Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3792/17.4T8VFX.L1-4
Relator: LEOPOLDO SOARES
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
ABONO DE CONDUÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I - Segundo o sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1 , Relator António Leones Dantas, acessível em www.dgsi.pt:
“ I - Conforme resulta do nº 2 do artigo 71º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, constitui retribuição, para efeito de acidentes de trabalho, «todas as prestações recebidas pelo sinistrado com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
II – Um subsídio de prevenção que visava compensar o constrangimento pessoal decorrente de o trabalhador ter que estar facilmente contactável e disponível para interromper o seu período de descanso e ir prestar trabalho, se necessário, e que é pago apenas nos meses em que o trabalhador está de prevenção, mesmo que pago apenas durante 7 meses no ano anterior ao sinistro, deve ser incluído na retribuição relevante para a reparação das consequências do acidente, nos termos do número anterior.” – fim de transcrição.
III – E ali se refere que importa que na ponderação do conceito de retribuição para efeitos de acidente de trabalho não olvidar que :
“No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.»
III - E mais recentemente, embora tendo por base a mesma Lei dos Acidentes de Trabalho, no acórdão proferido por esta Secção em 13/04/2011, proferido no processo n.º 216/07.9TTCBR.C1.S1 de que foi extraído, o seguinte sumário: «I- Conforme resulta do nº 3 do artigo 26º da Lei 100/97 de 13 de Setembro, constitui retribuição, para efeito de acidentes de trabalho, tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.»
IV  – Não consubstanciam “ custos aleatórios” para os efeitos do disposto no nº 2º do artigo 71º da LAT (aprovada pela  Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro)  a quantia recebida  mensalmente por um carteiro a título de motS/EmpC/U correspondente ao número de Kms que o trabalhador  percorria com a sua motorizada para efectuar a distribuição do correio.
V – Admite-se que o valor concreto  mensal da atribuição em causa até pudesse ser variável e sob essa perspectiva de “quantum “ incerto  por depender  do número de quilómetros  percorrido pelo sinistrado dentro da zona onde era  carteiro.  Todavia,  já não se pode afirmar o mesmo do seu pagamento que em  face das funções  de carteiro que o sinistrado desempenhava para a Ré se afigura certo.
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

AAA, residente na Rua (…)[1], intentou  [2][3]acção especial emergente de acidente de trabalho contra:
BBB;
- CCC;
- DDD;
- e EEE.
Pede a condenação:
- das RR. seguradoras no pagamento da pensão correspondente à IPP a fixar, por reporte à retribuição para as mesmas transferidas, no montante anual de € 17.718,38 e valor a fixar por danos morais, bem como nas custas do processo;
- da R. Empregadora, no montante da pensão correspondente à IPP a fixar  pelo valor remanescente do transferido para as Seguradoras, face ao montante da retribuição anual pelo mesmo auferida de € 20.513,73, bem como o valor de indemnização por incapacidades temporárias devidas até à data da alta e custas do processo.
A petição inicial - na parte relevante - teve o seguinte teor:
“(…)
Considerando que:
A) A entidade empregadora (4ª Ré), tinha a responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida em regime de co-seguro para a 1ª Ré, BBB, S.A., na qualidade de líder, na proporção de 65%; para a 2ª Ré, CCC  na proporção de 25%; e para a 3ª Ré, DDD. na proporção de 10%; através da apólice 203022515.
B) A responsabilidade transferida pela entidade patronal para as seguradoras era em função de uma retribuição anual de € 17.718,38.
C) A situação clínica do Autor ainda não está estabilizada, uma vez que, já após a alta dada pela seguradora (27/10/2017), o Autor continua - por insistência sua e perante apresentação de exame, por sua iniciativa efectuado, cerca de 10 dias antes da alta (Doc.1 junto) – a ser acompanhado pelos serviços médicos da seguradora tendo dado origem a uma intervenção cirúrgica em 05/02/2018 (Doc. 2, junto).

Dão-se aqui por reproduzidos para os legais efeitos todos os factos reconhecidos pelas partes na fase conciliatória (cf. Auto de Tentativa de Conciliação), em especial a existência e caracterização do acidente como de trabalho, e do nexo causal entre as lesões e o acidente, e a assunção da responsabilidade emergente do acidente de trabalho por parte das seguradoras, em função da retribuição anual transferida pela entidade empregadora no montante de € 17.718,38.

Pelas  Rés e pelo Autor não foi aceite a IPP (Incapacidade Permanente Parcial)  de 6%, fixada pelo Perito Médico do Tribunal.

Com efeito, o Autor considera que as sequelas resultantes das lesões sofridas no joelho direito, nomeadamente: dores constantes e incapacitantes; diminuição da força; instabilidade e rigidez dolorosa do joelho, serão causadoras de uma IPP superior à arbitrada pelo perito.

Pela Ré, EEE, não foi aceite a responsabilidade emergente do acidente de trabalho em função da retribuição anual não transferida para as seguradoras, no montante de € 2.795,35, alegando que essa quantia é referente a compensação do trabalhador pela utilização de veículo próprio na distribuição do correio e que não integra o conceito de retribuição.

O Autor não se conforma com tal justificação, uma vez que o montante em causa é pago regular e periodicamente, e cifra-se anualmente em € 5.360,33, à razão média mensal de € 487,30 (5.360,33/ 11 meses de trabalho).

E não poderia, nunca, ser considerado na sua totalidade como ajudas de custo, já que excede claramente a despesas normais com o uso do veículo, senão vejamos: as despesas anuais com a viatura, combustível, manutenções e seguro cifram-se em montante não superior a € 1.100,00, o que a dividir pelos meses de trabalho (11 meses) num ano dá uma média de cerca de € 100,00 por mês.

Neste sentido, considera o Autor, que a sua retribuição total anual à data do acidente era de € 20.513,73, tal como explanado no Auto de Tentativa de Conciliação pela Digníssima Magistrada do Ministério Público.

Na modesta opinião do Autor, e na sequência do considerando C), a sua situação clínica foi desde o início mal avaliada pela seguradora, o que causou atraso considerável na sua recuperação, com incapacidade absoluta para o trabalho desde a data do acidente.

