Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
448/17.1GHVFX.L1-5
Relator: VIEIRA LAMIM
Descritores: INJUNÇÃO
DESCONTO
PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULO MOTORIZADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: - O princípio ne bis in idem apenas proíbe a dupla condenação penal e só haveria duplo julgamento se a suspensão provisória do processo correspondesse a um julgamento e a injunção a uma pena, não sendo confundível o inquérito com o julgamento, nem o despacho de suspensão, enquanto encerramento do inquérito, com a sentença.

- A suspensão do processo pressupõe uma injunção particular especialmente prevista no nº3, do art.281, CPP, que não perde a sua natureza de injunção e que o arguido não pode deixar de avaliar, no momento em que lhe é pedida a concordância com a suspensão provisória do processo, consciente que se não cumprir as injunções impostas o processo prosseguirá e ficará sujeito às consequências penais que vierem a ser fixadas na sentença, sem que a lei preveja qualquer desconto na pena pelo eventual cumprimento de injunções.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa:

Iº 1. No Processo Abreviado nº448/17.1GHVFX, da Comarca de Lisboa Norte (Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira - Juiz 2), foi julgado, N. , acusado de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez.
O Tribunal, após julgamento, por sentença oral de 30Jan.19, decidiu:
“…
Condeno o arguido N. , como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, praticado em 07-10-2017, em Vialonga, p. e p.pelos artigos 292º, nº 1 e 69º nº 1 al. a), ambos do Código Penal, na pena de 75 (setenta) dias demulta, à taxa diária de 5,00 euros (cinco euros), o que perfaz o montante total de 375,00 euros(trezentos e setenta e cinco euros).
- Condeno o arguido N. , na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de todas as categorias, pelo período de 3 (três) meses.
…”.

2. Desta sentença recorre o arguido, N. , tendo apresentado motivações, das quais extraiu as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso da, aliás, douta sentença proferida nos autos, na qual foi o recorrente condenado, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 e 69º, nº 1, al. a) na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, o que perfaz o montante total de 375,00 euros e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de todas as categorias, pelo período de 3 meses.
2. Com a mesma não pode conformar-se, limitando as razões da sua discordância a questões de direito, concretamente por estender ter sido violado o princípio de non bis in idem .
3. O artigo 29º , nº 5 da Constituição da República Portuguesa consagra o mesmo ao nível do julgamento, nos seguintes termos : “ Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”.
4. Em anotação a este artigo, os Profs. Vital Moreira e Gomes Canotilho, consideram que a Constituição, “ (...) proíbe rigorosamente o duplo julgamento e não a dupla penalização, mas é óbvio que a proibição do duplo julagamento pretende evitar tanto a condenação de alguém que já tenha sido definitivamente absolvido pela prática da infracção, como a aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do mesmo crime” ( in Constituição da República Portuguesa anotada, Vol.I, pág. 497).
5. A protecção constitucional abrange o duplo julgamento, mas também a “ aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do mesmo crime”, que seria, também na nossa modesta opinião, o que aconteceria com o não desconto das injunções já cumpridas em sede de suspensão provisória do processo pelo arguido- 5 meses- ao nível da proibição de condução, como decidiu o Tribunal a quo nos presentes autos.
6. Revestindo as injunções natureza próxima das sanções penais, por força da intervenção do Juíz de Instrução, constitui uma “renovada sanção jurídico-penal”, o decidido na sentença revidenda não desconto da injunção já cumprida pelo arguido – a entrega da sua carta de condução por um período cumprido de 5 meses, em que esteve privado de conduzir-, sob pena de uma clara violação do princípio non bis in idem ínsito no texto constitucional.
7. Tendo sido nos presentes autos acordada a suspensão provisória do processo, nos termos do artigo 281º do CPP, com a 1ª injunção da proibição da condução de veículo automóvel, prevista no nº 3 do preceito, e tendo aquela suspensão terminado – apesar dos vários requerimentos do arguido para que tal não viesse a suceder, oferecendo o pagamento imediato da 2ª injunçao pecuniária imposta- , determinando o prosseguimento do processo ao abrigo do nº 4 do artigo 282º do mesmo Código, o tempo de 5 meses em que o arguido esteve privado da cara de condução deveria ser descontado no tempo da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir, aplicada na sentença revidenda.
8. A tal não obsta o aresto de fixação de jurisprudência do STJ 4/2017, prolatado em 4 de Maio de 2017, mas cuja interpretação não foi apreciada, até este momento, pelo Tribunal Constitucional e não constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 445º do CPP.
9. Resulta dos elementos juntos aos presentes autos que o arguido, ora recorrente, cumpriu a injunção de abstenção de conduzir pelo período de 5 meses aplicada no âmbito da suspensão provisória do processo, que, entretanto, prosseguiu por incumprimento de outra injunção que não a referida, nos termos do previsto na alínea a) do artigo 282º do CPP.
10. O recorrente, foi condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 ( três) meses pela sentença recorrida, nos termos do artigo 69º, nº 1 , al. a) do CP.
11. Assim, a pena acessória a que foi condenado deve ser extinta, por o recorrente já ter cumprido essa pena na suspensão provisória do processo.
12. Destarte não existir norma a prever o desconto, o legislador não quis criar uma situação de injustiça obrigando o arguido a repetir a sanção acessória anteriormente cumprida.
13. O tribunal a quo , sempre com o maior respeito, violou o artigo 29º, nº 5 da CRP, na medida em que duplicou a mesma punição.
14. E, de novo com todo o respeito, o tribunal recorrido também violou o artigo 281º, nº 3 do CPP, na medida em que não considerou a inibição de conduzir imposta na suspensão provisória do processo uma verdadeira pena.
15. As injunções e regras de conduta aplicadas na suspensão provisória do processo têm natureza penal.
16. A suspensão provisória do processo e a aplicação das injunções e regras de conduta, implica a “ concordância do Juíz de instrução” ( artigo 281º, nº 1 do CPP), o que confere às mesmas , s.m.o., uma natureza jurisdicional.
17. Esta natureza jurisdicional resulta, desde logo, da interpretação histórica da norma.
18. O projeto original do Código de Processo Penal de 1987 não previa a intervenção do juíz de instrução na suspensão provisória do processo , sendo tal competência exclusiva do Ministério Público.
19. No Acórdão do Tribunal Constitucional nº 7/87, de 9.01.1987, em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade do Código de Processo Penal, veio-se a considerar tal solução inconstitucional ao considerar que “ (...) Já se não aceita, porém, a atribuição ao Ministério Público da competência para a suspensão do processo e imposição das injunções e regras de conduta previstas na lei, sem a intervenção de um juíz, naturalmente o juíz de instrução, e daí a inconstitucionalidade, nessa medida, dos nºs. 1 e 2 do artigo 281º, por violação dos artigos 206º, e 32º, nº 4 da Constituição” .
20. Assim, a intervenção do juíz de instrução e a sua concordância vieram, em obediência a tal acórdão, a ser consagradas no CPP aprovado e, nessa medida, não podem deixar de ter consequência na natureza das injunções.
21. Na verdade, não faz sentido considerar que as injunções mantêm a mesma natureza com ou sem a intervenção do juíz de instrução, quando a solução sem a sua intervenção era inconstitucional.
22. A intervenção do juíz de instrução, com a sua concordância na suspensão provisória do processo, exigida pelo Tribunal Constitucional e assumida pelo legislador, confere às injuncões uma natureza que as aproxima das sanções penais e como tal devem ser consideradas.
23. A voluntariedade na aceitação das injunções é irrelevante para se aferir da natureza das mesmas . Não é, pois, a voluntariedade que determina a natureza da sanção, mas, antes, o facto de, na mesma, intervir ou não um Juíz.
24. Esta mesma ideia é reforçada quando o legislador veio a exigir, no nº 3 do artigo 281º do Código de Processo Penal, a obrigatoriedade da injunção de proibição de de conduzir veículos com motot. Aqui a voluntariedade já não existe, existindo, pelo contrário, uma espécie de contrato de adesão com o qual o arguido concorda ou não concorda e, nem por isso, a ideia subjacente ao mecanismo de suspensão provisória do processo, que é a voluntariedade, fica abalada. Portanto a voluntariedade é irrelevante para aferir da natureza da injunção.
25. O grande argumento que se pode invocar para o não desconto é, na verdade, o artigo 282º, nº 4 do Código de Processo Penal, quando estabelece que em caso de incumprimento e de o processo prosseguir, “ as prestações não podem ser repetidas”, tal como acontece no artigo 56º, nº 2 do Código Penal, em relação à revogação da suspensão da execução da pena de prisão.
26. Mas o que podemos entender com tal expressão “ As prestacões feitas não podem ser repetidas” ? : “ Todas as prestações feitas, só algumas?” .
27. Se, por exemplo, estivermos em face do pagamento em prestações de uma indemnização, as prestações pagas não são abatidas numa futura condenação? A resposta só pode ser afirmativa, pois caso contrário também aqui estaríamos perante um enriquecimento ilícito e sem justa causa.
28. A expressão “prestações” não se refere à proibição de conduzir veículos com motor, ainda que “prestação” numa acepção civilista seja a actividade ou acção, positiva ou negativa com vista à satisfação do interesso do credor, prestação de facto positivo ou negarivo , pois o conceito de não repetição das prestações só pode ser entendido como referindo-se às prestações que pela sua natureza possam ser repetidas, o que não acontececom o cumprimento da proibição de conduzir.
29. Trata-se, pois, de um conceito que se aproxima da “ repetição do indevido” utilizado em sede do instituto do enriquecimento sem causa, e como tal com um nítido cariz de natureza patrimonial, entendido como o direito de reaver aquilo que foi satisfeito, e com o mesmo sentido e alcance da impossibilidade de restituição de prestações efectuadas, em caso de revogação da suspensão da execução da pena de prisão, constante do nº 2 do artigo 56º do Cód. Penal, ou seja, as prestações previstas nas alíneas a) e b) do nº 1 do artº. 51º do CP” .
30. Nestas situações, meramente exemplificativas, como se pode ver as soluções são uniformes por força dos princípios que regem determinadas realidades jurídicas, seja ao nível civil, seja penal. O mesmo acontece, quando estão em causa injunções inerentes ao poder punitivo do Estado, cumpridas parcialmente pelo arguido. Nestas, o princípio que está em causa é a proibição de “ non bis in idem”.
31. As injunções, por força da intervenção do juíz na sua aplicação, com a sua concordância obrigatória, revestem natureza que as aproxima das sanções penais, pelo que não podem às mesmas deixar de se aplicar as regras previstas para essas mesmas sanções penais.
32. Nestas, se é verdade que o desconto da prisão preventiva está previsto na lei (artigo 80º do Código Penal), o que não acontece com o desconto das injunções parcialmente cumpridas, também é verdade que o legislador no artigo 69º, nº 6 do Código Penal, não incluiu como não contando para efeitos de proibição, o tempo já cumprido em sede de suspensão provisória de processo. Se atentarmos no inciso o mesmo é bastante completo e rigoroso, já que o campo de aplicação é bastante preciso “ medida de coacção processual, pena ou medida de segurança.
33. Este rigor leva-nos a concluir que foi intenção do legislador não incluir na “ conta para o prazo da proibição”, as injunções parcialmente cumpridas. Não se trata, pois, de uma omissão ou lacuna a preencher, mas, antes, de uma opção legislativa. O legislador não quis, expressa e intencionalmente, incluir na norma as injunções parcialmente cumpridas, como não contando, para efeitos da contagem do prazo de proibição de sanção acessória.
34. A protecção constitucional de non bis in idem abrange o duplo julgamento, mas também a “ aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do mesmo crime” , que seria exactamente o que aconteceria com o não desconto da injunção já cumprida pelo arguido em sede de suspensão provisória do processo – 5 meses de inibição de conduzir- seja ao nível da proibição de condução, como foi decidido na douta senença recorrida.
35. Revestindo as injunções natureza próxima das sanções penais, por força da intervenção do Juíz de instrução dever-se-á considerar como uma “ renovada sanção jurídico-penal” o não desconto da injunção já cumprida pelo recorrente, como, com o maior repeito, erradamente se decidiu na douta sentença revidenda.
36. Assim decidindo, violou o Tribunal a quo o princípio non bis in idem ínsito no texto constitucional supra referenciado.
37. Pelo que devem V. Exªs decidir que deve ser descontada na pena acessória aplicada ao recorrente a injunção já anteriormente por este cumprida em sede de suspensão provisória do processo, revogando a decisão tomada pelo tribunal a quo e dando provimento ao presente recurso, substituída por outra que decida que o período de inibição de condução de veículos a motor fixada em 5 meses a título de injunção, no âmbito da supensão provisória do processo, cumprida integralmente pelo recorrente deve ser descontado na pena acessória de inibição da faculdade de conduzir veículos motorizados imposta na sentença condenatória e, em consequência, doutamente considerar-se extinta esta pena, pelo cumprimento.
38. Acresce que a tal desconto estão também subjacentes elementares razões de justiça material e de equidade.
… deve a Douta Sentença recorrido ser revogada e substituída por outra que determine que o tempo que o arguido esteve anteriormente privado da carta de condução, em cumprimento da injunção fixada no âmbito da suspensão provisória do processo deve ser descontado na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados imposta na Sentença condenatória e, em consequência, considerar-se extinta esta pena, pelo cumprimento.

3. Admitido o recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, o Ministério Público respondeu, concluindo pelo seu não provimento.
4. Neste Tribunal, o Exmo. Sr. Procurador-geral Adjunto, em douto parecer, invocando a inconstitucionalidade do art.281, n°3 do CPP na interpretação que lhe é dada pelo Ac. de Fixação de Jurisprudência do STJ n°4/2017, conclui pelo provimento do recurso.
5. Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
6. O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, reconduz-se à questão de saber se tendo o processo prosseguido, nos termos do artigo 282.º, n.º 4, do CPP, a injunção de proibição de conduzir a que se refere o art. 281.º, n.º 3, do mesmo Código, que foi cumprida pelo arguido, deve ou não ser descontada na pena acessória de proibição de conduzir, aplicada na sentença ao abrigo do art. 69.º, do CP.
