Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
49/14.6TTBRR.L1-4
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: CRÉDITOS LABORAIS
GRUPO DE SOCIEDADES
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
PLURALIDADE DE EMPREGADORES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/26/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I Não se pode concluir que as sociedades demandadas a título de responsáveis solidárias pelos créditos pecuniários das autoras, nos termos do art.º 334.º do Código do Trabalho, se encontravam com a sociedade empregadora numa relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais, se, com relevo, apenas se provou que eram os funcionários daquela que desempenhavam o serviço de duas das outras sociedades.

II Tão pouco se trata de situação enquadrável na figura de pluralidade de empregadores, visto ser a aquela primeira sociedade que retribuía as autoras e a cujas ordens e instruções estavam as mesmas sujeitas.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


1.Relatório:


1. 1. AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG e HHH, instauraram a presente acção declarativa de condenação contra III, S.A., JJJ, Lda., KKK, LLL, Lda. e MMM, Lda, alegando, em síntese, que trabalharam mediante  contrato de trabalho com a R. III, trabalhando, porém, também para as RR. JJJ e KKK, empresas sem trabalhadores, sendo que resolveram os contratos de trabalho com a R. III, alegando justa causa, uma vez que lhes foi reduzida a retribuição e tinham várias retribuições em atraso.

Mais alegaram que tais RR. foram substituídas nos estabelecimentos onde exerciam a sua atividade, pelas RR. LLL e MMM, ficando com todo o negócio das primeiras e alguns trabalhadores, deixando deliberadamente a R. III ir à insolvência; sendo que existem relações de grupo entre tais empresas. Alegaram ainda que a atuação das RR. lhes causou os danos de natureza não patrimonial que descreveram.

Concluíram pela responsabilização de todas as RR. pelas dívidas da III perante as trabalhadoras.

Com tais fundamentos, requereram a condenação das RR. a pagarem-lhes, a título de indemnização pela resolução do contrato de trabalho e de crédito laborais: à A. AAA, € 20.375,28; à A. BBB, € 17.693,91; à A. CCC, € 14.282,66; à A. DDD, € 16.832,82; à A. EEE, € 29.973,59; à A. FFF, € 18.094,68; à A. GGG, € 36.994,55; e à A. HHH, € 30.349,54. Requereram ainda a condenação das RR. no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais, no montante de € 3.000,00 para cada uma das AA. e de quantias à segurança social.

Foi realizada Audiência de Partes, não se tendo logrado a conciliação.

As RR. JJJ e KKK e MMM contestaram, impugnando parte dos factos alegados e alegando que a R. III está insolvente, devendo os créditos das AA. ser reclamados e pagos no respetivo processo; a sua estrutura social (que descreveram) e a das demais RR. não se traduz numa relação de grupo, pelo que não existe responsabilidade solidária; as AA. nunca trabalharam para si, nem resolveram qualquer contrato de trabalho consigo. Não existiu qualquer acordo ou estratégia empresarial com as demais RR.. Com tais fundamentos, requereram a extinção ou suspensão da instância e a sua absolvição.

A R. LLL contestou, impugnando parte dos factos invocados, alegando que a sua estrutura social e a das demais RR. não se traduz numa relação de grupo, pelo que não existe responsabilidade solidária; não fez qualquer acordo com as demais RR. para beneficiar a R. III ou beneficiar dos serviços por esta prestados; as AA. nunca trabalharam para si; a R. III está insolvente, devendo os créditos das AA. ser reclamados e pagos no respetivo processo. Com tais fundamentos, requereu a declaração da sua ilegitimidade ou a sua absolvição.

As AA. responderam, pugnando pela improcedência da invocada exceção e mantendo a posição já expressa nos autos.

Entretanto, face à sua insolvência R. III, foi declarada a extinção da instância quanto a esta.

Não foi realizada audiência prévia.

Foi proferido despacho saneador, no qual foram indeferidas a invocadas exceções de ilegitimidade e de inutilidade superveniente da lide, tendo sido identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

As autoras vieram aos autos informar terem recebido do Fundo de Garantia Salarial, por conta das quantias peticionadas nestes autos, a A. CCC, a quantia de € 8.472,82; a A. DDD, a quantia de € 5.475,00; a A. EEE, a quantia de € 8.468,80; a A. HHH, a quantia de € 8.363,73; a A. AAA, a quantia de € 7.958,47; a A.,GGG a quantia de € 8.569,98; a A. FFF, a quantia de € 8.317,10; e a A. BBB, a quantia de € 7.058,00. 

Realizado o julgamento foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Nestes termos, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência:
A) Condeno a R. KKK, Lda no pagamento à A. CCC da quantia de € 5.809,84 (cinco mil oitocentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos).
B) Condeno a R. JJJ, Ld.a no pagamento às AA. FFF, GGG e HHH, respetivamente, nas quantias de € 8.220.57 (oito mil duzentos e vinte euros e cinquenta e sete cêntimos), € 28.424,57 (vinte e oito mil quatrocentos e vinte e quatro euros e cinquenta e sete cêntimos) e € 21.726,73 (vinte e um mil setecentos e vinte e seis euros e setenta e três cêntimos).
C)Absolvo as RR. JJJ, Lda. e KKK, Lda. do demais peticionado.
D)Absolvo as RR. LLL, Lda. e MMM, Lda. de todo o peticionado”.

1.2. Inconformadas com esta decisão dela recorrem as autoras e as rés JJJ, Lda.  e  KKK, Lda.
1.2.1. As autoras, concluíram  as  suas alegações nos seguintes termos:
(…)
1.2.2. As aludidas rés, por seu turno, concluíram as suas alegações de recurso do seguinte modo:
(…)
1.2.3. As autoras responderam ao recurso das rés, pugnando pela sua improcedência. Tendo ao recurso das autoras respondido a ré LLL, Lda., no sentido do seu não provimento.

1.3. Os recursos foram admitidos a fls. 1314, com efeito devolutivo.

1.4. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação teve vista dos autos (fls. 1328 a 1330), e emitiu parecer no sentido de que, ao contrário do recurso das rés, merece provimento o recurso das autoras.

1.5. Notificadas as partes desse parecer, apenas a ré LLL quanto ao mesmo se pronunciou, sustentando se decida em conformidade com o pedido por si formulado.

1.6. Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

2. Objecto do recurso.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - artigos 635.º, números 3 e 4, 639.º, n.º 1, 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, ainda não apreciadas com trânsito em julgado.
Assim, as questões que os recorrentes colocam à apreciação deste tribunal são as seguintes:

I. Recurso das autoras:
a)- Impugnação da matéria de facto;
b)- Responsabilidade solidária de todas as rés;
c)- Indemnização por danos não patrimoniais.

II. Recurso das rés:
a)- Impugnação da matéria de facto;
b)- Absolvição das rés do pedido

3. Fundamentação de Facto.
1.- Todas as AA. trabalhavam para a R. III através de contrato de trabalho sob as suas ordens e instruções, nos seus estabelecimentos sitos na  Rua …, sujeitas a horário de trabalho e com um salário mensal.
2.- A 1ª R. tinha por objeto, consultas e tratamento médicos, intervenções cirúrgicas, diagnóstico, análises, e todo o tipo de exame médicos, nomeadamente análises clínicas, radiografias, ecografias, ressonâncias, mamografias, endoscopias e colonoscopias, serviços de medicina no trabalho e outros.
3.- A R. IIII tinha todo o tipo de acordos, com a ADSE, segurança social, hospitais e seguradoras. Tinha médicos, enfermeiros, administrativos e auxiliares. Fazia exames como ecografias, ressonâncias magnéticas, recolha de análises, ecografias e colonoscopias. Tinha variadas especialidades médicas. Tinha dois estabelecimentos: a unidade de internamento da Rua …e a Unidade de Consultas na Rua ….
4.- As AA. trabalhavam em tais estabelecimentos, sujeitas a ordens e instruções da R. III, sujeitas a horário de trabalho, contra o pagamento de um salário mensal.
5.- A A. AAA tinha a categoria profissional de empregada de enfermaria (auxiliar de ação médica – A.A.M III > 6 anos), trabalhava para a R. III desde 1 de Março de 2001 e auferia € 568,90 de salário base mensal, € 47,76 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
6.- A A. BBB tinha a categoria profissional de empregada de enfermaria (auxiliar de ação médica – A.A.M III > 6 anos), trabalhava para a R. III desde 17 de Abril de 2002 e auferia € 485,90 de salário base mensal, € 47,76 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
7.- A A. CCC tinha a categoria profissional de auxiliar de bloco (auxiliar de ação médica – A.A.M III > 6 anos), trabalhava para a R. III desde 2 de Maio de 2001 e auferia € 494,00 de salário base mensal, € 47,76 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
8.- A A. DDD tinha a categoria profissional de empregada de enfermaria (auxiliar de ação médica – A.A.M III > 6 anos), trabalhava para a R. III desde Abril de 2003 e auferia € 485,00 de salário base mensal, € 23,88 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
9.- A. EEE tinha a categoria profissional de empregada de enfermaria (auxiliar de ação médica – A.A.M III > 6 anos), trabalhava para a R. III desde Janeiro de 1989 e auferia € 568,90 de salário base mensal, € 71,64 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
10.- A A. FFF tinha a categoria profissional de rececionista (técnica administrativa/secretária – Grau III), trabalhava para a R. III desde 2 de Junho de 2003 e auferia € 682,54 de salário base mensal, € 23,88 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
11.- A A. GGG desempenhava funções administrativas (Tecnico Adm/Secrt III), trabalhava para a R. III desde 1 de Dezembro de 1993 e auferia € 979,09 de salário base mensal, € 95,52 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição.
12.- A A. HHH desempenhava funções administrativas (Tecnico Adm/Secrt III), trabalhava para a R. III desde 1 de Agosto de 1990 e auferia € 682,54 de salário base mensal, € 119,40 de diuturnidades e € 4,70/dia de subsídio de refeição. A A. havia reduzido a retribuição da AA. em 10%.
13.- A 13 de Agosto de 2013, a AA. enviaram para a R. III e comunicaram à ACT, cartas, recebidas por esta a 2 de Agosto de 2013, resolvendo os seus contratos de trabalho, com efeitos a 11 de Agosto de 2013, com justa causa, face ao atraso no pagamento de retribuições e diminuição da retribuição em 10% (cfr. doc.s juntos aos autos).
14.- A R. III não pagou à A. AAA: salários em atraso, 2.058,03€; férias de 2013, 686,01€; subsídio de férias de 2013, 686,01€; metade do subsídio de férias 2011, 343,00€; subsídio de férias de 2012, 686,01€; subsídio de Natal de 2011, 686,01€; subsídio de Natal de 2012, 686,01€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 227,55€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 467,97; proporcionais de férias de 2013, 402,97€; proporcionais de sub. Natal 2013, 402,97€; subsídio de alimentação, 202,10€.
15.- A R. III não pagou à A.  BBB, salários em atraso, 1.808,28€; férias de 2013, 686,01€; subsídio de férias de 2013, 686,01€; metade do subsídio de férias 2011, 343,00€; subsídio de férias de 2012, 686,01€; subsídio de Natal de 2011, 686,01€; subsídio de Natal de 2012, 686,01€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 227,55€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 467,97; proporcionais de férias de 2013, 402,97€; proporcionais de sub. Natal 2013, 402,97€; subsídio de alimentação, 202,10€.
16.- A R. III não pagou à A. CCC: salários em atraso, 1.808,28€; férias de 2013, 602,76€; subsídio de férias de 2013, 602,76€; metade do subsídio de férias 2011, 301,38€; subsídio de férias de 2012, 602,76€; subsídio de Natal de 2011, 602,76€; subsídio de Natal de 2012, 602,76€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 227,55€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 410,97; proporcionais de férias de 2013, 402,97€; proporcionais de sub. Natal 2013, 402,97€; subsídio de alimentação, 300,80€.
17.- A R. III não pagou à A. DDD: salários em atraso, 1.736,64€; férias de 2013, 662,13€; subsídio de férias de 2013, 662,13€; metade do subsídio de férias 2011, 331,06€; subsídio de férias de 2012, 662,13€; subsídio de Natal de 2011, 578,88€; subsídio de Natal de 2012, 578,88€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 227,55€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 451,45; proporcionais de férias de 2013, 402,97€; proporcionais de sub. Natal 2013, 402,97€; subsídio de alimentação, 202,10€.
18.- A R. III não pagou à A. EEE salários em atraso, 2.589,57€; férias de 2013, 863,19€; subsídio de férias de 2013, 863,19€; metade do subsídio de férias 2011, 431,59€; subsídio de férias de 2012, 845,19€; subsídio de Natal de 2011, 760,19€; subsídio de Natal de 2012, 760,19€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 345,19€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 588,53; proporcionais de férias de 2013, 575,33€; proporcionais de sub. Natal 2013, 575,33€; subsídio de alimentação, 521,70€.
19.- A R. III não pagou à A. FFF: salários em atraso, 2.324,01€; férias de 2013, 774,67€; subsídio de férias de 2013, 774,67€; metade do subsídio de férias 2011, 387,33€; subsídio de férias de 2012, 774,67€; subsídio de Natal de 2011, 706,41€; subsídio de Natal de 2012, 706,41€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 309,86€; 15 dias férias n/gozadas em 2013, € 528,18; proporcionais de férias de 2013, 548,72€; proporcionais de sub. Natal 2013, 548,72€.
20.- A R. III não pagou à A. GGG: salários em atraso 3.223,80€; férias de 2013, 1.074,61€; subsídio de férias de 2013, 1.074,61€; metade do subsídio de férias 2011, 537,00€; subsídio de férias de 2012, 1.074,61€; subsídio de Natal de 2011, 1.074,61€; subsídio de Natal de 2012, 1.074,61€; 12 dias trabalho Agosto/2013, 429,84€; proporcionais de férias de 2013, 716,4€; proporcionais de sub. Natal 2013, 716,40€; a título de descontos nas retribuições, € 4.504,87.
21.- A R. III não pagou à A. HHH: salários em atraso, 2.405,82€; férias de 2013, 801,94€; subsídio de férias de 2013, 801,94€; metade do subsídio de férias 2011, 400,97€; subsídio de férias de 2012, 801,94€; subsídio de Natal de 2011, 801,94€; subsídio de Natal de 2012, 801,94€; 13 dias trabalho Agosto/2013, 347,50€; proporcionais de férias de 2013, 534,62€; proporcionais de sub. Natal 2013, 534,62€; a título de descontos nas retribuições, € 3.412,62.
22.- As RR. JJJ e KKK não tinham quadro de pessoal, sendo os trabalhadores da R. III que efetuavam o seu trabalho; as AA. FFF, GGG e HHH desenvolveram atividade incluída nos serviços prestados pela JJJ e a A. CCC desenvolveu atividade incluída nos serviços prestados pela KKK.
23.- A R. III sempre utilizou a designação de (…).
24.- A R. LLL foi constituída em Julho de 2013, tem sede num dos estabelecimentos anteriormente explorados pela R. III.
25.- A R. JJJ foi constituída em 04/02/2003 e encontra-se juridicamente organizada sob a forma de sociedade por quotas. Tem por objeto social a prestação de serviços médicos no âmbito da imagiologia. O seu capital é de € 5.000,00, integralmente subscrito e realizado representado por quotas, a saber: - € 2.550,00, pertencente à sócia R. MMM; - € 1.650,00, pertencente ao sócio (…); - € 400,00, pertencente à sócia (….); - € 400.00, pertencente à sócia (…). A sócia MMM adquiriu a sua quota em 26/09/2013. É seu gerente de direito e de facto, desde tal data, (…).
26.- O anterior gerente (…) foi gerente 26/09/13, data em que cessou funções. A sociedade obriga-se com a intervenção de apenas um gerente.
27.- A R. encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial do Barreiro e tem a sua sede social na Rua Dr. ….
28.- A R. KKK foi constituída em 07/12/2011 e encontra-se juridicamente organizada sob a forma de sociedade por quotas. Tem por objeto social a prestação de serviços médicos em ambulatório, gestão de negócios na área da saúde e compra, venda e aluguer de equipamentos médicos. O seu capital é de €12.000,00, integralmente subscrito e realizado representado por - € 500,00, pertencente â sócia (…) Lda; - € 500,00, pertencente ao sócio (…): - € 500,00, pertencente ao sócio (…): - € 500,00, pertencente ao sócio (…); - € 500.00, pertencente ao sócio (…); - € 500,00. pertencente ao sócio (…); - € 500.00, pertencente ao sócio (…); - € 500,00, pertencente ao sócio (…); - € 500,00, pertencente ao sócio (…); - € 500,00, pertencente ao sócio (…); - € 500,00, pertencente ao sócio (… S.A.) - € 6.500,00, pertencente ao sócio MMM, Lda. A sócia MMM adquiriu a qualidade de sócia em 29/08/2013, por aumento de capital social integralmente subscrito e realizado. São gerente de direito e de facto da 3.a R., desde 29/08/2013, (…) e (…) desde 09/07/2013.
29.- Os anteriores gerentes (…) e (…) foram gerentes da 3.a R. até 18/06/13 e 26/08/2013, respetivamente, data em que cessaram funções. A 3.a R. obriga-se com a intervenção conjunta de dois gerentes.
30.- A 3.a R. encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial do Barreiro e tem a sua sede social na Rua ….
31.- A R. MMM foi constituída em 08/07/2005 e encontra-se juridicamente organizada sob a forma de sociedade por quotas.
32.- Tem a 5.a R. por objeto social a prestação de serviços nas áreas da saúde e ambiente. O seu capital é de € 5.000,00, integralmente subscrito e realizado representado por quotas a saber: - € ,2.500,00, pertencente ao sócio (…); - € ,2.500.00, pertencente à sócia (…). É gerente de direito e de facto da 5.a R., (…) A 5.a R. obriga-se com a intervenção de apenas um gerente.
33.- A 5.ª R. encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial de … e tem a sua sede social no ….
34.- A R. III tinha a posse das instalações sitas na Rua …, ao abrigo de dois contratos de arrendamento.
35.- Nos termos dos contratos de arrendamento, a R. III tinha de pagar duas rendas mensais. A R. III entrou em incumprimento contratual, sendo devedora aos senhorios da quantia de € 63.702,80.
36.- Os senhorios denunciaram unilateralmente os contratos de arrendamento em 28 de Junho de 2013, com efeitos em 31 de Agosto de 2013.
37.- A 5.a R. MMM em 21 de Janeiro de 2014 celebrou dois contratos de arrendamento das instalações sitas Rua … com fiança da R. KKK.
38.- Os contratos de arrendamento entraram em vigor em 01/09/13.
39.- O sócio gerente da MMM (…) pagou ao senhorio, no dia 21/01/14, a quantia de € 57.332,52 como se de uma caução se tratasse.
40.- Os senhorios exigiram à 5.a R MMM o referido pagamento como condição essencial para a celebração dos contratos de arrendamento.
41.- Com o pagamento da quantia de € 57.332,52 a 1.a R. ficou desonerada da totalidade do valor em dívida aos senhorios.
42.- A Ré LLL foi constituída em 22.07.2013, com o capital social de € 25.000,00. O objeto comercial da Ré é, entre outros, a realização de consultas e prestação de cuidados de saúde por médicos de clínica geral e especialistas. São sócios da Ré: i. (…) titular de uma quota no valor de € 5.000,00; ii. (…), titular de uma quota no valor de € 5.000,00; iii. (…), titular de uma quota no valor de € 5.000,00; iv. (…), titular de uma quota no valor de € 5.000,00; v. (…), titular de uma quota no valor de € 2.500,00, e vi. (…), titular de uma quota no valor de € 2.500,00. Foram designados gerentes da Ré os sócios (…) e (…), os quais obrigam, conjuntamente, a sociedade. A Ré tem a sua sede na Rua Dr. ….
43.- O imóvel onde se encontra sediada a Ré é composto por duas fracções - A e B - ambas propriedade da sociedade “(…), Lda.”. Tendo a sociedade proprietária do imóvel arrendado a fracção B à Ré, por contrato de arrendamento comercial celebrado em 01.08.2014.

3.2. Factos não provados
- A R. III estava a convidar, desde Junho de 2013, apenas alguns trabalhadores, para ficarem a trabalhar a recibos verdes, sem dizer para que entidade iriam os serviços ser prestados e o preço.
- A R. III pretendia ir para a insolvência, não pagar a quem deve e continuar a funcionar em nome de outra entidade, as outras RR., sem pagar aos seus credores.
- Muito sofreram as AA. e todas as suas colegas, muitas delas, face ao desespero em que viviam, entraram de baixa, algumas trabalhadoras não pagaram as suas rendas de casa, outras não pagaram os seus empréstimos.
- As AA. trabalhavam por turnos e prestaram trabalho suplementar.
- As RR. LLL e MMM não tinham quadro de pessoal, sendo os trabalhadores da R. III que efetuavam o seu trabalho; as AA. FFF, GGG, HHH, CCC desenvolveram atividade incluída nos serviços prestados por outras RR. e as demais AA. para qualquer uma das R. para além da III.
- A R. LLL, a sua denominação foi criada para se confundir com o nome que era utilizado pela R. III e a sua criação resultou do acordo de todos as RR. e seus acionistas e sócios, com vista à continuação do negócio da R. III, sem o pagamento das suas dívidas.
- A R. KKK está a desenvolver o trabalho que era da R. III.

4. Fundamentação de Direito.

I. Recurso das autoras.

a)- Da impugnação da matéria de facto.
Como é sabido, de acordo com o n.º 1 do art.º 640.º do Código de Processo Civil, o recorrente que impugne a decisão da matéria de facto está sujeito a alguns ónus, incumbindo-lhe especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (alínea a)); os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida (alínea b)); a decisão que em seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (alínea c)). E, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, quando os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes
Impõe-se, pois, ao recorrente concretizar e individualizar a matéria que considera incorrectamente julgada (tanto a provada como a não provada) e indicar a resposta que em seu entender deverá ser dada.
Sucede que, conforme tem vindo a ser entendido, o recurso da decisão da matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova é reapreciada pelo tribunal superior, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª instância. Não deve olvidar-se que os recursos são “remédios jurídicos que se destinam a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, nos termos expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e de qual o sentido com que devia ter sido aplicada (Cfr. entre outros, o acórdão do TRE de 22-05-2017, processo 1216/15.0T8TMR.E2, www.dgsi.pt. E António Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil”, Almedina, 2007, pág. 143 e 144).

É também de salientar que a apreciação da prova pelo juiz de 1.ª instância se faz com recurso aos princípios da imediação e oralidade, o que não sucede na Relação. Isso não impede, porém, que esta forme a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das provas, tal como a 1ª instância, sem estar, contudo, limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida (Luís Filipe Sousa, “Prova Testemunhal”, Almedina, 2013, pág. 389).

Posto isto, analisemos, então, a impugnação da matéria de facto deduzida pelas autoras.
Pretendem estas que se altere a decisão da matéria de facto provada, aduzindo, para tanto, que “a Mma. Juiz tinha que ter em atenção também os accionistas da III antes da insolvência que são identificados pelo Senhor Administrador de insolvência em 07-07-2016 através de e-mails enviados para e juntos aos autos” e “ Por outro lado tinha a Mª Juiz que ver a JJJ, Lda e a KKK, Lda antes da MMM. Lda ter adquirido a maioria do capital das sociedades, em salvo erro Agosto e setembro de 2013 e bem assim como a composição societária da (…), Lda. e que a maioria dos sócios são filhos dos sócios e accionistas das outras sociedades e da própria” (Conclusões 113.ª e 114.ª). “Logo tais factos devem ser alterados em conformidade com as certidões juntas que a seguir se identificam” (Conclusão 114.ª).

Ora, quanto aos sobreditos aspectos, os referidos ónus impugnatórios não se mostram minimamente respeitados. Com efeito, as autoras limitam-se a reproduzir a matéria de facto provada (conclusões 93.ª a 111.ª) e a remeter em bloco  para documentos, sem especificar ou concretizar minimamente os factos que consideram incorrectamente julgados e sem especificar ou indicar, com precisão, os que deveriam ser dados como provados e a decisão que deveria ser proferida sobre a factualidade impugnada, o que, manifestamente não cumpre os ditames do legislador. Assim sendo, nos termos legais citados, rejeita-se o presente recurso da matéria de facto, nesta parte.

Pretendem ainda as autoras que se considere provada a matéria que o não foi em primeira instância, e que é a seguinte:

- “Desde Junho de 2013 que a ré III, começou a convidar apenas alguns trabalhadores para ficarem a trabalhar a recibos verdes mas não dizem sequer para que entidade vão os mesmos ser prestados e o preço” (Conclusão 116.ª). Invocam, para o efeito, os depoimentos de parte de (…), e de (…), bem como os depoimentos das testemunhas (…) e (…). Mas não têm razão. Ouvidos, com atenção, tais depoimentos, não é possível concluir, com rigor, nos termos da factualidade acima aduzida. Na realidade, o que resulta do depoimento de (…) é que este, em Setembro de 2013 ficou com algumas das pessoas que trabalharam para a III e que estavam no fundo de desemprego. A autora (…), por seu turno, referiu que foi no início de Agosto de 2013 que as trabalhadoras da III foram contactadas pelo Dr. (…) a fim de se saber da sua disponibilidade para continuarem a trabalhar com a futura empresa, a recibos verdes, estando o futuro dono apenas interessado em 5 ou 6 pessoas. A testemunha (…), também ela ex- trabalhadora da III, por seu turno referiu, que foi apenas a partir de Agosto de 2013, que algumas das trabalhadoras desta sociedade, que tinham ido para o fundo de desemprego, foram convidadas a ficar na nova empresa, com as quais foram feitos novos contratos. Em sintonia com esta prova, cujo conteúdo não vemos razão para não considerar, visto assentar em depoimentos prestados de modo natural e isento, manifesto é que se não pode dar como provada a sobredita factualidade que deve, assim, manter-se como não provada.

- “A R. III pretendia ir para a insolvência, não pagar a quem deve e continuar a funcionar em nome de outra entidade, as outras RR., sem pagar aos seus credores”. (Conclusão 121.ª). Invocam que essa matéria resulta da dinâmica descrita na petição, do negócio e objecto social ter continuado sem interrupção através da KKK, da JJJ, Lda. e da MMM, e de as consultas terem passado a ser feitas pelos filhos dos accionistas e sócios das referidas sociedades. Sucede que também neste ponto não lograram as autoras demonstrar a sua razão. Com efeito, da prova produzida não resultou minimamente demonstrado que as consultas tenham continuado a ser realizadas pelos familiares dos sócios e accionistas das ditas rés. Acresce a isto a circunstância da actividade prosseguida pela III em Agosto de 2013, ter sofrido substancial redução, circunscrevendo-se à entrega de exames, como atestaram, nomeadamente, (…) e a autora (…), em termos que merecem credibilidade. A primeira, por lá ter passado na altura e a segunda por ter retornado ao local, em finais desse mês de Agosto, a pedido dos novos responsáveis para explicar o funcionamento do sistema informático. Para além disso, como resulta da documentação junta aos autos, em particular da informação prestada pelo administrador de insolvência, a declaração de insolvência da III, foi requerida por um dos seus funcionários, sendo há vários anos (pelo menos 2009), notória a sua incapacidade financeira. Segundo aquele também refere na aludida informação a III perdeu significativa quota de mercado “a um ritmo de cerca de 10% ao ano, resultado da redução dos preços de praticados nas tabelas das convenções do Estado na área dos meios complementares de diagnóstico e o crescente predomínio dos grupos privados na área da saúde”, tendo a exploração registado “resultados líquidos negativos de valor extremamente elevado que não obstante a realização de sucessivos aumentos de capital (…), absorveram a totalidade dos fundos próprios, determinado a situação de falência técnica evidenciada” (fls. 1129). Itálicos nossos. Ponderando todos estes elementos probatórios, apenas se pode com razoabilidade concluir no sentido do decidido, ou seja, deve manter-se como não provada a sobredita matéria de facto.

- “Por outro lado, muito sofreram as AA. e todas as suas colegas, muitas delas, face ao desespero em que viviam, entraram de baixa, algumas trabalhadoras não pagaram as suas rendas de casa, outras não pagaram os seus empréstimos” (Conclusão 124.ª). Quanto a este ponto, invocam as autoras o depoimento da testemunha (…). Mas tão pouco aqui lhes assiste razão. Na verdade, perguntada a esta matéria, a dita testemunha limitou-se a apresentar um quadro muito genérico e abstracto das dificuldades por que teriam passado as trabalhadoras da III, face à situação dos salários em atraso, referindo, nomeadamente, que: “tudo se tornou mais complicado”, “o ambiente tornou-se um bocado mais difícil”,  “uns  dias a chorar, outros a rir, uns dias com esperança que viesse algum dinheiro …”, sem, contudo, resultar de tal depoimento ou de outros, a mínima pormenorização da situação vivida por cada  uma das autoras e esse respeito. Assim sendo, perante a ausência de prova concreta sobre aquela realidade, é de manter como não provada a descrita factualidade.

- “As AA. trabalhavam para todas as RR” (Conclusões 89.ª e 128.ª). A este propósito as autoras invocam os depoimentos das testemunhas (…),  (…), bem como o depoimento de parte da autora (…). Sucede que, mais uma vez, não lhes assiste razão. Ouvidos e ponderados tais depoimentos, deles resulta que as rés JJJ e a KKK não tinham pessoal, sendo os trabalhadores da III que desempenhavam as respectivas tarefas. Acresce que, no referente às autoras, se não apurou que todas elas trabalhassem para as ditas rés e muito menos que o fizessem para todas as rés (MMM e LLL, incluídas). Da conjugação dos depoimentos de (…),(…)  e (…), resultou, com clareza, que apenas algumas das trabalhadoras da III - mas nenhuma das autoras - foram contratadas para trabalhar para a empresa liderada por (…). Mantêm-se, por tudo isso, como não provados os sobreditos factos.

“A R. LLL, a sua denominação foi criada para se confundir com o nome que era utilizado pela R. III e a sua criação resultou do acordo de todos as RR. e seus accionistas e sócios, com vista à continuação do negócio da R. III, sem o pagamento das suas dívidas” (Conclusão 130.ª). Dizem as autoras que esta matéria resulta da própria sigla (…), de ser o número de telefone o mesmo e de se terem apropriado dos clientes da III. Ora, importa desde já assinalar que pelo facto de a sigla ser idêntica e de (algum) n.º de telefone se ter mantido, tal não nos permite concluir, sem mais e com a necessária segurança, que ré LLL tenha sido constituída para se confundir com a III, tendo a sua criação resultado de um acordo dos seus accionistas e sócios, com vista à continuação do negócio sem o pagamento das suas dívidas. Sobre esta matéria para além do supra referido, nenhuma prova foi feita no sentido de ter existido tal tipo de acordo, nefasto para os credores, entre accionistas e sócios. Relembra-se que a insolvência da III foi requerida por um trabalhador, assentou na sua deficitária situação financeira de há vários anos, e não foi qualificada. Acresce ainda que nada se provou no sentido de a clientela da LLL ser a mesma da III. Mantém-se, por conseguinte, como não provada, a referida matéria de facto.

-“A KKK está a desenvolver o trabalho que era da III” (Conclusão 135.ª). Sustentam as autoras que a matéria em causa decorre da situação de grupo existente entre as rés. Ocorre que também quanto a este aspecto carecem as autoras de razão. Do conjunto da prova produzida não resulta tal versão fáctica, tendo, ao invés, (…)  referido que a KKK, que fazia ressonâncias magnéticas, se encontra parada devido a problemas existentes com o aparelho que se encontra fechado, versão esta não infirmada por qualquer outra prova. É, assim, de manter como não provada a presente versão fáctica.

b) Da responsabilidade solidária das rés.
As autoras pretendem a responsabilização solidária das 2.ª, 3.ª, 4.ª e 5.ª rés, com base no preceituado no art.º 334.º do Código do Trabalho. Alegam que todas as empresas faziam parte do grupo, existiam e existem participações recíprocas e relações de domínio, como resulta das certidões juntas e da propriedade das acções da III.

Nos termos do art.º 334.º do Código do Trabalho “Por crédito emergente de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, vencido há mais de três meses, respondem solidariamente o empregador e sociedade que com este se encontre em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais ”.

Este normativo consagra, como é sabido, um reforço da tutela dos créditos laborais do trabalhador, vencidos há mais de 3 meses. Desde que se trate de créditos pecuniários vencidos há mais de 3 meses, pode o trabalhador demandar directamente outras sociedades, verificando-se alguma das hipóteses de coligação societária referidas no Código das Sociedades Comerciais. É esta uma solução proveniente do Código do Trabalho de 2003 (art.º 378.º), mantida no actual Código de 2009, cujo objectivo consiste em “intensificar a garantia patrimonial de tais créditos laborais, obviando a que a inclusão do empregador em determinado tipo de coligação intersocietária redunde em prejuízo dos seus trabalhadores”. O dito normativo alarga o regime decorrente do art.º 501.º do CSC, por via do qual a “sociedade directora-dominante é responsável por todas as obrigações da que lhe é subordinada, independentemente de elas se terem constituído antes ou depois da celebração do contrato de subordinação, mantendo-se a responsabilidade até à cessação deste negócio jurídico”, aplicando-se aos casos em que as sociedades se encontrem em relação de participação reciproca, de domínio ou de grupo com o empregador (Joana Vasconcelos “Código do Trabalho Anotado”, Pedro Romano Martinez e Outros,”, Almedina, 8.ª Edição, 2009, pág. 893 e Catarina Oliveira Carvalho “ Algumas Questões Sobre A Empresa e Direito do Trabalho”, “Reforma do Código do Trabalho”, Coimbra Editora, 2004, pág. 451).

E porque se trata de uma responsabilidade patrimonial ou de garantia, não se impõe ao trabalhador a demonstração de que a actuação das sociedades em causa se dirigiu ou teve como resultado defraudar os seus direitos ou comprometer gravemente a respectiva satisfação, nem tão pouco que aquele tenha trabalhado para qualquer das sociedades coligadas com a sociedade empregadora. Trata-se de “uma responsabilidade que não depende da culpa (…)” não se exigindo que o trabalhador tenha demandado primeiro sem sucesso o seu empregador” (Júlio Gomes, “Direito do Trabalho”, Vol. I, Coimbra Editora, 2007, pág. 900).

Para que possa beneficiar de tal garantia creditícia, deverá o trabalhador alegar e provar (art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil) a existência das sociedades que se encontram entre si numa relação de participação recíproca, de domínio ou de grupo, nos termos previstos no artigo 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais (Cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-11-2011, proc. 332/07.2TTVNG.P1.S1, www.dgsi.pt).

As relações intersocietárias a que se refere aquele preceito legal são as previstas no Código das Sociedades Comerciais, no art.º 481.º e seguintes, neste se estabelecendo que:  “... o presente título aplica-se a relações que entre si estabeleçam sociedades por quotas, sociedades anónimas e sociedades em comandita por acções», prescrevendo o art.º 482º que se consideram sociedades coligadas as “sociedades em relação de simples participação, as sociedades em relação de participações recíprocas, as sociedades em relação de domínio e as sociedades em relação de grupo”.

Como decorre do dito art.º 334.º do Código do Trabalho, estão excluídas da sua previsão as sociedades em relação de simples participação (em que uma sociedade é titular de quotas ou de acções de uma outra sociedade em montante igual ou superior a 10% e não esteja em relação de participações recíprocas, em relação de domínio ou de grupo com ela). Resultando da conjugação dos artigos 483º e 485º do Código das Sociedades Comerciais que as sociedades se encontram em relação de participações recíprocas quando se verifique ocorrer uma participação mútua no capital das sociedades coligadas. Quando qualquer delas participa no capital social da outra ou outras em valor igual ou superior a 10% do respectivo capital social e desde que não se verifique entre elas qualquer outra situação de coligação. Por outro lado, nos termos do art.º 486º n.º 1 do CSC, “duas sociedades estão em relação de domínio quando uma delas, dita dominante, pode exercer, directamente ou por sociedades ou pessoas que preencham os requisitos indicados no artigo 483.º n.º 2, sobre a outra, dita dependente, uma influência dominante”. Presume-se, nos termos do n.º 2 do citado preceit0, que uma sociedade é dependente de uma outra se esta, direta ou indiretamente: a) Detém uma participação maioritária no capital; b) Dispõe de mais de metade dos votos; c) Tem possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização». E, de acordo com o seu n.º 3, «sempre que a lei imponha a publicação ou declaração de participações, deve ser mencionado, tanto pela sociedade presumivelmente dominante, como pela sociedade presumivelmente dependente, se se verifica alguma das situações referidas nas alíneas do n.º 2 deste artigo». Quanto às sociedades em relação de grupo, esta forma de relacionação societária, de acordo com o disposto nos artigos 488.º a 490.º do CSC, decorre da titularidade de participação no capital de uma sociedade, abrangendo as situações de domínio total (inicial ou superveniente), ou da celebração de contrato de grupo paritário (art.º 492.º CSC) ou da celebração de contrato de subordinação (artigos 493.º a 508.º do CSC).

Sobre tais conceitos, escreve Maria Rosário Ramalho «Grupos Empresariais e Societários Incidências Laborais”, Almedina, 2007, pág. 141 e seguintes, que para “concretizar o conceito juridicamente indeterminado de influência dominante…, a lei recorre à técnica das presunções, estabelecendo as seguintes presunções legais de domínio: a detenção pela sociedade dominante de uma participação maioritária no capital da sociedade dominada; a disposição, por parte da sociedade dominante, de mais de metade dos votos da sociedade dominada; ou a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou de fiscalização da sociedade dominada pela sociedade dominante. Este critério de delimitação das situações de domínio societário justifica algumas notas complementares.

Em primeiro lugar, trata-se de um critério substancial e não formal de delimitação das situações de domínio, uma vez que a lei reconhece como dominantes situações em que a sociedade dominante não detém a maioria do capital da sociedade dominada, desde que possa actuar como tal – é o que sucede, por exemplo, se a sociedade detiver acções privilegiadas ou se, em resultado de um acordo parassocial ou de uma disposição estatutária especial, puder interferir decisivamente na designação dos membros do órgão de gestão ou de fiscalização de outra sociedade.

Em segundo lugar, estando em causa presunções de influência dominante, nada impede que seja reconhecida uma relação de domínio inter-societário mediante a verificação de outros factores que não os previstos nesta norma. Neste aspecto o sistema não é fechado, apenas facilitando o reconhecimento da situação de domínio societário se estiver presente um (ou mais) dos factores de influência dominante referidos.

Em terceiro lugar, crê-se que estas presunções são de considerar, nos termos gerais do art.º 350.º n.º 2 do CC, como presunções ilidíveis. Assim, a qualificação da relação inter-societária como uma situação de domínio pode ser afastada mediante prova de que a presunção de domínio existente não corresponde, no caso concreto, a um efectivo domínio de uma sociedade sobre a outra sociedade.

Por fim, embora não esteja estabelecido expressamente o limite máximo da participação maioritária de capital, retira-se da conjugação desta norma com a disposição relativa ao grupo constituído por domínio total (art.º 490.º n.º 1 do CSC) que as relações de domínio societário aqui contempladas, quando tenham na sua base a detenção da maioria do capital da sociedade dominada (i.e., a situação contemplada na alínea a) do n.º 2 do art.º 486.º), serão apenas aquelas em que a participação societária se situe entre os 50% e os 90% do capital da sociedade dominada – abaixo dos 50%, e desde que não se verifique nenhuma outra presunção de domínio, a relação é de participação simples ou recíproca; e a partir dos 90% a relação é de grupo constituído por domínio total».

(…) Os “grupos constituídos por domínio total correspondem à única modalidade de grupo em sentido próprio, cuja base não é negocial, mas de facto, uma vez que assentam numa participação total de uma sociedade no capital de outra sociedade. Estes grupos têm estrutura vertical e podem surgir com a constituição, ab initio, de uma sociedade de que a sociedade dominante seja a única titular (é a situação de domínio total inicial, prevista no art. 488.º do CSC), ou através da aquisição da totalidade das participações sociais de uma sociedade já constituída por outra sociedade (é a situação de domínio total superveniente, prevista no art.º 489.º do CSC). Uma vez verificados os pressupostos da situação de domínio total superveniente, a relação de grupo surge ope legis (art. 489.º n.º 1)».

Explicitando também tais noções e realçando a sua insuficiência para tutelar eficazmente a posição dos trabalhadores, aduzem Inês Arruda e Tito Arantes “Actualidade Jurídica, Úria Menéndez”, 13-2006, pág. 26 e segs., que “existe coligação de sociedades sempre que esteja preenchida uma das três modalidades enunciadas no artigo 482.º do referido diploma legal. O saber: (i) sociedades em relação de participação (simples ou recíproca); (ii) sociedades em relação de domínio; e, por fim, (iii) sociedades em relação de grupo. Vejamos:

(i) Sociedade em relação de participação: simples ou recíproca
a)- Sociedades em relação de simples participação: nos termos do artigo 483.º do CSC, uma sociedade encontra-se numa relação de simples participação com outra quando aquela é titular de participações sociais em montante igual ou superior a 10% do capital social desta última, desde que simultaneamente não se verifique a existência entre ambas de outra das relações previstas no artigo 482.º do CSC, ou seja, desde que o valor da participação não ultrapasse os 50 %, caso em que se presume a existência de uma relação de domínio, de acordo com o artigo 486.º, n.º 2, alínea a), do CSC;
b)- Sociedades em relação de participações recíprocas: a lei não define expressamente este tipo de relação. Contudo, face ao disposto no artigo 483.º do CSC, neste tipo de relação cada uma das sociedades participa no capital social da outra, devendo o montante das participações igualar ou exceder os 10%, mas sem ultrapassar os 50%, caso em que prevalece a situação de domínio;

(ii) Sociedades em relação de domínio: o artigo 486.º do CSC caracteriza a relação de domínio como aquela em que uma sociedade (dominante) pode exercer, directa ou indirectamente, sobre outra (dependente) uma influência dominante”.
Mais dizem serem “claras as insuficiências das consequências jurídicas que a lei associou a este tipo de coligação, para realizarem uma eficaz protecção dos interesses em jogo. Na verdade, tem-se, neste tipo de coligação, sobretudo em vista assegurar a integridade do capital social e a sociedade dominante, descurando os interesses dos sócios, dos credores, e, claro está, dos trabalhadores, da sociedade dominada.

(iii) Sociedades  em relação de grupo: esta é a forma mais intensa de coligação de sociedades. A disciplina jurídica encontra-se regulada nos artigos 488.º e ss, sendo que, contrariamente ao que sucede com outros tipos de coligação, encontramos agora uma especial preocupação de tutelar as «sociedades filhas» (sócios e credores), pois, no caso em apreço, o «interesse do grupo» prevalece sobre os interesses de cada uma das sociedades, dominadas por uma direcção económica unitária.
a)- grupo constituído por subordinação: Nos termos do artigo 493.º do CSC: «1. Uma sociedade pode, por contrato, subordinar a gestão da sua própria actividade à direcção de uma outra sociedade, quer seja sua dominante ou não. 2. A Sociedade directora forma um grupo com todas as sociedades por ela dirigidas, mediante contrato de subordinação, e com todas as sociedades por ela integralmente dominadas, directa ou indirectamente.» Os elementos caracterizadores desta forma de grupo são a subordinação e a gestão.
A verdade é que, por via deste tipo de contrato, a actividade empresarial da sociedade subordinada passa a ser orientada pela sociedade directora, no seu interesse e vontade específicos. Nos termos do artigo 503.º, n.º 1, do CSC, «... a sociedade directora tem o direito de dar à administração da sociedade subordinada instruções vinculantes». O número seguinte dispõe mesmo que «[…] podem ser dadas instruções desvantajosas para a sociedade subordinada, se tais instruções servirem os interesses da sociedade directora ou de outras sociedades do mesmo grupo.»

Do exposto resulta que o poder da sociedade directora sobre a sociedade subordinada abarca não só a política empresarial das diferentes sociedades do grupo como se alarga aos diversos sectores de gestão, desde a produção até às vendas, incluindo o sector de pessoal, pelo que podem ser emitidas uma série de recomendações que afectem, directa ou indirectamente, os trabalhadores da sociedade subordinada. Nesta medida é forçoso admitir a possibilidade de a sociedade directora promover a extinção de postos de trabalho da sociedade subordinada (por considerá-los não rentáveis, ou desnecessários), da mesma forma que pode promover o processo de despedimento colectivo, junto da sociedade subordinada, ditado por razões estruturais de reestruturação da empresa, podendo ainda promover a contratação ou despedimento do pessoal dirigente (salvo membros dos órgãos sociais), etc.
b)- grupo constituído por domínio total (inicial ou superveniente): nos termos do artigo 488.º do CSC, a relação de grupo sob a forma de domínio total inicial surge quando uma sociedade, através de escritura pública, cria uma sociedade de cujo o capital é a única titular. Se a sociedade adquirir, de forma directa ou indirecta, todas as acções ou quotas de uma sociedade já constituída, passando, na ausência de outros sócios, a dominá-la por completo, o domínio constitui-se a título superveniente (artigo 489.º do CSC). O regime jurídico deste tipo de sociedades é moldado pelo regime aplicável ao contrato de subordinação (a aplicação do regime é mesmo feita por remissão).        
c)- grupo contratual paritário: caracteriza-se pela circunstância de duas ou mais sociedades, que não sejam dependentes, nem entre si, nem de outras sociedades, constituírem um grupo de sociedades, mediante contrato, pelo qual aceitem submeter-se a uma direcção unitária e comum. A «direcção unitária» pode ir desde a criação de um órgão especial de direcção, em que participam todas as sociedades (como se deduz do artigo 492.º, n.º 4), até às ligações pessoais entre administrações, ou reuniões regulares entre os presidentes dos Conselhos de Administração. Neste tipo de coligação, ambas as sociedades podem exercer o poder de direcção legalmente previsto, ao qual se sujeitam os membros do agrupamento, sendo simultaneamente sujeitos passivos das instruções vinculantes. Parece-nos, contudo, que não existindo aqui nenhum regime que tutele os sócios, credores, bem como as próprias sociedades, não é admissível que as instruções vinculantes sejam prejudiciais para as outras sociedades”.

Mais dizem aqueles autores seremclaras as insuficiências das consequências jurídicas que a lei associou a este tipo de coligação, para realizarem uma eficaz protecção dos interesses em jogo. Na verdade, tem-se, neste tipo de coligação, sobretudo em vista assegurar a integridade do capital social e a sociedade dominante, descurando os interesses dos sócios, dos credores, e, claro está, dos trabalhadores, da sociedade dominada”.

Referindo ainda quea análise aprofundada dos tipos de grupos económicos regulados pelo CSC permite, na verdade, constatar que as normas constantes desse diploma legal mostram-se insuficientes para realizarem uma adequada protecção dos trabalhadores das empresas coligadas. Desde logo, o artigo 481.º do CSC restringe o regime das coligações de sociedades às relações entre sociedades por quotas, anónimas e em comandita por acções. Contudo, a verdade é que os problemas laborais gerados pela constituição de grupos não diferem em função da forma societária ou não societária dos respectivos membros.
(…) 
A perspectiva de análise laboralista dos grupos de empresas, ainda que conexa com a tipologia dos grupos de sociedades acima analisada, é, efectivamente, diferente da visão comercialista dos mesmos. Na verdade, não obstante a preocupação demonstrada pelo legislador na tutela dos credores sociais e sócios minoritários, não foi dispensada, neste diploma, qualquer protecção específica aos trabalhadores, sendo certo que os interesses dos mesmos não são assegurados de forma satisfatória pelas normas destinadas a proteger os credores sociais.

O regime das coligações de sociedades apresentado pelo CSC, mostra-se, desta forma, visivelmente limitado e redutor, impedindo a sua adopção no regime do Direito de Trabalho. Para necessária protecção dos trabalhadores, consideramos, então, necessário alargar o conceito de grupo de empresa de forma a abarcar todas as configurações do fenómeno susceptíveis de criarem riscos suplementares aos trabalhadores face aos riscos normais que suportam genericamente os trabalhadores de uma empresa globalmente autónoma.

Assim sendo, o direito de trabalho deve utilizar uma noção ampla de grupo de empresas: (i) não haverá dúvidas, desde logo, quanto à subsunção, na referida noção, das formas de coligação de sociedades tipificadas no CSC; (ii) deverá abarcar, além dessas, todas as situações em que se detecte uma relação de controlo de facto entre duas ou mais empresas, ou, não havendo embora uma relação de controlo, exista, de facto, uma direcção económica unitária. A presença de qualquer uma destas situações implica, necessariamente (e tal como acontece nas situações tipificadas no CSC), uma perda de autonomia para a empresa dominada/subordinada susceptível de afectar o estatuto dos trabalhadores, pelo que também tem que ser tida em conta no direito de trabalho. Aceitamos, porém, a crítica, no sentido de que esta forma de solucionar a questão não esgota, ainda, todos os problemas suscitados pelo fenómeno do grupo de empresas. Pense-se por exemplo na situação como o consórcio], que entendemos dever inserir no conceito de «grupo», em que não existe a unidade de direcção ou tão pouco a enunciada influência dominante. Assim, para além das situações supra enumeradas, dever-se-á incluir no conceito de grupo, para os efeitos que ora se analisam, (iii) todas as situações em que haja um agrupamento (associação) de duas ou mais empresas que se mostra susceptível de produzir efeitos ao nível do próprio quadro organizativo que serve de base à prossecução da actividade económica do empregador.» 

Como salienta João Zenha Martins, in “A descentralização produtiva e os grupos de empresas ante os novos horizontes laborais” QL, Ano VIII, 18, pág. 217, seria “irrealista confinar a temática dos grupos de empresas às empresas societárias previstas no CSC e não atender à emergência crescente de formas de cooperação empresarial de nível horizontal que proliferam a um ritmo vertiginoso (…) e que do ponto de vista material podem defraudar a tutela juslaboral. É que na actualidade ressalta mais o efeito económico do conjunto dos factores envolvidos num processo produtivo do que a forma jurídica de organização do capital. (…)”

Ainda segundo este autor: “O critério de referência, neste particular domínio, tem de repousar na tutela da posição dos trabalhadores em conjugação com o delineamento de um quadro de aferição da funcionalidade quanto ao exercício de determinados direitos e na necessidade de busca ao nível do ordenamento de soluções ou institutos materialmente adequados (independentemente do formalismo societário em questão) que logrem reparar situações de injustiça que, enquanto tal, repugnam à consciência jurídica e desvirtuam a estrutura finalística do direito do trabalho e actuam para além dos princípios básicos do sistema”, até porque a estruturação da realidade grupos de empresas, no plano dos problemas emergíveis no âmbito das prestações materiais multilocalizadas, é extremamente variável. (…) Existe uma exigência de fazer prevalecer a realidade jurídica objectiva sobre a aparência (…).”

Nesta linha, também existem alertas para os chamados grupos de sociedades de facto (em que o poder de direcção detido pela sociedade-mãe é um poder de facto, decorrente, nomeadamentede participações maioritárias, acordos parassociais, contratos interempresariais, uniões pessoais ou relações económicas factuais de dependência(Rita Garcia Pereira “A Garantia dos Créditos Laborais no Código do Trabalho”, QL, Ano XI, 2004, 24, pág. 186).

Aspectos esses, a merecerem, naturalmente, a devida ponderação. 

Face a este enquadramento, importa agora reverter ao caso concreto e aquilatar se a factualidade provada é susceptível de permitir a responsabilidade solidária das rés.

E desde já se adianta que a resposta não pode deixar de ser negativa.

Em primeiro lugar, não resulta que a situação das sociedades rés se enquadre em alguma das hipóteses de coligação societária previstas no Código das Sociedades Comerciais, acima referidas. E um ponto essencial deve ser destacado, é que a III, empresa com a qual as autoras haviam celebrado os seus contratos de trabalho, é uma sociedade anónima, sem que se tenha apurado a identidade dos titulares das respectivas acções, que essa sociedade tenha participado no capital das demais rés ou exercido qualquer tipo de influência dominante sobre qualquer uma das ora rés.

Acresce que as rés (JJJ, KKK, LLL e MMM), são sociedades por quotas, sem que se tenha também provado que anteriormente fossem sócias umas das outras, sendo que apenas em 29.08.2013 e 26.09.2013, respectivamente, a ré MMM adquiriu quotas e passou a participar maioritariamente no capital das rés KKK e JJJ (factos provados 25 e 28). 

A 4.ª ré, LLL, foi constituída em 22.07.2013, sendo seus sócios os acima referidos (factos provados 43 e 44), sem que se demonstre existir entre esta e as outras rés qualquer das apontadas relações societárias.

Não se demonstra, por outro lado, que a ré KKK  seja ou tenha sido sócia da III ou da JJJ. Tão pouco se tendo apurado que a ré MMM tenha sido sócia da III, e que a KKK tenham sido sócia desta última ou da JJJ e, como já dito, que esta tenha participado no capital social da III, SA.

Também se não provou que entre a III e as ora rés tenham existido relações enquadráveis na noção de sociedades em relação de grupo, pois se não provou tenha sido instituído grupo por domínio total (90% das sociedades dependentes), nem tão pouco grupo paritário ou de subordinação, os quais, nos termos supra assinalados, estão dependentes da celebração de contrato - o que nem sequer foi alegado.

Como refere o Prof. Raúl Ventura, citado no âmbito do acórdão do STJ de 9.11.2011, há uma situação comum aos apontados casos de sociedades em relação de grupo “em todos eles há uma entidade que tem o domínio das sociedades pertencentes ao grupo, isto é, que tem a ‘direcção unitária’ das sociedades, ou que tem o poder de decisão, em última análise”, o que, reafirma-se, no presente caso se não provou.

Em segundo lugar, e para afastar qualquer outra perspectiva de análise, sempre seria de considerar não ser a factualidade provada susceptível de integrar a noção ampliada de grupo, não existindo, entre todas as rés, dados compagináveis com as apontadas sociedades de facto. 

É verdade ter resultado provado que a III usava a designação de (…), que as rés JJJ e KKK não tinham pessoal, sendo os trabalhadores daquela que efectuavam o trabalho, e que algumas das autoras para estas rés trabalharam, o que permite afirmar ter existido entre as ditas sociedades estreito relacionamento, pelo menos em termos de pessoal. Contudo, tal acervo factual não chega, em nosso entender, para se perspectivar um alargamento do conceito de grupo, já que se ignora como estavam tais sociedades organizadas, nomeadamente em termos económicos e financeiros, com que base concretamente interagiam entre si, não se dispondo, assim, de elementos que nos permitam afirmar ter existido uma relação de controlo de facto entre tais empresas ou uma direcção económica unitária. Ignorando-se também, em que medida é que o relacionamento entre elas existente, era susceptível de produzir efeitos na estrutura organizativa da própria empregadora (III), e se o mesmo, de algum modo, contribuiu ou influenciou a situação económica em que esta se veio a encontrar, entretanto declarada insolvente.

É ainda de assinalar que se não vislumbra ter existido qualquer relacionamento jurídico ou de facto entre as sociedades MMM e LLL, ora 4.ª e 5.ª rés. Ignorando-se, outrossim, de todo, que exista qualquer relação entre a invocada proprietária das instalações “(…), Lda” e as ditas rés.

As autoras assentaram a sua tese grupal, sobretudo, nas alegadas relações existentes entre os accionistas da III e as ora rés (Conclusões 37.ª a 58.ª), o que, como acima já foi dito, se não provou. Invocaram também que o que se pretendia era a insolvência da III, o não pagamento dos salários e indemnização aos trabalhadores, continuando a (…) a funcionar em nome de outra entidade, as outras rés, sem pagar aos seus credores o que veio a suceder (Conclusão 8.ª). Sucede que tão pouco esta situação fraudulenta se provou (penúltimo parágrafo da factualidade não provada).

Nesta conformidade, não existindo elementos que permitam concluir pela responsabilidade solidária das rés relativamente aos invocados créditos das autoras, apenas resta concluir pela improcedência da presente questão.

c)- Da indemnização por danos não patrimoniais.
As autoras pediram 3.000,00 euros, cada uma, a título de danos não patrimoniais, pela actuação levada a cabo pela III (factos 236 a 241 da petição inicial). Sucede que se não provaram factos integradores de tal tipo de danos não patrimoniais (merecedores da tutela do direito, à luz do art.º 496.º do Código Civil). Por outro lado, a instância foi declarada extinta relativamente àquela, tendo a mesma sido declarada insolvente e concluiu-se pela inexistência da responsabilidade solidária das rés.
Assim sendo, improcede a presente questão.

II. Recurso das rés JJJ e KKK.

a)- Da impugnação da matéria de facto
Pretendem as rés que se dê como não provado que as RR. JJJ e KKK não tinham quadro de pessoal, sendo os trabalhadores da R. III que efetuavam o seu trabalho. As AA. FFF, GGG e HHH desenvolveram atividade incluída nos serviços prestados pela JJJ e a A. CCC desenvolveu atividade incluída nos serviços prestados pela KKK.
Aduzem, para tanto, que se verifica contradição na matéria de facto porquanto as referidas quatro autoras não poderiam simultaneamente trabalhar para a R. III através de contrato de trabalho sob as suas ordens e instruções, nos seus estabelecimentos sitos Rua …, e Rua …, sujeitas a horário de trabalho e com um salário mensal, como se deu por provado e simultaneamente dizer-se que as RR. JJJ e KKK não tinham quadro de pessoal, sendo os trabalhadores da R. III que efetuavam o seu trabalho; as AA. FFF, GGG e HHH desenvolveram atividade incluída nos serviços prestados pela JJJ e a A. CCC desenvolveu atividade incluída nos serviços prestados pela KKK.
Ponderando a prova produzida a este respeito, em particular a decorrente dos depoimentos de (…),(…) e da própria autora GGG, também referidos no âmbito do recurso da decisão da matéria de facto das autoras, resultou seguro que efectivamente as ditas rés JJJ e KKK não tinham pessoal, sendo os trabalhadores da III que prestavam serviço para aquelas.
Ora, relativamente às autoras, apenas se provou que algumas delas o fizerem para as ditas rés. FFF, GGG e HHH e desempenharam funções para a JJJ e a autora CCC para a ré KKK. Não se tendo provado, por outro lado, que qualquer delas tivesse trabalhado para as rés MMM e LLL.
Não existindo qualquer contradição na matéria de facto provada e não  provada, nada há, pois, a rectificar ou a alterar.

b)- Da absolvição das rés.
Dizem as rés, ora recorrentes, que se não deveria ter operado a desconsideração da sua personalidade colectiva, aduzindo, ainda, não ter aplicação o art.º 378.º do Código do Trabalho e art.º 481 e seguintes do CSC, pedindo a sua absolvição.

Como é sabido, o mecanismo da desconsideração da personalidade jurídica das pessoas colectivas depende, sobretudo, da demonstração de ter havido da parte dos respectivos agentes uma postura de fraude à lei ou de abuso de direito (Entre muitos outros, veja-se o acórdão do STJ de 7.11.2017, CJ, STJ, Ano XXV, Tomo III, pág. 88 a 96). No presente caso, estando em causa várias sociedades, com o levantamento da personalidade colectiva, não se trataria de responsabilizar as pessoas singulares que estão encobertas pela pessoa colectiva, mas sim as outras pessoas colectivas que nestes autos foram demandadas.

Nestes autos, porém, muito embora as autoras tivessem invocado factualidade susceptível de integrar actuação dolosa e fraudulenta da III com vista à sua insolvência, ao não pagamento aos seus credores, onde aquelas se incluem, e à continuação do desenvolvimento da mesma actividade pelas rés, tal matéria não se apurou, nos termos acima referidos.

Para além disso, a demais factualidade provada não nos permite alavancar a tese da desconsideração da personalidade colectiva que, como é sabido, é uma operação complexa e delicada, que apenas deve ser utilizada em situações limite e quando sejam claros e seguros os sobreditos indícios.

Ora, não se tendo operado a desconsideração da personalidade colectiva das rés, nem tendo aplicação o disposto no art.º 334.º do Código do Trabalho, não curando estes autos do apuramento do empregador real - nunca esteve em causa neste processo que a entidade patronal das autoras era a III, sendo esta que as retribuía e a cujas ordens e instruções aquelas estavam sujeitas (factos provados n.ºs 1 e 4) - a circunstância de algumas das autoras terem prestado funções, nos moldes descritos, para algumas das rés, decorria da sua condição de trabalhadoras subordinadas da III e do peculiar contexto em que a relação laboral se desenvolveu, não existindo qualquer confusão no que se refere à qualidade de empregador a que se impusesse por cobro.

Desta feita, não assumindo as rés a qualidade de responsáveis solidárias pelos créditos salarias das autoras, como decorreria se tivesse aplicação o art.º 334.º do Código do Trabalho, nem ocorrendo situação de pluralidade de empregadores, não há fundamento legal para condenar as rés nos peticionados créditos, procedendo, por conseguinte, a presente questão.

5. Decisão.
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso das autoras. E concede-se provimento ao recurso das rés JJJ e KKK.
Custas em ambos os recursos pelas autoras.



Lisboa, 2018.04.26



Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Eduardo Sapateiro