Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
25874/18.5T8LSB.L1-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: ARRENDAMENTO URBANO
OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/10/2020
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Ressalvadas as de conhecimento oficioso, não constituem objeto admissível do recurso questões que não tenham sido suscitadas pelas partes perante o tribunal a quo nem tenham sido objeto de apreciação por parte deste.
II. Não tendo a ré (inquilina) alegado, na primeira instância, que o meio formal de comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento urbano pelo senhorio era, nos termos constantes do contrato, a notificação judicial avulsa (também imposta pelo RAU, que vigorava à data da celebração do contrato), sendo vontade das partes que esse meio não pudesse ser substituído por meio de comunicação menos solene, não se tendo assim suscitado, perante o tribunal a quo, qualquer reparo quanto ao meio utilizado pelo senhorio - carta registada com aviso de receção, para o efeito prevista no NRAU - para, já em tempo de vigência do NRAU, declarar opor-se à renovação do contrato, vedado está à ré apelante alegar, em sede de recurso, o factualismo supra referido, a título de exceção perentória de que o tribunal supostamente deveria ter conhecido oficiosamente, com a consequente pretensa nulidade da decisão final.
III. Estando a decorrer um prazo de renovação de contrato de arrendamento urbano habitacional com prazo certo, cujo termo findava a 30 de setembro de 2019, se o senhorio, em julho de 2017, comunicar à inquilina a sua oposição à renovação do contrato, daí extraindo a conclusão, na dita comunicação, de que o referido contrato cessaria os seus efeitos a partir de 30 de setembro de 2018, deverá tal declaração ser interpretada, nos termos do art.º 236.º n.º 1 do CC, como visando evitar a renovação do contrato no termo do período efetivo da renovação em curso, isto é, 30 de setembro de 2019, data em que a referida comunicação produzirá os seus efeitos.
IV. Na situação referida em III, se em novembro de 2018 o senhorio reclamar judicialmente o imóvel, invocando a pretérita cessação do arrendamento em setembro de 2018 por força da não renovação do contrato operada pela comunicação de oposição à renovação, e concluindo o tribunal que a dita declaração de oposição só produziria efeitos em 30 de setembro de 2019, deverá, por aplicação do art.º 610.º do CPC, decidir em conformidade, condenando nos respetivos termos.
V. A Lei n.º 30/2018, de 16.7, que consagrou um regime extraordinário e transitório para proteção de pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias e residam no mesmo locado há mais de 15 anos, não se aplica a contratos de arrendamento com duração igual ou inferior a 15 anos à data da sua entrada em vigor.
VI. O regime previsto na Lei n.º 30/2018 não se aplica a declarações de oposição à renovação de contratos de arrendamento de duração limitada que, tendo sido emitidas antes da publicação da Lei, produzam os seus efeitos em data posterior à cessação da vigência da Lei, isto é, em data posterior a 31.3.2019.
VII. O regime previsto no n.º 5 do art.º 14.º da Lei n.º 13/2019, de 12.2, não se aplica a declarações de oposição à renovação do contrato de arrendamento enviadas antes da entrada em vigor da Lei n.º 30/2018, ou seja, antes de 17.7.2018.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Em 21.11.2018 Joana, Guilherme e Vitória instauraram ação declarativa de condenação (ação de reivindicação) com processo comum contra Francisca.
Os AA. alegaram, em síntese, que são proprietários de um prédio localizado em Alcântara, Lisboa, que identificaram. Em 01.10.2004 a anterior proprietária deu de arrendamento à ora R. o 2.º andar esquerdo do dito prédio, mediante renda que ultimamente tinha o valor de € 307,00 por mês. Tratava-se de contrato de duração limitada (cinco anos, renovável por períodos de um ano) e por carta registada com aviso de receção datada de 20.3.2017 e recebida a 19.7.2017, foi comunicada à R. a intenção de se não renovar o contrato de arrendamento, o qual cessaria os seus efeitos a partir de 30.9.2018. Porém a R. continuou a ocupar o locado, sendo certo que não possui título que legitime a ocupação do prédio.
Os AA. terminaram formulando o seguinte petitório:
Nestes termos e nos demais de direito, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e em consequência ser a ré condenada a:
a) reconhecer que os autores são os proprietários do 2º andar esquerdo A da Rua (…) do prédio em propriedade total sito na Rua Cruz de Alcântara, (…) em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, freguesia de Alcântara a descrição (…) e inscrita na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo (…)
b) ser condenada a entregar aos autores o 2º andar esquerdo livre e devoluto de pessoas e bens.
c) ser condenada aos autores uma quantia mensal 307,00 €, correspondente à utilização que aquela tem efectuado da coisa, desde 30 de Setembro de 2018 a data da aquisição até à efectiva entrega do andar.
d) ser condenada nas custas e procuradoria condigna.
A R. contestou, por exceção, alegando ter mais de 65 anos e residir no locado pelo menos desde 2002. Assim, pese embora tenha recebido a carta de oposição à renovação do contrato de arrendamento, aproveita-lhe o regime extraordinário e transitório previsto na Lei n.º 30/2018, de 16.7, que determinou a suspensão da oposição à renovação do arrendamento a pessoas idosas ou com deficiência, que residissem no locado havia mais de 15 anos. Por outro lado, arguiu a impropriedade do meio processual utilizado, o qual deveria ser uma ação de despejo. Acrescentou que tem vindo a depositar as rendas devidas.
A R. terminou pugnando pela procedência da exceção dilatória de erro na forma de processo e pela improcedência da ação, por não provada, reconhecendo-se a ineficácia da oposição à renovação comunicada pelos AA. e o direito da R. ao arrendamento.
A convite do tribunal, os AA. responderam, pugnando pela propriedade do meio processual utilizado e pela inaplicabilidade do regime extraordinário invocado.
Realizou-se audiência prévia, e dispensou-se audiência final, tendo em 24.01.2020 sido proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo:
Nesta conformidade e por todo o exposto, julgo parcialmente procedente a presente ação e, em consequência:
1. Declaro que o 2.º andar esquerdo A da rua (…) do prédio em propriedade total sito na Rua Cruz de Alcântara n.º (…) em Lisboa, descrito na Conservatória de Registo Predial de Lisboa, freguesia de Alcântara com a descrição (…) e inscrita na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo (…) é bem comum do casal composto pela autora Joana (…) e do seu falecido marido Guilherme (…) e que a autora é titular do seu direito à meação do património conjugal e todos os autores são herdeiros da herança indivisa aberta por óbito de Guilherme (…), da qual faz parte o direito à meação deste naquele património conjugal.
2. Condeno a ré a entregar aos autores a referida fração livre e devoluta de pessoas e bens.
3. Condeno a ré a pagar aos autores a quantia mensal de €307,00 a título de rendas vencidas, desde outubro de 2018 até setembro de 2019, devidas no âmbito do contrato de arrendamento objeto desta ação, sem prejuízo dos valores que a ré já tenha depositado, desde outubro de 2018 até 30/09/2019, à ordem do cabeça de casal da herança aberta por óbito de Guilherme (…).