Por este facto, e no caso de tal acréscimo no prazo de recuperação, se vier a comprovar dever-se à deficiente assistência médica prestada pela seguradora, deverá este Tribunal, arbitrar indemnização adequada pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, nomeadamente stress e ansiedade, causados pelo prolongar das dores sofridas, da dependência de terceiros para se deslocar e pelo agravamento da sua situação financeira, dado que, pelo facto de não estar a trabalhar sofreu uma redução evidente nos seus rendimentos.
NESTES TERMOS e nos melhores do douto suprimento deste tribunal, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e concomitantemente serem as RR. condenadas a,
a) Pagar ao A. a pensão remível de acordo com a Incapacidade que vier a ser fixada, desde a data da alta, com base na retribuição anual de € 20.513,73 (na proporção de € 17.718,38 da responsabilidade transferida para as RR. seguradoras e de € 2.795,35 da responsabilidade não transferida pela R(entidade patronal);
b) Serem ainda condenadas, as RR. Seguradoras, a pagar ao autor uma indemnização, a arbitrar por este tribunal, por danos não patrimoniais sofridos, pelo atraso considerável na recuperação do sinistrado, causado pela deficiente avaliação médica da seguradora “ab initio”;
c) Ser também a R. entidade patronal a pagar ao A. as  indemnizações temporárias devidas até à data da alta, em virtude do montante da retribuição anual não transferido para as seguradoras;
d) Devem ainda as RR. ser condenadas nas custas do processo, custas de parte, e procuradoria condigna. “ – fim de transcrição.
As Rés Seguradoras contestaram.[4]
Assumiram a responsabilidade do acidente pelo montante retributivo abrangido pelo contrato de seguro realizado com a R. empregadora, tendo em atenção a IPP que lhe atribuíram.
Mais solicitaram a realização de junta médica para determinação da incapacidade parcial permanente a fixar.
Também a  R. empregadora contestou.[5]
Sustenta que os montantes de retribuição auferidos pelo A. estavam integralmente transferidos para as Rés Seguradoras, sendo que os valores que o mesmo reclama a título de diferenciais correspondem ao pagamento de despesas com deslocação com o veículo motorizado , os quais visavam compensar/reembolsar o  sinistrado dessas mesmas despesas, não constituindo, por isso, retribuição.
Realizou-se Audiência Prévia.[6]
Nesta o  A. desistiu do pedido formulado contra as RR. A título de  compensação por danos de natureza não patrimonial, o que foi admitido.[7]
Foi  proferido  despacho saneador.
Seleccionou-se a matéria de facto assente e elaborou-se base instrutória.[8]
Ordenou-se a abertura de apenso de fixação de incapacidade.[9]
Em  26 de Abril de 2019,  no apenso próprio , após realizada junta médica[10],  foi   fixada a incapacidade permanente  parcial (IPP) do sinistrado em 0,0592, desde a data da alta, ocorrida em 27 de  Outubro  de 2017.[11]
Realizou-se  julgamento que  foi gravado.[12]
Nele as RR. Seguradoras e o A. acordaram sobre o objecto do litígio, na parte que lhes dizia respeito (pelo valor da retribuição anual para as Seguradoras transferida e pela IPP já determinada nos autos).[13]
Nessa parte,  foi  logo proferida sentença homologatória  que se mostra transitada.[14]
(…)
Em  8 de Julho de  2019, foi  proferida sentença que logrou o seguinte dispositivo:[15]
“Face ao exposto, julgo a presente acção provada e, em consequência:
1- Fixo a IPP de que padece o A., AAA, em consequência do acidente dos autos em 5,92% (cinco, vírgula noventa e dois por cento), desde 28.10.2017 e, em consequência, condeno a R. Empregadora, “DDD” a pagar-lhe:
a) o capital de remição da pensão correspondente a € 116,22 (cento e dezasseis euros e vinte e dois cêntimos), devida desde 28 de Outubro de 2017, acrescido dos respectivos juros de mora, desde essa data;
b) a quantia de € 1.576,28 (mil, quinhentos e setenta e seis euros e vinte e oito cêntimos), a título de indemnização por períodos de incapacidade temporária até 27 de Outubro de 2017, acrescida de juros de mora, a contar desde 20 de Abril de 2018; e
c) a quantia que se vier a determinar de indemnização por períodos de incapacidade temporária sofridos pelo A. após Outubro de 2017, calculada sobre o valor da retribuição anual de € 2.804,44.
Custas a cargo da R. Empregadora, na proporção da respectiva condenação.
Valor da acção: € 13.906,58 (treze mil, novecentos e seis euros e cinquenta e oito cêntimos).
*
Registe e notifique, sendo a R. empregadora, ainda, para demonstrar nos autos, o pagamento dos valores determinados a título de indemnização por incapacidades temporárias.
*
Oportunamente, proceda ao cálculo, e entrega, do capital de remição, para ambas as RR. “ - fim de transcrição.
As notificações da sentença foram expedidas em 9 de Julho de 2019.[16]
Em  1 de Agosto de 2019,  a Ré empregadora DDD – recorreu.[17][18]
Concluiu que:

1. É verdade que o Recorrido no exercício das suas funções de CRT, na data do acidente de trabalho, efectuava tarefas de distribuição de correio e conduzia viaturas, automóvel ou motociclo, da propriedade dos DDD ou da propriedade do sinistrado, nos termos em vigor, sendo que, 2. Na situação de utilização de viatura/motociclo do Recorrido, a Recorrente, entidade patronal do Recorrido, nos termos do Acordo de Empresa em vigor, no período em referência, AE DDD
2015, publicado no BTE n.º 8, de 28 de fevereiro de 2015, subscrito pelo Sindicato …, no qual o mesmo está filiado, disponibiliza viaturas ou motociclos aos seus trabalhadores para a execução de deslocações em serviço, nomeadamente na distribuição do correio, pagando-lhe o abono de condução por cada dia de condução viaturas/motociclo da empresa., processado no Boletim de vencimento com o código 423, ou autoriza que a deslocação em serviço seja efectuada em viatura ou motociclo próprio do trabalhador procedendo ao pagamento da compensação de despesas suportadas com a utilização de meio de transporte próprio, nos termos do AE DDD, processado no boletim de vencimento, atualmente mencionado com o código Rubrica 534, 535 e designação MotC/EmpC/U61- 90Km, Código/ Rubrica MotC/EmpC/U46-60Km/MotC/EmpC/U>90Km identificando a quantidade de Km efetuados em trabalho e o pagamento por Km percorrido.
3. No período em referência, o trabalhador ora se deslocava em serviço com motociclo próprio ou utilizava viatura da Recorrente, conforme resulta dos pagamentos efetuados ao trabalhador mencionados nos boletins de vencimento, nos quais constam os pagamentos processados com o Código 423 que identifica pagamentos a título Subsidio de Condução Auto e o código 534, 535 que identifica pagamentos efetuados a título de compensações de despesas deslocação em serviço, com utilização de motociclo propriedade do trabalhador, ora sinistrado.
4. Nos termos da Cláusula 79ª, do AEDD015, os trabalhadores que exerçam as tarefas de recolha, tratamento transporte ou distribuição de correio, que impliquem a condução de veículos automóveis ou motociclos disponibilizados pelos DDD têm direito a um subsidio por cada dia de condução, no montante previsto na al. a) do nº3 do Anexo V, do AEDDD 2015, no montante de 2,16€/dia,
5. Quando os trabalhadores, por necessidade de serviço e anuência prévia da Empresa. DDD, se deslocam em transporte próprio, a DDD, ora Recorrente, paga, nos termos da Clª 80ª do DDD 2015, por Quilometro percorrido, consoante se utilize automóvel ou motociclo, respetivamente 25% e 12% do preço médio do litro da gasolina, para pagamento das despesas suportadas pelo trabalhador com a deslocação em serviço, nomeadamente combustível, desgaste da viatura, reparações, substituição, encargos com acidentes e danos na viatura, seguros, licenças e todas as outras inerentes ao uso da viatura utilizada, que, face aos cálculos efetuados pela entidade patronal, com acordo dos Sindicatos subscritores do AEDDD, será o montante necessário para o reembolso das despesas suportadas pelo trabalhador por utilização da sua viatura em deslocações em serviço, diferenciando o pagamento pelo tipo de viatura, uma vez que a despesa de utilização de motociclo é inferior à de utilização de automóvel.
6. Acresce dizer que o montante pago por utilização em deslocações em serviço, com utilização de viatura própria é o montante equiparado ao pago pelo Estado aos funcionários públicos, que não tem natureza de retribuição e, como tal, não revestindo a natureza de pagamento pela prestação de trabalho, mas apenas compensação de despesas de deslocação em serviço, pelo que não pode revestir o conceito de retribuição, nem o trabalhador o pode considerar com rendimento disponível para a sua vida, mas apenas reembolso de despesas, suportadas pelo trabalhador, com a utilização da viatura em deslocações em trabalho, não podendo assim integrar o conceito de retribuição, nem calculo para efeito de apuramento do calculo de indemnização por ITA, ITP ou IPP.
7. Na utilização de viatura própria em deslocações em serviço, o trabalhador suporta a todas as despesas inerentes à deslocação com a sua viatura, desde a aquisição da mesma, aos custos de manutenção, reparações substituição de peças, reparações ou aquisição de nova viatura em consequência de acidentes de viação, furto, seguros, combustível etc., não podendo configurar tal pagamento uma retribuição, nem pode o trabalhador considera-lo e ter tal pagamento como parte do seu orçamento familiar, uma vez que se trata simplesmente de  compensação pelas despesas suportadas e uso e desgaste da viatura e todas as despesas inerentes a manutenção da mesma. “ - fim de transcrição.
Assim, sustenta a  procedência do recurso , com a consequente  revogação  da sentença recorrida.
Não se vislumbra que tenham sido apresentadas contra alegações.
O recurso foi recebido.[19]
Em 3 de Outubro de 2019, [20]na Relação foi  proferida decisão singular pelo relator  que logrou o seguintes dispositivo:
“Em face do exposto, julga-se o recurso improcedente.
Custas pela recorrente.
Notifique.
DN (processado e revisto pelo relator). “ – fim de transcrição.
As notificações dessa decisão foram expedidas em 3 de Outubro de 2019.[21]
Em 17 de  Outubro  de 2019[22], os DDD reclamou.
Fê-lo nos seguintes  termos:[23]

DDD., Sociedade Aberta, Recorrente nos autos à margem referenciados, notificada da Decisão Singular proferida a fls… vem, nos termos e para os efeitos dos artigos 643º, n.º 4 e 652º, nº 3 do C.P.C., requerer que sobre a matéria da Decisão Singular recaia Acórdão, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. Inconformada com a decisão de 1ª Instância que considerou que o abono km era parte integrante da retribuição para efeitos de acidente de trabalho veio a Ré, aqui Recorrente.
2. O referido Recurso culminou na Decisão Singular – sobre a qual se requer agora que recaia Acórdão – que veio manter a sentença recorrida.
3. Ora, não pode a aqui Recorrente deixar de discordar da Decisão Singular proferida.
Senão vejamos,
4. O abono MotC/EmpC/U61-90Km, MotC/EmpC/U46-60Km, MotC/EmpC/U >90Km NÃO deveria ser incluído na retribuição do Autor, ora Recorrido, para efeitos de apuramento de retribuição anual recebida.
5. É verdade que o Recorrido no exercício das suas funções de CRT, na data do acidente de trabalho, efectuava tarefas de distribuição de correio e conduzia viaturas, automóvel ou motociclo, da propriedade dos DDD ou da propriedade do sinistrado, nos termos em vigor, sendo que,
6. Na situação de utilização de viatura/motociclo próprio do Recorrido, a Recorrente, entidade patronal do Recorrido, nos termos do Acordo de Empresa em vigor, no período em referência, disponibiliza viaturas ou motociclos aos seus trabalhadores para a execução de deslocações em serviço, nomeadamente na distribuição do correio, pagando-lhe o abono de condução por cada dia de condução viaturas/motociclo da empresa, processado no Boletim de vencimento com o código 423,
7. ou autoriza que a deslocação em serviço seja efectuada em viatura ou motociclo próprio do trabalhador procedendo ao pagamento da compensação de despesas suportadas com a utilização de meio de transporte próprio, nos termos do AEDDD, processado no boletim de vencimento, atualmente mencionado com o código Rubrica 534,535 e designação MotC/EmpC/U61-90Km, Código/ Rubrica
MotC/EmpC/U46-60Km, MotC/EmpC/U >90Km identificando a quantidade de Km efetuados em trabalho e o pagamento por Km percorrido,
8. sendo que, no período em referência, o trabalhador ora se deslocava em serviço com motociclo próprio ou utilizava viatura da Recorrente, conforme resulta dos pagamentos efetuados ao trabalhador mencionados nos boletins de vencimento, nos quais constam os pagamentos processados com o Código 423 que identifica pagamentos a título Subsidio de Condução Auto e o código 534, 535 que identifica pagamentos efetuados a título de compensações de despesas deslocação em  serviço, com utilização de motociclo propriedade do trabalhador, ora sinistrado.
9. Nos termos da Cláusula 79ª, do AEDDD2015, os trabalhadores que exerçam as tarefas de recolha, tratamento transporte ou distribuição de correio, que impliquem a condução de veículos automóveis ou motociclos disponibilizados pelos DDD têm direito a um subsidio por cada dia de condução, no montante previsto na al. a) do nº3 do Anexo V, do AEDDD 2015, no montante de 2,16€/dia, ou,
10. Os condutores de Velocípedes disponibilizados pelos DDD, que desempenhem as mesmas tarefas anteriormente designadas, tem direito a um subsídio por cada dia de condução, no montante de 1,18€/dia.
11. Quando os trabalhadores, por necessidade de serviço e anuência prévia da Empresa. DDD se deslocam em transporte próprio, a DDD, ora Recorrente, paga, nos termos da Clª 80ª do DDD 2015, por Quilometro percorrido, consoante se utilize automóvel ou motociclo, respetivamente 25% e 12% do preço médio do litro da gasolina, para pagamento das despesas suportadas pelo trabalhador com a deslocação em serviço, nomeadamente combustível, desgaste da viatura, reparações, substituição, encargos com acidentes e danos na viatura, seguros, licenças e todas as outras inerentes ao uso da viatura utilizada, que, face aos cálculos efetuados pela entidade patronal, com acordo dos Sindicatos subscritores do AE DDD, será o montante necessário para o reembolso das despesas suportadas pelo trabalhador por utilização da sua viatura em deslocações em serviço, diferenciando o pagamento pelo tipo de viatura, uma vez que a despesa de utilização de motociclo é inferior à de utilização de automóvel.
12. Acresce dizer que o montante pago por utilização em deslocações em serviço, com utilização de viatura própria é o montante equiparado ao pago pelo Estado aos funcionários públicos, que não tem natureza de retribuição e, como tal, não revestindo a natureza de pagamento pela prestação de trabalho, mas apenas compensação de despesas de deslocação em serviço, pelo que não pode revestir o conceito de retribuição, nem o trabalhador o pode considerar com rendimento disponível para a sua vida, mas apenas reembolso de despesas, suportadas pelo trabalhador, com a utilização da viatura em deslocações em trabalho, não podendo assim integrar o conceito de retribuição, nem calculo para efeito de apuramento do calculo de indemnização por ITA, ITP ou IPP.
13. Diferente é a situação de pagamento de compensação por condução de viaturas da entidade patronal, porquanto não estamos perante reembolso de despesas suportada pelo trabalhador, porque não há acréscimo de custos para o trabalhador.
14. Na utilização de viatura própria em deslocações em serviço, o trabalhador suporta a todas as despesas inerentes à deslocação com a sua viatura, desde a aquisição da mesma, aos custos de manutenção, reparações substituição de peças, reparações ou aquisição de nova viatura em consequência de acidentes de viação, furto, seguros, combustível etc., não podendo configurar tal pagamento uma retribuição, nem pode o trabalhador considera-lo e ter tal pagamento como parte do seu orçamento familiar, uma vez que se trata simplesmente de compensação pelas despesas suportadas e uso e desgaste da viatura e todas as despesas inerentes a manutenção da mesma.
15. O trabalhador, ora Recorrido, tinha a opção de utilização de viatura/motociclo próprio nas deslocações, mediante pagamento das despesas efetuadas, nos termos do AEDDD ou utilizar viatura dos DDD nas deslocações em serviço.
16. Pelo que, não restam dúvidas, de que aqueles montantes não integram o conceito de retribuição, porquanto se trata de compensação por despesas suportadas na utilização de viatura no transporte em serviço, mesmo que se verifique alguma regularidade no pagamento, como tem sido considerado pelas Doutas sentenças e acórdãos proferidos por este Venerando Tribunal por se tratar de compensação das despesas com transporte.
17. Assim, e como tem sido entendimento uniforme deste Venerando Tribunal – de há uns anos para cá – o abono km/de viagem e marcha moto/ MotC/EmpC/U61-90Km, MotC/EmpC/U46-60Km, MotC/EmpC/U >90Km – não poderá integrar o conceito de retribuição pelo que deverá, nesta parte, ser revogada a sentença proferida.
18. Em suma, e atendendo a que não estamos perante um Despacho de mero expediente, requer-se para os devidos efeitos que sobre a matéria da presente Decisão Singular recaia Acórdão. “ – fim de transcrição.
Tal requerimento foi notificado ao mandatário da contra parte – artigo 221º do NCPC.
Foram colhidos os vistos.
Nada obsta ao conhecimento.
*****
A decisão singular -  na parte que para aqui mais releva  -  teve o seguinte teor:

Eís a matéria dada como provada em 1ª instância ( que não se mostra impugnada):
1. O A. foi admitido ao serviço da R., “DDD.” para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, prestar o seu trabalho de carteiro, o que fazia no dia 10 de Janeiro de 2017 (A).
2. No dia 10 de Janeiro de 2017, pelas 9:30 horas, quando o A. se deslocava na via pública, em (…),  para a distribuição do correio, a conduzir um veículo motorizado de duas rodas, caiu com o mesmo na via pública (B);
3. Em consequência da queda referida em 2., o A. sofreu traumatismo do joelho direito (C);
4. No âmbito dos presentes autos, o A. foi submetido a exame médico que lhe verificou, em consequência do acidente referido em 2., e traumatismo referido em 3, as lesões que constam do relatório de fls. 48 a 52, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (D);
5. A Empregadora tinha a responsabilidade emergente de acidente de trabalho reportado ao A. transferida para as RR. Seguradoras, em função da retribuição anual no montante de € 17.718, 38 (dezassete mil setecentos e dezoito euros e trinta e oito cêntimos) (E);
6. As Seguradoras, em consequência do acidente referido em 2. prestaram assistência médica ao A., e deram-lhe alta, em 27 de Outubro de 2017, com a IPP de 3%, a partir dessa data (F);
7. Desde 12 de Janeiro de 2018, que a R. Seguradora voltou a prestar tratamentos médicos ao A., estando o mesmo, desde essa data e até ao dia de hoje, em situação de incapacidade temporária (G);
8. A Seguradora, desde Janeiro de 2018, que está a pagar ao A. o valor correspondente à indemnização pela incapacidade temporária que lhe atribuiu (H);
9. Em consequência do acidente referido em 2. e lesões referidas em 3, o A. ficou com sequelas, que consolidaram em 27.10.2017 e lhe determinaram a IPP de 5,92%, desde essa data (Resp. factos 1, 2 e 3 BI);
10. Em sede de Tentativa de Conciliação, as partes determinaram que a título de períodos por incapacidade temporária, a R. Empregadora não pagou ao A. o valor correspondente a € 1.576,28 e que o A. despendeu € 18,00 com despesas de transportes (auto de fls. 73-75);
11. Em Janeiro de 2017, a R. DDD pagou ao A. a quantia de € 889,90, a título de “vencimento base”; € 152,85 de “diuturnidades”; € 198,22, de “subsídio de refeição”; € 14,64 de “trabalho nocturno”, € 11,02 de “abona para falhas”; € 10,07 de “complemento especial de distribuição”; € 13,11 “diuturnidade especial” e € 444,39 de “motS/EmpC/U”.
O valor reportado ao subsídio de alimentação, era calculado, todos os meses com base em € 9,01 por dia de trabalho e o “motS/EmpC/U” era calculado pela multiplicação do valor de € 0,23 ou 0,24 por cada km, mensalmente percorrido pelo A. e pago no mês seguinte.
Desde Janeiro de 2016 a Dezembro de 2016, a R. pagou ao A. os valores mensais reportados a cada uma das rubricas referidas, tendo pago, sob a rúbrica “MotS/EmC/U”, a quantia global de € 5.360,32; sob a rúbrica de “subsídio de refeição”, a quantia global de € 2.252,50; sob a rúbrica “trabalho nocturno”, a quantia global de € 204,43; sob a rúbrica “abono para falhas”, a quantia global de € 131,66; sob a rúbrica “complemento de distribuição”, a quantia global de € 130,31 (Resp. factos 4, 5 e 6 BI);
12. Em 2016, a título de trabalho suplementar, a RDDD pagou ao A. € 7,62, em janeiro; € 7,71 em Abril; € 217,28 em Junho e € 81,91 em Julho (Resp. facto 8 BI);
13. O A. suporta as despesas com a deslocação e manutenção da mota que utiliza para a distribuição do correio, recebendo da R. o valor ao Km efectuado, nos termos constantes em 10 (Resp. facto10 BI).
*****
É sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 635º e 639º ambos do Novo CPC [24]  ex vi do artigo 87º do CPT aplicável[25])[26].
In casu, mostra-se interposto um único recurso pela Ré DDD,.
E afigura-se-nos que nele a recorrente  suscita  uma única questão, a qual  consiste em saber  se o valor  mensal pago pela Recorrente ao pelo Autor  a título de “motS/EmpC/U  ( que era calculado pela multiplicação do valor de € 0,23 ou 0,24 por cada km, mensalmente percorrido pelo A. e pago no mês seguinte)   deve ou não ser considerado como retribuição  para efeitos do apuramento da indemnização devida pelo incontroverso  acidente de trabalho em causa nos autos.
Sobre o assunto a sentença recorrida discreteou nos seguintes moldes (na parte para aqui mais relevante) :

