Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
8543/10.1TBCSC.L1-7
Relator: AMÉLIA ALVES RIBEIRO
Descritores: DANO BIOLÓGICO
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/24/2017
Votação: MAIORIA COM UM VOTO VENCIDO
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Actua ilicitamente o R. que, agindo em nome próprio, na construção de um imóvel, não cumpre a legislação em matéria de obtenção da respectiva licença de utilização e que, numa segunda fase, agindo em nome do mandante, outorga o contrato de arrendamento sem ter obtido a mesma licença.
II. Vasta jurisprudência e doutrina têm entendido que o dano biológico, se traduz numa categoria que tanto pode dar origem a danos patrimoniais como não patrimoniais.
III. A autonomia da indemnização (que neste caso não se pode confundir com aquela que é atribuída quando há perda da capacidade de ganho) radica na afectação do direito à saúde concretizado numa situação de bem-estar físico e psíquico, enquanto direito fundamental de cada indivíduo, constitucionalmente consagrado nos artºs 24º nº 1, 25º nº 1 da CRP que estabelecem o carácter inviolável da vida e integridade física e moral da pessoa humana e no 70º do C.Civil que protege a ofensa ilícita à personalidade física ou moral de cada um.
IV. Ponderando, por um lado, que a A. tinha 55 anos à data do acidente e que lhe foi fixada a incapacidade de 60% e que ficou a precisar da supervisão de uma terceira pessoa para garantir as tarefas da vida diária tais como vestir-se, lavar-se, alimentar-se e transportar-se e, bem assim, as marcas do sofrimento físico plasmado na matéria de facto, e atendendo, por outro, à esperança média de vida (fixada em cerca de 83 anos para as mulheres) a remuneração mínima garantida (€403, em 2007), e vistos mutatis mutandis os critérios e valores orientadores constantes da Portaria n.º 377/2008 de 26 de maio, entretanto atualizada pela Portaria n.º 679/2009 de 25/6 e, bem assim, os valores médios atribuídos pela Jurisprudência dos tribunais superiores em casos congéneres, é de aceitar como não excessiva a indemnização e € 70.000 arbitrada pela primeira instância.
V. Ponderando os mesmos dados e atendendo ao tempo de vida activa da A. com base num cálculo paralelo, ao anteriormente referenciado, temperado pela equidade, em que ponderam factores como a circunstância de não ser tida em conta a inflação e sua repercussão nos salários, a ausência de possibilidade de progressão na carreira, não se afigura excessivo o valor de € 100.000,00 fixado a título de indemnização por danos patrimoniais em razão da incapacidade geral de ganho.
VI. Atendendo ao sofrimento psíquico da A. plasmado nas dores, na depressão, na privação da vida pelos períodos de internamento e pelas limitações de que passou a padecer, incluindo a perda de autonomia e o dano estético, e ponderando os padrões resultantes da jurisprudência publicada dos tribunais superiores, não se afigura exagerada a indemnização €50.000,00 por danos não patrimoniais.

(Sumário da responsabilidade exclusiva da relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA RELAÇÃO DE LISBOA.


I.RELATÓRIO:


1.Pretensão sob recurso: revogação da sentença recorrida, com a consequente absolvição dos RR..

1.1. Pedido: condenação dos RR. a pagar à A.:
- € 500.000,00 a título de ressarcimento de todos os danos físicos sofridos pela A. com o acidente;
- € 500.000,00 a título de ressarcimento de todos os danos morais sofridos pela A. com o acidente;
- € 500.000,00 a título de indemnização decorrente da IPP de 70%, a que viu votada, em consequência do acidente, onde se inclui a perda da capacidade de ganho, até aos 70 anos de idade (por ter ficado inválida, sem conseguir trabalhar);
- A importância relativa ao diagnóstico para determinação dos danos físicos efectivamente sofridos e ao custo dos tratamentos necessários à reparação dos danos causados, cuja liquidação se relega para execução de sentença;
- Todas aquelas importâncias devem ser acrescidas com os juros legais, contados desde a data da citação, até integral pagamento.

Para tanto, alegou a A., em síntese, que: vive com seu pai, AFL, numa moradia sita na Rua …, nº …, Bairro do …; o pai da A. celebrou em 31-1-2006, com o 1º Réu, contrato de arrendamento para habitação, da referida morada, figurando aquele como inquilino, e este como senhorio; a mencionada moradia foi edificada pelo 2º Réu, e é propriedade do 1º Réu; no dia 2-12-2007, quando a A. se encontrava a sacudir um tapete, na varanda do 1º andar da moradia arrendada pelo 1º Réu, a guarda de protecção da varanda cedeu e partiu-se, o que provocou a queda da A. do 1º andar, de uma altura de cerca de 3 metros; em consequência da queda, a Autora sofreu, além do mais, escalpe com ferida frontal, afagamento do murmúrio à esquerda no tórax, hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, fractura da parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho esquerdo e direito, fractura do primeiro arco costal à esquerda e da asa menor do esfóide junto à fossa cerebral médio; sofreu ainda, fractura do redobro externo da órbita, fractura do corpo de D12 e corpo anterior de L1, fractura de ambos os punhos, fractura do primeiro arco costal e hemopneumotorax esquerdo drenado e fractura da coluna dorso-lombar; em consequência dos referidos ferimentos, a Autora foi submetida, até à data, a quatro dolorosas intervenções cirúrgicas; a autora tem sido submetida a tratamentos diversos de fisioterapia em regime de ambulatório, desde a data do acidente, até hoje; presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades; em consequência do acidente, a Autora esteve internada em hospitais de 02.12… a 24.12….; ainda hoje, tem que ser submetida a intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo, de seis em seis meses; em consequência do acidente, a Autora esteve de baixa por doença, entre 02.12… a 10.08.2…; em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar; em consequência do acidente, a Autora perdeu o emprego e deixou de poder conduzir quaisquer viaturas; em consequência do acidente, a Autora perdeu o marido, que a abandonou por não conseguir viver ao lado de uma mulher em permanente sofrimento, inválida e dependente de terceiros, para tudo; o casamento da Autora foi dissolvido por divórcio em 28.07.2…; ainda hoje, a Autora apresenta sequelas do acidente, em termos de visão, mobilidade, em termos respiratórios e de estabilidade mental e emocional, etc.; em consequência directa e necessária do acidente, a Autora carece hoje de adequado acompanhamento oftalmológico, neurológico, ortopédico, psiquiátrico, fisiátrico e em sede de cirurgia plástica; a Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, sempre gozou de boa saúde e sem qualquer defeito físico nem psíquico; antes do acidente, a Autora não padecia de qualquer doença, sendo certo que era uma pessoa perfeitamente saudável, activa e dinâmica, em termos familiares, sociais e profissionais; com uma grande alegria de viver e constante boa disposição; os ferimentos causados à Autora, foram de tal forma graves, que ainda hoje, lhe provocam muitas dores nos membros superiores esquerdos, pernas, cabeça e coluna vertebral; para além da mobilidade que perdeu, a Autora sofreu muitas dores, depois do acidente, durante e após os tratamentos; ainda hoje, praticamente não faz movimentos com os membros superiores esquerdos, tem muitas dores na coluna, nos joelhos, nas pernas, braços e na cabeça; padece de dificuldades respiratórias, visão turva, depressões recorrentes, que motivam regulares deslocações aos serviços de urgência dos hospitais e ao Centro de Saúde; na altura do acidente, a Autora tinha uma vida activa intensa, em termos sociais, familiares e profissionais; em consequência do acidente dos autos, a autora ficou inválida, perdeu o emprego, não consegue trabalhar, perdeu o marido, não conseguindo passar os restantes dias da sua vida, senão agarrada a uma cama, dependente de terceiros para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais; apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes; a queda deu-se em consequência directa e necessária do colapso da varanda do primeiro andar da identificada moradia; a moradia referida não tem licença de habitação; a deficiente construção da guarda de protecção da varanda da referida moradia foi causa directa, em termos de causalidade adequada da queda da Autora, da varanda do primeiro andar, para o pavimento em tijoleira do rés do chão; a queda da Autora, foi devida a culpa dos RR que, construíram, mais a mais sem a adequada licença camarária, a moradia dos autos, arrendando-a, sem cuidarem de verificar se a mesma, designadamente ao nível das guardas das varandas, tinha adequadas condições de habitabilidade e segurança; os danos descritos foram consequência directa e necessária da conduta dos RR que, dando de arrendamento uma habitação clandestina, nem sequer cuidaram de assegurar que a mesma apresentava condições mínimas de segurança e habitabilidade, que evitassem o acidente dos autos.

Os RR. contestaram, alegando, em síntese, que: a moradia identificada nos autos foi construída num terreno adquirido pelo 1º Réu; o segundo Réu não foi o construtor da moradia identificada nos autos, este sempre agiu na qualidade de “procurador” do 1º Réu, limitando-se a representar o 1º Réu, junto do construtor e fornecedores de materiais, fazendo os respectivos pagamentos em nome do 1º Réu; foi nessa qualidade, que o 2º Réu tratou de todos os assuntos respeitantes à manutenção do contrato de arrendamento, celebrado pelo pai da A.; ao sacudir o tapete, a A. fez um uso indevido da guarda da varanda, provocando vibrações na estrutura, o que provocou a ruptura dos balaústres.
Concluem pela improcedência da acção

Foi proferida decisão do seguinte teor:Pelo exposto, atentos os factos, as normas e os princípios supramencionados, decido:
a)Condenar os réus MJFE e ABF, a pagarem, solidariamente, à autora DMFLM, as seguintes quantias:
-A indemnização no valor de € 70.000,00 a título de ressarcimento de todos os danos físicos sofrido pela A..
-A indemnização de € 50.000,00 a título de danos não patrimoniais:
- A indemnização de € 100.000,00 pela incapacidade permanente geral de 60%, que lhe foi arbitrada.
- As quantias referentes a despesas que a A. venha a suportar de futuro, necessárias à sua reabilitação, onde se incluem despesas médicas, medicamentosas e todos os tratamentos necessários, incluindo fisioterapia.
b)Absolver os Réus do demais peticionado.
Custas a cargo da autora e Réus, sendo 1/8 (um oitavo) a cargo da autora e 7/8 (sete oitavos) a cargo dos réus– artº.s 527.º e 607.º, n.º 6 do CPC.
Notifique e registe. ”.

1.2.Inconformados com aquela decisão, os RR. apelaram, tendo formulado as seguintes conclusões:

A Sentença é nula na parte em que condenou os RR. a pagar “as quantias referentes a despesas que a A. venha a suportar de futuro, necessárias à sua reabilitação, onde se incluem despesas médicas, medicamentosas e todos os tratamentos necessários, incluindo fisioterapia”;
A A. nada pediu expressamente quanto a tais futuras despesas “necessárias à sua reabilitação”;
A “importância” que a A. pretende ver relegada para liquidação de execução de sentença respeita ao “diagnóstico para determinação real dos danos físicos efectivamente sofridos” e “ao custo dos tratamentos necessários à reparação dos danos causados”;
Como tal, o pedido formulado pela A. não respeita a custos futuros de danos ainda não verificados;
Assim, o segmento condenatório em crise não está contido (expressa ou implicitamente) no pedido formulado pela A. identificado como segundo “2)”;
Tanto mais que aí a A. pede que esses custos sejam relegados para liquidação em execução de sentença e o Tribunal condenou os RR. no pagamento das quantias que a   A. venha a suportar de futuro, sem prévia liquidação;
A Sentença é ainda nula por falta de fundamentação na parte que condena os RR. no pagamento numa indemnização à A. por “danos físicos” e ainda outra “pela incapacidade permanente geral de 60% que lhe foi arbitrada”;
A Sentença não explana, ainda que de forma sucinta, as razões pelas quais se decidiu condenar os RR. no pagamento das referidas indemnizações;
A fundamentação de facto ou de direito insuficiente de modo a não permitir ao destinatário da decisão a percepção das razões de facto ou de direito da condenação, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos, determinando em consequência a nulidade da Sentença;
10ª O Tribunal decidiu erradamente quanto a alguns pontos da matéria de facto;
11ª Designadamente o Facto provado nº 1 apenas poderia ter sido dado por assente – pelo menos em parte (quanto à data de nascimento e à filiação da A.) – se tivesse sido junta aos autos a respectiva certidão de nascimento;
12ª Não se mostrando junta aos autos, o Facto nº 1 deve ser integralmente eliminado ou pelo menos reformulado, passando a ter a seguinte redacção: “A A. nasceu em Lisboa”;
13ª A inscrição no registo predial apenas se pode provar pela respectiva certidão;
14ª Logo, o Tribunal não podia ter considerado provado por confissão o Facto nº 4;
15ª Deve, pois, ser integralmente eliminado tal facto;
16ª A prova da propriedade do prédio em causa constitui um dos elementos essenciais da causa de pedir;
17ª A filiação e/ou a paternidade apenas podem ser provadas por certidão do registo civil;
18ª Desse modo, não se mostrando junta aos autos, o Facto nº 7 deve ser reformulado suprimindo-se a parte em que nele se refere que AFLé pai da A.;
19ª Por outro lado, tendo o Tribunal dado por reproduzido o teor do documento de fls. 13-15 na Motivação da fixação deste facto, deverá o mesmo ser reformulado passando a ter a seguinte redacção: “Por escrito denominado contrato de arrendamento para habitação, o 1º R. representado pelo 2º R., na qualidade de seu procurador, declarou dar de arrendamento a AFL um imóvel, para habitação”;
20ª Os depoimentos prestados pelas testemunhas MCD, JM e ACM, não provam o que consta do Facto nº 9;
21ª Nenhuma testemunha estava presente no momento do acidente;
22ª Assim, nenhuma das testemunhas presenciou onde é que a Autora se encontrava nem sabe como o acidente ocorreu;
23ª A confirmá-lo está o depoimento da testemunha ACM aos minutos 00:55, onde confirma que nada viu nem sabe acerca de como o acidente ocorreu;
24ª Igualmente o testemunho prestado pela testemunha JM nada pode provar quanto às circunstâncias do acidente e como o mesmo ocorreu;
25ª Também esta testemunha não estava em casa nessa ocasião, como se confirma pelo seu depoimento aos minutos 03:06 da respectiva gravação;
26ª Tendo chegado bastante tempo depois, o que é confirmado pelo seu depoimento gravado aos minutos 42:54;
27ª Também do depoimento da testemunha MCD não pode retirar-se que esta tenha visto a A. cair;
28ª Bem pelo contrário, esta testemunha afirmou peremptoriamente e por mais de uma vez que não viu a A. cair, conforme se pode constatar do seu depoimento gravado aos minutos 01:06, 02:40, 11:45 e 15:45;
29ª A própria A. nada consegue esclarecer acerca do acidente, não podendo assim, com base no seu relato, obter-se uma descrição indirecta do mesmo;
30ª O que é confirmado pelo depoimento da testemunha JM aos minutos 08:09 e da testemunha ACM aos minutos 10:10;
31ª Em suma, não foi produzida prova que possa sustentar o Facto nº 9;
32ª A prova produzida (em especial a prova testemunhal e pericial) apreciada global e criticamente, suscita sérias e fundadas dúvidas acerca das causas directas e do modo como ocorreu o acidente;
33ªDesignadamente do relatório pericial resulta que os elementos que compõem a estrutura que servia de guarda da varanda eram robustos; que aquela tinha uma altura total de 95 cm; que os perfis verticais tinham uma espessura apreciável; e o espaçamento entre eles era apertado;
34ªDa perícia em conjugação com a prova testemunhal resulta ainda que três balaústres ou perfis verticais que serviam de guarda à varanda partiram um pouco acima da base, tudo levando a crer que terá havido um impacto forte de uma força estranha;
35ªTal é confirmado pelo depoimento da testemunha JM aos minutos 46:31 e pelas fotografias juntas a fls. 121, 122, 126;
36ª Nenhuma pessoa com a estatura da A. (1 metro e 59), tendo em consideração a altura da guarda da varanda, cairia desta, mesmo que o parapeito se tivesse descolado e se encontrasse debruçada sobre este;
37ªNão se tendo apurado o modo como o acidente ocorreu nem a causa imediata da ruína de parte da varanda, a dúvida teria que ser resolvida contra a A.;
38ªAssim, o Facto nº 9 foi indevidamente dado por provado;
39ªEm consequência deverá ser suprimido, não podendo sustentar qualquer condenação;
40ª-- Eliminando-se dos factos provados, nada nos autos permite concluir que se tratou de uma queda;
41ªSuprimindo-se o Facto nº 9 deve eliminar-se a parte inicial do Facto nº 10 (“em consequência da queda”);
42ªE bem assim deve eliminar-se a parte inicial “em consequência da queda” dos Factos nºs 10, 19, 21 e 23;
43ªIgualmente deve proceder-se à supressão do Facto 18 na íntegra;
44ªTrata-se de um facto manifestamente conclusivo, contendo exclusivamente matéria de direito;
45ªO que está reflectido neste facto mais não é do que o nexo de causalidade, que é um dos pressupostos que a lei exige para que haja responsabilidade civil;
46ªAs questões de direito que constarem da selecção da matéria de facto devem considerar-se não escritas;
47ªEm consequência, o Facto 18 deve ser integralmente suprimido;
48ªO Facto 21 não pode manter-se na parte em que considera que o período de baixa de doença da A. foi consequência da queda;
49ªA prova produzida, conjugada e criticamente analisada, não permite dar por provado este facto nos termos em que o foi;
50ªA informação clínica para a qual remete a Motivação da decisão sobre a matéria de facto nada refere quanto ao período de incapacidade por doença da A.;
51ªO atestado médico de incapacidade multiuso emitido pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério da Saúde, junto a fls. 28, atesta que foi atribuída à A. uma incapacidade permanente registada com data de 5 de Fevereiro …;
52ªConsequentemente, o Facto 21 deve ser alterado passando a ter a seguinte redacção: “A A. esteve de baixa por doença entre 02.12.2.. e 7.09.20...”;
53ª Os Factos 13 e 22 são exactamente iguais;
54ªPara além disso, esses Factos e o Facto 17 estão em contradição com o Facto 30, porquanto naqueles se dá por provado que a A. passou a depender absoluta e permanentemente de terceira pessoa, durante 24 horas do dia, e neste apenas se dá por provado que só necessita da supervisão de terceira pessoa;
55ª A contradição evidenciada entre os mencionados Factos tem que ser resolvida com a eliminação dos Factos 13, 17 e 22 e manutenção do Facto 30, por somente este último Facto se suportar na prova pericial, corroborada pela prova testemunhal;
56ª--Os Factos 28 e 31 estão em contradição com o Facto 16, conforme resulta do exame pericial médico, após observação directa da A., junto a fls. 285, pois que deste consta que a A. apresenta “marcha normal sem apoio nem claudicação”;
57ª O que, aliás, é consentâneo com o depoimento prestado pelas testemunhas AEL e MCG;
58ª Assim, tomando em consideração toda a prova produzida, o Facto 28 deve ser eliminado e reformulado o Facto 16, passando este a ter a seguinte redacção: “Presentemente apresenta uma situação motora com dificuldade de mobilidade dos membros superiores, para além de alterações de humor e comportamento”;
59ªOs Factos 31 e 36 devem ser reformulados eliminando-se a referência à idade da A. à data do acidente, por não ter sido feita prova de tal facto com a junção da respectiva certidão de nascimento;
60ªOs autos demonstram designadamente através das informações clínicas juntas a fls. 270, 272 verso e 276, que a A., ao contrário do que consta do Facto 36, padecia de algumas doenças, designadamente asma brônquica e epilepsia;
61ªConsequentemente, os Factos 31 e 36 não podem manter-se tal como se encontram redigidos;
62ªOs Factos nºs 5, 20, 34, 35 e 37 são excessivos, exorbitando o âmbito da matéria alegada pelas partes, não a respeitando;
63ªTratando-se de factos essenciais que, porém, não foram alegados pela A.;
64ªO Tribunal não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor;
65ªA possibilidade de considerar factos essenciais resultantes da instrução e discussão da causa, que não tenham sido oportunamente alegados, dependeria sempre de representarem a concretização ou o complemento de outros já alegados, de manifestação expressa e inequívoca da parte que pretende aproveitá-los e da verificação do exercício do contraditório;
66ªO que não se verificou nos presentes autos;
67ªAcresce que os Factos 35 e 37 correspondem a meras opiniões, pareceres e observações técnicas;
68ªE sendo matéria que consta exclusivamente do relatório pericial, nunca poderia ter sido vertida no elenco dos Factos provados;
69ªDevendo ser excluídos do elenco dos Factos provados as alegações com conteúdo técnico ou conclusivas;
70ªOs factos instrumentais servem apenas para a prova indiciária dos factos essenciais, não devendo ser incluídos nos factos provados;
71ªPor tudo, pois, devem ter-se por não escritos os Factos 34, 35 e 37;
72ªA A. não logrou provar a prática, por parte dos RR. de qualquer facto ilícito;
73ªA Sentença recorrida não identifica as normas, designadamente de construção, que deviam ter sido observadas pelos RR.;
74ªSem normas jurídicas violadas não se pode falar de ilicitude;
75ªNão se verifica assim um dos pressupostos de aplicação do artigo 492º do CC;
76ªA A. não provou a causa concreta do dano nem as circunstâncias em que se deu a queda da varanda;
77ªIgualmente não provou que os danos tiveram origem ou causa no defeito ou vício de construção;
78ªO vício ou defeito de construção apontado nos Factos provados, nomeadamente nos Factos 35 e 37, afigura-se completamente inadequado a provocar a ruína da guarda da varanda no que diz respeito aos balaústres ou perfis verticais que partiram;
79ªO apontado vício de construção apenas podia originar a descolagem da guarda horizontal ou parapeito, na parte superior da estrutura de protecção da varanda;
80ªSendo insusceptível de causar a quebra ou a ruína dos balaústres;
81ªFicou por demonstrar que a queda da A. se tivesse ficado a dever à ruína do parapeito;
82ªE que a ruína da varanda se tivesse ficado a dever ao apontado vício de construção;
83ªConsequentemente, a A. não provou o nexo de causalidade entre a conduta dos RR. e os danos por si sofridos;
84ªOs danos físicos, ou seja, os danos decorrentes de dores sofridas pelo lesado ou com repercussões na sua saúde são indemnizáveis em sede de danos não patrimoniais;
85ªOs danos físicos não podem autonomizar-se para efeitos indemnizatórios sob pena de ocorrer uma injustificada duplicação da indemnização, como acontece na Sentença recorrida;
86ªSeja como for, a indemnização arbitrada a esse título é manifestamente exagerada;
87ªO mesmo sucede com a indemnização por danos não patrimoniais fixada na Sentença recorrida, a qual se afigura manifestamente exagerada, sobretudo se comparada com as fixadas judicialmente em casos semelhantes;
88ªNão se provou que os RR. tivessem actuado com dolo ou sequer negligência;
89ªA intensidade de culpa dos RR. é necessariamente um dos factores a ponderar na fixação da indemnização;
90ªA indemnização de € 100.000,00 euros atribuída à A. pela incapacidade permanente geral de 60% não se mostra minimamente fundamentada, não sendo explicitadas as razões que levaram o Tribunal a atribuir tal montante indemnizatório;
91ªNão resultou provado que a incapacidade permanente geral tenha reflexo em qualquer actividade profissional específica da A.;
92ªNão ficou provado sequer que a A. exercesse qualquer actividade profissional e retirasse qualquer provento de alguma ocupação profissional;
93ªNão são assim previsíveis quaisquer danos futuros por perda de ganho em virtude dessa incapacidade;
94ªDe qualquer modo, a indemnização arbitrada é manifestamente exagerada, sobretudo tendo em consideração o disposto nos Decretos-Leis nºs 352/2007, 291/2007 de 21 de Agosto e Portarias 377/2008 de 26 de Maio e 679/2009 de 25 de Junho;
95ªConforme decorre dos autos, o 2º R. não é proprietário ou possuidor da moradia cuja varanda em parte ruiu;
96ªCom base no disposto no artigo 492º do CC só o proprietário ou possuidor do edifício que ruir, no todo ou em parte, pode ser responsabilizado pelos danos causados;
97ªOs autos demonstram que o 2º R. apenas actuou em nome e representação do 1º R., como seu procurador;
98ªOs efeitos dos actos praticados pelo representante em nome do representado produzem-se e repercutem-se directamente e apenas na esfera jurídica deste último;
99ªSendo assim, não pode ser atribuída qualquer responsabilidade ao 2º R. pelos danos sofridos pela A.;
100ªA Sentença deve ser reformulada quanto a custas, uma vez que a proporção fixada não se mostra correcta;
101ªEm face do decaimento da A., as custas deveriam ter ficado a seu cargo na proporção de ⅞ e de ⅛ para os RR;
102ªDecidindo como decidiu, a Sentença violou designadamente as normas dos artigos 527.º, 607.º, 609º e 615º do CPC; 258º, 354º al. a), 492º, 494º, 496 e 564º do CC; 1º al. a) e b), 3º, 4º e 211º nº 1 do Cód. do Registo Civil; 110º nº 1 do Cód. Registo Predial; Decretos-Leis nºs 352/2007, 291/2007 de 21 de Agosto e Portarias 377/2008 de 26 de Maio e 679/2009 de 25 de Junho.

A A. contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:

1.3.Como é sabido, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões dos recorrentes, importando, assim, decidir as questões nelas colocadas e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada às outras, nos termos do art.º 608.º, 635/4 e 639/1 CPC do CPC.
Assim, considerando as conclusões dos apelantes, as questões essenciais a decidir no âmbito do presente recurso, consistem em saber se:

II. Fundamentação

II.1.Dos Factos

Em primeira instância, foram dados como provados os seguintes factos:

1.A Autora nasceu em Lisboa, em 10.02.1952 e é filha de AFL
2.Vive com seu pai na moradia sita na Rua …, … (também designado por …, Bairro …, em ….
3.A referida moradia foi edificada, sobre um lote de terreno para construção, designado por lote …, descrito na CRP de …sobre o número ….
4.O identificado lote mostra-se inscrito a favor do 1º R, através Ap. ….
5.–O 2º Réu actuou em seu nome, em nome do 1º Réu e de JRP, no planeamento e direcção da execução das construções feitas nos lotes .…, … e .., sitos na Rua .., …, C…, nomeadamente, escolhendo os executantes e procedendo ao pagamento a AJG, pelos trabalhos descritos a fls. 63 a 70, realizados entre Abril e Novembro de1990.
6.A dita moradia não tem licença de utilização.
7.Por escrito denominado "Contrato de Arrendamento para habitação...", o 1º R. representado pelo 2º R, declarou dar de arrendamento a AFL, pai da Autora, um imóvel, para habitação.
8.Esse imóvel correspondente à moradia de rés-do-chão e primeiro andar, sita na Rua …, ... (também designado …), Bairro do …, em ….
9.No dia 02.12.2…, pelo final da manhã, a Autora encontrava-se na varanda do primeiro andar da referida moradia, quando a respectiva guarda de protecção se partiu, caindo a A. do 1º andar da moradia, de uma altura de cerca de três metros.
10.Em consequência da queda, a Autora sofreu, além do mais, escalpe com ferida frontal, afagamento do murmúrio à esquerda no tórax, hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, fractura da parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho esquerdo e direito, fractura do primeiro arco costal à esquerda e da asa menor do esfóide junto à fossa cerebral médio. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
11.Sofreu ainda, fractura do redobro externo da órbita, fractura do corpo de D12 e corpo anterior de L1, fractura de ambos os punhos, fractura do primeiro arco costal E, hemopneumotorax esquerdo drenado e fractura da coluna dorso-lombar (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
12.A Autora sofreu igualmente feridas diversas profundas em todo o corpo (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
13.Em consequência do acidente, a A. passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar[1].
14.Em consequência dos referidos ferimentos, a A. foi submetida, até à data, a quatro dolorosas intervenções cirúrgicas (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
15.A autora tem sido submetida a tratamentos diversos de fisioterapia em regime de ambulatório, desde a data do acidente, até hoje. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
16.Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
17.Necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
18. As lesões sofridas pela A., foram directa e exclusivamente causadas pela queda de 2-12-2007 (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
19.Em consequência da queda, a Autora esteve internada em hospitais de 02.12.2007 a 24.12.2007 (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
20.Não estão excluídas novas intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo da A…(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
21.Em consequência da queda, a Autora esteve de baixa por doença, entre 02.12.2007 a 10.08.2010 (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
22.Em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
23.Em consequência da queda, a Autora ficou com uma incapacidade permanente geral de 60%.(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
24.Em consequência do acidente, a Autora deixou de poder conduzir quaisquer viaturas. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
25.Ainda hoje, a Autora apresenta sequelas do acidente, em termos de visão, mobilidade, em termos respiratórios e de estabilidade mental e emocional, etc. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
26.Em consequência directa e necessária do acidente, a Autora carece hoje de adequado acompanhamento oftalmológico, neurológico, ortopédico, psiquiátrico, fisiátrico e em sede de cirurgia plástica (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
27.Os ferimentos causados à Autora, foram de tal forma graves, que ainda hoje, lhe provocam muitas dores nos membros superiores esquerdos, pernas, cabeça e coluna vertebral. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
28.Para além da mobilidade que perdeu, a Autora sofreu muitas dores, depois do acidente, durante e após os tratamentos (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
29.Ainda hoje, praticamente não faz movimentos com os membros superiores esquerdos, tem muitas dores na coluna, nos joelhos, nas pernas, nos braços e na cabeça, dificuldades respiratórias, visão turva, depressões recorrentes, que motivam regulares  deslocações aos serviços de urgência dos hospitais e ao Centro de Saúde. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
30.Em consequência da queda, a A. necessita da supervisão de terceira pessoa para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
31.E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
32.Fruto do acidente, a autora vive também em permanente depressão, estando permanentemente triste. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
33.O casamento da Autora foi dissolvido por divórcio em 28.07.2010.
34.A varanda em causa nos autos, com a forma semicircular possui uma guarda composta por balaustradas em pedra moleanos, sobrepostos por pedras corridas em moleanos colocadas nos topos dos balaustres e interligando-os.
35.O sistema de colagem e fixação das peças verticais (balaustradas) na guarda horizontal é muito deficiente, tornando baixa a sua rigidez a esforços horizontais. Deviam de ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaustres, como existem nas bases, para garantir o seu travamento. O mais grave foi que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em “escamas”[2].
36.A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer doença[3].
37.Em relação à varanda referida em 9), resulta do laudo de peritagem de fls. 113 a 131, cujo teor se dá por reproduzido, que: “…devido a erros graves na sua montagem em obra, revela-se instável e completamente incapaz de cumprir a sua função para que foi destinada de guarda-corpos.”, e que “…a fixação das peças verticais na guarda horizontal é muito deficiente…deviam ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos    balaustres…para garantir o seu travamento. O mais grave foi no entanto que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em “escamas”.

Em primeira instância, foram dados como não provados os seguintes factos:

1– Que em consequência do acidente, a Autora perdeu o emprego.
2– Que em consequência do acidente, a Autora perdeu o marido, que a abandonou por não conseguir viver ao lado de uma mulher em permanente sofrimento, inválida e dependente de terceiros, para tudo.
3– Que o marido da A. tivesse vendido bens, para custear as despesas de saúde da A., decorrentes do acidente.

II.FUNDAMENTAÇÃO.

Nulidades da sentença

Quanto à alegada \nulidade por condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

Entendem os recorrentes que ao condenar os RR. a pagar solidariamente à A., além do mais, “As quantias referentes a despesas que a A. venha a suportar de futuro, necessárias à sua reabilitação, onde se incluem despesas médicas, medicamentosas e todos os tratamentos necessários, incluindo fisioterapia”, a sentença recorrida exorbitou o pedido uma vez que a A. nada pediu expressamente quanto a tais despesas.

Importa ter presente que no ponto 2 do petitório consta que: “A importância relativa ao diagnóstico para determinação real dos danos físicos efectivamente sofridos e ao custo dos tratamentos necessários à reparação dos danos causados, leva a A. a relegar a liquidação das respectivas importâncias, para execução de sentença”.

Por seu turno, no segmento da sentença onde se refere a parcial improcedência do pedido feito em 2) (segundo pedido nº 2) frisa-se que tal improcedência respeita aos montantes até então gastos na recuperação, ressalvando-se expressamente o que veio a projectar-se na condenação a título de “quantias referentes a despesas que a A. venha a suportar de futuro, necessárias à sua reabilitação, onde se incluem despesas médicas, medicamentosas e todos os tratamentos necessários, incluindo fisioterapia”, que sejam consequência das lesões resultantes da queda a que se reportam os autos.

Ora do nosso ponto de vista, a formulação do pedido contém as duas realidades apreciadas na decisão sob crítica: uma referente a gastos passados e a outra aos encargos que, porventura, no futuro a A. tenha de enfrentar em razão do que descreve no pedido nº 2) (formulado em 2º lugar).

Quando muito, do nosso ponto de vista a questão poderia colocar-se em termos de erro de julgamento mas não de extrapolação do pedido ao arrepio da proibição posta no artº 609º nº 1 do CPC.

Improcede pois a arguida nulidade ao abrigo do artº 615º nº1 alínea e) do mesmo diploma legal.

Quanto à alegada falta da especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão [artºs 607º nº3 do CPC/artº 615º nº 1 al. b) do CPC].

Os RR. discordam da condenação solidária no pagamento de uma indemnização total de € 220.000,00. Argúem a falta de motivação.

Todavia, sem qualquer razão, visto que a Mmª Juíza explana o seu raciocínio sobre a rubrica motivação da decisão, quanto a matéria de facto provada, ao longo de mais de 7 páginas e, sobre a motivação jurídica, ao longo de mais de 6 páginas, sobre cada uma das questões colocadas para decisão do tribunal.
Como se sabe - e os RR. dão conta disso - a ausência de motivação susceptível de gerar nulidade traduz-se na falta absoluta de motivação[4],  o que manifestamente não acontece, até porque a Mmª Juíza enunciou os meios de prova que ponderou e concretizou relativamente a cada facto, aqueles que entendeu relevantes para fundamentar a sua convicção.

Consequentemente, improcede o apontado vício de falta de fundamentação.

Quanto a pretendida modificação da decisão de facto

Os recorrentes questionam os factos 4, 7, 9, 10, 11, 19, 21, 23, 13, 16, 17, 22, 25, 28,30,31, 5, 20, 34, 35 e 37.

Vejamos.

Quanto ao facto nº 1

O facto nº 1 tem o seguinte teor: ”A autora nasceu em Lisboa, em 10.02.1952 e é filha de AFL”.
Os réus entendem que tal facto jamais poderia ter sido considerado provado com base em “confissão”, uma vez que o mesmo, segundo o entendimento que perfilham, “apenas poderia ter sido dado por provado […] se tivesse sido junta aos autos a certidão de nascimento da A..”.
Com este fundamento, pretendem que o facto deve ser eliminado ou pelo menos reformulado, passando a ter a seguinte redacção:”a autora nasceu em Lisboa”.
É um facto que da conjugação do disposto dos artigos 1º, al. a) e b), 4º e 211º nº1 do CRC resulta que os factos sujeitos a registo e o estado civil das pessoas se provam pelo acesso à base de dados do registo civil (usando naturalmente meios electrónicos) ou por meio de certidão.
Todavia, a jurisprudência tem entendido que, quando o objecto da causa não consista no próprio facto sujeito a registo, é de admitir que a prova dos mesmos factos possa ser feita por outros meios. Assim o decidiu, entre muitos outros, o STJ no acórdão de 14.01.2003[5].
No caso dos autos o que se extrai como relevante para a decisão da causa prende-se com a data de nascimento e a filiação da A., na perspectiva da fixação de indemnização por danos.
Sucede que se mostra junta uma cópia do BI da autora a folhas 11, a qual documenta precisamente que a autora nasceu em 02.10.1952. Este documento não se mostra impugnado pelos réus.
Assim não nos resta senão desatender a pretensão recursória neste particular.
              
Quanto ao facto provado sob o nº 4.

O Tribunal considerou provado que “o identificado lote mostra-se inscrito a favor do primeiro R., através da Ap. 52 de 04.08.2000”.
Entendem, os recorrentes, que a inscrição no registo predial apenas se pode provar pela respectiva certidão em obediência ao artigo 110º nº1 do CRP.
Segundo afirmam a propriedade é um dos elementos essenciais da causa de pedir pelo que não pode ser obviada através da prova por confissão a exigência probatória para que a lei remete.
Mutatis  mutandis vale aqui o que atrás se disse quanto ao facto nº 1.
Ao contrário do aparente sentido que os réus pretendem dar à causa de pedir, a verdade é que nem de perto nem de longe, aqui se discute a questão da propriedade.
Como quer que seja, mostra-se junto aos autos o contrato de arrendamento urbano para habitação em que figura como senhorio o réu MJFE, enquanto proprietário do andar em causa.
Não tendo os réus questionado ou de algum modo impugnado tal documento, junto a folhas 13 a 15, não podem agora questionar tal qualidade, com base num argumento de mera forma.
Desatende-se, pois, neste particular também a pretensão.

Quanto ao facto nº 7.

O tribunal deu como provado que: “Por escrito denominado “Contrato de Arrendamento para habitação …”, o 1º R. representado pelo 2º R., declarou dar de arrendamento a AFL, pai da Autora, um imóvel, para habitação”(com destaque e sublinhado nosso).

Os réus pretendem que, tendo o Tribunal dado por reproduzido o teor do contrato junto a fls. 13-15, o Facto nº 7 deve ser reformulado, passando a ter a seguinte redacção ou semelhante:
Por escrito denominado “Contrato de Arrendamento para habitação …”, o 1º R. representado pelo 2º R., na qualidade do seu procurador, declarou dar de arrendamento a AFL um imóvel, para habitação”.

Acontece que independentemente do teor do contrato, não está o tribunal impedido de complementar os factos com algum esclarecimento que entenda oportuno, que resulte da discussão da causa e que se mostre provado.

Naturalmente que a filiação da autora – que aqui não está em causa - é um dado de relevo para demonstrar a legitimação da presença da autora na casa em questão aquando do acidente.
Por isso e pelas razões indicadas quanto ao facto nº 1, desatende-se também quanto a este ponto o recurso dos RR..

Quanto ao facto nº 9

Insurgindo-se contra o facto de ter sido considerado provado com base nos depoimentos das testemunhas MCD, JM e ACM, os RR. pretendem que tal facto seja suprimido do elenco dos factos provados.
Entendem que nenhuma testemunha estava presente no momento do alegado acidente.
Acrescentam que a A. não podia ter caído por entre os perfis verticais ou balaustres que ficaram intactos e afirmando que “nenhuma pessoa com a estatura da A. [com 1,59 m. de altura], tendo em consideração a altura da guarda da varanda [uma altura total de 95 cm.] cairia desta, mesmo que o parapeito se tivesse descolado e se encontrasse debruçada sobre este. É pois fora de dúvida que a A. só poderia ter caído por entre o espaço dos balaústres partidos. E estes só poderiam ter partido por força de um impacto forte de algo ou de alguém”.
Daqui retiram os RR. que importaria apurar o que provocou que a referida guarda tivesse partido e que, não tendo sido esse o caminho seguido não resta senão a supressão de tal facto.

O facto nº 9. Tem a seguinte redacção “No dia 02.12.2007, pelo final da manhã, a Autora encontrava-se na varanda do primeiro andar da referida moradia, quando a respectiva guarda de protecção se partiu, caindo a A. do 1º andar da moradia, de uma altura de cerca de três metros”.

É patente a sem razão dos recorrentes visto que é totalmente, irrelevante neste caso, que nenhuma testemunha tenha estado presente no momento em que ocorreu o acidente dos autos.

Mais, as testemunhas fizeram afirmações que corroboram o facto acima transcrito. Com efeito a testemunha ACM, filha da autora referiu que no dia do acidente foi avisada por uma vizinha do que tinha sucedido e que a mãe estava a caminho do hospital cheia de sangue e em coma (fls. 347 e verso).
Também a testemunha JPM, então marido da autora, foi avisado por um empregado de que esta, na sequência de um acidente, tinha caído. Tendo ido a casa encontrou pedras no chão, sangue e constatou que a esposa já estava a caminho do hospital (fls. 347 verso).
Por seu turno, a testemunha MCD referiu que, quando estacionava o carro, apercebeu-se de algo a cair de uma varanda e, nessa sequência, foi dar com a A. sem conhecimentos e depois ter chamado o socorro.
Afirmou também ter visto a varanda partida (fls. 348 verso).

Estes testemunhos têm de ser cotejados com o teor do relatório pericial no qual consta nomeadamente que “a estrutura que servia de guarda da varanda era constituída por diversos elementos que, embora fossem bastante robustos (porventura até demasiado robustos para as dimensões da varanda), estavam deficientemente ligados entre si” (fls. 350).
Também segundo o laudo de peritagem de fls. 112 e seguintes consta que: “este tipo de varanda em pedra (desenho e material) repete-se nas moradias em banda adjacentes, as quais apresentam alguma robustez (pedra moleanos), espaçamento apertado entre os perfis verticais e sua espessura apreciável. No entanto devido a erros graves na sua montagem em obra, revela-se instável e completamente incapaz de cumprir a sua função para que foi destinada de guarda-corpos”.
E acrescenta-se na resposta ao quesito 2º onde se perguntava: “Essas características de construção foram causa adequada da queda da A. da varanda do 1º andar para o pavimento em tijoleira do rés-do-chão?
R: Sim, sem dúvida que o sistema de colagem e fixação das peças verticais (balaustradas) na guarda horizontal é muito deficiente, tornando baixa a sua rigidez a esforços horizontais. De facto, deviam ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres, como existem nas bases, para garantir o seu travamento. O mais grave foi no entanto que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em «escamas»”.
Ao quesito terceiro responderam ainda os senhores peritos à questão de saber se “uma pessoa adulta, colocada na posição da A., cairia da varanda, pelo simples facto de estar a sacudir um tapete.
R.: Em condições normais e se a guarda da varanda fixa, não”.
Por fim ai quesito 4º onde se perguntava se as características de construção da guarda da varanda não eram as adequadas para proteger uma pessoa que, sobre ela, se debruçasse sem se partir, os Srs. Peritos responderam que “não é tanto o material da constituição da guarda da varanda em pedra moleanos, mas sim a solução de materiais utilizados na montagem, como seja a cola totalmente ineficiente e a falta de fixação complementar com ferrolhos no topo das peças da mesma”.

O laudo pericial associado aos depoimentos das testemunhas que puderam observar as consequências da queda da A. (e visto o acidente, embora de forma difusa, por parte da testemunha C…) confirma inteiramente o facto nº 9. Mais, este facto veio a ser também reflexamente melhor fundamentado a fls. 332 verso (sentença) quando o Mmº Juiz se debruçou sobre os aspectos jurídicos da causa.

Consequentemente não se vê qualquer motivo para suprimir ou alterar o questionado facto.

Quanto aos factos nºs 10, 18, 19, 21 e 23

O raciocínio dos RR. no âmbito da impugnação desta matéria tem por pressuposto a eliminação do facto nº 9 o que, como se viu, não teve acolhimento.

Não vá todavia sem se dizer quanto à formulação do facto 18 “As lesões sofridas pela A. foram directa e exclusivamente causadas pela queda de 02.12.20…” é perfeitamente clara e tem um conteúdo factual que resulta do sentido que lhe é dado na linguagem corrente.

Quanto ao facto 21 acrescenta-se ainda que os RR. consentem que se dê como provado que “a A. esteve de baixa por doença entre 02.12.2.. e 05.09.20…”.
 Baseiam o seu raciocínio também na ausência de prova que permita concluir que a A. esteve de baixa por doença no período fixado no facto em análise. E, adiantam que a informação clínica para que remete a motivação da decisão de facto neste domínio, nada refere quanto ao período de incapacidade por doença da A., limitando-se a mencionar um episódio de urgência ocorrido no dia do acidente.

É do seguinte teor o facto 21º: Em consequência da queda, a Autora esteve de baixa por doença, entre 02.12…. a 10.08.2…. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).

Vejamos.

Da motivação de facto colhe-se que “os factos nºs 10 a 32, basearam-se na informação clínica junta aos autos, nomeadamente a fls. 22, 27, 174, 282 a 285 e 175 a 199, cujo teor se dá por reproduzido”.

O documento fls. 22 e 23 consubstancia um relatório médico elaborado no Hospital de .…, no qual vem relatado, entre outras lesões, incluindo fracturas, traumatismo crânio-encefálico, após queda, transferida do hospital de … e depois voltada a transferir para o hospital de ….
O documento fls. 27 consubstancia uma nota de alta do Hospital …, datada de 24.12.20….
O documento de fls. 28 traduz-se num atestado médico, datado de 05.02.200…, o qual, com base na Tabela Nacional de Incapacidades[6] fixa à A. uma incapacidade da ordem dos 70%.
O documento de fls. 175 corporiza a informação emitida pelos serviços de urgência quando a A. foi transportada para o Hospital …, no próprio dia do acidente (fls.175 e verso).
No documento de fls. 176 dá-se conta da situação clínica da A. e da sua transferência para o Hospital … no dia 05.12.200….
A fls. 177 consta uma nota de transferência de enfermagem também no Hospital de S. Francisco Xavier, alusiva ao período transcorrido entre 02.12.200.. e 05.12.20….
A fls. 178 temos um relatório de um TAC.
A fls. 179 a 181 verso, temos um outro documento que contém um diário clínico da doente e a indicação da respectiva terapêutica, no período de internamento no HS...
A fls. 182 temos uma folha de terapêutica transfusional no mesmo hospital com referência ao mesmo período.
A fls. 183 temos uma informação médica elaborada no mesmo hospital e relativamente ao mesmo período de tempo.
A fls. 184 e seguintes, temos resultados de análises feitos no mesmo hospital e no mesmo período de tempo.
A fls. 188  temos uma ficha de observação médica pelo INEM no dia do acidente.
A fls. 189 e seguintes temos um conjunto de documentos que se prendem com a terapêutica de emergência e aferição de parâmetros vitais e bem assim notas de evolução de enfermagem, avaliação neurológica.
A fls. 196 consta um relato referente a um episódio de urgência com referenciação para consulta externa, com data de 03.06.2008 elaborada pelo HSFX.
A fls. 198 existe uma nota elaborada, em 03.06.2008, pela especialidade médica ao que tudo leva a crer a qual referencia dor suportável a moderada e que a doente mantém os sintomas (cefaleias e vertigem) desde o acidente e que está a ser seguida no HEM sendo por conselho médico que se deslocou ao hospital (ao que tudo indica).
A fls. 199 temos um documento que consubstancia uma requisição de medicamentos no próprio dia do acidente.
A fls. 234 e seguintes consta um relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito civil elaborado pelo serviço do INML.
Na observação da perícia médica foi valorizado que no serviço de urgência do HSFX no dia 02.12.2.. foi diagnosticado à A. um “hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, sem indicação operatória de urgência, fractura de parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho direito e esquerdo, fractura do primeiro arco costal, fractura de corpo de D11 e D12. Foi internada no serviço de observação do HSFX até ao dia 05.12.2007, em que foi transferida para o Hospital ….
Quanto ao estado actual referencia as queixas da doente.
A fls. 269 consta uma informação médica do Hospital de .. referenciando a data de internamento no Hospital de C….
A fls. 270 a 275 verso consta o diário clínico da A. mencionando datas do período transcorrido entre 05.12.20.. e 21.12… e bem assim de 30.01.2008 a 13.10.2008, sendo certo que na data de 30.09.2… consta a indicação “para operar”.
A fls. 276 existe um documento de 24.12.20… (data da alta) no qual se fez constar um resumo do internamento no Hospital de ….
A fls. 277 consta um relatório no seguimento de uma ecografia aos ombros.
A fls. 278 consta um relatório no seguimento de uma TAC torácica, com a data 11.02.2008 onde vêm descritas algumas lesões, já em fase de resolução, ao que tudo indica.
A fls. 282 e seguintes consta um relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito civil, elaborado em 16.07.2015 onde se relatam nomeadamente dores, hipoacusia, cervicalgias com tonturas, hérnia discal C6 C7 a necessitar de programa extenso de fisioterapia, o mesmo se dizendo da coluna lombar, relacionando estas patologias com o acidente ocorrido em 2007.
É ainda mencionado que apresenta alterações nas capacidades cognitivas, designadamente na atenção e na memória visual e verbal, tonturas frequentes, cefaleias episódicas e desequilíbrio fácil.
Foi discutido e concluiu-se no âmbito da mesma perícia que a data de consolidação médico legal das lesões é fixável em 03.12.2014

Mas mais uma vez, são os próprios RR. que acabam por trazer os elementos que comprovam o equívoco em que incorrem.

Com efeito, o veredicto sentencial sobre esta matéria baseia-se inclusivamente no relatório pericial de fls. 282 a 285 o qual não foi nem é posto em causa no recurso.

Diga-se que o laudo pericial responde a uma série de quesitos que – conforme se pode constatar – coincide com o alegado no articulado pela A. na P.I..
Neste âmbito, o facto 21, respondido afirmativamente pelos peritos do IML, corresponde exactamente ao alegado pela A. no nº 21º. da P.I..

Portanto, ao contrário do sustentado pelos RR. o Mmº juíz baseou-se no relatório pericial junto aos autos, por eles não questionado, nem de resto contrariado pelos demais elementos dos autos considerados de per si e ou no seu conjunto.
O atestado referenciado pelos RR., constante de fls. 28, nem sequer se traduz na informação actualizada pois ali se refere a uma incapacidade da ordem dos 70%, quando é certo que à mesma foi fixada uma incapacidade de 60%.

Consequentemente, não pode também acolher-se a pretensão quanto a estes factos.

Quanto aos factos nºs 13, 16, 17, 22, 25, 28, 30 e 31

Entendem os recorrentes que os factos 13 e 22 estão repetidos e, por seu turno, são contraditórios com o teor do facto nº 30.

São do seguinte teor os enunciados factos:

13.Em consequência do acidente, a A. passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar.
17.Necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
22.Em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
30.Em consequência da queda, a A. necessita da supervisão de terceira pessoa para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).

É uma realidade que os factos 13 e 22 estão repetidos e, desse modo, se considera não escrito o facto nº 13.

Quanto à alegação de contradição com o facto nº 30 a mesma resultará de um entendimento desconforme à realidade, porquanto este facto tem um alcance concretizador do teor do facto nº 22, especificando em que medida se manifesta a dependência da A.: necessita de supervisão para a execução das actividades descritas no nº 22 e ao longo das 24 horas do dia.

O mesmo se diga da alegada contradição parcial com o facto nº 17, na medida em que este facto concretiza o que consta do facto nº 22 e, ao mesmo tempo, densifica o conteúdo da supervisão que concretamente a A. necessita.

É esse, aliás, o conteúdo das respostas dadas pela perícia médica de fls. 282 e seguintes.
 
Importa, ainda, dizer que a divergência quanto ao período abrangido pela dependência – 24H por dia -, não faz, salvo o devido respeito, qualquer sentido. Se a dependência exige a supervisão para certas tarefas da vida diária não se vê que período do dia pudesse estar excepcionado face ao carácter tão básico de tais tarefas e atendendo ao descritivo das lesões que resulta dos factos provados. 

Os RR. invocam contradição entre os factos 16, 28 e 31

Pretendem a eliminação do facto 28 e a reformulação do facto nº 16 de modo a que fique provado que: “Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285)”.

Vejamos.

São do seguinte teor os assinalados factos:

16.Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
28. Para além da mobilidade que perdeu, a Autora sofreu muitas dores, depois do acidente, durante e após os tratamentos. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
31. E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).

Mais entendem que a A. não tem problemas de locomoção como resulta do relatório médico de fls. 235 e dos depoimentos das testemunhas AEL e MCG.

Mas a verdade é que mais uma vez não se atentou na formulação dos enunciados factos que intrinsecamente se completam: Conforme se retira do contexto, “nunca mais andar” como dantes não significa, como é óbvio que não ande. Apenas face ao marco do acidente houve uma alteração na locomoção.
Mais, a normalidade de locomoção em que os RR. insistem com base no que se afirma no relatório de fls. 235 é, no mesmo relatório, também contrariada quando afirma designadamente que a A. tem dificuldades nas deslocações prolongadas, como consta do trecho transcrito pelos próprios recorrentes.
Por isso, não se vê qualquer razão para alterar ou eliminar de acordo com a pretensão dos recorrentes.

Quanto aos factos 31º e 36º  

Os RR. entendem que o facto nº 31 foi indevidamente dado como provado.
Esclarece-se que se considera aqui prejudicada a questão relativa à prova da idade da A. face ao que atrás se deixou dito.

São do seguinte teor os factos nºs 31 e 36:

31.E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
36.A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer doença.

Entende-se que neste particular assiste razão aos RR. na medida em que consta do relatório médico que a mesma sofria de asma brônquica e de epilepsia (fls. 270 e 272 e 276). 

Neste contexto altera-se o facto nº 36 que passará a ter a seguinte redacção:
36.A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer das doenças relatadas como consequência do acidente.

Quanto aos factos nºs 5, 20, 34, 35 e 37
 
Vejamos.

Quanto ao facto nº 5

Os RR. pretendem que o facto nº5 seja reformulado, por ser excessivo, Passando a ter a seguinte redacção “o segundo R. actuou em nome do 1º R. no acompanhamento da execução da construção feita no lote 139, sito na Rua … Bairro .., …, nomeadamente procedendo ao pagamento a AJG pelos trabalhos descritos a fls. 63 a 70, realizados entre Abril e Novembro de 1990”.
Concomitantemente os RR. entendem que o artº 3º da P.I. deve ser levado aos factos não provados.

O facto nº5 tem o seguinte teor

5 –O 2º Réu actuou em seu nome, em nome do 1º Réu e de João Rosa Pinto, no planeamento e direcção da execução das construções feitas nos lotes 138, 139 e 140, sitos na Rua …, Bairro …, C…, nomeadamente, escolhendo os executantes e procedendo ao pagamento a AJG, pelos trabalhos descritos a fls. 63 a 70, realizados entre Abril e Novembro de1990.

Na motivação da Exma. Julgadora quanto a este facto consta nomeadamente que o mesmo “resultou provado, pela conjugação do depoimento da testemunha JRP, que contou que o próprio, o 1º e o 2ª RR. compraram, cada um, um lote de terreno para construção, referentes aos lotes 138, 139 e 140 da Rua do …, Bairro do …, C…. A testemunha e o 1º R., aquando da construção da moradias que segundo a testemunha foram construindo em conjunto (porque seria mais económico), encontravam-se na África do Sul e foi o 2. R. que encontrando-se em Portugal lhe disse que tinha um construtor (apesar de não saber o nome desse construtor) que trataria da obra e a testemunha ia enviando ao 2º R. o dinheiro que este fosse pedindo, à medida que a obra avançava, sendo que a testemunha só regressou a Portugal, quando o 2º R. lhe comunicou que a obra estava concluída. Daqui resulta que o 2º R. escolheu o executante da obra e procedeu ao pagamento dos trabalhos à medida que os mesmos iam sendo realizados (documentos de fls. 63 a 70, pagamentos que fez ao executante AJG)”.
Esta factualidade é corroborada em parte pelo artº 6º da contestação.

Por outro lado, e em reforço do acima expendido, cotejando os documentos de fls. 63 a 70 (execução de trabalhos de construção nos lotes 138, 139 e 140, resulta que os referidos trabalhos foram realizados entre Abril e Novembro de 1990, coincide com o prazo da prorrogação da licença de construção, junta à fls. 82, donde se retira que a mesma caducava em 29 de Novembro de 1990”.

Assim, face aos termos da fundamentação da Mmª julgadora, este facto não vem consistentemente posto em causa. A relevância da alusão a lotes que ninguém discute que não são, de facto, propriedade do 1º R., prende-se com a análise do contexto e da amplitude do mandato do 2º R. no contexto da relação contratual entre ambos estabelecida, naturalmente circunscrita ao lote da propriedade do 1º R.. Por isso, afigura-se-nos que não existe qualquer excesso no mesmo indicado facto. Pelo contrário, a ausência da alusão criticada poderia levar a uma captação deficitária da relação contratual entre os RR..

Quanto ao facto nº 20

Os RR. questionam também o facto nº 20 defendendo que o mesmo é excessivo com fundamento em que o que se perguntava era se a A. tinha de ser submetida a intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo de seis em seis meses.

O facto nº 20 tem o seguinte teor: “20. Não estão excluídas novas intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo da A…(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285)”.

É patente que os RR. não têm qualquer razão visto que o conteúdo do facto cabe dentro da amplitude da pergunta a que os senhores peritos responderam.

Quanto aos factos 34º, 35º e 37º

Os RR. questionam estes factos argumentado que os mesmos, além de se traduzirem em reprodução do relatório pericial (facto 37), exprimem meras opiniões, pareceres ou observações técnicas, não correspondendo ao que a A. alega e acrescentam que esta se limita a alegar, nos termos dos artigos 32º, 58º e 61º.

São do seguinte teor os supra enunciados factos:
“34.A varanda em causa nos autos, com a forma semicircular possui uma guarda composta por balaustradas em pedras moleanos, sobrepostos por pedras corridas em moleanos colocadas nos topos dos balaústres e interligando-os”.
“35.O sistema de colagem e fixação das peças verticais (balaustradas) na guarda horizontal é muito deficiente, tornando baixa a sua rigidez a esforços horizontais. Deviam de ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres, como existem bases, para garantir o seu travamento. O mais grave foi que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em ‘escamas’ ” .
“37.Em relação à varanda referida em 9), resulta do laudo de peritagem de fls. 113 a 131, cujo teor se dá por reproduzido, que, “... devido a erros graves na sua montagem em obra, revela-se instável e completamente incapaz de cumprir a sua função para que foi destinada de guarda-corpos’, e que ‘ ... a fixação das peças verticais na guarda horizontal é muito deficiente ... deviam ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres ... para garantir o seu travamento. O mais grave foi no entanto que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em ‘escamas’”.

Por seu turno o segmento da P.I. convocado pelos RR. tem o seguinte teor:
-Art. 32º: “A deficiente construção da guarda de protecção da varanda da referida moradia foi causa directa, em termos de causalidade adequada da queda a Autora, da varanda do primeiro andar, para o pavimento em tijoleira do rés do chão”;
-Art. 58º: “A queda da Autora, foi devida a culpa dos RR. que, construíram, mais a mais sem a adequada licença camarária, a moradia dos autos, arrendando-a, sem cuidarem de verificar se a mesma, designadamente ao nível das guardas das varandas, tinha adequadas condições de habitabilidade e segurança”;
-Art. 61º: “sendo, mais a mais, inequívoco que a guarda da identificada varanda, não era adequada, como não foi, a proteger pessoas que sobre ela se debruçassem, sem se partir, como se partiu”.

É patente, mais uma vez, a sem razão dos RR., visto que, vindo alegada a deficiente construção, a alusão às condições em que se encontravam os balaústres em razão da sua construção, apenas concretiza os factos articulados pela A., o que cabe plenamente na literalidade do artigo 5º/2b) do CPC, não vindo sequer posto em causa (como não podia deixar de ser, face ao que resulta dos autos) que a mesma factualidade resulta da instrução da causa e sobre ela os RR. tiveram oportunidade de se defender. 

Note-se que os nºs 34º e 37º contêm matéria de índole meramente factual e que resulta da observação directa dos peritos (nº 34º) e do tribunal (facto nº 37 – leitura do relatório).

O que poderia ser duvidoso é o segmento do nº 35 em que consta que “Deviam de ter sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres, como existem bases, para garantir o seu travamento. O mais grave foi que o material de colagem empregue se revelou sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em ‘escamas’”.

Porém a expressão “”deviam ter”, que se traduz num juízo de valor – é verdade – quando lido no sentido de que “Tais dificuldades poderiam ser obviadas se tivessem”, perde a sua carga normativa.

O mesmo se diga da expressão “O mais grave foi que”, expressão que na realidade se torna inútil já que o juízo sobre a gravidade resulta do encadeamento dos factos descritos e da experiência comum.

Note-se que os factos descritos, com ressalva do segmento conclusivo/valorativo enquadram-se plenamente dentro da amplitude da alegação da A. “construção deficiente” e “guarda da varanda  não adequada”.
 
Assim e visto o nº 4 do art. 607º, do CPC/ a contrario sensu, altera-se o nº 35 dos factos para que o mesmo passe a ter a seguinte redacção:

35.O sistema de colagem e fixação das peças verticais (balaustradas) na guarda horizontal é de baixa rigidez (leia-se resistência) a esforços horizontais. Tais dificuldades poderiam ser obviadas se tivessem sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres, como existem bases, para garantir o seu travamento. O material de colagem empregue revelou-se sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em ‘escamas’ ”.

Assim, e com ressalva do que em parte se altera nos nºs 35 e 37, improcede a pretensão dos RR. quanto à matéria de facto

II.2.1.Apreciação jurídica

Os RR. invocam erro de julgamento baseando-se na falta de pressupostos da responsabilidade civil

Quanto à alegada falta de Ilicitude

Entendem os RR. que da sentença não constam as normas de segurança que supostamente terão por eles sido violadas, daí retirando que, sem normas jurídicas violadas, não poderá falar-se em ilicitude.

Todavia e ao contrário do afirmado pelos RR. a sentença referencia o estatuído no artigo 62º/1 do RGUE, aprovado pelo DL 555/99, de 16.12, na redacção da Lei 60/2007, ao referir a licença municipal obrigatória, destinada a verificar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado e com as condições de licenciamento ou da comunicação prévia.
E em torno desta carência a MMª julgadora desenvolve o raciocínio demonstrativo da ilicitude dos RR.

E na realidade assim é visto que à data do acidente (02.12.2207) ainda permaneciam por cumprir as disposições referentes ao licenciamento para utilização – conduta que se foi prolongando no tempo, sem que os RR. tenham vindo invocar responsabilidade exclusiva de qualquer outro terceiro.

Note-se que à luz do artigo 98º do citado diploma a falta de licença de utilização constitui contraordenação e, como tal, punível, mas sem prejuízo da responsabilidade civil que possa haver – como é o caso.

E se é verdade que quanto ao primeiro R. a ilicitude deriva também do artigo 492º CC, que integra os fundamentos da decisão sob crítica, quanto ao 2º R. deriva, do nosso ponto de vista, precisamente do enquadramento daqueles normativos.

Entende-se existir aqui uma situação de mandato sem representação, precisamente pelo facto de o segundo R. ter agido em nome próprio.

Com efeito, ele foi a pessoa que interveio na construção da obra em seu próprio nome designadamente na fase do planeamento, direcção e execução, escolhendo os executantes e procedendo ao pagamento dos trabalhos (factos nºs 3º e 5º).

A actuação entre os RR. denota vantagens patrimoniais manifestas em virtude de, em vez de construção individualizada,  a construção de três lotes – segundo a experiência comum – ser passível de embaratecer os custos da construção.

Assim, faz sentido considerar o presente contrato de mandato sem representação como mandato de interesse comum (artigo 1180º CC). Todavia, ainda que actuando no interesse e por conta do mandante, o mandatário não pode considerar-se dispensado do cumprimento da legislação pertinente no âmbito do seu mandato.
Ora, o segundo R. não demonstrou, bem pelo contrário, que tenha cumprido a legislação em matéria de obtenção da respectiva licença de utilização (vide facto nº 6).
E não podia ignorar tal omissão no âmbito do mandato com representação, quando agiu em nome do primeiro R. aquando da outorga do contrato de arrendamento do locado ao pai da A. que com este residia no mesmo.

Assim sendo, afigura-se-nos que não é aceitável colocar em dúvida o juízo de que a conduta de ambas os RR. se considera ilícita.

Quanto à alegada falta de nexo de causalidade

Os RR. entendem que o vício apontado nos factos 35 e 37 seria completamente inadequado para provocar a ruína da guarda da varanda.

Estribam-se no argumento de que tal vício apenas poderia ter originado a descolagem da guarda horizontal na parte superior da estrutura da varanda. Acrescentam que os balaústres estavam fixados à base por ferrolho metálico encastrado no piso, o que, segundo o entendimento que perfilham, leva à conclusão de que a A. não demonstrou que a queda se tivesse ficado a dever à ruína do parapeito e este, por seu turno, ao apontado vício de construção.

Todavia, mais uma vez, é patente a sem razão dos RR..

Não vem posto em causa que os balaústres não estivessem fixados à base por espigões de metal.
Importa ter em conta que se deixaram incólumes os factos nºs 9 e 10, tendo improcedido a crítica a que a queda resultou da fractura na guarda de protecção da varanda.
Por isso e desde logo, cairia pela base a afirmação de que não há nexo de causalidade.  

Em todo o caso, sempre se dirá que o que a perícia deixou claro nos autos foi que não havia ferrolhos nos topos superiores dos balaústres e que era deficiente o material de colagem (fls. 114). Daí os senhores peritos retirarem que as características  da construção da guarda da varanda não eram adequadas a proteger uma pessoa que sobre a mesma se debruçasse.

Ora este meio de prova não credivelmente posto em causa, é de modo a justificar o encadeamento causal para que apontam os nºs 9 e 10 e seguintes dos factos acima descritos.
 
Mantem-se, pois, que foi a ruína da varanda, devido a vício na construção, que provocou a queda da A., improcedendo, assim, a alegação da falta de prova do nexo causal.

Quanto ao danos (físicos / não patrimoniais / patrimoniais por incapacidade permanente geral)

Na esteira de vasta jurisprudência, nomeadamente dos acórdãos que infra citamos, estamos no domínio dos danos patrimoniais indetermináveis, cuja reparação deve ser fixada segundo juízos de equidade (cfr. art. 566º, nº 3, do Código Civil).

O que cumpre aferir, consiste em verificar se foram excedidos os parâmetros da equidade para que remete o artigo 566.º/3 CC ou se houve violação do disposto nas disposições dos artigos 562.º, 563.º, 564.º e 566.º, n.º 1 e 2, do mesmo diploma que fixam os parâmetros a ter em conta.

Neste âmbito, a par dos dados do caso, a jurisprudência tem-se valido de fórmulas matemáticas para balizar e de algum modo uniformizar critérios tendo em conta as finalidades da atribuição da indemnização atribuída de uma só vez.

Por razões de metodologia, antes de apreciar, em concreto, a fixação de cada uma das criticadas componentes da indemnização, interessa termos presentes os seguintes critérios gerais que intervêm na fixação a indemnização (seguindo-se essencialmente, os termos do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/01/2016, proc. n º 7793/09.8T2SNT.L1.S1, www.dgsi.pt,[7]:

-O princípio geral da obrigação de indemnizar consiste na reconstituição da situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art. 562º, do Código Civil). A reconstituição natural é substituída pela indemnização em dinheiro quando se verificar alguma das situações do nº 1, do art. 566º, do CC: “sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor”. A indemnização deve abranger os danos emergentes e os lucros cessantes (art. 564º, nº 1, do CC) e o seu cálculo deve ser feito segundo a fórmula da diferença, prevista no nº 2, do art. 566º, do CC (“a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”). Contudo, se o montante dos danos for indeterminado e, por isso mesmo, a fórmula da diferença não puder ser aplicada, “o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados” (nº 3, do art. 566º, do CC)”;
- “A compensação dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496º, nº 1, do CC), não pode – por definição – ser feita através da fórmula da diferença. Deve antes ser decidida pelo tribunal, segundo um juízo de equidade (art. 496º, nº 4, primeira parte, do CC), tendo em conta as circunstâncias previstas na parte final do art. 494º, do CC”;
- “Como tem sido considerado pelo Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por exemplo, o acórdão de 6 de Abril de 2015, proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1, com remissão para o acórdão de 28 de Outubro de 2010, proc. nº 272/06.7TBMTR.P1.S1, e para o acórdão de 5 de Novembro de 2009, proc. nº 381/2002.S1, todos em www.dgsi.pt), “a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito»”; se é chamado a pronunciar-se sobre “o cálculo da indemnização” que “haja assentado decisivamente em juízos de equidade”, não lhe “compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar (…), mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub iudicio»”;
- “A sindicância do juízo equitativo não afasta a necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade, o que aponta para uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo da consideração das circunstâncias do caso concreto. Nos termos do acórdão deste Supremo Tribunal de 31 de Janeiro de 2012, proc. nº 875/05.7TBILH.C1.S1, www.dgsi.pt, “os tribunais não podem nem devem contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito privado e, mais precisamente, na área da responsabilidade civil que a afirmação desses vectores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha recta à efectiva concretização do princípio da igualdade consagrado no artº 13º da Constituição”. Exigência plasmada também no art. 8º, nº 3, do CC: “nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.”[8];

Vejamos então quanto a cada uma das parcelas sob apreciação.
 
Quando aos danos físicos

Os RR. discordam da autonomização da condenação em indemnização pelos designados danos físicos, por entenderem que tal se cifra numa indevida duplicação da indemnização e, quando muito, devem ser indemnizados como dano não patrimonial.

No segmento decisório em causa lê-se que:
Pelo exposto, atentos os factos, as normas e os princípios supramencionados, decido:
a)Condenar os réus MJFE e ABF, a pagarem, solidariamente, à autora DMFLM, as seguintes quantias:
- A indemnização no valor de € 70.000,00 a título de ressarcimento de todos os danos físicos sofrido pela A..
(…)

Não nos revemos na pretensão dos RR..

Com efeito, tem-se vindo a entender que as lesões geradoras de incapacidades permanentes, com ou sem repercussão na esfera patrimonial do lesado, integra o conceito de dano biológico.

Em ordem a fixarem-se “os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal, nos termos do disposto no capítulo III do título II do Decreto -Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, veio a ser aprovada a Portaria n.º 377/2008 de 26 de maio, entretanto atualizada pela Portaria n.º 679/2009 de 25/6, pela qual se diferencia o “dano patrimonial futuro” (casos de dano corporal - art. 3.º n.º 1 al. a) da mencionada Portaria), da compensação devida por violação do direito à integridade física e psíquica, de que resulte ou não perda de capacidade de ganho, identificada aí como “dano biológico” (art. 3º al. b) da mesma Portaria).

Nesta Portaria fixaram-se critérios distintos para determinação da indemnização por “danos morais complementares” (art. 4º e anexo I), por “danos patrimoniais futuros” (art. 7.º e anexo III) e, finalmente, para o “dano biológico” (art. 8º e anexo IV). Neste caso, o primeiro e o último são tratados como “danos não patrimoniais” e o segundo como “dano patrimonial”.

Tem também dito, que:“A autonomização do dano biológico ou corporal deriva da tutela do direito à saúde, concretizado numa situação de bem-estar físico e psíquico, enquanto direito fundamental de cada indivíduo, constitucionalmente consagrado nos artºs 24º nº 1, 25º nº 1 da CRP que estabelecem o carácter inviolável da vida e integridade física e moral da pessoa humana e no 70º do C.Civil que protege a ofensa ilícita à personalidade física ou moral de cada um.
Este “direito à saúde” quando afectado, enquanto direito fundamental de cada um, dá lugar à obrigação de indemnizar que não pode ser limitada aos casos em que as lesões se repercutem sobre a capacidade de ganho do lesado[9].

Em reforço do entendimento de que os danos biológicos se podem projectar, quer a nível patrimonial, quer não patrimonial, pronunciou-se, inter alia, o Supremo Tribunal de Justiça, no Ac de 25-05-2017[10], onde se escreveu que: 
II -A afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais.
(…).
Conforme se extracta do mesmo acórdão, em idêntico sentido se havia pronunciado o acórdão do Supremo Tribunal de 28/01/2016 (proc. nº 7793/09.8T2SNT.L1.S1), in www.dgsi.pt, retomando o entendimento dos acórdãos de 07/04/2016 (proc. nº 237/13.2TCGMR.G1.S1), e de 14/12/2016 (proc. nº 37/13.0TBMTR.G1.S1), in www.dgsi.pt, “A afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais (neste sentido, decidiram os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 2015 (proc. nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1), de 19 de Fevereiro de 2015 (proc. nº 99/12.7TCGMR.G1.S1), de 7 de Maio de 2014 (proc. nº 436/11.1TBRGR.L1.S1), de 10 de Outubro de 2012 (proc. nº 632/2001.G1.S1), e de 20 de Outubro de 2011 (proc. nº 428/07.5TBFAF.G1.S1), todos em www.dgsi.pt.)”.
Afirma-se (…) no acórdão de 28/01/2016, que vimos citando:
“Para além dos danos patrimoniais consistentes em perda de rendimentos laborais da profissão habitual, segue-se a orientação deste Supremo Tribunal, supra referida, de procurar ressarcir as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade laboral para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais. Trata-se das consequências patrimoniais do denominado “dano biológico”, expressão que tem sido utilizada na lei, na doutrina e na jurisprudência nacionais com sentidos nem sempre coincidentes. Na verdade, a lesão físico-psíquica é o dano-evento, que pode gerar danos-consequência, os quais se distinguem na tradicional dicotomia de danos patrimoniais e danos não patrimoniais (cfr. tratamento mais desenvolvido pela relatora do presente acórdão, Responsabilidade Civil – Temas Especiais, 2015, págs. 69 e segs.). Com esta precisão, a indemnização pela perda da capacidade de ganho, tem a seguinte justificação, nas palavras do acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.: “a compensação do dano biológico [dentro das consequências patrimoniais da lesão físico-psíquica] tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.”
Entende-se que o aumento da penosidade e esforço para realizar as tarefas diárias pode ser atendido no âmbito dos danos patrimoniais (e não apenas dos danos não patrimoniais), na medida em que se prove ter como consequência provável a redução da capacidade de obtenção de proventos, no exercício de actividade profissional ou de outras actividades económicas.
“A perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe [ao lesado], de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais” (acórdão do Supremo Tribunal de 10 de Outubro de 2012, cit.).”.
Nestes termos, consideram-se reparáveis como danos patrimoniais as consequências danosas resultantes da incapacidade geral permanente (ou dano biológico), ainda que esta incapacidade não tenha tido repercussão directa no exercício da profissão habitual.

Poderemos, assim, dizer que, neste âmbito é abrangida a afectação da capacidade para actividades de natureza pessoal, tenham ou não um cunho económico, mas tê-lo-ão seguramente quando, pelo grau de incapacidade e em função das específicas lesões, haja necessidade de contratar a ajuda de terceira pessoa para os actos correntes da vida diária, designadamente do auto-cuidado.

Em suma: embora não se desconheça entendimento diverso, o dano biológico, traduz-se numa categoria que, segundo a doutrina e a jurisprudência tanto pode dar origem a danos patrimoniais como não patrimoniais e que dá origem a uma indemnização que não se pode confundir com aquela que é atribuída quando há perda da capacidade de ganho. A autonomia da indemnização pelo dano biológico radica na afectação do direito à saúde que pode originar outras perdas e ou despesas acrescidas, tanto de natureza patrimonial como não patrimonial.

Os RR. questionam também o montante a este título arbitrado

Opinam que o mesmo é excessivo: quando muito deveria ter sido fixado em € 50.000,00.

Para aferição sobre se no caso em apreço foram ou não excedidos os indicados critérios gerais de cálculo, importa ter em conta os danos sofridos pela A. a este nível e que, por comodidade de leitura, aqui se voltam a descrever:
10.Em consequência da queda, a Autora sofreu, além do mais, escalpe com ferida frontal, afagamento do murmúrio à esquerda no tórax, hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, fractura da parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho esquerdo e direito, fractura do primeiro arco costal à esquerda e da asa menor do esfóide junto à fossa cerebral médio. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
11.Sofreu ainda, fractura do redobro externo da órbita, fractura do corpo de D12 e corpo anterior de L1, fractura de ambos os punhos, fractura do primeiro arco costal E, hemopneumotorax esquerdo drenado e fractura da coluna dorso-lombar. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
12.A Autora sofreu igualmente feridas diversas profundas em todo o corpo. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
14.Em consequência dos referidos ferimentos, a A. foi submetida, até à data, a quatro dolorosas intervenções cirúrgicas. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
15.A autora tem sido submetida a tratamentos diversos de fisioterapia em regime de ambulatório, desde a data do acidente, até hoje. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
16.Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
17.Necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
18.As lesões sofridas pela A., foram directa e exclusivamente causadas pela queda de 2-12-2007. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
19.Em consequência da queda, a Autora esteve internada em hospitais de 02.12.2007 a 24.12.2007. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
20.Não estão excluídas novas intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo da A…(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
21.Em consequência da queda, a Autora esteve de baixa por doença, entre 02.12.2007 a 10.08.2010. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
22.Em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
23.Em consequência da queda, a Autora ficou com uma incapacidade permanente geral de 60% (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
24.Em consequência do acidente, a Autora deixou de poder conduzir quaisquer viaturas (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
25.Ainda hoje, a Autora apresenta sequelas do acidente, em termos de visão, mobilidade, em termos respiratórios e de estabilidade mental e emocional, etc. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
26.Em consequência directa e necessária do acidente, a Autora carece hoje de adequado acompanhamento oftalmológico, neurológico, ortopédico, psiquiátrico, fisiátrico e em sede de cirurgia plástica (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
27.Os ferimentos causados à Autora, foram de tal forma graves, que ainda hoje, lhe provocam muitas dores nos membros superiores esquerdos, pernas, cabeça e coluna vertebral (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
28.Para além da mobilidade que perdeu, a Autora sofreu muitas dores, depois do acidente, durante e após os tratamentos (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
29.Ainda hoje, praticamente não faz movimentos com os membros superiores esquerdos, tem muitas dores na coluna, nos joelhos, nas pernas, nos braços e na cabeça, dificuldades respiratórias, visão turva, depressões recorrentes, que motivam regulares deslocações aos serviços de urgência dos hospitais e ao Centro de Saúde (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
30.Em consequência da queda, a A. necessita da supervisão de terceira pessoa para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
31.E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, a mover todos os seus membros e ver como dantes (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
36.A Autora, com 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer das doenças relatadas como decorrência do acidente.

Importa ter em mente que, neste tipo de situações, o período a ponderar neste cálculo não se referencia ao tempo de vida activa (até aos 70 anos). Diversamente, há que ponderara esperança média de vida (fixada em cerca de 83 anos para as mulheres).
Mais, não se poderão ter em conta, os valores da remuneração como contrapartida da actividade laboral concreta de um trabalhador, para efectuar os respectivos cálculos, visto que estamos no domínio de uma das vertentes do direito à saúde que, como tal, deverá ter um tratamento equitativo para todos os cidadãos.
Depois, como referência é corrente lançar mão da remuneração mínima garantida (muito embora se note um crescendum na ponderação da remuneração média em função da etiologia deste tipo de dano e da finalidade da respectiva indemnização), a qual, à data do acidente, era de € 403,00 (x14 meses)[11] e, bem assim, os factores que delimitam os contornos do caso concreto (como sejam nomeadamente, neste caso, os 60% de incapacidade permanente geral que foram fixados à A.).
Neste domínio, a A. ficou a precisar da supervisão de uma terceira pessoa para garantir as tarefas da vida diária: para se vestir, lavar, alimentar e transportar. Isto é, irá ter despesas que, se não fosse o acidente, previsivelmente não teria.
Ora, se tivermos em conta os valores a que a Mmª julgadora chegou, nenhum excesso detectamos, ainda que na operação do cálculo lancemos mão das fórmulas da tabela utilizada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.12.2007[12], no Proc. 07A3836, igualmente adoptada no Acórdão da Relação do Porto de 08.05.2014, no Proc. 227/09.0TBRSD.P1[13].

Nestes casos a jurisprudência tem levado em linha de conta alguns ajustes no rendimento nominal em função nomeadamente da inflação.

Assim, tomando por base o rendimento anual da A. reportado a 14 meses (€ 403 x 14 meses x 28 anos), a incapacidade permanente geral, que lhe foi fixada em 60%, a taxa de juro nominal da ordem dos 4%, um período de vida previsível de 28 anos (com referência ao ano do acidente), uma taxa anual de crescimento da prestação na ordem dos 2% e uma redução de 1/3 do capital assim apurado a título de compensação pela antecipação do capital, e, bem assim, a ponderação da necessidade de cuidados por terceira pessoa (para as tarefas comuns da vida diária) e atendendo a que deixou de poder conduzir quaisquer viaturas, diminuindo assim a empregabilidade em termos gerais, face aos factores de cálculo acima indicados, submetidos a critérios de equidade, não se mostra que a indemnização de € 70.000,00 seja, de algum modo, excessiva para reparar o dano biológico sofrido pela A.

Danos patrimoniais por incapacidade permanente geral

Muito embora, como vimos, se trate de uma realidade que não pode confundir-se com a anteriormente tratada, a verdade é que tem com a mesma fortes pontos tangenciais.

Neste âmbito, importa basicamente ponderar os mesmos factos, salientando-se, nomeadamente as dificuldades de que a A. passou a padecer como decorrência do acidente dos autos, podendo, mais uma vez por comodidade de leitura, resumir-se assim:

10.Em consequência da queda, a Autora sofreu, além do mais, escalpe com ferida frontal, afagamento do murmúrio à esquerda no tórax, hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, fractura da parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho esquerdo e direito, fractura do primeiro arco costal à esquerda e da asa menor do esfóide junto à fossa cerebral médio. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
11.Sofreu ainda, fractura do redobro externo da órbita, fractura do corpo de D12 e corpo anterior de L1, fractura de ambos os punhos, fractura do primeiro arco costal E, hemopneumotorax esquerdo drenado e fractura da coluna dorso-lombar. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
16.Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
17.Necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades. (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
22.Em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar. (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
23.Em consequência da queda, a Autora ficou com uma incapacidade permanente geral de 60%. (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
24.Em consequência do acidente, a Autora deixou de poder conduzir quaisquer viaturas. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
25.Ainda hoje, a Autora apresenta sequelas do acidente, em termos de visão, mobilidade, em termos respiratórios e de estabilidade mental e emocional, etc. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
29.Ainda hoje, praticamente não faz movimentos com os membros superiores esquerdos, tem muitas dores na coluna, nos joelhos, nas pernas, nos braços e na cabeça, dificuldades respiratórias, visão turva, depressões recorrentes, que motivam regulares  deslocações aos serviços de urgência dos hospitais e ao Centro de Saúde. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
30.Em consequência da queda, a A. necessita da supervisão de terceira pessoa para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
31.E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes. (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
32.Fruto do acidente, a autora vive também em permanente depressão, estando permanentemente triste. (cfr. resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).

Fundamentalmente com base nos apontados critérios, mas tendo em conta o tempo de vida activa de 15 anos (até aos 70), mantendo-se ainda o valor da retribuição mínima mensal garantida, uma vez que não se provou a remuneração efectivamente auferida pela A., com base num cálculo paralelo, temperado pela equidade, em que ponderam factores como a circunstância de não ser tida em conta a inflação e sua repercussão nos salários, a ausência de possibilidade de progressão na carreira, entendemos não ser excessivo o valor de € 100.000,00 fixado a título de indemnização por danos patrimoniais em razão da incapacidade geral de ganho[14].
              
Quanto aos danos não patrimoniais

Os RR. sustentam que o montante de € 50.000,00 de indemnização a título de danos não patrimoniais é manifestamente exagerado para compensar os danos não patrimoniais sofridos pela A..
Argumentam com base no valor referência do direito à vida que entendem ser de € 50.000,00; nos dados de estudo comparativo de recentes decisões e na circunstância de não haver qualquer dolo por parte dos RR. (dispensando-nos aqui de referenciar os argumentos já afastados aquando do conhecimento das anteriores questões, relativas a ausência de ilicitude e nexo de causalidade).
 
A decisão recorrida teve por referência o quadro normativo pertinente (artigo 496º/1 e 3 e 494º, CC),

Nos termos do artigo 496.º do Código Civil na fixação da indemnização são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Foram ponderados neste caso “O mal estar permanente decorrente das dores que sentiu e as resultantes das intervenções cirúrgicas a que foi submetida (e que se submeterá no futuro), a lenta recuperação, o tempo em que esteve internada e acamada, as depressões recorrentes, a perda de autonomia (para deslocar, para se vestir, lavar, comer), deixou de conduzir (…), o dano estético.

Também correcta é a o alinhamento da sentença com a jurisprudência que tem vindo a entender que a indemnização deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, portanto, ser miserabilista, mas significativa, a fim de responder actualizadamente ao comando do art.º 496.° do Código Civil e constituir uma efectiva possibilidade compensatória (cf. Acs. do STJ de 25/6/2002, in CJ - STJ - ano X, tomo II, pág. 128 e de 28/5/98, aí citado)

Relembremos, então, mais uma vez por comodidade de leitura, os factos a este respeito provados:

10.Em consequência da queda, a Autora sofreu, além do mais, escalpe com ferida frontal, afagamento do murmúrio à esquerda no tórax, hematoma epidural laminar perifracturário temporal esquerda, fractura da parede lateral da órbita esquerda, fractura da arcada zigomática, fractura do punho esquerdo e direito, fractura do primeiro arco costal à esquerda e da asa menor do esfóide junto à fossa cerebral médio. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
11.Sofreu ainda, fractura do redobro externo da órbita, fractura do corpo de D12 e corpo anterior de L1, fractura de ambos os punhos, fractura do primeiro arco costal E, hemopneumotorax esquerdo drenado e fractura da coluna dorso-lombar. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
12.A Autora sofreu igualmente feridas diversas profundas em todo o corpo. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
13.Em consequência do acidente, a A. passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar.
14.Em consequência dos referidos ferimentos, a A. foi submetida, até à data, a quatro dolorosas intervenções cirúrgicas. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
15.A autora tem sido submetida a tratamentos diversos de fisioterapia em regime de ambulatório, desde a data do acidente, até hoje. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
16.Presentemente, apresenta ainda uma situação motora de dificuldades de locomoção e mobilidade dos membros superiores e inferiores, para além de alterações do humor e comportamento, (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
17.Necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para orientação e estimulação de todas as suas actividades. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
18.As lesões sofridas pela A., foram directa e exclusivamente causadas pela queda de 2-12-2007. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
19.Em consequência da queda, a Autora esteve internada em hospitais de 02.12.2007 a 24.12.2007. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
20.Não estão excluídas novas intervenções cirúrgicas ao punho esquerdo da A…(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
21.Em consequência da queda, a Autora esteve de baixa por doença, entre 02.12.2007 a 10.08.2010. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
22.Em consequência do acidente, a Autora passou a depender de terceiros, durante as 24 horas do dia, para se vestir, lavar, alimentar e transportar. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
23.Em consequência da queda, a Autora ficou com uma incapacidade permanente geral de 60%.(cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
24.Em consequência do acidente, a Autora deixou de poder conduzir quaisquer viaturas. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
25.Ainda hoje, a Autora apresenta sequelas do acidente, em termos de visão, mobilidade, em termos respiratórios e de estabilidade mental e emocional, etc. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
26.Em consequência directa e necessária do acidente, a Autora carece hoje de adequado acompanhamento oftalmológico, neurológico, ortopédico, psiquiátrico, fisiátrico e em sede de cirurgia plástica. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
27.Os ferimentos causados à Autora, foram de tal forma graves, que ainda hoje, lhe provocam muitas dores nos membros superiores esquerdos, pernas, cabeça e coluna vertebral. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
28.Para além da mobilidade que perdeu, a Autora sofreu muitas dores, depois do acidente, durante e após os tratamentos. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
29.Ainda hoje, praticamente não faz movimentos com os membros superiores esquerdos, tem muitas dores na coluna, nos joelhos, nas pernas, nos braços e na cabeça, dificuldades respiratórias, visão turva, depressões recorrentes, que motivam regulares deslocações aos serviços de urgência dos hospitais e ao Centro de Saúde. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
30.Em consequência da queda, a A. necessita da supervisão de terceira pessoa para se lavar, vestir, comer, andar e frequentar hospitais. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
31.E, apesar dos seus 55 anos, a Autora nunca mais voltou a andar, mover todos os seus membros e ver como dantes. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
32.Fruto do acidente, a autora vive também em permanente depressão, estando permanentemente triste. (cfr. Resposta aos quesitos na perícia de fls. 284 verso e 285).
36.A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer doença[15].

Ora, esta factualidade é de molde a permitir concluir que o sofrimento psíquico da A. plasmado nas dores, na depressão, na privação da vida pelos períodos de internamento e pelas limitações de que passou a padecer, incluindo a perda de autonomia e o dano estético, justifica o montante que lhe foi atribuído.

Ainda que se tomasse como referência o bem vida, a verdade é que tal valor tem vindo a ser corrigido pela jurisprudência, estando manifestamente desactualizado o valor indicado pelos RR..

Com efeito o mesmo situa-se, hoje, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50 000,00 e € 80 000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00.
A este título, citamos, entre muitos outros, o Ac. S.T. J. proferido na Revista n.º 2104/05.4TBPVZ.P1.S1, de 08.06.2017, relatado pela Excelentíssima Conselheira Maria dos Prazeres Piçarro Beleza, onde se escreveu que:
É exacto que o direito à vida é o mais valioso de todos os direitos, os valores indemnizatórios que os tribunais vêm atribuindo por morte - […] na maioria dos casos oscilam entre os 50.000,00 € e os 80.000,00 €.
Idêntica informação se deixou plasmada no Ac. S. T. J. proferido na Revista 2567/09.0TBABF.E1.S1, de 08.06.2017, também relatado pela mesma Ilustre Conselheira Maria dos Prazeres Beleza.
No sentido da fixação em 80.000,00 € do montante indemnizatório pela perda do direito à vida, pronunciou-se também o Ac. S. T. J. proferido na Revista 294/07.0TBPCV.C1.S1, de 16.03.2017, relatado pela Excelentíssima Conselheira Maria da Graça Trigo.
Também no Ac. S. T. J. proferido na Revista 6/15.5T8VFR.P1.S1, de 03.11.2016, rel. pelo Exc. Cons. Joaquim Piçarra, escreveu-se que:
A reparação do dano morte é hoje inquestionável na jurisprudência, situando-se, em regra e com algumas oscilações, entre os € 50.000,00 e € 80.000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a € 100.000,00.”

Por conseguinte, não se nos afigura argumento razoável que implique a contrariedade do valor encontrado pela Mm.ª Juíza, o argumento dos RR. baseado no valor do bem vida.

No que aos danos não patrimoniais toca, importa ter presentes os padrões indemnizatórios seguidos recentemente pelo Supremo Tribunal de Justiça:
Acórdão de 04.06.2015, no Proc. 1166/10.7TBVCD.P1.S1: jovem de 17 anos, vários tratamentos médicos, intervenções e internamentos, alta mais de 4 anos depois do acidente, repercussões estéticas, quantum doloris de grau 6, e grave culpa da condutora do veículo causador do acidente – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 40.000,00;
Acórdão de 21.01.2016, no Proc. 1021/11.3TBABT.E1.S1: jovem de 27 anos, múltiplos traumatismos, sequelas psicológicas, quantum doloris de grau 5, dano estético de 2 pontos; incapacidade parcial de 16 pontos, repercussão nas actividades desportivas e de lazer de grau 2, claudicação na marcha e rigidez da anca direita – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 50.000,00;
Acórdão de 26.01.2016, no Proc. 2185/04.8TBOER.L1.S1: jovem de 20 anos, desportista, que ficou com várias cicatrizes em zonas visíveis e padeceu de acentuado grau de sofrimento (quantum doloris de grau 5) e relevante dano estético – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 45.000,00;
Acórdão de 28.01.2016, no Proc. 7793/09.8T2SNT.L1.S1: quantum doloris de grau 5, sujeição a quatro operações, internamento por longos períodos, mais duas operações a que ainda teria de se sujeitar, vários tratamentos de reabilitação, dano estético de grau 4 – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 40.000,00; e,
Acórdão de 07.04.2016, no Proc. 237/13.2TCGMR.G1.S1: jovem de 22 anos de idade, défice funcional permanente de 8%, quantum doloris de grau 4, sequelas compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicando esforços suplementares, dano estético de grau 3, repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 1 e diversas sequelas psicológicas – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 50.000,00[16].
Acórdão de 25 de Maio de 2017, no Proc. 868/10.2TBALR.E1.S1: o acidente ocorreu quando o A. tinha 19 anos de idade, sendo sujeito a quatro cirurgias, a 125 sessões de fisioterapia e tendo alta cerca de dois anos e meio depois do acidente, com 627 dias de incapacidade temporária absoluta e 312 de incapacidade temporária parcial. Ficou afectado de sequelas que implicaram a perda do seu posto de trabalho e a incapacidade permanente para a sua profissão habitual. O quantum doloris foi de grau 4 (numa escala de 1 a 7), o dano estético é igualmente de grau 4, o défice permanente de integridade físico-psíquica é de 7 pontos, sendo de admitir danos futuros, a repercussão nas actividades desportivas e de lazer é de grau 3 e na actividade sexual de grau 2. Por outro lado, o A. ficou dependente economicamente da mãe e de um irmão, o que lhe causa complexos (naturais), sente tristeza, isola-se e padece de depressão, carecendo de apoio psicológico.

Neste caso há alguns parâmetros de gravidade mais acentuada expressa na incapacidade para a profissão habitual da A. e a repercussão nas actividades quotidianas, ficando a carecer permanentemente da supervisão de uma terceira pessoa.
Está, pois, também em causa uma perda própria (incluindo de autonomia), sentida pela pessoa do lesado em si mesmo.
Além disso, é uma perda de vulto (avaliada em 60%), a par dos subjectivos dolorosos e da depressão de que a A. passou a sofrer.
 Assim e face ao quadro depressivo de que a A. ficou a padecer entendemos equitativa a indemnização de € 50.000,00

Quanto à alegada falta de responsabilidade do 2º R.

Os RR. entendem dever ser considerado irresponsável o 2º R. com base em que ele não é proprietário do imóvel em que ocorreu o acidente com a A..
Todavia, valem aqui os argumentos que atrás expendemos quanto à questão da ilicitude, não restando senão confirmar o veredicto da primeira instância também neste particular.

Quanto à reforma quanto a custas

Os RR. pedem também a reforma quanto a custas.
É um facto que a A. pede a quantia de € 1.500.000,00 tendo a sentença condenado os RR. em € 220.000, valor que agora se mantém. Em sede de custas, a sentença condenou os RR. em 7/8 e a A. em 1/8.

É um facto que não foi observada a proporção do decaimento das partes na acção o que por isso terá, do nosso ponto de vista de ser corrigido face ao estatuído nos artigos 616º e 527º/2 do CPC..

III.Decisão.
Pelo exposto e de harmonia com as disposições legais citadas, decide-se:
(i)-Conceder parcial provimento ao recurso de facto, elimina-se o facto nº 13 e alteram-se os factos nºs 35 e 36, como se deixou explanado, mas sem qualquer impacto na decisão de fundo;
(ii)-negar provimento ao recurso quanto à matéria de fundo, mantendo por isso a decisão recorrida.
(iii)-conceder provimento ao recurso na parte que fixou a responsabilidade por custas, alterando a decisão por forma a que da mesma passa a constar “Custas na proporção do decaimento”.



Lisboa, 24-10-2017



Maria Amélia Ribeiro
Dina Monteiro
Luís Espírito Santo
*****

Voto de vencido:
Discordo da decisão que fez vencimento quanto aos seguintes pontos:
1– A responsabilidade do 2º Réu, António Basílio Frasco, só seria configurável no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, não podendo assentar, exclusiva e praticamente, na figura do mandato sem representação genericamente previsto para o plano da responsabilidade meramente contratual no artigo 1180º do Código Civil (preceito, aliás, a meu ver, totalmente inaplicável in casu face à concreta matéria de facto dada como provada e ao tipo de responsabilidade que se discute).
2– A presente acção não contém a factualidade mínima necessária que permita a responsabilização deste Réu, atenta a sua participação nos factos dados como provados, não se enquadrando a sua conduta na previsão do artigo 492º, do Código Civil (seu nºs 1 e 2). Os autos não fornecem igualmente factualidade susceptível de responsabilizar este Réu no âmbito da previsão do artigo 493º, do Código Civil.
3– As indemnizações fixadas cumulativamente a título de perda da capacidade de ganho e de “lesões físicas” assentam basicamente numa mesma e única realidade – que igualmente se mistura e confunde com a matéria relativa ao ressarcimento de danos morais (artigo 496º, nº 1, do Código Civil) -, constituindo duplicação de montantes indemnizatórios sem a adequada justificação substantiva.
4– Ressalvo ainda o recorte da figura do denominado dano biológico que assumi em moldes diversos noutros arestos de que fui relator.
                                                                                                (Luís (Espírito Santo)

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[1]Facto eliminado como infra se determina, por vir repetido no facto nº 22.
[2]Alterado nos termos infra consignados, passando a ter a seguinte redacção: 35. O sistema de colagem e fixação das peças verticais (balaustradas) na guarda horizontal é de baixa rigidez (leia-se resistência) a esforços horizontais. Tais dificuldades poderiam ser obviadas se tivessem sido montados ferrolhos nos topos superiores dos balaústres, como existem bases, para garantir o seu travamento. O material de colagem empregue revelou-se sem a mínima aderência entre as pedras, desligando-se completamente em ‘escamas’
[3]Alterado nos termos infra consignados, passando a ter a seguinte redacção: 36. A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer das doenças relatadas como consequência do acidente a que os autos aludem.
[4]Neste sentido, entre muitos outros, pode ver-se o acórdão da Relação de Lisboa proferido na Apelação nº 123.879/15.0YIPRT.L1, relatado pela Exma. Desembargadora Maria do Rosário Morgado.
[5]Processo 02ª4346, relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro Afonso de Melo.
[6]Tabela médica destinada a avaliar e pontuar as incapacidades resultantes de ofensa na integridade física e psíquica da vítimas de acidentes.
[7]Apud Ac. STJ de 07 de Abril de 2016, relatado pela Excelentíssima Conselheira Graça Trigo.
[8]Ac. STJ de 7 de Abril de 2016, relatado pela Excelentíssima Conselheira Maria da Graça Trigo.
[9]Ac. RC de 04.06.2013, relatado pela Desembargadora Maria Inês Moura
[10]Relatado  pela Excelentíssima Conselheira Graça Trigo.
[11]Decreto-Lei n.o 2/2007 de 3 de Janeiro.
[12]Relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro Moura Cruz, no qual se explicita de forma transparente o percurso cognitivo que, mutatis mutandis, aqui também seguimos para obtenção do valor da indemnização.
[13]Apud Ac. STJ de 07.04.2016 citado.
[14]Vide Acórdão do STJ de 10.03.2016, relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro Tomé Gomes.
[15] Alterado nos termos infra consignados, passando a ter a seguinte redacção: 36. A Autora, com apenas 55 anos à data do acidente, não padecia de qualquer das doenças relatadas como consequência do acidente a que os autos aludem.
[16]Apud Acórdão de 25 de Maio de 2017, no Proc. 868/10.2TBALR.E1.S1, relatado pelo Excelentíssimo Conselheiro
Lopes do Rego.