Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
21112/16.3T8LSB-A.L1-6
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: VALOR DA ACÇÃO
PEDIDO GENÉRICO
UTILIDADE ECONÓMICA
ACESSO À JUSTIÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Peticionando-se a condenação no pagamento da quantia que se vier a apurar que resultará da diferença entre o montante que poderá ser recuperado pela Autora em resultado da liquidação da entidade emitente de instrumento financeiro e o montante de USD 11.000.000,00 e juros, a utilidade económica do pedido já se encontra definida dentro destes parâmetros, não se estando perante pedido genérico.

II. A atribuição do valor da causa não é consequência, mas sim causa, da extensão admissível de recursos.

III. Não havendo qualquer paralelismo ou similitude com as situações previstas no artigo 303º do CPC, não tem fundamento atribuir-se à causa o valor de €30.000,01.

IV. A fixação do valor em correspondência com a máxima utilidade económica que pode vir a ser conseguida nos autos, não viola o direito de acesso à justiça.

V. A mesma fixação respeita o fundamento último do custo do serviço concretamente a desenvolver e a pagar, enquanto a relação que se estabelece com este não é exclusivamente directa mas reportada ao funcionamento geral do sistema de administração da justiça.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório

Mosaico Holding, S.A., com os sinais dos autos, veio intentar a presente acção declarativa com processo comum contra Banco Espírito Santo S.A. – em Liquidação, Haitong Bank S.A. (anterior Banco Espírito Santo de Investimento S.A.), GNB – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Mobiliários S.A. (anteriormente designada por ESAF – Espírito Santo Fundos de Investimento Mobiliários, S.A., e RS, peticionando a final a condenação solidária dos Réus no pagamento da quantia que se vier a apurar que resultará da diferença entre o montante que poderá ser recuperado pela Autora em resultado da liquidação da entidade emitente do instrumento financeiro “Fiduciary Time USD. 2,9% 08.05.2014-07.11.2014 ESBP PN (155928)”, com data de vencimento a 7 de novembro de 2014” e o montante de USD 11.000.000,00 (onze milhões de dólares), valor que corresponde aproximadamente a €9.858.490,00 (nove milhões, oitocentos e cinquenta e oito mil, quatrocentos e noventa euros), investido pela Autora nesse instrumento financeiro, e no pagamento dos juros convencionados à taxa de 2,9 % no valor de € 285.896,21 (duzentos e oitenta e cinco mil oitocentos e noventa e seis euros e vinte e um cêntimos), e no pagamento de juros vencidos calculados à taxa legal desde a data de incumprimento da entidade emitente em 13 de agosto de 2014 e de juros vincendos à Autora sobre as quantias devidamente referidas no parágrafo anterior até ao seu integral e efectivo pagamento, também calculados à taxa legal.
À causa indicou a Autora o valor de €30000,01, valor que nenhum dos Réus, todos contestantes, impugnou.

Notificada para esclarecer o valor que atribuiu à presente acção, a autora veio alegar, em suma, que à data da propositura da presente acção, não conseguia quantificar a importância da indemnização a pagar pelos Réus e, por isso, formulou um pedido genérico em consonância com o disposto na alínea b) do artigo 556.º, n.º 1 do CPC e do artigo 569.º do Código Civil. Embora se pretenda obter uma quantia certa em dinheiro, não é ainda possível definir a utilidade económica imediata do pedido, pelo que terá de ser atribuído à presente acção o valor da alçada da Relação e mais € 0,01, por forma a ser admissível recurso para o tribunal superior.
               
Seguida e oficiosamente veio a ser proferido o seguinte despacho, que aqui transcrevemos na parte relevante:
                “(…)
Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, devendo tal fixação realizar-se aquando da elaboração do despacho saneador, nos termos do artigo 306.º, n.º 1 e n.º 2, do Código de Processo Civil.
Vejamos, assim, qual o critério para determinação do valor da causa.
Estipula o art.º 297.º, n.º1, do C.P.C., que se pela acção se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa (…); se pela acção se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.
Visa a autora, com a presente acção, ser ressarcida dos danos patrimoniais que sofreu com a subscrição de uma aplicação fiduciária da empresa Espírito Santo Bank (Panama) SA, (ESBP) denominada “Fiduciary Time USD, 2,9%, 08.05.2014-07.11-2014 ESBP PN (155928)” no montante de USD 11.000.000,00 (onze milhões de dólares), valor que a autora alegou corresponder aproximadamente a €9.858.490,00 (nove milhões, oitocentos e cinquenta e oito mil, quatrocentos e noventa euros).
Alega a autora que é impossível quantificar os danos totais sofridos pois à data da propositura da acção judicial, aguardava (e continua a aguardar) a liquidação da entidade emitente dos títulos para saber a parte que lhe caberá do produto dessa liquidação.
De acordo com o disposto no artigo 299.º, n.º 1, do CPC, na determinação do valor da causa deve atender-se ao momento em que a acção é proposta. Ora, no momento da propositura da presente acção, de acordo com os factos alegados pela autora, esta não tinha ainda sido ressarcida de qualquer parte do valor que aplicou no supra referido instrumento financeiro. Desta forma, no momento em que a acção foi proposta, o prejuízo patrimonial sofrido pela autora cifrava-se, no mínimo, no montante de capital que aplicou, ou seja, em €€9.858.490,00, acrescido dos juros convencionados no montante total de €285.896,21. Assim, cumulando-se na presente acção vários pedidos de condenação no pagamento de diferentes quantias, o valor da causa deve corresponder à soma de todas elas (artigo 297.º, n.º 2, do CPC), ou seja, ao montante total de € 10.144.386,21 (dez milhões, cento e quarenta e quatro mil e trezentos e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimos), montante esse que corresponde ao prejuízo patrimonial existente no momento da propositura da acção, sem prejuízo desse valor sofrer alguma redução em resultado de a autora conseguir reaver algum do capital investido aquando da liquidação da entidade emitente dos títulos.
Revela-se, por isso, incorrecto o valor inicialmente indicado pela autora (€30000,01), não havendo sequer qualquer facto alegado que justifique esse valor.
Pelo exposto, nos termos das disposições legais acima referidas, fixa-se o valor da acção em € 10.144.386,21 (dez milhões, cento e quarenta e quatro mil e trezentos e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimos).
Custas do incidente pela autora (arts. 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C.).
Rectifique na capa e no sistema Citius.
Notifique, sendo as partes também para comprovarem nos autos, no prazo de dez dias, a autoliquidação do remanescente da taxa de justiça em dívida, face ao novo valor da causa.
***
Da competência do Tribunal:
De acordo com o disposto no artigo 310.º, n.º 1, do CPC, quando se apure, pela decisão definitiva do incidente de verificação do valor da causa, que o Tribunal é incompetente, são os autos oficiosamente remetidos ao Tribunal competente.
Também de acordo com o disposto no artigo 117.º, n.º 3, da Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, são remetidos aos Juízos Centrais Cíveis os processos pendentes em que se verifique alteração do valor susceptível de determinar a sua competência.
Ora, de acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 117.º da LOSJ, compete ao Juízo Central Cível a preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de processo comum de valor superior a (euro) 50 000.
Assim, face ao novo valor da causa determinado pela decisão que antecede, declaro este Tribunal incompetente em razão do valor e determino a remessa dos autos ao Juízo Central Cível de Lisboa desta Comarca.
Notifique e, após trânsito, remeta os autos ao Tribunal competente”.
Inconformada a Autora interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
(1) O presente recurso vem interposto do despacho do tribunal a quo que, não tendo concordado com o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) provisoriamente atribuído pela Autora, suscitou, a título oficioso, o incidente de valor da causa, nos termos do disposto no artigo 306.º, n.º 1 do CPC, e decidiu atribuir à causa o valor de € 10.144.386,21 (dez milhões, cento e quarenta e quatro mil e trezentos e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimo) e, em consequência, ordenar a remessa dos autos para a instância central, por se considerar incompetente em razão do valor da causa.
(2) O incidente de valor da causa, por implicar trâmites específicos que não se confundem com os da ação em que estão integrados, é um incidente processado autonomamente e da decisão que lhe ponha termo cabe recurso de apelação, nos termos do disposto no artigo 644.º, n.º 1, alínea a), in fine do CPC, com efeito devolutivo e subida em separado nos autos, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 647.º e no n.º 2 do artigo 645.º do CPC.
(3) Na situação sub judice está em causa uma ação de responsabilidade civil extracontratual, cuja causa de pedir assenta no facto de os Réus terem criado e mantido um esquema fraudulento de financiamento e de rotação de dívida no seio do GES, que configurou crime de burla qualificada e violação das regras de supervisão bancária, e do qual resultaram prejuízos para a Autora que investiu num instrumento financeiro emitido por uma entidade do GES.
(4) À data da propositura da ação judicial, a Autora não conseguia ainda determinar o valor dos prejuízos sofridos, visto encontrar-se em curso o processo de insolvência da entidade emitente dos títulos, no âmbito do qual reclamou créditos junto do administrador de insolvência, aguardando a liquidação da empresa para saber a parte que lhe caberá do produto da liquidação. Com rigor, será, portanto, a diferença entre (i) o montante que caberá à Autora em resultado da liquidação judicial da entidade emitente dos títulos e (ii) o montante de € 10.144.386,21 (dez milhões, cento e quarenta e quatro mil e trezentos e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimo), correspondente ao capital investido pela Autora e juros convencionados, que cristalizará o montante dos prejuízos a ressarcir e o valor da presente causa.
(5) O tribunal a quo, ao ter atribuído o valor provisório de € 10.144.386,21 (dez milhões, cento e quarenta e quatro mil e trezentos e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimo) à presente ação, está a obrigar as partes ao pagamento do valor máximo legal, a título de custas processuais, o que constitui uma condicionante do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva consagrado no número 1 do artigo 20.º da CRP.
(6) Não se sabendo, na presente data, qual é o valor da causa e havendo a séria probabilidade de a liquidação judicial da entidade emitente dos títulos não se encontrar concluída antes da sentença final a proferir nos presentes autos, não é razoável ou sequer justo, por se tratar de um valor tão elevado, exigir o pagamento antecipado de um valor máximo legal a título de custas processuais, ainda que aquele valor venha depois a ser corrigido, pois, entretanto, a Autora já teve (e terá tido) que desembolsar uma quantia elevadíssima, sob pena de ver denegado o seu direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva.
(7) Quanto ao valor da causa, não assiste igualmente razão ao tribunal a quo quando considera que o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) indicado pela Autora se encontra em oposição com os critérios legais de fixação do valor, em particular com o critério previsto no artigo 297.º, n.º 1 do CPC.
(8) Saliente-se que esta questão não é nova. Em um processo idêntico ao dos presentes autos, o Tribunal da Relação de Lisboa já teve oportunidade de decidir questão idêntica, em sede de recurso de apelação de despacho que fixou o valor da causa, e considerou ser de rever o valor da causa atribuído pelo tribunal a quo (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de junho de 2017, processo n.º 21131/16.T8LSB-A.L1, 7.ª seção, Relatora Juiz Desembargador Maria Amélia Ribeiro).
(9) No presente caso, as normas de fixação dos critérios do valor da causa têm de ser articuladas com o disposto no artigo 556.º, n.º 1, alínea b) do CPC, que estabelece que “[é] permitido formular pedidos genéricos nos seguintes casos: b) [q]uando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil”, o qual dispõe que “[q]uem exigir indemnização não necessita de indicar a importância exata em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da ação, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”.
(10) Em conformidade com a lei civil substantiva, a lei processual civil permite à Autora formular um pedido genérico e atribuir à presente ação o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), ou seja, correspondente à alçada da Relação e mais € 0,01, ao abrigo do disposto no artigo 569.º do Código Civil e do artigo 556.º, n.º 1, alínea b) do CPC e por forma a ser admissível recurso para o tribunal superior, nos termos do disposto no artigo 629.º, n.º 1 do CPC e no artigo 44.º, n.º 1 da LOFTJ.
(11) Este critério é o mesmo critério conferido por lei para as ações a que não é possível atribuir um valor, como é o caso das ações sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais ou difusos (artigo 303.º do CPC), sendo que, no presente caso, não há qualquer outro valor que se possa, por agora, atribuir à presente ação. Qualquer outro valor seria arbitrário, por falta de um elemento objetivo que permitisse, na presente data, determinar o valor da ação, e sem um mínimo de correspondência com a causa de pedir e pedidos formulados pela Autora.
(12) O montante de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) poderá vir a ser mais tarde corrigido em sede de liquidação, nos termos do disposto no artigo 299.º, n.º 4 do CPC.
(13) Pelas razões acima, impõe-se que o despacho recorrido seja revogado e, em consequência, verificada e decretada a manutenção do valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) indicado como valor da causa pela Autora, valor que também não foi impugnado pelos Réus, nos termos do disposto no artigo 569.º do Código Civil e no artigo 556.º, n.º 1, alínea b) do CPC, bem como no artigo 629.º, n.º 1 do CPC e no artigo 44.º, n.º 1 da LOFTJ, e os presentes autos remetidos à Instância Local Cível.
                Nestes termos,
O presente recurso deverá ser julgado procedente e o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que declare verificada e decretada a manutenção do valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) como valor da ação, seguindo-se os ulteriores termos legais, (…)”.
Não consta dos autos a apresentação de contra-alegações.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
                II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação, a questão a decidir é a de saber se deve ser fixado à acção o valor de €30.000,01 e em consonância manter-se a competência do tribunal recorrido.

               III. Matéria de facto
A constante do relatório que antecede.

               IV. Apreciação
Conforme vem referido nas alegações de recurso, a questão não é nova na jurisprudência, porém tem sido decidida em sentidos divergentes.
No sentido da decisão recorrida o acórdão do passado mês de Dezembro no processo 21190/16.5T8LSB-B.L1-6, aliás subscrito pelo ora relator enquanto 2º adjunto, e no qual se lê:
“O nº 1 do art. 296º do CPC prescreve que «A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido.».
Por sua vez, o nº 1 do art. 297º do mesmo Código determina que «Se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; (...)».

Quanto ao momento a que se atende para a determinação do valor da causa, diz-nos o art. 299º:
«1. Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exacto quando haja reconvenção ou intervenção principal.
(…)
4. Nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação, o valor inicialmente aceite é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.».

Entendem os apelantes que no presente caso as normas de fixação dos critérios do valor da causa têm de ser articuladas com o art. 556º nº 1, alínea b) do CPC e com o art. 569º do Código Civil, além de que será arbitrário atribuir outro valor que não seja o das acções sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais ou difusos, pois, dizem, ainda não conseguiram determinar o valor dos prejuízos sofridos por estar em curso o processo de insolvência das entidades emitentes dos títulos, no âmbito do qual reclamaram créditos, aguardando a liquidação da empresa para saber a parte que lhes caberá do produto da liquidação.
Mas não têm razão.
O art. 556º nº 1 al. b) do CPC estatui:
«1. É permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes:
             (…)
b) Quando não seja possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569º do Código Civil; (…).
2. Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358º, salvo, no caso da alínea a) quando (…)».
E o art. 569º do Código Civil prescreve:
«Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede de, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.».
Os apelantes indicam na petição inicial a importância exacta em que avaliam os danos decorrentes de alegadamente terem investido quantias em instrumentos financeiros, como se evidencia do art. 485º desse articulado, onde se lê:
«Atento o acima exposto, o Primeiro Autor e o Segundo Autor sofreram prejuízos patrimoniais no montante total de € 4.961.741,04 € (…) e de € 2.661.343,46 (…), respectivamente, que correspondem aos valores globais aplicados em instrumentos financeiros ESFG e respectivos juros convencionados».

Portanto, os apelantes querem ser ressarcidos por esses montantes de capital, juros convencionados e juros de mora.
Assim, a utilidade económica do pedido já se encontra definida, não está dependente de mais nenhum elemento, sendo evidente que não estamos perante pedidos genéricos pois foi possível aos apelantes determinarem de modo definitivo as consequências dos actos que reputam de ilícitos.
Aliás, repare-se que mesmo que se acolhesse a tese dos apelantes, no sentido da aplicabilidade do nº 4 do art. 299º do CPC, o valor da causa sempre teria de ser fixado na sentença (cfr art. 306º nº 2 do CPC) em função dos prejuízos que alegaram na petição inicial, não tendo fundamento legal aguardar pelo resultado da liquidação nos processos de insolvência.
De notar ainda que o argumento de que o elevado valor das custas processuais condiciona o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva consagrado no art. 20º da CRP não colhe, pois a lei prevê a protecção jurídica nos casos em que as pessoas não dispõem de meios económicos para custearem as acções judiciais”. (fim de citação)
Mais próximo da posição defendida pela apelante se situa o acórdão proferido no processo nº 21111/16.5T8LSB-A.L1-7, datado de 06-12-2017, tomado por maioria e com declaração de voto vencido, e que pela referência que faz à restante jurisprudência entendemos aqui também, na parte relevante, transcrever:
“De todo o modo, não se encontra o juiz vinculado ao valor acordado entre as partes (artigo 306º e 308º, do Código de Processo Civil, segundo o qual “Quando as partes não tenham chegado a acordo ou o juiz o não aceite, a determinação do valor da causa faz-se em face dos elementos do processo ou, sendo estes insuficientes, mediante as diligências indispensáveis, que as partes requererem ou o juiz ordenar”.
O artigo 299º, nº 4, do Código de Processo Civil estabelece que: “Nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação, o valor inicialmente aceite é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.”
Nesta sequência, e cumprindo a obrigação processual estatuída no artigo 552º, nº 1, alínea f), os AA. atribuem à causa o valor de € 30.000,01, remetendo a respectiva correcção para momento futuro, atendendo a que formularam um pedido ilíquido, não sendo objectivamente possível, neste momento processual, traduzir quantitativamente a utilidade económica dos seus pedidos.
   Em sentido oposto, tendo por certo o pressuposto da alegação de um determino prejuízo concreto, à data da propositura desta acção, que atingiria a impressiva verba de € 2.349.000,00 (o resultado do somatório dos valores de € 669 000,00, € 151 000,00 e € 1 529 000,00, todos a título de capital investido), a que acrescerão os juros contabilizados pelas Autoras, como interesses convencionados e vencidos até dia 18 de Janeiro de 2014, estes no montante global de € 116.447,50, o juiz a quo entendeu fixar o valor da causa em € 2 465 447,50 (dois milhões, quatrocentos e sessenta e cinco mil e quatrocentos e quarenta e sete euros e cinquenta cêntimos), correspondente à cumulação/soma dos aludidos valores de capital e dos juros vencidos, em detrimento do valor inicialmente atribuído pelas Autoras de € 30.000,01.                Vejamo:
Consideramos ser de conceder parcial razão aos AA. apelantes, uma vez que o astronómico valor estabelecido pelo juiz a quo não se compatibiliza, harmoniosa, realística e coerentemente, com a estrutura concreta da petição inicial apresenta, mormente quanto aos pedidos formulados genéricos e ilíquidos que vieram a ser em concreto deduzidos.
Importa, a este propósito, tomar em especial consideração que o pedido não deixa de ser, neste momento processual, ilíquido – o que significa que não atinge nenhuma expressão pecuniária certa e determinada (embora determinável em função da prova que poderá vir a ser produzida no futuro).
Resta, neste sentido, atender apenas à causa de pedir apresentada na petição inicial que indiciará, nos seus concretos termos, a noção da utilidade económica da pretensão.
Outrossim não é possível olvidar que o Réu BES encontra-se actualmente em liquidação por via da respectiva insolvência (facto público e notório).
Assim sendo, é absolutamente evidente que somente no âmbito do processo de liquidação será finalmente possível configurar verdadeiramente qual efectiva e real utilidade económica dos pedidos aqui em presença.
Tal utilidade económica dos pedidos (ilíquidos) formulados pelos AA. não é susceptível de exacta concretização na presente causa, sendo altamente improvável, quiçá totalmente irrealista e inverossímil, imaginar que, em sede de reclamação de créditos, os AA. venham a lograr obter o ressarcimento dos valores máximos que indicam relativamente ao capital investido.
Fazê-lo é pura e simplesmente ficcionar a existência de algo que seguramente não sucederá.
Esta evidente constatação arreda, por si só, qualquer possibilidade de recurso ao critério definido no artigo 299, nº 4, do Código de Processo Civil, cujo a aplicação automática, perante todo o circunstancialismo enunciado, deixa pura e simplesmente de fazer o menor sentido, não recolhendo a menor réstea de razoabilidade.
Havendo os AA. alegado não ser possível quantificar os danos sofridos, à data da propositura da acção, não se compreende, tendo presente todo o circunstancialismo enunciado, o fundamento para afirmar desde já que o valor do prejuízo deve equivaler à soma aritmética dos valores em referência respeitante ao capital investido e juros.
Nem a causa de pedir tal como os AA. a configuram, nem as pretensões formuladas, na sua específica vertende de crédito ilíquido, justificam a conclusão extraída pelo juiz a quo de que o prejuízo sofrido pelos AA. se reconduz necessariamente à mera soma daquelas parcelas.
Trata-se de uma conclusão precipitada e simplista que esquece a prévia necessidade de determinação do valor dos prejuízos genéricos discriminados na petição inicial, o que igualmente permite compreender os pedidos ilíquidos formulado a título de danos patrimoniais.
Tudo sopesado, face à manifesta impossibilidade da referida determinação no âmbito destes autos, é absolutamente legítimo e inteiramente equilibrado o recurso a critérios de equidade para a fixação do valor da causa, em plena harmonia com a regra geral ínsita no artigo 566º, nº 3, do Código Civil, avocando então a oportuna ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso, não podendo ignorar a complexidade e especificidade das questões que envolvem a lide, bem como a indiscutível e inegável dificuldade na efectivação imediata do crédito de que os AA. se arrogam.
Esta solução técnico-jurídico, plenamente consistente, evita ainda a injusta penalização dos AA., designadamente no que respeita aos pesados encargos processuais.
Ao invés, a solução oposta, sufragada pelo juiz a quo, acaba por redundar num profundo gravâme económico, através do valor excessivo de pagamento de custas que implicará, sem acarretar equivalente vantagem económica para os peticionantes.
Note-se que o critério utilizado em 1ª instância socorre-se do valor máximo que a que os AA. dizem que teriam direito - e que referem não ser viável, nem realista vir a obter, pugnando então pela condenação dos RR. na diferença do que vier afinal a ser possível arrecadar na liquidação.
Ou seja, é um valor diferencial que está aqui em causa e não a obtenção do limite máximo indicado que apenas serve, na prática, para estabelecer um tecto ao valor ideal a que os demandantes poderiam ter direito e quiçá aspirariam.
Por outro valor, o critério, puramente tabelar e formal, do valor da alçada do Tribunal da Relação – € 30.000,01 – também se nos afigura desajustado relativamente à grandeza dos interesses de ordem patrimonial que se discutem nos presentes autos, não sendo realista nem consentâneo com a elevada expressão dos créditos de que os AA. se arrogam.
Por todos estes motivos fixar-se-á à causa, com recurso a critérios de equidade e tomando por referência a ordem de grandeza dos montante genericamente peticionados, o valor de € 120.000,00 (cento e vinte mil euros), tomando também, para este efeito, em consideração os montantes de juros de mora já vencidos e liquidados em termos de pedido, aqui avocados como simples índice de grandeza (€34.615,50 + €7.172,50 + €74.659,50).
Seguindo as linhas gerais da tese propugnada no presente acórdão, vide o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de Junho de 2017 (relatora Maria Amélia Ribeiro), no processo n.º 21131/16.0T8LSB-A.L1, que, versando questão similar, referiu: “(…) de acordo com critérios de razoabilidade apoiados na equidade, não parece fazer sentido onerar a parte - com o impacto daí decorrente em termos de custas processuais - com um valor muito superior ao que ela indica e que no fundo, além de viabilizar as portas do recurso a todos os intervenientes, não deixe de preservar a competência do tribunal ao qual, a ser tido em conta o valor do pedido, caberia o processamento da presente acção [artº 117º/1/a)] da Lei 62/2013, de 26.08), ou seja, o valor de 50.000,01€.(…)”.
Corroborando o presente entendimento, vide acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26 de Setembro de 2017 (relatora Maria da Conceição Saavedra – ora 1ª adjunta)”[1]. (fim de citação)
                Que dizer?
Primeiro, que tal como é afirmado nos arestos, a pretensão de fixação do valor em €30.000,01, quer por recurso ao artigo 303º do CPC, quer por via de tal valor ser o que garante a extensão máxima dos recursos, não tem apoio na lei nem sustento no próprio sistema de recursos.
Com efeito, não estamos, de modo algum em situação idêntica ou sequer equiparável à dos interesses imateriais ou difusos ou sobre o estado das pessoas, pelo contrário, ainda que incerto o resultado da acção, o benefício pretendido é exclusivamente económico traduzível numa contrapartida em dinheiro.
O princípio constitucional de acesso à justiça não exige um sistema de recursos, e menos na sua máxima extensão ordinária. Por isso, o valor da acção não é atribuível em função dos patamares de recurso. Mas, no sentido inverso, também não é verdade que atingido o patamar máximo, todo o excedente valor seja irrelevante.
Não se encontra nas normas que definem a atribuição do valor, qualquer referência aos recursos, antes, a recorribilidade em função da regra do valor e da sucumbência é uma consequência da fixação do valor, ou seja, não é uma sua causa.
E isto leva-nos a outro nível de pergunta. Qual é a natureza da taxa de justiça, porque é que é devida, para que serve? É ela o simples pagamento do custo do serviço concretamente a prestar, ou tem um carácter menos adstrito ao custo concreto e mais dirigido ao financiamento da globalidade do serviço de justiça, ainda que sem poder perder a conexão ou comutatividade e proporcionalidade que a concreta acção justifica?
A propósito da distinção entre imposto e taxa, e incidindo directamente sobre esta questão, lê-se no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 09-09-2015, proferido no processo nº 0428/14:
“É sabido que a taxa se consubstancia numa prestação pecuniária e impositiva devida a uma entidade que exerça funções públicas em contrapartida de uma prestação dessa entidade, provocada ou utilizada pelo sujeito passivo e a prestação da entidade pública há-de consistir (na tipologia consagrada na LGT, na Lei das Finanças Locais e no Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais) na prestação de um serviço público, na utilização privativa de bens do domínio público e na remoção de obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares. (Cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, Editora Encontro da escrita, 4ª ed. 2012, pp. 70/71, anotação 4 ao art. 3°.)
Dando por adquiridas as inúmeras reflexões doutrinárias e jurisprudenciais produzidas sobre a matéria atinente à distinção entre imposto e taxa [ou seja, que ambos constituem receitas públicas coactivamente impostas, mas enquanto o imposto «... é uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral, sem carácter de sanção, exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos» (cfr. Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, Coimbra, 1977, 262) a taxa tem «carácter sinalagmático, não unilateral, o qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que consiste ou na prestação de uma actividade pública ou na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares» (cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, Lisboa, 1981, pag. 42) pressupondo, pois, uma contraprestação por parte do ente público que a exige, a verificar-se na respectiva génese, e que deve concretizar-se naquela prestação de serviço público, naquele acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular] (cfr. Casalta Nabais, Contratos Fiscais, Coimbra 1994, 236) ressalta na definição legal e doutrinal da taxa a individualização de um aspecto estrutural da mesma (a sinalagmaticidade ou bilateralidade) e, em consequência, os respectivos pressupostos da sua cobrança.
Relação sinalagmática essa que, como se sublinha no acórdão do Tribunal Constitucional nº 365/03, de 14/7/2003, «há-de ter um carácter substancial ou material, e não meramente formal; isso não implica, porém, que se exija uma equivalência económica rigorosa entre ambos, não sendo incompatível com a natureza sinalagmática da taxa o facto de o seu montante ser superior (e porventura até consideravelmente superior) ao custo do serviço prestado».
Ou seja, embora, por um lado, se venha acentuando que a taxa não pode ter só como pressuposto uma mera prestação administrativa sendo necessário que se dirija à compensação dessa prestação, estabelecendo-se uma relação comutativa entre a prestação e a taxa; e embora alguns autores entendam que a função compensatória das taxas se refere ao custo da prestação para a entidade pública ou ao benefício que esta acarreta para o devedor, elas também têm uma finalidade arrecadatória de receitas, intimamente associada à função compensatória, ou a outras finalidades, também, por outro lado, se acentua que, apesar de não dever ultrapassar-se um certo patamar quantitativo nem perder o sentido comutativo, a equivalência reconduz-se a uma equivalência jurídica (ver art. 4º do RTL) entre as prestações e não a uma equivalência económica, equivalência jurídica que deve, contudo, fundamentar-se numa relação entre o custo do serviço e o valor da prestação e é materialmente determinada segundo o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade (cfr. Suzana Tavares da Silva, As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário, CEJUR, Outubro de 2008. pp. 60/61)”. (fim de citação).
No mesmo sentido, veja-se o sumário do acórdão do Tribunal Central Administrativo proferido no processo nº 07700/14, em 26.06.2014:
“(…) VI – Para que se possa afirmar que o tributo é inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade, não basta afirmar a existência de uma desproporção entre a quantia a pagar e o beneficio auferido, sendo necessário demonstrar que essa desproporção é manifesta e compromete de forma definitiva a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática.
                (…)”. (fim de citação).
Portanto, o custo a pagar não é directamente a contraprestação do serviço concretamente a prestar, caso em que poderíamos fazer intervir as considerações que levaram esta Relação, no processo nº 21111/16.5T8LSB-A.L1-7, na parte acima transcrita, a convocar a equidade para determinar o valor, mas garantida uma proporcionalidade jurídica, e no pressuposto da aplicação da mesma regra a qualquer caso em garantia de igualdade jurídica, o custo do serviço a prestar enquadrado no custo de funcionamento geral do sistema e da administração da justiça.
Não pode pois afirmar-se que ocorra qualquer violação do princípio constitucional do acesso à justiça, em tanto quanto seria também impossível determinar qual o limite em que essa violação ocorreria: a partir de que montante acima de €30.000,01 se oneraria excessivamente e de modo intolerável quem pretende utilizar o serviço da justiça pública? Porque razão se distingue quem reclama sessenta mil, duzentos mil, três milhões ou onze milhões de euros?
Somos assim, com o voto de vencida proferido no referido processo nº 21111/16.5T8LSB-A.L1-7, a entender que não se pode recorrer à equidade, na medida em que existe, apesar do previsível insucesso das acções e apesar do carácter rotineiro em que se resolve a multiplicidade de acções do mesmo tipo, uma razão de fundo que não relaciona directamente a taxa a pagar com o custo do serviço concreto a desempenhar no processo concreto.
Resta renovar, quanto às considerações sobre a possibilidade de dedução de pedido genérico, o quanto ficou expendido no acórdão que o ora relator já subscreveu e que se aplica também no caso concreto:
“O art. 556º nº 1 al. b) do CPC estatui:
«1. É permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes:
                (…)
b) Quando não seja possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569º do Código Civil; (…)
2. Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior o pedido é concretizado através de liquidação, nos termos do disposto no artigo 358º, salvo, no caso da alínea a) quando (…)».
E o art. 569º do Código Civil prescreve:
«Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede de, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.».
Os apelantes indicam na petição inicial a importância exacta em que avaliam os danos decorrentes de alegadamente terem investido quantias em instrumentos financeiros, como se evidencia do art. 485º desse articulado, onde se lê:
«Atento o acima exposto, o Primeiro Autor e o Segundo Autor sofreram prejuízos patrimoniais no montante total de (…) que correspondem aos valores globais aplicados em (…) e respectivos juros (…)».
Portanto, os apelantes querem ser ressarcidos por esses montantes de capital, juros convencionados e juros de mora.
Assim, a utilidade económica do pedido já se encontra definida, não está dependente de mais nenhum elemento, sendo evidente que não estamos perante pedidos genéricos pois foi possível aos apelantes determinarem de modo definitivo as consequências dos actos que reputam de ilícitos.
Aliás, repare-se que mesmo que se acolhesse a tese dos apelantes, no sentido da aplicabilidade do nº 4 do art. 299º do CPC, o valor da causa sempre teria de ser fixado na sentença (cfr art. 306º nº 2 do CPC) em função dos prejuízos que alegaram na petição inicial, não tendo fundamento legal aguardar pelo resultado da liquidação nos processos de insolvência”. (fim de citação).
Em consequência, improcede o recurso, e nenhuma outra razão tendo sido aduzida quanto à incompetência do tribunal, há que manter a decisão recorrida, tanto na questão do valor quanto na da incompetência.
Tendo decaído no recurso, é a recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do CPC.
                V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam negar provimento ao recurso e em consequência confirmam a decisão recorrida.
                Custas pela recorrente.
                Registe e notifique.
Lisboa, 21 de Junho de 2018

