Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
167/06.4TBMFR.L1-7
Relator: HIGINA CASTELO
Descritores: PROVA PERICIAL
APRECIAÇÃO DA PROVA
VALOR DO BEM
EXPROPRIAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: As provas são livremente apreciadas e a pericial não se afasta da regra; porém, considerando a própria natureza da prova pericial que é determinada pela necessidade de conhecimentos especiais de certas áreas do saber que escapam ao julgador, o afastamento de um laudo maioritário, para mais arbitrando uma indemnização mais de três vezes superior ao parecer da maioria dos peritos, carece de detida fundamentação.

A determinação do valor do bem expropriado, obedecendo embora às regras definidas no Código das Expropriações, é um problema essencialmente técnico, que demanda áreas do conhecimento extrajurídico; apenas quando o juiz deteta que a avaliação dos peritos maioritários é desconforme às regras jurídicas que tinham que observar poderá haver um afastamento substancial daquela avaliação.

Esse afastamento não deve ocorrer sem que o juiz tente previamente perceber junto dos peritos (que são, afinal, os especialistas por si nomeados) as razões do seu parecer, pedindo os esclarecimentos necessários para se certificar de que os peritos não cumpriram os passos legalmente impostos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.


I.Relatório:


EP– Estradas de Portugal, S.A., expropriante no processo indicado à margem em que é expropriada Maria A., notificada da sentença que julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela expropriada e improcedente o recurso subordinado interposto pela expropriante, proferida em 21 de novembro de 2017, e com ela não se conformando, interpôs o presente recurso.

A expropriante EP – Estradas de Portugal, E.P.E, tinha requerido a expropriação por utilidade pública urgente das parcelas n.ºs 5.1 e 5.2, com área global de 2.416 m2 a destacar do prédio rústico situado nos limites do C..., freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º 3... e inscrito na matriz rústica sob o art.º 1.., secção E, da referida freguesia, pertencente a Maria A., com vista à execução da Autoestrada Ericeira-Mafra-Malveira, sublanço Ericeira-Mafra.

Por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, das parcelas de terreno necessárias à construção da Autoestrada acima referida, identificadas em quadro anexo ao despacho, quer pelo número de parcela, quer pelos proprietários, identificação matricial e predial, bem como área, autorizando-se logo a expropriante a tomar posse administrativa das mesmas.

A expropriante promoveu a realização da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a qual teve lugar a 04-05-2005 e da qual se lavrou auto (fls. 15 e seguintes).

A 19-07-2005, foi lavrado o auto de posse administrativa a favor da expropriante (fls. 33 a 35).

Tendo-se frustrado a aquisição da parcela por via do direito privado, promoveu a expropriante a realização de arbitragem, a qual teve lugar, tendo o colégio arbitral produzido acórdão, com respostas aos quesitos elaborados, onde atribuíram à expropriada indemnização no montante correspondente a € 63.763,92 (fls. 43 e seguintes).

A 23-01-2006, foi proferido despacho de adjudicação à expropriante das aludidas parcelas (fls. 68), o qual transitou em julgado.

A fls. 80 e seguintes, suscitou ainda a expropriada o incidente de expropriação total.

A fls. 253 e seguintes, a entidade expropriante exerceu o contraditório relativamente ao incidente no parágrafo anterior identificado.

A fls. 484 e seguintes, e após procedência do recurso interposto da primeira decisão proferida em sede incidental, consta decisão relativamente ao incidente de expropriação total, o qual improcedeu.

Inconformada com o acórdão arbitral, a expropriada interpôs recurso judicial (fls. 100 e seguintes), o qual foi admitido (fls. 220), tendo previamente suscitado incidente de mora na realização do depósito previsto no artigo 20.º, n.º 1, alínea b) do Cód. Expropriações.

A fls. 237 e seguintes, a entidade expropriante ofereceu resposta ao recurso interposto pela expropriada, no qual também se pronunciou sobre incidente acima referido, e recorreu subordinadamente, recurso admitido a fls. 266.

A fls. 297 e seguintes, a expropriada respondeu ao recurso interposto pela entidade expropriante.

Procedeu-se à avaliação obrigatória a que alude o n.º 2 do artigo 61.º do Código das Expropriações, tendo os peritos nomeados pela entidade expropriante e pelo Tribunal elaborado o relatório que consta a fls. 407 e seguintes e no qual fixam o valor da indemnização devida em € 58.767,15.

Por despacho proferido a fls. 736, determinou-se a realização de nova avaliação na sequência do decesso de um dos senhores peritos, para o que foi recomposto o colégio pericial, tudo nos termos aí melhor descritos.

Nesta sequência, foi elaborado o relatório de avaliação que consta de fls. 747 e seguintes dos autos, subscrito somente pelo perito nomeado para reconstituição do colégio pericial, por divergir do previamente apresentado que foi mantido pelos seus subscritores.
No mesmo, pugnou pela fixação da avaliação em € 96.363,75.

Por seu turno, o perito nomeado a indicação da expropriada apresentou o relatório de avaliação constante de fls. 922 e seguintes, no qual indica € 2.890.552,37 como montante indemnizatório.

A fls. 1346-50, o tribunal a quo conheceu do incidente suscitado aquando da interposição de recurso pela expropriada, o qual mereceu provimento nos termos aí melhor consignados, e determinou, tal como solicitado pela expropriada a fls. 318 e seguintes, a realização de avaliação por banda dos subscritores do relatório de avaliação maioritário (peritos do tribunal e da expropriante) com recurso aos critérios insertos no CIMI, atendendo e aplicando o sistema de indicador de preços na construção e habitação do INE e, finalmente, aplicando o sistema comparativo dos preços de mercado para a zona.

Em cumprimento do ordenado, a fls. 1360-71, os referidos peritos juntaram complemento ao relatório de avaliação, concluindo: a) o perito da expropriante e dois peritos do tribunal, que às parcelas 5.1 e 5.2 seja atribuída indemnização de € 130.300; b) um perito do tribunal que seja atribuída indemnização de € 164.124.

A expropriada arguiu ilegalidades e deficiências e pediu esclarecimentos. (fls. 1384-92).

Foram prestados os esclarecimentos.

As partes alegaram; a expropriada terminou pedindo indemnização de € 1.003.064,18 (fls. 1419 e seguintes) e a expropriante pugnando pela improcedência do recurso da expropriada, pelas razões que constam do relatório maioritário dos senhores peritos (fls. 1440 e seguintes).

Por incidente suscitado a fls. 1446 e ss., e com fundamento na falta de realização pela expropriante das obras de acesso à parcela sobrante, a expropriada requereu a renovação da instância de expropriação total.

Por despacho de 07/04/2016 (fls. 1534 dos autos), o tribunal a quo disse:
«Compulsados os autos, constato que em qualquer das decisões proferidas em sede de incidente de expropriação total, constantes a fls. 261 e seguintes (1.º Volume) e a fls. 484 e seguintes (3.º Volume), não se determinou a realização de obras ao abrigo do artigo 56.º, n.º 1 do Cód. Expropriações, sendo que as diligências entretanto ordenadas destinar-se-iam basicamente a instruir incidente de igual natureza suscitado no processo n.º 171/06.2TBMFR e a facultar a solução concertada das questões ora suscitadas, já que se revela impossível renovar a instância incidental ao abrigo do artigo 56.º, n.º 4 do diploma em referência por falhar o pressuposto de que depende e, consequentemente, encontrar-se decidida com a força de caso julgado que resulta do artigo 619.º do Cód. Proc. Civil.

Assim, não se afigura de determinar a realização das diligências solicitadas a fls. 1519 verso e seguintes, pelo menos não no âmbito dos presentes autos.

No que respeita à solução concertada das questões, a mesma não foi alcançada, razão pela qual, antes do mais e por forma a esclarecer a razão do conteúdo do segundo parágrafo de fls. 1446 verso (requerimento da expropriada de 21.06.2015), repetido a 14-º de fls. 1530 e seguintes (requerimento da expropriada de 01.03.2016), informe a expropriada se não terá incorrido em erro de análise das decisões proferidas sobre o incidente de expropriação total.»

Em requerimento de 27/04/2016, a expropriada requereu, uma vez mais, a renovação de incidente de expropriação total (fls. 1535- 1541).

A expropriante respondeu, concluindo que o direito à expropriação total foi judicialmente analisado e a decisão transitou em julgado, não existindo factos novos que justifiquem a violação do caso julgado (fls. 1550 v.º).

O incidente de renovação da instância de expropriação total foi indeferido nos termos dos despachos de fls. 1534 e 1552, este de 01/06/2016 com o seguinte teor:
«Fls. 1535 e seguintes: Tendo em conta o que já se verteu no despacho precedente, e uma vez que pelo presente somente se visa liquidar a indemnização devida pela expropriação realizada e não já determinar qualquer outra conduta ou indemnização por atuação em eventual violação dos direitos de propriedade sobre as parcelas sobrantes/não expropriadas, como bem aponta a entidade expropriante, nada mais há a ordenar nos autos relativamente a um incidente que manifestamente se encontra definitivamente decidido nos autos.»

Foi dada nova oportunidade para produção de alegações, que as partes aproveitaram a fls. 1589 e seguintes e 1608 e seguintes.
Em seguida é proferida a sentença de 21/11/2017, com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, julgo:
a)- parcialmente procedente o recurso interposto pela expropriada e, consequentemente, fixo em € 489.789 (quatrocentos e oitenta e nove mil setecentos e oitenta e nove euros) a indemnização a pagar à mesma na sequência da expropriação do prédio melhor identificado nos autos;
b)- integralmente improcedente o recurso subordinado interposto pela entidade expropriante.

Mais determino que o montante indemnizatório identificado em a) seja atualizado desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data da decisão final do processo, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, exceto na parte relativa à quantia já levantada, a qual deve ser atualizada até à data do levantamento.»

A expropriante recorre, concluindo as suas alegações de recurso como segue:
«1.– O presente recurso é interposto pela entidade expropriante da sentença proferida em sede de recurso da decisão arbitral que fixou a indemnização em € 489.789,00 (quatrocentos e oitenta e nove mil, setecentos e oitenta e nove euros).
2.– As parcelas n.ºs 5.1 e 5.2, com a área total de 2.416 m2, integram o conjunto de parcelas de terreno necessárias à execução da Autoestrada Ericeira-Malveira-Mafra, sublanço Ericeira-Mafra, cuja utilidade pública, com caráter de urgência, foi declarada pelo despacho n.º 5018-A/2005, de 14 de fevereiro de 2005, publicado na II Série do Diário da República, do Senhor Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
3.– A decisão arbitral fixou a indemnização a atribuir em € 63.763,92.
4.– Interposto recurso daquela decisão arbitral, foi efetuada a avaliação prevista no n.º 2 do artigo 61.º do C.E., tendo os peritos concluído, em relatório maioritário, subscrito por quatro peritos, pela fixação do valor em € 58.767,15.
5.– Determinada a recomposição do colégio pericial, os peritos que haviam subscrito o relatório pericial inicial mantiveram a avaliação (€ 58.767,15), tendo o novo perito apresentado autonomamente o valor de € 96.363,75 e o perito nomeado pela Expropriada o valor de € 2.890.552,37.
6.– Por despacho do Tribunal, foi determinada a realização de uma terceira avaliação aos peritos subscritores do relatório maioritário, com recurso aos critérios insertos no CIMI, atendendo e aplicando o sistema de indicador de preços na construção e habitação do INE e aplicando o sistema comparativo dos preços de mercado para a zona;
7.– Nesta terceira avaliação, os peritos, recorreram ao método da determinação do valor residual do terreno ou método do investimento, conjugado com o método comparativo e, a partir dos pressupostos referidos no relatório e construindo o cenário provável de aproveitamento do terreno, alcançaram o valor de mercado de € 131.300 (três dos quatro peritos subscritores do relatório maioritário inicial) e de € 164.124 (um dos quatro peritos subscritores do relatório maioritário inicial).
8.– Esta terceira avaliação, apesar de ter resultado de despacho judicial, foi totalmente desprezada, a ponto de nem sequer ter sido mencionada na sentença.
9.– A prova pericial assume relevância no processo de expropriação por utilidade pública e um laudo maioritário tem especial peso na decisão que o juiz vier a tomar na determinação do montante de indemnização a atribuir.
10.– Com efeito, tratando-se de uma avaliação essencialmente técnica, não pode o juiz, conforme jurisprudência abundante, afastar-se do resultado das peritagens, sem elementos sólidos suficientes, capazes de contrariar o resultado daquela avaliação.
11.– A avaliação pericial tem por objeto matéria cuja análise e perceção requerem conhecimentos especializados suficientemente justificativos do apoio técnico especializado.
12.– Todavia, a sentença recorrida rejeitou, quer o parecer técnico dos árbitros quer os apresentados pelos peritos.
13.– Ora, qualquer dos laudos apresentados pelos peritos designados pelo Tribunal e pela Expropriante utiliza um método de avaliação coerente e fundamentado.
14.– A douta sentença recorrida, ao desprezar os relatórios produzidos, optou por se lançar na tarefa de os substituir, incorrendo em diversos equívocos.
15.– Assim, não teve presente a douta sentença que o valor unitário da avaliação bancária divulgado pelo INE reflete o valor de construção e não o custo de construção.
16.– Assim, admitindo que o aproveitamento edificatório do prédio seria através de moradias unifamiliares e que tal pressuporia a realização de um loteamento, a douta sentença esqueceu-se de considerar – retirar – a área dos lotes necessária para as infraestruturas (obrigatórias).
17.– Assim, na comparação de preços unitários, para além de ter entrado em contradição com o que inicialmente afirmara sobre escassez de elementos, a douta sentença desconsiderou que o IGT prevê que nos espaços urbanos existam classificações distintas, com índices urbanísticos diferentes.
18.– Assim, a douta sentença aplicou ainda o preço unitário que obteve a toda a área e não, como devia, apenas à área permitida lotear.
19.– Assim, a douta sentença não considerou os custos com a urbanização necessária.
20.– Assim, a douta sentença não considerou os custos de construção e de esforço inerente à atividade construtiva.
21.– Também no que se refere à área sobrante a douta sentença se baseou em critérios subjetivos e não fundamentados, de que resultou a atribuição injustificada de 20 %.
22.– Em suma, ao substituir-se aos peritos, que têm o adequado conhecimento técnico, o julgador cometeu equívocos sobre equívocos.
23.– Em consequência, o valor apurado na douta sentença é totalmente destituído de sentido e deve ser revogado.
Termos em que deve ser revogada a douta sentença de primeira instância, com a consequente determinação da avaliação das parcelas expropriadas com base na metodologia prevista no artigo 26.º, n.º 4, do Código das Expropriações.»

A expropriada contra-alegou.
Nas suas contra-alegações, a expropriada teceu amplos conjuntos de considerações e terminou com pedidos que apenas teriam dotação em sede de recurso subordinado. Porém, não o deduziu. Tanto assim, que o tribunal a quo também não se pronunciou sobre um putativo recurso subordinado, que não existiu; nem a parte contrária foi notificada para contra-alegar nesse hipotético âmbito; nem o fez.

Pelo contrário, logo após as contra-alegações foi proferido despacho de admissão da apelação (despacho de 20/02/2018 – fls. 1783), ao qual também não foi apontada qualquer omissão.
Um eventual recurso subordinado teria de ter sido expressamente deduzido.

Não o tendo sido, não serão tidas em consideração as contra-alegações nas partes tendentes a modificar, a favor da expropriada, a decisão recorrida.

Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.

Objeto do recurso
Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.º 2, e 639, n.ºs 1 e 2, do CPC).

No caso, o objeto do recurso cinge-se às conclusões da recorrente.

A recorrida, embora tenha aproveitado as suas contra-alegações para deduzir pedidos, nomeadamente de modificação da sentença, não recorreu subordinadamente (nem autonomamente), pelo que, como já acima deixámos dito, as suas alegações não serão atendidas nessa parte.

Uma das questões suscitadas nas contra-alegações – a invocada «ilegitimidade» da EP - Estradas de Portugal, S.A. –, se pertinente fosse, seria de conhecimento oficioso e, nessa medida, passamos a pronunciar-nos nesta sede apenas para justificar por que razão não será apreciada. O facto de os requerimentos serem apresentados com o nome que a parte tinha à data da propositura da ação (EP - Estradas de Portugal, S.A.) – e não com a designação atual, da entidade na qual a primitiva foi incorporada e depois transformada – não gera qualquer ilegitimidade processual e é totalmente irrelevante. O DL 91/2015, de 29 de maio, procedeu à fusão, por incorporação, da EP - Estradas de Portugal, S.A., na REFER - Rede Ferroviária Nacional, E.P.E., transformou a REFER em sociedade anónima, redenominando-a para Infraestruturas de Portugal, S.A. Nos termos do art. 2.º, a fusão não constitui alteração de circunstâncias ou variação dos contratos celebrados pela REFER, E.P.E., e pela EP, S.A., com terceiros; nos contratos em que foram prestadas garantias a favor da EP, S.A., estas mantêm-se válidas por força da transferência universal do património da EP, S.A., para a IP, S.A., mantendo-se igualmente válidas as garantias prestadas a favor da REFER, E.P.E.; e a publicação do diploma substitui, para todos os efeitos legais e contratuais, a necessidade de comunicação ou notificação da sucessão ou transmissão da posição contratual por parte da REFER, E.P.E., e da EP, S.A., nos contratos por estas celebrados. Segundo o n.º 5 do mesmo artigo, todas as referências legais, regulamentares e contratuais, feitas à REFER, E.P.E., e ou à EP, S.A., consideram-se feitas à IP, S.A.

Em suma, por via legislativa, a parte é agora denominada Infraestruturas de Portugal, S.A., sendo irrelevante o facto de os requerimentos continuarem a ser efetuados com a primitiva designação.

Tendo em consideração o teor das alegações de recurso, coloca-se a questão de saber qual a indemnização adequada às parcelas expropriadas.

II.Fundamentação de facto.

Estão provados os seguintes factos (relacionados na sentença da 1.ª instância):
1.– Por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas n.º 5018-A/2005 de 14.02.2005, e publicado no DR-II, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, das parcelas de terreno necessárias à execução da Autoestrada Ericeira-Mafra-Malveira, autorizando desde logo a expropriante a tomar posse administrativa das referidas parcelas;
2.– Entre as parcelas acima mencionadas, encontram-se as n.ºs 5.1 e 5.2, com área de 2.416 m2, a destacar do prédio rústico sito nos limites do C... na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mafra sob o n.º 3... e inscrito na matriz rústica sob o art.º 1..., secção E, da referida freguesia, com área total de 12.750 m2;
3.– Na descrição aberta no Registo Predial de Mafra, melhor identificada em 2., encontra-se inscrita, desde 21.07.1982, a aquisição do direito de propriedade sobre o prédio aí melhor identificado a favor de Maria A., por compra;
4.– O prédio acima referido possuía as seguintes confrontações: Norte – EN 116; Sul – Casal do Cordeiro; Nascente e Poente - Caminho;
5.– A parcela 5.1 é um canto com 162 m2 junto à EN 116, alcatroada, dotada de infraestruturas elétricas, águas, telefones e iluminação pública;
6.– A parcela 5.2 é um canto com 2.254 m2, interior à estrada, marginada a sul por um barranco;
7.– Ambas as parcelas foram um antigo terreno de cultivo, estando inculto à data da realização da Vistoria Ad Perpetuam Rei Memoriam, apresentando ligeira pendente, com solos argiloarenosos, com exposição a poente, com vistas de mar, do qual dista cerca de mil e duzentos metro;
8.– A parcela 5.1. encontrava-se murada em 20 m de extensão com um muro de alvenaria de pedra rebocada, com 1,3 m de altura e de 0.40 de espessura;
9.– O prédio é marginado pela EN 116, via pública alcatroada, e é dotado de infraestruturas urbanísticas:
– de água;
– eletricidade;
– iluminação pública;
– telefones;
– rede de saneamento ligada a estação depuradora.
10.– O prédio é rodeado por densas florestas e na sua zona de inserção do não existem indústrias poluentes, sendo que a cerca de 100 metro do mesmo existem dois pavilhões comerciais, um afeto à comercialização de materiais de construção e outro à de mobiliário e decoração;
11.– A EN 116, com a qual confronta o prédio a Norte, entronca a cerca de um quilómetro para poente com a EN 247, na Ericeira, e a nove quilómetros para Nascente na EN9, em Mafra;
12.– O prédio situa-se no limite nascente da freguesia da Ericeira, encontrando-se inserido em área e expansão urbana, com construções habitacionais na generalidade constituídas por moradias térreas ou de rés-do-chão e andar, de construção corrente, parte situadas em loteamentos recentes à data da realização da Vistoria Ad Perpetuam Rei Memoriam;
13.– O prédio dista, em linha reta:
– 400 metro dos centros de saúde e desportivo;
– 1000 metro do Quartel dos Bombeiros;
– 1100 metro do Mercado da Ericeira, Correios e GNR;
– 1200 metro da praia mais próxima.
14.– O Plano Diretor Municipal de Mafra foi ratificado por Resolução do Conselho de Ministro n.º 175/95, publicado no DR série I-B, de 27 de Dezembro;
15.– Por Portaria n.º 1248/95 de 18.10, foi ratificado o Plano de Urbanização da Área Territorial da Ericeira;
16.– Nos termos do Plano Diretor Municipal de Mafra e do Plano de Urbanização da Área Territorial da Ericeira, a área de 945 m2 das parcelas acima referidas insere-se em Zona UB1, por não ser ocupada por apreciável mancha arborizada, destinada a habitação, equipamento urbano compatível e empreendimentos turísticos de baixa densidade;
17.– Nos termos do n.º 3 do artigo 34.º do Plano de Urbanização da Área Territorial da Ericeira, a zona em que se insere o prédio permite:
– Loteamentos para habitação unifamiliar, com frente mínima de 5 m se em banda, 10 m se geminada e de 20 m se isolada; CAS máximo - 0,5, COS máximo – 1 e Altura máxima - dois pisos, com eventual ocupação de sótão sob telhado e com um lugar por fogo na rua e outro no lote no que respeita a estacionamento mínimo e para habitação;
– Outros loteamentos: densidades máximas - 40 fogos/ha, 120 habitantes/ha; CAS máximo - 0,5; COS máximo – l, com altura máxima - três pisos, com eventual ocupação de sótão sob telhado e estacionamento mínimo e para habitação - um lugar por fogo na rua e um lugar por fogo no lote.
18.– Nos termos do Plano Diretor Municipal de Mafra e do Plano de Urbanização da Área Territorial da Ericeira, a área de 1.471 m2 das parcelas acima referidas insere-se em Zona UC;
19.– Nos termos do n.º 2 do artigo 36.º do Plano de Urbanização da Área Territorial da Ericeira, a zona em que se insere o prédio permite:
– Loteamentos para habitação unifamiliar, com área mínima de lote de 150 m2, com frente mínima de 5 m se em banda, 10 m se geminada e de 15 m se isolada; CAS máximo - 0,5, COS máximo – 1,2 e Altura máxima - dois pisos, com eventual ocupação de sótão sob telhado
– Outros loteamentos: área mínima do lote de 250 m2, com uma frente mínima de 10 m, densidades máximas - 70 fogos/ha, 210 habitantes/ha; CAS máximo - 0,6; COS máximo – l,5, com altura máxima - quatro pisos, estacionamento mínimo para habitação de um lugar por fogo.
20.– Um fogo médio tem 100 m2;
21.– O Instituto Nacional de Estatística divulgou os valores unitários da avaliação bancária de habitação por natureza de alojamento por metro quadrado no primeiro trimestre do ano de 2005, sendo que:
– A média global de habitação fixou-se em € 1.316,00/m2, situando-se os 25% menores em €
752,00/m2 e os 25% maiores em € 1.964,00/m2;
– A média global de apartamentos fixou-se em € 1.272,00/m2, situando-se os 25% menores em € 748,00/m2 e os 25% maiores em € 1.875,00/m2;
– A média global de moradias fixou-se em € 1.385,00/m2, situando-se os 25% menores em €
753,00/m2 e os 25% maiores em € 2.065,00/m2;
22.– Por escritura pública lavrada a 06.07.2005, foi vendido pelo preço de € 510.000,00 um prédio rústico com área de 3.000 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2536 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 126 da Secção E1;
23.– Por escritura pública lavrada a 24.01.2005, foi vendido pelo preço de € 1.070.000,00 um prédio rústico com área de 7.625 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 11136 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 127 da Secção F2;
24.– Por escritura pública lavrada a 04.10.2005, foi vendido pelo preço de € 750.000,00 um prédio rústico com área de 3.562 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2587 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 81 da Secção A3;
25.– Encontrou-se à venda no ano de 2006, prédio rústico com área de 7.182 m2, inserido em espaço urbano da freguesia da Ericeira, pelo preço de € 1.500.000,004;
26.– Por escritura pública lavrada a 11.08.2005, foi vendido pelo preço de € 50.000,00, um lote de terreno para construção com área de 305 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 1291 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 32775;
27.– Por escritura pública lavrada a 10.05.2005, foi vendido pelo preço de € 50.000,00, um lote de terreno para construção com área de 256 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3147 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 56696;
28.– Por escritura pública lavrada a 25.10.2005, foi vendido pelo preço de € 60.000,00, um lote de terreno para construção com área de 287 m2, situado na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3920 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 66597;
29.– Encontraram-se à venda no ano de 2006, lotes de terrenos para construção de moradias na freguesia da Ericeira, Mafra, sendo que o preço mais baixo situou-se em € 146,00/m2, o mais elevado em € 511,36/m2, fixando-se o médio em € 247,00/m28;
30.– Por escritura pública lavrada a 16.11.2005, foi vendida pelo preço de € 144.650,00, uma moradia com sessenta e quatro m2 e saguão com 16 m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na 4 Fls. 1200; Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2412 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 16329;
31.– Por escritura pública lavrada a 31.10.2005, foi vendida pelo preço de € 165.000,00, uma moradia composta por rés-do-chão e primeiro andar para habitação com oitenta e quatro, vírgula setenta m2 e logradouro com sessenta e nove vírgula trinta, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 755 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 468910;
32.– Por escritura pública lavrada a 17.05.2005, foi vendida pelo preço de € 170.000,00, uma moradia com cave para garagem, rés-do-chão e primeiro andar para habitação, com área coberta de noventa e três vírgula trinta m2 e logradouro com cento e doze, vírgula setenta m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3661 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 703811;
33.– Por escritura pública lavrada a 25.11.2005, foi vendida pelo preço de € 180.000,00, uma moradia com cave, rés-do-chão e primeiro andar para habitação e garagem, com área coberta de oitenta e três vírgulas cinquenta m2 e logradouro com cento e vinte e dois, vírgula cinquenta m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 1214 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 718412;
34.– Por escritura pública lavrada a 10.05.2005, foi vendida pelo preço de € 165.000,00, uma moradia com área coberta de cento e dezoito, vírgula treze m2 e logradouro com cento e sessenta e nove, vírgula oitenta e sete m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na 9 Fls. 1038 e seguintes. Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3713 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 740713;
35.– Por escritura pública lavrada a 29.08.2005, foi vendida pelo preço de € 180.000,00, uma moradia composta por rés-do-chão e primeiro andar para habitação e telheiro para estacionamento e anexo para churrasqueira, com cento e trinta e cinco, vírgula setenta e sete m2 e logradouro com duzentos e oitenta e dois, vírgula vinte e três m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3827 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 745414;
36.– Por escritura pública lavrada a 21.09.2005, foi vendida pelo preço de € 194.750,00, uma moradia com cento e cinquenta e um m2 e logradouro com trezentos e quarenta e nove m2, situada na freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 3237 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 748415;
37.– Encontraram-se à venda no ano de 2006, moradias na freguesia da Ericeira, Mafra, sendo que o preço mais baixo situou-se em € 390,00 m2, o mais elevado em € 2.878,000 m2, fixando-se o médio em € 1.365,00 m216;
38.– Por acórdão unânime dos árbitros nomeados pelo Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, a parcela em apreço foi classificada como “solo apto para construção”;
39.– No mesmo acórdão acima referido, foram utilizados os critérios valorativos ínsitos no artigo 26.º, n.º 4 e seguintes do Cód. Expropriações, tendo os Srs. Árbitros:
i.- Adotado o valor de construção na ordem dos € 600,00 €/m2, nos termos do.º 5 do preceito acima referido, valor que referenciam ao administrativamente na Portaria n.º 1379-A/2004 de 30.10, que determina para vigorar no ano de 2005 e para efeitos de cálculo da renda condicionada o preço de habitação por metro quadrado no concelho de Mafra na ordem de € 529,41/m2;
ii.- considerado um índice fundiário total de 16% aplicado a uma faixa de 50 m desde o arruamento público, nomeadamente a cerca de 600m2 da área afeta a UC, e por detrás desta faixa a de 7,5% dada a necessidade de completar as infraestruturas existentes;
iii.- considerado um índice bruto máximo de 0.4 em UB1 e de 0.7 em UC, atendendo às densidades populacionais e habitacionais previstas no PUATE de 70 fogos/Há, e ainda a dimensão média;
iv.- aplicado um coeficiente de 0.8 correspondente à limitação da expectativa de construção imediata face à grandeza das áreas propostas no PUATE por relação com a procura de terrenos no mercado;
v.- entendido que cerca de 1500 m2 do prédio donde provêm as parcelas expropriadas fica desvalorizada em cerca € 5,04 m/2, no valor global de € 7.560,00;
vi.- a valorização da benfeitoria – muro – à razão de € 45,00/m, num valor global de € 900,00.
40.– No referido acórdão arbitral, é atribuído o valor global de € 63.763,92 à indemnização devida à expropriada;
41.– No relatório de avaliação de fls. 407 e seguintes, três17 dos Srs. Peritos nomeados classificaram a parcela em apreço como “solo apto para construção”;
42.– No mesmo relatório, foram utilizados os critérios valorativos ínsitos no artigo 26.º, n.º 4 e seguintes do Cód. Expropriações, tendo sido: Considerando o decesso do terceiro subscritor e recomposição do colégio pericial por despacho de fls. 726 por perito que apresentou relatório autónomo por não concordar com o previamente oferecido.
i.- considerada uma inserção em UB1 de 1.033 m2 e em UC de 1.383 m2 das parcelas;
ii.- adotado o valor de construção de € 529,41/m2 por metro quadrado, fixado ao administrativamente para o concelho de Mafra na Portaria n.º 1379-A/2004 de 30.10 que estabelece os valores para efeitos de cálculo de renda condicionada;
iii.- considerado um índice fundiário de 10% nos termos do n.º 6 do artigo 26.º do Cód. Expropriações;
iv.- a este índice acrescerá 8% por aplicação do n.º 7 do artigo 26.º do Cód. Expropriações mas somente até 50 metros relativamente à EN 116 uma vez que só esta área beneficiaria directamente destas infraestruturas, sendo que a demais necessitaria do seu prolongamento para delas beneficiar cujos encargos são significativos;
v.- considerado ainda 90% de conversão de área bruta em útil, e 40% do índice de construção na zona UB1 e 70% de índice de construção na Zona UC1;
vi.- aplicado um fator corretivo de 80% devido à existência de áreas significativas de terrenos com características idênticas na zona pelo que o mercado não os absorveria num curto prazo e bem assim porque a edificabilidade simultânea permitida pelo PUATE acarretaria desvalorização das construções devida à elevada oferta;
vii.- e ainda a correção de 10% sobre o valor encontrado devido ao risco e esforço inerente à atividade construtiva uma vez que o mercado não absorve rapidamente a oferta, aplicável atenta ao n.º 10 do artigo 26.º do Cód. Expropriações;
viii.- a valorização da benfeitoria – muro na parcela 5.1– a valorização da benfeitoria em € 900,00;
ix.- valorização do encargo de vedação a instalar no limite da área expropriada, com aplicação de rede metálica com 1.2 metro de altura, suportada por postos de madeira tratada, no valor global de € 570,00;
x.- a aplicação do n.º 4 do artigo 23.º do Cód. Expropriações;
xi.- entenderam não existirem outros prejuízos por virtude da possibilidade de construir na área restante, face à sua inserção no plano de gestão territorial em vigor;
43.– No referido relatório e considerando os critérios ínsitos em 42., é atribuído o valor global de € 58.767,15 à indemnização devida à expropriada;
44.– No Relatório de Avaliação subscrito pelo perito nomeado para recomposição do colégio na sequência do decesso de um dos subscritores do constante a fls. 407 e seguintes, aquele discorda da aplicação da aplicação do fator corretivo de 80% e reduz para 5% o aplicado ao abrigo do artigo 26.º, n.º 10 do Cód. Expropriações, razão pela qual valoriza em € 79.604,80 as parcelas expropriadas;
45.– No relatório de avaliação de fls. 925 e seguintes, o Sr. Perito nomeado por indicação da expropriada classificou as parcelas em apreço como “solo apto para construção”;
46.– No mesmo relatório, o Sr. Perito procedeu à avaliação com recurso aos critérios referenciais previstos no n.º 4 e seguintes do artigo 26.º do Cód. Expropriações, aos critérios do CIMI e ao ínsito no n.º 2 do receito atrás referido;
47.– Por referência aos critérios ínsitos nos n.ºs 4 e seguintes do artigo 26.º do Cód. Expropriações, o Sr. perito:
i.- considerou um índice fundiário de 15% nos termos do n.º 6 do preceito em causa;
ii.- a este índice acrescerá 8% por aplicação do n.º 7 do artigo 26.º do Cód. Expropriações;
iii.- adotado o valor de € 1.385,00/m2 por metro quadrado, divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística enquanto valor unitário da avaliação bancária de habitação por natureza de alojamento por metro quadrado no primeiro trimestre do ano de 2005;
iv.- considerou 25% de cedência ao domínio público e 5% de custos de infraestruturação no interior do terreno;
48.– Alcançou assim uma valorização das parcelas no valor global de € 604.335,73;

49.– Por referência aos critérios ínsitos no CIMI, o Sr. Perito:
i.- considerou 25% de cedência ao domínio público e 5% de custos de infraestruturação no interior do terreno;
ii.- atendeu a uma CAS concretizada em 1.691,2/m2;
iii.- converteu para 85% o valor atingido por virtude de o valor patrimonial alcançado por este critério corresponder a 80% a 90% do valor de mercado;

50.– Alcançou assim uma valorização das parcelas no valor global de € 396.284,48;
51.– Por referência aos critérios ínsitos nos n.ºs 4 e seguintes do artigo 26.º do Cód. Expropriações, o Sr. Perito considerou 25% de cedência ao domínio público e 5% de custos de infraestruturação no interior do terreno, aplicando-a às médias alcançadas com recurso às listas das finanças que constam de fls. 794 e seguintes dos autos, alcançando uma valorização das parcelas no valor global de € 494.659,82;
52.– Considerou que as partes sobrantes, por não terem qualquer acesso, não possuem qualquer valor, sofrendo uma depreciação de 100%, que valoriza globalmente € 481.469,11;
53.– Procedeu, finalmente, à valorização da benfeitoria/muro, a € 50,00 m2, no montante global de € 1.000,00;
54.– Realizando a média dos resultados obtidos por via da implementação dos três métodos, o Sr. Perito nomeado por indicação da expropriada, pugna pela fixação em € 2.890.552,37 do montante de indemnização devido pela expropriação das parcelas identificadas;
55.– A fls. 1360 e seguintes, os Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal e por indicação da entidade expropriante, realizaram a avaliação do prédio dos autos com recurso aos critérios do CIMI, do sistema indicador dos preços de construção e habitação divulgados pelo INE, e do método comparativo de mercado;
56.– Alcançaram o valor de € 286.489,28 com recurso aos critérios previstos no CIMI;
57.– Limitaram-se a arguir que o valor médio indicado pelo INE no primeiro trimestre de 2005 foi de € 1.316/m2, esclarecendo que tal valor reporta-se ao valor de venda e informando que, por isso, não tem aplicação prática na avaliação a realizar;
58.– Referem a impossibilidade de realizar avaliação segundo o método comparativo de preços de mercado dada a inexistência de amostra suficiente de terrenos com dimensão similar e com a mesma classificação de solo no instrumento de planeamento aplicável;
59.– Aplicaram assim o método de determinação do valor residual do terreno ou método de investimento;
60.– Para o efeito, consideraram a densidade máxima de 70 e 40 fogos/Há, consoante a zona de inserção das parcelas, as cedências ao domínio púbico previstas na Portaria n.º 1136/2001 de 25.09 e um cenário de desenvolvimento de prédios de habitação coletiva com 3 pisos;
61.– Atenderam ao valor médio das avaliações bancárias para o concelho de Mafra no 1.º trimestre de 2005, analisaram o cash flow do empreendimento, aplicaram o fator corretivo de 80% devido à existência de áreas significativas de terrenos idênticos, razão pela qual o mercado não teria capacidade de os absorver no curto prazo, e ainda a correção de 10% nos termos do artigo 26.º, n.º 10 do Cód. Expropriações;
62.– Fixaram em € 131.300,00 o valor a atribuir às parcelas expropriadas de acordo com o método em referência;
63.– Exceção feita ao Sr. Perito J. Peixinho que pugna pela não aplicação do fator corretivo de 80%, fixando assim a indemnização devida em € 164.124,00;
64.– Não consideraram qualquer depreciação da área sobrante dado esta manter-se una e com idênticas condições de acesso à RN 116;
65.– Mais inscreveram não terem sido identificadas quaisquer benfeitorias na Vistoria Ad Perpetuam Rei Memoriam.

ii.- Com interesse para a decisão da causa, não se demonstraram os seguintes factos:
66.– O custo de urbanização do prédio atinge em regra cerca 5% do seu valor venal;
67.– A área sobrante não possui qualquer acesso.

III.Apreciação do mérito do recurso
Está em causa apenas o valor a atribuir às parcelas expropriadas, com área total de 2.416 m2, destacadas do prédio rústico com área total de 12.750 m2.
Não está em causa a validade e eficácia do ato expropriativo, nomeadamente quanto à justa ponderação dos conflituantes interesses público e privado, com observância dos critérios jurídicos, constitucionais e legais, que permitem às entidades públicas, por ato unilateral exercido no âmbito do seu ius imperii, apropriar-se de bens que integravam património de privados.

