Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
16275/16.0T8LSB.L1-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: DELIBERAÇÕES DO BANCO DE PORTUGAL
COMPETÊNCIA
NATUREZA DAS DELIBERAÇÕES
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/13/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1- Integrando os factos alegados pelos autores na petição inicial as excepções previstas nas subalíneas v) e vii) da alínea b) do anexo 2 da deliberação de resolução do BES para a transmissão do seu passivo para o Novo Banco, a acção improcede contra o réu logo após o saneamento dos autos.

2- Mesmo que se entendesse que teria havido transmissão do passivo em causa para o Novo Banco, sempre teria de se considerar a sua retransmissão para o BES, por via das deliberações do BdP de 29/12/2015, sendo tal retransmissão possível por, à data da deliberação de 3/08/2014, estar prevista no RGICSF e na Directiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/05/2014.

3- As deliberações do BdP respeitantes à resolução do BES constituem actos administrativos formados no âmbito das suas competências, no quadro legal nacional e europeu. 

4- A apreciação da validade dos actos administrativos constituídos pelas medidas tomadas pelo BdP cabe aos Tribunais Administrativos, sem prejuízo dos artigos 91º e 92º do CPC e 204º da CRP, não se verificando nas deliberações do BdP de 29/12/2015 usurpação do poder jurisdicional e a nulidade de usurpação do poder prevista no artigo 161º nº2 a) do CPA, nem a violação dos artigos 2º, 20º e 268º nº4 da CRP e do artigo 6º do CPTA.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO.

MS… e MR… intentaram acção declarativa com processo comum contra …, SA alegando, em síntese, que eram clientes do B.. há muitos anos, sempre fazendo depósitos com juros e retorno garantido do capital, como era do conhecimento dos gestores de conta, mas mais recentemente um gestor de conta, fazendo-os crer que contratavam os habituais depósitos, incentivou-os a subscrever aplicações financeiras sem lhes explicar a natureza dos investimentos, pelo que os autores, sem o saberem, aplicaram as suas poupanças, nos valores respectivos de 47 000,00 euros (em 10/12/1012, com data de liquidação de 20/10/2014), 27 000,00 euros (em 30/05/2013, com data de liquidação de 28/05/2015), 20 000,00 euros (em 4/11/2013, com data de liquidação de 20/02/2015) e 17 000,00 euros (em 11/02/2014, com data de liquidação em 20/02/2015), em acções preferenciais de sociedades veiculo montadas pelo B… e pelo C…, cujo único património era constituído por obrigações emitidas pelo B…, utilizadas para obterem um financiamento à custa dos clientes, levando a que os autores perdessem o valor das aplicações e ficando o B… responsável pela sua restituição, bem como pelo pagamento de indemnização por danos não patrimoniais, por ter violado os artigos 74º e 75º do RGICSF e 304º, 321º nº1 e 312º-E do CVM.

Mais alegaram que a responsabilidade do B… se transmitiu para o ora réu por via da deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014, que aplicou uma medida de resolução ao abrigo do artigo 145º-G do RGICSF e criou o banco de transição réu, separando-o do BES e para ele transferindo os activos e passivos, clarificando a medida nas deliberações de 11 de Agosto de 2014 e de 29 de Dezembro de 2015, não se podendo considerar excluídas da transferência dos passivos as obrigações que se constituíram por força da lei, como as do presente caso, de responsabilidade civil perante terceiros por violação dos deveres como intermediário financeiro, como resulta da subalínea vii) da alínea b) do anexo 2 da deliberação clarificada em 11 de Agosto de 2014.

Concluíram pedindo a condenação do réu a pagar-lhes (a) a quantia de 123 727,00 euros, sendo 110 000,00 euros de capital e 13 727,00 euros de juros e (b) e a quantia de 50 000,00 euros a título de danos não patrimoniais acrescida de juros.

O réu contestou arguindo a sua ilegitimidade porque na medida de resolução deliberada pelo Banco de Portugal e suas clarificações posteriores ficaram excluídas as responsabilidades imputadas pelos autores ao B…, que assim não foram transferidas para o contestante, o que já resultava formulação clarificada em 11 de Agosto de 2014, ao se mencionar as responsabilidades decorrentes de intermediação financeira e resulta também da deliberação de 29 de Dezembro de 2015, que exclui a transferência de obrigações desconhecidas antes de 3 de Agosto de 2014, como é o caso das responsabilidades invocadas pelos autores, determinando esta última deliberação a impossibilidade superveniente da lide.

Mais impugnou os factos alegados pelos autores na petição inicial e concluiu pedindo a procedência da excepção de ilegitimidade como excepção peremptória, com a absolvição do pedido, ou, cautelarmente, a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.

Os autores responderam, opondo-se às excepções invocadas pelo réu.

Por já ter havido discussão escrita sobre as questões a decidir, foi dispensada a audiência prévia e foi proferido despacho saneador que indeferiu o pedido de extinção da instância por impossibilidade da lide e julgou improcedente a excepção de ilegitimidade processual do réu, seguido de sentença que conheceu de mérito e julgou a acção improcedente e absolveu o réu dos pedidos. 

                                                            *

Inconformados, os autores interpuseram recurso e alegaram, formulando conclusões onde, para além, do mais, arguiram a nulidade da sentença por omissão de enunciação dos factos provados e não provados.

O recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

Na sequência da arguição de nulidade da sentença, foi proferido despacho que fixou a matéria de facto, determinando que o seu conteúdo passasse a fazer parte integrante da sentença, nos termos do artigo 617º nº2 do CPC.

Notificadas as partes deste despacho, vieram os apelantes ampliar o objecto do recurso ao abrigo do artigo 617º nº3 do CPC e reformularam as conclusões, aditando a matéria da ampliação do recurso.

São as seguintes as questões levantadas nas conclusões de recurso, incluindo já a respectiva ampliação:

- Não incluindo a identificação dos factos provados e não provados, a decisão recorrida é nula, nos termos do artigo 615º nº1 b) do CPC.

- Na hipótese de a lista de deliberações do Banco de Portugal a que se refere o despacho do tribunal recorrido proferido nos termos do artigo 617º nº1 do CPC ser entendida como um elenco de “factos provados”, deve considerar-se nula a sentença por falta de fundamentação de direito, também nos termos do referido artigo 615º nº1 b).

- A sentença recorrida assenta em três premissas para concluir que as obrigações indemnizatórias reclamadas pelos autores não integram o perímetro das relações jurídicas transitadas para o …: (1) por as responsabilidades contingentes referentes aos pedidos formulados integrarem o âmbito da subalínea v) da alínea b) do Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3/8/2014, (2) por as deliberações do Banco de Portugal de 29/12/2015, fazendo “interpretação autêntica” da deliberação de 3/8/2015, estabelecerem que as obrigações indemnizatórias ora reclamadas não integram o “perímetro” de transmissão das relações jurídicas do B… para o … e (3) porque, de acordo com as referidas deliberações de 29/12/2015, se porventura se pudesse ter considerado que a responsabilidade relacionada com os pedidos formulados se transmitiu para o …, a mesma sempre seria de se considerar retransmitida para o B…, com efeitos retroactivos à data da medida da resolução.

- Considerou também a sentença recorrida que o Banco de Portugal proferiu estas deliberações no quadro das suas competências legais, havendo uma presunção de legalidade relativamente às mesmas até serem impugnadas junto dos Tribunais Administrativos competentes, tendo ainda exercido em 29/12/2015 um “poder de retransmissão” previsto no artigo 40º da Directiva 2014/59/UE, directa e imediatamente aplicável por estas soluções resultarem expressamente previstas no artigo 25º nº2 a) do Reg. MUR, que estava em vigor em 3/8/2014, podendo ser aplicadas ao presente caso, um de vários em que os autores se integram no grupo dos “lesados do papel comercial”.     

- Tais premissas e subsequentes considerações não são correctas, assim como a conclusão retirada pela sentença recorrida.

- Não é aplicável ao caso dos autos a previsão excepcional da subalínea v) da alínea b) do anexo 2 à deliberação do BdP de 3/08/2014 e a aplicação da subalínea vii) da alínea b) do mesmo anexo é afastada por não se verificarem os seus elementos constitutivos essenciais uma vez que não se trata de obrigações assumidas, mas sim de obrigações legais.

- As deliberações do BdP de 29/12/2015, ao determinarem que as obrigações objecto do presente processo não se incluem no âmbito do passivo transmitido, constituem uma usurpação de poderes jurisdicionais, o que determina a sua nulidade, nos termos do 161º nº2 a) do CPA, pois é ao tribunal recorrido e não ao BdP que incumbe resolver a questão jurisdicional de saber se as obrigações indemnizatórias objecto do presente litígio integram ou não o âmbito da transmissão do passivo do B… para o ….

- Ao BdP apenas cabe a competência para determinar as categorias de relações jurídicas do BES que não são transmitidas para o …, cabendo aos tribunais julgar se uma concreta obrigação, objecto de um processo judicial, integra ou não o âmbito de transmissão definido pela autoridade de resolução

- Inexiste o poder do BdP retransmitir para o B… a relações jurídicas antes transmitidas para o …, desde logo porque falta a previsão desse poder na versão do RGICSF vigente ao tempo de deliberação de 3/08/2014 e depois porque não se verificam os pressupostos de que a lei nova prevê para a “retransmissão”.

- Inexiste a “presunção de legalidade” dos actos administrativos, no caso, das deliberações do BdP, nomeadamente de 3/08/2014 e de 29/12/2015, atentatória dos princípios da legalidade, da igualdade e da tutela jurisdicional efectiva, todos corolários do Estado de Direito.

- À data da aplicação medida de resolução sobre o BE, momento temporal relevante para a fixação do quadro normativo nacional e europeu, não eram aplicáveis, no ordenamento jurídico português, as disposições do Regulamento (UE) nº1024/2013 DO Conselho de 15/10/2013, do Regulamento (UE) nº806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/07/ 2014, nomeadamente o artigo 25º nº2 a) e da Directiva 2014/59/UE, nomeadamente o seu artigo 40º. 

- Os recorrentes não pertencem ao universo dos chamados “lesados do papel comercial”, não tendo subscrito quaisquer valores mobiliários representativos de dívida de sociedade do Grupo ES…, mas sim acções preferenciais do capital de quatro sociedades veículo de finalidade especial, montadas por administradores do B…, para promover a alavancagem financeira do Grupo B… e do Grupo ES….

- A sentença recorrida violou os seguintes parâmetros normativos: artigo 615º nº1 b) do CPC, o nº5 do artigo 145º-O do RGICSF, o proémio da alínea b) do Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3/8/2014, as subalíneas v) e vii) da alínea b) do anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3/8/2014, o artigo 161º nº2 a) do CPA, o artigo 145º-H do RGICSF, com a redacção vigente em 3/8/2014 conferida pelo DL 114-A/2014 de 1/8, o artigo 145º-Q do RGICSF na versão da Lei 23-A/2015 de 27/3, o artigo 40º nº7 da Directiva 2014/59/UE do PE e do Conselho de 15/5, os artigos 2º, 20º, 268º nº4 da CRP, o artigo 6º do CPTA, o artigo 12º nº2 do CC, o artigo 33º nº4 do Reg. (UE) nº1024/2013 do Conselho de 15/10/2013, o artigo 99º nº2 do Reg. (UE) nº806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/7/2014, o artigo 26º da Lei 23-A/2015 de 27/3 e o artigo 288º do TFUE.     

- Deve proceder o recurso com a revogação da sentença recorrida e sua substituição por decisão que julgue a acção procedente ou que, pelo menos, remeta os autos à 1ª instância para que seja o tribunal a julgar o litígio e não o Banco de Portugal.

                                                            *

O recurso e a respectiva ampliação foram admitidos, como apelação, a subir nos autos, imediatamente e com efeito devolutivo.

As questões a decidir são:

I) Nulidade da sentença.

II) Aplicação das subalíneas v) e vii) da alínea b) do anexo 2.

III) Enquadramento da medida de resolução no direito europeu.

IV) Retransmissão do passivo do banco de transição para a instituição de crédito originária.

V) Usurpação de poderes jurisdicionais por parte do Banco de Portugal e presunção de legalidade dos actos administrativos com violação dos princípios fundamentais do Estado de Direito.

VI) Procedência da acção ou prosseguimento dos autos para julgamento. 

                                                           *

FACTOS.

Na sequência da arguição de nulidade por omissão de factos provados, o tribunal recorrido consignou o seguinte:

1 – No dia 03 de Agosto de 2014 foi proferida deliberação do Banco de Portugal com o seguinte teor:

«Ponto Um (Constituição do …, SA):

«É constituído o …, SA, ao abrigo do nº 5 do artigo 145º-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro, cujos Estatutos constam do Anexo 1 à presente deliberação.

«Ponto Dois (Transferência para o …, SA, de activos, passivos, elementos extra patrimoniais e activos sob gestão do Banco …, SA):

«São transferidos para o …, SA, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 145º H do Regime Geral das Instituições de Credito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro, conjugado com o artigo 17º-A da Lei Orgânica do Banco de Portugal, os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco …, SA que constam dos Anexos 2 e 2A a presente deliberação»;

2 – Nos termos do artigo 1º dos Estatutos do …, que constam do Anexo 1, «O …, SA é um banco constituído nos termos do n.º 3 do artigo 145º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras ("RGICSF"), aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro»;

3 – Dispõe o artigo 3º dos mesmos Estatutos que «O …, SA tem por objecto a administração dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos do Banco ES…, SA para o …, SA, e o desenvolvimento das actividades transferidas, tendo em vista as finalidades enunciadas no artigo 145º-A do RGICSF, e com o objectivo de permitir uma posterior alienação dos referidos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão para outra ou outras instituições de crédito»;

4 – No referido Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 que determinou a transferência de activos, passivos, elementos extra patrimoniais e activos sob gestão do B… para o …, são referidos os critérios que presidirão à aludida transferência:

«(a) Todos os activos, licenças e direitos, incluindo direitos de propriedade do B… serão transferidos na sua totalidade para o …, SA com excepção dos seguintes:

(...).

(b) As responsabilidades do B.. perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste serão transferidos na sua totalidade para o …, SA, com excepção dos seguintes (“Passivos Excluídos”):

(...)

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais;

(vi) (...)

No que concerne às responsabilidades do … que não serão objecto de transferência, estes permanecerão na esfera jurídica do B….

(d) Os activos sob gestão do B… ficam sob gestão do …, S.A. (...).

Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o B… e o …, SA, activos, passivos, elementos patrimoniais e activos sob gestão, nos termos do artigo 145º-H, número 5 (...)»;

5 – No dia 11 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal emitiu nova deliberação com vista a clarificar e ajustar o "perímetro" do …, S.A. e, consequentemente, também, do B…, introduzindo diversas alterações e rectificações ao texto da referida deliberação de 3 de Agosto de 2014;

6 – Consta do texto consolidado do Anexo 2 da deliberação de 03 de Agosto de 2014, com as alterações introduzidas pela deliberação de 11 de Agosto de 2014, nomeadamente, o seguinte:

«(...) 1. Activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco ES…, AS (B…), registados na contabilidade, que são objecto de transferência para o …, S.A, de acordo com os seguintes critérios:

(a) Todos os activos, licenças e direitos, incluindo direitos de propriedade do BES são transferidos na sua totalidade para o …, S.A com excepção dos seguintes: (...).

(b) As responsabilidades do B… perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste são transferidos na sua totalidade para o …, S.A, com excepção dos seguintes (“Passivos Excluídos"):

(i) Passivos para com (a) os respectivos accionistas, cuja participação seja igual ou superior a 2% do capital social ou por pessoas ou entidades que nos dois anos anteriores à transferência tenham tido participação igual ou superior a 2% do capital social do B…, membros dos órgãos de administração ou de fiscalização, revisores oficiais de contas ou sociedades de revisores oficiais de contas ou pessoas com estatuto semelhante noutras empresas que se encontrem em relação de domínio ou de grupo com a instituição, (b) as pessoas ou entidades que tenham sido accionistas, exercido as funções ou prestado os serviços referidos na alínea anterior nos quatro anos anteriores à criação do …, S.A., e cuja acção ou omissão tenha estado na origem das dificuldades financeiras da instituição de crédito ou tenha contribuído para o agravamento de tal situação; (c) os cônjuges, parentes ou afins em 1º grau ou terceiros que actuem por conta das pessoas ou entidades referidas nas alíneas anteriores, (d) os responsáveis por factos relacionados com a instituição de crédito, ou que deles tenham tirado benefício, directamente ou por interposta pessoa, e que estejam na origem das dificuldades financeiras ou tenham contribuído, por acção ou omissão no âmbito das suas responsabilidades, para o agravamento de tal situação, no entender do Banco de Portugal;

(ii) Obrigações contraídas perante entidades que integrem o Grupo ES… e que constituam créditos subordinados nos termos dos artigos 48º e 49º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, com excepção das entidades integradas no Grupo G… cujas responsabilidades perante o B… foram transferidas para o …, sem prejuízo, quanto a esta entidades, da exclusão prevista na subalínea (v);

(iii) Obrigações contraídas ou garantias prestadas perante terceiros relativamente a qualquer tipo de responsabilidades de entidades que integram o Grupo ES…, com excepção das entidades integradas no Grupo B… cujas participações sociais tenham sido transferidas para o …, S.A.;

(iv) Todas as responsabilidades resultantes da emissão de instrumentos que seja, ou em algum momento tenham sido, elegíveis para o cômputo dos fundos próprios do B… e cujas condições tenham sido aprovadas pelo Banco de Portugal;

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais;

(vi) Quaisquer responsabilidades ou contingências do B… relativas a acções, instrumentos ou contratos de que resultem créditos subordinados perante o B…;

(vi) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o Grupo ES…, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais, anteriores a 30 de Junho de 2014, documentalmente comprovadas nos arquivos do B…, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.

(c) No que concerne às responsabilidades do B… que não sejam objecto de transferência, estas permanecem na esfera jurídica do B… (...).

(e) Os activos sob gestão do B… ficam sob gestão do …, S.A. (...).

2. Após a transferência prevista nas alíneas anteriores, o Banco de Portugal pode a todo o tempo transferir ou retransmitir, entre o B… e o …, S.A., activos, passivos, elementos patrimoniais e activos sob gestão, nos termos do artigo 145º H, número 5º. (...).

9. A transferência decretada (...) não pretende conferir a quaisquer contrapartes ou terceiros quaisquer novos direitos nem permitir exercer quaisquer direitos que na ausência dessa transferência não existissem ou não pudessem ser exercidos sobre ou com relação aos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do B…, assim transferidos, incluindo quaisquer direitos de denúncia, resolução ou de decretar o vencimento antecipado ou de compensar {netting/set-off}, nem dar lugar a (i) qualquer incumprimento, (ii) alteração de condições, direitos ou obrigações, ou (iii) sujeição a aprovações ou (iv) direito a executar garantias, (v) direito a efectuar retenções ou compensações (netting/set-off) entre quaisquer pagamentos ou créditos ao abrigo de tais activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos»;

7 – No dia 29 de Dezembro de 2015, o Banco de Portugal emitiu três novas deliberações, denominadas "Contingência", "Perímetro" e "Retransmissão";

8 – Na deliberação "CONTINGÊNCIA" pode ler-se que a mesma é adoptada relativamente «ao ponto da agenda” Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20 horas), na redacção que lhe foi dada pela Deliberação da Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014 (17 horas)»;

9 – Do teor da deliberação "CONTINGÊNCIA" consta, além do mais, o seguinte:

«(...) 1. A deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20:00 horas), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de Agosto de 2014 (17:00 horas) - doravante a "Deliberação de 3 de Agosto", para efeitos dos considerandos seguintes - que determinou a constituição do …, S.A. ("…"), determinou igualmente a transferência de um conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco ES…, S.A. ("Banco ES…" ou "B…") para o …, descritos no Anexo 2 da mesma Deliberação de 3 de Agosto.

2. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os accionistas e credores da instituição objecto de resolução devem assumir os prejuízos da referida instituição.

3. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir directamente os prejuízos da instituição de crédito objecto de resolução.

4. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente conferido que pode ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do B… para o exercício da actividade ou da venda do …, para determinar transferências adicionais de activos e passivos entre o … e o B… (o "Poder de Retransmissão"). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente estabelecido no número 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto.

Fundamentos para a clarificação e para o exercício do Poder de Retransmissão

5. A versão original da Deliberação de 3 de Agosto, publicada em 3 de Agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do nº 1 do Anexo 2:

“As responsabilidades do B… perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o … SA, com excepção das seguintes (Passivos Excluídos) (...).

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude e violação de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais."

6. A versão alterada da Deliberação de 3 de Agosto, publicada em 11 de Agosto de 2014, dispunha o seguinte na alínea (b) do nº 1 do Anexo 2:

"As responsabilidades do B… perante terceiros, que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais, serão integralmente transferidas para o … SA, com excepção das seguintes (Passivos Excluídos) ".

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais."

7. O Banco de Portugal considerou ser proporcional e de interesse público não transferir para o banco de transição as responsabilidades contingentes ou desconhecidas do B… (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais], independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do BES nos termos da subalínea (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto, uma vez que a certeza relativamente às responsabilidades do banco de transição é essencial para garantir a continuidade das funções críticas desempenhadas pelo … e que anteriormente tinham sido desempenhadas pelo B….

8. A legitimidade processual do B… tem vindo a ser questionada ou enjeitada em processos judiciais em que este é parte, com base na alegada transferência para o … das responsabilidades que se discutem naqueles processos, em que o B… era réu a 3 de Agosto de 2014 e que respeitam a factos anteriores à aplicação da medida de resolução ao B… e por efeito da aplicação desta.

9. Importa clarificar que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, decidiu e considera que todas as responsabilidades contingentes e desconhecidas do B… (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do B…, estão abrangidas pelas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação, não tendo sido, portanto, transferidas para o ….

10. Alguns tribunais solicitaram ao Banco de Portugal que este lhes comunicasse o seu entendimento, enquanto entidade de resolução, sobre a não transferência de responsabilidades e contingências do B… para o …, ao abrigo das subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto.

11. Esses pedidos não foram efectuados na maior parte dos processos pendentes em tribunal, que se relacionam com responsabilidades ou contingências não transferidas para o ….

12. Se o número de processos pendentes nos tribunais judiciais e a diferente orientação nas decisões até hoje tomadas conduzirem a que, de modo significativo, não venha a ser reconhecida adequadamente a selecção efectuada pelo Banco de Portugal (enquanto autoridade pública de resolução) dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos do B… para o … (decisão sobre o «perímetro de transferência»}, pode ficar comprometida a execução e a eficácia da medida de resolução aplicada ao B…, a qual, entre outros critérios, se baseou num critério de certeza quanto ao perímetro de transferência.

13. Foi esse critério de certeza que permitiu calcular as necessidades de capital da instituição de transição, o …, e foi com base nesse cálculo que o Fundo de Resolução realizou o capital da instituição de transição.

14. Caso viessem a materializar-se na esfera jurídica do … responsabilidades e contingências por força de sentenças judiciais, o … seria chamado a assumir obrigações que de modo algum lhe deveriam caber e cuja satisfação não foi pura e simplesmente tida em consideração no montante do capital com que aquele banco de transição foi inicialmente dotado.

15.Este risco pode materializar-se ainda antes do trânsito em julgado das decisões judiciais se, de acordo com as regras contabilísticas, for entendido que, não obstante a decisão do Banco de Portugal, aquela materialização é provável.

16. Nos termos da lei, a decisão do Banco de Portugal sobre o perímetro de transferência só pode ser alterada através dos meios processuais previstos na legislação do contencioso administrativo, de acordo com o artigo 145º-AR do RGICSF (correspondente ao artigo 145º-N do RGICSF, em vigor à data de aplicação da medida de resolução ao BES).

17.Questionar o referido perímetro de transferência fora do contencioso administrativo constitui um desvio à competência dos tribunais administrativos, legalmente estabelecida, e impede que o Banco de Portugal exerça a prerrogativa que a lei lhe confere de afastar, por motivo de interesse público, a execução de sentenças desfavoráveis, iniciando-se de imediato o procedimento tendente à fixação da indemnização de acordo com os trâmites definidos no Código do Processo nos Tribunais Administrativos.

18. Decisões de tribunais judiciais que, directa ou indirectamente, ponham em causa o perímetro de transferência neutralizam este mecanismo contencioso (e compensatório), legalmente previsto, de impugnação das decisões do Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, e comprometem a execução e a eficácia da medida de resolução.

19. Tem a presente deliberação o seguinte objectivo:

a. Clarificar o tratamento das responsabilidades contingentes e desconhecidas do B… (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do B…, nos termos da subalínea (v) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto;

b. Se e na medida em que quaisquer responsabilidades contingentes e desconhecidas ou incertas do B… à data de 3 de Agosto (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais, independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do B… e que devessem ter permanecido na sua esfera jurídica nos termos da Deliberação de 3 de Agosto, sejam atribuídas ao …, proceder à sua retransmissão, mediante o exercício do Poder de Retransmissão, das referidas responsabilidades contingentes e desconhecidas (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais) para o B…; e

c. Determinar que, de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145º-P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145º-G do RGICSF, o B… e o … tomem as medidas previstas nesta deliberação por forma a conferir-lhe eficácia plena.

20. Face ao exposto e de forma a garantir a continuidade das funções essenciais desempenhadas pelo …, encontram-se reunidos os pressupostos para o exercício da Poder de Retransmissão, conforme previsto nesta deliberação, exercício que se afigura extremamente necessário, urgente e inadiável.

O Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para seleccionar os activos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:

A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto, não foram transferidos do B… para o … quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do B… que, às 20:00 horas do dia 3 de Agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do B…;

B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do B… para o … os seguintes passivos do B…:

(i) Todos os créditos relativos a acções preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo B… e vendidas pelo B…;

(ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com ativos imobiliários que foram transferidos para o …;

(iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de activos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20h00 do dia 3 de Agosto de 2014;

(iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o B… - Companhia de Seguros de Vida, S.A.;

(v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o B… era o mutuante;

(vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo B… enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e

(vii) Qualquer responsabilidade que seja objecto de qualquer dos processos descritos no Anexo I.

C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efectuados, se verifique terem sido efectivamente transferidos para o … quaisquer passivos do B… que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de Agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do … para o B…, com efeitos às 20 horas do dia 3 de Agosto de 2014;

D) O Conselho de Administração do B… e o Conselho de Administração do … praticarão todos os actos necessários à implementação e eficácia das clarificações e retransmissões previstos na presente deliberação. Em particular e de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145º-P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145º-G do RGICSF, o … e o B… devem:

(a) Adoptar as medidas de execução necessárias à adequada aplicação da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao B…, bem como de todas as decisões do Banco de Portugal que a complementam, alteram ou clarificam, incluindo a presente deliberação;

(b) Praticar todos os actos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal referidas em (a), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter actos anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões;

(c) Para efeito de cumprimento do disposto na alínea (b), requerer a imediata junção da presente deliberação aos autos em que sejam parte;

(d) Adequar os seus registos contabilísticos ao disposto nas decisões do Banco de Portugal referidas em (a); e

(e) Abster-se de qualquer conduta que possa por em causa as decisões do Banco de Portugal referidas em (a) (…).

Anexo I

I. Lista de responsabilidades litigiosas relativas aos processos judiciais pendentes em Tribunais em Portugal:

1.Processos existentes a 3 de Agosto de 2014 (...)

2.Processos iniciados após 3 de Agosto de 2014 (relativos a factos anteriores à aplicação da medida de resolução):

«(...)»;

10 – Na mesma data, 29 de Dezembro de 2015, foi emitida pelo Banco de Portugal a denominada deliberação "PERÍMETRO" de onde consta, nomeadamente, escrito o seguinte:

«(…) 1. A deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20:00h), com as clarificações e ajustamentos introduzidos pela deliberação de 11 de Agosto de 2014 (17:00 horas) – doravante a “deliberação de 3 de Agosto” para efeitos dos considerandos seguintes – que determinou a constituição do …, S.A. (“…”), determinou igualmente a transferência de um conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco ES…, S.A. (“Banco …” ou “B…”) para o …, descritos no Anexo 2 à mesma Deliberação de 3 de Agosto.

2. Após 3 de Agosto, e à medida que tem vindo a ser disponibilizada informação adicional, o Banco de Portugal, na qualidade de autoridade de resolução, tem vindo a aprofundar o conhecimento da situação financeira do conjunto de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do ….

3. O RGICSF estabelece, em conformidade com a legislação europeia na matéria, que os accionistas e credores de uma instituição objecto de medida de resolução devem suportar os prejuízos dessa mesma instituição.

4. Um dos princípios do RGICSF impõe que os recursos do fundo de resolução não sejam utilizados para assumir directamente os prejuízos da instituição de crédito objecto de resolução.

5. O Banco de Portugal dispõe de um poder legalmente estabelecido que poderá ser exercido a todo o tempo antes da revogação da autorização do B… para exercício da actividade ou da venda do …, para determinar transferências adicionais de activos e passivos entre o … e o B… (o “Poder de Retransmissão”). O Poder de Retransmissão encontra-se previsto no Capítulo III (Resolução) do Título VIII do RGICSF, tendo ficado expressamente previsto no número 2 do anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto.

6. São necessárias clarificações adicionais quanto aos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos do B… para o … e alterar o Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto para reflectir estas clarificações.

7. É desejável clarificar que quaisquer contingências fiscais passivas, quer presentes ou futuras, resultantes de dívidas fiscais, constituídas ou por constituir, relativas a factos tributários anteriores a 3 de Agosto de 2014 deverão permanecer na esfera jurídica do B….

8. Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e de 15 de Setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade OF…» (tal como definida na deliberação de 15 de Setembro de 2015), o Banco de Portugal deve adicionalmente determinar que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do B…, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade OF… não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao …, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o B….

9. Na medida em que, e não obstante as clarificações e alterações constantes desta deliberação, um activo ou passivo tenha sido transferido para o … que devesse ter permanecido na esfera jurídica do B…, ou tenha permanecido na esfera jurídica do B…, mas que devesse ter sido transferido para o …, o Poder de Retransmissão é exercido para conferir eficácia às clarificações e alterações constantes desta deliberação.

10. Considerando que, desde a aplicação da medida de resolução ao B… e também na presente data foram tomadas pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal várias deliberações que produziram efeitos na selecção de activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos para o …, a qual estava originalmente expressa no Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto, revela-se oportuno e adequado proceder-se a um esforço de consolidação, actualizando o referido Anexo 2 às mencionadas deliberações, o Conselho de Administração do Banco de Portugal, ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para seleccionar os activos e passivos a transferir para o banco de transição e do disposto no nº 2 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto, delibera o seguinte:

A) A subalínea (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redacção:

“Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respectivo prazo já se ter vencido ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respectivo vencimento) já se ter verificado, e cumulativamente (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de Junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do B… e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do B…, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.”

B) A alínea (d) do nº 1 do Anexo 2 passa a ter a seguinte redacção: “São transferidos na sua totalidade para o … SA todos os restantes elementos extrapatrimoniais do B…, com excepção dos relativos ao Banco ES… SA, ao ES… (Miami), ao AB… (Líbia) e dos relativos às entidades cujas responsabilidades perante o B… não foram transferidas nos termos da subalínea (v) da alínea (a) do nº 1 e, com efeitos a partir de 29 de Dezembro de 2015, ao BF…, limited;”

C) É aditado um nº 10, com a seguinte redacção:

“Transferem-se ainda para o … quaisquer créditos já constituídos ou por constituir reportadas a factos tributários anteriores a 3 de Agosto de 2014, independentemente de estarem ou não registados na contabilidade do B….”

D) A Administração do B… deve, para efeitos de cumprimento de quaisquer formalidades que se julguem necessárias, exercer as suas competências, praticar os actos e tomar as iniciativas adequadas para garantir as transferências de valares a receber e créditos para o … decorrentes das contingências fiscais activos, actualmente identificadas ou futuras, resultantes de créditos fiscais já constituídos ou por constituir, reportados a factos tributários anteriores a 3 de Agosto de 2014, independentemente de se encontrarem ou não registadas na contabilidade.

E) É aditado um novo nº 11, com a seguinte redacção:

“O disposto nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do presente Anexo devem ser interpretadas à luz das clarificações constantes do Anexo 2C”.

F) É aditado um novo Anexo 2C à deliberação de 3 de Agosto, com a redacção constante da deliberação relativa à “Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas subalíneas (v) a (vii) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20 horas), na redacção que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014 (17 horas) ”, adoptada pelo Conselho de Administração do Banco de Portugal na presente data;

G) Sem prejuízo das deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e de 15 de Setembro de 2015, todas relativas à «Responsabilidade OF…» (tal como definida na deliberação de 15 de Setembro de 2015), o Banco de Portugal determina adicionalmente que, por se tratar de uma responsabilidade de natureza equiparável a obrigações, dirigida a, e subscrita por, investidor(es) qualificado(s), tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) deve permanecer na esfera jurídica do B…, pelo que na eventualidade de, por decisão transitada em julgado, se determinar que a Responsabilidade OF… não se encontra abrangida pela subsubalínea (c) da subalínea (i) da alínea (b) do nº 1 do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto ou se determinar que essa responsabilidade pertence ao …, tal responsabilidade (bem como todas as responsabilidades com esta conexas) é retransmitida para o B…;

H) É aditada uma subalínea (ix) à alínea (b) ao nº 1 do Anexo 2, com a seguinte redacção: ‘’Responsabilidade OF…”.

I) Na medida em que qualquer activo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer das alíneas anteriores, devesse ser transferido para o …, mas que, de facto, tenha permanecido na esfera jurídica no B…, são, pela presente, os referidos activos, passivos ou elementos extrapatrimoniais transferidos do B… para o …, com efeitos a 3 de Agosto de 2014 (20.00h);

J) Na medida em que qualquer activo, passivo ou elemento extrapatrimonial que, nos termos de qualquer uma das alíneas anteriores, devesse ter permanecido na esfera jurídica do B… mas que foram, de facto, transferidos para o …, são, pela presente, os referidos activos, passivos ou elementos extrapatrimoniais retransmitidos do … para o B…, com efeitos a 3 de Agosto de 2014 (20.00h);

K) O Conselho de Administração do B… e o Conselho de Administração do … devem tomar todas as medidas necessárias à execução eficaz das clarificações, ajustamentos, transferências e retransmissões previstos na presente deliberação;

L) É anexada à presente deliberação uma versão revista e consolidada do Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto de 2014, a qual incorpora:

a. As clarificações e alterações constantes da presente deliberação;

b. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal, adoptadas na presente data, relativas à “Retransmissão de obrigações não subordinadas do …, S.A., para o Banco ES…, S.A. e à “Retransmissão das acções representativas da totalidade do capital social do BF…, Limited do …, S.A., para o BE…, S.A. “:

c. As deliberações do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 22 de Dezembro de 2014, de 11 Fevereiro de 2015 e 15 de Setembro de 2015, todas relativas à Responsabilidade OF…, e de 13 de Maio de 2015, relativa a eventuais obrigações contraídas e garantias prestadas perante terceiros pelo B…, relacionadas com a comercialização de instrumentos de dívida do G…;

d. O Anexo 2 da Deliberação de 3 de Agosto será alterado e rectificado de modo a revestir a forma estabelecida no anexo da presente deliberação, incluindo o aditamento dos Anexos 2B e 2C (…).

Anexo 2C

DELIBERAÇÃO.

Clarificação e retransmissão de responsabilidades e contingências definidas como passivos excluídos nas alíneas (v) a (vii) do nº 1 do Anexo 2 à Deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 (20 horas), na redacção que lhe foi dada pela Deliberação do Banco de Portugal de 11 de Agosto de 2014 (17 horas)

O Conselho de Administração do Banco de Portugal - ao abrigo da competência conferida pelo RGICSF para seleccionar os activos e passivos a transferir para o banco de transição, delibera o seguinte:

A) Clarificar que, nos termos da alínea (b) do número 1 do Anexo 2 da deliberação de 3 de Agosto, não foram transferidos do B… para o … quaisquer passivos ou elementos extrapatrimoniais do B… que, às 20:00 horas do dia 3 de Agosto de 2014, fossem contingentes ou desconhecidos (incluindo responsabilidades litigiosas relativas ao contencioso pendente e responsabilidades ou contingências decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais), independentemente da sua natureza (fiscal, laboral, civil ou outra) e de se encontrarem ou não registadas na contabilidade do B…;

B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do B… para o … os seguintes passivos do B…:

(i) Todos os créditos relativos a acções preferenciais emitidas por sociedades-veículo estabelecidas pelo B… e vendidas pelo B…;

(ii) Todos os créditos, indemnizações e despesas relacionados com activos imobiliários que foram transferidos para o …;

(iii) Todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos (compra e venda de activos imobiliários e outros), assinados e celebrados antes das 20h00do dia 3 de Agosto de 2014;

(iv) Todas as indemnizações relacionadas com contratos de seguro de vida, em que a seguradora era o B… - C…, S.A.;

(v) Todos os créditos e indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo, em que o B… era o mutuante;

(vi) Todas as indemnizações e créditos resultantes de anulação de operações realizadas pelo B… enquanto prestador de serviços financeiros e de investimento; e

(vii) Qualquer responsabilidade que seja objecto de qualquer dos processos descritos no Anexo I.

C) Na medida em que, não obstante as clarificações acima efectuadas, se verifique terem sido efectivamente transferidos para o … quaisquer passivos do B… que, nos termos de qualquer daquelas alíneas e da Deliberação de 3 de Agosto, devessem ter permanecido na sua esfera jurídica, serão os referidos passivos retransmitidos do … para o B…, com efeitos às 20 horas do dia 3 de Agosto de 2014;

D) O Conselho de Administração do B… e o Conselho de Administração do … praticarão todos os actos necessários à implementação e eficácia das clarificações e retransmissões previstos na presente deliberação. Em particular e de acordo com o disposto no nº 7 do artigo 145º -P e nos nºs 2,3 e 4 do artigo 145º-6 do R6ICSF, o … e o B… devem:

(a) Adoptar as medidas de execução necessárias à adequada aplicação da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao B…, bem como de todas as decisões do Banco de Portugal que a complementam, alteram ou clarificam, incluindo a presente deliberação;

(b) Praticar todos os actos, sejam estes de natureza procedimental ou processual, nos processos em que sejam parte de modo a dar adequada execução às decisões do Banco de Portugal referidas em (a), incluindo aqueles que sejam necessários para reverter atas anteriores que tenham praticado contrários aquelas decisões;

(c) Para efeito de cumprimento do disposto na alínea (b], requerer a imediata junção da presente deliberação aos autos em que sejam parte;

(d) Adequar os seus registos contabilísticos ao disposto nas decisões do Banco de Portugal referidas em (a); e

(e) Abster-se de qualquer conduta que possa por em causa as decisões do Banco de Portugal referidas em (a) (...).

Anexo I

I. Lista de responsabilidades litigiosas relativas aos processos judiciais pendentes em Tribunais em Portugal:

1. Processos existentes a 3 de Agosto de 2014 (...).

2. Processos iniciados após 3 de Agosto de 2014 (relativos a factos anteriores à aplicação da medida de resolução) (...)».

                                                                        *

Fundamentação:

Os factos acima elencados resultaram provados pelo teor das supra identificadas deliberações do Banco de Portugal, que se encontram juntas aos autos.

                                                            *

ENQUADRAMENTO JURÍDICO.

I) Nulidade da sentença.

Por força do artigo 615º nº1 b) é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito.

Nos presentes autos, arguida a nulidade da sentença com o fundamento de omissão de fundamentação de facto, foi proferido despacho que fixou a matéria de facto e respectiva fundamentação.

Os apelantes mantiveram a arguição de nulidade, por via da ampliação de recurso prevista no artigo 617º nº3 do CPC, alegando que a lista de deliberações do BdP que veio a ser elencada não pode considerar-se “factos provados” e, caso se entenda o contrário, deverá então entender-se que foi omitida a sua fundamentação.

Apreciando, haverá que ter em conta a fase processual em que foi proferida a sentença recorrida, ou seja, após o despacho saneador e sem submeter os factos alegados pelas partes a julgamento, por se ter entendido que os elementos dos autos eram suficientes para proferir decisão de mérito.

Neste contexto, haveria que consignar provados apenas os factos que não são controvertidos e que, naturalmente, tenham relevância para a decisão que se vai proferir, a qual constitui a apreciação negativa da subsunção ao quadro legal aplicável dos factos alegados (e ainda não submetidos a prova).

Não há assim lugar ao elenco de factos provados sem relevância para esta decisão, bem como de factos não provados, que não chegaram a ser submetidos a prova e aqueles que foram considerados relevantes pelo tribunal recorrido para a decisão a proferir correspondem ao conteúdo das deliberações do BdP, invocadas pelos autores como fundamento para a responsabilidade do réu pela satisfação do crédito alegado, consideração que não nos merece censura. 

Quanto à fundamentação, consignou o tribunal recorrido que a mesma resulta do teor das deliberações juntas aos autos e que, aliás, são públicas.

Improcede, portanto, a arguição de nulidade da sentença.

                                                            *

II) Aplicação das subalíneas v) e vii) da alínea b) do anexo 2.

Agindo no exercício das suas funções de supervisão das instituições de crédito, o Banco de Portugal, ao abrigo dos artigos 17º e 17º-A da respectiva lei orgânica e perante o desequilíbrio financeiro do réu B…, deliberou em 3 de Agosto de 2014 aplicar-lhe uma medida de resolução, prevista nos artigos 145º-A e seguintes do DL 298/92 de 31/12 do RGICSF (Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras), na redacção então vigente (do DL 114-A/2014 de 1/8) e criando um banco de transição, o ora réu …, nos termos do artigo 145º-G do mesmo diploma.

Na referida deliberação foram criados os estatutos do réu …, que constituem o seu anexo 1 e para o qual foram transferidos os activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do B…, nos termos dos Anexos 2 e 2-A, onde estes são definidos, nomeadamente os que são considerados excluídos da transferência.

A mesma deliberação consignou, no anexo 2, que, ao abrigo do artigo 145º-H nº5 do RGICSF, após as transferências aí determinadas, o BdP poderia a qualquer momento transferir e retransmitir, entre o B… e o …, activos e passivos, elementos patrimoniais e activos sob gestão. 

Esta deliberação veio a ser esclarecida por deliberação de 11 de Agosto de 2014, que clarificou e ajustou o perímetro dos activos, passivos e elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do B… transferidos para o …, alterando e consolidando a redacção do referido Anexo 2 e, posteriormente, pela deliberação de 29 de Dezembro de 2015, que tornou a clarificar e alterar o âmbito dos passivos excluídos da transferência.

Importa então apreciar se as responsabilidades imputadas pelos autores ao réu B… constituem passivo que foi transferido para o ….

Pela deliberação de 3 de Agosto de 2014, clarificada pela deliberação de 11 de Agosto do mesmo ano, foram excluídos da transferência os seguintes passivos previstos nas subalíneas v) e vii) da alínea b) do nº1 do anexo 2:

(v) Quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contra-ordenacionais.

(vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira e distribuição de instrumentos de dívida emitidos por entidades que integram o GE…, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados resultantes de estipulações contratuais, anteriores a 30 de Junho de 2014, documentalmente comprovadas nos arquivos do B…, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas   

E, na deliberação de 29 de Dezembro de 2015, foi clarificado que (…) B) Em particular, desde já se clarifica não terem sido transferidos do B… para o … os seguintes passivos do B…: (i) Todos os créditos relativos a acções preferenciais emitidas por sociedades veículo estabelecidas pelo B… e vendidas pelo B… (…) (iii) todas as indemnizações relacionadas com o incumprimento de contratos de compra e venda de activos imobiliários e outros, assinados e celebrados antes das 20.00h do dia 3 de Agosto de 2014 (…).

Foi também alterada a subalínea vii), que passou a ter a seguinte redacção:

vii) Quaisquer obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização, intermediação financeira, processo de contratação e distribuição de instrumentos financeiros emitidos por quaisquer entidades, sem prejuízo de eventuais créditos não subordinados, cuja posição devedora não seja excluída por alguma das subalíneas anteriores, designadamente as subalíneas (iii) e (v), que (a) fossem exigíveis à data da medida de resolução em virtude de o respectivo prazo já se ter vencido, ou, sendo os créditos condicionais, em virtude de a condição (desde que apenas desta dependesse o respectivo vencimento) já se ter verificado e, cumulativamente, (b) resultassem de estipulações contratuais (negócios jurídicos bilaterais) anteriores a 30 de Junho de 2014, que tenham cumprido as regras para a expressão da vontade e vinculação contratual do B… e cuja existência se possa comprovar documentalmente nos arquivos do B…, em termos que permitam o controlo e fiscalização das decisões tomadas.      

Ora o pedido formulado pelos autores (fundado na actividade de intermediação financeira, de comercialização de acções preferenciais de SPVs, deliberadamente enganadora e violadora dos deveres funcionais da instituição de crédito) integra desde logo a previsão da alínea v) da alínea b) do nº1 do anexo 2 da medida de resolução de 3/08/2014, por decorrer de fraude ou violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contravencionais, ou ainda eventualmente a previsão da subalínea vii) da mesma disposição legal, por resultar de intermediação financeira e distribuição de instrumentos financeiros não vencidos antes da resolução, sendo certo que, de acordo com a deliberação de 29 de Dezembro de 2015, não foram transmitidas para o banco de transição os créditos relativos a acções preferenciais emitidas por sociedades veículo estabelecidas pelo B… e vendidas pelo B….

Os apelantes alegam que não é aplicável a subalínea v) e que não se verificam os pressupostos de aplicação da subalínea vii) porque não estaríamos face a obrigações “assumidas”, ou voluntárias, mas sim legais, por constituírem responsabilidade civil perante terceiros.

Porém, não é possível afastar a aplicação da subalínea v), que prevê precisamente os comportamentos fraudulentos e violadores das disposições do RGICSF e do CVM invocadas pelos apelantes, podendo, por outro lado as obrigações resultantes de responsabilidade civil perante terceiros provir de obrigações assumidas, como seria o caso de responsabilidade civil contratual.

Dos factos alegados na petição inicial e do conteúdo destas duas subalíneas, bem como da deliberação de 29/12/2015, não pode, assim, deixar de se considerar excluído da transferência do passivo para o … o invocado crédito, não se afigurando relevante a questão de os apelantes serem ou não qualificados como “lesados do papel comercial”, já que o que releva é que os factos alegados na petição inicial integram as excepções à transmissão do passivo para o ….

                                                            *

III) Enquadramento da medida de resolução no direito europeu.

Alegam também os apelantes que o quadro do direito europeu descrito na sentença recorrida não está correcto, não se podendo considerar aplicáveis os Regulamentos UE nº1024/2013 MUS de 15/10/2013 do Conselho e nº806/2014 MUR de 15/07/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, por não se encontrarem ainda em vigor aquando da resolução de 3/08/2014, como resulta do artigo 33º do Reg. MUS e do artigo 99º do Reg. MUR.

A sentença recorrida faz menção a estes regulamentos para realçar a coerência do quadro legislativo nacional com a regulamentação da União Europeia relevante para a matéria, mas, de qualquer modo, o enquadramento jurídico nacional constante do artigos 139º e 145º e seguintes do RGICSF na redacção do DL 114-A/2014 de 1/8, em vigor à data da resolução de 3/08/2014, já continha as normas que legitimaram as deliberações do BdP, nos termos acima referidos, assim como já vigorava a Directiva 2014/59 UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15/05/2014, que estabeleceu um enquadramento para a resolução de instituições de crédito, nos seus artigos 31º e seguintes, nomeadamente, com a criação de uma instituição de transição, prevista no artigo 40º.

Sendo assim, estão as deliberações do BdP tomadas nesta matéria fundadas no quadro legal nacional e europeu.

                                                            *

IV) Retransmissão do passivo do banco de transição para a instituição de crédito originária.

Tendo a sentença recorrida concluído que, mesmo que se pudesse ter considerado transmitida para o … a responsabilidade do B… relacionada com os factos alegados na petição inicial, sempre a mesma se teria de considerar retransmitida para o B…, com efeitos retroactivos à data da medida de resolução por via da deliberação de 29/12/2015, não se conformam os apelantes com tal conclusão, alegando que o BdP não tinha o poder de fazer operar a retransmissão, a qual não estava contemplada na lei, à datada resolução de 3/08/2014.

Porém, não lhes assiste razão, pois o artigo 145-H do RGICSF, com a redacção do DL 114-A/2014 de 1/8, previa a possibilidade de retransmissão, no seu nº5 b), permitindo o artigo 40º nº7 da Directiva 2014/59/UE a retransmissão em duas situações em alternativa, sendo uma delas no caso de a decisão de resolução ter previsto essa possibilidade, o que aconteceu na deliberação de 3/08/2014, que expressamente prevê a retransmissão ao abrigo do acima referido artigo 145º-H (regime este que actualmente se encontra contemplado no artigo 145º-Q do RGICSF).

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 V) Usurpação de poderes jurisdicionais por parte do Banco de Portugal e presunção de legalidade dos actos administrativos com violação dos princípios fundamentais do Estado de Direito.

Alegam ainda os apelantes que as deliberações de 29/12/2015 do BdP, na parte em que determinam que as obrigações objecto deste processo são excluídas do passivo transmitido, constituem uma usurpação de poderes jurisdicionais que só cabem aos tribunais e que não pode haver uma “presunção de legalidade” dos actos administrativos, sob pena de violação dos princípios do Estado de Direito como o princípio da igualdade das partes e princípio da tutela jurisdicional efectiva.

A medida de resolução e criação do banco de transição, com a transferência dos seleccionados activos e passivos para o …, consubstancia um acto administrativo e foi tomada no âmbito da actividade do BdP de supervisão e salvaguarda das instituições de crédito, dos depositantes e do sistema financeiro e de acordo com as normas do RGICSF, destinadas para o efeito, nomeadamente do seu artigo 139º do RGICSF.

E, como actos administrativos que são, as deliberações tomadas pelo BdP são vinculativas, enquanto não houver impugnação pelos meios próprios, da competência dos Tribunais Administrativos, em harmonia com o artigo 4º nº1 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei 13/2002 de 19/2 e com o artigo 145º-AR do RGICSF, na redacção da Lei 23-A/201523/2 (que corresponde o artigo 145º-N na redacção anterior), o que está ao alcance de qualquer interessado, se assim o desejar.

Não sendo o Tribunal Comum competente em razão da matéria para apreciar a validade dos actos administrativos, resta-lhe a competência incidental, prevista nos artigos 91º e 92º do CPC, com o efeito do nº2 do primeiro, ou seja, de que a decisão tomada nesse âmbito não faz caso julgado fora do processo. 

Dir-se-á então que não se verifica qualquer usurpação do poder jurisdicional, nem a nulidade de usurpação prevista no artigo 161º nº2 do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que foi o tribunal recorrido que, ao abrigo do poder jurisdicional que lhe assiste, apreciou e decidiu que o crédito objecto dos presentes autos não se inclui no passivo transmitido, o que fez de acordo com o acto administrativo formulado pela entidade com competência para o efeito.

Igualmente, não sendo da competência dos Tribunais Comuns a apreciação da legalidade dos actos administrativos, está o mesmo obrigado a recusar a aplicação das normas que infrinjam a Constituição, por força do artigo 204º da CRP, pelo que haverá que concluir que as normas do RGICSF, na aplicação e interpretação que lhes foi dada pelo BdP na medida de resolução e suas clarificações, não estão feridas de inconstitucionalidade, não se verificando a violação de princípios fundamentais do Estado de Direito, nem sendo violados os artigos 2º, 20º e 268º da CRP e artigo 6º do CPTA, como alegam os apelantes.

Na verdade, existindo um meio próprio, da competência dos Tribunais Administrativos, para os interessados impugnarem os actos administrativos formados no âmbito da sua competência, não há violação do direito de igualdade nem do direito de tutela jurisdicional efectiva.

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VI) Procedência da acção ou prosseguimento dos autos para julgamento

Do atrás exposto conclui-se necessariamente que a responsabilidade que os autores imputam ao B… não se transferiu para o réu …, conclusão que se impõe, mesmo se os factos alegados pelos autores se viessem a provar em julgamento.

Deste modo, não merece censura a sentença recorrida que decidiu de mérito após o saneador, não havendo fundamento para o prosseguimento dos autos.

(No sentido da improcedência resultante da lei das acções intentadas contra o réu … com fundamento na transferência responsabilidade do B… pela sua actividade de intermediação financeira fraudulenta, tem-se pronunciado jurisprudência largamente maioritária, como os acs STJ 30/03/2017, p.725/14, 26/09/2017, p.3499/16, 2/11/2017, p.11674/16, 22/03/2018, p.220/16, 13/03/2018, p.25795/15, RL 7/03/2017, p.48/16, 26/04/2017, p. 3594/15, 26/04/2017, p.31251/15, 11/05/2017, p.2471/16, 8/06/2017, p.3379/16 (relatado pelo ora 1º adjunto), 6/07/207, p.6961/16, 14/09/2017, p.6909, 14/09/2017, p.652/16, 3/07/2017, p.20120/16, 15/02/2018, p.31811/15 (relatado pela ora 2ª adjunta), todos em www.dgsi.pt; no mesmo site, em sentido diferente, da necessidade de produção de prova para averiguar da responsabilidade do …, pronunciaram-se ac STJ 18/01/2018, com voto de vencido, p.18084/15 e acs RL de 15/03/2018, p.16196/16, 22/03/2018, p.7382/16 e 12/04/2018, p.26163/16, todos com voto de vencido da ora relatora).     

Deverá, portanto, manter-se a absolvição do réu ….  

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DECISÃO.

Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. 

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Custas pelos apelantes.

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2018-09-13

Maria Teresa Pardal

Carlos Marinho

Anabela Calafate