Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1459/11.6TTLSB.L1-4
Relator: LEOPOLDO SOARES
Descritores: ACÇÃO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DOS ESTATUTOS DE ASSOCIAÇÃO SINDICAL
REGIME DO CONTRATO DE TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS
ESTATUTO DA CARREIRA DIPLOMÁTICA
DIREITO DE PARTICIPAR NA ACTIVIDADE DA ASSOCIAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/18/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I - O art. 319º, al. a) da Lei 59/08, de 11 de Setembro , consagra os princípios da organização e da gestão democráticas nos seguintes moldes:
No respeito pelos princípios da organização e da gestão democráticas, as associações sindicais devem reger -se, nomeadamente, em obediência às seguintes regras:
a) Todo o associado no gozo dos seus direitos sindicais tem o direito de participar na actividade da associação, incluindo o de eleger e ser eleito para a direcção e ser nomeado para qualquer cargo associativo, sem prejuízo de poderem estabelecer -se requisitos de idade e de tempo de inscrição;
b) A assembleia geral reúne -se ordinariamente, pelo menos, uma vez por ano;
c) Deve ser possibilitado a todos os associados o exercício efectivo do direito de voto, podendo os estatutos prever para tanto a realização simultânea de assembleias gerais por áreas regionais ou secções de voto, ou outros sistemas compatíveis com as deliberações a tomar;
d) Nenhum associado pode estar representado em mais do que um dos órgãos electivos;
e) São asseguradas iguais oportunidades a todas as listas concorrentes às eleições para a direcção, devendo constituir -se para fiscalizar o processo eleitoral uma comissão eleitoral composta pelo presidente da mesa da assembleia geral e por representantes de cada uma das listas concorrentes;
f) Com as listas, os proponentes apresentam o seu programa de acção, o qual, juntamente com aquelas, deve ser amplamente divulgado, por forma que todos os associados dele possam ter conhecimento prévio, nomeadamente pela sua exposição em lugar bem visível na sede da associação durante o prazo mínimo de oito dias;
g) O mandato dos membros da direcção não pode ter duração superior a quatro anos, sendo permitida a reeleição para mandatos sucessivos;
h) Os corpos sociais podem ser destituídos por deliberação da assembleia geral, devendo os estatutos regular os termos da destituição e da gestão da associação sindical até ao início de funções de novos corpos sociais;
i) As assembleias gerais devem ser convocadas com ampla publicidade, indicando -se a hora, local e objecto, e devendo ser publicada a convocatória com antecedência mínima de três dias em um dos jornais da localidade da sede da associação sindical ou, não o havendo, em um dos jornais aí mais lidos;
j) A convocação das assembleias gerais compete ao presidente da respectiva mesa, por sua iniciativa ou a pedido da direcção, ou de 10 % ou 200 dos associados.
II - Com essa norma pretende proteger-se entre outras a possibilidade de todos os sócios de uma Associação sindical serem eleitos para os respectivos órgãos.
III- Porém, a lei não refere que isso tenha que suceder durante todo o tempo em que são associados.
Se assim fosse o legislador não teria admitido restrições ao nível de idade e de tempo de inscrição.
IV- Todavia a lei não pretende patrocinar desigualdades entre sócios no activo e o que o não estão, assim como entre sócios residentes em Portugal e os que o não são.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:O Ministério Público, intentou acção de declaração de nulidade,
com processo especial contra a Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses.
Pede que seja declarada a nulidade dos estatutos da ré, dando-se conhecimento da decisão ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social para registo e publicação no Boletim de Trabalho e Emprego.
Alega, em resumo, em Assembleia Geral Extraordinária, realizada em 3 de Fevereiro de 2011, foi deliberada a alteração dos estatutos da associação demandada.
Tais estatutos foram objecto de Registo no Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e foram publicados no Boletim do Trabalho e do Emprego.
Tal Ministério deu conhecimento dos estatutos à Procuradoria Geral da República.
Analisado o novo texto estatutário, do mesmo resulta que as alterações do nº 3 dos estatutos, limitam as candidaturas aos cargos da mesa da assembleia geral e do conselho directivo apenas aos associados que exercem funções em Lisboa.
Tais restrições contendem com o disposto no art. 319.º, al. a) da Lei 59/08 .
Assim, porque tais restrições violam normas legais de carácter imperativo, os estatutos da ré devem ser declarados nulos.
Citada a ré respondeu.
Alegou, em síntese, que a petição inicial revela uma análise superficial, simplista e descontextualizada das atribuições e competências da ré, da sua estrutura, da sua actividade e da génese da alteração estatutária posta em causa.
A carreira diplomática é uma carreira muito específíca e, os funcionários diplomáticos, desempenham indistintamente as suas funções em Portugal e no estrangeiro.
Os funcionários diplomáticos no activo prestam serviço, alternadamente em Portugal e no estrangeiro, sendo aproximadamente dois terços no exterior e um terço no quadro interno.
Perante esta realidade específica que a própria lei reconhece, o art. 9º, nº 2 do Estatuto da Carreira Diplomática, preceitua que só podem integrar o Conselho Diplomático os funcionários do quadro diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros colocados nos serviços internos e que se encontrem no activo ou na situação de disponibilidade.
Logo, é a própria lei que atribui capacidade eleitoral passiva para membros eleitos do Conselho Diplomático exclusivamente aos funcionários do activo colocados no quadro interno.
Aliás, o Conselho Diplomático apenas existe em Lisboa, pelo que só
nesta cidade podem ser colocados funcionários diplomáticos.
Assim,  a associação demandada sustenta que o Ministério Público, limitou-se a fazer uma interpretação literal da norma legal pretensamente violada, sendo certo que a referência a Lisboa utilizada na norma, é usada no sentido de serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros e não como significado literal e estrito da cidade ou região de Lisboa.
Deste modo, os estatutos alterados da ré não implicam qualquer limitação da capacidade eleitoral passiva dos seus sócios.
Não se verifica, pois, qualquer ilegalidade, não tendo sido violado o
art. 319º, al.a) da Lei 59/2008, pelo que não deve ser declarada a nulidade dos estatutos e, a haver nulidade, a mesma apenas sería parcial, levando à reposição da norma revogada.
Veio a ser proferida decisão que na parte que releva teve o seguinte teor:
“ O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo não enferma de nulidade total.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Inexistem outras nulidades, excepções ou quaisquer questões prévias de que cumpra conhecer.
O estado dos autos permite o imediato conhecimento do pedido, uma
vez que não existe matéria factual controvertida e a questão a decidir é de direito.
(………….).
Mostram-se provados os seguintes factos relevantes para a boa
decisão da causa:
1- Em Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 3 de Fevereiro de 2011, foi deliberada a alteração dos estatutos da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses;
2- A requerimento da ré, esses estatutos foram objecto de registo no
Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, em 15/3/2011, sob o nº19, pag 136 do Livro nº2, e foram publicados no Boletim do Trabalho e do Emprego nº 12, em 29/3/2011;
3- O Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social deu, conhecimento dos Estatutos da ré, ao Ministério Público, através do ofício que faz fls. 9 dos autos;
4- O qual deu entrada na Procuradoria da República junto do Tribunal do Trabalho em 6 de Abril de 2011;
5- De acordo com o nº3 dos estatutos, a Associação Sindical dos
Diplomatas Portugueses, abrange ...os funcionários na efectividade ou disponibilidade que integrem o quadro do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou funcionários aposentados que o tenham integrado;
6- Foi feita uma alteração nos estatutos ao art. 12º, nº2, que passou a ter a seguinte redacção:
Só poderão candidatar-se aos cargos da mesa da assembleia geral os associados que, quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora de serviço, jubilados ou aposentados tenham residência em Portugal;
7- E foi feita uma alteração ao art. 17º, nº3, que passou a ter a
seguinte redacção:
Só poderão candidatar-se aos lugares do conselho directivo os
associados que quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora do serviço, jubilados ou aposentados tenham residência em Portugal.

                                                      ***

A convicção do tribunal quanto aos factos dados como assentes,
baseou-se no acordo das partes, manifestado no art. 1º da contestação, e na prova documental apresentada nos autos.

                                                         ***
Aplicando o Direito,
O Ministério Público considera que as alterações aos estatutos da ré violam o art. 319º, al. a) da Lei 59/08.
Preceitua tal normativo o seguinte:
No respeito pelos princípios da organização e da gestão
democráticas, as associações sindicais devem reger-se, nomeadamente, em obediência às seguintes regras:
a ) Todo o associado no gozo dos seus direitos sindicais tem o direito
de participar na actividade da associação, incluindo o de eleger e ser eleito para a direcção e ser nomeado para qualquer cargo associativo, sem prejuízo de poderem estabelecer-se requisitos de idade e de tempo de inscrição (...).
Vejamos então se as alterações introduzidas aos estatutos da ré
referidas na fundamentação de facto, violam ou não este preceito legal.
Nos termos do art. 3º dos Estatutos da ré, podem ser sócios da
Associação os funcionários na efectividade ou na disponibilidade que integrem o quadro do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, ou os funcionários aposentados que o tenham integrado;
O DL. 40-A/98, de 27 de Fevereiro, que define o estatuto profissional
dos funcionários do quadro do serviço diplomático, designados por funcionários diplomáticos, estipula no seu art. 2º:
Os funcionários diplomáticos constituem um corpo único e especial de funcionários do Estado, sujeito a regras específicas de ingresso, progressão e promoção na respectiva carreira, independentemente das funções que sejam chamados a desempenhar”.
Deste normativo, salienta-se que a carreira diplomática tem
reconhecidamente um regime específico.
Por sua vez, o art. 5º, nº1 do aludido decreto-lei, preceitua que os
funcionários diplomáticos desempenham indistintamente as suas funções em Portugal e no estrangeiro.
Da conjugação dos arts. 47º e 48º deste Estatuto da Carreira
Diplomática, os funcionários diplomáticos no activo prestam o seu serviço no quadro interno e externo, de forma alternada e segundo as regras estipuladas pelo Estatuto.
Face a tal especificidade de prestação de funções, o próprio art. 9º, nº2 do Decreto Lei 40-A/98, prevê que só podem integrar o conselho diplomático os funcionários do quadro diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros colocados nos serviços internos e que se encontrem no activo ou na situação de disponibilidade.
É pois a própria lei a limitar a capacidade eleitoral passiva para
membros eleitos do Conselho Diplomático a funcionários do activo colocados no quadro interno ou na situação de disponibilidade.
Ora, é nosso entender que o preceituado no art. 319º, al. a) da Lei
59/08, tem de ser interpretado em conjugação com as normas existentes no ordenamento jurídico.
No caso concreto dos funcionários diplomáticos, naturalmente que a
exigência contida na alínea a) do referido art. 319º, tem de ser medida e condicionada pelas normas vigentes sobre esta especifíca carreira profissional.
Assim, se a Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses, tem a
sua sede em Lisboa (cfr.art. 1º, nº2 dos Estatutos da ré), é por natureza impraticável que o exercício efectivo de funções nos orgãos sociais da ré seja feito por sócios que não estão colocados nos serviços internos em Portugal.
E, se as funções no quadro interno, têm de ser obrigatoriamente exercidas em Lisboa, como é facto público e notório, porque é aí que está sedeado o Conselho Diplomático, é óbvio que, quando as alterações aos estatutos prevêm associados que quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou quando na disponibilidade em serviço, fora de serviço ou quando jubilados ou aposentados tenham residência em Portugal, estão a contemplar todo o universo possível de sócios da Associação da ré, que podem exercer efectivamente funções nos órgãos sociais da ré.
São os únicos que podem ter capacidade eleitoral passiva, tal como o próprio Estatuto da Carreira Diplomática, já tinha limitado esse universo.
Assim, o art. 319º. al. a) da L. 59/08, terá de ser interpretado com os
limites de capacidade eleitoral passiva que o próprio ordenamento jurídico português contemplou, nesta carreira profissional específica.
E, este universo de elegíveis, foi perfeitamente respeitado nas alterações feitas aos estatutos da ré.
Deste modo, consideramos que não há qualquer violação da
preceituado no art. 319º, al. a) da L.59/89, nem de qualquer outra norma imperativa vigente no ordenamento jurídico português.
E, não se verificando qualquer violação de norma legal imperativa,
naturalmente que as alterações aos estatutos da ré se mostram válidas e legais, não se verificando a invocada nulidade de tais estatutos.
Concluindo, a pretensão deduzida pelo Ministério Público, mostra-se
improcedente.

                                                     ***
Nesta conformidade e decidindo,
Julga-se a acção improcedente e, consequentemente, absolve-se a ré
do pedido.
Sem custas.
Registe e Notifique” - fim de transcrição.
Inconformado o MºPº recorreu.
Concluiu que:
(…)
A recorrida contra alegou.
Concluiu que:
(…)
Foram colhidos os vistos dos Exmºs Adjuntos.
Nada obsta à apreciação.                         

                                                         ***                             
                                  
Em 1ª instância foi dada como a supra citada  matéria de facto com o seguinte teor:
1- Em Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 3 de Fevereiro
de 2011, foi deliberada a alteração dos estatutos da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses;
2- A requerimento da ré, esses estatutos foram objecto de registo no
Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, em 15/3/2011, sob o nº19, pag 136 do Livro nº2, e foram publicados no Boletim do Trabalho e do Emprego nº 12, em 29/3/2011;
3- O Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social deu, conhecimento dos Estatutos da ré, ao Ministério Público, através do ofício que faz fls. 9 dos autos;
4- O qual deu entrada na Procuradoria da República junto do Tribunal do Trabalho em 6 de Abril de 2011;
5- De acordo com o nº 3 dos estatutos, a Associação Sindical dos
Diplomatas Portugueses, abrange ...os funcionários na efectividade ou disponibilidade que integrem o quadro do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou funcionários aposentados que o tenham integrado;
6- Foi feita uma alteração nos estatutos ao art. 12º, nº2, que passou a ter a seguinte redacção:
Só poderão candidatar-se aos cargos da mesa da assembleia geral os associados que, quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora de serviço, jubilados ou aposentados tenham residência em Portugal;
7- E foi feita uma alteração ao art. 17º, nº3, que passou a ter a seguinte redacção:
Só poderão candidatar-se aos lugares do conselho directivo os
associados que quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora do serviço, jubilados ou aposentados tenham residência em Portugal.