Relembramos o essencial, socorrendo-nos do elenco dos factos que, para o que ora interessa, repete dados processuais também descritos no relatório:
- Arbitragem promovida pela expropriante – o colégio arbitral atribui à expropriada indemnização no montante correspondente a € 63.763,92;
- Não se conformando a expropriada, interpôs recurso judicial no âmbito do qual se procede à avaliação obrigatória a que alude o n.º 2 do artigo 61.º do Código das Expropriações, tendo os peritos nomeados pela entidade expropriante e pelo Tribunal elaborado o relatório que consta a fls. 407 e seguintes e no qual fixam o valor da indemnização devida em € 58.767,15;
- Por despacho proferido a fls. 736, determinou-se a realização de nova avaliação na sequência do decesso de um dos senhores peritos, para o que foi recomposto o colégio pericial, tendo sido elaborado o relatório de avaliação que consta de fls. 747 e seguintes dos autos, subscrito somente pelo perito nomeado para reconstituição do colégio pericial, que pugnou pela fixação da avaliação em € 96.363,75.
- Por seu turno, o perito nomeado a indicação da expropriada apresentou o relatório de avaliação constante de fls. 922 e seguintes, no qual indica € 2.890.552,37 como montante indemnizatório.
- A fls. 1346-50, o tribunal a quo determinou a realização de avaliação por banda dos subscritores do relatório de avaliação maioritário (peritos do tribunal e da expropriante) com recurso aos critérios insertos no CIMI, atendendo e aplicando o sistema de indicador de preços na construção e habitação do INE e, finalmente, aplicando o sistema comparativo dos preços de mercado para a zona.
- Em cumprimento do ordenado, a fls. 1360-71, os referidos peritos juntaram complemento ao relatório de avaliação, concluindo: a) o perito da expropriante e dois peritos do tribunal, que às parcelas 5.1 e 5.2 seja atribuída indemnização de € 130.300; b) um perito do tribunal que seja atribuída indemnização de € 164.124.

Ou seja, o laudo maioritário inicial de três peritos (dois indicados pelo tribunal e um pela expropriante) cifrava-se em € 58.767,15 (com laudo de um terceiro perito do tribunal em € 96.363,75).

Tendo o tribunal determinado que estes peritos refizessem a avaliação tendo presente o CIMI, foi apresentado novo relatório maioritário (perito da expropriante e dois peritos do tribunal) no sentido de ser atribuída indemnização de € 130.300; o terceiro perito do tribunal chegou ao valor de € 164.124.

O tribunal a quo desconsiderou este relatório apresentado pelos quatro peritos em 20/01/2014 (fls. 1360 e ss.), e desenvolveu a sua argumentação crítica, finalizando por encontrar uma indemnização de € 489.789 a atualizar desde a data da publicação da declaração de utilidade pública.

As provas são livremente apreciadas e a pericial não se afasta da regra. Porém, considerando a própria natureza da prova pericial que é determinada pela necessidade de conhecimentos especiais de certas áreas do saber que escapam aos juízes, o afastamento de um laudo maioritário, para mais arbitrando uma indemnização mais de três vezes superior ao parecer da maioria dos peritos, dificilmente se poderá justificar.

A determinação do valor do bem expropriado, obedecendo a regras definidas no Código das Expropriações (no caso, em especial, às do seu art. 26) é um problema essencialmente técnico, que demanda áreas do conhecimento extrajurídico. Cremos que apenas quando o juiz deteta que a avaliação dos peritos maioritários é desconforme às regras jurídicas que tinham que observar poderá haver um afastamento substancial daquela avaliação. Ainda assim deverá o juiz tentar perceber junto dos peritos (que são, afinal, os especialistas por si nomeados) as razões do seu parecer, pedindo os esclarecimentos necessários para se poder certificar de que os peritos não cumpriram os passos legalmente impostos.

No caso, o tribunal a quo não só não aderiu ao parecer maioritário dos peritos, como dele se afastou substancialmente.

Impõe-se neste momento aferir se o tribunal a quo o fez justificadamente.

Lê-se na sentença do tribunal a quo:
«O primeiro dos equívocos que acabaram por determinar a disparidade acima referida é, desde logo, o facto de, aparentemente sem qualquer explicação plausível, os Srs. Peritos, exceção feita ao nomeado a indicação da expropriada, afirmarem áreas de inserção em UB1 e UC das parcelas expropriadas diferentes daquelas que consignadas se encontram na Vistoria Ad Perpetuam Rei Memoriam e que não merecerem qualquer contradição por banda das aqui partes, do que inclusivamente resulta a sua aquisição nos termos naquela Vistoria anunciados.

Ora, tal discrepância, dadas as circunstâncias patenteadas nos autos apenas pode ser atribuída a alguma falta de cuidado na elaboração da avaliação em apreço e suscita logo alguma apreensão quanto à atividade posteriormente empreendida pelos subscritores do laudo maioritário.»

Os senhores peritos da avaliação de 2014 (a última que o tribunal determinou) justificaram extensamente a distribuição das parcelas expropriadas pelas zonas UC e UB1 (v. fls. 1367-8 dos autos), da seguinte forma:




As zonas UC e UB1 estão descritas na Portaria 1248/95, de 18 de outubro (sobre o Plano de Urbanização da Ericeira, em Mafra), da seguinte forma.

Artigo 34.º

Subzona UB1
1-Subzona que não é ocupada por apreciável mancha arborizada.
2-Subzona destinada a habitação e equipamento urbano compatível e empreendimentos turísticos de baixa densidade.
3-Loteamentos para habitação unifamiliar:
Frente mínima do lote:
Em banda - 5 m;
Geminada - 10 m;
Isolada - 20 m;
CAS máximo - 0,5;
COS máximo - 1;
Altura máxima - dois pisos, com eventual ocupação de sótão sob telhado;
Estacionamento mínimo e para habitação - um lugar por fogo na rua e um lugar por fogo no lote.
4- Outros loteamentos:
Densidades máximas - 40 fogos/ha, 120 habitantes/ha;
CAS máximo - 0,5;
COS máximo - 1;
Altura máxima - três pisos, com eventual ocupação de sótão sob telhado;
Estacionamento mínimo e para habitação - um lugar por fogo na rua e um lugar por fogo no lote.
São obrigatoriamente sujeitos a desenho urbano da envolvente.

Artigo 36.º

Zona UC
1- Zona de ocupação nova, essencialmente envolvendo a zona UB;
2- Zona destinada a habitação, equipamento urbano, comércio, serviços, empreendimentos turísticos e artesanato/pequena indústria não poluente e compatível com a rede viária local.
2.1- Loteamentos para habitação unifamiliar:
Área mínima do lote - 150 m2;
Frente mínima do lote:
Em banda - 5 m;
Geminada - 10 m;
Isolada - 15;
CAS máximo - 0,5;
COS máximo - 1,2;
Altura máxima - dois pisos, mais eventual ocupação do sótão sob telhado;
2.2- Outros loteamentos:
Área mínima do lote - 250 m2;
Frente mínima do lote - 10 m;
CAS máximo - 0,6;
COS máximo - 1,5;
Altura máxima - quatro pisos;
Estacionamento mínimo para a habitação - um lugar por fogo;
Densidades máximas - 70 fogos/ha, 210 habitantes/ha.
São obrigatoriamente sujeitos a desenho urbano da envolvente.

Não se vê razão para que a distribuição das parcelas expropriadas pelas zonas devesse ser diferente da feita pelos senhores peritos, nem o tribunal a quo adianta qualquer razão para a sua desconfiança.

Prossegue a sentença da 1.ª instância:
«O segundo equívoco resulta da equiparação do valor da construção a que se reportam os n.ºs 1 e 4 do artigo 26.º do Cód. Expropriação e a partir do qual se aferirá do valor solo (por aplicação de um índice fundiário), ao do custo material de execução da edificação. Tal equiparação resulta patente na argumentação aduzida pela entidade expropriante de 39.º a 41.º da sua resposta de fls. 237 e seguintes, e bem assim nas razões aduzidas pelos Srs. Peritos no complemento ao relatório apresentado a fls. 1360 e seguintes, para afastarem o critério de aplicação do valor médio das avaliações divulgadas pelo INE, as quais assentam no facto de tais valores reportarem-se a valores de venda e não do custo de construção.
Como escreve Luís Perestrelo de Oliveira Quando se identifique o custo de construção com os custos diretos de produção (materiais, equipamentos dos edifícios e mão de obra) ter-se-á de concluir que o valor do solo é determinado a partir de um dado não comparável. Outro tanto já não sucede se o custo de construção for considerado da perspetiva do adquirente final.
De resto, o próprio Tribunal Constitucional já se pronunciou pela desconformidade constitucional da interpretação sustentada pela entidade expropriante e pelos Srs. Peritos subscritores do relatório de avaliação complementar acima identificado, afirmando no acórdão n.º 667/2006 de 12.12.0650: não é constitucionalmente admissível, pois afastaria o critério da determinação do valor da indemnização do critério de uma “justa indemnização” que o “valor da construção”, relevante para efeitos de cálculo do “valor do solo apto para construção”, seja reduzido apenas ao “custo de construção” (…) tal redução do valor da construção ao custo desta, afasta o critério da indemnização da exigência da uma justa indemnização.
Isto porque, como explica detalhadamente Bernardo Sabugosa Portal Madeira, o valor de mercado de uma habitação … calcula-se com uma equação muito resumida que inclui como principais fatores o valor do solo, o custo operacional da construção, custo do capital e risco do empreendimento, custos com a comercialização e margem de lucro do promotor da operação.
Nos casos das expropriações desconhece-se…, o [valor] do solo. Assim, este valor tem que ser estimado a partir do todo. Não é possível saber o valor do solo considerando-o uma percentagem do valor dos materiais gastos, nem tão pouco o solo é uma parte do lucro. O solo é o solo e é um componente do valor final da Habitação.
Portanto, a simples aplicação do quociente deduzido nos n.ºs 6 e 7 do Art. 26. do C.E. ao valor final da construção dá-nos o valor monetário do solo,…
É, assim, evidente que o valor a ser atendido para aplicação do índice fundiário calculado nos termos dos n.ºs 6 e 7 do artigo 26.º do Cód. Expropriações é o de mercado da edificação construível no prédio expropriado.»

Foi justamente o valor de mercado da edificação suscetível de ser construída que os senhores peritos tiveram em consideração, pelo que não se compreende a crítica.

Relatório a fls. 1367 dos autos:

Prossegue o tribunal a quo:
«O terceiro dos equívocos em que laboram os Srs. Peritos, exceção ao nomeado por indicação da expropriada, é a aplicação acrítica e imediata que realizam do valor veiculado pela Portaria n.º 1379-A/2004 de 30.10 para efeitos de cálculo de renda condicionada, ao abrigo do artigo 26.º, n.º 5 do Cód. Expropriações.
A este propósito escreve Fernando Alves Correia É importante acentuar que esta norma não impõe uma correspondência do preço por metro quadrado da construção, para efeitos da expropriação, ao preço por metro quadrado fixado administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação e custos controlados ou de renda condicionada, mas apenas uma obrigação de consideração destes preços como padrão de referência ou como fator indiciário do custo do metro quadrado de construção para cálculo da indemnização por expropriação.
Na verdade, A utilização dos montantes sugeridos, desenquadrados da realidade a que se destina, resulta sempre em valores que se afastam do verdadeiro preço de mercado de um solo.

São “um fator limitativo da fixação real e corrente do bem, numa situação normal de mercado (…) que visam contrariar os valores decorrentes do livre jogo da oferta e da procura e que, de resto, são profundamente divergentes entre si”.

Assim sendo a utilização em expropriações destes valores indicados no n.º 5 do art. 6.º é inadmissível sempre que se não provar, no caso concreto, que são estatisticamente idênticos aos valores de mercado, não se desviando significativamente destes.
Em face de tal e na ausência de elementos de facto demonstrados nos autos de cuja análise resultasse a identidade entre o valor usado pelos Srs. Peritos, e bem assim pelos Srs. Árbitros – que o fixam, partindo da referência em apreço sem justificar senão com recurso a juízos conclusivos, num montante que nem em € 100,00 o supera (cfr. 39.i do julgamento de facto) – e o praticado no mercado, não resta senão desconsiderar a base da qual se partiu no acórdão arbitral e na avaliação realizada pela maioria dos peritos que integram o respectivo colégio.»

Quer os senhores Peritos, quer anteriormente os Árbitros, tinham considerado o custo de construção com referência à Portaria 1379-A/2004. Tal recurso não se pode considerar acrítico. Pelo contrário, foi bem justificado no primeiro relatório (fls. 421 do processo):


Continua o tribunal a quo:
«Passando agora ao quarto equívoco, e no qual o Sr. Perito J. Peixinho não incorre (cfr. 44. do julgamento de facto), é o da aplicação de um fator corretivo de 20%, no caso do Acórdão Arbitral, e de 20% mais 10%, no Relatório de Avaliação de fls. 407 e seguintes, por consequência da limitação da expectativa da construção imediata face à grandeza das áreas propostas pelo PUATE por relação com a procura de terreno e porque a edificabilidade simultânea permitida por aquele instrumento de gestão territorial acarretaria desvalorização das construções devida à elevada oferta.
Pese embora a natureza conclusiva das afirmações acima realizadas, que não se sustentam em quaisquer acontecimentos da vida real cuja demonstração conduzisse à consideração da verificação dos riscos aí referidos e nos graus arguidos, a verdade é que a repercussão da sua existência far-se-ia pela aplicação de um fator de correção directamente sobre o valor do solo entretanto apurado, num máximo de 15% deste.
Ora, quer no Acórdão Arbitral, quer no Relatório de Avaliação e seu complemento, aplica-se um fator de correção na ordem dos 20% e dos 30%, respetivamente – com a agravante de que no relatório de fls. 407 e seguintes, procede-se à correção do mesmo risco por duas vezes – a saber, a demora da absorção do mercado das construções edificáveis, ou seja, o risco proveniente das dificuldades de comercialização.
É, assim, manifestamente ilegal a aplicação de tais fatores de correção na ordem de grandeza em que o foram, razão pela qual não se pode deixar de assim julgar.»

Os Árbitros e quatro dos cinco Peritos julgaram adequada a introdução de fatores de correção e justificaram a sua posição. O relatório final (de 20/01/2014, fls. 1360 e ss.) não tem sequer a dupla «correção do mesmo risco» que a sentença atribuiu ao primeiro relatório (fls. 407 e ss.). Lembramos a este propósito que o relatório de fls. 407 e ss. data de 18/10/2006, numa altura em que o imobiliário estava em baixa, justificando-se por isso elevado fator de correção pela «demora da absorção do mercado das construções edificáveis», ou seja, pelo risco «proveniente das dificuldades de comercialização».
O tribunal a quo não justifica, muito menos de forma suficiente, por que motivo opta por um fator corretivo 15%, em vez dos 20% ou 30% a que os especialistas chegaram.

Após apontar os designados «equívocos» às avaliações dos especialistas (árbitros e peritos), o tribunal a quo passa a aferir do quantum indemnizatório, cometendo, a nosso ver, dois erros que resultam no elevado valor que obtém – € 489.789.
Por um lado, começa por se afirmar na sentença que «Em face da escassez de informação que consta das listas juntas aos autos a fls. 794 e seguintes, é evidente que se torna impossível recorrer ao primeiro dos critérios referenciais, a saber, o previsto no n.º 2 do artigo 26.º do Cód. Expropriações, a fim de lograr o apuramento do custo de construção a partir do qual se aquilatará do valor do solo». Continua-se concluindo que «não resta senão recorrer ao critério referencial ínsito nos n.ºs 4 e seguintes do artigo 26.º do Cód. Expropriações, lançando mão dos elementos factuais coligidos nos autos».
Todavia, o tribunal acaba por recorrer sobretudo aos mesmos elementos (valores de transações efetivadas), que previamente afastou pela sua escassez, para aferir da bondade do valor a que, por outro método, chegou. Leia-se a seguinte passagem: «A fim de apreciar da adequação deste valor ao efetivamente praticado no mercado regional e no momento determinante, atende-se neste momento aos valores por m2 apurados com recurso aos elementos consignados de 30. a 37. do julgamento de facto, e que se reportam aos preços pelos quais se perspetivava a transação ou se efetuou a alienação de moradias na freguesia de localização do prédio no decurso dos anos de 2005 e 2006».

