Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
17737/17.8T8SNT-A.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- Dispõe o artigo 829º-A do Código Civil que “nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo (…), o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor no pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento”, a fixar “segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar”.
II- Dispõe o art.º 10/5 que “toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
III- Se a sentença dada à execução não só não fixou prazo para as reparações como não condenou o empreiteiro em sanção pecuniária compulsória, realizando a interpretação da sentença nenhum subsídio se colhe em relação à configuração da prestação de reparação dos defeitos da obra por parte empreiteiro como uma prestação infungível, já que o que a lei diz é que realizada a obra defeituosamente o empreiteiro tem não só a obrigação como o direito em primeira linha de os reparar, salvo as situações que a doutrina e a jurisprudência tem qualificado como de situações de urgência que não são compatíveis com a concessão de prazo ao empreiteiro para a reparação que na maior parte dos casos não são atendidas como é do conhecimento público e notório,  porque, por força do art.º 10/5, é a sentença que determina os limites da acção executiva, é com essa disposição legal se tem de harmonizar o disposto no art.º 868 em que se suportou o requerimento do exequente e que levou ao despacho de 12/11/2019 que é muito singular na parte que ora importa” “...considerando o tempo decorrido desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda e a natureza das obras a realizar aplico ao executado a sanção pecuniária compulsória de 150,00 euros por cada dia de atraso na sua conclusão..”.
IV- Este despacho proferido nesta execução que não incide sobre a relação processual antes sobre a relação material, não tem a força de caso julgado formal a que se refere o art.º 620, a relação material que já fora definida na sentença dada à execução dotada de força de caso julgado material e cujo teor define os limites da execução nada refere a propósito da sanção pecuniária compulsória, a decisão de 12/11/2019, indo para além dos concretos termos do título dado à execução, não é susceptível de execução por força da própria lei; poder-se-ia ir mesmo mais longe e como defende o professor Teixeira de Sousa, em anotação a Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça sobre situação paralela, e considerar aquele segmento da decisão ineficaz e por isso insusceptível de servir de base à execução para pagamento de quantia certa pela referida quantia; numa outra perspectiva, também defendida na decisão recorrida poder-se-á dizer que ao optar pela prestação de facto por outrem dentro da própria execução o exequente esvaziou a razão de ser e a finalidade da sanção pecuniária compulsória fixada naquele despacho.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I- RELATÓRIO
APELANTE/EXEQUENTE: PM (representado pelo ilustre advogado JC, com escritório no Estoril conforme instrumento de procuração de 21/5/2013 junto aos autos físicos).
APELADO/EXECUTADO: MO (representada, pela ilustre advogada TM, com escritório em Mem Martins como dos autos decorre)
Valor do recurso: 34.211,00 euros (indicado no requerimento executivo)
I.1. No processo …/…, na acção que PM moveu contra MO com vista à eliminação de defeitos em obra sua que, por força do contrato de empreitada com o réu que este levou a cabo foi, aos 30/9/2015, decidido julgar parcialmente provada e procedente o pedido e em consequência o réu condenado a efectuar as reparações discriminadas sob a) do dispositivo e ainda a pagar ao Autor 600 euros por este despendido com pinturas efectuadas a título de reparações urgentes.
I.2. Aos 25/9/2017 o mencionado PM moveu contra o referido MO execução a que deu o valor de 34.211,00 euros (33.611,0 euros+600,00 euros) com base naquela decisão judicial alegando que  “a condenação se encontra transitada em julgado pelo que dela aqui se dá à execução uma vez que o executado até à presente data e depois de interpelado voluntariamente não efectuou qualquer reparação ou pagamento ao exequente, 3- uma vez que o prazo para a prestação não está determinado no título executivo o exequente, nos termos do disposto no art.º 874 do Código de Processo Civil requer a) a fixação judicial de praxo para o executado efectuar as reparações a que respeita a condenação indicando para o efeito como suficiente o prazo de trinta dias; b) a fixação de sanção pecuniária compulsória a que respeita a 2.º parte do n.º 1 do artigo 868 do CPC indicando para o efeito o valo diário de 150,00 euros, 4) O executado foi também interpelado para proceder ao pagamento voluntário da quantia em que foi condenado na sentença o que não fez até à presente data, 5) Ao montante acima indicado acrescem juros moratórios e compulsórios vencidos e vincendos calculados à taxa d legal em vigor até efectivo e integral pagamento liquidados a final pelo agente de execução. 6) Mais requer que o executado seja citado para em 20 dias dizer o que se lhe oferece sob cominação legal.
I.3 Citado o executado veio o mesmo aos 5/12/2017 informar que está disponível para proceder à reparação com início a 11/12/2017 juntando, ainda, 3 orçamentos de empresas externas das quais o executado poderá escolher uma para que esta proceda à reparação a que o executado está obrigado, requerendo, ainda, que o exequente informe se a obra pode ter início a 11 de Dezembro ou se opta por algum dos orçamentos em anexo e em caso afirmativo em que data poderão ter início os trabalhos.
I.4. Por despacho de 4/5/2018 foi julgada nula e destituída de qualquer efeito a citação efectuada na medida em que que se realizou uma penhora e se citou o executado para se opor à execução o que não corresponde ao peticionado pelo exequente.
I.5. Aos 12/11/2019 foi proferido despacho  que considerando o acordo das partes para a realização das obras especificadas na alínea a) do dispositivo da sentença exequenda fixou em 30 dias o prazo para a realização das mesmas e para o efeito de licenciamento da sobras o executado deve indicar nos autos em 5 dias os elementos de identificação do exequente necessários para instruir o respectivo pedido e o exequente prestar nos autos por requerimento as informações solicitadas pelo executado para esse efeito, iniciando-se o prazo de 30 dias no quinto dia posterior à data da notificação à ilustre mandatária do executado do requerimento referido em b) e considerando tempo decorrido desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda e a natureza das obras a realizar aplicou ao executado a sanção pecuniária compulsória de 150,00 euros por cada dia de atraso na sua conclusão.
I.6. Aos 10/12/2019 o executado veio requerer que o exequente forneça os eu documento de identificação ora via citius ou directamente junto do engenheiro do qual o mesmo tem o contacto, na media em que o exequente tendo junto vários documentos não juntou o cartão de contribuinte/ cartão e cidadão do condomínio/dono documento esse sem o qual o Engenheiro OT não consegue submeter o processo na Câmara.
I.7 O exequente veio, aos 27/1/2020, requerer a conversão da execução em execução para pagamento de quantia certa, ao abrigo do disposto nos art.ºs 868 e 869 do C.P.C.,  que a obra seja realizada por outrem requerendo a nomeação de perito para avaliar o custo da execução da obra, ao abrigo do art.º 870/1, do C.P.C., e, ainda que seja ordenada a penhora de bens do executado suficientes para o pagamento do valor que venha a ser determinado na perícia requerida e para pagamento da sanção pecuniária compulsória na qual o executado foi condenado, a qual até à presente data já ascende a 1.800,00 euros; em suma alega que se estranha que a Câmara Municipal de Sintra não consiga identificar a licença de utilização do prédio em causa, o executado não demonstra que já tenha solicitado a emissão de licença de ocupação da via pública ou em que data o fez ou sequer que  Câmara tenha agora pedido mais esse elemento tanto que a licença de utilização não foi um dos elementos solicitados pelo executado ao exequente no requerimento de 19/11/2019, não sendo esta senão uma manobra dilatória do executado para fazer crer que pretende cumprir com o que foi determinado na sentença condenatória há 4 anos; as informações necessárias ao pedido de licenciamento foram prestadas em 25/11/2019 pelo que o prazo de 30 dias fixado no despacho  teve o seu início a 16/12/2019 devendo as obras ter sido concluídas em 15/1/2020, o que não aconteceu, não tendo as obras que não carecem de licenciamento sido sequer iniciadas.
I.8 Por requerimento de 4/2/2020 o executado veio requerer a prorrogação do prazo estipulado pelo tribunal para o início das obras até ser emitida a licença  não sendo calculada até lá qualquer multa a ser paga pelo executado em suma alegando que o Engenheiro deu entrada ao processo de licenciamento juntou os documentos que lhe tinham sido solicitados, os dados referentes à licença de utilização foram posteriormente solicitados pela Câmara conforme documentos que junta pelo que o facto de o pedido de ocupação da via pública não ter sido deferido não é culpa do executado.
I.9. Aos 12/3/2020 o exequente reitera o pedido de conversão da execução e a penhora dizendo ser falso o alegado pelo executado e que nenhum pedido de licença tinha sido formulado.
I.10. Aos 24/6/2020 é proferido o seguinte despacho:
“O exequente pede, no requerimento em apreço, a conversão da execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa, nos termos do disposto nos artigos 868.º e 869.º, ambos do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 875.º, do mesmo código.
Requer, ainda, que seja ordenada a penhora de bens do executado suficientes para pagamento do valor que venha a ser determinado na perícia prevista no artigo 871.º do CPC, bem como para pagamento da sanção pecuniária compulsória em que o executado foi condenado, que ascende a €1.800,00.
Invoca, para tanto, no essencial, que o executado não realizou as obras peticionadas no prazo fixado no despacho de 12/11/2019 nem demonstrou sequer que já apresentou na Câmara Municipal competente o pedido de licenciamento necessário para o efeito. Neste contexto, defende, o pedido de entrega da licença de utilização do imóvel em causa, formulado pelo executado em 27/01/2020, é um mero expediente dilatório que demonstra não ser sua intenção dar início às obras em que foi condenado.
O executado opôs-se, por requerimento de 04/02/2020
Cumpre decidir.
Por despacho de 12/11/2019, proferido ao abrigo do artigo 874.º do CPC, decidiu-se, além do mais, fixar o prazo de 30 dias para a realização das obras peticionadas pelo exequente, especificando-se que ele teria início no quinto dia posterior à data da entrega pelo exequente dos elementos necessários à instrução do pedido de licenciamento das obras em causa.
Considerando que o exequente não pôs em causa, em tempo oportuno, a efectiva necessidade de licença municipal para a realização das obras em que o executado foi condenado, é de presumir que, sem ela, não estão reunidas as condições legais para o cumprimento, no âmbito da presente execução, da obrigação de realização dessa prestação de facto.
Por isso, apesar dos termos literais do referido despacho – que apenas visaram garantir uma acção diligente do executado no momento prévio da formulação do pedido de licenciamento das obras – não é possível concluir que, no período que antecede a emissão dessa licença, o executado não realizou voluntariamente as obras em que foi condenado no prazo judicialmente fixado.
Ora, contrariamente ao que alega o exequente, está demonstrado nos autos que o executado – ou pessoa a seu mando – apresentou na Câmara Municipal de Sintra (CMS) em 12/12/2019 o pedido de licenciamento das obras e que lhe foi solicitado, em 18/12/2019, no âmbito do respectivo procedimento administrativo, a licença de utilização do imóvel em causa (referência n.º 16299972, de 04/02/2020).
Neste contexto, não é possível concluir, como defende o exequente, que o pedido adicional pelo executado desse documento constitui um expediente dilatório demonstrativo de que não é intenção do executado realizar a prestação em que foi condenado, sendo certo que, através dos requerimentos de 27/01/2020 (referência n.º 16242238) e 04/02/2020 (referência n.º 16299972), veio o executado solicitar no processo, por duas vezes, que o exequente fornecesse o elemento em causa. Por outro lado, se é certo que o executado apenas formalizou tais pedidos no processo nas referidas datas, não está demonstrado que o procedimento administrativo de licenciamento se extinguiu pelo facto de o executado não ter entregado, em tempo, os documentos que lhe foram solicitados pela CMS em 18/12/2019. Aliás, segundo requerimento do executado de 26/02/2020, já foi emitida a licença municipal em causa, pelo que já estarão reunidas as condições legais para a sua realização. Assim sendo, não se pode concluir que está verificado o pressuposto básico de que depende, nos termos do artigo 875.º, n.º 2, do CPC, a conversão da presente execução em execução para pagamento de quantia certa (artigos 868.º e seguintes do CPC): a não realização – leia-se, voluntária – da prestação de facto pelo executado dentro do prazo judicialmente fixado.
E, faltando esse pressuposto, também não se pode permitir que a execução prossiga para pagamento da sanção pecuniária compulsória fixada no aludido despacho de 12/11/2019, como igualmente solicitado pelo exequente no requerimento em apreço.
Pelo exposto, indefiro o requerido.
Custas do incidente, no mínimo legal, pelo exequente (artigo 7.º, n.º 4, do RCP).
Notifique, sendo o executado para comprovar nos autos, em 5 dias, a data em que foi emitida a licença municipal em causa e esclarecer se, atento o tempo entretanto decorrido, a mesma ainda se encontra em vigor e até quando...”
I.11. Aos 24/6/2020 o executado veio prestar a informação solicitada.
I.12. Por requerimento de 9/7/2020 o exequente veio informar que “as obras poderão ter início na próxima quinta-feira, dia 16.07.2020, pelas 9h00 horas.”
I.13. Por requerimento de 7/10/2020 o exequente veio solicitar ao agente de execução para comprovar o estado das obras na medida em que ao contrário do alegado pelo executado as obras não estão concluídas.
I.14. Por despacho de Abril de 2021 foi determinado que: “A fim de verificar se o executado efectuou cabalmente as obras de reparação em que foi condenado, na sentença exequenda, e, em caso negativo, qual o custo das obras suplementares e/ou rectificativas necessárias para integral cumprimento do julgado, nomeio perito pessoa idónea que a secção vier a indicar para o efeito. O perito deverá prestar por escrito compromisso de honra no relatório pericial.
I.15. Do Relatório pericial de 6/9/2021 resulta que as obras não estão todas efectuadas e discrimina e aponta o custo de 7.245,00 euros para a sua conclusão.
I.16. Por requerimento de 2/12/2021 o exequente veio renovar o seu pedido de “conversão da presente execução em execução para pagamento de quantia certa, nos termos do disposto nos art.ºs 868.º e 869.º, ambos do CPC (aplicáveis ex vi Art.º 875.º do mesmo diploma), já que, se verifica um incumprimento por parte do Executado e, como tal, o Exequente não pretende mais que seja este a realizar os trabalhos que ainda estão em falta, e corrigir os trabalhos deficientemente executados...”
I.17. Por despacho de 7/2/2022 foi determinado que “Atento o teor do relatório pericial junto aos autos, que não foi objecto de reclamação por qualquer das partes, conclui-se que o executado não realizou a prestação em que foi condenado, na sentença exequenda, nos termos devidos, no prazo fixado nos presentes autos. Assim sendo, notifique o executado do requerimento em apreço, nos termos e para os efeitos do artigo 875.º, n.º 2, do CPC...”
I.18. Por requerimento posterior do exequente foi referido que “...O Executado foi notificado de tal despacho e não deduziu qualquer oposição, como resulta da notificação dirigida pelo Tribunal ao Agente de Execução, datada de 10.03.2022 (Ref. 136206220)... Ora, não tendo sido deduzida oposição, é de aplicar o disposto nos art.ºs. 867.º e 868.º, ambos do CPC, (aplicáveis ex vi Art.º 875.º, do mesmo diploma), a conversão da presente execução em execução para pagamento de quantia certa. Sendo que, conforme Relatório Pericial junto aos autos, já foi avaliado o custo da execução da obra, no montante de 7.245,00 EUR (sete mil duzentos e quarenta e cinco euros). Por outro lado, por despacho proferido em 12.11.2019 (Ref. 122158451), foi fixado em 30 (trinta) dias o prazo para o Executado realizar as obras especificadas na alínea a) do dispositivo da sentença exequenda... As obras tiveram início no dia 16.07.2020, pelo que deveriam todos os trabalhos sido realizados até 15.08.2020, o que, não se verificou... No referido despacho datado de 19.11.2019, foi determinado aplicar ao Executado uma a sanção pecuniária compulsória de 150,00 EUR (cento e cinquenta euros), por cada dia de atraso na conclusão das obras... Desde a data em que as obras deveriam ter sido concluídas (15.08.202) até à presente data (25.03.2022) já decorreram 587 (quinhentos e oitenta e sete) dias... Assim, até à presente data, a sanção compulsória a aplicar ao Executado ascende a 88.050,00 EUR (oitenta e oito mil e cinquenta euros)... Face ao exposto, e uma vez que os valores já se encontram liquidados, requer-se que seja ordenada a penhora de bens do Executado suficientes para pagamento das quantias referidas, num total de 95.295,00 EUR (noventa e cinco mil duzentos e noventa e cinco euros), nos termos do disposto nos art.ºs 868.º, n.º 1, e 870.º, n.º 2, ambos do CPC...”
I.19. Por requerimento de 28/3/2022 o executado veio dizer que realizou “a reparação no prazo determinado embora com defeitos como consta do relatório pericial pelo que não pode aceitar o peticionado quanto ao pagamento da sanção pecuniária compulsória”, e porque foi requerida conversão requer o prazo de 15 dias para o pagamento da quantia de 7.245,00 euros do relatório pericial.
I.20. Por despacho de 3/6/2022 ordenou-se o prosseguimento da execução como requerido pelo exequente com a penhora de bens suficientes para o pagamento dos custos da reparação por outrem.
I.21. Aos 8/8/2022 é proferido o despacho recorrido que indefere o pedido de execução da sanção pecuniária compulsória pelas razões constantes do mesmo e que aqui se reproduzem.
I.22. Inconformado com a decisão de 8/8/2022 dela apelou o exequente em cujas alegações conclui em suma:
a) A decisão viola o princípio da segurança jurídica e o disposto no art.º 868 do C.P.C e deve ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da execução para a penhora de bens do executado suficientes para o pagamento da quanta devida a título de sanção pecuniária compulsória no montante já liquidado nos termos dos art.ºs 868/1 e 870/2, foi o comportamento inadimplente do executado que ao incumprir com a execução da prestação no prazo que lhe foi concedido pela decisão transitada m julgado determinou a conversão da execução para pagamento de quantia certa e com o despacho de 12/11/2019 nasceu uma nova obrigação que não pode ser afastada pela decisão ora recorrida, sendo que só o cumprimento integral da obrigação do devedor afasta aplicação da sanção pecuniária compulsória e já não assim acontece em caso de cumprimento parcial ou cumprimento defeituoso, ao decidir como decidiu o Tribunal recorrido está a deturpar e a esvaziar de conteúdo tal mecanismo pois a mensagem que passa ao devedor é a de que o incumprimento não é relevante a partir do momento em que o credor requer o cumprimento da prestação por outrem. [Conclusões A a I]
b) A decisão atribui efeitos retroactivo à conversão da execução para prestação de facto e execução para pagamento de quantia certa afectando a eficácia e exequibilidade da decisão transitada em julgado de aplicação da sanção pecuniária compulsória ao executado, efeitos retractivos que a decisão já não pode produzir já que o pedido de prestação da obrigação por outrem por parte do Exequente em resultado do incumprimento por parte do devedor apenas poderá produzir efeitos para o futuro e apenas poderia fazer cessar os efeitos da sanção pecuniária compulsória a partir da data de deferimento de tal pedido e nunca para o passado já que os pressupostos da aplicação de tal sanção em caso de pedido de realização da prestação por outrem, cessa a partir da data em que tal pedido é deferido pelo tribunal, sendo a sanção devida desde o termo do prazo concedido ao devedor para o cumprimento da obrigação e a data em que foi determinada a prestação por outrem por isso a sanção é devida desde 16/8/2020 dia seguinte aos termo do prazo de 30 dias que o Tribunal determinou e foi aceite pelo executado para a execução da sobras que tiveram inicio em 176/7/2020  e 3/6/2022 data em o Tribunal determinou a conversão da execução, uma vez que entre tais datas medeiam 688 dias, à razão de 150,00 euros/dia totaliza 103.200,00 euros, a decisão viola o caso julgado da decisão proferida aos 12/11/2019 e transitada em julgado violando ao mesmo tempo o princípio da segurança jurídica de que o instituto do caso julgado é expressão plena. [Conclusões J a S]
c) Não pode, igualmente, o Exequente concordar com o entendimento do Tribunal de que não é de aplicar a sanção pecuniária compulsória ao cumprimento defeituoso, pois o cumprimento defeituoso não mais do que um incumprimento parcial como resulta do art.º 799 do CCiv, mantendo por isso o credor o direito à sanção pecuniária compulsória até ao efectivo e integral cumprimento pelo devedor, o próprio Tribunal considerou o incumprimento da prestação por parte do Executado no despacho de 7/2/2022, devendo ser revogada a decisão e ser substituída por outra que ordene o prosseguimento da execução para penhora de bens do executado suficientes ara o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória no montante já liquidado pelo exequente nos termos do art.º 868/1 e 870/2 do C.P.C.
Termina pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por acórdão que ordene o prosseguimento da execução para penhora de bens do executado suficientes para o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória.
I.23. Em contra-alegações conclui em suma o executado:
a) O executado procedeu ao cumprimento da obrigação, o exequente alegando incumprimento da prestação e facto no prazo judicialmente fixado veio requerer a realização da prestação por outrem,, foi nomeado perito idóneo que considerou haver cumprimento defeituoso tendo o perito estipulado o valor a liquidar pelo executado para reparação dos vícios, valor que o executado não impugnou nem o exequente, razão pela qual não procedeu à oposição e pagou voluntariamente os valores atribuídos pelo perito.[Conclusões a) a f)]
b) Nesta fase não há prejuízo algum para o recorrente, pretende o exequente o seu enriquecimento sem causa, não deve o executado ser obrigado a pagar valor pela sanção pecuniária compulsória. [Conclusões g) a i)]
I.24. Os autos formam aos vistos dos Ex.mos juízes adjuntos que nada sugeriram, mantendo-se a instância válida e regular.
I.25. São as seguintes as questões a dirimir:
Saber se tendo sido fixada, por despacho de 12/11/2019 sanção pecuniária compulsória, não tendo havido cumprimento integral da prestação de facto a que o executado estava obrigado pela sentença de 2015, ela é devida  pelo período que mediou entre 16/8/2020- dia seguinte ao termo do prazo de 30 dias determinado pelo Tribunal e aceite para a execução as obras que tiveram o seu início em 16/7/2020, que se verificou terem sido defeituosamente cumpridas- e 3/6/2022, data em que o Tribunal determinou a conversão da execução em execução para pagamento de quantia certa, sob pena de ofensa do caso julgado formado pelo despacho de 12/11/2019.
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Constitui matéria de facto para a decisão da questão o que consta sob I supra.
III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 635, n.º 4, 639, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3. Saber se, tendo sido fixada por despacho de 12/11/2019 sanção pecuniária compulsória, não tendo havido cumprimento integral da prestação de facto a que o executado estava obrigado pela sentença de 2015, ela é devida  pelo período que mediou entre 16/8/2020- dia seguinte ao termo do prazo de 30 dias determinado pelo Tribunal e aceite para a execução as obras que tiveram o seu início em 16/7/2020, que se verificou terem sido defeituosamente cumpridas e 3/6/2022- data em que o Tribunal determinou a conversão da execução em execução para pagamento de quantia certa, sob pena de ofensa do caso julgado formado pelo despacho de 12/11/2019.
III.3.1. A questão coloca-se do seguinte modo: tendo o executado sido condenado a realizar certas reparações na obra que executara para o exequente no âmbito da empreitada entre ambos acordada de modo reconhecidamente imperfeito, não tendo sido fixado prazo na sentença para a execução dessa reparações nem sanção pecuniária compulsória, isto nos idos de 2015, iniciando-se a execução em 2017 com alguns percalços iniciais, incluindo a nulidade de citação, declarada em 2018, prosseguindo os termos regulares, ocorrendo, em 12/11/2019, o referido despacho, que fixou em 30 dias a contar de certos condicionalismos de licenciamento de obras, o prazo para a sua realização, acordando o exequente em que as obras poderiam ter início em 16/7/2020, verificando-se, após comprovação pericial em Setembro de 2021, que as reparações no decurso da execução tinham sido executadas com defeito e que o custo da sua integral realização era o mencionado 7.245,00 euros, renovando o exequente o seu pedido de conversão da execução de prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa com pedido de penhora de bem suficientes para o pagamento da sanção pecuniária que liquida e do valor fixado na sentença, porque foi requerida a prestação de facto por outrem deixou de fazer sentido a sanção pecuniária judicialmente estabelecida. De acordo com o disposto no art.º 817.º do CC, não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor.
III.3.2. O credor pode, assim, solicitar ao tribunal que condene o devedor a cumprir, se a prestação ainda puder ser efetuada; se o devedor judicialmente condenado não cumprir, pode recorrer à execução, requerendo a realização coactiva da prestação.
III.3.3. A execução de uma prestação pode ser específica (quando se pretende a realização da prestação incumprida) ou não específica (quando se visa obtenção de um valor patrimonial ou quantia pecuniária destinada a servir de sucedâneo da prestação não realizada).
III.3.4. São suscetíveis de execução específica as prestações que consistem na entrega de coisa determinada (art.º 827.º do CC), as prestações de facto negativo e as emergentes de contrato promessa (art.º 830.º do CC). De igual modo, nas prestações de facto fungível. A prestação diz-se fungível quando pode ser realizada por pessoa diferente do devedor e infungível a que apenas pode ser realizada pelo devedor - cf. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, Almedina, 3ª edição, págs. 85 e ss. e Almeida e Costa, Direito das Obrigações, Coimbra editora, 4ª edição, pág. 466. Donde a necessidade de encontrar um instrumento destinado a fazer pressão sobre o devedor e a vencer a sua resistência, a fim de o decidir a cumprir voluntariamente as obrigações não suscetíveis de «cumprimento forçado», isto é, de execução in natura, por falta de correspondente ação executiva que efective e actue a sentença de condenação no cumprimento. [2] Daí a sanção pecuniária compulsória, consagrada no art.º 829.º-A do Código Civil, normativo introduzido pelo Decreto-Lei n.º 262/83, de 16 de Junho, em cujo nº 1 se estabelece que “nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso”. De harmonia com o disposto no art.º  767.º, n.º 2 do CC, ressalvando os casos em que expressamente se tenha acordado que a prestação deva ser feita pelo devedor (a designada infungibilidade convencional) ou em que a substituição prejudique o credor (infungibilidade natural, fundada na natureza da prestação), as obrigações de prestação de facto são fungíveis.
III.3.5. Ora, no caso, e não havendo acordo que exclua a intervenção de terceiro, a realização das obras por outrem, que não os réus, só é legítima se não prejudicar os autores. E isto porque, como refere Calvão da Silva, na obra citada, quando a substituição do devedor por terceiro prejudique o credor, este pode recusar a prestação, não havendo lugar ao chamado cumprimento por terceiro. E assim, só em função do interesse concreto do credor, se pode resolver a questão da fungibilidade ou infungibilidade. Ponderando o caso concreto, nada obstava que, caso, os réus não procedessem à realização das obras, as mesmas fossem realizadas por outrem, - o que veio a ser requerido e deferido- e que os interesses dos autores sejam realizados. Dispõe o artigo 828º do Código Civil que, o credor de prestação de facto fungível tem a faculdade de requerer, em execução, que o facto seja prestado por outrem à custa do devedor. É o caso dos presentes autos, uma vez que se os réus não cumprirem (e não iniciarem a realização das obras após o trânsito em julgado da sentença), podem os autores requerer a prestação por outrem.
III.3.5. Dispõe o artigo 829º-A do Código Civil que “nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo (…), o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor no pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento”, a fixar “segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar”. A sanção pecuniária compulsória destina-se a forçar o demandado resistente a abster-se de um comportamento que lhe está proibido, designadamente fazendo “acompanhar a condenação no cumprimento, de medidas destinadas a exercer pressão sobre a vontade do devedor, capazes de vencer a sua rebeldia e de decidi-lo a cumprir voluntariamente” (CALVÃO DA SILVA, “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 1995, pg. 372). A sanção pecuniária compulsória só é possível em relação às obrigações de facere ou non facere infungíveis (neste sentido, veja-se os Acórdãos da Relação do Porto de 30/04/2009 e de 04/06/2012, da Relação de Guimarães de 28/09/2010 e da Relação de Lisboa de 13/02/2014, in www.dgsi.pt). Tratando-se de uma prestação de facto fungível, a mesma pode ser realizada por pessoa diferente do devedor, sem que daí resulte qualquer prejuízo para o interesse do credor – ver Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 10.ª edição, pág. 97 – fungibilidade que aparece legalmente consagrada no artigo 767º do C.C. “E compreende-se que assim seja, pois que consistindo a sanção pecuniária compulsória uma medida coercitiva de caracter compulsório que visa forçar o devedor a cumprir, não faz sentido que essa coercividade seja usada nas situações em que o facto possa ser prestado por terceiro ou até pelo próprio credor que depois pode fazer repercutir esse custo na esfera patrimonial do devedor” – Acórdão do STJ de 19/09/2019, processo n.º 939/14.6T8LOU-H.P1.S1 (Maria João Vaz Tomé), in www.dgsi.pt
III.3.6. Se o exequente optar pela prestação por outrem, por entender que estava perante facto fungível, não pode reclamar sanção pecuniária compulsória, pois a mesma, como vimos, ao abrigo do art.º 829º-A, do CC, destina-se apenas a cobrir a hipótese de prestação de facto infungível.
III.3.7. No requerimento executivo o exequente pedia que se fixasse prazo ao executado para efectivar a  reparação em que fora condenado por sentença na medida em que não tinha sido fixado e ainda requereu a fixação de sanção pecuniária compulsória tido nos termos do art.º 874 conjugado com o disposto no art.º 868 cujo n.º 1 segunda parte estatui  quer o credor “pode também requerer o pagamento de quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória em que o devedor tenha sido já condenado ou cuja fixação o credor pretenda obter no processos executivo”. Por despacho de 12/11/2019, fixou-se em 30 dias o prazo para a realização das mesmas obras de reparação e para o efeito de licenciamento das obras o executado deve indicar nos autos em 5 dias os elementos de identificação do exequente necessários para instruir o respectivo pedido e o exequente prestar nos autos por requerimento as informações solicitadas pelo executado para esse efeito, iniciando-se o prazo de 30 dias no quinto dia posterior à data da notificação à ilustre mandatária do executado do requerimento referido em b) e, considerando tempo decorrido desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda e a natureza das obras a realizar aplicou ao executado a sanção pecuniária compulsória de 150,00 euros por cada dia de atraso na sua conclusão. Aqui surge a primeira dúvida: se a prestação da reparação pode ser efectuada por terceiros, não se tendo convencionado que só possa ser efectuada pelo próprio empreiteiro que cumpriu defeituosamente (ao que tudo indica por duas vezes) então a conclusão é a de que a sanção pecuniária compulsória não devia ter sido fixada porque a tanto se opõe a letra da própria lei.[3] III.3.8. E tendo sido fixada, embora contra legem, ela é devida pelo período em que a reparação podia ser efectuada pelo responsável e não o foi cabalmente por ter sido defeituosamente cumprida essa reparação e até ao momento em que se deferiu a conversão da execução para prestação de facto, sob pena de violação do caso julgado formado pelo despacho de 12/11/2019? No caso concreto o exequente por diversas vezes desde que fez entrar o requerimento executivo requer a conversão da execução em execução para pagamento de quantia certa onde liquidou também o montante da sanção pecuniária compulsório em suma alegando que o executado se furtava ao cumprimento do sentenciado, e que as exigências da Câmara Municipal não faziam sentido. Sobre tal requerimento veio a incidir em data posterior o despacho de 24/6/2020 onde se colhe entre o mais que: “...Neste contexto, não é possível concluir, como defende o exequente, que o pedido adicional pelo executado desse documento constitui um expediente dilatório demonstrativo de que não é intenção do executado realizar a prestação em que foi condenado sendo certo que, através dos requerimentos de 27/01/2020 (referência n.º 16242238) e 04/02/2020 (referência n.º 16299972), veio o executado solicitar no processo, por duas vezes, que o exequente fornecesse o elemento em causa... segundo requerimento do executado de 26/02/2020, já foi emitida a licença municipal em causa, pelo que já estarão reunidas as condições legais para a sua realização. Assim sendo, não se pode concluir que está verificado o pressuposto básico de que depende, nos termos do artigo 875.º, n.º 2, do CPC, a conversão da presente execução em execução para pagamento de quantia certa (artigos 868.º e seguintes do CPC): a não realização – leia-se, voluntária – da prestação de facto pelo executado dentro do prazo judicialmente fixado.
E, faltando esse pressuposto, também não se pode permitir que a execução prossiga para pagamento da sanção pecuniária compulsória fixada no aludido despacho de 12/11/2019, como igualmente solicitado pelo exequente no requerimento em apreço.” Tendo já as licenças necessárias o executado, por requerimento de 9/7/2020 o exequente veio informar que “as obras poderão ter início na próxima quinta-feira, dia 16.07.2020, pelas 9h00 horas.” E em 6/9/3021 veio a constata-se que as reparações foram defeituosamente realizadas. Nunca aquele despacho de 19/11/2019 foi revogado, será que com o pedido de conversão da execução depois renovado e deferido a sanção pecuniária compulsória perdeu a razão de ser. No Referido Acórdão de Maria João Vaz Tomé entendeu-se numa situação paralela mas de alguma foram inversas (sentença dada à execução fixa a sanção pecuniária compulsória mas no requerimento executivo o exequente opta desse logo pela prestação de facto por outrem) entre o mais que: “...O art.º 619.º, do CPC, estabelece que uma vez transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos art.ºs 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos art.ºs 696.º-702.º, do mesmo corpo de normas.... Delineados os contornos do alcance do caso julgado material, pode dizer-se que, ao contrário do acórdão recorrido, a sentença proferida no processo n.º 2558/08.7TBAMT do extinto 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Amarante transitou em julgado. Independentemente de a ação declarativa não ter sido contestada pelos Recorridos, afigura-se indiscutível a conclusão de que a sentença dada à execução incidiu sobre o mérito da causa e sobre a relação material controvertida e, como tal, adquiriu força de caso julgado material (art.º 619.º, n.º 1, do CPC sendo, desse modo, posteriormente imodificável. Nela se definiu, definitivamente, que assistia aos Exequentes o direito a haverem dos Executados a “quantia de 2 UC por cada dia de atraso no cumprimento dos trabalhos supra ordenados, para além dos 30 dias acima concedidos contados do trânsito em julgado desta decisão, a título de sanção pecuniária compulsória”, tendo estes sido condenados a satisfazê-la. Todavia, o Tribunal de 1.ª Instância, levando em linha de conta a natureza fungível da prestação de facto exequenda, entendeu que o montante fixado a título de sanção pecuniária compulsória não era devido aos Recorrentes. Tribunal da Relação do Porto, por seu turno, apesar de confrontado com a alegação de ofensa do caso julgado formado no processo n.º 2558/08.7TBAMT ancorou-se em considerações respeitantes ao escopo e ao âmbito de aplicação do art.º 933.º, n.º 1, in fine, do anterior CPC (correspondente ao art.º 868.º, n.º 1, do CPC atualmente em vigor), para manter a decisão apelada, entendendo que a mesma não merecia qualquer censura. Poderia, assim, à primeira vista, afirmar-se que o Tribunal de 1.ª Instância –diretamente - e o Tribunal da Relação do Porto – indiretamente - acabaram, deste modo, por reapreciar e decidir a relação jurídica controvertida em sentido oposto àquele que fora definido na sentença exequenda, tendo, na prática, procedido à sua revogação no que toca ao pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória. É precisamente a essa luz que se deve entender a decisão de que a execução não deveria abranger a penhora de bens necessários ao pagamento da quantia fixada a título de sanção pecuniária compulsória. Isto contrariaria o princípio segundo o qual a sentença dada à execução determina os limites e os fins da ação executiva (art.º 10.º, n.º 5, do CPC). Verificar-se-ia, por conseguinte, uma ofensa ao caso julgado material formado na precedente ação declarativa tendo sido indevidamente desconsiderado o efeito negativo e preclusivo do caso julgado material. A condenação no pagamento da sanção pecuniária compulsória encontra-se intimamente ligada à condenação do devedor na realização da prestação de facto, na medida em que visa compeli-lo a adotar a conduta devida, até então por si omitida. Tem, outrossim, em vista assegurar a observância da sentença condenatória. No caso em apreço, os Recorrentes, no requerimento executivo, optaram pela prestação por outrem - e não pelos Recorridos. Deste modo, verifica-se que o requerimento do pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, em que os Recorridos foram condenados, não encontra respaldo na sentença exequenda. É que a condenação nesse pagamento pressupõe, de acordo com a sentença, a prestação pelos Recorridos e não por outrem à custa destes. O caso julgado formou-se nestes precisos termos, de um lado e, de outro, a execução tem de respeitar o título executivo. A pretensão da realização da prestação por outrem não é teleologicamente compatível com a pretensão do pagamento da quantia devida como sanção pecuniária compulsória. Os Recorrentes como que renunciaram a este meio de tutela quando requereram a prestação por outrem. Não se cura, nesta sede, de apreciar o caráter (in)fungível da prestação e a compatibilidade material da condenação no seu comprimento com a medida compulsória em causa. A sede própria para esta discussão era a ação declarativa. Não se reaprecia e nem se descura, pois, o que já foi decidido. O efeito preclusivo das exceções alegáveis na ação declarativa dissolveu-se no efeito geral do caso julgado... Não podem, por isso, os Recorrentes, no caso sub judice, obter a cobrança coerciva dos montantes previamente fixados, em sede declarativa, a título de sanção pecuniária compulsória correspondente ao lapso de tempo compreendido entre 9 de setembro de 2009 e a data da realização da prestação de facto. Em jeito de conclusão, pode dizer-se que não se verifica ofensa do caso julgado no que toca ao afastamento do pagamento desta sanção compulsória no período subsequente a 9 de setembro de 2009: data da propositura da ação executiva em que os Recorrentes requerem a realização da prestação por outrem. Enquanto meio de coerção, a sanção pecuniária compulsória deixou então de produzir efeitos. Desapareceu o pressuposto da sanção em apreço e, por isso, não pode continuar a pressionar-se os Recorridos, dada a irrelevância da sua vontade. Não pode, todavia, afirmar-se o mesmo a propósito da sanção pecuniária compulsória liquidada no montante de €7.920, correspondente ao período que medeia entre 8 de agosto (termo do prazo judicialmente fixado para a realização da prestação pelos Recorridos e momento a partir do qual a sanção pecuniária compulsória decretada começa a produzir efeitos) e 9 de setembro de 2009 (data da instauração da ação executiva, do requerimento da prestação por outrem). É que, nesta parte, já há ofensa de caso julgado, pois que os Recorrentes aguardavam o cumprimento da prestação pelos Recorridos, ainda não tinham optado pela prestação por outrem, os Recorridos podiam mas não cumpriram a obrigação principal a que estavam vinculados e em cujo cumprimento haviam sido condenados. O requerimento da prestação por outrem apenas faz cessar os efeitos da sanção pecuniária compulsória para o futuro, não para o passado.” Sobre este acórdão o Professor Miguel Teixeira de Sousa no seu blog veio a pronunciar-se em discordância em suma dizendo: “...4. [Comentário] a) Com todo o devido respeito, a decisão do STJ não é defensável. É claro que, nesta matéria, os equívocos começaram na decisão condenatória proferida na anterior acção declarativa, na qual, apesar de se ter qualificado (ou aceitado) a prestação dos réus como sendo uma prestação de facto fungível, ainda assim se condenou, em clara violação do disposto no art.º 829.º-A, n.º 1, CC, os demandados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória. Já na execução proposta na sequência da condenação proferida no processo declarativo, o tribunal de 1.ª instância e Relação procuraram "emendar" a decisão condenatória, defendendo que, sendo a obrigação fungível, nunca pode haver condenação (nem, naturalmente, consequente execução) de qualquer sanção pecuniária compulsória. No acórdão em análise, o STJ entendeu que os executados tinham direito à sanção pecuniária compulsória "correspondente ao período que medeia entre 8 de agosto (termo do prazo judicialmente fixado para a realização da prestação pelos Recorridos e momento a partir do qual a sanção pecuniária compulsória decretada começa a produzir efeitos) e 9 de setembro de 2009 (data da instauração da ação executiva, do requerimento da prestação por outrem)". Salvo o devido respeito, esta solução não parece aceitável b) No âmbito das decisões "viciadas", a doutrina processualista alemã trabalha, pelo menos desde os anos 50 do Século passado (Jauernig, Das fehlerhafte Urteil (1958)), com o conceito de "decisões ineficazes". Esta ineficácia da decisão pode ter várias causas. Assim, entre outras situações, "uma sentença é ineficaz, quando ela pronuncia ou ordena uma consequência jurídica que, de acordo com a sua natureza, é desconhecida do direito vigente, como, por exemplo, quando [...] condena numa prestação que não existe segundo o direito vigente" (Rosenberg/Schwab/Gottwald, Zivilprozessrecht (2018), 352 Quer dizer: a sentença tem de se movimentar no quadro do ordenamento jurídico, não podendo construir algo que está fora deste ordenamento. Nem o caso julgado obsta a esta conclusão, nomeadamente quando num outro processo -- como, in casu, num processo executivo -- se invoca o vício da decisão. Efectivamente, o que está fora do ordenamento jurídico não entra neste através do caso julgado, pois que este está tanto fora do ordenamento como a própria decisão a que se refere. Neste contexto, a ideia de que o caso julgado faz do branco, preto, e do recto, curvo (e vice-versa), já fez o seu tempo. c) A acima referida sentença condenatória constitui um bom exemplo de uma decisão ineficaz na acepção da doutrina alemã: ao mesmo tempo que condena os réus a reporem a nascente no estado em que se encontrava antes dos movimentos de terras, condenou esses réus no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória. Atendendo ao disposto no art.º 829.º-A, n.º 1, CC, isto é, naturalmente, contraditório, porque da premissa (prestação fungível) nunca pode decorrer a consequência (sanção pecuniária compulsória). Repare-se não se trata de discutir se a prestação que os demandados devem realizar é fungível ou infungível e, tendo-se concluído que se trata de uma prestação infungível, condenar esses réus no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória. Nesta hipótese, poderia haver discordâncias quanto ao carácter infungível da prestação, mas a decisão não padecia de nenhum vício intrínseco: em coerência com a qualificação atribuída, a condenação na sanção pecuniária compulsória era intocável.
O caso em análise é completamente diferente: não se discute o carácter fungível da prestação a que os réus são condenados, mas, ainda assim e manifestamente contra legem, condena-se os mesmos réus no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória. Ou seja, extraiu-se de uma premissa uma consequência inexistente na ordem jurídica portuguesa, dado que, quanto a prestações fungíveis, nunca é aplicável o regime da sanção pecuniária compulsória. Como se disse, as instâncias -- quiçá pressentindo a "ineficácia" da decisão condenatória -- procuraram, através da interpretação desta decisão, afastar a exigibilidade e a execução da sanção pecuniária compulsória. Estranhamente, o STJ não seguiu este caminho, antes entendeu que a prestação era infungível até ao momento em que o exequente pediu a sua sua execução por outrem, momento em que a prestação de infungível passa a fungível. Dado que a fungibilidade ou a infungibilidade de uma prestação é definida por critérios objectivos e não pode depender da vontade do credor, trata-se de uma solução que não parece nada feliz.”
III.3.9. Dispõe o art.º 10/5 que “toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”. A sentença dada à execução não só não fixou prazo para as reparações como não condenou o empreiteiro em sanção pecuniária compulsória. Realizando a interpretação da sentença nenhum subsídio se colhe em relação à configuração da prestação de reparação dos defeitos da obra por parte empreiteiro como uma prestação infungível, o que a lei diz é que realizada a obra defeituosamente o empreiteiro tem não só a obrigação como o direito em primeira linha de os reparar, salvo as situações que a doutrina e a jurisprudência tem qualificado como de situações de urgência que não são compatíveis com a concessão de prazo ao empreiteiro para a reparação que na maior parte dos casos não são atendidas como é do conhecimento público e notório. Mas no caso nada disse aconteceu. Nada se disse sobre a natureza da prestação e reparação do empreiteiro, não se fixou prazo para a reparação nem sanção pecuniária compulsória pela mora na execução integral da reparação. Contudo, por força do art.º 10/5, é a sentença que determina os limites da acção executiva, sendo que com essa disposição legal se tem de harmonizar o disposto no art.º 868 em que se suportou o requerimento do exequente e que levou ao despacho de 12/11/2019 que é muito singular na parte que ora importa” “...considerando o tempo decorrido desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda e a natureza das obras a realizar aplico ao executado a sanção pecuniária compulsória de 150,00 euros por cada dia de atraso na sua conclusão..”. Parece-nos salvo melhor e mais elucidada posição que este despacho proferido nesta execução que não incide sobre a relação processual antes sobre a relação material, não tem a força de caso julgado formal a que se refere o art.º 620; a relação material que já fora definida na sentença dada à execução dotada de força de caso julgado material e cujo teor define os limites da execução nada refere a propósito da sanção pecuniária compulsória, a decisão de 12/11/2019 como se disse indo para além dos concretos termos do título dado à execução não é susceptível de execução por força da própria lei. Poder-se-ia ir mesmo mais longe e como defende o professor Teixeira de Sousa na referida anotação, poder-se-ia considerar aquele seguimento da decisão ineficaz e por isso insuscetível de servir de base à execução para pagamento de quantia certa pela referida quantia. Numa outra perspectiva também defendida na decisão recorrida poder-se-á dizer que ao optar pela prestação de facto por outrem dentro da própria execução o exequente esvaziou razão de ser e a finalidade da sanção pecuniária compulsória fixada naquele despacho.

IV-DECISÃO
Tudo visto e pelas razões expostas em III supra acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
As Custas são da responsabilidade do apelante em razão do decaimento e por força do art.º 527/1 e 2

Lxa., 09 de fevereiro de 2023
João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Leal
Nelson Borges Carneiro
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[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/6, entrado em vigor a 1/9/2013,  atento o disposto no art.º 6/1 da referida Lei atenta a data do início da execução em 2017 e a da decisão em 2022; ao Código referido, na redacção dada pela referida Lei, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2] Calvão da Silva, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Coimbra, 1987, 355 e Pedro Albuquerque, o Direito ao Cumprimento de Prestação de Facto, o Dever de a Cumprir e o Princípio nemo ad factum cogi potest, Providência Cautelar, Sanção Pecuniária Compulsória e Caução, Boletim da Ordem Advogados, Ano 2 (2013), nº 9, 8981-9041
[3] Entendimento unânime tanto quanto se saiba na doutrina e jurisprudência de que são reflexo os Acórdãos da Relação de Guimarães de 25/2/2021 no processo 335/20.6t8gmp-a.g1 relatado por Ana Cristina Duarte, do Supremo Tribunal de Justiça de 10/12/2020 no processos 1695/17.t8pdl.a-l2.s1 relatado pro Maria do Rosário Morgado, do STJ de  19 Setembro 2019, Processo nº 939/14.6T8LOU-H.P1.S1 relatado por Maria João Vaz Tomé.