Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TERESA PRAZERES PAIS | ||
Descritores: | DIVISÃO DE COISA COMUM VENDA DE IMÓVEL CASO JULGADO ACÇÃO DE ANULAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/09/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | - Todas as decisões tomadas no âmbito do processo de divisão de coisa comum , designadamente uma compra e venda do imóvel que constitui objeto da aludida ação de divisão de coisa comum - realizada pelo Sr. encarregado de venda, em nome e por determinação do Tribunal -, não tendo na referida acção sido objecto de impugnação, têm força de caso julgado - Por isso, vedado está a uma parte da referida acção, e agora através de uma ação autónoma, sindicar um procedimento que ele próprio orientou , como se de um tribunal de recurso se tratasse. - É que, em rigor, deixou o autor - da acção autónoma – precludir o direito de anular a venda, o que consubancia a verificaçõ de exceção dilatória cuja consequência é a absolvição dos requeridos da instância quanto a tal pedido, nos termos do artigo 278, nº 1, alínea e) e 576º do CPC. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa J… intentou a presente ação declarativa contra M…e J.., pedindo, além do mais, a declaração de nulidade da compra e venda celebrada no dia 7 de Novembro de 2018 com o 2º réu, a ineficácia da mesma em relação ao autor, a restituição ao autor do direito de adjudicar e ser a escritura efetuada a seu favor. Alega para o efeito que, no âmbito da venda realizada no processo de divisão de coisa comum a que estes autos estão apensos, manifestou ao encarregado de venda a intenção de adjudicar, ao abrigo do direito de preferência, pelo que a venda realizada ao 2º réu não deveria ter sido efetuada. * O autor foi notificado para se pronunciar quanto à eventual procedência da exceção dilatória inominada de falta de atualidade do litígio, por preclusão do direito de obter a anulação, tendo defendido que não existe caso julgado, por serem divergentes os objetivos da ação e que ficou a aguardar a tomada de posição a autorizar a venda ao autor. ** Foi,então, proferida esta decisão: “....Termos em que se declara verificada a exceção dilatória inominada de falta de preclusão do direito do autor pelo que, em consequência, indefere liminarmemnte a petição inicial apresentada, nos termos do artigo 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, nº 2 e 590.º do CPC. Custas a cargo do autor (artigos 527º' do CPC e 6º , n.º 1 do RCP e tabela anexa àquele diploma).” *** É esta decisão que o A impugna, formulando estas conclusões: 1. O recorrente na acçao principal manifestou a sua intenção de adquirir o imovel 2. Para isso apresentou diversos requerimentos 3. Nenhum deles foi respondido 4. Antes foi realizada a venda ao seu inquilino 5. Sem que fosse sequer dado a preferência ao A 6. Apos este ter tomado conhecimento da venda 7. Agiu e fê-lo com a acçao que ora se recorre 8. A qual não deveria sequer ter sido interposta pois o bem deveria ter-lhe sido adjudicado a si, pois sempre o pediu 9. O recorrente entrou com ação a pedir a nulidade desse negocio 10. Nessa acçao depositou o preço de 17.000.00 euros 11. O A, é confrontado com a obstrução desse direito 12. Pois não lhe é permitido sequer litigar 13. Porquanto o tribunal recorrida considera que existe a preclusão do direito 14. Quando o que existiu sempre foi o não deixar que o recorrente o exercitasse vide doc. 1 e os documentos anexos 15. Por fim indefere liminarmente a ação, quando nada obsta ao seu prosseguimento e conhecimento do mérito da causa 16. E o recorrente exerceu esse direito logo que tomou conhecimento da venda a terceiros 17. Pois nem sequer foi notificado para exercer preferência 18. O que possui em causa a legalidade do negócio, e desta forma, o negocio realizada com terceiro esta inquinado 19. O negocio possui vícios graves de forma , que inevitavelmente tem como consequência a nulidade que se requereu na acçao e foi negado 20. O recorrente apenas pede o é seu de direito que o património que é seu se mantenha na sua posse, não cre ser pedir muito 21. E sente que a justiça só se realizará a justiça que dever ser aplicada aos homens quando esta sentença for revogada *** Compulsados o processo nº 1482/10.8T2AMD apura-se o seguinte: 1) M… propôs uma acção especial de divisão de coisa comum contra J…,o apelante , a fim de que fosse definida a situação jurídica de um imóvel ,loja nº4 do rés do chão do prédio urbano em regime de propriedade horizontal situado na freguesia e concelho … ,por natureza, indivisivel 2) O R contesta ,alegando que o imóvel é de sua exclusiva propriedade. 3) Por decisão de 1-10-2012 foi agendada a realização da conferência de interessados a que alude o artº 1056 CPC ,uma vez que a questão levantada pelo R já se encontrava definitivamente resolvida. 4) O R ,ora apelante , não compareceu .Por isso,foi ordenada a venda do imóvel nos termos do artº1056 nº2 CPC ) e convidaram-se as partes a pronunciarem-se quanto à modalidade da venda e valor a atribuir ao imóvel 5) Por decisão de 21-3-2013 foi decidido que a venda se efectue por propostas em carta fechada e que o valor é o equivalente a 70% do valor tributário 6) Esta última diligência não teve lugar ,ordenando-se a sua repetição 7) Esta última não teve lugar ,a fim de se indagar se sobre o imóvel pendia uma penhora . 8) Constatou-se ,posteriormente, que sobre o imóvel pendiam ónus e encargos 9) Foi ordenada a citação dos credores à luz do artº 786 CPC 10) Por decisão,datada de 19-05-2015 foi ordenada a venda do imóvel mediante propostas em carta fechada .O valor a anunciar corresponde a 85%do valor tributário 11) No auto de abertura de propostas ,datado de 9/9/2015 ,por falta de propostas , determinou-se a venda por negociação particular 12) O Tribunal autorizou que a venda se efectuasse pelo preço de e 20.000,00 13) Foi interposto recurso desta decisão,o quel foi julgado improcedente. 14) O SR encarregado de venda informa que o proponente é N… 15) Por decisão de 2-5-2018 o sr Encarregado de venda é notificado para se pronunciar sobre a proposta apresentada . Foi também ordenada a notificação da A M… e do , agora A , J.. para se pronunciarem sobre a proposta ,devendo este último apresentar ,querendo ,melhor proposta ,sob pena de poder perder a oportunidade para o fazer 16) A fls 418 o Sr encarregado da venda informa que conseguiu uma nova oferta para o imóvel no valor de €17.000,00 e queo proponente é o Rendeiro J…. 17) A fls 422 foi ordenada a notificação do requerido ,ora apelante, para esclarecer se pretende adquirir o imóvel pelo preço de€ 17.000,00,ou se nada tem a opor quanto à venda pelo preço indicado. 18) O requerido nada disse ,pelo que por despacho datado de 9-10-2018 , foi autorizada a venda pelo preço de € 17.000,00. 19) Posteriormente ,o requerido pronunciou-se ,formulando a intenção de adquirir o imóvel , mas atenta a extemoraneidade ,o requerimento foi desentranhado. 20) E por escritura pública outorgada a 7/11/2018 foi formalizada a compra e venda com o proponente Jorge Baptista *** Atendendo a que o âmbito do objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente ( artº663 nº2 ,608 nº2.635 nº4 e 639mº1 e 2 do Código de Processo Civil ),,sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso ,exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, o que aqui se discute é saber se há lugar à excepção dilatória insuprível . Vejamos ... Compulsados os autos de divisão de coisa comum, constatamos que o ,agora, Autor e apelante, devidamente citado e posteriormente notificado de todos os actos e diligências [1]de forma consistente por legal , não praticou qualquer acto que o levasse a adquirir o imóvel: - relembramos que , a fls 418 o Sr encarregado da venda informa que conseguiu uma nova oferta para o imóvel no valor de €17.000,00 e que o proponente é o Rendeiro J.... Por isso , a fls 422 foi ordenada a notificação do requerido ,ora apelante, para esclarecer se pretende adquirir o imóvel pelo preço de€ 17.000,00,ou se nada tem a opor quanto à venda pelo preço indicado. O requerido nada disse ,pelo que por despacho datado de 9-10-2018 , foi autorizada a venda pelo preço de € 17.000,00. Posteriormente ,o requerido pronunciou-se ,formulando a intenção de adquirir o imóvel, mas atenta a extemporaneidade ,o requerimento foi desentranhado. O que concluir? O Autor intenta a presente ação declarativa, por apenso a ação especial de divisão de coisa comum, em que é parte passiva, pedindo a declaração de nulidade da compra e venda celebrada no dia 7-11-2018, assim como a escritura celebrada, por violação do artigo 823.º e ss. do CPC e 416º e 1308 do CC e ainda declarada ineficaz a relação de venda realizada entre o encarregado de venda e o 2º réu, E consequentemente ser restituído o direito ao autor de adjudicar. O que o Autor pretende é inutilizar a escritura de compra e venda do imóvel que constitui objeto da ação de divisão de coisa comum, realizada pelo Sr. encarregado de venda, em nome e por determinação do Tribunal. Por isso, a haver qualquer vício de que enfermasse a tramitação daqueles autos , incluindo o despacho que determinou a venda deveria o A ter interposto o respectivo recurso. Não o tendo feito , todas as decisões tomadas no âmbito do processo de divisão de coisa comum tem força de caso julgado Com efeito, a autoridade de caso julgado importa a aceitação de uma decisão proferida em acção anterior, que se insere no objecto da acção posterior; visa obstar a que a situação jurídica material definida por uma sentença possa ser validamente definida de modo diverso por outra sentença, e , não exige a tríplice identidade a que alude o art. 581.º do CPC. Termos em que, bem andou o Sr Juiz ao decidir : “....o que ocorre é a preclusão do direito do autor vir nesta ação obter do tribunal a anulação ou declaração de ineficácia de uma venda judicial, que orientada pelo tribunal sob o controlo das partes, através da possibilidade de invocar nulidades, reclamar ou recorrer. Acresce que o autor tinha a possibilidade de adquirir o imóvel no processo de venda, bastando fazer uma proposta mais elevada ao Sr. encarregado de venda, do que foi reiteradamente informado. O autor tinha uma sede própria e um prazo para invocar vícios da venda, a preterição de formalidades essenciais e, até, de fazer propostas de compra ou de invocar o direito de preferência, com vista a que o tribunal reconhecesse esse direito. Não o fez ou fê-lo parcialmente, tendo sido proferida decisão sobre a questão da preferência (ou da inexistência de direito) assim como foi proferida decisão a autorizar a venda. O autor pretende agora que este tribunal, através de uma ação autónoma, sindique um procedimento que ele próprio orientou, como se de um tribunal de recurso se tratasse. Admitir este desiderato é equivalente a aceitar soluções distintas para o mesmo direito ou que decisões da primeira instância possam revogar ou contradizer decisões tomadas pelo mesmo tribunal noutro processo, no qual o autor era parte (e que, por isso, podia conformar), e que decisões que autorizaram o Sr. encarregado de venda a celebrar a escritura de compra e venda, e que transitaram em julgado, fossem alteradas em sucessivas ações intentadas sobre o assunto. Permitir tal atuação é acolher, a nosso ver, uma violação grave do princípio da segurança jurídica e do respeito por decisões ali tomadas. A tutela jurisdicional visa a resolução de litígios atuais e não para regular situações em que o direito já deixou de existir ou de merecer proteção. Destarte, consideramos que o direito de anular a venda não existe, por ter precludido, uma vez que a oposição a tal acto deveria ter sido exercido na ação especial de divisão de coisa comum, além de que não pode o tribunal considerar a existência de um direito de preferência que já declarou entender não existir. Consideramos, assim, que falta um dos pressupostos processuais da lide que é o da atualidade do litígio, exceção dilatória inominada. Tendo precludido o direito do autor, é procedente a exceção dilatória, cuja consequência é a absolvição dos requeridos da instância quanto àqueles pedidos, nos termos do artigo 278º, nº 1, alínea e) e 576º do NCPC). ** Síntese: todas as decisões tomadas no âmbito do processo de divisão de coisa comum tem força de caso julgado. Por isso , precludiu tendo precludido o direito do autor, é procedente a exceção dilatória, cuja consequência é a absolvição dos requeridos da instância quanto àqueles pedidos, nos termos do artigo 278, nº 1, alínea e) e 576 do CPC. *********** Pelo exposto,acordam em julgar a apelação improcedente e confirmam a decisão impugnada. Custas pelo apelante. ** Lisboa, 9 de Maio de 2019 Teresa Prazeres Pais Isoleta de Almeida e Costa Carla Mendes [1] Tal como decorre do que acima está exposto. |