Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1623/12.0TACSC.L3-9
Relator: MARIA DO CARMO FERREIRA
Descritores: AUTORIDADE DE POLÍCIA CRIMINAL
POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
MEIOS COERCIVOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIMENTO
Sumário: I- A PSP dispõe de normas orientadoras- as chamadas NEP, normas de execução permanente (ex. destas o Regulamento interno de 1/6/2004) que dirigidas aos agentes policiais, traçam a orientação e o limite ao uso dos meios coercivos, sabido que o Estado de Direito conserva praticamente o monopólio da coacção, exercido pela especificidade da função policial que os usa de modo directo e imediato, para levar o cidadão a cumprir a sua obrigação legal mas nunca para punir o incumprimento- esta será a função dos tribunais.

II- A actuação do agente policial, ainda que tenha causado lesões físicas no Assistente, mas que observou as regras do NEP e dos manuais no que respeita à algemagem do Assistente, não revela uma actuação arbitrária, excessiva ou desproporcionada, ou que indique a voluntariedade do agente policial para causar lesão física ao algemando.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:                  Acordam em conferência na 9ª. Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO.

             No processo supra identificado, da Secção Criminal- J3 da Inst. Local de Cascais, Comarca de Lisboa Oeste, foram julgados os arguidos:

L..., (…) ;

e

A..., , agente da P.S.P. (…).

Acusados em co-autoria material e na forma consumada, de factos que  integram um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. m), todos do Cód. Penal.

Realizado o julgamento, foi proferida decisão que decidiu o seguinte:

(transcreve-se)

A) Absolve o arguido A... relativamente à prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. m), todos do Cód. Penal;

B) Julga improcedente, por não provado, o pedido de indemnização cívil deduzido pela demandante “HPP Saúde – Parcerias Cascais, S.A.”, contra o arguido/demandado A..., e, em consequência, dele se absolve o arguido/demandado A...;

C) Condena o arguido L... pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punível pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.ºs 1, al. a) e 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. m), todos do Cód. Penal, na pena de 4 (quatro) meses de prisão;

D) Nos termos dos artigos 43.º, n.º 1 e 47.º, n.º 1, ambos do Cód. Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, decide substituir a pena de 4 (quatro) meses de prisão, cominada ao arguido L..., a que é feita referência em C), por 120 (cento e vinte) dias de multa, à razão diária de € 15,00 (quinze euros), o que perfaz o montante de € 1800,00 (mil e oitocentos euros);

E) Condena o arguido/demandado L... a pagar à demandante “HPP Saúde – Parcerias Cascais, S.A.” a quantia de € 108,00 (cento e oito euros), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa comercial em vigor, desde a data da notificação do arguido L... para contestar o pedido de indemnização e até integral e efectivo pagamento.

Mais se condena o arguido L... nas custas do processo, fixando a taxa de justiça em 2 U.C.`s.

Sem custas cíveis.

***

                 Inconformado, o arguido L... veio interpor recurso da referida sentença, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 929 a 1090 dos autos, onde escreveu as seguintes:

Conclusões: (transcrição)

1.        Vem o presente recurso interposto, limitado apenas a parte da decisão proferida pelo Tribunal Singular da Comarca de Lisboa Oeste – Cascais – Instância Local – Secção Criminal, J3, firmada no Processo n.º 1623/12.0TACSC, o qual, na parte condenatória do arguido, única que vem sindicada, pesar do muito e devido respeito, não pode merecer a concordância do Arguido e daí o presente recurso, que, além de impugnar a matéria de facto dado como assente, visa suscitar nulidades e má aplicação do direito.

2.         Foi dado como assente que a arguido cometeu o crime de ofensa à integridade física qualificada, e punido na pena de 4 meses de prisão que substituiu por multa em 140 dias à taxa de 15 euros/dia, quando deveria ter sido integralmente absolvido, e mesmo que assim não fosse, o que se refere por dever de patrocínio e sem conceder, o crime a considerar deveria ser simples e nuca qualificado, sendo a pena manifestamente exagerada.

3.         O Tribunal a quo assentou a sua convicção em clara violação do principio in dúbio pro reo e violando o principio da livre apreciação a prova, posto que nenhum elemento probatório existe nos autos que permite concluir que o arguido cometeu os crimes, nem tal se deveria dar por provado, pois nenhuma prova foi feita nesse sentido, bem pelo contrário e por isso, entende o arguido que deveria ter sido absolvido.

4.        Existe, salvo o muito e devido respeito errada apreciação da prova e falta de fundamentação, o que configura Nulidade insanável, sendo certo que o arguido deveria ter sido absolvido integralmente, como o foi o outro arguido, e bem diga-se.

5.         Deu-se como provado que o arguido agrediu o assistente e agiu com abuso de poder, quando apenas agiu em missão de serviços, em operação policial marcada, que visava fiscalizar locais conotados com o tráfico e consumo de estupefacientes e por isso foram ao local onde estava o assistente com mais quatro amigos e a consumir drogas, pois assim foram inspecionados e tinham dois droga na sua posse, um deles o assistente.

6.         O qual quis confrontar os agentes e injuriou a atuação policial, tendo cometido um crime na pessoa do aqui arguido, que o teve de deter, usando as técnicas e normas de procedimento ensinadas na PSP e nada mais que isso.

7.         E o assistente foi detido, julgado e condenado, em decisão que já remonta há quatro anos. Decisão confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa ainda em 2012.

8.         O princípio da livre apreciação da prova (art.º 127.º do CPP) encontra limite na prova concreta que somente pode ser apreciada segundo as regras da experiência e valorada numa direção e não em direções díspares.

9.        Não existe prova qualquer nos autos, nem testemunhal, nem documental que permitam firmar, com um mínimo de certeza, que o arguido cometeu o crime pelo qual foi condenado, sendo que até em alegações a Digna Magistrada  MP considerou não haver prova que o arguido tenha agido além do que é determinado e ficou na duvida sobre se houve ou não joelhadas.

10.      Existiu violação do princípio “in dúbio pró reo”, quando o Tribunal, em face da parca prova resolveu dar como assentes factos sobre os quais a única prova são as declarações do assistente, que são contrariadas pelo que referem as testemunhas de defesa, sendo certo que esta testemunhas de acusação, que foram de defesa no julgamento em que o assistente foi condenado, não contrariam o que todos os agentes da PSP presentes disseram e foram 4, não havendo qualquer prova que sustenta a decisão recorrida. 

11.      Foram erradamente apreciadas as provas, e omitida a decisão condenatória do assistente e que havia sido alegada nas contestações dos arguidos, o que equivale a omissão e pronuncia.

12.       O que redunda em Nulidade absoluta, sendo Nula tal decisão e inerente  apreciação de prova, podendo concluir-se, no que tange aos pontos que erradamente foram dados como assentes e os que erradamente foram dados por não assentes, que existiu, como se demonstra na motivação ut supra, erro manifesto na apreciação da prova e, violação do principio da presunção de inocência, isto é, na dúvida, esta beneficia o arguido, mesmo no quando se aprecia a prova e se determina a convicção do julgador.

13.       O recorrente tem profunda convicção, que, a decisão recorrida, lida e relida a fundamentação de facto e consequente motivação da fundamentação, resulta evidente que a fundamentação não cumpre a exigência legal e constitucional, de traduzir rigorosamente, cotejando prova a prova, todas e não somente uma, de onde se firmam os factos assentes e em que provas se funda essa convicção.

14.       Não é clara e evidente em que parte da fundamentação se retirou o convencimento de que o arguido atingiu o assistente com joelhadas, quando nenhuma testemunha viu dar joelhadas, aliás, não somente não viram, como afirmaram isso não ter sucedido, sendo que apenas o Assistente referiu que o arguido lhe deu umas joelhadas para afastar as pernas, o que o arguido negou.

15.       Quando na mesma fundamentação factual se não dá por assente o que o assistente referiu, dizendo que o arguido tinha proferido algumas expressões constantes na acusação, expressões injuriosas, o que o arguido negou, e igualmente nenhuma testemunha ouviu, e, como é bom de ver, tais factos foram dados por não provados. Mas, porque razão as joelhadas foram dadas por provadas se a prova é toda a mesma e não pode valor num sentido e noutro não?

16.       E da motivação da fundamentação não se extrai, por insuficiência da mesma, em que fundamentos, de facto ou de direito a MM Juiz a quo escora o entendimento que a levou a dar por assente o facto vertido no ponto 3 no segmento de que o arguido L..., desagradado com a atitude do assistente aproximou-se dele quando se encostou ao muro e no ponto 4 que lhe tenha dado joelhadas.

17.      As duas testemunhas da acusação e mais de sete da defesa, cinco delas presenciais, nisso todas concluíram, isto é, não viram joelhadas, nem existiu conduta agressiva do arguido L..., mas apenas uma reação à conduta do assistente que, foi encontrado (e outro dos indivíduos também) na posse de droga (haxixe) para consumo e após lhe ter sido dito que ia para a esquadra,  injuriou os agentes, especialmente o Comissário L..., e por isso teve de ser detido, com recurso a algemagem de segurança, tudo como melhor ficou no auto de noticia, que deu origem ao julgamento do aqui assistente e que foi condenado pelo mesmo Tribunal de Cascais, por ter cometido o crime de injurias contra o assistente, decisão transitada em julgado há vários anos, após recurso para o TRL, que se encontra junta aos autos e é prova documental.

18.      Ou seja, os factos já foram apreciados, apreciação que está transitada em julgado, onde a versão do ali arguido e aqui assistente e suportada pelas mesmas testemunhas, obviamente não colheu, como não colheu em sede de primeira decisão instrutória.

19.       Sendo certo que esse julgamento foi pouco depois dos factos (a decisão em primeira instância foi antes de seis meses e por isso é que o assistente se queixou na último dia do prazo), isto é, quando as testemunhas tinham uma melhor memória do que sucedeu, não podem as mesmas testemunhas, vários anos depois, dar uma impressão diferente, sobre os mesmos factos ao julgador.

20.       E muito menos o julgador do processo à luz do qual se apresente o presente recurso, pode deixar de ter em linha de conta uma decisão transitada e que condenou o assistente, por ter cometido um crime contra o aqui arguido, sendo que os factos em apreço são os mesmos e a fundamentação que se explana par justificar a motivação de facto, em nenhum momento faz referência ao facto do assistente ter sido punido pelo mesmo tribunal, em decisão confirmada por Tribunal superior, onde se confirmou que o aqui assistente teve de ser detido e essa detenção foi justificada pelo crime cometido  pelo aqui Assistente e ali arguido, contra o ali Ofendido e aqui arguido, nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar e perante as mesmas testemunhas que nestes autos igualmente testemunharam.

21.       Como é evidente, trata-se de factos passados há quase cinco anos. È natural que a memória no primeiro julgamento estivesse mais fresca e nessa altura os detalhes fossem melhor explicados. Esta é uma regra que resulta da experiência comum.

22.       Tudo isto merecia uma mais exigente e ponderada explicitação em sede de fundamentação, onde todos estes detalhes, estes “pormaiores” se cotejassem e concatenassem de forma convicta e nada ficasse por esclarecer, utilizando um discurso lógico e coerente, de forma a entender-se, como o Tribunal a quo tomou a decisão que decidiu tomar e isso não sucedeu.

23.      Decide-se nuns pontos acreditar no assistente que se reputa credível, e nas testemunhas de acusação, quando nem no nome do restaurante onde estavam acertaram e as duas testemunhas referidas, não viram joelhadas nas pernas . Mas, curiosamente, na mesma fundamentação, já não se acredita no assistente sobre outros factos que o mesmo assistente disse terem ocorrido.

24.       Ora, ou o assistente fala verdade e por isso se reputa credível, ou não fala verdade e não pode ser credível. Não pode é ser as duas coisas na mesma decisão. Trata-se de fundamentação claramente insuficiente e manifesta contradição entre a fundamentação e a motivação. Em ambos os casos a consequência é a mesma: NULIDADE INSANÁVEL da decisão. Nulidade que se arguiu com as legais consequências.

25.      O arguido negou as acusações e todos os factos da mesma acusação, e os agentes policiais afirmaram que nada do que o assistente referiu aconteceu e inexistem marcas de lesões nas pernas, nem disso no hospital o assistente se queixou. As lesões no rosto resultaram da necessidade de algemar o arguido, seguindo a técnica ensinada na PSP, de que o formador V..., testemunha nos autos, foi suficientemente claro e esclarecedor em dizer que a atuação do comissário L... foi a habitual e ensinada aos policias em situações semelhantes. Aliás por isso o MP; nas suas alegações referiu não ter ficado provado ter havido agressão e abuso de autoridade na algemagem do assistente.

26.       Ora, finalizando, nunca poderia a MM Juiz a quo, ter dado como assente factos que deu, sem fundamentação bastante e que se furtasse ao cotejo que se vai fazendo, posto que a fundamentação não responde às questões que acima se elencam. A fundamentação é obscura, omite factos provados noutro processo, não esclarece nada e é obscura, magra e puco cuidada, salvo o devido respeito pela decisão tomada e por opinião diversa.

27.       É, aliás, contraditória quer na motivação quer na fundamentação da motivação, omitindo ainda dados relevantes, sobre os quais tinha o dever de mencionar (o facto do assistente ter sido condenado nem sequer consta na decisão, que sobre isso fez tábua rasa e consta das contestações) e tinha de esclarecer e constar na fundamentação, sob pena de omissão de pronúncia.

28.       E, acima de tudo, para explicitar os motivos pelos quais foi no sentido que foi, nomeadamente como deu por assente que o arguido L... agiu sem razão e em abuso de autoridade, quando na verdade apenas e só – como se confirmou porque o assistente foi condenado – teve de deter o assistente porque tinha cometido um crime.

29.       E depois, para conseguir esclarecer porque qualifica a conduta, na apreciação de direito, como especialmente censurável, quando o mesmo Tribunal, tinha plasmado quatro anos antes, logo a seguir aos factos e quando todos tinham a memória mais fresca, que o aqui arguido, apenas e somente cumpriu o seu dever funcional e, por isso, condenou o assistente pelos factos pelos quais foi detido nas circunstâncias de tempo, modo e lugar.   

30.      Posto isto, a decisão aqui recorrida, ao assim decidir, fundamentando deficientemente a decisão tomada, além de entrar em contradição e omitindo uma decisão condenatória do assistente, pelos mesos factos, tal equivale a falta de fundamentação e, por isso, redunda em Nulidade. Que se arguiu com as legais consequências. Tratando-se de dupla Nulidade. Nulidade por fundamentação insuficiente e por omissão de pronúncia, posto que tal situação encontra-se devidamente relatada nos autos e foi objeto da contestação do arguido e, sobre isso, o Tribunal a quo não se pronunciou.

31.      Constata-se assim que existiu uma falta evidente de um exame criterioso e rigoroso das provas, que se devem traduzir em exigente e ponderada fundamentação, o que neste caso nunca sucedeu. Especialmente até por existir uma condenação do assistente, tal determinaria uma redobrada exigência na explanação da fundamentação e inerente motivação.

32.       É unânime a jurisprudência que vai referida supra na motivação e para cuja consulta se remete.

33.      É assim Nula a decisão por manifesta falta de fundamentação, por contradição entre a fundamentação e a motivação e por omissão de pronúncia, Nulidades que se deixam arguidas e se querem ver declaradas. Como é de Lei, tendo sido violados, nesta parte, os artigos 127.º,374.º, n.º 2, do CPP. Sendo Nula a decisão nos termos do artigo 379.º, n .º 1, alíneas “a” e “c” e n.º 2, do CPP.

34.      É ainda Nula a decisão por violação grosseira, do princípio in dúbio pró reo, e não somente por falta de fundamentação, resultando ambas as nulidades de um mesmo facto: firmar o convencimento com base em prova que não é nem nunca pode ser dada como suficientemente esclarecedora e fora de qualquer dúvida e aquando existe prova, não cotejada e até omitida, que aponta em sentido diametralmente oposto, num convencimento que, de todo, não foi fundamentado na forma e modo imposto pela lei processual penal.

35.       O arguido prestou declarações e negou os factos. As afirmações e a palavra do arguido, pessoa que é Comissário da PSP e excelente Comandante são, aliás, suportadas em condenação anterior do assistente pelos mesmos factos e as afirmações do arguido, não podem valer menos que as do assistente – que, aquando dos factos tinha produto estupefaciente na sua posse e estava em local conotado com tráfico de droga – sendo certo que os agentes policiais ouvidos, confirmaram as declarações do arguido, que foi detido, julgado e condenado.

36.      Mal andou o Tribunal a quo, ao assim decidir, tendo sido violado, entre outros, o artigo 127.º, bem como o artigo 374.º, todos do CPP. Sendo Nula a decisão nos termos do artigo 379.º, n .º 1, alíneas “a” e “c” do CPP.

37.       Prevenindo o recurso para o Tribunal Constitucional desde já se invoca que é, aliás, inconstitucional o entendimento, rectius, interpretação dado pela decisão recorrida ao artigo 127.º do CPP, segundo a qual, a livre apreciação de prova permite afirmar um facto como provado, sem que prova material ou pessoal diretamente apreciada e clara e fundadamente esclarecida tenham existido, a não ser parte do que diz o Assistente (que nem tudo a decisão aproveitou, faltando saber porque acreditou numa parte e noutra não, daí a deficiente fundamentação, que acarretam as Nulidades já arguidas).

38.       O arguido deveria ter sido absolvido! No mínimo a dúvida sobre o que se passou, ter-se-ia que instalar e, ao passar por cima disso, incluindo passando por cima de anterior decisão condenatória do assistente, a decisão recorrida violou o referido princípio de presunção de inocência, constitucionalmente consagrado, o que configura a Nulidade decisória, que se invoca expressamente, embora acima vá já aflorada e arguida, violando as regras da experiência comum o resultado a que chegou a decisão recorrida.

39.       O artigo 127.º do CPP, não pode ser interpretado de forma a permitir que se permita uma apreciação da prova que se furte a um cotejo permanente da presunção e inocência, permitindo-se um afastamento das dúvidas razoáveis que em qualquer processo têm de existir e, atento tudo o que supra vai dito, neste caso concreto, no mínimo teriam de ser ponderadas e levar a concluir, se não pela não prova – como devia – mas, pelo menos, pela dúvida. A qual milita sempre a favor do arguido em obediência ao sagrado principio de presunção de inocência.

40.      Quem agiu ilicitamente assim foi condenado, com decisão transitada, foi o assistente, que aliás referiu no seu depoimento que teve uma altercação com o arguido, como se numa operação policial se permitisse a um suspeito alterar com quem o revista e fiscaliza. Altercou, injuriou e teve de ser detido. Estava em local suspeito; tinha na sua posse produto estupefaciente; injuriou um Comissário de Policia e opôs-se à ação policial, quando outras pessoas se mantiveram calmas e, mesmo uma delas tendo também droga consigo nada de anormal ocorreu. Só com o assistente.

41.       O recorrente, aqui arguido, não tem dúvidas de que a decisão só poderia ter sido a absolvição por ausência de qualquer comportamento ilícito da sua parte, o que é por demais evidente nos presentes autos. Mas, no mínimo, deveria ter ficado firmado haver dúvidas em face de contradição de versões do assistente e do arguido. Porque a palavra do assistente não pode valer mais do que a do arguido! A isso se opõe o artigo 32.º n.º 2 da CRP, as regras da experiência e tudo em clara e manifesta violação da garantia constitucional contra a auto incriminação (nemo tenetur se ipsum accusare), o que é proibido.

42.      Ficando assim claramente demonstradas, a nosso ver, as Nulidades de que enferma a decisão recorrida, as quais e pretendem ver declaradas pelo presente recurso, tendo sido violadas, entre outras, as normas supra indicadas.

B – Recurso sobre a matéria de facto

43.      O arguido foi condenado com fundamento em errónea apreciação da prova, a qual deve ser objeto de reapreciação, sendo certo que entende o recorrente que não precisará o Tribunal, ad quem, de recorrer ao principio da imediação, posto que, as provas, todas elas apontam em sentido diametralmente oposto ao que chegou o Tribunal a quo e levará à absolvição do arguido, que é e está inocente

44.       Prova que se requer a sua reapreciação, o que deverá ser feito, no seguimento do disposto na lei processual penal e seguindo-se de perto a jurisprudência do STJ, no Acórdão de 14-03-2007, tirado por unanimidade:

45.       Salvo o muito e devido respeito, e no seguimento da motivação acima expendida e que fundamenta a alegação dos vícios de Nulidade, foi erradamente dado como assente que o arguido cometeu o crime de ofensa á integridade física qualificada, porque entendeu o Tribunal a quo, dar como provados um conjunto de factos assente na versão unilateral do Assistente, não sustentada por qualquer testemunho ou evidência, existindo provas contrarias, o arguido negou tais factos e a verdade consta no processo em que o assistente já foi julgado e condenado.

46.       Existe, salvo o muito e devido respeito, além da alegada falta de fundamentação e contradição entre a fundamentação e a motivação, insuficiência da prova para a condenação; errada apreciação da prova e violação do princípio in dúbio pro reo, atento que toda a prova aponta em sentido diverso.

47.      Ninguém viu o arguido agredir o assistente, com joelhadas, apenas o viram ser levado ao chão e ser algemado por ter injuriado o aqui arguido e ter assumido uma postura de confrontação. A tal altercação nas palavras do assistente, o que foi uma confissão da sua conduta contrária á acção dos agentes, especialmente do aqui arguido. Isto é, permitiu-se o assistente, segundo as suas palavras, ousar ter uma “uma altercação” . Isto são palavras do assistente. Ou seja permitiu-se altercar com a Autoridade de Policia, em pleno exercício de funções. Altercar, quer significar discutir acaloradamente; polemizar; brigar; confrontar de forma veemente, etc, conforme qualquer dicionário de língua portuguesa o refere. Essa altercação resultou nas expressões injuriosas que teve e a exaltação que manifestou.

48.      O assistente refere que foi ele quem tirou os seus pertences e depois a sentença refere que foi o arguido, mas a sentença suporta-se nas declarações do assistente. Em que ficamos? Como se motiva uma fundamentação e facto assim plasmada? Há ou não deficiente fundamentação? Claro que há e é manifesta.

49.       E diga-se que a ação do arguido foi a habitual em situações do mesmo género, sendo que a técnica de algemagem utilizada foi a correta apara as circunstâncias do caso, da conduta do assistente, que promoveu a “altercação” que disse, mais as injurias que proferiu e por isso foi condenado como o arguido e as testemunhas, agentes da PSP o disseram, e do local, conforme toda a prova o afirmou, nomeadamente quem na PSP, ministra formação nesse sentido e faz parte dos manuais de atuação policial.

50.       O assistente confirmou que teve uma altercação com o arguido que bem sabia ser policia e disso não teve dúvidas e bem sabia que não o podia fazer e o arguido, agindo de acordo com a formação e ensinamentos recebidos na formação recebida na PSP, deteve o assistente porque este o injuriou e teve uma conduta, a por si confessada dita de “altercação” que percecionou como ameaçadora e também tinha na sua posse produto estupefaciente.

51.      É gritante o erro em se dar por credíveis os depoimentos do Assistente e da testemunha R…, quando nem sequer no restaurante onde jantaram são coincidentes no depoimento. Um diz que foi no Panorama, outro diz que foi no Paradigma.

52.       Salvo o devido respeito, que aliás é muito, a apreciação a prova é errada e os factos dados por assentes não o podiam ter sido, foi cometida a ilegalidade de se ter condenado quando a prova aponta em sentido totalmente oposto e existe contradição insanável entre a motivação de facto e entre esta e a fundamentação, quando, se dá por provado uma coisa, as joelhadas , e se refere que se chegou a essa convicção com base no depoimento do assistente que se refere ser credível, quando depois, para se dar como não provado que o arguido não proferiu as afirmações constantes na acusação  considerando-se aqui já não credível o depoimento do assistente.

53.       O princípio da livre apreciação da prova (art.º 127.º do CPP) encontra limite na prova concreta que somente pode ser apreciada segundo as regras da experiência e valorada numa direção e não em direções díspares e tem de ter como limite a dúvida razoável que sempre se dever ter na ausência de suporte probatório claro. Existiu, por isso, flagrante contradição e, como supra se disse e a nosso ver, violação do princípio “in dúbio pró reo”.

54.      Não há qualquer prova de que o arguido tenha tido o comportamento plasmado na decisão, como já assim se havia considerado em sede de instrução e por isso, e bem, os arguidos haviam sido despronunciados. Decisão revogada pelo Tribunal da Relação de Lisboa é certo, mas que pecou por não ter visto os indícios na globalidade e ter também, já aí, omitido a decisão que levou á condenação do assistente e que foi confirmada pelo mesmo TRL. Conforme está documentado nos autos.

55.      No processo penal, não basta que a hipótese colocada pela acusação e o que diz o assistente e uma ou outra testemunha de forma inconclusiva, como foi o caso. O princípio da culpa e da presunção da inocência exigem que o tribunal de julgamento decida para além de toda dúvida com base em meios de prova efetivamente produzidos, sendo certo que o arguido negou os factos; tem quatro testemunhas que confirmam a sua versão e a versão do assistente é contrariada pela condenação que recebeu.

56.       Existiu erro notório na apreciação da prova e o arguido deveria ter sido absolvido integralmente, como o foi, e bem, o outro arguido, sendo a prova que vai nesse sentido a que consta dos autos, quer a documental quer a testemunhal. Esta é a realidade que o processo contém. E os factos dados como assentes pelo Tribunal a quo foram-no assim dados com base em errónea perceção da realidade, passe o devido respeito por opinião diferente, que se aceita, mas com a qual se não concorda.

57.       Na precisa lição de Germano Marques da Silva o princípio da presunção de inocência consagrado no Art.º 32º, n.º 2 da CRP integra uma norma diretamente vinculativa e constitui um dos direitos fundamentais do cidadão. (Art.º 18º, nº 1 da CRP).

58.       Quanto ao livre convencimento do juiz, este traduz-se como uma autêntica limitação ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, não pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.º, 61º, nº1, alínea c) conjugado com o Art.º 343º, nº1, ambos do CPP) e assim sendo, ao formar a sua convicção, o Tribunal a quo, valorou erradamente a prova produzida em audiência, pois uma correta apreciação e valoração da mesma, impõem decisão diferente da aplicada ao ora recorrente, devendo consequentemente a prova a analisar, que é a resultante da decisão do processo pelo qual o assistente foi condenado  e o depoimento do assistente; do arguido e das testemunhas – duas da acusação e sete dos arguidos –  levar a conclusão diferente da firmada na decisão recorrida. Devendo, a dúvida favorecer o arguido.

59.      No caso sub júdice, o acórdão recorrido, ao formar como formou o livre convencimento do juiz, traduziu-se como uma autêntica limitação ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, não pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.º, 61º, nº1, alínea c) conjugado com o Art.º 343º, nº1, ambos do CPP), ferindo o princípio do in dúbio pro reu. Pelo que, também por isso a sentença que ora se recorre deve ser declarada como inconstitucional, e ser declarada nula, como aliás se disse acima e aqui se reitera, sendo inconstitucionais tais normas quando interpretadas no seguinte sentido:“Ao formar o livre convencimento, o juiz, não se encontra limitado ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.º, 61º, nº1, alínea c) conjugado com o Art.º 343º, nº1, ambos do CPP), ferindo o princípio do in dúbio pro reu.”

60.      Tal interpretação viola ainda o art.º 6º da Convenção para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais com as modificações introduzidas pelo Protocolo n° 11 acompanhada do Protocolo adicional e dos Protocolos nos 4, 6, 7 e 13, e os artigos 32º, n.º 2 e 18.º, n.º 1, ambos da C.R.P.  Inconstitucionalidade e Nulidade que já igualmente se arguiu e se reitera, traduzida na violação do princípio “in dúbio pro reo”.

61.      Tendo o presente recurso como objeto a reapreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do CPP, o recorrente deve especificar:

a. os pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b. as provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c. as provas que devem ser renovadas;

62.      Nos termos do n.º 4 da mesma disposição, quando as provas forem gravadas as indicações das alíneas b e c, fazem-se por remissão para o suporte digital (que segue em CD), estando aí toda a prova gravada, e devidamente indicada no suporte digital, juntando o Recorrente , em documento anexo, a transcrição integral dos depoimentos das testemunhas e, considerando os vícios invocados, desde já se invoca que as provas que implicam diversa decisão em matéria de facto, são todas as que se encontram gravadas que devem ser renovadas e integralmente reproduzidas com julgamento publico no Tribunal.

63.      De forma a concluir-se, como o faz o recorrente que a prova documental e testemunhal iliba completamente o arguido de ter cometido qualquer crime e muito menos o crime de que foi condenado, requerendo-se integral renovação desta prova!

64.      Cumprindo o disposto no referido normativo, enuncia o recorrente, ponto a ponto, de forma expressa, relativamente ao arguido, os factos que foram erradamente dados como provados na constantes na motivação de facto dada como assente , bem como se explicita detalhadamente o que deveria ter sido dado por provado, nesta sede, indicando, passo a passo as provas que fundamentam esta arguição. Assim:

65.       Da Matéria de facto Provada (ponto A da Fundamentação):

Ponto 2: Deve ser extirpado deste ponto o segmento “..o arguido L..., … abordou o assistente G... e outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-lhes ordenado que se encostassem á parede”.

Não pode ser dado por provado porque quem deu essa ordem foram os agentes da PSP, Cardoso e Araújo, quem primeiro chegou ao local e nisso testemunharam. Este ponto 2 deve, por isso passar a ficar desta forma:

Ponto 2: No dia 15 de Outubro de 2011, pelas 02H20, na Rua Major Escrivaniz, sita em Cascais, o assistente – após ter sido mandado encostar a uma parede por dois agentes da PSP que chegaram ao local, se identificaram como policias e deram essa ordem a quem ali estava, dirigiu-se ao arguido L..., que entretanto também chegou logo atrás dos primeiros dois agentes e era quem comandava a força policial – e referiu disse ao arguido: “ É sempre a mesma merda, policias do caralho, vocês não podem fazer isto” assumindo ainda uma postura de confronto com o arguido, bem sabendo que o mesmo era agente da força publica e as ordens eram legitimas e por tal facto o assistente veio a ser detido e a ser condenado no processo que correu termos sob o n.º 1381/11.6PBCSC, no extinto 4.º Juízo Criminal de Cascais,

As provas que apontam neste sentido e não no sentido firmado pelo Tribunal, são:

O documento existente nos autos que é a sentença e o acórdão da Relação de Lisboa que a confirmou, que contêm as decisões finais transitadas em julgado há quatro anos no processo n.º 1381/11.6PBCSC, no extinto 4.º Juízo Criminal de Cascais;

As declarações do arguido e as declarações das testemunhas “a” “b” “c” “d” “e”. Os primeiros cinco todos são unânimes em confirmar que os primeiros que chegaram ao local foram o A… e o C… e que foram eles a chegar ao local em primeiro lugar e que foram eles a dar a ordem e o arguido chegou depois e que o assistente se dirigiu ao aqui arguido em tom exaltado, a injuriar e proferir as expressões indicadas e a confrontar e a intimidar o arguido e por isso foi detido, na forma que a PSP ensina a fazer e não houve excesso nenhum, o que foi confirmado pelas duas últimas testemunhas

Ponto 4. Este ponto deve pura e simplesmente desaparecer da matéria de facto assente, por ausência de qualquer prova que o sustente. Isto é, ninguém viu dar joelhadas nem o assistente se queixou disso ou ouve qualquer marca disso e o arguido negou tal facto.

Não há qualquer indício; prova; exame médico que a corrobore. Somente as declarações do assistente, sendo que o arguido nega e as testemunhas R… e J… nada disto viram, nem sequer viram o arguido com o assistente junto à parede, sendo que os agentes da PSP que são testemunhas, afirmaram no seu depoimento terem visto o que quer que fosse. 

Ponto 5. Deve ser retirada a expressão de seguida, em função do que se disse relativamente ao ponto 4. E passar este ponto a ser o ponto 4.

Ponto 6. Este ponto, como o anterior ponto 4, deve pura e simplesmente desaparecer da matéria de facto assente, por ausência de qualquer prova que o sustente.

Não há qualquer indício; prova; exame médico que a corrobore. Somente as declarações do assistente, sendo que o arguido nega e as testemunhas R... e J... nada disto viram, nem sequer viram o arguido com o assistente junto à parede, sendo que os agentes da PSP que são testemunhas, afirmaram no seu depoimento terem visto o que quer que fosse.  A prova está gravada e os depoimentos transcritos e de toda ela, não há um excerto, passagem ou pormenor que confirme isto. Só o que diz o assistente, o que é manifestamente insuficiente, dada a demais prova e a declaração do arguido a negar o facto.

Ponto 7.  Neste ponto, não pode ficar assente o que nele consta, em face do que o assistente disse, do que disse o arguido e as testemunhas disseram.

As testemunhas R... e J..., viram o arguido a ser levado ao chão com o arguido a segurá-lo por um braço e os agentes da PSP e testemunhas referiram que o procedimento foi o normal. O braço não é torcido é puxado e o corpo levado ao solo.

Deve ficar a constar neste ponto o ponto 5 como seguinte teor:

Ponto 5: “Em face do que ficou assente no ponto 2, e após lhe ter sido encontrado produto estupefaciente, ao assistente foi referido que teria de ir à esquadra e para parar com a sua conduta de confrontação, mas, como a manteve, foi detido e passou a ser considerada uma algemagem de alto risco pera efeitos de actuação policial e o assistente foi levado ao solo pelo arguido, sendo puxado por um braço, tendo ficado com a cara encostada ao solo e com um joelho do arguido nas costas até ser algemado, no que o arguido foi auxiliado pelo agente A…” 

As provas que impõem esta alteração e fixação deste ponto da matéria de facto são as mesmas indicadas para o ponto 2.

Ponto 8. Este ponto não pode ser dado como assente, porque nunca os pés do assistente estiverem colocados na base das costas. Viola em grande grau as regras da experiência e é de impossível verificação, pois o arguido colocou um joelho nas costas do assistente e o pé de lado, e com as mãos procedeu à algemagem, sendo fisicamente impossível ao mesmo tempo, manter os pés do assistente junto à base das costas deste.

E também, neste caso não há, cotejando a prova e os depoimentos transcritos, linha a linha e para os quais se remete, qualquer momento ou referência que sustente este facto, que deve ser extirpado da prova assente.

Ponto 9. Deve ser retirada a expressão: “Em seguida” e passar a ser o ponto 6.

Ponto Onze: Deve ser o ponto 7 e ser retirado o segmento: “recebeu tratamento médico”, pois em nenhum documento hospitalar se refere que o arguido recebeu qualquer tratamento. Terá sido visto, nisso consente-se, agora dar como assente que foi tratado medicamente, isso não resulta da prova. Foi tratado a quê?

Que fez exames fez, está no relatório hospital e foram feitos, obviamente em face das queixas do arguido. Basta uma pessoa ir ao hospital e dizer que caiu e bateu com a cabeça para, necessariamente lhe ser feito RX e exame á coluna cervical. É normal. Isso não é tratamento médico. Tratamento implica ter havido diagnóstico de algo a ser tratado, o que não é o caso. Aliás, o que foi receitado, foi colocação de gelo. Nem medicamento o foi. Logo não podai ser dado como assente que recebeu tratamento médico. Aceita-se que se fixe que foi assistido por médico, não que tenha sido tratado de algum ferimento, pois não é isso que se retira da prova. 

As provas que isso impõem, são os documentos hospitalares juntos aos autos a fls…prova que de ser renovada também.

Ponto 12. Considerando o que se entende dever passar a constar nos pontos 2 e 7 da matéria assente, depois de corrigidos os erros apontados, deve ser retirado o segmento inicial e passar a constar, como ponto 8 que:

Ponto 8 (anterior 12): No seguimento da conduta do assistente e acima plasmada nos pontos 2 e 7 assentes, tendo o arguido L… de proceder a uma algemagem de alto risco, seguindo as técnicas em uso na PSP, o ofendido sofreu….”

As provas que a esta conclusão deve levar, são as mesmas indicadas para os pontos 2 e 7. Ut supra.

Ponto 13. Deve ser extirpado da matéria assente, devendo em seu lugar passar a constar o ponto 9, a referir que a ação do arguido foi a ajustada e tendente a imobilizar o arguido, no exercício normal e agente da autoridade.

Os pontos 14 e 15, devem ser retirados da matéria assente, por não haver prova que sustente tais factos.

As provas que sustentam esta conclusão são as mesmas indicadas para os pontos 2 e 7. Ut supra. Basta ouvir os depoimentos, na íntegra, e consultar, na íntegra, a sentença que condenou o assistente.

O ponto 17, deve ser alterado e passar a constar, o ponto 11, onde se diz tratamentos hospitalares, deve substituir-se por exames e atendimento hospitalar, pois em nenhum elemento probatório dos autos se menciona que o assistente foi tratado ou medicado. Foi examinado e aconselhado a aplicação e gelo nas zonas doridas e nada mais e isso é um resultado compatível com a algemagem e alto risco, como o referiu o formador da PSP nesta ária, a testemunha V….

66.       O erro na apreciação fáctica, fica assim esclarecido e elencado especificadamente ponto por ponto, com a indicação do que se deve dar por assente, estando as provas igualmente indicadas a cada ponto e não se trata de segmentos de prova, mas dos documentos e depoimentos vistos um a um, in totuum. Pois somente assim e fica com a verdadeira dimensão do erro gritante na apreciação da prova e se chega à mesma conclusão do arguido/recorrente, prova que está gravada e para a qual se remete, integralmente, juntando-se a transcrição integral de todos os depoimentos, bem como se remete para a prova documental constante nos autos.

67.       Sendo que nos presentes autos foram inquiridas, além das da acusação e que igualmente foram ouvidas no outro processo, sete testemunhas indicadas pelos arguidos, que confirma o que o arguido declarou. E tudo isto sustenta a teste do recorrente de que existiu manifesto erro na apreciação da prova.

68.      Existiram também factos dados por não provados, em que igualmente existiu erro na apreciação a prova e deviam ter sido dados por provados, havendo ainda uma flagrante contradição entre um facto provado e outro não provado, contradição existente entre o que se deu por provado e por não provado, posto que a prova é toda a mesma e a fundamental em que se estribou a decisão recorrida, tanto deve valer para uns factos como para outros.

69.      Isto é, no essencial, a decisão recorrida, estribou-se no depoimento do assistente, que apenas encontrou apoio numa pequena parte, nos dois depoimentos de R... e J..., mas relativamente à parte final, quando o assistente foi imobilizado. Nesta parte o R... até referiu em audiência ter pensado na altura: “ Mas o que é que o Gonçalo terá feito?”

70.      Ora, se o tribunal a quo deu credibilidade a esta versão do assistente, não podia depois dizer-se e dar consequentemente por não provado na Matéria dada Por Não Provada, na parte B da Fundamentação, mas, nesta parte, esta é uma decisão que se aceita por ser a pura verdade o que ali consta, com exceção dos pontos que foram melhor sindicados na motivação.

71.       Ou seja, depois do Tribunal aceitar a versão do assistente, que reputou ter um depoimento credível e isento numa parte e dar como não credível noutra parte, para assim se afirmar (e bem) não ser verdade que o arguido L... tenha feito e dito tudo o mais que o assistente disse o arguido ter feito e consta nos pontos “b” a “i” dos factos não privados, ressaltando flagrantemente uma outra contradição entre o que se deu por provado, nos pontos 6 e 7 da matéria assente e dar-se como não provado que o arguido tenha puxado o braço com força, como se diz na alínea “d” dos factos não provados, posto que, se o arguido teve, na altura de levar o assistente ao chão para o imobilizar e algemar, obviamente isso teve de ser feito com força, em face da postura conflituosa, intimidatória, alterada e não colaborante do assistente que, por isso mesmo foi detido, julgado e condenado pela sua conduta, tendo havido da parte do recorrente apenas e somente o cumprimento do dever.

72.      Existe aqui, como aliás em outras partes da decisão recorrida, evidente contradição, que se pretende ver declarada e corrigida por este mais Alto Tribunal, nos termos requeridos e que vão sendo explanados.

73.      De outra sorte, todos os agentes policiais ouvidos como testemunhas, referiram, no final dos respetivos depoimentos, que o arguido, Comissário L..., é um excelente Oficial, o melhor comandante que tinham tido, competente, responsável e dedicado ao serviço, tendo comandado a esquadra de Cascais e atualmente estando a comandar outra esquadra no Algarve. A isto se referiram, na parte final dos seus depoimentos, as testemunhas:  “a” “b” “c” “d”, pelo menos.

74.      Não havia qualquer outro elemento a considerar e esta factualidade constava da contestação do arguido ora recorrente, pelo que, atentas as afirmações das testemunhas a esta matéria e que estão gravadas e constam na transcrição, os pontos “m” “n” e “o”, dos factos dados por não provados  teriam e têm, que ser dados por provados e passar para a matéria assente. Sem margem para qualquer dúvida, sendo manifesto, também aqui, o erro na apreciação a prova; quer na fixação da matéria assente, quer na não assente, sendo ainda flagrantes as contradições, entre a motivação e a fundamentação. Sendo que, em caso de dúvida, se um evento leva a outro ou não (prova indireta ou facto instrumental), toda a prova, na dúvida, esta favorece o arguido. O princípio in dúbio pró reo, isso impõe.