                                                         ****

É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 684º nº 3º  do CPC ex vi do artigo 87º do CPT).[i]
In casu, afigura-se que a recorrente suscita uma única questão que consiste em saber se tendo-se procedido a uma alteração parcial dos Estatutos da recorrida se deve declarar a nulidade dos mesmos  por violarem o disposto no art. 319º, al. a) da Lei 59/08, de 11 de Setembro ( o qual corresponde ao disposto no artigo 415º do CT/2009).
Segundo tal preceito ( Princípios da organização e da gestão democráticas):
No respeito pelos princípios da organização e da gestão democráticas, as associações sindicais devem reger -se, nomeadamente, em obediência às seguintes regras:
a) Todo o associado no gozo dos seus direitos sindicais tem o direito de participar na actividade da associação, incluindo o de eleger e ser eleito para a direcção e ser nomeado para qualquer cargo associativo, sem prejuízo de poderem estabelecer -se requisitos de idade e de tempo de inscrição;
b) A assembleia geral reúne -se ordinariamente, pelo menos, uma vez por ano;
c) Deve ser possibilitado a todos os associados o exercício efectivo do  direito de voto, podendo os estatutos prever para tanto a realização simultânea de assembleias gerais por áreas regionais ou secções de voto, ou outros sistemas compatíveis com as deliberações a tomar;
d) Nenhum associado pode estar representado em mais do que um dos órgãos electivos;
e) São asseguradas iguais oportunidades a todas as listas concorrentes às eleições para a direcção, devendo constituir -se para fiscalizar o processo eleitoral uma comissão eleitoral composta pelo presidente da mesa da assembleia geral e por representantes de cada uma das listas concorrentes;
f) Com as listas, os proponentes apresentam o seu programa de acção, o qual, juntamente com aquelas, deve ser amplamente divulgado, por forma que todos os associados dele possam ter conhecimento prévio, nomeadamente pela sua exposição em lugar bem visível na sede da associação durante o prazo mínimo de oito dias;
g) O mandato dos membros da direcção não pode ter duração superior a quatro anos, sendo permitida a reeleição para mandatos sucessivos;
h) Os corpos sociais podem ser destituídos por deliberação da assembleia geral, devendo os estatutos regular os termos da destituição e da gestão da associação sindical até ao início de funções de novos corpos sociais;
i) As assembleias gerais devem ser convocadas com ampla publicidade, indicando -se a hora, local e objecto, e devendo ser publicada a convocatória com antecedência mínima de três dias em um dos jornais da localidade da sede da associação sindical ou, não o havendo, em um dos jornais aí mais lidos;
j) A convocação das assembleias gerais compete ao presidente da respectiva mesa, por sua iniciativa ou a pedido da direcção, ou de 10 % ou 200 dos associados.
Ora , tal como resulta da ,matéria assente em 6 e 7, os Estatutos da recorrida [1]foram alvo de uma alteração[2] nos seguintes moldes:
“Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses — Alteração
Alteração, aprovada em assembleia geral extraordinária realizada em 3 de Fevereiro de 2011, dos artigos 12.º, n.º 2, e 17.º, n.º 3, dos estatutos da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses (ASDP), publicados no Boletim do Trabalho e Emprego, 3.ª série, n.º 31, de 22 de Agosto de 1999.
No artigo 12.º, n.º 2, onde se lê:
«Só poderão candidatar -se aos cargos da mesa da assembleia geral os associados que exerçam funções em Lisboa e não sejam membros do conselho do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou, quando na disponibilidade em serviço ou aposentados, tenham residência em Portugal.»
deve ler -se:
«Só poderão candidatar -se aos cargos da mesa da assembleia geral os associados que, quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora do serviço, jubilados ou aposentados, tenham residência em Portugal.»
No artigo 17.º, n.º 3, onde se lê:
«Só poderão candidatar -se aos lugares do conselho directivo os associados que não sejam membros natos do conselho do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou, quando na disponibilidade fora do serviço ou aposentados, tenham residência permanente em Portugal.»
deve ler -se:
«Só poderão candidatar -se aos lugares do conselho directivo os associados que quando no activo, exerçam funções em Lisboa ou, quando na disponibilidade fora do serviço, jubilados ou aposentados, tenham residência em Portugal.»
Registado em 15 de Março de 2011, ao abrigo do artigo 316.º do Código do Trabalho, sob o n.º 19, a fl. 136 do livro n.º 2.” – fim de transcrição.
Como tal , em face do raciocínio explanado pelo recorrente , constata-se que quer a redacção anterior dos artigos em causa  quer a actual padecem do mesmo vício , visto que apenas permitem a alguns dos seus associados ( sem ser por requisitos de idade ou de tempo de inscrição) candidatarem-se a cargos  na mesa da assembleia geral e no conselho directivo.[3]
Ou seja em relação aos que estão no activo apenas os que exercem funções em Lisboa.
No tocante aos que se mostram na disponibilidade , jubilados ou aposentados apenas os que têm residência permanente em Portugal.
Cabe contudo salientar que a derradeira redacção dos Estatutos sempre eliminou a impossibilidade de serem eleitos para tais cargos os membros do Conselho do Ministério dos Negócios Estrangeiros...
E em relação aos argumentos aduzidos em sede de recurso cumpre, desde logo ,  salientar que se concorda que Conselho Diplomático e a Associação , aqui recorrida, são entidades distintas.
Como tal -  como bem refere o MºPº em sede alegatória (vide artigo 20º a fls. 63) - não é o facto de na composição do Conselho Diplomático se fazerem certas restrições que as torna legítimas quanto à composição dos órgãos sociais da Ré.
Admite-se que o Corpo Diplomático é um Corpo Especial com Estatuto e regras próprias.
E também se dá de barato que o facto de sócios em exercício de funções não colocados nos serviços internos em Portugal possam sentir maiores dificuldades no desempenho de funções nos órgãos sociais em causa, o mesmo se dizendo dos que não o estando não residam em Portugal...
Todavia tais factos, só por si, não se afiguram absolutamente impeditivos do exercício das respectivas de funções atentos os modernos meios de comunicação invocados pelo recorrente.
Argumentar-se-á contudo que o que a norma , cuja violação se invoca , pretende proteger é a possibilidade de todos os sócios de uma Associação sindical fazerem parte dos respectivos órgãos.
Porém, a lei não refere que isso tenha que suceder durante todo o tempo em que são associados...
Se assim fosse o legislador não teria admitido restrições ao nível de idade e de tempo de inscrição.
Daí que se possa sustentar que se devem admitir outras que, igualmente, não violem o principio democrático.
Ora nos termos do Estatuto da Carreira Diplomática ( vide artigos 2º, 47º e 48º) os funcionários diplomáticos no activo prestam serviço no quadro interno e externo de forma alternada, sendo que a repartição temporal do desempenho em apreço é de aproximadamente dois terços no exterior ( no estrangeiro ) e um terço no quadro interno (em Lisboa).
Como tal poderia concluir-se  que todos os associados da recorrida que se encontrem no exercício de funções num momento ou noutro da sua carreira – de forma igual e democrática – podem ser eleitos para os órgãos em causa, sendo que a Ré tem a sua sede em Lisboa ( vide artigo 1º, nº 2º dos Estatutos).
Ou seja em relação aos sócios que estão no activo todos eles – em pé de igualdade – num momento ou noutro das suas carreiras podem integrar os órgãos em causa.
Assim, quantos a estes ( sócios no activo) poderia concluir-se que os Estatutos em causa quer nos nº 1º e 2º do seu artigo 12º, assim como no nº 3º do seu artigo 17º não consagram nenhuma causa inelegibilidade específica ( uma capitis deminutio) restrita a alguns dos seus associados ao referir que apenas têm capacidade para o efeito os que exercem funções em Lisboa….
Porém, cabe relembrar que nem todos os sócios da recorrida têm que estar no activo.
É que também podem candidatar-se à mesa associados na disponibilidade fora de serviço, jubilados ou aposentados.
Ora se alguém está nessas condições (na disponibilidade fora de serviço, aposentado ou jubilado  , desde logo, por definição não exerce funções em Lisboa para os efeitos do nº 1º do artigo 12º dos Estatutos.
Por outro lado, porque motivo um associado na disponibilidade,  aposentado ou jubilado residente em Bragança, Elvas ou no Funchal
( ou seja residente em Portugal ) tem capacidade para ser eleito para a mesa e para o conselho directivo e um que resida  em Zamora,  Badajoz ou Palma de Maiorca já a não tem ...

Certamente que não será por motivos de ordem geográfica...!
É evidente que tal raciocínio é reversível, bastando para isso pensar num caso em que o aposentado ou jubilado tenha decidido fixar residência em Pequim, Buenos Aires, S. Paulo , etc...
Seja como for , neste caso decorre que os preceitos em causa  dos Estatutos são geradores de desigualdades quer entre os sócios que estão no activo e os que o não estão ( atenta a menção ao exercício de funções em Lisboa) – que estes  últimos por definição não exercem – quer entre os sócios que não estão no activo entre si ( porque uns podem residir em Portugal e outros não..., gerando assim obstáculo não conexionado com o local da sede, mas com o País de residência).
E isso afigura-se violador da norma invocada pelo recorrente.
A menos que se pretenda sustentar que devem existir sócios de primeira e sócios de segunda.....; sendo que no caso em apreço a redacção em causa sempre permitia hierarquizá-los para os efeitos em causa como sócios no activo que exercem funções em Lisboa, sócios que o não estão e residem em Portugal e sócios que também   o não estão e residem no estrangeiro.
Mas será que estas desigualdades devem levar à declaração da nulidade dos estatutos da Ré nesses pontos ?
Afigura-se que a resposta é afirmativa, devendo contudo salientar-se que na presente acção não foi peticionada a extinção da recorrida.
Como tal , a nosso ver, cumpre reputar nula – por contrária à lei ( vide artigo 280º do CC) :
- a menção ao exercício de funções em Lisboa,  constante do nº  1º do artigo 12º dos Estatutos;
- o nº 2º do artigo 12º dos Estatutos;
-     o nº 3º do artigo 17º dos Estatutos.
Todavia qualquer dessas nulidades também não se afigurava susceptível de determinar a extinção da recorrente.
Tal raciocínio sempre resulta do disposto no artigo 292º do Código Civil.
Segundo este preceito ( sob a epígrafe redução ) :
A nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio , salvo quando se mostre que não teria sido concluído sem a parte viciada”.
Para António Menezes Cordeiro o primeiro requisito para aplicação desse preceito “é o de uma nulidade ou anulação meramente parcial.
Na base desta fórmula , algumas doutrina e jurisprudência têm admitido uma regra de divisibilidade dos negócios.
De modo algum : o que a lei diz é  o seguinte : a nulidade ou anulação ( quando seja) parcial não determina a invalidade do conjunto.”[4]
E refere ainda o mesmo Professor que “ o segundo requisito tem a ver com a vontade das partes no tocante ao ponto da redução: esta não opera quando se mostre que o negócio não teria sido concluído sem a parte viciada.
Bastará provar, pelas circunstâncias  objectivas ou pela vontade real duma das partes , conhecida pela outra – artigo 236º - ou pela sua vontade hipotética  e pela boa fé – artigo 239º - que sem a parte viciada , aquele concreto negócio não teria visto a luz.” [5]
In casu, é certo que não estamos perante um negócio jurídico.
Todavia quer o acto constitutivo quer a posterior alteração de Estatutos , no mínimo , configuram um acto jurídico a que se aplicam , nos termos do disposto no artigo 295º do Código Civil, as mesmas regras, sendo certo que como também salienta Menezes Cordeiro “em termos de ónus de prova a situação é a seguinte:
“ o interessado na salvaguarda do negócio deverá invocar e provar os factos donde decorra a natureza meramente parcial da invalidade ;
-ao seu opositor caberá invocar e provar os factos donde se infira que, sem a parte viciada,  não teria havido negócio”.[6]
Ora no caso concreto, é patente que as supra citadas nulidades  assumem um cariz meramente parcial , sendo certo ,por outro lado,  que nenhum elemento aponta no sentido que sem as supra citadas  partes viciadas os Estatutos em apreço não teriam visto a luz.
Daí que não se vislumbre que devam implicar a invalidade do conjunto.
Como tal , afigura-se que declarada a nulidade se deve operar a redução referida no artigo 292º do Código Civil.

                                                        ****

Nestes termos, acorda-se em julgar procedente o recurso e em consequência declaram-se nulas:
- a menção ao exercício de funções em Lisboa,  constante do nº  1º do artigo 12º dos Estatutos da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses.
- o nº 2º do artigo 12º dos referidos Estatutos;
-   o nº 3º do artigo 17º dos mesmos Estatutos.
Continua , pois, o artigo 12º, nº 1º a ter a redacção inicial, salvo em relação à parte afectada, sendo eliminados os nº 2º do artigo 12º e nº 3º do artigo 17º em qualquer das suas redacções.
Comunique-se, oportunamente, esta decisão ao competente Ministério para registo e publicação.[7]
Custas pela apelada.
DN (processado e revisto pelo relator -  nº 5º do artigo 138º do CPC).

Lisboa, 18 de Abril de 2012

Leopoldo Soares
José Eduardo Sapateiro
Maria José Costa Pinto
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[1] Publicados no BTE, 3ª série, nº 31, de 22 de Agosto de 1999.
[2] Publicada no BTE, 3ª série, nº 12. de 29-3-2011.
[3] Cumpre salientar que o nº 1º do artigo 12º dos Estatutos , que não foi alvo de alteração, na Assembleia Extraordinária realizada em 3.2.2011,  estabelece que “ as reuniões da assembleia geral serão dirgidas por uma mesa  constituida por um presidente e secretário, que exerçam funções em Lisboa, eleitos por período de um ano, por sufrágio secreto, directo e simultâneo”.
[4] Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral , Tomo I, 1999, pág . 586.
[5] Obra citada, pág 586.
[6] Obra citada, pág 586.
[7] Artigo 449º , nº 4º do CT /2009.
[i] Nas palavras do Conselheiro Jacinto Rodrigues Bastos:
“As conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso…
Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente” – Notas ao Código de Processo Civil, volume III, Lisboa, 1972, pág 299.
Como tal transitam em julgado as questões não contidas nas supra citadas conclusões.
Por outro lado, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas  pelas partes e decididas pelos Tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente ( vide vg: Castro Mendes , Recursos , edição AAFDL, 1980, pág 28, Alberto dos Reis , CPC, Anotado, Volume V, pág 310 e acórdão do STJ de 12.12.1995, CJSTJ, Tomo III, pág 156).
Decisão Texto Integral: