Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1646/08.4TJLSB.L1-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: CONTRATO-PROMESSA
EMPRÉSTIMO BANCÁRIO
CONDIÇÃO RESOLUTIVA
RESTITUIÇÃO DO SINAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/26/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: SUMÁRIO (do relator)

I. Verificada a condição resolutiva do contrato-promessa acordada entre as partes (não obtenção de empréstimo bancário pela promitente-compradora), o contrato- promessa extingue-se, devendo os promitentes vendedores restituir à contraparte o sinal prestado.
II. A tal não obsta a circunstância de à data da verificação da condição resolutiva a promitente-compradora se encontrar em mora, por ter já decorrido o prazo estipulado no contrato-promessa para a celebração da escritura definitiva.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO

Em 16.7.2008 Florence (…) intentou nos Juízos Cíveis de Lisboa ação declarativa de condenação, com processo sumário, contra Sérgio (…) e Patrícia (…).

A A. alegou que em 19.11.2007 celebrou com os RR. um contrato-promessa de compra e venda mediante o qual os RR. prometeram vender-lhe uma determinada fração autónoma, pelo preço de € 152 500,00. No contrato ficou consignado que o mesmo seria automaticamente resolvido se a promitente-compradora, a ora A., não obtivesse o empréstimo bancário pedido, devendo então ser restituído em singelo o sinal prestado. Ora, a A. não logrou obter o aludido empréstimo, pelo que comunicou aos ora RR., por carta datada de 27.02.2008, a resolução do contrato-promessa, reclamando a restituição do sinal que prestara, no valor de € 7 625,00. Porém, até ao momento os RR. não procederam à pretendida restituição do sinal.

A A. terminou pedindo que fosse declarada a resolução do contrato-promessa de compra e venda sub judice, à data de 27.02.2008; subsidiariamente, pediu que fosse declarado nulo e sem nenhum efeito o aludido contrato-promessa, por omissão de formalidades essenciais (reconhecimento presencial da assinatura dos contraentes e certificação da existência da respetiva licença de utilização); sempre com a condenação dos RR. na restituição à A. da quantia de € 7 625,00, acrescida de juros de mora que, calculados à taxa de 4%, se vencessem desde 27.02.2008 até integral pagamento.

Os RR. contestaram e deduziram reconvenção. Negaram que a A. não tivesse obtido o empréstimo bancário de que carecia, rejeitaram a arguição de nulidade do contrato-promessa (suscitando a existência de abuso de direito) e alegaram prejuízos que terão sofrido em consequência da não celebração do contrato de compra e venda prometido. Concluíram pela improcedência da ação, por não provada, e sua consequente absolvição do pedido; em reconvenção, pediram que fosse declarado o incumprimento do contrato pela A. e o sinal perdido a favor dos RR. e, subsidiariamente, para o caso de se julgar o contrato nulo, se condenasse a A. a indemnizar os RR. pelos prejuízos por estes sofridos, a liquidar em execução de sentença.

A A. replicou, pugnando pela inexistência de abuso de direito e pela improcedência da reconvenção e concluindo como na petição inicial.

Em audiência preliminar proferiu-se saneador tabelar e selecionou-se a matéria de facto assente e a matéria de facto controvertida.

Em 26.11.2012 realizou-se audiência de julgamento, que culminou com a decisão sobre a matéria de facto.

Em 14.4.2014 foi proferida sentença, na qual se julgou a ação procedente por provada e consequentemente condenou-se os RR. nos termos peticionados e, julgando-se a reconvenção improcedente, por não provada, dela se absolveu a A..

Os RR. apelaram da sentença, tendo apresentado motivação em que formularam as seguintes conclusões:

A) A prova testemunhal (depoimentos das Testemunhas Sandra Lopes e Sara Alves) conjugado com o doc. nº 2 junto com a P.I. a fls …. obrigam a alteração da matéria de facto provada.

B) Obriga nomeadamente a alterar a resposta dada à Base 1ª que em conformidade com aqueles elementos de prova deve ter a seguinte formulação:

1ª “Provado apenas que o Banco Espírito Santo, entidade bancária junto da qual a A. procedeu ao pedido de financiamento pelo valor de € 150.000,00, aprovou um crédito à habitação de € 137.745,00 (cento e trinta e sete mil setecentos e quarenta e cinco euros) correspondente a 90% do resultado da avaliação do imóvel.”

C) A Base 2ª deve ter a resposta de “Provado” porque foi alegado e resulta de uma simples operação aritmética, conjugando todos os dados disponíveis no processo.

D) A Base 3ª deve também ter a resposta de “Provado” por idênticos motivos: - simples cálculo aritmético.

E) Assentes estes factos que correspondem aos dados resultantes da prova ter-se-á que fazer uma diferente análise da condição resolutiva constante da Cláusula 9ª do Contrato.

F) A Cláusula significou para os Apelantes um pedido de financiamento sujeito aos requisitos e critérios e concessão do Crédito à Habitação impostos pela Instituição de Crédito.

G) Significou que a Apelada conhecia os requisitos e critérios do Banco a que recorreu para se financiar.

H) A Cláusula não tinha um valor declarado para financiamento, pelo que um Declaratário na posição dos RR apenas podia entender que seria o montante necessário para pagar o remanescente do preço.

I) De Acordo com as regras do Crédito à Habitação, o Banco Espírito Santo concedeu à Apelada o valor de € 137.747,50 (cento e trinta e sete mil setecentos e quarenta e sete euros e cinquenta centavos).

J) Ou seja, concedeu o financiamento que dentro daqueles critérios, lhe tinha sido pedido.

K) A condição prevista na Cláusula 9ª nº 2 do Contrato foi verificada pelo que não havia lugar à resolução automática do Contrato.

L) A resolução declarada pela Apelada não tem fundamento, pelo que o comportamento daquela equivale ao incumprimento culposo e definitivo do Contrato Promessa com perda do sinal entregue aos Promitentes Vendedores.

M) Ao não decidir desta forma, a douta Decisão Recorrida violou as regras do artº 442º, nº 2 do C.C.

Os apelantes terminaram pedindo que fosse dado provimento ao recurso e consequentemente se revogasse a sentença e fosse proferido acórdão que reconhecesse a procedência do pedido reconvencional quanto ao sinal.

Não houve contra-alegações.

Foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO

As questões que se suscitam neste recurso são as seguintes: impugnação da matéria de facto; não verificação da condição resolutiva do contrato-promessa de compra e venda.

Primeira questão (impugnação da matéria de facto)

O tribunal a quo deu como provada a seguinte

Matéria de facto

A) Os R.R. são donos e legítimos proprietários da fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao 2.º andar, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua (…), tornejando para a Travessa (…), em Lisboa, descrita na 3.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º (…) e inscrita na matriz predial da freguesia de (…), sob o artigo (…).

B) Em 19 de Novembro de 2007, A. e RR. celebraram um contrato promessa de compra e venda da fracção autónoma identificada no artigo precedente.

C) Nos termos do referido contrato, os R.R. prometeram vender à A., e esta prometeu comprar, a fracção autónoma, livre de quaisquer ónus ou encargos e pelo preço de € 152.500,00 (cento e cinquenta e dois mil e quinhentos euros).

D) A título de sinal a A. entregou aos R.R., na data da assinatura do mencionado contrato, o cheque n.º (…), sacado sob o Banco (…), no valor de € 7.625,00 (sete mil seiscentos e vinte e cinco euros).

E) Consta da cláusula 9.ª do contrato que: “1 – a celebração do contrato de compra e venda ora prometido fica dependente da aprovação do empréstimo bancário pedido, na respectiva Instituição Bancária, pela ora Segunda Outorgante. 2 – Caso o empréstimo, referido no número anterior, não seja concedido, o presente contrato-promessa de compra e venda considera-se automaticamente resolvido, devendo os Primeiros Outorgantes entregar à Segunda Outorgante, o sinal por esta prestado em singelo, não havendo lugar a indemnização a qualquer das partes.

F) O referido contrato promessa de compra e venda foi celebrado sem o reconhecimento presencial das assinaturas dos promitente vendedores e compradora e sem a certificação notarial da existência da respectiva licença.

G) Foi enviada uma carta registada com aviso de recepção datada de 27 de Fevereiro de 2008, cujo teor se reproduz:

Exmos. Senhores,

Solicitou-me a M/ Constituinte, a Exma. Senhora D. Florence (…), de em seu nome e representação comunicar formalmente a V. Exas. a resolução automática do Contrato Promessa de Compra e Venda celebrado em 19 de Novembro de 2007 e relativo À fracção autónoma designada de propriedade horizontal sito na Rua (…), tornejando para a Travessa (…) , em Lisboa, descrita na 3.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º (…) e inscrita na matriz predial da freguesia de Santos-o-Velho sob o art. (…).

A resolução contratual comunicada justifica-se com base no disposto na Cláusula Nona do Contrato Promessa de Compra e Venda em apreço, sendo consequência da não aprovação do empréstimo bancário para aquisição pedido pela minha cliente junto da respectiva Instituição Bancária.

Nesta conformidade, ao abrigo do disposto no n.º 2 da supra referida Cláusula Nona, deverão V. Exas. devolver à minha cliente o sinal por esta oportunamente prestado, em singelo, no montante de € 7.625,00 (sete mil seiscentos e vinte e cinco euros).

Para tanto, e tendo em vista a concretização da devolução do sinal em singelo contratualmente prevista, aguardarei um contacto por parte de V.Exas. com a maior brevidade possível.

Mantendo-me ao vosso dispor para qualquer esclarecimento adicional, apresento a V. Exas. os meus melhores.”

H) Até à presente data os R.R. não devolveram à A. a quantia recebida a título de sinal.

I) O prédio onde se situa a fracção fica na Rua das Madres, na zona histórica da cidade e é pelo menos do século XIX.

J) O Contrato-Promessa do litígio foi feito com a intermediação da Imobiliária “MORE SPACE”.

K) A mediadora imobiliária tratou de todas as formalidades inerentes à celebração do contrato.

L) O Banco Espírito Santo, entidade bancária junto da qual a A. procedeu ao pedido de financiamento pelo valor de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), não aprovou o referido crédito à habitação.

M) Sendo os RR. um jovem casal e tendo-lhes nascido um filho, puseram a casa onde residiam à venda para aquisição de outra maior.

N) A A. visitou a casa, manifestou interesse pela aquisição, sempre acompanhada pela Imobiliária, fez uma ficha de reserva com a caução de €1.000,00, em 9-11-2007.

O) Os Réus encontraram uma outra casa situada na Rua de São José, n.º (…), nas proximidades do atelier do R. marido, arquitecto de profissão, que muito lhes agradou.

P) Tendo por isso outorgado um Contrato-Promessa de compra e venda em 12 de Dezembro de 2007.

Q) Os RR. decidiram-se pela aquisição deste andar porque esperavam concretizar a venda do contrato prometido nos autos.

R) Os RR pretendiam afectar ao pagamento do preço do andar que iam adquirir o montante que iriam receber da venda do andar da Rua das Madres.

S) O andar identificado em A) tinha sido adquirido pelos RR. com recurso ao crédito estando estes a amortizá-lo.

T) Os RR. sinalizaram a compra da casa referida em P) em € 22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros).

U) Na qualidade de Promitentes-Vendedores da casa dos autos, os RR. obtiveram da Câmara Municipal de Lisboa o documento do não exercício do direito de preferência.

V) Por via da aquisição da casa referida em P) os RR assumiram o encargo inerente à amortização do empréstimo.

W) Os RR viram-se de um momento para o outro com dois empréstimos para pagar.

X) O andar identificado em A) continuava à venda na data da propositura da presente acção e foi vendido por € 137.500,00 em 09-07-2009.

O Direito

Pretendendo o recorrente impugnar a decisão relativa à matéria de facto, deverá, nos termos do art.º 640.º do CPC, sob pena de rejeição, especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (n.º 2 alínea a) do art.º 640.º do CPC).

Os apelantes insurgem-se contra a resposta dada pelo tribunal a quo aos artigos 1.º, 2.º e 3.º da base instrutória, que têm a seguinte redação:

1.º -“O Banco Espírito Santo, entidade bancária junto da qual a A. procedeu ao pedido de financiamento pelo valor de € 150 000,00 (cento e cinquenta mil euros), não aprovou o referido crédito à habitação?

2.º - “Para pagamento do preço do imóvel, a A. só necessitaria de € 144 875,00 (cento e quarenta e quatro mil oitocentos e setenta e cinco euros)?

3.º - “A casa foi avaliada pelo Banco em € 153 000,00?

O tribunal a quo deu o primeiro artigo da BI como provado e os outros dois como não provados.

Os apelantes defendem que o 2.º e o 3.º artigo ficaram provados e, quanto ao 1.º, se provou o seguinte:

Provado apenas que o Banco Espírito Santo, entidade bancária junto da qual a A. procedeu ao pedido de financiamento pelo valor de € 150.000,00, aprovou um crédito à habitação de € 137.745,00 (cento e trinta e sete mil setecentos e quarenta e cinco euros) correspondente a 90% do resultado da avaliação do imóvel.”

Para tal os apelantes apontam o depoimento das testemunhas Sandra Lopes e Sara Alves e o teor do documento junto com a petição inicial sob o n.º 2.

Vejamos.

As testemunhas Sandra (…) e Sara (…), respetivamente gerente do balcão do BES onde a A. apresentou o pedido de empréstimo e gestora de clientes que acompanhou o pedido da A. declararam, de forma clara e segura, que numa primeira fase o pedido de empréstimo formulado pela A., no valor de € 150 000,00, foi aprovado, na medida em que se entendeu que a A. tinha condições financeiras para o suportar, se bem que tenha sido necessário garantir a participação de uns tios da A., como fiadores. Porém, a concessão final do empréstimo, pelo valor pretendido, ficava dependente da avaliação do prédio a adquirir, o qual, pelos elementos dados pela A., estava inicialmente avaliado em € 170 000,00. A prática do banco era não financiar mais do que 90% do valor da avaliação. Segundo as testemunhas, o prédio foi avaliado num valor que correspondia tão só a 98% do empréstimo pedido, pelo que, conforme consta na informação junta como doc. n.º 2 da petição inicial, o banco apenas aceitava emprestar € 137 745,00. A A. desistiu, porque não tinha condições para suportar a diferença entre os € 150 000,00 pedidos e aquilo que o banco estava disposto a financiar. A testemunha Sara referiu que além do preço da compra a A. teria de suportar despesas com impostos e outras. Esta testemunha Sara disse ter explicado à A., logo de início, que o empréstimo não poderia ultrapassar 90% do valor da avaliação do prédio. Só que nessa altura a avaliação estimada era de € 170 000,00. A testemunha informou a A. do valor da avaliação e, consequentemente, que só emprestariam € 137 745,00, logo a seguir a ter obtido essa informação, o que ocorreu em 12.2.2008.

Por sua vez as testemunhas Ana (…) e Frantz (…), amigos da A., que se nos afigurou terem deposto de forma isenta, apenas declarando aquilo de que tinham conhecimento, disseram que a A. precisava do empréstimo que solicitara, para pagar a casa que pretendia adquirir. Declararam que para pagar o sinal para a casa a A. pediu cerca de € 5 000,00 a familiares (aos pais, segundo a testemunha Frantz).

Destes depoimentos resulta que a A. efetivamente carecia de um financiamento de € 150 000,00 para poder fazer face aos encargos necessários à aquisição da casa prometida comprar. O banco apenas lhe emprestava € 137 745,00 (doc. 2 junto com a p.i.), pelo que a A. desistiu da dita operação financeira.

Face ao exposto, não vemos razão para alterar as respostas dadas pelo tribunal a quo aos dois primeiros artigos da base instrutória.

No que concerne ao artigo 3.º da base instrutória, nenhum elemento escrito foi junto aos autos e as testemunhas Sandra e Sara não explicitaram o valor em concreto, acabando por nesta matéria se suscitarem dúvidas, pois que a testemunha Sara disse que o valor da avaliação correspondia a 98% do valor do empréstimo inicialmente pedido, o que dá o valor de € 147 000,00, distinto do quesitado.

Assim, sendo certo que este facto não tem relevância para o desfecho do litígio, opta-se por manter a resposta negativa dada pelo tribunal a quo.

Segunda questão (não verificação da condição resolutiva do contrato-promessa de compra e venda)

Provou-se que pelo escrito documentado a fls 9 a 12 dos autos, datado de 19.11.2007, os RR. prometeram vender à A. e esta prometeu comprar-lhes uma fração autónoma, pelo preço de € 152 500,00, de que a A. entregou, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 7 265,00, devendo o restante ser pago no ato da celebração do contrato definitivo de compra e venda.

Celebraram, pois, os respetivos outorgantes, um contrato-promessa bilateral (art.º 410.º do Código Civil), o qual tinha por objeto a compra e venda de um imóvel.

Os contratos regem-se pelo clausulado pelas partes, dentro dos limites da lei (art.º 405.º do Código Civil).

Os contratos só podem extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (n.º 1 do art.º 406.º do Código Civil).

No caso de contrato-promessa, e se tiver sido prestado sinal, se a obrigação não for cumprida por quem o recebeu, o outro contraente pode, nomeadamente, resolver o contrato e exigir o sinal em dobro (artigos 442.º n.º 2 e 801.º n.º 2 do Código Civil). Por sua vez se o incumprimento provier do contraente que prestou o sinal, a contraparte tem a faculdade de o fazer seu (n.º 2 do art.º 442.º do CC), para além de resolver o contrato (n.º 2 do art.º 801.º do Código Civil). Competirá ao devedor da prestação em falta provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua (art.º 799.º n.º 1 do Código Civil). A obrigação considera-se não cumprida, nomeadamente, quando o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor (art.º 808.º n.º 1 do Código Civil).

No contrato sub judice ficou estipulado que:

Cláusula 9.ª:

1 – a celebração do contrato de compra e venda ora prometido fica dependente da aprovação do empréstimo bancário pedido, na respectiva Instituição Bancária, pela ora Segunda Outorgante. 2 – Caso o empréstimo, referido no número anterior, não seja concedido, o presente contrato-promessa de compra e venda considera-se automaticamente resolvido, devendo os Primeiros Outorgantes entregar à Segunda Outorgante, o sinal por esta prestado em singelo, não havendo lugar a indemnização a qualquer das partes.

Ou seja, as partes subordinaram a cessação dos efeitos do negócio (resolução) à verificação de um acontecimento futuro e incerto, a uma condição resolutiva (art.º 270.º do Código Civil). In casu, a promitente-compradora não tinha meios próprios para pagar o preço do imóvel que prometera adquirir aos ora RR., pelo que, não tendo ainda garantido a obtenção do empréstimo bancário de que necessitava, disso informou os promitentes vendedores, os quais, em plena liberdade, aceitaram que o vínculo negocial ficasse subordinado à concessão do imprescindível empréstimo bancário. Ou seja, no caso de a A. não lograr obter o aludido financiamento, o contrato-promessa seria dado sem efeito, devendo os promitentes-vendedores restituir à A., em singelo, o sinal que esta lhes entregara.

Ora, sucedeu que o banco não emprestou à A. o montante de que esta carecia, pelo que a A., impossibilitada de pagar o preço prometido, comunicou aos RR. tal facto, por carta datada de 27.02.2008, dando o contrato-promessa por resolvido e reclamando a restituição da quantia que havia entregue aos promitentes vendedores a título de sinal.

É certo que nessa data já havia decorrido o prazo de 90 dias que ficara consignado no contrato-promessa para a marcação da escritura definitiva (cláusula quarta do contrato), o qual terminava em 17.02.2008, cabendo à promitente-compradora marcar a escritura. Mas o decurso desse prazo não implicara a cessação, só por si, do contrato-promessa, nem implicara o incumprimento definitivo do mesmo, posto que tal efeito não resultava dos termos do contrato, nem nada foi aduzido pelas partes no sentido de que da simples passagem desse prazo decorria a perda de interesse na celebração do contrato prometido, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 808.º do Código Civil.

Assim, a dita declaração de resolução produziu os efeitos estipulados entre as partes, extinguindo o contrato e constituindo os RR. na obrigação de restituírem à A. a quantia peticionada.

Pelo que a apelação improcede, devendo ser confirmada a sentença recorrida.

DECISÃO

Pelo exposto, julga-se a apelação improcedente e consequentemente mantém-se a sentença recorrida.

As custas da apelação são a cargo dos apelantes, pois nela decaíram.

Lisboa, 26.02.2015

Jorge Leal

Ondina Carmo Alves

Eduardo Azevedo