Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
146/14.8TTFUN.L1-4
Relator: SÉRGIO ALMEIDA
Descritores: DESPEDIMENTO COLECTIVO
REQUISITOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/13/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I. Na comunicação da intenção de resolver o contrato de trabalho e na decisão do empregador, no âmbito de despedimento coletivo, importa indicar os fundamentos do despedimento de forma concreta e bem delimitada, em termos tais que quer o trabalhador quer, eventualmente, o Tribunal, possam sindicar a referida decisão.
II. O mesmo se passa com a comunicação à Comissão de Trabalhadores, a qual não se pode pronunciar convenientemente – e nem pode haver a negociação prevista outrossim na lei – sem conhecer os fundamentos concretos que levam à cessação do contrato dos trabalhadores visados.
III. A decisão de despedimento coletivo conterá, além da referência à motivação geral da decisão de redimensionamento da organização subjacente ao despedimento coletivo, os motivos concretos que determinam a cessação de cada um dos contratos de trabalho abrangidos pelo despedimento, os quais podem não ser iguais para todos os trabalhadores.
IV. O despedimento é ilicito se o empregador não indica no procedimento de despedimento coletivo, ainda que de forma menos feliz, os motivos para se propor despedir e para despedir, não podendo suprir essas faltas no processo judicial.
(Sumário elaborado pelo Relator).
Decisão Texto Parcial: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa:


RELATÓRIO:

Autor (A.) e recorrido: AA.

Ré (R.) e recorrente: BB, Unipessoal, Lda.

O A. alegou, em súmula, a total e insanável insuficiência da comunicação de despedimento, em violação do disposto no art.º 363º, nº 1 do Código do Trabalho; falta de pagamento da indemnização devida; e inexistência de critérios objectivos para a selecção do A. e ainda a inexistência de comunicação a esse respeito na decisão de despedimento. E pediu que seja declarado ilícito o despedimento efectuado, com o consequente direito à reintegração no seu posto de trabalho e pagamento das retribuições vencidas e vincendas até à decisão final, reservando-se para o Autor o direito de opção pela indemnização legalmente prevista no art.º 391º do Código de Trabalho, agravada para o dobro por força do disposto no art.º 410º, nº 6 do mesmo Código.

A R. contestou alegando que foram cumpridas todas as formalidades relativas ao processo disciplinar; o A. foi seleccionado de acordo com critérios objectivos, tendo em conta a avaliação de desempenho efectuada anualmente pela R.; no universo dos colaboradores com a categoria profissional de motoristas distribuidores, o A. faz parte do grupo dos dois trabalhadores que têm pior avaliação; e concluiu pela regularidade do despedimento e improcedência da acção.
*
Os autos prosseguiram, tendo sido proferida sentença que julgou a ação procedente, declarou ilícito o despedimento do A. e condenou a R. a reintegrá-lo e a pagar-lhes todas as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, devendo proceder-se às deduções previstas no art.º 390º, nº 2 do Código do Trabalho, em sede de liquidação em execução de sentença.
*
A R. apelou, tendo apresentado motivação em que concluiu:
(...)
*
Contra-alegou o A., pugnando pela confirmação da sentença recorrida, e concluiu:
(...)
*
O MºPº teve vista e pronunciou-se pela confirmação da decisão recorrida.

As partes não responderam ao parecer.

Foram colhidos os vistos legais.
*
*
FUNDAMENTAÇÃO:

Cumpre apreciar neste recurso – considerando que o seu objecto é definido pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, e exceptuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.º 635/4, 608/2 e 663, todos do Código de Processo Civil – se está fundamentada a comunicação da intenção de despedimento e a decisão de despedimento no procedimento coletivo, sendo o despedimento do A. valido e licito e, eventualmente, se foi disponibilizada a compensação devida nos termos legais.
*
*
Estão provados os seguintes factos:

1. – Em 4/5/1974 o A. entrou ao serviço da R., sendo-lhe atribuída a categoria profissional de “motorista distribuidor” e pago recentemente o salário mensal base mais diuturnidades de € 1.156,10.

2. – Por carta registada datada de 26/11/2013, a R. comunicou ao A. a intenção de despedimento colectivo, conforme cópia junta aos autos a fls. 124, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

3. – Com a carta acima referida em 2.2. a R. remeteu ao A. o “Anexo II”, intitulado “Critério para selecção dos trabalhadores a despedir”, conforme cópia junta aos autos a fls. 47 a 55, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

4. – Naquele “Anexo II” refere-se que:
 “(…)
Para as funções que não se extinguem mas cujo número de postos de trabalho é reduzido, foi adoptado o critério da avaliação de competências, com base nas avaliações de performance profissional efectuados regularmente pela BB porquanto, dada a redução de postos de trabalho, se afigura essencial preservar os postos dos trabalhadores que revelam ter, globalmente, o melhor domínio dos skills profissionais e maior flexibilidade funcional.
(…)
No actual contexto da empresa e atendendo à acentuada diminuição dos indicadores financeiros e a previsão de diminuição do volume de vendas, nestas circunstâncias de mercado, a BB considera suficientes para assegurar as necessidades de distribuição actuais da empresa uma equipa composta, no máximo, por 7 motoristas distribuidores.

A empresa decidiu assim reduzir de 9 para 7, o número de motoristas distribuidores e consequentemente, suprimir 2 dois postos de trabalho inerentes a esta categoria profissional.

Afigurando-se indispensável a cessação de contrato de trabalho com dois motoristas distribuidores e revelando-se que não existem diferenças significativas de remuneração entre 05 trabalhadores pertencentes a esta categoria profissional foi decidido cessar o contrato de trabalho com os dois trabalhadores que apresentam os piores índices de avaliação, tendo por referência as avaliações regulares implementa-das pela BB nos últimos anos”.