75.       Sintetizando a factualidade erradamente dada como assente é a que acima se indicou e se encontra vertida nos pontos supra indicados da fundamentação de facto, devendo passar a ser dado como não assente que o arguido não praticou os factos impugnados, devendo a prova assente ser a que supra se sindicou e indicou, depois de corrigidos os erros encontrados e apontados, conforme supra vai plasmado.

76.       As provas que impõem decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal a quo, nos pontos indicados, são as que acima se indicou expressamente, mas repetem-se: São os documentos constantes nos autos e os depoimentos do arguido e dos agentes da PSP (sete!), sendo que pelo menos quatro deles são presenciais e confirmam as declarações do arguido que o inocentam de qualquer crime.

77.      Vai reproduzida na motivação a transcrição de todos os depoimentos, e vão, mais legíveis em ficheiro anexo, existindo inda suporte áudio no sistema existente nos tribunais, mas que igualmente segue a gravação em suporte de CD. Prova esta que, cumprindo-se os requisitos legais, se pretende ver integralmente renovada, em julgamento publico, que se requer, única forma de se verificar o erro judiciário cometido. E são os depoimentos como um todo e a prova documental nos autos, que devem ser reapreciados e não parte deles, porque somente ouvindo todos os depoimentos, é que se pode verificar que não há prova que permita dar como assente o que se deu e permite verificar a inexistência de qualquer prova contra o arguido.

78.      Fixando-se a matéria assente como requerido e a matéria não assente, na parte impugnada, de igual modo, tendo sido violadas entre outras, as normas do artigo 127.º e artigo 374.º, n.º 2, ; 64 e 357.º, do Código de Processo Penal; os artigos 143.º, n.º 1; 145.º n.º 1, “a” e 2 e 132.º, n.º 2, “m”, sendo Nula a sentença, nos termos do artigo 379.º do CPP.

79.       Ao não atender ao princípio in dúbio pró reo, o Tribunal “a quo” violou os artigos 18.º; 25.º, nº 1; 26.º; 32.º, n.º 8; 34.º, n.º 3; e o artigo 204.º da Constituição da República.

80.      Assim sendo, a matéria de facto que tem de se considerar assente, depois de corrigidos os vícios de que enferma e acima vão coligidos, deve levar a concluir da inexistência de prova de cometimento de algum crime pelo arguido recorrente, decretando-se a sua absolvição integral.

C – Recurso de Direito

81.      Como é de concluir, o presente recurso versa, essencialmente sobre a errada apreciação  a prova e má aplicação da lei, nomeadamente esquecendo uma decisão anterior, e, posto isso, considerando o que se disse sobre os pontos de facto que se sindicaram acima, como é evidente, sendo corrigida a decisão no sentido propugnado pelo recorrente, obviamente, este terá de ser absolvido integralmente do crime pelo qual foi acusado. Comos e espera, pois outra coisa se não pode concluir. Não se trata de diferente apreciação a prova. Trata-se de manifesto erro nessa apreciação por parte da sentença recorrida. Salvo o muito e devido respeito que se tem pela Tribunal a quo.

82.       Nem outra pode ser, a nosso ver, a conclusão sob pena do erro e inerente injustiça se manter, no que se não acredita e se refere sem conceder e por dever de patrocínio, sendo que, ainda que assim se não considere, no que se não acredita e se refere sem conceder, sempre se diga que o arguido, agiu no pleno exercício de funções e nunca exorbitou das mesmas, inexistindo qualquer ilicitude no seu comportamento.

83.      E, em tese académica, o que, mais uma vez se refere sem conceder e por dever de patrocínio, mesmo que se venha a considerar ter havido exagero na força empregue para a detenção, nãos e pode omitir que o assistente foi detido; a detenção foi validada pelo Tribunal; o assistente foi constituído arguido, julgado e condenado por ter cometido um crime na pessoa do Comissário L..., que agiu somente em pleno exercício de funções e não exorbitou das mesmas.

84.       E, nessa medida, nunca se pode considerar ter havido conduta especialmente censurável do arguido, logo, a haver crime, o que se não concede, sempre o mesmo seria na sua forma simples e nunca na forma qualificada, sendo que as circunstâncias qualificativas que constam do artigo 132.º n.º 2 do CP, são meramente exemplificativas e é preciso que, em cada caso, a conduta do agente do crime revele especial censurabilidade e perversidade, o que se atinge em sede apreciação a culpa, para se chegar á qualificação. E isso, no caso em apreço, nunca existiu.

85.       A atuação do arguido e a forma como foi feita a detenção, do assistente seguiu rigorosamente o procedimento ensinado na PSP. Todos os agentes ouvidos nisso confirmaram e o técnico ouvido e que ensina estas técnicas na PSP, igualmente o confirmou, isto é, o arguido não fez nada além do que lhe é ministrado pela PSP. Agiu assim em conformidade com as regras de atuação definidas pela Policia. Mesmo que se considere ter havido excesso de zelo, o que se refere sem conceder, fez o que lhe determinam as normas de procedimento da PSP, quando se tem de algemar alguém que não colabora na sua detenção, passando a ser uma atuação e alto risco e a segurança tem de ser garantida. Não houve, por isso, nenhuma atuação fora do que é o normal da atuação policial, motivo pelo qual inexiste fundamento para qualificar a conduta do arguido, como especialmente censurável ou eivada de perversidade.

86.       Isto a dar-se por assente que o arguido tivesse cometido algum crime, o que se refere sem conceder. Nunca se pode esquecer que o assistente foi julgado e condenado e, para isso, o arguido o teve de deter e segundo as técnicas previstas na PSP. Nada mais, o assistente tinha cometido um crime e estava na posse de drogas. Tinha de ser conduzido á esquadra e só o podia fazer no carro patrulha algemado, porque são estas as normas em funcionamento na PSP, pelo que nenhum alternativa teve que não passassem pela algemagem no chão seguindo os procedimentos e, por isso, caso se considere haver crime, o que se não aceita, nunca o crime seria qualificado, somente por ser cometido por agente da força pública.

87.      Seria sempre preciso que, no seu cometimento, o agente revelasse especial censurabilidade ou perversidade, e esta afirmação teria de ser manifestada na apreciação a conduta, relevando, para este efeito, que tivesse havido um manifesto desvalor de atitude, que não houve. O juízo ético-jurídico de censura, que se manifesta na atribuição da culpa concreta, no caso concreto, tem de revestir uma especial relevância em função do especial desvalor retirado na forma e intenção no cometimento dos factos. O que neste caso concreto, tal se não verifica.

88.      O arguido é um ainda jovem Oficial da PSP. Um excelente comandante de homens, que todos, em audiência disseram ser o melhor comandante que já tiveram; agiu em sede de uma operação policial, em local suspeito, com indivíduos que são sempre desconhecidos e, é certo que eram cinco e quatro acataram as ordens de atuação policial, tudo decorrendo sem incidentes e ouve outro que foi algemado e conduzido á esquadra, sem que algum incidente houvesse.

89.       Apenas o assistente quis, segundo as suas palavras “questionar” e impedir a ação da PSP, promovendo o que chamou de “altercação” e o arguido, enquanto comandante da força pública no local, apenas e somente teve de manter a autoridade e impedir a continuação das injúrias. Houve condenação do Assistente e nenhuma especial censura merece a atuação do arguido.

90.       O qual tem de ser absolvido, mas, sem conceder, nunca poderia ser punido pelo crime qualificado, sendo a pena exagerada em função do crime cometido pelo assistente e pelo qual foi julgado e condenado. O que justifica a conduta do arguido e, por isso nenhum crime cometeu, pois estava no cumprimento de um dever e isso afasta a ilicitude, conforme o impõem os artigos 32 e 33 do CP.

91.       Não há dúvidas que o arguido estava em missão de serviço com outros elementos; que todos se identificaram e ninguém teve duvidas que eram agentes da PSP; o local era tido por suspeito; eram 02H20 da madrugada; dois dos visados tinham produto estupefaciente e o assistente quis questionar a intervenção policial, sendo certo que não se provou qualquer abuso na ida da polícia ao local e legitimidade na atuação ao pedir para se encostarem e serem sujeitos a revista.

92.      E toda a atuação subsequente, incluindo levar o assistente ao solo para o algemar, está de acordo com os procedimentos policiais, em vigor na PSP. Logo, sempre a conduta do arguido estava legitimada, mas, ainda que assim não fosse, o que se refere sem conceder, nunca a conduta se poderia catalogar como especialmente perversa ou censurável, e assim, também por esta via, deveria ter havido absolvição, ou, se assim não se entender, o que se refere, sem conceder e por dever de patrocínio, deveria ser aplicado a figura do crime simples e a pena especialmente atenuada, numa pequena multa.

Em suma;

93.       Tudo isto motiva o presente recurso, que vem arguir as nulidades invocadas em “A”, requerer uma nova reapreciação da prova e sejam corrigidos os vícios invocados em “B”, absolvendo-se o recorrente, ou, caso assim se não considera, o que se refere sem conceder, deve considerar-se justificada a atuação do arguido, ou, sem conceder e por dever de patrocínio, que a pena seja reduzida, no mínimo legal, nomeadamente até uma admoestação, ou multa nos limites mínimos.

94.       Foram violados as disposição legais já citadas supra e para as quais se remete, nomeadamente as normas do artigo 127.º e artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal; os artigos 64 e 357.º do mesmo CPP; os artigos 32.º; 33.º; 48.º; 50:º; 71 e 72.º, 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2 “m” todos do Código Penal, sendo Nula a sentença, nos termos do artigo 379.º do CPP.

95.       Ao não atender ao princípio in dúbio pró reo, o Tribunal “a quo” violou os artigos 18.º; 25.º, nº 1; 26.º; 32.º, n.º 8; 34.º, n.º 3; e o artigo 204.º da Constituição da República.

Nestes termos e demais de Direito que V.ª s Exas. Doutamente suprirão, requer-se a V.ªs Ex.ªs que revoguem o acórdão recorrido pelos motivos de facto e de direiro supra invocados.

**

Respondeu ao recurso, nas fls.1279 a 1295 dos autos, o Mº.Pº., onde conclui:

(transcreve-se)

1.         Nestes autos, o recorrente foi condenado na pena de 4 meses de prisão, substituída, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1 e 47.º, n.º1 ambos do Código Penal, por 120 dias multa, à taxa diária de € 15,00, perfazendo a multa global de € 1.800,00, pela prática, como autor material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º1 e 145.º, n.º1, alínea a) e n.º2 do Código Penal, com referência ao art. 132.º, n.º2, alínea m) do mesmo diploma legal.

2.         Consta da sentença recorrida, para dar como assentes os factos que considerou provados, que o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção nas declarações do assistente- declarações que esse mesmo Tribunal considerou e, a nosso ver, acertadamente, genuínas, sinceras, credíveis e coerentes- devidamente conjugadas com a prova testemunhal, com os documentos juntos aos autos, maxime, as fotografias de fls. 6, a ficha clínica do Hospital de Cascais junta a fls. 18, e com a prova pericial, ou seja, o relatório de exame médico directo de fls. 44 a 46.

3.         O tribunal a quo justificou e explicou, de forma clara e detalhada, porque motivo acreditou na versão dos factos apresentada pelo assistente na parte atinente ao preenchimento do crime por cuja prática o recorrente veio a ser condenado, e porque motivo entendeu não merecerem credibilidade as declarações do recorrente, revelando, de forma esclarecedora e suficientemente pormenorizada, o raciocínio lógico que esteve subjacente a tal convicção.

4.         Na fundamentação da decisão recorrida o tribunal a quo aborda e analisa as declarações prestadas pelo recorrente em sede de audiência de discussão e julgamento, os depoimentos de todas as testemunhas inquiridas no decurso da audiência de julgamento, os documentos constantes dos autos e explica os motivos pelos quais deu como provada a factualidade constante do elenco dos factos assentes.

5.        Não ocorre qualquer nulidade, nomeadamente a prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal.

6.        A circunstância de o Tribunal a quo não ter feito constar do elenco dos factos provados a condenação que o assistente sofreu no processo abreviado n.º 1381/11.6PBCSC, não integra qualquer omissão de pronúncia e, consequentemente, nulidade.

7.        Da análise da sentença recorrida não resulta que aí se tenha decidido, no que tange à matéria de facto, nomeadamente, no que respeita ao julgamento dos factos dados causa como provados, perante uma qualquer situação de dúvida, de factos incertos ou de non liquet.

8.        A simples existência de versões díspares e até contraditórias sobre factos relevantes não implica que se aplique, sem mais, princípio "in dubio pro reo". Não foi, pois, violado este princípio.

9.         Não há qualquer erro na apreciação da prova. Antes, o tribunal a quo valorou correctamente a prova produzida.

10.       A actuação do recorrente, que é Oficial da PSP (Subcomissário) dada como provada na sentença recorrida, é objectivamente grave e especialmente censurável e reprovável, para além de ser claramente excessiva e desproporcional, existindo evidente abuso de autoridade, justificando-se, pois, a qualificação do crime.

11.       Deverá, pois, ser mantida a sentença recorrida.

**

Respondeu também o Assistente Gonçalo Afonso Ferreira Cruz, a fls. 1296, argumentando que o recurso deve improceder e manter-se a decisão recorrida.

Neste Tribunal a Ex.m.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, a fls. 1303 dos autos, aderindo à resposta do Mº.Pº. na 1ª. Instância.

Cumpridos os vistos, procedeu-se a conferência.[1]

 Cumpre conhecer e decidir.

II- MOTIVAÇÃO.

É jurisprudência constante e pacífica (acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.1999, CJ VII-I-247 e de 20-12-2006, em www.dgsi.pt) que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação (art.s 403º e 412º do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 410º nº 2 do Código de Processo Penal e Ac. do Plenário das secções criminais do STJ de 19.10.95, publicado no DR Iª série-A, de 28.12.95).

             No caso em apreço, o recorrente invoca a falta de fundamentação da sentença, o erro de julgamento, a verificação dos vícios a que alude o artigo 410º-2 a) b) e c) do C.P.P.- a insuficiente matéria de facto para a decisão, a contradição insanável da fundamentação e decisão e o erro notório na apreciação da prova.

           Para melhor apreciação das questões colocadas, vejamos a matéria fixada na sentença e a fundamentação que dela fez o Tribunal.

(transcreve-se)

1. O arguido A... é agente da PSP, sendo o arguido L... subcomissário e, em Outubro de 2011, prestavam serviço na 50.ª Esquadra da PSP de Cascais, nesta vila de Cascais.

2. No dia 15 de Outubro de 2011, pelas 02H20, na Rua Major Escrivanis, sita em Cascais, o arguido L..., que se encontrava no exercício das suas funções, abordou o assistente G... e outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-lhes ordenado que se encostassem à parede.

3. Tendo o assistente questionado os elementos da PSP sobre a sua conduta, o sub-comissário L..., desagradado com a atitude do assistente, aproximou-se dele quando se encostou ao muro, de costas, para efectuar a revista.

4. Quando o assistente se encontrava com as palmas das mãos encostadas à parede e os pés afastados, o arguido L... colocou-se atrás de si e desferiu-lhe joelhadas nas pernas.

5. De seguida, o arguido L... revistou o assistente, retirando-lhe as chaves, o Ipod, o porta cartões e o chapéu.

6. Depois de o revistar, o arguido L... agarrou  o assistente pelo braço e puxou-o, de modo a que ficasse de frente para si.

7. Acto continuo, o arguido L... agarrou novamente o assistente pelo braço e torceu-o com força, projectando-o para o chão com violência.

8. Quando se encontrava no solo, de barriga para baixo, o arguido L... agarrou nas pernas do assistente, após o que colocou os pés deste junto à base das costas.

9. Em seguida, o arguido L... colocou um dos joelhos, fazendo peso com o corpo, em cima das costas do assistente, na zona da caixa torácica, após o que juntou as mãos do assistente na base das costas e algemou-o.

10. Durante um período de tempo que não se logrou precisar com rigor, mas não inferior a 2 (dois) minutos, e que não excedeu os 5 (cinco) minutos, o arguido L... manteve o assistente naquela posição, permanecendo a fazer força com o joelho e com o peso do seu corpo sobre a caixa torácica.

11. Pelas 06H46 do dia 15 de Outubro de 2011, o assistente deslocou-se ao Hospital de Cascais, onde recebeu tratamento médico, tendo feito exames (Raio-X coluna cervical, face e crânio, mandíbula), e foi medicado e indicada a aplicação de gelo.

12. Em consequência directa e necessária da descrita conduta do arguido L..., o ofendido sofreu dores e trauma da face na região mandibular com escoriações e edema na região malar bilateral e periorbitária esquerda, escoriação no ombro direito, escoriações com equimoses na região cervical posterior, lesões que lhe determinaram 20 (vinte) dias de doença, sem incapacidade para o trabalho profissional.

13. O arguido L..., ao atingir voluntariamente o corpo da vítima da forma supra descrita, quis provocar-lhe lesões no corpo e na saúde, o que conseguiu, bem sabendo que era elemento da PSP, que se encontrava no exercício de funções, qualidade da qual se aproveitou para agir daquela forma, excedendo o poder do seu cargo e violando os deveres inerentes à sua qualidade de agente de autoridade.

14. Ao molestar fisicamente o assistente da forma supra descrita, o arguido L... quis, ainda, aproveitar-se da posição de superioridade que a autoridade em que estava revestido lhe conferia sobre o assistente, que se encontrava impedido de se defender, para o humilhar na presença dos outros indivíduos que o acompanhavam, por ter questionado a sua autoridade, violando os deveres de correcção e de urbanidade que sobre si recaíam.

15. O arguido L... sabia que as suas condutas afectavam a autoridade e credibilidade da administração do Estado e que eram proibidas e punidas por lei.

16. Em consequência dos factos descritos em 4. e 7. a 10., no dia 15 de Outubro de 2011, o ofendido G... deu entrada no Hospital de Cascais e recebeu assistência hospitalar no serviço de urgência.

17. Pelos tratamentos hospitalares prestados ao ofendido G..., a que é feita referência em 16., existe um débito hospitalar no valor de € 108,00.

Mais se provou, com interesse para a decisão do mérito:

18. O arguido L... possui, como habilitações literárias, a licenciatura em Ciências Policiais.

19. O arguido exerce a actividade profissional de subcomissário da P.S.P., auferindo o salário líquido mensal de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros), ao qual é descontado um quinto do vencimento desde que se encontra suspenso de funções.

20. O arguido é divorciado e vive com a sua companheira, agente da P.S.P..

21. Não tem filhos.

22. Paga a quantia mensal de € 500,00 (quinhentos euros), a título de renda de casa.

23. O arguido L... não tem antecedentes averbados no respectivo registo criminal.

*

24. O arguido A... exerce a actividade profissional de agente da P.S.P., auferindo o salário líquido mensal de € 950,00 (novecentos e cinquenta euros).

25. O arguido vive com a esposa, que exerce a actividade profissional de empregada de balcão numa sapataria.

26. O arguido tem averbada no registo criminal uma condenação, pela prática, no ano de 2010, de dois crimes de injúria e de um crime de dano simples, tendo sido condenado, em cúmulo jurídico, na pena única de 30 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, a qual foi declarada extinta, por despacho datado de 01/02/2013, em virtude do pagamento.

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B) MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA

Com relevância para a decisão da causa não se provou a seguinte matéria de facto:

a) – que, nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas em 2., o arguido A... tivesse abordado o assistente G... e os outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-lhes ordenado que se encostassem à parede;

b) – que, quando o assistente e E... se dirigiram para o muro, ficando de costas para os elementos da PSP, o agente A... desferiu, sem qualquer justificação, uma bofetada que atingiu E... na cara;

c) - que, nas circunstâncias referidas em 4., o arguido L..., dirigindo-se ao assistente, tivesse dito: “Abre as pernas cabrão, abre mais as pernas, caralho”;

d) – que, nas circunstâncias referidas em 6., o arguido L..., ao agarrar o assistente pelo braço, e ao puxá-lo, o tivesse feito com força;

e) - que o arguido L... questionou o assistente sobre quem tinha batido em quem, ao que este respondeu que tinham batido no seu amigo;

f) – que, na altura em que o assistente se encontrava caído no solo, algemado, com o arguido L... em cima de si, fazendo força com o joelho sobre a sua caixa torácica, o arguido A... lhe calcou, com força, a cara com o pé, atingindo-o no nariz, olhos, fonte e testa;

g) – que o comportamento do arguido L..., a que é feita menção nos pontos 8. a 10., tivesse perdurado durante cerca de 15 minutos, e/ou que, ao assim proceder, o arguido L... tivesse agido de comum acordo e em comunhão de esforços com o arguido A...;

h) – que, enquanto mantinham o assistente naquela posição, a sufocar, os arguidos lhe diziam, em tom jocoso: “Então campeão, já não falas? Pois isto é assim, tens a mania mas a gente trata de ti. Tens direito a um tratamento especial para campeões. Olha aí que o rapaz está a ficar azul, parece que vais desfalecer”;

i) – que os arguidos L... e A... agiram de comum acordo e em conjugação de esforços e objectivos;

j) – que o arguido A... quis provocar lesões no corpo e na saúde do ofendido, bem sabendo que era elemento da PSP, que se encontrava no exercício de funções, qualidade da qual se aproveitou para agir daquela forma, excedendo o poder do seu cargo e violando os deveres inerentes à sua qualidade de agente de autoridade;

k) – que o arguido A... sabia que as suas condutas afectavam a autoridade e credibilidade da administração do Estado e que eram proibidas e punidas por lei;

l) – que não houve agressões por parte de qualquer agente policial, muito menos por parte do arguido L...;

m) – que o arguido L... é um Oficial de Polícia de elevado mérito e capacidade, tendo comandado inúmeras Esquadras, entre elas a de Investigação Criminal, tendo sob seu comando dezenas de homens, Chefes e Agentes, pautando sempre por lealdade, transparência e seriedade em todas as actuações;

n) que o arguido L... é tido pelos seus superiores e demais colegas como um bom Oficial, capaz, competente e dedicado;

o) que o arguido L... dedicou sempre ao serviço toda a sua inteligência, zelo e dedicação, muitas vezes fora do horário de serviço;

p) – que o arguido A... é um agente policial de elevado mérito e capacidade, tendo feito parte das equipas de carro patrulha durante muito tempo;

q) que o arguido A... é tido pelos seus superiores e demais colegas como um bom agente, capaz, competente e dedicado;

r) que o arguido A... dedicou sempre ao serviço toda a sua inteligência, zelo e dedicação, muitas vezes fora do horário de serviço.

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C) MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

O tribunal fundamentou a sua convicção, quanto aos factos constantes da pronúncia e do pedido de indemnização civil considerados como provados, na análise ponderada das declarações do assistente G..., que prestou um relato que se afigurou genuíno, sincero, credível e coerente, devidamente conjugado com a prova testemunhal, com os documentos juntos aos autos, designadamente as fotografias juntas a fls. 6, resumo de informação clínica do Hospital de Cascais, de fls. 18, e factura de fls. 185, e com a prova pericial (relatório de exame directo de fls. 44 a 46).

No caso vertente, o testemunho do assistente G..., apesar da posição que ocupa nos presentes autos, foi eloquente, convincente e elucidativo quanto à concreta situação de agressão física de que foi vítima por parte do ora arguido L..., tendo respondido de forma congruente a todas as questões que lhe foram colocadas. No seu discurso não se denotou qualquer pretensão vingativa ou de retaliação em relação ao arguido, ou de querer enfatizar defeitos deste, pelo contrário, a sua postura em julgamento foi de evidente naturalidade, procurando tão-só esclarecer o tribunal, de forma clara, objectiva e pormenorizada, quanto aos aspectos mencionados na pronúncia, explicando ainda em juízo as circunstâncias da actuação do arguido e os motivos que o levaram a assim proceder. A este respeito adiantou que, na data dos factos, encontrando-se em Cascais, sentado nuns bancos situados junto à porta do restaurante “Panorama”, onde tinha estado com uns amigos num jantar de aniversário, foram abordados por uma patrulha de agentes da P.S.P., vestidos à civil, que lhes pediram para se encostarem à parede, a fim de serem revistados. Na ocasião questionou os agentes do motivo de terem agredido um dos seus amigos, tendo-se o arguido L... dirigido a si e começado a atingi-lo com joelhadas, na parte de trás dos joelhos das duas pernas, por forma a forçá-lo a afastar ainda mais as pernas, após o que procedeu à sua revista, pegando-lhe de seguida pelo pulso esquerdo, por forma a virá-lo na sua direcção, e, após uma breve troca de palavras, pegou de novo no pulso esquerdo, projectando-o contra o chão. Com o ofendido no chão, o arguido dobrou as suas pernas para trás, por forma a conduzir os calcanhares do ofendido até à base das costas, algemou-lhe as mãos atrás das costas, e colocando os seus joelhos em cima das costas do ofendido, na zona da caixa torácica, assentou o seu peso em cima das costas do ofendido, o que, para além de lhe causar dores, dificultou bastante a sua respiração, tendo-o mantido nesta posição durante cerca de dez minutos, enquanto os seus amigos, que foram sujeitos a revista, permaneciam encostados à parede. O assistente explicitou que, no decurso deste episódio, foi sempre o arguido L... o único agente da P.S.P. que se lhe dirigiu, não se lembrando de ter visto a cara de qualquer outro agente. Adiantou, ainda, que enquanto se encontrava imobilizado no chão, com o lado direito do rosto assente na calçada, outra pessoa, cuja cara não conseguiu visualizar, assentou um dos pés em cima da sua cabeça e ficou a fazer pressão com a bota na sua cabeça, contra a calçada, tendo-o pisado na zona da orelha, vista, nariz, queixo, maxilar e pescoço, o que se manteve durante todo o tempo em que esteve a ser manietado pelo arguido L.... Em consequência destes factos, careceu de receber assistência hospitalar, tendo-o os seus amigos levado ao Hospital de Cascais, logo que foi autorizado a sair da Esquadra da PSP, para onde fora conduzido. Confrontado com as fotografias de fls. 6, referiu que as mesmas lhe foram tiradas no próprio dia dos factos, a caminho do hospital.

As declarações do assistente G... foram confirmadas, no essencial, pelo depoimento da testemunha J…, que, na data dos factos, se encontrava na companhia do primeiro, no momento em que surgiu a patrulha da PSP. Esta testemunha começou por referir ter assistido ao emprego de força exagerada, pela polícia, sobre o assistente, tendo visto este a ser imobilizado no chão, pelo ora arguido L..., que, já com o ofendido no chão, de peito para baixo, lhe colocou um joelho nas costas e um pé em cima da cabeça, de tal forma que o ofendido não se conseguia mexer, por estar completamente imobilizado. A testemunha G... adiantou que, dos agentes da P.S.P. presentes no local, foi o arguido L... o único que teve intervenção nesta imobilização do ofendido, bem como não ter visto um qualquer comportamento do arguido que justificasse tal comportamento por parte do arguido. Adiantou, ainda, que a aludida imobilização do ofendido G..., no chão, durou “no mínimo dois minutos e no máximo cinco minutos”.

Também a testemunha R... relatou os factos de uma forma, no essencial, coincidente com a versão do assistente e da testemunha J..., tendo adiantado que, na data dos factos, encontrando-se na companhia do ofendido e de outros amigos, sentados numas escadinhas situadas nas proximidades do restaurante “Panorama”, apareceu a polícia. Na ocasião, levantaram-se e encostaram-se à parede, enquanto os agentes da polícia procediam à sua revista. Logo depois de ter sido revistado, viu o ofendido G... “a voar” e a ser projectado no chão, tendo a testemunha referido que a queda do ofendido no chão foi violenta. Já com o ofendido no chão, de barriga para baixo, o arguido L... colocou um joelho nas suas costas, a empurrar contra o chão, e um pé na cara, sendo notório que o ofendido estava a sentir dificuldades em respirar, porque tinha o peso do arguido sobre a coluna, tratando-se tal procedimento do arguido, na opinião da testemunha, de uma coisa sem razão de ser, uma coisa desnecessária, não tendo o ofendido tido qualquer comportamento que justificasse tal procedimento por parte do arguido. Adiantou, ainda, não ter ouvido qualquer conversa entre o ofendido e o arguido ou outro qualquer agente da PSP presente no local.

Ambos os depoimentos testemunhais, na matéria aludida, foram relevantes, atento o conhecimento directo demonstrado, tendo ambas as testemunhas deposto com isenção, de forma explicativa e circunstanciada, e sem qualquer outro desígnio que não o de colaborar com o tribunal na descoberta da verdade dos factos, motivo pelo qual nos mereceram credibilidade.

No que concerne às joelhadas nas pernas, projecção com violência para o chão e imobilização do ofendido no solo, de barriga para baixo, enquanto fazia força com o joelho sobre a sua caixa torácica, importa ponderar que este facto encontra suporte de prova não apenas nas declarações da assistente e no depoimento das testemunhas J... e R..., mas sobretudo na consistência que as mesmas revelam tendo em conta o teor do resumo da informação clínica, junto a fls. 18, de onde resulta que no dia 15/10/2011, pelas 06H46, ou seja, cerca de quatro horas após a ocorrência dos factos, o ofendido G... deu entrada nos serviços de urgência do Hospital de Cascais Dr. José de Almeida, apresentando “traumatismo da face com pé, escoriação com cerca de 6 cm e algum edema na região malar e periorbitária externa à esquerda, edema importante a nível malar e da ATM direita com cerca de 6 cm, escoriações no ombro direito, escoriações com algumas equimoses na região cervical posterior”, e do relatório médico-legal de fls. 44 a 46, resultando claro e evidente deste elemento de prova pericial, que as lesões descritas denotam terem sido produzidas por objecto contundente ou actuando como tal, compatíveis com o mecanismo de lesão descrito, devendo ter demandado para a sua cura um período de vinte dias, sem incapacidade para o trabalho profissional. 

A testemunha H…, agente da P.S.P., deu conta ao tribunal de, na data dos factos, integrar a patrulha de agentes que se deslocou ao local com o propósito de proceder a uma acção de fiscalização de estupefacientes, por aquele sítio se encontrar referenciado como sendo uma zona em que tinham lugar actos de tráfico e de consumo de produtos estupefacientes, fazendo parte, juntamente com o ora arguido L..., do grupo de cinco agentes, que, trajando à civil, primeiro chegaram ao local, tendo adiantado que, depois de se terem identificado, mediante a exibição da carteira profissional, informaram o grupo, de cerca de cinco indivíduos, que aí encontrava, que estavam no local para proceder a uma acção de fiscalização de produtos estupefacientes, tendo ordenado aos mesmos que se encostassem à parede, a fim de serem revistados. Acrescentou que, na ocasião, na sequência da revista, foi encontrado um “charro” na posse do ofendido, e que, nesse momento, este ficou exaltado, resistiu à detenção, não queria ser algemado e estava a esbracejar, tendo afirmado, dirigindo-se aos elementos policiais presentes no local “a polícia é sempre a mesma coisa, é sempre a mesma merda, vocês não mandam aqui, polícias do caralho”, e, dirigindo-se directamente ao arguido L..., perguntou-lhe “vais-me bater ?”, tendo sido nesta altura que o ora arguido L... interveio, puxando o ofendido pelo braço, levando-o para o chão e procedendo à sua algemagem, tendo ainda adiantado ter considerado o procedimento de algemagem adoptado pelo arguido adequado, em face da resistência oferecida pelo ofendido.

A testemunha A…, agente da PSP, que tomou parte na referida operação policial, referiu que no momento em que chegou ao topo da escadaria, os indivíduos abordados já estavam encostados à parede, com excepção de um deles, o ora assistente, que dizia que os polícias não podiam fazer aquilo, tendo partido logo com agressividade para o arguido L..., com quem “esteve quase cara a cara”, a dizer que os polícias não podiam fazer aquele tipo de abordagem, que não tinham autoridade. A testemunha adiantou, ainda, que de acordo com os procedimentos adoptados na polícia, quando os indivíduos alvo de revista não oferecem resistência, são encostados à parede, com os braços assentes na parede e de pernas abertas, sendo algemados de pé. Pelo contrário, nas situações que designou de “algemagem de alto risco”, os visados têm de ir para o chão, com vista a proceder-se à sua imobilização.

A testemunha AC…, agente da PSP, adiantou que tomou parte nesta operação policial, tendo explicitado que dos agentes que se dirigiram ao local foi o primeiro a subir a escadaria, acompanhado de um outro agente, de apelido Araújo, seguindo o ora arguido L..., de quem era subordinado, um pouco mais atrás. Adiantou que, ao chegar ao cimo da escadaria, depararam com um grupo de cinco indivíduos, junto de quem se identificou, exibindo a carteira profissional, e a quem deu instruções para que os mesmos se encostassem à parede. Enquanto quatro dos indivíduos acataram logo, e foram para a parede, o ofendido não o fez, tendo-se dirigido ao arguido L..., em tom agressivo, a esbracejar, e, cara a cara, afirmado “vocês são sempre a mesma merda, vocês não podem fazer tudo o que querem”, não se recordando a testemunha que, para além desta, o ofendido tivesse proferido qualquer outra frase ou expressão. Referiu, ainda, que, em face de tal comportamento por parte do ofendido, se impunha efectuar uma abordagem de alto risco, o que implicava a ida do ofendido para o chão, a fim de aí ser algemado e revistado.

A testemunha LR…, agente da PSP, actual companheira do arguido L..., adiantou que tomou parte nesta operação policial, tendo-lhe incumbido permanecer nas escadas a fazer a segurança. Presenciou a revista a que o grupo de indivíduos foi sujeito, recordando-se de ter sido apreendida droga na posse de dois deles. Não se recorda de qual foi o agente que procedeu à revista ao ofendido, lembrando-se que este, na ocasião, proferiu expressões injuriosas, designadamente que os polícias “eram ladrões, que era sempre a mesma merda, polícias do caralho”.

Procedendo ao confronto dos depoimentos testemunhais dos quatro agentes da PSP referidos (…), facilmente se surpreendem contradições, designadamente no que concerne ao comportamento imputado ao ofendido e às expressões por este verbalizadas na ocasião, motivo pelo qual não nos puderam merecer credibilidade, porquanto se encontram em contradição com a versão dos factos relatada pelo próprio assistente e pelas testemunhas J... e R..., em quem o tribunal, pelos motivos apontados, acreditou.

Pelo mesmo motivo, não nos puderam merecer credibilidade as declarações prestadas pelo arguido L..., quando negou a prática dos factos, e referiu ter-se sentido ameaçado pelo ofendido G..., que, depois de lhe ter sido comunicado que teria de ser conduzido à esquadra, para ser elaborado o expediente por consumo de estupefacientes, “explodiu” e começou a ofendê-lo, afirmando “a polícia é sempre a mesma merda, vocês pensam que podem fazer tudo o que querem, polícias do caralho”, ao mesmo tempo que avançava na sua direcção com uma postura agressiva e intimidatória, dizendo, “vais-me bater, é ?”, tendo sido por tal motivo que procedeu à manietação do ofendido no solo, com recurso à algemagem, tendo asseverado que ninguém pôs o pé em cima da cara do ofendido. Na realidade, a versão apresentada pelo arguido encontra-se em patente contradição com a versão dos factos apresentada pelo assistente e pelas testemunhas J... e R..., sendo certo que, nos termos em que foi relatada pelo arguido, a mesma não encontra suporte probatório no depoimento de nenhum dos quatro agentes da PSP, inquiridos na qualidade de testemunha, a que acima se aludiu.

As testemunhas Carlos Jesus e Vítor Francisco, agentes da PSP, não trouxeram qualquer contributo para a decisão da matéria de facto, nada sabendo de relevante, tendo-se o primeiro limitado a adiantar que, na data dos factos, recebeu uma chamada para se dirigir ao local da ocorrência, a fim de assegurar o transporte de dois indivíduos, um dos quais o ora assistente, para a esquadra. No local, ambos os indivíduos foram conduzidos para o carro patrulha, tendo efectuado o seu transporte para a esquadra. A testemunha V…, por seu turno, referiu não ter presenciado os factos, tendo adiantado que na P.S.P. trabalha praticamente em exclusividade na área da formação, sendo responsável pela formação em técnicas de algemagem, e explicado, em audiência, as diferentes técnicas de algemagem adoptadas pelas forças policiais.

O tribunal socorreu-se, ainda, de uma presunção natural no que tange aos factos subjectivos constantes dos pontos 13., 14. e 15., porquanto os factos objectivos provados, de acordo com as regras da experiência comum, permitem inferir estes factos subjectivos. Que o arguido L... agiu com vontade livre e consciente corresponde ao normal do agir humano, nada tendo sido alegado que ponha em causa essa liberdade de decisão.

Os factos dos pontos 18. a 22. e 24. e 25. resultaram provados, tendo por base as declarações de cada um dos arguidos, quanto às respectivas condições pessoais, laborais e económicas, que se consideraram credíveis, não sendo postas em causa, mostrando-se a ausência de antecedentes criminais do arguido L... certificada a fls. 670, com data de emissão de 24/02/2016, e os antecedentes criminais do arguido A... certificados a fls. 646 a 648, com data de emissão de 15/02/2016.

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No que tange à matéria de facto considerada como não provada, tal ficou a dever-se à circunstância de não ter sido feita prova da sua verificação, ou de a mesma se encontrar em contradição com a matéria de facto que o tribunal considerou como demonstrada, o que se verifica relativamente à factualidade a que é feita menção em g) e l).

No que respeita à factualidade a que é feita menção nas als. c), e) e h), pese embora o assistente G... tivesse asseverado que o arguido L... proferiu tais expressões, este negou que o tivesse feito, sendo que, de todas as testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, nenhuma se apercebeu que tal tivesse ocorrido, pelo que, em face das versões contrárias apresentadas, neste particular, por assistente e arguido, e na ausência de qualquer prova complementar que permitisse dilucidar tal contradição, o tribunal considerou tal factualidade como não provada.

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Conhecendo do recurso, cumpre fazer um breve introito sobre o seu objecto.

    A matéria de facto fixada na decisão pode ser sindicada por duas vias: na “revista alargada” de âmbito mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410º nº2 do Código de Processo Penal e através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412º nº3, 4 e 6, do mesmo diploma. Sendo assente que o Tribunal de segunda jurisdição não vai à procura de uma nova convicção, a reponderação de facto não é ilimitada, antes se circunscreve à apreciação das discordâncias concretizadas pelo recorrente já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção “cirúrgica”, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação. Dito de outra forma, os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos apontam inequivocamente para uma resposta diferente da que foi dada pela 1.ª instância.

A especificação aludida no artigo supra, dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorrectamente julgados, só se satisfazendo tal especificação com a indicação do conteúdo especifico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida. (Acórdãos do S.T.J., de 14 de Março de 2007, Processo 07P21, e de 23 de Maio de 2007, Processo 07P1498, em www. dgsi.pt).  No caso, o recurso obedece a estes requisitos, pelo que este Tribunal fica em posição de poder reapreciar a prova gravada no âmbito do recurso amplo da matéria de facto.

A questão suscitada em recurso prende-se não só com a questão do erro de julgamento relativamente aos factos que são especificados na motivação e conclusões, se os mesmos factos devem ser dados como provados, por haver provas que impõem diversa decisão de facto, daí decorrendo a condenação do arguido ou a sua absolvição; bem como com a falta de exame crítico das provas, levando à nulidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 379-1 a) e c) do C.P.P. e também com os vícios aludidos no nº. 2 do artigo 410 do C.P.P.

Uma vez que as questões sobre a matéria de facto erradamente julgadas e os vícios do texto da decisão se apresentam, de certo modo, interligados, apreciá-los-emos em seguida, numa perspectiva de conjunto, sem contudo perder de vista a ordem de precedência lógica indicada nos artigos 368º/369º do C.P.P., por remissão do art. 424º, n.º2 do mesmo diploma.

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Vejamos primeiramente a questão da nulidade por falta de fundamentação e omissão de pronúncia.

O recorrente entende que a sentença na sua fundamentação não traduz com rigor o iter do conhecimento e da lógica da convicção do Tribunal e omite pronúncia sobre determinados factos, alguns dos quais se encontram documentados nos autos, como é o caso da condenação do Assistente pela prática do crime de injúrias na pessoa do aqui arguido, praticado na mesma data e local dos factos objecto destes autos.

         Sendo certo que os referidos factos encontram prova documental nos autos nas certidões da sentença e do Acordão de Recurso desta Relação ( fls. 88 a 124) e foram invocados na contestação do arguido, na realidade o Tribunal não os referiu quando fixou a matéria de facto, mas  também, esta questão prende-se mais com o fundo da questão na amplitude do erro de julgamento do que com a eventual omissão, pelo que será nesta perspectiva que nos iremos debruçar adiante. Ou seja, com a fundamentação aduzida pelo recorrente não se nos afigura a existência da invocada nulidade por omissão de factos, da sentença.

Adiante-se, no entanto e desde já que a fundamentação não é insuficiente ou omissa, antes é na sua maior parte contraditória na apreciação/valoração das provas, verificando-se inclusivé que a credibilidade em que foi alicerçada a decisão sobre a prova não tem justificação lógica e colide frontalmente com a lógica e as regras da experiência comum, o que de seguida melhor explicaremos.

Com efeito.

Na fundamentação da convicção, o Tribunal refere que o Assistente diz que … “enquanto se encontrava imobilizado no chão, com o lado direito do rosto assente na calçada, outra pessoa, cuja cara não conseguiu visualizar, assentou um dos pés em cima da sua cabeça e ficou a fazer pressão com a bota na sua cabeça, contra a calçada, tendo-o pisado na zona da orelha, vista, nariz, queixo, maxilar e pescoço, o que se manteve durante todo o tempo em que esteve a ser manietado pelo arguido L....” E, tal versão até pode fazer sentido atenta a posição do arguido Luís que dificilmente conseguiria uma posição de equilíbrio com o joelho nas costas do Assistente e um pé em cima da sua cabeça ( por melhor equilibrista e contorcionista que fosse), mas, sempre, por força da dita bota, o assistente apresentaria também lesões do lado da cabeça que mantinha contra o solo e, tal não se confirma no documento clínico junto.

 Seguidamente, ainda na página 890 da fundamentação o Tribunal refere que:… “J..., que, na data dos factos, se encontrava na companhia do primeiro, no momento em que surgiu a patrulha da PSP. Esta testemunha começou por referir ter assistido ao emprego de força exagerada, pela polícia, sobre o assistente, tendo visto este a ser imobilizado no chão, pelo ora arguido L..., que, já com o ofendido no chão, de peito para baixo, lhe colocou um joelho nas costas e um pé em cima da cabeça, de tal forma que o ofendido não se conseguia mexer, por estar completamente imobilizado.” E, ainda, na página 891 se refere: … “a testemunha R... relatou os factos de uma forma, no essencial, coincidente com a versão do assistente e da testemunha J..., tendo adiantado que, na data dos factos, encontrando-se na companhia do ofendido e de outros amigos, sentados numas escadinhas situadas nas proximidades do restaurante “Panorama”, apareceu a polícia. Na ocasião, levantaram-se e encostaram-se à parede, enquanto os agentes da polícia procediam à sua revista. Logo depois de ter sido revistado, viu o ofendido G... “a voar” e a ser projectado no chão, tendo a testemunha referido que a queda do ofendido no chão foi violenta. Já com o ofendido no chão, de barriga para baixo, o arguido L... colocou um joelho nas suas costas, a empurrar contra o chão, e um pé na cara…”

Ora, destes depoimentos, o Tribunal não concluiu pela verificação de contradição entre eles e o do próprio Assistente, antes dando por fundada a credibilidade daqueles, sem mais. Mas, como vemos da leitura acima, a contradição é nítida, sobretudo na parte do pé (ou bota) na cara (ou cabeça) do Assistente pelo próprio arguido, o que, deveria ter sido tomado em conta pelo Tribunal.

Ainda no texto da fundamentação encontramos a referência às “joelhadas” nas pernas, que segundo o Tribunal se justifica … “tendo em conta o teor do resumo da informação clínica, junto a fls. 18, de onde resulta que no dia 15/10/2011, pelas 06H46, ou seja, cerca de quatro horas após a ocorrência dos factos, o ofendido G... deu entrada nos serviços de urgência do Hospital de Cascais Dr. José de Almeida, apresentando “traumatismo da face com pé, escoriação com cerca de 6 cm e algum edema na região malar e periorbitária externa à esquerda, edema importante a nível malar e da ATM direita com cerca de 6 cm, escoriações no ombro direito, escoriações com algumas equimoses na região cervical posterior”, e do relatório médico-legal de fls. 44 a 46, resultando claro e evidente deste elemento de prova pericial, que as lesões descritas denotam terem sido produzidas por objecto contundente ou actuando como tal, compatíveis com o mecanismo de lesão descrito, devendo ter demandado para a sua cura um período de vinte dias, sem incapacidade para o trabalho profissional”. Mas, na realidade, confrontando o documento clínico de fls. 18 dos autos, o que o mesmo relata são declarações do próprio Assistente à chegada à urgência (traumatismo da face com pé). O que verdadeiramente consta do documento, por observação clínica é: “edema importante a nível malar e da ATM direita com cerca de 6 cm, escoriações no ombro direito, escoriações com algumas equimoses na região cervical posterior”, e, no relatório de exame de fls. 44 e 45 dos autos mais não se fez que a reprodução do relato de fls. 18. Ou seja, as lesões apresentadas pelo Assistente não são (contrariamente ao que o Tribunal decidiu) compatíveis com as tais joelhadas nas pernas quando o Assistente se encontrava de costas para o arguido, com as mãos na parede. Diz-nos a experiência comum que, naquela posição teria o Assistente de ter apresentado lesões (equimoses, escoriações ou outras) na parte posterior das pernas, pois as lesões do ombro e da região cervical posterior, como é óbvio não podem ser produzidas por joelhadas nas pernas. Para além de que não encontrámos depoimento testemunhal que referisse tais factos.

Ora, nas páginas 892 a 894 da fundamentação da convicção, o Tribunal descreve por súmula, os depoimentos dos Agentes Policiais (…), e, conclui pela existência de contradições no que diz respeito ao comportamento do arguido, nomeadamente quanto às expressões proferidas pelo ofendido, injuriando o arguido. Na verdade não concretiza tais contradições e, surpreende-nos quando da súmula anterior dos seus depoimentos não as conseguimos vislumbrar, sendo certo que, por essas expressões verbais, o Assistente sofreu uma condenação penal, como consta da sentença de fls.88 a 97, proferida no proc.1381/11.6PBCSC e confirmada por esta Relação no Acórdão de fls. 98 a 124. Ora, é precisamente porque o Tribunal concluíu pela existência de contradições (que não concretiza) entre os depoimentos dos Agentes Policiais e não viu qualquer contradição nos depoimentos das testemunhas J... e R... (e que existem como acima vimos), que veio a alicerçar a credibilidade da prova testemunhal em permissas ilógicas e contrárias às regras da experiência comum. [2]Ou seja, infirmou e contaminou de erro toda a matéria de facto que veio a fixar na sentença, como de seguida se constatará.

Vejamos então, em pormenor a impugnação da matéria de facto efectuada no recurso.[3]

Começa o recorrente por impugnar a matéria fixada pelo Tribunal no ponto 2, onde se refere que o arguido abordou o Assistente, dando a perceber que nada ocorreu antes desse momento. Ora, quer dos depoimentos de todos os agentes policiais envolvidos na operação policial, quer do próprio assistente o que se deduz é que compareceram dois agentes (…) que trajavam à civil, se identificaram como PSP e deram ordem para que todos se encostassem à parede. Portanto, por precisão e realidade da prova, deveria o Tribunal ter dado como provado no ponto 2:

No dia 15 de Outubro de 2011, pelas 02H20, na Rua Major Escrivanis, sita em Cascais, os agentes (…)  que se encontravam no exercício das suas funções, abordaram o assistente G... e outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-se identificado como PSP, ordenado-lhes que se encostassem à parede.

Impugna também a matéria do ponto 4, quanto às “joelhadas” que o arguido desferiu nas pernas do Assistente.

Percorrida a prova testemunhal, verificamos que apenas o Assistente refere as joelhadas. Nenhuma das restantes testemunhas, apesar de questionadas refere ter visto o arguido a desferir joelhadas. Do relato clínico também não se vislumbra a existência de lesões a nível das pernas do Assistente, nomeadamente na parte de trás das mesma, já que, segundo o Assistente elas foram desferidas quando se encontrava com as mãos apoiadas na parede.

Também o ponto 3 deve ser alterado com base na prova testemunhal, nomeadamente no depoimento gravado, da testemunha H… e A… e certidão de fls. 88 dos autos, ficando agora a constar que “Tendo o assistente questionado os elementos da PSP sobre a sua conduta, evidenciando comportamento agressivo, o sub-comissário L..., ordenou-lhe que se encostasse ao muro, de costas, para efectuar a revista.”

Assim, tal matéria constante do ponto 4 deve ser levada aos factos não provados.

Neste sentido, do ponto 5 deve constar apenas: “o arguido L... revistou o assistente, retirando-lhe as chaves, o Ipod, o porta cartões e o chapéu.”

Quanto ao ponto 6, impugnado pelo Assistente, entende-se não lhe assitir razão, pois a conduta referida é assumida pelo próprio arguido no seu depoimento.

Quanto ao ponto 7, pese embora o Assistente tenha referido tal expressão, dos depoimentos das restantes testemunhas (nomeadamente dos agentes da PSP, da testemunha Rodrigo e J...) não resulta senão que: “O arguido L... agarrou novamente o assistente pelo braço e torceu-o junto ao corpo para trás das costas, projectando-o para o chão.”

Sobre o ponto 8, não vemos em nenhum dos depoimentos gravados a referência a essa situação, pelo que deverá ser eliminado.

Posto que o ponto 9 e 10 não prime pela exactidão, são as próprias declarações do arguido e ofendido que indicam o procedimento ali descrito; todavia e, em rigor da prova testemunhal, no ponto 10, em vez de caixa torácica deverá constar base das costas.

Os pontos 13,14,15 devem ser levados aos factos não provados, já que “caindo” os factos principais dos quais o Tribunal retirou estes por presunção, caem também estes que, atinentes ao elemento subjectivo que não tiveram suporte em qualquer outro elemento da prova.

Quanto ao ponto 16 apenas deverá constar que o Assistente, por volta das 6h 56m do dia 15/10/2011 foi observado no serviço de urgências do Hospital de Cascais, como consta do documento de fls. 38 dos autos.

Relativamente aos factos não provados, resulta dos depoimentos das testemunhas (…) a situação profissional do arguido, pelo que devem ser levados aos factos provados os pontos m) a r) que o Tribunal não deu como provados mas que resultaram efectivamente dos depoimentos dos Colegas de profissão do arguido e nenhuma circunstância colocou tais depoimentos em causa, quer pelo seu conteúdo quer pela idoneidade dos depoentes.

Alterada a matéria nos termos expostos, fixa-se o seguinte:

1. O arguido A... é agente da PSP, sendo o arguido L... subcomissário e, em Outubro de 2011, prestavam serviço na 50.ª Esquadra da PSP de Cascais, nesta vila de Cascais.

2. No dia 15 de Outubro de 2011, pelas 02H20, na Rua Major Escrivanis, sita em Cascais, os agentes (…), que se encontravam no exercício das suas funções, abordaram o assistente G... e outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-se identificado como PSP, ordenado-lhes que se encostassem à parede.

3. Tendo o assistente questionado os elementos da PSP sobre a sua conduta, evidenciando comportamento agressivo, o sub-comissário L..., ordenou-lhe que se encostasse ao muro, de costas, para efectuar a revista.

4. O arguido L... revistou o assistente, retirando-lhe as chaves, o Ipod, o porta cartões e o chapéu.

5. Depois de o revistar, o arguido L... agarrou o assistente pelo braço e puxou-o, de modo a que ficasse de frente para si.

6. O arguido L... agarrou novamente o assistente pelo braço e torceu-o junto ao corpo para trás das costas, projectando-o para o chão.

7. Em seguida, o arguido L... colocou um dos joelhos, fazendo peso com o corpo, em cima das costas do assistente, na zona da base das costas, após o que juntou as mãos do assistente na base das costas e algemou-o.

8. Durante um período de tempo que não se logrou precisar com rigor, mas não inferior a 2 (dois) minutos, e que não excedeu os 5 (cinco) minutos, o arguido L... manteve o assistente naquela posição, permanecendo a fazer força com o joelho e com o peso do seu corpo sobre a base das costas.

9. Pelas 06H46 do dia 15 de Outubro de 2011, o assistente deslocou-se ao Hospital de Cascais, onde recebeu tratamento médico, tendo feito exames (Raio-X coluna cervical, face e crânio, mandíbula), e foi medicado e indicada a aplicação de gelo.

10. Em consequência directa e necessária da descrita conduta do arguido L..., o ofendido sofreu dores e trauma da face na região mandibular com escoriações e edema na região malar bilateral e periorbitária esquerda, escoriação no ombro direito, escoriações com equimoses na região cervical posterior, lesões que lhe determinaram 20 (vinte) dias de doença, sem incapacidade para o trabalho profissional.

11. O Assistente, por volta das 6h 56m do dia 15/10/2011 foi observado no serviço de urgências do Hospital de Cascais.

12. Pelos tratamentos hospitalares prestados ao ofendido G..., a que é feita referência em 16., existe um débito hospitalar no valor de € 108,00.

Mais se provou, com interesse para a decisão do mérito:

13. O arguido L... possui, como habilitações literárias, a licenciatura em Ciências Policiais.

19. O arguido exerce a actividade profissional de subcomissário da P.S.P., auferindo o salário líquido mensal de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros), ao qual é descontado um quinto do vencimento desde que se encontra suspenso de funções.

14. O arguido é divorciado e vive com a sua companheira, agente da P.S.P..

15. Não tem filhos.

16. Paga a quantia mensal de € 500,00 (quinhentos euros), a título de renda de casa.

17. O arguido L... não tem antecedentes averbados no respectivo registo criminal.

*

18. O arguido A... exerce a actividade profissional de agente da P.S.P., auferindo o salário líquido mensal de € 950,00 (novecentos e cinquenta euros).

19. O arguido vive com a esposa, que exerce a actividade profissional de empregada de balcão numa sapataria.

20. O arguido tem averbada no registo criminal uma condenação, pela prática, no ano de 2010, de dois crimes de injúria e de um crime de dano simples, tendo sido condenado, em cúmulo jurídico, na pena única de 30 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, a qual foi declarada extinta, por despacho datado de 01/02/2013, em virtude do pagamento.

21. O arguido L... é um Oficial de Polícia de elevado mérito e capacidade, tendo comandado inúmeras Esquadras, entre elas a de Investigação Criminal, tendo sob seu comando dezenas de homens, Chefes e Agentes, pautando sempre por lealdade, transparência e seriedade em todas as actuações;

22. O arguido L... é tido pelos seus superiores e demais colegas como um bom Oficial, capaz, competente e dedicado;

23. O arguido L... dedicou sempre ao serviço toda a sua inteligência, zelo e dedicação, muitas vezes fora do horário de serviço;

24. O arguido A... é um agente policial de elevado mérito e capacidade, tendo feito parte das equipas de carro patrulha durante muito tempo;

25. O arguido A... é tido pelos seus superiores e demais colegas como um bom agente, capaz, competente e dedicado;

26. O arguido A... dedicou sempre ao serviço toda a sua inteligência, zelo e dedicação, muitas vezes fora do horário de serviço.

B) MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA

Com relevância para a decisão da causa não se provou a seguinte matéria de facto:

a. Quando o assistente se encontrava com as palmas das mãos encostadas à parede e os pés afastados, o arguido L... colocou-se atrás de si e desferiu-lhe joelhadas nas pernas.

b. O arguido L..., ao atingir voluntariamente o corpo da vítima da forma supra descrita, quis provocar-lhe lesões no corpo e na saúde, o que conseguiu, bem sabendo que era elemento da PSP, que se encontrava no exercício de funções, qualidade da qual se aproveitou para agir daquela forma, excedendo o poder do seu cargo e violando os deveres inerentes à sua qualidade de agente de autoridade.

c. Ao molestar fisicamente o assistente da forma supra descrita, o arguido L... quis, ainda, aproveitar-se da posição de superioridade que a autoridade em que estava revestido lhe conferia sobre o assistente, que se encontrava impedido de se defender, para o humilhar na presença dos outros indivíduos que o acompanhavam, por ter questionado a sua autoridade, violando os deveres de correcção e de urbanidade que sobre si recaíam.

d. O arguido L... sabia que as suas condutas afectavam a autoridade e credibilidade da administração do Estado e que eram proibidas e punidas por lei.

e. Nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas em 2., o arguido A... tivesse abordado o assistente G... e os outros indivíduos que ali se encontravam, tendo-lhes ordenado que se encostassem à parede;

f. Quando o assistente e E... se dirigiram para o muro, ficando de costas para os elementos da PSP, o agente A... desferiu, sem qualquer justificação, uma bofetada que atingiu E... na cara;

g. Nas circunstâncias referidas em 4., o arguido L..., dirigindo-se ao assistente, tivesse dito: “Abre as pernas cabrão, abre mais as pernas, caralho”;

h .Nas circunstâncias referidas em 6., o arguido L..., ao agarrar o assistente pelo braço, e ao puxá-lo, o tivesse feito com força;

i .O arguido L... questionou o assistente sobre quem tinha batido em quem, ao que este respondeu que tinham batido no seu amigo;

j. Na altura em que o assistente se encontrava caído no solo, algemado, com o arguido L... em cima de si, fazendo força com o joelho sobre a sua caixa torácica, o arguido A... lhe calcou, com força, a cara com o pé, atingindo-o no nariz, olhos, fonte e testa;

k. O comportamento do arguido L..., a que é feita menção nos pontos 8. a 10., tivesse perdurado durante cerca de 15 minutos, e/ou que, ao assim proceder, o arguido L... tivesse agido de comum acordo e em comunhão de esforços com o arguido A...;

l. Enquanto mantinham o assistente naquela posição, a sufocar, os arguidos lhe diziam, em tom jocoso: “Então campeão, já não falas? Pois isto é assim, tens a mania mas a gente trata de ti. Tens direito a um tratamento especial para campeões. Olha aí que o rapaz está a ficar azul, parece que vais desfalecer”;

m. Os arguidos L... e A... agiram de comum acordo e em conjugação de esforços e objectivos;

n. O arguido A... quis provocar lesões no corpo e na saúde do ofendido, bem sabendo que era elemento da PSP, que se encontrava no exercício de funções, qualidade da qual se aproveitou para agir daquela forma, excedendo o poder do seu cargo e violando os deveres inerentes à sua qualidade de agente de autoridade;

o. O arguido A... sabia que as suas condutas afectavam a autoridade e credibilidade da administração do Estado e que eram proibidas e punidas por lei;

p. Não houve agressões por parte de qualquer agente policial, muito menos por parte do arguido L...;

*

Assim se entendendo, em face da reapreciação que fizemos da prova gravada, e, tendo em conta a alteração agora realizada quanto à matéria de facto, vejamos se a mesma integra o ilícito penal imputado ao arguido, ou seja, se o arguido excedeu os limites funcionais ou usou indevidamente os meios coercivos próprios da sua função de agente da força policial.

          Tal como as “guide lines” orientam o exercício da actividade médica, também a PSP dispõe de normas orientadoras- as chamadas NEP, normas de execução permanente (ex. destas o Regulamento interno de 1/6/2004)[4].

São estas normas que se dirigem aos agentes policiais, que traçam a orientação e o limite ao uso dos meios coercivos, sabido que o Estado de Direito conserva praticamente o monopólio da coacção, exercido pela especificidade da função policial que os usa de modo directo e imediato, para levar o cidadão a cumprir a sua obrigação legal mas nunca para punir o incumprimento- esta será a função dos tribunais. Esta coacção directa consiste no emprego da força física pelo agente policial e, se necessário, de meios auxiliares de coacção física como sejam as algemas e o bastão e, em caso extremo, a arma de fogo ou outra autorizada.

Dentro das directivas referidas em cada intervenção, além de outras circunstâncias mencionadas na NEP, haverá que atentar ao prescrito na NEP acima referida:

“Gravidade da Infracção

A seriedade e grau de perigosidade da ameaça ou ofensa para a integridade física dos elementos policiais ou de terceiros são o critério determinante da natureza e intensidade da força a utilizar.

4.2 Relativamente aos intervenientes não policiais:

a. Número de indivíduos envolvidos;

b. Grau de cooperação/resistência;

c. Utilização de qualquer objecto ou arma e o seu tipo;

d. Envergadura, força física e capacidade para ofender;

e. Idade;

f. Eventual influência de álcool ou drogas;

g. Antecedentes conhecidos.”

No ponto 3 da NEP quanto ao procedimento da imobilização por algemas consta:

“O procedimento de algemagem é obrigatório nas seguintes situações:

1) Sempre que o detido oponha qualquer resistência à abordagem inicial, às acções de detenção ou durante o processo de condução ao local da custódia ou de comparência perante autoridade judiciária;

2) Sempre que existam indícios ou suspeitas razoáveis de que o infractor possa reagir com violência contra o agente policial ou tentar a fuga;

3) Sempre que seja oferecida resistência física, relativamente à execução de serviço ou ordens policiais legais e legítimas;

4) Transporte em viaturas policiais,

5) Enquanto os suspeitos/detidos permaneçam nas instalações policiais fora dos quartos de detenção ou fora dos compartimentos especificamente destinados à permanência de suspeitos agressivos ou detidos, excepto quando participarem em actos ou diligências processuais que se justifiquem designadamente interrogatórios ou reconhecimentos.

h. Devem ser ponderados os seguintes parâmetros, no que respeita à decisão de proceder ou não à algemagem:

1) O grau de risco para os agentes policiais ou terceiros, quanto à possibilidade de virem a ser alvo de agressão ou dominados pelo detido ou infractor;

2) Efectivo policial presente no local;

3) Risco de fuga;

4) Gravidade e circunstâncias em que o crime foi cometido;

5) Possibilidade de o detido ter apoio de terceiros que visam obstar à manutenção da detenção;

6) Habilidades ou capacidades físicas do visado.

i. Os procedimentos de execução da algemagem devem ser aplicados conforme as técnicas em vigor na PSP e classificam-se de risco desconhecido ou de alto risco, atendendo à avaliação do grau de ameaça em questão;”

Ou seja, existem normas orientadoras (e procedimentais) quanto às situações em que os suspeitos devem ser algemados e como o agente policial deve proceder. Sabemos que os procedimentos ministrados na Escola Pública da PSP constam de manuais ilustrados e são ali treinados com os respectivos orientadores. Aliás foi o que todos os agentes ouvidos, sem excepção, quiseram transmitir ao Tribunal: a operação policial e o comportamento de algemagem do Assistente observaram os procedimentos constantes das respectivas regras de execução. Naturalmente e, como já acima referimos, estes procedimentos são técnicas de coacção física e, enquanto tais deixam quase sempre algumas lesões físicas no visado. Segundo ouvimos (e sabemos do Manual da E.P.P.) a algemagem de risco, como era o caso, atenta a resistência do visado em acatar as ordens policiais, e retorquindo com expressões injuriosas, em grupo, era consentânea com a sua execução com o visado deitado no chão, colocando-se o agente com um joelho na zona do pescoço e outro no fundo das costas, com vista à sua imobilização para conseguir a algemagem. Ora, bastaria algum estrebuchar (como aliás referiu a testemunha Humberto Santos no seu depoimento) no chão irregular e com pedras, para provocar no ofendido as lesões que apresentou na face, do lado esquerdo e no ombro.

E, como acima referimos não vemos como afastar, quer pelos conhecimentos e razão de ciência, quer pela idoneidade, os testemunhos dos agentes policiais ouvidos em audiência e que participaram na operação policial que esteve na génese dos factos em causa. E, o Tribunal afastou-os numa alegada contradição, que não encontrámos e, esquecendo que os relatos efectuados sobre a técnica da algemagens correspondiam aos manuais e ás directrizes da função.

Também não vemos outras causas para as lesões apresentadas pelo Assistente, que são, na realidade consentâneas com o procedimento policial. Por outro lado não conseguimos encontrar em momento algum indícios de uma qualquer actuação voluntária por parte do arguido em querer causar ofensa na integridade física do ofendido. E, repete-se, não encontramos nenhum fundamento para desconsiderar a idoneidade e o teor dos depoimentos dos agentes policiais e, credibilizar (como fez o Tribunal e acima demonstrámos que o foi de forma errada) o depoimento do Assistente que já havia sido julgado e condenado pela prática do crime de injúrias na pessoa do aqui arguido, praticado no momento e nas circunstâncias dos factos objecto destes autos, o que negou agora e cuja versão contrariou nalguns pontos os depoimentos dos agentes policiais e dos próprios amigos que o acompanhavam o que, na nossa perspectiva, de certo modo dá mais crédito à versão do arguido no que toca à sua actuação por virtude do comportamento agressivo e contrário ao acatamento das ordens da entidade policial pelo Assistente.

 E, não podemos deixar de notar que, do grupo do Assistente só ele apresentou queixas sobre o comportamento policial, o que só se compreende também porque todos os restantes acataram ordeiramente as ordens policiais.

E, ainda que o Assistente possa ter tido a percepção de um excesso na utilização da força física pela autoridade policial, (além de a “canalizar” toda na pessoa do arguido, em nítida “revolta” pessoal pela condenação já sofrida pelas injúrias ao aqui arguido), sempre deveria ter pensado que era seu dever de cidadão, cumprir as ordens da entidade policial que, no exercício das suas funções de segurança da população, procedia a uma operação de revista e detecção de produtos estupefacientes em local referenciado como tal e onde o Assistente e o seu grupo de amigos se encontravam. Teria, naturalmente obviado a todos os “incómodos” processuais para si e para os restantes intervenientes.

Aqui chegados, atento o entendimento acima descrito e a alteração da matéria de facto que realizámos, ficam prejudicadas as restantes questões colocadas em recurso, uma vez que caem os requisitos objectivos e subjectivos do tipo legal do crime pelo qual o arguido foi condenado na 1ª. Instância. Isto é, a actuação do arguido, ainda que tenha causado lesões físicas no Assistente, observou as normas do NEP e dos manuais no que respeita à algemagem do Assistente, nada se encontrando na prova produzida, que inculque uma actuação arbitrária, excessiva ou desproporcionada, ou que indique a voluntariedade do arguido na sua actuação.

III -  DECISÃO.

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em dar provimento ao recurso, alterando a matéria de facto nos termos acima expostos e, consequentemente, declarando a absolvição do arguido/recorrente do crime por que foi condenado na 1ª.Instância. Decorrente desta decisão a absolvição agora decretada abrangerá também a condenação cível.

Sem tributação.

        (Acórdão elaborado e integralmente revisto pela relatora – artº 94º, nº 2 do C.P.Penal)

 Lisboa, 26/01/2017

Maria do Carmo Ferreira

                                                                     

Cristina Branco

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[1] Embora de alguns pontos do texto do recurso possa ficar a dúvida sobre a pretensão do arguido de realização de audiência neste Tribunal, na realidade, para além de não existir um pedido expresso, verificamos que toda a argumentação se dirige à reapreciação da prova gravada, e, assim se decidirá do presente recurso, em conferência.
[2] O testemunho de policiais é válido, ressalvadas as hipóteses de evidente interesse particular na investigação. A acusação não demonstrou qualquer inconsistência nas declarações dos agentes que apontassem motivação pessoal no sentido de que o arguido não fosse condenado. Os seus testemunhos são pois aceites e válidos como os de qualquer testemunha.
[3] Para além da leitura das transcrições dos depoimentos juntas pelo arguido, ouvimos na íntegra a gravação da prova, nomeadamente os depoimentos, do arguido, assistente e testemunhas inquiridas nas sessões da audiência de julgamento.
[4] Encontramos facilmente na internet, no site da Direcção Nacional da PSP.