4. Condeno a ré a pagar aos autores a quantia mensal de €307,00, correspondente à utilização que aquela tem efetuado da coisa, a partir de outubro de 2019, após a cessação do contrato, até à efetiva entrega do arrendado aos autores, sem prejuízo dos valores que já se encontram depositados, desde o dia 30/09/2019 até à presente data, à ordem do cabeça de casal da herança aberta por óbito de Guilherme (…).
5. Condeno os autores e ré no pagamento das custas judiciais devidas, na proporção dos respetivos decaimentos que se fixam em 23% para os autores e 77% para a ré.
Fixo à ação o valor de €16.000,00.
A R. apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões:
A. Como provado, o meio e a forma que a Autora usou para comunicar a não renovação do contrato de arrendamento (carta registada) não corresponde à forma da “comunicação pelo senhorio” que foi convencionada por acordo das partes (notificação judicial avulsa);
B. A falta da forma convencionada pelas partes é um facto que impede, modifica ou extingue o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, na medida em que essa comunicação é juridicamente ineficaz e insusceptível de produzir o efeito de cessar o arrendamento por oposição à renovação;
C. Esses factos integram uma excepção peremptória que o tribunal não conheceu oficiosamente, quando dela podia e devia ter tomado conhecimento e cuja invocação a lei não torna dependente da vontade do interessado;
D. A comunicação enviada à Ré continha uma indicação expressa da data em que o contrato cessaria (“…pelo que o referido contrato cessará os seus efeitos a partir de 30.09.2018…”), devendo ser interpretada e valer com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
E. O entendimento e interpretação feito pelo douto tribunal recorrido de que nessa declaração negocial pode também conter-se uma vontade de produção de efeitos para uma data diferente da declarada pela Autora (30 de setembro de 2019 e não 30 de setembro de 2018) é abusivo e não tem qualquer correspondência ou suporte nem na própria declaração nem nas regras que regulam a sua interpretação, pelo que não pode valer como declaração de não renovação do arrendamento com efeitos a 30 de setembro de 2019;
F. A única interpretação possível das vicissitudes contratuais do arrendamento em apreço caso se entenda que o mesmo não era renovável em 2018 é que o mesmo mantém-se ainda em vigor, podendo eventualmente ser cessado por meio de declaração de oposição à renovação com efeitos a 30 de setembro de 2021;
G. A sentença errou na parte em que, reconhecendo expressamente que o direito dos Autores não existia no momento em que a acção foi proposta, fundou a condenação no art. 611º do CPC, uma vez que o arrendamento não cessou por oposição nem em 2017, nem em 2019 e, portanto, mantém-se ainda em vigor, podendo eventualmente ser cessado por meio de declaração de oposição à renovação com efeitos a 30 de setembro de 2021.
H. A douta decisão recorrida deveria ter-se pronunciado sobre a questão de Ré ter estado abrangida pelo regime de proteção estabelecido pela Lei 30/2018, sem prejuízo das suas consequências, substanciais ou processuais, razão pela qual a mesma é nula, por ter omitido pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar;
I. A douta decisão recorrida violou fez errada interpretação jurídica, nomeadamente, das normas jurídicas constantes dos arts. 233º e 236º do CC, 579º, 611º e 615º do CPC.
A apelante terminou pedindo que a sentença recorrida fosse revogada e substituída por outra que decidisse os factos provados conformemente ao direito português aplicável ou, caso se entendesse necessário, que fosse decidida a baixa do processo à 1.ª instância para julgamento de questões de facto relevantes.
Os AA. contra-alegaram, tendo rematado com as seguintes conclusões:
1-O tribunal de recurso não deve conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, sendo que no âmbito do recurso determina-se pelas conclusões do recorrente (cfr. arts. 635º).
2- A douta Sentença proferida, objecto do presente recurso, não merece qualquer reparo e deverá manter-se, uma vez que, não violou qualquer preceito legal.
3-Nos termos do artigo n.º 1080º do Código Civil as normas sobre a resolução, a caducidade e a denúncia do arrendamento urbano têm natureza imperativa, salvo disposição legal em contrário.
4- O 1097º do Código Civil não obriga que a comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento tenha de revestir de uma notificação judicial avulsa, pelo que a carta registada com aviso de recepção foi o meio adequado para comunicar a cessação do contrato de arrendamento.
5- A cláusula contratual que prevê que a comunicação teria de ser efectuada por notificação judicial avulsa, por ser violadora de regras imperativas, em face do preceituado nos artigos 1079.º, 1080.º, 1083.º, n.º 3, e 1084.º, n.º 2, do CC, a mesma é nula, devendo ter-se por não escrita, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 271.º do CC.
6- A recorrente em sede de contestação não suscitou esta questão pelo que não pode pronunciar-se sobre as mesmas por não ser uma questão de conhecimento oficioso.
7- Enquanto circunstância impeditiva da eficácia da não renovação do contrato de arrendamento, pela sua própria natureza, esta excepção peremptória atípica não é de conhecimento oficioso, encontrando-se sempre dependente da vontade do interessado.
8- Por isso, deve sempre ser invocada pelo réu no adequado momento processual, em regra, na contestação, só o podendo ser posteriormente caso seja superveniente (art.ºs 571º, n.º 2 e 573º, ambos do Código de Processo Civil), o que não é manifestamente o caso dos presentes autos.
9- A recorrente não satisfez esse ónus de alegação e de prova, sendo que não reagiu quando recepcionou a carta a comunicar a não renovação do contrato de arrendamento, o que configura agora um abuso de direito.
10-Não ocorreu a violação do artigo 236º, nº 1 do Código Civil, pois foi claro para a recorrente, que o conteúdo da declaração consubstanciava-se na comunicação da não renovação do contrato de arrendamento, sendo que a data a partir do qual o mesmo cessaria é um elemento acessório.
11- O Tribunal não poderia deixar de valorar, ao abrigo do disposto no artigo 611.º do CPC, que, no momento da prolação da Sentença, que a comunicação de oposição à renovação já era plenamente eficaz.
12- O Tribunal pronunciou-se sobre todas as questões que foram suscitadas e não deixou de se pronunciar sobre nenhuma, pelo que não se verifica nenhuma nulidade.
Os apelados terminaram pedindo que fosse negado provimento ao recurso.
O tribunal a quo pronunciou-se pela inexistência de nulidades da sentença e admitiu o recurso.
Foram colhidos os vistos legais.
FUNDAMENTAÇÃO
As questões objeto deste recurso são as seguintes: conhecimento da exceção perentória de falta de cumprimento de forma convencionada; admissibilidade da produção de efeitos da declaração objeto da ação em data diversa da indicada pelos AA.; nulidade da sentença por falta de apreciação da aplicabilidade do regime previsto na Lei n.º 30/2018, de 16.7.
Primeira questão (conhecimento da exceção perentória de falta de cumprimento de forma convencionada)
O tribunal a quo deu como provada e não foi questionada a seguinte
Matéria de facto
1. O direito de propriedade sobre o 2.º andar esquerdo A da rua (…) do prédio em propriedade total sito na Rua Cruz de Alcântara n.º (…) em Lisboa, descrito na Conservatória de Registo Predial de Lisboa, freguesia de Alcântara com a descrição (…) e inscrita na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o artigo (…), encontra-se registado pela Ap. 26 de 1973/01/19 a favor de Joana (…), casada com Guilherme (…) no regime de comunhão geral.
2. No dia 27 de maio de 2018, faleceu Guilherme (…) deixando como seus únicos e universais herdeiros o seu cônjuge Joana (…), o seu filho Guilherme (…) e a sua neta Vitória (…), esta última filha de Margarida (…) que repudiou a herança aberta pelo óbito do seu pai.
3. No dia 1 de outubro de 2004, foi celebrado entre a autora Joana (…) e a ora ré, Francisca Maria o contrato de arrendamento de duração limitada, que se mostra junto aos autos a fls. 19 e ss. e se dá como integralmente reproduzido.
4. A cláusula 2ª desse contrato tem a seguinte redação: “O arrendamento é feito pelo prazo efectivo prazo de cinco anos, que se inicia a 1 DE OUTUBRO de 2004 e termina a 30 DE SETEMBRO DE 2009.”
5. A cláusula 3ª desse contrato tem a seguinte redação: “No fim do prazo convencionado, o contrato de arrendamento renova-se por períodos anuais enquanto não for denunciado por qualquer das partes contratantes”.
6. A renda mensal acordada, no montante de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), ascendeu durante ao ano de 2018 a € 307,00 (trezentos e sete euros).
7. Por carta registada, com aviso de receção, datada de 20 de Março de 2017 e recebida a 18 de Julho de 2017, assinada pela autora Joana (…), que se mostra junta aos autos a fls. 26 e cujo teor aqui se deixa reproduzido, foi comunicada à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento, o qual cessaria os seus efeitos a partir de 30 de Setembro de 2018.
8. Após 30 de Setembro de 2018 a ré continuou a habitar o locado, não o tendo entregue devoluto de pessoas e bens.
9. A ré nasceu no 13 de abril de 1952.
10. A ré tem depositado todos os meses, desde outubro de 2018, em conta n.º (…) Caixa geral de Depósitos, à ordem de “Guilherme (…)– Cabeça-de-Casal de herança”, o montante de €307,00.
O Direito
Esta ação tem por objeto um contrato de arrendamento urbano, para habitação, que foi celebrado à luz do regime de arrendamento urbano aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15.10 (RAU). Tal conforme permitido pelos artigos 98.º n.º 1 e 100.º n.º 1 do RAU, ao contrato foi fixada duração limitada, de cinco anos, anualmente renovável, salvo se qualquer dos contraentes não “denunciasse” o contrato. Nos termos da lei então em vigor, a dita declaração de “denúncia”, quando proveniente do senhorio, deveria ser feita mediante notificação judicial avulsa (n.º 2 do art.º 100.º do RAU).
A admissibilidade de contratos de arrendamento urbano sujeitos a prazo certo, renováveis salvo se qualquer dos contraentes declarar a sua oposição à renovação, manteve-se no novo regime de arrendamento urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27.02 (artigos 1095.º e 1096.º do Código Civil, quanto ao arrendamento para habitação). De acordo com o regime do NRAU, que também é aplicável aos contratos existentes à data da sua entrada em vigor (artigos 26.º n.º 1, 27.º n.º 1 e 59.º n.º 1 do NRAU; 12.º n.º 2, 2.ª parte, do Código Civil), as comunicações entre as partes, nomeadamente a comunicação de oposição à renovação do contrato, devem processar-se, na falta de disposição legal especial, por escrito assinado pelo declarante e remetido por carta registada com aviso de receção (artigos 1096.º n.º 2 e 1097.º do CC, 9.º n.º 1 do NRAU).
Na petição inicial alegou-se que o senhorio comunicou à R. a não renovação do contrato mediante carta registada com aviso de receção. Na contestação a R. confirmou tal afirmação, que foi dada como provada.
Alega agora a apelante que a comunicação em causa deveria ter sido processada por notificação judicial avulsa, por que era isso que estava convencionado no contrato. O tribunal a quo terá, assim, omitido a apreciação de questão que era de conhecimento oficioso.
Vejamos.
O processo civil constitui instrumento de tutela dos direitos e interesses legalmente protegidos na vertente do direito privado ou comum. Pese embora algumas matérias em que o interesse público impõe a imperatividade de certos aspetos do regime legal, a regra é a do predomínio, neste campo, da autonomia privada. Concomitantemente, no processo, vigora o princípio do dispositivo, devendo o tribunal ater-se ao que é pedido pelo autor (art.º 609.º n.º 1 do CPC), cingir-se aos factos essenciais alegados pelas partes para sustentarem a ação e a defesa (art.º 5.º n.º 1 do CPC) e não se ocupar de questões não suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (n.º 2 do art.º 608.º do CPC).
No caso dos autos os AA. alegaram que a comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento foi efetuada por carta registada com aviso de receção. Isto é, foi dada a conhecer à inquilina pela forma que na altura da sua execução estava prevista na lei (art.º 9.º n.º 1 do NRAU). Na contestação a R. não questionou a receção dessa comunicação, nem a sua regularidade formal.
Assim sendo, o aspeto agora invocado pela apelante, o de que as partes teriam convencionado que a dita comunicação seria efetuada por notificação judicial avulsa, e que assim se teriam querido obrigar nos termos previstos no art.º 223.º do Código Civil, é uma questão nova, que não é de conhecimento oficioso, que como tal deveria ter sido suscitada pela apelante na sua contestação (art.º 573.º do CPC).
De resto, cremos que na aludida cláusula as partes se limitaram a reproduzir aquele que era o regime legal então em vigor, não se mostrando que fosse sua intenção opor-se a uma outra solução formal menos exigente que o legislador porventura previsse ou viesse a prever.
Em suma, a questão ora suscitada não é admissível, porque não foi tempestivamente arguida perante o tribunal a quo, conforme exposto, sendo certo que ao tribunal ad quem cabe fiscalizar a correção da atuação jurisdicional exercida pelo tribunal a quo (art.º 627.º n.º 1), à luz dos termos do litígio que lhe foram regularmente apresentados pelas partes.
Nesta parte, pois, a apelação é improcedente.
Segunda questão (admissibilidade da produção de efeitos da declaração objeto da ação em data diversa da indicada pelos AA.)
O regime jurídico do arrendamento urbano tem-se pautado por permanente instabilidade, traduzida em sucessivas reformas e, dentro destas, reiteradas alterações e modificações. Tal é reflexo da relevância dos interesses em presença, em particular dos inquilinos, que no locado exercem a sua atividade económica ou satisfazem a necessidade, essencial, da habitação. Após um longo período em que o regime se caracterizou pelo chamado vinculismo, forçando os senhorios à sucessiva renovação dos contratos e à manutenção do valor das rendas inicialmente contratadas, com a publicação, em 1990, do RAU, consolidou-se um movimento de pendor contrário, mais sensível aos interesses dos proprietários e aberto ao livre funcionamento do mercado. Desde logo, admitiu-se a celebração de contratos de arrendamento urbano, para habitação, de duração limitada, por prazo não inferior a cinco anos, que seriam renováveis, pelo prazo supletivo de três anos, se outro não fosse convencionado, podendo qualquer das partes impedir a renovação, mediante declaração nesse sentido (apelidada pelo legislador de “denúncia” – art.º 100.º do RAU) emitida com uma determinada antecedência (um ano antes do termo do prazo ou da renovação, quanto ao senhorio – art.º 100.º n.º 2 do RAU).
O NRAU, que aprofundou esse pendor mais liberal das alterações ao regime do arrendamento urbano, manteve a possibilidade da celebração de contrato de arrendamento para habitação com prazo certo, com a duração mínima de cinco anos (art.º 1095.º n.º 2 do CC), automaticamente renovável pelo prazo supletivo de três anos (art.º 1096.º n.º 1), mediante declaração de oposição à renovação que, no caso do senhorio, deveria ter a antecedência mínima de um ano antes do termo do contrato ou da renovação (art.º 1097.º) – tudo à luz da versão inicial do NRAU.
Porém, conforme bem se analisou na sentença recorrida e não foi questionado pelas partes, o NRAU estabeleceu um regime próprio para os contratos habitacionais de duração limitada celebrados à luz do RAU.
Com efeito, no art.º 26.º n.º 3 do NRAU estipulou-se o seguinte:
3 - Os contratos de duração limitada renovam-se automaticamente, quando não sejam denunciados por qualquer das partes, no fim do prazo pelo qual foram celebrados, pelo período de três anos, se outro superior não tiver sido previsto, sendo a primeira renovação pelo período de cinco anos no caso de arrendamento para fim não habitacional.
E este artigo 26.º n.º 3 foi alterado pela Lei n.º 31/2012, de 14.8, que introduziu a seguinte redação:
3 - Quando não sejam denunciados por qualquer das partes, os contratos de duração limitada renovam-se automaticamente no fim do prazo pelo qual foram celebrados, pelo período de dois anos, se outro superior não tiver sido previsto.
Estas alterações tiveram como efeito, quanto ao contrato sub judice, o seguinte:
a) À luz do inicialmente contratado, tendo o contrato tido o seu início em 01.10.2004 e o prazo de cinco anos, renovar-se-ia a 30.9.2009, por períodos anuais;
b) Porém, por força do regime introduzido pela versão inicial do NRAU, em 30.9.2009 o contrato renovou-se, por mais três anos, isto é, até 30.9.2012;
c) Em 30.9.2012, na medida em que ainda não entrara em vigor a Lei n.º 31/2012, de 14.8 (entrou em vigor 90 dias após a sua publicação – art.º 15.º), o contrato renovou-se por mais três anos, isto é, até 30.9.2015;
d) Em 30.9.2015, por força da alteração introduzida pela Lei n.º 31/2012, o contrato renovou-se por mais dois anos, isto é, até 30.9.2017, e nessa data renovou-se por mais dois anos, isto é, até 30.9.2019.
Consequentemente, a pretensão dos AA., de que o contrato cessasse, por não renovação, em 30.9.2018, estava condenada ao fracasso.
Mas poderá aceitar-se, como ajuizou o tribunal a quo, que essa declaração produzisse efeitos a partir de 30.9.2019, data do termo do prazo em curso aquando da declaração?
A declaração de oposição à renovação do contrato constitui uma declaração unilateral recetícia, um negócio jurídico unilateral (art.º 295.º do CC), que tem por finalidade fazer cessar um vínculo contratual. Nesta modalidade de cessação do contrato, que alguma doutrina qualifica de denúncia indireta (Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, 3.ª edição, 2017, Almedina, pp. 118 e 122), a declaração de vontade corresponde ao exercício de um direito potestativo, que implica a caducidade do contrato. É um meio mediato ou indireto de extinção do contrato, por caducidade (neste sentido, Pedro Romano Martinez, obra e locais citados). Com efeito, por força dessa declaração, o contrato, decorrido o prazo inicial ou o da sua renovação, extingue-se, não operando a sua renovação automática. Assim sendo, o essencial, para a eficácia da declaração emitida pelo senhorio, é que seja dada a conhecer ao inquilino a vontade de não renovação do contrato, e que essa declaração seja emitida com a antecedência legalmente exigida face à data em que a extinção ocorrerá. Por exemplo, num contrato idêntico ao destes autos, se estivesse a correr um prazo de renovação do contrato que terminasse a 30 de setembro de 2019, se o senhorio declarasse a oposição à renovação a 30 de julho de 2019, tal declaração, por extemporânea (art.º 1097.º n.º 1 al. b) do CC – exigência de pré-aviso de 120 dias), seria ineficaz. Não lograria impedir a renovação do contrato em 30 de setembro de 2019. E o senhorio teria, então, para obstar à renovação do contrato no final do novo prazo, que emitir nova declaração, desta feita tempestiva, nesse sentido.
No caso destes autos não se põe a questão da intempestividade da declaração de oposição à renovação do contrato em curso. O prazo da renovação em curso terminava a 30.9.2019 e a inquilina recebeu a declaração de oposição à renovação em 18.7.2017.
No escrito enviado pela senhoria à R. consta o seguinte:
Na qualidade de senhoria do 2.º andar esquerdo (…), venho por este meio comunicar a V. Exª nos termos do artº 1097 do Código Civil a minha intenção de não renovação automática do contrato de arrendamento habitacional com prazo certo tendo por objeto o referido locado, firmado em 1 de Outubro de 2004 pelo que o referido contrato cessará os seus efeitos a partir de 30.09.2018, respeitando o período de pré-aviso legal, data em que deverá entregar o locado livre de pessoas e bens, bem como proceder à entrega das respetivas chaves.”
Face a uma declaração destas ficaria bem patente, perante qualquer declaratário normal, colocado na posição da arrendatária, o propósito de se pôr fim ao contrato, mediante a sua não renovação no termo do prazo então em curso (art.º 236.º n.º 1 do CC).
Assente este propósito e o respetivo efeito, eventual controvérsia quanto à data em que terminava o prazo em curso apenas relevaria (cumprido que fosse o prazo legal de pré-aviso) para a concretização do momento da produção de efeitos da cessação, com a consequente fixação das prestações devidas.
Cremos, pois, que tendo a senhoria manifestado a sua oposição à renovação do contrato de arrendamento, e terminando o prazo então em curso no dia 30 de setembro de 2019, nessa data o contrato cessaria, independentemente de a senhoria ter indicado como data da cessação o dia 30 de setembro de 2018.
É certo que os AA., sucessores da primitiva senhoria, propuseram a ação em 21 de novembro de 2018, ou seja, em data em que não tinham ainda o direito à restituição do locado.
Porém, esse direito venceu-se na pendência da ação, o que autorizava o tribunal a condenar a R. no seu cumprimento, nos termos previstos no art.º 610.º do CPC. Assim se harmonizando a sentença com o que decorre do direito substantivo.
Note-se que o tribunal, ao declarar que os AA. tinham direito à restituição do locado a partir de 30 de setembro de 2019, concedeu aos AA. menos do que aquilo que os AA. haviam peticionado, que era o reconhecimento do direito de restituição do imóvel com efeitos a partir de 30 de setembro de 2018. Mostram-se, pois, respeitados os limites legais da condenação (art.º 609.º n.º 1 do CPC).
Os AA. só não terão direito à pretendida restituição do imóvel se se entender que a R. beneficia, ou poderá beneficiar, do regime de suspensão previsto pela Lei n.º 30/2018, de 16.7.
Analisaremos esse aspeto no âmbito da apreciação da terceira questão.
Terceira questão (nulidade da sentença por falta de apreciação da aplicabilidade do regime previsto na Lei n.º 30/2018, de 16.7.)
A apelante entende que a sentença é nula, por nela o tribunal a quo não se ter “pronunciado sobre a questão de Ré ter estado abrangida pelo regime de proteção estabelecido pela Lei 30/2018, sem prejuízo das suas consequências, substanciais ou processuais”.
Imputa-se, assim, à sentença a nulidade prevista no art.º 615.º n.º 1 al. d) do CPC, a qual ocorre quando o juiz “deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.
Na contestação a R. suscitou a questão da aplicação ao caso do disposto na Lei n.º 30/2018, de 16.7. Segundo a R., esta beneficiaria desse regime, o qual determinava, relativamente a inquilinos idosos ou com deficiência que fossem arrendatários e residissem no locado havia mais de 15 anos, a suspensão da oposição à renovação deduzida pelo senhorio, quando a produção de efeitos dessas comunicações devesse ocorrer durante a vigência dessa lei.
Ora, a verdade é que na sentença recorrida o tribunal a quo abordou a referida questão.
Veja-se a seguinte transcrição da sentença:
“A ré argumenta que beneficia do regime extraordinário e transitório aprovado pela lei 30/2018 de 16 de julho, o qual determinava a suspensão da oposição à renovação deduzida pelo senhorio, quando a produção de efeitos dessas comunicações devesse ocorrer durante a sua vigência e que, à data da entrada da ação os autores não tinham o direito que se arrogam o que gera a improcedência da presente ação.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
Como a própria ré admite, a Lei 30/2018 de 16 de julho, estabeleceu um regime extraordinário e transitório para proteção de pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias e residam no mesmo locado há mais de 15 anos (sublinhado nosso). Prescreve o artigo 1.º desse diploma que “A presente lei estabelece um regime extraordinário e transitório para proteção de pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias e residam no mesmo locado há mais de 15 anos, procedendo nestes casos à suspensão temporária dos prazos de oposição à renovação e de denúncia pelos senhorios de contratos de arrendamento. (sublinhado nosso). Este regime extraordinário e transitório, aplica-se aos contratos de arrendamento para habitação cujo arrendatário, à data da entrada em vigor da mesma, resida há mais de 15 anos no locado e tenha ou idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 % - artigo 2.º.
E, assim, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 2, nos contratos abrangidos, fica suspensa a oposição à renovação deduzida pelo senhorio, quando a produção de efeitos dessa comunicação deva ocorrer durante a vigência da mesma. Esta lei entrou em vigor no dia 17/07/2018, mas produziu efeitos apenas até ao dia 31/03/2019 (artigo 6.º). Ou seja, conforme vimos, a comunicação de oposição à renovação aqui em apreço apenas produziu efeitos a partir do dia 30/09/2019, já depois de cessado o regime transitório da Lei 30/2018 de 16 de julho, não se tendo verificado, por isso, qualquer suspensão dessa oposição à renovação. Mas mesmo que o entendimento fosse contrário, a verdade é que a suspensão decretada por aquele normativo cessou a partir do dia 1/04/2019, nada obstando a que a mesma produzisse efeitos a partir dessa data. Note-se que, a situação dos presentes autos, não integra a previsão da norma transitória, prevista no nº 5 do artigo 14.º da Lei 13/2019 de 12 de fevereiro de 2019, que entrou em vigor a 13/02/2019, uma vez que a comunicação de oposição à renovação do contrato aqui em causa foi remetida antes da vigência da Lei 30/2018 de 16 de julho. Por outro lado, também não se aplica o disposto no n.º 3 do mesmo artigo 14.º da lei 13/2019 de 12 de fevereiro, porquanto a comunicação de oposição à renovação foi remetida antes da entrada em vigor desta lei, sendo certo que a ré também nunca preencheria os requisitos exigidos, designadamente, os 20 anos de residência, porquanto a própria alega que reside no arrendado, desde 2002. Na verdade, ao contrário do que defende a ré, o facto de, à data de entrada da presente ação, os autores não serem ainda titulares do direito que se arrogam, in casu, porque a comunicação da oposição à renovação ainda não tinha produzido os seus efeitos, a verdade é que este tribunal não pode deixar de valorar, ao abrigo do disposto no artigo 611.º do CPC, que, neste momento, a mesma já é plenamente eficaz. Em face do exposto, forçoso se torna, pois, concluir que a oposição à renovação produziu os seus efeitos a partir de 30/09/2019, data a partir da qual se tem por cessado o contrato de arrendamento e a partir da qual estava a ré obrigada a restituir o arrendado, livre de pessoas e bens aos autores, em conformidade com o disposto no artigo 1081.º, n.º 1 do CC.”
A sentença não enferma, pois, da apontada nulidade.
Vejamos se é de confirmar a solução sufragada pelo tribunal a quo (de inaplicabilidade ao caso dos autos da Lei n.º 30/2018, de 16.6 e do art.º 14.º, n.ºs 3 e 5, da Lei n.º 13/2019, de 12.2).
A Lei n.º 30/2018, de 16.7, consagrou um “regime extraordinário e transitório para proteção de pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias e residam no mesmo locado há mais de 15 anos”.
Esta Lei teve a sua origem no Projeto de Lei n.º 853/XIII/3.ª (Bloco de Esquerda) e no Projeto de Lei n.º 854/XIII (Partido Socialista).
Estes projetos visavam, conforme consta nas respetivas exposições de motivos, garantir, de forma transitória (enquanto não fosse publicada a legislação que definitivamente corrigiria os desequilíbrios que se entendia existirem no mercado habitacional), a proteção de inquilinos considerados em situação de fragilidade:
a) Face a ações de despejo e a procedimentos de despejo que tivessem por causa de pedir a oposição pelo senhorio à renovação de contratos de arrendamento que proviessem da transição para o NRAU de contratos celebrados antes da entrada em vigor do mesmo, suspendendo-se temporariamente os prazos previstos nas normas transitórias do NRAU (Título II) e processos de despejo (Projeto de Lei n.º 853/XIII/3.ª – publicado no D.A.R. II série A, n.º 105/XIII/3 2018.04.17, pp. 19 e 20);
b) Restringir, durante esse período transitório, a denúncia e a oposição à renovação do contrato pelo senhorio, atinentes a determinadas categorias de arrendatários considerados em situação de fragilidade (pessoas idosas ou com deficiência que fossem arrendatárias e residissem no mesmo local há mais de 15 anos), às situações previstas na al. a) do art.º 1101.º do Código Civil - necessidade de habitação pelo senhorio ou pelos seus descendentes em 1.º grau – (Projeto de Lei n.º 854/XIII – publicado no D.A.R. II série A, n.º 105/XIII/3 2018.04.27, pp. 20-22).
Vejamos os trechos relevantes da Lei n.º 30/2018.
Nos termos do art.º 1.º a Lei tem por objeto estabelecer “um regime extraordinário e transitório para proteção de pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias e residam no mesmo locado há mais de 15 anos, procedendo nestes casos à suspensão temporária dos prazos de oposição à renovação e de denúncia pelos senhorios de contratos de arrendamento.”
Quanto ao seu âmbito, a Lei “aplica-se aos contratos de arrendamento para habitação cujo arrendatário, à data da entrada em vigor da mesma, resida há mais de 15 anos no locado e tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 %” (art.º 2.º).
O objetivo da lei concretizava-se, no ponto de vista do direito substantivo, pelo seguinte modo, estabelecido no art.º 3.º:
“Denúncia ou oposição à renovação do contrato pelo senhorio
1 — Nos contratos abrangidos pela presente lei e durante o prazo estabelecido no artigo 6.º, o senhorio só pode opor-se à renovação, ou proceder à denúncia, do contrato de arrendamento nas situações previstas na alínea a) do artigo 1101.º do Código Civil, sem prejuízo do disposto no artigo 5.º
2 — Nos contratos abrangidos pela presente lei, ficam suspensas as denúncias já efetuadas pelo senhorio, nos termos das alíneas b) e c) do artigo 1101.º do Código Civil, ou a oposição à renovação deduzida pelo senhorio, quando a produção de efeitos dessas comunicações deva ocorrer durante a vigência da mesma.
No que concerne ao espaço temporal da produção de efeitos da Lei, ficou assim definido, no art.º 6.º:
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos até 31 de março de 2019.
Resulta da lei que, quanto aos contratos de duração limitada, cujo arrendatário, à data da entrada em vigor do diploma (17.7.2018), tivesse idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 % e residisse no locado havia mais de 15 anos, o senhorio ficava impedido, durante o período de vigência da lei (17.7.2018 a 31.3.2019), de se opor à renovação do contrato, a menos que pretendesse acorrer às suas necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau. Quanto às declarações de oposição à renovação que tivessem sido emitidas antes da entrada em vigor da lei e que produzissem efeitos dentro do prazo de vigência da lei, os seus efeitos ficavam “suspensos” (ressalvando-se, também aqui, os casos que visassem as necessidades de habitação própria do senhorio ou dos seus descendentes em 1.º grau).
O regime destinado a corrigir definitivamente os alegados desequilíbrios foi aprovado pela Lei n.º 13/2019, de 12.2.
Este diploma teve por base a Proposta de Lei n.º 129/XIII, publicada no D.A.R., II série-A, n.º 106/XIII/3, de 30.4.2018 (pp. 20-30).
Na respetiva Exposição de Motivos considerava-se “necessário estimular a oferta de habitação para arrendamento que constitua uma alternativa habitacional efetiva, proporcionando a estabilidade, a segurança e a acessibilidade em termos de custos, necessárias ao desenvolvimento da vida familiar e aos investimentos realizados com a conservação desses edifícios”.
Para alcançar esses objetivos, além do mais, anunciava-se um conjunto de medidas que iriam contribuir “para minorar uma vulnerabilidade histórica e estrutural de competitividade da habitação permanente face aos outros usos potenciais, e responder à necessidade imperiosa de salvaguardar a segurança e estabilidade dos agregados familiares que permaneceram ao longo de décadas numa habitação arrendada, sobretudo, das pessoas de idade mais avançada, perante o risco de cessação de contratos de arrendamento decorrente da superveniência de opções mais rentáveis para os mesmos espaços.
O diploma legal que subsequentemente veio a ser aprovado, a já referida Lei n.º 13/2019, de 12.2., contém, neste âmbito, e com interesse para a matéria destes autos, sob a epígrafe “Disposição transitória”, um art.º 14.º, de que se transcrevem os n.ºs 3 e 5:
3 — Nos contratos de arrendamento habitacionais de duração limitada previstos no n.º 1 do artigo 26.º do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, cujo arrendatário, à data de entrada em vigor da presente lei, resida há mais de 20 anos no locado e tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60 %, o senhorio apenas pode opor-se à renovação ou proceder à denúncia do contrato com o fundamento previsto na alínea b) do artigo 1101.º do Código Civil, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 47344/66, de 25 de novembro, com a redação dada pela presente lei, havendo lugar à atualização ordinária da renda, nos termos gerais.
5 — As comunicações do senhorio de oposição à renovação do contrato de arrendamento enviadas durante a vigência da Lei n.º 30/2018, de 14 de junho, aos arrendatários por ela abrangidos, que não tenham como fundamento o previsto na alínea a) do artigo 1101.º do Código Civil, com a redação dada pela presente lei, não produzem quaisquer efeitos.”
Segundo este regime, quanto ao n.º 3 do art.º 14.º, nos contratos de arrendamento habitacionais de duração limitada celebrados ao abrigo do RAU, cujo arrendatário, à data da entrada em vigor do diploma (13.02.2019 – art.º 16.º), resida há mais de 20 anos no locado e tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60%, o senhorio apenas poderá opor-se à renovação do contrato ou proceder à sua denúncia se tencionar demolir o locado ou nele proceder às obras de remodelação ou restauro profundos referidas na alínea b) do art.º 1101.º do Código Civil.
Por outro lado, no que concerne à disposição contida no n.º 5 do art.º 14.º, aí se estipula que as comunicações do senhorio de oposição à renovação do contrato de arrendamento enviadas durante a vigência da Lei n.º 30/2018 aos arrendatários por ela abrangidos não produziriam quaisquer efeitos, a menos que tivessem por fundamento as necessidades de habitação do senhorio e seus descendentes em 1.º grau.
As apontadas normas destes diplomas atinentes protegem, pois, os interesses de algumas categorias de arrendatários, que o sejam à luz do RAU, em detrimento dos senhorios, nesse sentido se integrando, conjuntamente com outras normas legais, numa inflexão do movimento liberalizador que vinha sendo imprimido ao regime do arrendamento urbano pelo NRAU e suas alterações.
Tem-se entendido que a Lei n.º 18/2018 visa contratos de arrendamento com mais de 15 anos (à data da entrada em vigor da Lei), o que constitui pressuposto da duração da residência no locado exigida ao arrendatário para beneficiar do regime contido no diploma. Também o n.º 3 do art.º 14.º da Lei n.º 13/2019, de 12.2, pressupõe que o arrendamento em causa é anterior a 13 de fevereiro de 1999. Neste sentido, veja-se Iolanda Gávea, “O Novo Regime de Protecção de Inquilinos Idosos”, in I Congresso de Direito do Arrendamento, 2019, Almedina, p. 68; Rui Paulo Coutinho de Mascarenhas Ataíde e António Barroso Ramalho Rodrigues, “Denúncia e oposição à renovação do contrato de arrendamento urbano”, in Revista de Direito Civil, ano IV (2019), número 2, p. 307; Jorge Pinto Furtado, em Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano, 2019, Almedina, p. 585; Maria Olinda Garcia, “Alterações em matéria de Arrendamento Urbano introduzidas pela Lei n.º 12/2019 e pela Lei n.º 13/2019”, Julgar Online, março de 2019, p. 22, consultável em http://julgar.pt/wp-content/uploads/2019/03/20190305-JULGAR-Altera%C3%A7%C3%B5es-em-mat%C3%A9ra-de-arrendamento-Leis-12_2019-e-13_2019-Maria-Olinda-Garcia.pdf).
À luz deste entendimento, uma vez que o contrato de arrendamento celebrado com a R. teve o seu início em 01.10.2004 (n.º 4 da matéria de facto), à data da entrada em vigor da Lei n.º 30/2018 (17.7.2018) ainda não perfazia sequer 14 anos de vigência. Pelo que a R. não beneficiaria do regime da Lei n.º 30/2018 nem do do art.º 14.º, n.ºs 3 e 5, da Lei n.º 13/2019.
Ainda que assim não fosse, isto é, ainda que a Lei n.º 30/2018 fosse aplicável a contratos de arrendamento sujeitos ao RAU, mas não necessariamente com duração igual ou superior a 15 anos, bastando que o arrendatário residisse no locado por esse período, independentemente do título jurídico dessa ocupação, in casu, como vimos, o efeito jurídico da oposição à renovação do contrato emitida pelo senhorio só se produziria em 30.9.2019, isto é, fora do período de vigência da Lei n.º 30/2018 (que vigorava até 31.3.2019). Por outro lado, a declaração de oposição à renovação foi efetuada antes da entrada em vigor da Lei n.º 30/2018, pelo que não só não foi abrangida pela Lei n.º 30/2018 como também não o é pelo art.º 14.º n.º 5 da Lei n.º 13/2019 (art.º 14.º n.º 5). E, se acaso a cessação do contrato ocorresse, como declarado na carta objeto dos autos, em setembro de 2018, o senhorio poderia invocar junto da arrendatária a produção de efeitos da cessação após o termo do prazo de vigência da Lei 30/2018, isto é, em 01.4.2019 (vide Iolanda Gávea, texto citado, páginas 66 e 67). Quanto ao n.º 3 do art.º 14.º da Lei n.º 13/2019, a R. afirma residir no locado desde 2002, isto é, não perfaz o período de 20 anos exigido por essa norma para a proteção do inquilino aí prevista.
Pelo que a apelação é improcedente, devendo manter-se a sentença recorrida.
DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida.
As custas da apelação, na vertente de custas de parte, seriam a cargo da apelante (artigos 527.º n.ºs 1 e 2 e 533.º do CPC), caso não beneficiasse de apoio judiciário, devendo aplicar-se o disposto no art.º 26.º n.º 6 do RCP.

Lisboa, 10.9.2020
Jorge Leal
Nelson Borges Carneiro
Pedro Martins (vencido)

Voto vencido em três pontos: I - Os pressupostos de um direito têm de estar preenchidos na data da propositura da acção e a demora processual não pode servir de facto constitutivo; II - A maior parte das excepções peremptórias pode ser deduzida mesmo só nas alegações de um recurso, desde que os factos constem do processo; III – Se as partes estipularam uma determinada forma para uma comunicação, é essa a forma que tem de ser observada, sob pena de ineficácia.
I
Há muito que se defende que os direitos que as partes pretendem ver reconhecidos em tribunal têm que ter os seus pressupostos preenchidos na data da propositura de uma acção. Ou seja, ninguém pode meter uma acção e esperar que os factos constitutivos do seu direito se venham a verificar no decurso da acção (como se a demora processual fosse um facto constitutivo do direito: neste sentido, ac. do STJ de 30/04/1997, BMJ 466, páginas 472 e seg, lembrado por Nuno Salter Cid, obra e local citados abaixo).
Assim, por exemplo, a maior e melhor parte da doutrina e da jurisprudência sempre defendeu que não se podia intentar uma acção de divórcio litigioso baseada na separação de facto por mais de um ano, sem que esse prazo de um ano já estivesse verificado na data da propositura da acção (hoje a questão põe-se em relação ao divórcio sem consentimento, por separação de facto por mais de um ano: arts. 1781/-a e 1782, ambos do CC).
[assim, por exemplo, Miguel Teixeira de Sousa: “esse prazo (…) deve estar completamente decorrido à data da propositura da acção de divórcio, porque sem o decurso daquele prazo a separação de facto não pode ser invocada como causa do divórcio (ac. RP de 11/10/1979, BMJ. 291/538)” (O Regime Jurídico do Divórcio, Almedina, 1991, pág. 84); Abel Pereira Delgado, O Divórcio, Petrony, 1980, pág. 69 (é um prazo de carácter substantivo, pelo que há-de verificar-se à data do pedido => acórdão do STJ de 1/3/1979, publicado no BMJ. 285/324); Pais do Amaral, Do Casamento ao Divórcio, Cosmos, Direito, 1997, pág. 96 (: o prazo deve estar completo no momento da propositura da acção, por se tratar de um elemento constitutivo do direito ao divórcio); Ferreira Pinto, Causas do Divórcio, Almedina, 1980, pág. 122; Acórdão do STJ de 24/10/2006, proc. 06B2898; Rute Teixeira Pedro, anotação 4 ao art. 1781, no CC anotado citado, pág. 682; e, principalmente, Nuno de Salter Cid, Desentendimentos conjugais e divergências jurisprudenciais, Lex Familiae, RPDF, ano 4, n.º 7, 2007, págs. 18 a 23, que desenvolve a questão e relembra muitos autores e artigos que vão todos neste sentido, indicando e criticando acórdãos que vão em sentido contrário, bem como o aproveitamento incorrecto que eles faziam do então art. 663 do CPC, também neste ponto com várias indicações de doutrina no mesmo sentido; bem como, entre muitos outros, os acórdãos do TRL de 15/05/2012, proc. 9139/09.6TCLRS.L1-7; de 22/10/2013, proc. 16/11.1TBHRT.L1-7; de 17/12/2015, proc. 425/13.1TMLSB.L1-2; e de 10/05/2018, proc. 29812/15.9T8LSB.L1-2).
Os tribunais têm que ser coerentes nas soluções que adoptam para casos paralelos. Não podem decidir, na maior parte dos casos, que o direito em litígio tem que ter os seus pressupostos verificados à data da propositura da acção e, noutros, decidir que o contrário é que é correcto.
Os autores intentaram a acção em 21/11/2018. Diziam ter, desde 01/10/2018, direito à restituição do imóvel, por uma caducidade ocorrida em 30/09/2018. Isto com base numa carta escrita a 20/03/2017 que visava comunicar a oposição à renovação de um arrendamento em 30/09/2018.                         
Nessa data, como explica a sentença, o contrato que, por força de várias leis, tinha sido renovado até 30/09/2015 e depois até 30/09/2017, estava sujeito a renovações por período de 2 anos, pelo que se renovaria a 30/09/2019 e não, como pretendiam os autores, a 30/09/2018. Quer isto dizer que o direito de oposição à renovação foi mal exercido pelos autores e, por isso, por erro dos autores, a oposição deduzida por eles em 20/03/2017 não produziu os efeitos que visava. Utilizando os próprios termos da sentença recorrida: “[…] à data de entrada da presente acção, os autores não [eram] ainda titulares do direito que se arrogam […]”.
Pelo que a acção, que tinha por objecto o reconhecimento do direito dos autores à restituição do prédio devido à caducidade do contrato de arrendamento, em 30/09/2018, tinha necessariamente de improceder por essa caducidade não se ter verificado.
Repete-se, o objecto da acção era este e o tribunal não o podia convolar para outro. A caducidade do contrato noutro ano, que ainda nem sequer se tinha ocorrido, não era o objecto do contrato. O objecto de um divórcio por separação de facto ocorrida em 2018, não é um divórcio por separação de facto ocorrida em 2019. O objecto de uma acção de responsabilidade civil por facto ocorrido em Jan2018, intentada em Dez2018, não é uma acção de responsabilidade civil por facto ocorrido em 2019. A decisão do tribunal que se reporta a uma caducidade que teria ocorrido a 01/10/2019, ou seja, quase um ano depois da caducidade invocada na acção, está errada.
Dito de outro modo, a decisão do tribunal que reconhece a caducidade do arrendamento em 30/09/2019 afasta-se do objecto do processo, em violação do princípio do pedido (art. 609/1 do CPC). Basta notar que, se tivesse ocorrido a possibilidade de um despacho liminar da petição, em Out2018, esta devia ter sido liminarmente indeferida, por ser manifesta a sua improcedência, visto que os autores não podiam ter o direito que se arrogavam, porque a caducidade do arrendamento não tinha ocorrido.
O art. 611/3 do CPC não pode ser aplicado ao caso: o que estava em causa no processo era uma caducidade ocorrida em 30/09/2018, que teria feito surgir o direito dos autores à restituição em 01/10/2018, pelo que qualquer facto posterior a tal data não tem nada a ver com essa caducidade. O contrato de arrendamento poderá vir a caducar noutro ano, depois da devida manifestação da vontade dos autores em se oporem à renovação do contrato nesse outro ano. Mas, em 21/10/2018, quando intentaram a acção, ela não se tinha verificado, nem, pela natureza e lógica das coisas, poderá ter ocorrido depois de 21/10/2018. O art. 611/3 do CPC não pode servir para dar procedência às acções com base em causas de pedir diferentes das invocadas.
Tem, assim, razão a ré no que diz no seu recurso.
Ou dito com Alberto dos Reis, lembrado por Nuno Salter Cid (obra e local citados): “Aqui temos um caso nítido em que a lei substancial obsta a que o facto superveniente [constitutivo] exerça influência sobre o julgamento a proferir. […]; [….] tanto pela letra como pelo espírito da disposição é óbvio que os requisitos requeridos pelo artigo hão-de verificar-se no momento em que se apresenta em tribunal o pedido de divórcio […] Logo, se não existirem nesse momento, o juiz tem de indeferir o pedido.”
II
As excepções peremptórias são, regra geral, de conhecimento oficioso. Ou seja, são-no todas as que não estejam dependentes da vontade do interessado (art. 579 do CPC), o que só acontece com os direitos potestativos e as excepções de direito material (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 2.º, 3.ª edição, Almedina, 2017, pág. 587).
Como tal, devem ser conhecidas pelo tribunal recurso, desde que os factos subjacentes constem do processo. Pelo que as partes podem, mesmo que não o tenham feito até aí, levantar, nos recursos, as excepções peremptórias que sejam de conhecimento oficioso (art. 573/2, parte final, do CPC). E os tribunais de recurso têm que as decidir.
Assim, a excepção peremptória deduzida pela ré no recurso, que não se refere a uma excepção de direito material nem a um direito potestativo, e que está baseada em factos que estão provados no processo – o contrato celebrado (dado por reproduzido na sentença recorrida) que estipulava que o senhorio podia denunciar o contrato de arrendamento mediante notificação judicial avulsa do inquilino (cl.ª 4) e a notificação da oposição através de carta registada com a/r - devia ser apreciada e decidida por este TRL.
A ré tem, assim, razão.
III
Esta questão devia ter sido decidida em sentido contrário ao sugerido pelo projecto de acórdão: se as partes estipularam num contrato que a oposição à renovação devia ser feita por notificação judicial avulsa (adoptando a exigência legal, então em vigor, de notificação judicial avulsa, pelo que o ‘pode’ referido no contrato é um ‘deve’), uma oposição comunicada através de carta registada com a/r não observa a formalidade que as partes impuseram para a comunicação da oposição, sendo de presumir que as partes não queriam ficar vinculadas por ela senão fosse feita pela forma convencionada (art. 223/1 do CC), presunção que não foi ilidida. Assim, não se pode considerar que a oposição foi comunicada em termos de vincular as partes e por isso a oposição à renovação não tem eficácia.
A ré tem, assim, razão.
Por tudo isto, o destino necessário da acção (no que se refere ao pedido de restituição do prédio arrendado) era o da sua improcedência.
Era isso que o acórdão devia ter decidido, considerando parcialmente procedente o recurso.

Pedro Martins