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IIº A decisão recorrida, no que diz respeito aos factos provados, não provados e respectiva fundamentação, como consta da respectiva gravação, é do seguinte teor:
O tribunal considera provados os factos constantes da acusação, que aqui se dão por integralmente reproduzidos e, ainda, que o arguido é mecânico, estando actualmente desempregado, mas efectuando alguns biscates nesta área, no que obtém cerca de 400/500 euros mensais, tem duas filhas, de 6 e 8 anos de idade que residem com a progenitora, suportando o arguido uma pensão de alimentos no valor de 200 euros mensais, o arguido vive actualmente em casa dos pais, tem o 3º ano de escolaridade, confessou os factos de forma integral e sem reservas, não tem antecedentes criminais.
Fundamentação.
A convicção do tribunal baseou-se na confissão integral e sem reservas do arguido, declarações do arguido quanto às suas condições pessoais e CRC de fls.97 quanto aos seus antecedentes criminais.
Considera provado, ainda, que o arguido cumpriu a injunção de proibição de conduzir durante cinco meses no âmbito da suspensão provisória do processo que depois veio a ser revogada.
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IIIº 1. Condenado por crime de condução de veículo em estado de embriaguez na pena de 75 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de todas as categorias, pelo período de 3 meses, o arguido limita o seu inconformismo ao facto de não ter sido julgado extinta a pena acessória, com o período de proibição de conduzir que cumpriu (5 meses) como injunção no âmbito da suspensão provisória do processo que depois veio a ser revogada.
A Lei nº20/2013, de 21/2, que introduziu a actual redacção do nº3 do art.281, do CPP, determinou que, quando se trata de crime para o qual esteja prevista pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, na suspensão provisória do respectivo processo “é obrigatoriamente oponível ao arguido a aplicação de injunção de proibição de conduzir veículos com motor”.
Com base nesse preceito legal, tendo sido determinada a suspensão provisória do processo, foi oportunamente imposta ao arguido a injunção de proibição de conduzir durante cinco meses, que ele cumpriu, tendo aquela suspensão sido revogada por falta de cumprimento de outra injunção, prosseguindo o processo até que foi proferida a sentença recorrida.
Condenado, agora, em 3 meses de proibição de conduzir, coloca-se a questão de saber se o período de proibição cumprido no âmbito da injunção imposta para suspensão provisória do processo deve ser tido em conta, levando à extinção da pena acessória.
Esta questão foi abordada pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores de forma divergente, tendo sido proferidas decisões em ambos os sentidos, o que justificou recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, na sequência do que foi proferido o ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA N.º 4/2017 (DIÁRIO DA REPÚBLICA N.º 115/2017, SÉRIE I DE 2017-06-16), no qual foi fixada jurisprudência no seguinte sentido:
“Tendo sido acordada a suspensão provisoria do processo, nos termos do art. 281º do Código de Processo Penal, com a injunção da proibição da condução de veículo automóvel, prevista no nº 3 do preceito, caso termine aquela suspensão prosseguindo o processo, ao abrigo do nº 4, do art. 282º, do mesmo Código, o tempo em que o arguido esteve privado da carta de condução não deve ser descontado, no tempo da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir, aplicada na sentença condenatória que venha a ter lugar”.
Esta decisão apoia-se na seguinte argumentação, que se transcreve:
“3.3. Posição adotada
A questão de direito que sobre a qual se revela oposição, importa afirmá-lo, não se resolve pela opção entre uma interpretação, ou outra, de uma ou mais normas jurídicas, a começar, no caso, pelo art. 281º, nº 3 do CPP. Isto porque, nenhuma controvérsia surgiu quanto à interpretação de quaisquer normas, em si.
É que, como bem apontou o MP, na conclusão 18ª da sua motivação, o desconto do tempo de proibição de conduzir veículos com motor, resultado da injunção, na pena acessória que vier a ser aplicada, desconto caro à tese afirmativa, pressupõe, necessariamente, o recurso à analogia. De facto, nenhuma norma prevê esse desconto, e tal analogia só poderia ser feita, aliás, com o que dispõe o art. 80º, nº 1, do CP, que se acaba de transcrever, na parte que interessa.
3.3.1. O art. 4º do CPP, relativo à “Integração de lacunas”, diz-nos que “Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal”.
A primeira tarefa que importa levar a cabo é, pois, a de saber se se está perante um caso omisso. Portanto, se existe uma verdadeira lacuna do processo penal.
Ora, como a seu tempo nos disse Karl Larenz, “o conceito de «lacuna da lei» não assinala, por certo, o limite do possível e admissível desenvolvimento do Direito em absoluto, mas antes o limite de um desenvolvimento do Direito imanente à lei, que se mantém vinculado à intenção reguladora, ao plano e à teleologia imanente à lei” [1].
A inexistência de regra para determinada configuração do caso não revela por si uma lacuna. “Silêncio da lei” não é igual a lacuna, porque há, nas palavras do autor referido “silêncios eloquentes” [2].
Uma distinção que a doutrina tem acolhido, passa pela diferença entre lacunas da lei, ou próprias, e lacunas chamadas teleológicas.
No primeiro caso, estará em causa uma norma que “não pode ser aplicada sem que acresça uma nova determinação que a lei não contém” [3]. Não é manifestamente o caso, porque a norma que impõe a injunção de proibição de conduzir veículos com motor, o nº 3 do art. 281º do CPP, pode ser aplicada sem depender de um desconto de tempo, na pena acessória que eventualmente venha a ser aplicada em ulterior condenação.
Nas lacunas teleológicas a sua deteção resulta da eleição “do escopo visado pelo legislador, ou seja, do ratio legis de uma norma, ou da teleologia imanente a um complexo normativo” [4] 
Fala-se então de uma incompletude do sistema normativo que contraria o plano deste, de tal modo que não seja possível encontrar motivo relevante, para que a disciplina consagrada de facto, na lei, para certo tipo de casos (que aqui seria o desconto do tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação na pena de prisão, do art. 80º, nº 1 do CPP), não deva ser aplicável a outros. A saber, o do desconto do tempo da injunção, no tempo da pena acessória que vier a ser aplicada.
Ora, para este tipo de lacuna, o método do seu preenchimento é o mesmo que importa usar para a sua descoberta, sem que se trate, forçosamente, da mesma operação.
Concretamente, recorrendo-se à analogia.
Socorrendo-nos do comando do nº 2 do art. 10º do Código Civil, segundo o qual “Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei”, do que se trata é então de saber, se procede ou não aqui o argumento de paridade ou maioria de razão, para que haja desconto, em ambas as situações.
3.3.2. Adiantamos já que nos parece de perfilhar uma resposta negativa a esta questão, porque a indispensável similitude de situações, a nosso ver, não existe no caso.
Tentar demonstrá-lo passa forçosamente, em primeiro lugar, pelo rebatimento dos argumentos apresentados pela tese afirmativa, e pelo acolhimento dos que confortam a tese negativa, podendo ser aduzidos outros que tenham relevância para a discussão.
Vejamos pois se a falta de previsão do desconto do tempo da injunção “nos cai mal” [5],e, na afirmativa, por haver uma verdadeira lacuna da lei, ou por descobrirmos tão só uma lacuna teleológica, “político-jurídica”, “lacuna crítica”, “lacuna imprópria” ou “de lege ferenda”.
3.3.2.1. O primeiro ponto a abordar, será o de saber se a tese negativa viola o princípio “ne bis in idem”, como se disse no acórdão recorrido (supra, 2.1.), depois de considerar que a injunção da proibição de conduzir veículos com motor é inequivocamente uma verdadeira pena, de execução efetiva, de tal modo que até nos casos de suspensão provisória do processo a mesma terá quer ser imposta.
Aqui, são convocadas as seguintes questões: a da natureza da injunção, assimilável ou não a uma pena, qual a relevância do facto de ser imposta, e por fim a da violação do princípio “ne bis in idem”.
a) Começando por este último ponto, diremos que o art. 29º, nº 5 atrás transcrito (supra 3.1.1.) proíbe o duplo julgamento pelo mesmo crime, o que implica que, pelo mesmo crime não possa haver absolvições e condenações ou só condenações que se sucedam. 
Mas o princípio apenas proíbe a dupla condenação penal, sendo compatível com a condenação simultânea numa pena criminal e numa contraordenação ou sanção disciplinar, pelos mesmos factos. Estranho seria que já não fosse compatível com uma medida processual como é, adiante se verá melhor, a injunção.
Depois, só haveria duplo julgamento se a suspensão provisória do processo correspondesse a um julgamento e a injunção a uma pena. Ora, não só as fases preliminares do processo, em que se inclui o inquérito, não se confundem com a de julgamento, na sua conformação e razão de ser, como o despacho de suspensão, enquanto encerramento do inquérito, não tem que ver com a sentença, seja ela condenatória ou absolutória. Tudo isto se nos afigura claro.
b) Sabe-se que a reforma do nosso processo penal introduzida com o Código de 1987, inovou, entre outros aspetos, inscrevendo “todo o universo processual num sistema de coordenadas definido por um eixo horizontal e outro vertical” [6]. E, quanto ao primeiro, deu-se especial relevância à distinção entre criminalidade grave e pequena criminalidade, reservando para esta reações que se valem da “oportunidade, diversão, informalidade, consenso, celeridade”. O legislador fez questão de dizer que, em termos de política criminal, se identifica como resposta relevante, a este desiderato, para além do processo sumaríssimo, a possibilidade de suspensão provisória do processo com injunções e regras de conduta.
Quanto ao segundo eixo, estabeleceu-se uma fronteira entre o que o Preâmbulo do Código chama “espaços de consenso” e “espaços de conflito”, no processo penal. Quanto àqueles, passaram a poder ver-se, no processo, “situações em que a busca de consenso, da pacificação e da reafirmação estabilizadora da norma assente na reconciliação, vale como um imperativo ético-jurídico”. Ora, a seguir, exemplifica-se com “o acordo de vários sujeitos processuais como pressuposto de institutos como o da suspensão provisória do processo”, enquanto concretização daquele espaço de consenso.
A imposição, com o correlativo acatamento, de injunções e regras de conduta, surge pois como manifestação de anuência, sendo indiferente, na perspetiva do arguido, que a fonte da injunção seja uma escolha do MP ou a lei. Em qualquer dos casos estamos perante condições "sine qua non" da suspensão, que podem ou não ser aceites pelo arguido e, neste caso, se lhe impõem.
Diferentemente se passam as coisas com a condenação surgida na sequência de um julgamento, porque ser algo a que o arguido não pode fugir. Tal como, já não tinha dependido de si, a detenção ou a escolha da medida de coação privativa de liberdade antes aplicada.
Quanto à confluência do acordo do juiz de instrução, para ser possível a suspensão, por certo que não é tal confluência que faz da suspensão um ato de julgamento, quer em sentido material quer formal. Surge, simplesmente, pelo facto de as injunções e regras de conduta poderem contender com os direitos fundamentais do arguido, e por, na perspetiva do Tribunal Constitucional (TC), dever o juiz fiscalizar a legalidade da opção do MP encerrar o inquérito por essa via [7].
Serve para dizer que o curso do processo antes considerado padrão (instrução, acusação, julgamento), pode ser alterado, evitando-se a fase de julgamento, típica dos espaços de conflito. Exatamente nos casos em que, pese embora estarem reunidas provas da responsabilidade do arguido [8], as finalidades que a justiça penal se propõe alcançar não se mostrem prejudicadas pela falta da condenação Tudo com as vantagens de se subtrair o arguido ao estigma do julgamento, de se obter maior celeridade na solução do caso e se lograr uma pacificação social, fruto do acordo, não só do arguido e do juiz de instrução, como também do assistente. 
c) A suspensão do processo resulta de critérios que são de "legalidade aberta" ou de "oportunidade regrada", a que o MP lança mão, sendo ele, e não o juiz, que decide da sua utilização. Ora, o facto de a opção pela suspensão do processo ser do MP e a escolha das injunções e regras de conduta serem do mesmo MP, só por si, impede que se esteja qui a falar de sanções penais, designadamente de penas. Não fora assim, cair-se-ia em grosseira inconstitucionalidade, tendo em conta o que dispõe o  art. 202º, nº 1 da CR [9].
No dizer de Maia Costa "Trata-se de medidas que impõem deveres (positivos ou negativos) ao arguido como condição da suspensão, sendo a sua aceitação por parte deste necessário para a suspensão" [10].
Para Anabela Rodrigues, as injunções e regras de conduta, sem terem a natureza de pena ou sanção penal, inscrevem-se "na linha de medidas que visam alertar o arguido para a validade da ordem jurídica e despertar nele o sentimento de fidelidade ao direito" [11].
Também Germano Marques da Silva e Paulo Pinto de Albuquerque afastam a natureza de sanção penal das injunções aqui em apreço[12].
O facto de se tratarem de medidas processuais que impõem atos ou condutas, ativos ou passivos e não de penas (nem sequer "encapotadas") [13], não obsta a que condicionem a normal atividade do arguido ou representem para ele um sacrifício. A suspensão é, apesar de tudo, uma reação ao crime cometido, integrada no sistema repressivo penal. Numa linha de "diversão" [14], têm que se ter no horizonte, sempre, a prevenção geral e especial.
Porque a injunção ou regra de conduta não são penas, é que o arguido continuará a presumir-se inocente, e nunca se poderá considerar a aceitação da suspensão, como uma confissão sua.
d) A utilidade que o disposto no art. 282º, nº 4, do CPP (vide supra 3.1.3.), pode ter para a discussão em curso, nunca abonaria a tese afirmativa, mas também se não mostra indiferente para a questão. Pelo contrário, aponta claramente para a tese negativa. Vejamos porquê.
A opção pela suspensão do processo e sua aceitação é uma aposta no consenso entre os sujeitos do processo, uma pacificação entre arguido e assistente, que tem o sentido da reconciliação do agente do crime com a ordem jurídico-penal. Ora, o não cumprimento das injunções ou regras de conduta que o arguido aceitou, ou o cometimento de crime da mesma natureza no período da suspensão, pelo qual venha a ser condenado, são a revelação de que a aludida aposta falhou. Afinal, o arguido revela-se ainda, indireta ou diretamente, desrespeitador dos bens jurídico-penais e, nessa medida, um cidadão que continua a incidir negativamente na ordem social.
Ora, porque o falhanço referido se deve só ao arguido, entendeu a lei que "as prestações feitas não podem ser repetidas".
É evidente que as prestações em causa dirão respeito, antes do mais, às injunções das als. a) e c), do nº 2,  do art. 281º, do CPP, e não à do nº 3 do preceito, relativa à proibição de conduzir veículos com motor. Só que, a razão de ser da impossibilidade, de repetição das prestações feitas, tem que ter consequências equivalentes, no tocante ao tempo de proibição de conduzir cumprido.
Foi dada uma oportunidade ao arguido de se subtrair a um julgamento e a uma pena criminal, com a suspensão. Houve um acordo que o arguido violou, e assim sendo, o legislador não quis que as consequências de uma oportunidade perdida, só da responsabilidade do arguido, se reduzissem à prossecução do processo com uma acusação e um julgamento. Pretendeu também que o que tenha havido de cumprimento do acordo, que levou à suspensão, não redundasse em benefício do arguido, como se não tivesse havido nenhuma suspensão e o seu falhanço.
Dir-se-ia então que, a recorrer-se no caso a qualquer analogia, ela levaria a um raciocínio por paridade de razão do seguinte teor: pela mesma razão porque as prestações feitas não podem ser repetidas, também o tempo de proibição de conduzir não poderá ser tido em conta.
e) E chegou o momento da abordarmos o instituto do desconto da prisão preventiva e outras privações de liberdade, do art. 80º e segs. do CP, para o distanciarmos da situação que agora aqui se discute.
É que, se naquele caso a lei quis o desconto e o previu expressamente, aqui não só o não previu e nada impedia que o tivesse feito (simultaneamente com a nova redação dada ao nº 3 do art. 281º, do CPP, com a lei 20/2013. de 21 de fevereiro), como manteve a indicação de que o arguido não tiraria benefício, do falhanço de uma suspensão que só a si é imputável. Essa indicação revela-se, já se viu, na impossibilidade de repetição das prestações feitas.
A explicação para que a prisão preventiva ou privações de liberdade que a lei lhe equipara, sejam descontadas na pena da condenação, assenta em "imperativos de justiça material" [15].
Descontam-se aquelas medidas nas penas, pese embora a diferença de natureza e razão de ambas. Temos de um lado, na verdade, medidas processuais cautelares e não penas antecipadas, e do outro verdadeiras penas. Mas, porque medidas e penas se traduzem num sacrifício análogo, e resultam todas da prática do crime que integra (ou deveria ter integrado), o mesmo processo, daí o desconto.
Claro que esses imperativos de justiça material nem sempre foram os mesmos que são hoje, e quer o CP de 1886, quer o CPP de 1929 fizeram depender o desconto, ou a medida do desconto, da gravidade da pena aplicada.
De qualquer modo, o que interessa aqui apontar é que tais razões de justiça material não são transponíveis, sem mais, do desconto da prisão preventiva (e medidas equiparadas), na pena da condenação, para o desconto do tempo de proibição de conduzir da injunção, no tempo da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir. E as razões já foram abordadas.
Em primeiro lugar, de um lado temos a imposição de medidas cautelares a que o arguido foi alheio, e do outro a aceitação por parte deste da suspensão, que inclui a aceitação da injunção de não conduzir veículo automóvel.
Também a imposição de uma pena principal resultado da condenação, foi algo a que o arguido não pôde fugir, distanciando-se da aplicação da pena acessória de inibição da faculdade de conduzir, na medida em que o arguido poderia ter evitado esta, se não tivesse inviabilizado o sucesso da suspensão.
Finalmente, não é indiferente, prosseguindo imperativos de justiça material, estar em causa o sofrimento causado por uma prisão, ou a limitação de não poder conduzir. Trata-se de sacrifícios dificilmente equiparáveis.
Por todo o exposto se entende não estarem, no caso, preenchidos, os pressupostos de que depende a configuração de uma lacuna da lei, que se preencheria com recurso à analogia, e por isso se acorda, no Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em revogar o acórdão recorrido …».
Antes deste Ac. de Fixação de Jurisprudência, chegamos a defender solução contrária à que veio a ser adoptada no mesmo[16], apoiados em argumentos rebatidos por este douto acórdão do STJ.
O Ex.mo Procurador-geral Adjunto, no seu douto parecer, defende a inconstitucionalidade do art.281, n°3 do CPP na interpretação que lhe é dada pelo citado Ac. de Fixação de Jurisprudência do STJ, n°4/2017.
Faz referência aos dois regimes previstos pelo citado art.281, nº3, o anterior e o posterior às alterações introduzidas ao CPP pela Lei nº20/2013, de 21 de Fevereiro, mas tal como acontece nos presentes autos, o citado acórdão nº4/17, teve em conta o disposto no art.281, nº3 do CPP, na redacção da Lei nº20/2013.
Defende que a solução da decisão recorrida e do acórdão nº4/17 conduzem a uma dupla punição constitucionalmente proibida, pelo art.29, nº5, da CRP.
Ora, como refere o acórdão nº4/17, o princípio ne bis in idem apenas proíbe a dupla condenação penal e só haveria duplo julgamento se a suspensão provisória do processo correspondesse a um julgamento e a injunção a uma pena, não sendo confundível o inquérito com o julgamento, nem o despacho de suspensão, enquanto encerramento do inquérito, com a sentença.
Considerando a infracção em causa, a suspensão do processo pressupõe uma injunção particular especialmente prevista no nº3, do art.281, CPP, que não perde a sua natureza de injunção e que o arguido não pode deixar de avaliar no momento em que lhe é pedida a concordância com a suspensão provisória do processo, consciente que se não cumprir as injunções impostas o processo prosseguirá e ficará sujeito às consequências penais que vierem a ser fixadas na sentença, sem que a lei preveja qualquer desconto na pena pelo eventual cumprimento de injunções.
Invoca o Ex.mo PGA, ainda, o regime do processo sumaríssimo, para defender a equiparação entre injunção e pena mas, com o devido respeito, não é possível tal equiparação, pois no processo sumaríssimo a sanção é fixada por decisão judicial, enquanto na injunção o JIC apenas dá a sua concordância, por outro lado quando aceita a injunção o arguido sabe que o processo pode prosseguir, enquanto no processo sumaríssimo a decisão do juiz é a final do processo.
Não se reconhece, assim, a invocada inconstitucionalidade.
Deste modo, não tendo argumentos em sentido diferente do fixado pelo STJ, não os apresentando o recorrente e não se reconhecendo a inconstitucionalidade invocada, outra solução não nos resta senão acatar e dar aplicação à jurisprudência fixada.
Assim, fazendo-o, impõe-se a confirmação da decisão recorrida, na parte em que afastou o aludido desconto da injunção cumprida na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor.
Em consequência, o recurso não merece provimento.
*     *     *

IV DECISÃO:
Pelo exposto, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, após conferência, negando provimento ao recurso do arguido N. , acordam em confirmar a sentença recorrida.
Condena-se o recorrente em 3Ucs de taxa de justiça.
Lisboa,

Relator: Vieira Lamim
Adjunto: Ricardo Cardoso

[1] In “Metodologia da Ciência do Direito”, Fundação Calouste Gulbenkian, 3ª Edição, pág. 524.
Este autor aceita, ao lado de “direito imanente à lei”, para casos excepcionais, um “direito superador da lei”, certo que as situações elencadas que o poderiam justificar não se mostram aplicáveis ao nosso caso (vide ob. cit. págs. 588 e segs.).
[2] Idem, pág. 525
[3] Cf. J. Baptista Machado, in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1983, pág. 195.
Por certo que a realização prática da injunção da proibição de conduzir, a partir do momento em que a lei a introduziu de facto, e de modo obrigatório para certas situações, tem que se socorrer analogicamente do disposto no art. 69º do CP.
Mas claro que esta questão nada tem a ver com o recurso à analogia (nessa altura com o art. 80º e segs. do CPP), para se saber se há desconto na pena acessória de inibição da faculdade de conduzir.
[4] Idem, pág.196.
[5] Esta e as que se seguem são expressões de Karl Engish, in “Introdução ao Pensamento Jurídico”, Fundação Calouste Gulbenkian, 7ª Edição, pág. 281.
[6] Do Preâmbulo, III, 6, que neste ponto citaremos.
[7] A intervenção do juiz de instrução não estava prevista no projeto do CPP e foi requerida pelo TC no seu Acórdão 7/87, Diário da República, Iª Série, nº 33 de 9/2/1987, em sede de fiscalização preventiva. Mas, a constitucionalidade da norma não mais foi posta em causa, afastando-se uma hipotética violação do princípio de independência dos tribunais ou do princípio da reserva da função jurisdicional, devido ao relevo do papel do MP, aqui.
[8] Se o arguido cumprir as injunções e regras de conduta o MP arquiva o processo não podendo reabri-lo (art. 282º, nº 3 do CPP), e se não as cumprir o MP deduz acusação.
[9] Que é do seguinte teor: "Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados"
[10] Cf. Henriques Gaspar et alteri,  in "Código de Processo Penal Comentado", Almedina, 2ª Edição, págs. 939 e 940. 
[11] Cf. "O inquérito no novo Código de Processo Penal", in "O Novo Código de Processo Penal. Jornadas de Direito Processual Penal", Almedina, 1988, pág. 75.
[12] Cf. "Curso de Processo Penal", III, Verbo, pág. 116 e "Comentário do Código de Processo Penal, 4ª Edição, pág. 764, respetivamente.
[13] A expressão é de P. P. Albuquerque (ob loc. citados).
[14] A "diversão" penal significa, como se sabe, "divergência" em relação à reação penal clássica, e assenta na opção pelo consenso e pacificação aludidos, tudo a reclamar uma intervenção mais reduzida do Estado.
[15] Cf. Figueiredo Dias, in ""Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime", Coimbra Editora, 2ª Edição, pág. 434, ou Germano Marques da Silva, in "Direito Penal Português", III, Verbo, pág. 176.
[16] Ac. de 16Nov.16, proferido no Pº261/15.0S9LSB.L1, acessível em www.dgsi.pt.