5. – A R. decidiu o despedimento do A., com efeitos a 4/3/2014, ao abrigo de um processo de despedimento colectivo.

6. – Tendo disponibilizado a quantia de € 36.693,76, a título de compensação pela cessação do contrato, sendo que o A. procedeu à devolução dessa quantia.

7. –A R. comunicou ao A. a decisão de despedimento, acompanhada do “documento n.º 1º, conforme cópia junta aos autos a fls. 14 a 29, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, constituído por um relatório em que procedia à analise da situação de mercado ao nível da indústria de bebidas, com referência à situação de “crise económica” que se vive no país e alegando dados sobre a sua situação financeira, resultados de exercício e condições de acesso ao crédito bancário.

8. – O despedimento colectivo destinava-se a abranger 15 trabalhadores.

9. – A R. veio a desistir das suas intenções relativamente a uma trabalhadora e chegou a acordo para a rescisão com outros treze.

10. – O A. é membro da Direcção do Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura e das Indústrias de Alimentação, Bebidas e Tabacos de Portugal, qualidade que a R. bem conhecia.
*
*
2) de Direito
a) introdução
Sendo o contrato de trabalho de execução continuada, as formas de cessação aproximam-se das dos demais contratos com esta natureza[1]. Há uma certa propensão para se protelar no tempo – uma vez que não se extingue com a respectiva execução -, sem que isto signifique um vínculo perpétuo, já que, como é próprio das coisas do ser humano, tudo tem um fim.

Contudo, o princípio constitucional da segurança no emprego (art.º 53 da Constituição)[2] impõe uma regulamentação apertada dos modos de cessação e a imperatividade do respectivo regime. Desta sorte, o art.º 340 do Código do Trabalho revisto, sob a epígrafe “Modalidades de cessação do contrato de trabalho”, estipula que “para além de outras modalidades legalmente previstas, o contrato de trabalho pode cessar por:
a) Caducidade;
b) Revogação;
c) Despedimento por facto imputável ao trabalhador;
d) Despedimento colectivo;
e) Despedimento por extinção de posto de trabalho;
f) Despedimento por inadaptação;
g) Resolução pelo trabalhador;
h) Denúncia pelo trabalhador”.

O despedimento é uma das formas de cessação do contrato de trabalho (art.º 384 e 396, Código do Trabalho), que traduz uma cessação unilateral da entidade patronal fundado num motivo atendível (atenta a proibição do despedimento ad nutum em resultado do princípio constitucional da segurança no emprego, art.º 53 da Constituição da República Portuguesa).

Na modalidade paradigmática, por facto imputável ao trabalhador, supõe uma conduta culposa “do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento (art.º 351/1, Código do Trabalho2009; 396/1 CT2003).

Dito de outro modo: uma justa causa subjetiva.

Existem, porém, outras modalidades – o despedimento colectivo e o despedimento por extinção do posto de trabalho[3] - em que a causa não é subjetiva, mas, pelo contrário, objetiva: não é imputável ao trabalhador mas funda-se em razões económicas (de mercado, estruturais ou tecnológicas), que afetam o empregador.

O cumprimento das formalidades legais é, aqui, fundamental, e as incompleições procedimentais fundamentais acarretam, nos termos dos art.º 383, 384 e 385, a ilicitude do despedimento[4].

O empregador tem de colocar à disposição do trabalhador a compensação até ao termo do aviso prévio, sendo a falta sancionada de igual modo.

Uma resolução unilateral do contrato por iniciativa do empregador, ainda que abranja uma pluralidade de trabalhadores, não constitui despedimento colectivo se não satisfizer os requisitos legais, incluindo o pagamento de uma compensação e a observância de formalidades como consultas e comunicações, sendo então, um caso de vários despedimentos singulares ilícitos.

Mas vejamos mais detalhadamente o regime legal.

O despedimento colectivo, previsto nos art.º 359 a 366 do CT2009, é uma forma de cessação de contratos laborais promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de micro empresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos (art.º 359, n.º 1).

Funda-se em (art.º 359, n.º 2 e 367, n.º 2):
a) Motivos de mercado – redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado;
b) Motivos estruturais – desequilíbrio económico-financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes;
c) Motivos tecnológicos – alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.

Requisitos:
- cessação em simultâneo ou sucessivamente no período de 3 meses;
-abranger pelo menos 2 ou 5 trabalhadores, consoante o tamanho da empresa;
- por motivo de encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente, ou redução de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos (art.º 359, n.º 1).

Por secção ou estrutura equivalente entende-se uma unidade funcional dentro do organigrama da empresa (art.º 368, n.º 2; note-se que não é secção ou estrutura equivalente alguma do empregador a cessação de contrato de prestação de serviços deste e a consequente perda de locais de clientes da empregadora onde o trabalhador laborava, por exemplo, se uma empresa de telecomunicações deixa de proporcionar serviços de reparação/instalação de linhas e externalizando qualquer necessidade através do outsourcing a terceiros, fica em princípio sem actividade para dar aos seus trabalhadores nessa área; mas se se limita a perder alguns clientes, num universo alargado não há encerramento de qualquer secção ou estrutura e não pode simplesmente – sem averiguar o cumprimento dos critérios do n.º 2 do art.º 368 - despedir aqueles que prestavam a actividade relativamente àqueles clientes).

O empregador tem de comunicar a intenção de despedir, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger;. na falta das entidades referidas no n.º 1, o empregador comunica a intenção de proceder ao despedimento, por escrito, a cada um dos trabalhadores que possam ser abrangidos (360, n.º 1 e 3).

Nas comunicações constará:
a) Os motivos invocados para o despedimento colectivo;
b) O quadro de pessoal, discriminado por sectores organizacionais da empresa;
c) Os critérios para selecção dos trabalhadores a despedir;
d) O número de trabalhadores a despedir e as categorias profissionais abrangidas;
e) O período de tempo no decurso do qual se pretende efectuar o despedimento;
f) O método de cálculo de compensação a conceder genericamente aos trabalhadores a despedir, se for caso disso, sem prejuízo da compensação estabelecida no artigo 366.º ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho (art.º 360, n.º 2).

Na fase das Informações e Consultas o empregador promove fase de informações e negociação com a estrutura representativa dos trabalhadores, com vista a um acordo sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que reduzam o número de trabalhadores a despedir, designadamente (art.º 361, n.º 1):
a) Suspensão de contratos de trabalho;
b) Redução de períodos normais de trabalho;
c) Reconversão ou reclassificação profissional;
d) Reforma antecipada ou pré-reforma.

No que toca à decisão, o empregador comunica a cada trabalhador abrangido a decisão de despedimento, com menção expressa do motivo e da data de cessação do contrato e indicação do montante, forma, momento e lugar de pagamento da compensação, dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, por escrito e com antecedência mínima, relativamente à data da cessação (art.º 363, n.º 1).

Tal deverá ser feito com um período de aviso prévio expresso na antecedência mínima, relativamente à data da cessação, de: a) 15 dias, no caso de trabalhador com antiguidade inferior a um ano; b) 30 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a um ano e inferior a cinco anos; c) 60 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a cinco anos e inferior a 10 anos; d) 75 dias, no caso de trabalhador com antiguidade igual ou superior a 10 anos. (art.º 363, n.º 1, 371, n.º 3, 378, n.º 2). Caso a cessação abranja ambos os cônjuges ou pessoas que vivam em união de facto, a comunicação deverá ser feita com a antecedência mínima prevista no escalão imediatamente superior ao que seria aplicável se apenas um deles integrasse o despedimento (art.º 363, n.º 2).

Direitos do trabalhador:
- Não sendo observado o prazo mínimo de aviso prévio, o contrato cessa decorrido o período de aviso prévio em falta a contar da comunicação de despedimento, devendo o empregador pagar a retribuição correspondente a este período. (art.º 363, n.º 4)
- Durante o prazo de aviso prévio, o trabalhador tem direito a um crédito de horas correspondente a dois dias de trabalho por semana, sem prejuízo da retribuição. O crédito de horas pode ser dividido por alguns ou todos os dias da semana, por iniciativa do trabalhador (artigo 364.º, n.º 1 e 2)
- Durante o prazo de aviso prévio, o trabalhador pode denunciar o contrato de trabalho, mediante declaração com a antecedência mínima de três dias úteis, mantendo o direito a compensação (art.º 365.º)
- O trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade. Em caso de fracção de ano, a compensação é calculada proporcionalmente. A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades (artigo 366.º, n.º 1 a 3)
- Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo, mas a presunção pode ser elidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, à disposição do empregador a totalidade da compensação pecuniária recebida (art.º 366, n.º 4 e 5; cfr. ainda art.º 372 e 379.

Quanto aos fundamentos de ilicitude do despedimento acrescem aos genericamente previstos no art.º 381, que se reconduzem a falta do procedimento, inexistência da causa de justificação invocada, discriminação e falta de parecer prévio no caso de puérperas, grávidas ou lactantes), os seguintes fundamentos especiais, decorrentes de o empregador:
a) Não ter feito a comunicação prevista nos n.ºs 1 ou 4 do artigo 360.º ou promovido a negociação prevista no n.º 1 do artigo 361.º;
b) Não ter observado o prazo para decidir o despedimento, referido no n.º 1 do artigo 363.º;
c) Não ter posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 366.º e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 4 do artigo 363.º (artigo 383).
*
O Tribunal recorrido estribou-se nesta ordem de razões:

- "O Autor começa por fundamentar o pedido (...) na alegada insuficiência da comunicação prevista no art.º 363º, nº 1 do Código do Trabalho. (...) A enunciação e procedência da motivação invocada para o despedimento colectivo tem importância fundamental desde a fase inicial do processo que se inicia depois de, internamente, o empregador ter decidido proceder ao despedimento colectivo e que se desenvolve até à cessação dos contratos dos trabalhadores abrangidos. Por essa razão o artigo 360º, n.º 2, determina que a comunicação prévia da intenção de proceder ao despedimento deve ser acompanhada, além do mais, de descrição dos motivos invocados (...) e da indicação dos critérios que servem de base para a selecção dos trabalhadores a despedir. A R. efectuou essa comunicação prévia (n.º 3. e 4), enunciado de forma vaga que o critério de selecção seria “a avaliação de competências, com base nas avaliações de performance profissional efectuados regularmente”. Dessa comunicação também resulta que em relação aos motoristas manobradores, categoria do A., serão suprimidos dois dos nove postos de trabalho, fazendo-se “cessar o contrato de trabalho com os dois trabalhadores que apresentem os piores índices de avaliação, tendo por referência as avaliações regulares implementadas pela BB nos últimos anos”. Este critério não se mostra devidamente concretizado, desde logo porque não se refere o número de anos que vão ser considerados nessa avaliação.

- O artigo 363º, n.º 1 (...) impõe que, após a fase de informações e negociação, e na falta de acordo, a decisão de despedimento seja notificada por escrito a cada trabalhador a despedir “com menção expressa do motivo e da data da cessação do respectivo contrato”. A (...) indicação prévia dos critérios de selecção (...) tem como objectivo evitar práticas arbitrárias e discriminatórias na escolha dos trabalhadores (...) e a permitir a sindicabilidade, quer pelo trabalhador, quer pelo tribunal, da decisão concreta da aplicação desses critérios, (...) decisão que terá de ser incluída na comunicação a que se reporta o artigo 363º, nº 1, através da qual a entidade patronal comunica a cada trabalhador abrangido a decisão do seu despedimento individual. Dessa comunicação deve resultar o motivo que levou o empregador a seleccionar o trabalhador (...) e não apenas a fundamentação que justificou o recurso ao despedimento colectivo e que foi comum a todos os trabalhadores por ele abrangidos. O motivo individual tem necessariamente de conter a indicação concreta das razões que, de acordo com os critérios de selecção previamente definidos pelo empregador, tivesse conduzido a que fosse o Autor e não qualquer outro trabalhador o seleccionado (neste sentido vd. Ac. do S.T.J. de 18.10.2006, proc. 06S1324, www.dgsi.pt).

- (...) Ora, na comunicação da decisão final a R. não explicitou o motivo que a levou a seleccionar o A., limitando-se a reproduzir os motivos económico-financeiros e de mercado que estiveram na base do recurso ao despedimento colectivo (facto 7. e documento de fls. 14 a 29). (...) Na carta da comunicação da intenção de despedimento o critério estabelecido para a selecção dos trabalhadores é vago, referindo-se as avaliações dos últimos anos, sendo que a decisão final comunicada ao trabalhador não contém qualquer explicitação da forma como tais critérios vagos foram aplicados, por forma a concluir-se que o A. teria de ser o trabalhador seleccionado para o despedimento. (...) Não é explicitado como é que se conclui que o A. faz parte do grupo dos dois trabalhadores que têm pior avaliação".

Vejamos.

Dispõe o art.º 360, n.º 1, 2 e 3, do CT, que:
1 – O empregador que pretenda proceder a um despedimento colectivo comunica essa intenção, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger.

2 – Da comunicação a que se refere o número anterior devem constar:
a) Os motivos invocados para o despedimento colectivo;
b) O quadro de pessoal, discriminado por sectores organizacionais da empresa;
c) Os critérios para selecção dos trabalhadores a despedir;
d) O número de trabalhadores a despedir e as categorias profissionais abrangidas;
e) O período de tempo no decurso do qual se pretende efectuar o despedimento;
f) O método de cálculo de compensação a conceder genericamente aos trabalhadores a despedir, se for caso disso, sem prejuízo da compensação estabelecida no artigo 366.º ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.

3 – Na falta das entidades referidas no n.º 1, o empregador comunica a intenção de proceder ao despedimento, por escrito, a cada um dos trabalhadores que possam ser abrangidos, os quais podem designar, de entre eles, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção da comunicação, uma comissão representativa com o máximo de três ou cinco membros consoante o despedimento abranja até cinco ou mais trabalhadores.
(4, 5, 6…)
Ou seja, a comunicação há de mencionar, designadamente, os motivos invocados para o despedimento colectivo e os critérios para selecção dos trabalhadores a despedir.

A razão de ser dessas comunicações prende-se com a possibilidade de proceder ao controlo dos motivos alegadamente justificativos do despedimento, seja pelos trabalhadores visados e seus representantes, seja eventualmente, mais adiante, pelo Tribunal.
Neste sentido escreveu o Sr. Desembargador José Feteira, em intervenção apresentada no Colóquio anual sobre Direito do Trabalho promovido pelo Supremo Tribunal de Justiça em Outubro de 2009, que “esse controlo deve incidir, quer sobre os fundamentos invocados pelo empregador como justificativos do despedimento – podendo o juiz socorrer-se, se necessário, de assessoria técnica, como decorre do disposto no art. 157º do Cod. Proc. Trabalho – quer sobre o procedimento desenvolvido pelo empregador na concretização de dessa forma de cessação do contrato de trabalho. (…) A justificação para a existência de um tal controlo jurisdicional, reside, sobretudo, na tutela dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento e que reclamem a intervenção dos tribunais. Através desse controlo procura garantir-se a esses trabalhadores, não só a legalidade dos fundamentos invocados pelo empregador como motivadores do despedimento que sobre eles recaiu, mas, sobretudo, que fundamentos correspondam a verdadeiras razões objectivas capazes de justificar o sacrifício de interesses fundamentais dos trabalhadores visados, como seja o respectivo emprego e, consequentemente, o correspondente estatuto sócio profissional no meio em que vivem e laboram. Para além disso, procura garantir-se aos trabalhadores alvo de despedimento colectivo ou, então, por extinção de postos de trabalho, a legalidade do procedimento desenvolvido pelo empregador na respectiva concretização. (…) Esse controlo jurisdicional deverá exercer-se de forma a serem levados em consideração e a serem objecto de ponderação todos os interesses em presença. De um lado, os interesses do empregador quando, no âmbito do princípio constitucional da liberdade de iniciativa económica privada e no quadro de gestão da sua empresa, decide optar pela reestruturação desta através da concretização do despedimento de trabalhadores baseado em qualquer das mencionadas razões objectivas. De outro lado, os interesses dos trabalhadores envolvidos no despedimento, mormente aqueles a que fizemos referência, sendo certo que, dessa maneira, se estará a observar e a acautelar, de algum modo, o princípio constitucional de segurança no emprego”.

Para isso é, pois, necessário que sejam conhecidas as razões concretas que levam ao despedimento, levadas desde logo ao conhecimento dos representantes dos trabalhadores; e no caso de os trabalhadores não terem nem constituírem representantes, tal comunicação é-lhes feita diretamente (neste sentido, por todos, cfr. Pedro Romano Martinez, Código do Trabalho Anotado, 8ª ed., 2009, nota IV ao art.º 360, pag. 953 e 954; Júlio Gomes, Direito do Trabalho, I, 988; e Pedro Furtado Martínez, Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª ed., 313). Obviamente que a comunicação, em tal caso feita aos trabalhadores, há de conter as informações aludidas no art.º 360, n.º 2 (Furtado Martins, op. cit., 314).

Verifica-se que, no caso, veio a ser constituída uma comissão representativa dos trabalhadores.

A 1ª questão consiste em saber se o critério comunicado, a saber, “os piores índices de avaliação, tendo por referência as avaliações regulares implementadas pela BB nos últimos anos”, é vago e insuficiente ou se, como defende a recorrente, é especifico e concreto, afastando qualquer duvida em sede de descriminação ou arbitrariedade.

Antes, porém, de a podermos decidir, deparamos com uma objeção prévia do recorrido, a saber, a de que a R. aditou a estes autos, inclusive após a contestação, uma série de elementos que não estavam no Procedimento de Despedimento Coletivo e que não poderão ser tidos em conta, quais são os que mencionados nas al. I, K, P, Q, R. e S.

Esgrimiu aí a R.:
I) Sistema de Avaliação de Desempenho este que é, inclusive, assegurada e gerido por uma empresa externa, a Minimal – Business Objects Informática, Lda., empresa esta que nada tem a haver com a Recorrente;
K) Face à extensa prova documental junta pela Recorrente, não persiste qualquer obstáculo ao Recorrido que o pudesse impedir de sindicar a escolha individual à luz dos critérios de selecção definidos pelo empregador;
P) A Recorrente levou efectivamente em consideração os anos de 2011 e 2012, tendo para o efeito junto a totalidade das avaliações de todos os motoristas distribuidores relativas aos referidos anos de 2011 e 2012;
Q) A escolha dos anos de 2011 e 2012, altura em que a empresa nem equacionava a promoção de um processo de despedimento colectivo é, por si só, demonstradora da objectividade e transparência na determinação do critério de selecção;
R) Resulta inequivocamente destes documentos que o Recorrido tem o pior índice de avaliação de entre todos os motoristas distribuidores nos anos tidos em consideração;
S) Razão pela qual, os anos levados em consideração devem considerar-se adequadamente concretizados;

Ponderando a matéria trazida oportunamente ao conhecimento do Tribunal, mormente constante do Procedimento de Despedimento Coletivo (PDC), há que reconhecer que não consta aí, de tal sorte que a 1ª instância até destacou expressamente que a decisão do empregador “não refere o número de anos que vão ser considerados nessa avaliação”.

Com efeito, a comunicação da intenção de despedimento é sucinta e até tabelar, remetendo a R. para o anexo II contendo os “critérios para seleção dos trabalhadores a despedir” , após o que refere aquilo que consta no n.º 4 dos factos provados.

[“(…) Para as funções que não se extinguem mas cujo número de postos de trabalho é reduzido, foi adoptado o critério da avaliação de competências, com base nas avaliações de performance profissional efectuados regularmente pela BB porquanto, dada a redução de postos de trabalho, se afigura essencial preservar os postos dos trabalhadores que revelam ter, globalmente, o melhor domínio dos skills profissionais e maior flexibilidade funcional.
(…)
No actual contexto da empresa e atendendo à acentuada diminuição dos indicadores financeiros e a previsão de diminuição do volume de vendas, nestas circunstâncias de mercado, a BB considera suficientes para assegurar as necessidades de distribuição actuais da empresa uma equipa composta, no máximo, por 7 motoristas distribuidores.

A empresa decidiu assim reduzir de 9 para 7, o número de motoristas distribuidores e consequentemente, suprimir 2 dois postos de trabalho inerentes a esta categoria profissional.

Afigurando-se indispensável a cessação de contrato de trabalho com dois motoristas distribuidores e revelando-se que não existem diferenças significativas de remuneração entre 05 trabalhadores pertencentes a esta categoria profissional foi decidido cessar o contrato de trabalho com os dois trabalhadores que apresentam os piores índices de avaliação, tendo por referência as avaliações regulares implementadas pela BB nos últimos anos”].

Desconhecendo-se que anos são esses, tem de se ignorar o teor das próprias avaliações (o que sempre decorreria da falta de indicação dos anos considerados na decisão patronal).

A sindicabilidade de um critério deste tipo exigiria sempre a demonstração de que ao trabalhador foi dado o conhecimento da avaliação e a oportunidade de se pronunciar sobre o seu teor, porventura impugnando-o até. De outro modo poderá tratar-se apenas de uma bitola formal, formalmente um pseudo critério objetivo e na realidade uma ferramenta colocada sob a inteira disponibilidade do empregador (como poderá ser uma não controlada “avaliação de carácter psicológico”) para a prossecução dos seus fins, o qual, manipulando os critérios a seu bel prazer, conseguiria determinar os trabalhadores a despedir.

Quer dizer, uma afirmação como esta – de que o trabalhador tem o pior desempenho -, desacompanhada de elementos que permitam compreender o seu sentido e acerto bem como legitimá-la (o que, quanto a esta, passaria pela oportuna notificação do mesmo para se manifestar), tanto pode ter subjacente um ponderoso motivo imputável ao trabalhador (que vg. “não gostaria de se esforçar”), como a eventualidade mesquinha de o empregador (que vg. poderia não simpatizar com sindicalistas) se querer livrar dele. Em qualquer caso a avaliação, não sendo oportunamente sujeita ao contraditório (não se confunda isto com a auto-avaliação que era pedida aos trabalhadores, que o A. manifestamente conhecia), mesmo existindo tem um relevo meramente interno da R. (nem se argumente com o facto de ser uma entidade terceira a avaliar; não é aí que está o elemento fulcral mas na isenção e independência, que nem sempre existem em terceiros prestadores de serviços diante dos interesses dos clientes).

Ora, é sem dúvida ao empregador que cabe demonstrar que cumpriu os legais pressupostos (art.º 342/1, CC; e no caso, note-se, o trabalhador é sindicalista, qualidade especialmente protegida pelo Código do Trabalho, como se vê, designadamente, no art.º 410).

Mais ainda, cumpriria esclarecer porque foram escolhidos aqueles dois anos (que em todo o caso a comunicação não refere, ficando pela afirmação nebulosa de que são os “últimos anos”) e não, vg., 5 ou 10, ou outro numero porventura mais suscetível de refletir o valor real do trabalhador (e não de o mostrar, quiçá, numa fase menos boa da sua vida). Isto é tanto mais pertinente quanto é certo que o A. tem quase 40 anos de antiguidade (foi admitido em 4.5.1974 e despedido a 4.3.2014).

Não é possível agora, fora do PDC, vir a R. esclarecer como é que era feita a avaliação e os anos a que se referia: trata-se de matéria que devia constar logo da comunicação de intenção de despedir e da própria decisão. Isto é, não são vg. os anexos IV e seguintes, mormente o IX, que suprem esta incompleição.

Argumenta a R. que o empregador tem plena liberdade de escolha do critério de seleção no despedimento coletivo.

Mas é duvidoso que assim seja: estão em causa valores constitucionais de parte a parte, pelo que se impõe que os critérios sejam claros e comprensíveis. José Feteira, op. cit., problematiza:
“o empregador é, plenamente, livre quanto à fixação dos critérios de selecção dos trabalhadores alvo desse tipo de despedimento? Deve o tribunal atender aos interesses dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento, designadamente o interesse maior que é o da manutenção dos respectivos empregos, sobretudo quando esses interesses, porventura submetidos a apreciação na fase processual de informações e negociação, não foram, depois, levados em devida conta pelo empregador nessa fase processual nem na decisão de despedimento? O tribunal poderá fundar o reconhecimento de ilicitude de despedimento com base nos aludidos critérios de escolha ou na falta de uma ponderação séria destes interesses pelo empregador no âmbito do procedimento levado a cabo para alcançar aquele objectivo?
(…) Uma posição doutrinal (… defende) que, embora devendo proceder de boa fé, “no despedimento colectivo o empregador é livre na fixação dos critérios que vai seguir para selecção dos trabalhadores a despedir, embora tenha que indicar tais critérios na comunicação enviada à comissão de trabalhadores ou outra estrutura representativa dos trabalhadores” (Cfr. Prof. Júlio Gomes em “Direito do Trabalho” Vol. I – Relações Individuais de Trabalho, pagª 983); (mas também há) criticas doutrinais (…) no sentido de se não compreender que a ponderação jurisdicional dos fundamentos invocados pelo empregador como justificativos do despedimento colectivo de trabalhadores, seja efectuada numa perspectiva meramente economicista, encarando esses fundamentos e, consequentemente os despedimentos que eles suportam, como actos de gestão do empregador a exigir, quando muito, um controlo mínimo pelos tribunais, a que acresce a circunstância destes, por via de regra, não atenderem a que, a par dos interesses do empregador concorrem direitos fundamentais dos trabalhadores, desde logo o direito ao emprego, impondo-se-lhes um juízo de proporcionalidade necessário em ordem a serem conciliados, em concreto, esses interesses.
(…) Afigura-se-me ser de difícil admissibilidade que o empregador, em processo de despedimento colectivo e ressalvados quaisquer critérios discriminatórios, de si, legalmente inadmissíveis, possa usar de plena liberdade quanto aos critérios de selecção de trabalhadores a despedir. Não se compreende que possam constituir critérios de selecção de trabalhadores alvo de despedimento colectivo, designadamente e a título de meros exemplos, o maior ou menor absentismo “tout court”, sem se olhar, portanto, às razões que, porventura, possam estar na base e justificar, de alguma forma, esse o maior ou menor absentismo, ou, então, o perfil mais ou menos adequado dos trabalhadores ao exercício da função, ou, ainda, a maior ou menor polivalência dos trabalhadores em causa, com toda a subjectividade que critérios deste tipo, sobretudo destes últimos, podem encerrar.
Impõe-se, portanto e a meu ver, ao empregador, para além da observância de alguns limites, em termos de razoabilidade, quanto aos fundamentos invocados como susceptíveis de justificar a opção pelo despedimento enquanto via de reestruturação da sua empresa, a exigência quanto à adopção de critérios congruentes em termos de selecção dos trabalhadores a despedir. Com efeito, afigura-se-nos que os critérios avançados pelo empregador com esta finalidade e dados a conhecer aquando das comunicações que deve efectuar no âmbito do procedimento para despedimento colectivo, devem, pelo menos, ter a virtualidade de afastar qualquer ideia de arbitrariedade, sob pena de, em posterior controlo jurisdicional, poderem ser considerados como constituindo violação do princípio constitucional de segurança no emprego ou, porventura, como expressão de eventual exercício abusivo de um direito por parte do empregador e, nessa medida, não lograrem ultrapassar o crivo de apreciação em termos de licitude.

Também o Dr. Fraústo da Silva, em “Observações Acerca da Selecção Social no Procedimento de Despedimento Colectivo”, depois de dar conta de que se entendeu, durante anos, que os critérios do empregador eram insindicáveis, escreve:
Esta orientação veio a ceder – a nosso ver, correctamente. O reconhecimento de que a cessação de contratos de trabalho é, em sede de despedimento colectivo, uma consequência de pressupostos objectivos relevantes (organizativos, técnicos, económicos) e não um fim e que, por conseguinte, se impõe a possibilidade de verificação externa desse facto que não se limite ao controlo de aspectos meramente formais, sob pena de se considerar violado o art. 53.º da Constituição, conduziu à conclusão de que o tribunal pode apreciar a adequação do despedimento de cada um dos trabalhadores atingidos à fundamentação do despedimento colectivo.
Cremos que esta nova perspectiva foi pela primeira vez enunciada pelo Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 18 de Outubro de 2006, secundada, pelo menos, em decisões de 17 de Janeiro de 2007, 27 de Junho de 2007 e 26 de Novembro de 2008, podendo considerar-se hoje pacífica”.

Podemos concluir, pois, que o empregador não tem plena liberdade de escolha dos critérios do despedimento coletivo; importa que adote critérios razoáveis e inteligíveis, e não bitolas que se prestem à consecução de outros fins (nomeadamente livrar-se sem mais dos elementos menos convenientes).

Naturalmente, a primeira decorrência da boa fé decorre do disposto no citado art.º 360/2: importa que o empregador cumpra as formalidades legais em termos que permitam a sua sindicação. Como proclamou o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. acórdão de 19.11.2014, proc. 3193/09.8TTLSB.L1.S1), “Tratando-se de um despedimento coletivo, na comunicação por escrito à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger, é essencial que constem os critérios para seleção dos trabalhadores a despedir: os motivos, os setores abrangidos, os trabalhadores selecionados. Tal enunciação dos critérios deverá ser suficientemente clara de modo a permitir: (i) aos trabalhadores afetados, (a) a percepção das razões que importaram fossem englobados no procedimento, (b) aquilatar da adequação desses critérios à cessação, em concreto, dos seus vínculos laborais, (c) aferir da veracidade dessas razões e seu nexo com o critério eleito; (ii) ao Tribunal, a sindicabilidade da sua concreta aplicação”.

O que a R. não o fez, desde logo ao não indicar os anos da avaliação nem a razão da escolha dos mesmos (art.º 360/2/c).
O que era especialmente pertinente, tendo em atenção a grande antiguidade do A., e também dado ser um sindicalista, como forma de clarificar exatamente a lisura do critério (e porque é que não é discriminatório). 

Ao não prestar as informações em falta a R. eximiu-se também a negociar nos seus devidos termos, como pretende a lei, não podendo os representantes dos trabalhadores argumentar com pleno conhecimento dos factos (art.º 361).

Seguiremos pela terceira vez, com a devida vénia, a reflexão do Desemb. José Feteira:

“Por outro lado, considerando a existência de uma fase de informações e negociação no âmbito do procedimento para despedimento colectivo e considerando manifesto propósito do legislador numa crescente participação dos trabalhadores no âmbito da gestão das empresas e nos respectivos processos de reestruturação – como decorre do disposto nos artigos 426º a 429º do actual Código do Trabalho – afigura-se-me que naquela fase processual devem ser colocados e discutidos, franca e honestamente, ou seja, segundo princípios de boa fé, os interesses de parte a parte entre o empregador e os representantes dos trabalhadores a despedir, sem esquecer a participação moderadora mas, essencialmente, conciliadora do representante do ministério responsável pela área laboral em causa, cabendo, depois, ao juiz, numa ulterior fase de impugnação de despedimento ponderar os diversos interesses em presença, descortinando, se necessário com assessoria técnica, da viabilidade ou não das medidas alternativas ao despedimento que, porventura, tenham sido propostas e discutidas, concluindo pela licitude ou ilicitude do despedimento decidido pela entidade empregadora.
Estamos em crer, porém, que, grande parte das vezes, na prática, não é isto que sucede. (…) Nessas circunstâncias, nem sequer se poderá concluir que o empregador haja promovido a negociação a que se alude no n.º 1 do art. 361º do actual Código do Trabalho, sendo certo que é a ele que cabe essa missão, a qual passa, normalmente, por um contraponto de propostas e subsequente discussão dos correspondentes fundamentos, ou, no mínimo, que a proposta apresentada pelo mesmo se estribe em fundamentos de algum modo convincentes quanto as opções por ele tomadas”.
Assim, é claro que a comunicação da intenção de despedimento com os elementos facultados aos representantes não satisfaz os requisitos legais e nem permite adequada negociação.
*
Quanto à decisão do empregador, importa que dela constem:
- o motivo da cessação
- a data de cessação do contrato
- a indicação do montante, forma, momento e lugar de pagamento da compensação, dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho (art.º 363, n.º 1, Código do Trabalho).

Importa que a indicação do motivo da cessação seja feita em termos tais que seja possível o seu controle jurisdicional e pelo trabalhador (como diz Pedro Furtado, op. cit., 329-330, citando em parte o prezado mestre Prof. Bernardo Xavier, “exige-se «a indicação de um complexo motivacional, em que o empregador sintetiza as razões que assume como determinantes, de modo suficientemente nítido para dar a conhecer ao trabalhador os fundamentos essenciais, a completar eventualmente com aqueles que constam do procedimento ou até por outros que possuam carácter instrumental ou de desenvolvimento. Haverá assim que comunicar o necessário para que se possa deduzir «a concreta decisão da gestão, em termos de tornar transparente a situação e de convencer ou habilitar o despedido com os elementos necessários a pensar numa eventual impugnação». Por outro lado, há que ter presente que a decisão faz parte de um procedimento participado, em que a motivação foi objeto de informação e negociação. Daí que, noutra formulação da mesma ideia, se assinale que «uma indicação de motivos, clara, suficiente e devidamente congruente com o procedimento encetado e com a decisão tomada, é necessária como requisito, em termos de o trabalhador despedido, insuficientemente informado, poder sustentar a irregularidade e a nulidade do seu despedimento». Mas recorda-se que a fundamentação poderá constar apenas da decisão final, havendo que ponderar todos os elementos do procedimento que a ela respeitem, desde os constantes da comunicação inicial aos que resultam da fase de informações e negociação, pelo que a indicação final dada a cada trabalhador sempre poderá ser complementada com as demais indicações resultantes do procedimento. (… A) fundamentação concreta e final do despedimento (conterá), além da referência à motivação geral da decisão de redimensionamento da organização subjacente ao despedimento coletivo, (os) concretos motivos que determinam a cessação de cada um dos contratos de trabalho abrangidos pelo despedimento, os quais podem não ser exatamente iguais para todos os trabalhadores”).

A comunicação da decisão de despedimento ao A. (fls. 14 e 15) diz: “o despedimento coletivo tem por fundamento motivos estruturais, de mercado e financeiros que se encontram devidamente enunciados no Anexo I da carta de comunicação de intenção de despedimento”, que dá por reproduzido. Junta o dito Anexo I, que respeita à situação da própria R., nada referindo quanto ao A..

Destarte, razão tem a sentença recorrida quanto afirma que:
“(…) O motivo individual tem necessariamente de conter a indicação concreta das razões que, de acordo com os critérios de selecção previamente definidos pelo empregador, tivesse conduzido a que fosse o Autor e não qualquer outro trabalhador o seleccionado (neste sentido vd. Ac. do S.T.J. de 18.10.2006, proc. 06S1324, www.dgsi.pt). (...) Ora, na comunicação da decisão final a R. não explicitou o motivo que a levou a seleccionar o A., limitando-se a reproduzir os motivos económico-financeiros e de mercado que estiveram na base do recurso ao despedimento colectivo (facto 7. e documento de fls. 14 a 29)”.

A este propósito cita o acórdão de 30.04.2014 desta Relação de Lisboa (em que intervieram os ora adjuntos) o Prof. Bernardo Xavier, in” O Despedimento Colectivo no Dimensionamento da Empresa”, Lisboa, p. 575: “o empregador está vinculado a disponibilizar-se para a negociação e a criar os mecanismos e condições necessárias para que aquela tenha lugar, marcando as reuniões e a elas comparecendo. Cumpridas essas exigências mínimas, só em casos contados, em que se comprove que o empregador não forneceu a informação exigível, nem possibilitou uma correcta audição dos pontos de vista dos trabalhadores ou que os rejeitou sem exame, de modo a frustrar-se o que pode ser tido como conteúdo útil da consulta, é que de verá considerar inexistente a promoção” da negociação» [p. 321]”, concluindo que “a omissão das menções a incluir na decisão de despedimento, como é o caso da “menção expressa do motivo”, só releva se for total, isto é, se não puder ser suprida por outros elementos do procedimento que explicitem os respectivos motivos”.

Aqui, porém, a omissão é total, não podendo ser preenchida por elementos do Procedimento de Despedimento Coletivo, na medida em que não há quaisquer elementos pertinentes no PDC. Não podia o trabalhador nem a comissão ad hoc saber quais as avaliações pertinentes e a sua razão de ser, por aí não constarem.

Assim sendo, concluímos que não foram feitas, nos termos da lei, as comunicações devidas, seja da intenção de despedimento (em especial a comunicação à representação dos trabalhadores) seja a comunicação da decisão de despedimento, o que acarreta a ilicitude do despedimento (art.º 381/b e 383/a, CT).
*
Fica prejudicada a questão suscitada subsidiariamente da falta de disponibilização da quantia devida, que seria, na ótica do A. € 38.693,76 e não € 36.693,76, a qual não foi conhecida em 1ª instância.
*
DECISÃO:

Pelo exposto julga-se a apelação improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
Custas do recurso pelo recorrente.


Lisboa, 13 de maio de 2015

Sérgio Almeida
Jerónimo Freitas
Francisca Mendes


[1] Pense-se em certos contratos como de fornecimento de água, energia eléctrica e telefone ou de arrendamento vinculístico.
[2] O qual não traduz um privilégio do trabalhador mas o correspectivo da sua subordinação jurídica à entidade patronal.
[3] Procurando distingui-los, proclamou o recentíssimo acórdão desta Relação de Lisboa de 10-04-2013: o despedimento coletivo busca a cessação concertada de, pelo menos, dois (no caso das micro e da pequena empresas) ou cinco contratos de trabalho (nas média e grande empresas), havendo despedimento por extinção do posto de trabalho por exclusão de partes ou seja, quando estejam em causa, com referências aos mínimos fixados para o despedimento coletivo, um número inferior de postos de trabalhos a eliminar.
[4] Neste sentido, por todos, cfr. o acórdão da Relação do Porto de 04-06-2007, Processo 0711178 (apud www.itij.pt, consultado em 09/10/2009): “I - O despedimento por extinção do posto de trabalho deve fundamentar-se em razões objectivas, ligadas à empresa, apuradas num procedimento em que se observe um conjunto de requisitos e pressupostos, sob pena de ilicitude. II - Tal como sucede com o despedimento disciplinar, também no despedimento por extinção do posto de trabalho vigoram as regras gerais de repartição do ónus da prova, cabendo ao empregador alegar e provar os pressupostos formais e substanciais do despedimento fundado em razões objectivas. III - Não tendo a entidade patronal provado que elaborou o legal procedimento, com vista ao despedimento por extinção do posto de trabalho, mas apenas que remeteu ao trabalhador a declaração Modelo 346, tal despedimento tem de ser visto como um despedimento individual, sem justa causa, sem precedência de procedimento disciplinar e a que correspondem as legais consequências”.

Decisão Texto Integral: