e o direito a celebrar casamento permite, desde logo, alargar a família a comunidades constitucionalmente protegidas («famílias monoparentais», apenas com «mãe e filhos» ou «pai e filhos», «comunidades familiares com filhos nascidos fora do casamento», «famílias formadas por irmãs ou irmãos», «uniões de facto»)”.
Estabelecendo-se, deste modo, uma noção ampla de relação familiar, “o art.º 36º, ao dispor sobre a família, casamento e filiação, não está a restringir a relação familiar à família proveniente do casamento, mas separa os conceitos, atribuindo direitos diferentes, o direito de constituir família, podendo esta família ser constituída (representada) de várias formas (famílias matrimoniais, famílias monoparentais, comunidades familiares com filhos nascidos fora do casamento, famílias constituídas por irmãos e irmãs, uniões de facto), e o direito de contrair casamento, como uma forma para a constituição de uma relação familiar” [33].
O nosso ordenamento jurídico não regula ou prevê qualquer regime de bens aplicável à união de facto, o que determina um adensar da problemática, a nível patrimonial, quanto esta tem o seu epílogo.
Com efeito, fruto “da convivência em comum, muitas vezes ao longo de muitos e muitos anos, torna-se difícil identificar, em concreto, aquilo que pertence a cada um dos membros quando se chega a um momento de rutura, existindo dificuldades no que toca à partilha de bens e também no que concerne à liquidação de dívidas”.
Efectivamente, através da “comunhão de vida que é gerada através da união de facto, ambos os membros vão, eventualmente, contribuir para o “agregado familiar”, quer seja com bens ou com a sua participação nas tarefas domésticas, tal como acontece com o casamento. No entanto, numa relação de, por exemplo, quinze anos, será muito difícil, se não impossível, manter um registo de tudo aquilo que foi contribuição de um e que foi contribuição de outro, até porque na decorrência da relação, e sempre que é adquirido um bem para uso comum do casal, os membros não estão, desde logo, a pensar que algum dia a relação pode chegar ao fim. Na união de facto nunca se presume existir património comum, não obstante na maioria dos casos os bens serem adquiridos com dinheiro ou esforço de ambos os membros” [34].
Ora, na resolução de tais problemáticas, e à míngua de um regime específico e regulado, a jurisprudência tem vindo a ser chamada no sentido de encontrar soluções e alternativas de resolução, recorrendo, fundamentalmente a mecanismos de direito comum, entre os quais o regime das sociedades de facto (num período de resolução inicial) e o regime do enriquecimento sem causa.
Desta forma, surgida a cessação da união de facto e o consequente conflito, este “não pode resolver-se por recurso a um único instituto, ou seja, consoante o tipo de questão em análise (titularidade dos bens, prestação de serviços ou actividade não remunerada a favor do outro, danos causados pela ruptura da união, relação dos conviventes com terceiros credores…) ter-se-á de recorrer ao instituto de Direito comum que melhor se enquadrará na situação fáctica a resolver” [35].
Antes de efectuarmos uma análise da jurisprudência e das soluções por esta encontrada para a problemática equacionada, apreciemos, previamente, acerca do instituto jurídico do enriquecimento sem causa.
Prevendo acerca do instituto do enriquecimento sem causa, enriquecimento injusto ou locupletamento à custa alheia, estatui o art. 473º, nº 1,do Cód. Civil, que “aquele que, sem causa justificativa, enriquecer á custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou” [36].
Acrescenta o art. 474º, conferindo-lhe a sua natureza subsidiária, que “não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento”.
Como elementos constitutivos do presente instituto temos:
- a existência de uma vantagem patrimonial para uma pessoa, ou seja, uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária ;
- a existência de um empobrecimento que afecte o património de outra pessoa (correlativo do enriquecimento mencionado) ;
- e  a falta de uma justa causa para o enriquecimento e empobrecimento referenciados [37] [38].
Referem Pires de Lima e Antunes Varela [39], que o “enriquecimento consiste na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, seja qual for a forma que essa vantagem revista”. No que concerne ao elemento de ausência de causa justificativa, deve entender-se que “o enriquecimento carece de causa justificativa porque, segundo a própria lei, deve pertencer a outra pessoa”, sendo esta a directriz fundamental a observar. Assim, o que está em causa é a correcta ordenação jurídica dos bens pois, quando “o enriquecimento criado está de harmonia com a ordenação jurídica dos bens aceita pelo sistema, pode asseverar-se que a deslocação patrimonial tem causa justificativa ; se, pelo contrário, por força dessa ordenação positiva, ele houver de pertencer a outrem, o enriquecimento carece de causa”.
Por fim, e no que concerne ao elemento decorrente da correlatividade entre enriquecimento e empobrecimento, ou seja, que aquele tenha sido obtido à custa de quem requer a restituição, é necessário que a vantagem patrimonial “alcançada por um deles resulte do sacrifício económico correspondente suportado pelo outro. Ao enriquecimento injusto de uma pessoa corresponde o empobrecimento de outra”.
Jurisprudencialmente, referencie-se o aduzido no douto Acórdão desta Relação e Secção de 27/04/2017 [40], o qual enuncia como requisitos do instituto em apreciação:
a)-o enriquecimento, consistente na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, seja qual for a forma que essa vantagem revista;
b)-o empobrecimento, traduzido no inerente sacrifício económico correspondente à vantagem patrimonial alcançada, ou seja, o valor que ingressa no património de um é o mesmo que saí do património do outro;
c)-o nexo causal entre um e outro;
d)-a falta de causa justificativa da deslocação patrimonial verificada, ou porque nunca a tenha tido ou porque tendo-a inicialmente, entretanto a haja perdido”.
Relativamente ao último dos requisitos enunciados – falta de causa justificativa da deslocação patrimonial -, citando Pires de Lima e Antunes Varela [41], “a falta de causa terá de ser não só alegada como provada, de harmonia com o princípio geral estabelecido no art. 342º, por quem pede a restituição. Não bastará para esse efeito, segundo as regras gerais do onus probandi, que não se prove a existência de uma causa da atribuição, é preciso convencer o tribunal da falta de causa” [42]. Em idêntico sentido pronuncia-se Rodrigues Bastos [43], referindo que “àquele que invoca o enriquecimento injusto é que cabe demonstrar a falta de causa justificativa”. Acrescente-se, ainda, a posição defendida por L.P. Moitinho de Almeida [44], referindo que na presente acção compete ao autor a prova dos pressupostos da mesma, configurando-se como facto negativo integrador de tais pressupostos a ausência de causa. E, é ainda este autor quem cita Cunha Gonçalves [45], referindo este que “em caso de dúvida deve presumir-se que o enriquecimento derivou de justa causa e  ao autor incumbe a prova de que o seu detrimento foi produzido sine causa”. Concluindo o seu raciocínio, refere Moitinho de Almeida que a solução é óbvia, atento o prescrito no art. 342º do Cód. Civil, “uma vez que, alegando o autor na petição, como não pode deixar de ser, os factos denunciativos de ausência de causa, factos que lhe aproveitam, é bem de ver que não pode ser dispensado da respectiva prova visto não ter nenhuma presunção legal a seu favor” [46].
Estatui o douto Acórdão do STJ de 23/09/1999 [47], citando Leite de Campos [48] que o enriquecimento não tem causa ou é ausente de causa justificativa “quando, segundo a lei, não devia pertencer àquele que dele beneficia, mas sim a outrem.
A causa, cujo conteúdo é o próprio ordenamento jurídico, os valores defendidos, as ponderações de interesses realizadas caso por caso, visa evitar que o princípio do enriquecimento contrarie, fraude, a lei.
Deste modo, quando o enriquecimento foi obtido à custa de outrem, é necessário averiguar, por interpretação e integração da lei, se esta o quer radicar no beneficiado ou não.
Na 1ª hipótese, não se verifica o pressuposto falta de causa do enriquecimento”.
E, conclui o mesmo douto aresto, que tal entendimento já mereceu acolhimento jurisprudencial ao nível do Supremo Tribunal [49], citando ainda, em sua defesa, Antunes Varela [50], quando este refere tratar-se “de um puro problema de interpretação e integração da lei tendente a fixar a correcta ordenação jurídica dos bens” [51].
Desta forma, a obrigação de restituir, por parte do enriquecido, e a correspondente pretensão à restituição, por parte do empobrecido, “constituem assim uma forma de compensação instituída pela lei para certas situações que, embora formalmente conformes aos seus preceitos, conduzem a resultados (de injusto enriquecimento) substancialmente reprovados pelo direito” [52].
Precisando a noção e requisito de falta de justa causa de enriquecimento, aduz Rodrigues Bastos [53] que esta “pode assentar em vários pressupostos negativos “, sendo que “a hipótese que se tem em vista não deve coincidir com a hipótese legal de transferência: assim, uma deslocação patrimonial para que possa dizer-se injustificada não deve estar prevista por uma norma como consequência de incumprimento ou do cumprimento tardio de um dever, nem como sacrifício legitimamente imposto por um sujeito investido de um poder de supremacia, nem como deslocação que tem lugar ex lege por virtude de relações de família, nem, além disso, como deslocação patrimonial funcionalmente relacionada com outra deslocação em sentido inverso entre os mesmos sujeitos, nem, ainda, como cumprimento de uma obrigação natural. Na falta de tais pressupostos negativos, pode considerar-se injustificado o enriquecimento que se produza independentemente da vontade do empobrecido relativamente à deslocação patrimonial” sublinhado nosso).
O que parece certo é que a noção de causa de enriquecimento não é única e singular, variando e alterando-se consoante a natureza do acto que lhe subjaz, ou seja, do acto que lhe serve de fonte.
Acrescenta o nº. 2 do citado artº. 473º, do Cód. Civil que “a obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou”.
Aduzem Pires de Lima e Antunes Varela [54] indicar o presente normativo, de forma exemplificativa, “casos especiais de enriquecimento sem causa”, nomeadamente os decorrentes de “pagamento indevido, a que se referem os artigos 476º a 478º”, do caso “de alguém receber uma prestação em virtude de uma causa que deixou de existir(condictio ob causam finitam) ou o da “prestação ter sido recebida em vista de um efeito que não se verificou” (condictio ob causam futuram ; condictio causa data causa non secuta), enunciando vários exemplos demonstrativos do preenchimento de tais situações especiais.
Por sua vez, Ana Prata [55]refere exemplificar este nº. 2 “a obrigação de restituição com base em enriquecimento sem causa com as situações tradicionais de ter havido uma vantagem patrimonial sem fundamento jurídico (nº. 1 do art. 476º), em razão de um efeito que deixou de existir (p. ex., a obrigação que foi cumprida provinha de um contrato que se extinguiu posteriormente com efeitos retroactivos) ou que se previa e não veio a ter lugar (p. ex., a prestação feita para cumprimento de um contrato que não veio a celebrar-se”.
Este nº. 2, concernente ao requisito negativo de ausência de causa jurídica, contém, deste modo, “exemplos de falta de causa, mas está longe de as esgotar”.
Analisemos, então, em termos jurisprudenciais, a forma como vem sendo tratadas as questões referentes aos efeitos patrimoniais da dissolução da união de facto, fundamentalmente no que concerne ao eventual preenchimento dos requisitos do instituto do enriquecimento sem causa.
O douto Acórdão do STJ de 04/07/2019 [56], no enquadramento efectuado, começou por indagar qual a solução encontrada no direito comum relativamente à regulação e disciplina dos efeitos patrimoniais decorrentes da cessação da união de facto.
Citando Telma Carvalho [57], referencia que “a união de facto passou a ser uma opção de vida de muitos casais, em detrimento do casamento; pela própria função, como comunhão de vida, de mesa, leito e habitação, a união de facto permite, tal como o casamento, a realização pessoal de cada um dos seus membros”, reconhecendo-se que o direito, “tomando esta inelutável realidade, acompanhando a evolução social registada neste domínio, reconhece a união de facto, alargando os respectivos efeitos”.
Seguidamente, após enunciar que o legislador, no reconhecimento da relevância social da união de facto, tem vindo a estabelecer, através de vários diplomas que enuncia, requisitos para o seu reconhecimento jurídico, regulando e delimitando os seus efeitos em vários domínios, ressalva, porém, que nada foi prescrito “no âmbito dos efeitos patrimoniais, optando o legislador por não estabelecer um regime patrimonial geral, atinente aos bens dos membros da união de facto, nem definir regras sobre a administração e disposição desses bens, outrossim, sobre as dívidas contraídas pelos conviventes e a liquidação e partilha do património, em virtude da dissolução da união, levando a Doutrina e a Jurisprudência a analisar, regular e disciplinar os efeitos patrimoniais da cessação da união de facto, procurando encontrar soluções no plano do direito comum”.
Tendo decidido previamente acerca da não aplicabilidade, por analogia, do regime jurídico do casamento à união de facto, para regular e disciplinar os efeitos patrimoniais da cessação desta, cita o douto Acórdão do mesmo Tribunal de 11/04/2019 (Processo nº. 219/14.7TVPRT.P1.S1), nos seguintes termos:
 “Segundo alguns, a resolução dos casos de divisão do acervo patrimonial constituído no seio da união de facto, poderá fazer-se através do recurso ao regime previsto para as sociedades de facto, desde que verificados os respectivos pressupostos.
No entanto, para além de outras limitações resultantes de diferenças essenciais nas situações de facto em presença, a Lei n.º 41/2013, de 26/06, que aprovou o novo Código de Processo Civil, eliminou o Processo Especial de Liquidação Judicial de Sociedades de Facto, designadamente as normas constantes dos arts. 1122º a 1130° do anterior CPC.
Assim sendo, parece inviável recorrer agora a um instrumento que a lei processual expressamente afastou.
O recurso ao instituto da compropriedade (cf. arts 1403° e ss., do CC) tem sido igualmente convocado para a divisão do património adquirido no seio da união de facto.
Importa, porém, ter em atenção que ao contrário do que sucede no casamento em que o património comum dos cônjuges se reparte entre eles por quotas ideias - os cônjuges são, nas palavras de Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, titulares de um único direito sobre o património coletivo, sendo este uno e indivisível, em regra, até à dissolução do casamento -, na compropriedade podem fixar-se quotas quantitativamente diferentes, apesar de qualitativamente iguais, presumindo-se, no entanto, a igualdade quantitativa de quotas quando do título constitutivo não conste indicação em contrário (cf. n.° 2 do art. 1403°, do CC). Em todo o caso, a aplicação do regime da compropriedade implica a intervenção de ambos os conviventes de facto no momento da aquisição do bem, como decorre do disposto no art. 1403.°, n.º 1, do CC., ao contrário do que ocorre na comunhão conjugal em que, por força do art. 1730°, n°1, do CC, os cônjuges participam por metade no ativo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer disposição em sentido diverso. Ora, sucede muitas vezes que apenas um dos membros da união de facto consta como adquirente no título de aquisição. Nestes casos, o proprietário é quem efetivamente constar no título de aquisição do bem, não funcionado uma presunção de compropriedade semelhante à que vigora no casamento para o regime de separação de bens para os bens móveis (art. 1736.°, n.° 2, do CC). Por outro lado, se a aquisição do bem se mostrar registada em nome de um dos conviventes, o titular do direito inscrito beneficia da presunção prevista no art. 7°, do CRP.
Perante as dificuldades que a dissolução da união de facto suscita no plano das relações patrimoniais, a doutrinar e a jurisprudência têm ainda lançado mão do enriquecimento sem causa, previsto nos arts. 473.° e ss., do CC.
Como ensina Antunes Varela, “o enriquecimento consiste na obtenção de uma vantagem de carácter patrimonial, seja qual for a forma que essa vantagem revista: pode traduzir-se num aumento do ativo patrimonial, numa diminuição do passivo, numa poupança de despesas, etc. A vantagem patrimonial pode ser direta (quando se assiste a uma deslocação patrimonial direta do empobrecido para o enriquecido) ou indireta (quando o enriquecimento é apenas um reflexo ou um efeito de uma prestação diferente efetuada pelo empobrecido).
Desta forma, o convivente que tenha contribuído igualmente para a aquisição de bens mas, não obstante isso, não conste no título aquisitivo como proprietário, poderá pedir a restituição da parcela por si investida na exata medida do enriquecimento sem causa do outro convivente.
Poderá também haver obrigação de restituir nos casos em que o membro da união de facto, ainda que titular do direito de propriedade de bens imóveis ou móveis adquiridos na constância da união de facto (e cujo preço até pode ter sido suportado exclusivamente à custa do seu património), beneficiou em grande medida do esforço/colaboração/participação do outro membro em prol da vida em comum (v.g., por via do trabalho doméstico, da criação e educação dos filhos, etc.), proporcionando, desta forma, poupanças significativas e facilitando/incrementando a carreira profissional de um deles” (sublinhado nosso).
Na prossecução do exposto, e comungando o entendimento plasmado no aresto citado, conclui-se, então, “ser inviável para a resolução dos casos de divisão do acervo patrimonial constituído no seio da união de facto, o recurso ao regime previsto para as sociedades de facto, outrossim, o recurso ao instituto da compropriedade, restando-nos, assim, o instituto do enriquecimento sem causa, como solução no plano do direito comum, com vista a regular e disciplinar os efeitos patrimoniais da cessação da união de facto, relembrando que a demanda trazida a Juízo teve também por fundamento, precisamente, o enriquecimento sem causa, resultante da dissolução da relação de união de facto” (sublinhado nosso).
Seguidamente, sublinha-se a natureza subsidiária do instituto em equação, no sentido de apenas ser pertinente o apelo ao mesmo nas situações em que a lei não concede ao empobrecido outro meio de ser restituído ou indemnizado e enunciam-se os seus requisitos cumulativos, com especial relevo e atenção no que se reporta ao de ausência de causa justificativa.
Considera, assim, que a nossa lei substantiva, conforme decorre do já transcrito nº. 2, do artº. 473º, do Cód. Civil, enunciou e identificou, no que a este requisito concerne, um critério orientador, “uma linha de rumo interpretativa”, pressupondo, “numa enumeração exemplificativa, três situações especiais de enriquecimento desprovido de causa: condictio in debiti (repetição do indevido), condictio ob causam finitam (enriquecimento por virtude de causa que deixou de existir) e condictio ob causam datorum (enriquecimento derivado da falta de resultado previsto)”.
Desta forma, no que se reporta ao presente requisito – falta ou ausência de causa justificativa -, pode a mesma resultar “da circunstância de nunca ter existido ou, tendo existido, entretanto, se ter perdido, ou seja, a causa do enriquecimento pode resultar do fim imediato da prestação e do fim típico do negócio, donde, se a obrigação não existiu ou se o fim do negócio falhou, deixou de haver causa para a prestação e a obrigação resultante do negócio, importando ainda saber, em cada caso concreto, “se o ordenamento jurídico considera ou não justificado o enriquecimento e se portanto acha ou não legítimo que o beneficiado o conserve” [58], ou, então, se “o enriquecimento criado está de harmonia com a ordenação jurídica dos bens aceite pelo sistema, ou se, pelo contrário, por força dessa ordenação positiva, ele houver de pertencer outrem, o enriquecimento carece de causa” [59].
Pelo que, acrescenta, “esta situação, do desaparecimento posterior da causa, corresponde à tradicional condictio ob causam finitam (enriquecimento por virtude de causa que deixou de existir), tipificada na enumeração exemplificativa do consignado n.º 2 do art.º 473.º do Código Civil, que se caracteriza por alguém ter recebido uma prestação em virtude de uma causa que, entretanto, deixou de existir, caso em que o nosso ordenamento jurídico força a repor o equilíbrio patrimonial rompido com aquela deslocação patrimonial, por não tolerar que essa vantagem perdure, constituindo o accipiens no dever de restituir o recebido, donde, verificada a deslocação patrimonial mediante uma prestação, a causa há-de ser a relação jurídica que essa prestação visa satisfazer, e se esse fim falta, a obrigação daí resultante fica sem causa” (sublinhado nosso).
Refere-se, ainda, à luz do que já supra expusemos, no enquadramento que efectuámos do instituto em equação, e no que se reporta ao ónus probatório no preenchimento de tal requisito, que “para se reconhecer a obrigação de restituir sustentada no enriquecimento, não é suficiente que se demonstre a obtenção duma vantagem patrimonial, à custa de outrem, sendo ainda exigível mostrar que não exista uma causa justificativa para essa deslocação patrimonial, quer porque nunca a houve, por não se ter verificado o escopo pretendido, ou, porque, entretanto, deixou de existir, devido à supressão posterior desse fundamento, importa também anotar que a falta originária ou subsequente de causa justificativa do enriquecimento assume a natureza de elemento constitutivo do direito à restituição, impondo-se, assim, ao demandante que reclama a restituição, por enriquecimento sem causa, o ónus da demonstração dos respectivos factos constitutivos que contém a falta de causa justificativa desse enriquecimento, conforme decorre das regras estatuídas no direito substantivo civil acerca do ónus da prova (artsº. 342° e 344°, n.°1 do Código Civil (…)” (sublinhado nosso).
Na continuação do raciocínio jurisprudencial, e aplicando o enquadramento exposto ao caso concreto em equação, com manifestas semelhanças à situação sub júdice, aduz-se, então, que “uma vez demonstrado que a união de facto ficou dissolvida em Novembro de 2014, impõe-se a “liquidação” e “partilha” dos interesses patrimoniais dos membros da união de facto, daí que, confrontados os factos adquiridos processualmente distinguimos que a Ré/BB convivente, com a dissolução da união de facto, obteve um favorecimento patrimonial, enquanto o Autor/AA ficou prejudicado na proporção da apurada contribuição monetária para a aquisição dos prédios ajuizados, ou seja, no valor demonstrado de €23.000,00 (vinte e três milhares de euros), que, de todo, pode ser entendida como cumprimento de qualquer dever que possa vincular o Autor/AA para com a Ré/BB, mormente, dever de assistência, na medida em que, como se torna claro, as aludidas aquisições (terrenos para construção) são estranhas aos encargos do quotidiano da vida familiar, daqui decorrendo, com efeito, que a dita contribuição não encerra qualquer causa justificativa, pese embora se reconheça que a esta mesma contribuição não é alheia a estabelecida união de facto, pois, divisamos, sem dificuldade, que a mencionada contribuição monetária destinou-se à aquisição dos ajuizados prédios - terrenos para construção - para a respectiva fruição por parte dos membros da união de facto, com tudo o que daí pudesse resultar, importando, por isso, reconhecer-se que a união de facto encerra e constitui a causa jurídica da contribuição monetária realizada pelo Autor/AA para a aquisições dos ajuizados prédios.
Constituindo a união de facto a causa jurídica da contribuição monetária realizada pelo Autor/AA para a aquisição dos aludidos prédios, temos que, com a dissolução da união de facto, conforme também ficou demonstrado nos autos, importa concluir pela extinção da causa jurídica da referida contribuição monetária, deixando de ter justificação a privação da contribuição monetária prestada para as demonstradas aquisições, cuja propriedade se presume ser da Ré/BB, atentos os registos das respectivas aquisições, não elidida” (sublinhado nosso).
Decorre, assim, de forma clara e linear ter ocorrido “o desaparecimento superveniente da causa da deslocação patrimonial, que representou a apurada contribuição monetária, condizente à conditio ob causam finitam (enriquecimento por virtude de causa que deixou de existir) estabelecida no n.º 2 do art.º 473º do Código Civil, fundamentando a restituição, sem que do mesmo possa resultar qualquer outro tipo de consequências, nomeadamente, no sentido de eliminar o efeito da obrigação de restituir”, ou seja “a dissolução da união de facto constitui o facto que consubstancia a perda da causa para a deslocação patrimonial, fundamentando a restituição”.
Por outras palavras, igualmente impressivas, “o Autor/AA logrou demonstrar a obtenção, por parte da Ré/BB, duma vantagem patrimonial, à sua custa, sem causa justificativa para essa deslocação patrimonial, porque criada, deixou, entretanto, de existir, devido à supressão posterior desse fundamento, encerrando uma falta subsequente de causa justificativa do invocado enriquecimento”.
Concluindo-se, então, que “o convivente que tenha contribuído igualmente para a aquisição de bens mas, não obstante isso, não conste no título aquisitivo como proprietário, poderá pedir a restituição da respectiva contribuição monetária, por si investida na exacta medida do enriquecimento sem causa do outro convivente (…)”(sublinhado nosso), o que se traduz, na situação concreta ali apreciada, na obrigatoriedade da Ré em restituir ao Autor os valores comprovadamente entregues por este, com vista à aquisição dos imóveis em equação.
O douto Acórdão do STJ de 11/04/2019 [60], citado no aresto antecedente, para além do trecho objecto da exposta transcrição, reconhece a pertinência do recurso ao instituto do enriquecimento sem causa, na hipótese em que apenas um dos conviventes consta do título aquisitivo, tendo, porém, ambos contribuído para a aquisição do bem, directamente ou através da propiciação de poupanças significativas vão adquirente.
De forma expressa, referencia-se que “o convivente que tenha contribuído igualmente para a aquisição de bens mas, não obstante isso, não conste no título aquisitivo como proprietário, poderá pedir a restituição da parcela por si investida na exata medida do enriquecimento sem causa do outro convivente.
Poderá também haver obrigação de restituir nos casos em que o membro da união de facto, ainda que titular do direito de propriedade de bens imóveis ou móveis adquiridos na constância da união de facto (e cujo preço até pode ter sido suportado exclusivamente à custa do seu património), beneficiou em grande medida do esforço/colaboração/participação do outro membro em prol da vida em comum (v.g., por via do trabalho doméstico, da criação e educação dos filhos, etc.), proporcionando, desta forma, poupanças significativas e facilitando/incrementando a carreira profissional de um deles”.
Em termos jurisprudenciais, e com especial relevância e atinência na ponderação do caso concreto em apreciação, referenciemos, em aditamento, os seguintes arestos:
- do STJ de 31/03/2009 [61], o qual, acerca do ónus de prova do enriquecimento injustificado ou ausente de causa, aduziu que o que possa traduzir “ausência de causa não é pacífico nem fácil de definir.
Mas, estando nós perante um enriquecimento por prestação, podemos lançar mão da disposição clarificadora do n.º2 do artigo 473.º referido. A obrigação de restituir tem por objecto o que for indevidamente recebido, o que for recebido por causa que deixou de existir ou em vista de efeito que não se verificou.
Conforme tem vindo a ser entendido de modo reiterado, cabe àquele que pretende beneficiar do instituto do enriquecimento sem causa a prova dos factos, positivos ou negativos, que integrem tal requisito.
Já Cunha Gonçalves (Tratado de Direito Civil, IV, 743) escreveu que:
“Em caso de dúvida deve presumir-se que o enriquecimento derivou de justa causa e ao autor incumbe a prova de que o seu detrimento foi produzido “sine causa”. No mesmo sentido podendo ver-se Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, 4.ª ed., 456 e Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, II, 269.

Sendo abundante a jurisprudência deste Tribunal ainda no mesmo sentido (assim, os Ac.s de 3.10.1970, no BMJ 199,190, 15.12.1977, no BMJ 272,196, 29.06.2002, 7.7.2003 , 17.10.2006, 15.12.2006 e 29.5.2007 e 20.9.2007, estes cinco podendo ver-se em www.dgsi.pt.)
Na verdade, um enriquecimento de alguém e correlativo empobrecimento de outrem traduz uma realidade que, por regra, tem uma causa. Mesmo que tal causa traduza um acto não oneroso é ela que confere sentido a essa alteração patrimonial.

Existir tal deslocação sem causa representa um rompimento com a normalidade da vida patrimonial e daí compreender-se bem que esse rompimento haja de ser considerando elemento integrante do direito de restituição. Com a consequente demonstração por quem o invoca” (sublinhado nosso) ;
- do STJ de 02/07/2009 [62], o qual, acerca do preenchimento do pressuposto de ausência de causa justificativa, referencia não bastar que “uma pessoa tenha obtido vantagem económica à custa de outra, sendo ainda necessária a ausência de causa jurídica justificativa da deslocação patrimonial (sendo apenas esta e não qualquer outra situação de enriquecimento que aqui poderá estar em causa).
Sendo, pois, necessária, repete-se, a ausência de causa jurídica para a recepção da prestação que foi realizada.
Cabendo ao autor que pede a restituição com base no enriquecimento da ré à sua custa sem causa justificativa, por força do preceituado no art. 342º, nº 1 do CC, o ónus de alegação e prova dos referidos pressupostos.
Designadamente, o ónus da prova da ausência de causa da sua prestação pecuniária., sendo a carência de causa justificativa da deslocação patrimonial facto constitutivo de quem requer a restituição.
Onerando, assim, o autor, que invocou o direito em referência, com a sua prova (citado art. 342º, nº 1).
Tendo, pois, a falta de causa de ser não só alegada, como também provada, por quem pede a restituição.
Não bastando, segundo as regras do onus probandi, que não se prove a existência de uma causa da atribuição, sendo preciso convencer o tribunal da falta de causa” ;
- do STJ de 06/07/2011 [63], no qual se sumariou, acerca do eventual preenchimento dos pressupostos do enriquecimento sem causa, que “em caso de dissolução da união de facto, o trabalho doméstico que a autora fez enquanto viveu naquela situação com o réu, porque constitui uma participação livre para a economia comum baseada na entreajuda ou partilha de recursos, não lhe confere o direito de restituição do respectivo valor” ;
- ainda do STJ de 20/03/2014 [64], que, a propósito do preenchimento do pressuposto do enriquecimento sem causa ausência de causa justificativa, defende que “a cessação da união de facto não preenche, por si só, o requisito em questão: é preciso que o autor da acção de enriquecimento prove que as deslocações patrimoniais se verificaram no pressuposto, entretanto desaparecido, da continuação e subsistência, querida por ambos os unidos de facto, da vida do casal em condições análogas às dos cônjuges. Quer a doutrina, quer a jurisprudência, têm defendido uniformemente que na acção de enriquecimento cabe ao autor o ónus da prova da falta de causa da prestação efectuada, não bastando que no final do processo não resulte pro­vada qualquer causa”.
Consignando-se, ainda, que “no âmbito de uma união de facto, as despesas normais e correntes (água, electricidade, gás e televisão), sendo próprias de quem vive, ainda que “informalmente”, a plena comunhão de vida de que fala o art.º 1577.º do CC, não são restituíveis, à luz do instituto do enriquecimento sem causa” ;
- desta Relação de 28/04/2016 [65], que, relativamente à eventual aplicação à união de facto do regime de bens do casamento, citando Cristina Dias [66], aduz “que, a entender-se haver lacuna susceptível de preenchimento por analogia, e esta ser possível, sempre deveria ser por recurso ao regime de separação de bens […]. De facto, neste regime há bens próprios e bens em compropriedade, estabelecendo a lei uma presunção nesta matéria, no artigo 1736.º,nº2. Em matéria de titularidade e partilha dos bens, a solução não diferirá significativamente da encontrada para a união de facto (onde, a haver bens comuns, serão em compropriedade e não em comunhão), com a única vantagem de, naquele regime, haver a presunção referida quanto aos bens móveis. Quanto aos bens imóveis, no regime da separação de bens (e na união de facto), cada um deles será daquele que aparecer como seu titular e se o outro contribui para a sua aquisição tê-lo-á de provar invocando um crédito face ao outro cônjuge a exercer nos termos gerais do direito das obrigações.
Há, portanto, o recurso às regras gerais e, havendo enriquecimento de um cônjuge em detrimento do outro, poderá aplicar-se o instituto do enriquecimento sem causa. A haver alguma similitude seria com o regime de separação de bens”.
Considera-se, assim, neste aresto que, cessada a união de facto, cada um dos sujeitos da relação tem direito a participar na liquidação do património adquirido pelo esforço comum, podendo esta liquidação ser efectuada com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa.
Após considerarem-se os requisitos do enriquecimento sem causa, ressalva-se que a transferência patrimonial tem de carecer de causa jurídica justificativa tutelada pelo direito, ou seja, o Autor tem que provar que se deu um enriquecimento do Réu através do seu empobrecimento, sem cobertura jurídica que a sustente, o qual se pode traduzir num aumento do activo patrimonial, numa diminuição do passivo ou numa poupança proporcionada ao Réu.
Ou, ainda, num entendimento necessariamente menos exigente, estando em equação a cessação da união de facto, tem o Autor que demonstrar que se criou um património pelo esforço conjunto de ambos e que cumpre, pois, de alguma forma, partilhar, de forma a impedir o enriquecimento de um à custa do outro.
Considera, por fim, que na questão concreta ali apreciada encontravam-se preenchidos todos os pressupostos do instituto jurídico equacionado, pois, o “imóvel foi adquirido com os proventos do trabalho que a Autora e o 1º Réu, em comum, desenvolveram nos negócios que exploraram em Inglaterra: a Autora contribuiu com o dinheiro que ganhou, a par com o 1º Réu, para a aquisição do imóvel; estes, no âmbito da sua união de facto, agiam como se houvesse um património comum onde se incluía o imóvel dos autos (veja-se que em conjunto ambos chegaram a tentar a venda do imóvel para partilhar o preço). O imóvel, em virtude da sua aquisição ficar titulada apenas em nome do 1º Réu, entrou apenas no seu património, assim o enriquecendo à custa da Autora.
Constituiu-se, pois, o Réu (…), na obrigação de pagar à Autora a quantia com que injustamente se locupletou, correspondente a metade do valor do imóvel” ;
- desta mesma Relação de 29/11/2012 [67], o qual começa por realçar que o nosso sistema jurídico é omisso na regulação dos efeitos patrimoniais decorrentes da cessação da relação de união de facto, defendendo o recurso aos institutos do direito comum, e não à analogia relativamente ao regime do casamento, pois na união de facto inexiste regime de bens, não tendo aplicabilidade as regras que disciplinam os efeitos patrimoniais do casamento,  pelo que não é pertinente aludir-se, propriamente, à existência de qualquer lacuna.
Com efeito, fazendo alusão aos contratos de coabitação e aos contratos de concubinato, existentes noutros países, acrescenta que a “inexistência da regulamentação em causa tendo o legislador oportunidade para o fazer e, não o fazendo, poderemos concluir que não se pretendeu regular especificamente essa matéria da união de facto, por aplicação do regime do casamento.
Os Professores Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, entendem que a legislação que equiparasse inteiramente a união de facto ao casamento seria inconstitucional, fosse por descaracterizar o instituto matrimonial garantido constitucionalmente, fosse por violar o direito de não casar (dimensão negativa do direito de não contrair casamento)”.
Desta forma, sendo materialmente diferenciada a situação do casamento e da união de facto, as relações patrimoniais entre os membros da união de facto ficam sujeitas ao regime geral das relações obrigacionais e reais.
Donde, cessada a união de facto, pode haver a necessidade de liquidar o património comum acumulado durante a vivência em comum, determinando-se os efeitos patrimoniais favoráveis e desfavoráveis repercutidos, reciprocamente, em cada um dos patrimónios individuais.
O que se logra concretizar, nomeadamente, através do recurso ao enriquecimento sem causa, como fonte autónoma de obrigações, donde decorre a necessidade de inexistência duma causa jurídica justificativa dessa deslocação patrimonial (ou porque nunca houve ou porque, entretanto, desapareceu).
Seguidamente, após notar a natureza subsidiária do instituto, decorrente do artº. 474º do Cód. Civil, enuncia a posição de Menezes Leitão, ao referenciar que “no enriquecimento por prestação (ao lado do qual existem o enriquecimento por intervenção, o enriquecimento por despesas realizadas em benefício doutrem e o enriquecimento por desconsideração de um património intermédio), “a ausência de causa jurídica deve ser definida em sentido subjectivo, como a não obtenção do fim visado com a prestação”, havendo, assim, lugar à restituição da prestação sempre que esta é realizada com vista à obtenção de determinado fim e esse fim não vem a ser obtido (“condictio ob rem”), ou, aditaremos nós, com directa aplicação ao caso vertido nos autos, quando a causa jurídica – no sentido que ficou evidenciado – da prestação realizada desaparece posteriormente à sua realização (“condictio ob causam finitam)”.
Por fim, analisando o conceito de obrigação natural, com enquadramentos nos artigos 402º e 403º, ambos do Cód. Civil, cita o consagrado no Acórdão do STJ de 07/06/2011, onde se referencia ser “o caso da contribuição para a economia comum na união de facto, desde que assente a ausência de vínculos juridicamente relevantes entre os seus membros, designadamente os deveres de coabitação, cooperação e assistência enunciados no art. 1672º CC sobretudo estes dois últimos, na modalidades de socorro e auxílio mútuos e de assunção conjunta das responsabilidades da vida familiar (art. 1674º CC) e na de alimentos e de contribuição para os encargos da vida familiar de harmonia com as possibilidades de cada um através da afectação dos seus recursos àqueles encargos e do trabalho dispendido no lar (art. 1675º nº1 e 1676º nº1 CC).
Ora, não pode ser repetido o que foi prestado espontaneamente – isto é, livre de toda a coacção (art. 403º nº2 CC) - no cumprimento de uma obrigação natural (art. 403º º1 CC) .
Não sendo o trabalho dispendido no lar judicialmente exigível no âmbito da união de facto, a sua prestação como contribuição para a economia comum configura-se como cumprimento espontâneo de obrigação natural, insusceptível de ser repetido, pelo que falece à apelante e autora o direito à restituição do respectivo valor” ;

- desta Relação de 18/12/2012 [68], o qual defende que cessada a união de facto, as despesas necessárias e inerentes à convivência típica de um envolvimento familiar e íntimo, não são exigíveis em termos da sua repetição, por aplicabilidade do regime das obrigações naturais, inscrito no nº. 1, do artº. 403º, do Cód. Civil.
Acrescenta que tais despesas não podem ainda ser reclamadas com base no enriquecimento sem causa, atenta a não verificação de um dos requisitos essenciais: a inexistência de causa para a deslocação patrimonial invocada.
Efectivamente, justifica-se, tais despesas, “livre e espontaneamente realizadas entre os membros dessa união têm uma causa justificativa : a própria subsistência do relacionamento, análogo ao dos cônjuges, que é desejado e querido por parte de quem presta e de quem beneficia dos actos de deslocação patrimonial.
Tais gastos foram efectuados espontaneamente, em estreita conformidade com a natureza da comunhão de interesses e afectos que liga quem os concede e quem os recebe, enquadrando-se numa multiplicidade de actos e compensações, insusceptíveis de determinar, muitos anos após, qualquer formal e discriminado sistema de deve e haver” ;
- ainda desta Relação de 15/11/2011 [69], que, a propósito dos pressupostos ou requisitos integrantes do enriquecimento sem causa, aduz que a falta de causa justificativa traduz-se “na inexistência de uma relação ou de um facto que, à luz dos princípios aceites no sistema, legitime o enriquecimento. Assim, por exemplo, sempre que o enriquecimento provenha de uma prestação, a sua causa é a relação jurídica que a prestação visa satisfazer, pelo que, cumprindo-se obrigação inexistente, pode repetir-se o indevido (cfr. os arts.473º, nº2 e 476º, nº1) (sublinhado nosso).
No caso concreto, apreciou-se situação em que a transferência patrimonial entre os conviventes teve por base uma causa que deixou de existir – a união de facto e a sua manutenção -, pelo que, concluiu-se, o enriquecimento à custa de outrem deu-se sem causa justificativa. Ou seja, e nas palavras ali referidas, a “deslocação patrimonial, que tinha uma causa quando ocorreu, deixou de a ter posteriormente. O que dá origem à obrigação de restituir, nos termos do nº1, do art.473 (cfr. o nº2, do mesmo artigo)”.
Por fim, afasta a existência de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, nessa restituição, por não verificação cumulativa dos respectivos requisitos – “uma situação objectiva de confiança, um investimento nessa confiança com a irreversibilidade desse investimento e a boa fé da parte que confiou” -, considerando a não prova da “ré ter sido induzida em legítima expectativa de confiar que jamais o autor lhe exigiria essa restituição” ;
- desta Relação de 19/10/2017 [70] que, fundada no entendimento de Menezes Leitão, que cita, e por referência à situação do enriquecimento por prestação, afasta no caso concreto a aplicação da modalidade de condictio ob causam finitam, ou seja, restituição da prestação por posterior desaparecimento da causa.
Considera, antes, a situação enquadrável como enriquecimento por prestação através da condictio ob rem, ou seja, restituição da prestação por não verificação do efeito pretendido (a parte final do nº. 2, do artº. 473º, do Cód. Civil).
Por fim, reafirma o entendimento de que, para fundamentar a restituição do indevidamente pago, a falta de causa da atribuição ou vantagem patrimonial que integra o enriquecimento deve ser alegada e demonstrada por quem invoca o direito à restituição, não sendo bastante a mera falta de prova da existência de causa, mas antes provar que “efectivamente a causa falha” ;
- igualmente desta Relação de 03/07/2012 [71], no qual foi consignado sumários defendendo que “cessada a união de facto, aquele membro que em momento anterior tenha disponibilizado ao outro determinadas quantias, quer para a aquisição por este último ( apenas ) de imóvel, quer para a frequência de curso, tudo no pressuposto da manutenção da vida em “comum”, tem direito à sua restituição com base no instituto do enriquecimento sem causa”, o que configura “uma situação correspondente a um enriquecimento por prestação e assentando a obrigação de restituir em fattispecie equivalente a “ condictio ob causam finitam “” ;
- ainda desta Relação de 26/10/2010 [72], onde se efectua destrinça entre os efeitos patrimoniais decorrentes do casamento e sua dissolução, relativamente aos mesmos efeitos no âmbito da união de facto e cessação desta.
Acrescenta-se, no sumário elaborado, que “embora a comunhão de vida, própria da união de facto, gere, a maioria das vezes, a contribuição – quer com a percepção de rendimentos do trabalho, quer com a realização de tarefas domésticas indispensáveis à vida do casal – de ambos os membros para a aquisição de bens e serviços, inerentes à vida do casal, como sejam a alimentação, o vestuário ou a casa onde habitam, ainda não existe na nossa ordem jurídica tutela para essas situações”, afastando a aplicação, ainda que por analogia, dos mecanismos referentes aos bens comuns do casal aquando da dissolução do casamento.
O que justifica em virtude de na união de facto não existirem “as razões justificativas que, no casamento, levaram a essa regulamentação, designadamente o feixe de obrigações e direitos que vinculam reciprocamente cada um dos cônjuges ligados pelo vínculo contratual do casamento, sendo de destacar, atento o seu cariz patrimonial, os deveres de cooperação, de assistência e o de contribuição para os encargos da vida familiar”.
Todavia, consigna o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa às situações em que “com a participação de ambos os membros da união de facto, são adquiridos bens, figurando no respectivo título apenas um deles” ;
- da RP de 04/02/2019 [73], onde se sumariou que a “união de facto é insusceptível de, só por si, originar um património comum entre os seus membros”, sendo que a orientação jurisprudencial maioritária defende que “a forma para efectivar a liquidação do património adquirido pelo esforço comum é a de, em acção declarativa de condenação, o ex-membro da união de facto, que se considere empobrecido relativamente aos bens em cuja aquisição participou, pedir que o outro convivente seja condenado a reembolsá-lo, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa” ;
- da RP de 09/06/2015 [74], no qual se sumariou que a “deslocação patrimonial é todo o acto por virtude do qual se aumenta o património de alguém à custa de outrem”, sendo que no caso ali apreciado “foi em razão dessa causa - a união de facto - que a autora investiu com dinheiro que auferiu nas suas diversas actividades laborais na realização de várias obras e na aquisição de vários bens no e para o imóvel pertença do 2.º réu. A causa justificativa da referida deslocação patrimonial da autora para o 2.º réu materializada no valor das obras realizadas e dos equipamentos colocados no imóvel, deixou de subsistir com a ruptura dessa relação. Ocasião em que também se verificou o enriquecimento do 2.º réu”, assim se justificando o recurso ao instituto jurídico em equação ;
- da RP de 10/07/2013 [75], no qual, com clara pertinência para o caso sub júdice, se sumariou que “se, na pendência da união de facto, os bens são adquiridos apenas m nome de um deles e ambos contribuíram para a sua aquisição, o companheiro que não consta do título como proprietário poderá reaver a sua comparticipação financeira na aquisição do bem através do instituto do enriquecimento sem causa” ;
- da RC de 26/03/2019 [76], onde se sumariou que contrariamente ao que acontece com as relações patrimoniais entre os cônjuges e destes com terceiros, na união de facto as relações patrimoniais ficam  “sujeitas ao regime geral das relações obrigacionais e reais”.
Pelo que, extinta a relação, “as regras a aplicar, à liquidação e partilha do património do casal, são as acordadas no “contrato de coabitação” eventualmente celebrado e, na sua falta, o regime geral das relações obrigacionais e reais”, não excluindo que “a liquidação do património do casal se faça segundo os princípios das sociedades de facto ou do enriquecimento sem causa” ;
- da RC de 22/05/2018 [77]. No qual se começa por constatar que o direito ao enriquecimento sem causa apenas se coloca quando, no âmbito de uma união de facto, existem bens adquiridos com a participação de ambos os membros.
Acrescenta-se, todavia, que o facto de um dos conviventes ter sido fiador/garante não confere, naturalmente, de per se, direitos patrimoniais, se não se mostrar que, enquanto garante, foi chamado ao pagamento da dívida garantida, pois, “o garante não se torna credor do devedor pelo simples facto da prestação da garantia, mas pelo pagamento que haja feito, por força da garantia, em vez do devedor”.
Ressalva, todavia, tal como tem sido entendimento jurisprudencial maioritário, do qual cita exemplos, que “«o trabalho doméstico que a autora fez enquanto viveu (em união de facto, retenha-se) com o réu» traduz atividade que «tem de ser vista, nas circunstâncias concretas, com a sua participação, livre, para a economia comum baseada na entreajuda ou partilha de recursos», não estando «em causa qualquer enriquecimento do réu à custa da autora», já que o trabalho desta «era a sua contribuição para a vida em comum, mas da matéria de facto não resulta que só a autora contribuísse para as despesas do lar.
Se a autora cozinhava, naturalmente que os géneros teriam de ser comparados e nada faz presumir que fosse a autora que tudo pagasse.».
A contribuição da A., «envolvendo necessariamente um dispêndio de energias e de força de trabalho – os serviços domésticos – mais não é, afinal, que o cumprimento de uma obrigação natural – a de contribuir para a comunhão de vida (comunhão de cama, mesa e habitação) e para a economia comum baseada na entreajuda ou partilha de recursos.».
Assim, afigura-se-nos correto o entendimento no sentido de que «a contribuição para a economia comum na união de facto, desde que assente a ausência de vínculos juridicamente relevantes entre os seus membros», cai, por regra, no regime das obrigações naturais (cfr. art.ºs 402.º e segs. do CCiv.), pelo que «não pode ser repetido o que foi prestado espontaneamente em cumprimento de uma obrigação natural» (n.º 1 do art.º 403.º do CCiv.).
E também haverá de concordar-se – repete-se, e salvo o devido respeito – que,
não sendo o trabalho despendido no lar judicialmente exigível no âmbito da união de facto, a sua prestação como contribuição para a economia comum se configura como cumprimento espontâneo de obrigação natural, insuscetível de ser repetido, pelo que falece à apelante e autora o direito à restituição do respetivo valor” ;
- da RC de 17/09/2013 [78], incidente sobre o ónus da prova da causa justificativa, enquanto pressuposto do enriquecimento sem causa, sumariando-se que no “caso do chamado “enriquecimento por prestação” do empobrecido, a obrigação de restituir assenta na efectiva inexistência, não verificação ou posterior desaparecimento da concreta “causa justificativa” que presidiu a essa prestação”.
Todavia, é diferenciada a situação em que “existiu uma causa para a realização da prestação, mas que esta se não verificou – rectius, que já não se verificava ou que se frustrou –, desencadeará, se provada, a obrigação de restituir o enriquecimento, por verificação da facti species interpretativa do artigo 473º do CC”, da situação em que se conclui pela “ausência dessa causa”, decorrente “de um non liquet da parte sobre a qual recai o ónus da alegação e da demonstração da existência dessa mesma causa. Neste último caso, a consequência de não se provar (ou de não se ter alegado) a causa de uma prestação não é a restituição desta por falta de causa, será, em princípio, no quadro da já mencionada “teoria das normas” (v. nota 7 supra), o accionar das chamadas “regras de decisão” – no caso, os artigos 342º, nº 1 e 516º, respectivamente do CC e CPC – próprias desse non liquet” ;
- da RC de 25/05/2010 [79], que, após afastar a consideração de inexistência ou falta de causa nas situações em que um dos conviventes quis, através da prestação que efectuou, colocar determinado bem em situação de compropriedade com o demais convivente, ainda que exclusivamente à sua custa (o fim visado de criar uma situação de comunidade de bens existiu e foi alcançado, com o estabelecimento da situação de compropriedade), reconhece, todavia, que a “consideração do fim da causa da atribuição patrimonial (do fim da união de facto) parece-nos abrir a via do enriquecimento sem causa, face aos pressupostos do instituto recolhidos na nossa lei (“[…] o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir […]”), devendo considerar-se – quase que poderíamos dizer: contabilizar-se) o que se deslocou de um património ao outro teleologicamente referido, em exclusivo, à existência do estado de facto expresso nessa situação de vida em comum em condições análogas às dos cônjuges” ;
- da RG de 07/05/2020 [80], sumariando-se constituir a união de facto “um meio informal de constituição e organização familiar que assenta exclusivamente na vontade dos conviventes de estabelecerem uma comunhão de vida análoga à dos unidos pelo casamento, e que gera entre os conviventes um dever ético ou moral de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência, cujo incumprimento não pode ser exigido judicialmente, restando ao unido de facto, em caso de incumprimento desses deveres por parte do outro convivente, nomeadamente, do dever de assistência, assumir sozinho os encargos normais e correntes do agregado ou pôr termo à união de facto.
O facto da Autora, durante a união de facto, ter pago, sem qualquer contributo do Réu, todas as despesas normais e correntes do agregado familiar, não confere àquela, uma vez finda a união, qualquer direito de restituição sobre o último em relação a essas despesas, uma vez que os pagamentos que efetuou consubstanciam o cumprimento do dever ético de prestar assistência ao seu agregado familiar, informalmente constituído, traduzindo o cumprimento de uma obrigação natural” ;
- da RG de 15/11/2018 [81], onde, acerca da contribuição para a economia comum de cada um dos conviventes, reforça não se poderem “considerar como situações de enriquecimento, as despesas e tarefas realizadas em sede da vida doméstica por um dos membros daquela relação, em nome da união que aqueles pretendiam manter e preservar, em função do afecto e/ou interesse que os unia”, pois, neste tipo de situações “estamos no âmbito de uma relação sentimental análoga à dos cônjuges em que cada um contribui com o que quer e/ou pode para o êxito dessa relação, e por isso, a prestação de cada um e a que cada membro da união de facto efectuou é mais do que justificada no âmbito dessa relação, ainda que cada um contribua com prestação diferente ou em medida diferente daquela que o outro prestou”.
Donde, aduz, “na constância da união de facto, as prestações patrimoniais espontâneas efectuadas por qualquer um dos membros da união de facto, para satisfazer as necessidades de vida em comum, devem presumir-se feitas em cumprimento de uma obrigação natural de alimentos, pelo que, em regra, o autor da prestação não pode exigir ao companheiro a restituição do que prestou dentro daquele contexto (cfr. art. 403º do CC)”.
Por fim, no que se reporta ao ónus probatório relativamente ao requisito do enriquecimento sem causa carência de causa justificativa, sublinha que o seu preenchimento “não se basta com a mera cessação da união de facto; torna-se necessário que o autor alegue e prove que as deslocações patrimoniais se verificaram no pressuposto, entretanto desaparecido, da continuação e subsistência da união de facto, só assim se podendo considerar preenchido o requisito da carência de causa justificativa inerente ao instituto do enriquecimento sem causa”.
Em termos doutrinários, reconhecendo o enriquecimento sem causa como um dos institutos utilizado na resolução de conflitos patrimoniais aquando da ruptura da união de facto, nomeadamente, e principalmente, quando se coloca o problema da partilha dos bens existentes, defende Ana Catarina Leopoldo Fernandes [82] não ser bastante “que um dos membros enriqueça, terá sempre esse enriquecimento que comportar o empobrecimento do outro, ou seja, terá que ser ás custas do outro, sem ter, ainda, qualquer causa que o justifique. Refere Vaz Serra que “No domínio do enriquecimento sem causa, tem importância saber em que consiste a causa, pois só quando ela falta se admite o direito de restituição do enriquecimento””.
Acrescenta, então, constituir tal instituto “uma das fontes geradoras de obrigações, sendo que o credor da obrigação de restituir é a pessoa à custa de quem o enriquecimento se deu e o devedor aquele que injustamente se locupletou à custa dele. Esta obrigação de restituir destina-se a compensar a contraparte, à custa de quem um outro, sem qualquer causa justificativa, viu o seu património enriquecido, defendendo Cristina Dias que o facto de existir união de facto entre duas pessoas não justifica o enriquecimento de um dos conviventes à custa do outro, entendendo, ainda, a autora que “A obrigação de restituir não visa aqui reparar o dano do lesado, mas suprimir o eliminar o enriquecimento de alguém à custa de outrem””.
Situações diferenciadas existem, todavia, quando “um dos membros da união abdica do seu trabalho para se dedicar, e, exclusivo, ás lides domésticas e à educação dos filhos do casal, que possam existir, sendo que somente um dos membros aufere rendimentos. Ora, nestas situações, não obstante a contribuição do membro que não trabalha não ser uma contribuição direta para o sustento do lar, sempre é esta uma contribuição com o seu trabalho, ainda que não remunerado. Perante uma situação deste tipo, é provável que qualquer bem que seja adquirido pelo casal seja pago somente com os valores de um deles, bem como qualquer conta bancária somente tenha depósitos monetários de um deles. Assim, se se pretende compensar o trabalho que um dos membros prestou em favor da vida comum do casal, e desde que, lá está, estejam previstos os pressupostos já referidos da aplicação do regime jurídico do enriquecimento sem causa, então a jurisprudência recorrerá a esse instituto, por forma a que a vantagem que um dos membros adquirir, às custas do outro, seja diminuída. Neste sentido, Cristina Dias refere que “A vantagem em que o enriquecimento sem causa consiste é encarada do ponto de vista do enriquecimento patrimonial, que traduz a diferença produzida na esfera económica do enriquecido e que resulta da comparação entre a sua situação efectiva (situação real) e aquela em que se encontraria se a deslocação se não tivesse verificado (situação hipotética).”. Pelo que, cremos, a maior dificuldade que poderá existir aquando da aplicação deste regime às uniões de facto será contabilizar o montante a restituir àquele que saiu empobrecido”.
Ora, efectuado o enquadramento legal, doutrinário e jurisprudencial da controvérsia em equação, retornemos ao caso concreto, efectuando a devida articulação com a factualidade provada, em concatenação com o instituto jurídico fundante do pedido subsidiário a considerar. 
Já supra consignámos que, relativamente a um dos mútuos em equação – datado de 10/10/1996, contraído junto do BCP pela Ré, para aquisição da fracção habitacional, no qual o ora Autor figura como fiador -, julgado improcedente o pedido principal, urge considerá-lo no âmbito do pedido subsidiário formulado, ou seja, aferir acerca da sua pertinência em sede de enriquecimento sem causa, tendo por base os efeitos patrimoniais da dissolução da união de facto mantida entre Autor e Ré.
O que faremos de imediato.
Provou-se que a vivência em união de facto entre Autor e Ré, como se marido e mulher fossem, prolongou-se desde data não anterior a 1992 nem posterior a Março de 1994, até Setembro de 2010 - facto 1.
Bem como que, na pendência de tal vivência em comum, Autor e Ré decidiram adquirir um apartamento, de forma a servir, como serviu, de habitação dos dois, do filho de ambos e dos três filhos da Ré. E que, pese embora a intenção das partes de que o imóvel ficasse a integrar o património do agregado familiar, pelo facto de o Autor querer proteger o património familiar do risco inerente à sua actividade empresarial, foi decidido que o apartamento da Rua … seria adquirido em nome da Ré – cf., factos 13 e 14. Ocorrendo tal, ainda, devido ao facto do Autor, à data, apesar de se encontrar separado, ainda ser casado, apenas se tendo vindo a divorciar em 13/11/2000, circunstância pela qual, em aditamento ao supra exposto, tal fracção veio a ser adquirida apenas em nome da Ré, passando a ser a habitação permanente do casal – factos 17 e 18.
 Na prossecução do decidido, provou-se, ainda, que mediante escritura pública de compra e venda outorgada em 10/10/1996, a Ré adquiriu a fracção autónoma designada pela letra «C» que corresponde ao … andar do prédio urbano situado na Rua …, números … e …-A, em Lisboa, pelo preço de vinte e cinco milhões de escudos (€ 124.699,47).
Pela mesma escritura, foi celebrado um contrato de mútuo em que intervieram o Banco de Investimento Imobiliário, SA. [do grupo Millennium BCP] na qualidade de mutuante, a Ré, na qualidade de mutuária e o Autor na qualidade de fiador e principal pagador, em virtude do qual foi emprestado à Ré, com a obrigação de restituição, o montante de vinte e oito milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a €142.157,40), sendo vinte e cinco milhões de escudos (correspondentes a €124.699,47) destinados ao pagamento da aquisição da fracção acima referida e os restantes três milhões e quinhentos mil escudos (correspondentes a € 17.457.93) destinados ao pagamento de obras de beneficiação na mesma fracção.
Tal empréstimo foi concedido pelo prazo de dezassete anos a contar de 15 de Outubro de 1996 e seria amortizado em duzentas e quatro prestações mensais, de capital e juros, tendo a primeira vencimento no dia 15 de Novembro de 1996, sendo que o pagamento das prestações de amortização da dívida, capital e juros atinentes a tal empréstimo foi sempre efectuado por débito directo da conta titulada pelo Autor no Banco Millennium BCP, com o número …, a qual passou a ser conjuntamente titulada por A. e Ré a partir de 27.05.1996 – cf., factos 2 a 5.
A última prestação de tal mútuo foi debitada em 16/09/2013, tendo, até essa data, sido pago o montante global de 214.031,20 €, a título de capital e juros – cf., factos 9 e 9.1.
Provou-se, ainda, nunca ter sido o Autor chamado ao pagamento de tal empréstimo, a título de fiador, em virtude da conta na qual as prestações eram debitadas sempre ter tido cobertura – cf., facto 34.
Para além do exposto, provou-se, ainda, o seguinte:
- o Autor recebia o seu vencimento e outros rendimentos naquela conta bancária onde eram debitadas as prestações – facto 11 ;
- apesar de ser contitular de tal conta desde a indicada data de 27/05/1996, a Ré apenas a movimentava, a débito, através do uso de cartão de crédito associado ;
- sendo que a crédito apenas a movimentos nos termos expostos nos factos provados 27 e 28 – facto 12 ;
-   os movimentos de crédito para tal conta enunciados no facto 27, ocorreram entre 1993 e 1995, no valor global de 39.841,17 € - facto 27 ;
- computando-se e entendendo-se a consideração de tais valores, mesmo anteriores à data da contracção do mútuo bancário, em virtude dos conviventes já habitarem tal fracção desde Março d e1994, primeiramente como arrendatários – facto 16 -, na mesma tendo efectuado obras, e resultando ainda assente nos autos que o seu pagamento à vendedora concretizou-se anteriormente à data de recurso ao mútuo bancário ;
- todavia, logo após a disponibilização da quantia referente ao mútuo contraído em 10/10/1996, o Autor emitiu e entregou à Ré um cheque sacado sobre a conta identificada em 5, datado de 14/10/1996, no valor de 7.500.000$00 (contravalor de 37.409,84 €), que esta depositou na conta do BBVA – Banco Bilbao Vizcaya Argentaria, identificada em 19 -  facto 27.3 ;
- por outro lado, a quantia referenciada em 27.1, transferida em 31/10/2005, é irrelevante para a ponderação em apreciação, atenta a prova da sua pertença ao Autor – facto 27.4 ;
- a quantia mencionada no facto 27.2 - € 7.481,96 - foi paga directamente pela Ré á anterior proprietária vendedora ;
- por sua vez, os valores depositados na mesma conta do BCP, entre 2001 e 2009, provenientes dos arrendamentos da fracção (e garagem) da Ré, identificadas em 2 e 6, no montante total de 207.789,00 €, tiveram como correspondente que, em idêntico período, tenha sido suportado o pagamento de rendas, debitadas na mesma conta, no montante de €265.236,00 - factos 28 e 55 -, ou seja, em montante ainda superior ao depositado.
Resulta, assim, do exposto, ter o Autor assumido, quase na totalidade, o pagamento das prestações mensais debitórias relativas ao mútuo bancário contraído no âmbito da aquisição de um imóvel que, pelos motivos invocados, veio a ser adquirido apenas em nome da Ré. Assumpção que determinou que, durante o período de amortização do empréstimo, terminado em 16/09/2013, o mesmo tenha liquidado o montante global de 214.031,20 €, a título de capital e juros.
Tal pagamento veio a ser processado através de conta bancária solidária, onde eram depositados os réditos do Autor, e que a Ré apenas movimentou a crédito no valor de 39.841,17 €.
Sendo que, do valor disponibilizado pelo banco mutuante, e logo que foi disponibilizado, a Ré tenha recebido o valor de 37.409,84 €, depositado na conta do BBVA, apenas por si movimentada a débito – facto 20.
Donde constata-se que daquele valor creditado entre 1993 e 1995, foi devolvido/reembolsado à Ré a quase totalidade, só não o sendo no remanescente montante de 2.431,33 € (39.841,17 (-) 37.409,84 €). 
Resulta, assim, que daquele valor suportado pelo convivente Autor a título de capital e juros, na amortização do mútuo contraído para aquisição e obras do imóvel que veio apenas a ser registado em nome da Ré (tendo sido apenas esta a figurar como compradora), esta apenas logrou provar ter contribuído para a sua aquisição naquela quantia residual, pelo que, comprovadamente, e a tal título, o Autor suportou a quantia de 211.599,87 € (214.031,20 € (-) 2.431,33 €).
Esta quantia corresponde ao enriquecimento da Ré, por tal imóvel apenas ter integrado o seu património pessoal, e consequente empobrecimento do Autor, traduzindo-se a causa do enriquecimento a vivência em união de facto, sendo certo, tal como se provou, destinar-se tal imóvel à habitação dos conviventes e respectivos filhos (da Ré e um deles comum), sendo a habitação permanente do casal, e tendo sido mesmo intenção das partes que tal imóvel ficasse a integrar o património do agregado familiar, o que só não sucedeu pelo facto do Autor ainda figurar como casado e no intuito de proteger o património familiar do risco inerente à sua actividade empresarial.
Todavia, cessada tal união de facto, aquela causa justificativa deixou de existir, ou seja, ocorreu posterior e subsequente desaparecimento da causa legitimadora do enriquecimento ocorrido.
O que determinará que, constatada aquela deslocação patrimonial mediante a prestação efectuada pelo Autor convivente, a qual tinha como causa a união de facto e permanência desta, com consequente permanência dos conviventes na fracção adquirida, cessando este fim, a obrigação daí resultante fica sem causa, ou seja, a deslocação patrimonial fica carente de causa justificativa, por supressão posterior desta.
O que determina que o ordenamento jurídico acautele e legitime a necessária reposição do equilíbrio patrimonial, preenchidos que se mostram todos os requisitos ou pressupostos do enriquecimento sem causa
De forma que pretendemos ainda mais clara, afirmemos que, demonstrada a dissolução da união de facto entre Autor e Ré, e perante a pretensão do Autor traduzida na presente acção, impõe-se a partilha ou liquidação dos interesses patrimoniais dos membros daquela.
Resulta indubitável que a aquisição do imóvel em equação, e consequente assumpção dos encargos bancários subjacentes ao mútuo contraído para tal aquisição, não traduzem encargos do quotidiano da vida familiar, de forma a que pudéssemos falar do cumprimento de qualquer dever de assistência.
Resulta concludente que á contribuição do Autor, concretizada no pagamento do capital e juros com a amortização daquele mútuo bancário, esteve subjacente a estabelecida união de facto, pois a concretizada aquisição da fracção habitacional teve por clara finalidade a fruição por parte dos conviventes e respectivos filhos, tendo-se inclusive equacionado que a aquisição do imóvel teria por finalidade integrá-lo no património do agregado familiar, o que só não aconteceu devido ao subsistente estado de casado daquele (à data) e pretensão de protecção daquele património ao risco inerente á actividade empresarial por si desenvolvida.
Ou seja, resulta claro que a união de facto encerrou e constituiu a causa jurídica da contribuição monetária realizada pelo convivente Autor, através da assumpção do pagamento das prestações debitórias, para a aquisição do identificado imóvel.
Pelo que, nos termos expostos, com a dissolução da união de facto, importa concluir pela extinção da causa jurídica daquela contribuição por prestação, ou seja, a causa justificadora daquela deslocação patrimonial não mais subsiste, tendo supervenientemente desaparecido (condictio ob causam finitam), ocorrendo assim enriquecimento em virtude de causa que deixou de existir.
Determinando, consequentemente, o total preenchimento dos enunciados requisitos do enriquecimento sem causa, devendo a Ré pagar ao Autor, a tal título, por referência ao mútuo datado de 10/10/1996, a quantia de 211.599,87 € (duzentos e onze mil quinhentos e noventa e nove euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida dos respectivos juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa legal, computados desde a citação e até integral pagamento.
Tal como anotámos supra, o Autor peticiona, ainda, o pagamento da quantia total de 44.752,00 €, por si integralmente paga, relativa a seguros obrigatórios indexados aos mútuos supra identificados – cf., o artº. 21º da petição inicial e alínea c) do petitório accional principal.
Replicando o supra aduzido por referência ao pedido principal e demais mútuo, inquestionado que está o pagamento de tais seguros, desconhece-se, todavia, qual a natureza dos mesmos, montantes efectivamente liquidados e a sua referência a um ou a outro dos mútuos em consideração.
O que determina, por recurso ao quadro legal inscrito no nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, a condenação da Ré, na quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente às quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo ora equacionado, identificado nos factos 3 e 4.
Não sendo a falta de liquidez da presente vertente do crédito, fundado no enriquecimento sem causa, imputável à Ré devedora, não são devidos juros moratórios sobre a mesma, atento o prescrito no 1º segmento do nº. 3, do artº. 805º, do Cód. Civil.
A decisão equacionada tem por subjacente as seguintes considerações ou entendimentos:
- as despesas referenciadas nos factos 29, 35, 44 a 49, 57 a 59, 63 a 65 e 70, suportadas pela Ré e pelo Autor, referentes, entre outras, a despesas de supermercado, viagens, férias, de manutenção de casas de férias, alimentação, empregadas, jardineiro, parcial pagamento de um veículo para uma das filhas da Ré e casamento de uma das filhas desta, por que inerentes e necessárias à convivência típica de um envolvimento familiar, sendo livre e espontaneamente realizadas entre os membros da união de facto, não são exigíveis em termos da sua repetição, sendo-lhes antes aplicável o regime das obrigações naturais.
Com feito, tais despesas, tendo uma causa justificativa, que é a própria subsistência do relacionamento análogo aos dos cônjuges, querido por ambos os conviventes, não podem ser reclamadas com base no enriquecimento sem causa, pois, além do mais, e independentemente da maior premência ou necessidade da sua verificação, sempre volátil consoante a concreta disponibilidade económica do concreto agregado familiar, consubstanciam ainda como que o cumprimento do dever ético de prestar assistência ao agregado familiar, ainda que informalmente constituído. O que traduz efectivo cumprimento de uma obrigação natural.
Tais despesas, catalogadas, assim, como correntes ou normais, de verificação constante ou periódica e normalmente sem natureza excepcional e economicamente relevante, são próprias de quem vivência a aludida, ainda que informal, plena comunhão de vida, não podendo, reitera-se, ser restituíveis à luz da tutela do enriquecimento sem causa, pois têm por base um mero dever de ordem moral ou social – cf., artigos 402º e 403º, ambos do Cód. Civil.
E, o mesmo sucede com as provisões efectuadas pelo próprio Autor na conta BBVA, referenciadas no facto provado 36, sendo através desta conta, solidária a partir de determinado momento, mas  apenas movimentada a débito pela Ré, que esta normalmente pagava despesas do agregado familiar – factos 19, 20 e 29 -, tudo indiciando que tais provisões tinham por alicerce ou razão contribuir para aquelas, para além do próprio directo contributo do Autor no suportar de despesas de tal natureza.
- conforme bem se refere na sentença apelada, apesar de se ter provado – facto 66 – que o Autor suportou o custo das obras feitas no apartamento da Rua …, em 2009, no valor global de cerca de €63.000,00, sendo aquele apenas pertença da Ré, conforme constatámos, o que é certo é que não logrou pedir tal valor, pelo que relativamente ao mesmo nada urge decidir ou avaliar, nomeadamente acerca da sua  eventual ressarcibilidade através do mecanismo em aferição.
 - por fim, ajuizou a sentença apelada (repetimos mo supra consignado por mera facilidade expositiva) que algumas contribuições, apesar de serem judicialmente exigíveis, por não estarem a coberto do regime das obrigações naturais, não são, todavia, repetíveis, por tal reivindicação traduzir abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
Procurou-se, então, aferir acerca do motivo/causa pelo qual, após 2005, data do último depósito “por conta” da Ré na conta do Millenium BCP, sensivelmente a meio do plano prestacional, o Autor continuou a assegurar o pagamento das prestações. Equacionou-se que tal causa poderá ter sido:
c. A união de facto (a expectativa da manutenção da união) ;
d. O valor global recebido da Ré, que ultrapassou o valor peticionado ao Banco.
Assim, na ponderação da primeira situação, aferiu-se se, no contexto das partes, a cessação da união de facto deveria ser entendida como extinção da causa justificativa para estes efeitos.
Considerou-se, então, que o Autor, após a cessação da união de facto, continuou a suportar a referidas prestações de amortização dos mútuos bancários, bem como outras despesas da Ré e do filho comum, durante cerca de dois anos, sem lograr demonstrar (ou sequer alegar) que a teria avisado que iria cessar a assumpção de tal encargo e sem que lhe tivesse pedido contas.
Ora, perante tal comportamento, equacionou-se se o mesmo não determinava que o peticionado nesta acção devesse ser considerado abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, atenta a existência de um comportamento contraditório, concluindo-se em sentido afirmativo, na consideração da confiança que o comportamento do Autor transmitiu à Ré, em termos desta confiar no cumprimento integral das prestações por banda do Autor. Ou seja, com tal comportamento, o Autor revelou que não encarou a ruptura da união de facto como a cessação da causa que justificava o seu contributo para aquele agregado.
o Autor comportou-se como se, no seu animus, o agregado em que se encontrava o seu filho fosse (continuasse a ser) família que o mesmo devesse proteger e ajudar, ou seja, comportou-se como se a causa da sua contribuição se mantivesse, ou como se tivesse para si que, em tempo, a Ré lhe tivesse depositado na conta valores suficientes para pagar antecipadamente os empréstimos bancários.
Criando, assim, com tal comportamento, uma situação objectiva de confiança num determinado comportamento e ponto de vista, nos quais a Ré terá, compreensivelmente, confiado. Pelo que, o comportamento contraditório ora revelado traduz os elementos constitutivos de uma situação de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
O que, caso se considerassem preenchidos os requisitos do enriquecimento sem causa (o que não se reconhece) sempre extinguiria o direito decorrente da aplicação daquele instituto. Ou seja, ainda que existisse um enriquecimento da Ré, suportado pelo empobrecimento do Autor, o que este não demonstrou, existiria uma causa para aquela conferida vantagem, consubstanciada na intenção do Autor de, conscientemente, e num espírito de generosidade, beneficiar o património da Ré, de modo a, eventualmente, preservar o agregado familiar do filho comum, não sendo conferida tutela jurídica ao seu posterior arrependimento.
Determinando, consequentemente, igual juízo de total improcedência relativamente ao pedido subsidiário, fundado no enriquecimento sem causa.
Ora, o entendimento sufragado não pode merecer, minimamente, a nossa adesão.
Por um lado, conforme já supra referenciámos, o aludido comportamento do convivente, ora Autor, mesmo após a Ré ter deixado de depositar quaisquer quantias na conta onde as prestações mensais do mútuo contraído eram debitadas, ou seja, logo após 1995, nunca poderia ter por base a consideração de que, para o mesmo Autor tal decorreria do facto daquela ter depositado na conta valores suficientes para pagar antecipadamente os empréstimos bancários. O que é explicável pelo simples facto de tal nunca ter acontecido, sendo que esteve, inclusive, muito longe de ocorrer.
Por outro, não logramos corroborar o entendimento de que, preenchidos os pressupostos/requisitos do enriquecimento sem causa, existe abuso de direito por parte do Autor, na modalidade de venire contra factum proprium, atento o aludido comportamento contraditório deste. O que inoperacionalizava o exercício deste direito.
Vejamos.
A cláusula geral da boa fé ou do abuso de direito encontra-se estatuída no art.º 334º, do Cód. Civil, o qual dispõe ser “ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
Traduz, assim, o abuso de direito a “fórmula mais geral de concretização do princípio da boa fé”, de acordo com a afirmação de que “o direito cessa onde começa o abuso”, sendo configurado como “um excelente remédio para garantir a supremacia do sistema jurídico e da Ciência do Direito sobre os infortúnios do legislador e sobre as habilidades das partes” [83].
Parafraseando os ensinamentos de Antunes Varela [84], refere-se que a fórmula legal de excesso manifesto dos limites impostos pela boa fé, abrange, de uma forma especial, as situações que a doutrina e jurisprudência reconhecem como de venire contra factum proprium. São, nomeadamente, “aqueles casos em que a pessoa pretende destruir uma relação jurídica ou um negócio, invocando, por exemplo, determinada causa de nulidade, anulação, resolução ou denúncia de um contrato, estabelecida no interesse do contraente, depois de fazer crer á contraparte que não lançaria mão de tal direito, ou depois de ter dado causa ao facto invocado como fundamento da extinção da relação ou do contrato”.
Assim, a noção de venire contra factum proprium postula dois comportamentos da mesma pessoa, “lícitos em si e diferidos no tempo. O primeiro – factum proprium – é, porém, contrariado pelo segundo”. E, citando Meneses Cordeiro [85], acrescenta-se existir venire contra factum proprium numa de duas situações: “quando uma pessoa, em termos que, especificamente, não a vinculem, manifesta a intenção de não ir praticar determinado acto e, depois, o pratique e quando uma pessoa, de modo, também, a não ficar especificamente adstrita, declare pretender avançar com certa actuação e, depois, se negue”.
Traduz, assim, esta locução - venire contra factum proprium – que “a ninguém é permitido agir contra o seu próprio acto. À partida, ela exprime a reprovação social e moral que recai sobre aquele que assuma comportamentos contraditórios”. Abarca a “hipótese de, independentemente de ter sido accionada qualquer previsão normativa comum de tipo contratual, o agente ficar adstrito a não contradizer o que primeiro fez e disse” [86].
Ora, a proibição do venire contra factum proprium radicada na boa fé tem como alvo preferencial o quadro em que “uma situação de aparência jurídica é criada, em termos tais que suscita a confiança das pessoas”.
Pelo que, para além das situações em que o Direito estrito permite uma solução mais rápida e eficaz, “permanece uma zona na qual alguém, por acção, dá azo a uma situação de confiança sem que, dogmaticamente, seja possível recorrer à teoria dos negócios. Não se trata tanto de conseguir uma protecção: antes prevalece a necessidade de definir os termos e o âmbito duma tutela razoável. Aí, o apelo à boa fé e aos meandros da tutela da confiança, acima apontados, constituirá uma solução excelente” [87].
Nas palavras de Baptista Machado [88] , o venire contra factum proprium, enquanto modalidade do abuso de direito, é traduzida por “uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada posição futura”.
O investimento nessa confiança reporta-se aos casos em que “haja sido feito apenas com base nessa confiança”.

E, por referência à boa fé do contraente que confiou, “só merecerá protecção jurídica quando este esteja de boa fé e tenha agido com cuidado e precauções usuais no tráfico jurídico”.
Acresce, recorrendo-se aos ensinamentos de Manuel de Andrade, que este Ilustre Professor inclinava-se, ainda que de forma não categórica, para a solução de improcedência de arguição da nulidade, quando esta arguição revista as características de um abuso de direito. Com efeito, conforme expressamente referenciado por aquele, “tal consideração não exige, porém, que as regras da forma devam ser consideradas um «jus strictum», indefectivelmente aplicado, sem qualquer subordinação a um princípio supremo do direito, verdadeira exigência fundamental do «jurídico», como é o do artigo 334º (abuso do direito).
O intérprete, desde que lealmente aceite como boa e valiosa para o comum dos casos a norma que prescreve a nulidade dos negócios feridos de vício de forma, está legitimado para, nos casos excepcionalíssimos do art. 334º, afastar a sua aplicação, tratando a hipótese como se ao acto estivesse formalizado.
Fora destes casos excepcionalíssimos, se uma das partes actuou com má fé nas negociações, o negócio é nulo, mas surgirá uma indemnização por força do artigo 227º (......).
De qualquer modo a segurança da vida jurídica e a certeza do direito, sendo valores de importância fundamental na ordenação da vida social e compreendendo-se o seu acatamento mesmo que para isso se pague o tributo de alguma injustiça, não podem ser afirmados com sacrifício das elementares exigências do «justo»” [89].  
Exposto tal entendimento, que se nos afigura imaculado e pertinente, a questão a decidir e clarificar é a seguinte: o que é que se deve entender por abuso de direito ?
No nosso sistema legal, a concepção de abuso de direito adoptada “é a objectiva: - não é necessário a consciência de se atingir, com o seu exercício, a boa fé, os bons costumes ou o fim social ou económico do direito conferido: basta que os atinja” [90]. E, relativamente ao conceito de boa fé, esta não está presente “quando se pretende alcançar resultados opostos aos que uma consciência razoável poderia tolerar”, devendo então credor e devedor comportarem-se reciprocamente “como o fariam pessoas sérias e equânimes, não se atendo à letra dos contratos, mas sobretudo ao espírito deles, e fazendo o que for razoável para evitar o prejuízo dos interesses legítimos da parte contrária”. Pelo que, a obrigação não deve ser assumida “farisaicamente, nos seus aspectos exteriores e formais, mas no seu verdadeiro espírito, segundo as exigências profundas da natureza das coisas, da justiça, da liberdade”, não sendo a boa fé “um produto da indução lógica, nem objecto de conhecimento científico, mas matéria de experiência e de razão prática” [91].
Relativamente á conceptualização dos bons costumes, devem estes ser entendidos como “o conjunto de regras éticas aceites pelas pessoas honestas, correctas, de boa fé, num dado ambiente e num certo momento”, pelo que “não há que atender á moral que se pratica («mores») mas à moral que se entende dever ser observada («boni mores»), não à moral subjectiva do juiz, mas à moral objectiva, isto é, ao sentido ético preponderante na comunidade social ; não se trata ainda da moral transcendente, religiosa ou filosófica, mas da moral positiva” [92].
Por outro lado, o excesso de exercício do direito há-de ser manifesto, ou seja, “indiscutível, franco e claro, clamoroso, em termos clamorosamente ofensivos da justiça, verdadeiramente escandalosos”, pretendendo desta forma o legislador “prevenir uma excessiva intervenção do tribunal na vida de certas relações” [93].
Jurisprudencialmente, o presente instituto jurídico tem merecido a importância e realce que merece, através da abordagem de várias situações factícias capazes de traduzirem a abrangerem o mesmo.
Assim e procedendo á definição do abuso de direito, refere o sumário do douto Acórdão do STJ de 03/05/90 [94], que o instituto mais claro daquele “é a conduta contraditória (venire contra factum proprium) em combinação com o princípio da tutela da confiança”, existindo, ainda, duas figuras próximas: a renúncia e a neutralização do direito. Para que esta se verifique, necessária se torna a combinação das seguintes circunstâncias: “o titular de um direito deixar passar longo tempo sem o exercer ; com base neste decurso do tempo e com base ainda numa particular conduta do dito titular, ou noutras circunstâncias, a contraparte chega à convicção justificada de que o direito já não será exercido ; movida por esta confiança, tomou medidas ou adoptou programas de acção com base naquela confiança, pelo que o exercício tardio e inesperado do direito em causa lhe acarretaria agora uma desvantagem maior do que o seu exercício atempado”.
Em idêntico sentido, pronunciou-se o douto Acórdão do STJ de 20/06/2000 [95], o qual, após reafirmar concepção objectiva do instituto, independentemente da consciência da existência de abuso de direito, reconhece ser necessário que “o excesso constituído seja manifesto, ou seja, que haja uma clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante”, traduzindo-se a manifestação mais clara desse abuso na “conduta contraditória do «venire contra factum proprium», em combinação com o princípio da tutela da confiança, isto é, a inadmissibilidade  da pretensão de exercer um direito quando, com isso, o seu titular entra em contradição com a sua conduta anterior, e por ser uma exigência da lealdade” (sublinhado nosso). Pelo que, para que se verifique a neutralização do direito, é necessária a combinação de três distintas circunstâncias, nomeadamente a existência de “longo tempo sem exercício, de criação de convicção de confiança de confiança da contraparte de que já não será exercido, e de exercício tardio a acarretar uma desvantagem maior do que o exercício atempado” [96].
Após esta breve resenha doutrinária e jurisprudencial, a questão a demandar clarificação elenca-se nos seguintes termos: poderá afirmar-se que a conduta do ora Apelante/Recorrente/Autor é imbuída de abuso de direito ao vir reclamar, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, o pagamento das quantias relativamente às quais empobreceu, com consequente enriquecimento da Ré, em consequência da cessação da causa que legitimava tal deslocação patrimonial ?
A nossa resposta só pode ser negativa.
Com efeito, não descortinamos qualquer comportamento contraditório do Autor convivente.
Ora, e desde logo, o facto do mesmo ter continuado a assumir o pagamento das prestações relativas ao mútuo bancário concedido à Ré para a aquisição do imóvel, mesmo após 2005, tem uma explicação perfeitamente plausível e lógica, pois tal decorria da perduração da relação de união de facto que vivenciava, tendo aquele imóvel constituído, durante algum tempo, a residência dos unidos e respectivos filhos da Ré e filho comum.
Todavia, para além disso, não se pode igualmente olvidar que a tal pagamento, que se prolongou até á última prestação do mútuo, datada de 16/09/2013 – facto 9.1 -, ou seja, até data posterior á própria cessação da união de facto, datada de Setembro de 2010 – facto 1 -, não foi igualmente certamente alheio o facto do Autor figurar em tal mútuo na posição de fiador e principal pagador. Pelo que, eventual incumprimento na satisfação do mesmo não deixaria de ter repercussões na posição patrimonial deste, bem como lateralmente no seu crédito junto da instituição bancária mutuante (e, reflexamente, junto das demais).
Pelo que, da perduração de tal pagamento não se podem retirar as consequências e efeitos consignados na sentença apelada, sendo que a presente acção foi instaurada no mesmo ano em que tal pagamento cessou (e quando as prestações referentes ao demais mútuo ainda se encontravam a pagamento, o que, ademais, ainda sucede presentemente, pois o seu terminus só ocorrerá em 2024, sendo que o eventual incumprimento do Autor relativamente às mesmas acarretará responsabilidade acrescida, atenta a sua qualidade de condevedor solidário – factos 7 e 9.2).
Desta forma, não se entende como é possível concluir-se no sentido de tal conduta do Autor ter logrado criar na Ré a aludida situação objectiva de confiança relativamente a um determinado futuro comportamento seu, e no qual a mesma Ré teria compreensivelmente confiado, pois inexiste qualquer atitude ou comportamento provado que traduza contradição com o antecedente, ou que fosse pertinente a ser interpretado pela mesma Ré no sentido de que o Autor nunca reclamaria o pagamento das quantias que havia suportado no pagamento do mútuo bancário.
Esta conclusão não é, minimamente abalada pela prova de que o Autor, mesmo após a cessação da união de facto, tenha continuado a suportar, para além das prestações dos créditos, o seguro de saúde da Ré e do filho comum, médicos e despesas de saúde, bem como o colégio do mesmo filho e ainda as compras de supermercado até cerca de dois anos após a separação – factos 56, 67, 68, 70 e 71.
Ora, no que concerne às despesas do filho comum, mais não estamos do que perante o efectivo cumprimento da sua obrigação de alimentos, cumprindo um dever de assistência legalmente imposto, relativamente ao qual seria totalmente incongruente, no mínimo, a retirada de outras ilações, em seu desfavor. Nomeadamente, a de que tal comportamento traduza ou revele que não encarou a ruptura da união de facto como a cessação da causa que justificava o seu contributo para aquele agregado, ou que se tenha comportado como se, no seu animus, o agregado em que se encontrava o seu filho fosse (continuasse a ser) família que o mesmo devesse proteger e ajudar, ou seja, comportou-se como se a causa da sua contribuição se mantivesse. E que, vindo posteriormente exercer o direito à requerida restituição, que nada tem a ver com aqueles contributos, legalmente impostos no que ao filho concerne, e perfeitamente entendíveis (e mesmo louváveis) relativamente à progenitora do filho, atenta a natureza das despesas, tenha revelado uma contraditoriedade comportamental, susceptível de paralisar ou neutralizar o exercício do direito à restituição fundada no enriquecimento sem causa.  Ademais, não se olvide, ainda, que tendo a Ré sido acometida de doença de natureza oncológica em Março de 2002 – facto 26 -, a eventual cessação do seguro de saúde dificultaria, se é que não inviabilizava, a posterior contratação de um outro.
Pelo que, sem outras delongas, que se nos afiguram dispensáveis, concluímos pela inexistência de qualquer abuso de direito por parte do Autor no exercício do invocado direito, fundado no enriquecimento sem causa.
Em conclusão, num juízo de parcial procedência da presente apelação, decide-se o seguinte:
I) Revogar a sentença apelada ;
II) Em sua substituição, decide-se o seguinte:
- Julgar parcialmente procedente o pedido principal formulado pelo Autor, fundado no invocado direito de regresso perante a Ré condevedora solidária, condenando-se esta, a pagar àquele, a título de direito de regresso, as seguintes quantias, referentes ao mútuo identificado nos factos provados 7 e 8 (datado de 10/07/2008):
a) O montante de 22.208,95 € (vinte e dois mil duzentos e oito euros e noventa e cinco cêntimos), correspondente a metade do valor pago, a título de capital e juros, através de prestações de amortização, até 06/04/2016 ;
b) A quantia que, na proporção de metade, tenha sido ou venha a ser paga, exclusivamente pelo Autor, enquanto condevedor, a idêntico título de amortização (capital e juros), computada desde aquela data e até à sua total liquidação (30/05/2024) ;
c) Juros moratórios, vencidos e vincendos, sobre tais quantias já pagas, desde a citação e até integral pagamento ;
d) Nos termos do nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, a quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente a metade das quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo identificado nos factos 7 e 8.
- Julgar parcialmente procedente o pedido subsidiário deduzido pelo Autor, fundado no enriquecimento sem causa, e, consequentemente, condenar a Ré a pagar-lhe, a tal título e por referência ao mútuo identificado nos factos 3 e 4, datado de 10/10/1996, as seguintes quantias:
e) a quantia de 211.599,87 € (duzentos e onze mil quinhentos e noventa e nove euros e oitenta e sete cêntimos) ;
f) juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa legal, computados desde a citação e até integral pagamento ;
g) Nos termos do nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente às quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo ora equacionado, identificado nos factos 3 e 4 ;
III) Julgar improcedente o demais peticionado a título principal e subsidiário.
Relativamente à tributação, nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, decide-se o seguinte:
- no que concerne à acção:
- Custas cargo da Ré, relativamente á parte liquidada, sendo que relativamente á parte ilíquida, as custas serão suportadas, provisoriamente, por Autor e Ré, em idêntica proporção, fazendo-se o respectivo rateio aquando da liquidação de execução de sentença ;
- no que concerne ao recurso:
- Custas a cargo da Ré apelada/recorrida, atenta a procedência recursória obtida (por via do pedido principal e pedido subsidiário).
***
IV. DECISÃO
Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Autor/Apelante/Recorrente JS…, em que figura como Ré/Apelada/Recorrida MT… e, consequentemente, decide-se:
I) Revogar a sentença apelada ;
II) Em sua substituição, decide-se o seguinte:
- Julgar parcialmente procedente o pedido principal formulado pelo Autor, fundado no invocado direito de regresso perante a Ré condevedora solidária, condenando-se esta, a pagar àquele, a título de direito de regresso, as seguintes quantias, referentes ao mútuo identificado nos factos provados 7 e 8 (datado de 10/07/2008):
a) O montante de 22.208,95 € (vinte e dois mil duzentos e oito euros e noventa e cinco cêntimos), correspondente a metade do valor pago, a título de capital e juros, através de prestações de amortização, até 06/04/2016 ;
b) A quantia que, na proporção de metade, tenha sido ou venha a ser paga, exclusivamente pelo Autor, enquanto condevedor, a idêntico título de amortização (capital e juros), computada desde aquela data e até à sua total liquidação (30/05/2024) ;
c) Juros moratórios, vencidos e vincendos, sobre tais quantias já pagas, desde a citação e até integral pagamento ;
d) Nos termos do nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, a quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente a metade das quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo identificado nos factos 7 e 8.
- Julgar parcialmente procedente o pedido subsidiário deduzido pelo Autor, fundado no enriquecimento sem causa, e, consequentemente, condenar a Ré a pagar-lhe, a tal título e por referência ao mútuo identificado nos factos 3 e 4, datado de 10/10/1996, as seguintes quantias:
e) a quantia de 211.599,87 € (duzentos e onze mil quinhentos e noventa e nove euros e oitenta e sete cêntimos) ;
f) juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa legal, computados desde a citação e até integral pagamento ;
g) Nos termos do nº. 2, do artº. 609º, do Cód. de Processo Civil, quantia que se liquidar em execução de sentença, relativamente às quantias despendidas pelo Autor, com o(s) seguro(s) obrigatório(s) indexado(s) ao empréstimo ora equacionado, identificado nos factos 3 e 4 ;
III) Julgar improcedente o demais peticionado a título principal e subsidiário.
IV) As custas em dívida, quer no que concerne á acção, quer no que respeita ao recurso, são fixadas, nos termos do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, nos seguintes termos:
- no que concerne à acção:
- Custas cargo da Ré, relativamente á parte liquidada, sendo que relativamente á parte ilíquida, as custas serão suportadas, provisoriamente, por Autor e Ré, em idêntica proporção, fazendo-se o respectivo rateio aquando da liquidação de execução de sentença ;
- no que concerne ao recurso:
- Custas a cargo da Ré apelada/recorrida, atenta a procedência recursória obtida (por via do pedido principal e pedido subsidiário).
                       
Lisboa, 09 de Julho de 2020
Arlindo Crua
António Moreira
Carlos Gabriel Castelo Branco
_______________________________________________________
[1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
[2] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 155 e 159.
[3] Idem, pág. 160 e 161, bem como a menção aos arestos do STJ aí exposta e considerada.
[4] Relator: Rui Vouga, Processo nº. 329/16.6T8CSC.L1-1, in www.dgsi.pt .
[5] Relatora: Ana de Azeredo Coelho, Processo nº. 544/08.6TBPTS.L1-6, in www.dgsi.pt .
[6] Assim, o douto aresto desta Relação de 20/05/2010 – Relatora: Catarina Arêlo Manso, Processo nº. 336/09.5TVLSB.L1-8 ; no mesmo sentido, cf., o douto Acórdão ainda desta Relação de Lisboa de 05/03/2009 – Relator: Granja da Fonseca, Processo nº. 74/05.8TBSLX.L1-6, ambos in www.dgsi.pt .
[7] Relator: Salazar Casanova, Processo nº. 5443/2008-8, in www.dgsi.pt .
[8] A redacção impugnada era do seguinte teor:
A última prestação do mútuo datado de 10.07.08 foi debitada em 06.04.16, tendo, até essa data, sido pago o montante global de €44.417,89, a título de capital e juros”.
[9] A redacção impugnada era do seguinte teor:
“A Ré depositou na conta solidária do BCP os seguintes valores:
a)-€279.939,89 (cinquenta e seis milhões de escudos) em 11.01.94 * ;
b)€1.246,99 (duzentos e cinquenta mil escudos) em 13.03.95;
c)- €2.743,39 (quinhentos e cinquenta mil escudos) em 16.09.93;
d)-€25.874,83 (cinco mil, cento e oitenta e sete mil, quatrocentos e trinta e oito escudos) em 10.05.95;
e)-€9.975,96 (dois milhões de escudos) em 10.08.95; e
f)- €24.939,89 (cinquenta milhões de escudos) em 11.01.94”.
[10] Facto aditado, conforme infra decidido.
[11] Facto aditado, conforme infra decidido.
[12] Constava o seguinte da antecedente redacção do presente facto:
Através de cheques passados à Ré que a mesma veio a depositar na aludida conta do BBVA e de transferências para a mesma conta, o Autor provisionou o respectivo saldo com o montante global de € 52.100,00, entre 2003 e 2007”.
[13] O presente facto tinha a seguinte redacção:
“Até Junho de 2009, as rendas recebidas pelo arrendamento do imóvel identificado no ponto 2 deste elenco ascendeu a €207.789,00 sendo que A. e Ré suportaram renda de valor global para igual período de €265.236,00”.
[14] Tal facto tinha a seguinte redacção:
O montante de € 105.562,50 supra mencionado é dinheiro do Autor”.
[15] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Edição, Almedina, pág. 285.
[16] Idem, pág. 285 a 287.
[17] Notas ao Código Civil, Vol. II, Lisboa, 1988, pág. 329.
[18] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, pág. 538 e 539.
[19] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 6ª Edição, Almedina, pág. 752.
[20] Idem, pág. 758 e 759.
[21] Margarida Lima Rego, Código Civil Anotado, Coord. Ana Prata, Almedina, 2017, pág. 687.
[22] Rodrigues Bastos, ob. cit., Vol. III, pág. 107 e 108.
[23] Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pág. 661 e 662.
[24] Antunes Varela, ob. cit., Vol. II, pág. 486.
[25] Joana Farrajota, Código Civil Anotado, Coord. Ana Prata, Almedina, 2017, pág. 825.
[26] Ob. cit., Vol. I, pág. 755 e 756.
[27] Margarida Lima Rego, ob. cit., pág. 687.
[28] Com as alterações introduzidas pela Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto e Lei n.º 2/2016, de 29 de Fevereiro.
[29] Cf., Ana Catarina Leopoldo Fernandes, A Dissolução da União de Facto: Efeitos Patrimoniais, Universidade do Minho, 2017, Dissertação de Mestrado, pág. 13 e 14, citando, nesta última parte, Jorge Duarte Pinheiro, O direito da família contemporâneo - lições, 4.ª ed., Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 2015, p. 652.
[30] Canotilho, J.J. Gomes, e Moreira, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4ª ed. revista, Coimbra: Coimbra Editora, 2007, pp. 561.
[31] Daniel António Raimundo Nogueira, União de Facto: um estudo sobre a regulamentação dos efeitos patrimoniais pelo contrato de coabitação, Universidade de Coimbra, 2016, pág. 13, Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, no âmbito do 2.º Ciclo de Estudos em Direito (conducente ao grau de Mestre), na Área de Especialização em Ciências Jurídico-Forenses.
[32] Ob. cit., pág. 567.
[33] Daniel António Raimundo Nogueira, ob. cit., pág. 14 e 15.
[34] Ana Catarina Leopoldo Fernandes, ob. cit., pág. 61.
[35] Cristina Dias, O regime da responsabilidade por dívidas dos cônjuges: problemas, críticas e sugestões, Coimbra, Coimbra Editora, 2009, pág. 1018, nota de rodapé n.º 1768.
[36] Seguiremos, nesta parte, de perto, o Acórdão desta Relação e Secção, de 18/10/2018, proferido na Apelação nº. 2874/16.4T8LRS.L1, com idênticos Relator e 1º Adjunto.
[37] assim, Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, Vol. VI, 1998, Lisboa, 1988, pág. 268.
[38] fazendo uma elencagem um pouco diferente, mas englobando todos os elementos apontados, cfr., Pires de Lima e  Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra Editora, págs., 454 a 456.
[39] idem.
[40] Relatora: Ondina Carmo Alves, Processo nº. 1/15.4T8ALQ.L1-2, in www.dgsi.pt .
[41] ob. e  vol. cits., pág. 456.
[42] cf., os Acórdãos do STJ referenciados pelos mesmos AA. na anotação citada.
[43] ob. e  vol. cits., pág. 269.
[44] Enriquecimento Sem Causa, 2ª edição, 1998, Almedina, pág. 105,.
[45] Tratado de Direito Civil, Vol. IV, pág. 743 ; e ainda Henri de Page, Traité élémentaire de droit civil belge, II, 40, pág. 52.
[46] em idêntico sentido é a solução defendida pela Ac. da RP de 07/05/69, in B.M.J., nº 194, pág. 288, em cujo sumário se defende que “a falta de justificação de enriquecimento necessária para que este possa considerar-se indevido, dando lugar à restituição por locupletamento injusto, é facto constitutivo do direito de quem pede a restituição, cuja prova lhe incumbe” ; no mesmo sentido, cfr., entre outros, os Acórdãos do STJ de 15/12/77, in BMJ, nº 272, pág., 196, e da RC de 24/10/96, in B.M.J., nº 460, pág. 830, referindo-se neste que para a procedência da acção de in rem verso “é indispensável que o autor faça a prova do pressuposto da ausência de causa, que não pode deixar de ter alegado”.
[47] Relator: Nascimento Costa, Doc. nº SJ199909230006862, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf .
[48] A Subsidiariedade da Obrigação de Restituir o Enriquecimento, pág. 317.
[49] Acórdão de 22/10/1996, Recurso nº 88384.
[50] Das Obrigações em Geral, 1970, pág. 324.
[51] Efectivamente, para a procedência do enriquecimento sem causa, não basta a não prova de tal causa justificativa da atribuição patrimonial ou do enriquecimento. É antes necessário “que se prove a falta de causa de deslocação patrimonial, nos termos da regra geral sobre o ónus probandi  estatuída no artigo 342º do Código Civil, por essa carência de causa justificativa ser facto constitutivo de quem requer a restituição do indevido”. Assim, não se tendo provado que “a causa da prestação de determinada importância fosse a invocada pelo autor ou a alegada pelos réus, ou qualquer outra, nem tampouco a falta de causa dessa atribuição patrimonial (...) o pedido de restituição da aludida importância, fundado no enriquecimento sem causa, não pode deixar de ser desatendido” – cf., o já citado douto Acórdão do STJ de 15/12/77. E, nem se olvide, tal como já supra referido, que é preciso convencer o tribunal da falta de causa, e que, no caso de dúvida, deve presumir-se que o enriquecimento derivou de justa causa, pois é o autor que tem que provar que o seu empobrecimento foi produzido sem causa.      
[52] Antunes Varela, ob. cit., pág. 444.
[53] ob. e  vol. cits., pág. 269.
[54] ob. e  vol. cits., pág. 457 e 458.
[55] Ob. cit., pág. 614.
[56] Relator: Oliveira Abreu, Processo nº. 2048/15.1T8STS.P1.S1, in www.dgsi.pt .
[57] A união de facto: a sua eficácia jurídica, em Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Volume I, página 226.
[58] Citando Inocêncio Galvão Telles, in, Direito das Obrigações, 7ª edição, Reimpressão, 2010, Coimbra Editora, páginas 199 e 200.
[59] Citando Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., páginas 454 e seguintes.
[60] Relatora: Maria do Rosário Morgado, Processo nº. 219/14.7TVPRT.P1.S1.
[61] Relator: João Bernardo, Processo nº. 09B652, in www.dgsi.pt .
[62] Relator: Serra Baptista, Processo nº. 123/07.5TJVNF.S1, in www.dgsi.pt .
[63] Relator: Sérgio Poças, Processo nº. 3084/07.7TBPTM.E1.S1, in www.dgsi.pt .
[64] Relator: Nuno Cameira, Processo nº. 2152/09.5TBBRG.G1.S1, in www.dgsi.pt .
[65] Relatora: Maria de Deus Correia, Processo nº. 6157/08.5TBCSC.L1-6, in www.dgsi.pt .
[66] Cadernos de Direito Privado, n.º 11, Jul./Set. 2005, pág. 76 da anotação ao Ac. da Relação de Guimarães de 29-9-2004,P. 1289/04), citado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31-05-2011.
[67] Relatora: Catarina Arêlo Manso, Processo nº. 444/09.2TCFUN.L1-A-8, in www.dgsi.pt .
[68] Relator: Luís Espírito Santo, Processo nº. 8762/08.0TBCSC.L1-7, in www.dgsi.pt .
[69] Relator: Roque Nogueira, Processo nº. 2880/05.4TBMTJ.L1-7, in www.dgsi.pt .
[70] Relatora: Maria Teresa Albuquerque, Processo nº. 1920/16.6T8FNC.L1-2, in www.dgsi.pt .
[71] Relator: António Santos, Processo nº. 4521/10.9TBOER.L1-1, in www.dgsi.pt .
[72] Relatora: Rosa Ribeiro Coelho, Processo nº. 1874/05.4TCSNT.L1-7, in www.dgsi.pt .
[73] Relator: Manuel Domingos Fernandes, Processo nº. 999/15.2T8PVZ.P1, in www.dgsi.pt .
[74] Relatora: Anabela Dias da Silva, Processo nº. 210/12.8TBVNG.P1, in www.dgsi.pt .
[75] Relatora: Maria João Areias, Processo nº. 2273/11.4TJVNF.P1, in www.dgsi.pt .
[76] Relator: Fonte Ramos, Processo nº. 1501/15.1T8CTB.C2, in www.dgsi.pt .
[77] Relator: Vítor Amaral, Processo nº. 619/16.8T8MGR.C1, in www.dgsi.pt .
[78] Relator: Teles Pereira, Processo nº. 64/09.1TBTMR.C1, in www.dgsi.pt .
[79] Relator: Teles Pereira, Processo nº. 64/03.5TBTBV.C1, in www.dgsi.pt .
[80] Relator: José Alberto Moreira Dias, Processo nº. 7233/18.1T8GMR.C1, in www.dgsi.pt .
[81] Relator: Pedro Damião e Cunha, Processo nº. 5873/17.5T8GMRC.G1, in www.dgsi.pt .
[82] Ob. cit., pág. 65 a 68.
[83] Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, Tomo I, 1999, Almedina, pág. 191, 192 e 197.
[84] Ob. cit., Vol. I, 10ª edição, pág. 547.
[85] Da boa fé no Direito Civil, Vol. II, págs. 742 e segs..
[86] Menezes Cordeiro, Tratado ……, ob. cit., pág. 200.
[87] Idem, pág. 200 e 202.
[88] Obra Dispersa, I, pág. 416 e seguintes, citado no já referenciado douto Acórdão do STJ de 31/03/2009.
[89] cf.., Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, págs. 439 e 440.
[90] Abel Delgado, Ob. Cit., pág. 162..
[91] Idem, com a remissão para os autores e obras aí referenciados.
[92] Ibidem, com remissão para os autores e obras aí referenciados.
[93] Ibidem, págs. 164 e 165, bem como os autores e obras aí citados.
[94] In http://www.dgsi.pt , Doc. Nº SJ199005030783711.
[95] In http://www.dgsi.pt , Doc. Nº SJ200006200016051.
[96] cf.., ainda, entre outros, o sumariado no douto Acórdão do STJ de 02/02/89 – in http://www.dgsi.pt/jstj , Doc. n.º SJ198902020767822 -, onde se refere que o instituto do abuso de direito há-de “representar remédio tão eficiente quanto específico para actuar como válvula de segurança capaz de evitar que um direito seja exercido em termos clamorosamente ofensivos da justiça, com manifesto excesso dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social desse direito”, não se destinando, por sua vez, “a fazer extinguir direitos, antes se propõe manter o seu exercício em moldes conformes com o salutar equilíbrio dos interesses em jogo” ; o referenciado no douto acórdão do STJ de 08/07/82 – in http://www.dgsi.pt/jstj , Doc. n.º SJ198207080700801 -, que, após reafirmar a concepção objectiva do abuso de direito, acrescenta que este tem-se de “estruturar e alicerçar em factos que, para lá dessa falta de consciência, revelem um manifesto, clamoroso excesso, ofensivo dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico desse direito” ; o douto acórdão do STJ de 02/07/96 – in http://www.dgsi.pt/jstj , Doc. n.º SJ199607020001361 -, que reconhece a concepção objectivista do abuso de direito, mas realçando que a intencionalidade com que o titular tenha agido não deva ser ignorada para a questão de aferir se existe ou não abuso de direito, e acrescentando que a grande maioria da jurisprudência e doutrina “é no sentido de que improcede a arguição de nulidade de um contrato quando esta arguição configura um abuso de direito, como sucederá nos casos em que a nulidade formal é arguida pelo contraente que a provocou, ou levou dolosamente o autor a não formalizar o contrato ou procedeu de modo a criar nesse outro contraente a convicção de que não seria invocada a nulidade, procedendo, assim, de modo iníquo ou escandaloso” ; cf.., ainda, os Acórdãos do STJ de 28/10/97 e 12/04/89, in http://www.dgsi.pt/jstj, respectivamente, Doc. n.º SJ199710280006091 e SJ198904120773881.