Por outro lado, o tribunal a quo usou como critério o valor unitário da avaliação bancária divulgado pelo INE nos termos consignados a 21. do julgamento de facto. Socorrendo-se da opinião escrita de B. Madeira, qualificou essa informação como muito completa e fiável, utilizada pelo Governo e pelo Banco de Portugal nas suas análises económicas.
Aplicando aquela informação do INE, concluiu: «Tendo em conta a envolvente urbanística das parcelas expropriadas que se encontra demonstrada (…), afigura-se que nelas seriam implantadas habitações unifamiliares do tipo moradia, cujo preço unitário médio encontrado pelo INE ascende a € 1.385,00/m2».

Em seguida efetuou várias reduções:
- «Partindo do princípio de que o valor do solo representa uma fração do valor final de um imóvel, … na generalidade das situações, no máximo, 25% do custo da construção, ou seja, o valor do imóvel no mercado. Este percentual é arbitrado livremente pelos peritos que efetuam a avaliação, pautando-se naturalmente pelos critérios que influenciam o valor de um solo apto para construção, como a sua localização e ambiente envolvente, a proximidade de equipamentos sociais relevantes e outros fatores que seja pertinente atender. (…) Afigura-se a este Tribunal que o prédio expropriado tem uma localização geográfica acima da média, muito próxima do centro da Ericeira – contrariamente ao pugnado pelos Srs. Árbitros e Srs. Peritos – com boa qualidade ambiental, a qual não é desmerecida pelo facto de ser marginado pela EN116, e acessibilidades rodoviárias valorizáveis, razões que determinam a fixação do índice fundiário referido no n.º 6 do artigo 26.º do Cód. Expropriações em 13 %».
- «A este acrescerão os 6,5% resultantes da existências das infraestruturas indicadas nas alíneas a), c), e) e i) do n.º 7 do mesmo preceito, num total de € 19,5%».
- «Aplicando o índice acima obtido sobre € 1.385,00 m2, obtém-se o montante de € 270,00 por m2 (por arredondamento), correspondente ao valor do solo no prédio expropriado».
- «Contudo, não se pode olvidar que no prédio em apreço, a expropriada não realizou qualquer operação urbanística com vista à sua valorização enquanto terreno para construção, motivo pelo qual se afigura dever aplicar-se o fator corretivo constante do n.º 10 do artigo 26.º (…) dever-se-á fixar uma dedução de 15% sempre que o expropriado não tenha tomado, antes da data da DUP, qualquer iniciativa tendente a valorizar a parcela a expropriar, que entende este Tribunal ser de aplicar in casu, então o valor por metro quadrado das parcelas expropriadas cifra-se em € 229,50».
- «No entanto, a realidade ora em apreciação difere da do prédio dos autos na medida em que um lote de terreno para construção é uma realidade predial resultante da operação urbanística de loteamento cujos encargos de gestão, incluindo o legítimo lucro, poderão, numa primeira estimativa, fixar-se, dependendo da conjuntura económica, entre os 25% e os 30% do valor do solo,…

Assim, para se procurar qual o preço do solo na realidade predial em apreço, haverá que retirar ao valor acima alcançado a percentagem que se deverá reconduzir àquelas encargos, que na situação em concreto se fixa nos 30%, atendendo a que necessariamente à expropriada também competiria reforçar a infraestruturação do prédio em causa atenta a sua dimensão. Donde, será legítimo considerar que o valor do solo atingirá os € 160,00/m2». – valor que dista apenas € 13,00 da média dos preços por metro quadrado pelos quais foram transacionados ou encontraram-se no mercado os prédios rústicos melhor identificados a 22. a 25. do julgamento de facto». Elementos que antes tinha dito serem escassos para suportarem a avaliação.
- Por fim, o tribunal a quo argumenta: «Tendo, contudo, presente o já bastas vezes referido fenómeno da subdeclaração e bem assim que apenas é alcançável o justo preço por aproximação ao valor real e de mercado, entende este Tribunal que se encontrará mais adequada à realidade a avaliar um valor situado na casa dos € 180,00/m2, considerando a razoável infraestruturação existente junto à parcela, que necessariamente a valorizar a fará decrescer os respetivos custo, no qual fixa definitivamente o montante indemnizatório devido à expropriada na sequência do ato ablativo da sua propriedade operado por via dos presentes autos».

Com este último passo, o tribunal ainda incrementa o valor unitário da avaliação bancária divulgado pelo INE em 12,5%.
Em seguida e por último multiplica o valor assim obtido pela área total do terreno expropriado obtendo o valor de € 434.880,00 (quatrocentos e trinta e quatro mil oitocentos e oitenta euros). Esquecendo-se, como a recorrente repara que boa parte do terreno não seria ocupado por construções, as por áreas públicas destinadas a arruamentos e outras infraestruturas.
Aqui chegados há que reafirmar que não encontramos na fundamentação da sentença recorrida justificação suficiente e consistente para o afastamento do laudo maioritário. A argumentação expendida pelo tribunal a quo não nos convenceu de que assista a este um conhecimento específico, em matéria de avaliação de terrenos, superior ao dos vários árbitros e peritos.
Os árbitros fundamentaram exaustivamente os seus relatórios, nomeadamente o de 2014, socorrendo-se dos parâmetros legais definidos no art. 26 do Códigos das Expropriações, sendo de aderir ao valor do laudo maioritário correspondente a uma indemnização de € 131.300.

Finalmente, a sentença considerou que com a expropriação dos 2.416 m2 (do prédio que no total tinha 12.750 m2) causou a desvalorização dos sobrantes 10.334 m2.
Nas expropriações parciais, os peritos devem calcular separadamente o valor e o rendimento totais do prédio e das partes abrangidas e não abrangidas pela declaração de utilidade pública (art. 29, n.º 1, do CE). Quando a parte não expropriada ficar depreciada pela divisão do prédio ou desta resultarem outros prejuízos ou encargos, incluindo a diminuição da área total edificável ou a construção de vedações idênticas às demolidas ou às subsistentes, especificam-se também, em separado, os montantes da depreciação e dos prejuízos ou encargos, que acrescem ao valor da parte expropriada (n.º 2 do mesmo artigo).

Quatro dos cinco peritos (três do tribunal e o da expropriante) entenderam não haver depreciação da área sobrante justificando no seu relatório de 2014 (v. fls. 1370):



O tribunal a quo justificou o arbitramento de indemnização neste quadrante com a suposta omissão de pronúncia dos peritos. Lê-se na sentença: «Ora, analisando os relatórios de avaliação juntos aos autos, conclui-se pela completa omissão de pronúncia quanto à matéria em apreço».
Ainda que assim fosse, com o que discordamos como antes referido, tal não seria razão bastante para indemnizar.

Por tudo o acima exposto, aderimos ao segundo e último laudo maioritário dos Peritos, de 20 de janeiro de 2014, que levou em consideração os critérios que lhe foram determinados pelo tribunal, aumentando consideravelmente o valor da indemnização do laudo inicial, e atribuímos indemnização no valor de € 131.300 (cento e trinta e um mil e trezentos euros).

IV.Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação da expropriante, fixando a indemnização devida à expropriada no montante de € 131.300 (cento e trinta e um mil e trezentos euros), a atualizar desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data da decisão final do processo, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, exceto na parte relativa à quantia já levantada, a qual deve ser atualizada até à data do levantamento.

Custas pela expropriada.



Lisboa, 22/05/2018


Higina Castelo
José Capacete
Carlos Oliveira