Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
425/16.0YIPRT.L1-6
Relator: ANA PAULA A. A. CARVALHO
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
EFEITOS
ACÇÃO DECLARATIVA
RECONVENÇÃO
EXTINÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I– Se o PER aprovado não prevê a continuação da ação declarativa de condenação, e o pedido reconvencional tal como foi estruturado pela ré depende da procedência do pedido formulado na ação, a extinção desta não impõe o prosseguimento dos autos – artigos 17º-E, nº 1 do C.I.R.E. e 266º nº 6 do C.P.C.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa.

*

RELATÓRIO:


A [ ….,Unipessoal, Lda.]  instaurou processo de injunção que foi convertido em ação de processo comum contra B [ ….. Embalagens para Indústria, S.A.]  , pedindo a condenação da ré a pagar-lhe o valor total de € 36.980,00, a título de capital, bem como os juros, no montante de € 899,20, calculados à taxa legal aplicável de 8,05%, vencidos desde a data das respectivas faturas e vincendos até integral pagamento.

Na oposição, a ré defende-se por impugnação e apresenta reconvenção na qual pede em suma que a autora seja condenada:
I– A concluir o fornecimento e revestimento da totalidade do pavimento cerâmico da unidade fabril da Ré sita em Alcácer do Sal, nos mesmos materiais, espessura, cor ou pigmentação do já existente e executado pela A.
II– A concluir a totalidade do rodapé da unidade fabril acordado com rodapé do mesmo material, cor ou pigmentação do existente e já executado pela A.
III– A proceder à total eliminação dos defeitos existentes no pavimento executado pela autora e reclamados no presente articulado.
IV– A pagar à Ré a indemnização que for liquidada em execução de sentença relativa aos prejuízos que vierem a ser apurados resultantes do atraso na conclusão da obra e os resultantes da existência dos defeitos ou vícios da obra.

Em sede de audiência prévia, foi admitida a reconvenção, nos termos dos artigos 266º nº 2, alínea a) e artigo 583º nº 1 do C.P.C., proferiu-se o despacho saneador e identificou-se o objecto do litígio, bem como os temas da prova.

A final foi declarada a extinção da instância por força do seguinte despacho:
«Pese embora a R., B não tenha junto a informação sobre o estado do Processo de Revitalização, conforme determinado no despacho datado de 23.04.2018, resulta da pesquisa que antecede que, em 29.05.2018 foi proferida sentença homologatória do plano de revitalização, cuja cópia se encontra junta a fls. 214 a 223, sendo a A., uma das credoras da R..
Ora, tal como resulta do art. 17º-E, nº1 do CIRE, com a aprovação e homologação do plano de recuperação, as ações pendentes em que é peticionado o pagamento de um crédito incluído no referido plano, extinguem-se.
Em face do exposto, decide-se julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide (art. 277º, al. e) do C.P.C.).
Custas a cargo da R. (art. 536º, nº 3 do CPC).
Registe e notifique.
06-06-2018»

Não se conformando, a ré interpôs recurso de apelação pedindo que se revogue a sentença que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, e se determine o prosseguimento dos autos.
*

A apelante formula as seguintes conclusões das alegações de recurso:
«a)- É o presente recurso de apelação interposto da douta sentença que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide por considerar que: “Com a aprovação e homologação do plano de recuperação, as ações pendentes em que é peticionado o pagamento de um crédito incluído no referido plano, extinguem-se, tal como resulta do art. 17º-E, n.º 1 do CIRE.”
b)- Com tal decisão a Recorrente não se pode conformar porquanto considera, entre outras questões, que face ao pedido reconvencional deduzido e admitido na presente acção, não podia o Tribunal a quo julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, já que citada para deduzir oposição ou pagar a quantia reclamada, a Recorrente deduziu oposição/contestação tomando posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pela Autora aqui Recorrida, deduzindo ainda na contestação pedido reconvencional.
c)- Admitida a reconvenção deduzida, nos termos do disposto nos artigos 266º, nº 2, al. a) e art. 583º, nº1 do C.P.C., entendeu o Tribunal a quo que o objeto do litígio se refere ao direito da Recorrida a receber as quantias peticionadas, no âmbito do contrato de empreitada celebrado com a Recorrente; bem como o direito da Ré /Recorrente na reparação e eliminação das deficiências detetadas na execução do referido contrato, além do direito a receber uma indemnização decorrente da atuação da Recorrida.
d)- Ora, tendo a Recorrente deduzido um pedido contra a Recorrida, nunca o Tribunal a quo podia ter julgado extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, sem pelo menos ter notificado a Ré para se pronunciar e sem que o douto despacho que homologou o acordo no PER tivesse transitado em julgado - O que à data da sentença recorrida ainda não se tinha verificado.
e)- No caso dos presentes autos não se verifica nenhuma causa de extinção da instância, já que a lide só se torna inútil quando é patente que por qualquer causa – processual ou extraprocessual – o efeito jurídico pretendido deixa de ter interesse, redundando a actividade processual subsequente em verdadeira inutilidade, tornando a continuação da lide totalmente desnecessária. – O que face ao pedido reconvencional deduzido não é o caso.
f)- No caso concreto deve o Juiz conhecer, de acordo com o princípio da motivação das sentenças, todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, exceptuadas as questões, quanto ao pedido, à causa de pedir ou às excepções, cuja apreciação fique prejudicada pela solução dada às outras. Nessa medida violou a sentença recorrida, entre outos, o princípio da motivação das sentenças.
g)- A Recorrente na pendência desta acção, recorreu a um Processo Especial de Revitalização (CIRE), que corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo de Comercio de Setúbal, Juiz 2, sob o n.º 8899/17.5T8STB, no qual o crédito da Recorrida consta da lista de créditos reconhecidos sob condição, já que a ora Recorrente impugnou o crédito da Recorrida alegando em síntese a existência da pendência desta acção, concluindo em sede de impugnação da lista provisória de créditos que quando muito poderia ser reconhecido o valor de € 6.580,00 (seis mil quinhentos e oitenta euros), como crédito sob condição, mas nunca a totalidade do crédito reclamado pela Recorrida.
h)- No seguimento desse entendimento julgou o Tribunal de Comercio parcialmente procedente a impugnação apresentada pela Devedora aqui Recorrente, mantendo o crédito reconhecido na lista provisória de créditos, no montante global de € 36.980,00, com natureza comum, mas sob condição desse crédito ser reconhecido por decisão judicial no âmbito deste processo.
i)- Dispondo o art. 50º do CIRE que, para efeitos daquele código, consideram-se créditos sob condição aqueles cuja constituição ou subsistência se encontra sujeita à verificação ou não verificação de um acontecimento futuro e incerto, por força da lei, de decisão judicial, ou de negócio jurídico.
j)- Ora, o normativo invocado pelo Tribunal na douta sentença (art. 17º-E, n.º 1 do CIRE) pretende assegurar apenas as condições adequadas ao estabelecimento de negociações entre o Devedor e os seus Credores, tendo em vista a revitalização daquele e a efectiva sujeição de todos os créditos ao plano de revitalização acordado e homologado pelo Tribunal, mas nunca impedir a apreciação judicial e o eventual reconhecimento dos créditos litigiosos.
l)- Nesta medida, não podia o Tribunal a quo ter declarado extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide sem se inteirar minimamente de qual era a situação concreta do crédito da ora Recorrida, já que a expressão «acções para cobrança de dívidas» constante do nº 1 do art.º 17.º-E do CIRE, deve ser interpretada no sentido de abranger quer as acções executivas quer as acções declarativas que tenham por finalidade obter a condenação do devedor numa prestação pecuniária, mas nunca extinguir, por força da homologação do plano de recuperação, as acções onde se discutem créditos que continuam a necessitar de definição jurisdicional para que possam ser satisfeitos, ainda que em obediência ao plano homologado.
m)- Não podendo ser abrangida pelo âmbito da extinção uma acção declarativa como esta em que se discute a existência de créditos e o seu valor, por isso relacionados (no PER) “sob condição” - sem prejuízo de a decisão de homologação do plano vincular os credores da devedora, nos termos do nº 6 do art. 17-F do CIRE, encontrando-se a Recorrida obrigada a observá-la, nos precisos termos previstos no processo especial de revitalização, com a única especificidade de os créditos “estabilizarem” deixando de depender da “condição” ali mencionada.
n)- Violou por isso esta decisão recorrida os artigos 17-E, n.º 1 do CIRE e 277º alínea e) do CPC, devendo ser proferido acórdão que, concedendo provimento ao recurso, revogue a sentença recorrida e ordene o prosseguimento dos autos, devendo ser marcada data para a audiência final.
Nestes termos e nos mais de Direito deve o presente recurso ser julgado procedente e provado e por via dele ser revogada a sentença que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, ordenado o prosseguimento do autos e marcada data para a audiência final, com o que se fará a habitual JUSTIÇA.»
*

Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
*

Nas contra-alegações de recurso, a recorrida formula as seguintes conclusões:

«A
1.– O recurso vem interposto pela R. da sentença que pôs termo à presente acção, declarando-a extinta por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277º, al. e) do C.P.C..
2.– A sentença assim decidiu por haver sido proferida sentença homologatória do plano de revitalização, cuja cópia se encontra junta a fls. 214 a 223, sendo a A. , uma das credoras da R.. Ora, tal como resulta do art. 17º-E, nº1 do CIRE, com a aprovação e homologação do plano de recuperação, as ações pendentes em que é peticionado o pagamento de um crédito incluído no referido plano, extinguem-se.
3.– Andou bem a sentença e a interposição do presente recurso constitui um autêntico abuso de direito, na sua forma de venire contra factum proprium.
4.– A decisão encerrada na sentença é plenamente conforme à lei e ao que os credores e a própria R. decidiram no PER, em sede de Plano de Recuperação, e que como tal foi judicialmente homologado e é portanto perfeitamente válido e eficaz.

B
1.– Relativamente às acções de cobrança de dívidas em curso à data da interposição de um PER, instauradas contra o devedor a lei - art. 17º-E, nº1 do CIRE -prevê a sua extinção com a aprovação e homologação do plano de recuperação, caso outra solução não conste deste mesmo plano.
2.– Quanto às acções – de cobrança de dívidas ou outras - em curso à data da interposição de um PER, instauradas pelo devedor, a lei nada prevê, tendo o legislador deixado tal regime para regulação no próprio PER..
3.– Nos presentes autos discute-se a validade e exigibilidade de créditos reclamados quer pela A. contra a R. (pedido inicial – créditos já liquidados), quer da R. contra a A. (pedido reconvencional – créditos por liquidar), ou seja, e em simultâneo, os dois tipos de cobrança de créditos: do e contra o devedor.
4.– Quanto ao pedido inicial da A. contra a R., a lei (art. 17º-E, nº1 do CIRE) predispõe a extinção da presente acção, salvo se outra solução houver sido consignada no plano de revitalização.
5.– Aplicando ao presente pleito o que o Plano de Revitalização, aprovado e homologado no âmbito do PER que correu termos quanto á devedora, estabelecem, e que consta da sua página 15, deveria a acção prosseguir para aferição e cobrança do pedido de cobrança formulado pela A.
6.– A sentença, porém, não violou tal regime do Plano de Revitalização, ao considerar extinto tal pedido e, portanto, a acção.
7.– É que, o administrador judicial do PER colocou o crédito da aqui A. e Recorrida, na sua totalidade, na listagem de créditos (comuns) a solver de acordo com o plano de recuperação aprovado.
8.– Ou seja, não obstante o crédito da aqui A. e recorrida haver sido considerado inicialmente como condicional em incidente suscitado e decidido no âmbito de PER; acabou o mesmo, porém, convolado como crédito a regularizar in totu.
9.– A R. e aqui recorrente não reagiu contra esta decisão, não tendo impugnado o Plano, dele reclamado ou recorrido da sentença que o homologou.
10.– Pelo que o Plano, com esse conteúdo e efeito, convalidou-se: o crédito da aqui A. foi reconhecido como crédito comum a solver, em paridade com os restantes, na sua totalidade.
11.– O que tornou inútil – supervenientemente inútil – o pedido formulado pela A. e aqui recorrente na acção em presença, e logo conduziu à extinção da mesma.
12.– Resta tão só aquilatar se a sentença, que andou bem quanto ao pedido principal deduzido na acção pela A., também assim procedeu quanto ao soçobrar do pedido reconvencional deduzido na mesma pela R..
13.– Nem a lei – o CIRE – nem o Plano de Revitalização aprovado no PER relativo ao devedor, aqui R. e recorrente, estipulam algum regime sobre o destino das acções interpostas por este último, em curso à data da interposição do PER; pelo que se terá aí de recorrer às regras gerais de Direito, mormente e no caso, às adjectivas.
14.– Dispõe o artigo 266º, nº 6, do CPP, que a improcedência da ação e a absolvição do réu da instância não obstam à apreciação do pedido reconvencional regularmente deduzido, salvo quando este seja dependente do formulado
15.– A presente acção consiste uma acção de cobrança do remanescente do preço não pago relativo a uma empreitada em que a A. é empreiteira geral e a R. é dona de obra.
16.– A R, na sua Contestação (Oposição a Injunção), vem opor-se ao pagamento desse remanescente do preço, deduzindo pedido reconvencional em que alega factos constitutivos do seu direito de se eximir a esse pagamento.
17.– Na sua reconvenção, a R. vem alegar, em síntese, dois conjuntos de factos constitutivos desse alegado direito: o incumprimento parcial da empreitada (defeitos da obra), e o cumprimento defeituoso da empreitada (falta de conclusão de trabalhos).
18.– Ambos os fundamentos serviriam como fundamento para não pagar o preço da empreitada.
19.– O que significa que o pedido reconvencional é dependente do pedido principal formulado na acção.
20.– Com a aceitação feita pela própria R., da validade e eficácia do Plano de revitalização aprovado e homologado, ONDE SE RECONHECE NA ÍNTEGRA O CREDITO DA A., e portanto o pagamento de tal preço da empreitada, o fundamento do pedido reconvencional desapareceu, tendo a R. abdicado dos direitos que lhe subjaziam para obstar àquele pagamento.
21.– Daí a interposição do presente recurso constituir um autêntico abuso de direito, na sua forma de venire contra factum proprium, pois que não se pode reconhecer num lado o crédito da A. e continuar a contestá-lo noutro.
22.– Ao abrigo do nº 6 do artigo 266º do CPC, extinta a acção (o pedido principal) necessariamente teria de esse extinguir o pedido reconvencional.
23.– Pelo que andou bem a sentença ora colocada em crise.

C
1.– Do ponto de vista estritamente formal ou adjectivo, a consecução do peticionado ou pretendido no recurso interposto pela R. é impossível de realizar.
2.– A R. pretende a revogação da sentença lavrada na 1ª instância, e a prossecução da presente acção.
3.– A prossecução da presente acção conduziria à verificação de caso julgado, e ao risco de contradição de julgados, atenta a aprovação e homologação, por sentença judicial, do Plano de Revitalização que, no âmbito do PER da devedora, aqui R. reconheceu o direito de crédito da A..
4.– Pelo que também por esta via o presente recurso não pode ter provimento.
Deve, por todo o exposto, ser mantida a sentença.»
*

Obtidos os vistos legais, cumpre apreciar.
*

Questões a decidir:

O objeto e o âmbito do recurso são delimitados pelas conclusões das alegações, nos termos do disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil. Esta limitação objectiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. Artigo 5º nº 3 do C.P.C.). Similarmente, não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas (Abrantes Geraldes, Recursos no N.C.P.C., 2017, Almedina, pág. 109).

Importa apreciar unicamente se a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 17-E, n.º 1 do CIRE e 277º alínea e) do CPC?
*

FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA:

A factualidade processualmente adquirida com relevo para a decisão é a seguinte:
1.– A. instaurou processo de injunção que foi convertido em ação de processo comum contra B., pedindo a condenação da ré a pagar-lhe o valor total de € 36.980,00, a título de capital, bem como os juros, no montante de € 899,20, calculados à taxa legal aplicável de 8,05%, vencidos desde a data das respectivas faturas e vincendos até integral pagamento.

2.– Na oposição, a ré apresenta reconvenção na qual pede em suma que a autora seja condenada:
I– A concluir o fornecimento e revestimento da totalidade do pavimento cerâmico da unidade fabril da Ré sita em Alcácer do Sal, nos mesmos materiais, espessura, cor ou pigmentação do já existente e executado pela A.
II– A concluir a totalidade do rodapé da unidade fabril acordado com rodapé do mesmo material, cor ou pigmentação do existente e já executado pela A.
III– A proceder à total eliminação dos defeitos existentes no pavimento executado pela autora e reclamados no presente articulado.
IV– A pagar à Ré a indemnização que for liquidada em execução de sentença relativa aos prejuízos que vierem a ser apurados resultantes do atraso na conclusão da obra e os resultantes da existência dos defeitos ou vícios da obra.

3.– A reconvenção foi admitida.

4.– Na pendência da ação, a ré apresentou Plano Especial de Revitalização (PER) junto do Tribunal da Comarca de Setúbal, Juízo de Comércio de Setúbal, Juiz 2, com o Nº 8899/17.5T8STB, que determinou a suspensão da instância, nos termos do despacho de fls. 227.
5.– O PER foi aprovado e homologado por sentença proferida pelo Juízo de Comércio de Setúbal, no processo identificado, incluindo o crédito da autora, e aqui recorrida, na sua totalidade, na listagem de créditos comuns.

6.– O Plano de Revitalização, aprovado e homologado no âmbito do PER que correu termos quanto à devedora, ora ré e recorrente, predispõe, na sua página 15, o seguinte:
«C.– Efeitos Legais sobre as Acções Pendentes
Todas as acções declarativas que têm em vista o reconhecimento de créditos sobre a B deverão prosseguir os seus termos, ao abrigo da prerrogativa legal prevista no disposto na parte final do nº 1, do artigo 17º-E, do CIRE, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos, os termos previstos no Plano para créditos de igual natureza.
No que respeita às acções pendentes à data da apresentação a PER, destinadas à cobrança de créditos - (com excepção das execuções fiscais e das execuções por dividas ao Instituto da Segurança Social, I.P.) - e que se encontrem suspensas serão consideradas extintas logo que seja aprovado e homologado o presente Plano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17º -E, nº 1, do CIRE.»
*

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
*

Segundo dispõe o artigo 17º-E, nº 1 do CIRE, A decisão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º -C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo -se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.

Tem-se debatido na jurisprudência que tipo de ações são abarcadas pelo nº 1 do artigo 17º-E do CIRE, e o entendimento dominante é o de que a expressão «ações para cobrança de dívidas» abrange qualquer ação judicial – declarativa ou executiva – destinada a exigir o cumprimento de um direito de crédito resultante da atividade económica do devedor e que, por isso, contenda com o seu património (cfr. entre outros Acórdão do S.T.J. de 05.01.2016, processo nº 172.724/12.6YIPRT.L1, e Acórdão do S.T.J. de 26.11.2015, processo nº 1190/12.5TTLSB.L.2.S1 – disponíveis no sítio da internet do IGFEJ).

No caso vertente, é inequívoco que a autora e recorrida instaurou o procedimento de injunção com vista à cobrança do remanescente do preço não pago relativamente a uma empreitada, na qual figura como empreiteira geral, e a ré, recorrente, é a dona da obra. E na reconvenção apresentada, a ré alega os factos constitutivos do seu direito a eximir-se ao pagamento, o incumprimento parcial da empreitada por falta de conclusão de trabalhos e fornecimentos, e o cumprimento defeituoso devido à existência de defeitos dos trabalhos executados.

No PER aprovado, o crédito da autora foi reconhecido na sua totalidade, como crédito comum, e não se previu a continuação da presente acção declarativa de condenação.

Paralelamente, e tal como salienta a recorrida nas contra-alegações, o nº 6 do artigo 266º do C.P.C. dispõe que a improcedência da ação e a absolvição do réu da instância não obstam à apreciação do pedido reconvencional regularmente deduzido, salvo quando este seja dependente do formulado. «A apreciação do pedido reconvencional está excluída quando a sua procedência dependa da procedência do pedido do autor (nº 6) e este seja improcedente (por inconcludência ou falta de prova da causa de pedir, ou por proceder uma exceção perentória) ou inadmissível (por proceder uma exceção dilatória» (J. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, C.P.C. Anotado, vol. 1º, 3ª ed., Coimbra Editora, pág. 524). No caso vertente, a ré e ora recorrente na oposição deduzida à injunção defende-se por impugnação e com a reconvenção apresentada visa obstar ao pagamento do crédito que é reclamado, com base no incumprimento parcial e no cumprimento defeituoso da empreitada contratada. Consequentemente, o pedido reconvencional tal como foi estruturado depende da procedência do pedido formulado na acção, pelo que a extinção desta não impõe o prosseguimento dos autos.
Nesta sequência, entende-se que as conclusões do recurso não merecem qualquer acolhimento.
*

DECISÃO.
Em face do exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em manter a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante.


Lisboa, 10.01.2019



Ana Paula Albarran Carvalho
Gabriela Fátima Marques
Adeodato Brotas