III – Fundamentação de Direito
Do acidente de trabalho e da retribuição auferida pelo A. e a atender para determinação do âmbito da reparação dos danos decorrentes do mesmo.
(…..)
As partes aceitaram já no âmbito da Tentativa de Conciliação, a fls. 73-75, que o acidente reportado nos autos, e demonstrado sob os n.ºs 2, 3 e 9 dos factos provados, consubstancia um acidente de trabalho, tendo, assim, o A. direito à reparação estabelecida na citada NLAT, reportadas às sequelas dele derivadas e pelo montante de retribuição que o A. auferia à data da ocorrência do mesmo.
É neste âmbito, que as partes divergem, sustentando o A. que o valor que auferia, para além daquele que a R. Empregadora transferiu para  a R. Seguradora, no âmbito do contrato entre elas celebrado por acidentes de trabalho, também constituem retribuição e, por isso, tem de ser englobado, para determinação da reparação dos danos que sofreu com o acidente de trabalho.
Vejamos:
Atentos os factos provados nos presentes autos, no que releva para determinação do valor a considerar como retribuição do A., verifica-se que se encontra demonstrado, sob os n.ºs 11 a 13, que:
- em Janeiro de 2017, a R. DDD pagou ao A. a quantia de € 889,90, a título de “vencimento base”; € 152,85 de “diuturnidades”; € 198,22, de “subsídio de refeição”; € 14,64 de “trabalho nocturno”, € 11,02 de “abona para falhas”; € 10,07 de “complemento especial de distribuição”; € 13,11 “diuturnidade especial” e € 444,39 de “motS/EmpC/U”;
- o valor reportado ao subsídio de alimentação, era calculado, todos os meses com base em € 9,01 por dia de trabalho e o “motS/EmpC/U” era calculado pela multiplicação do valor de € 0,23 ou 0,24 por cada km, mensalmente percorrido pelo A. e pago no mês seguinte;
- de Janeiro a Dezembro de 2016, a R. pagou ao A. os valores mensais reportados a cada uma dessas rubricas referidas, tendo pago, sob a rúbrica “MotS/EmC/U”, a quantia global de € 5.360,32; sob a rúbrica de “subsídio de refeição”, a quantia global de € 2.252,50; sob a rúbrica “trabalho nocturno”, a quantia global de € 204,43; sob a rúbrica “abono para falhas”, a quantia global de € 131,66; sob a rúbrica “complemento de distribuição”, a quantia global de € 130,31; e
- o A. suporta as despesas com deslocação e manutenção da mota que utiliza para a distribuição do correio, recebendo da R. o valor ao Km efectuado no mês.
Dispõe o art. 23.º, n.º 2 da LAT, que o direito à reparação compreende prestações em espécie e prestações em dinheiro, correspondentes a indemnizações, pensões, prestações e subsídios na mesma lei estabelecidos.
Para cálculo das prestações em dinheiro, é atendida à retribuição auferida pelo sinistrado, sendo, aliás, por referência a essa retribuição que é efectuado o cálculo das prestações a determinar, em função das variadas situações de incapacidade atribuída, conforme art.s 47.º a 55.º da LAT, sendo a responsabilidade da seguradora aferida pelo montante da retribuição à mesma declarada, conforme art. 79.º do mesmo diploma legal.
Sobre o conceito de retribuição a atender no âmbito do regime da LAT, para cálculo e pagamento das prestações na mesma determinadas, estabelece, expressamente, o art. 71.º que:
«1. A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, á data do acidente.
2. Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com caracter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
3. Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
(…)».
Verifica-se, assim, que o próprio legislador consignou no seio do regime da LAT norma concreta e específica para os valores a atender para o cálculo das prestações estabelecidas nesse diploma legal, apresentando-se, assim, a mesma, por reporte ao disposto em termos gerais no art.º 258.º e 260.º do CT, como especial.
Efectivamente, no âmbito da LAT, para se atender aos valores pagos como retribuição, basta que os mesmos sejam pagos por causa do trabalho e de forma regular, não se destinando a compensar o trabalhador/Sinistrado por «custos aleatórios».
Conforme se exarou na fundamentação do aresto da 4.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 31.10.2018, no proc. n.º 395/15.5, disponível in www.dgsi.pt, reafirmando posição desse mais alto Tribunal, expressa nos acórdãos datados de 17.03.2010 e de 13.04.2011, em face do regime legal constante do art.º 71.º, n.º 1 a 3 da LAT (anteriormente art.º 26.º da lei n.º 100/97):
«Analisados estes dispositivos, decorre dos mesmos que o conceito de retribuição assumido como elemento de base do cálculo da reparação das consequências do acidente não coincide com o conceito de retribuição que emerge dos artigos 258.º e ss. do Código do Trabalho.
Para os efeitos daquele artigo 71.º, são retribuição «todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
Não se faz apelo à contrapartida da efetiva prestação de trabalho, estando-se antes perante uma noção mais ampla onde cabem todas as prestações recebidas pelo sinistrado que não se destinem a compensar custos aleatórios.
Outro dos elementos que permitem incluir estas prestações na base de cálculo das reparações é o conceito de regularidade.
O conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado.
Importa que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado.»
Atentos os factos provados nos presentes autos, verifica-se que, para além da retribuição que a R. empregadora reportou à R. seguradora, como sendo a auferida pelo A. (facto provado sob o n.º 5), a R. pagava ao A., para além das demais prestações pecuniárias, concretamente referidas no facto provado sob o n.º 10, um valor mensal correspondente ao n.º de Km pelo mesmo percorrido com a moto para efectuar a distribuição do correio.
O pagamento desse montante não corresponde a qualquer compensação do A. de «custos aleatórios» porquanto o A. para efectuar a sua prestação de trabalho usava, normalmente, a referida moto, e suportava, necessariamente, as despesas de manutenção e de deslocação da mesma.
Esse valor era pago pela R., regularmente ao A. e por causa de o mesmo utilizar a referida moto nas deslocações que precisava de efectuar para prestar o seu trabalho.
Deste modo, o valor pago pela R. a esse título também tem de ser atendido, no caso, para a indemnização por incapacidade temporária e para a determinação da pensão devida ao A. pela IPP que nos autos lhe foi fixada, nos termos do disposto no art. 71.º da LAT.
Atentos os factos provados, incluindo essa prestação pecuniária, verifica-se que o A. nos doze meses anterior à data do acidente recebeu da R. o montante anual de € 20.523,82, sendo que a R. transferiu para a Seguradora, o montante anual de € 17.718,38, (factos n.º 5 e 11), o que corresponde a um valor diferencial retributivo de € 2.804,44.
Nos termos do disposto no art. 7.º da LAT, o empregador é o responsável pela reparação de danos decorrentes para os seus trabalhadores emergentes de acidentes de trabalho, nos termos estabelecidos nesse diploma legal, sendo sua obrigação proceder à transferência dessa responsabilidade para entidades legalmente autorizadas a realizar esses seguros, conforme art. 79.º do mesmo diploma legal.
Nos termos do disposto nos n.º 4 e 5 do citado art.º 79.º LAT, quando a retribuição declarada para efeito do prémio do seguro for inferior à real, a seguradora só é responsável em relação àquela retribuição, e o empregador responde pela diferença relativa às indemnizações por incapacidade temporária e pensões devidas, bem como pelas despesas efectuadas com hospitalização e assistência clínica, na respectiva proporção.
Ora, no caso dos presentes autos, está demonstrado que em consequência do acidente e das lesões e sequelas dele derivadas, o A. sofreu um período de incapacidades temporárias até 27.10.2017, estando, a esse título, em dívida pela Empregadora, a quantia de € 1.576,28 e ficou com uma IPP de 5,92%, desde o dia 28 de Outubro de 2017 (factos provados sob os n.ºs 9 e 10).
A Seguradora já assumiu perante o A. o pagamento das prestações devidas, por reporte à retribuição que à mesma foi declarada pela R. empregadora, encontrando-se, quanto a ela, determinada a respectiva responsabilidade, mediante sentença proferida em sede de audiência de julgamento.
Deste modo, cumpre agora, apenas, determinar a responsabilidade proporcional da R. Empregadora.
Em face da retribuição no montante do valor diferencial determinado, de € 2.804,44 e da IPP determinada de 5,92%, nos termos disposto nos art.s 8.º, 23.º, 39.º, 47.º, 48.º, n.º 3, al. c) e 75.º, todos da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro (LAT), é devido ao A., pela Empregadora, o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia no montante de € 116,22, desde o dia 28 de Outubro de 2017.
Em relação à indemnização a título de incapacidades temporárias até 27.10.2017, está o valor já definido, no montante de € 1.576,28, desde 19.04.2018 (data da Tentativa de Conciliação), pelo que é devido, até essa data, o respectivo valor, acrescido dos juros de mora.
Como o A. já obteve assistência médica após essa data e sofreu períodos de incapacidade temporária, tem, ainda a haver da R. Empregadora, o valor correspondente, na proporção do determinado montante retributivo não transferido para a Seguradora, supra determinado.” – fim de transcrição.
Será assim ?
Segundo o artigo 71º da LAT ( Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro) :
Cálculo
1 - A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente.
 2 - Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
 3 - Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
 4 - Se a retribuição correspondente ao dia do acidente for diferente da retribuição normal, esta é calculada pela média dos dias de trabalho e a respectiva retribuição auferida pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente.
 5 - Na falta dos elementos indicados nos números anteriores, o cálculo faz-se segundo o prudente arbítrio do juiz, tendo em atenção a natureza dos serviços prestados, a categoria profissional do sinistrado e os usos.
 6 - A retribuição correspondente ao dia do acidente é paga pelo empregador.
 7 - Se o sinistrado for praticante, aprendiz ou estagiá-rio, ou nas demais situações que devam considerar-se de formação profissional, a indemnização é calculada com base na retribuição anual média ilíquida de um trabalhador da mesma empresa ou empresa similar e que exerça actividade correspondente à formação, aprendizagem ou estágio.
 8 - O disposto nos n.os 4 e 5 é aplicável ao trabalho não regular e ao trabalhador a tempo parcial vinculado a mais de um empregador.
 9 - O cálculo das prestações para trabalhadores a tempo parcial tem como base a retribuição que aufeririam se trabalhassem a tempo inteiro.
 10 - A ausência ao trabalho para efectuar quaisquer exames com o fim de caracterizar o acidente ou a doença, ou para o seu tratamento, ou ainda para a aquisição, substituição ou arranjo de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais, não determina perda de retribuição.
 11 - Em nenhum caso a retribuição pode ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. 
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Como interpretar o nº 2º desta norma ?
Segundo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça , de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1 , Relator  Conselheiro António  Leones Dantas ,acessível em www.dgsi.pt:[27]
“ Resulta do artigo 71.º, n.º 1 da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, que «a indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente» e decorre do n.º 2 do mesmo artigo que «entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios» e do n.º 3 do mesmo dispositivo decorre que «entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade».
Analisados estes dispositivos, decorre dos mesmos que o conceito de retribuição assumido como elemento de base do cálculo da reparação das consequências do acidente não coincide com o conceito de retribuição que emerge dos artigos 258.º e ss. do Código do Trabalho.
Para os efeitos daquele artigo 71.º, são retribuição «todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
Não se faz apelo à contrapartida da efetiva prestação de trabalho, estando-se antes perante uma noção mais ampla onde cabem todas as prestações recebidas pelo sinistrado que não se destinem a compensar custos aleatórios.
Outro dos elementos que permitem incluir estas prestações na base de cálculo das reparações é o conceito de regularidade.
O conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado.
Importa que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado.
Carece, deste modo, de sentido o apelo que a decisão recorrida faz ao critério subjacente ao acórdão desta Secção proferido em 10 de outubro de 2015, consagrado no processo n.º 4156/10.6TTLSB.L1.S1[9].
Neste acórdão estava apenas em causa a consideração da natureza retributiva de uma específica prestação para saber da integração da mesma no cálculo do valor do subsídio de férias e da retribuição de férias.
A jurisprudência aí fixada nada tem a ver com o reflexo da perda da capacidade de ganho do sinistrado e com a sua projeção em termos de rendimentos futuros.
Com efeito, apesar de proferida sobre a norma do artigo 26.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, continua inteiramente válida a jurisprudência fixada nesta Secção no acórdão invocado na sentença proferida na 1.ª instância[10], onde a este propósito se referiu o seguinte: 
«Por seu turno, o n.º 3 do falado artigo 26.º prescreve deste modo:
“Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Se este normativo começa por apelar ao critério geral de retribuição – que já alude, ele próprio, à regularidade da prestação – para depois adicionar aquelas prestações regulares que não se destinem a compensar custos aleatórios, é forçoso reconhecer que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações.
No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.»
E mais recentemente, embora tendo por base a mesma Lei dos Acidentes de Trabalho, no acórdão proferido por esta Secção em 13/04/2011, proferido no processo n.º 216/07.9TTCBR.C1.S1 de que foi extraído, o seguinte sumário: «I- Conforme resulta do nº 3 do artigo 26º da Lei 100/97 de 13 de Setembro, constitui retribuição, para efeito de acidentes de trabalho, tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.»[11]
Neste contexto, o subsídio de prevenção auferido pelo sinistrado durante 7 meses no ano anterior ao do acidente tem natureza retributiva para os efeitos dos n.ºs 1, 2, e 3 do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009 e, como tal, deve ser tomado em consideração no cálculo das pensões e indemnizações ali previstas.  “ – fim de transcrição.[28]
Concorda-se integralmente com tal raciocínio que aqui se perfilhará  integralmente.
Aliás, no mesmo  sentido aponta  recente aresto desta Relação , de 11-7-2019 , proferido no processo nº 2151/15.8T8FAR.L1-4  , Relator  José  Feteira acessível em www.dgsi.pt [29] [30]  :
“porquanto, se estipula no seu art. 71º n.º 1 que «[a] indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente».
Ora, nos termos do n.º 2 deste preceito legal, «[e]ntende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios» e prevê-se no n.º 3 do mesmo dispositivo legal que, «[e]ntende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade».
Por outro lado e no que aqui releva, estipula-se no art. 258º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12-02, que:
«1- Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2- A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas, feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.
3- Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.».
Destaca o Prof. Bernardo Lobo Xavier[4] na noção de retribuição que emerge deste normativo legal, quatro elementos principais que dela são caracterizadores:
1º - «Prestações regulares e periódicas», na medida em que, por um lado não são arbitrárias mas seguem uma regra permanente ou constante e, por outro lado, são relativas a períodos certos (ou aproximadamente certos) no tempo, de modo a integrarem-se na periodicidade e na repetência própria das relações contratuais de trabalho e nas necessidades recíprocas que o contrato de trabalho se destina a servir.
2º - «…em dinheiro ou em espécie…», traduzida num conjunto de valores patrimoniais – pecuniários ou não, mas, ainda assim avaliáveis em dinheiro – não constituindo retribuição outras atribuições de ordem não patrimonial.
3º - «…a que… o trabalhador tem direito…» por título contratual e normativo, correspondendo a um dever da entidade empregadora, o que, em regra, faz excluir as gratificações e liberalidades, para além de excluir as importâncias atribuídas por terceiros.
4º - «…como contrapartida do trabalho», já que é o trabalho prestado a causa determinante da retribuição, sendo aquele e esta prestações de carácter correspetivo e sinalagmático «retribui-se quem trabalha, trabalha-se porque se é retribuído.»
Estamos perante a chamada retribuição em sentido próprio ou técnico-jurídico que surge dotada das características de obrigatoriedade da prestação em dinheiro ou em espécie feita pelo empregador ao trabalhador, obrigatoriedade decorrente da lei, de uma convenção ou então dos usos (da profissão ou da empresa), da correspetividade ou contrapartida dessa prestação face à disponibilidade de trabalho oferecida pelo trabalhador e da regularidade e periodicidade com que a prestação é efetuada.
Todavia, do confronto dos mencionados dispositivos legais (art. 71º da LAT e art. 258º do CT), verifica-se que o conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, não coincide plenamente com o conceito de retribuição que decorre da aludida norma do Código do Trabalho. Com efeito, aquele surge com maior abrangência ou amplitude do que este, porquanto, para além de integrar as prestações recebidas pelo trabalhador (sinistrado), enquanto correspetivo ou contrapartida da sua prestação de trabalho ao serviço do empregador, nele se integram também todas as prestações recebidas por aquele da parte deste com carácter de regularidade, desde que não se destinem a compensá-lo por custos aleatórios (cfr. art. 71º n.º 2 da LAT).
É certo que no n.º 3 do art. 258º do Código do Trabalho se estabelece uma presunção de retribuição relativamente toda e qualquer prestação – em dinheiro ou em espécie – feita pelo empregador ao trabalhador. Contudo, estamos perante uma presunção “iuris tantum” que, como tal, pode ser ilidida, bastando que o empregador demonstre factos reveladores da não obrigatoriedade do seu pagamento ao trabalhador, ou então que a mesma não constitui uma contrapartida da prestação de trabalho, ou ainda, que se não verifica a regularidade ou a periodicidade do seu pagamento ao trabalhador.
Constata-se, portanto, que o elemento caracterizador do conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, é o da regularidade do pagamento de uma determinada prestação pelo empregador ao trabalhador sinistrado, sendo que, como se refere, a dado passo, no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1[5], «[o] conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado».
Contudo, como, a nosso ver, bem se refere neste douto Aresto, «[i]mporta que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado» (realce e sublinhado nosso), razão pela qual, no entendimento jurisprudencial ali expresso, careça de sentido o apelo ao critério de que para que uma prestação seja considerada como integrante da retribuição (isto, a nosso ver, para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho), seja necessário que o seu pagamento ocorra em todos os meses de atividade do trabalhador, ou seja, onze meses por ano, critério levado em consideração, designadamente, nos doutos Acórdãos proferidos, também pelo Supremo Tribunal de Justiça, respetivamente, em 16/12/2010 no processo n.º 2065/07.5TTLSB.L1.S1 e em 10/10/2015  no processo n.º 4156/10.6TTLSB.L1.S1[6], sendo que neles o que estava em causa era a natureza retributiva de específicas prestações, de forma a saber-se se deveriam ser integradas no cálculo do valor da retribuição por férias, por subsídio de férias e por subsídio de Natal, nada tendo a ver a jurisprudência neles estabelecida com o reflexo da perda da capacidade de ganho do sinistrado e com a sua projeção em termos de rendimentos futuros, como também se refere no douto Aresto do STJ que estamos a acompanhar.
Daí que, a nosso ver, seja perfeitamente compreensível a maior abrangência ou amplitude dada pelo legislador, ao longo dos anos, ao conceito de retribuição nos diplomas que têm regulado o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, face ao conceito de retribuição ínsito nas normas que, ao longo dos anos, vêm regulando o contrato de trabalho.
Na verdade, acrescenta-se no mencionado Acórdão do STJ de 31/10/2018 que, «apesar de proferida sobre a norma do artigo 26.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, continua inteiramente válida a jurisprudência fixada nesta Secção no acórdão invocado na sentença proferida na 1.ª instância[10][7], onde a este propósito se referiu o seguinte:
«Por seu turno, o n.º 3 do falado artigo 26.º prescreve deste modo:
“Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Se este normativo começa por apelar ao critério geral de retribuição – que já alude, ele próprio, à regularidade da prestação – para depois adicionar aquelas prestações regulares que não se destinem a compensar custos aleatórios, é forçoso reconhecer que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações.
No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.», concluindo, depois, que «[n]este contexto, o subsídio de prevenção auferido pelo sinistrado durante 7 meses no ano anterior ao do acidente tem natureza retributiva para os efeitos dos n.ºs 1, 2, e 3 do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009 e, como tal, deve ser tomado em consideração no cálculo das pensões e indemnizações ali previstas». “ – fim de transcrição, sendo o negrito nosso.
Saliente-se  ainda que , tal como se refere em aresto da Relação de Lisboa, de 9-5-2018, proferido no âmbito do processo nº 743/16.7T8TVD.L1 -4, acessível em www.dgsi.pt[31]  é pacífica a jurisprudência “ no sentido de que cabe ao empregador o ónus de provar a natureza compensatória de custos aleatórios dos valores pagos[9], bem como de que o que é determinante para aferir a natureza das atribuições patrimoniais não é a sua denominação ou o modo como o empregador as classifica nos recibos emitidos, mas o fim a que se destinam[10].  “ – fim de transcrição.[32]
Ora , não se nos afigura que a recorrente o tenha logrado fazer no caso concreto.
E  retornando a ele , em nosso entender , atenta a matéria provada em  5 e 10  a 13 (5. A Empregadora tinha a responsabilidade emergente de acidente de trabalho reportado ao A. transferida para as RR. Seguradoras, em função da retribuição anual no montante de € 17.718, 38 (dezassete mil setecentos e dezoito euros e trinta e oito cêntimos) (E);
10. Em sede de Tentativa de Conciliação, as partes determinaram que a título de períodos por incapacidade temporária, a R. Empregadora não pagou ao A. o valor correspondente a € 1.576,28 e que o A. despendeu € 18,00 com despesas de transportes (auto de fls. 73-75);
11. Em Janeiro de 2017, a R. DDD pagou ao A. a quantia de € 889,90, a título de “vencimento base”; € 152,85 de “diuturnidades”; € 198,22, de “subsídio de refeição”; € 14,64 de “trabalho nocturno”, € 11,02 de “abona para falhas”; € 10,07 de “complemento especial de distribuição”; € 13,11 “diuturnidade especial” e € 444,39 de “motS/EmpC/U”.
O valor reportado ao subsídio de alimentação, era calculado, todos os meses com base em € 9,01 por dia de trabalho e o “motS/EmpC/U” era calculado pela multiplicação do valor de € 0,23 ou 0,24 por cada km, mensalmente percorrido pelo A. e pago no mês seguinte.
Desde Janeiro de 2016 a Dezembro de 2016, a R. pagou ao A. os valores mensais reportados a cada uma das rubricas referidas, tendo pago, sob a rúbrica “MotS/EmC/U”, a quantia global de € 5.360,32; sob a rúbrica de “subsídio de refeição”, a quantia global de € 2.252,50; sob a rúbrica “trabalho nocturno”, a quantia global de € 204,43; sob a rúbrica “abono para falhas”, a quantia global de € 131,66; sob a rúbrica “complemento de distribuição”, a quantia global de € 130,31 (Resp. factos 4, 5 e 6 BI);
12. Em 2016, a título de trabalho suplementar, a R. DDD pagou ao A. € 7,62, em janeiro; € 7,71 em Abril; € 217,28 em Junho e € 81,91 em Julho (Resp. facto 8 BI);
13. O A. suporta as despesas com a deslocação e manutenção da mota que utiliza para a distribuição do correio, recebendo da R. o valor ao Km efectuado, nos termos constantes em 10 (Resp. facto10 BI).)  afigura-se-nos que sempre cumpre considerar que  para além da retribuição referida em 5, sendo que a recorrente  havia transferido a respectiva responsabilidade infortunística  laboral pela mesma para as Seguradoras , a Ré DDD,  pagava ao sinistrado , para além das demais prestações pecuniárias, referidas em 10, um valor mensal a título de motS/EmpC/U”, correspondente ao número de Kms que o trabalhador percorria com a moto para efectuar a distribuição do correio.
Aleatório significa “sujeito  às contingências do futuro; dependente de circunstâncias casuais ou fortuitas”.[33]
Em resumo, depende de acontecimento incerto , do acaso.
Ora, com respeito por opinião diversa, admite-se que o valor concreto  mensal da atribuição em causa – denominada de “motS/EmpC/U  - até pudesse ser  variável e sob essa perspectiva de ” quantum “ de montante incerto por depender do número de quilómetros  percorrido pelo sinistrado dentro da zona onde era  carteiro ( por sua vez o número de Kms a percorrer nessa zona dependia certamente do volume de correspondência  a entregar  o qual  se pode presumir  judicialmente  [34]que não é sempre igual[35]).
Todavia,  a nosso  ver, já não se pode afirmar o mesmo do seu pagamento que em  face das funções  de carteiro na distribuição de correio que o sinistrado desempenhava para a Ré ( recorde-se que em 1 se provou:
1. O A. foi admitido ao serviço da R., “DDD.” para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, prestar o seu trabalho de carteiro, o que fazia no dia 10 de Janeiro de 2017 (A).
2. No dia 10 de Janeiro de 2017, pelas 9:30 horas, quando o A. se deslocava na via pública, em (…),  para a distribuição do correio, a conduzir um veículo motorizado de duas rodas, caiu com o mesmo na via pública (B)) , se nos afigura certo.
Desta forma,  salvo o devido respeito  por opinião diversa, a nosso ver,  não se pode  considerar que  o pagamento desses valores se destinava  a compensar o sinistrado/Autor por  «custos aleatórios».
E cumpre ainda salientar  que na efectivação  do seu trabalho  - mais concretamente para realizar a sua prestação laboral para a Ré DDD -  o sinistrado , normalmente, usava a referida moto, e suportava, necessariamente, as despesas de deslocação, manutenção e desgaste da mesma.
Ou seja, o montante em apreço  era pago pela Ré DDD , regularmente ao A. em virtude dele utilizar  veículo motorizado de duas  rodas nas deslocações que  no âmbito da prestação do seu trabalho  tinha que levar a cabo.
Improcede, pois, o recurso. “ – fim de transcrição.
****
E passando a submeter-se a verberada decisão à conferência , sendo certo que a reclamante  vem   exercer o seu inequívoco  direito a obter uma decisão colegial, dir-se-á que reanalisada  a decisão singular  constata-se  que a mesma é clara e mostra-se fundamentada , não se vislumbrando  necessidade de sobre ela aduzir  novos argumentos ou esclarecimentos.
Afigura-se-nos, pois, ser  de manter a decisão  singular.
****          
Em  face do exposto, acorda-se em desatender  a  reclamação, mantendo-se , pois, a decisão singular  nos seus  precisos  moldes.
Custas pela  reclamante.
DN.

Lisboa, 2019-12-04
Leopoldo  Soares
José  Eduardo  Sapateiro 
Alves  Duarte
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[1] Representado  por Exmº mandatário – vide fls. 83.
[2] A acção deu entrada na fase contenciosa em 9 de Maio de 2018 – vide fls. 84 v.; sendo certo que a participação inicial do acidente de trabalho foi apresentada em  6.11.2017 ( vide fls. 1) pela BBB.
[3] Vide fls. 79 v a 81 v.
[4] Vide fls. 91 v a 92 v.
[5] Vide fls. 96 a 100.
[6] Vide fls. 109,110, 115 a 118.
[7] Vide fls. 115 v e 116.
[8] Vide fls. 116 a 118.
[9] Vide fls. 117 v e 118.
[10] Vide fls. 18 a 20 do apenso de fixação de incapacidade.
[11] Vide fls. 25 a 27 do apenso de fixação de incapacidade.
[12] Vide fls. 143 a 147.
O julgamento realizou-se em 27 de Maio de 2019 – vide fls. 143 a 147.
[13] Vide fls. 146 e 146 v.
[14] Vide fls. 146 v.
[15] Vide fls. 179 a 184 v .
[16] Vide fls. 193; histórico junto pela Secção  neste Tribunal da Relação.
[17] Vide fls. 189 v .
[18] Vide fls. 185 v a 189.
[19] Vide fls. 190.
[20] Vide fls. 196 a 209.
[21] Vide fls. 211 a 213.
A  Exmª PGA  foi notificada em 4 de Outubro de 2019 – vide fls. 214.
[22] Vide fls. 215.
[23] Vide fls. 215 v a 217  v.
[24] Diploma aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.
[25] Atenta a data de interposição dos presentes autos  -  em vigor a partir de 1/1/2010 - aprovado pelo.:
Decreto-Lei n.º 480/99 de 9 de Novembro Alterado pelos seguintes diplomas:
- Decreto-Lei n.º 323/2001 de 17 de Dezembro;
- Decreto-Lei n.º 38/2003 de 8 de Março;
- Decreto-Lei n.º 295/2009 de 13 de Outubro.
[26] Nas palavras do Conselheiro Jacinto Rodrigues Bastos:
“As conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso…
Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente” – Notas ao Código de Processo Civil, volume III, Lisboa, 1972, pág 299.
Como tal transitam em julgado as questões não contidas nas supra citadas conclusões.
Por outro lado, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas  pelas partes e decididas pelos Tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente ( vide vg: Castro Mendes , Recursos , edição AAFDL, 1980, pág 28, Alberto dos Reis , CPC, Anotado, Volume V, pág 310 e acórdão do STJ de 12.12.1995, CJSTJ, Tomo III, pág 156).
[27] Que logrou o seguinte sumário:
““ I - Conforme resulta do nº 2 do artigo 71º da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, constitui retribuição, para efeito de acidentes de trabalho, «todas as prestações recebidas pelo sinistrado com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
II – Um subsídio de prevenção que visava compensar o constrangimento pessoal decorrente de o trabalhador ter que estar facilmente contactável e disponível para interromper o seu período de descanso e ir prestar trabalho, se necessário, e que é pago apenas nos meses em que o trabalhador está de prevenção, mesmo que pago apenas durante 7 meses no ano anterior ao sinistro, deve ser incluído na retribuição relevante para a reparação das consequências do acidente, nos termos do número anterior.
III - …..” – fim de transcrição.
[28] Os pés de página devem ser consultados no aresto.
[29]
Que logrou o seguinte Sumário:
“ I - O conceito de retribuição, enquanto base de cálculo para efeitos de reparação em matéria de acidentes de trabalho, não coincide plenamente com o conceito de retribuição que decorre do Código do Trabalho. Com efeito, aquele surge com maior abrangência ou amplitude do que este, porquanto, para além de integrar as prestações recebidas pelo trabalhador (sinistrado), enquanto correspetivo ou contrapartida da sua prestação de trabalho ao serviço do empregador, nele se integram também todas as prestações recebidas por aquele da parte deste com carácter de regularidade, desde que não se destinem a compensá-lo por custos aleatórios.
II - Como se referiu no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31/10/2018, proferido no processo n.º 359/15.5T8STR.L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt, «[i]mporta que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado» (sublinhado nosso) pelo que, tendo em consideração a abrangência do conceito de retribuição que decorre do disposto no art. 71º da LAT, quando conjugada com o que está verdadeiramente em causa neste tipo de ações, não poderemos deixar de concluir que as importâncias (o seu valor médio) pagas pela Ré/apelante ao Autor/apelado a título de trabalho suplementar, em 7 (sete) dos 12 (doze) meses que precederam a data do acidente de trabalho por este sofrido, com as consequências que resultam da matéria de facto provada, devem ser levadas em consideração a título da retribuição por este auferida à data do acidente, para efeitos no cálculo das prestações que lhe são devidas ao abrigo da mencionada LAT  “ . – fim de transcrição.
[30] As notas de rodapé devem ser consultadas no aresto.
[31] Que logrou o seguinte sumário:
“– A LAT de 2009 deixou de fazer remissão para os critérios da retribuição da lei geral, mas continua a conferir especial atenção ao elemento da regularidade no pagamento.
II – E exceptua do conceito as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, pois que não se traduzem num ganho efectivo para o trabalhador.
III – Cabe ao empregador o ónus de alegar e provar a natureza compensatória de custos aleatórios dos valores regularmente pagos, como facto impeditivo do direito do sinistrado. “ – fim de transcrição.
[32]  Os pés de página devem ali  ser consultados.
[33] Vide Dicionário Universal da Língua Portuguesa , Texto Editora, pág.  60.
[34] Nas palavras de Manuel de Andrade  a prova por presunção é a prova por indução ou inferência (prova conjectural)  a partir dum facto provado por outra forma – e não destinado a representar a representar nem mesmo a indicar ( como o sinal ou contramarca) o facto que constitui o thema probandum.
Chama-se presunção à própria inferência ; ou ainda (menos propriamente  ) o facto que lhe serve de base – facto que mais rigorosamente , se designará por base da presunção” – fim de transcrição - Noções  Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora,1979, pág 215,
E também ensinava este Professor que as presunções podem ser :
- legais ou de direito, sendo estas  as estabelecidas pela própria lei ( vide artigo 349º do CC segundo o qual
Noção);
Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
- naturais – de facto, judiciais , simples ou de experiência, sendo que estas resultam das máximas de experiência , do curso ou andamento natural das coisas , da normalidade dos factos  (regras da vida;…), sendo livremente apreciadas pelo juiz ( artigo 351º).
Saliente-se  que o artigo 349º do Código Civil estipula:
 (Noção)
Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto
desconhecido.
Por sua vez, o artigo 351º do Código Civil regula:
 (Presunções judiciais)
As presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.
[35] Basta pensar  em épocas festivais , tal como o  Natal.
Decisão Texto Integral: