Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7852/17.3T8LSB.L2-7
Relator: CONCEIÇÃO SAAVEDRA
Descritores: LIVRANÇA EM BRANCO
NÃO PREENCHIMENTO
SOCIEDADE POR QUOTAS
GERENTE
RESPONSABILIDADE CIVIL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/02/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário:  I- O título em branco, que apenas contenha a assinatura do seu subscritor, será válido enquanto tal, mas não eficaz, pelo que a livrança não pode produzir efeitos enquanto título de natureza cambiária na falta de elementos essenciais;
II- Tendo o A. subscrito a referida livrança como avalista, não se constitui o mesmo obrigado enquanto a livrança não for preenchida e completada nos termos acordados, não podendo, por consequência, exercer direito de regresso sobre outros avalistas que, nas mesmas condições, tenham subscrito a livrança;
III- Tendo o A. proposto acção contra o R. invocando a sua qualidade de sócio de sociedade em que praticou os actos que invoca – e em que fundamenta os seus pedidos – actos que justifica com a actuação ilícita do R. enquanto gerente dessa mesma sociedade (para além de sócio), é de concluir que o faz nessa qualidade de sócio, à luz do disposto no nº 1 do art. 79 do C.S.C., e não de mero credor social, à luz do disposto no nº 1 do art. 78 do mesmo Código;
IV- A responsabilidade dos gerentes para com os sócios a que alude o nº 1 do art. 79 do C.S.C. enquadra-se no regime geral da responsabilidade civil extracontratual, na medida em que não existe uma relação obrigacional entre eles, cumprindo fazer aplicação do disposto no art. 483 do C.C.;
V- Nos termos dos indicados normativos, respondem os gerentes perante os sócios apenas pelos danos que directamente lhes causarem no exercício das suas funções, estando à partida excluídos os actos que se integram numa gestão ruinosa ou no deficiente exercício dos poderes de gestão;
VI- A desvalorização da quota do sócio constitui dano indirecto ou reflexo deste que não encontra cobertura no art. 79, nº 1, do C.S.C..
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I- Relatório:
A [ A. José …] veio propor contra B [ António ….] ação declarativa sob a forma comum pedindo a condenação do R. pagar-lhe a quantia de € 85.639,62, acrescida de juros à taxa legal desde a citação, e a quantia de € 2.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal desde o trânsito da sentença. Invoca, para tanto e em breve síntese, que sendo, juntamente com o R., sócio e gerente da sociedade comercial T. da Armada, Lda, o R. explorou em exclusivo a atividade de restauração da dita sociedade entre 2.2.2013 e 20.4.2015, no estabelecimento que constitui a sede social, impedindo o A. de entrar no restaurante e de participar na atividade da sociedade, tendo o A. renunciado à gerência em 21.9.2016. Refere que o R. nunca prestou contas da gerência, apropriando-se indevidamente de quantias pertencentes à sociedade que terá gasto em proveito próprio, tendo o A. instaurado, além do mais, ação especial de suspensão e destituição daquele cargo que corre termos no Tribunal de Comércio de Lisboa. Diz que avalizou com o R. uma livrança em branco que a referida sociedade subscreveu, no âmbito de um contrato de locação financeira. Face ao incumprimento do referido contrato pela sociedade, o A. pagou, entre Outubro de 2013 e 30.1.2017, a quantia global de € 19.692,60 ao Banco Popular. E pagou ao BPI, também por conta da sociedade, a quantia de € 3.575,00. Utilizou ainda o R. o estabelecimento de restaurante em colaboração com pessoas estranhas ao A., desenvolvendo ali atividade em proveito próprio que não foi refletida nas contas bancárias da sociedade. Quando o R., em 20.4.2015, abandonou a sociedade e as instalações da sua sede, deixou-as vazias de todo o equipamento, em parte pertencente ao A., que levou consigo. Conclui que o R. violou os deveres de lealdade e de agir no interesse da sociedade, com o propósito de encerramento da sua atividade e esvaziamento do respetivo património, causando prejuízos ao A., desvalorizando, designadamente, a sua quota social. Defende que, ao agir da forma descrita, o R. incapacitou financeiramente a sociedade de devolver os suprimentos efetuados pelos sócios e o direito do A. na participação dos lucros, na proporção da sua quota. Para além do mais, tem direito de regresso sobre o R. relativamente às quantias pagas ao tomador da livrança referida, no valor de € 9.846,30. Reclama, em suma, a título de danos patrimoniais, o valor global de € 85.639,62, discriminados da forma seguinte (cfr. artigo 151º da petição inicial): € 2.500,00 relativo à sua quota no capital social; € 8.800,00 relativo aos bens de que o A. era proprietário exclusivo; € 1.787,50 correspondente a metade dos pagamentos que efetuou por conta da dívida da sociedade ao BPI (num total de € 3.575,00); € 22.390,42, correspondente a metade do contrato de crédito celebrado com o Banco Popular (num total de € 44.780,85); € 9.846,30, correspondente a metade dos valores pagos como avalista no contrato com o Banco Popular (num total de € 19.692,60); € 40.269,17, respeitante a metade do valor das faturas de compra de equipamentos (num total de € 80.538,35). Fixa em € 2.500,00 os danos não patrimoniais, pela frustração das expectativas criadas com a sociedade constituída e pelo sofrimento decorrente da conduta ilícita do R..
Contestou o R., arguindo, nomeadamente, a exceção do caso julgado e da litispendência, e impugnando a factualidade alegada. Conclui pela procedência das exceções ou, se assim não se entender, pela improcedência da causa, pedindo, em reconvenção, a condenação do A. a pagar-lhe as quantias de € 80.269,18, de € 1.380,00 e de € 10.000,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidas de juros à taxa legal desde a citação.
O A. apresentou réplica, pedindo a improcedência da reconvenção e a condenação do R. como litigante de má-fé, em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.
Por despacho de fls. 405, considerou o Tribunal como não escritos os artigos 4º a 37ª da réplica, justificando que o A. não podia responder naquele articulado às exceções deduzidas na contestação, mas apenas defender-se quanto à matéria da reconvenção.
Realizou-se audiência prévia e, em 17.10.2018, foi proferido despacho saneador que fixou à causa o valor de € 179.788,80, correspondendo € 88.139,62 aos pedidos deduzidos pelo A. e € 91.649,18 à reconvenção, julgou improcedentes as exceções do caso julgado e da litispendência e não admitiu a reconvenção. Mais se conheceu do mérito, decidindo-se pela improcedência da causa e absolvendo-se o R. dos pedidos formulados.
Interposto recurso pelo A. foi, por Acordão desta Relação de 18.6.2019, determinada a revogação da sentença recorrida, ordenando-se o prosseguimento dos autos para apreciação de mérito.
Por despacho de 24.1.2020, procedeu-se à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova, relegando-se para final o conhecimento da matéria de exceção de prescrição do direito de regresso invocado pelo A..
Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, em 20.7.2020, que decidiu da seguinte forma: “(...) Termos em que:
a) se julga a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência condena-se o R. B a pagar ao A. A a quantia de € 2.000,00 acrescida de juros de mora á taxa legal de 4% desde 10/04/2017 até á presente data e dos juros de mora calculados à taxa que vigorar desde a presente data até integral pagamento, absolvendo-o de tudo o mais peticionado;
b) se julga improcedente por não provada a litigância de má fé do R. e em consequência absolve-se o mesmo do pedido de indemnização formulado neste âmbito pelo A.
Custas por A. e R. na proporção do decaimento que desde já se fixam em 98% para o A. e 2% para o R.(…).”
De novo inconformado, interpôs recurso o A., culminando as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem:

1. Verifica-se, com o devido respeito e salvo melhor opinião, na douta Sentença/Apelada, uma incorreta apreciação da matéria de facto e a incorreta subsunção da mesma ao direito, com a violação do disposto nos artigos 78º e 79º do Código das Sociedades Comerciais.
2. Na douta Sentença /Apelada, entre o mais, ficou provado que:
a) A 2 de Fevereiro de 2013 o Reu impediu o Autor de permanecer no restaurante e declarou que a partir daquela data o restaurante seria explorado unicamente por ele e que não permitiria que o Autor ali voltasse a entrar, prescindindo da sua colaboração na gestão e administração da sociedade.
b) O Autor deixou de exercer a gerência da sociedade.
c) Tendo, a mesma, passado a ser exercida exclusivamente pelo Reu
d) A partir de data não concretamente apurada de 2014 o Reu passou a explorar o restaurante conjuntamente com outras pessoas, desconhecendo-se a concreta natureza da relação estabelecida.
e) Desde 2 de Fevereiro até ao seu encerramento o restaurante continuou em atividade e a receber o preço dos serviços prestados.
f) Em data não concretamente apurada de 2015, mas posteriormente ao corte da água e da eletricidade, com conhecimento e autorização do Reu, o restaurante foi esvaziado de todo o seu conteúdo, de natureza não concretamente apurada.
g) E, em consequência, a sociedade T. da Armada, Lda, ficou impedida de prosseguir aquela atividade.
3. O Meritíssimo Juiz a quo, não atendeu ao facto de o Autor/Apelante ter em vista os danos causados diretamente pelo Reu/Apelado de forma delituosa ou em violação duma obrigação na esfera jurídica do Autor sem interferência da sociedade, bem como os danos decorrentes da violação das disposições legais relativas à conservação do património social, ao abrigo do disposto nos artigos 79º e 78º do Código das Sociedades Comerciais e julgou, conforme se pode ler relativamente a cada um dos pedidos formulados, a improcedência da ação, ressalvado o direito à indemnização do Autor/Apelante por danos morais.
4. Da factualidade que ficou provada é forçoso concluir que o Reu/Apelado extrapolou dolosamente todas as regras pertinentes aos deveres fundamentais dos gerentes ou administradores - duty of care e duty of loyalty - e à preservação do património social, resultando na perda total da quota social do Autor/Apelante.
5. Não resultou do processo, facto que contrariasse a realidade trazida aos autos pelo Autor/Apelante, designadamente aquela que resulta do conteúdo do documento nº 99 junto com a petição inicial, que corresponde a um edital das finanças de venda judicial por proposta em carta fechada de determinados bens penhorados no local que veio a constituir a sede da sociedade, tendo ficado o Autor/Apelante fiel depositário dos mesmos enquanto proprietário do local, que dos mesmos nunca os retirou e que serviram os propósitos do Reu até que entendeu levá-los, incumbindo ao Autor/Apelante apresenta-los ao serviço de finanças quando interpelado para o efeito
6. Provado ficou que, os pagamentos efetuados pelo Autor/Apelante ocorreram face ao incumprimento da sociedade, única e exclusivamente por efeito de um comportamento omissivo e ilícito do Reu/Apelado
7. O Autor/Apelante ao longo do processo nos diversos articulados apresentados, estrutura substantivamente a sua ação no estatuído nos artigos 64º, 78° e 79º do Código das Sociedades Comerciais, e em sede de recurso de apelação do despacho saneador proferido, entendeu existir uma incorreta subsunção da matéria de facto ao direito com violação do disposto nos mesmos artigos 78º e 79º do Código das Sociedades Comerciais.
8. Porem, veio a douta Sentença ora apelada, conforme se transcreve afirmar que:
"O art.° 78º respeita á responsabilidade dos gerentes ou administradores para com os credores da sociedade. O A. não intenta a presente acção como credor social, mas como sócio, pelo que podemos também afastar a relevância deste preceito para a decisão da causa."
9. Perante toda a factualidade invocada forçosamente se impunha concluir de que, face à prova produzida, constante da douta Sentença/Apelada, as irregularidades da gestão do Reu/Apelado foram determinantes para a situação de inviabilidade económica e falência a que a sociedade chegou,
10. Resulta do senso comum, atentos os comportamentos provados, que a descrita conduta ilícita do Reu/Apelado praticada com dolo, não é imune a críticas graves e não pode, com bom senso e justa visão das coisas, de acordo com as máximas da vida, passar em branco, como se nenhum peso tivesse para o desfecho final dos investimentos do Autor/Apelante e para a sorte da sociedade constituída entre eles.
11. Os pressupostos da obrigação de indemnizar não diferem consoante se esteja perante uma responsabilidade contratual ou extracontratual, residindo a distinção no que toca à prova da culpa.
12. Em qualquer das modalidades, para que o facto ilícito seja gerador de responsabilidade civil é necessário que o agente tenha assumido uma conduta culposa, que seja merecedora de reprovação ou censura em face do direito constituído. Como sucederá, em termos gerais, se o agente, na situação concreta, podia e devia ter agido de modo a não cometer o ilícito e não o fez.
13. O princípio geral que rege a matéria da responsabilidade civil extracontratual encontra-se estabelecido no artigo 483º do Código Civil segundo o qual "aquele que com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação".
14. Existe uma ação, ou seja, um facto positivo — apropriação ou destruição de coisa alheia —que importa a violação de um dever geral de abstenção, do dever de não ingerência na esfera de ação do titular do direito absoluto; mas pode também traduzir-se num facto negativo, numa abstenção, numa omissão, entendendo-se que a omissão é causa do dano, sempre que haja o dever jurídico de praticar um ato que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano.
15. Agir com culpa significa, atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito, sendo que a conduta do lesante é reprovável, quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo.
16. Estabelece o artigo 563° do Código Civil, que o autor do facto só será obrigado a reparar aqueles danos que não se teriam verificado sem esse facto e que abstraindo deste, seria de prever que não se tivessem produzido, não se excluindo aqui a ideia da causalidade indireta que se dá quando o facto não produz ele mesmo o dano mas desencadeia ou proporciona um outro, que leva á verificação deste.
17. E por fim tem que haver um nexo causal entre o facto e o dano, ou seja, um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima, de modo a poder afirmar-se, à luz do direito, que o dano é resultante da violação, pois só quanto a esse a lei manda indemnizar o lesado - cfr. A. Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 4ª ed., 1982, 445 e segs.
18. Porque os factos ocorrem num âmbito societário - de gestão societária - quanto à vertente e modelo de responsabilidade contratual surge à colação o estipulado no artigo 64º Código das Sociedade Comerciais: Os gerentes (...) da sociedade devem observar: a) Deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da atividade da sociedade adequadas às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado; b) Deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores.
19. É aqui consagrado, como obrigação típica dos gerentes, o dever de diligência, diligência apreciada não em função do comportamento normal do próprio gerente (culpa em concreto), mas face a um padrão objetivo, padrão esse não subsumível ao do bonnus pater famílias ou familiae mas sim a de um gestor dotado de certas qualidades.
20. Apesar do legislador ter colocado o dever de diligência em plano igual aos demais deveres, deverá entender-se que a diligência exigida neste artigo é um critério vinculativo para a apreciação da conduta do gerente no cumprimento de todos os seus deveres.
21. Concretizando-se tal dever de diligência na fórmula de um gestor criterioso e ordenado, devendo a gestão prosseguir o interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e seus trabalhadores.
22. Em qualquer caso, a responsabilidade civil dos administradores tem que decorrer da  "preterição de deveres contratuais e legais", tendo que existir sempre uma  desconformidade entre a conduta do administrador, gerente, e aquela que lhe era normativamente exigível.
23. De harmonia com o disposto no nº 1 do artigo 78º do Código das Sociedades Comerciais, os gerentes ou administradores respondem para com os credores da sociedade quando, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à proteção destes, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos respetivos créditos.
24. Também o artigo 79º, nº 1, estatui que os gerentes ou administradores respondem, também, nos termos gerais, para com os sócios e terceiros, pelos danos que diretamente lhes causarem no exercício das suas funções.
25. Estas modalidades de responsabilidade civil são de natureza extracontratual, e situam-se: - a primeira – 78º do Código das Sociedades Comerciais - no quadro da chamada responsabilidade pela violação de normas de proteção, prevista no artigo 483°, no 1  do Código Civil, sendo as normas de proteção relevantes aquelas que protegem a função de garantia do capital social para os credores sociais. (...). A responsabilidade direta dos administradores só surge quando a inobservância culposa das normas de proteção provoque uma insuficiência patrimonial. (...). Já na segunda - do artigo 79º, no 1 do Código das Sociedades Comerciais, - está em causa, portanto, a violação culposa (com dolo ou mera culpa) de direitos subjetivos absolutos ou de normas de proteção.
26. O artigo 79º, no 1 do Código das Sociedades Comerciais procede, contudo, a uma delimitação especial da responsabilidade civil dos gerentes, nos termos da qual, esta cobre apenas os danos diretamente causados ao terceiro.
27. A responsabilidade é direta quando os danos resultem do facto ilícito, sem nenhuma intervenção de quaisquer outros eventos, o que redunda, em termos valorativos, numa restrição desta responsabilidade, como defende Menezes Cordeiro, aos casos de «práticas dolosas dirigidas à consecução do prejuízo verificado»; ou de «práticas negligentes grosseiras, cujo resultado seja, inelutavelmente, a verificação do dano em causa.».
28. Ao dever de lealdade costuma ser associado a obrigação de não concorrência, de não se aproveitar em benefício próprio eventuais oportunidades de negócio, de não atuação em conflito de interesses com a sociedade protegida, violando manifestamente deveres de cuidado e de lealdade o gerente que, procede à integral dissipação da património social desta que teve por consequência a cessação de toda a atividade.
29. Tal conduta adotada pelo ora Reu/Apelado é altamente censurável já que a realização do interesse social da sociedade impunha, a satisfação de todos os seus débitos (e não a sua escolha pelo Reu/Apelado) bem como a manutenção da sua laboração.
30. O Autor/Apelante estruturou a sua ação com base na responsabilização efetiva do Reu/Apelado, enquanto gerente da sociedade, durante um determinado período, causando-lhe prejuízos, decorrentes do modo negligente, culposo e ruinoso como geriu a sociedade, delapidando, destruindo e apropriando-se de todo o património da sociedade, após o que abandonou o restaurante, entregando ao sócio um imóvel cuja propriedade lhe pertencia em exclusivo, que também era a sede da sociedade, mas esta já sem possibilidade de prosseguir a sua atividade - (resultado da atuação dolosa e ilícita do Reu).
31. As atribuições do órgão da administração de uma sociedade assumem, como é óbvio, papel fundamental para a vida social: é a este órgão que cabe, verdadeiramente, a condução dos negócios sociais, a prática corrente dos atos destinados a dinamizar e prosseguir o escopo da sociedade.
32. Daí que a lei enfatize, como dever central e nuclear dos membros dos órgãos de administração e representação, o de "actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores» (artigo 64º Código das Sociedades Comerciais).
33. E é também em consonância com o relevo e implicações deste dever de diligência dos gerentes, bem como dos deveres resultantes para eles dos artigos 6º, nº 4, 254º, 398º e 428º, entre outros, que eles estão sujeitos a responsabilidade civil (artigo 71º a 73º, 78º e 79º) e criminal (artigo 509º e seguintes) pelos atos que pratiquem ou omissões em que incorram no exercício das suas funções e que infrinjam tais deveres.
34. Assim e porque o Autor/Apelante intentou a presente ação como sócio e como credor social, ao abrigo das disposições amplamente invocadas ao longo do processo, ou seja os artigos 78º e 79 do Código das Sociedades Comerciais, não se compreende porque entendeu o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, não considerar julgar os pedidos também por via da aplicação do artigo 78º do Código das Sociedades Comerciais.
35. A determinação do modelo normativo da responsabilidade é uma questão de qualificação jurídica e, portanto, matéria de direito, de conhecimento oficioso, a cuja indagação, interpretação e aplicação o juiz não está sujeito às respetivas alegações das partes, por força do preceituado pelo artigo 5º, nº 3, do Código do Processo Civil.
36. Há responsabilidade civil contratual do Reu/Apelado perante a sociedade, na sua condição de gerente e ocorre responsabilidade civil extracontratual ou delitual, por violação ilícita e culposa de direito subjetivos ou de normas de proteção, cujas lesões se situam, para além desse contrato, decorrente de facto ilícito, nesta medida extracontratual, já que os danos se não situam, no âmbito ou perímetro do contrato com a sociedade, estando para além do interesse do cumprimento dos seus deveres para com a sociedade, pelo que se deveria entender que os mesmos factos humanos - atuação ilícita do Reu/Apelado - provocaram um dano simultaneamente contratual e extracontratual.
37. Nos presentes autos os mesmos factos perpetrados pelo Reu/Apelado produziram dois danos, envolvendo um deles responsabilidade contratual, em relação à sociedade, e o outro, responsabilidade extracontratual, em relação ao Autor/Apelante, ocorrendo um concurso real de responsabilidade contratual e de responsabilidade extracontratual.
38. Em qualquer caso, a responsabilidade civil dos administradores terá que decorrer da preterição de deveres contratuais e/ou legais, tendo que existir sempre uma desconformidade entre a conduta do administrador e aquela que lhe era normativamente exigível.
39. A partir do momento em que a sociedade apenas tem a sua sede e não desenvolve qualquer atividade, nem tem aptidão para o efeito, em face das alienações efetuadas pelo Reu/Apelado, há integral dissipação do património social, o que traduz uma evidente inobservância do dever de atuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade.
40. Os riscos inerentes a qualquer atividade económica estão condicionados ou limitados pelo quadro de obrigações que devem nortear a atuação do gerente, mas no caso concreto é por demais evidente de que, não se coloca em crise uma determinada decisão do Réu/Apelado ou uma alienação de determinado bem corpóreo, ocorreu a total alienação do património societário.
41. A realização do interesse social que deverá presidir à atuação do gerente terá que se conjugar com a satisfação dos interesses dos demais sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os sócios, clientes, credores e trabalhadores, o que manifestamente não ocorreu,
42. O Reu/Apelado inviabilizou a execução do objeto social, lesando não só a sociedade, mas também, diretamente, o próprio sócio, Autor/Apelante, que perante os atos ilícitos praticados pelo Reu, viu, do dia para a noite, todo o investimento ser reduzido a poeira.
43. Por uma questão de JUSTIÇA concreta - de forma a que a posição jurídica do Autor/Apelante não fique sem qualquer proteção jurídica e, por outro lado, para que as condutas ilícitas e abusivas do Reu/Apelado não permaneçam impunes o que seria contrário e chocaria a mais grosseira sensibilidade ético-jurídica, impõe-se a reforma do douto sentença recorrida, mormente através do reconhecimento de que se encontram verificados todos os requisitos previstos no artigo 78 e 79º, n.º 1 do Código das Sociedade Comerciais, face ao dolo manifesto das condutas praticadas pelo Reu/Apelado.
44. Sendo a conduta do réu ilícita, porque ética e juridicamente censurável, faz impender sobre o seu património próprio a responsabilidade pelos danos derivados da sua atuação que foram causados no património do Autor/Apelante (artigo 563° do Código Civil).
45. Na verdade, todo o comportamento do Reu/Apelado se revela censurável por frontalmente violador dos deveres de cuidado e de lealdade que sobre si recaíam, foi gerador de prejuízo para o património da sociedade, mas e sobretudo porque são os que são peticionados, gerador de prejuízos à Autor/Apelante enquanto sócio e simultaneamente enquanto credor da sociedade.
46. É justamente a caracterização do dolo da conduta lesiva do Reu/Apelado que, segundo a Doutrina, permite o reconhecimento do preenchimento do requisito da verificação de dano direto sofrido pelo Autor/Apelante.
47. Há uma tese interpretativa do conceito de dano diretamente causado que sustenta que o administrador responde para com sócios ou terceiros apenas por condutas dolosas ou comportamentos especialmente reprováveis.
48. O Reu/Apelado não pode ficar impune, provada a pratica dos atos lesivos, devendo ser levado em consideração que a Doutrina, diante da configuração flagrante do dolo dos agentes, tem admitido a configuração do dano direto, para os efeitos de preenchimento do requisito exigido pelo artigo 79, nº 1 do Código das Sociedades Comerciai, principalmente quando provado que as condutas lesivas e de dissipação dos valores sociais se deu em benefício próprio dos Réus.
49. Tal prova, relativa ao benefício do Reu/Apelado, entendeu o Meritíssimo Juiz quo não terá existido, mas pergunta-se, com o devido respeito, que outra conclusão há a retirar, aplicando as regras da experiencia comum, de todo os factos provados relativos ao comportamento ilícito do Reu/Apelado.
50. Carneiro da Frada, menciona a imposição de um nexo "direto" entre a conduta e o dano, ou seja, que o prejuízo causado aos sócios ou terceiros não seja meramente reflexo do dano sofrido pela sociedade e na justificação do artigo 79º do Código das Sociedades Comerciais o autor garante que se existiu dolo de lesão o pressuposto da causação direta de danos está verificado.
51. O Autor/Apelante invocou danos diretos, ou seja, invocou danos causados diretamente pelo Reu/Apelado, assentes em responsabilidade delitual comum, que ocorreram em termos que não são interferidos pela presença da sociedade — designadamente, todos os comportamentos ilícitos desenvolvidos pessoalmente pelo Reu/Apelado à margem da sociedade, supra mencionados e associados à recusa ilícita de deixar participar o Autor/Apelante na vida da sociedade, atuando com terceiros sem prévio conhecimento daquele, omitindo-lhe informação sobre a sociedade, causando-lhe evidentes prejuízos, num claro abuso de direito, sendo irrelevante para a produção de tais danos, ainda que invocada, a representação da sociedade.
52. Os atos de gestão, que o Autor/Apelante alegou consistiram num comportamento delitual do Réu/Apelado, tendo em conta o circunstancialismo que rodeou tal comportamento, designadamente tendo tido tais atos um propósito que não atendeu aos interesses da sociedade, sem contrapartida financeira para a sociedade, devendo por isso considerar-se realizados não no interesse da sociedade, mas sim no interesse daquele que então impos o seu poder exclusivo de gestão e que afastou o outro sócio, levando para o seio do negócio pessoas estranhas ao mesmo.
53. Nesta medida, o Reu/Apelado teve em conta, apenas, o seu interesse e daqueles que com ele passaram a usufruir as instalações e a explorar uma atividade económica, não o negócio da sociedade, mas outro que passaram a desenvolver naquele local, apenas retirando uma utilidade económica do imóvel que pertencia ao Autor/Apelante, legitimo proprietário das instalações da sede da sociedade, deixando de fora da exploração que foi fazendo com outros, a sociedade e o outro sócio.
54. Admitindo sem conceder que tal exploração com terceiros, constituiu um ato diretamente lesivo do património da sociedade e só indiretamente podendo considerar-se prejudicial para o Autor/Apelante enquanto sócio, pela eventual diminuição do valor sua participação social, no entanto, o Autor/Apelante alega um prejuízo decorrente do facto de ser o proprietário das lojas, onde estava e continuou sediada a sociedade e que o Reu/Apelado insistia em não entregar livre de pessoas e bens, tendo permanecido no local contra a vontade do seu legitimo dono, passando a servir refeições no local, em seu único proveito e à margem da sociedade, para a qual não revertiam os benefícios daquela atividade económica, que passou a desenvolver-se naquele local com terceiros, estranhos ao Autor/Apelante.
55. O Autor/Apelante invocou factos de onde decorre o seu prejuízo, proveniente do incumprimento do Réu/Apelado da obrigação que sobre si recaía no âmbito da gestão que lhe estava cometida, enquanto gerente de facto e também pela pratica de factos ilícitos que, como é manifesto, não resultaram da vontade da sociedade mas apenas de uma conduta levada a cabo à margem da sociedade e por iniciativa exclusiva do Reu.
56. O pagamento das responsabilidades bancárias pelo Autor/Apelante não teria ocorrido, se o Réu/Apelado não decidisse, conforme fez, que a sociedade não cumpriria, ciente de que tal omissão, levaria o Autor/Apelante a pagar de imediato, conforme ocorreu, querendo evitar que o seu bom nome junto da banca fosse afetado e comprometido na suas relações futuras.
57. De facto, as diversas condutas ilícitas do Reu/Apelado tiveram como consequência a impossibilidade da sociedade honrar os seus compromissos, mas daí não decorre (bem pelo contrário) que a mesma sofreu um dano pelo não pagamento das quantias que o Autor/Apelante, face à omissão do Reu/Apelado se viu obrigado a assumir, uma vez que, nesta questão, foi o Autor/Apelante que, exclusivamente pagou em razão da conduta dolosa do Reu/Apelado.
58. Com o não pagamento das quantias peticionadas, a sociedade não sofreu diretamente nenhum prejuízo, bem pelo contrário, apenas um benefício, na medida em que deixou de ter de desembolsar os valores correspondentes, no âmbito das suas responsabilidades bancárias.
59. Não acolhendo a douta Sentença/Apelada o entendimento de que as indemnizações peticionadas pelo Autor/Apelante não se fundam juridicamente no disposto no artigo 79° Código das Sociedades Comerciais (scilicet, na verificação de um dano diretamente causado ao ora recorrente), mas na subsunção das situações fácticas à hipótese legal do artigo 78°, n° 1 do Código das Sociedades Comerciais - sem prejuízo de também ao abrigo desta norma, ter o Autor/Apelante demandado o Reu/Apelado- então sempre haveria que verificar a subsunção ao caso dos autos, o que o Meritíssimo Juiz a quo impediu, não obstante resultar dos factos alegados: (a) o facto ilícito (comportamento violador de normas legais, e.g., de disposições legais relativas à conservação do património social e destinadas à proteção dos credores sociais, nos quais se inclui o próprio Autor/Apelante, que ficou provado); (b) culpa (o dolo do Reu que ficou provado); (c) nexo de causalidade e dano (requisitos que igualmente se verificam, atenta a insuficiência do património social para satisfação dos créditos, apos o Reu/Apelado ter esvaziado a sociedade de todos os seus elementos, como ficou provado);
60. Ainda que se considere a existência de danos reflexos, a respetiva indemnização decorrente do ressarcimento dos valores pagos em substituição da sociedade nas responsabilidades assumidas com o garante dos sócios, sempre seriam devidos ao Autor/Apelante, porque devidamente configurada, também, a hipótese prevista no artigo 78º, no 1 do Código das Sociedades Comerciais.
61. Pelo facto de no caso em questão, também se verificar o preenchimento de todos os requisitos exigidos pelo artigo 78°, n° 1 do Código das Sociedade Comerciais, impõe-se a reforma da Sentença para também condenar o Reu/Apelado, com fundamento quer no artigo 79º, quer no artigo 78°, ambos do Código das Sociedades Comerciais — porque em relação a ambas as disposições, estão preenchidos os requisitos legais exigidos - ao pagamento de pelo menos parte das indemnizações peticionadas, como seja a perda da quota social, as quantias pagas no âmbito das responsabilidades bancárias da sociedade, a indemnização por danos morais em quantia peticionada.
62. Em decorrência das condutas ilícitas e dolosas do Reu/Apelado que "administrava" a sociedade, somadas ao reconhecido estado de delapidação patrimonial total e de inatividade da sociedade, o Reu/Apelado também se tornou pessoalmente responsável perante os credores sociais, incluindo-se nesse rol, o Autor/Apelante, tendo liquidado as responsabilidades bancárias do BPI e do Banco Popular e, portanto constituindo-se credor da sociedade.
63. As indemnizações reclamadas pelo Autor/Apelante, a não serem consideradas estarem fundadas na verificação de um dano diretamente causado pelo Réu/Apelado, sempre poderiam ficar contempladas na subsunção da situação fáctica na hipótese legal do artigo 78º, nº 1 do Código das Sociedades Comercial, na medida em que se verifica: ato ilícito (violação às disposições legais relativas à conservação do património social), culpa (face ao dolo do Reu/Apelado), nexo de causalidade, e dano (atenta a insuficiência do património social para satisfação dos créditos e pagamento do Autor/Apelante por dívidas da sociedade).
64. Não tendo, no âmbito da decisão do Meritíssimo Juiz a quo, prevalecido o entendimento para o enquadramento da situação fáctica no artigo 79º, no 1 do Código das Sociedades Comerciais), a verdade é que o dano sofrido pelo Autor/Apelante - se for considerado como sendo dano indireto ou reflexo - sempre seria ainda indemnizável, por força do disposto no artigo 78º, no 1 do Código das Sociedades Comerciais.
65. A insuficiência/inexistência de património social é o resultado da violação pelo Reu/Apelado, das normas de proteção dos credores, nos quais se inclui o Autor/Apelante.
66. Imperioso será reconhecer que não obstante a posição jurídica seguida na douta decisão sob censura, o Autor/Apelante sempre terá o direito à indemnização dos valores que desembolsou, na qualidade de credor da sociedade, a título de pagamento de empréstimos que não foram honrados, pela sociedade em razão de atos praticados ilícita e dolosamente pelo Reu/Apelado, pelo que deverá a decisão ser alterada em conformidade.
67. Destarte, impõe-se, a reforma da sentença recorrida, também em relação ao quantum fixado a título de indemnização pelos danos imateriais, devendo o mesmo ser elevado para o montante considerado adequado, segundo o elevado critério deste Tribunal da Relação, atentas as circunstâncias do caso concreto, mas que não deverá nunca ser inferior a € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).
68. O Autor/apelante entende que a douta Sentença ora recorrida peca por má interpretação e apreciação dos factos e deficiente aplicação do direito e como tal deverá ser substituída por outra, que aplicando corretamente os artigos 78º e 79º do Código das Sociedades Comerciais, julgue procedente os pedidos de indemnização do Autor/Apelante.”
Em contra-alegações, defende o R./apelado a manutenção do julgado, aludindo à sentença proferida no Proc. 2159/13.8TVLSB, que correu termos no Juízo Central Cível de Lisboa, Juiz 7, opondo o A. e o R..
O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*
II- Fundamentos de Facto:
A sentença fixou como provada, sob o ponto 3, a seguinte factualidade:
Factos considerados provados, no despacho saneador, por documento ou por acordo:
1.1. A 19 de Abril de 2011 A e B subscreveram o instrumento junto por cópia a fls. 36-39, denominado "Contrato de sociedade por quotas", cujo integral teor se dá aqui por reproduzido, em que declararam constituir uma sociedade com a firma "….da Armada, Lda", NIPC 509844073 e sede na Praça da Armada, 36/40, Lisboa, tendo por objecto a "restauração e estabelecimento de bebidas", o capital social de € 5.000,00 integralmente realizado em numerário, representado por duas quotas, cada uma de € 2.500,00, uma pertencente a A e outra a B, a sociedade obriga-se com dois gerentes, foram nomeados gerentes ambos os sócios. (A)
1.2. A sociedade foi matriculada na CRCom pela ap. 91/20110419. (B)
1.3. Pela ap. 418/20161010 foi inscrita a cessação e funções do gerente António…. (C)
1.4. Em 2011 a sociedade "T…da Armada, Lda", despendeu € 80.538,35 em equipamento e decoração do restaurante. (D).
1.5. A 01 de Março de 2012 o Banco Popular, SA e a sociedade "T….da Armada, Lda", subscreveram o instrumento junto por cópia a 100-103, denominado "Contrato de locação financeira mobiliário (Leasing") n.° 540-0699865, cujo integral teor se dá aqui por reproduzido, onde consta:
- Objecto do contrato: bem locado
1. Identificação do bem: Mobiliário
2. (...)
3. Fornecedor: Nexus — Assistência TPC — Comércio equipamentos Hoteleiros, Lda
(...)
Preço do bem locado: € 44.780,85, ao qual acresce IVA à taxa legal. (E)
1.6. No âmbito do referido acordo, a "T….da Armada, Lda", obrigou-se ao pagamento de 60 rendas, sendo a primeira no valor de € 31.236,98 (incluindo IVA) e as restantes no valor, cada uma, de € 486,98, com vencimento a primeira no dia 22.02.2012 e as restantes no dia 22 de cada um dos meses subsequentes. (F)
1.7. Como garantia do pagamento das responsabilidades decorrentes do contrato de locação financeira o Banco Popular emitiu e a "T….da Armada, Lda" subscreveu a livrança em branco junta por cópia a fls. 41, tendo o A. e o R. aposto no respectivo verso a sua assinatura a seguir aos dizeres: "Bom por aval à firma subscritora". (G)
1.8. A referida livrança foi entregue ao Banco Popular, SA autorizando-o a preenchê-la em caso de incumprimento, apondo-lhe a data de vencimento e o valor que estivesse em dívida à data do seu preenchimento. (H)
1.9. O "mobiliário" objecto do contrato de locação financeira foi integrado no restaurante. (I)
1.10. Aquando da constituição da sociedade, a "T…. da Armada, Lda" abriu uma conta bancária, junto do Banco Popular, com o n.° 0046-…, destinada à movimentação dos dinheiros resultantes da atividade comercial que a mesma se propunha desenvolver.(J)
1.11. A "T….. da Armada, Lda", abriu uma conta bancaria no Banco BPI com o n.° 8-4639870-000-001, destinada à movimentação bancária dos dinheiros resultantes da atividade. (K)
1.12. A sociedade contraiu um mútuo junto do Banco BPI. (L)
1.13. Para pagamento do referido mútuo o A. efectuou quatro (4) depósitos em numerário na conta do BPI, o primeiro a 29/04/2014 e o ultimo a 18/08/2014, tendo entregue € 3.575,00, o que fez com recurso ao seu património pessoal.
Da instrução da causa resultou provado que:
2.1. A 02 de Fevereiro de 2013 o R. impediu o A. de permanecer no restaurante e declarou que a partir daquela data o restaurante seria explorado unicamente por ele e que não permitiria que o A. ali voltasse a entrar, prescindindo da sua colaboração na gestão e administração da sociedade.
2.2. O A. deixou de exercer a gerência da sociedade.
2.3. Tendo, a mesma, passado a ser exercida exclusivamente pelo R.
2.4. A "T…. da Armada, Lda", deixou de pagar as rendas do contrato de locação financeira.
2.5. O Banco Popular enviou ao A., que a recebeu, a carta junta por cópia a fls. 73, datada de 16/12/2015, com o seguinte teor:
"Tendo como referência o Contrato de Locação Financeira Mobiliária, em epigrafe identificado, celebrado em 29 de Fevereiro de 2012, pelo montante de € 44.780,85, entre T…..da Armada, Lda e esta instituição de crédito em que V.Exa(s) interveio como avalista, vimos interpela-lo nessa qualidade, no sentido de proceder(em) ao pagamento das rendas vencidas desde 29/09/2015 a 29/11/2015, acrescidas dos respectivos juros de mora (...) sob pena de não o fazendo no prazo de 10 dias contados da data aposta na presente comunicação, conforme direito que contratualmente nos assiste, consideramos imediatamente vencidas e exigíveis todas as obrigações emergentes daquele contrato e procedermos á sua resolução"
2.6. O A. pagou, a título de rendas vencidas e não pagas pela sociedade:
- a 22 de outubro de 2013, a quantia de € 200,00;
- a 10 de dezembro de 2013, por meio de cheque, € 1.110,00;
- a 31 de janeiro de 2014, por meio de cheque, € 500,00;
- a 3 de março de 2014, por meio de cheque, € 520,00;
- a 12 de março de 2014, por meio de cheque, € 80,00;
- a 1 de abril de 2014, por meio de cheque, € 525,00;
- a 28 de abril de 2014, por meio de cheque, € 525,00;
- a 28 de maio de 2014, por meio de cheque, € 515,00;
- a 16 de julho de 2014, por meio de cheque, € 650,00;
- a 5 de agosto de 2014, por meio de cheque, € 500,00;
- a 15 de setembro de 2014, por meio de cheque, € 620,00;
- a 30 de outubro de 2014, por meio de cheque, € 490,00;
- a 11 de dezembro de 2014, por meio de cheque, € 570,00;
- a 14 de janeiro de 2015, por meio de cheque, € 585,00;
- a 9 de fevereiro de 2015, por meio de cheque, € 560,00;
- a 11 de março de 2015, por meio de cheque, € 560,00;
- a 8 de abril de 2015, € 585,00;
- a 18 de maio de 2015, por meio de cheque, € 500,00;
- a 6 de julho de 2015, por meio de cheque, € 540,00;
- a 20 de agosto de 2015, por meio de cheque, € 550,00;
- a 4 de setembro de 2015, por meio de cheque, € 490,00;
- a 30 de setembro de 2015, por meio de cheque, € 620,00;
- a 18 de janeiro de 2016, por débito em conta, € 301,67;
- a 18 de janeiro de 2016, por débito em conta, € 496,51;
- a 18 de janeiro de 2016, por débito em conta, € 492,86;
- a 18 de janeiro de 2016, por débito em conta, € 489,32;
- a 1 de fevereiro de 2016, por crédito em conta, € 424,04;
- a 1 de fevereiro de 2016, por débito em conta, € 489,15;
- a 1 de fevereiro de 2016, por crédito em conta, € 65,11;
- a 2 de março de 2016, por crédito em conta, € 489,04;
- a 31 de março de 2016, por crédito em conta, € 489,04;
- a 4 de maio de 2016, por crédito em conta, € 489,39;
- a 2 de junho de 2016, por crédito em conta, € 489,27;
- a 4 de julho de 2016, por crédito em conta, € 489,39;
- a 4 de agosto de 2016, por crédito em conta, € 36,05 ;
- a 3 de agosto de 2016, por crédito em conta, € 489,27;
- a 31 de agosto de 2016, por crédito em conta, € 489,04;
- a 29 de setembro de 2016, por crédito em conta, € 540,41;
- a 31 de outubro de 2016, por crédito em conta, € 517,15;
- a 29 de novembro de 2016, por crédito em conta, € 516,61;
- a 29 de dezembro de 2016, por crédito em conta, € 488,80.
- a 30 de janeiro de 2017, por crédito em conta, € 488,80.
2.7. A 13.03.2017. o Banco Popular endereçou à T… da Armada a Declaração" junta a fls. 97 com o seguinte teor:
" Para os devidos efeitos, o Banco popular Portugal, SA (...) na qualidade de locador, vem declarar que o Contrato de Locação Financeira n.° 0046 …, associado a " Equipamento de Hotelaria" encontra-se, na presente data, liquidado."
2.8. A partir de data não concretamente apurada de 2014 o R. passou a explorar o restaurante conjuntamente com outras pessoas, desconhecendo-se a concreta natureza da relação estabelecida.
2.9. Desde 02 de Fevereiro até ao seu encerramento o restaurante continuou em actividade e a receber o preço dos serviços prestados.
2.10. Em data não concretamente apurada de 2015, mas posteriormente ao corte da água e da electricidade, com conhecimento e autorização do R., o restaurante foi esvaziado de todo o seu conteúdo, de natureza não concretamente apurada.
2.11. E, em consequência, a sociedade T….da Armada, Lda, ficou impedida de prosseguir aquela actividade.
2.12. A actuação do R. referida em (3.)2.1., com as consequências referidas nos pontos (3.)2.2. e (3.)2.3. e a actuação do R. referida em (3.)2.10. causou ao A. frustração, agitação e nervosismo,
2.13. O A. pediu fosse cortada a água e a electricidade das lojas ocupadas pelo restaurante "T…..da Armada".
2.14. A água e electricidade foram cortadas em datas não concretamente apuradas de 2015, mas antes do encerramento do restaurante.
2.15. Em virtude do corte da água o restaurante ficou impossibilitado de funcionar e determinou o seu encerramento.
*
III- Fundamentos de Direito:
São as conclusões que delimitam o objeto do recurso (art. 635, nº 4, do C.P.C.). Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso.
Compulsadas as conclusões da apelação, verificamos que cumpre apreciar:
- da (eventual) impugnação da matéria de facto;
- da subsunção jurídica: do direito do A. aos valores peticionados ao abrigo do disposto nos arts. 78 e 79 do C.S.C.; do valor arbitrado a título de danos não patrimoniais.
A) Da (eventual) impugnação da matéria de facto:
Diz o A. apelante que se faz na sentença “uma incorreta apreciação da matéria de facto e a incorreta subsunção da mesma ao direito” (conclusão 1ª do recurso), embora nunca refira que pretende impugnar a matéria de facto, não obstante o que consta, designadamente, das conclusões 5ª e 9ª.
Cumpre deixar claro, antes de mais, que o apelante não impugna validamente a matéria de facto.
Com efeito, a impugnação da decisão relativa à matéria de facto obedece a determinadas exigências, que surgem mais precisas no âmbito do C.P.C. de 2013 por referência ao Código revogado, e cuja observância não pode deixar de ser apreciada à luz de um critério de rigor([1]).
Assim, de acordo com o atual art. 640, nº 1, do C.P.C.: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios, incumbe, por outro lado, ao recorrente “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (art. 640, nº 2, al. a)).
Finalmente, tais regras terão de compaginar-se com aquela outra já indicada de que as conclusões delimitam o âmbito do recurso (art. 635, nº 4).
Por conseguinte e resumindo, ao recorrente que impugne a matéria de facto caberá indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (aos quais deve aludir na motivação do recurso e sintetizar nas conclusões), especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que, em seu entender, impunham decisão diversa quanto a cada um desses factos e propor, ainda, a decisão alternativa sobre cada um deles. A não observância de tais regras implicará a rejeição imediata do recurso.
É evidente que o recorrente não cumpre minimamente as indicadas exigências legais.
Na verdade, o apelante não alude a quaisquer pontos da matéria julgada assente que pretenda impugnar, não propondo, quanto a cada um deles, a correspondente resposta alternativa, tal como não especifica os meios probatórios que justificariam, uma a uma, as alterações propostas.
Não identifica, assim, com a indispensável precisão e clareza, quais os concretos factos que, afinal, em seu entender, deveriam considerar-se provados ou que, tendo sido julgados provados, deveriam considerar-se não provados, não reclamando tão pouco o aditamento de novos factos ao elenco dos julgados assentes. Do mesmo modo não especifica, ainda que resumidamente, os meios probatórios que justificariam a alteração ou a decisão alternativa proposta.
A omissão verificada compromete, de forma irremediável, o eventual recurso quanto à decisão de facto, pois, como dissemos, a inobservância dos requisitos previstos no art. 640 do C.P.C. impõe logo a rejeição do recurso nessa parte, sem lugar a aperfeiçoamento.
Em suma, é de manter inalterada a factualidade fixada em 1ª instância, rejeitando-se o eventual recurso sobre a decisão da matéria de facto.
B) Da subsunção jurídica: do direito do A. aos valores peticionados ao abrigo do disposto nos arts. 78 e 79 do C.S.C.; do valor arbitrado a título de danos não patrimoniais:
Discorda o apelante da sentença na parte em que absolveu o R. do pedido, sustentando, no essencial, que o R., atenta a sua conduta comprovadamente ilícita e dolosa, devia ter sido condenado conforme requerido, face aos danos sofridos pelo A., atento o disposto nos arts. 78 e 79 do C.S.C..
O apelado defende que deve manter-se o decidido nos exatos termos.
Na sentença apreciou-se, de forma desenvolvida, cada um dos pedidos formulados, concluindo-se pela procedência parcial do pedido respeitante a danos morais sofridos e pela improcedência dos demais.
Seguiremos aqui o mesmo critério, para melhor compreender a decisão e as razões do apelante.
Vejamos.
Como acima referimos, o A. pediu a condenação do R. pagar-lhe a quantia de € 85.639,62, acrescida de juros à taxa legal desde a citação, e a quantia de € 2.500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais – pela frustração das expectativas criadas com a sociedade constituída e pelo sofrimento decorrente da conduta ilícita do R. – acrescida de juros à taxa legal desde o trânsito da sentença.
O A. inclui no montante de € 85.639,62 (cfr. artigo 151º da petição inicial, que aqui indicamos por alíneas como na sentença):
a) € 2.500,00 relativo à quota no capital social;
b) € 8.800,00 relativo aos bens de que o A. era proprietário exclusivo;
c) € 1.787,50 correspondente a metade dos pagamentos que efetuou por conta da dívida da sociedade ao BPI (num total de € 3.575,00);
d) € 22.390,42, correspondente a metade do contrato de crédito celebrado com o Banco Popular (num total de € 44.780,85);
e) € 9.846,30, correspondente a metade dos valores pagos como avalista no contrato com o Banco Popular (num total de € 19.692,60);
f) € 40.269,17, correspondente a metade das faturas respeitantes à compra de equipamentos (num total de € 80.538,35);
Estabelece, ainda, em
g) € 2.500,00 o montante dos danos não patrimoniais, pela frustração das expectativas criadas com a sociedade constituída e pelo sofrimento decorrente da conduta ilícita do R..
- Quanto à quantia de € 9.846,30 referida em e), diz o A. que avalizou, juntamente com o R., uma livrança em branco que a sociedade T…. da Armada, Lda, de que são ambos sócios, subscreveu, no âmbito de um contrato de locação financeira e que face ao incumprimento do referido contrato pela sociedade, o A. pagou, entre Outubro de 2013 e 30.1.2017, a quantia global de € 19.692,60 ao Banco Popular. Pede a condenação do R. no pagamento de € 9.846,30, correspondente a metade dos valores pagos como co-avalista nesse contrato e no âmbito do seu direito de regresso (arts. 146º e 151º da p.i.).
Resultou apurado que, em 1.3.2012, o Banco Popular, S.A., e a sociedade T…. da Armada, Lda, celebraram um contrato de locação financeira mobiliário (“Leasing”), sendo o preço do bem locado de € 44.780,85, acrescido de IVA à taxa legal, e obrigando-se a locatária ao pagamento de 60 rendas, sendo a primeira no valor de € 31.236,98 e as restantes no valor, cada uma, de € 486,98, com vencimento a primeira no dia 22.2.2012 e as restantes no dia 22 de cada um dos meses subsequentes. Como garantia do pagamento das responsabilidades decorrentes desse contrato, o Banco Popular emitiu e a T….da Armada, Lda, subscreveu a livrança em branco junta por cópia a fls. 41, tendo o A. e o R. aposto no respetivo verso a sua assinatura a seguir aos dizeres "Bom por aval à firma subscritora", mais ficando o Banco Popular, a quem a mesma foi entregue, autorizado a preenchê-la em caso de incumprimento, apondo-lhe a data de vencimento e o valor que estivesse em dívida à data do seu preenchimento.
Mais se apurou que tendo a referida sociedade deixado de pagar as rendas acordadas, o Banco Popular enviou ao A. a carta indicada sob o ponto 2.5., interpelando-o, na qualidade de avalista, para proceder ao pagamento em falta sob pena de “consideramos imediatamente vencidas e exigíveis todas as obrigações emergentes daquele contrato e procedermos à sua resolução”. Por fim, apurou-se que o A. pagou, a título de rendas vencidas e não pagas pela sociedade, as quantias indicadas sob o ponto 2.6. e que, em 13.3.2017, o Banco Popular remeteu à T….da Armada, Lda, a “Declaração” junta a fls. 97 com o seguinte teor: “Para os devidos efeitos, o Banco popular Portugal, SA (...) na qualidade de locador, vem declarar que o Contrato de Locação Financeira n.° 0046 …, associado a " Equipamento de Hotelaria" encontra-se, na presente data, liquidado.”
Na sentença discorreu-se sobre a questão do modo seguinte: “(…) Nos termos do disposto no art.° 75° da LULL a livrança contém um conjunto de requisitos ali identificados, nomeadamente, a promessa pura e simples de pagar uma quantia determinada, a época do pagamento, a indicação do lugar em que se deve efectuar o pagamento, a indicação da data em que e do lugar onde a livrança é passada.
A livrança junta aos autos está em branco e não foi alegado que em algum momento a mesma tenha sido preenchida.
Dispõe o art.° 76° da LULL que o escrito a que faltar algum dos requisitos indicados no artigo anterior não produzirá efeito como livrança, salvo nos casos determinados nas alíneas seguintes.
O que consta das alíneas seguintes respeita á época de pagamento, ao lugar do pagamento, ao domicilio do subscritor e ao lugar onde foi passada.
Porém, no caso, ao escrito dos autos falta muito mais do que isso e, concretamente, falta a promessa pura e simples de pagar uma quantia determinada, o que impede que o mesmo produza efeitos como livrança, ou seja, não existe enquanto titulo cambiário.
E sendo assim, impede também que o facto de o aqui A. e o R. terem aposto no verso de tal escrito os dizeres "Bom por aval á firma subscritora", produza efeitos como aval.
Destarte, o que resulta da factualidade provada é que o A. pagou, pela sociedade, rendas vencidas e não pagas, não sendo possível afirmar que o A. pagou as quantias referidas no ponto 3.2.6. como co-avalista, porque o escrito denominado livrança não chegou a produzir efeitos como tal.
A este respeito veja-se o Ac. do STJ de 30/04/2015 consultável in www.dgsi.pt/jstj que trata de uma situação semelhante á dos autos, ou seja, livranças em branco que não chegaram a ser preenchidas, dizendo-se no texto do mesmo que: " Mas, ainda que o direito de regresso entre co-avalistas não seja
regulado pelas regras do direito cambiário ( máxime pela LULL), é pressuposto necessário do seu exercício a existência e eficácia do titulo de crédito que sustenta a relação e aval ou de co-aval " o que não se verificava ás livranças em referência no acórdão por não estarem preenchidas.
E acrescenta-se no mesmo o seguinte:
"3. É admissível a subscrição ou o aval numa livrança em branco, com pacto de preenchimento, nos termos do art. 10° da LULL.
Mas como decorre do art. 76° da LULL, em conexão com o art. 75°, n° 2, na falta dos elementos essenciais como aquele que respeita ao montante titulado, a livrança não pode produzir efeitos enquanto título de natureza cambiária.
O seu posterior preenchimento relativamente aos elementos essenciais de que a lei não prescinde constitui uma condição de eficácia do título de crédito (cfr. neste sentido Pereira Delgado, LULL anot., 4a ed., págs. 63 e 66), posto que Pinto Furtado defenda que "só se considera constituída a obrigação cambiária quando o título vier a ser preenchido" (Títulos de Crédito, pág. 145).
Independentemente da qualificação do vício que se verifica quando se constate a ausência nos escritos de fls. 33 e 34 do montante que cada uma titulava e da indicação da data de emissão (quanto à data de vencimento deveria entender.se que seria pagável à vista, nos termos do art. 76° da LULL), decorre da lei com inequivocidade que os mesmos não são susceptíveis de produzir efeitos enquanto documentos que titulam livranças, o que se repercute em todas as relações cambiárias que em abstracto da mesma podem emergir, com inclusão da relação de aval ou e co-aval (neste sentido cfr. também o Ac. do STJ, de 1-7-03, Rel. Silva Salazar).
A verificação desses requisitos formais revela-se tanto mais necessária quanto é cedo que qualquer uma dessas relações cambiárias (com destaque para o aval) é pautada pela autonomia, abstracção e líteralidade, sendo a responsabilidade de cada um dos intervenientes definida unicamente em função do teor da livrança."
Sendo assim e por via do direito de regresso, a presente acção deve improceder no que diz respeito à quantia referida em e) supra e, em consequência fica prejudicada a apreciação da questão da prescrição invocada pelo R. quanto ao direito de regresso.
Mas o A. alegou e foi objecto de instrução (ponto 9 dos temas da prova) que o Banco Popular declarou sub-rogar nos direitos que lhes assistiam.
A sub-rogação está regulada nos artigos 589° a 594° do CC, sendo ainda aplicável, nos termos do disposto no art.° 594°, com as devidas adaptações, o disposto nos artigos 582° a 584° do CC.
A sub-rogação é uma das modalidades de transmissão de um crédito, baseado no cumprimento da obrigação, como decorre da referência a esta realidade nos diversos preceitos que regulam a matéria.
E pode ser definida como a substituição do credor, na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento (Antunes Varela, in Das obrigações em geral, II, 4ª edição, pág. 324).
O devedor no contrato de locação financeira era a Tasca da Armada, Lda.
Destarte, a haver sub-rogação, a mesma teria de ser, sempre, relativamente à T….. da Armada e nunca relativamente ao R., que não é o devedor no referido contrato (nem sequer garante, já que da mesma forma que o aval não produziu efeitos em relação ao A., também não se produziu relativamente ao R.)
Destarte, a invocada sub-rogação quanto ao R. não tem fundamento legal, pelo que também por esta via a presente acção deve improceder no que diz respeito à quantia referida em e) supra.(…).”
O decidido não merece reparo.
O aval é o ato pelo qual um terceiro ou signatário da letra ou livrança garante o pagamento da mesma por parte de um dos subscritores (cfr. arts. 30 e 77 da L.U.L.L.). Constitui, por isso, um verdadeiro ato cambiário, uma garantia cambial de natureza comercial, em que o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele avalizada.
O fim próprio do aval, a sua função específica, é garantir ou caucionar a obrigação de certo obrigado cambiário, dando origem a uma obrigação materialmente autónoma, pelo que o dador de aval não se limita a responsabilizar-se pela pessoa garantida, antes assumindo a responsabilidade abstrata e objetiva pelo pagamento da obrigação correspondente([2]).
O aval não tem, assim, aplicação nos contratos em geral, destinando-se antes a garantir títulos de crédito.
O avalista não é, por sua vez, um fiador.
Apesar do aval se apresentar, essencialmente, como uma fiança, existem diferenças relevantes entre ambos, exatamente decorrentes da natureza cambiária do primeiro. Assim, por exemplo, a fiança tem de ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal (art. 628 do C.C.), enquanto o aval pode ser em branco ou incompleto, resultando da mera assinatura do dador aposta em certo lugar do título (art. 31 da L.U.L.L.), o fiador goza, em regra, do benefício da excussão (art. 638 do C.C.), enquanto o avalista responde, com os outros firmantes do título, solidária e subsidiariamente, perante o portador (art. 47 da L.U.L.L.), o fiador pode contratar especiais condições ou prazo de validade da fiança (art. 631 do C.C.), o que não acontece no aval, e pode requerer a sua liberação em determinados casos legalmente previstos (art. 648 do C.C.), sem que o possa fazer o dador de aval.
Como se observa na sentença, não consta dos autos, nem foi sequer invocado, que a dita livrança, entregue em garantia do contrato de leasing, tenha sido preenchida pelo Banco Popular nos termos acordados (pacto de preenchimento).
O título em branco, isto é, aquele que apenas contenha a assinatura do seu subscritor será válido enquanto tal, mas não eficaz. Essa eficácia depende, nas relações imediatas, do credor a apresentar preenchida de harmonia com o acordo de preenchimento, quando pretender exercer os direitos dela emergentes([3]).
Como se refere igualmente na sentença, a livrança não pode produzir efeitos enquanto título de natureza cambiária na falta de elementos essenciais, como a promessa de pagar uma quantia determinada, a época do pagamento, a indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento, a indicação da data em que e do lugar onde a livrança é passada, de acordo com o disposto nos arts. 75 e 76 da L.U.L.L..
Ou seja, o A. apenas se constituiria como obrigado perante o Banco Popular mediante o preenchimento da livrança em caso de incumprimento da dita sociedade e por força do aval ali prestado (ponto 1.8. supra).
Não tendo sido apresentada a livrança, devidamente assinada e completada nos termos acordados, tem de entender-se que o Banco Popular não chegou, em rigor, a acionar a garantia, não obstante a interpelação que fez ao A. em 16.12.2015.
Note-se, aliás, que parte dos pagamentos realizados pelo A. ao referido Banco Popular que se encontram descritos no ponto 2.6. supra – como os respeitantes aos anos de 2013, 2014 e 2015 – são até anteriores à dita carta de interpelação daquele Banco referida no ponto 2.5..
Assim sendo, tal como se concluiu em 1ª instância, o que resulta da factualidade provada é que o A. pagou, no lugar da sociedade, rendas vencidas e não pagas, não sendo possível afirmar que as pagou na qualidade de co-avalista, na medida em que a dita livrança não chegou a produzir efeitos como tal.
Isso mesmo se entendeu no Ac. do STJ de 30.4.2015([4]), citado na sentença, em que se concluiu: “(…) não se questiona a admissão de letras ou de livranças em branco, nem a legitimidade da assinatura aposta por avalista de algum dos demais obrigados cambiários, o que gera uma vinculação incompleta, cujo eficácia e conteúdo não prescinde do posterior preenchimento dos elementos essenciais em falta, através dos quais é medida a responsabilidade dos avalistas em globo e, a partir desse plano, a responsabilidade individualizada susceptível de ser reclamada no âmbito da acção de regresso.
O facto de os AA. terem efectuado o pagamento das quantias contra-garantidas pelas referidas livranças logo que foram confrontados com a solicitação do Banco Santander não supera a necessidade do seu preenchimento para efeitos de ser exercido o direito de regresso relativamente à R. coavalista.(…).”
Em suma, e pelas razões aduzidas, não assiste ao A. o direito de regresso reclamado sobre o R. quanto à referida quantia, conforme se ajuizou na sentença.
- Quanto às demais quantias referidas nas alíneas a), b), c), d) e f), fez-se na sentença recorrida análise do enquadramento legal respetivo, mormente dos arts. 78 e 79 do C.S.C., e analisadas depois, uma a uma, cada uma das pretensões, concluiu-se pela improcedência das mesmas.
O apelante defende no recurso, em breve resumo, que todos os danos reclamados são danos diretos por si sofridos em resultado da conduta ilícita do R., sendo enquadráveis nos arts. 78 e 79 do C.S.C., uma vez que o A. demanda o R. como sócio mas também como credor social.
Vejamos.
A primeira questão que se coloca é a de saber se o A. pode também invocar a qualidade de credor social e, assim, prevalecer-se do disposto no art. 78, nº 1, do C.S.C., sendo evidente que demanda o R. enquanto sócio da sociedade comercial que ambos constituíram (ver artigos 146º a 148º da p.i.).
De acordo com o art. 72, nº 1, do C.S.C., com a epígrafe “Responsabilidade de membros da administração para com a sociedade”: “Os gerentes ou administradores respondem para com a sociedade pelos danos a esta causados por actos ou omissões praticados com preterição dos deveres legais ou contratuais, salvo se provarem que procederam sem culpa.”
Nos termos do art. 77, nº 1, do C.S.C., com a epígrafe “Acção de responsabilidade proposta por sócios”: “Independentemente do pedido de indemnização dos danos individuais que lhes tenham causado, podem um ou vários sócios que possuam, pelo menos, 5% do capital social, ou 2% no caso de sociedade emitente de acções admitidas à negociação em mercado regulamentado, propor acção social de responsabilidade contra gerentes ou administradores, com vista à reparação, a favor da sociedade, do prejuízo que esta tenha sofrido, quando a mesma a não haja solicitado.”
Já o art. 78, nº 1, do C.S.C., sob a epígrafe “Responsabilidade para com os credores sociais”, dispõe que: “Os gerentes ou administradores respondem para com os credores da sociedade quando, pela inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à protecção destes, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos respectivos créditos.”
Por último, o art. 79, nº 1, do mesmo C.S.C., sob a epígrafe “Responsabilidade para com os sócios e terceiros”, estabelece que: “Os gerentes ou administradores respondem também, nos termos gerais, para com os sócios e terceiros pelos danos que directamente lhes causarem no exercício das suas funções.”
Cremos que, conforme se concluiu na sentença, o A., sustentando os seus pedidos na qualidade de sócio da sociedade de que o R. é único gerente de facto pelo menos desde 2.2.2013 (pontos 2.1. a 2.3. supra) e de direito desde 2016 (ponto 1.3. supra), pode apenas apelar ao disposto no nº 1 do art. 79 do C.S.C. e não também ao previsto no nº 1 do art. 78 daquele Código.
Com efeito, enquanto o nº 1 do art. 72 regula a responsabilidade civil dos administradores e gerentes perante a própria sociedade, o nº 1 do art. 78 regula a responsabilidade civil destes perante os credores sociais, enquanto o nº 1 do art. 79 regula tal responsabilidade perante os sócios e terceiros. Por sua vez, o nº 1 do art. 77 respeita a ação social deduzida contra gerentes ou administradores por sócio ou sócios com um certo capital mínimo, com vista à reparação, a favor da sociedade, do prejuízo que esta tenha sofrido, quando a mesma a não haja solicitado.
Excluída, no caso, a responsabilidade civil perante a sociedade (nº 1 do art. 72) ou a ação prevista no nº 1 do art. 77, atenta a qualidade em que o A. propõe a presente causa, é manifesto que este invoca uma particular relação com a sociedade e o R. demandado que é o facto de ser sócio da primeira sendo o R. o seu gerente (para além de sócio).
Ou seja, o A. não invoca perante o R. uma qualquer relação exterior estabelecida com a sociedade – como a de fornecedor ou outra, ainda que sendo simultaneamente sócio – no exato enquadramento do referido art. 78, nº 1, do C.S.C..
O que invoca não é uma simples posição de terceiro face à sociedade, porque com ela tenha celebrado um determinado contrato tornando-se, por consequência, credor da mesma, mas antes a qualidade de sócio em que praticou os atos que invoca – e em que fundamenta os seus pedidos – atos que justifica com a atuação ilícita do R. enquanto gerente dessa sociedade.
Donde, afigura-se medianamente evidente, face ao fundamento de cada um dos pedidos indemnizatórios formulados, que o A. não é um mero credor da sociedade nem propõe a ação como credor social, mas como sócio, não sendo aplicável, por isso, ao caso o disposto no art. 78, nº 1, do C.S.C..
De resto, não faria sentido que o sócio que demandasse o gerente da sociedade ao abrigo do art. 79, nº 1, do C.S.C., pudesse considerar-se por isso, em simultâneo e de forma automática, credor social para os efeitos previstos no referido nº 1 do art. 78, sendo claramente diversa a previsão das referidas normas.
Por sua vez, concordamos que a responsabilidade dos gerentes para com os sócios a que alude o nº 1 do art. 79 se enquadra no regime da responsabilidade civil extracontratual, na medida em que não existe uma relação obrigacional entre eles. Atenta a remissão do preceito para o regime geral, cumpre fazer então aplicação do disposto no art. 483 do C.C..
Diz-nos, a propósito, Ana Filipa Duarte Ferreira([5]): “(…) O artigo 79º, nº 1, do C.S.C., remete para o regime geral da responsabilidade civil mas não esclarece se lhe é aplicável o regime da responsabilidade obrigacional ou o regime da responsabilidade delitual. Conforme já tive oportunidade de esclarecer, a responsabilidade dos administradores perante sócios e terceiros não pode ser considerada obrigacional, na medida em que não existe uma relação obrigacional entre os administradores e os sócios ou entre os administradores e terceiros, dada a interposição da personalidade jurídica da própria sociedade.
Entre os administradores e a sociedade esta questão não se coloca pois existe uma relação jurídica que confere aos administradores deveres e direitos sociais para com a sociedade. Por sua vez, entre os administradores e os sócios ou terceiros não existe qualquer relação jurídica. De notar que mesmo o contrato de sociedade não cria um vínculo obrigacional entre os órgãos sociais e os sócios. Ainda que os sócios ou terceiros estabeleçam contacto direto com o administrador, a sua atuação é imputada à sociedade, não se criando qualquer relação direta entre administrador, na qualidade de administrador, e o sócio ou terceiro.
Repare-se, também, que o Direito societário, nomeadamente o texto do C.S.C., não impõe aos administradores deveres específicos para com os sócios ou terceiros. Apenas lhes são impostos deveres genéricos. Assim, de um ponto de vista substancial, a responsabilidade dos administrados para com sócios e terceiros é uma responsabilidade puramente delitual. Deste modo, só se verificará caso estiverem cumpridos os pressupostos elencados no artigo 483º do C.Civil.”
Assim se entendeu, do mesmo modo, no Ac. do STJ de 3.4.2003([6]), a propósito da demanda de uma gerente por sócia da sociedade: “(…) A ré era gerente.
Como gerente estava obrigada a actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores (CSCom- 64º).
Entre a ré, enquanto gerente da sociedade e no exercício dessas funções, e a autora, como sócia desta, não existia relação contratual funcional, pelo que a responsabilidade apenas pode ser delitual e assentar em culpa efectiva (CSCom- 79º,1 e 2 e 72º-2 a 5). Em causa não está uma violação de deveres sociais, onde o gerente tem obrigações perante a sociedade, não perante os sócios - na responsabilidade delitual é o gerente que é directamente responsável (o problema que se coloca não é o da responsabilidade da sociedade pela gestão societária - art. 6º-5 mas a da responsabilidade da gerente para com a sócia, o que aquela norma não exclui).
A entrega do imóvel locado com a consequente extinção da sociedade não resultou de uma deliberação social mas da vontade unilateral da ré (CSCom- 270º, 1 e 2), tratando a sociedade como uma sua coutada nem de acção legalmente desenvolvida pela senhoria - encerrando o "C, Lda." e entregando a chave a esta, extinguiu-o de facto.
Conduta ilícita da ré, assumida no exercício das suas funções de gerente, e da qual advêm danos directamente para os outros sócios, estes os lesados detentores dos interesses violados (CC- 483º).
A presente acção é pessoal, não é acção social, de natureza delitual, daí que ressarcíveis sejam apenas os prejuízos directamente (não por via reflexa, causados à sociedade mas repercutindo-se no património dos sócios) causados no património dos sócios.(…).”
Sendo então os gerentes responsáveis perante os sócios nos termos dos arts. 79, nº 1, do C.S.C., e 483 do C.C., respondem estes apenas pelos danos que diretamente lhes causarem no exercício das suas funções.
Nessa perspetiva, os atos que se integram numa gestão ruinosa ou no deficiente exercício dos poderes de gestão não serão, à partida, de incluir entre os que permitem aos sócios demandar diretamente os administradores ou gerentes([7]).
Como se afirma no Ac. da RP de 5.11.2001([8]), aderindo-se à posição de Menezes Cordeiro, os danos diretamente causados pelos gerentes aos sócios serão aqueles causados em termos que não são interferidos pela presença da sociedade, sendo irrelevante a representação desta, mesmo que invocada.
Também aqui defende Ana Filipa Duarte Ferreira([9]) que: “(…) do conteúdo do artigo 79º do C.S.C. resulta que todos os danos provocados no património social que, indiretamente, prejudicam os acionistas não justificam a responsabilidade direta dos administradores perante estes, pois, os prejuízos criados por uma gestão ruinosa do património social assumem-se como um dano indireto. Ainda que existam normas de proteção que visem proteger os acionistas face a determinados comportamentos dos administradores lesivos do património social, a responsabilidade civil não será considerada por se tratarem de danos indiretos.
Os danos dolosamente provocados ao património social ou a gestão negligente poderão originar responsabilização dos administradores para com a sociedade mas jamais uma responsabilização perante os acionistas, o artigo 79º do C.S.C. exige que os danos sejam diretamente provocados na esfera jurídica dos acionistas. Deste modo, o legislador pretendeu separar a responsabilidade direta perante os sócios e terceiros da responsabilidade perante a sociedade, incluindo a ação social ut singuli. O património social ao ser ressarcido pelos danos provocados pelos administradores terá como efeito natural a reposição do valor das participações sociais. O direito de indemnização que assiste à sociedade reflete-se favoravelmente no valor das ações.(…).”
Encontrando-nos no domínio da responsabilidade civil extracontratual recordamos que constituem pressupostos da mesma: o facto, a ilicitude, o nexo de imputação (do facto ao lesante), o dano ou prejuízo e o nexo de causalidade.
Assim, para que nasça a obrigação de indemnizar é necessário que ocorra um facto ilícito, por ação ou omissão do agente, culposo e adequado a causar danos ao lesado, estabelecendo o art. 483 do C.C. que: “1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.”
Deste modo, no domínio da responsabilidade civil extracontratual por ato ilícito, é ao lesado que cumpre provar a culpa do autor da lesão, exceto havendo presunção legal de culpa (art. 487 do C.C.).
Sintetizando, estamos, no caso em análise, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual sendo, além do mais, os danos a indemnizar apenas os diretamente causados ao sócio demandante pelo gerente R. no exercício das suas funções (arts. 79, nº 1, do C.S.C., e 483 do C.C.).
Feito este breve enquadramento, cumpre analisar agora cada uma das alíneas acima indicadas, respeitantes aos pedidos formulados pelo A. que a 1ª instância desatendeu.
- No que respeita à alínea a), o A. pede a quantia de € 2.500,00 pela desvalorização sofrida na sua quota social (arts. 146º e 151º da p.i.).
Na sentença concluiu-se pela improcedência da pretensão, sustentando-se, no essencial, que a factualidade apurada “reflecte-se, directamente na sociedade – no seu património e actividade – e só reflexa ou indirectamente no valor da quota social.
E sendo assim, não estamos perante danos causados directamente ao sócio, mas apenas reflexamente.
A desvalorização (ou mesmo extinção) do valor da quota são sempre reflexo da falta de património e actividade da sociedade.(…).”
Para além do A. não ter feito uma concreta demonstração da desvalorização da sua quota na sociedade Tasca da Armada, Lda, somos levados a concluir que estamos perante um dano indireto ou reflexo.
Tal como se explicou no Ac. da RL de 18.9.2007, acima citado em rodapé: “(…) A quota, com um determinado valor nominal (art. 219º do CSC) constitui um bem do respectivo sócio, cujo valor de transacção (assim como o de amortização) dependerá de diversos factores, entre os quais sobressai a situação patrimonial da sociedade reflectida pelo relatório de gestão e pelas contas de exercício a apresentar nos termos dos arts. 65º e 66º, sujeitas a apreciação e deliberação, que, relativamente às sociedades por quotas, estão especificamente assinaladas nos arts. 246º, nº 1, al. d), e 263º.
Ainda que da actuação dos administradores decorra uma redução do valor das participações sociais, a partir do preceituado no art. 79º, não é possível reclamar o direito de indemnização correspondente àquela redução.[...]
Em tais circunstâncias, eventuais efeitos que a actuação dos gerentes ou administradores possa ter determinado no valor da participação social também constituem mero reflexo de uma alteração da situação patrimonial da sociedade, em consequência de uma redução de receitas ou da cessação da actividade. Relativamente a esses danos, apenas à sociedade, por si ou através de algum dos sócios, pode ser reconhecido o direito de ser ressarcida dos prejuízos, verificados que sejam os demais pressupostos do direito de indemnização.(…).”
Por conseguinte, sendo de entender que a alegada desvalorização da quota do A. na sociedade, para além de indemonstrada, não encontra cobertura no art. 79, nº 1, do C.S.C., é de confirmar o sentenciado nesta parte.
- No que respeita à alínea b), o A. pede a quantia de € 8.800,00 relativo aos bens de que o A. era proprietário exclusivo (arts. 92º e 151º da p.i.).
Na sentença concluiu-se pela improcedência desta pretensão, sustentando-se que “não ficou provado que os bens alegadamente propriedade do A. se encontravam no restaurante, como também não ficou provado que o mesmo era, efectivamente, o respetivo proprietário.”
Nenhuma dúvida se nos oferece quanto a este pedido, pois não foi feita a menor prova de que o A. fosse titular de quaisquer bens ou equipamentos existentes no estabelecimento (pontos 3.3.3. a 3.3.6. julgados não provados).
Pelo que, assim sendo, não pode deixar de confirmar-se, igualmente, o decidido nesta parte.
- No que respeita à alínea c), o A. pede a quantia de € 1.787,50 correspondente a metade dos pagamentos que efetuou por conta da dívida da sociedade ao BPI (num total de € 3.575,00) (arts. 76º e 151º da p.i.).
Na sentença concluiu-se, uma vez mais, pela improcedência desta pretensão, sustentando-se que, conforme resulta dos pontos 1.11. a 1.13, o mútuo em questão foi contraído pela sociedade, sendo esta a responsável pelo seu pagamento: “O mutuo foi contraído pela sociedade.
Destarte, era a sociedade a responsável pelo pagamento do mesmo.
A sociedade não procedeu ao pagamento, desconhecendo-se as razões por que tal sucedeu.
O A. assumiu pagar a divida.
Mas então é uma questão entre ele e a sociedade.
Não há aqui qualquer causação directa de um dano por parte do R. sem interferência da sociedade. A interferência da sociedade reside no facto de ser ela a devedora e de ter sido ela quem não cumpriu.
Assim, não tem cabimento, à luz do disposto no art.° 79° do CSC, pretender fazer repercutir sobre o R. alguma parte da referida quantia.(…).”
Nenhum reparo nos merece tal raciocínio.
Resultou provado que o A., com recurso ao seu património pessoal, procedeu ao pagamento da quantia de € 3.575,00 para amortização do contrato de mútuo celebrado entre a sociedade Tasca da Armada, Lda, e o Banco BPI (pontos 1.11. a 1.13. supra).
É manifesto que tal pagamento foi realizado por conta da indicada sociedade que era a obrigada ao reembolso do empréstimo contraído.
Donde, se não se comprova que o A. tenha procedido a tal pagamento em razão da conduta do R. gerente da sociedade, é manifesto que tal afetação patrimonial do A. não pode justificar-se como dano direto causado por aquele no exercício da gerência, tanto mais que se desconhece, em absoluto, se e em que condições a sociedade terá deixado de cumprir o aludido contrato.
Tem de confirmar-se, por isso, também o decidido nesta parte.
- Quanto à alínea d), o A. pede a quantia de € 22.390,42, correspondente a metade do contrato de crédito celebrado com o Banco Popular (num total de € 44.780,85) (arts. 13º a 75º e 151º da p.i.) e, quanto à alínea f), pede a quantia de € 40.269,17, correspondente a metade das faturas da compra de equipamentos (num total de € 80.538,35) (arts. 89º a 98º e 151º da p.i.)
Na sentença concluiu-se pela improcedência de ambas as pretensões, atento o teor dos pontos 1.4. e 1.5., nos seguintes termos: “(…) O primeiro dos valores referidos - € 22.390,42 — corresponde a metade do preço dos bens objecto do contrato de locação financeira celebrado entre o Banco Popular e a sociedade T…. da Armada referido no ponto 3.1.5. e o segundo - € 40.269,17 – corresponde a metade do valor que a T…. da Armada, Lda", despendeu em equipamento e decoração do restaurante — € 80.538,35 — referido no ponto 3.1.4.
Esta pretensão também não tem enquadramento no disposto no art.° 79° do CSC.
Em primeiro lugar impõe-se observar que o contrato de locação financeira não tem como efeito a aquisição dos bens, mas a sua locação.
No caso dos autos, no termo do contrato a sociedade tinha a opção de compra pagando o valor residual — cfr. cláusulas 10ª n.° 1 e 11° n.° 1 alínea a) do contrato.
Desconhece-se, por nada ter sido alegado nesse sentido, se a sociedade chegou a fazer tal opção de compra e a pagar o valor residual.
Mas, admitindo-se que assim tenha sucedido, estamos, em qualquer uma das situações, perante bens da sociedade e que constituíam garantia dos credores (cfr. art.° 601° do CC) e não dos sócios.
Os sócios só terão direito a bens da sociedade ou ao valor dos mesmos, numa situação de dissolução e liquidação da mesma e depois de pagos todos os credores — art.° 156° do CSC.
Até lá, os sócios não têm tal direito.
Como referem Raul Ventura e Luis Brito Correia, já supra citados, esta pretensão do A. traduzir-se-ia em última análise, na entrega ao sócio de valores que deveriam pertencer à sociedade e a que aquele só teria direito como saldo de liquidação, redundando, assim, numa diminuição da garantia dos credores sociais, que é o património social.(…).”
Cremos que também nesta matéria está o A. impedido de reclamar do R. os valores referidos, não tendo a sua pretensão sustento à luz do art. 79, nº 1, do C.S.C..
Com efeito, o equipamento e decoração referidos no ponto 1.4. supra pertenciam à sociedade T….. da Armada, Lda, sendo esta, por sua vez, locatária financeira do mobiliário referido no ponto 1.5. supra.
É certo que se apurou que o A. pagou algumas rendas do referido contrato de locação financeira (pontos 2.4. a 2.6. supra), como acima vimos, e que o estabelecimento de restaurante foi, em 2015 e após corte da água e da eletricidade (ponto 2.14.), esvaziado, com conhecimento e autorização do R., de todo o seu conteúdo, de natureza não concretamente apurada (ponto 2.10.).
No entanto, apurou-se igualmente que o A. pediu que fosse cortada a água e a eletricidade das lojas ocupadas pelo restaurante "T….. da Armada" e que estas foram cortadas em datas não concretamente apuradas de 2015 antes do encerramento do restaurante, tendo, em virtude do corte da água, ficado o restaurante impossibilitado de funcionar o que determinou esse encerramento (pontos 2.13. a 2.15.).
Se no que respeita aos pagamentos realizados pelo A. no âmbito do contrato de locação financeira já vimos que aquele o fez em nome e por conta da sociedade, temos de concluir que nenhum direito tem o mesmo sobre os bens e equipamentos indicados que lhe não pertenciam, no todo ou em parte, mas quando muito à referida sociedade, sendo ainda certo que, como se refere na sentença, os sócios só terão direito a bens da sociedade ou ao valor deles em caso de dissolução e liquidação desta e depois de pagos os credores, nos termos do art. 156 do C.S.C..
Acresce que nenhuma prova se fez sobre quais os bens que se encontrariam no estabelecimento aquando do seu encerramento, qual o seu estado e respetivo destino, não resultando igualmente apurado que o R. deles se tenha apoderado ou feito seus.
Em todo o caso, a existir uma indevida dissipação do património societário por parte do R., sempre estaríamos no âmbito da afetação de interesses da sociedade T…. da Armada, Lda, de danos causados à sociedade que só indireta ou reflexamente se repercutiriam, em segunda linha, no património do A..
Por conseguinte, no que respeita aos indicados mobiliário e equipamento do restaurante, ainda que extraviados, não se alcança o dano direto sofrido pelo A. em consequência de atuação ilícita do R. como gerente da sociedade, não podendo deixar de confirmar-se também o sentenciado neste tocante.
- Em suma, os pedidos indemnizatórios formulados pelo A. nas indicadas alíneas a), b), c), d) e f) são forçosamente improcedentes pelas razões expostas e conforme decidido em 1ª instância, sendo irrelevantes as reiteradas alusões feitas pelo apelante à conduta ilícita e dolosa do R. como gerente da sociedade.
De resto, e percorrendo a factualidade apurada, não resultam suficientemente patenteadas as irregularidades de gestão e a conduta dolosa, causadores da dissipação do património social, que o A. atribui ao R., como seja a apropriação indevida por este dos bens da sociedade. Tal como não resulta minimamente demonstrado que o R. tenha agido enquanto gerente da T…. da Armada, Lda, com o intuito de lesar a sociedade e/ou o A..
Realça-se, por outro lado, que nada resultou provado sobre a efetiva situação financeira e contabilística da sociedade.
Veja-se ainda que o A. nada peticionou nesta ação quanto a prejuízos por si diretamente sofridos com o uso, pelo R., do espaço do estabelecimento de restaurante que seria de sua propriedade, tão pouco se tendo apurado que tal espaço lhe pertencesse (facto que, de todo o modo, nem sequer foi concretamente alegado na p.i.).
- Por último, resta a alínea g), respeitante ao pedido formulado de condenação do R. “a pagar ao Autor a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde o trânsito em julgado da sentença até integral e efectivo pagamento.”
Fundamenta o A. tal pedido na frustração das expectativas criadas com a sociedade constituída e no sofrimento decorrente da conduta ilícita do R. (artigo 153º da p.i.).
Na sentença ponderou-se a factualidade provada sob o ponto 2.12., nomeadamente a frustração, agitação e nervosismo sofridos pelo A. pelo seu afastamento de facto da gerência da sociedade que se ajuizou corresponder a um dano moral diretamente sofrido por aquele, fixando-se em € 2.000,00 o valor da indemnização, ao abrigo do art. 496 do C.C.. Desvalorizou-se, por sua vez, a matéria do esvaziamento do restaurante, por se entender que, nessa parte, foi a sociedade que sofreu diretamente o dano, sendo a frustração, agitação e nervosismo sentidos pelo A. um mero reflexo dessa situação e não um dano diretamente causado.
O apelante defende no recurso que o valor indemnizatório deve “ser elevado para o montante considerado adequado, segundo o elevado critério deste Tribunal da Relação, atentas as circunstâncias do caso concreto, mas que não deverá nunca ser inferior a € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros)” (conclusão 67ª).
O que está, por conseguinte, em causa no recurso é somente o montante fixado a título de danos não patrimoniais sofridos pelo A., e não o seu direito a tal ressarcimento.
Em todo o caso, cumpre assinalar que o A. estimou, na p.i., o valor respetivo em € 2.500,00, o que não pode deixar de ser atendido por este Tribunal, apesar do mesmo não constituir um limite em si mesmo nos termos e para os efeitos do art. 609 do C.P.C.([10]).
Resulta do art. 496 do C.C. que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, excluindo-se destes, como é prática jurisprudencial, os simples incómodos ou contrariedades.
Devem, por isso, ser ressarcidas a título de danos não patrimoniais todas as consequências, físicas e morais, havidas pelo lesado que, não correspondendo a uma efetiva perda patrimonial e não abrangidas por outra compensação, por suficientemente graves mereçam a tutela do direito.
O montante indemnizatório deve fixar-se com recurso à equidade, tendo em atenção, de todo o modo, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (arts. 496, nº 3, e 494 do C.C.).
No caso provou-se que, em 2.2.2013, o R. impediu o A. de permanecer no restaurante e declarou que a partir daquela data o estabelecimento seria explorado unicamente por ele e que não permitiria que o A. ali voltasse a entrar, prescindindo da sua colaboração na gestão e administração da sociedade, pelo que o A. deixou de exercer a gerência da sociedade que passou a ser exercida apenas pelo R. (pontos 2.1., 2.2. e 2.3.).
Mais se apurou que, em data indeterminada de 2015, mas após o corte da água e da eletricidade, com conhecimento e autorização do R., o restaurante foi esvaziado de todo o seu conteúdo (ponto 2.10.).
Provou-se, finalmente, que as descritas atuações do R. causaram ao A. frustração, agitação e nervosismo (ponto 2.12.).
Ainda que excluindo os efeitos emocionais provocados no A. pela conduta do R. como gerente perante a sociedade (pontos 2.10. e 2.12.), cumpre ter em conta a comprovada frustração, agitação e nervosismo que o A. sofreu por ter sido afastado pelo R. da sociedade de que era sócio e gerente e impedido de exercer essa gerência bem como de entrar no restaurante onde aquela desenvolvia a sua atividade.
Assim, e apesar de se desconhecer a concreta situação económica do A. e do R., afigura-se-nos equitativo e ajustado fixar o valor da indemnização pelos referidos danos não patrimoniais sofridos em € 2.500,00, conforme fora peticionado, nos termos do art. 566, nº 2, do C.C., e com respaldo no art. 79, nº 1, do C.S.C..
Procede, assim, o recurso apenas neste tocante.
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IV- Decisão:
Termos em que e face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e alterar a sentença recorrida, fixando em € 2.500,00 o valor da indemnização atribuída ao A. por danos não patrimoniais sofridos, no mais mantendo o decidido.
Custas pelo apelante e pelo apelado na proporção do vencimento.
Notifique.
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Lisboa, 2.2.2021
Maria da Conceição Saavedra
Cristina Coelho     
Luís Filipe Pires de Sousa
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[1] Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, págs. 128/129.
[2] Cfr., Abel Delgado, “Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, Anotada”, 7ª ed., págs. 167 a 176, e Ferrer Correia, “Lições de Direito Comercial”, vol. III, 1975, págs. 205 a 219.
[3] Ver, a propósito, Abel Delgado, “Lei Uniforme sobre Letras e Livranças Anotada”, 7ª ed., pág. 83.
[4] Proc. 2430/11.3.TVLSB.L1.S1, em www.dgsi.pt.
[5] “A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ADMINISTRADORES PERANTE SÓCIOS E TERCEIROS – o conceito de dano diretamente causado do artigo 79º do Código das Sociedades Comerciais”, disponível em https://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/46647/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o_Ana%2BFilipa%2BDuarte%2BFerreira_2016.pdf, págs. 37 e 38.
[6] Proc. 03A676, disponível em www.dgsi.pt.
[7] Neste sentido, o Ac. da RP de 15.1.2013, Proc. 548/06.3TBARC.P1, e o Ac. da RL de 18.9.2007, Proc. 6603/2007-7, em www.dgsi.pt, realçando-se as referências doutrinárias e jurisprudenciais dos mesmos constantes.
[8] Proc. 0151236, em www.dgsi.pt.
[9] Ob. cit., pág. 66.
[10] Cfr. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, Almedina, 2018, Vol. I, pág. 729, anotação 5 ao referido art. 609.