Eduardo Petersen Silva

Cristina Neves

Manuel Rodrigues




[1] Do voto de vencida da Exmª Senhora Desembargadora Dina Monteiro salienta-se o entendimento seguinte:
 “Como se referiu no acórdão 653/16.T8SLSB.L1, já citado:
“Não temos dúvida que, no caso de pedidos ilíquidos, a equidade tem um papel preponderante na determinação dos critérios relevantes para a fixação do valor da causa. No entanto, o recurso à equidade não é um exercício de arbitrariedade do poder judicial.
(…)
Em primeiro lugar, a solução legal deste problema é que que resulta do Art. 4º do C.C., que estabelece que os tribunais só poderão resolver segundo a equidade quando haja disposição legal que o permita, quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja sobre direitos indisponíveis ou quando elas a tenham previamente convencionado.

No caso dos autos a permissão legal para o recurso à equidade não resulta de norma expressa, mas da competência que a lei atribui ao juiz da causa para fixar o valor da causa (Art. 306º n.º 1 do C.P.C.) conjugado com elasticidade que o próprio legislador confere ao caso específico das ações em que são formulados pedidos ilíquidos (v.g. Art. 299º n.º 4 do C.P.C.).
O exercício da equidade está, no entanto, balizado pelo pedido e causa de pedir, tendo por referência o benefício económico concretamente pretendido, que é o critério geral da fixação do valor da causa (Art. 297º n.º 1 do C.P.C.), ou o benefício meramente expectável, se não houver elementos que permitam objetivar esse benefício doutro modo. Só neste último caso a equidade assume papel relevante”
Ressalvado o devido respeito, entendemos, assim, que não pode o Tribunal lançar mão da equidade para a fixação do valor de uma ação quando, ali já se encontrarem presentes elementos que permitam, com segurança, concluir pela dedução de um pedido, ainda que apenas em parte, líquido.
            (…)
Por fim, entendem os AA. que a interpretação realizada pelo Tribunal de 1.ª Instância relativamente ao artigo 297.º, n.º 1, do Código de Processo Civil Revisto, sempre teria de ser tida como inconstitucional por se traduzir numa inibição do recurso aos tribunais por parte dos lesados, violando-se, assim, o disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito de acesso à justiça mediante um processo justo e equitativo.
Também neste segmento defendemos o que já antes tínhamos referido no âmbito do citado acórdão 653/16.T8SLSB.L1:
“Sucede que, as regras da fixação do valor da causa em processo civil são objetivas e aplicáveis a todos os cidadãos.
A regra de fazer corresponder custas mais elevadas a quem pretende obter benefícios económicos mais elevados é perfeitamente conforme à realização duma Justiça equitativa. Sendo que, o efeito indireto de inibição de acesso à Justiça por alguns cidadãos que tenham maiores dificuldades económicas não é obtido pela criatividade do juiz ou pela fixação do valor da ação com recurso a regras meramente subjetivas, mas sim pela aplicação do instituto do benefício de apoio judiciário e pela aplicação da correção decorrente do Art. 6.º n.º 7 do R.C.P., que permite a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça em casos que o justifique. O que, no caso, até foi aplicado pelo Tribunal a quo e de forma absolutamente correta e pertinente.
Julgamos assim que o Art. 297º n.º 1 do C.P.C. não viola a Constituição, nomeadamente o direito ao acesso aos tribunais mediante um processo justo e equitativo”.