Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1604/09.1TVLSB.L2-8
Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
CADUCIDADE
PARTES COMUNS
DEFEITOS DA OBRA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: O prazo de caducidade estabelecido no artº 1225º nº 1 do Código Civil, relativamente à reclamação de defeitos verificados nas partes comuns de prédio constituído em propriedade horizontal inicia-se com a reunião da 1ª assembleia de condóminos e a nomeação de administrador.

Esta orientação é a mais razoável, pois entendemos que decisiva é a data em que o promotor fez a transmissão dos poderes de administração das partes comuns aos condóminos, o que só pode ter sucedido quanto estes constituíram a sua estrutura organizativa, reunindo em assembleia de condóminos e elegendo o seu administrador.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.


IRELATÓRIO:


Condomínio do prédio sito no Lote ...D, P... Lisboa, com sede na Rua MS, Lisboa, intentou acção ordinária, contra Sociedade, SA, com sede na Rua M, nº ... D - 1º, Lisboa, pedindo a condenação desta a reparar, a suas expensas, os defeitos elencados nos artigos 14º e 37º da petição inicial. Caso não seja possível a reparação pela ré em prazo razoável, não superior a três meses, a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de € 261.370,61.

Em síntese, alegou que a ré vendeu todas as fracções que integram o prédio, o edifício padece de defeitos, os quais têm origem exclusivamente na natureza construtiva ou na escolha do material desadequado para o efeito ou utilização pretendida. A assembleia de condóminos foi constituída em 14 de Julho de 2003, onde esteve presente a ré, então titular da totalidade da permilagem do edifício, começando o prazo de garantia das partes comuns a correr em 14 de Julho de 2003 e que viria a conhecer o seu termo em Julho de 2008, conhecendo-se em 14 de Abril de 2008 os defeitos do edifício, suas causas e soluções, dirigindo-se à ré, por carta registada e de que foi destinatária em 2 de Janeiro de 2009, da denúncia adequada e dar-lhe conhecimento dos defeitos e pedir-lhe a sua correcção, tendo a ré respondido em 21 de Janeiro de 2009, propondo visita ao prédio, a qual teve lugar em 29 de Janeiro de 2009 e informando esta que estava disposta a proceder à correcção dos defeitos que identificou no artigo 17º da petição inicial, mas até ao momento não o fez.

Contestou a ré, alegando, em substância, a excepção da irregularidade da representação do condomínio e da caducidade do direito de accionamento judicial quanto aos defeitos não reconhecidos pela ré e solicitou a intervenção acessória provocada de Construções, Lda por ter sido a construtora do edifício na sequência de um contrato de empreitada entre ambos celebrado.

O autor apresentou réplica., reiterando os pedidos formulados na petição inicial, pedindo que sejam julgadas improcedentes as excepções deduzidas pela ré.

Foi admitida a intervenção acessória provocada de Construções, Lda que não apresentou contestação.

Em 30.04.2013 foi proferido saneador- sentença que julgou procedente a excepção da caducidade invocada pela ré e parcialmente procedente a acção e condenou a ré a, no prazo de três meses, eliminar os defeitos a que alude o ponto 4 da matéria de facto provada, absolvendo do mais contra si peticionado.

Perante o recurso do autor, foi proferido o acórdão desta Relação de 20.03.2014 que revogou “ a decisão recorrida na parte que julgou procedente a excepção da caducidade, devendo os autos prosseguir a sua tramitação normal (com selecção dos factos provados e daqueles que devem integrar a base instrutória), conhecendo-se a final a invocada excepção”.

Em obediência àquele acórdão, foram fixados os seguintes temas de prova: (i) a existência dos defeitos alegados pelo autor, com excepção daqueles que a ré já foi condenada a eliminar; (ii) a causa desses defeitos; (iii) a data do conhecimento de tais defeitos; (iv) a data da denúncia.

Após a realização da prova pericial, foi proferida SENTENÇA que julgou a acção parcialmente improcedente e, consequentemente, absolveu a ré dos pedidos referentes aos defeitos não abrangidos pela condenação de 30 de Abril de 2013.

Não se conformando com a sentença, dela recorreu o autor, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
a)- A sentença recorrida viola o disposto nos n. 3 e 4 do art.º 607º do C.P.C, por não fundamentar a sua decisão sobre a matéria de facto;
b)- E uma vez que a ausência de fundamentação é total, implica isso a nulidade da sentença nos termos da al. b) do n. 1 do art.º 615º do CPC.;
c)- E ainda que assim não entenda esse venerando tribunal, sempre se imporia a correcção de tal vicio, conforme desde já se suscita e requer no âmbito do presente recurso, até nos termos do disposto na al. d) do n.º 2 do art.º 662º do C.P.C.;
d)- Diga-se ainda que a sentença começa por ignorar todo um conjunto de prova produzida, nomeadamente toda a prova testemunhal e grande parte da prova documental, nomeadamente e neste ultimo caso, o documento junto ao processo a fls. 73 a 189, não se pronunciando em absoluto sobre a mesma;
e)- A sentença não analisa por isso criticamente esta prova mas também não analisa criticamente o único elemento de prova por si aparentemente considerado, e que é o primeiro relatório de pericial judicial junto aos autos;
f)- A sentença valoriza unicamente este primeiro relatório pericial em detrimento do segundo relatório, sem justificar devidamente a sua opção e critério de escolha;
g)- A sentença não fornece quaisquer outros fundamentos decisivos para sua convicção, nem estabelece qualquer exercício de compatibilização da matéria de facto adquirida nos autos;
h)- No uso da sua liberdade de apreciação das provas, a Exma Juiza do tribunal a quo, para além de não fundamentar tal apreciação, ao optar em exclusivo pela utilização do meio de prova consubstanciado no primeiro relatório pericial, acaba por fazer cair a sua decisão sobre os factos provados e não provados em contradições evidentes.
i)- Tal relatório contém respostas aos quesitos (defeitos alegados pelo A) que sendo iguais entre si, umas vezes são aproveitadas para dar factos como provados, e outras vezes como não provados;
j)- Mesmo o critério indicado na sentença como tendo sido o utilizado para dar os factos como provados, e que se consubstancia numa coincidência de respostas positivas entre os seis peritos (portanto a totalidade dos intervenientes nos dois relatórios), também falece, pois existem defeitos aceites pelos 6 peritos que não são dados como provados na sentença, e outros que sendo dados como provados, não foram reconhecidos pelos seis peritos;
k)- Verifica-se, portanto, na sentença uma contradição entre o critério e meio indicado para se responder à matéria de facto e a decisão a que se chegou sobre tal matéria, ou seja ocorre uma contradição entre esta parca fundamentação e a decisão.
l)- Sendo obscuro e ambíguo o raciocínio lógico indicado na sentença pelo julgador como tendo sido utilizado por si.
m)- Paralelamente a sentença não se pronuncia sobre matéria relativamente à qual se deveria pronunciar (aliás como é sustentado no próprio acórdão anteriormente produzido por esse Venerando Tribunal no âmbito dos presentes autos) e que tem a ver com determinar se houve ou não por parte da R. o reconhecimento do direito invocado pelo apelante, ficando impedida assim a caducidade do direito deste último.
n)- Constituindo-se assim uma outra nulidade da sentença nos termos do disposto na al. d) do nº 1 do artº 615º do CPC;
o)- A sentença enferma ainda de erro de julgamento quanto à matéria de facto.
p)- Na realidade para além dos factos dados como provados na sentença sob os n.ºs 1 a 10, todos os restantes e constantes no elenco do artº 14º da PI , e que constituem a base de ambas as perícias judiciais, deveriam ter sido dados como provados;

q)- A excepção dos seguintes:
Edifício n. 3:
Escadas de Serviço: 5. Caixilharia possui os silicones rasgados nos pisos 2 e 6; Patamares: 3. Pintura dos tectos com irregularidades nos pisos 1, 5 e 6; 4. Pedra com lasca preenchida com material irregular no piso 3; 5. Pedra de lambrim danificada no piso 2;
Edifício n. 5
Hall: 2. Pinturas com pequenas irregularidades no tecto; 5. Empeno nas portas das caixas de correio; Escadas de Serviço: 2. Lasca na pintura da porta no piso 0; 3. Falhas de betumes; 4. Portas corta-fogo não possuem vedantes laterais adequados; 5. Caixilharia possui os silicones rasgados nos pisos 1, 3,4 e 6; Patamares: 2. Pinturas das paredes com irregularidades nos pisos 1, 2,3, 4, 5, e 6;
Edifício n. 7
Hall: 4. Pinturas com pequenas irregularidades no tecto; Escadas de serviço: 2. Falhas de betumes; 4. Portas corta-fogo não possuem vedantes laterais adequados; 5. Caixilharia possui os silicones rasgados no piso 6; Patamares: 7. Pedra de lambrim danificada;
Cobertura 3 edifícios: 4. Pintura das telas com irregularidades e muito enfraquecida; telas sem pinturas; 5. Caleira com acumulação de água na zona da fachada principal; sujidades no ralo de pinha; sujidades nas telhas;
Fachadas dos 3 Edifícios: 2. Falhas de betumes entre a fachada e o pavimento; 4. Fissura com eflorescência na parede da rampa de acesso à garagem;
Parqueamento dos 3 edifícios: 4. Remates de argamassa irregulares e sem pintura junto a tubos no piso -1; 5. Sujidades de argamassa; 9. No lugar 03 existe uma caixa de ventilação que começa no tecto do piso -2 até ao exterior; esta fuga não possui reboco nas paredes e possui tijolos à vista muito lascados;

r)- E portanto, em consequência, o único ponto da matéria de facto não provada, encontra-se erradamente julgado, pois todos os defeitos abarcados pelo mesmo e acima não elencados deveriam ter sido dado como provados.
s)- Todos os restantes defeitos, para além daqueles que constam nos pontos 3 a 8 da matéria provada e que não foram acabados de elencar na al. q) destas conclusões, e que constam no art.º 14º da PI, (e foram transpostos para os quesitos a que as duas peritagens responderam), ou resultam provados em ambas as peritagens judiciais, (fls 416 a 448 e 581 a 596) ou apenas numa delas, nomeadamente a segunda, e bem assim resultam provados da analise que se pode fazer ao documento n. 2 junto à PI pelo A, fls . 73 a 189 dos autos) constituindo o mesmo um relatório técnico certificado feito na sequência de uma vistoria/ peritagem feita ao imóvel, por parte de empresa devidamente credenciada tecnicamente.
t)- Acresce que tais defeitos também resultam provados pela prova testemunhal produzida nos autos, nomeadamente pelo Sr. MD, (Depoimento prestado na sessão de 24 de Fevereiro de 2017 - T_00:41:20 – Inicio 10:38:35 – Fim 11:19:55), pelo Sr. RV, (Sessão de Audiência de 28 de Abril de 2017 - T_ 01:33:23 – Inicio: 14.03.55 – Fim: 15.37.18) e pelo Sr. AM(Sessão de Audiência de Julgamento de 28 de Abril de 2017 - T_ 00:28:11 – Inicio: 15.38.28 – Fim: 16.06.40);
u)- A prova produzida por tais documentos, perícias e testemunhas, é portanto só por si suficiente par dar como provados os defeitos que constam no art.º 14º da PI e que não estão incluídos na sentença.
v)- Finalmente temos que o art.º 1225º do C.C. conforme é interpretado e aplicado na sentença recorrida resulta violado.
w)- A sentença concluiu que o regime aplicável à situação apresentada em juízo nos presentes autos é efectivamente o decorrente do art.º 1225º do Código Civil.
x)- Assim na sentença considera-se que pelo facto de o A apenas ter denunciado os defeitos a 2 de Janeiro de 2009 e se dar como provado nos autos que a primeira administração do condomínio foi eleita a 14 de Julho de 2003 em assembleia geral de condóminos, tendo ocorrido nessa data a entrega da gestão dos interesses relativos às partes comuns aos compradores e a quem os represente, tal implica que tenham decorrido mais de cinco entre a data dessa entrega e a data de denuncia dos defeitos, e portanto isso implicará a caducidade do direito do A a exigir a reparação dos defeitos à R.
y)- Ora tal entendimento da referida norma, é no entender do apelante, e salvo o devido respeito, errada.
z)- Efectivamente, como é entendimento dominante na Jurisprudência, o art.º 1225º do C. C., quando se trate de defeitos num imóvel vendido por um promotor, deve ser interpretado no sentido de que esses defeitos terão de se manifestar dentro do prazo de garantia de 05 anos ( n.º 1). Mas manifestados tais defeitos dentro de tal prazo, deverá e poderá o comprador denunciar tais defeitos no prazo de um ano a contar do seu conhecimento, tendo depois ainda que exigir a respectiva indemnização dentro de um ano a contar da respectiva denuncia, (n.º 2 do art.º 1225º do C.C.).
aa)- Ou seja, se cada um dos prazos for levado ao seu limite, poderá resultar um prazo total acumulado de 07 anos, e portanto nos presentes autos, uma vez que os defeitos foram conhecidos ainda dentro dos cinco anos de garantia (ponto 9 da matéria provada), e foram denunciados dentro do ano subsequente ao seu conhecimento e a presente acção deu entrada dentro do ano subsequente a tal denuncia, terá de se considera que a excepção de caducidade não poderá proceder.
Termina, pedindo que a decisão proferida seja considerada nula, ou assim não se entendendo, anulada, com eventual determinação da sua devida fundamentação. Sem prejuízo de a Relação poder entender existirem nos autos elementos suficientes que permitam a revogação da decisão por erro na apreciação da matéria de facto e aplicação do direito e substituição por uma outra que condene a R nos precisos termos peticionados.

A parte contrária contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II–FUNDAMENTAÇÃO.

A)–Fundamentação de facto.

Mostram-se assentes os seguintes factos:
- A R. foi a vendedora de todas as fracções que integram o prédio sito na Rua MS, Lisboa.
- A primeira administração do condomínio foi eleita a 14 de Julho de 2003 em assembleia geral de condóminos.
- O edifício 3 do prédio identificado no ponto 1 apresenta as seguintes anomalias construtivas: - fissura na pedra de soleira da porta principal; - lascas na pintura da porta de corta-fogo das escadas de serviço no piso 1; - microfissuras no patamar do piso -2 sobre a porta corta-fogo; e - a bateria dos contadores da água não está devidamente fixa à parede.
- O edifício 5 do prédio identificado no ponto 1 apresenta as seguintes anomalias construtivas: - microfissura no hall sobre as portas dos contadores e falta de betume na pedra ao lado da caixa de correio; - portas dos armários de serviços no hall com irregularidades no acabamento; - mal executada a pintura do elevador no piso 2; - pintura com irregularidades nos pisos 0 e 1; - manchas amareladas nos tectos dos patamares dos pisos -2 e -1; e - irregularidade na pintura do tecto do patamar do piso 6.
- O edifício 7 do prédio identificado no ponto 1 apresenta as seguintes anomalias construtivas: - fissuras em duas pedras do pavimento do hall exterior, junto à caixa de visita da rede de águas residuais; - betumes fissurados nas paredes do hall do edifício; - empenos nas portas das caixas de correio do RCA, 1º A, 1º B, 4º B, 5º B e 6º A- pintura com irregularidades nas escadas de serviço nos pisos 1 e 5: - falta de cuidado na pintura das portas das escadas de serviço nos pisos -1, 0, 1, 2, 3, 4, 5 e 6; - vestígios de oxidação na porta de acesso à cobertura; e - microfissuração vertical na alvenaria da casa do lixo.
- A cobertura dos três edifícios do prédio identificado no ponto 1 apresenta a seguinte anomalia construtiva: - oxidação em algumas peças metálicas.
- O parqueamento dos três edifícios do prédio identificado no ponto 1 apresenta a seguinte anomalia construtiva. - falta a grelha de tamponamento sobre o lugar 3.
- As instalações eléctricas e telecomunicações do prédio identificado no ponto 1 apresentam as seguintes anomalias construtivas: - as caixas do 6º andar não estão fixas e os disjuntores nelas existentes estão mal acondicionados; - as peças dos quadros de serviço comum D1, D2 e D3 estão mal acondicionadas; - calha de caminho de cabos metálica, na cobertura, a fixar os cabos eléctricos, sem ligação terra; - cabo eléctrico mal acondicionado junto à arrecadação nº 29; e -falta de ligadores nos cabos do videoporteiro.
- O A. teve conhecimento dos defeitos mencionados nos pontos 3, 4, 5, 6, 7 e 8 a 14 de Abril de 2008.
10º - A 2 de Janeiro de 2009, o A., por carta registada com A/R, denunciou à R. esses defeitos.

B)–Fundamentação de direito.

As questões colocadas e que este tribunal deve decidir, nos termos dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aplicável por força do seu artigo 5º nº 1, em vigor desde 1 de Setembro de 2013, são as seguintes:
(i) - Nulidade da sentença; (ii) - Impugnação da decisão sobre matéria de facto; (iii) - a questão de direito.

NULIDADE DA SENTENÇA.
Invoca o apelante a nulidade da sentença com os fundamentos previstos no artigo 615º nº 1 alª b) e d) do Código de Processo Civil.
Argumenta que existe ausência de fundamentação da decisão sobre matéria de facto, o que é gerador da nulidade prevista no artigo 615º nº 1 alínea b), com violação do disposto no artigo 607º nºs 3 e 4.

Cumpre decidir.
Prescreve o nº 1 alª b) do artigo 615º do Código de Processo Civil que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

Os nºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil preceituam o seguinte:
“3 - Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
4 - Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.

Na fundamentação da matéria de facto consta o seguinte:
“Os factos vertidos nos pontos 1 e 2 da matéria de facto provada são factos plenamente provados por terem sido admitidos por acordo.
No que toca aos pontos 3, 4, 5, 6, 7 e 8 da matéria de facto provada e 1 da matéria de facto não provada, o tribunal teve em conta os relatórios periciais de fls. 416 a 448 e 581 a 596, sem esquecer que a acção prossegue quanto aos defeitos alegados pela A. não abrangidos pela condenação de 30 de Abril de 2013, tendo o tribunal incluído na matéria de facto provado as anomalias que foram reconhecidas pelos seis peritos, sendo de salientar que o primeiro relatório pericial, por ser mais explicativo, aparenta maior rigor. Tendo em conta os defeitos que foram levados à matéria de facto provada, ficou prejudicada a alegação da denúncia dos defeitos a 20 de Novembro de 2003 com base no documento de fls. 224 e 225 e o reconhecimento do conhecimento pelo A. dos defeitos anterior à data por este alegada.
Assim, atentos os documentos de fls. 44 a 46 e 73 a 189 e o disposto no art. 343º nº 2 do C.C., o tribunal considerou provados os factos vertidos nos pontos 9 e 10 da matéria de facto provada”.
Ora, a fundamentação assim efectuada, apesar de sucinta, mostra-se perfeitamente enquadrável na letra dos nºs 3 e 4 daquele artigo 607º, pelo que não ocorre a invocada nulidade.
Invoca ainda o apelante a nulidade prevista no artigo 615º nº 1 alª d), argumentando que a sentença não se pronunciou sobre se houve ou não por parte da ré o reconhecimento do direito invocado pelo apelante que inviabilize definitivamente a verificação da caducidade.

Cumpre decidir.
Dispõe o artigo 615° n°1, alínea d) do Código de Processo Civil que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Esta nulidade está directamente relacionada com o artigo 608° n°2 do CPC, segundo o qual "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras".

Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes.

Como já ensinava o Professor Alberto dos Reis[1] " São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão".

Esta nulidade só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir pedido e excepções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das "razões" ou dos "argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas[2].

Assim, incumbe ao juiz conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente deve conhecer (artigo 608° n° 2 do CPC) à excepção daqueles cujo conhecimento esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outros.

O conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição directa sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui[3]

Tomadas estas considerações, diremos que a arguida nulidade é manifestamente descabida, pois a respectiva argumentação não constitui mais do que uma simples consideração ou argumento lateral produzido pelo apelante, sem qualquer interesse para a boa decisão da causa.

Foram especificados os fundamentos de facto e de direito da parte dispositiva da sentença, que não são contraditórios com esta, e houve pronúncia sobre todas as questões que cumprira conhecer, sem que tenha ocorrido qualquer omissão de pronúncia.

Para tal conclusão basta percorrer a sentença na sua forma e substância.

Terminando, para concluir esta questão, tal como refere a apelada, a questão em causa é a da excepção de caducidade invocada pela ré, a qual é obviamente objecto de pronúncia na sentença recorrida. Saber se o tribunal deveria ter levado a análise da decisão mais longe e pronunciar-se sobre um eventual reconhecimento por parte da ré do direito do autor é já uma questão de erro de julgamento, e não de nulidade da sentença.

IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE MATÉRIA DE FACTO.

Argumenta o apelante que existe nos autos prova produzida que necessariamente apontaria para uma decisão sobre a matéria de facto em sentido radicalmente oposto aquele que veio a ser fixado pelo tribunal a quo.
Refere que, para além dos factos dados como provados na sentença sob os nºs 1 a 10, todos os restantes e constantes no elenco do artº 14º da petição inicial e que constituem a base de ambas as perícias judiciais, deveriam ter sido dados como provados, à excepção dos descritos na alínea q) das conclusões.
Em consequência, o único ponto da matéria de facto não provada, encontra-se erradamente julgado, pois todos os defeitos abarcados pelo mesmo e acima não elencados deveriam ter sido dado como provados.

Tal ponto que a sentença considerou não provado (fl 681 vº) tem a seguinte redacção:
“As anomalias alegadas pelo autor não abrangidas pela condenação de 30 de Abril de 2013 e que não foram incluídas nos pontos 3, 4, 5, 6, 7 e 8 da matéria de facto provada”.

Vejamos então os depoimentos apresentados.

MD, funcionário da sociedade X que prestou serviços ao autor, designadamente o Relatório técnico junto pelo autor e que consta de fls 72 a 189 (Acta de 24.02.2017 - fls 670). Participou na auditoria e também na elaboração daquele.
Advogado: Ora bem, o que é que lhe quero perguntar. Relativamente aquilo que viu, portanto do trabalho que fez, o que é que nos pode transmitir, o que é que conclusões é que chegaram, de uma forma mais geral já que temos aqui o relatório nos autos?
Testemunha: Então foi solicitado à empresa que eu trabalho que é a X uma auditoria técnica a todo o edifício. Nessa auditoria técnica nós não conhecemos quem é o verdadeiro cliente, se é o construtor, se é dono de obra, ou os condóminos, neste caso e fazemos um levantamento exaustivo a todo o edifício, seguindo uma checklist previamente feita e adaptada ao tipo de edifício. E nessa auditoria identificamos os pontos que estão mal e que estão bem e vamos à procura da origem dos problemas que existirem
Advogado: E diga-me uma coisa, dessa análise a que genericamente a que tipos de problemas ou defeitos é que chegaram e que verificaram no imóvel?
Testemunha: Sim, verificámos a nível de construção civil, recordo que não fui que fiz essa parte, deixar claro, mas recordo-me haver infiltrações, fissuras, alguns maus acabamentos interiores, exteriores não me recordo, a não ser na cobertura também. A nível da parte eléctrica, temos os problemas de protecção dos ventiladores na cobertura. Depois havia ali um grave problema na questão de exaustão, nomeadamente entre lareiras, cozinhas, casas-de-banho.
Advogado: Olhe e diga-me uma coisa, o tipo de problemas, defeitos, patologias, utilizando o termo que preferir, que detectaram, esses defeitos eram passíveis de ser levantados, detectados, percebidos, por um condómino sem que houvesse recurso a uma análise do tipo daquela que vocês fizeram?
Testemunha: Alguns problemas, sim, outros, não, aquelas fissuras e infiltrações que se vê entrar água é óbvio que qualquer pessoa consegue identificar esses problemas. Na questão de outros problemas que é a origem das infiltrações, a questão da exaustão a questão dos problemas eléctricas tem que ser alguém que domine essa área e que tenha equipamento para procurar identificar a origem desses mesmos problemas.
Advogado: E diga-me uma coisa, no vosso relatório, portanto no relatório, é este, vocês portanto, quando fizeram o levantamento, isto está aqui dividido em várias, deixe-me cá ver, tem várias, depois tem um índice com várias partes onde o relatório aparece dividido, vocês tem um elenco de anomalias identificadas, é assim que lhe chamam, ou que o relatório chama. Depois vocês classificam a anomalia, aparece aqui no relatório com duas classificações diferentes, A e B. Pode explicar o que é que isto quer dizer?
Testemunha: Sim, nós exactamente para não haver dúvidas e pela nossa experiência, depois de identificar os problemas, a origem dos problemas, tentamos identificar, temos o nome como patologia tipo A, que são aquelas patologias que estão desde a construção, que foram, são defeitos de construção, por projecto ou por qualquer outro motivo, mas que foi, o edifício à partida foi entregue com aquele problema. Depois o tipo B, são aqueles problemas que nós consideramos que são dúbios, por exemplo riscos numa porta, riscos num pavimento. Será que foi feito por um condómino, por um animal, por uma criança. Problemas de manutenção. Esses problemas estão considerados como tipo B. Tipo A, é aqueles que nós na dúvida colocamos como tipo B. No tipo A, à partida não temos dúvidas porque são, não dá para ninguém fazer aquele problema pós obra, nomeadamente uma infiltração com uma má impermeabilização. Isso não tem ligação nenhuma com utilização do edifício. A questão da má exaustão das lareiras por falta de admissão de ar, por exemplo. Se não foi criada a admissão de ar, é claramente um problema de construção. Foi por aí que nós seguimos isso.
Advogado: Muito bem e diga-me uma coisa, estes problemas, portanto havendo aqui os de tipologia A, de origem construtiva e os de categoria B, manutenção… Em relação aos de categoria A, os de origem construtiva, pergunto-lhe se há aqui, ou se tem ideia daquilo que na altura fez, do levantamento que foi feito, se haveria aqui problemas que se resolveriam só por si, ou seja, pelo facto de ter tido aqui, neste processo mais duas análises, no caso duas peritagens ao local, ao fim de alguns anos, poderão ter existido situações que não se evidenciaram, como na altura em que o relatório foi feito. O que lhe pergunto é se, estes problemas por exemplo infiltrações, ou a questão das exaustões teriam por si só, se teriam auto acomodado e desaparecido?
Testemunha: Não, isso não e possível, se ninguém reparou por exemplo as questão das infiltrações não são auto reparáveis. O que pode ser é que no inverno, se uma auditoria foi feita sem equipamento, no verão, se as paredes estiverem secas, ninguém identifica uma infiltração. Se for no inverno e água estiver a escorrer, é identificável. Um diagnóstico técnico, também é preciso ter essa sensibilidade, o relatório técnico que a X faz, é com tempo e com equipamentos, estamos dedicados ao edifício naquela altura. Uma peritagem simples, (imperceptível) por exemplo, é uma análise visual e dependente, basta neste caso das infiltrações depender … da época do ano, há ou não infiltrações de água porque chove ou não chove agora reparar sozinho, não.
Advogado: Muito bem. Diga-me uma coisa eu verifico mais uma vez na análise do vosso relatório, que em determinada altura surgem aqui mencionados o tipo de métodos e de equipamentos a que recorreram. Temos por exemplo aqui umas imagens termográficas. Isto por exemplo aqui referindo-se à questão das infiltrações, isto foi um tipo de técnica a que tiveram que recorrer, por exemplo para perceber que tipo de infiltração é que era, donde é que ela provinha, é isso?
Testemunha: Sim, é isso. Como o diagnóstico é feito com equipamentos, a termografia, neste caso é uma câmara termográficas. Atenção que é uma câmara termográfica dedicada à construção civil. Porque hoje em dia já há câmaras termográficas já para telemóveis mas que não funcionam neste tipo de diagnóstico, é preciso deixar isso bem claro. Mas na duvida se existe uma infiltração activa ou se não existe uma infiltração activa, independentemente da época do ano por isso é que nós usamos esses equipamentos, é feito um varrimento aos (imperceptível) e se efectivamente que dizemos que a infiltração estava activa é com provas dadas pelas termografias, porque a diferença de temperaturas que a água causa nos materiais faz prova da infiltração, neste caso.
Advogado: Muito bem. Deste relatório, da análise que fizeram ao imóvel perguntava-lhe o que é que saltou mais à vista, o que causou maior impacto no meio de toda esta informação que recolheram?
Testemunha: Bom, primeiro temos que considerar que estamos a falar de uma habitação gama média alta, portanto com algum rigor que, devia ter algum rigor na construção. Eu destaco a questão das infiltrações, a questão das pinturas fissuras, pronto. A questão, que já falei há pouco da parte eléctrica ao nível dos ventiladores, que estava por acabar completamente e acima de tudo a questão das condutas de exaustão, conforme foram feitas, até causa perigo em caso de incêndio, de haver possibilidade propagação de incêndio de uns apartamentos para os outros, no caso das salas, porque existem condutas comuns a correr todo o edifício, que são autênticos condutores de chama, por exemplo, isso deixa-me preocupado. 
Advogado: Lembra-se de qual foi, se é que houve a reacção dos vossos clientes ao receberam aqui esta listagem de defeitos, anomalias?
Testemunha: Se calhar ficaram surpreendidos pela questão das anomalias, que nem eles próprios sabiam que tinham naquele edifício, lá está, muitas delas não são identificadas sem conhecimento e sem meios para isso.
Advogado: Sem uma análise…(imperceptível)
Testemunha: Sem uma análise profissional!..
Advogado: Muito bem. Olhe, quem é que o contactou, foi no fundo haa.., tem um superior hierárquico na X que lhe diz, olha vai fazer este relatório para ali, ou recebem um pedido de alguém,… já disse que não sabe quem o contratou mas alguém lhe disse para fazer….
Testemunha: Certo, eu explico, a X é uma entidade certificada ISO9001 e isso está tudo devidamente pensado e não é um telefonema. Portanto o cliente seja ele quem foi, liga para o departamento comercial, pede uma proposta, diz o que é que pretende e o departamento comercial então, por sua vez pede um agendamento ao departamento técnico. O director técnico verifica qual é a disponibilidade técnica e faz o agendamento com, diz ao departamento comercial no dia X temos data para os técnicos lá ir, depois da adjudicação. E os técnicos recebem uma folha, que chamamos folha de diagnóstico em que lá vem descrito quem é que nos vai receber naquele dia, que não sabemos se é o proprietário, se não é; vai lá escrito a pessoa, o nome da pessoa. No caso, neste serviço foi ao administrador de condomínio da altura, o contacto para quando chegarmos ao local, poderemos ligar para ele, se não nos encontrarmos e o âmbito do serviço. Neste caso foi um diagnóstico completo.
Advogado: E olhe, e essa checklist que falou, chamam checklist tipo de X, é uma coisa que é adaptada pelo director pela parte comercial que vos dá, como é que isso funciona?
Testemunha: É uma checklist tipo para a tipologia do edifício. Nós temos uma checklist para zonas comuns, foi o caso. Temos outras checklist para moradias e fracções…
Advogado: Mas é vossa?
Testemunha: Nossa e é a mesma checklist para aquele edifício em Lisboa, como para o edifício que podemos fazer no Porto ou no Algarve.
Advogado: Mas falando uma coisa que tem a ver consigo, que são a parte das instalações eléctricas e telecomunicações.
Testemunha: Sim.
Advogado: Por exemplo há uma questão sobre a caixa (imperceptível) não sei como…
Testemunha: Advogado Onde passam os cabos de TV. Isto foi passado 5 anos do edifício estar construído, é natural que as pessoas tenham televisão por cabo…
Testemunha: Mas já agora qual é a situação de caixa, o que é que ela tinha?
Advogado: Existem dois fios eléctricos com corrente sem qualquer protecção nas suas extremidades.
Testemunha: Certo.
Advogado: E a pergunta é, estas caixas são mexidas depois do edifício entregue designadamente por empresas que prestam serviços de televisão por cabo.
Testemunha: Certo.
Advogado: Isto não lhe suscita a divida se poderão ter sido estas empresas a mexer. Testemunha: Se fosse outro caso, sugeria. Agora a questão de haver fios mal isolados só se for mesmo vandalismo, que eu não acredito que uma empresa profissional que vá fazer a instalação, vandalize pontualmente uma situação, esse caso era claramente que nunca foi feito, nunca foi protegido o fio, está a perceber.
Advogado: Mas aceita que uma empesa profissional que monte essas coisas quando constrói o edifício faça isso?
Testemunha: Não, se fosse uma porta partida ou qualquer coisa assim que nós claramente víssemos que podia ser dessa empresa ou (…) feito durante este período de 5 anos, tudo bem, agora os fios que não foram nunca isolados, porque consegue-se perceber exactamente se um fio já esteve ligado ou não teve ligado, pronto e foi por aí que notei, claramente que o fio nunca foi ligado, nunca teve nenhuma peça porque o fio fica pisado com uma ligação e foi essa que nos balizou se é de construção ou (…).
Advogado: Muito bem. Senhor engenheiro, o senhor engenheiro não fez a parte das infiltrações, mas falou da termografia.
Testemunha: Falei porque…
Advogado: É o senhor engenheiro que faz a parte da termografia?
Testemunha: Não, mas trabalho há 10 anos e percebo plenamente como funciona a empresa, e conheço a termografia e trabalho com ela na questão…
Advogado: O que faz a termografia, que género de aparelho que é certificado?
Testemunha: É um aparelho (…) é certificado…
Advogado: E é mantido?
Testemunha: É mantido! Vai todos os anos à empresa que nos calibra, é a (…)
Advogado: Com certeza, não ponho isso em causa. Só estou a dizer é que no seu relatório, estava a falar da termografia, no seu relatório não tem, portanto, não tendo, o senhor engenheiro assume que estava. A minha pergunta é diferente se não estiver calibrado, o resultado pode não ser preciso.
Testemunha: Naquele tipo de equipamento não…
Advogado: Então é indiferente a calibração e a manutenção?...
Testemunha: Imagine a calibração daquele equipamento o que é faz, eu explico exactamente para que não haja dúvidas. Aquele equipamento, além de fazer o espectro termográfico diz-nos extramente quais temperaturas que tem, conseguimos apontar aquele equipamento para uma panela com água a ferver e aquele equipamento diz que água está a 100º. Portanto a calibração do equipamento é para garantir que ele quando diz 100º estão exactamente 100º, não está 101 nem está 99. No caso do âmbito das infiltrações, nós não precisamos de saber sequer se aquilo está, se a parede está a 20 ou 21, precisamos de saber é o contraste entre a zona húmida e a zona não húmida, mas isso a termografia tem a ver é com a sensibilidade da câmara por isso eu disse há pouco que algumas câmaras não dá para fazer isso, porque são pouco sensíveis, são sensíveis, para trabalhar materiais de construção. No entanto a questão de ela estar a falhar mesmo que não fosse calibrada e estar a falhar uma décima de grau pela falta de calibração, não ia alterar de forma o diagnóstico, se era uma infiltração activa ou se não era activa. Está a perceber aquilo que eu quero dizer, porque estamos a falar do espectro de uma imagem, e um espectro de uma parede por exemplo…
Advogado:Mas quando é que foram comprados estes equipamentos?
Testemunha: Foram em 2006 ou 2007.
Advogado Estes?
Testemunha: A empresa foi fundada em 2006 e por isso os equipamentos foram todos novos na empresa. Advogado E a manutenção é anualmente?
Testemunha: Alguns equipamentos, outros a certificação obriga -nos só de 2 em 2 anos.
Advogado: Olhe, o senhor também disse há pouco, o senhor engenheiro, que a propósito das infiltrações que às vezes tem a ver com o ser feito a análise no verão e outra vezes no inverno.
Testemunha: Certo, isto sem equipamento. Certo, é para perceber que não quer dizer que seja exactamente no dia mas para além disso nós fizemos o diagnóstico com equipamentos. Se calhar, no mesmo dia, fosse lá outra pessoa, mesmo técnica sem equipamentos se calhar não via alguns espectros onde havia infiltrações que nós já detectamos na altura. Já quanto ao sistema de exaustão a testemunha também se revelou inequívoca.
Advogado: Certo. Senhor engenheiro, sobre as exaustões, o senhor engenheiro disse que para si era uma questão muito grave, ser uma coluna única e que haveria riscos de incêndio. Não sei se estou…
Testemunha: Certo.
Advogado: Foi a ideia com que eu fiquei.
Testemunha: Não é uma coluna, eu posso explicar…
Advogado: Deixe primeiro fazer a pergunta. A minha pergunta é, estes edifícios não têm, não estão obrigados aa…, primeiro, os senhores quando fizeram esta vistoria tiveram acesso às telas finais do edifício?
Testemunha: Não tivemos acesso às telas finais porque as telas finais valem o que valem, que é mesmo assim!
Advogado: Valem quê?
Testemunha: Valem o que valem…Eu posso desenhar uma tela final depois do edifício estar pronto, sem equipamento, não consegue verificar a câmara municipal não consegue verificar se a tela final é efectivamente é aquilo que lá está.
Advogado: Olhe outra questão, é possível que alguns problemas, é possível, não! Os problemas que os condóminos se queixam com a questão da exaustão propriamente, o que é que os senhores se aperceberam. Puseram as lareiras e os exautores a funcionar, os recuperadores de calor?
Testemunha: Sim, isso ficou bem claro. Nós (…) edifícios por exemplo, em que qualquer situação, isso para deixar bem claro e para ser idóneo ao máximo, a situação das lareiras, também tem métodos de funcionamentos. Se uma pessoa funcionar mal com uma lareira muito bem-feita há de sempre deitar fumo para dentro de casa. Eu sou idóneo nisso. No entanto nos verificamos que nas cozinhas que existem ventiladores de extracção forçada, portanto exaustores comuns e em alguns apartamentos, lá está, isso é um defeito de construção, em alguns apartamentos as portas não tinha entradas de ar, havia portas que tinham entradas de ar, e que foram fechadas pelos condóminos. Isso é outro caso, havia outras portas que não tinham entradas de ar, que foi assumido portanto que é impossível entrar ar na cozinha para compensar os exaustores e o exaustor tem que ir buscar ar às lareiras. Portanto é esse erro de construção em algumas fracções.
Advogado: Não visitaram todas as fracções?
Testemunha: No dia do diagnóstico, não verificamos, acho, que não verificamos todas as fracções no dia do diagnóstico… depois as que verificamos umas tinham, outras não tinham entradas de ar permanente. Depois na sala fizeram, isto foi ideia de alguém, (…) na altura de construção, só pode ser porque não foi antes, quem fazia a admissão de ar nas salas, comum, isto é, é um tubo que vem da cobertura, tipo uma chaminé ao contrário em que entra o ar para as salas, porque para haver chama tem que haver oxigénio e a sala tem que ser alimentada com ar para se conseguir utilizar a lareira. Então eles fizeram uma conduta única a passar por todos os apartamentos, e essa conduta é que eu digo, que permite a propagação de chama, porque estamos a falar de um tubo metálico que liga um apartamento ao outro.
Juíza: Tentado só falar de algumas coisas que já tinha dito quando começamos e depois tivemos que repetir. Houve coisas que disse que eram defeitos detectáveis pelos condóminos, como falou das fissuras, o problemas da exaustão. Falou numa situação em que só se verificava …, falou na instalação eléctrica provisória.
Testemunha: Sim.
Juíza: Só detectaram…, não era detectável pelos condóminos, não é assim.
Testemunha: Sim.
Juíza: Só abrindo é que…
Testemunha: Nós verificamos que no piso superior, vou tentar ser muito objectivo para que perceba. Os ventiladores que estão na cobertura…
Juíza: Eu percebi, é porque causa da repetição, antes ter dito, estou a perguntar agora, para que possa dizer.
Testemunha: Ok, existem vários ventiladores eléctricos na cobertura, que são ligados,.. era suposto ter um quadro eléctrico no piso superior. Já dentro do imóvel mas no piso superior, (00:40:00) e nesse piso, nesse armário técnico não foi feito esse quadro eléctrico, foram feitos…, esses ventiladores foram ligados provisoriamente numa caixa, pronto, numa caixa ai montada provisoriamente, numa caixa pendurada no armário técnico para alimenta r esses ventiladores.
Juíza: Desta vez falou em infiltração activa e infiltração não activa. Também tinha dito da outra vez, infiltração activa, está-se a referir que é uma verdadeira infiltração e a outra será condensação, é isso?
Testemunha: Uma infiltração não activa é normalmente, consideramos uma infiltração não activa quando existem focos de infiltração mas que entretanto essa infiltração foi reparada, não estou a falar neste caso pontual no apartamento, estou a falar no geral, a infiltração foi reparada, está lá o espectro da infiltração mas não está activa. Infiltração activa é quando tem água no paramento ou então quando falei inicialmente sobre as câmaras termográficas também servem para despistar a questão da presença de fumos por condensação e de uma infiltração efectivamente real no (…) por exemplo.
RV, condómino e que faz parte da “comissão de acompanhamento (Acta de 28 de Abril de 2017 – fls 677).
Testemunha: Portanto é um edifício de grande dimensão. Isto para dizer que num edifício com esta estrutura e com esta dimensão, como julgo que será perceptível, não é fácil, e sobretudo para quem, como é o meu caso, tanto quanto conheço na grande maioria, para não dizer a totalidade, e só não digo totalidade porque não tenho por hábito questionar os meus vizinhos das suas actividades profissionais, mas na grande maioria pelo menos, tanto quanto sei ao longo destes anos, a maioria das pessoas não tem conhecimentos técnicos da parte de engenharia, arquitectura, que lhes facilitassem a vida no sentido de poder aperceber -se, de uma forma célere, de eventuais problemas que pudessem ir surgindo num edifício desta natureza. Sendo assim, quando eu entrei no edifício, que foi em Março de 2004, o edifício era recente, começou a ser habitado em Outubro de 2003, quando entrei no edifício desconhecia por completo o que se tinha passado naqueles meses até lá, mas nos primeiros anos, tirando uma situação pontual ou outra para a qual pudesse ser chamada a nossa atenção, tirando isso, como é normal num edifício com alguma qualidade – também devo dizer que o edifício foi vendido aos futuros compradores, como eu e os meus vizinhos, como de classe média alta (foi vendido em planta e em maqueta e só mais tarde construído), julgo eu que é suposto esperar que um edifício com estas características e vendido pelos preços que foram vendidas as respectivas fracções autónomas (eu sei do preço da minha), que não ofereçam problemas nos primeiros tempos.
(…) Portanto nessa assembleia geral de Janeiro ou Fevereiro de 2008 os condóminos, insatisfeitos já com esta postura por parte da ré, decidiram requerer uma auditoria técnica de diagnóstico ao edifício, completa, e, repito, um edifício de grande dimensão, ocupa um quarteirão completo, no sentido de permitir conhecer aos condóminos – repito também, a grande maioria, se não a totalidade deles, sem conhecimentos técnicos para que pudessem ser eles a fazer esse diagnóstico – permitir -nos ter um retracto de qual era o edifício em termos de eventuais patologias e eventuais defeitos, até porque, também aprendi eu ao longo destes anos, muitas vezes os defeitos ou patologias são aquilo que se chamam ocultos, ou seja, não são visíveis a olho nu e muito menos por pessoas não habilitadas tecnicamente para o fazer. E foi isso que aconteceu. No seguimento dessa assembleia geral a administração, ou no seguimento ou naquele período mais ou menos contemporâneo com a data de realização dessa assembleia geral, a administração contratou, com a autorização da assembleia geral de condóminos os serviços de uma empresa devidamente certificada e habilitada para fazer esse tipo de auditoria de diagnóstico, chamada Check House, e encomendou esse estudo. Esse estudo feito, falo por mim mas posso falar também da totalidade dos meus vizinhos condóminos, que quando recebemos o relatório referente a essa auditoria de diagnóstico, quase que se pode dizer que pusemos as mãos à cabeça. Eu penso que o relatório faz parte dos autos, que foi junto aos autos pelo mandatário judicial do condomínio, mas eu tenho aqui o relatório comigo, tenho uma cópia, um relatório com cento e dezassete páginas, bastante exaustivo, identificando um a um ou uma a uma as patologias e defeitos do edifício, classificando-os inclusivamente entre defeitos de construção ou de falta de qualidade dos materiais empregues na construção do edifício e outros defeitos resultantes de eventual falta de manutenção, estão devidamente identificados esses dois tipos neste relatório, ilustrado com inúmeras fotografias que atestam que à data da realização dessa auditoria de diagnóstico as patologias que estão aqui referenciadas existiam de facto porque de outra forma não poderiam estar aqui ilustradas com fotografias, juntando também uma série de registos termográficos que identificam infiltrações ou identificaram infiltrações ocultas, não aparentes, não visíveis a olho nu fazendo me dições com sondas que permitem detectar diferenças de temperatura no interior das paredes e portanto na parte não exterior, não observável a olho nu – também esses registos termográficos estão presentes nesse mesmo relatório – e atestam os defeitos que nesta altura ficámos a conhecer, e depois chega ao ponto de inclusivamente fazer uma série de recomendações relativamente à forma tecnicamente mais aconselhável de proceder à reparação desses defeitos.
(…) Havia ali talvez dois/três problemas principais que eram reportados, e eu próprio reportei no meu caso concreto à administração do condomínio enquanto condómino e morador, e um deles, muito importante, era relacionado com o funcionamento das lareiras ou dos recuperadores de calor. As casas estão equipadas com esses sistemas de recuperação de calor ou lareiras e as pessoas foram-se apercebendo que quando surgia o tempo mais frio no inverno, acendiam as suas lareiras mas de um momento para o outro, isso aconteceu comigo na minha casa duas ou três vezes, a sala (que é onde as lareiras estão) ficavam inundadas por vezes de fumo e quando não de fumo, também de cheiro – de cheiro sempre e de fumo proveniente não das nossas lareiras, mas de lareiras de fracções autónomas vizinhas. Portanto havia um problema efectivamente muito bem definido que era o mau funcionamento das lareiras ou recuperadores de calor, como queiramos chamar. Esse era um e foi reportado por vários condóminos à administração porque no meu caso concreto eu comecei a habitar em Março de 2004, terei começado a acender a minha lareira no inverno de 2004/2005, era impossível. A maior parte das pessoas eximiu-se de acender as suas lareiras.
Advogado: Muito bem. Sr RV, agora ultrapassando já a fase da dinâmica da comunicação dos defeitos, o senhor entretanto tem acompanhado aqui a situação até à actualidade, entretanto ocorreram até duas peritagens judiciais, penso que o senhor esteve presente, um dos relatórios menciona a sua presença, o que eu lhe quero perguntar é se efectivamente à data da realização das peritagens, os defeitos que estão elencados, as patologias elencadas no relatório que adveio da auditoria, se esses defeitos foram reparados. Testemunha: Não foram reparados.
Advogado: Portanto o que estava na altura permaneceu até hoje?
Testemunha: Exactamente. Eu até diria que o natural é tendo sido a auditoria feita em 2008 e por questões processuais as perícias técnicas judiciais (não sei se estou a dizer bem o nome), as peritagens foram realizadas em 2015 uma e em 2016 outra, o natural é que entre 2008 e 2015 e 2016, defeitos que já estavam consubstanciados e devidamente identificados – estou-me a problemas de impermeabilização, infiltrações, etc. – em 2008, que se tenham agravado à data da realização das perícias judiciais.
Advogado: Ao longo destes anos que se foram passando, relativamente às lareiras, por exemplo, quantas vistorias é que houve para ver se as lareias estavam em bom funcionamento ou não? Testemunha: Vistorias… não me estou a referir, portanto temos que ser precisos, não me estou a referir às perícias judicias!
Advogado: Não. Já vamos lá.
Testemunha: Sim.
Advogado: Estou-me a referir às vistorias feitas conjuntamente pela administração do condomínio e pelas rés.
Testemunha: Que seja do meu conhecimento, e é do meu conhecimento porque eu estive envolvido como membro da comissão de acompanhamento e junto da administração do condomínio, foi feita uma vistoria geral ao funcionamento das lareiras, para a qual foram convidados os representantes da K. Foi combinado uma data…
Advogado: E recorda-se quando é que isso foi?
Testemunha: Isso terá sido eventualmente 2006/2007.
Advogado: E foram feitas?…
Testemunha: Foi em maio/Junho de 2006.
Advogado: E no seguimento dessa vistoria foi feito, ou não foi, um protocolo sobre a correta utilização dos recuperadores de calor?
Testemunha: Antes desse protocolo foi feita outra coisa. A K assumiu existirem problemas com o funcionamento das lareiras e então procedeu na cobertura do edifício ao desnivelamento das chaminés, ou das saídas de fumo, das tubagens das lareiras de cada uma das fracções. Existe uma conduta comum nas couretes do edifício que depois se dirigem em direcção à cobertura, na cobertura existe uma série de tubagens cada uma referente a uma específica fracção autónoma, (-01.20.00-) muitas dessas saídas de condutas são contíguas entre elas e a K assumiu, no seguimento dessa vistoria, que o mau funcionamento das lareiras adviria do facto de as condutas, das saídas das condutas, estarem ao mesmo nível e então propôs à administração do condomínio, que aceitou, proceder ao desnivelamento dessas condutas na cobertura.
Advogado: E assumiu…
Testemunha: Só mas tarde é que a K, já feito esse desnivelamento, decidiu enviar um protocolo à administração do condomínio de forma a que esta distribuísse pelos condóminos alguns conselhos relativamente à forma mais correta de utilizar os recuperadores de calor. Advogado: E assumiu de que forma? Foi por escrito? Foi uma carta? Foi numa dessas cartas que o Sr. Dr. tem no dossier mas que o condomínio não nos deu?
Testemunha: Eu julgo que sim. 
AM, funcionário da ré (ACTA de 28 de Abril de 2017 – fls 677).
Advogado:-Mas não necessariamente aceites pela K como defeitos. Pelo menos as lareiras nunca foi aceite…
Testemunha: Não, as lareiras não. Interveio-se, tentou-se resolver, ver onde é que existiam problemas… Houve sítios onde se foi verificar, portanto a K no fundo aceitou… foi com os técnicos e penso que o assunto ficou resolvido relativamente às lareiras.

Análise crítica da prova
Preliminarmente, há que recordar que, consoante refere Abrantes Geraldes[4], as diferentes circunstâncias em que se encontra o Tribunal de 1ª instância e o Tribunal de 2ª instância «deverão ser ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados».

Dito de outro modo, quanto aos recursos que têm por objecto a reapreciação da matéria de facto, vigora o princípio da livre apreciação da prova – Cfr artigo 607°/5 do CPC - segundo o qual “o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.

Além deste princípio de livre apreciação da prova, vigoram ainda os princípios da imediação, da oralidade e da concentração, pelo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão de 1ª instância sobre a matéria de facto, deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados.
Posto isto, iremos apreciar a impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto.

Na página 7 deste acórdão transcrevemos a fundamentação da sentença relativamente à matéria de facto e com ela concordamos em absoluto.

Há que acrescentar que a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal – artigo 389º do Código Civil. E ainda que a segunda perícia não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo tribunal – artigo 489º do Código de Processo Civil. Por isso se compreende que a sentença, acertadamente, considere o relatório da primeira perícia mais “explicativo” e com maior “rigor”… e que o relatório da segunda perícia, por oposição, nada explica.

No tocante ao relatório elaborado pela empresa Check House (fls 73 a 189) e junto pelo autor que o encomendou àquela empresa, em termos de força probatória, é livremente apreciado pelo tribunal – Cfr artigo 376º do Código Civil.

Quanto às testemunhas que depuseram sobre esta matéria, tal como observa a apelada, nenhuma teve a virtualidade de alterar, quanto a qualquer ponto de facto a que se refira o artigo 14º da PI, a convicção do tribunal, nem sequer as transcrições escolhidas pelo Recorrente são de molde a concluir que se impunha ao tribunal de 1.ª instância uma decisão diversa quanto a determinados pontos da matéria de facto.

Assim, quanto à testemunha MD, a mesma foi um dos autores materiais do relatório de fls 73 a 189, estando o seu testemunho necessariamente vinculado pela prestação de serviços ao autor e a partir da qual este acabou por decidir propor a presente acção, para além de repetir o que constava do documento apenas foi tecer considerações gerais sobre o edifício dos autos, não prestando um testemunho concreto sobre a verificação ou não dos defeitos que lograsse infirmar as conclusões da perícia, meio probatório que, sendo igualmente sujeito à livre apreciação do tribunal, teve a virtualidade de o convencer suficientemente.

Por isso, consideramos este depoimento tendencioso e pouco convincente, pelo que em nada contribuiu para uma decisão diferente sobre a matéria de facto.

O mesmo se diga, relativamente à testemunha RV, que prestou um depoimento parcial e com falta de isenção, atenta a sua qualidade de condómino do edifício em causa nos autos. Como bem observa a apelada, a testemunha RP pronunciou-se bastante sobre a dinâmica da denúncia de defeitos, sobre se a ré teria feito reparações na sequência do relatório junto a fls 73 a 189, mas sobre os defeitos em concreto alegados, o seu depoimento foi feito em termos muito genéricos e, por isso mesmo, não susceptível de pôr em causa as conclusões dos engenheiros, peritos, que realizaram as perícias.
Quanto à testemunha AM, funcionário da ré, praticamente nada disse, sendo o seu depoimento totalmente irrelevante.
Terminando, para concluir, diremos que a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto improcede, mantendo-se, por isso, a decisão da primeira instância.

A QUESTÃO DE DIREITO.
Argumenta o apelante que, se cada um dos prazos previstos no artigo 1225º “for levado ao seu limite, poderá resultar um prazo total acumulado de 7 anos, e portanto nos presentes autos, uma vez que os defeitos foram conhecidos ainda dentro dos cinco anos de garantia (ponto 9 da matéria provada), e foram denunciados dentro do ano subsequente ao seu conhecimento e a presente acção deu entrada dentro do ano subsequente a tal denúncia, terá de se considera que a excepção de caducidade não poderá proceder.

A sentença recorrida julgou procedente a excepção de caducidade.

Cumpre decidir.

No que toca à excepção de caducidade, o regime aplicável à efectivação da responsabilidade do construtor empreiteiro pelos defeitos de um imóvel enquadráveis no artigo 1225º do Código Civil é o definido nesta disposição e não no artigo 926º[5].

O artigo 1225º do Código Civil, sob a epígrafe, (Imóveis destinados a longa duração), preceitua o seguinte:
“ 1.– Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada tiver por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente.
2.– A denúncia, em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia.
3.– Os prazos previstos no número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previstos no artigo 1221º.
4.– O disposto nos números anteriores é aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado”.

O prazo estabelecido neste artigo é de caducidade.

Assim, o preceito aplica-se à interveniente “Habier-Construções Ldª”, na qualidade de construtora do prédio.
E também se aplica à ré “K – Sociedade Gestora da Alta de Lisboa, SA”, na qualidade de dona da obra, ou de vendedora, por força do seu nº 4.
Efectivamente, o nº 4 do artigo 1225º do Código Civil, introduzido pelo Decreto-Lei nº 267/94, de 25 de Outubro, veio estabelecer que as normas do contrato de empreitada que regulam a responsabilidade do empreiteiro pelos defeitos da obra se aplicam à compra e venda celebrado com o respectivo construtor do imóvel destinado a longa duração.

Como refere Calvão da Silva, “este mesmo diploma legal – Decreto-Lei nº 267/94 –, além da expressa responsabilização do empreiteiro perante o terceiro adquirente do imóvel, dando nova redacção ao nº 1, in fine, do artigo 1225º, veio aplicar o regime estatuído pelo artigo 1225º ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado, aditando-lhe o novo nº 4, por forma a evitar que o empreiteiro se escude na relatividade da empreitada e sua ineficácia perante terceiros compradores. Desta sorte, quando, na compra e venda, o alienante tenha sido também o construtor do imóvel (vendedor e construtor), mas inexista e apesar de inexistir empreitada entre ele e o comprador, aos defeitos da coisa transmitida deve aplicar-se o regime do artigo 1225º e não o dos artigos 916º e 917”[6]

A questão que se coloca é a de saber a partir de que momento se conta o prazo de caducidade de cinco anos previsto no nº 1 do artigo 1225º do Código Civil: a partir de 14.07.2003, como foi decidido na sentença, ou aquele prazo de caducidade é de 7 anos, como vem alegado nas conclusões da apelação.

No caso dos autos, estamos perante defeitos verificados nas áreas comuns do Condomínio do prédio sito no “alto do Lumiar”, Lote 99/003, Lisboa.
Neste caso, a questão pode suscitar entendimentos divergentes que, no essencial, se reconduzem às seguintes orientações:
a)- O início do prazo de caducidade iniciar-se-ia com a primeira entrega de fracção autónoma a condómino adquirente;
b)- Com a última entrega de fracção autónoma a condómino adquirente;
c)- Com a entrega da maioria das fracções autónomas aos condóminos adquirentes;
d)- Com a transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos, através da sua estrutura organizativa, reunindo em assembleia de condóminos e elegendo o seu administrador.

Aderimos à terceira orientação, considerando o seguinte:
Entendemos, assim, que a tese mais razoável será aquela que entende que o momento a partir do qual se deve ter como efectuada a entrega do prédio, é aquele momento a partir do qual o vendedor deixa de ter poder para determinar ou influir sobre o curso das decisões dos condóminos constituídos em assembleia de interesses autónomos e identificados com os interesses comuns que passam a representar de modo orgânico e próprio plasmados nas deliberações que tomam.

Este momento – da cisão/apartamento do vendedor do prédio vendido – pode coincidir, ou não, com a constituição da assembleia de condóminos. Relevante, para o seu início, é que o prédio esteja em condições de ser entregue à assembleia de condóminos para que esta possa exercer todos os direitos de fiscalização sobre as partes comuns, de forma livre, ou seja, sem que se encontre manietada pela circunstância de o construtor ou vendedor, enquanto detentor de uma percentagem maioritária do prédio, poder, de alguma forma, impedir o exercício de tais direitos, impossibilitando o exercício de direitos por parte da assembleia.

Aqui chegados, importa referir que o facto de não estar devidamente constituída a administração do condomínio, por incúria dos condóminos em constituí-la formalmente, em nada afasta a circunstância de o prédio estar entregue aos condóminos, verificada que esteja a existência da detenção, pelos condóminos singulares, de um capital superior a 25% (pois que a assembleia de condóminos poderá ser convocada por, pelo menos, vinte e cinco por cento do capital investido e deliberar a propositura da acção colectiva (cfr. artigo 1431º, n.º2, do Código Civil).

Analisados os factos supra elencados como provados, constatamos que a primeira administração do condomínio foi eleita a 14 de Julho de 2003 em assembleia geral de condóminos – Facto provado sob o nº 1.

Entendemos, assim, que o prazo de garantia de cinco anos, se iniciou em 14/07/2003, pois que a partir desse momento a ré deixou de ter qualquer poder para influenciar o curso das decisões a tomar sobre o prédio. A ser assim, como entendemos que deve ser, concluímos que o prazo máximo de garantia estabelecido se esgotou em 14/07/2008, por aí se encontrarem decorridos os cincos anos que aos consumidores se mostram concedidos para exercer os seus direitos de reparação de vícios da coisa adquirida.

A presente acção deu entrada em 30 de Junho de 2009.

Resultou provado que o autor teve conhecimento dos defeitos mencionados nos pontos 3, 4, 5, 6, 7 e 8 a 14 de Abril de 2008., mas só os denunciou à ré em 2 de Janeiro de 2009, por carta registada com A/R, ou seja, já depois de findo o prazo máximo de cinco anos - Factos provados nºs 9º e 10º.

Nesta conformidade, confirma-se a douta sentença quando julga procedente a excepção de caducidade invocada pela ré e improcedem as conclusões das alegações do apelante.

III–DECISÃO

Atento o exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.



Lisboa,08-02-2018 



Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais
Isoleta de Almeida Costa



[1]Código de Processo Civil Anotado, Vol V, pág. 143. Cfr. Ac.STJ de 7.7.94, in BMJ n° 439, pág. 526 e de 22.6.99, in, CJ STJ II/1999, pág. 161 e da RL de 10.22004, in CJ I/2004, pág. 105.
[2]Ac. STJ de 21.12.2005, in www.dgsi.pt/jstj.
[3]Ac. STJ de 8.3.2001, in www.dgsi.jstj/pt.
[4]Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág. 235.
[5]Ac. STJ de 26.0.4.1983, in BMJ 326º-472.
[6]Compra e Venda de Coisas Defeituosas, págs. 102 e 103.